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AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1913035 - DF (2020/0340604-6)

RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES


AGRAVANTE : DISTRITO FEDERAL
ADVOGADO : RODRIGO OTAVIO BARBOSA DE ALENCASTRO -
DF015101
AGRAVADO : AUZENI AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : EDNA AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ELIAS AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ENOCK AQUINO DE ARAUJO
ADVOGADO : MIZAEL BORGES DA SILVA NETO - DF039773

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE.


MULTA COMINATÓRIA. MORTE DO AUTOR NO CURSO DO
TRATAMENTO. PERDA DE OBJETO. INOCORRÊNCIA. DIREITO
SUCESSÓRIO. PARCELAS VENCIDAS. HABILITAÇÃO DE
HERDEIROS. NECESSIDADE. EXCLUSÃO DAS ASTREINTES.
POSSIBILIDADE. CONDUTA DO DEVEDOR. PARÂMETRO DE
AVALIAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA.
1. O óbice da Súmula 7/STJ (A pretensão de simples reexame de
prova não enseja recurso especial) não incide quando o julgamento
por esta Corte Superior limita-se a aplicar o direito à luz dos fatos
conforme expressamente delineados pela origem. O sentido do
enunciado elucida ser vedado a esta Corte redefinir a hipótese fática à
luz dos elementos probatórios e respectivos argumentos das partes
sobre tais aspectos, mas não tecer novas e distintas conclusões
jurídicas acerca das situações descritas na instância ordinária.
2. Na hipótese dos autos, o acórdão de origem deliberada e
expressamente desconsiderou a jurisprudência deste Tribunal
Superior acerca da possibilidade de execução das astreintes vencidas
pelos herdeiros do autor falecido, em se tratando de direito à saúde.
3. Conforme a jurisprudência, em matéria de direito à saúde, admitir a
impossibilidade de execução das astreintes pelos herdeiros do autor
falecido geraria incentivo econômico inverso ao devedor. O sujeito
passivo poderia apostar na fragilidade da saúde do beneficiário para,
com mais esforço, resistir ao cumprimento da obrigação judicial de
prestação de atendimento médico. O efeito cominatório da multa
estaria não só esvaziado, como revertido em desfavor do detentor do
direito.
4. A exclusão da multa deve levar em consideração, primordialmente,
a conduta do devedor. A recalcitrância deliberada ou inobservância
passiva da ordem judicial devem ser sopesadas lado a lado com
esforços de cumprimento da determinação, ainda que não plenamente
frutífera, quiçá por eventuais limitações e impedimentos alheios à
vontade do obrigado.
5. Hipótese em que o ente federado deixou de cumprir seis ordens
judiciais determinando a prestação de atendimento médico domiciliar
a idoso de mais de 95 anos, portador de Alzheimer, por mais de 6
meses, sem qualquer indício de tentativa de acolhimento da
determinação jurisdicional.
6. No caso, a multa diária foi progressivamente majorada diante da
obstinação do Distrito Federal em não fornecer o atendimento médico
determinado pela Justiça, tendo, ao final, fixada em R$ 2 mil diários,
porém limitada ao teto de R$ 60 mil. Os valores não denotam abuso
ou excessividade, tanto que nem sequer a parte agravante arguiu sua
irrazoabilidade.
7. Agravo interno a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,


acordam os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin, Mauro
Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Herman Benjamin.
Brasília, 30 de agosto de 2021.

Ministro OG FERNANDES
Relator
AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 1913035 - DF (2020/0340604-6)

RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES


AGRAVANTE : DISTRITO FEDERAL
ADVOGADO : RODRIGO OTAVIO BARBOSA DE ALENCASTRO -
DF015101
AGRAVADO : AUZENI AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : EDNA AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ELIAS AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ENOCK AQUINO DE ARAUJO
ADVOGADO : MIZAEL BORGES DA SILVA NETO - DF039773

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. DIREITO À SAÚDE.


