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ESTUDO DE CASOS
CASOS
EM DIREITO
EM DIREITO MEDICO
MEDICO EE DA
DA SAUDE
SAUDE
Organizadores:
Autores:
Salvador, Bahia,
Brasil – 2021
Conselho Editorial
• Antonio Francisco Costa
• Gilson Alves de Santana Júnior
• Nelson Cerqueira
• Rodolfo Pamplona Filho
• Wilson Alves de Souza
Produção gráfica:
Couto Coelho – E-mail: editorapagine@gmail.com
Capa:
Maitê Coelho – E-mail: maitescoelho@yahoo.com.br
Editoração eletrônica:
Cendi Coelho – E-mail: cendicoelho@gmail.com
Vários autores.
Bibliografia.
ISBN 978-65-89459-12-5
21-82024 CDU-347.56:61
Nota editorial....................................................................................................... 17
– Os organizadores
Capítulo I
Suicídio assistido e eutanásia à luz do direito Constitucional
português e brasileiro: direito à vida ou dever de viver
sob qualquer circunstância?....................................................................... 19
– Daniel Silva Vitor Bento
1. Introdução ....................................................................................................... 19
2. Conceito e classificações de suicídio assistido e eutanásia........ 20
3. O suicídio assistido e a eutanásia no direito comparado............. 22
4. Análise do Decreto n.º 109/ XIV/2021 da Assembleia
da República Portuguesa – Lei João Semedo..................................... 26
4. Definições normativas e jurisprudência brasileira........................ 35
6. Considerações finais.................................................................................... 39
Referências............................................................................................................. 41
Capítulo II
Dano iatrogênico à luz da boa fé objetiva, uma análise
do direito à informação do paciente e do ônus probatório...... 43
– Daniela Brito Mercuri
– Monalisa Barbosa Pimentel Pinheiro
1. Introdução ....................................................................................................... 43
2. Considerações sobre dano iatrogênico................................................ 45
6 Estudo de casos em direito médico e da saúde
Capítulo III
Parâmetros para o exercício seguro da recusa terapêutica:
uma análise a partir do entendimento jurisprudencial
acerca da disposição sobre o próprio corpo.................................. 63
– Érica Baptista Vieira de Meneses
– Lucas Macedo Silva
1. Introdução 63
2. O conceito de vida digna no ordenamento jurídico
brasileiro........................................................................................................... 65
3. Conformação da autonomia privada no contexto
da disposição sobre o próprio do corpo.............................................. 70
4. O exercício do direito de recusa a tratamento médico................. 73
5. Considerações finais.................................................................................... 81
Referências............................................................................................................. 83
Capítulo IV
A publicidade médica nas redes sociais e a responsabilidade
civil em casos de procedimentos estéticos: uma análise
acerca das expectativas criadas nos pacientes
e a vinculação de resultados....................................................................... 87
– Fernanda Moura Silva
– Gabriela Silva Sady
1. Introdução.......................................................................................................... 88
2. Breves considerações acerca da publicidade médica
e da responsabilidade civil do médico................................................. 88
2.1. A publicidade médica em tempos de redes sociais.............. 92
2.2. A responsabilidade civil do médico em procedimentos
estéticos: novos paradigmas?........................................................ 94
3. Análise do caso concreto: o posicionamento do Conselho
Federal de Medicina .................................................................................... 97
Sumário 7
Capítulo V
TikTok e a publicidade médica: a adesão da classe médica
ao aplicativo e os limites da ética na publicidade.......................... 109
– Mariane Heberlê Hurtado Plácido
– Paula Carolina Araújo da Silva
1. Introdução 109
2. Publicidade médica: legislação e adequação à era digital........... 111
3. Redes sociais: o uso das redes sociais como meio
de divulgação de serviço............................................................................ 114
3.1. Aderência dos profissionais da saúde às regras
de publicidade...................................................................................... 115
3.2. A pandemia do covid-19 e as mídias sociais:
a viralização do TikTok..................................................................... 118
4. Análise de caso concreto: decisão do cremesp de interdição
cautelar de cirurgiã plástica por publicidade indevida................ 122
5. Conclusão......................................................................................................... 127
Referências............................................................................................................. 129
Capítulo VI
O setor de saúde suplementar e o rol da Agência Nacional
de Saúde Suplementar sob a ótica do Superior Tribunal
de Justiça................................................................................................................ 133
– Lucas Funghetto Lazzaretti
1. Introdução ....................................................................................................... 133
2. Considerações sobre a Lei nº 9.656/98, a Agência Nacional
de Saúde Suplementar e o setor de saúde suplementar.............. 134
3. O rol da ANS sob a ótica do superior tribunal de justiça............. 143
4. Conclusão ........................................................................................................ 147
Referências............................................................................................................. 148
8 Estudo de casos em direito médico e da saúde
Capítulo VII
Envelhecimento populacional e planos de saúde:
a (i)legitimidade dos reajustes por faixa etária
dos novos idosos................................................................................................ 151
– Ana Maria Silva Souza
– Matheus Athayde
1. Introdução ....................................................................................................... 151
2. O envelhecimento populacional............................................................. 153
2.1. Envelhecimento ativo e novos idosos......................................... 154
2.2. Acesso à saúde para os idosos....................................................... 155
3. Saúde suplementar, planos de saúde e o enquadramento
por faixa etária............................................................................................... 157
3.1. Reflexões acerca das normas infralegais
regulamentadoras............................................................................... 159
3.2. Reajustes por faixa etária na visão do STJ................................ 163
4. Considerações finais ................................................................................... 166
Referências............................................................................................................. 168
Capítulo VIII
Uma análise da ADI 5.529: a não prorrogação da vigência
das patentes farmacêuticas como forma de assegurar
a função social e o direito à saúde........................................................... 171
– Flávia Mendes Moreira de Andrade Mélo
– Henrique Costa Princhak
1. Introdução ....................................................................................................... 172
2. Breve exame sobre o contexto de registro de patentes
na área da saúde e a assistência farmacêutica................................. 173
3. Uma análise da ADI 5529 do STF: a não prorrogação
da vigência das patentes farmacêuticas como forma
de assegurar a função social e o direito à saúde.............................. 180
4. Considerações finais.................................................................................... 192
Referências............................................................................................................. 194
Capítulo IX
Responsabilidade civil do Estado em casos de danos
provenientes da vacinação ........................................................................ 199
– Luana Reis Ferreira
– Daniela Brito Mercuri
Sumário 9
Capítulo X
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária.. 221
– Hugo Leonardo Cunha Roxo
1. Introdução ....................................................................................................... 221
2. O direito à saúde e a pandemia de covid-19...................................... 222
2.1. Uma breve noção de saúde.............................................................. 222
2.2. O direito à saúde e a legislação correlata.................................. 223
2.3. O caos: um pouco do contexto pandêmico............................... 225
3. O que fazem as empresas privadas e os governos:
imunização, geopolítica e soberania sanitária................................. 233
3.1. A teoria do sistema-mundo: um rápido esboço..................... 233
3.2. Imunização e geopolítica................................................................. 234
3.3. Autonomia/soberania sanitária e direito à saúde................ 245
4. Considerações finais.................................................................................... 248
Referências............................................................................................................. 248
Capítulo XI
A alocação de recursos de saúde em face da escassez
de Unidades de Terapia Intensiva (UTI’s) decorrente
da pandemia ocasionada pela covid-19............................................... 251
– Diogeano Marcelo de Lima
1. Introdução........................................................................................................ 251
2. Da eleição de critérios para alocação de vagas em unidades
de terapia intensiva (UTI’S)...................................................................... 253
3. Da impossibilidade de se multiplicar os recursos de saúde
através da via judicial.................................................................................. 256
4. Breve histórico sobre o surgimento da bioética.............................. 261
4.1. Da bioética principialista ............................................................... 264
4.2. Da aplicabilidade do princípio bioético da justiça
na distribuição de vagas de UTI’S................................................. 271
10 Estudo de casos em direito médico e da saúde
Capítulo XII
Judicialização da saúde e escassez de recursos públicos:
estudo de caso do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia....... 277
– Flávia Sulz Campos Machado
1. Introdução ....................................................................................................... 277
2. Estudo de caso do tribunal de Justiça do Estado da Bahia.......... 278
3. Direito à saúde e escassez de recursos................................................ 284
4. A dificuldade do judiciário de enfrentar o problema
dos custos do direito à saúde................................................................... 288
5. Considerações finais.................................................................................... 293
Referências............................................................................................................. 294
Capítulo XIII
O sistema de precedentes do CPC e a importância
da bioética nas decisões judiciais: uma análise
da fundamentação do AI 0088052-64.2020.8.21.7000,
oriundo do TJRS ................................................................................................ 297
– Isabela Maria Silva Oliveira
– Jemyma Jandiroba Ferreira
1. Introdução ....................................................................................................... 298
2. O sistema de precedentes brasileiro..................................................... 299
3. Agravo de instrumento n. 0088052-64.2020. 8.21. 7000,
da comarca de Gaurama. Tribunal de Justiça do Estado
do Rio Grande do Sul (TJRS). Sétima Câmara Cível........................ 306
4. O caso concreto e o conflito de regras e princípios sobre
a (não)obrigatoriedade da vacinação infantil ................................. 308
4.1. Breve histórico sobre a implantação da vacinação
obrigatória no Brasil e a origem do pensamento anti-vacina
a partir da tecnologia da (des)informação........................................ 310
4.2. Análise temática à luz da bioética ............................................... 311
5. Conclusão......................................................................................................... 316
Referências............................................................................................................. 317
Mensagem
do presidente da OAB/BA
Thaís Bandeira
Diretora da ESA/BA
Nota editorial
Os organizadores
CAPÍTULO I
1. INTRODUÇÃO
Esse artigo investiga o suicídio assistido e a eutanásia em Portugal
e no Brasil, com enfoque nas suas respectivas Constituições e jurispru-
dências. Trata-se de um tema relevante e nada pacífico, que acarreta
em discussões com argumentos religiosos, filosóficos, socioeconômicos,
políticos, jurídicos e bioéticos.
A partir da década de 1980 alguns países passaram a admitir a
prática da morte assistida, com fundamentações e critérios legais dife-
rentes, tendo em vista a sua própria estrutura constitucional, de modo
2. CONCEITO E CLASSIFICAÇÕES
DE SUICÍDIO ASSISTIDO E EUTANÁSIA
Albert Camus (2010, p. 19), afirmava que só existe um problema
filosoficamente sério: o suicídio. Segundo Durkheim (2010, p. 14), o
suicídio é todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de
um ato, positivo ou negativo, realizado pela própria vítima com a ciência
que surtirá esse resultado.
Suicídio assistido e eutanásia à luz do direito Constitucional português e brasileiro... 21
anos de idade que solicitaram sua eutanásia, desde que seus pais ou
tutores tenham participado da tomada desta decisão; e os menores de
idade entre doze e dezesseis anos, desde que seus pais ou tutores tenham
concordado com sua eutanásia (ALBUQUERQUE, 2006, p. 301).
A eutanásia ativa passou a ser permitida na Bélgica com a entrada
em vigor da lei sobre a matéria em 28 de maio de 2002. Esta lei sofreu
alterações para estender a possibilidade da eutanásia a menores de
idade, por outra lei em 28 de fevereiro de 2014. Nos termos do artigo 2.º
prevê eutanásia como o ato praticado por alguém que intencionalmente
põem termo à vida de outra pessoa, a pedido desta. Para ser legítima,
a eutanásia tem que obedecer determinadas condições e só pode ser
praticada por médicos, sendo irrelevante a distinção das modalidades
de eutanásia. De acordo com o artigo 3.º da referida lei, na redação de
2014, o médico que pratique a eutanásia não comete infração se ele
se tiver assegurado de que: o paciente seja maior de idade ou menor
emancipado capaz ou ainda menor de idade dotado de capacidade de
discernimento e que esteja consciente no momento do pedido; o pedido
deve feito de forma voluntária e refletida, repetidamente, sem qualquer
pressão externa; e o paciente deve se encontrar em situação médica sem
saída e em sofrimento físico e/ou psíquico constante e insuportável sem
possibilidade de ser aliviado, causados por lesão ou patologia grave e
incurável (PORTUGAL, 2016, p. 17).
