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HABEAS CORPUS Nº 641362 - SC (2021/0021449-4)

RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ


IMPETRANTE : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA
CATARINA
ADVOGADOS : DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA
CATARINA
ADRIANA YURIKA IWASHITA - SP292952
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA
CATARINA
PACIENTE : MARCOS FABRICIO SOEIRO RODRIGUES (PRESO)
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA
CATARINA

DECISÃO

MARCOS FABRÍCIO SOEIRO RODRIGUES alega sofrer coação


ilegal em decorrência de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado
de Santa Catarina que negou provimento à Apelação Criminal n. 5007707-
91.2019.8.24.0011 e manteve inalterada a reprimenda de 5 anos e 10 meses de
reclusão, em regime semiaberto, mais multa, imposta ao réu pela prática do delito
de tráfico de drogas.

Busca-se, por meio deste writ: a) a aplicação da minorante prevista no §


4º do art. 33 da Lei de Drogas; b) a fixação de regime mais brando para o início do
cumprimento da reprimenda; c) a substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos.

Indeferida a liminar e prestadas as informações, o Ministério Público


Federal opinou pela denegação da ordem.

Decido.

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Publicação no DJe/STJ nº 3158 de 31/05/2021. Código de Controle do Documento: fc0eb496-96c1-4c39-9a32-206b425ed6ff
I. Pena-base

O paciente teve a pena-base majorada pelos seguintes fundamentos (fl.


369):

[...] tenho que o acusado agiu com elevado grau de culpabilidade,


uma vez que comercializava as substâncias "crack" e "cocaína",
altamente perniciosas e nocivas à saúde pública, tendo em vista a
rapidez com que submete o usuário à dependência, causando-lhe,
por consequência, danos físicos e psíquicos graves e irreversíveis
(Apelação Criminal n. 2009.001203-3, de Joinville, rela.
Desa. Salete Silva Sommariva), de modo que em atenção ao artigo
42, da Lei n.
11.343/2006, esta circunstância deve ser considerada negativa.

Certo é que, segundo o disposto no art. 42 da Lei n. 11.343/2006, "O


Juiz, na fixação das penas, considerará, com preponderância sobre o previsto no
art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a
personalidade e a conduta social do agente".

No entanto, embora a natureza das substâncias apreendidas constitua, de


fato, circunstância preponderante a ser considerada na dosimetria da pena, entendo
que a quantidade das drogas não foi excessivamente elevada – 9,9 g de crack e 4,1
g de cocaína –, de maneira que se mostra manifestamente desproporcional sopesar,
no caso ora analisado, apenas a natureza para justificar a exasperação da pena-base.

Do contrário, qualquer agente que fosse apreendido com crack ou com


cocaína, ainda que com uma porção com peso de 5 g, por exemplo, deveria ter a
sua pena-base estabelecida acima do mínimo legal – a pretexto de correta aplicação
do disposto no art. 42 da Lei n. 11.343/2006 –, o que, evidentemente, não se
coaduna com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Assim, uma vez verificada a inadequação da análise das circunstâncias


judiciais, a pena-base deve ser reduzida ao mínimo legal, ou seja, 5 anos de
reclusão e 500 dias-multa.

II. Aplicação da minorante

Sobre a incidência do privilégio no tráfico de drogas, identifico a


ocorrência de flagrante ilegalidade que demanda a concessão da ordem.

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A Corte estadual assim fundamentou a impossibilidade de incidência do
redutor em questão, verbis (fl. 371):

No caso, extrai-se da certidão de antecedentes criminais (Evento


45 dos autos originários) que o apelante foi condenado nos autos
n. 0003967-16.2019.8.24.0011, e embora não esteja configurada a
reincidência ou os maus antecedentes, haja vista a ausência de
trânsito em julgado, por outro lado, tal ação penal em curso
permite deduzir que o recorrente dedicava-se à atividade
criminosa.
Portanto, embora o apelante seja primário, as circunstâncias da
prisão, os depoimentos dos agentes públicos, os tipos de drogas
apreendidas, diga-se de passagem, de altíssima perículosidade e
nocividade, bem como as demais provas carreadas aos autos,
afastam qualquer possibilidade de conduta eventual, mostrando-se
evidente que o mesmo se dedicava continuamente às atividades
ilícitas.