MULTA COMINATÓRIA. MORTE DO AUTOR NO CURSO DO
TRATAMENTO. PERDA DE OBJETO. INOCORRÊNCIA. DIREITO
SUCESSÓRIO. PARCELAS VENCIDAS. HABILITAÇÃO DE
HERDEIROS. NECESSIDADE. EXCLUSÃO DAS ASTREINTES.
POSSIBILIDADE. CONDUTA DO DEVEDOR. PARÂMETRO DE
AVALIAÇÃO. SÚMULA 7/STJ. NÃO INCIDÊNCIA.
1. O óbice da Súmula 7/STJ (A pretensão de simples reexame de
prova não enseja recurso especial) não incide quando o julgamento
por esta Corte Superior limita-se a aplicar o direito à luz dos fatos
conforme expressamente delineados pela origem. O sentido do
enunciado elucida ser vedado a esta Corte redefinir a hipótese fática à
luz dos elementos probatórios e respectivos argumentos das partes
sobre tais aspectos, mas não tecer novas e distintas conclusões
jurídicas acerca das situações descritas na instância ordinária.
2. Na hipótese dos autos, o acórdão de origem deliberada e
expressamente desconsiderou a jurisprudência deste Tribunal
Superior acerca da possibilidade de execução das astreintes vencidas
pelos herdeiros do autor falecido, em se tratando de direito à saúde.
3. Conforme a jurisprudência, em matéria de direito à saúde, admitir a
impossibilidade de execução das astreintes pelos herdeiros do autor
falecido geraria incentivo econômico inverso ao devedor. O sujeito
passivo poderia apostar na fragilidade da saúde do beneficiário para,
com mais esforço, resistir ao cumprimento da obrigação judicial de
prestação de atendimento médico. O efeito cominatório da multa
estaria não só esvaziado, como revertido em desfavor do detentor do
direito.
4. A exclusão da multa deve levar em consideração, primordialmente,
a conduta do devedor. A recalcitrância deliberada ou inobservância
passiva da ordem judicial devem ser sopesadas lado a lado com
esforços de cumprimento da determinação, ainda que não plenamente
frutífera, quiçá por eventuais limitações e impedimentos alheios à
vontade do obrigado.
5. Hipótese em que o ente federado deixou de cumprir seis ordens
judiciais determinando a prestação de atendimento médico domiciliar
a idoso de mais de 95 anos, portador de Alzheimer, por mais de 6
meses, sem qualquer indício de tentativa de acolhimento da
determinação jurisdicional.
6. No caso, a multa diária foi progressivamente majorada diante da
obstinação do Distrito Federal em não fornecer o atendimento médico
determinado pela Justiça, tendo, ao final, fixada em R$ 2 mil diários,
porém limitada ao teto de R$ 60 mil. Os valores não denotam abuso
ou excessividade, tanto que nem sequer a parte agravante arguiu sua
irrazoabilidade.
7. Agravo interno a que se nega provimento.

RELATÓRIO

Trata-se de agravo interno interposto por Distrito Federal contra


decisão que deu provimento ao recurso especial dos ora agravados, para
restabelecer a multa cominatória e determinar o prosseguimento da habilitação
da parte recorrente na origem (e-STJ fls. 742-746).
A parte agravante aduz, em suma: i) incidir a Súmula 7/STJ (A
pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial) à
pretensão recursal; e ii) inexistir violação ao dispositivo legal alusivo às
astreintes na hipótese, dada sua substituição por medida prática equivalente.
Requer, assim, a submissão do feito ao Colegiado.
Impugnação apresentada (e-STJ fls. 762-780).
Processo com prioridade legal especial (art. 1.048, I, do CPC/15 c/c
71, § 5º, da Lei 10.741/03).
É o relatório.

VOTO

A hipótese versa sobre o prosseguimento de execução de multa


cominatória pelos herdeiros, em vista do falecimento do autor no curso do
processo. Com o falecimento do idoso de mais de 90 anos e portador de
Alzheimer, beneficiário do tratamento domiciliar obtido por ordem judicial após
meses de recalcitrância, a instância ordinária entendeu ter havido substituição
da astreinte pelo sequestro de valores em conta do ente público.
Quanto à Súmula 7/STJ (A pretensão de simples reexame de prova
não enseja recurso especial), o acórdão delineou clara e precisamente as
circunstâncias fáticas, não se exigindo qualquer incursão desta Corte sobre as
provas em si mesmas para se averiguar a veracidade ou contestar a realidade
da descrição das circunstâncias conforme procedida pela origem. Transcrevo (e-
STJ fl. 597):

