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O regulament o europeu de prot eção de dados pessoais e a lei geral de prot eção de dados bra…
Laura Schert el Mendes
PROT EÇÃO DA PERSONALIDADE NO AMBIENT E DIGITAL: UMA ANÁLISE À LUZ DO CASO DO ASSIM CHA…
PPGD UNOESC - Espaço Juridico Journal of Law | EJJL
APROXIMAÇÕES ENTRE O DIREITO AO ESQUECIMENTO
E A LEI GERAL DE PROTEÇÃO DE DADOS PESSOAIS (LGPD) 160
Resumo
Abstract
This study, based on the deductive method, deals with the recognition of the right to
be forgotten in Brazil, which is related to the one’s hope to limit certain passages of
his life to the past. Two opinions are presented in the Extraordinary Appeal affected
for a judgment with general repercussion by the Brazilian Supreme Federal Court
and that will define the applicability of the right to be forgotten in civil law, when
it is invoked by the victim himself or his family, aiming to identify their points of
convergence and divergence. It analyses the main provisions of the Personal Data
Protection Law (Law 13709/2018) and the interpretation of the same subject reached
previously by the Court of Justice of the European Union. It is concluded that there
is a trend towards a minimum harmonization of the understanding on the subject
and of differentiation of the situation of the person who, for the role played in public
life, may have to submit to the prevailing interest of the public or the community in
having access to certain information.
Resumen
vida pública, pueda tener que someterse al interés preponderante del público o de la
colectividad en tener acceso a determinada información y que los instrumentos de la
LGPD pueden contribuir a la concreción del derecho al olvido en varias situaciones.
1 INTRODUÇÃO
3 Cf. os seguintes julgados: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1335153/RJ Recurso Especial
2011/0057428-0; Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma; Data do Julgamento: 28/05/2013; BRASIL.
Superior Tribunal de Justiça. ARE 833248 RG, Relator Min. Dias Toffoli, julgado em 11/12/2014, Processo
Eletrônico Dje-033, Divulg. 19-02-2015. Public. 20/02/2015.
4 No País, veja, por todos: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1660168/RJ, Rel. Ministra Nancy
Andrighi, Rel. p/ Acórdão Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 08/05/2018,
DJe 05/06/2018.
5 Lembra-nos, nesse sentido a pesquisa de Moreira e Alves, sobre a relevância do reconhecimento do
direito ao esquecimento às pessoas transexuais. Dizem-nos que “o direito ao esquecimento não possui
aplicação restrita aos casos de conflito entre os direitos da personalidade (em especial da privacidade)
e a liberdade de expressão ou de imprensa. Por certo que o seu surgimento é relacionado a casos em
que uma pessoa tenta impedir a exploração de fatos constrangedores sobre a sua personalidade, já
acontecidos há determinado tempo e que interessam ser esquecidos. [...] Este direito expandiu-se
para a proteção do consumidor nos casos de cadastros negativos, para a proteção de dados pessoais
no direito eletrônico e também para possibilitar um novo começo para aquelas pessoas que resolvem
mudar o seu plano existencial, alterando ou adequando a sua identidade pessoal como é o caso do
transexual.” (MOREIRA; ALVES, 2015)
6 A despeito de existir, por outro lado, quem defenda que o direito ao esquecimento foi expressamente
previsto e está garantido no art. 7º, X, da Lei no 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), ainda que não
tenham sido estabelecidos critérios. Nesse sentido, confira: LIMA, C. R. P. de. Direito ao Esquecimento
e Internet: o fundamento legal no Direito Comunitário europeu, no Direito italiano e no Direito
brasileiro São Paulo, Revista dos Tribunais, v. 946, p. 77-109, ago., 2014.
7 Entendimento adotado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça por ocasião do julgamento
do Agravo Interno no Recurso Especial REsp nº 1593873/SP, 2016/0079618-1, de relatoria da Ministra
Nancy Andrighi. Data do julgamento: 10/11/2016.
8 Nesse sentido a conclusão do Superior Tribunal de Justiça no REsp 1335153/RJ Recurso Especial
2011/0057428-0; Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma; Data do Julgamento: 28/05/2013.
