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Evangelho da Natividade de Maria

Traduzido do Hebreu por S. Jerónimo, A.D. 340-420


Fonte: http://www.newadvent.org/fathers/0849.htm em 2012-09-07
Tradução para português de Pedro Aguiar Pinto

Capítulo I
A bem-aventurada e gloriosa sempre virgem Maria, de ascendência real e da família de David,
nasceu na cidade de Nazaré e foi trazida a Jerusalém ao templo do Senhor. O seu pai
chamava-se Joaquim e a sua mãe Ana. A casa do seu pai era da Galileia e da cidade de
Nazaré, mas a família de sua mãe era de Belém. A vida de seus pais era isenta de malícia e
agradável ao Senhor e irrepreensível e piedosa perante os homens. Dividiam o que tinham em
três partes. Uma parte gastavam no templo e para os servos do templo, outra distribuíam pelos
estrangeiros e pobres e a terceira reservavam para si e para as necessidades da família.
Assim, queridos por Deus, amáveis para os homens, durante cerca de vinte anos viveram na
sua própria casa um casamento casto, sem terem filhos. Todavia fizeram o voto de, na
eventualidade de Deus lhes dar um descendente, entregá-lo-iam ao serviço do Senhor; à conta
deste voto, costumavam visitar o templo do Senhor em cada festa durante o ano.

Capítulo II
Aconteceu que a festa da dedicação estava próxima; pelo que Joaquim subiu a Jerusalém com
alguns homens da sua tribo. Nesse tempo Issachar era o sumo sacerdote. E ao ver Joaquim
com a sua oferta entre os seus conterrâneos, desprezou-o e rejeitou as suas oferendas,
perguntando-lhe como é que ele, que não tinha filhos se achava no direito de estar entre os
que os tinham, dizendo que as suas ofertas não podiam, de modo nenhum, ser aceites por
Deus, uma vez que Ele o tinha considerado imerecedor de descendência: porque a Escritura
dizia, Amaldiçoado seja aquele que não dê um macho ou uma fêmea a Israel. Ele disse que,
por conseguinte, ele tinha que se livrar, em primeiro lugar dessa maldição, arranjando um filho.
E então, e só então, poderia vir à presença de Deus com as suas oferendas. E Joaquim,
coberto de vergonha por esta repreensão que lhe era atirada à cara retirou-se para junto dos
pastores que estavam no pastagem com os seus rebanhos; não regressou a casa, não se
fosse dar o caso de ser contemplado com a mesma censura pelos homens da sua própria tribo
que tinam presenciado a repreensão do sumo sacerdote.

Capítulo III
Então, quando ele já aí estava há algum tempo, num certo dia em que ele estava sozinho, um
anjo do Senhor apresentou-se-lhe no meio de uma grande luz. E quando ele estava perturbado
com esta aparição, o anjo sossegou-o, dizendo: Não temas, Joaquim, nem te perturbes com a
minha aparição porque eu sou o anjo do Senhor, enviado por Ele para te dizer que as tuas
orações foram ouvidas, e que as tuas acções caridosas chegaram à Sua presença. Porque ele
viu a vergonha e ouviu a repreensão da esterilidade que te foi injustamente trazida. Porque
Deus é o vingador do pecado, não da natureza: e, assim, quando Ele fecha o ventre de
alguém, fá-lo para que Ele possa abri-lo miraculosamente outra vez; de modo que aquele que
nasce seja reconhecido não como fruto da luxúria, mas como dádiva do Senhor. Porque não foi
assim o caso da primeira mãe da tua nação, Sara, estéril até aos oitenta anos? E, não
obstante, mesmo com essa idade, ela deu à luz, Isaac, a quem a promessa da bênção de
todas as nações foi renovada. Também Raquel, tão favorecida pelo Senhor e tão amada pelo
santo Jacob, foi longamente estéril; e contudo, gerou José, que não só foi senhor do Egipto,
mas a providência de muitas nações que estavam perto de morrer de fome. Quem entre os
juízes era quer mais forte do que Sansão ou mais santo do que Samuel? E contudo as mães
de ambos foram estéreis. Se, mesmo assim, a razoabilidade das minhas palavras não te
consegue persuadir, acredita no facto de que as concepções muito tarde na vida e os
nascimentos no caso de mulheres que foram estéreis, são geralmente acompanhadas de
qualquer coisa de maravilhoso. Deste modo, a tua mulher Ana dar-te-á uma filha a quem porás
o nome de Maria: ela será, como foi o vosso voto, consagrada ao Senhor na sua infância e
será cheia do Espirito Santo, ainda mesmo no ventre de sua mãe. Ela não comerá nem beberá
nada impuro, nem passará a sua vida entre as multidões, mas no templo do Senhor, de modo
que não seja possível dizer, ou mesmo suspeitar, algum mal a respeito dela. Assim, quando ela
for crescida, na mesma medida em que ela nasceu miraculosamente de uma mulher estéril, de
um modo incomparável ela, a virgem, dará à luz o Filho do altíssimo, que se chamará Jesus, e
que, de acordo com a etimologia do Seu nome, será o Salvador de todas as nações. E este
será o sinal que te darei sobre estas coisas que te anuncio: Quando chegares à Porta Dourada
em Jerusalém, encontrarás Ana, a tua mulher, que, estando ansiosa com a demora do teu
regresso, regozijará quando te vir. Tendo dito isto, o anjo, partiu.

