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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE

CENTRO DE EDUCAÇÃO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO

DISCENTE: JOSENILSON VIANA GUEDES


DISCIPLINA: FILOSOFIA DAS CIÊNCIAS

Qual a fundamentação epistemológica de seu projeto de pesquisa para a pós-graduação


em educação em nível de mestrado?

O objeto de estudo que nos propomos a investigar é o Projeto Político Pedagógico na


perspectiva dos direitos humanos e da construção da cidadania ativa na escola. Essa temática
parte da seguinte problemática: A participação na implementação do Projeto Político
Pedagógico contribui para a construção de uma educação em direitos humanos na perspectiva
da cidadania? Com isso, temos como objetivo: Analisar a implementação do PPP da E. M.
Antônio Campos e Silva como meio de construção de uma educação em direitos humanos na
perspectiva da construção da cidadania ativa na escola.
O ambiente da escola é o lócus da nossa pesquisa, os sujeitos são os gestores,
professores e funcionários, ou seja, os profissionais de educação, pais alunos e moradores da
comunidade.
Consideramos importante pensar o Projeto Político Pedagógico como um instrumento
fundamental nos processos de reflexão, discussão e implementação de uma educação em
direitos humanos. Entendemos que as ações que projetam a (re)formulação do PPP devem
estar em conformidade com as demandas da escola, portanto, todos devem participar. Por
isso, o papel da escola é mobiliar a comunidade escolar, promovendo uma reflexão acerca da
necessidade da atualização permanente deste documento que direciona o trabalho pedagógico,
com intuito de resgatar os valores humanos dentro e fora do ambiente escolar, criando e
promovendo processos de socialização da cultura dos Direitos Humanos no ambiente escolar,
na perspectiva de uma cidadania ativa.
Na proposição de uma educação em direitos humanos na perspectiva da cidadania
ativa, entendemos que se faz necessário destacar que os processos educacionais são marcados
por profundas transformações, acompanhados de debates, entraves e lutas de classes. Esse
cenário é resultado de raízes históricas, ideológicas e de conflitos de interesses. Na atualidade,
a construção de uma bandeira de lutas no campo da educação se estreita, levando em
consideração o ambiente político de disputa de poder entre os grupos sociais que defendem
projetos societários diversos.
Nesse sentido, discutir o papel que a educação ocupa nesse campo de disputa de
interesses se torna indispensável, particularmente no que diz respeito ao papel da escola como
instituição que discute igualdade e justiça social. Portanto, não se pode considerar a educação
ou a escola deslocada desse contexto social imerso na luta pelo poder. Pensar na relação entre
projetos sociais e direitos humanos se faz necessário, uma vez que, na luta por ideais distintos,
a discussão em torno dos direitos humanos são substituídas pela valorização das formas de
competição, lucro e liberdade de mercado.
Em se tratando da educação como direito, podemos considerar que esse direito é
universalmente reconhecido. No entanto, conforme defende Bobbio (1986) “Há uma
diferenciação entre a proclamação do direito e a sua efetivação”. É nesse ponto que está a
bandeira de luta da classe trabalhadora – estabelecer e fomentar movimentos sociais que
caminhem para equalização desse distanciamento entre o que está garantido em lei e o que de
fato é ofertado aos cidadãos brasileiros. Essa distância entre o que está regulamentado e o que
é ofertado se constitui uma grande problemática não apenas no campo da educação, mas sim
uma problemática social.
A discussão de Bobbio parte do pressuposto de que é necessário lutar para que os
direitos independentemente de seu fundamento ou natureza sejam simplesmente garantidos na
prática. É necessário romper com esse distanciamento entre a legislação e a efetivação do
direito. A luta é pela não violação dos direitos da pessoa humana. A escola pode dar sua
contribuição nessa luta por meio da formação política dos sujeitos.
De acordo com Cabral Neto (2004), a formação política constitui em uma dimensão
indispensável à cidadania. Ou seja, é necessário que os sujeitos também tenham uma