9 No caso, busca-se a reparação de danos em virtude do uso não autorizado da imagem da falecida irmã
dos autores em programa televisivo que reconstituiu a história do violento crime contra ela perpetrado.
10 Com o provimento do Agravo para se admitir o Recurso Extraordinário, o feito foi reautuado como
RE nº 1.010.606/RJ.
11 O Tribunal, por maioria, reputou constitucional a questão, vencido o Ministro Marco Aurélio. Na
ocasião, não se manifestou a Ministra Cármen Lúcia. A Decisão pela existência de repercussão geral
foi proferida em 12/12/2014. Atualmente, os autos do Recurso Extraordinário nº 1010606/RJ estão
conclusos com o Min. Dias Tofoli, Relator.
12 A perspectiva do direito do positivismo científico “deduzia as normas jurídicas e a sua aplicação
exclusivamente a partir do sistema, dos conceitos e dos princípios doutrinais da ciência jurídica,
sem conceder a valores ou objetivos extra-jurídicos (por exemplo religiosos, sociais ou científicos) a
possibilidade de confirmar ou infirmar as soluções jurídicas.” Mas, explica Wieacker, “na verdade, as
normas jurídicas não são plenas (i.e., isentas de lacunas). No entanto, o lugar dos conceitos na pirâmide
conceitual e as conexões lógicas do sistema permitem imediatamente um preenchimento consequente
das lacunas da lei positiva através da ‘construção criadora’ (ou ‘construtiva’). É precisamente para
esta exigência que serve o incessante limar e polir dos conceitos jurídico-científicos até uma plena
sistemática da justiça.” (WIEACKER, 1980).
13 Na tradução da obra para o italiano, constou: “È evidente che un legislatore che si limita a formulare
norme programmatiche […] pone a carico della giurisprudenza il vero e proprio compito di configurare
principi e regole che diano forme e limiti più precisi all’azione che si fonda sull’atto illecito, che la legge,
da parte sua, appena abbozza.” (ZWEIGERT; KÖTZ, 1998)
14 Em alusão à obra “1984”, de George Orwell, na qual o governo autoritário ficcional, por meio do
Departamento da Verdade, reescrevia por completo as notícias insatisfatórias, submetendo a nova
minuta à autoridade superior antes de arquivar.
15 Em relação a tais direitos abre-se ao próprio titular do direito a autorização de que atue, sempre que
necessário e urgente, para exercer a autotutela contra qualquer ameaça razoável da sua violação, antes
mesmo de o Estado prestar as mais eficientes formas de tutela possíveis (VENTURI, 2014).
16 Justificativa: “Os danos provocados pelas novas tecnologias de informação vêm-se acumulando
atualmente. O direito ao esquecimento tem sua origem histórica no campo das condenações criminais.
Surge como parcela importante do direito do ex-detento à ressocialização. Não atribui a ninguém o
direito de apagar fatos ou reescrever a própria história, mas apenas assegura a possibilidade de discutir o
uso que é dado aos fatos pretéritos, mais especificamente o modo e a finalidade com que são lembrados.”
17 Justificativa: “Recentemente, o STF entendeu ser inexigível o assentimento de pessoa biografada
relativamente a obras biográficas literárias ou audiovisuais (ADIn 4815), asseverando que os excessos
devem ser coibidos repressivamente (por meio do direito de resposta, de uma indenização por danos
morais ou pela responsabilização criminal por delito contra a honra). Com isso, o STF negou o direito ao
esquecimento (este reconhecido no Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil) quando em confronto
com a liberdade de publicar biografias, mas sem eliminar a possibilidade de seu reconhecimento em
outros casos concretos. É hora, pois, de reafirmar a existência do direito ao esquecimento. Esta é a
posição conciliadora de Gustavo Tepedino (Opinião Doutrinária acerca da interpretação conforme a
Constituição dos arts. 20 e 21 do CO, Organizações Globo, 15.06.2012, p. 25), ao afirmar que o direito
ao esquecimento cede espaço ao interesse público inerente à publicação de biografias. Sobretudo,
mais do que ser reconhecido, o caso concreto pode exigir que o direito ao esquecimento seja protegido
por uma tutela judicial inibitória, conforme admitiu o STJ em dois precedentes (REsp 1.334.097/RJ
e REsp 1.335.153/RJ). Isso porque a violação do direito à honra não admite a restitutio in integrum. A
compensação financeira apenas ameniza o abalo moral, e o direito de resposta proporcional ao agravo
sofrido também é incapaz de restaurar o bem jurídico violado, visto ser impossível restituir o status quo.
