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Avaliação para VISÃO GERAL

habilitação à 1 – O processo de habilitação para adoção


adoção 2 – Dificuldades na avaliação de pretendentes à adoção
3 – O que deve ser considerado ao longo do processo de habilitação à
Autoras: adoção?
Verônica Petersen Chaves
Patricia Santos da Silva 4 – Critérios para habilitação dos pretendentes
Giana Bitencourt Frizzo 5 – Sobre a história, o funcionamento psíquico e a capacidade de
estabelecer relações de afeto dos pretendentes
Páginas 167 -179 6 – Sobre as relações com a família extensa e a rede de apoio
Livro: Avaliação psicológica no
contexto forense 7 – Sobre as expectativas em relação ao filho por adoção
8 – Sobre o desejo de parentalidade
Ano: 2020
9 – Da seleção à preparação dos pretendentes
10 – Considerações finais
1 – O processo de habilitação para adoção

- A habilitação à adoção: processo judicial previsto no art. 197-C da Lei nº 8069/1990 (ECA) –
Prevê a intervenção da equipe interprofissional, realizando estudo psicossocial para aferir a
capacidade e o preparo dos postulantes, a fim de subsidiar a decisão judicial sobre a inclusão destes
no Cadastro Nacional de Adoção

- Os critérios descritos na lei sobre quem pode adotar são objetivos: maiores de 18 anos; 16
anos a mais que o adotante; qualquer estado civil; documentos necessários: identidade, CPF,
certidão de nascimento ou casamento, comprovante de residência, comprovante de rendimentos,
atestado de sanidade física e mental, certidões cível e criminal

- Os pretendentes deverão passar por um processo de preparação psicossocial e jurídica,


orientado pelas equipes técnicas dos Juizados da Infância e Juventude, com apoio dos técnicos
responsáveis pelo programa de acolhimento e pela execução da política municipal de garantia do
direito à convivência familiar
INÍCIO

Pretendente (s) entrega (m) petição e


documentos na Vara da Infância e Juventude
local Fluxo dos
processos de
habilitação à
Documentos são digitalizados, inseridos no
adoção
sistema de justiça e viram um processo judicial

Inclusão do (s)
O processo é remetido ao Ministério Público, pretendente (s) no
para manifestação do Promotor de Justiça Cadastro Nacional de
Adoção

Avaliação e preparação Retorna ao Juiz para


Retorna ao Juiz, que determina a intervenção
dos pretendentes / sentença (deferindo ou
dos setores de psicologia e serviço social
Laudo indeferindo o pedido)
- O ECA não descreve de forma específica os critérios que devem ser estudados na avaliação dos
pretendentes;

- Art. 29 do ECA: a adoção não deverá ser deferida a pessoa que revele incompatibilidade com a
natureza da medida ou não ofereça ambiente familiar adequado;

- O desafio das equipes é o de traduzir para a prática o que seria incompatibilidade ou ambiente familiar
adequado;

- Art. 43 do ECA complexifica a situação quando afirma que “a adoção será deferida quando apresentar
reais vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”. Muitas são as discussões sobre
quais seriam as vantagens ao adotado e qual seria o conceito de motivos legítimos. Para alguns
autores do direito, isso diz respeito à capacidade das famílias de oferecer condições mínimas de
proteção e sustento (termos muito subjetivos);

- A metodologia de avaliação e preparação dos pretendentes à adoção dependerá da formação de cada


profissional e das especificidades de cada caso;
- Há variações no processo de habilitação entre os países, mas verificam-se alguns objetivos comuns:

 EUA - processo se inicia em agências conveniadas ao governo; candidatos passam por avaliação “Home Study”, cujo
objetivo é colher informações e preparar; processo dura de 2 a 10 meses e é finalizado no Judiciário.
 REINO UNIDO - semelhante aos EUA
 FRANÇA – objetivo da avaliação de candidatos é conhecer a confiabilidade de projeto adotivo e a capacidade de se
identificarem como pais de uma criança e inscrevê-la em sua história e descendência; realizada pelo Serviço de
Assistência Social à Infância Francesa; avaliações sociais e psicológicas; após aprovação, é válido por 5 anos
 ITÁLIA – adoção é permitida aos casados há mais de 3 anos, levando em consideração a convivência do casal e suas
condições de educar, instruir e manter a criança; essas condições são avaliadas por psicólogos e assistentes sociais
dos serviços de saúde e reportadas ao Tribunal de Menores; existem limites de idade (para assegurar que os pais
tenham condições de manter o filho até a idade adulta

