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Esquema de resolução de casos práticos de TGDC I

PASSO 1: Início e termo da personalidade jurídica


A, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de um
sujeito ser titular de direitos e de estar adstrito a deveres e a obrigações) desde o
momento do seu nascimento com vida [artigo 66º/1 CC].

Se houver um nascituro, referir o artigo 66º/2 CC, bem como a divergência


doutrinária relativamente à personalidade jurídica do nascituro.

 MENEZES CORDEIRO e PPV – nascituros têm personalidade jurídica pois


essa inicia-se com a concepção e não com o nascimento;

 ROSÁRIO PALMA RAMALHO – nascituros não têm direitos, mas sim


expectativas jurídicas, pelo que o Direito já lhes confere alguma tutela;

 MOTA PINTO e CASTRO MENDES – há direitos sem sujeito, pois existem


direitos nos termos do artigo 66º/2 CC, mas não há titular do direito
porque ainda não há personalidade jurídica;

 DIAS MARQUES – a personalidade jurídica retroage até ao momento da


aquisição do direito da parte do nascituro.

A meu ver, basta referir a posição do vosso Regente e, no caso de ser diferente, a
vossa própria opinião, devidamente fundamentada.

Se alguém morrer, referir que a sua personalidade jurídica cessou, nos termos do
artigo 68º/1 CC, logo deixou de ser titular de quaisquer situações jurídicas.

A verificação da morte é feita com base no disposto no Decreto-Lei nº 141/99,


de 28 de Agosto, sendo os únicos artigos relevantes para TGDC o artigo 2º (“A morte
corresponde à cessação irreversível das funções do tronco cerebral”) e o artigo 3º/1 (“A
verificação da morte é da competência dos médicos, nos termos da lei”).

PASSO 2: Direitos de personalidade


Como A tem personalidade jurídica, é titular de direitos de personalidade
(direitos inerentes à sua qualidade enquanto pessoa), que constituem situações
jurídicas ativas (de vantagem para o titular) e absolutas (existem por si mesmas, não
dependendo de nenhuma relação jurídica) ou, mais ainda, verdadeiros direitos
subjetivos (MC: permissão normativa de aproveitamento de um bem em específico).
PASSO 3: Tutela geral da personalidade
Os direitos de personalidade são tutelados de modo geral no artigo 70º CC, isto
é, a lei protege os indivíduos contra qualquer ofensa ou ameaça à sua integridade física
ou moral [artigo 70º/1 CC], para além de permitir ao sujeito recorrer às providências
necessárias para atenuar a ofensa cometida ou ameaçada [artigo 70º/2 CC].

Se estivermos perante ofensa a pessoa falecida, recorram ainda ao artigo 71º CC.
Notem que aqui estamos perante um direito de personalidade à memória dos familiares
e herdeiros do falecido e não perante um direito à integridade moral do falecido, pois a
sua personalidade jurídica cessou com a morte, logo deixou de ser titular de direitos.

PASSO 4: Direitos de personalidade em especial


Identificar quais os direitos de personalidade que encontramos no caso prático
em estudo e, de seguida, explicar (ou seja, não basta identificarem o artigo, têm de
esmiuçar e analisar com rigor os artigos em questão – LER OS ARTIGOS ATÉ AO FIM
porque é muito fácil existir uma excepção no final que pode passar despercebida por
quem lê sem atenção) o seu regime: artigos 72º-80º CC e 24º-26º CRP.

Justifiquem, obviamente, se o caso prático em estudo se encontra ou não na


previsão dos artigos mencionados.

PASSO 5: Situações especiais


O regime dos artigos 70º a 80º CC não basta para analisarem os direitos de
personalidade. Devem ter em atenção outras matérias, nomeadamente:

 Limitação voluntária dos direitos de personalidade [artigo 81º CC];

 Colisão de direitos [artigo 335º CC];

 Existência de algum meio de autotutela [artigos 336º - 339º CC];

 Consentimento do lesado [artigo 340º CC];

 Exceptio veritatis – “excepção de verdade”.