Como afirma Marinoni, é dever do juiz encontrar, dentro de uma moldura, a técnica processual idônea
à proteção do direito material, de modo a assegurar o direito fundamental a uma tutela jurisdicional
efetiva (art. 5º, XXXV, CF/88). Disso se conclui que não se pode sonegar a tutela judicial inibitória
para resguardar direitos dessa natureza, pois nenhuma outra é capaz de assegurá-los de maneira tão
eficiente.”
18 Veja, sobre a informação e a desinformação nas relações de consumo: BENJAMIN, Antonio Herman
V. O controle jurídico da publicidade. São Paulo, Revista de Direito do Consumidor, v. rmações que lhes
são prestadas e restando, portanto,9, p. 25-57, Jan./Mar.,1994.
19 Trata-se da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, dispõe sobre a proteção de dados pessoais e altera
a Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014 (Marco Civil da Internet).
20 A Medida Provisória nº 869, de 27 de dezembro de 2018, alterou a LGPD, para, dentre outras
providências, estender até agosto de 2020 o prazo para adequação ao novo regime jurídico de proteção
de dados ao ampliar a vacatio legis de dezoito para vinte e quatro meses. A Lei foi publicada em
15/08/2018, logo, entrará em vigor em 16/08/2020. Estão em vigor, desde 28/12/2018, somente os artigos
que criaram e disciplinaram a instalação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão
da administração pública responsável por zelar, implementar e fiscalizar o cumprimento da LGPD.
21 Trata-se do Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho de 27 de abril de
2016 relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e
à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção
de Dados).
22 Existe uma interdependência entre as políticas de segurança da informação e de proteção de dados
pessoais (MENDES, 2013).
23 Encontra seus alicerces principalmente nos princípios de tutela da dignidade da pessoa humana (art.
1º, III, CRFB), de inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e de
proteção ao sigilo de seus dados (art. 5º, X e XII, CRFB).
24 Essa diretriz determina modificações profundas em diversos negócios, exigindo a implementação de
mecanismos efetivos de segurança das informações e de conformidade com a legislação (compliance) e
acentuando o controle sobre um ambiente até então pouco regulado. E as sanções pelo descumprimento
são graves. As sanções administrativas aplicáveis isolada ou cumulativamente pela Autoridade Nacional
são previstas no art. 52 da LGPD e poderão incluir uma multa por infração de até 2% (dois por cento)
do faturamento da pessoa jurídica, grupo ou conglomerado no Brasil no seu último exercício, podendo
atingir até R$ 50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais) (art. 52, III, LGPD). Também é prevista
uma sanção de shaming, ou seja, de publicização da infração após a apuração e a confirmação da sua
ocorrência por meio de processo administrativo (art. 52, IV, LGPD). As sanções da LGPD não excluem
as previstas em outras Leis, como, por exemplo, a que define o crime de concorrência desleal em
desfavor de outras empresas do setor quando os dados obtidos ilegalmente forem utilizados para oferta
de produtos ou serviços, gerando uma vantagem competitiva no setor. (Delito previsto no art. 195, XI e
XII, da Lei nº 9.279/96: “Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem: [...] XI - divulga, explora
ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos informações ou dados confidenciais, utilizáveis na
indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento público
ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual ou
empregatícia, mesmo após o término do contrato; XII - divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização,
de conhecimentos ou informações a que se refere o inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que
teve acesso mediante fraude. Pena - detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa.”)
25 O art. 17 esclarece o âmbito de abrangência da LGPD: limita-se aos dados de titularidade de pessoas
naturais, excluindo-se, com algumas exceções, a proteção de pessoas jurídicas. Essa diferenciação
justifica-se pela existência de outras legislações que tutelam os dados das pessoas jurídicas, sobretudo
por meio da proteção da propriedade industrial.
