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Revista Brasileira

ISSN 1982-3541 de Terapia Comportamental


2014, Vol. XVI, no. 1, 41 - 54 e Cognitiva

Da Gnosiologia à Epistemologia:
Um Caminho Científico para Uma Terapia
Baseada em Evidências
From Gnosiology to Epistemology: A Scientific Path to an Evidence-
Based Therapy

André Luiz Moreno*


Universidade Federal do Triângulo Mineiro

Ricardo Wainer**
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Resumo

Este trabalho tem como objetivo discutir como conceitos da teoria do conhecimento, particularmente a gno-
siologia e a epistemologia, podem contribuir para o estudo das bases filosóficas da terapia cognitiva. Outro
objetivo deste trabalho é analisar a influência do construtivismo e do racionalismo crítico no desenvolvi-
mento dos objetivos terapêuticos e das técnicas em terapia cognitiva. Esses objetivos são alcançados a partir
da revisão do idealismo transcendental de Kant, do conceito de construtivismo e da influência da psicologia
cognitiva na terapia cognitiva. Analisa-se também a terapia cognitiva como uma prática científica, baseada
no método hipotético-dedutivo. Nesse sentido, as etapas do processo terapêutico em terapia cognitiva e a
aplicabilidade de algumas técnicas cognitivas e comportamentais em cada etapa são analisadas a partir do
método hipotético-dedutivo, utilizando como analogia as práticas de pesquisa. Por fim, discute-se a visão da
terapia cognitiva como um processo de aprendizagem e a influência do terapeuta no processo terapêutico.

Palavras-chave: terapia cognitiva; gnosiologia; epistemologia; racionalismo crítico.

* moreno.andreluiz@gmail.com
** ricardo@wainerepiccoloto.com.br

Rev. Bras. de Ter. Comp. Cogn., 2014, Vol. XVI, no. 1, 41 - 54 41


Da Gnosiologia à Epistemologia: Um Caminho Científico para Uma Terapia Baseada em Evidências

Abstract

This paper aims to discuss how the theory of knowledge, mainly gnosiology and epistemology, can con-
tribute to the study of the philosophical foundations of cognitive therapy. Furthermore, this study aims to
analyze the influence of constructivism and critical rationalism in the development of therapeutic goals and
techniques of cognitive therapy. These goals are achieved from reviewing the transcendental idealism of
Kant, the concept of constructivism and the influence of cognitive psychology in cognitive therapy. It also
examines the cognitive therapy as a scientific practice, based on the hypothetical-deductive method. In this
direction, the steps of the therapeutic process in cognitive therapy and the application of some cognitive and
behavioral techniques for each step are analyzed from the hypothetical-deductive method perspective, using
research practices as an analogy. Finally, we discuss the vision of cognitive therapy as a learning process
and the influence of the therapist in the therapeutic process.

Keywords: cognitive therapy; gnosiology; epistemology; critical rationalism.

A terapia cognitiva, uma abordagem terapêutica modelo ABC, que propõe a visão de que antece-
desenvolvida no final dos anos 50 como alterna- dentes situacionais são modulados por crenças que
tiva aos tratamentos da depressão, atualmente é dão origens a consequências emocionais e com-
aplicada a uma variedade de transtornos mentais portamentais. (Rangé, 2001; Beck, 1997). A se-
(Beck, 1997; Knapp & Beck, 2008). Esta aborda- gunda delas trata da natureza construtivista do sig-
gem tem sua eficácia terapêutica avaliada por uma nificado, ou seja, a visão de que as pessoas dotam
série de ensaios clínicos controlados e apresenta- as situações de significado próprio, estruturando
se, atualmente, como abordagem psicoterapêutica a realidade de forma ativa (Beck & Alford, 2000;
de maior amparo empírico (Powell, Abreu, Oli- Castañon, 2005a). Esta segunda ideia é reconhe-
veira & Sudak, 2008; Beck, 2005; Scher, Segal & cida tanto por Beck (Knapp & Beck, 2008) como
Ingram, 2010). A principal inovação introduzida por Ellis (Still & Dryden, 1999) como tendo forte
pela terapia cognitiva no campo das psicoterapias, influência da filosofia estoica.
responsável pelos desdobramentos posteriores
dessa abordagem e por seu sucesso terapêutico, é A ideia de que os seres humanos são perturbados
o que foi denominado por seus autores como “mo- pelos significados que atribuem aos fatos e não aos
delo cognitivo”. fatos em si é frequentemente citada, inclusive por
vários trabalhos relacionados à terapia cognitiva,
O modelo cognitivo, presente desde os trabalhos como marco da filosofia estoica grega (Knapp &
iniciais de Beck e Ellis, pode ser explicado a partir Beck, 2008; Abreu & Filho, 2005; Brookshire,
de duas ideias principais e intimamente relaciona- 2007). A filosofia estoica é uma escola helênica
das. Uma delas versa sobre a modulação cognitiva de filosofia, caracterizada pela busca pela felicida-
das emoções e comportamentos, conhecida como de e pela busca de soluções a problemas emocio-