Capítulo IV
Em seguida, apareceu a Ana, a mulher de Joaquim: Não temas, Ana, nem penses que é um
fantasma o que vês. Porque eu sou o anjo que apresentou as vossas orações e oferendas
perante Deus e agora fui-vos enviado para vos anunciar que ireis ter uma filha, que será
chamada Maria, e que será abençoada acima de todas as mulhers. Ela, cheia da graça do
Senhor, mesmo desde o nascimento, permanecerá três anos na casa de seu pai até deixar de
mamar. Depois, sendo entregue ao serviço do Senhor, não sairá do templo antes de atingir os
anos da discrição. Aí, finalmente, servindo Deus dia e noite com jejuns e orações ela abster-se-
á de tudo o que seja impuro; não conhecerá homem, mas sozinha, sem exemplo, imaculada,
incorrupta, sem conhecer homem, ela, a virgem, dará à luz um filho; ela, criará o Senhor em
graça e no trabalho, o Salvador do mundo. Por isso, levanta-te e sobe até Jerusalém e quando
chegares à porta que, por ser revestida a ouro, se chama Dourada, aí, como sinal, encontrarás
o teu marido, pela segurança de quem estás tão ansiosa. E quando estas coisas assim
acontecerem, fica a saber que o que eu anuncio será, sem dúvida, cumprido.

Capítulo V
Assim, tal como o anjo havia ordenado, ambos partiram para Jerusalém; e quando chegaram
ao lugar indicado pela profecia do anjo, encontraram-se. Então, alegrando-se por se verem um
ao outro, e seguros da certeza da promessa daquela filha, deram graças ao Senhor, que exalta
os humildes. E, assim, tendo rezado ao Senhor, voltaram para casa e esperaram confiantes e
alegres a divina promessa. Ana, então, concebeu e deu à luz uma filha; e tal como o anjo tinha
dito, os seus pais deram-lhe o nome de Maria.

Capítulo VI
E quando os três primeiros anos tinham passado e o tempo do aleitamento estava completo
trouxeram a virgem ao templo do Senhor com ofertas. Havia à roda do templo, de acordo com
os Salmos, quinze degraus a subir; isto porque, tendo o templo sido construído numa elevação,
ao altar das oferendas, que ficava no exterior, não se podia aceder excepto por estes degraus.
Num destes, então, os seus pais pousaram a rapariguinha, a santa virgem Maria.E quando
trocavam as roupas que tinham trazido na viagem, como era habitual, por outras lavadas e
melhores, a virgem do senhor subiu todos os degraus, um após o outro, sem qualquer ajuda,
de tal modo que, pelo menos deste ponto de vista, dir-se-ia que já era crescida. Por que já
desde a infância da Sua virgem, o Senhor tinha operado grandes coisas, e pela indicação
deste milagre antecipou quão grande ela estava destinada a ser. Assim, depois do sacrifício ter
sido oferecido de acordo com o hábito da lei, e do seu voto ter sido aperfeiçoado, deixaram a
virgem nos aposentos do templo, para ser educada com as outras virgens e eles voltaram a
casa.

