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E MODOS
Quando o som se propaga em espaço aberto, tudo é muito simples. As ondas avançam e se
afastam de sua origem; podem ser refletidas, dispersadas, absorvidas por superfícies que
encontram, mas os fenômenos acústicos se resumem a ecos e cancelamentos.
Em locais pequenos e fechados, porém, a vida se complica, pois as ondas sonoras se tor-
nam grandes em comparação com o tamanho dos ambientes. Suponhamos que, numa sala
com 3,44m de comprimento, é gerada uma freqüência de 50Hz. Como a velocidade do som
é de 344m/s, o comprimento da onda desta freqüência será de 344 ÷ 50 = 6,88m. Qual será
o comportamento da onda dentro da sala? A onda nasce em uma extremidade da sala, e
segue em direção à outra extremidade. Quando está na metade de seu ciclo, tendo percor-
rido metade de seu comprimento (ou seja, 3,44m), encontra a outra parede, e é refletida de
volta. O que acontece? As velocidades de ida e de volta, iguais mas de direções opostas, se
anulam, e as variações de pressão permanecem paradas, ou estacionárias, dentro da sala
(fig. 1). Vemos que, nas extremidades da sala, temos a máxima pressão (áreas escuras),
enquanto na metade da distância, temos pressão mínima, isto é, silêncio (áreas claras).
Se a freqüência for o dobro, isto é, igual a 100Hz, teremos uma
onda completa “presa” dentro da sala: em uma extremidade te-
remos pressão máxima; a 1/4 do comprimento teremos pressão
mínima, na metade teremos novamente pressão máxima; a 3/4 do
comprimento teremos outra zona de pressão mínima, e na outra
extremidade teremos pressão máxima. Veja a fig. 2.
Para cada múltiplo ou harmônico da freqüência da estacionária
mais grave (no caso, 50Hz), haverá uma estacionária. A fig. 3 Figura 1
mostra as estacionárias no terceiro e no quarto harmônico, para o
comprimento da nossa sala hipotética.
Freqüência de Schroeder
Acima de uma freqüência, denominada freqüência de Schroeder,
as ondas estacionárias se tornam pequenas em relação ao tama-
nho da sala, perdendo sua importância na acústica do ambiente. A
freqüência de Schroeder é calculada pela seguinte fórmula:
Figura 2
3 v som
fS
Dmin
onde vsom é a velocidade do som e
Dmin é a menor dimensão da sala.
Na prática, acima de 300Hz, a impor-
tância das estacionárias para a acús-
tica da sala diminui muito, portanto
geralmente basta calcular até essa
freqüência. Figura 3
Modos axiais
Os modos contidos entre duas paredes paralelas, como estamos estudando, são chamados
modos axiais, já que correspondem a distâncias iguais aos eixos da sala.
Para cada uma das três dimensões do ambiente – comprimento, largura e altura – existe
uma correspondente “família” de modos axiais, que vão desde as freqüências mais baixas,
cujos comprimentos de onda são o dobro de cada dimensão da sala, até a freqüência de
Schroeder, onde se pára de considerar os modos. Os modos de cada dimensão produzem
efeito ao longo dessa dimensão, como vimos nas figuras de 1 a 3: os modos corresponden-
tes ao comprimento produzem variações de pressão sonora ao longo do comprimento, e
assim por diante.
Na fig. 4, vemos os dois primeiros modos axiais correspondentes à largura de uma sala.
Semelhantemente, na fig. 5 vemos os dois primeiros modos axiais correspondentes à altura
da sala.
Naturalmente, existem muitos modos
axiais, correspondendo às “famílias”
de harmônicos das três dimensões
da sala. O estudo dos modos é, ge-
ralmente, feito dividindo-se a faixa de
áudio de 20Hz a 300Hz em bandas
de 1/3 de oitava, de modo que, dentro
de cada uma destas bandas, podem
aparecer modos oriundos de diferen-
Figura 4
tes dimensões.
Por exemplo, para a sala das figuras
4 e 5, se tomarmos a banda de 100Hz
(que vai de 89,1 Hz a 112,2 Hz), tere-
mos dentro dela dois modos axiais: um
de 90,5Hz, correspondente à altura de
1,90m, e um de 100Hz, corresponden-
do ao segundo harmônico do modo do
comprimento (2 × 50Hz). Veja a fig. 6.
Figura 5
Modos tangenciais
Além da óbvia direção axial das esta-
cionárias, em que elas se estabelecem
entre paredes paralelas, há uma outra
forma de propagação: as ondas se
refletem entre quatro paredes forman-
do um plano. Este tipo de estacionária
é chamado tangencial, e os modos
produzidos por ela são também cha-
mados modos tangenciais. Figura 6
Modos oblíquos
Uma onda pode também, para completar (e com-
plicar!) ser refletida entre todas as dimensões
de uma sala, numa seqüência do tipo: frente
esquerda teto fundo chão direita
frente. Da mesma maneira que nas estacionárias
tangenciais, cada trecho contém um número in-
teiro de meios comprimentos de onda, permitindo
assim a formação de estacionárias entre as seis
superfícies da sala, denominada estacionárias
oblíquas. Veja a fig. 9.
