Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
PUC-SP
SÃO PAULO
2017
AMANDA MARTINEZ LOURIDO
SÃO PAULO
2017
BANCA EXAMINADORA
______________________________________
______________________________________
______________________________________
Agradecimentos
Aos colegas com os quais tive o prazer de percorrer este caminho, em especial
Lia, Eliane, Felipe e Angélica, por terem tornado meus dias nesta grande cidade
muito melhores.
À minha família, em especial àqueles sem os quais nada seria possível, meus
pais, por acreditarem e contribuírem infinitamente nos meus sonhos. Ao meu
irmão e ao meu parceiro, Daniel e Gustavo, pelas alegrias e pelo apoio que
tornaram este caminho mais leve.
Vou mostrando como sou
E vou sendo como posso
Jogando meu corpo no mundo,
Andando por todos os cantos
E pela lei natural dos encontros,
Eu deixo e recebo um tanto
E passo aos olhos nus
Ou vestidos de lunetas
Passado, presente
Participo sendo o mistério do planeta
Novos Baianos
RESUMO
The presente study composes the research line “Childhood and adolescence
panorama: a phenomenological study about psychoeducational practices in
institutions”, coordinated by Professor Dr. Luciana Szymanski, of the research
group on educational practices and psychoeducational attention in the family,
school and community (ECOFAM). Conducted in a municipal elementar school
on the outskirts of São Paulo, this research aimed to understand the corporeity
and its unfoldings in the school context. This experience of research and
psychoeducational intervention was an opportunity to think about the relation
between University and School, allowing to perceive the ample possibilities for
enrichment and improvement for both institutions, also enable to understand the
phenomenological approach as facilitator of a questioning method and with a
critical view when faced with society challenges. This study consists in a
qualitative, participatory and interventional research, based on the
phenomenological approach, especially the Merleau Ponty thought. It’s was
carried out an investigation about the body with the school community based on
three aspects: 1. Identify the ways of manifestation and expression of corporeity
in daily life, spaces and school activities. 2. Understand the relation between
educators and the issue of corporeity. 3. Promote an area of intervention-
reflection with the educators about the corporeity and its possibilities in the
pedagogigcal practice. The procedures used in the research were the participant
observation and the reflective encounter, proposed by Szymanski, H. The
analysis was made from the notion of Constelation, proposed by Szymanski, H.
and from the merleaupontian comprehension about the corporeity and other
aspects related to the theme. In the dialogue with the educators there were
criticisms to the brazilian educational structure, on how to mantain segmented
and controlling practices about the body and the students knowledge. The body
shows up as a part of the cartesian dichotomy, devalued and subjugated to
rationalized contente and practices. On the other hand, the extracurricular
activities reveal the corporal character and the appreciation of experience that
can be provided by school education, although extensive discussion is still
needed about these aspects in the school environment, in view of transformations
that understand education and learning as experiences of human existence that
can only be realized through corporeity .