Eutanásia e suicídio assistido foram legalizados em Luxemburgo,
em 16 de março de 2009, e atualmente são regulados pela Comissão
Nacional de Controle e Avaliação. A lei abrange adultos competentes,
portadores de doenças incuráveis e terminais que causam sofrimen-
to físico ou psicológico constante e insuportável, sem possibilidade
de alívio. O paciente deve solicitar o procedimento por meio de suas
disposições de fim da vida, um documento escrito, obrigatoriamente
registrado e analisado pela Comissão Nacional de Controle e Avaliação.
Este documento permite que o paciente registre as circunstâncias em
que gostaria de se submeter à morte assistida, que será realizada por
médico de confiança do requerente. A solicitação poderá ser revogada
pelo paciente a qualquer momento. Antes do procedimento, o médico
deve consultar outro especialista independente, a equipe de saúde do
paciente, e uma pessoa de confiança apontada por ele; após sua realiza-
26 Daniel Silva Vitor Bento
ção, o óbito deve ser comunicado à Comissão em até oito dias (CASTRO
et al, 2016, p. 360).
Na Inglaterra pune-se a eutanásia como qualquer homicídio em
geral, ainda que a pena concreta a aplicar possa ser atenuada. O Homi-
cide Act 1957, combinado com o Offences Against the Person Act 1861,
continuam a ser os atos legislativos, embora bastante alterados, em que
se baseia a punição do homicídio. Com o Suicide Act 1961, a própria ten-
tativa de suicídio deixou de ser crime na Inglaterra e no País de Gales.
De acordo com a mesma lei, mas emendada pelo Coroners and Justice
Act 2009, encorajar ou prestar auxílio ao suicídio constitui crime e faz
incorrer o autor numa pena de prisão até 14 anos (PORTUGAL, 2016,
p. 42). Diversas propostas foram apresentadas, como o Assisted Dying
Bill, elaborado por Lord Falconer, que foi rejeitada pela Câmara Baixa
em setembro de 2015. A proposta baseava-se na legislação de Oregon
e visava a legalização apenas do suicídio assistido para pacientes com-
petentes, com mais de 18 anos, com expectativa de vida menor que seis
meses (CASTRO et al., 2016, p. 361).
4. DEFINIÇÕES NORMATIVAS
E JURISPRUDÊNCIA BRASILEIRA
O suicídio, em sentido estrito, é um ato, comissivo ou omissivo,
realizado exclusivamente pelo próprio agente, consciente de que resul-
tará em sua própria morte. É uma conduta não tipificada na legislação
brasileira, portanto não se trata de crime punível. Por outro lado, os
atos de indução, instigação ou auxílio ao suicídio estão previstos no art.
122 do Código Penal brasileiro, com a pena de 6 meses a 2 anos; se de
algum dos referidos atos resultar em lesão corporal de natureza grave
ou gravíssima, pena de 1 a 3 anos; e se resultar em morte, pena de 2 a
6 anos. Não há previsão expressa do suicídio assistido no ordenamento
jurídico brasileiro, entretanto, a conduta de fornecer medicamentos ou
informações para finalidade de suicídio, caracteriza-se, também, como
em auxílio ao suicídio.
O ordenamento jurídico brasileiro vê no suicídio um fato imoral e
socialmente danoso, que deixa de ser penalmente indiferente quando
concorrer com a atividade da vítima outra energia individual provinda
da manifestação da vontade de outro ser humano. Segundo a teoria da
acessoriedade limitada, adotada pelo ordenamento jurídico brasileiro,
a punibilidade da participação em sentido estrito, que é uma atividade
secundária, exige que a conduta principal seja típica e antijurídica. A
despeito dessa correta orientação político-dogmática, as legislações
modernas, considerando a importância fundamental da vida humana,
passaram a prever uma figura sui generis de crime, quando alguém, de
alguma forma, concorrer para realização do suicídio (BITENCOURT,
2011, p. 124 e 125).
De igual forma não há previsão expressa do termo eutanásia no
ordenamento jurídico brasileiro, contudo a conduta é proibida e classi-
ficada como homicídio privilegiado, também conhecido como homicídio
piedoso, cuja pena é diminuída de um sexto a um terço, segundo o art.
121, §1º do Código Penal.
36 Daniel Silva Vitor Bento
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao identificar os países que admitem o suicídio assistido e a eu-
tanásia observou-se que as soluções normativas para permissão do
suicídio assistido e da eutanásia foram diferentes. Apenas por decisões
jurisprudenciais, como inicialmente na Colômbia; sem previsão expressa
e através de interpretações do Código Penal, como na Suíça; através de
lei própria, como na Bélgica; e por meio de confirmação de Tribunal
Constitucional, como atualmente na Colômbia e na Espanha.
Ao analisar o suicídio assistido e a eutanásia em Portugal, obser-
vou-se que a questão vem sendo debatida desde a década de 1990,
avançou significativamente nos últimos anos, chegando a aprovação
do Decreto n.º 109/XIV da Assembleia da República. Após a publicação
do referido decreto, o Presidente da República portuguesa encaminhou
ao Tribunal Constitucional o requerimento de fiscalização preventiva
da constitucionalidade, que publicou no dia 15 de março de 2021, o
Acórdão n.º 123/2021, pronunciando-se pela inconstitucionalidade
da norma constante do artigo 2.º, n.º 1, do Decreto n.º 109/XIV, ob-
servando desconformidade com o princípio da determinabilidade da
lei. Diante disso, o decreto foi vetado, por inconstitucionalidade, pelo
presidente.
Analisou-se que Constituição prevê no seu artigo primeiro, como
princípio fundamental, que Portugal é uma República soberana, ba-
seada na dignidade da pessoa humana. Por sua vez, prevê também,
em seu art. 24, o direito inviolável à vida, dentro do rol dos direitos,
liberdades e garantias. Diante disso, desdobram-se duas questões,
que foram analisadas: se haveria conflito aparente das referidas
normas constitucionais, de modo que o direito à vida previsto seria
absoluto e se sobreporia à dignidade humana; e a legitimidade do
legislador sobre a matéria. Em síntese, o suicídio assistido e a eutaná-
sia não foram declarados inconstitucionais. Ademais, a legitimidade
do legislador sobre a matéria foi reconhecida. Contudo, verificou-se
40 Daniel Silva Vitor Bento
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Roberto Chacon de. A lei relativa ao término da vida sob
solicitação e suicídio assistido e a Constituição holandesa.
ÁVILA, Elliot Parra; ALIPIO, Cezar Augusto Báez. Una clasificación de las mo-
dalidades de vulneración del derecho a la vida en Colombia. NOVUM
JUS • ISSN: 1692-6013 • E-ISSN: 2500-8692 • Volumen 13 No . 1 • Enero
– Junio 2019 • Págs. 205-228
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: Dos crimes contra a
pessoa. Parte 2. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2011
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lheiros, 2005
BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário
Oficial da União, Rio de Janeiro dez. 1940
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de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Consti-
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CAMUS, Albert. O mito de Sísifo. Trad. Ari Roitman e Paulina Watch. Rio de
Janeiro: Bestbolso, 2010.
CASTRO, Mariana Parreira Reis et. al. Eutanásia e suicídio assistido em países
ociendetais: revisão sistemática. Revista Bioética, 24 (2).
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA. Código de ética médica. Resolução CFM
nº2217 de 27 de setembro de 2018.
DADALTO, Luciana. Distorções acerca do testamento vital no Brasil (ou o por-
que é necessário falar sobre uma declaração prévia de vontade do paciente
terminal. Revista de bioética y derecho 28, (2013): 61-71.
DURKHEIM, Émile. O suicídio: estudo da sociologia. Tradução Mônica Stahel.
São Paulo: Martins Fontes, 2000.
DWORKIN, Ronald. Domínio da vida: aborto, eutanásia e liberdades indivi-
duais. Tradução Jefferson Luiz Camargo. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes,
2009.
GONÇALVES, Susana Isabel Dourado. Posicionamento dos profissionais de
saúde face às propostas de despenalização da morte medicamente
assistida em Portugal. Aveiro: 2018
ORDEM DOS ADVOGADOS. Parecer da Ordem dos Advogados relativo ao
Projecto de Lei nº 773/XIII/3ª (BE).
PORTUGAL. Constituição da República Portuguesa. Diário da República n.º
86/1976, Série I de 1976-04-10. Disponível em:<https://dre.pt/legisla-
cao-consolidada/-/lc/34520775/view> Acesso em 03 jul 2021;
42 Daniel Silva Vitor Bento
1. INTRODUÇÃO
A reflexão acerca do dano iatrogênico, e sua repercussão na esfera
da responsabilidade civil, são de extrema relevância tanto no campo jurí-
dico, pois pouco se conhece o termo dentro de uma perspectiva civilista,
quanto na seara médica, vez que, muitos profissionais não sabem a im-
portância de tomar alguns cuidados informacionais durante sua atuação.
(*) Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
– UFMS. Especializanda em Direito Médico pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais – PUC Minas. Integra o grupo de pesquisa “Estudo de Casos em Direito
Médico e da Saúde” promovido pela OAB/BA. E-mail: dbmercuri@gmail.com.
(**) Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana
– UEFS. Formada em Direito Médico pelo Instituto Paulista de Direito Médico. Es-
pecialista em Direito Médico pela Faculdade de Minas – FACUMINAS. E-mail: mona-
lisapimentel.adv@gmail.com.
44 Daniela Brito Mercuri e Monalisa Barbosa Pimentel Pinheiro
outro de maior valor (a vida sadia) [...] Posto isso, voto pelo não
provimento do apelo. (TJ-RS – AC: 70060930609 RS, Relator: Elisa
Carpim Corrêa,Data de Julgamento: 09/10/2014, Sexta Câmara
Cível, DJe: 22/10/2014)
Assim, iatrogenia e erro médico podem ser compreendidos como
conceitos inconciliáveis e excludentes. Dano iatrogênico seria aquela
previsível, decorrente de procedimento necessário e realizado pelo mé-
dico de maneira diligente, não gerando responsabilidade em nenhuma
de suas esferas. Aqui, o médico adota conduta consciente e deliberada,
direcionada a um determinado resultado, qual seja a melhoria do estado
de saúde de seu paciente. (MEIRELES; BARBOSA).
Com isso, deve-se compreender que a essência do exercício da prá-
tica médica já compreende uma margem de risco, ainda mais presente
e potencializado com a evolução de equipamentos e medicamento, téc-
nicas desenvolvidas nas pesquisas e práticas do exercício profissional.
Além disso, a própria especificidade de cada organismo, ao responder
de maneira peculiar aos tratamentos conduzidos pelos profissionais,
evidencia que mesmo sendo provocado um dano, não há que se falar em
responsabilidade médica (MEIRELES; BARBOSA, 2017)
Por fim, cabe destacar que os riscos conhecidos e, portanto, previ-
síveis no campo da literatura médica, imprescindivelmente, devem ser
comunicados aos pacientes através do Termo de Consentimento Informa-
do, devendo este ser livre e esclarecido para não haver uma imputação
de responsabilidade civil ao médico, garantindo assim, a fidelidade ao
princípio da autonomia e dever informacional, assunto que será melhor
exposto no tópico 3 deste artigo.
