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Intervenção Psicológica em Vítimas e Ofensores I

1º SEMESTRE
AULA 5
TERAPIA CONGITIVO-COMPORTAMENTAL
Pressupostos básicos:

 O pensamento disfuncional, que influencia o humor e o comportamento, é comum a todas


as patologias.
o Aprender a avaliar os pensamentos de forma realista e adaptativa permite melhorar
o estado de humor e comportamento.
o Os terapeutas trabalham num nível cognitivo profundo- as crenças básicas dos
clientes acerca de si próprios, do mundo e dos outros- para promover mudanças
duradouras.
Princípios da Terapia Cognitivo-Comportamental:

 A terapia cognitivo-comportamental baseia-se numa formulação clínica individual dos


clientes sempre em desenvolvimento.
 Requer uma aliança terapêutica bem estabelecida.
 Enfatiza a colaboração e participação ativa do cliente.
 É orientada para os objetivos e focada na resolução dos problemas.
 É educativa, pois pretende ensinar o cliente a ser o seu próprio terapeuta, e enfatiza a
prevenção da recaída.
 Pretende ser limitada no tempo.
 As sessões são estruturadas.
 Ensina os clientes a identificar, avaliar e responder aos seus pensamentos e crenças
disfuncionais.
 Usa uma grande variedade de técnicas para modificar pensamentos, humor e
comportamento.
Desenvolver a relação terapêutica

 Demonstrar competências de atendimento e de compreensão adequadas.


 Partilhar a conceptualização e plano de tratamento.
 Tomar decisões colaborativamente.
 Procurar feedback.
 Ajudar os clientes a resolver problemas e aliviar o mal-estar psicológico.

MODELO COGNITIVO

 Defende que numa situação/evento específico, existem pensamentos automáticos que


levam a uma reação por parte da pessoa, seja ela, uma reação emocional,
comportamental ou fisiológica.
 Pensamentos Automáticos
o Surgem espontaneamente, ou seja, não são o resultado de um pensamento
racional, e têm como características a sua brevidade e rapidez.

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o Habitualmente temos maior consciência das emoções e comportamentos
subsequentes, do que dos pensamentos automáticos.
o São pensamentos aceites sem crítica e que são tidos como verdadeiros.
 Atitudes, regras e assunções
o As crenças centrais influenciam o desenvolvimento de uma classe intermédia de
crenças, as atitudes, regras e assunções.
o Estas surgem porque as pessoas fazem sentido do ambiente que as rodeia desde
cedo, organizando a sua experiência de forma coerente para responderem
adaptativamente. As suas interações com o mundo e com os outros, influenciadas
pela predisposição genética, conduzem ao desenvolvimento de determinadas
crenças, que podem variar em termos de precisão e funcionalidade. Estas crenças
podem ser “desaprendidas”, desenvolvendo novas crenças baseadas na realidade e
mais funcionais.
o O terapeuta promove a identificação das crenças que estão mais perto do nível
consciente, e o distanciamento:
 Só porque acredita em algo não significa que é verdade.
 A mudança de pensamento no sentido de maior realismo e funcionalidade
ajuda-o a sentir-se melhor e a atingir os seus objetivos.
 Crenças centrais
o Desde a infância que as pessoas desenvolvem ideias acerca de si porpiás, dos
outros e do mundo.
o As crenças básicas são entendimentos profundos e basilares que não são
articulados pois são tidas como verdades absolutas (“é a minha maneira de ser”).
o As crenças centrais são globalizantes, rígidas e sobregeneralizadas.
 Baseado nas crenças e nos pensamentos automáticos surge a ideia de que ao temos uma
crença central e esta estiver associada a crenças intermédias, perante uma situação
iremos ter pensamentos automáticos e estes irão desencadear uma reação (emocional,
comportamental, fisiológica).

EFEITOS DA VIOLÊNCIA
Psicológicos:

 Auto-estima
 Vergonha, culpa, embaraço
 Depressão, ansiedade
 Tentativas de suicídio

Físicos:

 Insónia
 Cansaço
 Distúrbios psicossomáticos
 Hiperatividade
 Dependência química

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Sociais:

 Isolamento
 Estigmatização
 Desconfiança
 Dificuldades de resolução de problemas

PORQUÊ A ABORDAGEM COGNITIVO-COMPORTAMENTAL?