[...] foi determinado, inicialmente em decisão antecipatória [...] e


posteriormente em sentença [...] que o Distrito Federal fornecesse ao
Sr. [...], idoso então com 95 (noventa e cinco) anos de idade, portador
de Alzheimer em grau avançado e de sequelas decorrentes de
acidente doméstico em que fraturou o fêmur, tratamento de saúde no
regime home care. Noticiado em Juízo o descumprimento do comando
judicial, foi fixada multa diária no valor de R$ 500,00(quinhentos reais),
limitada a R$ 15.000,00 (quinze mil reais) [...]. Diante da persistência
da mora do Ente Federado no cumprimento da obrigação cominada, o
Sr. [...] manejou Cumprimento Provisório de Sentença, voltado a exigir
disponibilização da equipe de atenção domiciliar em home care [sic],
bem assim o pagamento das fixadas na fase de conhecimento [...]. No
âmbito do Feito executivo, foi fixada nova multa diária para estimular o
cumprimento da obrigação, arbitrada em R$ 1.000,00 (um mil reais),
limitada ao valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais)[...]. Persistindo o
descumprimento, a multa diária fixada na fase de cumprimento de
sentença foi majorada para R$ 2.000,00 (dois mil reais), limitada ao
valor de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) [...], decisão que foi até
mesmo confirmada em recurso a que nos coube a Relatoria [...].
Contudo, em face da renitência no cumprimento da ordem judicial, foi
deferido sequestro de verbas em conta de titularidade do Ente
Federado, para pagamento das despesas da clínica de prestação de
serviços de home care por 3 meses. O aludido provimento jurisdicional
restou renovado em decisão posterior, assegurando-se a manutenção
ao Sr. [...] do atendimento em home care, mediante pagamento com
verbas sequestradas do Poder Público, até a data de seu falecimento,
ocorrido em 30/10/19 [...]. Diante da perda de objeto quanto ao
fornecimento do tratamento em si, os herdeiros [...], sucessivamente,
pleitearam sua habilitação nos autos e a continuidade da tramitação
para exigir do Agravado o pagamento das astreintes fixadas na fase
de conhecimento e no cumprimento de sentença [...].

Portanto, não há qualquer confronto com a jurisprudência sumulada.


Aqui, os fatos são tratados juridicamente como dados e desenhados pela
instância de origem.
O que se discute, em verdade, é o seguinte fundamento do acórdão
(e-STJ fl. 599):

Com efeito, sendo induvidoso que a multa diária era obrigação


acessória destinada unicamente a assegurar a efetividade da
obrigação (principal) de fazer imposta ao Ente Público, esta extinta
com o falecimento do Autor da ação cominatória, também extinta está
a obrigação acessória. Inexiste, portanto, interesse processual dos
herdeiros, sendo também acertada a rejeição ao pedido de
habilitação.
Nesse passo, asseverou-se no juízo singular ora impugnado (e-STJ fl. 744):

[...] o argumento do acórdão de que a multa é acessória não afasta


sua incidência ante a extinção do benefício principal, na hipótese de
tratamento de saúde.

Firmou-se tal compreensão na jurisprudência desta Corte, assim transcrita


na ocasião:

PROCESSUAL CIVIL. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO.


