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(síntese da matéria anterior no caderno)

Filosofia da ciência

O problema da demarcação
 Criar um critério geral e seguro que permita distinguir o que é
ciência do que não é ciência.

O que distingue as teorias científicas das teorias não científicas?

Pseudociência  teoria, prática, investigação ou disciplina que se


autodenomina científica, mas não é reconhecida como ciência pela
comunidade científica.

Por forma a responder a responder a este problema, iremos analisar o


verificacionismo, associado a uma conceção indutivista do método
científico, e o falsicacionismo de Karl Popper, associado ao método das
conjeturas e refutações.

Conceção indutivista da ciência (=método experimental)

 Critério da demarcação (verificabilidade).


 Conceção do método científico.

Francis Bacon defendeu  método para a ciência baseada na indução e


simultaneamente na experimentação.

Indução: Mesmo que as premissas sejam verdadeiras a conclusão pode ser


falsa.

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Generalizações e previsões  raciocínios indutivos.

 Generalizações  observação de casos particulares para concluir


uma afirmação geral.
 Previsões  a conclusão diz respeito a um acontecimento particular
futuro, que também se obtêm a partir de observações feitas no
passado.

Falácias da indução: Falácia da generalização precipitada; Falácia da


amostra não-representativa.

De acordo com os indutivistas, não haveria ciência sem indução, cujo


papel é central no método científico.

De acordo com a perspetiva indutivista, a ciência começa com a


observação:

 À medida que as observações se vão tornando cada vez mais


abrangentes, vamos alcançando cada vez mais um conhecimento
geral – as leis científicas.
 Condições necessárias para que este raciocínio indutivo funcione
sem contradições:
1. O número de enunciados singulares observados, e que
constituem a base de uma generalização, deve corresponder
a uma amostra ampla. (caso contrário corremos o risco de
cometer a falácia da generalização precipitada).
2. As observações devem repetir-se numa ampla variedade de
circunstâncias.

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3. Nenhum enunciado singular aceite deve entrar em
contradição com uma lei universal derivada.

O método científico baseia-se no…

Princípio da indução: Se, numa ampla variedade de condições, se observa


uma grande quantidade de P, e se todos os P observados possuem sem
exceção a propriedade Q, então todos os P têm a propriedade Q.

 A ciência não poderia apoiar-se apenas nos raciocínios dedutivos,


pois consideram a dedução um tipo de raciocínio meramente
demostrativo:
 limita-se a estabelecer na conclusão o que já está implícito
nas premissas;
 permite aumentar o nosso grau de certeza na conclusão, mas,
não aumenta substancialmente o nosso conhecimento.

A ciência…

Objetivo: explicar e prever fenómenos, encontrando factos particulares


que confirmem a teoria/lei universal.

Para os indutivistas: evolui de um modo linear, por uma aproximação


progressiva e cumulativa à verdade.

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O problema do método científico

Fases do método científico

1. Observação (de casos particulares)


 Constitui o ponto de partida para a investigação científica.

O cientista tem de analisar os factos de forma:


 Imparcial (os seus gostos não podem interferir);
Ex.: Um comentador a analisar um jogo de futebol.  não é uma teoria
científica.
 Rigorosa
 Neutra
 Isenta
 Objetiva

2. Leis científicas (=enunciados gerais)


 Conseguimos observar generalizações.

Observar factos Leis gerais


particulares Indução
(generalizações)

David Hume…

 Afirma que não podemos confiar na indução;

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 Muitos casos particulares observados não podem constituir uma lei
geral  nunca teremos justificação racional para acreditar que essas
regularidades se irão manter no futuro.