 É breve e de tempo limitado, incentivando os pacientes a desenvolver competências de


auto-ajuda.
 É estruturada e diretiva e baseia-se numa cooperação terapêutica sólida, sendo o paciente
explicitamente identificado como um parceiro com iguais atribuições numa abordagem de
equipa que tem por objetivo a solução de problemas.
 Dirige-se para o problema e está concentrada nos fatores de manutenção das dificuldades
(e não nas suas origens).
 Está dependente de um processo de questionamento e descoberta orientada ou guiada (e
não de persuasão).
 Baseia-se em métodos indutivos, de forma que os pacientes aprendam a considerar
pensamentos e crenças como hipóteses cuja validade se presta a ser testada.

RACIONAL DA INTERVENÇÃO

 Não são as situações que nos fazem sofrer, mas a interpretação que nós fazemos delas.
 Responsabilização é diferente de culpabilização.
 O objetivo é ajudar as clientes a tornarem-se mais autónomas.
 Baseado em aprendizagem de novas formas de lidar com os problemas associados à
violência sofrida.
o Acabar com a violência também é uma aprendizagem.
 Intervenções comportamentais: os comportamentos aprendidos noutros contextos podem
não ser úteis no presente.
o Mudar alguns comportamentos trará mudanças no contexto em que a violência
ocorre.
 Intervenções cognitivas: os pensamentos automáticos, crenças e atitudes mantêm os
comportamentos, que por sua vez mantêm o contexto de violência.
o Ex. ideias sobrevalorizadas de responsabilidade (culpa) interferem na assertividade
e na defesa dos próprios direitos, o que deixa a mulher mais vulnerável na relação.

PROTOCOLO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

 Dirige-se a mulheres vítimas de violência conjugal, quer se encontrem ou não na relação


abusiva.

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 Terapia individual para mulheres vítimas de situações de violência física e/ou psicológica
manifestadas no âmbito de uma relação íntima heterossexual (ex. namoro, união de facto,
casamento).
 Objetivos centrais:
o Ajudar a mulher a desenvolver formas de pensar, de sentir e de se comportar mais
eficazes para controlar a sua vida e lidar com a situação abusiva.
o Compreender de que modo as experiências anteriores (que podem ter carácter
traumático), as normas sociais acerca de papéis de género e o impacto da violência
se repercutem nas perceções, sentimentos e comportamentos da vítima.
o Desenvolvimento de competências das mulheres no sentido de lidar com a situação
abusiva e de controlar as suas vidas de forma efetiva.
 Estrutura:
o Módulos:
 Avaliação; promoção do controlo da ansiedade e reações à vitimação;
identificação, análise e alteração de crenças disfuncionais; promoção do
empoderamento; avaliação final.
 Módulo opcional: redução da sintomatologia de stress pós-traumático.
o A ordenação dos módulos de intervenção pode e dever ser reestruturada de acordo
com as necessidades da mulher e da formulação clínica do caso.
o O número de sessões também pode ser flexibilizado de acordo com o progresso,
prevendo um número médio de 12 a 16 sessões.
 Objetivos específicos:
o avaliar o risco, estabelecer a segurança pessoal da mulher e promover a sua
capacidade de avaliar o risco;
o diminuir os sentimentos de incapacidade e desvalorização pessoal, pela
identificação e modificação das cognições disfuncionais sobre si e os outros;
o aprender a identificar estados emocionais, relacionando-os com os pensamentos e
respostas comportamentais respetivas, de forma a identificar e analisar padrões de
funcionamento disfuncionais;
o promover a aquisição de competências de confronto e de resolução de problemas
para lidar com situações geradoras de ansiedade;
o aprender a percecionar de forma mais efetiva os eventos de vida e a desenvolver
respostas comportamentais adequadas;
o perceber quais as crenças que mantêm o ciclo de violência e como o perpetuam, e
considerar as suas implicações, inclusive no que se refere à tomada de decisões,
como sair da relação abusiva;
o reconstruir a forma de a mulher se perceber, promovendo o seu autoconceito;
o fomentar atitudes que promovam e mantenham o suporte social;

MÓDULO I: AVALIAÇÃO

 Questionários:
o Inventário de Violência Conjugal;
o Escala de Crenças sobre a Violência Conjugal;

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o Inventário de Sintomas Psicopatológicos;
o Inventário da Depressão de Beck;
o Escala de Avaliação da Resposta ao Acontecimento Traumático- Adultos;
 Entrevista semiestruturada proposta por Matos:
o avaliação do funcionamento global da vítima (a nível individual e conjugal) e da
vitimação (a nível do risco de revitimação e da sintomatologia e impacto
provocados).
 Elaboração do plano de segurança e avaliação e gestão do risco.
 Normalizar a experiência de vitimação.
o Informar a mulher sobre o crime de maus tratos conjugais (ex. causas, dinâmicas,
consequências, enquadramento legal, prevalência)
o Informar sobre a natureza e características da sintomatologia
 Definir os objetivos terapêuticos (acordados em função das necessidades da mulher).
 Explicar o racional da intervenção (ex. confidencialidade, fases e procedimentos,
importância dos trabalhos de casa, papel do terapeuta e da vítima).