Para a aplicação da minorante em comento, são exigidos, além da


primariedade e dos bons antecedentes do acusado, que este não integre organização
criminosa e que não se dedique a atividades delituosas. Isso porque a razão de ser
da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei n.
11.343/2006 é justamente punir com menor rigor o pequeno traficante, ou seja,
aquele indivíduo que não faz do tráfico de drogas o seu meio de vida; antes, ao
cometer um fato isolado, acaba incidindo na conduta típica prevista no art. 33 da
mencionada lei federal.

A propósito, confira-se o seguinte trecho de voto deste Superior


Tribunal: "A mens legis da causa de diminuição de pena seria alcançar os
condenados neófitos na infausta prática delituosa, configurada pela pequena
quantidade de droga apreendida, e serem eles possuidores dos requisitos
necessários estabelecidos no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/06." (AgRg no REsp n.
1.389.632/RS, Rel. Ministro Moura Ribeiro, 5ª T, DJe 14/4/2014).

No caso, para negar ao réu a incidência da minorante a instância


ordinária fundou-se em 2 motivos: a) a natureza das drogas apreendidas; b) ter o
acusado anterior condenação, ainda não transitada em julgado.

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Em princípio, quanto ao fato de estar o réu respondendo a outro processo
pela prática do mesmo delito, faço lembrar que, por ocasião do julgamento dos
EREsp n. 1.431.091/SP (DJe 1º/2/2017), de relatoria do Ministro Felix Fischer, a
Terceira Seção desta Corte Superior de Justiça firmou o entendimento de que: "[...]
é possível a utilização de inquéritos policiais e/ou ações penais em curso para
formação da convicção de que o Réu se dedica a atividades criminosas, de modo a
afastar o benefício legal previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06".

Nesse mesmo julgado, ressaltou-se que "O crime de tráfico de drogas


deve ser analisado sempre com observância ao mandamento constitucional de
criminalização previsto no artigo 5º, XLIII, da Constituição Federal, uma vez que
se trata de determinação do constituinte originário para maior reprimenda ao delito,
atendendo, assim, ao princípio da vedação de proteção deficiente".

Deveras, não se discute que a existência de inquéritos policiais ou de


ações penais em andamento não possuem o condão de exasperar a reprimenda-
base, consoante o enunciado na Súmula n. 444 deste Superior Tribunal. Essa,
aliás, é a essência do princípio da presunção de não culpabilidade.

Contudo, não vejo óbice a que a existência de inquéritos policiais, de


processos em andamento ou mesmo de condenações ainda sem a certificação do
trânsito em julgado possa, à luz das peculiaridades do caso concreto, ser
considerada elemento apto a evidenciar a dedicação do acusado a atividades
criminosas. Essa, aliás, sempre foi a minha compreensão acerca dessa matéria,
conforme já externalizei, por exemplo, no HC n. 338.379/SP, julgado por esta
colenda Sexta Turma em 6/12/2016.

É de rigor consignar que uma interpretação teleológica do art. 33, § 4º,


da Lei n. 11.343/2006 à luz da política criminal de drogas instituída pelo Sistema
Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – Sisnad permite inferir que o espírito
da norma contida no referido dispositivo de lei é o de beneficiar o agente que não
se utiliza da mercancia de entorpecentes como atividade profissional. Se o intuito
foi esse, inequivocamente a orientação normativa pretendeu afastar o benefício

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àqueles que, constantemente, incorrem na prática ilícita e já tiveram envolvimento
com o narcotráfico e/ou com crimes que, não raro, estão a ele interligados (como
delitos patrimoniais, homicídio, associação criminosa etc.).