Divergências doutrinárias e jurisprudenciais trazem consigo a
dificuldade em se atribuir uma diferenciação entre erro médico e
iatrogenia. Parte da doutrina entende ser o dano iatrogênico espécie
do erro médico, enquanto outra parcela afirma serem conceitos to-
talmente desconexos. Tal desencontro, de um lado, inviabiliza muitos
advogados a atuarem nas demandas judiciais envolvendo suposto erro
médico, e por outro, fomenta uma medicina cada vez mais defensiva,
estando o profissional de saúde atuando, diariamente, com receio de
estar cometendo ato ilícito.
Dano iatrogênico à luz da boa fé objetiva, uma análise do direito à informação... 47
3. DEVER DE INFORMAÇÃO
E ASPECTOS PRINCIPIALISTAS BIOÉTICOS
Dano iatrogênico à luz da boa fé objetiva, uma análise do direito à informação... 49
4. CONCLUSÃO
Ao analisar as características particulares de um dano oriundo de
iatrogenia, diferenciando-o do erro médico, a presente pesquisa atende
ao objetivo geral na reflexão quanto aos aspectos do dever de informar.
Verificando-se a essencialidade do termo de consentimento informado,
como instrumento do dever de informação, com ressalva à boa-fé objetiva
e ônus probatório.
Em atendimento ao objetivo geral, foi demonstrado o conceito de
dano iatrogênico, indicando-se a distinção com o erro médico, verifican-
do-se o entendimento dos tribunais com relação a imprescindibilidade
do dever de informação.
Ainda, elaborou-se uma reflexão quanto aos aspectos principia-
lista da bioética referentes ao dever de informação, adentrando-se à
58 Daniela Brito Mercuri e Monalisa Barbosa Pimentel Pinheiro
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Ana Thereza Meirelles; BARBOSA, Amanda Souza. Dano Iatrogêni-
co e Erro Médico: o Delineamento dos Parâmetros para Aferição da
Dano iatrogênico à luz da boa fé objetiva, uma análise do direito à informação... 59
1. INTRODUÇÃO
A partir da revolução tecnológica, a todo momento emergem
novas modalidades de tratamento e novas perspectivas de cura para
enfermidades, o que constantemente enseja modificações na relação
(*) Professora de Ética Médica da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública. Pós-
-graduada em Ciências Criminais pela Universidade Federal da Bahia e em Direito
Médico, Bioética e Biodireito pela Universidade Católica do Salvador. Mestranda
em Direito Público com ênfase em Ciências Criminais pela UFBA. Foi Presidenta
da Comissão de Direito Médico e da Saúde da OAB/BA (2019-2020). Servidora do
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia. E-mail erica.meneses@gmail.com..
(**) Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade Baiana de Direito e em Direito
Processual Civil pela Faculdade Damásio. Graduado em Direito pela Universidade
Salvador (UNIFACS). Membro da Comissão Especial de Direito Médico e da Saúde
da OAB/BA no triênio 2019/2021. Coordenador do Grupo de Pesquisa “Estudo de
64 Érica Baptista Vieira de Meneses e Lucas Macedo Silva
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Inicialmente, restaram apresentados os direitos constitucionalmente
protegidos como fundamentais à vida e à integridade física, os quais
adquirem um papel extremamente relevante para a pesquisa por serem
os direitos potencialmente mitigados pelo direito de recusa a tratamento
médico. Como a Constituição Federal garante a inviolabilidade da vida,
supõe-se que há a eficácia absoluta desse princípio sobre os outros. Essa
prevalência, entretanto, não é absoluta, situação admitida amplamente,
sobretudo pela existência de hipóteses que o legislador relativizou o
direito à vida.
Pela Constituição atualmente vigente, também se extrai que o concei-
to de vida não se apresenta mais como meramente biológico, destituído
de qualquer análise valorativa. Há que se pensar no termo “vida digna”
como o real bem a ser protegido pelo ordenamento jurídico como um
todo. Essa seria uma ascensão de uma perspectiva qualitativa, que faz
com que o indivíduo possua o direito de viver conforme as próprias
convicções sem interferências autoritárias externas para o livre desen-
volvimento da sua personalidade.
82 Érica Baptista Vieira de Meneses e Lucas Macedo Silva
REFERÊNCIAS
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2 ed. São Paulo: Malheiros,
2011.
BELTRÃO, Sílvio Romero. Direitos da personalidade: de acordo com o Novo
Código Civil. 1 ed. São Paulo: Atlas, 2005.
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Parâmetros para o exercício seguro da recusa terapêutica: uma análise... 85
(*) Advogada. Pós-graduada em Direito Médico e Hospitalar pela Escola Paulista de Di-
reito. Membro efetivo da Comissão Especial de Direito Médico e de Saúde da OAB/
SP.
(**) Advogada. Pós-graduada em Direito Público pelo CEJAS. Pós-graduanda em Direito
Médico e Hospitalar pelo CPJUR. Integra a Comissão Especial de Direito Médico e
da Saúde da OAB/BA. Coordenadora de Grupos de Pesquisa em Direito Médico e da
Saúde promovidos pela OAB/BA.
88 Fernanda Moura Silva e Gabriela Silva Sady
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo central analisar a publicidade
médica de procedimentos estéticos nas redes sociais e sua influência
sobre a natureza da obrigação e da responsabilidade civil dos médicos,
ante a criação de expectativas nos pacientes. A importância do trabalho
mostra-se irrefragável, considerando a necessidade de orientação destes
profissionais quanto às consequências de seus anúncios.
O artigo emprega o método hipotético-dedutivo, partindo de fun-
damentos teóricos e práticos para alcançar a solução específica. Foram
utilizadas referências bibliográficas nacionais e estrangeiras, levando
em consideração trabalhos reconhecidos na área para verticalizar a
discussão. Em que pese não tenha a intenção de exaurir o debate, este
artigo pretende enriquecer a discussão no sentido de pensar o tipo de
obrigação e a responsabilidade de médicos que veiculam propaganda
de procedimentos estéticos com o intuito de convencer os pacientes de
seus resultados.
4. CONCLUSÃO
A pesquisa realizada possui a intenção de fomentar a discussão a
respeito da divulgação de imagens de “antes e depois” nas redes sociais
de médicos, para fins de publicidade, notadamente de procedimentos de
cunho estético embelezador, revelando sua influência sobre a natureza
da obrigação e da responsabilidade civil desses profissionais, ante a
criação de expectativas nos pacientes.
Ao final da pesquisa, percebe-se que o regramento jurídico vigente
acerca das matérias discutidas embasa a vedação da publicidade médica
ostensiva de procedimentos estéticos nas redes sociais, sobretudo por
fotos de resultados finais. A reprovabilidade de tal meio de publicidade se
justifica, seja por omitir os riscos, percalços e desacertos eventualmente
ocorridos, apenas oferecendo destaque aos bons resultados; seja por
configurar evidente violação ao dever informacional e ao princípio da
boa-fé objetiva, gerando no público-alvo, isto é, nos pacientes, expecta-
tivas de resultados irreais.
Além do mais, a divulgação explicita e ostensiva de resultados, atra-
vés do formato “antes e depois”, se mostra apta a configurar a obrigação
do médico como de resultado, ensejando uma possível aplicação da
responsabilidade objetiva, restando a seu cargo o ônus probatório de
que o resultado prometido não foi alcançado por motivo de força maior,
caso fortuito ou culpa exclusiva do paciente.
Nesse cenário, o desafio inicial é levar ao conhecimento desses
profissionais, preferencialmente ainda em seu processo de graduação,
informações que possibilitem a compreensão da importância e relevância
de se levar a cabo apenas meios éticos de publicidade – absolutamente
possíveis – inclusive como forma de mitigar futuras condenações não
apenas na esfera administrativa/ético-profissional, como também na
esfera cível. Soma-se a isso a imperiosidade de ser cada vez mais defen-
dida a atuação regulatória e fiscalizatória do Conselho Federal de Medi-
cina e seus Regionais, cujas orientações se revelam, ao longo dos anos,
104 Fernanda Moura Silva e Gabriela Silva Sady
REFERÊNCIAS
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A publicidade médica nas redes sociais e a responsabilidade civil em casos... 105
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1131-1164, 2018.
CAPÍTULO V
1. INTRODUÇÃO
A vida social mudou. Com a pandemia do Sars-Cov 2019 assolando
o país no primeiro trimestre de 2020, a forma de comunicação e traba-
lho também mudaram. E assim, a sociedade evoluiu, inevitavelmente,
talvez com mais pressa para um diálogo por meio de vídeo, além dos já
consagrados escrita e áudio.
As videochamadas, as reuniões via diversos aplicativos de vídeo,
as aulas, congressos, audiências e os despachos com os juízes, o encon-
tro com a família e a forma de se expressar, tudo isso foi amplificado,
(*) Advogada, pós graduada em Processo Civil, pós graduanda em Direito Médico.
(**) Advogada, Pós-Graduanda em Direito Médico pelo CERS e em Direito Civil e Proces-
sual Civil pela Faculdade Legale, membro do Grupo de Pesquisa Estudos de Casos
em Direito Médico e da Saúde da OAB/BA, e-mail: paulacaroliina.adv@gmail.com
110 Mariane Heberlê Hurtado Plácido e Paula Carolina Araújo da Silva
2. PUBLICIDADE MÉDICA:
LEGISLAÇÃO E ADEQUAÇÃO À ERA DIGITAL
A relação médico-paciente foi alterada com o passar dos anos, pois
a forma como a sociedade se comunica é alterada conforme a tecnologia
avança. Logo, a atitude de esperar por pacientes dentro de um consul-
tório/clínica não satisfaz mais o profissional médico e nem mesmo
prospecta pacientes como o esperado.
A necessidade da prova social1 sempre foi latente na medicina, e este
foi o ponto de partida para que médicos começassem a tornar público
seus feitos, títulos e competências e tal necessidade foi de encontro à
vedação de mercantilização da medicina, ou seja, como divulgar seus
serviços sem mercantilizar a profissão?
1. Prova social é uma evidência utilizada para mostrar que outras pessoas compraram
seu produto/serviço, provando o quão popular ou bom ele é.
112 Mariane Heberlê Hurtado Plácido e Paula Carolina Araújo da Silva
através do reels) e daqui a pouco será outro aplicativo, com outro en-
foque e lá estarão muitas pessoas (ou muitos possíveis clientes) e logo
os profissionais de diversas áreas estarão também, tentando ser vistos
para serem lembrados.
Contudo, faz-se necessário estudo e constante atualização por parte
dos médicos para que esse profissional que está ativo nas redes sociais
observe a deontologia médica (MARTORELL; NASCIMENTO; GARRAFA,
2016):
[...] sempre prudente o profissional interessado considerar o contex-
to ético e legal relacionado com a especificidade de cada situação e
com as circunstâncias onde esta prática será executada, no sentido
de estar proporcionando uma ação realmente útil e necessária aos
seus pacientes e ao bem-estar societário, em consonância com o
respeito aos direitos humanos universais.
Ou seja, o conhecimento da Bioética e dos seus princípios é essencial
para quem quer fazer uso das redes sociais dentro da ética e dos preceitos
legais e observar esses princípios será uma situação mais provável se
esse profissional tiver contato desde as cadeiras da graduação.
2. Apesar de serem públicos os dados, aqui foi retirado o nome completo da médica e
seu CRM.
TikTok e a publicidade médica: a adesão da classe médica ao aplicativo... 123
– no caso em tela, vez que no caso em comento a médica não está sendo
acusada de pôr em risco algum paciente e não é possível vislumbrar, a
priori, qual seria o risco de dano irreparável ao paciente, visto que não
existe queixa de pacientes sobre a conduta da médica, ou seja, a decisão
foi tomada tendo como objeto jurídico digno de defesa o “bom prestígio
da profissão” e questiona-se se não seria mais acertada a aplicação de
outra punição mais branda ou mesmo a assinatura do TAC, antes da
interdição cautelar.