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nais, particularmente através da racionalidade. Por questão da natureza construtivista do significado


exemplo, Sêneca, um pensador estoico romano, tem sua origem nos trabalhos de Kant (Castañon,
utilizava uma visão racional de resolução de pro- 2005b; 2007a). Antes dos trabalhos de Kant, havia
blemas emocionais em suas consolações sobre o duas grandes escolas filosóficas que explicavam a
luto (Silva, 2007). Still e Dryden (1999) discutem origem do conhecimento humano: os empiristas e
também o lugar da racionalidade tanto para a filo- os racionalistas. Para a escola racionalista, o co-
sofia estoica quanto para a terapia cognitiva, apon- nhecimento humano é derivado inicialmente da
tando que as similaridades entre essas abordagens razão, enquanto para a escola empirista o conhe-
não são somente análogas. De acordo com estes cimento humano é derivado inicialmente das ex-
autores, a terapia cognitiva tem importantes raízes periências sensíveis. Kant revolucionou a filosofia
na filosofia estoica, particularmente no que tange à moderna ao propor que o ponto de partida para a
interdependência entre razão e emoção e ao confli- solução desta questão deveria se iniciar com o es-
to entre crenças racionais e irracionais. tudo dos mecanismos que possibilitam o conheci-
mento humano, e não de onde este conhecimento
Assumir a natureza construtivista do significa- seria derivado (Chauí, 2010).
do implica dizer que os seres humanos possuem
uma visão parcial da realidade, ou seja, apesar de De acordo com Kant, certas condições a priori
existir uma realidade ontológica comum a todos os na razão humana permitem que a realidade sen-
sujeitos, esta realidade não é passível de ser aces- sível se transforme em conhecimento. Estas con-
sada, já que é representada e estruturada pelos in- dições a priori seriam categorias de análise que
divíduos (Beck & Alford, 2000). Considerar esta determinam o conhecimento humano, na medida
natureza construtivista do significado no setting em que permitem a interpretação dos estímulos
clínico cognitivo implica, portanto, assumir que sensíveis, perspectiva denominada de idealismo
tanto terapeutas quanto pacientes possuem esta vi- transcendental (Silveira, 2002). Assim, Kant afir-
são parcial de realidade. Contudo, se o terapeuta mava que somente parte da realidade poderia ser
também possui uma visão parcial, como é possível passível de conhecimento, na medida em que exis-
que este terapeuta seja efetivo? Como é possível tia uma realidade externa independente do sujeito
ao terapeuta sugerir técnicas cognitivas e compor- que não é possível de ser avaliada pelas categorias
tamentais ao paciente se, no limite, estas técnicas de análise. Porém, mesmo com a existência dessa
são limitadas à visão parcial do terapeuta? A efe- lacuna entre a realidade objetiva e o conhecimen-
tividade terapêutica estaria associada a cognições to humano, Kant postulava a possibilidade de co-
ideais a que o terapeuta teria acesso, apesar de sua nhecimento objetivo, na medida em que existe um
visão parcial da realidade? conhecimento intersubjetivo a ser partilhado (Sil-
veira, 2002). O idealismo transcendental inicia o
Psicologia Cognitiva e construtivismo debate moderno acerca da natureza construtivista
do significado na medida em que nessa posição o
Apesar de presente na filosofia estoica, pode- sujeito é ativo na estruturação do conhecimento,
se afirmar que uma descrição mais rigorosa da construindo-o a partir de estímulos externos por