APRESENTAÇÃO .............................................................................................. 8
Primeiros passos ............................................................................................ 8
Corpo: um fenômeno a ser investigado ........................................................ 10
A pesquisa .................................................................................................... 15
1. A DICOTOMIA MENTE-CORPO EM PERSPECTIVA .............................. 17
1.1. O paradigma cartesiano e a cisão mente-corpo .................................. 17
1.2. Corpo e controle social ........................................................................ 22
1.3. O corpo como personagem na educação ........................................... 27
2. CORPOREIDADE E EDUCAÇÃO: CONTRIBUIÇÕES À LUZ DO
PENSAMENTO DE MERLEAU-PONTY........................................................... 34
2.1. Corporeidade....................................................................................... 36
3. MÉTODO E ATITUDE FENOMENOLÓGICA NA PESQUISA .................. 43
3.1. Método e rigor em fenomenologia: outras contribuições de Merleau-
Ponty............................................................................................................. 47
3.1.1. “Retornar às coisas mesmas” ....................................................... 52
3.1.2. Redução fenomenológica ............................................................. 54
3.1.3. Intencionalidade ............................................................................ 56
3.2. Contexto da pesquisa.......................................................................... 58
3.2.1. O território ..................................................................................... 58
3.2.2. A escola ........................................................................................ 59
3.2.3. Participantes parceiros ................................................................. 61
3.2.4. Cuidados éticos ............................................................................ 62
3.3. Procedimentos .................................................................................... 63
3.3.1. Observação participante ............................................................... 64
3.3.2. Encontros reflexivos ..................................................................... 70
4. DESVELANDO CORPOS, PALAVRAS E SENTIDOS .............................. 73
4.1. Diário de bordo .................................................................................... 73
4.2. Encontros com as educadoras ............................................................ 75
4.3. Como se desvelam os corpos: análise em foco .................................. 81
4.3.1. “Então, a minha didática quem faz sou eu” - cuidar de ser
professora... .............................................................................................. 84
4.3.2. Experiências de ser professora: um retorno à coisa mesma ........ 90
4.3.3. “E a escola acaba sendo... presa” - desafios de ser professora e
críticas ao mundo escolar vivido ............................................................... 95
CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 110
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 115
ANEXO I ......................................................................................................... 118
ANEXO II ........................................................................................................ 119
ANEXO III ....................................................................................................... 120
ANEXO IV ...................................................................................................... 122
8
APRESENTAÇÃO
Primeiros passos
Foi na dança que percebi minha relação mais íntima e compreensiva com
meu corpo e suas possibilidades de movimento. Aos 7 anos de idade iniciei
minha formação em ballet clássico na cidade onde morava. Naquela época, meu
interesse maior e minha curiosidade repousavam nos elementos que
compunham aquele universo artístico inteiramente novo para mim.
Noutro lugar a dança não era possível. Não era uma prática ou lazer da
minha família e amigos, e na escola simplesmente não havia momento para
qualquer manifestação do meu corpo e dos meus colegas. Os espaços e as
atividades escolares, na maior parte do tempo, não contemplavam e muitas
vezes não permitiam aquilo que eu vivia tão intensamente com meu corpo na
dança.
Entretanto, por ter sido a dança a via que encontrei para manifestar minha
corporeidade1, acreditava que tudo aquilo que se relacionava ao meu corpo só
era possível em salas espelhadas, com música alta e barras de ferro nas
paredes. Por muito tempo não percebi possibilidades de me expressar
corporalmente em outros momentos e situações da minha vida. Aos poucos fui
percebendo que a dança não era para mim uma prática, mas sim uma
possibilidade de ser e apreender o mundo ao meu redor. Busquei, a partir de
então, encontrar este modo de ser nas escolhas que fui fazendo ao longo da
minha vida.
1
Conceito cunhado por Merleau-Ponty, a ser explicitado no tópico seguinte.
10
Meu encontro com esta escola inspirou em mim a busca por modos de
fazer educação que fossem “integrais”, o que exige e possibilita maneiras mais
criativas de estar na escola, tanto para alunos quanto para professores. A
tentativa de dar conta deste compromisso comigo mesma foi o que me trouxe ao
mestrado em Educação: Psicologia da Educação, na Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo.
2
A autora opta pelo termo corporalidade como uma possibilidade de tradução da obra de
Merleau-Ponty. Entretanto, corporalidade e corporeidade referem-se ao mesmo fenômeno aqui
estudado.
12
A forma dicotômica como a escola lida com seus alunos possui bases
históricas e filosóficas, que remontam aos primórdios da educação. Buss-Simão
et al (2010), fazem uma reflexão acerca da infância e do corpo na educação a
partir da dicotomia entre as dimensões de natureza e cultura. Acentuam que a
temática corpo e infância vem sendo estudada de forma segmentada,
privilegiando ora as perspectivas biológicas, ora as sociológicas e culturalistas.
Esta abordagem cindida do tema negligencia a atenção aos aspectos inter-
relacionais entre estas duas visões.
