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PSICOLOGIA

DA EDUCAÇÃO

Daiane Duarte Lopes


Relação entre a
aprendizagem e o
desenvolvimento
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Examinar o processo de desenvolvimento humano.


„„ Analisar o processo de aprendizagem.
„„ Explorar a relação entre a aprendizagem e o desenvolvimento.

Introdução
O desenvolvimento humano se relaciona com a aprendizagem de ma-
neira a promover um indicativo sobre as transformações sociais, dispo-
nibilizando-se representativamente sob as estruturas da sociedade, ao
mesmo tempo que integrando as características cognitivas, afetivas e
comportamentais dos sujeitos.
Neste capítulo, estudaremos sobre os processos do desenvolvimento
humano e analisaremos o processo de aprendizagem, explorando as
relações existentes entre ambos.

O processo de desenvolvimento humano


O desenvolvimento humano é conceituado com base na possibilidade de
evolução na formação do sujeito, objetivando a construção de sua identidade
de acordo com a integralidade de seu modo de ser, agir, pensar, sentir, entre
outros aspectos particulares. Para a plenitude do desenvolvimento humano é
necessário considerar o perfil genético e o contexto social.
O desenvolvimento humano é monitorado pela organização dos sistemas
da sociedade em todos os países do mundo, buscando observar seu processo
enquanto constituinte do contexto social. A Organização das Nações Unidas
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(ONU) elaborou uma ferramenta métrica para identificar e avaliar os níveis


de qualidade de vida das pessoas, o Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH), que tem como objetivo analisar três fatores considerados básicos para
um desenvolvimento humano pleno: a renda, a educação e a saúde. A saúde é
analisada desde a concepção buscando projetar uma potencial expectativa de
vida. A educação é monitorada de maneira a acompanhar o acesso ao conhe-
cimento desde a infância e durante toda a trajetória de vida, sendo considerada
elemento essencial para o desenvolvimento pleno. E a renda é entendida como
um analisador para a manutenção de um padrão de vida saudável.
Dessa maneira, podemos visualizar o desenvolvimento humano como um
indicativo das transformações sociais, reflexivo da organização das estruturas
da sociedade, ao mesmo tempo em que integrador das características cognitivas,
afetivas e comportamentais dos sujeitos em processos mutuamente constituídos.
Muito além da sua composição orgânica por meio da maturação do corpo, o
desenvolvimento humano atravessa a evolução relacional dos sujeitos. Portanto,
é um processo que cruza as etapas maturacionais na aquisição de conheci-
mentos. Pelo desenvolvimento físico, pode ser alcançado o desenvolvimento
da linguagem, com aquisição da fala e da comunicação; o desenvolvimento
cognitivo vem por meio da elaboração das percepções sobre o funcionamento
do seu corpo e sobre sua atuação do contexto; já o desenvolvimento afetivo
ocorre com a concepção sobre suas emoções em meio às relações, sendo in-
fluenciador do desenvolvimento social, no qual o sujeito percebe sua relação
com o contexto social.
A partir disso, o desenvolvimento humano é o principal assunto de interesse
de diversas concepções teóricas da ciência psicológica, sendo tema de pesquisa
de teorias psicanalíticas, cognitivistas, comportamentalistas, humanistas, entre
outras (BEE, 1997). Cada linha teórica aborda o desenvolvimento humano a
partir de seu foco de estudo.
As teorias psicanalíticas, desenvolvidas pelo fisiologista Sigmund Freud,
buscam compreender o desenvolvimento de acordo com um panorama de
expressões inconscientes na construção de uma personalidade. Dessa maneira,
o desenvolvimento decorre de elaborações de processos que vão se consti-
tuindo durante toda a trajetória de vida do ser, mas com base mais profunda
na primeira etapa da vida humana, a infância.
As teorias cognitivistas, desenvolvidas pelo teórico suíço Jean Piaget,
entendem o desenvolvimento como um compositor da construção do ser ao
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longo de toda a vida. Assim, seus modos de pensar, agir e se relacionar in-
fluenciam seu desenvolvimento ao mesmo tempo em que seu desenvolvimento
promove modos de pensar, agir e se relacionar. Além disso, existem marcos
como a linguagem, as aptidões motoras e as percepções sensoriais que se
relacionam diretamente com a fluência do desenvolvimento.
As teorias comportamentalistas ou behavioristas foram desenvolvidas
inicialmente por pesquisas de Watson, Skinner e Pavlov, cada um com suas
técnicas. Visam o comportamento humano como influenciador do desenvol-
vimento, sendo que o desenvolvimento é determinado pelo comportamento
gerado por um estímulo do meio.
As teorias humanistas foram inicialmente desenvolvidas por Abraham
Maslow e, em seguida, por Carl Rogers. Consideravam a pessoa como base
para o entendimento do seu próprio desenvolvimento, entendendo que cada ser
contém em si uma força capaz de impulsionar ou bloquear o seu desenvolver,
processo este que na visão humanista ocorria ao longo de todo o percurso de vida.