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meio de suas categorias de análise. Tal pressuposi- externos de forma particular que dá origem aos
ção influenciou fortemente não somente a filosofia outros processos psicológicos básicos (Castañon,
a partir do século XVIII mas também outras ciên- 2007b).
cias, como a psicologia.
Porém, vale ressaltar que assumir a perspectiva
No campo da psicologia, pode-se afirmar que uma mentalista para a explicação dos fenômenos não
das escolas mais influenciadas pelo idealismo significa assumir uma perspectiva dualista em ter-
transcendental foi a psicologia cognitiva. A psico- mos ontológicos. Para a psicologia cognitiva, o
logia cognitiva tem como objeto de estudo basi- funcionamento psíquico não se divide em mente
camente o foco da revolução proposta por Kant, e cérebro ontologicamente, não existem duas es-
ou seja, o estudo dos mecanismos que permitem o feras de funcionamento distintas. Esta divisão só
conhecimento humano. Assim, pode-se dizer que é realizada para facilitar o estudo de fenômenos
a psicologia cognitiva expandiu os estudos kantia- do comportamento, perspectiva conhecida como
nos acerca das categorias de análise a priori, in- dualismo metodológico. Assim, apesar de algumas
vestigando quais são as condições e processos que discussões a respeito de como a mente se apresen-
permitem a aquisição, transformação e aplicação ta a partir do plano biológico, atualmente o enten-
do conhecimento. E para a psicologia cognitiva, dimento do funcionamento neuronal em termos de
todas essas condições e processos são mediados propriedades emergentes é o que mais se encontra
por representações mentais (Thagard, 2005; Cas- presente na psicologia cognitiva. Entende-se por
tañon, 2007b), por mais que existam discussões propriedades emergentes a noção de que exis-
neste campo acerca da natureza dessas representa- tem níveis de complexidade e organização entre
ções mentais (Castañon. 2007b) e da competência os neurônios, e que certos níveis de organização
deste conceito para resumir a experiência humana levam à existência de fenômenos, como a mente,
(Gomes e Gauer, 2012). que não podem ser reduzidos a nenhum dos neurô-
nios em específico (Bunge, 1980).
De forma geral, a psicologia cognitiva entende
representação mental como um símbolo mental Psicologia Cognitiva e Racionalismo
interno que representa o mundo externo ou outro Crítico
estado mental interno (Thegard, 2005; Chrane,
2003). Apesar de não necessariamente descrita na Conforme descrito acima, a revolução apresentada
definição do conceito de representação mental, im- pelo idealismo transcendental de Kant, no que se
plicitamente pode-se deduzir que o símbolo mental refere ao objeto de conhecimento e ao sujeito que
é caracterizado por uma modificação com relação conhece, foi uma importante influência para que a
à estrutura externa que ele representa (Stenberg, psicologia cognitiva adotasse a natureza constru-
2008). Assim, pode-se afirmar que a psicologia tivista do significado enquanto premissa. Porém,
cognitiva assume a natureza cognitiva do signifi- essa influência kantiana não se deu de forma di-
cado como pressuposto básico, na medida em que reta, a partir dos escritos do filósofo alemão. Tal
afirma que existe uma organização dos estímulos influência foi mediada por algumas perspectivas

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filosóficas do século XX, entre elas o racionalismo fenômeno, nem mesmo qual fenômeno a ser ex-
crítico. plicado (Chalmers, 2005). A proposição do racio-
nalismo crítico de Popper responde a esses dois
O racionalismo crítico é uma perspectiva filosófica problemas básicos da ciência baseada em indução.
fundada por Karl Popper no século XX, interessa-
da particularmente na filosofia da ciência, na de- Para Popper, a ciência baseada na indução apresen-
marcação dos critérios que definem uma perspecti- tava os problemas acima apontados por questões
va como científica e na validade do conhecimento lógicas e psicológicas (Castañon, 2007c). O pro-
(Moreira & Massoni, 2011). Popper é responsável blema lógico é a noção de que as teorias podem ser
pela demarcação do método hipotético-dedutivo extraídas a partir de certo número de observações
de pesquisa no século XX e, em função de sua es- que podem ser verificadas, e que a partir dessas
truturação deste método e de sua visão como filó- teorias se podem fazer previsões acerca da ocor-
sofo da ciência, é visto como um importante marco rência dos fenômenos. O racionalismo crítico pro-
precursor da revolução que deu origem à psicolo- põe que o que demarca o critério de validade das
gia cognitiva (Castañon, 2007c). teorias científicas não é a verificação da ocorrência
de seus predicados na natureza, mas sim o quanto
Anteriormente à proposição do racionalismo críti- suas proposições são passíveis de serem falseadas
co, acreditava-se em que a fundamentação da ciên- (Moreira & Massoni, 2011; Chalmers, 2005). Ca-
cia estava na lógica indutiva. De acordo com essa beria então às teorias organizar seus pressupostos
perspectiva, o cientista observava a ocorrência de de forma que pudessem ser submetidos a experi-
um fenômeno em diversas situações, até que, pela mentos que poderiam refutar as teorias e não so-
repetição do mesmo fenômeno em várias situa- mente confirmá-las. Isso porque a confirmação
ções, o cientista induzia uma regra, uma teoria a de uma teoria em função de um experimento não
partir dessas observações, que relacionava o fenô- aponta que há correspondência da teoria com a re-
meno às situações. A partir daí, a teoria permitia alidade, mas sim que tal teoria se aproxima desta
prever que, no caso da presença das mesmas situa- realidade na medida em que ainda não foi refutada.
ções de observação, o fenômeno estaria novamen-
te presente. Nesse sentido, a ciência fundamentada O problema psicológico da ciência baseada em in-
na lógica indutiva teria como base a verificação, dução se refere à neutralidade das observações ini-
haja vista que o papel do cientista era apenas veri- ciais, ou seja, à idéia de que é possível ao cientista
ficar na natureza a existência da relação já presente dispor de impressões e opiniões sobre o fenômeno
entre os fenômenos (Chalmers, 2005). Porém, este antes de fazer observações. Para Popper, tal ob-
princípio baseado na indução não garante que o fe- servação neutra é impossível. Toda observação se
nômeno foi observado em todas as situações pos- orienta por hipóteses e expectativas, que dirigem
síveis, nem mesmo que se repetirá na manutenção inclusive a escolha do fenômeno para observação.
das condições. Além disso, não ficam explícitos Assim, os indivíduos criam teorias, constroem hi-
nesta concepção de ciência quais são os fenôme- póteses e expectativas a respeito do mundo, que
nos que o cientista deve escolher para explicar tal posteriormente podem se confirmar ou não de