MÓDULO II: PROMOÇÃO DO CONTROLO DAS REAÇÕES À VITIMAÇÃO

 Objetivos:
o compreender a natureza da ansiedade;
o diminuir a ativação gerada pela vitimação;
o promover o autocontrolo;
o facilitar o retomar de atividades quotidianas comprometidas (ex. emprego, contactos
sociais);
o ajudar a lidar com as novas exigências, por exemplo, face à saída de casa e a
procedimentos judiciais (ex. queixa, deslocação a tribunal);
 Processo de treino de inoculação do stress:
o Fase educacional
 Informar a mulher acerca da natureza da ansiedade e dos medos, e seus
efeitos, inclusive explicando a forma como estes estão relacionados com a
vitimação e como se costumam expressar em termos fisiológicos, cognitivos
e comportamentais.
 Em que situações sentiu ansiedade? O que pensou? O que fez?
 O terapeuta deve questionar sobre estímulos que passaram a suscitar medo
(ex. certas expressões do marido) e os medos identificados são propostos
como alvo de intervenção.
 As técnicas de confronto ajudam, portanto, a ultrapassar estes medos e a
funcionar adequadamente em situações geradoras de ansiedade.
 Adverte-se que a ansiedade não será eliminada (pois exerce determinadas
funções em situações adaptativas) e que se pode esperar que aumente em
certas situações (ex. relativas ao sistema judicial) mas que diminua
naturalmente.

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 Necessidade de lidar com a situação para que a ansiedade diminua e para
obter controlo sobre o estímulo temido, obviamente quando este não envolve
risco para a segurança pessoal.
o Aquisição e aplicação de competências de confronto
 Identificação das estratégias de confronto e os mecanismos pelos quais
funcionam; demonstração da competência e a sua aplicação na sessão, para
ser transferida para as situações específicas através da tarefa de casa.
 Respiração e relaxamento muscular
 Treino de autoinstrução
 A mulher é treinada a focar-se no seu diálogo interno e a identificar
autoafirmações irracionais, e aconselhada a substituí-las por auto-
verbalizações mais adequadas, seguindo as fases propostas por
Gonçalves: identificar auto-verbalizações de confronto para situações
específicas; instrução externa aberta; e autoinstrução aberta, esbatida
e coberta.
 Paragem de pensamento
 interromper pensamentos ruminativos (ex. “não presto como mulher”,
“tenho culpa do que está a acontecer”) e dar controlo à vítima sobre os
mesmos.

MÓDULO III: IDENTIFICAÇÃO, DEBATE E ALTERAÇÃO DE CRENÇAS DISFUNCIONAIS


ACERCA DA VITIMAÇÃO

 Objetivos:
o identificar, debater e desafiar crenças disfuncionais sobre si, os outros e o mundo;
o validar os seus direitos, compreender a dinâmica da vitimação e o seu papel de
vítima (passo inicial para a responsabilização do agressor);
o diminuir a tolerância para com o uso de qualquer tipo de violência;
o perceber o conceito e os significados associados aos desempenhos tradicionais de
género e as crenças associadas à legitimação da violência.
 Reestruturação cognitiva
o Significado da vitimação
 Para a próxima sessão, escreva pelo menos uma página sobre o que
significa para si a experiência de violência conjugal. Considere os efeitos que
esta teve sobre as ideias acerca de si, dos outros e do mundo. Considere
também os tópicos: segurança, confiança, poder, autoestima e intimidade.
o Auto-monitorização
 apoiar a vítima na identificação dos pensamentos automáticos negativos,
caracterizando-os como sendo espontâneos e que tendem a parecer
verosímeis, de maneira que não são frequentemente questionados acerca da
sua plausibilidade.
 registo diário das situações geradoras de mal-estar, no qual se identificam os
pensamentos automáticos.
o Debate cognitivo

