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2996 6547 1 PB
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Resumo
Este artigo trata do tema do turismo em região atingida pela
mineração, tendo em vista que o processo de implantação das
mineradoras exige estratégias de minimização dos desmantelamentos
sociais, econômicos e ambientais resultantes. Objetiva-se
compreender, a partir da percepção dos (das) agricultores (as)
familiares dos municípios de Alvorada de Minas, Conceição do Mato
Dentro e Dom Joaquim, o interesse no desenvolvimento do turismo em
suas comunidades, identificando os riscos, os entraves, os potenciais e
os benefícios advindos a partir do desenvolvimento da atividade. O
resultado aponta para a necessidade de cautela diante de propostas de
desenvolvimento do turismo no espaço rural. Estas devem ser
pautadas na valorização dos aspectos naturais, da cultura e da
atividade produtiva das comunidades rurais e contar com a
Abstract
This study discusses the tourism theme in a region affected by mining,
considering that the implementation of mining requires strategies to
minimize the social, economic and environmental dismantlement. The
goal is to comprehend the farmers’ interest from Alvorada de Minas,
Conceição do Mato Dentro and Dom Joaquim, to develop tourism in
their communities, identifying risks, barriers, potential and benefits
from the development of tourism. The results indicate the need for
caution in the face of tourism development proposals in rural areas.
Proposals must be guided by the enhancement of natural and cultural
aspects and the appreciation of the productive activity of rural
communities. Projects must have the active participation of the local
community in all stages of development: from the structure of the
product to the control of the results arising from the activity.
Introdução
Este artigo trata do tema do turismo direcionado à agricultura
familiar em região atingida pela mineração, enquanto fator de
desenvolvimento rural sustentável, tendo em vista que o processo de
destruição inerente à implantação das mineradoras exige estratégias
de minimização dos desmantelamentos sociais, econômicos e
ambientais resultantes.
Parte-se dos princípios do desenvolvimento local e do turismo
sustentável que implica, antes de seu planejamento e desenvolvimento,
a participação ativa da comunidade receptora, explicitando suas
demandas e seus receios, representando a equanimidade entre o poder
público, o mercado, o turista e a comunidade.
Questiona-se a idealização de uma indústria do turismo, na
condição de mercado corporativo gerador de emprego e renda, em
detrimento de outros fatores como a preservação/degradação
ambiental, a ilusão de progresso, a descaracterização do tipo de vida e
trabalho e os choques culturais. Evidencia-se a valorização de outras
reflexões sobre o papel do turismo no desenvolvimento, da perspectiva
da preservação das relações socioculturais e ambientais, dos aspectos
genuínos do ambiente rural, da autonomia e independência do (da)
agricultor (a) e do fortalecimento do saber local.
Essas evidências colocam no centro das preocupações a
seguinte pergunta: as famílias agricultoras possuem interesse em
construir, implementar e gerir os planos de turismo conjuntamente, ou
em detrimento, de suas atividades tradicionais? A pergunta se
desdobra na seguinte problematização: o turismo nas comunidades
rurais da região pode se configurar como mais uma forma de geração
autônoma de renda, corroborando as novas configurações da
agricultura familiar como atividade plural.
Dentro desse quadro, objetiva-se compreender, a partir da
percepção dos (as) agricultores (as), o interesse no desenvolvimento do
turismo em sua região, identificando os riscos, os entraves, os
potenciais e os benefícios da atividade do turismo para as comunidades
rurais.
Do ponto de vista metodológico, registra-se que a pesquisa4 foi
executada na região de Alvorada de Minas, Conceição do Mato Dentro
4
Projeto de pesquisa nº 2308011772201544 realizado pelo Núcleo Travessia - Núcleo de
Pesquisa, Extensão e Apoio à Agricultura Familiar e Desenvolvimento Rural da
Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI) com o apoio da Cáritas Brasileira Regional
Minas Gerais e o Ministério Público de Minas Gerais.
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O Sistema FIEMG trabalha para contribuir com a indústria mineira, buscando
resultados que sustentem sua competitividade. É composto por cinco empresas:
Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG), o Centro Industrial e
Empresarial de Minas Gerais (CIEMG), o Serviço Social da Indústria (SESI), o Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e o Instituto Euvaldo Lodi (IEL). Juntas,
essas empresas oferecem à indústria mineira estratégias para o desenvolvimento
industrial. Para informações ver http://www7.fiemg.com.br/mais-sistema-fiemg.
Alvorada de Minas
No município de Alvorada de Minas, nas comunidades de Bom
Jesus, Descoberto e Morro dos Monteiros, registrou-se a inexistência
de direitos básicos de manutenção das famílias, o que trouxe
desconforto na abordagem do tema do turismo, em face da distância
quanto às prioridades demandadas pelas famílias. Na luta pela
sobrevivência, a prática do turismo é atividade alheia à realidade dos
agricultores visitados.
