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HABEAS CORPUS Nº 764375 - MG (2022/0256265-2)

RELATOR : MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO


IMPETRANTE : INGRYD SILVERIO DOS SANTOS E OUTRO
ADVOGADOS : NUGRI BERNARDO DE CAMPOS - SP343409
INGRYD SILVÉRIO DOS SANTOS - SP434703
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS
PACIENTE : MARIA EDUARDA DIAS TEODORO
INTERES. : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS

DECISÃO

Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado em benefício de


MARIA EDUARDA DIAS TEODORO apontando como autoridade coatora o Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais (Revisão Criminal n. 1.0000.21.226076-4/000).

Colhe-se dos autos que a paciente foi condenada, como incursa nas
sanções do art. 33, caput, da Lei n. 11.343/2006, à pena de 7 anos, 9 meses e 10 dias
de reclusão, em regime fechado, mais 777 dias-multa (e-STJ fls. 72/86).

Segundo consta, a paciente foi apreendida em posse de 710g (setecentos e


dez gramas) de cocaína (e-STJ fl. 72).

Posteriormente, a defesa ajuizou revisão criminal, pugnando pelo


reconhecimento de nulidade do processo, tendo em vista a ilicitude de prova
decorrente da realização de busca e apreensão em endereço divergente do contido no
mandado judicial e onde foram localizadas drogas, as quais não pertenceriam à ora
paciente.

O pedido, no entanto, foi julgado improcedente pelo Tribunal de origem em


acórdão assim ementado (e-STJ fl. 91):

REVISÃO CRIMINAL – TRÁFICO DE DROGAS – NULIDADE –


FLAGRANTE – PROVA – ARGUMENTOS VALORADOS EM SEDE DE
APELAÇÃO CRIMINAL – REEXAME DA ARGUMENTAÇÃO E DO
ARCABOUÇO PROBATÓRIO – AUSÊNCIA DE DADOS INÉDITOS A
CONTRARIAR A CONDENAÇÃO – REDISCUSSÃO DA MATÉRIA.- A
revisão criminal não se presta ao reexame de provas ou teses já apreciadas,
mas sim como meio processual hábil a sanar erro técnico ou injustiça na

Edição nº 0 - Brasília, Publicação: sexta-feira, 16 de dezembro de 2022


Documento eletrônico VDA34895170 assinado eletronicamente nos termos do Art.1º §2º inciso III da Lei 11.419/2006
Signatário(a): ANTONIO SALDANHA PALHEIRO Assinado em: 14/12/2022 19:11:39
Publicação no DJe/STJ nº 3537 de 16/12/2022. Código de Controle do Documento: 9148d126-a06c-437c-8314-d84df2ce99d2
condenação. - A reapreciação das provas, já analisadas, tanto na primeira
como na segunda instância, ausentes elementos inovadores ou dados
inéditos, não constitui componente apto da ação de revisão criminal.

Neste writ, os impetrantes reiteram a existência de nulidade por ilicitude de


prova, argumentando que, no caso, os policiais realizaram verdadeiro fishing expedition
, adentrando a casa da avó da paciente, local onde foram encontrados os
entorpecentes.

Requerem, dessa forma, a suspensão da execução da paciente. No mérito,


requerem "o reconhecimento da ILICITUDE DAS PROVAS obtidas através da
apreensão de drogas em desconformidade ao texto legal e entendimentos
jurisprudenciais" (e-STJ fl. 14).

Liminar indeferida (e-STJ fls. 109/111).

Informações prestadas.

O Ministério Público Federal manifestou-se pela denegação da ordem (e-STJ


fls. 310/313).

É o relatório.
Decido.
Cumpre asseverar que o art. 33 da Lei n. 11.343/2006 consubstancia tipo
penal de ação múltipla. O dispositivo desse artigo traz em seu bojo dezoito
modalidades de ações que se subsomem à incidência do referido tipo, entre as quais
estão inseridos "ter em depósito" ou "guardar" drogas sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Essas duas modalidades, consoante a jurisprudência dos tribunais


superiores, traduzem hipóteses de crime permanente, significando que o momento de
consumação do crime de tráfico de entorpecentes se prolonga no tempo, permitindo a
conclusão de que o agente estará em flagrante delito até a cessação da permanência.

Aliás, essa é a inteligência do art. 303 do Código de Processo Penal,


segundo o qual, "nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito
enquanto não cessar a permanência".