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 Os pensamentos automáticos negativos são, então, desafiados e
transformados em pensamentos alternativos, recorrendo à análise de
evidências:
 listar evidências a favor e contra este pensamento; identificar
consequências positivas e negativas de manter este pensamento;
listar consequências positivas e negativas de modificar este
pensamento por outro menos absoluto, mais adaptativo e realista;
identificar pensamentos alternativos; e classificar as evidências a favor
dos pensamentos alternativos.
o A técnica da seta descendente é muito útil para questionar
sobre os pensamentos negativos até às crenças centrais (ex. e
se a separação acontecer? E se ficar sozinha com os filhos a
seu cargo? E se o seu companheiro se envolver numa outra
relação?).
o A descatastrofização pode apoiar na procura de soluções face
ao cenário pior possível imaginado (ex. O que se pode fazer a
partir daí? Como gerir a situação dos filhos? A quem recorrer
para apoio?).
 É importante enfatizar a imperativa necessidade de desenvolver respostas
racionais mais realistas e adaptativos após o debate cognitivo.
 À medida que o debate acerca dos pensamentos automáticos negativos se
desenvolve, o terapeuta vai progressivamente ter acesso às crenças centrais
que guiam a interpretação das experiências das mulheres.
 “eu não posso falhar”, “tenho que ser boa esposa”, “se não for perfeita,
não mereço ser amada”.
 Este “livro de regras” de processamento originam os erros cognitivos,
que se revelam nos pensamentos automáticos negativos, e têm a sua
origem nos esquemas desadaptativos.
 Estes esquemas são formados ao longo da socialização e das
relações precoces, tendendo a ser reforçados ao longo do tempo, pois
restringem a interpretação das experiências de vida.
o A última fase da reestruturação cognitiva deve desejavelmente
obedecer à identificação e desafio das crenças centrais.

MÓDULO IV: PROMOÇÃO DO EMPODERAMENTO

 Objetivos:
o identificar e valorizar as capacidades da mulher;
o promover a autovalorização e o relacionamento social;
o potenciar um funcionamento normal, estruturar as atividades diárias e os contactos
sociais.
 Processo de empoderamento
o Valorização das capacidades pessoais
 Fornecer à mulher um documento em branco, em que apenas se instrui para
que sejam listadas algumas capacidades que identifica nas mulheres que
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lidaram com situações semelhantes à sua, e que depois se apresente um
outro no qual se solicita que de entre as capacidades listadas identifique as
que estão presentes no seu caso.
 O terapeuta deve, de seguida, colocar várias questões com o intuito de:
 identificar e caracterizar capacidades (ex. Quais as suas capacidades
mais fortes agora? Porquê? Quando é mais provável usá-las?)
 concretizar a sua utilização (ex. Como é que estas capacidades a
podem ajudar a enfrentar os obstáculos? Que pessoas ou situações a
podem ajudar a revitalizar essas capacidades?)
 comparar as capacidades atuais com as anteriores (ex. Como se
encontram hoje as capacidades de outrora? Entorpecidas, em
revitalização ou a ser usadas de modo diferente?);
 promover a sua generalização para outros momentos do tempo ou
contextos de vida (ex. Como pode redescobrir ou reativar capacidades
passadas?)
o Mobilização da rede de suporte social
 debater a relevância desta estratégia;
 discutir hipóteses sobre as reações dos outros e as consequências das
experiências interpessoais;
 identificar possíveis fontes de suporte;
 apoiar na (re)ativação desses contactos;
o Treino de resolução de problemas
 orientação geral face ao problema;
 definição e identificação do mesmo;
 criação de alternativas de resposta ao problema, custos e benefícios
associados, e eventuais obstáculos;
 tomada de decisão;
 implementação e verificação da eficácia;
 manutenção e generalização;

MÓDULO OPCIONAL: REDUÇÃO DA SINTOMATOLOGIA DE STRESS PÓS-TRAUMÁTICO

 Objetivos:
o compreender a natureza da sintomatologia de PPST, as suas origens e dinâmicas
associadas;
o partilhar e explorara as experiências traumáticas num contexto seguro;
o reduzir a sintomatologia associada às experiências traumáticas;
o incrementar o funcionamento global;
 Técnicas e procedimentos apresentados noutros módulos, destacando-se: a
psicoeducação, o treino de inoculação do stress, a aquisição e treino de competências de
confronto (ex. respiração e relaxamento muscular), a reestruturação cognitiva, a
valorização de capacidades, a mobilização da rede de apoio social e o treino de resolução
de problemas.
 Acrescenta-se, também, uma nova dimensão relativa à exploração do trauma, cujo objetivo
central é proporcionar um momento exclusivo, num ambiente de receptividade e
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segurança, em que a mulher possa identificar as situações eventualmente traumáticas e
explorar as vivências que mais a inquietam. O terapeuta deve, portanto, fazer uso das suas
competências de escuta ativa e de estabelecimento de uma relação empática e de suporte.