3. Previsão, explicação e confirmação


A partir de teorias, os cientistas…
Deduzem  previsões e explicações  que possam ser confirmadas

Tentam encontrar informações


adicionais à teoria
Ex.: Todos os metais dilatam na base do calor.  Previsão de que vai
dilatar.
Quando é bem-sucedida vem
reforçar as premissas/teorias

O problema da demarcação

De acordo com a conceção indutivista da ciência, o melhor critério para


distinguir teorias científicas de teorias não científicas (problema da
demarcação) é o…
Critério da verificabilidade: uma teoria só é verdadeira se for
empiricamente verificável.
Condição necessária

Ou seja, … o seu valor de verdade pode ser determinado a partir de


observações (diretas).

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Alfred Jules Ayer  é empiricamente verificável qualquer proposição para
a qual possamos indicar condições empíricas para determinar o seu valor
de verdade, na prática ou em princípio.
Ex.: Na prática  a barra de ferro dilatou quando a aquecemos.
Em princípio (não consigo verificar na prática, mas imagino conseguir
verificar)  existe vida em Marte.
Objeções ao critério de verificabilidade

 O verificacionismo continua a tomar como não científicas


preposições que fazem parte da ciência.
Ex.: Nada se pode deslocar a uma velocidade superior à da luz.
 Não é possível mostrar que as proposições universais da ciência são
sequer provavelmente verdadeiras.
 Para isso teríamos de confiar no raciocínio indutivo.
 Hume argumenta: é um tipo de raciocínio problemático, por não ter
qualquer justificação lógica.
 Demasiado rígido, excluindo parte das ciências sociais e humanas,
cujas teorias têm um caráter mais compreensivo e menos preditivo.

Objeções à conceção indutivista da ciência

Objeção à 1º etapa: o papel da observação

A observação não é o ponto de partida para a ciência – a ciência não é


imparcial.

Um cientista quando observa algo  já com um conhecimento prévio e


expectativas prévias  não é imparcial  influência as nossas
observações e interpretação dos factos.

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Algumas teorias científicas referem-se a objetos que não podem ser
observados.

 A observação não pode ser baseada na indução.


 Muitas teorias científicas referem-se a entidades/objetos (ex: ADN,
eletrões, genes) dos quais nunca tivemos uma observação direta.

Objeção à 2º etapa: o problema da indução


As inferências indutivas não são racionalmente justificáveis.

Mesmo considerando
Não Justificação para inferir
um grande número de
Temos uma lei geral
casos particulares

Pois não temos a certeza se essas regularidades se irão manter no futuro.

Ex.: Se sempre observei cisnes brancos concluo que todos os cisnes são
brancos. Mas, nada me garante que amanhã possa encontrar um cisne de
outra cor.
Por isso, a lei geral que formulei (de que todos os cisnes são brancos)
deixou de fazer sentido com a observação de que um cisne não é branco.
Ou seja, a veracidade da minha lei não pode ser devidamente demostrada.

Objeção à 3º etapa: o problema da verificação das hipóteses científicas


A lógica subjacente à verificação experimental é falaciosa

Os enunciados gerais que correspondem a teorias científicas não podem


ser objeto de uma observação direta  incluem um número demasiado
abrangente de casos  única forma de os testar:

 Fazer previsões particulares baseadas nesses mesmos enunciados

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 Procurando determinar se a previsão se confirma ou não, para
justificar a nossa aceitação ou rejeição dos mesmos.

Ex.: Enunciado geral – “Todos os metais dilatam quando aquecidos.”


 Nunca terei oportunidade de aquecer todos os metais para verificar
se eles dilatam ou não quando aquecidos por isso…
 Única hipótese para colocar à prova este enunciado: extrair dele
uma previsão diretamente observável.
 Previsão – Se todos os metais dilatam quando aquecidos, então o
próximo pedaço de metal que eu aquecer também irá dilatar.

Karl Popper – Caráter falaciosos da lógica subjacente a este raciocínio:

 T= teoria ou enunciado geral a ser testado


P= previsão deduzida a partir do mesmo

(1) Se T é verdadeira, então P.


(2) Ora, P. Argumento inválido
(3) Logo, T é verdadeira.