- Em todos os países, a ideia central é que existe um processo de avaliação e preparação dos adotantes
que visa ao bem-estar da criança que chegará a essa família

- As MOTIVAÇÕES dos candidatos constituem o critério mais importante para considerar a viabilidade da
adoção
2 – Dificuldades na avaliação dos pretendentes à adoção

- Trajetória típica dos adultos que decidem pela adoção: percurso difícil na realização do desejo de ter filhos
(infertilidade ou outros / não ter alguém para compartilhar esse projeto);

- Processo avaliativo é percebido pelos pretendentes como mais um impeditivo – “excesso de burocracia”
(pode ser reflexo da frustração e insatisfação com as experiências negativas vividas anteriormente). Outra
fala comum dos pretendentes: “se fosse para engravidar, eu não seria avaliado!”

- O processo de habilitação é apenas uma tentativa de garantir o sucesso na consolidação dos vínculos de
filiação. São crianças que já tiveram seus direitos violados e que necessitam do máximo cuidado em sua
medida de proteção

- Conhecer as fragilidades e as potencialidades desses adultos possibilita que possamos ajuda-los a


encontrar as melhores ferramentas para enfrentar as exigências de cuidar de seus filhos também com tantas
fragilidades e potencialidades ainda desconhecidas
- O processo de habilitação:

 É a primeira etapa de inserção dos candidatos no contexto da adoção, e muitas vezes, da parentalidade

 Pode se construir como um espaço para que expressem seus desejos, suas expectativas, seus medos, seus
mitos

 E no qual terão acesso a informações, esclarecimentos e reflexões acerca de todos os aspectos que estão
implicados em uma adoção

 Poderão integrar suas questões pessoais com as demandas das crianças que precisam de uma família

- Papel da equipe: suportar junto com os pretendentes as limitações e as frustrações durante um período que tem
data inicial, mas muitas incertezas com relação ao seu desfecho

- Cotidiano dos profissionais: sofrimento com o peso das responsabilidades, dificuldades na interação com os
pretendentes e com a rede de proteção, dificuldades institucionais com todo o Poder Judiciário. O
acompanhamento pressupõe a avaliação continuada do processo de adaptação da criança à família, o que traz
maior complexidade ao trabalho dos profissionais.
- A preparação dessas famílias para a adoção seguirá diferentes caminhos de acordo com os profissionais
envolvidos e suas concepções a respeito de família e adoção

- Caberá realizar o autoexame das próprias concepções de família, de modo a evitar pré-julgamentos que tragam
prejuízos à percepção do profissional diante do caso concreto

- O trabalho dos profissionais deveria passar por um momento de reflexão sobre a família contemporânea,
mudanças ocorridas no âmbito da justiça, necessidade de dispor de meios para melhor conhecer os candidatos e
sobre seus próprios valores decorrentes de modelos internalizados de família que podem favorecer ou dificultar a
ponderação de suas respostas e a sequencia que resultará na escrita do parecer ou laudo final

- Lei nº 12.010/2009, reformulada pela Lei 13.509/2017 (art.197, p.1) inclui como passo essencial na habilitação
para adoção a participação em programa oferecido pela Justiça da Infância e da Juventude. Programas devem
incluir: preparação psicológica, orientação e estímulo à adoção inter-racial, de crianças ou de adolescentes com
deficiência doenças crônicas ou necessidades específicas de saúde, e grupos de irmãos

- Algumas equipes trabalham na perspectiva de que a confrontação com a realidade das crianças disponíveis à
adoção seria o objetivo do trabalho (a meta não seria definir quem são as pessoas com condições de se
tornarem bons pais, mas encontrar aqueles dispostos a apresentarem condições de sê-lo).
- Algumas equipes estabeleceram protocolos baseados em critérios, na maior parte das vezes, definidos pela
própria equipe ou pelo profissional, levando em conta seus próprios conceitos na definição de aptidão ou não
para o exercício de ser pai e mãe por adoção;

- A maior parte desses protocolos trata de procedimentos e itens a serem examinados, mas sem discussões
teóricas a respeito do tema da parentalidade e suas repercussões no projeto adotivo;