Sem se aprofundar no tema da interdição cautelar, essa pode ser
positiva também no sentido em que serve de exemplo, como forma de
inibição da conduta. Ainda, em sendo o médico um risco à população
(CALLEGARI, 2009) há quem entende ser perfeitamente aplicável, para
que o médico seja impedido de trabalhar durante o processo.
O ponto em questão é que a inobservância dos ditames de publici-
dade não se comparam à prática de erro médico grave com resultado
morte ao paciente, mas às duas condutas são aplicadas a mesma punição,
a interdição cautelar, não sendo possível verificar a proporcionalidade
da punição à conduta do agente.
Conforme (MASCARENHAS; DANTAS; COSTA, 2021):
Apesar de existir no bojo das interdições causas de denúncias de
supostos assédios sexuais, homicídios, lesões corporais graves e
outros tipos, que são considerados pelo próprio CFM como graves,
e de inexistir uma hierarquia formal entre os 117 deveres médicos,
denota-se uma série de interdições em razão de publicidade e/ou
outras infrações, que, apesar de deverem ser enfaticamente repu-
diadas, não podem ser equiparadas às demais figuras.
(...)
A conduta imediata, até para que não haja a reprodução do
conteúdo ilícito, não pode ser impedir a atuação profissional, visto
que essa medida não possui correlação imediata com o dano. A
promoção de informação e educação são alternativas mais efetivas
e eficazes aos casos analisados, jamais a simples interdição cautelar,
que supera em muito a penalidade de suspensão, prevista na Lei
3.268/1957 (LGL\1957\21).
Ainda que verificado que o caso em comento transcende a relação
médico-paciente e atinge a sociedade como um todo pela exposição e o
choque à demonstração de peles humanas e material biológico, é preciso
TikTok e a publicidade médica: a adesão da classe médica ao aplicativo... 125
5. CONCLUSÃO
O novo amedronta certa parcela da população e incentiva outra
parcela, a área médica é uma das mais conservadoras quando o assun-
to é publicidade, comportamento social e em ambientes sem o jaleco,
profissionais geralmente exaustos pelos diversos vínculos trabalhistas
e plantões, que são vistos como heróis numa profissão com tamanha
seriedade, o zelo pelo decoro da medicina surge como justificativa para
ausência de profunda análise sobre as novas mídias sociais que surgem
diariamente.
Pesa-se que, mesmo antes da viralização do Tiktok, as regras de pu-
blicidade (ou propaganda) já não eram observadas, mas essas ganhavam
128 Mariane Heberlê Hurtado Plácido e Paula Carolina Araújo da Silva
3. Durante o artigo, usou-se médico para se referir à classe médica, ou seja, médicos e
médicas.
TikTok e a publicidade médica: a adesão da classe médica ao aplicativo... 129
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2015/2126
130 Mariane Heberlê Hurtado Plácido e Paula Carolina Araújo da Silva
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho visa abordar a Lei nº 9.656/98, conhecida como
a lei dos planos de saúde, as funções da Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS), os critérios utilizados pelo setor de saúde suple-
mentar ao praticar a saúde privada no país e, por fim, será explorado o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o rol da ANS
ter caráter taxativo ou exemplificativo.
Na primeira etapa do estudo serão abordas as disposições norma-
tivas referentes à Lei nº 9.656/98, a função da ANS como autarquia
4. CONCLUSÃO
Através do presente estudo foi possível notar que a limitação dos
riscos no âmbito da saúde suplementar, isto é, a sua predeterminação,
é elementar e fundamental, já que é com base nesta que o valor dos
prêmios e contraprestações é calculado. Contraprestações estas que
visam, essencialmente, haja vista a nevrálgica incidência do princípio
do mutualismo, a formação de um fundo, verdadeira poupança, capaz
de custear, caso ocorram, os riscos pré-determinados.
Ainda, através da abordagem crítica dos dois entendimentos contrá-
rios exarados do STJ, referente ao rol da ANS, restou cristilano a evidente
da insegurança jurídica que tal fato acarreta aos operadores do direito,
majorando a importância da busca dos meios autocompositivos antes
148 Lucas Funghetto Lazzaretti
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O setor de saúde suplementar e o rol da Agência Nacional de Saúde Suplementar... 149
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo tem por objetivo precípuo traçar um panorama
do envelhecimento populacional, os seus efeitos para com a saúde suple-
mentar e, por sua vez, analisar o abalo financeiro dos reajustes por faixa
etária nos planos de saúde num contexto em que os idosos constituirão,
em breve futuro, cerca de 30% (trinta por cento) dos beneficiários, ao
passo que a legislação não acompanhou o avanço populacional.
2. O ENVELHECIMENTO POPULACIONAL
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que a população
idosa no mundo seja superior a 1 bilhão. No Brasil, esse contingencial é
de quase 30 milhões de pessoas. De acordo com o Instituto de Estudos de
Saúde Suplementar (IESS), o fenômeno ocorre em função da diminuição
da natalidade em contrapeso ao expressivo aumento da longevidade
(CARNEIRO et al., 2013).
Segundo Renato Veras (2009, p. 549), o Brasil é um “jovem país de
cabelos brancos”. Isso se deve ao fato de que anualmente a população
idosa ganha 650 novos membros. Além disso, o autor enfatiza que viver
mais é uma aspiração das sociedades, contudo, isso se transmuta em
benefício apenas se houver um compasso concomitante com a qualida-
de de vida, o que é um grande desafio frente às questões estruturais e
sociais brasileiras.
Nessa lógica, envelhecimento é conceituado como um “fenômeno
natural inerente ao processo de vida e que acarreta mudanças biop-
sicossociais especificas associadas a passagem do tempo, variando de
indivíduo para individuo” (FERREIRA et al., 2010, p. 357).
No livro “Os Novos Idosos Brasileiros: Muito Além dos 60?”, as auto-
ras, ao discutirem o conceito de idoso, reconhecem haver muitos critérios
para delimitação do termo, sendo o mais usual o etário. Nesta esteira, o
envelhecimento não está diretamente ligado à idade do indivíduo, mas às
alterações de suas condições biológicas, comportamentais e psicológicas
(CAMARANO; PASINATO, 2004). Assim, do ponto de vista social não se
pode agrupar os idosos a partir de um único critério.
Pois bem. Seja “viver mais” ou “envelhecer”, o relevante é o processo
de crescimento da população em atividade, resultado de um amadureci-
mento social. Uma das formas de se medir o envelhecimento populacional
é calcular a velocidade da duplicação da população idosa. Na França e
Estados Unidos, por exemplo, o processo de envelhecimento e duplicação
da população idosa demorou 120 e 70 anos, respectivamente. Por outro
lado, esse processo no Brasil ocorrerá em tão somente 20 anos, entre
2011 e 2032 (CARNEIRO et al., 2013).
Por fim, de acordo com as projeções da Organização Pan-Americana
de Saúde (OPAS), em 2050, a população idosa chegará a 2 bilhões de
154 Ana Maria Silva Souza e Matheus Athayde
1. Veja-se o que previa a redação original dos artigos 14 e 15 da Lei: “Art. 14. Em razão
da idade do consumidor, ou da condição de pessoa portadora de deficiência, nin-
guém pode ser impedido de participar de planos ou seguros privados de assistência
à saúde. Art. 15. É facultada a variação das contraprestações pecuniárias estabele-
cidas nos contratos de planos e seguros de que trata esta Lei em razão da idade do
consumidor, desde que sejam previstas no contrato inicial as faixas etárias e os per-
centuais de reajuste incidentes em cada uma delas, conforme critérios e parâmetros
gerais fixados pelo CNSP. Parágrafo único. É vedada a variação a que alude o caput
para consumidores com mais de sessenta anos de idade, se já participarem do mes-
mo plano ou seguro, ou sucessor, há mais de dez anos.”
158 Ana Maria Silva Souza e Matheus Athayde
2. Nesse sentido, pontua Barletta, 2010, p. 203: “Observe-se que pessoas que se assegu-
ram contra a doença por planos privados de saúde podem ser pobres ou ricas. Con-
tudo, as que discutem cláusulas abusivas ou impedimentos lesivos levantados pelo
plano em momentos dramáticos de suas vidas, precisando da tutela do Judiciário
para usufruir um direito, não são ricas. Essas pagam pelo serviço de saúde e depois
decidem acerca de se restituírem ou não pela via do Judiciário. São os contribuintes
pobres ou os que não possuem condições de arcar com o tratamento do qual neces-
sitam, que morrem ou sofrem demasiadamente ao aguardar uma posição favorável
do órgão jurisdicional”.
Envelhecimento populacional e planos de saúde: a (i)legitimidade... 163
3. Destacam-se os REsp 809.329, REsp 889.406, REsp 866.840, REsp 989.380, REsp
1.280.211, AgRg no AREsp 257.898, AgRg no AREsp 95.973, AgRg nos EDcl no REsp
1.231.015, REsp 1.299.481, REsp 1.381.606 e o REsp 1.568.244.
164 Ana Maria Silva Souza e Matheus Athayde
Essa norma não confronta o art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso, que
veda a discriminação consistente na cobrança de valores diferen-
ciados em razão da idade. Discriminação traz em si uma conotação
negativa, no sentido do injusto, e assim é que deve ser interpretada
a vedação estabelecida no referido estatuto.
Na hipótese dos autos, o aumento do valor do prêmio decorreu
do maior risco, ou seja, da maior necessidade de utilização dos servi-
ços segurados, e não do simples advento da mudança de faixa etária.
O Min. Raul Araújo, em outro julgado simbólico, manifestou-se sobre
o tema da seguinte forma:
[...] não se extrai de tal norma interpretação que determine, abs-
tratamente, que se repute abusivo todo e qualquer reajuste que se
baseie em mudança de faixa etária, como pretende o promovente
desta ação civil pública, mas tão somente o reajuste discriminante,
desarrazoado, que, em concreto, traduza verdadeiro fator de dis-
criminação do idoso, justamente por visar dificultar ou impedir
sua permanência no plano. (STJ. AgRg no REsp: 1228862 Relator:
Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Publicação: DJ 11/02/2014)
Veja-se que não é uma novidade o STJ enfrentar a matéria. No
entanto, respondendo a questionamento anterior, a discussão que
envolve a “discriminação”, citada no art. 15, § 3º, do Estatuto do Idoso,
apresentou-se de forma vazia, superficial. Dizer que o reajuste não é
aplicado por conta do advento da mudança de faixa etária, mas sim
porque o indivíduo carrega um risco subjetivo maior, é dizer o mesmo
com outras palavras.
Ora, se o indivíduo completa 59 anos e, por consequência, lhe é
aplicado um reajuste é justamente porque ele atingiu uma faixa etária
do contrato que, com base em estudos atuariais, utiliza-se mais do plano
de saúde. No entanto, o enquadramento desconsidera por completo a
heterogeneidade dos idosos e, notadamente, os novos idosos, aqueles
que acabam de ingressar na faixa dos sessenta. Logo, para compensar
todos os custos de uma faixa etária que pode ir dos 59 a 100 anos, por
exemplo, há uma sobrecarga dos novos idosos, o que torna tão discri-
minatório quanto cobrar valores sem base atuarial.