 Corresponde à falácia da afirmação do consequente.

P é condição necessária para T, mas não nos diz que é uma condição
suficiente.
 Isto significa que o próximo pedaço de metal pode dilatar sem que
isso implique que seja verdade que todos os metais dilatem quando
aquecidos.
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O falsificacionismo
Karl Popper  crítico da conceção indutivista da ciência.

Objeções:

1. A observação não é o ponto de partida para a ciência – a observação


em ciência não é imparcial.
2. Problema da indução: por muito casos particulares não podemos
concluir uma lei geral.
3. A lógica subjacente à verificação experimental é falaciosa (falácia da
afirmação do consequente).

Karl Popper propõe uma nova abordagem ao método científico:


Método das conjeturas e refutações (3 etapas)
1º Problema
2º Conjetura
3º Refutação

1º Problema

A observação não pode ser o ponto de partida para a investigação


científica.

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Mandar alguém observar sem delimitar o seu campo de investigação é
completamente absurdo. = a observação é seletiva

2º Conjetura

Teoria/hipótese  palpite  apoiado nos nossos conhecimentos prévios

Suposição arrojada e imaginativa fundamentada

Características da conjetura
 Criativa
 Imaginativa
 Arrojada (= enfrenta as coisas (grande grau de falsificabilidade) 
posso correr riscos  ou seja, pode ser falsa  por isso, tem de ser
fundamentada.

3º Refutação (+/- = 3ºetapa do método científico)

Por mais que seja o número de casos que confirma uma hipótese

Pode aparecer um caso que contrarie  = colocar em causa

Se fizermos uma previsão a partir de uma teoria geral e essa previsão não
se confirmar, podemos concluir validamente que essa teoria é falsa.

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Popper propõe que se recorra a testes experimentais, não para confirmar
uma hipótese, mas para tentar provar a sua falsidade, ou seja, para a
tentar refutar.

 Estrutura lógica subjacente aos testes experimentais:

(1) Se T é verdadeira, então P.


(2) Não P. Modus Tolens  argumento
válido
(3) Logo, T é falsa.
A corroboração de teorias

 Qual é a importância de se tentar mostrar que uma teoria é falsa?

Popper responde…

 Uma vez provada a falsidade de uma conjetura, ela terá de ser


reformulada ou abandonada e substituída por uma melhor.
 Por outro lado, se os testes não provarem a sua falsidade, isso
significa que ela foi apenas corroborada (ter resistido aos constantes
testes que visam refutá-la).

Teoria corroborada  aceitar uma teoria como uma mera hipótese.

Provisoriamente verdadeira  é uma teoria que, tendo sido sujeita a


testes empíricos, ainda não foi refutada ou falsificada, mas pode vir a sê-
lo.

A ciência evolui de modo irregular através de uma aproximação


progressiva à verdade que resulta do afastamento sucessivo do erro.
ou seja,
Nunca podemos saber que uma teoria científica/conjetura é
conclusivamente verdadeira.

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 Á medida que vamos aprendendo com os erros que cometemos, o
nosso conhecimento aumenta, embora possamos nunca vir a saber.

O falsificacionismo de Popper: o problema da demarcação


- Distinguir o que é ciência do que não é ciência.
Para Popper  não servem para a ciência  método indutivo e o critério
da verificabilidade.
Motivos:
1. A ciência, se pretende ser racional e objetiva, tem de dispensar o
recurso à indução
2. Ao admitir a verificabilidade como critério de demarcação, acabaríamos
por admitir como científicas teorias que sabemos serem irrefutáveis e
pseudociências.

Popper  teoria que seja irrefutável  não é uma teoria científica  pois
não pode verdadeiramente ser posta à prova através de testes
experimentais.

Alternativa sugerida por Popper…


Critério da falsificabilidade: Podemos através da observação ver que a
teoria é falsa.