FALECIMENTO DA AUTORA. PERDA DE OBJETO. SENTENÇA DE
EXTINÇÃO - ART. 267, IV, DO CPC. IRRESIGNAÇÃO. PRETENSÃO
PELA HABILITAÇÃO E COBRANÇA DE MULTA COMINATÓRIA.
TRANSMISSIBILIDADE AOS HERDEIROS. CRÉDITO DE
NATUREZA PATRIMONIAL, QUE NÃO APRESENTA O MESMO
CARÁTER PERSONALÍSSIMO DA OBRIGAÇÃO DE FORNECER
TRATAMENTO MÉDICO OU MEDICAMENTO. POSSIBILIDADE DE
PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO PELOS SUCESSORES DA
PARTE DEMANDANTE.
[...]
III - É plenamente possível o reconhecimento do direito dos
sucessores ao recebimento do quantum devido a título de multa diária,
visto que, segundo entendimento do STJ, nas demandas cujo objetivo
é a efetivação do direito à saúde, a multa diária prevista no art. 461, §§
4º a 6º, do CPC/1973 (correspondente ao art. 537 do CPC/2015), não
se reveste da mesma natureza personalíssima que possui a pretensão
principal, representando, em verdade, crédito patrimonial, de modo
que é plenamente transmissível aos herdeiros, podendo ser por eles
executada. Nesse sentido: AgInt no AREsp n. 1.139.084/SC, relator
Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Órgão Julgador T1 - Primeira
Turma, DJe 28/3/2019.
IV - Outrossim, incabível à parte recorrente suscitar o óbice do art.
537, § 1º, do CPC, pois, além de configurar inovação recursal, tal
dispositivo se aplica às multas vincendas, e não às multas vencidas,
que constituem direito patrimonial transmissível aos sucessores. Aliás,
tal argumento também também atrai o disposto na Súmula n. 284/STF.
V - Agravo interno improvido.
(AgInt no REsp 1.761.086/SP, Rel. Min. FRANCISCO FALCÃO,
SEGUNDA TURMA, julgado em 23/11/2020, DJe 25/11/2020).

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO À SAÚDE.
FALECIMENTO DA PARTE AUTORA. MULTA DIÁRIA.
TRANSMISSIBILIDADE AOS HERDEIROS. CRÉDITO DE
NATUREZA PATRIMONIAL, QUE NÃO APRESENTA O MESMO
CARÁTER PERSONALÍSSIMO DA OBRIGAÇÃO DE FORNECER
TRATAMENTO MÉDICO OU MEDICAMENTO. POSSIBILIDADE DE
PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO PELOS SUCESSORES DA
PARTE DEMANDANTE. AGRAVO INTERNO DO ENTE ESTADUAL A
QUE SE NEGA PROVIMENTO.
[...]
2. A multa diária, tratada nos §§ 4o. a 6º. do art. 461 do CPC/1973
(art. 537 do Código Fux) afigura-se como crédito patrimonial, não se
revestindo da mesma natureza personalíssima que possui a pretensão
principal, nas demandas cujo objeto é a efetivação do direito à saúde.
[...]
5. Quanto às questões patrimoniais, por outro lado, e ainda que se
relacionem de alguma forma com o direito à saúde em si, a solução é
diversa. Isso porque, havendo nos autos pretensão de caráter
patrimonial, diversa do pedido personalíssimo principal, o direito
subjetivo que embasa a pretensão é um crédito em obrigação de
pagar quantia, sendo, por isso, plenamente transmissível aos
herdeiros.
6. Há que se distinguir, portanto, a obrigação principal cujo
adimplemento se busca na Ação - uma obrigação de fazer, no caso de
tratamento ou providências aptas a garanti-lo, ou de dar, se o pedido
for pelo fornecimento de medicamentos ou outros itens - e eventuais
obrigações de pagar, que com aquela não se confundem.
7. Eventual morte da parte autora, assim, afetará apenas a obrigação
de fazer ou de dar, que apresenta natureza personalíssima, porquanto
adequada apenas ao quadro clínico pessoal da parte demandante.
[...]
10. Além das considerações sobre a natureza patrimonial do crédito
oriundo da multa diária, há ainda outra questão a ser considerada,
referente à própria eficácia do instrumento processual em si. Caso
acolhida a argumentação do agravante sobre a intransmissibilidade do
crédito, o instrumento da multa diária perderia sua força coercitiva,
notadamente nos casos em que o beneficiário da tutela antecipada
apresentasse quadro clínico mais grave ou mesmo terminal. Nessas
situações, o réu poderia simplesmente descumprir a decisão judicial e
esperar pelo falecimento do postulante, na certeza de que não teria de
arcar com os custos da desobediência à determinação do Judiciário.
11. Nos casos em que a morte fosse decorrência dessa ilícita omissão
estatal, seria criado um cenário completamente esdrúxulo, em que o
réu se beneficiaria da sua própria torpeza, deixando de fornecer o
medicamento ou tratamento determinado judicialmente e sendo
recompensado com a extinção dos valores pretéritos da multa diária.
12. A eficácia prática do instrumento previsto no art. 537 do Código
Fux restaria assim não só prejudicada, mas verdadeiramente invertida,
pois se converteria em meio de estimular o réu a ignorar a
determinação judicial e aguardar pelo perecimento do direito da parte
autora.
13. Em observância à natureza de crédito patrimonial da multa e à
necessidade de preservar seu poder coercitivo, conclui-se que é
possível a execução do valor, pelos herdeiros da parte originalmente
beneficiária da tutela jurisdicional que fixou as astreintes, sendo
inviável a extinção do processo sem resolução de mérito com
fundamento no art. 267, IX do CPC/1973 (art. 485, IX do Código Fux).
Deve-se, como decorrência, admitir a habilitação dos herdeiros da
parte (ou do espólio, conforme o caso) como seus sucessores
processuais.
14. Agravo Interno do ente estadual a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp 1.139.084/SC, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA
FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 21/3/2019, DJe 28/3/2019).

