Você está na página 1de 10

Introdução

O presente trabalho tem por finalidade discutir Princípios de Mudança e Reconstituição


Linguística, a mudança linguística é vista como um fenómeno que resulta do cenário
heterogéneo que naturalmente caracteriza o funcionamento da linguagem em seu contexto
social. Tanto que Weinreich, Labov e Herzog (2006, p. 124) afirmam que “uma mudança
linguística começa quando um dos muitos traços característicos da variação na fala se difunde
através de um subgrupo específico da comunidade de fala”.

Nessa mesma direcção, Labov (2008) afirma que a mudança não pode ser um fenómeno
idiossincrático, posto que a língua é “um instrumento usado pelos membros da comunidade
para se comunicar entre si”. Por conseguinte, “só podemos dizer que a língua mudou quando
um grupo de falantes usa um padrão diferente para se comunicar entre si”. (LABOV, 2008, p.
320).
Conceito de Mudança linguística

A mudança é um processo inerente à própria língua natural humana, qualquer língua natural
humana evolui. Evolui o sistema linguístico, evolui aqueles que o usem (comunidade
linguística).

Chama-se mudança linguística ao processo de modificação e transformação que todas


as línguas experimentam em geral - e as unidades linguísticas de cada um dos seus níveis, em
particular -, na sua evolução histórica.

A mudança linguística se diferencia da variação linguística. Na mudança linguística, as


modificações são diacrónicas e, portanto, são objecto de estudo da linguística histórica. Já as
variações linguísticas são sincrónicas e constituem o objecto de análise da sociolinguística,
entre outras disciplinas.

De acordo com Charles Bally (Apud COSERIU, 1979: 15), “a língua muda sem cessar e não
pode continuar funcionando senão não mudando”. Trata-se do paradoxo da linguagem que
nos leva à compreensão de que a língua vive em equilíbrio instável.

A mudança linguística, para Faraco, possui algumas características, tais como: ela é contínua
e própria a todas as línguas, assim cada estado de língua é produto de um processo histórico, o
que já apontara Saussure, a língua é ao mesmo tempo estática e evolutiva. Apesar de ser
contínua, a mudança é lenta e gradual, ou seja, a mudança não é algo imediato nem integral,
mas sim gradativa, atingindo partes da língua, sendo que a substituição de um termo por outro
passa por um período intermediário, em que os dois elementos coexistem como variantes até
um desaparecer totalmente. Além disso, a mudança é regular, ou seja, as mudanças
linguísticas não acontecem aleatoriamente, pois quando um elemento está em processo de
mudança, esse processo é regular e alcança todas as suas ocorrências. Por fim, a mudança
nunca atinge todo o sistema da língua, mas sim uma parte, como já afirmara Saussure que as
mudanças ocorrem em elementos isolados, não afectando o sistema como um todo. Assim, as
mudanças podem ocorrer em qualquer domínio da língua.

De acordo com Batibo (1992, apud Winford 2003, p. 258), o processo de mudança linguística
envolve cinco estádios que vão desde o uso da L1 como único sistema linguístico de que o
falante dispõe, passando por períodos intermédios de transição de monolinguismo a
bilinguismo, até à completa “extinção” da L1 e consequente substituição pela L27. A
delimitação dos cinco estádios não é claramente visível, uma vez que a erosão linguística
opera em tempos distintos nos vários falantes.

A língua é, como diz Coseriu, um fazimento (Id., p. 100) e as mudanças lingüísticas


pertencem à ordem final, o que significa dizer que a língua é um sistema para cumprir uma
função: a comunicação. A língua faz-se continuamente porque o falar é atividade criadora.

Desde que a Lingüística passou a ser encarada como ciência, na segunda metade do século
XIX, a mudança passou a ser uma preocupação dos estudiosos de língua. A princípio,
acreditava-se que a língua evoluía paulatina e gradualmente para atingir uma fase final de
plenitude, quando estacionaria, caracterizando, assim, uma civilização superior.

Toda mudança significativa que se verifique na língua é, inicialmente, uma variação


individual, mas nem todas as variantes fazem parte da deriva, só “as que se movem em certa
direção” (SAPIR, 1971: 155). Cada traço característico da deriva existe, a princípio, como
tendência, muitas vezes encarada com desprezo. Seria o caso de uma pessoa dizer largato em
vez de lagarto.