PASSO 6: Consequências em caso de violação do direito de personalidade
No caso de violação, A pode requerer as providências necessárias para evitar ou
atenuar os efeitos da ofensa ou ameaça [artigo 70º/2 CC], dando lugar a imputação do
dano ao causador sob a forma de responsabilidade civil extra-contratual, nos termos
do artigo 483º/1 CC. Para haver responsabilidade civil, têm de se verificar os cinco
seguintes pressupostos:

 Dano - supressão de uma vantagem tutelada pelo Direito;

 Facto ilícito – que viole um direito absoluto de outrem (exemplos: direito


de propriedade ou direitos de personalidade) ou disposição legal que
proteja o interesse de terceiros (exemplo: normas sobre a Concorrência);

 Culpa – trata-se de um juízo de censura apreciado pelo Direito, segundo


o critério da diligência de «um bom pai de família» [artigo 487º/2 CC];

 Nexo de causalidade – o facto praticado tem de ser a causa necessária (e


não meramente fortuita ou acidental) do dano causado [artigo 563º CC];

 Imputabilidade – capacidade do autor da lesão de entender o facto que


praticou, apreciada nos termos do artigo 488º CC.

No caso de estarmos perante uma ofensa ao bom nome, temos ainda


responsabilidade civil nos termos do artigo 484º CC. No caso dos direitos de
personalidade, releva ainda a responsabilidade por danos morais ou não patrimoniais,
nos termos do artigo 496º/1 CC.

Havendo responsabilidade civil, gera-se uma obrigação de indemnizar, nos


termos do artigo 562º CC, devendo essa indemnização compreender não só os danos
emergentes (“o prejuízo causado”), como também os lucros cessantes (“os benefícios
que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”), à luz do artigo 564º/1 CC.
Perante violação de direitos de personalidade, a indemnização funciona normalmente
enquanto sanção compensatória e portanto é fixada em dinheiro [artigo 566º/1 CC].
Caso Prático 1

Andreia é uma famosa atriz de teatro e de televisão. Aos 25 anos, ao sair


bastante embriagada de uma festa particular na discoteca CITY BEACH onde estavam
presentes várias celebridades, esta foi detida por suspeitas de fraude fiscal.
Vários repórteres da comunicação social, que tiveram informação antecipada do
sucedido através de denúncia, encontravam-se à saída da discoteca e decidiram
fotografar e gravar a detenção de Andreia.
Bruno, jornalista do jornal «Pasquim da Madrugada», escreveu uma extensa
reportagem sobre Andreia, fazendo destaque a uma fotografia desta, notoriamente
embriagada, a ser detida e acusando-a de ser «a vergonha da televisão nacional».
Andreia pretende pôr fim à divulgação das notícias e das imagens, para além de
exigir que Bruno lhe pague uma indemnização por danos à honra e à sua imagem.
Quid juris?

Resolução:
Andreia, enquanto pessoa, adquiriu personalidade jurídica (suscetibilidade de ser titular
de direitos e de estar adstrita a deveres e obrigações) desde o momento do seu nascimento
completo e com vida [artigo 66º/1 CC].

Portanto, Andreia é titular de direitos de personalidade (direitos inerentes à sua


qualidade enquanto pessoa), os quais constituem situações jurídicas ativas (de vantagem para
o titular) e absolutas (existem por si mesmas, não dependendo de nenhuma relação jurídica) ou,
mais ainda, verdadeiros direitos subjetivos (MENEZES CORDEIRO: permissão normativa de
aproveitamento de um bem em específico).

Os direitos de personalidade são tutelados de modo geral no artigo 70º CC, isto é, a lei
protege os indivíduos contra qualquer ofensa ou ameaça à sua integridade física ou moral [artigo
70º/1 CC], para além de permitir ao sujeito recorrer às providências necessárias para atenuar a
ofensa cometida ou ameaçada [artigo 70º/2 CC].