Os modos oblíquos também fazem parte da acús- Figura 7 - Trajetória de
tica de um ambiente, embora com menor importância. uma estacionária tangencial
Cálculo Modal
Muitas vezes, ao ouvir música, você percebe que algu-
mas notas do contrabaixo ou outro instrumento grave
soam muito mais altas do que outras. É claro, pode ser
defeito de sua caixa acústica, do instrumento ou até do
músico, mas – provavelmente – o defeito é mesmo da
sua sala. Maus modos podem criar uma resposta de
graves extremamente deficiente e desagradável, com al-
gumas notas que ressoam e sobressaem, e outras que
mal se ouvem, dependendo do local na sala.
Figura 8 – pressões de uma
Quanto menor uma sala, mais sérios são os proble- estacionária tangencial
mas com modos, pois as freqüências das estacionárias
estão mais afastadas entre si, criando
trechos na banda de graves com pou-
cos modos e baixa pressão, e outros
trechos com modos acumulados e alta
pressão sonora. Em ambientes de
grandes dimensões, há estacionárias
em todo o espectro de áudio e a res-
posta acústica da sala é normalmente
muito melhor. Usando a fórmula de
Schroeder, podemos afirmar, por exem-
plo, que uma sala cuja menor dimen-
são é de 20,6 metros não tem modos
acima de 50Hz, o que significa uma
resposta acústica excelente. Figura 9 – trajetória de
uma estacionária oblíqua
Modos axiais
Para calcular as freqüências dos modos axiais de uma sala, usamos as fórmulas:
c m c p
fx ; f y c n ; fz ,
2 x 2 y 2 z
m, n, p 5m 4m 3m
1 34,4 43,0 57,3
2 68,8 86,0 114,7
3 103,2 129,0 172,0
4 137,6 172,0 229,3
5 172,0 215,0 286,7
6 206,4 258,0 —
7 240,8 — —
8 275,2 — —
Modos tangenciais
Para calcular os modos tangenciais, usam-se as fórmulas:
2 2 2 2
c m n
2
c m p c n p
2
2 2 2
c m n p
fxyz ;
2 x y z
fxyz
2 x y z
Se, por exemplo, quisermos calcular os modos axiais em x de uma sala, basta igualar a zero
os valores dos coeficientes n e p, correspondentes às outras dimensões, e a fórmula, depois
de simplificada, voltará a ser a fórmula simples do modo axial:
2 2 2 2
c m 0 0 c m c m
fx
2 x y z 2 x 2 x
O cálculo de todos os modos de uma sala até a freqüência de Schroeder ou até 300Hz é
extremamente trabalhoso e repetitivo para ser feito com calculadora ou à mão. Se a sala é
grande, várias centenas de modos vão aparecer, tornando a tarefa quase impossível.
O mais prático é usar o computador, que faz todo esse trabalho quase instantaneamente
através de um software especializado ou planilha de cálculo adequada.
O que calcular
A primeira tarefa é calcular as freqüências de todos os modos até a freqüência de Schroeder
ou até 300Hz, e colocá-los em ordem crescente, numa lista e/ou num gráfico. Este gráfico
indicará, além da posição dos modos ao longo do eixo das freqüências, coincidências (dife-
renças de menos de 1Hz) entre modos. Será interessante, também, informar qual o tipo de
cada modo (axial, tangencial ou oblíquo).
As bandas ISO
A tabela a seguir mostra as freqüências centrais e as freqüências extremas das bandas ISO.
Critérios de Bonello
Algumas regras devem ser seguidas para que os modos de uma sala contribuam para uma
acústica equilibrada. Os Critérios de Bonello resumem o que se deve obter do relacionamen-
to entre os modos de uma sala:
Critérios de Bonello
1. O número de modos por banda deve aumentar com a freqüência. Na pior hipótese,
pode-se manter constante por 2 bandas, mas nunca diminuir com a freqüência.
2. Se houver dois modos coincidentes numa banda, deve haver pelo menos mais três
modos não coincidentes na mesma banda para que isso seja aceitável.
3. Três modos coincidentes numa mesma banda são sempre inaceitáveis.
Figura 14
Vamos, então, voltar à altura original de 2,90m, e tentar modificar a largura da sala. Para
nossa decepção, não há largura que conserte a acústica desta sala – a queda em 80Hz
permanece lá! Veja a fig. 15, onde a largura foi reduzida para 3,20m e o aspecto da curva
pouco mudou.
Nossa terceira tentativa será em reduzir o comprimento. Reduzindo para 4,75m, a melhora é
imediata (fig. 16). Com a redistribuição dos modos, o “pico” em 63Hz se reduz, e a curva se
suaviza consideravelmente. Neste ponto, a sala já está aceitável.
Figura 16
Figura 17
O que fazer?
A rigor, não existe solução decente para este caso. O melhor, ou o menos ruim, seria insta-
lar absorvedores de baixa freqüência, fortemente sintonizados em 63Hz, em todas as su-
perfícies possíveis do quarto-estúdio, de maneira a evitar a formação das três estacionárias
nessa banda (58Hz, 63Hz e 66Hz). O local teria fraca resposta de graves, mas pelo menos
não teria “altos e baixos” na resposta. Para melhorar os graves, use um equalizador gráfi-
co... por sua conta e risco.