26 O consentimento do titular é um dos pontos da regulamentação que merece maior atenção. O
consentimento do usuário para a coleta, o uso, o armazenamento e o tratamento de dados pessoais
deve ser de maneira livre, específica, informada e explícita, destacadamente das demais cláusulas
contratuais com as quais anui. A coleta somente poderá ocorrer posteriormente à outorga da anuência
pelo titular, devendo observar os limites em que ela foi concedida. A cláusula de consentimento deve
ser apresentada na modalidade opt-in (o cliente deve marcar a anuência com clique específico sobre a
cláusula), sendo clara e completa quanto à abrangência da consulta e indicando qual o banco de dados
que será acessado. Uma vez que as opções pré-validadas não são consideradas como consentimento
válido nos termos do GDPR (considerado nº 32 do Regulamento (UE) 2016/679), a tendência de futuro
é que também não sejam consideradas consentimento livre e inequívoco no Brasil. Deve-se indicar,
detalhadamente, quais dados serão importados e armazenados e para quais finalidades eles serão
utilizados.
27 A proteção do sigilo, da integridade e da autenticidade, assim como a garantia da utilização dos
dados compartilhados pelo usuário exclusivamente para os fins previamente indicados é imperiosa
para se evitar danos e possíveis sanções pelo tratamento indevido. Conforme orientações publicadas em
2010 pelo Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, nas palavras de Danilo Doneda, “como
condições para o consentimento livre e informado, é necessário que o monitoramento se processe de
forma clara e transparente e que sejam fornecidas aos usuário informações sobre quais dados serão
colhidos, a forma como eles serão utilizados e por quem serão utilizados, entre outras informações
essenciais. Além disso, é fundamental que o usuário tenha condições de desistir a qualquer momento
de ser objeto deste monitoramento.” (DONEDA, 2010)
contrato, quando, por exemplo, o controlador trate dados pessoais na realização das
suas atribuições públicas.28
No caso Costeja González29 (citado expressamente pela Procuradoria-Geral da
República), por exemplo, o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) analisou os
arts. 7º e 8º da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia30 e atribuiu aos
motores de buscas na internet a obrigatoriedade, diante, por exemplo, de informações
incompletas ou inexatas, a “suprimir da lista de resultados, exibida na sequência de
uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma pessoa, as ligações a outras páginas
web publicadas por terceiros e que contenham informações sobre essa pessoa.”31
O TJUE fez referência expressa ao “direito de apagamento”, em conjugação com o
“direito a ser esquecido” nessas circunstâncias.
A orientação do TJEU32 é de prevalência dos direitos e das liberdades
fundamentais da pessoa cujos dados pessoais são retratados em detrimento dos
28 A exemplo do que acontece na União Europeia. (Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu
e do Conselho de 27 de abril de 2016 relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito
ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE
(Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados).
29 Em 5 de março de 2010, M. Costeja González apresentou uma reclamação contra a La Vanguardia
Ediciones SL, que publica um jornal de grande tiragem, e contra a Google Spain e a Google Inc. Isso
porque, quando um internauta inseria o nome de M. Costeja González no motor de busca do Google,
obtinha ligações a duas páginas do jornal da La Vanguardia de, respetivamente, 19 de janeiro e 9 de
março de 1998, nas quais figurava um anúncio de uma venda de imóveis em hasta pública decorrente de
um arresto com vista à recuperação de dívidas à Segurança Social, que mencionava o nome de M. Costeja
González. O reclamante objetivada se ordenasse à Google Spain ou à Google Inc. que suprimissem ou
ocultassem os seus dados pessoais, para que deixassem de aparecer nos resultados de pesquisa e de
figurar nas ligações da La Vanguardia, sob a alegação de que o processo de arresto, de que fora objeto,
tinha sido completamente resolvido há vários anos e que a referência ao mesmo carecia atualmente de
pertinência.
30 O art. 7º, assegura que “todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo
seu domicílio e pelas suas comunicações.” E o artigo subsequente, 8º, assegura a todas as pessoas o
direito “à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito.”