Por outro lado, também não se chegou a plenário a discussão que
envolva a burla da regulamentação da ANS na RN 63/2003 quando an-
tecipou o último reajuste por faixa etária, dos 60 para 59. Ou seja, não
166 Ana Maria Silva Souza e Matheus Athayde
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, o avançar da idade cria para o plano de saúde uma maior
probabilidade da sua utilização, confirmando o risco subjetivo inerente
a pessoa idosa, o que não acontece com os novos idosos. Nesse sentido,
o regime instaurado pela CF/88 e por todo arcabouço legislativo que
foi tratado aqui, deve nortear o tratamento digno ao idoso, o qual figura
REFERÊNCIAS
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cobrança diferenciada, bem como de limite máximo de variação de valo-
res entre as faixas etárias definidas para planos e seguros de assistência
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missão Mista destinada a apreciar a MP nº 148, 2003. Atribui com-
petências à Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS e fixa as dire-
trizes a serem observadas na definição de normas para implantação de
programas especiais de incentivo à adaptação de contratos anteriores à
Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998. Brasília, DF: Câmara dos Deputados,
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do Brasil e das Unidades da Federação. IBGE. 02 jul. 2021. Disponível
em: https://www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/. Acesso em: 02
jul. 2021.
Envelhecimento populacional e planos de saúde: a (i)legitimidade... 169
1. INTRODUÇÃO
Por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.529/
DF, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a inconstitucionali-
dade do parágrafo único do art. 40 da Lei 9.279/1996, a chamada Lei de
Propriedade Industrial (LPI), a qual permitia a extensão dos prazos de
patentes para invenção e utilidade, ao estabelecer que, a contar da data da
concessão, o prazo de vigência não poderia ser inferior a sete anos para
a patente de modelo de utilidade e dez anos para a patente de invenção.
A decisão foi proferida com modulação de efeitos, no dia 12 de maio
de 2021, passando a valer a partir da publicação da ata do julgamento,
exceto para as ações judiciais propostas até o dia 7 de abril de 2021 e
para patentes com extensão de prazo relacionadas a produtos e proces-
sos farmacêuticos e a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde,
tendo a decisão, para ambas as situações, efeito retroativo, perdendo
todas as extensões de prazo concedidas com base no parágrafo único
do art. 40 da LPI.
Houve o reconhecimento de que o Estado não pode transferir para a
sociedade a responsabilidade e consequências de sua ineficiência, pois
o consumidor seria o principal lesado. Em relação às patentes ligadas
à área de saúde, constatou-se que a extensão tinha grande incidência
em razão da complexidade, que acarretava grande mora, e da grande
quantidade de requerimentos, tendo reflexos na efetivação deste direito
fundamental social, na medida em que dificultava a adoção de melhores
políticas públicas e o acesso ao tratamento adequado em virtude dos
altos preços cobrados por aqueles detentores da proteção patentária.
Desse modo, o presente artigo busca analisar os efeitos da decisão
da ADI nº 5.529/DF no que diz respeito às patentes relacionadas a
saúde, tendo em vista que essa temática possui relevância tanto para o
Direito quanto para sociedade. Cabe adiantar que se entende que a não
2. Lei nº 9.279/96, art. 40. A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 (vinte) anos
e a de modelo de utilidade pelo prazo 15 (quinze) anos contados da data de depósito.
Parágrafo único. O prazo de vigência não será inferior a 10 (dez) anos para a patente
de invenção e a 7 (sete) anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data
de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exa-
Uma análise da ADI 5.529: a não prorrogação da vigência das patentes... 181
3. Lei 9.279/96, art. 44. Ao titular da patente é assegurado o direito de obter inde-
nização pela exploração indevida de seu objeto, inclusive em relação à exploração
ocorrida entre a data da publicação do pedido e a da concessão da patente (BRASIL,
1996).
Uma análise da ADI 5.529: a não prorrogação da vigência das patentes... 183
Por outro lado, além dos fundamentos arguidos pela PGR, a corrente
que apoia a inconstitucionalidade argumenta que a proteção patentária
estabelecida no dispositivo impugnado vai contra o interesse social por
estender o monopólio sobre uma tecnologia, afetando a concorrência, a
capacidade do SUS e os consumidores individuais de arcar com os custos
da compra de medicamentos. Assim, ratificam a visão de violação da
temporalidade da norma, da lesão à segurança jurídica e transferência
do ônus da ineficiência da administração pública à população (BRASIL,
2016).
No caso das patentes farmacêuticas, registram-se que a concessão
da prorrogação da patente dificulta a efetivação de políticas públicas na
área da saúde, além de restringir o acesso ao tratamento adequado para
grande parte da população, em razão dos altos preços cobrados pelo de-
tentor da patente, pois impede o efeito de redução de preços provocado
pela livre concorrência entre companhias de referência e produtores de
genéricos, além de impedir a produção direta por laboratórios públicos.
Assim, o período de vigência da patente não deve ultrapassar o estabe-
lecido em acordos de âmbito internacional, não devendo ser permitido
qualquer tipo de extensão, visto que tal situação incide nas realidades
individuais de pacientes e no orçamento empenhado para a aquisição
de medicamentos.
Sobre o tema, apesar da incidência teórica do art. 40, parágrafo
único, da Lei nº 9279/96 ser aplicável a qualquer seara tecnológica de
fato, até pela própria complexidade e agentes envolvidos, vê-se que são
as patentes farmacêuticas/agroquímicas as que geram a maior mora
administrativa na análise do pedido de concessão patentária.
Também, é importante destacar que, do protocolo do pedido de
concessão das patentes é efetuado o exame formal preliminar e, se devi-
damente instruído, será protocolizado considerando a data de depósito
a da sua apresentação; após, será mantido em sigilo durante 18 meses
contados da data de depósito ou da prioridade mais antiga, quando
houver, e decorrido o referido prazo será publicado o pedido, sendo que
esta publicação pode ser antecipada a requerimento do depositante.
Com a publicação, e até o final do exame, que não ocorrerá antes
de decorridos 60 dias da publicação do pedido, os interessados podem
186 Flávia Mendes Moreira de Andrade Mélo e Henrique Costa Princhak
que o exame técnico foi requerido pelo depositante e que ainda não
estão decididos, de forma a não computar o prazo legal previsto para o
requerimento de exame (ME, 2019).
Ademais, seguindo com a análise da ADI Nº 9279/DF, em 24 de
fevereiro de 2021, o Procurador-Geral da República apresentou pedido
de Tutela Provisória de Urgência requerendo a suspensão imediata
dos efeitos do parágrafo único, do art. 40, da Lei nº 9.279/1996. Em
seu pedido de urgência, arguiu fato superveniente em virtude da crise
sanitária ocasionada pela pandemia de COVID-19 e o impacto direto da
ação no direito fundamental à saúde com o impedimento da indústria
farmacêutica produzir medicamentos genéricos contra o novo corona-
vírus e suas atuais e futuras variantes (BRASIL, 2021).
Em 07 de abril de 2021, o Ministro Relator Dias Toffolli proferiu
decisão conhecendo a procedência da ação e votando no sentido de que
fosse declarada a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 40
da Lei nº 9.279/1996, reconhecendo-se o estado de coisas inconstitu-
cional no que tange à vigência das patentes no Brasil. No que se refere
à modulação dos efeitos, considerando que o parágrafo único do art.
40 da LPI estaria vigente há 25 anos e já produziu amplos efeitos, por
razões de segurança jurídica e interesse social, propôs a modulação dos
efeitos conferindo a ela efeito ex nunc, ou seja, a partir da publicação da
ata deste julgamento (BRASIL, 2021).
No caso, não seriam atingidas pela declaração de inconstitucionali-
dade as patentes já deferidas e ainda em vigor em virtude da extensão
prevista no preceito questionado. Contudo, para as ações judiciais em
curso que eventualmente tenham como objeto a constitucionalidade do
parágrafo único do art. 40 da LPI e sobre as patentes concedidas com
extensão de prazo relacionadas a produtos e processos farmacêuticos e
a equipamentos e/ou materiais de uso em saúde, propôs efeito ex tunc,
esclarecendo que não implicaria em queda de patentes visto que estaria
assegurado a vigência da exclusividade pelo período previsto no caput
do art. 40 (BRASIL, 2021).
Entre outras coisas, em seu voto, registrou que, até que o exame
técnico seja requerido, o INPI não pode proceder com a análise de
patenteabilidade da matéria pleiteada e, em geral, os pedidos somente
Uma análise da ADI 5.529: a não prorrogação da vigência das patentes... 189
são realizados perto do fim desse prazo, de forma que, por até três anos
o processo fica paralisado no INPI. Destacou que, com a expedição da
carta-patente, surge para o titular o direito de obter indenização pela ex-
ploração indevida do objeto patenteado, inclusive, em relação ao período
entre a publicação do pedido e a concessão da patente, como preceitua
o art. 44 da Lei nº 9279/96. Assim, a proteção patentária conferida re-
troagiria ao momento inicial do processo, o que seria um impeditivo aos
concorrentes que porventura cogitem explorar indevidamente o objeto
protegido durante a tramitação do pedido (BRASIL, 2021).
Sobre o parágrafo único do art. 40 da LPI, objeto da ação de incons-
titucionalidade, registrou a problemática do dispositivo na medida em
que acaba por tornar o prazo de vigência das patentes variável e, não se
sabendo o prazo final da vigência de uma patente no Brasil até o momento
em que esta é efetivamente concedida (BRASIL, 2021).
Ao seu ver, tal indeterminação, por si só, gera a violação da seguran-
ça jurídica da temporariedade patentária, do princípio da eficiência da
administração pública, dos princípios da ordem econômica e do direito à
saúde, tendo como consequência a ausência de limitação temporal para a
proteção patentária no Brasil ultrapassando os limites da razoabilidade
destacando, de forma negativa, o Brasil, quando se trata de proteção
da propriedade industrial, e muito frequentemente as proteções aqui
vigentes já estão em domínio público no exterior e com preços muito
mais acessíveis (BRASIL, 2021).
No caso das patentes de produtos e processos farmacêuticos, re-
gistrou que, em levantamento efetuado pelo TCU, entre 2008 e 2014, a
quase totalidade dos pedidos incidiu na previsão do parágrafo único do
art. 40 da LPI. E, em razão de tal incidência, o poder público é onerado
por ser grande comprador para fornecimento dos produtos por meio de
suas políticas de saúde (BRASIL, 2021).
Concluiu-se que, o INPI opera em situação precária, com processos
de trabalho ineficazes, defasagem tecnológica e carência de recursos
humanos, o que o posiciona em patamar inferior aos seus equivalentes
no plano internacional, e que tal situação seria um contrassenso já que se
trata de um órgão estatal cuja função é impulsionar o desenvolvimento
tecnológico e a inovação no país (BRASIL, 2021).
190 Flávia Mendes Moreira de Andrade Mélo e Henrique Costa Princhak
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No caso em questão, percebeu-se a importância do sistema de pro-
teção patentária para o desenvolvimento tecnológico e econômico, visto
que devem ser estabelecidas todas as garantias para aquele que investe
na elaboração da tecnologia. Contudo, ressalta-se que a patente também
a sua função social, isto é, deve atender não apenas interesses indivi-
duais, mas ser utilizado de modo a proporcionar o bem-estar para toda
a sociedade. Isto é, deve atender não apenas interesses individuais, mas
ser utilizado de modo a proporcionar o bem-estar para toda a sociedade.
O presente trabalho evidenciou que, contrariamente aos objetivos do
Acordo TRIPs da OMC, no Brasil, não houve um maior número de pedidos
de patentes feitos por nacionais ou mesmo estrangeiros residentes no
país, quer por meio de investimento direto de capital estrangeiro, quer
por meio de difusão de tecnologia supostamente propiciada pela conces-
são de patentes, e a proteção estaria funcionando como mecanismo de
transferência de renda no fluxo inverso do estipulado por seus objetivos.