Apreciando o tema, tanto o Superior Tribunal de Justiça como o Supremo


Tribunal Federal pacificaram a orientação de que, tratando-se o delito de tráfico de
entorpecentes nas modalidades "guardar" ou "ter em depósito" de crime permanente,
mostra-se prescindível o mandado de busca e apreensão em caso de flagrante delito.

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Nesse sentido:
RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ART. 312 DO
CPP. PERICULUM LIBERTATIS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE.
RECURSO NÃO PROVIDO.
[...]
2. O delito de tráfico de drogas é crime de natureza permanente, de forma
que é despiciendo o mandado de busca e apreensão para que a autoridade
policial adentre o domicílio do acusado, porquanto configurada a situação de
flagrância, exceção contemplada pelo art. 5º, XI, da Constituição da
República de 1988.
[...]
5. Recurso não provido. (RHC n. 75.397/MG, relator Ministro ROGERIO
SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 11/10/2016, DJe 27/10/2016.)

PENAL E PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 33, CAPUT, DA


LEI Nº 11.343/2006. ART. 12 DA LEI N.º 10.826/03. ALEGAÇÃO DE
AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO DE FLAGRÂNCIA. CRIMES PERMANENTES.
REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO.
PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ. COLHEITA DA PROVA
PELA MAGISTRADA TITULAR, À ÉPOCA. SENTENÇA PROLATADA, EM
RAZÃO DE AFASTAMENTO MOTIVADO POR DESIGNAÇÃO PARA
OUTRO JUÍZO, PELO SUCESSOR. APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ARTIGO
132 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. ILEGALIDADE. AUSÊNCIA.
CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA. NÃO INCIDÊNCIA.
CONCLUSÃO DE QUE O PACIENTE DEDICAVA-SE AO TRÁFICO DE
DROGAS. AFERIÇÃO. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO.
INVIABILIDADE. NÃO CONHECIMENTO.
1. "Tratando-se de crimes de natureza permanente, como é o caso do tráfico
ilícito de entorpecentes, mostra-se prescindível o mandado de busca e
apreensão para que os policiais adentrem o domicílio do acusado, não
havendo se falar em eventuais ilegalidades relativas ao cumprimento da
medida (precedentes)" (HC 306.560/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER,
QUINTA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 01/09/2015).
2. Para se concluir que não havia situação de flagrância, seria necessário
reexaminar o contexto fático-probatório dos autos, o que se afigura inviável
na estreita via eleita.
[...]
5. Habeas corpus não conhecido. (HC n. 359.420/SP, relatora Ministra
MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em
16/8/2016, DJe 26/8/2016.)

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO


ORDINÁRIO. NÃO CABIMENTO. NOVA ORIENTAÇÃO
JURISPRUDENCIAL. ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/2006 E ART. 12,
CAPUT, DA LEI 10.826/2003. BUSCA DOMICILIAR E PESSOAL.
ALEGAÇÃO DE ILICITUDE NA EFETIVAÇÃO DA PRISÃO.
INOCORRÊNCIA. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. DELITO
PERMANENTE. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE
FUNDAMENTADA NA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. DIVERSIDADE E
QUANTIDADE DE DROGAS. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.
[...]

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IV - Tratando-se de tráfico ilícito de substância entorpecente, crime de
natureza permanente, cuja consumação se prolonga no tempo, a busca
domiciliar e pessoal que culminou com prisão da paciente, mantendo em
depósito drogas e na posse de arma de fogo, não constitui prova ilícita, pois
ficou evidenciada a figura do flagrante delito, o que, a teor do disposto no art.
5º, inciso XI, da Constituição Federal, autoriza o ingresso, ainda que sem
mandado judicial, no domicílio alheio (Precedentes).
[...]
Habeas corpus não conhecido. (HC n. 290.619/SP, relator Ministro FELIX
FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 25/11/2014, DJe 12/12/2014.)