- Conceito de parentalidade – não basta ser genitor nem ser designado como pai para preencher todas as
condições, é necessário tornar-se pais, o que se faz por meio de um processo complexo, implicando níveis
conscientes e inconscientes do funcionamento mental

- Processo de tornar-se pai e mãe: marcado por singularidades que são inerentes a cada pessoa e/ou família.
Construção diária que se dá antes, durante e depois da chegada do filho;

- É a relação com a criança que confere sentido às palavras “maternidade” e “paternidade”. É necessário construir
a parentalidade nessa relação. Além disso, o bebê faz seus pais, construindo-os e parentalizando-os ao mesmo
tempo em que é construído por eles. Todos os pais, adotivos ou biológicos, precisam aprender as demandas que
a parentalidade exige.
3 – O que deve ser considerado ao longo do processo de habilitação à adoção?

- Muitas possibilidades de instrumentos a serem utilizados nos processos de habilitação, entre eles:

 Entrevistas conjuntas com os requerentes


 Entrevistas individuais
 Entrevistas com filhos ou outros familiares
 Visitas domiciliares
 Testes psicológicos
 Discussão em equipe

- O que deve ser investigado:

 Estabilidade e estrutura psíquica e emocional dos integrantes da família


 Experiências familiares e de vida
 Crenças e expectativas com relação ao filho a ser adotado
 Compreensão de aspectos relacionados à adoção e à história anterior do adotado
- Projeto de pesquisa “Estar apto a ser pai e ser mãe do ponto de vista jurídico” (Silva, Lopes & Frizzo 2013). Objetivo:
compreender de que maneira os psicólogos e os assistentes sociais das equipes técnicas do Judiciário de diversos
estados do país realizavam suas avaliações;

- Dissertação de mestrado de Silva (2015) – foram analisados dados de cinco Comarcas do Rio Grande do Sul.
Participantes: 17 psicólogos e assistentes sociais judiciários. Quando questionados sobre as rotinas e dificuldades,
relataram carga de trabalho excessiva e falta de recursos humanos.

- Todos os profissionais referiram utilizar a entrevista semiestruturada como principal meio de coletar dados. Iniciam o
processo com uma entrevista conjunta (casais) e, conforme a necessidade, marcam mais encontros conjuntos ou
individuais.

- E alguns casos, os profissionais relataram sentir a necessidade de entrevistar outros membros da família (famílias que
já tem filhos biológicos ou candidatos solteiros)

- Número médio de entrevistas: entre 2 e 3 (mas variando de 1 a 9) – com o casal ou individual. Apenas 3 psicólogos
referiram utilizar algum teste projetivo, mas somente quando sentiam dúvidas na avaliação. Apenas uma profissional
relatou sempre utilizar testagem (Inventário fatorial de personalidade – IFP II). Um profissional referiu utilizar contatos
com a rede de atendimento de saúde

- Em relação a isso, ressalta-se a dificuldade de acesso dos profissionais às ferramentas de avaliação psicológicas
disponíveis, bem como a escassez de instrumentos próprios para avaliação relativa à parentalidade
4 – Critérios para habilitação dos pretendentes

- O exame das potencialidades dos pretendentes é um trabalho pericial no qual o recorte de tempo atual da
situação do pretendente no momento da solicitação é uma das limitações, ou seja, a avaliação é da motivação
de adotar dentro das circunstâncias daquele momento em que foi feito o movimento de ingresso no Judiciário.

- Diversas motivações para adoção:

 infertilidade é o motivo manifesto mais frequente;


 questões inconscientes podem ser difíceis de serem trazidas à tona (medo da solidão, dificuldades na
elaboração de perdas e abandono, necessidades narcísicas de envolvimento com alguém diversos de si
mesmo, etc.);
 existem outras dificuldades, talvez não tão inconscientes, que podem ser também incompatíveis com a adoção,
como tentativa de resolução de conflitos conjugais, minimização de sentimentos de solidão ou preocupações
sociais

- O trabalho de avaliação deve ser feito de forma interdisciplinar (psicologia e serviço social), buscando
elementos diversos e complementares que respondam sobre o potencial daquela família em receber uma
criança em adoção
Tópicos a serem examinados no exame psicossocial (opinião de outros autores)