Uma teoria é científica só se é empiricamente falsificável.


Num gau elevado
ou seja,
Há teorias que tem uma maior possibilidade de serem falsas  maior
conteúdo empírico.

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Exemplo:
(previsão)

 Choverá ou não choverá amanhã.


 Se chover – verdadeiro
 Se não chover – verdadeiro
Não é possível de se mostrar falsa através da experiência  apenas se
trata de uma verdade lógica.

Graus de falsificabilidade
As melhores teorias são exatamente aquelas que nos fornecem mais
informações sobre o mundo e, consequentemente, fazem a ciência
progredir.
Exemplos de enunciados:

 Choverá ou não choverá no próximo ano.


 não é falsificável
Dicionário: P= amanhã chove aqui

P P V¬ P
V V V F
F F V V

 Choverá no próximo ano.


 menor grau de falsificável
 Choverá em Portugal no próximo ano.
 menor grau de falsificável
 Choverá no Porto na próxima semana.
 maior grau de falsificável
 mais específico = mais informação  maior conteúdo
empírico

Objeções ao falsificacionismo de Popper

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Nem todas as teorias científicas são falsificáveis
Falsificabilidade  não é uma condição necessária  para que uma dada
teoria passa a ser considerado científico.

já que,

algumas teorias se referem a objetos que não são diretamente observáveis

O falsificacionismo não está de acordo com a prática científica


Os cientistas  não tentam refutar as teorias aceites, mas,  confirmar as
suas teorias  mesmo quando as suas previsões não se confirmam.

Falsificações inconclusivas
Thomas Kuhn defende  existência de falsificações inconclusivas

 O facto de um procedimento experimental não decorrer de acordo


com o previsto numa dada teoria não é suficiente para estabelecer,
de um modo conclusivo, a sua falsidade.
pois,
O problema para o insucesso empírico pode estar no processo de
falsificação.

 Além da teoria existem vários fatores envolvidos num procedimento


experimental que podem conduzir ao seu fracasso:
 Hipóteses auxiliares A lógica subjacente ao
 Instrumentos utilizados falsificacionismo não é
tão robusta quanto à
 Fatores sociais e pessoais
primeira vista possa
parecer

Subestima a importância das confirmações no progresso científico

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Segundo Popper, nunca temos uma justificação racional para aceitar que
uma dada teoria científica é verdadeira, pois, na sua opinião, por muito
que uma teoria seja corroborada pela experiência, ela nunca deixa de ser
uma conjetura que pode vir a ser refutada.
Algumas teorias científicas possibilitaram grandes avanços tecnológicos 
temos justificação para acreditar que elas são verdadeiras e não apenas
conjeturas por refutar.
(Popper: uma teoria é sempre provisoriamente verdadeira.)

A racionalidade científica e a questão da objetividade


O problema da evolução da…

Ciência  Objetividade

Indutivismo Indutivismo
 A ciência progride rumo à verdade;  A ciência é objetiva;
 Através do raciocínio indutivo e da  A ciência é um processo estritamente
verificação experimental, a ciência racional;
progride de modo racional, linear e  A ciência fornece-nos uma imagem
cumulativa em direção a um cada vez mais próxima e ampla da
conhecimento mais amplo e realidade;
aprofundado da realidade tal como  Podemos saber que certas teorias são
objetivamente é. objetivamente verdadeiras.

Popper Popper
 A ciência progride de forma irregular  A ciência é objetiva;
por aproximação à verdade;  É objetiva sem abandonar o raciocínio
 A ciência evolui por eliminação do indutivo e a lógica da verificação
erro. experimental;
 A ciência é objetiva porque utiliza
processos rigorosos de falsificação.