Sobre o tema, ainda, cumpre frisar que o Supremo Tribunal Federal, por
ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão
geral, firmou o entendimento segundo o qual a "entrada forçada em domicílio sem
mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em
fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da
casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil
e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados". Confira-se,
oportunamente, a ementa do acórdão proferido no referido processo:
Recurso extraordinário representativo da controvérsia. Repercussão geral. 2.
Inviolabilidade de domicílio – art. 5º, XI, da CF. Busca e apreensão domiciliar
sem mandado judicial em caso de crime permanente. Possibilidade. A
Constituição dispensa o mandado judicial para ingresso forçado em
residência em caso de flagrante delito. No crime permanente, a situação de
flagrância se protrai no tempo. 3. Período noturno. A cláusula que limita o
ingresso ao período do dia é aplicável apenas aos casos em que a busca é
determinada por ordem judicial. Nos demais casos – flagrante delito,
desastre ou para prestar socorro – a Constituição não faz exigência quanto
ao período do dia. 4. Controle judicial a posteriori. Necessidade de
preservação da inviolabilidade domiciliar. Interpretação da
Constituição. Proteção contra ingerências arbitrárias no domicílio.
Muito embora o flagrante delito legitime o ingresso forçado em casa
sem determinação judicial, a medida deve ser controlada judicialmente.
A inexistência de controle judicial, ainda que posterior à execução da
medida, esvaziaria o núcleo fundamental da garantia contra a
inviolabilidade da casa (art. 5, XI, da CF) e deixaria de proteger contra
ingerências arbitrárias no domicílio (Pacto de São José da Costa Rica,
artigo 11, 2, e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, artigo
17, 1). O controle judicial a posteriori decorre tanto da interpretação da
Constituição, quanto da aplicação da proteção consagrada em tratados
internacionais sobre direitos humanos incorporados ao ordenamento
jurídico. Normas internacionais de caráter judicial que se incorporam à
cláusula do devido processo legal. 5. Justa causa. A entrada forçada
em domicílio, sem uma justificativa prévia conforme o direito, é
arbitrária. Não será a constatação de situação de flagrância, posterior
ao ingresso, que justificará a medida. Os agentes estatais devem
demonstrar que havia elementos mínimos a caracterizar fundadas
razões (justa causa) para a medida. 6. Fixada a interpretação de que a
entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em
período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente
justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de

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flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do
agente ou da autoridade e de nulidade dos atos praticados. 7. Caso
concreto. Existência de fundadas razões para suspeitar de flagrante de
tráfico de drogas. Negativa de provimento ao recurso. (RE n. 603.616/RO,
relator Ministro GILMAR MENDES, TRIBUNAL PLENO, julgado em
5/11/2015, DJe 10/5/2016.)

O Ministro Rogerio Schietti Cruz, ao discorrer acerca da controvérsia objeto


desta irresignação no REsp n. 1.574.681/RS, bem destacou que "a ausência de
justificativas e de elementos seguros a legitimar a ação dos agentes públicos, diante da
discricionariedade policial na identificação de situações suspeitas relativas à ocorrência
de tráfico de drogas, pode fragilizar e tornar írrito o direito à intimidade e à
inviolabilidade domiciliar" (SEXTA TURMA, julgado em 20/4/2017, DJe 30/5/2017).

Pontuou o ministro que "tal compreensão não se traduz, obviamente, em


transformar o domicílio em salvaguarda de criminosos, tampouco um espaço de
criminalidade", mas que "há de se convir, no entanto, que só justifica o ingresso no
domicílio alheio a situação fática emergencial consubstanciadora de flagrante delito,
incompatível com o aguardo do momento adequado para, mediante mandado judicial,
legitimar a entrada na residência ou local de abrigo".

Cinge-se a controvérsia, portanto, a verificar a existência de "fundadas


razões" que, consoante o entendimento da Suprema Corte, autorizem a entrada
forçada em domicílio, prescindindo-se de mandado de busca e apreensão.

Colaciono, oportunamente, este trecho da sentença condenatória (e-STJ


fls. 75/79):
A preliminar merece ser refutada.
Em que pese a droga ser apreendida em residência diversa ao cumprimento
do mandado de busca e apreensão, não merece guarida a alegação da
defesa, vez que a residência onde localizada a droga, localizava -se no
mesmo terreno da residência apontada como alvo, cuida-se de casa vizinha,
pertencente a avó da acusada, em um à distância de cerca de três metros,
conforme bem narrou a testemunha Maria do Carmo Dias Teodoro (mãe da
acusada).

Ademais, a entrada dos policiais na residência da avó da acusada foi


devidamente permitida pela própria proprietária.