Portanto, é sedimentada a compreensão jurídica desta Corte de que,


em se tratando de direito à saúde, descabe falar-se em extinção das astreintes
pelo falecimento do autor, no que tange à pretensão executória dos herdeiros.
Isso porque, conforme se extrai da ratio dos precedentes, o resultado desse
proceder seria uma odiosa inversão de incentivos comportamentais do sujeito
passivo, que tanto mais resistiria quanto mais enfática fosse a multa.
Não se desconhece, por óbvio, a possibilidade de exclusão da multa a
qualquer tempo, mesmo em sede executória. Resta avaliar o padrão
jurisprudencial em que se permite tal apreciação, na medida em que há
parâmetros para seu exercício.
No ponto, a jurisprudência desta Corte também: o fator preponderante
para a fixação da multa cominatória é a recalcitrância do devedor. Assim, é a
conduta resistente do sujeito passivo que determina a possibilidade de redução
ou, como se fez no caso, exclusão da astreinte. A propósito:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. NEGATIVA DE


PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. TUTELA
PROVISÓRIA DE URGÊNCIA. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO
FAZER. RETIRADA DE CONTAINER. PROXIMIDADE DE
PORTAS E JANELAS DE IMÓVEL VIZINHO. ASTREINTES.
FIXAÇÃO. NATUREZA. EXECUÇÃO INDIRETA. PRECLUSÃO.
COISA JULGADA. NÃO SUBMISSÃO. REVISÃO. QUALQUER
TEMPO. ART. 537, § 1º, DO CPC/15. EXCLUSÃO. FATOR
PREPONDERANTE. RESISTÊNCIA DO DEVEDOR. CASO
CONCRETO. INEXISTÊNCIA.
[...]
7. A fixação das astreintes deve ter em consideração como fator
preponderante a efetividade da tutela pretendida pelo credor,
averiguada segundo o grau de resistência a ela oposta pela
conduta do devedor.
8. O grau de resistência do devedor é elemento central da
previsão do art. 537, § 1º do CPC/15, pois serve tanto de
parâmetro para a modificação do valor das astreintes, em vista
de sua insuficiência ou excesso, na hipótese do inciso I, quanto
para a sua exclusão, em decorrência do cumprimento parcial
superveniente ou da justa causa para o descumprimento, na
hipótese do inciso II.
[...]
(REsp 1862279/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,
TERCEIRA TURMA, julgado em 19/05/2020, DJe 25/05/2020).

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO


INDENIZATÓRIA. DESCUMPRIMENTO DE DECISÃO JUDICIAL.
MULTA DIÁRIA. REDUÇÃO.
[...]
3. Se o único obstáculo ao cumprimento de determinação judicial para
a qual havia incidência de multa diária foi o descaso do devedor, não é
possível reduzi-la, pois as astreintes têm por objetivo, justamente,
forçar o devedor renitente a cumprir sua obrigação. Precedentes.
4. Agravo Regimental improvido.
(AgRg no REsp 1324053/MG, Rel. Ministro SIDNEI BENETI,
TERCEIRA TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 05/09/2013).