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acordo com a experimentação (Castañon, 2007c; de uma hipótese sobre um fenômeno, a busca por
Chalmers, 2005). experimentos que permitam falsear esta hipótese,
a realização destes experimentos e a retroalimen-
Assim, pela proposição de resolução dos proble- tação dos resultados destes experimentos sobre a
mas da ciência baseada em indução, Popper defen- teoria. A adoção progressiva do método hipoté-
de a ciência baseada em conjecturas de observação tico-dedutivo pela psicologia behaviorista e, por
e na idéia de falseabilidade. O conhecimento evo- consequência, a necessidade de uma concepção
luiria a partir de conjecturas, de hipóteses de ob- mentalista e construtivista que apoie a raciona-
servação, de que deveriam ser falseáveis (Moreira lidade deste método foram fundamentais para a
& Mossoni, 2011). Dessa forma, Popper substitui revolução que deu origem à psicologia cognitiva
o conceito de verdade pelo conceito de verossimi- (Castañon, 2007c).
lhança nas teorias científicas. Essa substituição se
justifica na medida em que as hipóteses são cons- Terapia Cognitiva, Psicologia
truídas pelos sujeitos a princípio e não extraídas Cognitiva e Racionalismo Crítico
objetivamente (Castañon, 2007c).
Apesar de não ser ter como base a Psicologia Cog-
E é justamente a substituição do conceito de verda- nitiva, pode-se afirmar que a terapia cognitiva foi
de pelo de verossimilhança que justifica o batismo fortemente influenciada pelas pressuposições fi-
de racionalismo crítico para a teoria de Popper. É losóficas, pelas hipóteses metodológicas e pelos
uma perspectiva racionalista por afirmar a impor- avanços experimentais desta escola (Knapp &
tância das hipóteses a priori sobre a observação Beck, 2008; Ingram & Siegle, 2010). Neste traba-
para a construção do conhecimento, mas ao mes- lho, duas dessas influências da psicologia cogniti-
mo tempo é uma perspectiva crítica por afirmar que va sobre a terapia cognitiva serão analisadas: a na-
tal representação racionalista não é exatamente tureza construtivista do significado e a influência
correspondente à realidade ontológica (Castañon, metodológica do racionalismo crítico.
2007b). O objetivo da ciência, portanto, não se-
ria confirmar, verificar, corresponder à realidade; A natureza construtivista do significado é uma das
mas sim possibilitar que as representações racio- pressuposições fundamentais da terapia cogniti-
nalistas se aproximem da realidade ontológica, por va. Mesmo considerando-se a importância do es-
mais que a correspondência entre representação e toicismo e do idealismo transcendental para esta
realidade ontológica seja impossível. questão, não se pode desprezar que a adoção desta
perspectiva pela psicologia cognitiva teve grande
Porém Popper não se preocupa somente com a influência nas pressuposições da terapia cogniti-
adoção de certa perspectiva ontológica e a justi- va, conforme descrito acima. Para esta abordagem
ficação de uma filosofia da ciência baseada nes- terapêutica, o indivíduo constrói representações
se princípio. Ele propõe também a adoção de um acerca da realidade objetiva e ordena-as, de forma
método epistemológico baseado nessa perspectiva, particular, em estruturas de cognição com signi-
o método hipotético-dedutivo, guiado pela criação ficado denominadas esquemas. Assim, de forma