As teorias humanistas influenciaram especialmente a psicologia da educação, por


visualizar o sujeito como um ser com uma natureza individual, única e inigualável. Cada
ser é entendido conforme suas subjetividades e necessita ser tratado sem parâmetros
pré-estabelecidos, possuindo como único conceito de comparação o seu próprio
desenvolvimento prévio. Assim o ser é visto e reconhecido como um todo e não
somente sob um olhar restrito ao seu intelecto.

O processo de aprendizagem
A aprendizagem é um processo decorrente do desenvolvimento humano,
intrinsecamente subjetivo, que acompanha o sujeito ao longo de toda a vida
e que ocorre conforme a assimilação de determinados saberes e modelos
comportamentais. Assim, por aprendizagem podemos entender a aquisição
de todo e qualquer conhecimento, das mais variadas ordens: atitudinais,
contextuais, teóricas, afetivas, entre outras.
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Já nas etapas iniciais do desenvolvimento humano, os sujeitos adquirem


aprendizagens protetivas para a manutenção da vida e aprendizagens que os
inserem na participação da vida em sociedade, sendo que estas últimas serão
aprofundadas e mais bem contextualizadas conforme o seu desenvolvimento.
A aprendizagem se relaciona de maneira direta com o processo de de-
senvolvimento cognitivo, que possibilita sua expansão conforme a trajetória
relacional entre os sujeitos – consigo mesmos, com os demais sujeitos e com
o ambiente –, instrumentalizando-os para o viver. Todos os seres são apren-
dizes sem necessariamente se preocupar com os processos de aquisição de
conhecimento, no entanto, a aprendizagem é um processo que intervém nas
escolhas do sujeito que aprende.
As mesmas bases teóricas da ciência psicológica que se dispuseram a estudar
o desenvolvimento humano, estenderam seus paradigmas sobre a aprendiza-
gem. E cada uma a seu tempo, e conforme suas demandas, desenvolveu uma
diversidade em teorias da aprendizagem.
No contexto educacional, as teorias cognitivistas, comportamentalistas e
humanistas exerceram significativa influência, representando uma adaptação
às demandas do meio, e resultando em:

„„ Aprendizagem por observação, na qual, a partir de estímulos do


meio, o sujeito se conecta às situações visualizadas, apreendendo-as
sem necessariamente haver um envolvimento, como, por exemplo, em
uma situação em que o aluno escuta a explicação de conceito.
„„ Aprendizagem por imitação, na qual ocorre a reprodução de conceitos
e comportamentos, sem precisar de problematização ou de um enten-
dimento mais profundo e amplo do que está sendo imitado, como por
exemplo, na reprodução do cálculo de uma fórmula.
„„ Aprendizagem por modelagem, na qual o que está sendo exposto
é assimilado e apropriado para o sujeito com adaptações para suas
características individuais (BANDURA, 2008).

Existe ainda a aprendizagem por descoberta, também recorrente em am-


biente educacional. Esta consiste em priorizar a experimentação do ambiente,
com liberdade exploratória para que os sujeitos possam desenvolver suas próprias
compreensões (BRUNER, 1961). Dessa maneira, a ampliação da capacidade
exploratória torna-se mais significativa do que a memorização de conceitos
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estruturados previamente. À medida que experimenta e desenvolve novas apren-


dizagens, amplia-se no sujeito o desejo de buscar novas experiências, e assim,
sucessiva e ininterruptamente, o processo de aprendizagem vai se expandindo.
Ou seja, uma aprendizagem vai constituindo ponte para a próxima.
Desse modo, a aprendizagem possibilita captar os estímulos destacados
no meio, promovendo mudanças conceituais nesses estímulos, a partir da
elaboração das percepções. Isso implica uma interação direta do sujeito neste
processo, conforme seus recursos motivacionais.

No livro Teoria da Aprendizagem Social, de Alberto Bandura, de 1977, você pode conferir
teorias sobre a aprendizagem relacionadas a conceitos como vínculo, pertencimento
e afetividade.