Apesar de o município pertencer a rota turística do ‘Caminho
dos Diamantes’, da Estrada Real, a pesquisa não identificou entre os
grupos pesquisados nenhuma família agricultora que reconhecesse o
potencial para o turismo, mesmo entre aquelas que se lembraram de
festas e celebrações religiosas ainda existentes.
6
Apesar dos grupos culturais que se apresentam nas festas virem de outras
comunidades.
7
Trata-se do depoimento de agricultores familiares da Comunidade Água Quente,
município de Conceição do Mato Dentro. Todas as falas evidenciadas durante este texto
são dos (das) agricultores (as) entrevistados em pesquisa de campo, descrita na
metodologia. Cabe ressaltar, também, que, por questões éticas, não serão mencionados
os nomes dos agricultores entrevistados.
8
Extraído do site http://guiaviajarmelhor.com.br/cachoeira-do-tabuleiro-a-maior-queda-
dagua-de-mg/. Acesso em 20 de março de 2016.
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Há cachoeiras em propriedades rurais que são desconhecidas pelo turista. Em uma das
casas das famílias entrevistadas, havia mais de 13 cachoeiras.
Dom Joaquim
No município de Dom Joaquim não há percepção de benefícios
e interesse pelo desenvolvimento do turismo, na quase totalidade das
famílias agricultoras entrevistadas. Apesar da forte presença das
festas tradicionais religiosas e de belezas naturais, a fala de um
agricultor de São João é expressiva: “(...), não, aqui não tem nada que
atrai. Tem cachoeira, mas é particular”.
Em São Joaquim, relata-se que o desaparecimento das festas
deve-se ao conservadorismo crescente e a falta de apoio da prefeitura.
Para os agricultores de Machado o argumento segue na mesma
direção: “(...) as festas diminuíram, (...) os moradores (...) não podem
festejar. Não fazem mais forró e não tem mais folia de reis. (...) agora
não tem mais farra. Eu tenho 72 anos, já dancei muito forró”.
Nota-se que o esvaziamento das práticas culturais, a ausência
do apoio do poder público e de ações coletivas das comunidades
provocam o enfraquecimento das tradições locais. A retomada das
festas é vista como uma possibilidade de fortalecimento da identidade
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As pisquinhas são uma mistura de versos e adivinhações que se transformam numa
brincadeira, segundo explicação de um morador da comunidade.
Esforço de síntese
Considerando a perspectiva das famílias agricultoras que
demonstraram interesse no desenvolvimento do turismo, este pode-se
valer das práticas culturais (culinária, festas, danças etc.) e o desfrute
das belezas naturais como atrativo a ser fomentado. Reitera-se o alerta
para a necessidade de avaliar as políticas públicas de turismo locais e
sua relação com o aproveitamento do ambiente rural enquanto espaço
de trocas culturais com as comunidades. A atividade turística no
espaço rural deve ser promovida a partir dos interesses de seus
moradores, principais ocupantes, utilizadores e preservadores desse
espaço. É fundamental o diálogo entre os diversos atores para que as
políticas públicas nesse espaço estejam aliadas ao interesse e
participação das comunidades rurais e os projetos solidários se voltem
para estes interesses.
Considerações finais
O artigo se propôs compreender a percepção dos agricultores e
agricultoras sobre os riscos, os entraves, os potenciais e os benefícios
da atividade do turismo para as comunidades onde vivem.
Da proposição buscou-se identificar o grau de interesse das
famílias agricultoras no planejamento e implementação do turismo em
suas comunidades, levando em consideração a manutenção de suas
atividades tradicionais e a autonomia dos agricultores enquanto
atividade alternativa e complementar de geração de renda.
Os (as) agricultores (as) entendem os riscos e os benefícios que
a atividade do turismo pode promover: os entraves ficam por conta da
falta de estrutura e da ausência de apoio do poder público local; os
benefícios estão no reconhecimento do potencial da região, em face da
presença de festas populares, das diversas manifestações culturais, do
patrimônio histórico, das riquezas naturais e da culinária regional.
As propostas de desenvolvimento do turismo no espaço rural
devem abranger os interesses das comunidades rurais dos municípios
pesquisados, pois são nas comunidades que estão os sujeitos deste
estudo – os agricultores e agricultoras familiares. Quaisquer iniciativas
nesse sentido devem pautar-se na valorização dos aspectos naturais, da
cultura e da atividade produtiva das comunidades rurais, gerando
complementação da renda familiar.
Dentro dos preceitos do desenvolvimento do turismo como
atividade sustentável, a participação da comunidade local em todas as
etapas do desenvolvimento turístico é indispensável: da estruturação
do produto ao controle dos resultados advindos da atividade. Portanto,
o investimento no turismo nas regiões estudadas precisa, antes de
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