1. História pregressa e atual dos pretendentes


2. Capacidade de lidar com frustrações e equilíbrio emocional
3. Qualidade das relações afetivas
4. Flexibilidade e capacitação de se adaptar a questões adversas
5. Porque desejam adotar (motivação)
6. Questões sobre a infertilidade
7. Sentimentos com relação à adoção
8. Sentimentos com relação à adoção
9. Sentimentos com relação à história da criança e sua revelação
10. Expectativas com relação ao filho por adoção
11. Previsão quanto à possibilidade de estabelecer uma relação parental satisfatória
12. Capacidade de estabelecer vínculos interpessoais e projetos de vida
13. Relação com a família extensa
14. Rede de apoio
15. Experiências anteriores com filhos (biológicos ou adotivos, enteados ou outras pessoas que estiveram sob
seus cuidados)
16. Projetos de vida
- Segundo Bowlby (1976), para realizar esse trabalho, a habilidade do profissional é imprescindível, uma
vez que é importante que sejam investigados os motivos reais que estão por trás do desejo manifesto de
um casal

- Aspectos importantes na avaliação de pretendentes à adoção (opinião das autoras):

 História e funcionamento psíquico


 Relações com a família extensa
 Desejo de parentalidade
 Capacidade de estabelecer vínculos
 Flexibilidade e capacidade de superação de dificuldades
 Preparação (que vai além da etapa de avaliação)
5 – Sobre a história, funcionamento psíquico e a capacidade de estabelecer relações de afeto dos
pretendentes

- O modo como a relação entre os pais e a criança vai se estabelecer, em qualquer modalidade de filiação,
também é marcado pela subjetividade e elo funcionamento psíquico desses pais, por determinações
inconscientes

- Conhecer as características das pessoas que buscam a adoção, mesmo não sendo um fator determinante, pode
dar indícios do sucesso no estabelecimento de vínculos positivos com o filho adotivo

- Investigar a capacidade de afeto dos futuros adotantes foi descrito como um fator importante para autores
clássicos (Bowlby, 1907 – capacidade de vinculação afetiva / Schettini Filho, 1998 – a parentalidade é
essencialmente afetiva / Camargo, 2012 – a adoção deve vir para satisfazer esse desejo de vinculação afetiva
com um filho

- A capacidade de elaboração de vivências traumáticas também apareceu como questão importante (Bowlby, 1995
– a coragem para enfrentar dificuldades e refletir sobre a melhor solução possível para os problemas é fator
indispensável aos pais adotivos. O importante, para o autor, é saber se os pais conseguiriam funcionar como pais
afetuosos mesmo depois de uma decepção com o filho. Mesmo que não exista uma “adoção garantida”, é
fundamental que os técnicos percebam que os pais estão preparados para aceitar uma criança que não
corresponda exatamente às suas expectativas
- A chegada do filho pode trazer à tona experiências traumáticas vividas pelos pais (Fraiberg, Adelson & Shapiro,
1994). Por isso, é importante avaliar a forma como os pais enfrentaram situações traumáticas

- Investigar a capacidade de adaptação a novas situações e a flexibilidade dos candidatos. Os que possuem
postura muito rígida, principalmente em relação ao perfil desejado, fazem isso por questões pessoais mal
resolvidas, e nesses casos, não se necessita da criança por ela mesma, e sim como soluções para os
problemas particulares, o que pode trazer conflitos na relação com o futuro filho (Bowlby, 1995). Flexibilidade
também é fator importante para a prevenção deproblemas de comportamento das crianças

- Estabilidade emocional = segurança emocional. Os pais devem ter segurança em relação a si mesmos para
conseguir transmitir essa noção ao filho. A estabilidade dos comportamentos dos pais é fundamental para o
desenvolvimento emocional saudável do bebê e pode ser entendida como algo importante para uma criança
adotiva, já vítima de muitos períodos de instabilidade durante a vida
6 - Sobre as relações com a família extensa e a rede de apoio

- A diferenciação / individuação do casal também é um fator importante a ser avaliado

- Quanto maior for o grau de dependência em relação à família de origem, menor será a tolerância de cada um em
relação à diversidade do outro, dentro do funcionamento do casal, e maior será a ansiedade diante das
diferenças inevitáveis. Isso poderá trazer problemas na relação do casal e nas questões relativas ao
desenvolvimento do filho

- Avaliar os modelos de pai e mãe que os candidatos apresentam, porque a forma como um indivíduo vai
parentalizar seus filhos depende, em parte, da percepção que tem sobre como foi cuidado por seus pais, bem
como da forma como acredita que poderia ter sido diferente É esse questionamento que fará os adotantes
criarem seu próprio modelo a ser seguido.