Observando, por exemplo, o coloquial carioca, conclui-se que, em relação à 2ª pessoa do


singular, há uma tendência à simplificação, igualando-a às formas de 3ª pessoa. Assim, “tu
vai”, “tu disse”, “tu sabia”, “tu achou”...vão, pouco a pouco, substituindo, no Rio de Janeiro,
“tu vais”, “tu disseste”, “tu sabias”, “tu achaste”, formas essas que permanecem apenas em
locais de grande influência lusitana. É interessante notar que a forma simplificada já não se
acha marginalizada entre pessoas pouco escolarizadas; ao contrário, vem sendo adotada em
todas as camadas da população, especialmente entre jovens, em situações informais. Por outro
lado, o tratamento você, de Vossa Mercê, através de vosmicê, originariamente cerimonioso,
passou, pouco a pouco, à linguagem familiar e, hoje, é comum, pelo menos entre jovens
cariocas, ser usado em oposição ao tu, em situações que exigem maior respeito.

Mas, como disse Sapir, “não podemos antecipar a deriva e manter, ao mesmo tempo, nosso
espírito de casta” (Id., p. 157). Fica-se, portanto, em relação à flexão da segunda pessoa, com
o conflito mental: a aceitação consciente e incômoda da forma flexionada e o desejo
inconsciente de empregar a forma simplificada.
Causas da mudança linguística

 Factores individuais

Má audição/compreensão do falante.

Falhas de memória.

Problemas de visão.

Lei do menor esforço.

Tendência para a analogia (ex. Hambúrguer: de Hamburgo, Cheeseburger?).

 Factores ligados ao grupo

Aceitação no grupo (ex. Hipercorrecção).

Aparecimento de novas realidades (criação/formação de palavras; ex. Internet, Sida).

Melhoramento da expressão do pensamento:

 Mudança de significado (alargamento, restrição ou troca).

Desaparecimento de palavras (ex. Azinha = pressa).

Caracterização da mudança linguística (Labov, Weinreich, Herzog) 

Não corresponde a desvios resultantes da fala, só quando se generaliza (vindo dum subgrupo
da comunidade) e impondo-se gradualmente até ser reconhecida como regra (ex. Informar de
que: o «de» tem tendência a desaparecer).

Não pode confundir-se estrutura com homogeneidade. A variação nunca é desordenada, há


regras. Falar uma língua é dominar as estruturas heterogéneas que o constituem (fala de
Olhão, de Braga, etc.).

Nem sempre a variação implica mudança no sistema, porém toda a mudança resulta da
variabilidade do sistema.

A mudança não se generaliza de forme uniforme e instantânea, o sistema pode albergar


formas alternativas durante muito tempo antes de adoptar alguma delas como regra.
A mudança ocorre nos idiolectos. Estes não são coesos nem internamente consistentes pois
dependem de factores sociais.

A mudança não se restringe à variação dentro da família para ser considerada como tal tem de
transmitir-se a toda a comunidade.

A mudança decorre da conjunção de factores intra e extra linguísticos indissociavelmente


ligados. Todas as perspectivas que se limitam ao estudo de apenas umas destas vertentes,
falha na descrição dos fenómenos.

Princípios de Mudança Linguisticas

Interessados em identificar fundamentos relevantes para o estudo da mudança linguística,


Weinreich, Labov e Herzog (2006) apresentam-nos cinco princípios empíricos para uma
teoria da mudança linguística, os quais são tratados, pelos autores, como problemas a serem
resolvidos na análise da estrutura em mudança. Assim, o primeiro deles, relativo aos fatores
condicionantes, “visa determinar o conjunto de mudanças possíveis e condições possíveis
para a mudança”, posto que se reconhece que “nem toda combinação de fatores linguísticos e
sociais tem sido observada em estudos até o momento, nem tem sido observada toda possível
combinação de variáveis linguísticas” (p. 121). No caso da expressão do objeto direto
anafórico, vimos que alguns desses fatores podem ser: o tempo e a forma do verbo, a
escolaridade, o registro, entre outros.

O segundo princípio se orienta pelo problema da transição, isto é, pelo reconhecimento de que
“entre quaisquer dois estágios observados de uma mudança em progresso, normalmente se
tentaria descobrir o estágio interveniente que define a trilha pela qual a estrutura A evoluiu
para a estrutura B” (p. 122). Por exemplo, o estudo diacrónico da formação do pronome
“você” no português revela que a mudança entre “vossa mercê” e “você” não se deu
abruptamente, mas gradualmente uma forma inovadora esteve em competição com a pré-
existente, até que aquela prevalecesse em detrimento do completo apagamento desta.

O problema do encaixamento – terceiro princípio proposto – recorda-nos que as mudanças


linguísticas devem ser vistas como encaixadas no sistema (sócio) linguístico como um todo
(p. 122). Isso é possível porque o modelo de língua proposto pela sociolinguística compreende
“estratos discretos, coexistentes, definidos pela coocorrência estrita, que são funcionalmente
diferenciados e conjuntamente disponíveis a uma comunidade de fala” (p. 123). Assim é que
se pode identificar, por exemplo, que os resquícios de uso do pronome clítico acusativo na
modalidade falada do português brasileiro se dá junto a formas verbais de infinitivo e tempos
de presente e pretérito perfeito do indicativo (DUARTE, 1989 apud OMENA; DUARTE,
2013), na variedade culta da língua.