Capítulo VII
Mas a virgem do Senhor cresceu em idade e em virtudes; e apesar de, nas palavras do
salmista os seus pais a terem abandonado, o Senhor tomou conta dela. Porque ela era visitada
diariamente por anjos, diariamente le tinha o privilégio de uma visão divina, que a preservava
de todo o mal, e a fazia abundante em todo o bem. E assim, ela chegou ao seu décimo quarto
ano, e não só os maldosos eram incapazes de lhe apontarem qualquer coisa de reprovável
como os bondosos, que conheciam a sua vida e conversação, ajuizavam ser ela merecedora
de admiração. Então o sumo sacerdote, anunciou publicamente que as virgens que tinham sido
publicamente entregues ao templo e tinham atingido esta idade, deviam voltar a casa e casar,
de acordo com o costume da nação e a sua maturidade. As outras obedeceram prontamente a
este comando; mas só Maria, a virgem do Senhor respondeu que ela não podia fazer isso,
dizendo que os seus pais a tinam devotado ao serviço do Senhor e que, ainda por cima, ela
própria tinha feito ao Senhor um voto de virgindade, que ela nunca poderia violar conhecendo
um homem. E o sumo-sacerdote, em grande perplexidade, vendo que nem ele podia pensar
que um voto pudesse ser quebrado, contrariando as Escrituras, que dizem, Promete e paga,
nem ele se atrevia a introduzir um costume desconhecido na nação, deu ordem que no festival
que estava a começar, todas as pessoas principais de Jerusalém e das redondezas estivessem
presentes, de modo que, a partir do seu conselho, ele pudesse saber o que fazer em caso tão
duvidoso. E quando isto teve lugar, resolveram unanimemente que o Senhor devia ser
consultado sobre esta matéria. E quando se curvaram em oração, o sumo-sacerdote consultou
Deus da maneira habitual. Nem tiveram que esperar muito tempo: ouvida por todos, uma voz
saída do oráculo e do lugar da misericórdia disse, que, de acordo com a profecia de Isaías, um
homem devia ser procurado e a virgem a ele entregue e desposada. Porque é claro que Isaías
disse: Uma vara deverá nascer da raiz de Jessé, e uma flor deve ascender da sua raiz; e o
Espírito do Senhor pousará sobre le, o espírito de sabedoria e compreensão, o espírito de
conselho e fortaleza, o espírito de sabedoria e piedade; e ele será cheio com o espírito do
temor do Senhor. De acordo com esta profecia, então, ele predisse que todos os que eram da
casa e família de David e que eram solteiros e aptos para o casamento deveriam trazer as
suas varas ao altar; e aquele cuja vara produzisse uma flor, e em cuja extremidade o Espírito
do Senhor pousasse sobre forma de pomba, seria o homem a quem a virgem deveria ser
confiada e desposada.

Capítulo VIII
Havia entre todos eles um homem de nome José, da casa e família de David, um homem de
idade avançada e quando todos trouxeram as varas, de acordo com a ordem, só ele não a
trouxe. Então, como nada aconteceu em conformidade com a voz divina, o sumo sacerdote
achou necessário consultar Deus uma segunda vez; e Ele respondeu que daqueles que tinham
sido designados, o único a quem a virgem devia ser desposada não tinha trazido a sua vara.
José, então, foi achado. E quando ele trouxe a sua vara, a pomba veio do deu; e pousou no
cimo da vara, pareceu então claramente a todos que ele era o homem com quem a virgem
deveria ser desposada. Assim, após as cerimónias de noivado, ele regressou para a cidade de
Belém para pôr a sua casa em ordem, e para procurar as coisas necessárias ao casamento.
Mas Maria, a virgem do Senhor, com outras sete virgens da sua idade, e que tinham sido
educadas ao mesmo tempo, que lhe tinham sido entregues pelo sacerdote, retornaram a casa
dos seus pais na Galileia