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geral, pode-se afirmar que, para a terapia cogni- produz e estrutura novos conhecimentos a partir
tiva, cada indivíduo desenvolve uma teoria acerca dos esquemas. Assim, realizar uma análise gno-
de si mesmo e do mundo, baseada no conjunto de siológica dos esquemas do paciente significa co-
significados construídos, que lhe permite ordenar, nhecer quais são suas estruturas organizadoras de
assimilar, prever e modificar o mundo (Beck & Al- conhecimento que influenciam sua representação
ford, 2000). de novas situações e o planejamento de seu com-
portamento. Tal análise, conhecida como conceitu-
A importância do construtivismo na terapia cog- alização cognitiva, é fundamental para o processo
nitiva é tão marcante que algumas de suas pressu- terapêutico (Neufeld e Cavenage, 2010), haja vista
posições são assumidamente advindas da teorias que a terapia cognitiva assume que os transtornos
dos construtos pessoais de George Kelly (Beck & psicológicos têm sua origem nos esquemas disfun-
Alford, 2000) e das perspectivas construtivistas cionais, ou seja, em padrões desadaptativos de re-
de Mahoney acerca da modificação de compor- presentação e organização de conhecimento acer-
tamentos (Knapp & Beck, 2008). Além disso, a ca do mundo e de si mesmo (Beck, 1997; Beck &
força das perspectivas construtivistas nas terapias Alford, 2000).
cognitivo-comportamentais pode ser observada na
medida em que algumas escolas de terapia cogni- No que se refere ao papel do racionalismo crítico
tivo-comportamentais se denominam como cogni- na terapia cognitiva, percebe-se que sua influência
tivo-construtivistas (Abreu, 2011), menos compro- é bem menos explícita do que a natureza constru-
metidas com o realismo ontológico característico tivista do significado. Porém, o fato de não estar
da terapia cognitiva fundada por Aaron Beck e ten- explicitamente colocado entre os pressupostos ini-
do como grandes expositores o próprio Mahoney e ciais da terapia cognitiva não coloca o racionalis-
nomes como Oscar Gonçalves, Robert Neimeyer e mo crítico como um mero coadjuvante nas origens
Cristiano Abreu. Porém, outros autores defendem conceituais desta abordagem terapêutica. Apesar
a filiação construtivista na terapia cognitiva de do pouco reconhecimento acerca da influência de
Beck, na medida em que se considera construtivis- Popper na psicologia cognitiva (Castañon, 2007c)
mo a noção de que o indivíduo constrói e ordena suas pressuposições epistemológicas e metodoló-
representações de um modo particular (Castañon, gicas que constituem parte do arcabouço teórico
2005c). da psicologia cognitiva foram também adotadas
pela terapia cognitiva, sendo algumas influências
Denomina-se Gnosiologia o ramo da filosofia res- mais explícitas que outras.
ponsável por discutir a possibilidade, a origem e
estruturação do conhecimento por parte do sujei- Explicitamente, pode-se observar a influência do
to (Gomes, 2009). Este ramo é, portanto, de fun- racionalismo crítico na terapia cognitiva na me-
damental importância para a terapia cognitiva, na dida em que seus autores utilizam uma estrutura
medida em que o terapeuta cognitivo tem como axiomática para organizar os postulados da teo-
objeto de trabalho o plano gnosiológico de funcio- ria (Beck & Alford, 2000, p. 24). Em outros mo-
namento do paciente, ou seja, como este paciente mentos, os autores demonstram a importância da

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falseabilidade para seu entendimento das qualida- existente entre os significados construídos indivi-
des necessárias para a constituição de uma teoria dualmente e a realidade ontológica objetiva (Dob-
(Beck & Alford, 2000, p. 26; Hofmann, Asmund- son, 2013).
son & Beck, 2013). Uma das implicações do uso
do conceito de falseabilidade na terapia cognitiva Epistemologicamente, a influência racionalista
pode ser observada na medida em que esta abor- crítica na terapia cognitiva é reconhecida na medi-
dagem terapêutica foi uma das primeiras aborda- da em que o trabalho do terapeuta cognitivo é levar
gens em psicoterapia a se alinhar ao movimento o paciente a comparar seus esquemas de significa-
das práticas baseadas em evidências (Knapp & dos construídos com a realidade ontológica, visan-
Beck, 2008), movimento este que busca evidên- do ao esbatimento dos sintomas. De forma geral,
cias de eficácia baseadas em pesquisas empíricas Epistemologia pode ser entendida como a área da
para orientar evoluções e reformulações nas suas filosofia responsável por discutir as questões re-
pressuposições teóricas e nas práticas de interven- lativas à validade do conhecimento, à verificação
ção (Pheula & Isolan, 2007). Porém, a influência do conhecimento individual quando relacionado a
do racionalismo crítico na terapia cognitiva não se um conhecimento universal (Gomes, 2009; Chauí,
deu apenas no âmbito formal de formulação da te- 2010).
oria. O racionalismo crítico foi fundamental para
embasar, tanto ontologica quanto epistemologica- Assim, a reestruturação cognitiva na terapia cog-
mente, os objetivos da terapia cognitiva e algumas nitiva pode ser caracterizada por uma abordagem
de suas técnicas. epistemológica dos esquemas do paciente, na qual
o terapeuta leva o paciente a buscar a validade
Ontologicamente, a influência racionalista crítica destes esquemas com relação à realidade ontoló-
é fundamental na pressuposição da terapia cogni- gica a partir de evidências fornecidas por esta re-
tiva de que, mesmo que todos os indivíduos sejam alidade ontológica. Após esta análise, o paciente
ativos na construção de significados particulares, teria condições de avaliar quais esquemas estariam
estes significados podem ser avaliados em compa- distorcidos, desadaptativos ou disfuncionais com
ração a uma realidade ontológica objetiva. Assim, relação à realidade ontológica para engajar-se na
os significados construídos e os esquemas oriun- construção de novos significados menos distantes
dos destes significados, podem ser julgados em da realidade objetiva.
função de seu distanciamento desta realidade onto-
lógica objetiva, mesmo que esta realidade não seja Beck e Alford (2000) descrevem a existência de
passível de acesso por nenhum indivíduo. Dessa dois polos de funcionamento da díade terapeuta-pa-
forma, justifica-se o uso dos termos distorcidos, ciente que auxiliam o entendimento deste objetivo
desadaptativos e disfuncionais para qualificar os na terapia cognitiva. Para estes autores, o paciente
esquemas responsáveis pela etiologia e manuten- com um transtorno psicológico está funcionando
ção dos transtornos mentais, na medida em que a apenas em um plano construtivista, na medida em
visão de psicopatologia para a terapia cognitiva é que não compara seus esquemas com a realidade
determinada em função da magnitude da diferença ontológica. Já o terapeuta funciona tanto no plano