MÓDULO V: AVALIAÇÃO FINAL

 A avaliação final compõe-se de uma última sessão e duas de follow-up, e visa:


o Prevenir a recaída e consolidar as competências aprendidas;
o Aferir os resultados finais e a evolução do processo;
o Identificar os aspetos centrais da terapia;
 Última sessão: prevenção da recaída, revendo as capacidades atuais de identificação de
sinais de eventual risco e as competências cognitivo-comportamentais adquiridas,
nomeadamente as de coping em relação à sintomatologia.
 Nas sessões de follow-up (após 1 mês e 6 meses da última sessão) procede-se à
readministração das medidas quantitativas, para avaliar os resultados finais e monitorizar a
manutenção, ou não, dos ganhos conseguidos. Além disso, questiona-se a mulher acerca
da sua perceção sobre o processo terapêutico, sobre as mudanças ocorridas e sobre a
forma de as manter.

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QUADRO-RESUMO

AULA 6
INTERVENÇÃO EM GRUPO- PORQUÊ?

 Crescente solicitação de apoio por parte das vítimas.


 Desenvolvimento de soluções equilibradas em termos de custo-eficácia.
 Facilidade de implementação a nível institucional.
 É a mais utilizada com mulheres vítimas de violência na intimidade

o Por ser breve


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o Quadros teóricos: feminista, suporte social, psico-educacional, cognitivo-
comportamental.

VANTAGENS DA INTERVENÇÃO EM GRUPO

 Quebrar o isolamento.
 Validar a experiência, receber informação, dar e receber suporte (ex. emocional).
 Perceber que o seu problema não é único.
 Perceber formas alternativas de lidar com a situação.
 Fornecer suporte social.
 Apoiar a tomada de decisões.

EFICÁCIA DA INTERVENÇÃO EM GRUPO

 Na recuperação do controlo sobre a vida da mulher.


 Na diminuição da violência que experienciam.
 No aumento da autoestima, das competências pessoais e sociais.
 Na diminuição da raiva e da depressão.
 Na promoção de alterações positivas de atitudes face ao casamento e à família.
 Na diminuição da tolerância ao abuso a que estão expostas.
 Na consolidação dos resultados construídos a nível individual.

OBJETIVOS GENÉRICOS
A intervenção em grupo visa, genericamente, promover:

 A redução do isolamento.
 O aumento da auto-estima e do auto-conceito.
 A planificação da segurança pessoal.
 A educação acerca do ciclo da violência.
 A promoção da tomada de decisão.
 A resolução de problemas.
 A consciencialização acerca do papel feminino e masculino na sociedade.
 O treino da assertividade.
 O empoderamento.

MANUAL PARA PROFISSIONAIS

 Pretende orientar os/as profissionais da área na preparação, planeamento e


implementação de grupos com mulheres vítimas.
 Deve ser usado por profissionais especializados/as.
 Prevê monitorização dos resultados a um nível individual.
 População-alvo
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o Mulheres que se encontram em situação de violência conjugal ou que saíram
recentemente de uma relação abusiva.

A IMPLEMENTAÇÃO DA INTERVENÇÃO EM GRUPO: O/A FACILITADOR/A

 O papel do/a facilitado/a


o Durante a implementação do grupo:
 Assegurar um ambiente seguro, protetor, suporte e de aceitação
 Ser empático
 Promoção do debate construtivo e interativo entre as participantes
 Ter confiança no potencial de mudança e nas aptidões das participantes
 Promover o empowerment e suporte mútuo dentro do grupo
 Apoiar a tomada de decisão das participantes
 Promover o respeito pela heterogeneidade dentro do grupo.

A IMPLEMENTAÇÃO DA INTERVENÇÃO EM GRUPO

 Definir o objetivo
 Decidir sobre as participantes
 Proceder ao recrutamento
 Delinear a logística
 Estabelecer os/as facilitadores/as
 Definir racional, formato e guidelines
 Avaliação das mudanças (processo e eficácia)

A IMPLEMENTAÇÃO DA INTERVENÇÃO EM GRUPO: PARTICIPANTES

 8-12 participantes
 Critérios de inclusão:
o Tipo de relação
 Estar atualmente na relação violenta
 Ter saído de uma relação violenta nos últimos 6 meses
o Idade (18-65 anos)
o Estado civil (indiferenciado)
o Estatuto socioeconómico (indiferenciado)
 Critérios de exclusão
o Evidência de problemas psiquiátricos (ex: perturbações de personalidade,
depressão grave)
o Indícios de ideação e comportamento suicida
o Problemas associados ao abuso de substâncias
 Triagem
o Entrevista individual semi-estruturada

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o Início do processo de desenvolvimento de confiança entre o/a facilitador/a e as
potenciais participantes.
 Avaliação do risco individual.
 Analisar as condições de intensificação ou perpetuação do problema (ex: o que faz manter-
se ou agravar-se).
 Identificar os recursos pessoais para lidar com o problema (capacidade para gerar
mudança, rede primária e secundária, grau de isolamento social e familiar).
 Procurar definir o tipo de impacto presente na situação (psicológico, legal, social,
económico ou outros).
 Verificar se existe história prévia de agressões frequentes e com consequências graves
que conduziram a vítima a procurar ajuda médica.
 Desenvolver um plano de segurança para o grupo.