[...]
A despeito da denunciada Maria Eduarda negar os fatos, sua condenação
para o crime de tráfico de entorpecentes é medida a se imperar.
Com a devida vênia, a versão trazida em juízo mostra-se inverossímil,
parecendo, in casu, mais uma tentativa inócua em desconstituir a robusta
imputação de traficância.
Consigne-se que Maria Eduarda é conhecida pela prática de crime de tráfico
nesta Comarca, consoante demonstra suas certidões de antecedentes, na

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época dos fatos estava em execução de pena pela traficância.
Conforme os depoimentos policiais, Maria Eduarda é amásia de Minaldo;
atualmente foragido e preso no Estado de São Paulo por outros crimes.
A testemunha Marcelo Divino Silva Fagundes afirma que a casa pertencente
a acusada Maria Eduarda, local do cumprimento do mandado de busca e
apreensão, estava vazia, porém com indícios de que Maria Eduarda tinha
acabado de sair da casa, com possível pré conhecimento do cumprimento do
mandado de busca e apreensão, especialmente porque ao adentrarem na
casa, a acusada sequer teve tempo de desligar sua televisão.
A acusada e sua mãe (Maria do Carmo), ouvida como informante,
afirmam que Maria Eduarda não se encontrava na sua residência,
porque estava se deslocando ao hospital.
Ocorre que a acusada e sua defesa não comprovam nos autos qualquer
atendimento médico submetido, o que corrobora sua fuga no momento
do cumprimento do mandado de busca e apreensão.
As drogas foram arrecadadas na casa de Eliza Luiza da Silva, avó da
acusada
A defesa alega que a casa da senhora Eliza é de fácil acesso, e sugere que
a droga poderia ter sido acondicionada no local por qualquer pessoa para
incriminá-la. Ainda em seu interrogatório, Maria Eduarda diz que possui
inimizade com sua avó, motivo pelo qual não poderia ter ocultado ; droga no
local.
Alegações essas inverídicas
Inicialmente, uma simples indagação rechaça eventual «plantio" de drogas,
vez que quisesse alguém incriminar Maria Eduarda. teria armazenado as
drogas em sua residência, pois como se sabe Maria Eduarda tinha que se
recolher no presidio local durante o período noturno, onde estava em
cumprimento de pena.
Certo que impossível a senhora Eliza Luíza da Silva ser a proprietária
da droga, pois, já conta com 98 anos e, consoante sua filha e
testemunha Maria do Carmo, já não possui boas condições mentais,
inclusive a propria acusada afirma que durante o período noturno seus
familiares se revezam para cuidar da senhora Eliza.
O fato é que Maria Eduarda utilizou da casa de sua avó para ocultar as
drogas, pois, trata-se de melhor local, bem como não despertaria qualquer
suspeita.
Ora, ao mesmo tempo que a acusada afirma que sua avó possui inimizade
consigo, também corrobora que a casa de sua avó é de fácil acesso- daí ser
o melhor local para a denunciada se excusar da traficância.
Note-se ainda que a própria acusada informa que sua avó Eliza não possui
afeto por ela, pois nunca concordou com o seu relacionamento com a
pessoa de Minaldo, por este estar envolvido na prática de crimes.
Ademais, a defesa não justificou os balões, os mesmos utilizados na
embalagem das drogas, também encontrados na residência de Maria
Eduarda. Note-se que foram encontrados, além de 698g de pasta de
"Cocaína", 12 pedras de "Crack", envolvidos em plásticos de balões na cor
vermelha, sendo que na residência da denunciada foram .encontrados 38
balões, também de cor vermelha. (Grifei).

Eis o excerto pertinente do acórdão hostilizado (e-STJ fl. 95):


Propositado ressaltar: ainda que não houvesse autorização ou mandado de
busca e apreensão para a entrada nos aludidos imóveis, sabe-se que, de

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acordo com o disposto no artigo 5º, inciso XI, da Constituição da República,
ocorrendo situação flagrante, a atuação policial independe de autorização
judicial. Mas na hipótese, mesmo que versando de tráfico de drogas –crime
de natureza permanente –a entrada dos policiais na residência da avó da
peticionária foi autorizada, o que supera a tese de nulidade do ato, “data
vênia”.

No caso em exame, verifica-se violação do art. 157 do Código de Processo


Penal, observado que o ingresso forçado na casa onde foram apreendidas as drogas
não se sustenta em fundadas razões extraídas da leitura dos documentos dos autos.
Isso, porque o mandado de busca e apreensão é para outra residência, e a acusação
alega que a avó da acusada teria autorizado a entrada.