Ademais, se a natureza do instituto em análise é justamente tratar com


menor rigor o indivíduo que se envolve circunstancialmente com o tráfico de
drogas – e que, portanto, não possui maior envolvimento com o narcotráfico ou
habitualidade na prática delitiva –, não me parece razoável punir aquele que ostenta
diversas anotações penais em seu desfavor da mesma forma que um traficante que
não possui nenhum registro criminal contra si.

Ainda, é imperioso o registro de que tais elementos – feitos criminais em


curso ou condenações ainda pendentes de definitividade – podem, a meu ver,
afastar o redutor não por ausência de preenchimento dos dois primeiros
requisitos elencados pelo legislador – quais sejam, a primariedade e a
existência de bons antecedentes, elementos que exigem o trânsito em julgado
da condenação para o seu reconhecimento –, mas pelo descumprimento do
terceiro e/ou do quarto requisito exigido pela lei, que é a ausência de
dedicação do acusado a atividades delituosas e a sua não integração em
organização criminosa.

Por fim, entendo que exigir a existência de trânsito em julgado da


condenação anterior para fins de justificar o afastamento do redutor em questão
acaba, em última análise, esvaziando o próprio conceito de dedicação a atividades
criminosas. Isso porque, se houver trânsito em julgado, então essa condenação
anterior já se enquadra ou no conceito de maus antecedentes ou no conceito de
reincidência. Assim, considerando que não há palavras inúteis na lei, por certo que
o legislador quis abarcar situação diversa ao prever a impossibilidade de concessão
do benefício àqueles indivíduos que se dedicam a atividades delituosas.

a) Observância aos precedentes

Não obstante todas essas considerações, e embora a matéria trazida a


debate esteja pacificada no âmbito desta Corte Superior de Justiça, não há como

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perder de vista que a questão tem encontrado solução distinta no Supremo
Tribunal Federal.

Com efeito, entende a Corte Suprema que inquéritos policiais e/ou ações
penais em curso não constituem fundamento idôneo a justificar o afastamento do
redutor em questão, em observância ao princípio constitucional da presunção de
não culpabilidade.

Da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, menciono, por


todos, o HC n. 173.806/MG, de relatoria do Ministro Marco Aurélio (DJe
9/3/2020), cujo acórdão ficou assim ementado:

PENA – FIXAÇÃO – ANTECEDENTES – INQUÉRITOS E


PROCESSOS EM CURSO – DESINFLUÊNCIA.
O Pleno do Supremo, no julgamento do recurso extraordinário nº
591.054, de minha relatoria, assentou a neutralidade, na definição
dos antecedentes, de inquéritos ou processos em tramitação,
considerado o princípio constitucional da não culpabilidade.

PENA – CAUSA DE DIMINUIÇÃO – ARTIGO 33, § 4º, DA


LEI Nº 11.343/2006 – ATIVIDADES CRIMINOSAS –
DEDICAÇÃO – PROCESSOS EM CURSO.
Revela-se inviável concluir pela dedicação do acusado a
atividades criminosas, afastando-se a incidência da causa de
diminuição prevista no artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006,
considerado processo-crime em tramitação.

A Segunda Turma também possui idêntica compreensão acerca da


matéria, senão vejamos:

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. FIXAÇÃO


DA PENA. TRÁFICO DE DROGAS. CAUSA DE
DIMINUIÇÃO DE PENA DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N.
11.343/2006. INQUÉRITOS E PROCESSOS EM CURSO:
FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA PARA AFASTAR A
INCIDÊNCIA DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO.
PRECEDENTES. ORDEM CONCEDIDA. AGRAVO
REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(AgRg no HC n. 170.392/SP, Rel. Ministra Cármen Lúcia, DJe
15/6/2020).

1. Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. 2.