Em síntese, com o problema do encaixamento, busca-se determinar o grau de correlação


social e linguística que existe por detrás do uso. É importante destacar que “nos estágios
iniciais e finais de uma mudança, pode haver muito pouca correlação com factores sociais” (p.
123). Em quarta posição, o problema da avaliação lida com o nível de consciência social
sobre o processo de mudança linguística. Sabe-se que os “correlatos subjectivos da mudança
são por natureza mais categóricos do que os padrões cambiantes do comportamento” (p. 124)
e que nem sempre a comunidade de fala apresenta uma consciência explícita sobre o processo
de variação e mudança que sofre dada estrutura da língua. Esse problema fica muito evidente
no estudo da concordância no português brasileiro, haja vista que o uso de sintagmas sem
concordância de número (Ex.: não trouxe os livroø) recebe uma avaliação negativa muito
forte, gerando inclusive actos de preconceito e intolerância linguística contra o falante
(LEITE, 2008; SCHERRE, 2005).

Por último, o problema da implementação acompanha o processo global da mudança


linguística. Assim, identifica o início desse processo quando um dos elementos em variação
na língua começa a ser difundido por um subgrupo específico da comunidade de fala. Esse
elemento seleccionado assume uma significação social que é correspondente aos valores
sociais associados ao grupo que o difundiu inicialmente. Uma vez encaixada na estrutura da
língua, a mudança vai se generalizando gradualmente a outros elementos do sistema. Assim,
conforme alertam Weinreich, Labov e Herzog (2006), “o avanço da mudança linguística rumo
à completação pode ser acompanhado de uma elevação no nível de consciência social da
mudança e do estabelecimento de um estereótipo social”. Finalmente, a conclusão da
mudança e a passagem da variável para o status de constante são acompanhadas da perda de
qualquer significado social atribuído à forma (WEINREICH; LABOV; HERZOG, 2006, p.
124 e 125).
Conclusão

Depois de as minhas pesquisas conclui-se que as mudanças, sejam elas fónicas, lexicais,
semânticas, sintácticas ou morfológicas, estão sempre latentes, convivem com os usuários da
língua em qualquer momento sincrónico e podem, a qualquer momento, fazer parte da deriva
e incorporar-se ao sistema.

Às pessoas que julgam ter a língua portuguesa se estruturado no século XVI, com Camões, e,
a partir daí, permanecendo fixa, inalterável, respondemos que a língua é processo dinâmico e
apresentamos algumas variantes na segunda parte desse trabalho. É certo que algumas se
diluirão com o tempo e a pressão da norma culta ensinada nas escolas; outras, entretanto,
impõem-se, seguem o rumo da deriva e “ficam para sempre assinaladas na história da língua”
(SAPIR, 1971: 155).

Portanto, daí que a mudança está associada ao funcionamento das línguas, ou, em outras
palavras, fenómeno essencialmente funcional, no sentido de que está relacionado o às
estratégias comunicativas que os usuários utilizam nos diferentes eventos de uso.
Referência bibliográfica

FARACO, C. A. A Linguística Histórica: uma introdução ao estudo da história das línguas. 1.


ed. São Paulo: Parábola, 2005.

ALI, M. SAID. Gramática histórica da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Melhoramentos,


1965.

AMARAL, Amadeu. O dialeto caipira. São Paulo: Anhembi, 1955.

CÂMARA JR., J.Mattoso. Introdução às línguas indígenas brasileiras. Rio de Janeiro: Ao


Livro Técnico, 1965.

COSERIU, Eugenio. Sincronia, diacronia e história. Rio de Janeiro: Presença, 1979.

COUTINHO, Ismael de Lima. Gramática histórica. Rio de Janeiro: Acadêmica, 1969.

ELIA, Sílvio. Ensaios de filologia e lingüística. Rio de janeiro: MEC, 1975.

MARROQUIM, Mário. A língua do Nordeste. Rio de Janeiro: Nacional, 1945.

FARACO, C. A. Apresentação de um clássico. In: WEINREICH, Uriel; LABOV, Willian;


HERZOG, Marvin I. Fundamentos empíricos para uma mudança linguística. Trad. Marcos
Bagno. São Paulo: Parábola, 2006.

LABOV, W. Princípios del cambio linguístico: factores sociales. Trad. Pedro Martín
Butragueño. Madrid: Gredos, 2006. 2 v.

WEINREICH, U.; LABOV, W.; HERZOG, M. I. Fundamentos empíricos para uma mudança
linguística. Trad. Marcos Bagno. São Paulo: Parábola, 2006.

Você também pode gostar