- A família de origem é algo muito apontado na literatura como benéfico ao desenvolvimento das crianças.
Crianças que tem contato com seus avós apresentam maior segurança afetiva e são mais receptivas a outros
vínculos. Buscar informações sobre o pensamento da família a respeito da adoção, porque a criança deve ser
adotada emocionalmente por uma família, e não apenas por duas pessoas. A opinião dos avós é importante
porque são eles que vão inserir a criança na cadeia das gerações, e os postulantes não precisarão lidar sozinhos
com a questão da hereditariedade familiar
- O projeto de adoção não deve ser apenas dos adotantes, mas também deve ter aceitação e participação da
família, porque a chegada de um novo membro ao sistema familiar provoca alterações importantes nos
subsistemas que compõem a família, e a adoção leva a uma nova constituição desse núcleo

- Observar a relação estabelecida com a família de origem – os candidatos devem ter a possibilidade de buscar
suporte quando necessário mas ao mesmo tempo, devem demonstrar independência, sendo capazes de
administrar a casa e a família

- Self interdependente – o senso de maturidade se relaciona com a aceitação de que temos uma interdependência
básica com os outros e com toda a natureza, e a individuação dependeria de habilidades como a capacidade de
se sentir seguro no contexto familiar e conhecido e em contextos não tão familiares, de reconhecer emoções no
outro e praticar a empatia de autorceitar-se e aceitar as diferenças do outro, mermo que tenham valores
diferentes, e ainda de considerar outras pessoas e se preocupar com as gerações futuras

- Apoio social – avaliar a qualidade das relações e saber o quanto essa criança também poderá contar com uma
rede de apoio externa à família nuclear. Necessidade de investigar o quanto a família consegue inserir-se
socialmente e buscar na rede o auxílio necessário em atividades sociais, culturais e de saúde
7 – Sobre as expectativas em relação ao filho por adoção

- A criança adotiva deve ser desejada muito antes de sua “concepção”, fazendo os candidatos se tornarem pais
pelo desejo

- A parentalidade não deve se basear no desejo de preencher uma lacuna da vida dos pais, nem na
possibilidade de conciliação de um casal e crise, muito menos em um ato de caridade

- A criança que é colocada em adoção já passou por histórias de privação em demasia e dependerá de um
meio familiar que consiga auxilia-la nessas necessidades

- A não superação e a não elaboração de um luto por uma perda podem ser complicadores na relação com a
criança que substituirá esse lugar vago.

- As crianças precisam ser adotadas por pessoas que desejam ter um filho, e não por um ato de caridade
(exigências posteriores de retribuição)

- Pressões sociais para ter um filho – motivação problemática pois a decisão por adotar deve ser de ordem
existencial e não para atender a exigências externas
- Importância de investigar o desejo dos adotantes por uma criança em suas vidas – desejo real de ter um filho.
Isso é o que dará ao filho adotivo o seu lugar como sujeito. À medida que o laço familiar passa a ter um valor
simbólico, é possível que os pais consigam acolher de maneira saudável as demandas da criança

- Relação do desejo de ter um filho com o conceito abordado por Zapiain (1996), que diferencia os conceitos do
desejo de gravidez do desejo de filho. Algumas mulheres desejam um filho somente pela realização do sonho de
estarem grávidas e pelo reconhecimento social que a condição de gestante pode trazer.

- O desejo de ter um filho se refere ao desejo consciente de querer ter um filho como integrante de um projeto de
vida, incluindo-o na vida e aceitando as gratificações e as dificuldades que o “ser pai” e “ser mãe” podem trazer

- É importante perceber qual preparação os candidatos estão fazendo interna e psiquicamente para receber esse
filho. A chegada de um filho cria necessidade de abrir um espaço emocional para receber um novo ser, fazendo
os pais abdicarem da condição de filho e passarem a exercer o papel de pai e mãe

- Somente a partir da inserção da criança no desejo dos pais é que sua identidade terá um lugar

- Identificar a disponibilidade geral das famílias adotantes para receber um novo membro deve ser o “propósito
norteador” do processo de habilitação para adoção (não diz respeito somente à filiação adotiva – tornar-se pai e
mãe depende mais da lógica do desejo do que de laços consanguíneos)
- No caso da adoção, percebe-se que hoje é mais valorizada, idealizada e admirada porque o valor atribuído à
criança mudou (criança não é mais produto do acaso e sim do desejo dos pais)