Direito Constitucional, Penal e Processual Penal. 3. Tráfico de
entorpecentes. Condenação. 4. Causa de diminuição de pena do §
4º do artigo 33 da Lei 11.343/2006. 5. Não aplicação da minorante

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em razão de sentença sem trânsito em julgado. 6. Ré primária. 7.
Ausência de provas de que integra organização criminosa ou se
dedique à prática de crimes. 8. Decisão contrária à jurisprudência
desta Corte. Constrangimento ilegal configurado. 8.1. O Pleno do
STF, ao julgar o RE 591.054/SC, com repercussão geral, de
relatoria do Ministro Marco Aurélio (DJe 26.2.2015), firmou
orientação no sentido de que a existência de inquéritos policiais ou
de ações penais sem trânsito em julgado não pode ser considerada
como maus antecedentes para fins de dosimetria da pena. 8.2. Para
efeito de aumento da pena, somente podem ser valoradas como
maus antecedentes decisões condenatórias irrecorríveis, sendo
impossível considerar para tanto investigações preliminares ou
processos criminais em andamento, mesmo que estejam em fase
recursal, sob pena de violação ao artigo 5º, inciso LIV (presunção
de não culpabilidade), do texto constitucional. 9. Precedentes. 10.
Agravo regimental não provido.
(AgRg no ARE n. 1.231.853/SE, Rel. Ministro Gilmar Mendes,
DJe 18/3/2020).

Com a mesma compreensão, cito, ainda, os seguintes julgados proferidos


em casos análogos: AgRg no HC n. 177.629 (DJe 9/12/2019), Rel. Ministro
Ricardo Lewandowski; HC n. 177.670/MG (DJe 26/11/2019), Rel. Ministro
Edson Fachin (monocrática).

Diante de tais considerações, firme na importância de se observarem os


precedentes e de se adotar interpretação uniforme das leis – até para garantir uma
ordem jurídica mais coerente, mais estável e com maior previsibilidade quanto à
interpretação adotada pelo Poder Judiciário –, curvo-me ao posicionamento
firmado pelo Supremo Tribunal Federal, para reconhecer a inidoneidade do
fundamento apontado no caso para justificar a impossibilidade de incidência do
redutor previsto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 em favor do paciente, qual
seja, a existência de processos em andamento e de condenação ainda não transitada
em julgado.

Além disso, não desconheço o entendimento segundo o qual a natureza


das drogas apreendidas, a depender das peculiaridades do caso concreto, é hábil a
denotar a dedicação do acusado a atividades criminosas e, consequentemente, a
impedir a aplicação da causa especial de diminuição de pena, prevista no § 4º do
art. 33 da Lei n. 11.343/2006, porque indica maior envolvimento do agente com o
mundo das drogas. Exemplificativamente: STJ, AgRg no AREsp n. 359.220/MG,

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Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª T., DJe 17/9/2013; STF, HC n.
111.666/MG, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 23/5/2012.

Contudo, ao contrário do que afirmaram as instâncias ordinárias


considero que a quantidade de drogas apreendidas em poder do paciente – 9,9 g de
crack e 4,1 g de cocaína –, mesmo considerada sua natureza deletéria, não se
mostra excessivamente elevada a ponto de, por si só, levar à conclusão de que ele
se dedica a atividades criminosas, notadamente quando verificado que, ao tempo
do delito, era tecnicamente primário e possuidor de bons antecedentes e que, no
contexto da prisão em flagrante, não foram apreendidos outros apetrechos
destinados à traficância.

Faço lembrar que, segundo entendimento consolidado no Supremo


Tribunal Federal, "A dosimetria da pena é matéria sujeita a certa discricionariedade
judicial. O Código Penal não estabelece rígidos esquemas matemáticos ou regras
absolutamente objetivas para a fixação da pena. Cabe às instâncias ordinárias, mais
próximas dos fatos e das provas, fixar as penas e às Cortes Superiores, em grau
recursal, o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios
empregados, bem como a correção de eventuais discrepâncias, se gritantes ou
arbitrárias" (HC n. 122.184/PE, Rel. Ministra Rosa Weber, 1ª T., DJe 5/3/2015),
situação que entendo devidamente caracterizada nos autos.