IMPLEMENTAÇÃO DO GRUPO

 Cariz psico-educativo e cognitivo-comportamental.


 8 Sessões semanais:
o Significação das dinâmicas íntimas violentas (2 sessões);
o Aquisição de competências pessoais, relacionais, e sociais (4 sessões);
o Promoção de relações íntimas saudáveis (2 sessões);
 90 minutos por sessão.
 Monitorização dos resultados terapêuticos (pré-teste, pós-teste, follow-up).

OBJETIVOS

 Compreender as dinâmicas da violência e dos seus efeitos (ex: culpa, tristeza).


 Identificar background social e cultural que legitima a violência.
 Promoção de competências pessoais e sociais (ex: autoestima, assertividade, tomada de
decisão).
 Prevenção da violência nas relações futuras.
 Consolidação das mudanças.

DIFICULDADES PREVISTAS

 Vitimação institucional.
 Dificuldades externas (ex: ausência de apoio formal, problemas ou atrasos nas medidas
judiciais).
 Adesão, assiduidade e participação ativa das participantes.
 Filhos das vítimas (ex: garantir apoio durante as sessões).
 Potencial conflito entre as obrigações legais e o processo de ajuda por parte do técnico.
 Burnout dos/as facilitadores/as.

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NOTA IMPORTANTE

 Trata-se de um trabalho multidisciplinar em rede


o Articulação com outros técnicos que assegurem outras necessidades (ex: sociais,
habitacionais, laborais,…)
 Que promovam a mudança no sentido do bem-estar da vítima.

MÓDULO III
ABUSO SEXUAL: DEFINIÇÃO

 Práticas de cariz sexual envolvendo uma criança.


 Uma “condição abusiva” expressa na coerção ou num grande diferencial etário entre os
sujeitos envolvidos, que indicia falta de consentimento decorrente da imaturidade
desenvolvimental da criança para se autodeterminar sexualmente.
 Crimes contra a autodeterminação sexual:
o Abuso sexual de crianças.
o Abuso sexual de menores dependentes.
o Atos sexuais com adolescentes.
o Recurso à prostituição de menores.
o Lenocídio de menores.
o Pornografia de menores.
 Atos sexuais praticados com menores de 14 anos.
o Os atos prejudicam o desenvolvimento normativo da criança, ainda que ausentes
meios violentos, coercivos ou fraudulentos.

PREVALÊNCIA

 Estudos portugueses
o Entre 2.6% e 9.8% para os rapazes e entre 2.7% e os 17.4% para as Raparigas.
o O abuso sexual de criança representa 51.7% dos crimes sexuais praticados em
Portugal.

IMPACTO E CONSEQUÊNCIAS DO ABUSO SEXUAL

 O impacto pode traduzir se em psicopatologia na infância,adolescência e/ ou na idade


adulta.
 Não há um padrão típico, havendo sintomas afetivos, cognitivos, físicos e comportamentais
em 40% a 60% das crianças vitimadas.
 Apresentam mais sintomas de Perturbação Stress Pós-Traumático e comportamentos
sexualizados.

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IMPACTO E CONSEQUÊNCIAS DO ABUSO SEXUAL NAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

 Sinais e sintomas mais frequentes:


o Problemas físicos:
 Lesões genitais ou anais, problemas de apetite e de sono, queixas
somáticas.
o Problemas de externalização:
 Comportamento agressivo e disruptivo, perda de rendimento escolar,
problemas de atenção, fugas, conduta antissocial.
o Problemas de internalização:
 Ansiedade e medos, isolamento, vinculação pouco seletiva, comportamentos
regressivos, automutilação, ideação suicida.
o Comportamentos sexualizados não adequados à idade:
 Linguagem de cariz sexual, masturbação compulsiva, expressão de afeto
pela sexualidade.
 As características individuais, as estratégias de coping e os recursos sociais.
o Influenciam na diminuição do risco e promovem a resiliência.