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construtivista, na medida em que ele também tem tica mas também como uma prática de pesquisa.
significados construídos próprios, quanto no plano Tal afirmativa pode ser justificada, por exemplo,
realista, servindo como mediador dos significados pela disposição de seus pressupostos em estrutu-
construídos pelo paciente e a realidade ontológica. ra axiomática, pela familiaridade e utilização da
Ou seja, é papel do terapeuta superar epistemolo- falseabilidade como demarcação científica e por
gicamente a vivência subjetiva dos significados se alinhar ao movimento das práticas baseadas em
próprios do paciente, buscando evidências de que evidências. Porém, pode-se observar que, em te-
estes significados estejam adequados e validados rapia cognitiva, o próprio processo terapêutico se
quanto à realidade ontológica. alinha com práticas de pesquisa de acordo com o
método hipotético-dedutivo, sendo possível locali-
Porém, vale ressaltar que, apesar da caracterização zar os objetivos da terapia e as técnicas cognitivo-
da psicopatologia ser descrita a partir da magni- comportamentais nas etapas deste método.
tude da distância existente entre os significados
construídos e a realidade ontológica, nem terapeu- De forma geral, o método hipotético-dedutivo é
ta nem paciente possuem o conhecimento desta re- definido por quatro etapas: definição do problema
alidade. Dessa forma, a terapia cognitiva utiliza a de pesquisa; desenvolvimento de hipóteses a se-
filosofia da ciência do racionalismo crítico como rem testadas; experimentos que permitem falsear
alternativa para a construção de novos significa- as hipóteses; redefinição do problema de pesqui-
dos mais adaptados à realidade ontológica. Nesta sa a partir dos resultados dos experimentos. Em
perspectiva, o papel do terapeuta não é apresentar função do exposto, o método hipotético-dedutivo
ao paciente as cognições ideais da realidade ob- será utilizado em suas quatro etapas para analisar
jetiva aos quais nem ele mesmo tem acesso, mas o processo terapêutico em terapia cognitiva.
sim guiar o paciente em um processo metodológi-
co que o permita construir novos significados mais Na definição de um problema de pesquisa, pri-
adequados à sua experiência. E é nesta perspec- meira etapa do método hipotético-dedutivo, o pes-
tiva que mais uma vez a influência do racionalis- quisador tem por objetivo avaliar quais são suas
mo crítico se faz presente na terapia cognitiva, na concepções a respeito do fenômeno que deseja
medida em que esta abordagem terapêutica utiliza estudar, avaliar quais são as teorias vigentes que
o método hipotético-dedutivo como embasamento explicam este fenômeno e avaliar se tais expli-
para suas principais técnicas que guiam o paciente cações são satisfatórias, ou seja, explicam e pre-
à construção de novos significados. dizem, sem prejuízos, as variáveis envolvidas no
fenômeno. De forma análoga, o primeiro objetivo
Técnicas cognitivo-comportamentais em terapia cognitiva é o levantamento das quei-
e o método hipotético dedutivo xas e metas e a análise gnosiológica do paciente,
ou seja, dos esquemas, crenças centrais, crenças
Conforme exposto anteriormente, a terapia cog- subjacentes e pensamentos automáticos responsá-
nitiva mostra bastante interesse em se caracteri- veis pela origem e manutenção das queixas. Nesta
zar não somente como uma abordagem terapêu- primeira etapa do processo terapêutico, a concei-

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tualização cognitiva de caso é a principal técnica encontrar como resultado a verificação de que sua
utilizada, visto que agrupa outras técnicas menores hipótese explica corretamente o fenômeno|,| mas,
visando ao mapeamento do funcionamento cogni- sim, o fato de que sua hipótese para a explicação
tivo do paciente. do fenômeno não pode ser falseada.