Ora, coincidentemente, no mesmo provimento judicial o Magistrado afirma,


categoricamente, que "impossível a senhora Eliza Luíza da Silva ser a proprietária da
droga, pois, já conta com 98 anos e, consoante sua filha e testemunha Maria do
Carmo, já não possui boas condições mentais" (e-STJ fl. 77).

Portanto, o Magistrado concluiu que a proprietária do imóvel era


absolutamente capaz de autorizar, voluntarius, a entrada dos policiais, mas seria
incapaz mentalmente de se adequar à ação que lhe fora imputada pela defesa.

Como consabido, a voluntariedade da autorização é requisito indispensável,


tanto que exigida lavratura de auto circunstanciado por 2 testemunha presenciais,
somadas aos vizinhos da residência, conforme dispõe o art. 244, §§ 4º e 7º do CPP.

E, como consabido, esta Corte tem reiteradamente decidido que compete ao


Estado a comprovação da voluntariedade do residente em autorizar a entrada dos
policiais, o que não ocorreu no caso em tela como já exposto.

Nesse sentido:
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. SENTENÇA. NULIDADE.
INGRESSO DE POLICIAIS NO DOMICÍLIO DO ACUSADO. AUSÊNCIA DE
JUSTA CAUSA OU DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. COMPROMETIMENTO
DA MATERIALIDADE DELITIVA. APREENSÃO DE GRANDE QUANTIDADE
DE DROGA (21 KG DE MACONHA). ÔNUS DA PROVA. ESTADO
ACUSADOR. PROVAS OBTIDAS EIVADAS DE VÍCIO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL MANIFESTO.
1. Esta Corte Superior tem entendido, quanto ao ingresso forçado em
domicílio, que não é suficiente apenas a ocorrência de crime permanente,
sendo necessárias fundadas razões de que um delito está sendo cometido,
para assim justificar a entrada na residência do agente, ou, ainda,
autorização para que os policiais entrem no domicílio.
2. Segundo a nova orientação jurisprudencial, o ônus de comprovar a
higidez dessa autorização, com prova da voluntariedade do
consentimento, recai sobre o estado acusador.
3. Ordem concedida para reconhecer a nulidade do flagrante em razão da

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invasão de domicílio e, por conseguinte, das provas obtidas em decorrência
do ato e absolver o paciente da imputação delituosa (art. 386, II, do CPP)
referente à Ação Penal n. 1500041-98.2020.8.26.0580, da 1ª Vara Criminal
da comarca de Assis/SP. Os efeitos desta decisão deverão ser estendidos à
corré. (HC n. 685.593/SP, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta
Turma, DJe de 19/10/2021, grifei.)

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS.


APREENSÃO DE 110G (CENTO E DEZ GRAMAS) DE COCAÍNA.
VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO. INGRESSO POLICIAL APOIADO EM
DENÚNCIA ANÔNIMA AUTORIZAÇÃO DE ENTRADA NÃO COMPROVADA
PELO ESTADO. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. APLICAÇÃO DO
ENTENDIMENTO FIRMADO NO HC N. 598.051/SP. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO.
1. Tendo como referência o recente entendimento firmado por esta Corte,
nos autos do HC n. 598.051/SP, o ingresso policial forçado em domicílio,
resultando na apreensão de material apto a configurar o crime de tráfico de
drogas - 110g (cento e dez gramas) de cocaína -, quando apoiado em mera
denúncia anônima, não traz contexto fático que justifica a dispensa de
investigações prévias ou do mandado judicial para a entrada dos agentes
públicos na residência, acarretando a nulidade da diligência policial, como no
caso dos autos.
2. Na hipótese em exame, do contexto fático delineado pelas instâncias
ordinárias, infere-se que não houve nenhuma espontaneidade no dito
consentimento do acusado para que os policiais ingressassem na
residência, pois não foi comprovada a voluntariedade, tal como narrada
na sentença condenatória, ônus probatório esse de incumbência do
Estado.
3. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC n. 692.882/RJ, de minha
relatoria, Sexta Turma, DJe de 13/12/2021, grifei.)

Ante o exposto, concedo a ordem para anular as provas colhidas mediante


ingresso desautorizado no domicílio e as delas derivadas.

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 14 de dezembro de 2022.

Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO


Relator

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