Com a pandemia do coronavírus, houve o aumento da pressão sobre
os sistemas de saúde de forma global, elevando a demanda por insumos
em toda a cadeia de atendimento no intuito de amenizar os sintomas
da doença e para o tratamento de suas complicações. A pandemia evi-
denciou a necessidade premente de reavaliação do dispositivo que por
anos vem fomentando distorções, abusos, e altos gastos do Estado que
– no caso dos medicamentos-, é obrigado a adquiri-los por altos valores
daqueles que estão protegidos pela extensão da proteção patentária,
quando poderia tê-los adquiridos de empresas concorrentes por valores
menores, ou participado do processo de produção, protegendo interesses
da Administração Pública e da sociedade ao buscar a economicidade e a
vantajosidade, considerando-se preços, qualidade, tecnologia e benefí-
cios sociais, e fomentando o desenvolvimento tecnológico e o intercâmbio
de conhecimentos para a inovação no âmbito das instituições públicas
e das entidades privadas.
Registre-se que grande parcela da população não possui recursos
para aquisição de medicamentos nas farmácias, sendo dependente do
sistema público de saúde. O direito à saúde também é prestado pelo
Estado através da assistência farmacêutica, devendo participar do
Uma análise da ADI 5.529: a não prorrogação da vigência das patentes... 193
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CAPÍTULO IX
1. INTRODUÇÃO
Com os benefícios advindos do desenvolvimento e avanço tecno-
lógico da Ciência para a vida e saúde, merece destaque os atinentes à
vacinação. Com alto potencial imunizante e grande probabilidade de
erradicação de doenças infecciosas, a vacinação pode ser considerada
um dos maiores instrumentos profiláticos no combate a doenças infec-
tocontagiosas.
(*) Advogada. Graduada em Direito pela Faculdade UNIME de Ciências Jurídicas. Espe-
cialista em Direito Processual Civil pela Faculdade Baiana de Direito. Especializan-
da em Direito Médico, da Saúde e Bioética pela Faculdade Baiana de Direito. Integra
a Comissão Especial de Direito Médico e da Saúde da OAB/BA. Integra o grupo de
pesquisa “Estudo de Casos em Direito Médico e da Saúde” promovido pela OAB/BA.
E-mail: luanareis.adv@gmail.com.
(**) Advogada. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
– UFMS. Especializanda em Direito Médico pela Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais– PUC Minas. Integra o grupo de pesquisa “Estudo de Casos em Direi-
to Médico e da Saúde” promovido pela OAB/BA. E-mail: dbmercuri@gmail.com.
200 Luana Reis Ferreira e Daniela Brito Mercuri
3. REFLEXÕES BIOÉTICAS
ACERCA DA VACINA COMPULSÓRIA
Ultrapassado o breve contexto histórico da vacinação no Brasil,
nesta seção busca-se elaborar uma reflexão quanto a perspectiva da
compulsoriedade da vacinação, para alguns casos.
Como já visto no tópico 2 do presento artigo, a vacinação no Brasil
pode ser obrigatória ou não, a depender da recomendação do Ministério
da Saúde, conforme determina o PNI (BRASIL, 1975, p. 1). Em que pese
ser mundialmente essencial para erradicação de doenças infecciosas
(DUMARD, 2017), insta imprescindível refletir acerca da compulsorieda-
de sob uma perspectiva bioética, sobre até que ponto o Estado deve in-
tervir na vida dos cidadãos sem que viole os seus direitos fundamentais.
Assim, torna-se necessário destacar a teoria principialista, instituí-
da por Beauchamp e Childress, consubstanciada “[...] nos princípios da
autonomia, beneficência e justiça, já constantes no Relatório Belmont,
os autores acrescentaram um quarto que foi o da não-maleficência”
(LEITE, 2018, p. 22).
Para o desenvolvimento do raciocínio, é preciso destinar atenção
especial ao princípio da autonomia bioética, pela sua pertinência com
o tema. Isso é devido, pois o princípio da autonomia “[...] sugere que o
pré-requisito para o exercício das moralidades é a existência de uma
pessoa autônoma” (DINIZ; GUILHEM, 2017, p. 28).
Por autonomia, entende-se uma liberdade, direito este já devida-
mente tutelado pela Constituição Federal (CF) vigente, quando trata dos
direitos e garantias individuais e coletivas, e conhecido como direito de
1ª geração.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança e à propriedade, nos termos seguintes (BRASIL, 1988,
grifo nosso).
Responsabilidade civil do Estado em casos de danos provenientes da vacinação 207
a serem custeados pelos impostos. O que não tem sentido, nem am-
paro jurídico, é fazer com que uns ou apenas alguns administrados
sofram todas as consequências danosas da atividade administrativa.
(CAVALIERI FILHO, 2014, p. 286)
Conforme o dispositivo em análise, o Estado só responde objetiva-
mente pelos danos que causarem a terceiros. Logo, percebe-se que a
responsabilidade objetiva do Poder Público é condicionada ao dano que
seus agentes causarem (TEPEEDINO; TERRA; GUEDES. 2021).
Dito isso, é possível perceber, no caso julgado de relatoria do ministro
Edson Fachin.
AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRA-
VO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ART. 37, § 6º, DA CF. NEXO DE
CAUSALIDADE. COMPROVAÇÃO NA ORIGEM. INDENIZAÇÃO POR
DANO MORAL. CONDUTA LÍCITA. IRRELEVÂNCIA. REEXAME DE
MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 279 DO STF. PRECEDENTES. TEMA 810
DA REPERCUSSÃO GERAL. INAPLICABILIDADE. 1. Inaplicável, na
hipótese, o Tema 810 da repercussão geral, visto que não foi debatido
em sede de apelação o índice de correção monetária (TR). Razões
do apelo extremo dissociadas do acórdão recorrido. Súmula 284
do STF. 2. A responsabilidade objetiva se aplica às pessoas jurídicas
de direito público pelos atos comissivos e omissivos, independen-
temente da licitude ou não do comportamento do agente público,
nos termos do art. 37, § 6º, do Texto Constitucional. Precedentes. 3.
O Tribunal de origem assentou a responsabilidade do Recorrente a
partir da análise do contexto probatório dos autos, concluindo pela
ocorrência do dano e pela presença do nexo de causalidade. Assim,
eventual divergência de tal entendimento demandaria o reexame de
fatos e provas da causa, providência inviável nos termos da Súmula
279 do STF. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. Inapli-
cável o art. 85, § 11, do CPC, em virtude da sucumbência recíproca
reconhecida na instância de origem.
(STF – ARE: 1249452 DF 0020024-04.2015.8.07.0018, Relator:
EDSON FACHIN, Data de Julgamento: 08/06/2021, Segunda Turma,
Data de Publicação: 15/06/2021)
6. CONCLUSÃO
Da análise do estudo em comento, através de um breve histórico
da vacina, verificou-se a sua grande importância desde a descoberta
até os dias hodiernos, inclusive acerca da atual Pandemia de COVID-19,
tendo em vista o seu triunfo com a erradicação e controle de doenças
infectocontagiosas no Brasil e no mundo. Em contrapartida, também se
verificou que apesar de muito benéfica, a vacina pode causar reações
adversas graves, inclusive óbitos.
Ademais, foi abordado aspectos bioéticos, ressaltando a bioética de
intervenção como mecanismo ensejador para a vacinação compulsória
no Brasil. Entretanto, também foi levantada a reflexão sobre até que
ponto o Estado deve intervir na vida dos cidadãos sem que viole direitos
fundamentais e bioéticos.
Destarte, ventilou-se acerca da Responsabilidade Civil do Estado nos
casos de danos decorrentes das reações adversas da vacina. Para tanto,
foi apontado a legislação vigente e casos práticos de danos decorrentes
da vacinação, não restando dúvidas da necessidade do estudo sobre um
sistema de compensação para aqueles que sofrem os danos.
Ainda que notório o benefício da vacinação para a erradicação e
controle de doenças infectocontagiosas, o presente artigo busca refletir
sobre a imposição, no intento de demonstrar a inadequação do meio
Responsabilidade civil do Estado em casos de danos provenientes da vacinação 215
para o cidadão, uma vez que ainda são insuficientes alicerces jurídicos
no que tange a compensação de danos.
Atualmente, aqueles que sofrem danos decorrentes da vacinação,
necessitam buscar a análise do judiciário, e passam anos na busca de
uma decisão de mérito, até que haja o trânsito em julgado, além do risco
de sofrer com a improcedência.
Logo, a imposição demonstra ser o caminho mais fácil, em que pese
o convencimento, respeitando a autonomia do cidadão, informando
claramente sobre os riscos individuais e coletivos quanto à imunização
demonstre ser o meio mais adequado.
Ressalte-se que, em que pese o Estado impor a vacinação, inexiste
um sistema de compensação de danos, onde aprecie-se de maneira clara
a responsabilidade pelos danos que porventura vier a acontecer.
Assim sendo, conclui-se que a ferramenta adequada para levar os
cidadãos à vacinação é através da informação, do convencimento, e
não da obrigatoriedade. Com base na Constituição Federal de 1988, a
saúde é um direito, e não como um dever. A partir do momento em que
o Estado impõe a vacinação, esta deixa de ser um direito e passa a ser
uma obrigação.
Portanto, o trabalho buscou corroborar a reflexão de que ao invés
de se impor a vacina, os cidadãos devem ser convencidos a usufruir
desse direito, por meio da informação de maneira clara e objetiva, sendo
alertados, inclusive, quanto aos riscos.
Ademais, a pesquisa tentou demonstrar a imprescindibilidade da
observação quanto a questões de reparação de danos daqueles que
sofrem com reações adversas. Muitos desses danos podem ser graves e
irreversíveis, logo, insta essencial o estabelecimento de um programa ou
sistema de compensação administrativo indenizatório, daqueles que se
vacinam em prol de um benefício não somente individual, mas também
em atendimento a um dever coletivo.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descompli-
cado. 20ª edição revista e atualizada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo:
Método.2012.
216 Luana Reis Ferreira e Daniela Brito Mercuri
Geopolítica da vacina,
direito à saúde e soberania sanitária
1. INTRODUÇÃO
O debate acerca da efetivação do direito à saúde durante o transcur-
so da pandemia de COVID-19, doença causada por mutações do vírus
SARS-COV-2, enfrenta uma série de obstáculos no Brasil, sejam eles no
âmbito individual ou no âmbito coletivo.
Sem adentrar nos meandros do subfinanciamento e do desfinancia-
mento do SUS, que não é o propósito direto do presente artigo, muito
menos escarafunchar as tortuosas sendas percorridas pelas decisões do
Poder Executivo federal no combate ao patente caos sanitário, é óbvio
que as empresas privadas multinacionais, detentoras das patentes da
maioria das vacinas anti-COVID, bem como os governos que financiaram
órgãos públicos para encontrar soluções vacinais para suas populações
e que mantêm sob sua guarda a produção dos insumos necessários para
a produção, causaram mudanças na configuração política do mundo.
A busca pela vacina e pela decorrente imunização evidenciou uma
determinada linha de atuação de empresas e governos nos últimos tem-
pos. O jogo geopolítico tornou-se mais complexo, o que permite levantar
a hipótese de que mais dificuldades do que facilidades se colocam para
a efetivação do direito à saúde daqui para a frente.
Tratar esquematicamente, de forma sintética, do desenho desta
nova geopolítica e das dificuldades encontradas para efetivar o direito
à saúde, utilizando como referencial teórico a teoria do sistema-mundo,
de Immanuel Wallerstein, é o escopo do presente artigo, ainda que muito
longe de esgotar tema tão denso.
2. Food and Drugs Administration, órgão regulador estadunidense nos setores de ali-
mentação e medicamentos.