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E


PROCESSUAL CIVIL.
[...]
3. É verdade que, para a consecução da "tutela específica", entendida
essa como a maior coincidência possível entre o resultado da tutela
jurisdicional pedida e o cumprimento da obrigação, poderá o juiz
determinar as medidas de apoio a que faz menção, de forma
exemplificativa, o art. 461, §§ 4º e 5º do CPC/1973, dentre as quais se
destacam as denominadas astreintes, como forma coercitiva de
convencimento do obrigado a cumprir a ordem que lhe é imposta.
4. No tocante especificamente ao balizamento de seus valores, são
dois os principais vetores de ponderação: a) efetividade da tutela
prestada, para cuja realização as astreintes devem ser
suficientemente persuasivas; e b) vedação ao enriquecimento sem
causa do beneficiário, porquanto a multa não é, em si, um bem jurídico
perseguido em juízo.
5. "O arbitramento da multa coercitiva e a definição de sua
exigibilidade, bem como eventuais alterações do seu valor e/ou
periodicidade, exige do magistrado, sempre dependendo das
circunstâncias do caso concreto, ter como norte alguns parâmetros: i)
valor da obrigação e importância do bem jurídico tutelado; ii) tempo
para cumprimento (prazo razoável e periodicidade); iii) capacidade
econômica e de resistência do devedor; e iv) possibilidade de adoção
de outros meios pelo magistrado e dever do credor de mitigar o próprio
prejuízo (duty to mitigate de loss)" (AgInt no AgRg no AREsp
738.682/RJ, Rel. Ministra Maria Isabel Gallotti, Rel. p/ Acórdão
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 17/11/2016,
DJe 14/12/2016).
[...]
8. Agravo interno não provido.
(AgInt no AgInt nos EDcl no AREsp 766.996/MT, Rel. Ministro LUIS
FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 12/03/2019, DJe
19/03/2019).

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM


RECURSO ESPECIAL. RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO
NCPC. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
[...]
4. A apuração da razoabilidade e da proporcionalidade do valor da
multa diária deve ser verificada no momento da sua fixação, em
relação ao da obrigação principal, uma vez que a redução do
montante fixado a título de astreinte, quando superior ao valor da
obrigação principal, acaba por prestigiar a conduta de recalcitrância do
devedor em cumprir a decisão judicial e estimula a interposição de
recursos a esta Corte para a redução da sanção, em total desprestígio
da atividade jurisdicional das instância ordinárias. Precedente.
[...]
(AgInt no AREsp 1517002/RS, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO,
TERCEIRA TURMA, julgado em 16/12/2019, DJe 18/12/2019).

Nesse cenário pretoriano, deve-se considerar, como na decisão


agravada, a avaliar a conduta do Distrito Federal. O ente federado deixou de
cumprir a liminar, deixou de cumprir a sentença, deixou de atender não a um,
nem a dois, nem a três, mas a seis comandos judiciais específicos de
fornecimento de atendimento médico domiciliar a idoso de mais de 95 anos,
portador de Alzheimer. Passados mais de 6 meses da primeira ordem, o
Judiciário, enfim, dignou-se a bloquear os valores do ente em conta.
Isto é: o devedor em nada colaborou ou agiu para desincumbir-se de
sua obrigação. Assistiu, passivamente, ao descumprimento da ordem judicial,
apostando ou na complacência da jurisdição, ou na fragilidade da saúde do
autor, como ressalta o Distrito Federal em suas razões de agravo, que
transcrevo (e-STJ fl. 757, grifei):

Com todo respeito que merece o amor fraternal que envolvia a relação
dos Agravados com o Autor da ação e reconhecendo e valorando a
luta que tiveram para resguardar a sua vida, não se pode olvidar que a
idade longeva de 95 anos agravada por quadro doença degenerativa,
apesar de todos os esforços empreendidos, não conduzia a uma
quadro de esperançosa recuperação do paciente.