Kuhn Kuhn
 A ciência é uma sucessão descontínua  A ciência não é totalmente15
objetiva;
e não cumulativa de períodos de  A ciência não é uma atividade
relativa estabilidade e consensos, estritamente racional;
Perspetiva de Popper…

 A ciência é uma atividade crítica;


 A ciência evolui por eliminação do erro, por aproximação da
verdade.
 (falsificacionismo) uma teoria é melhor do que a anterior se resistir
aos constantes testes de falsificabilidade que visam refutá-la.
 Critérios:
 Resolver alguns erros que a outra teoria colocava
 Evitar algumas falhas da outra teoria
 Explicar o que a outra não explicava

Verosímil: Comparando duas teorias, a melhor tem de implicar um menor


número de falsidades (menor número de erros) mas mais informação.

A perspetiva de Kuhn: a estrutura das revoluções científicas


1. Pré-ciência
2. Ciência normal
3. Crise
4. Ciência extraordinária
5. Revolução científica

Pré-ciência (período pré-paradigmático)

 Kuhn  existência de várias escolas/investigadores rivais 

apresentam diferentes perspetivas (desacordos)  impossibilita a


chegada a um consenso entre os mesmos de uma forma
concentrada.

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 Os investigadores  não são capazes de distinguir o que é acidental
e acessório do que é relevante  nada lhes permite garantir que a
sua investigação está no caminho certo.

Os diversos investigadores não parecem avançar muito além do ponto de


que partiram e a sua contribuição para o seu campo de estudos é quase
nula

-- Paradigma --

Paradigma: modelo teórico adotado por uma comunidade científica que


orienta toda a investigação.
Inclui:
 Orientações gerais (identificação dos fenómenos e dos problemas a estudar
sobre o trabalho a desenvolver no futuro)
 Aplicações-tipo (regras para aplicar o corpo teórico à realidade)
 Instruções e técnicas e metodologias (indicações acerca do método de
trabalho, do tipo de experiências a realizar, dos instrumentos a utilizar e do seu
funcionamento)
 Pressupostos teóricos e metafísicos (leis que são assumidas como
verdadeiras)
 Princípios metafísicos (informação sobre o tipo de identidades que existem
e as relações que estabelecem entre si)

Emergência paradigmática: é o aparecimento de um paradigma que


origina a passagem da fase pré-científica para a investigação científica
propriamente dita.
Comunidade científica: Um paradigma consiste numa teoria amplamente
aceite e com grande poder explicativo, que põe fim aos desacordos
existentes entre os investigadores e as escolas.

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Um paradigma oferece uma visão do mundo, uma forma de se fazer
ciência numa dada área.
podemos concebê-lo como
Modelo/matriz, disciplinar, adotado pela comunidade científica durante
um determinado período de tempo.

Ciência normal (ciência paradigmática)

 Entra-se numa nova fase do desenvolvimento científico depois da


emergência de um dado paradigma.
 Fase em que os cientistas se dedicam à aplicação e consolidação do
paradigma.

Tornando-o cada vez mais preciso, consistente e de acordo com a natureza

Função do cientista neste período: alargar o âmbito e o alcance do


paradigma
 Limita-se a resolver pequenos puzzles e enigmas
 Tentativa de melhorar a afinação entre a natureza e o paradigma
 Tentar estender o paradigma a novas áreas científicas que ainda não
foram descobertas/que não estavam previstas.
 Construção de equipamento adequado às exigências experimentais
de todos estes processos

Kuhn  aceitação quase dogmática (=não questionar; sem procurar


fundamentos/justificações) e acrítica  durante o período de ciência
normal  importância crucial para o desenvolvimento científico  só
assim se pode avançar na investigação sem se estar permanentemente a
rever os seus fundamentos.

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Apenas e só no interior de um dado paradigma é que se registam alguns
progressos cumulativos  o que significa  o paradigma vai ficando cada
vez mais informativo e explicando cada vez melhor os fenómenos
ocorridos.

A visão do cientista está focada  alcançando uma maior compreensão de


aspetos altamente específicos.