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 229
5. PLADSON, Kristie. De onde vêm e para onde vão as vacinas contra a COVID– 19?
Disponível em: https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/deutsche-welle/2021
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 235
/01/06/de-onde-vem-e-para-onde-vao-as-vacinas-contra-a-covid-19.htm. Acesso
em 14/06/2021.
6. CNN. 95% dos insumos utilizados para produzir vacinas no Brasil são impor-
tados. https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2021/05/26/95-dos-insumos-utiliza-
dos– para-produzir-vacinas-no-brasil-sao-importados, acessada em 10/07/2021.
236 Hugo Leonardo Cunha Roxo
7. VERAS MOTA, Camila. Vacinas: sem o Estado, não haveria Big Pharma. Disponí-
vel em: https://outraspalavras.net/outrasmidias/vacinas-sem-o-estado-nao-haveria-
-big– pharma/. Acesso em 09/07/2021.
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 237
10. CNN. Plano dos EUA de distribuição global de vacina pode ser apresentado nes-
ta quinta. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/saude/2021/06/03/pla-
no-dos-eua-de-distribuicao-global-de-vacina-pode-ser-apresentado-nesta-quinta.
Acesso em 10/07/2021.
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 239
países mais pobres. Se tomarmos a lista dos países que mais vacinaram,
proporcionalmente, sua população, é possível identificar uma correlação
clara entre esse sucesso relativo e uma relação de aliança prioritária dos
Estados Unidos para com eles.
China, Rússia, Índia e Brasil figuram como países-chave na produção
e distribuição de vacinas. China e Rússia como desenvolvedores e pro-
dutores de algumas das principais iniciativas de vacinação (Sinophar-
ma, Sinovac/Coronavac, Sputnik V, entre outras) e Índia e Brasil como
grandes centros de fabricação (Coronav pelo Butantã, AstraZeneca pelo
Serum indiano e pela FioCruz no Brasil). Provavelmente sem condições
de disputar uma corrida rápida nas vacinas de mRNA com os norte-a-
mericanos, a China apostou em diferentes projetos vacinais de primeira
e segunda geração para os anos de 2020 e 2021, estabelecendo ligações
com laboratórios de todo o mundo e usando a vacina como meio de apro-
ximação ou retaliação política. Ainda que numa posição menos relevante
que a China, a Rússia atuou de forma decisiva para a construção de uma
vacina bastante sofisticada, entre as de segunda geração, recorrendo a
dois tipos de adenovírus como vetores das características do coronavírus.
Inicialmente, houve várias acusações de que os russos estariam roubando
tecnologia britânica do projeto da AstraZeneca, mas ao fim ficou claro
que o projeto russo era mais sofisticado do que o concorrente britânico
capitaneado, cientificamente, pela Oxford. Argentina, Venezuela, Pales-
tina e uma série de outros países estão vacinando já com a Sputnik V,
aparentemente com resultados positivos. Essa ação comercial tem como
resultado o fortalecimento das relações diplomáticas e econômicas da
Rússia com países da América Latina, por exemplo, o que enfraquece
relativamente o domínio comercial norte-americano.
O caso da União Europeia, até o momento, é especialmente signifi-
cativo. Embora conte com algumas das mais importantes indústrias far-
macêuticas do mundo e participe de consórcios de produção de vacinas
como a da Pfizer, a vacinação na região fica aquém do que a condição de
um dos centros econômicos e políticos do mundo. Dados do Our World
in Data indicavam que o bloco administrou 6,8 doses de vacinas por 100
pessoas, contra 29 para cada 100 habitantes do Reino Unido e 20,6 nos
Estados Unidos. É possível perceber que a ausência de controle públi-
co sobre essas empresas privadas e a relativa dependência do capital
242 Hugo Leonardo Cunha Roxo
Fonte: Official data Collated by Our World in Data – Last updated 9 Abril, 10:40 (London time)
OurWorldinData.org/coronavirus • CCBY
14. PINTO, Élida Graziane. E se a CPI da Covid-19 no Senado investigasse o caos fis-
cal do SUS? Disponível em http://idisa.org.br/domingueira/domingueira-n-17-ju-
nho-2021. Acesso em 10/07/2021.
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 247
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente texto, sob a égide da teoria do sistema-mundo, de Imma-
nuel Wallerstein, angariou a hipótese de que a geopolítica da vacina
anti-COVID-19 trouxe, e ainda traz, dificuldades para a efetivação do
direito à saúde, uma vez que a soberania sanitária resta comprometida
num cenário onde há intensa concentração no acesso e no controle ao
acesso aos imunizantes realizado pelos países centrais.
No caso específico do Brasil, a ausência de soberania sanitária não
se ateve apenas ao vetor externo, mas também ao vetor interno, já que
o orçamento da saúde não previu a compra de imunizantes nem fora
executado todo o programa financeiro destinado ao Ministério da Saúde,
sem quaisquer justificativas plausíveis.
A pandemia de COVID-19 trouxe à tona a geopolítica da vacina como
complicador na efetivação do direito à saúde para os países periféricos
e semi-periféricos.
Há saídas. Mas precisam de decisões políticas. Mais uma vez resta
patente que não há direito fundamental à saúde sem a concretização de
políticas públicas sólidas para se evitar a morte de tantos brasileiros.
REFERÊNCIAS
AITH, Fernando; VENTURA, Deisy; REIS, Rossana [org.]. A linha do tempo da
estratégia federal de disseminação da COVID-19. Publicação do Cen-
tro de Pesquisas em Direito Sanitário – CEPEDISA, da Universidade de São
Paulo – USP. Disponível em: https://cepedisa. org.br/publicacoes/ . Acesso
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________. Direitos na pandemia: mapeamento e análise das normas jurídi-
cas de resposta à COVID-19 no Brasil. Publicação do Centro de Pesqui-
sas em Direito Sanitário – CEPEDISA, da Universidade de São Paulo – USP.
Boletim nº 12. Disponível em: https://cepedisa.org.br/publicacoes/. Aces-
so em 01/07/2021.
ALEXANDRAKIS, Fredy. Os EUA entre o nacionalismo e a diplomacia da va-
cina. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/expresso/2021/05
/30/Os-EUA-entre-o-nacionalismo-e-a-diplomacia-da-vacina. Acesso em
10/07/2021.
BRASIL. Lei Federal nº 8080/1990. Disponível em: http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/leis/l8080.htm. Acesso em 25/06/2021.
Geopolítica da vacina, direito à saúde e soberania sanitária 249
1. INTRODUÇÃO
O cenário brasileiro nunca escondeu a realidade do caos que aflige
o serviço de saúde pública, sendo costumeiro a repercussão de matérias
jornalísticas que mostram a sua precarização com a falta de leitos, de
remédios e a longa lista de espera para se marcar uma consulta com um
médico especialista ou realizar algum procedimento médico.
Em nosso verdadeiro normal, já convivemos com a escassez diária
de recursos, onde os investimentos aplicados no Sistema Único de Saúde
nunca são suficientes para acompanhar a demanda dos mais de 150
(*) Especialista em Direito Processual Civil pelo instituto Luiz Flávio Gomes e Pós-Gra-
duando em Direito Médico pela Faculdade CERS.
252 Diogeano Marcelo de Lima
3. DA IMPOSSIBILIDADE DE SE MULTIPLICAR
OS RECURSOS DE SAÚDE ATRAVÉS DA VIA JUDICIAL
Recentemente tem aumentado o número de ações promovidas por
pessoas que buscam a efetivação do seu acesso ao pleno exercício do
direito a saúde pública (MORAIS, 2021). Essa realidade materializa-se,
cotidianamente, com o aumento exponencial da quantidade de ações plei-
teando o acesso ao Direto à Saúde, conforme restou demonstrado através
de pesquisa encomendada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça),
entre os anos de 2008 e 2017, na qual ficou caracterizado o aumento de
A alocação de recursos de saúde em face da escassez de Unidades de Terapia... 257
130% de ações cujo tema era o acesso à saúde. Desse total, o percentual
de 8,76% diz respeito a tratamento médico-hospitalar e fornecimento
de medicamentos. Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ, 2019):
Entre 2008 e 2017, o número de demandas judiciais relativas à saúde
registrou um aumento de 130%, conforme revela a pesquisa “Judicia-
lização da Saúde no Brasil: Perfil das demandas, causas e propostas
de solução”. O estudo, elaborado pelo Instituto de Ensino e Pesquisa
(Insper) para o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostra que, no
mesmo período, o número total de processos judiciais cresceu 50%.
O levantamento foi divulgado nesta segunda-feira (18/3) durante a
III Jornada de Direito da Saúde, em São Paulo.
O crescimento exponencial das ações distribuídas no âmbito do
Poder Judiciário pode nos trazer duas conclusões imediatas: o quanto
o acesso pleno ao direito à saúde é uma realidade distante no nosso
cenário brasileiro e o quanto o Poder Judiciário tem assumido posição
de destaque para garantir a efetividade do acesso à saúde pública no
Brasil (MORAIS, 2021).
No entanto, embora seja função importante do Poder Judiciário
garantir o acesso à saúde, especialmente nos casos de inércia do Poder
Público, e que esta seja atribuição garantida pelo texto constitucional,
especialmente porque vem adotando a doutrina da efetividade dos
direitos fundamentais, não se deve fechar os olhos para as limitações
materiais do fornecimento de serviços que não podem ser multiplicados
via liminar (MORAIS, 2021).
No cenário pandêmico que se instalou no Brasil em decorrência
da Covid-19 ocorreu, sem dúvidas, a sobrecarga do Sistema Único de
Saúde, em especial no que se diz respeito a disponibilização de vagas
de leitos de Unidade de Terapia Intensiva para as pessoas infectadas
por Covid-19, haja vista que, a gravidade da doença exigia, em muitos
casos, o atendimento intensivo e o uso de respiradores para garantir a
sobrevivência e recuperação do paciente (MAGENTA, 2021).
A medida em que o número de contaminados fora aumentado, o
aumento da demanda por leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI’s)
cresceu vertiginosamente de forma desproporcional a capacidade do Es-
tado de ofertar novos leitos, haja vista que, a pandemia deu início a uma
corrida pelos mais diversos recursos de saúde, sejam eles medicamentos,
258 Diogeano Marcelo de Lima
cura que pode agravar o seu estado clínico ou causar dor e sofrimento.
A este respeito, mencionam Álvares e Ferrer (2003, p. 128):
O princípio de não-maleficência afirma, essencialmente, a obrigação
de não causar dano intencionalmente. Costuma ser relacionado com
a máxima “primum non nocere” de Hipocrates. Na verdade, Diego
Garcia sustenta que o princípio da não-maledicência é o fundamento
da ética médica. Nós nos atreveríamos a dizer mais: provavelmente
a não-maleficência seja o princípio básico de todo o sistema moral.
Podemos encontrá-lo no primeiro princípio da ordem moral da
tradição medieval: “faz o bem e evita o mal”. O mais fundamental na
vida moral e o que nos vincula de modo mais rigoroso é a obrigação
de evitar o mal.
Embora haja muita semelhança entre os princípios da benefi-
cência e da não-maleficência, tendo alguns autores agregados ambos
os conceitos em um único princípio, como meio de facilitar o estudo, o
princípio da não-maleficência diferencia-se do princípio da beneficência
na medida em que este proíbe o profissional da área de saúde de causar
dano aos direitos e interesses fundamentais das pessoas (MINAHIM e
PETERSEN, 2021).