Na hipótese sub judice, encontramo-nos perante eventuais violações de direitos de


personalidade, nomeadamente do direito à imagem (artigo 79º CC e artigo 26º/1 CRP) e do
direito à honra ou ao bom nome (artigo 70º/1 CC e artigos 25º e 26º/1 CRP).

No caso do direito à imagem, o artigo 79º/1 CC consagra a regra geral: “O retrato de


uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento
dela”. Logo, os vários repórteres e Bruno, à partida, necessitariam do consentimento de Andreia
para captarem e reproduzirem imagens suas.

Não obstante, o artigo 79º/2 CC permite que não haja consentimento se assim se
justificar a “notoriedade” da pessoa retratada ou se estivermos perante acontecimentos de
interesse público ou que ocorram publicamente. Andreia, sendo uma famosa atriz de teatro e
de televisão, parece-nos encontrar-se na situação supra mencionada e, portanto, não seria
necessário o seu consentimento.
No entanto, o artigo 79º/3 proíbe a reprodução, divulgação ou captação da imagem se
daí “resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada”. De facto,
parece-nos que as imagens captadas de Andreia a ser detida por um crime ainda não
comprovado (apenas existem suspeitas) e, além disso, claramente embriaga, são uma evidente
violação da sua honra e reputação. Logo, concluímos que estamos, de facto, perante uma
violação do direito à imagem de Andreia.

Do exposto anteriormente, parece-nos, portanto, que também estamos perante uma


violação do direito à honra ou ao bom de Andreia, sobretudo quando temos em consideração o
facto de que Bruno, jornalista, qualificou-a como «a vergonha da televisão nacional». A lei tutela
este direito de personalidade nos artigos 70º/1 CC e nos artigos 25º e 26º/1 CRP.

Teremos ainda de averiguar se estaremos perante uma colisão de direitos: o direito a


informar e à liberdade de imprensa dos vários jornalistas, nomeadamente de Bruno, e os direitos
de personalidade de Andreia. Consagra o artigo 335º/2 CC que, quando estamos perante
direitos de valor ou espécie diferente, “prevalece o que deva considerar-se superior”. Neste
sentido, a doutrina maioritária (onde se insere MENEZES CORDEIRO, PAIS DE VASCONCELOS e
ROSÁRIO RAMALHO), na qual nos inserimos, tende a declarar a superioridade dos direitos de
personalidade. Logo, estamos efetivamente perante a violação do direito à imagem e ao bom
nome de Andreia.

Andreia pode requerer as providências necessárias para evitar ou atenuar os efeitos da


ofensa ou ameaça [artigo 70º/2 CC], dando lugar a imputação dos danos causados sob a forma
de responsabilidade civil extra-contratual [artigo 483º/1 CC].

Para haver responsabilidade civil, têm de se verificar os cinco seguintes pressupostos:


existência de um dano (supressão de uma vantagem tutelada pelo Direito); facto ilícito (violação
de direitos de personalidade); culpa, apreciada segundo o critério da diligência de «um bom pai
de família» [artigo 487º/2 CC]; nexo de causalidade [artigo 563º CC] e imputabilidade
(capacidade do autor da lesão de entender o facto que praticou, apreciada nos termos do artigo
488º CC). Consideramos, através de tudo o que foi exposto anteriormente, que os cinco
pressupostos se encontram preenchidos.

Como nos encontramos perante uma ofensa ao bom nome, temos ainda
responsabilidade civil nos termos do artigo 484º CC. Releva ainda, a nosso ver, a
responsabilidade por danos morais ou não patrimoniais [artigo 496º/1 CC].

Havendo responsabilidade civil, gera-se uma obrigação de indemnizar, nos termos do


artigo 562º CC, devendo essa indemnização compreender não só os danos emergentes (“o
prejuízo causado”), como também os lucros cessantes (“os benefícios que o lesado deixou de
obter em consequência da lesão”), à luz do artigo 564º/1 CC. Perante violação de direitos de
personalidade, a indemnização funciona normalmente enquanto sanção compensatória e
portanto é fixada em dinheiro [artigo 566º/1 CC].

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