Crise (acumulação de anomalias)


Kuhn defende…

 Embora os cientistas não caminhem no sentido de questionar ou


pôr em causa a solidez dos pressupostos do paradigma, por vezes
“tropeçam” acidentalmente em acontecimentos que o paradigma
vigente não é capaz de explicar adequadamente ou que não estão
de acordo com aquilo que se observa na natureza.

Exemplo: quando o paradigma geocêntrico de Ptolomeu estava vigente, os


cientistas começaram a observar fenómenos que não encaixavam bem no
paradigma (como o movimento dos planetas).

 Trata-se de algo totalmente incompatível com a imagem do


funcionamento da natureza fornecida pelos paradigmas.

Exemplo: uma previsão que não se confirma em sucessivos e meticulosos


testes experimentais  anomalias
 As anomalias eram sempre resultados acidentais e inesperados.
 Perante uma anomalia, os cientistas não se predispunham a
abandonar de imediato o paradigma  atribuíam o erro a uma
falha no procedimento experimental.

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Kuhn  caráter profundamente avesso à mudança
ou seja,
A mudança de paradigma acarreta uma alteração significativa das regras
do jogo  implica que o cientista teria de aprender de novo o seu ofício.

Se o fracasso for particularmente persistente  a confiança no paradigma


vigente é naturalmente abalada e a ciência entra em crise.

Ciência extraordinária (= algo que não se estava à espera)

A existência de poderosas e numerosas anomalias começa a pôr em causa


o próprio paradigma  deixa de ser o modelo consensual de fazer ciência.

Nesse momento…

 Os acordos intersubjetivos estabelecidos entre os cientistas


desaparecem, e a comunidade científica divide-se em duas grandes
fações:
 Conservadores (defensores do velho paradigma): mantêm a
sua confiança no mesmo, tentando procurar soluções para as
falhas encontradas, independentemente do seu fracasso
sistemático.
 Revolucionários (defensores da adoção do novo paradigma):
procuram uma revisão completa dos fundamentos do seu
campo de estudo, de modo a traçar um novo paradigma
capaz de solucionar as anomalias anteriormente detetadas.

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Revolução científica

Revolução científica: processo de passagem, de abandono do velho


paradigma e de adoção do novo.

Exemplo: Revolução de 1974


 Iniciou com o descontentamento do povo pelo Antigo Regime
– uns apenas aceitaram;
– outros lutaram.

Mudança do Antigo Regime para a Democracia (completamente distintos)

Para Kuhn… Estes processos revolucionários não representam uma


evolução num sentido cumulativo  em direção a uma compreensão mais
profunda da realidade.

Kuhn sugere… Os cientistas orientados por paradigmas diferentes têm


mundos também diferentes e incompatíveis  não existindo um padrão
neutro  que permita julgar qual desses mundos está mais próximo da
realidade.

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A tese da incomensurabilidade dos paradigmas

Para Kuhn…

 Só podemos falar em progresso científico no interior de um dado


paradigma no período de ciência normal.
 É aí que o paradigma se vai tornando cada vez mais
ajustado à realidade

Tese da incomensurabilidade: Não existe uma medida comum, ou um


padrão neutro, que permita objetivamente estabelecer a superioridade de
um paradigma em relação a outro.

ou seja,
Não podemos dizer que o novo paradigma é mais objetivo que o outro.

Argumento baseado na insuficiência dos critérios objetivos

 Não conseguimos arranjar critérios razoáveis para dizer que um


paradigma é melhor que o outro

Critérios comuns para avaliar a adequação de uma teoria científica

Deve ser…

 Precisão: as consequências que podem ser deduzidas de uma teoria


devem estar em comprovada concordância com os resultados das
experiências e observações existentes.
 Consistência com ela e com outras teorias correntemente aceites e
aplicáveis a aspetos relacionados da natureza.
 Abrangência: as consequências de uma teoria devem estender-se
muito além das observações/leis, para as quais ela foi inicialmente
concebida.
 Simplicidade: ordenar fenómenos sem que se tornem confusos.
 Fecundidade: originar novas descobertas.