Relação entre aprendizagem e desenvolvimento


A aprendizagem e o desenvolvimento humano expandem-se para além de
sequências organizacionais sobre o momento maturacional, físico, cognitivo
e emocional. São processos marcados por uma considerável complexidade
inerente a cada sujeito conforme sua singularidade.
A relação entre desenvolvimento e aprendizagem é fluídica, não meca-
nizada, categorizando uma relação recíproca, na qual, por intermédio de
estímulos impulsionados por transformações biológicas e cognitivas, os sujeitos
se conectam com o processo educacional.
A aprendizagem transcorre de acordo com a assimilação de processos do
desenvolvimento na aquisição de conhecimentos com intuito de compreendê-los
e aplicá-los de maneira consciente e autônoma. Assim sendo, a aprendizagem
tem uma conexão direta com as condições de vida do sujeito e também com
sua percepção e compreensão sobre sua trajetória de vida. Dessa forma, a
consolidação da aprendizagem é dependente dos significados que o sujeito
sustenta em relação à experiência social.
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Dentre os teóricos que correlacionaram em suas pesquisas a aprendizagem e o de-


senvolvimento humano, a partir de uma perspectiva centrada na construção do ser,
estão Vygotsky, Freire e Maturana.
„„ Vygotsky (1896-1934) desenvolveu uma teoria que propõe uma cisão, com reflexões
que observam somente aspectos orgânicos entre os processos de desenvolvimento
humano e aprendizagem. Estabeleceu como constituinte essencial do sujeito o
processo histórico-cultural que balizou seu desenvolvimento e, por consequência,
sua aprendizagem. Assim, é possível entender o desenvolvimento humano em sua
diversidade qualitativa, bem como a aprendizagem com suas desacomodações
pluralizadas em contrastes, rompimentos e acentuadas transformações.
„„ Paulo Freire (1921-1997) transcorreu sobre uma visão de mundo mais ampliada a
partir de uma associação entre o desenvolvimento e a aprendizagem nos sujeitos.
Seus escritos sobre pedagogia problematizadora e transformadora enfatizam
duas ideias centrais: o conceito de consciência influenciada por seus elementos
subjetivos e o conceito de que o modo de ser de cada sujeito, de como aprende
e se desenvolve é também influenciado pelo contexto social.
„„ Maturana (1928-) desenvolveu uma teoria sobre o que chama de “sistema auto-
poiético”, com a ideia de que a autopoiese é transformadora dos processos de
produção de componentes da aprendizagem que interagem e se desenvolvem
continuamente. A partir de sua transformação e interação com o meio, os estímulos
que desencadearam a produção da aprendizagem constituem o sistema enquanto
uma unidade concreta no espaço onde se encontra com o processo de desenvol-
vimento, existindo uma constante e contínua complementação e recriação entre
ambos, aprendizagem e desenvolvimento.

Sendo assim, na relação entre aprendizagem e desenvolvimento é possível


associar as influências dos processos internos sobre os externos e vice-versa,
o que acontece de maneira cíclica, em um constante processo de mudança
nas capacidades associativas e adaptativas dos sujeitos, potencializando a
plasticidade e a resiliência aos desafios do meio.

No artigo Abordagens pedagógicas e sua relação com as teorias de aprendizagem, você


encontra outros elementos que compõem a relação entre aprendizagem e desenvol-
vimento humano (PERES et al., 2014).
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Vamos imaginar que você sempre quis aprender a dançar, mas, por falta de oportu-
nidade ou por fatores diversos, nunca foi possível frequentar uma aula de dança. Mas
por ter guardado em si o desejo por desenvolver as técnicas de dança, buscou estar
atento quando surgiu a oportunidade de ver outros sujeitos dançarem e, por vezes,
exercitou sua memória para o armazenamento de alguns passos. Suponhamos que
se você iniciasse hoje a frequentar uma aula de dança, você conseguiria executar
estes passos memorizados previamente. Dessa maneira, podemos entender que a
aprendizagem e o processo de desenvolvimento estão intimamente envolvidos pela
conexão com o meio e com a capacidade adaptativa dos sujeitos.

BANDURA, A. A evolução da teoria social cognitiva. In: BANDURA, A.; AZZI, R. G.;
POLYDORO, S.A.J. (Org.). Teoria social cognitiva: conceitos básicos. Porto Alegre: Art-
med, 2008.
BANDURA, A. Social Learning Theory. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1977.
BEE, H. O ciclo vital. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997
BRUNER, J. S. The act of discovery. Harvard Educational Review, Harvard, 1961.
PERES, C. M. et al. Abordagens pedagógicas e sua realização com as teorias de aprendi-
zagem. Medicina, Ribeirão Preto, v. 47, n. 3, 2014. Disponível em: <http://www.revistas.
usp.br/rmrp/article/view/86611/89541>. Acesso em: 07 nov. 2017.

Leituras recomendadas
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São
Paulo: Paz e Terra,1996.
MATURANA, H.; VARELA, F. A árvore do conhecimento: as bases biológicas do conhe-
cimento humano. Campinas: Ed. Psy, 1995.
TAVARES, J.; ALARCÃO, I. Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. 4. ed.
Coimbra: Livraria Almedina.1992.   
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