formação crítica e participativa na sociedade. Que ele possa intervir na sua realidade e
contribuir para o bem da coletividade. Este autor afirma o que Bobbio já havia orientado em
seus estudos décadas atrás, ou seja, a problemática em torno da educação é política. É política
porque há um ideário de controle por traz das grandes mudanças no campo da educação;
porque a formação na escola pública brasileira ao longo de sua história não formou
criticamente os cidadãos? Justamente para que não houvesse uma contraposição ao ideário da
classe dominante. Política no sentido de que se faz necessário atentar para as bases de
controle e de lucro do capital que a sociedade brasileira está alicerçada e que os sujeitos
compreendam essa realidade, participando ativamente dos processos de mudança e
ressignificação das práticas cotidianas.
Discutir direito, política e cidadania, é, indiscutivelmente estabelecer as bases de uma
educação em direitos humanos. Portanto, entendemos que educar em direitos humanos é
educar para a cidadania, educar para romper com a lógica do capital, educar para a mobilidade
social. Garantindo a todos uma educação que respeite a diversidade e promova uma formação
alicerçada na justiça social.
O ato de educar é sistemático, interessado e objetivo. Sistemático porque tem suas
bases em discussões, diretrizes e conteúdos historicamente produzidos. Interessado,
justamente porque dependendo da ideologia dominante que direciona o fazer na educação, os
objetivos são traçados, esses objetivos revelam o que, para que e para quem a educação está a
serviço.
Diante disso, compreendemos que a nossa investigação está fundamentada numa
concepção de conhecimento histórico-crítica. Para Saviani (1991), a escola assume uma
posição importante na construção das aprendizagens. Essa postura é histórica porque as
relações humanas são entendidas como uma construção histórica. Crítica porque desafia o ser
humano a constantemente rever suas ações sobre a realidade na perspectiva de humanizá-la.
Por isso, é preciso desenvolver no aluno uma posição de comprometimento com a realidade e
de participação que o sensibilize para a sua dimensão humana.
O mundo enquanto uma dimensão histórico-cultural é, na concepção de Freire (1997)
inacabado, portanto, encontra-se em uma relação permanente com os homens, que tem a
capacidade de transformar o mundo, com isso, sofre os efeitos dessa transformação. O ser
humano para Freire é considerado um ser de práxis, da ação e da reflexão, por isso, um sujeito
que tem autonomia no processo de construção do conhecimento. Portanto, inacabado, único e
curioso em relação ao mundo. Nesse sentido, essa condição se materializa na relação com os
outros, na comunicação entre os sujeitos, na interação.
Essa concepção de conhecimento esta compreendida primeiramente no entendimento
de que não existe uma verdade absoluta. O conhecimento é algo dinâmico e está disponível a
todos os sujeitos. Por isso, corroboramos com as ideias de Atlan (1993), onde ele diz que no
pensamento do mundo moderno não se pode considerar apenas um racionalismo absoluto.
Atlan faz uma crítica ao absolutismo científico, segundo ele o pensamento absolutista
promove novas alienações na medida em que totaliza a verdade. Isso impede o pensamento
aberto, podendo provocar um retorno aos obstáculos democráticos dos séculos passados. Para
Atlan: “a razão não pode por fim as ideologias opostas, isso retornaria ao dogmatismo” (p.
149).
De acordo com Sheldrake (2014), esse absolutismo científico pode ser identificado na
ideologia materialista, também chamada de teoria de tudo, onde acredita-se que exista uma
formula unificada que explique toda realidade (na física e na química). Para o autor,
“ninguém pode reivindicar primazia absoluta. Tudo está interligado. Nada é
permanentemente, nem está isolado de tudo. Há uma interdependência [...]” (SHELDRAKE,
2014, p. 339). Essa interdependência é chamada por Almeida (2009) de complexidade. Para
autora: “[...] a pesquisa é a metamorfose, em patamares hiper-complexos, da curiosidade e da
vontade de ordem que estão na base da condição humana” (ALMEIDA, 2009, p. 104). Para
ela, ”é por meio dessa atividade que os conhecimentos acumulados são ampliados,