A segunda etapa do método hipotético-dedutivo é Em terapia cognitiva, a terceira etapa do processo


o desenvolvimento de hipóteses a serem testadas. terapêutico tem como objetivo avaliar se os esque-
Nesta etapa, o pesquisador desenvolve possíveis mas que foram colocados como hipoteticamente
explicações para as falhas encontradas nas teorias disfuncionais na segunda etapa do processo são
existentes para o momento para a explicação de disfuncionais de fato. Assim, de forma análoga ao
certo fenômeno. Em terapia cognitiva, uma se- pesquisador que desenha experimentos para testar
gunda etapa do processo terapêutico consiste em, hipóteses, o terapeuta cognitivo tem à sua disposi-
a partir da análise gnosiológica anteriormente re- ção um grande arsenal de técnicas e instrumentos
alizada, avaliar quais possíveis esquemas são os que permitem realizar estes experimentos com o
mantenedores da psicopatologia e devem ser co- paciente, visando falsear a validade dos esquemas
locados como hipótese, haja vista que pelo fato de disfuncionais enquanto bons explicadores e predi-
serem disfuncionais estes esquemas não explicam tores da realidade. Algumas técnicas descritas em
e nem predizem de forma satisfatória o ambiente, Leahy (2006) que podem ser utilizadas para falsear
gerando prejuízos ao paciente. Assim, constrói-se os esquemas disfuncionais do paciente são: exame
como hipótese a possibilidade de que os esquemas de evidências, análise de distorções cognitivas, du-
do paciente estejam distorcidos, disfuncionais ou plo-padrão, gráfico em forma de torta, continuum,
desadaptativos. Nesse sentido, a psicoeducação análise dos erros de lógica, ensaios cognitivos e
acerca do modelo cognitivo, o questionamento so- experimentos comportamentais.
crático acerca da validade dos pensamentos auto-
máticos disfuncionais e a motivação do paciente A quarta e última etapa do método hipotético-dedu-
para a mudança são fundamentais. tivo é caracterizada pela análise dos resultados dos
experimentos realizados para testar a hipótese, com
A terceira etapa do método hipotético-dedutivo é objetivo de responder às questões desenvolvidas en-
caracterizada pelo desenvolvimento de experimen- quanto problema de pesquisa. Nesse sentido, se os
tos que permitem testar as hipóteses construídas experimentos apontaram que a hipótese desenvol-
na segunda etapa do método. Nesta etapa, o pes- vida era falsa, o pesquisador deve se engajar no de-
quisador organiza suas hipóteses em pressupostos senvolvimento de outras hipóteses que expliquem o
lógicos capazes de serem testados, desenha os ex- fenômeno. Se os experimentos não foram suficien-
perimentos necessários ao teste destas hipóteses e tes para falsear a hipótese construída, o pesquisador
realiza estes experimentos. Vale ressaltar que o ob- assume o caráter provisório de sua hipótese enquan-
jetivo dos experimentos não é confirmar a hipóte- to explicação para o fenômeno, e busca desenvol-
se levantada, mas sim testar a falseabilidade desta ver outros experimentos e condições que continuem
hipótese. Nesse sentido, o pesquisador não busca testando a validade desta hipótese.

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André Luiz Moreno – Ricardo Wainer

A última etapa do processo terapêutico em terapia relacionada à fidelidade do pesquisador ao método


cognitiva é caracterizada pela análise dos resulta- de pesquisa, o paciente pode se tornar expert na
dos das técnicas utilizadas na terceira etapa, visan- contestação dos próprios significados, realizando
do avaliar a validade dos esquemas disfuncionais por si só o caminho terapêutico-metodológico.
do paciente. Analogamente à pesquisa, cabe ao te- Portanto, um dos objetivos da terapia cognitiva
rapeuta analisar o quanto foi possível falsear, com é não somente esbater os sintomas do transtorno
as técnicas utilizadas, a congruência dos esquemas apresentado pelo paciente mas também tornar o
do paciente em relação à realidade ontológica. Caso paciente capaz de utilizar-se do método terapêuti-
as técnicas utilizadas não tenham sido suficientes co para questionar os próprios significados mesmo
para a percepção do paciente acerca da disfuncio- após o término do tratamento.
nalidade de seus esquemas, o terapeuta cognitivo
deve buscar novas situações para experimentação Considerações Finais
ou novas condições que permitam ao paciente ava-
liar a pertinência de seus esquemas disfuncionais. De forma geral, este trabalho teve como objeti-
Ao contrário, se as técnicas utilizadas possibilita- vo demonstrar como o processo terapêutico em
ram ao paciente o insight sobre a disfuncionalida- terapia cognitiva pode ser entendido como um
de de seus esquemas, inicia-se um novo momento caminho entre a análise gnosiológica e a análise
no processo terapêutico caracterizado pela cons- epistemológica do conjunto de representações do
trução de novos significados em substituição aos paciente. Além disso, relembrando que a palavra
que eram disfuncionais. Nesse sentido, o terapeuta método tem originalmente o significado de cami-
pode se utilizar de técnicas de descoberta guiada nho, outro objetivo foi demonstrar como o cami-
para auxiliar o paciente na construção de signifi- nho entre gnosiologia e epistemologia é o caminho
cados mais funcionais, mais adequados à realidade do método hipotético-dedutivo.
ontológica. Porém, deve-se sempre considerar que
esses novos significados construídos devem tam- Dessa forma, é possível avaliar que a visão parcial
bém ser sempre colocados sobre análise, haja vis- do terapeuta cognitivo acerca da realidade ontoló-
ta que podem apresentar apenas provisoriamente gica não impossibilita a efetividade da terapia, haja
uma representação funcional da realidade. vista que o que define o processo terapêutico são
as análises epistemológicas realizadas pelo pró-
Assim como as hipóteses desenvolvidas para res- prio paciente acerca de suas representações. Nesse
ponder aos problemas de pesquisa são construções sentido, as técnicas cognitivas e comportamentais
verdadeiramente provisórias, assim também são os são experimentos que visam avaliar a funcionali-
novos significados gerados após o processo tera- dade da estrutura gnosiológica do paciente, e não
pêutico. Dessa forma, tanto as hipóteses explicati- proposições de verdade que o terapeuta faz acerca
vas para os problemas de pesquisa quanto os novos das representações e experiências do paciente. As-
significados devem ser sempre submetidos a novas sim, descarta-se a visão da terapia cognitiva como
análises a partir do método hipotético-dedutivo. um processo de aprendizagem de cognições ideais,
Além disso, assim como a expertise na ciência está no qual o terapeuta teria como objetivo ensinar ao