Capítulo IX
E naqueles dias, isto é, ao tempo da sua primeira entrada na Galileia, o anjo Gabriel foi-lhe
enviado por Deus para lhe anunciar a concepção do Senhor e para lhe explicar a maneira e
ordem da concepção. Assi, ele encheu a sala em que ela se encontrava com uma grande luz; e
saudando-a muito cortesmente le disse: Avé maria! Ó virgem favorecida pelo Senhor, virgem
cheia de graça, o Senhor está contigo; bendita sejas entre todas as mulheres. E a virgem, que
já conhecia bem as faces angélicas e que não estranhava a luz do céu, não ficou aterrorizada
com a visão do anjo, nem espantada pela grandeza da luz, mas apenas perplexa com as
palavras que ouviu e começou a considerar a natureza da saudação tão fora do comum, e o
que ela poderia predizer ou que finalidade teria. E o anjo, divinamente inspirado, adivinhando o
seu pensamento, disse: Não temas, Maria, porque não há nada contrário à tua castidade
escondido nesta saudação. Porque ao escolheres a castidade, encontraste o favor do Senhor,
e assim, tu, uma virgem, irás conceber sem pecado, e darás à luz um filho. Ele será grande,
porque Ele reinará de Mara a mar, e desde o rio até aos confins do mundo; e Ele será
chamado Filho do Altíssimo, porque Ele que nasce na terra em humildade, reina no céu em
exaltação; e o Senhor Deus dar-lhe-á o trono de Seu pai David, e Ele reinará na casa de Jacob
para sempre, e o Seu Reino não terá fim; porque Ele é o Rei dos reis e Senhor dos senhores, e
o Seu trono durará para sempre. A virgem não duvidou das palavras do anjo, mas desejando
saber como seria, respondeu: Como é que será possível? Porque, em obediência ao meu voto,
nunca conheci nenhum homem, como será possível sem a semente de um homem? Em
resposta a isto o anjo disse: Não te preocupes, Maria, irás conceber conforme a maneira da
humanidade: mas sem conheceres homem, e apesar de virgem, irás conceber: pois o Espírito
Santo virá sobre ti e o poder do Altíssimo ofuscar-te-á, sem sinais de luxúria; e assim, aquele
que nascerá de ti será o único santo, porque é o único, concebido e nascido sem pecado , e
será chamado Filho de Deus. Então, Maria abriu os braços e levantou os olhos ao céu, e disse:
Eis aqui a escrava do Senhor, pois eu não sou digna do nome de senhora; faça-se em mim
segundo a Sua palavra.

Seria longo e talvez para alguns, mesmo entediante, se tivéssemos inserido neste pequeno
trabalho tudo que lemos sobre o que precedeu e segui a natividade do Senhor; assim, omitindo
estas coisas que estão contadas nos Evangelhos, fiquemos pelas que são tidas como menos
merecedoras de serem narradas

Capítulo X
José então veio da Judeia para a Galileia, com a intenção de casar a virgem que lhe tinha sido
prometida; já tinham passado três meses e estava no princípio do quarto mês desde os
esponsais. Entretanto, era evidente pela sua figura que ela estava grávida, nem ela poderia
escondê-lo de José. Como consequência do noivado, porque os encontros com ela eram mais
livres e a conversa mais íntima, ele descobriu que ela estava de esperanças. Ele começou a
ficar com grandes dúvidas e perplexidades, porque não sabia o que era melhor fazer: Porque,
sendo um homem justo, não queria denunciá-la; nem, sendo um homem piedoso, queria
injuriar a sua reputação com a suspeita de fornicação. Chegou então à conclusão, de dissolver
o contrato, privadamente, e mandá-la embora secretamente. E, enquanto pensava nestas
coisas, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos, dizendo: José, filho de David, não
temas, não tenhas suspeição, não penses mal dela; e não temas recebê-la por tua esposa:
porque o que lhe aconteceu e que agora perturba a tua alma, não é obra de homem, mas do
Espírito Santo. Porque só ela, de entre todas as virgens, dará à luz o Filho de Deus e deverás
dar-Lhe o nome de Jesus, que quer dizer, Salvador; porque Ele salvará o Seu povo dos seus
pecados. Então José, seguindo a ordem do anjo, tomou a virgem como sua esposa; porém,
não a conheceu, mas tomou conta dela e conservou-a na castidade. E quando chegou o nono
mês desde a concepção, José levou a sua esposa e também as coisas que eram precisas e foi
para Belém, a cidade de onde tinha vindo. E, enquanto lá estavam, chegaram ao fim os dias da
gravidez; e ela deu à luz o seu filho primogénito, como os sagrados evangelistas contaram,
Nosso Senhor Jesus Cristo, que com o Pai e o Filho e o Espírito Santo, vive e reina Deus pelos
séculos dos séculos.

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