ESTRATÉGIAS USADAS PELOS/AS OFENSORES/AS

 Construção de uma relação de proximidade afetiva e de confiança com a vítima com o


intuito de a tranquilizar dizendo que é uma relação “normal” entre duas pessoas (e.g.,
Somos amigos/as, podes confiar em mim).
 Permitir o acesso a bens materiais.
 Recurso à surpresa.
 Recurso a estratégias de confusão/engano (e.g., vamos brincar aos pais e às mães).
 Recurso à ameaça (e.g., Não te dou de comer se não fizeres o que te estou a mandar!).
 Recurso à agressão verbal, psicológica (e.g., ninguém gosta de ti ””), física.
 Recurso ao rapto e/ou sequestro.

MODELO EXPLICATIVO DE FINKELHOR E BROWNE

 Os efeitos disruptivos estão associados às dinâmicas da vivência emocional e cognitiva do


abuso.

 Sexualização traumática

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o Comportamento sexual problemático; comportamentos de evitamento; utilização do
sexo para obter ganhos emocionais ou materiais.
 Traição
o Sentimentos de desconfiança; incapacidade de estabelecer vínculos; hostilidade e
comportamento auto-destrutivo.
 Estigmatização
o Padrões relacionais abusivos; comportamentos auto-destrutivos; sintomas
depressivos, abuso de substâncias, isolamento social.
 Impotência
o Depressão, ansiedade, problemas de sono, dificuldades de aprendizagem,
desânimo aprendido, comportamento agressivo e desviante.

FATORES QUE PODEM MODERAR A GRAVIDADE E O TIPO DE CONSEQUÊNCIAS


SENTIDAS PELAS VÍTIMAS

 Fatores relativos ao abuso:


o Início precoce
o Duração e frequência
o Uso da força ou ameaça
o Abuso físico e sexual conjuntos
o Múltiplos abusadores
o Intrusividade dos atos
o Proximidade na relação ofensor/a-vítima
o Revelação
 Fatores da criança:
o Inteligência
o Competências de coping
o Significação dada à experiência
 Fatores do meio:
o Tentativas de revelação mal sucedidas
o Ausência de figuras protetoras/suporte inexistente.
o Estigmatização ou culpabilização da criança
o Qualidade do apoio especializado recebido
o Vitimização secundária

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SISTEMA FORMAL E INFORMAL DE INTERVENÇÃO

AVALIAÇÃO

 Entrevista clínica
o História desenvolvimental e estado atual.
o Ajustamento psicológico.
o Apoio e ajustamento familiar.
o Fatores de risco e de proteção associados à criança/adolescente, à família e redes
de suporte informal e formal.

OBJETIVOS DA INTERVENÇÃO COM A CRIANÇA/ADOLESCENTE

 Reduzir as respostas emocionais e comportamentais negativas face ao abuso.


 Promover a transformação de crenças desajustadas relacionadas com esta experiência.
 Promover a integração cognitiva e emocional do abuso na história de vida, no sentido de
gerar novos significados que sejam adaptativos e funcionais.

PRESSUPOSTOS DA INTERVENÇÃO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL

 Ênfase no processamento do trauma.


 Sintomatologia percebida como resultante do evitamento.
 Necessidade de exposição gradual às memórias do abuso.
 Integração cognitiva e emocional da experiência de abuso.

ESTABELECIMENTO DA RELAÇÃO TERAPÊUTICA

 O/A terapeuta deve demonstrar disponibilidade emocional, envolvimento e responsividade


face à criança/adolescente.
o Contactos telefónicos, exploração dos seus gostos e preferências, da sua vida
académica e
lazer.

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 Encorajar a identificação de objetivos individuais colaborativamente.
 Devido às características do abuso, pode ser necessário despender tempo na construção
da relação.

PARTILHA DE INFORMAÇÃO RELEVANTE SOBRE O FENÓMENO

 Fornecer informação relevante sobre o abuso.


o Fatores explicativos do abuso, potenciais reações, dificuldades na revelação.
o Desconstruir sentimentos de culpa.
 Preparar a criança/adolescente para os procedimentos médico-legais e diligências
processuais e judiciais.
o Promover alguma sensação de controlo e redução da ansiedade.

