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Herberto Helder Poetas contemporâneos

EDUCAÇÃOLITERÁRIA|GRAMÁTICA

1. Explicita o campo semântico de fonte, tendo em conta os sentidos literais e figurados. RETOMA

2. Lê a Parte II do poema “Fonte”.

Fonte
No sorriso louco das mães batem as leves
gotas de chuva. Nas amadas
caras loucas batem e batem
os dedos amarelos das candeias.
Que balouçam. Que são puras.
Gotas e candeias puras. E as mães
aproximam-se soprando os dedos frios.
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Seu corpo move-se
pelo meio dos ossos filiais, pelos tendões
e órgãos mergulhados,
e as calmas mães intrínsecas sentam-se
nas cabeças filiais.
Sentam-se, e estão ali num silêncio demorado e
[apressado

1 vendo tudo,
0 e queimando as imagens, alimentando as imagens
enquanto o amor é cada vez mais forte.
E bate-lhes nas caras, o amor leve.
O amor feroz.
E as mães são cada vez mais belas.
Pensam os filhos que elas levitam.
Flores violentas batem nas suas pálpebras.
Elas respiram ao alto e em baixo. São
silenciosas.
E a sua cara está no meio das gotas particulares
da chuva,
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5 em volta das candeias. No contínuo
escorrer dos filhos.
As mães são as mais altas coisas
que os filhos criam, porque se colocam
na combustão dos filhos, porque
os filhos estão como invasores dentes-de-leão
no terreno das mães.
E as mães são poços de petróleo nas palavras dos
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filhos,
e atiram-se, através deles, como jatos
para fora da terra.

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E os filhos mergulham em escafandros no interior


de muitas águas,
e trazem as mães como polvos embrulhados nas mãos
e na agudeza de toda a sua vida.
E o filho senta-se com a sua mãe à cabeceira da mesa,
e através dele a mãe mexe aqui e ali,
nas chávenas e nos garfos.
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E através da mãe o filho pensa
que nenhuma morte é possível e as águas
estão ligadas entre si
por meio da mão dele que toca a cara louca
da mãe que toca a mão pressentida do filho.
E por dentro do amor, até somente ser possível
amar tudo,
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e ser possível tudo ser reencontrado por dentro do amor.

HELDER, Herberto (2009). Ofício Cantante – Poesia Completa. Lisboa, Assírio & Alvim, pp. 47-48.

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3. Ao longo do poema, o sujeito poético descreve as mães e o processo de maternidade.

3.1. Transcreve trechos que remetam para as seguintes características das mães:
a. as mães são a fonte/origem da vida;
b. as mães encontram-se intrinsecamente ligadas aos filhos;
c. as mães nutrem um amor incondicional pelos filhos;
d. a maternidade eleva as mães a um estatuto de superioridade;
e. a relação entre mãe e filho também se caracteriza pelo conflito;
f. os filhos são o prolongamento das mães; é através das mães que os filhos se constroem.

3.2. Identifica o principal recurso expressivo utilizado para descrever as mães.

4. Interpreta o do título do poema (“Fonte”), relacionando-o com o sentido global do poema.

5. Lê a informação seguinte:

Poética de Herberto Helder

Na poética de Herberto Helder, a língua materna encontra um eco na figura


da própria mãe, que, por um lado, é aquela que dá a vida e é portadora da
memória, e, por outro, é também aquela que é modificada pelo nascimento do
filho. […] O filho é aquele que renova a língua materna, que revolve o solo do
passado para extrair o substrato a partir do qual se constrói o presente.

LEAL, Izabel (2008). “No reino das mães: notas sobre a poética de Herberto Helder” ,
Cadernos de Letras da UFF – Dossiê: Literatura, língua e identidade, n.º 34, p. 127 [Com supressões].

5.1. Consideras que a informação se pode aplicar ao poema “Fonte”? Justifica.

6. Lê o “Poema à Mãe”, de Eugénio de Andrade, e evidencia possíveis pontos de contacto entre


este poema e o poema “Fonte”, de Herberto Helder.

Poema à Mãe
No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe

Tudo porque já não sou


o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.

Tudo porque tu ignoras


que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
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Por isso, às vezes, as palavras que te digo


são duras, mãe,

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e o nosso amor é infeliz.

Tudo porque perdi as rosas brancas


que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.

Se soubesses como ainda amo as rosas,


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talvez não enchesses as horas de pesadelos.

Mas tu esqueceste muita coisa;


esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Mas – tu sabes – a noite é enorme,
Olha – queres ouvir-me? –
e todo o meu corpo cresceu.
às vezes ainda sou o menino
Eu saí da moldura,
que adormeceu nos teus olhos;
dei às aves os meus olhos a beber.
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ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
Não me esqueci de nada, mãe.
como as que tens na moldura;
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
ainda oiço a tua voz: 35

Era uma vez uma princesa


Boa noite. Eu vou com as aves.
no meio de um laranjal…
ANDRADE, Eugénio de (2012). Primeiros Poemas – As Mãos e os Frutos –
Os Amantes sem Dinheiro. Porto: Assírio & Alvim, pp. 97-98.
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SOLUÇÕES|SUGESTÕESMETODOLÓGICAS

“Fonte” (p. 61)

Gramática | Educação Literária


1. Sentidos literais: lugar de onde brota água continuamente, nascente; água que nasce do solo; bica por onde corre
água; construção provida de uma ou mais bicas ou torneiras por onde corre água potável; chafariz; pessoa, instituição ou
documento que constitui a origem de uma informação; qualquer substância ou objeto que produz energia, luz ou calor;
conjunto de caracteres com o mesmo estilo, tamanho e face. Sentidos figurados: origem; proveniência; causa; motivo;
texto originário de uma obra.

3.1. Exemplos: a. Título. b. Versos 8-12, 38-39. c. Versos 16, 17-18, 48-50. d. Versos 19-20, 28-29. e. Versos 30-32. f.
Versos 33-35, 43-45.

3.2. Metáfora.

4. Título que remete para uma origem ancestral, que será explicitada ao longo do poema (fonte/origem > mãe).

5.1. Exemplo: A informação aplica-se ao poema, pois a Mãe pode ser encarada como metáfora da língua “materna”; é
através da mãe que o filho se constrói, renovando a língua materna, embora com algum atrito.

6. Representação da mãe como origem/fonte; ligação intrínseca entre mãe e filho (“Poema à Mãe”, vv. 22-24), que também
se caracteriza pelo conflito (“Poema à Mãe”, vv. 9-11, 17-21).

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