Rev. Bras. de Ter. Comp. Cogn., 2014, Vol. XVI, no. 1, 41 - 54 51


Da Gnosiologia à Epistemologia: Um Caminho Científico para Uma Terapia Baseada em Evidências

paciente maneiras corretas de se pensar, enquanto medida em que se organizam os pressupostos ló-
se fortalece a visão da terapia cognitiva como uma gicos e axiomáticos aos quais os resultados devem
perspectiva terapêutica comprometida com a va- ser interpretados. Neste sentido, a terapia cogniti-
lidade dos significados construídos pelo sujeito a va reafirma-se como prática baseada em evidên-
partir de sua experiência. cias e permite a possibilidade de falseamento de
suas hipóteses, premissa esta fundamental para a
Além disso, esta investigação aponta como resul- evolução da ciência.
tado o forte embasamento teórico no qual a terapia
cognitiva está fundamentada. Nesse sentido, a te- Referências
rapia cognitiva se defende de muitas críticas rece-
bidas acerca de sua validade enquanto escola te- Abreu, C.A. (2011). Psicoterapia cognitivo-construtivista: o novo
rapêutica, considerada por alguns como um mero paradigma dos modelos cognitivistas. In: Range, B (Ed.).
conjunto de técnicas desprovido de argumentação Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais:
racional ou fundamentação teórica, ao afirmar um diálogo com a psiquiatria. Porto Alegre: Artmed.
suas respostas acerca das quatro grandes áreas da
Abreu, C.N. & Filho, R. C. (2005). A abordagem cognitivo-con-
filosofia: ontologia, epistemologia, lógica e ética.
strutivista de psicoterapia no tratamento da anorexia nervo-
Afirma-se, assim, a força da terapia cognitiva en-
sa e bulimia nervosa. Revista Brasileira de Terapias
quanto abordagem terapêutica embasada em prin-
Cognitivas 1(1), 45-58
cípios filosóficos definidos, em contraposição às
críticas de se tratar de uma panacéia terapêutica Beck, A.T. (2005) The current state of cognitive therapy: a 40-year
caracterizada por um conjunto de técnicas. retrospective. Archives of General Psychiatry;
62(9):953-9
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cas da terapia cognitivo comportamental é também terapia cognitiva. Porto Alegre: Artmed
fundamental para a prática do terapeuta cognitivo,
Beck, J. (1997). Terapia Cognitiva - teoria e prática.
na medida em que localiza de forma mais precisa
Porto Alegre: Artmed.
os objetivos terapêuticos e facilita o entendimento
acerca das etapas e técnicas do processo terapêu- Brookshire, S.A.M. (2007). Utilizing Stoic Philosophy to Improve
tico. Permite também ao terapeuta cognitivo com- Cognitive Behavioral Therapy. NC Perspectives, 1,
preender que as deduções que ocorrem na díade 30-36.
paciente-terapeuta são formadas a partir de uma Bunge, M.A. (1980). The Mind-Body Problem. Oxford:
estrutura lógica hipotético-dedutiva, relaciona- Pergamon
da inclusive às práticas de pesquisa da psicologia
Castañon, G.A. (2005a). Construtivismo e terapia cognitiva:
cognitiva.
questões epistemológicas. Revista Brasileira de Ter-
apias Cognitivas, 1 (2), 31-42.
Por fim, fortalecer epistemologicamente a terapia
cognitiva permite uma aproximação ainda maior Castañon, G.A. (2005b). Construtivismo e ciências humanas.
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Recebido: 06/04/20013
Revisado: 26/08/2013
Aceito: 27/08/2013

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