Portanto, à ausência de fundamento suficiente o bastante para justificar o


afastamento da causa especial de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei de
Drogas, deve a ordem ser concedida nesse ponto, a fim de aplicar, em favor do
acusado, o referido benefício.

Assim, deve ser concedido o habeas corpus nesse ponto, a fim de aplicar
a causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da Lei de Drogas
no patamar máximo de 2/3. Apenas ressalto que estou fixando a maior redução
prevista em lei, porque a quantidade de drogas apreendidas não foi tão expressiva e
porque não constam dos autos elementos que evidenciem não ser o paciente
traficante eventual.

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Por fim, apenas ad cautelam, ressalto que, especificamente no caso dos
autos, a conclusão pela possibilidade de aplicação do referido redutor não demanda
o revolvimento de matéria fático-probatória, procedimento, de fato, vedado na via
estreita do habeas corpus. O caso em análise, diversamente, demanda apenas a
revaloração de fatos incontroversos que já estão delineados nos autos e das provas
que já foram devidamente colhidas ao longo de toda a instrução probatória, bem
como a discussão, meramente jurídica, acerca da interpretação a ser dada acerca
dos fundamentos apontados pelas instâncias ordinárias para negar ao paciente a
incidência da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º do art. 33 da
Lei n. 11.343/2006.

III. Nova dosimetria

Procedendo-se, pois, à nova dosimetria da pena, verifico que a


reprimenda-base ficou estabelecida no mínimo legal, ou seja, em 5 anos de
reclusão e pagamento de 500 dias-multa. Na segunda fase, ausentes agravantes e
atenuantes. Na terceira etapa, ausentes causas de aumento, reduzo a reprimenda em
2/3, em decorrência da causa especial de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da
Lei de Drogas, tornando a pena do acusado definitivamente estabelecida em 1 ano
e 8 meses de reclusão e pagamento de 183 dias-multa.

IV. Consectários – regime e substituição

Como consectário da redução efetivada na pena do paciente, deve ser


procedido ao ajuste no regime inicial do seu cumprimento. Uma vez que ele foi
condenado a reprimenda inferior a 4 anos de reclusão, era tecnicamente primário
ao tempo do delito, foi beneficiado com a minorante prevista no § 4º do art. 33 da
Lei n. 11.343/2006 e foi apreendido com quantidade de drogas não elevada, deve
ser fixado o regime inicial aberto.

Da mesma forma, entendo que a favorabilidade das


circunstâncias mencionadas evidencia que a substituição da pena se mostra
medida socialmente recomendável, nos termos do art. 44, III, do Código Penal,
de maneira que deve ser concedido o habeas corpus também para determinar

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a substituição da reprimenda privativa de liberdade por duas restritivas de direitos,
as quais deverão ser estabelecidas pelo Juízo das Execuções Criminais, à luz das
peculiaridades do caso concreto.

V. Dispositivo

À vista do exposto, com fundamento no art. 34, XX, do RISTJ,


concedo a ordem, a fim de reduzir a pena-base ao mínimo legal, aplicar em 2/3 a
causa especial de diminuição prevista no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 e,
por conseguinte, reduzir a reprimenda do paciente para 1 ano e 8 meses de
reclusão e pagamento de 183 dias-multa, fixar o regime aberto de cumprimento
de pena e determinar a substituição da reprimenda por duas restritivas de direitos,
a serem escolhidas pelo Juízo das Execuções Criminais.

Comunique-se, com urgência.

Publique-se e intimem-se.

Brasília (DF), 27 de maio de 2021.

Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ


Relator

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