31 A saber: “importa designadamente examinar se a pessoa em causa tem o direito de que a informação
em questão sobre a sua pessoa deixe de ser associada ao seu nome através de uma lista de resultados
exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do seu nome, sem que, todavia, a constatação
desse direito pressuponha que a inclusão dessa informação nessa lista causa prejuízo a essa pessoa. Na
medida em que esta pode, tendo em conta os seus direitos fundamentais nos termos dos artigos 7.° e 8.°
da Carta, requerer que a informação em questão deixe de estar à disposição do grande público devido à
sua inclusão nessa lista de resultados, esses direitos prevalecem, em princípio, não só sobre o interesse
económico do operador do motor de busca mas também sobre o interesse desse público em aceder à
informação numa pesquisa sobre o nome dessa pessoa. No entanto, não será esse o caso se se afigurar
que, por razões especiais como, por exemplo, o papel desempenhado por essa pessoa na vida pública,
a ingerência nos seus direitos fundamentais é justificada pelo interesse preponderante do referido
público em ter acesso à informação em questão, em virtude dessa inclusão.” (UNIÃO EUROPEIA, 2014)
32 Seguindo, inclusive, o revogado art. 7º, f, da Diretiva 95/46 que foi reproduzido no considerando
(47) do Regulamento Geral de Proteção de Dados da União Europeia. Antes: “Artigo 7º Os Estados-
membros estabelecerão que o tratamento de dados pessoais só poderá ser efectuado se: [...] f) O
tratamento for necessário para prosseguir interesses legítimos do responsável pelo tratamento ou do
terceiro ou terceiros a quem os dados sejam comunicados, desde que não prevaleçam os interesses ou
os direitos e liberdades fundamentais da pessoa em causa, protegidos ao abrigo do nº 1 do artigo 1º”
(UNIÃO EUROPEIA, 1995).
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O STF afetou o tema do direito ao esquecimento para decidir essa temática, que
tem sido discutida de norte a sul do País, com repercussão geral. Trata-se do Recurso
Extraordinário com Agravo no 833.248/RJ, substituído pelo Recurso Extraordinário
RE 1010606.
Não raras vezes, a inexistência de enunciação expressa acerca de determinado
direito ou garantia é invocada como argumento para afastar ou limitar a tutela
jurisdicional, confundindo-se, indevidamente, a lei ao Direito. A inexistência de um
dispositivo legal expresso não significa, no plano das relações jurídicas de direito
privado, a ausência de uma tutela pelo ordenamento jurídico.
Os dois pareceres da Procuradoria-Geral da República no caso mencionam
um julgamento do Tribunal de Justiça da União Europeia (caso Costeja González),
que também sob a rubrica do direito ao esquecimento e com base na Diretiva de
proteção de dados pessoais, obrigou os provedores de buscas a “suprimir da lista de
resultados, exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma
pessoa, as ligações a outras páginas web publicadas por terceiros e que contenham
informações sobre essa pessoa”.
Posteriormente a esse julgamento, o Regulamento Geral de Proteção de Dados
na UE contemplou um previsão de que “o tratamento só é lícito se e na medida em
que se verifique pelo menos uma das seguintes situações: [...] f) O tratamento for
necessário para efeito dos interesses legítimos prosseguidos pelo responsável pelo
tratamento ou por terceiros, exceto se prevalecerem os interesses ou direitos e
liberdades fundamentais do titular que exijam a proteção dos dados pessoais, em
especial se o titular for uma criança”.
Na Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) brasileira existe previsão muito
semelhante, inclusive pelos termos empregados, devido à forte influência do RGPD/
EU no anteprojeto. As sanções na LGPD, por exemplo, são bastantes gravosas e
servem como incentivo ao cumprimento das ordens de remoção de conteúdo na
internet pelos grandes provedores de buscas, a exemplo do que aconteceu na UE.
Com o aumento do tráfego de informações pela internet, a tendência é que
no plano internacional se busque uma harmonização mínima de regras, em prol
da efetividade destes direitos fundamentais a que se faz alusão quando tratamos
do direito ao esquecimento. O profissional que se dedica ao estudo do direito ao
esquecimento também deve ter esses novos instrumentos legislativos em mente.