transformados, ganham historicidade e se mantêm vivos – porque estão em permanente
metamorfose” (ALMEIDA, 2009, p. 103). As coisas e os fenômenos têm uma história,
evoluem, se transformam. Por isso, toda generalização é perigosa (ALMEIDA, 2009, p. 105).
Segundo Bachelard: É necessário sair da contemplação do mesmo para buscar o outro, para
dialetizar a experiência. O homem movido pelo espírito científico deseja saber para questionar
melhor. (BACHELARD, 1996, p.21). Segundo o autor, a observação primeira é sempre um
obstáculo inicial para a cultura cientifica. Por isso é necessário um olhar para além, uma visão
do todo, do contrário. É sempre um perigo seguir as generalizações de primeira vista.
(BACHELARD, 1996, p.24). É preciso que o pensamento abandone o empirismo imediato.
Considerando essas afirmativas, compreendemos que o conhecimento é algo
construído historicamente e que as relações entre os sujeitos se dão de forma plural. Para isso,
nos baseamos na “Filosofia pluralista” de Popper. De acordo com Popper, “a relação entre os
três mundos apresenta os problemas fundamentais da teoria pluralista” (POPPER, 1975,
p.152). Resumidamente os três mundos são: O mundo material, o mundo mental e o mundo
das ideias objetivas. O primeiro mundo pode ser considerado como a realidade concreta, a
instituição escolar, os sujeitos e os objetos presentes na vida dos sujeitos. O segundo mundo,
constitui-se pelas diversas formas de pensar dos sujeitos. Já o terceiro é o mundo da produção
do conhecimento. O terceiro mundo tem origem como produto da atividade humana, ou seja,
transcende sobre humano (p. 156) Apesar de nenhum homem dominar o terceiro mundo,
segundo Popper, todos “nos contribuímos, mesmo que de forma pequena, através do uso da
fala” (POPPER, 1975, p. 157). Neste sentido, essa nossa tarefa de investigação se constitui
como uma atividade do terceiro mundo, do mundo das ideias objetivas.
No que se refere a historicidade, entendemos que “a análise da situação pelo
historiador é uma conjectura histórica (POPPER, 1975, p. 178), ou seja, o pesquisador é
também historiador. Assim, o que ele tem de fazer como historiador não é representar
experiências passadas, mas enfileirar argumentos objetivos pró e contra sua análise
situacional e conjectural. (POPPER, 1975, p. 178). Por isso, a nossa pesquisa se constitui
como um recorte histórico de uma realidade dada que pode ser compreendida como
construção social.
Essa análise deve ser uma análise crítica, uma vez que para se compreender a
complexidade que envolve a escola, os sujeitos e os processos educacionais se faz necessário
considerar e buscar compreender todos os fatos que envolvem o objeto estudado. Para Bizzo
(1991), é importante considerar a influencia no meio, a mudança de costumes. Portanto,
principalmente nos estudos relacionados a seres humanos é necessário atenção para a cultura,
as condições de sobrevivência e as mudanças durante o processo de vida dos sujeitos”
(BIZZO, 1991, p. 19). Nesse sentido, para compreensão dos processos de implementação do
projeto político pedagógico da escola se faz necessário que o pesquisador tenha um contato
com o espaço da pesquisa e com os sujeitos, por meio de instrumentos que facilitem essa
correlação. Para Dartigues (1973) “A correlação entre sujeito-objeto só se da na intuição
originária da vivencia” (DARTIGUES, 1973, p. 23). Para este autor, “o mundo como
fenômeno só tem sentido em sua manifestação da vivência”, essa é uma nova atitude atitude
fenomenológica, “onde os fenômenos se dão a nós por intermédio dos sentidos”
(DARTIGUES, 1973, p. p. 19). Essa fenomenologia compreende a relação entre os três
mundos de Popper.
A partir do exposto, consideramos que a discussão em torno do projeto político
pedagógico da escola e a promoção de uma educação em direitos humanos aponta para uma
compreensão de que o conhecimento é algo possível através da razão humana. Nessa
concepção, os sujeitos o homem é visto como sujeito da história e ao mesmo tempo
condicionado as relações em sociedade. Portanto, os sujeitos a partir da sua interação e da
participação no ambiente da escola, da rua e da sociedade é sujeito de ação, de reflexão, de
intervenção e de mudança na sociedade em que vive.

REFERÊNCIAS

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