Em outras palavras, enquanto o princípio da beneficência exige
uma conduta positiva do profissional da área da saúde, o princípio da
não maleficência exige uma conduta negativa, ou seja, é um não agir,
para que não venha a causar dano. Nesse sentido MINAHIM e PETERSEN
ensinam que (2021, p. 59):
Propondo uma equivalência relativa entre as virtudes e os prin-
cípios, operam a transformação destes em quatro, distinguindo
beneficência e não-maleficência que se referem respectivamente
à ideia: de realizar ações que beneficiem os outros e abster-se de
ações que causem lesões às pessoas. No que diz respeito aos sujeitos
da pesquisa, referem-se à obrigação, por exemplo, de não causar
danos, para tanto utilizando procedimentos de baixo risco –não
maleficência -e de, por outro lado, àquela de prestar auxílio a quem
foi lesado no decorrer da pesquisa -beneficência. A não maleficência
preponderaria sobre a beneficência, embora os autores alertem que
não é possível estabelecer por antecedência a prioridade de um,
sobre outro princípio.
A título de exemplo, enquanto no primeiro, o profissional da área
de saúde deve optar pelo melhor tratamento possível, ou na ausência
A alocação de recursos de saúde em face da escassez de Unidades de Terapia... 269
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
ARAUJO, Virginia Novaes Procópio de. O ato médico no crime de tortura.
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University of São Paulo, São Paulo, 2012. Disponível em: https://www.
teses.usp.br/teses/disponiveis/2/2136/tde-29102012-163521/publico/
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AZEVEDO, Marco; DALL’AGNOL, Darlei; BONELLA, Alcino; e ARAUJO, Marcelo
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saúde crescem 130% em dez anos. Disponível em: https://www.cnj.
jus.br/demandas-judiciais-relativas-a-saude-crescem-130-em-dez-anos/.
Acesso em: 06 jul. 2021.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Recomendação nº. 92, de 29 de
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berto Cordón. A declaração Universal sobre Bioética e Direitos Huma-
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amib.org.br/fileadmin/user_upload/amib/2020/junho/10/Recomenda-
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GOLDIM, José Roberto. Bioética: origens e complexidades. Clinical & Biome-
dical Research, [S.l.], v. 26, n. 2. Disponível em: https://www.seer.ufrgs.br/
hcpa/article/view/100251/56009. Acesso em: 09 jul. 2021.
A alocação de recursos de saúde em face da escassez de Unidades de Terapia... 275
1. INTRODUÇÃO
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88)
situa o direito à saúde como direito fundamental de cunho social no
ordenamento jurídico brasileiro. No plano internacional, o direito à
saúde é mencionado na Declaração Universal dos Direitos Humanos de
1948 (artigo XXV), no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais de 1966 (artigo 12), sendo tratado especificamente
em documentos como a Carta de Ottawa de 1986 e a Declaração de
Alma-Ata de 1978, que representaram o ápice do crescimento de uma
que gênero de normas são essas que não ordenam, proíbem ou permitem hic et nunc,
mas ordenam, proíbem ou permitem num futuro indefinido e sem um prazo de ca-
rência claramente delimitado?” (2004, p.37).
12. Através de decisões da Suprema Corte norte-americana e de dados com gastos para
proteção de direitos fundamentais nos Estados Unidos, a obra enfatiza que os custos
dos direitos vão desde a possibilidade de acesso ao Poder Judiciário para reivindica-
ções sobre lesão ou ameaça, até especificamente às medidas práticas para garantir o
exercício do direito (Cf. HOLMES, SUNSTEIN, 2019).
290 Flávia Sulz Campos Machado
14. “O estudo que se segue, contudo, tem seu objeto restrito à produção de ideias tal
como difundidas no Brasil (rectius: a partir da produção de autores brasileiros) nos
últimos quarenta anos aproximadamente [...] estando longe dos escopos do autor,
e mais ainda de suas possibilidades reais, elaborar a história circunstanciada das
ideias jurídicas no país sobre os direitos fundamentais. Assim, o objetivo [...] é ape-
nas inventariar algumas teorias mais influentes, de molde a evidenciar as tendências
e ideias dominantes” (GALDINO, 2006, p.179-180).
15. A respeito do primeiro modelo teórico, cumpre advertir, conforme esclarecimento
do autor que “Salvo melhor juízo, é possível afirmar que a produção acadêmica na-
cional de que se trata neste estudo não alcança este momento histórico, ingressando
292 Flávia Sulz Campos Machado
do plano fático tão somente por terem sua discussão vetada no mundo
dos autos. Consoante ressalta Bahia (2019c), ao comentar o modelo
teórico da utopia, nota-se uma crença de que a mera previsão do direito
no texto constitucional seria suficiente à sua justiciabilidade.
No segundo modelo teórico proposto por Galdino (2006), da veri-
ficação da limitação de recursos, o autor explica que há uma tímida in-
clusão da dimensão da realidade e da limitação material das prestações
públicas. A orientação normativista ainda é predominante e os custos
dos direitos permanecem como externalidades, agora considerados
meros óbices à observância dos direitos fundamentais que demandem
prestações. A partir deste modelo, verificam-se alocações de recursos
para contemplar pretensões individuais, numa perspectiva de microjus-
tiça, sem atenção aos efeitos coletivos das decisões. Conforme observa
Bahia (2019c), entende-se que, se há recurso financeiro, este pode
ser utilizado independentemente da escolha política, ignorando-se
que a somatória das condenações individuais representa efeitos alar-
mantes.
No modelo da utopia ou no modelo da verificação da limitação de
recursos (GALDINO, 2006), a jurisprudência brasileira tende a ignorar a
questão da escassez e dos custos dos direitos, “seja presumindo que haja
recursos, seja tendo por imoral qualquer consideração orçamentária”
(AMARAL, 2001, p.173).
Dentro de uma perspectiva de microjustiça, no cerne de um modelo
utópico ou da verificação da limitação de recursos, a jurisprudência
do TJBA analisada no recorte de pesquisa ora proposto demonstra um
tratamento insuficiente dos custos, da escassez e das escolhas alocativas
ao decidir sobre a tutela da saúde.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A pesquisa proposta no presente artigo pretendeu encontrar os
posicionamentos recorrentes nos acórdãos do Tribunal de Justiça do
Estado da Bahia, especialmente a fim de verificar se havia ou não o
enfrentamento do problema da escassez de recursos públicos para
concessão do direito à saúde.
294 Flávia Sulz Campos Machado
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CAPÍTULO XIII
1. INTRODUÇÃO
O Código de Processo Civil (CPC) de 2015, em vigor desde 16 de
março de 2016, instaurou um verdadeiro sistema de respeito aos pre-
cedentes no ordenamento jurídico brasileiro. Os precedentes judiciais,
como normas que são, devem ser observados não somente pelos juízes
no ato decisório, mas também pelos jurisdicionados e por aqueles que
trabalham diuturnamente com o Direito, como os advogados.
Certamente se trata de um sistema incipiente, o qual espera-se que,
aos poucos, vá se consolidando na prática forense, sobretudo levando-
-se em consideração a necessidade de os cidadãos sentirem-se seguros
quanto à interpretação e aplicação das leis.
Ocorre que há demandas que são tão específicas que carecem de
uma análise aprofundada, não apenas no sentido legalista, mas sim con-
siderando as peculiaridades morais e anseios dos indivíduos que dela
fazem parte como requerente ou requerido, bem como a principiologia
oriunda da bioética. Para fins deste trabalho, enfatiza-se a peculiaridade
das demandas que envolvem saúde.
O Poder Judiciário está cada vez mais sendo demandado acerca de
controvérsias que versam sobre a medicina e a saúde, o que se denomina
de judicialização da medicina e judicialização da saúde, respectivamen-
te. Acontece que, de modo geral, não se observa nas decisões judiciais
uma fundamentação que envolva uma análise do caso sub judice sob a
perspectiva de princípios bioéticos.
Diante de um ordenamento jurídico que visa a segurança jurídica,
a isonomia e a previsibilidade, através de um sistema de precedentes
judiciais, se questiona neste trabalho qual seria a importância da bioética
o que não mais se coaduna com o CPC, em vigor desde 2016. Por isso,
além de fundamentada, a decisão judicial deve ser coerente, em sintonia
com situações fático-jurídicas semelhantes, observando-se desta forma
os ideais de igualdade de tratamento aos jurisdicionados e de universa-
lização dos seus fundamentos (BREITENBACH, 2016, p. 124).
Na realidade, o sistema brasileiro de precedentes ainda é incipiente.
Tomaz (2018, p. 171) assevera que não se pode esperar a implantação de
um sistema de precedentes de uma hora para outra, através da simples
importação de uma teoria, e sua positivação através da promulgação
de um novo código. Até porque, um sistema de precedentes possui uma
“bagagem procedimental, consubstanciada em exigências de funda-
mentação adequada, que o fortalecimento da natureza vinculante dos
provimentos jurisdicionais exige”.
Em países de tradição civil law, historicamente os precedentes comu-
mente são vistos como secundários, e sua força vinculante praticamente
em nada se assemelha ao common law. O uso dos precedentes como
fonte do direito em países de civil law acaba, por vezes, a se mostrar
como uma “válvula de escape” para a solução de problemas concretos,
equivocadamente “invocando-se a autoridade do tribunal superior”, sem
analisar suas convergências e divergências fático-jurídicas. Ou seja, dife-
rentemente do que ocorre no common law, muitas vezes não se invoca
“a própria autoridade normativa do precedente”. Assim, como no civil
law a lei ocupa um papel central como fonte do direito, a jurisprudência
é utilizada, muitas vezes, de maneira irrefletida, por mera subsunção
(TOMAZ, 2018, p. 170).
Acerca dessa problemática, Tomaz (2018, p. 171 e 173) aduz que:
A fundamentação adequada (coerente e íntegra) das decisões judi-
ciais, em constante diálogo com o caso concreto a ser julgado, é um
passo absolutamente essencial e basilar para que se possa pensar
na construção de um sistema de precedentes ou, de maneira mais
modesta e realista, de um sistema jurisprudencial minimamente fun-
cional e adequado ao art. 93, IX, da Constituição Federal de 1988. [...]
Por consequência, a fundamentação das decisões judiciais atua
como um fator discursivamente racionalizante do processo judicial,
na medida em que (i) obriga o juiz a sempre se reportar ao Direito,
mantendo-se a diferenciação funcional do sistema jurídico e a inte-
gridade de seu código binário; e (ii) proporciona às partes litigantes
O sistema de precedentes do CPC e a importância da bioética... 305
3. AGRAVO DE INSTRUMENTO
N. 0088052-64.2020. 8.21. 7000, DA COMARCA
DE GAURAMA. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
DO RIO GRANDE DO SUL (TJRS). SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP/RS), após
ter ciência de que os genitores de uma criança de 02 (dois) meses de
idade optaram por não o vacinar por motivos de religião e ideologia
de vida, ajuizou uma demanda no juízo da Comarca de Gaurama/RS,
requerendo medida de proteção.
O pleito promovido pelo MP/RS teve como argumentação a prepon-
derância do melhor interesse do menor; a obrigatoriedade de vacinação
das crianças conforme o Programa Nacional de Imunizações (PNI),
do Ministério da Saúde; a ideologia de vida dos genitores não pode se
sobrepor às políticas de saúde pública utilizadas há longos anos; e os
genitores estariam sendo “omissos e negligentes nos cuidados”, tornando
O sistema de precedentes do CPC e a importância da bioética... 307
5. CONCLUSÃO
O presente capítulo deste livro buscou demonstrar a importância
da utilização da Bioética na fundamentação das decisões que compõem
o sistema de precedentes do CPC, através da análise do Agravo de
Instrumento n. 0088052-64.2020.8.21.7000, da comarca de Gaurama,
oriundo da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande
do Sul, sobre o tema “saber se os pais podem deixar de vacinar os seus
filhos, tendo como fundamento convicções filosóficas, religiosas, morais
e existenciais”.
O sistema de precedentes do CPC e a importância da bioética... 317
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