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 São condições necessárias, mas não suficientes para avaliar uma
teoria.
 Os critérios são imprecisos
 Não nos dizem qual paradigma é o melhor  não há
uma “hierarquização”.
 Interferência de fatores subjetivos no processo de adoção de um
novo paradigma:
 Experiência e as preferências pessoais, o prestígio
associado aos proponentes de um paradigma, os apoios
financeiros disponibilizados para o tipo de investigação
recomendado pelo paradigma.
Formulação do argumento:

(1) Se os paradigmas fossem comensuráveis, então seria possível


justificar a preferência por um paradigma através de critérios
puramente objetivos.
(2) Mas não é possível justificar a preferência por um paradigma através
de critérios puramente objetivos.
(3) Logo, os paradigmas são incomensuráveis.

Argumento baseado na impossibilidade de tradução entre paradigmas

Cada paradigma tem conceitos/palavras especificas  as mesmas palavras


noutro paradigma podem ter significados diferentes  não há uma
tradução objetiva e direta  variam de um paradigma para o outro.

 Não podemos saber se as teorias científicas atuais estão mais


próximas da verdade do que as suas antecessoras.

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Ex.: “massa” tem um significado diferente na teoria de Newton daquele
que possui na teoria de Einstein.

Kuhn conclui…

 Não há uma aproximação à verdade na mudança de paradigmas.


 As revoluções científicas, que são uma mudança de paradigma,
constituem episódios de desenvolvimento não cumulativo.
 Esta conclusão pode abalar seriamente a confiança que nós
depositamos no conhecimento científico.

Objeções à tese da incomensurabilidade de paradigmas de


Kuhn
Objeção baseada na resolução de anomalias
Baseia-se no facto de os novos paradigmas resolverem as anomalias dos
seus antecessores, podendo concluir-se que eles não são incomensuráveis.
(1) Se um paradigma resolve anomalias de outro, então é falso que os
paradigmas são incomensuráveis.
(2) Frequentemente um paradigma resolve as anomalias do seu
antecessor.
(3) Logo, é falso que os paradigmas são incomensuráveis.

 Conclui-se que se admitimos que o novo paradigma resolve


anomalias a que o anterior não consegue dar resposta
(=comensuráveis), então isso prova que os paradigmas não são
realmente incomensuráveis.

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Objeção baseada no crescente sucesso da ciência

Rejeita esta tese com base no crescente sucesso da ciência na previsão e


no domínio da natureza.

 Caso as teorias atuais não fornecessem uma compreensão mais


completa da realidade, esse crescente sucesso seria totalmente
incompreensível.
Formulação do argumento:
(1) Se os paradigmas são incomensuráveis, então não podemos dizer
que as teorias científicas atuais estão mais próximas da verdade do
que as suas antecessoras.
(2) Mas uma vez que as teorias científicas atuais têm uma maior
capacidade de prever o comportamento da natureza do que as suas
antecessoras, podemos considerar que estão mais próximas da
verdade do que as suas antecessoras.
(3) Logo, os paradigmas não são incomensuráveis.

Os opositores, no geral, se recusam a aceitar que o progresso científico se


limita ao aperfeiçoamento do paradigma no período da ciência normal 
que pode ser interrompida por uma revolução científica da qual resulta a
substituição por um paradigma novo e incomensurável.

Características fundamentais:
1. A ciência é influenciada por fatores objetivos e subjetivos.
2. Retrato de um cientista: solucionador de puzzles, comprometido
com uma determinada visão do mundo, ditada pela sua adesão a
um paradigma.
3. Uma fase da ciência, em que a fé e a convicção depositadas no
paradigma se aproximam do fanatismo  profunda resistência à
mudança  mesmo na presença de inquietantes anomalias.

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