- O principal desafio dos adotantes é a elaboração pessoal que se poderia sintetizar como uma mudança de
paradigma que é passar da necessidade de conseguir uma criança ao desejo de acolher um filho

- Investigar o quanto os “fantasmas no quarto do bebê” estão influenciando o projeto adotivo – o filho imaginado
pode representar para os pais a realização de uma imagem idealizada de si mesmos, dando a oportunidade
de realização de seus próprios ideais, o que faz o filho nunca ser alguém completamente estranho, já que
representa imagens do passado dos pais. Esses vínculos antigos revividos trariam aos pais a possibilidade de
elaboração, e o filho desempenhará o papel de curador dos pais, trazendo a possibilidade de redenção. Por
tudo isso, é importante investigar se essas expectativas não são maiores do que a criança adotiva é capaz de
carregar
- Investigar o pensamento dos candidatos a respeito da origem da criança colocada em adoção, porque a
relação filial implica um aceitação completa desse filho, juntamente com toda a sua biografia

- Toda filiação, biológica ou não, é uma adoção, já que a criança só será considerada como filho se for
emocionalmente adotada pelos pais, e o sentimento de pertencimento à família é fundamental para a
consolidação dos vínculos afetivos
8 – Sobre o desejo de parentalidade

- A reorganização psíquica da mulher na maternidade acontece de forma independente do processo


biológico de gestação. Assim, na maternidade por adoção, as mulheres também são capazes de integrar, à
sua nova identidade de mãe, funções relacionadas à capacidade de cuidar, proteger e empatizar, antes
mesmo serem terem conhecimento de quem será seu futuro filho

- O desejo de parentalidade também pode ser entendido como a disponibilidade emocional e afetiva, em
determinado momento, para assumir a função parental

- É necessária essa disponibilidade porque se sabe que se tornar pai e mãe pode ser um dos
acontecimentos mais marcantes do ciclo vital e imprime mudanças na personalidade e no psiquismo dos
pais

- Desejo de parentar surge como uma forma de prolongamento que o filho proporciona, um meio para dar
continuidade à linhagem e faz parte da autoimagem do adulto, sendo algo além de um projeto de vida

- A criança seria, para o pai, a possibilidade de imortalidade, pela transmissão de suas características para
além de si mesmo Isso proporcionaria aos pais, também, a possibilidade de realizar desejos que não
conseguiram por meio dos filhos
9 – Da seleção à preparação de pretendentes

- Complexidade do tema adoção exige dos profissionais que dela se ocupam ferramentas diversas de
abordagem

- As reformulações da legislação acompanharam a preocupação com esse contexto, transformando a


habilitação para adoção em um processo que vai além da simples avaliação

- A preparação dos candidatos é prevista em lei como uma possibilidade de trabalho de reflexão com essas
famílias, oferecendo a elas a possibilidade de aproximação com a realidade da adoção

- A garantia desse procedimento na lei amplia as possibilidades de trabalho de intervenção e de boas


práticas na adoção

- Nos moldes atuais, existe a previsão de uma preparação dos pretendentes, em que são esclarecidas todas
as informações relativas ao trâmite do processo na instituição, havendo mais do que apenas uma avaliação
dos aspectos psicológicos e sociais da família

- O trabalho preventivo com as futuras famílias adotivas coloca uma nova perspectiva aos profissionais da
rede de proteção como um todo, mais especificamente às equipes judiciárias. Sem uma previsão
metodológica, ou mesmo dos conteúdos a serem trabalhados, cada localidade tem a liberdade de construir
seu sistema próprio de habilitação com os recursos disponíveis
- Parcerias com a rede de proteção, com universidades, com profissionais da saúde, bem como com todos os
profissionais do direito, são bem vindas nesse processo de formação

- A preparação teria dois grandes objetivos que deriva do objetivo maior, que é a proteção da criança e as
práticas voltadas ao seu melhor interesse:

 Informação: oferecer dados e orientações práticas com relação ao processo judicial da habilitação e da
adoção, bem como a respeito das crianças com necessidade de adoção
 Reflexão: espaço para que os adultos possam refletir sobre sua motivação para adoção e recursos
emocionais, familiares e sociais par ao acolhimento de uma criança em adoção