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais no Brasil,
em agosto de 2020, os seus instrumentos (materiais, processuais e administrativos)
poderão, em muitos casos, servir como incentivo para a efetividade das ordens
judiciais de remoção de conteúdos da internet. A articulação da nova legislação de
proteção de dados pessoais, tal como revela a experiência no plano internacional, é
uma técnica com grande potencial para contribuir com a efetividade da proteção dos
jurisdicionados que tiverem o direito ao esquecimento reconhecido em seu favor.
A exemplo do reconhecimento realizado pelo TJUE, é possível que o Supremo
Tribunal Federal reconheça que para uma proteção completa e eficaz das liberdades
e dos direitos fundamentais das pessoas, o direito à vida privada não deve ser objeto
de interpretação restritiva e que os motores de busca na internet têm o dever de zelar
pela intimidade e a vida privada35, sobretudo quando se verifica no caso relevante
35 O TJUE reconheceu que “[...] o operador de um motor de busca é obrigado a suprimir da lista de
resultados, exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do nome de uma pessoa, as ligações
a outras páginas web publicadas por terceiros e que contenham informações sobre essa pessoa, também
na hipótese de esse nome ou de essas informações não serem prévia ou simultaneamente apagadas
dessas páginas web, isto, se for caso disso, mesmo quando a sua publicação nas referidas páginas seja,
em si mesma, lícita. [...] importa designadamente examinar se a pessoa em causa tem o direito de que
a informação em questão sobre a sua pessoa deixe de ser associada ao seu nome através de uma lista de
resultados exibida na sequência de uma pesquisa efetuada a partir do seu nome, sem que, todavia, a
constatação desse direito pressuponha que a inclusão dessa informação nessa lista causa prejuízo a essa
pessoa. Na medida em que esta pode, tendo em conta os seus direitos fundamentais nos termos dos
artigos 7.° e 8.° da Carta, requerer que a informação em questão deixe de estar à disposição do grande
público devido à sua inclusão nessa lista de resultados, esses direitos prevalecem, em princípio, não
só sobre o interesse económico do operador do motor de busca mas também sobre o interesse desse
público em aceder à informação numa pesquisa sobre o nome dessa pessoa. No entanto, não será
esse o caso se se afigurar que, por razões especiais como, por exemplo, o papel desempenhado por
essa pessoa na vida pública, a ingerência nos seus direitos fundamentais é justificada pelo interesse
preponderante do referido público em ter acesso à informação em questão, em virtude dessa inclusão.”
(UNIÃO EUROPEIA. Tribunal De Justiça (Grande Seção). Acórdão no processo C131/12, em 13 de maio
de 2014. Google Spain SL, e Google Inc. contra Agencia Española de Protección de Datos (AEPD) e
Mario Costeja González.)
REFERÊNCIAS
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1334097/RJ, Rel. Ministro Luis Felipe
Salomão, Quarta Turma, julgado em 28/05/2013, DJe 10/09/2013.
36 O direito ao esquecimento mantém uma relação simbiótica com a passagem do tempo. A atribuição
de efeitos jurídicos à passagem do tempo não é nova no Direito – os institutos da prescrição e
decadência, o ato jurídico perfeito, a anistia, a irretroatividade da lei, a coisa julgada, a usucapião, a
limitação temporal dos bancos de dados, a garantia de duração razoável do processo, são alguns dos
vários exemplos dessa íntima relação. A percepção das influências recíprocas entre o tempo e o Direito
é imperiosa para se assegurar a efetiva tutela da dignidade humana, especialmente no que concerne à
construção do seu projeto de vida e à autodeterminação da sua personalidade.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ARE 833248 RG, Relator Min. Dias Toffoli,
julgado em 11/12/2014, Processo Eletrônico Dje-033, Divulg. 19-02-2015. Public.
20/02/2015.
JANAL, Ruth. Data Portability: A Tale of Two Concepts. 8 J. Intell. Prop. Info. Tech.
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MARINONI, Luiz Guilherme. A ética dos precedentes. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2014.
ORWELL, George. 1984. 29ª ed. São Paulo: Ed. Companhia Editora Nacional, 2005.