PROMOÇÃO E TREINO DE COMPETÊNCIAS DE COPING (OU DE CONFRONTO)

 Competências ao nível emocional:


o Desenvolvimento de um vocabulário para as emoções pela identificação das
emoções próprias e dos outros.
 Desde as situações do quotidiano para a situação de abuso, gradualmente.
 Elaborar listas de sentimentos.
o Expressão adaptativa das emoções e expressão de sentimentos associados ao
abuso.
 Competências ao nível cognitivo:
o Compreensão da interrelação de pensamentos, sentimentos e comportamento.
o Identificação e disputa de pensamentos automáticos desadaptativos.
 Autoafirmações positivas, paragem de pensamento, análise de evidências.
o Aplicação a situações pessoais e aos pensamentos sobre o abuso, gradualmente.
 Competências ao nível fisiológico:
o Relaxamento muscular progressivo.
 Distinção entre tensão e relaxamento.
 Desenvolvimento de estratégias de relaxamento.
 Desenvolvimento de outras estratégias que promovam maior controlo sobre o
próprio corpo.

EXPLORAÇÃO E PROCESSAMENTO DO POTENCIAL TRAUMÁTICO DO ABUSO SEXUAL

 Elaborar uma narrativa coerente sobre o abuso.


o Escrever sobre a sua vida antes da situação abusiva, o episódio do abuso e as
consequências percebidas.
o Progressivamente, integrar aprendizagens e mudanças.
 Exposição gradual a pistas evocativas do abuso.

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Intervenção Psicológica em Vítimas e Ofensores I
o Explicação do racional e construção de uma hierarquia de situações (desde as
menos ansiógenas até às mais ansiógenas.
o Exposição gradual e dessensibilização.
 Exploração de sentimentos, sensações corporais e pensamentos.
 Foco nas dimensões afetadas:
o Segredos
o Pesadelos e memórias intrusivas
o Culpa e vergonha
o Processamento emocional do dano
o Expressão de sentimentos bloqueados
 Identificação e disputa das crenças irracionais (utilização das competências
de coping).

PREVENÇÃO DA VITIMAÇÃO FUTURA

 Competências de segurança:
o Discriminação de segredos apropriados/inapropriados.
o Discriminação de toques OK e não OK.
o Identificação do espaço pessoal.
o Direito a dizer não.
o Estratégias para lidar com os toques inapropriados.
o Identificação de figuras de recurso e locais de segurança.
o Identificar sinais de alerta.
 Preparação para o eventual contacto com o ofensor.
 Educação sexual.
 Plano de segurança.
 Finalização.

INTERVENÇÃO COGNITIVO-COMPORTAMENTAL COM OS PAIS (NÃO ABUSIVOS) -


OBJETIVOS

 Contextualizar e dar informação sobre o abuso.


 Desenvolver competências para lidar com as suas dificuldades.
 Responder de forma adequada e securizante aos/às filhos/as.
 Promover competências de autorregulação parental e gestão de comportamento.

RELAÇÃO TERAPÊUTICA E APOIO FACE À REVELAÇÃO

 Interromper a “síndrome do segredo” abordando os factos do abuso com a


criança/adolescente na presença dos pais.
o Respeitar a confiança terapêutica com a vítima, e seus timings e sentimentos.
o Responsabilizar o ofensor, diminuindo os sentimentos de culpa da vítima e
familiares.
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Intervenção Psicológica em Vítimas e Ofensores I
o Promover suporte dos pais à vítima.
 Normalização dos sintomas, validação da experiência e reações, e promoção da
esperança na recuperação.

PARTILHA DE INFORMAÇÃO

 Fornecer informação sobre o abuso.


 Normalizar e enquadrar as reações da vítima e familiares.
 Identificar sintomas da vítima.

PROMOÇÃO DE COMPETÊNCIAS PARENTAIS

 Promoção das capacidades e competências pró-sociais da criança/adolescente.


o Elogio e reforço.
 Estratégias de gestão do comportamento inadequado.
 A criança/adolescente não deve ser tratada de forma diferente por ter sido vítima de abuso;
são necessários limites e regras pois ajudam na recuperação.
 Promover competências nos pais de identificação e exploração de sentimentos da
criança/adolescente, reforçando a sua adequada expressão e gestão.

PROMOÇÃO DE COMPETÊNCIAS DE AUTOREGULAÇÃO DA FAMÍLIA

 Promover competências de identificação e gestão de sintomas ansiosos.


o Relaxamento muscular, autoinstruções.
 Estratégias de regulação afetiva.
 Desfiar padrões de pensamento desadaptativos.
 Exposição gradual a informação relacionada com o abuso no sentido do processamento da
experiência.
o Paralelamente à exposição da criança.

INTERVENÇÃO COM A FAMÍLIA (NÃO ABUSIVA) E COM A CRIANÇA/ADOLESCENTE

 Promover a comunicação na família.


 Diminuir dinâmicas do segredo.
 Permitir à vítima a partilha.
 Envolvimento no plano de segurança.

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