- Prática recente que tem se tornado cada vez mais comum nas comarcas do RS: a terceirização dos grupos
de preparação dos habilitantes para os grupos cadastrados de apoio à adoção. Diversos convênios entre
essas organizações não governamentais que promovem grupos de apoio e o Judiciário têm aparecido como
como um recuso importante para a demanda de trabalho dos profissionais das equipes técnicas e como uma
possibilidade maior de visibilidade dos magistrados

- A participação dos grupos de apoio à adoção na habilitação de pretendentes é uma prática muito difundida e
complementa o trabalho das equipes interprofissionais. A cooperação do trabalho técnico com a vivência das
famílias por adoção, seus testemunhos e possibilidades de rede de apoio pode ser um recurso importante,
considerando especialmente a complexidade das adoções tardias e das adoções especiais
10 – Considerações finais

- O processo de habilitação para adoção é uma medida de proteção à criança que já se encontra em situação
de vulnerabilidade

- Compreender as capacidades, possibilidades, potencialidades e fragilidades dos futuros pais é


imprescindível para o sucesso dessa tarefa singular de construção da parentalidade no contexto da adoção

- Apesar da importância da avaliação, o processos de habilitação não se resume à atividade pericial de


registrar e relatar

- Deve-se pensar no processo como um espaço de reflexão acerca do projeto adotivo e de parentalidade dos
adotantes, mesmo que tenha como objetivo emitir ao juiz um parecer técnico com conclusões dos
profissionais relativas às solicitações recebidas. Estas servirão de subsídios à decisão judicial, a qual poderá
se configurar como um espaço de construção entre os postulantes e os profissionais

- Bowlby já propunha que o relacionamento estabelecido entre os candidatos e o profissional também é


valioso para o conhecimento de que tipo de pessoa eles são. Segundo o autor, as famílias que se
mostravam ressentidas com o interesse do entrevistador por suas vidas íntimas, ou que achavam que suas
referências, sua posição ou sua necessidade intensa de parentalidade lhes dava o direito de receber uma
criança sem mais perguntas, em geral, refletiam problemas subjacentes muito relacionados com a
capacidade dessas pessoas como pais
- Em geral, famílias que estabeleciam facilmente bom relacionamento com o profissional, que reconheciam
ser necessário que bons pais fossem escolhidos para as crianças e admitiam ter receios, problemas e
imperfeições humanas tinham profundas qualificações para a parentalidade (Bowlby, 1995)

- Profissionais não devem se colocar em uma posição de detentores do conhecimento. Devem conseguir
acolher com neutralidade a multiplicidade de configurações familiares presentes nos dias de hoje

- É importante que exista um debate entre os profissionais da psicologia e do serviço social na definição de
critérios na avaliação e na preparação de pretendentes à adoção, de forma a facilitar o processo de
habilitação e proporcionar maior segurança na garantia da proteção da criança

- A falta de critérios norteadores pode ser um fator que propicia a utilização de questões pessoais nas
avaliações, o que abre espaço para que o preconceito influencie o trabalho. Por isso, a utilização de um
protocolo mais uniforme, que seja sensível às especificidades de cada configuração familiar, poderia auxiliar
os profissionais nesse processo

- A construção de instrumentos padronizados que possam dar indícios de questões relevantes à parentalidade
adotiva como a motivação, aparece como uma boa possibilidade para estudos futuros
- A falta de profissionais no Judiciário pode prejudicar esse trabalho, bem como a terceirização dos recursos e
o pouco incentivo à capacitação profissional (seleção dos profissionais para trabalhar no Judiciário não leva
em conta especificidades da formação acadêmica)

- Necessidade de trabalhos e pesquisas nesse campo, que busquem elucidar as dúvidas e contribuir para a
prática profissional

- Trazer o olhar da psicologia do desenvolvimento sobre os processos de habilitação à adoção podem auxiliar
no entendimento a respeito da complexidade envolvida no processo de construção da parentalidade adotiva
- Defende-se a ideia de que, independentemente da configuração familiar ou do perfil dos candidatos, é
fundamental que as crianças sejam cuidadas e desejadas e que exista uma presença que ofereça a ela um
lugar configurado com seus limites

- Os pais adotivos não precisam ser os melhores e não é isso que o processo de habilitação busca, e sim
pais que possam ser “suficientemente bons” (Winnicott, 1975), o que seus progenitores biológicos e
nenhuma instituição de acolhimento conseguiram ser.

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