A pergunta subjacente é: quais esforços empreendeu o Distrito Federal


para cumprir a ordem? Não há qualquer indício de resposta. Nessa linha,
manifestei-me no juízo singular (e-STJ fls. 743-744):

Note-se que a multa foi limitada a R$ 60 mil, e o tratamento custou,


efetivamente, cerca de R$ 55 mil. Mantida a situação, restaria como
"lucrativo", rogando vênias pela expressão em matéria tão sensível, ao
ente federado descumprir por mais de meio ano as ordens judiciais,
quiçá apostando na piora das condições de saúde do autor. A rigor,
todas as multas seriam descabidas, bastando à parte ré que se
obstinasse de forma ainda mais ferrenha; afinal, estariam unidas as
duas certezas da vida, a morte do autor e os impostos, não gastos em
seu atendimento. A medida coercitiva não pode se prestar a prejudicar
a pretensão principal, estimulando, ao revés, o comportamento
recalcitrante contumaz.

Note-se que não houve qualquer insurgência da parte agravante


acerca do valor da multa. Portanto, tenho como incólume a decisão agravada,
que assim concluiu (e-STJ fl. 745):

Entendo, por conseguinte, ser necessário o restabelecimento das


astreintes na forma originalmente fixadas, limitadas ao valor de R$ 60
mil reais, devendo a origem, ainda, processar a habilitação da parte
ora recorrente como devido.

Ademais, cumpre destacar que a Corte de origem, em evidente


descompasso com a atual quadra processual e jurisprudencial, considerou
irrelevantes os precedentes deste Tribunal Superior acerca da matéria,
expressamente invocados pela parte. Limitou-se, quanto a eles, a afirmar (e-
STJ fl. 599):

Em relação aos julgados colacionados ao recurso, em que pese


adotarem posicionamento diverso do disposto no presente voto, não
possuem caráter vinculante a me demover dos fundamentos ora
expostos.

Não se pretende dar força vinculante à jurisprudência não qualificada.


Mas a compreensão da Corte Superior deve ser -- senão por outras razões,
como coerência do ordenamento, economia processual, isonomia perante o
direito e segurança jurídica -- ao menos considerada e, no mínimo, detidamente
rebatida pelo tribunal subordinado, ainda que para convencer a instância de
revisão e uniformização de seu desacerto anterior. No caso, esse inexiste esse
desacerto. O precedente citado pela parte autora por ocasião do agravo de
instrumento e ignorado pelo tribunal é precisamente o primeiro acima
colacionado, que mantém-se como guia jurisprudencial da hipótese fática dos
autos.
Ante o exposto, nego provimento ao agravo interno.
É como voto.
TERMO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
AgInt no REsp 1.913.035 / DF
Número Registro: 2020/0340604-6 PROCESSO ELETRÔNICO

Número de Origem:
07011406120208070000 07087621120188070018 07115153820188070018 7011406120208070000
7087621120188070018 7115153820188070018

Sessão Virtual de 24/08/2021 a 30/08/2021

Relator do AgInt
Exmo. Sr. Ministro OG FERNANDES

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro HERMAN BENJAMIN

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : AUZENI AQUINO DE ARAUJO


RECORRENTE : EDNA AQUINO DE ARAUJO
RECORRENTE : ELIAS AQUINO DE ARAUJO
RECORRENTE : ENOCK AQUINO DE ARAUJO
ADVOGADO : MIZAEL BORGES DA SILVA NETO - DF039773
RECORRIDO : DISTRITO FEDERAL
PROCURADOR : RODRIGO OTAVIO BARBOSA DE ALENCASTRO - DF015101

ASSUNTO : DIREITO DA SAÚDE - PÚBLICA - TRATAMENTO MÉDICO-HOSPITALAR

AGRAVO INTERNO

AGRAVANTE : DISTRITO FEDERAL


ADVOGADO : RODRIGO OTAVIO BARBOSA DE ALENCASTRO - DF015101
AGRAVADO : AUZENI AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : EDNA AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ELIAS AQUINO DE ARAUJO
AGRAVADO : ENOCK AQUINO DE ARAUJO
ADVOGADO : MIZAEL BORGES DA SILVA NETO - DF039773

TERMO

A SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, decidiu negar


provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Assusete
Magalhães votaram com o Sr. Ministro Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Herman Benjamin.
Brasília, 31 de agosto de 2021

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