A pesquisa
Dessa forma, percebeu que não apenas os sentidos, mas tudo aquilo que
pertence ao mundo físico, ao qual denominou res extensa – coisas, corpos,
sensações – são passíveis de dúvida. Por outro lado, a res cogitans - a razão
pura, o pensamento em essência, o espírito – sempre se orienta pela razão, pois
não parte de elementos sensíveis e, portanto, apresenta maior veracidade.
3
A obra original “Meditações metafísicas” foi publicada originalmente em 1641, e o exemplar
utilizado como base teórica para nossa pesquisa data de 2005. Nas referências a esta obra que
se seguirão ao longo deste texto a data que aparecerá junto ao nome do autor será a do exemplar
utilizado para a realização deste estudo. Adotamos este modo de apresentação das referências
ao longo de todo este trabalho.
19
Assim, chega a seguinte afirmação: “Mas o que sou então? Uma coisa
que pensa. O que é uma coisa que pensa? Isto é uma coisa que duvida, que
concebe, que afirma, que nega, que quer, que não quer, que imagina e que
sente.” (DESCARTES, 2005, p. 47-48) Estas ações relacionadas ao pensamento
são consideradas como modos de pensar que se unificam no ser pensante.
Além disso, Descartes (2005) faz outra distinção entre o espírito e o corpo,
identificando que o corpo é composto por partes, enquanto o espírito é uno. É
possível ter algumas partes do corpo subtraídas sem que isso afete a razão,
entretanto, a razão quando retirada acaba por anular o ser e a existência do
corpo por inteiro.
Por volta do século XVII e XVIII, percebeu-se que o corpo poderia ser
utilizado como objeto passível de manipulação e alvo de interesses de poder. Ao
mesmo tempo em que podia ser manipulado e treinado, também era possível
controlar e submeter o corpo. As técnicas de controle e aperfeiçoamento das
habilidades corporais foram exploradas inicialmente na área militar, mas
rapidamente foram difundidas na educação, nas instituições hospitalares e na
área industrial. (FOUCAULT, 1975/2014)
Estes territórios não são apenas espaços físicos, mas também práticas,
hábitos, ideias e rotinas que vão ocupando os territórios individuais de cada
pessoa. O que determina a criação destes territórios de dominação, segundo
Mondardo (2009), é a classe burguesa, por meio do poder do Estado. Neste
sentido, a movimentação e ação dos corpos passa a ser utilizada como
estratégia de controle das pessoas, por meio de regras, normas e leis.
4
Palavra de origem grega que se refere ao tempo em sua dimensão cronológica (segundos,
minutos, horas, dias, meses, anos, séculos).
27
5
Corpo, neste sentido, e ao longo de todo o trabalho, compreendido enquanto corporeidade,
aspecto a ser explicitado ao longo deste capítulo.
35
2.1. Corporeidade
[...] meu corpo conta-se entre as coisas, é uma delas, está preso
no tecido do mundo, e sua coesão é a de uma coisa. Mas, dado
que vê e se move, ele mantém as coisas em círculo a seu redor,
elas são um anexo ou um prolongamento dele mesmo, estão
incrustadas em sua carne, fazem parte de sua definição plena,
e o mundo é feito do estofo mesmo do corpo.
em si, ou melhor, é o em si por excelência, sua definição é ser em si. [...] o espaço
é a evidência do onde.”
Esta familiaridade com que o ser humano habita o mundo permite refletir
sobre o modo como as escolas são estruturadas e organizadas, algo percebido
na escola onde realizamos nossa pesquisa. A disposição dos móveis e objetos
e os espaços ocupados e disponíveis nas salas de aula e nos demais espaços
da escola revelam uma proposta e convocam determinadas atitudes, e não
outras.
Isto significa que salas com carteiras enfileiras e voltadas à lousa, por
exemplo, dificultam a comunicação dos alunos entre si e sugerem maior atenção
à pessoa do professor, enquanto que salas com carteiras organizadas em
semicírculo convidam os alunos a olharem-se e conversarem, estando o
professor integrado ao grupo.
40
O modo como alguém olha o mundo faz parte de sua condição de ser
lançado no mundo, e também de sua percepção sobre si, sua corporeidade e a
relação que estabelece com as coisas. Neste sentido, Merleau-Ponty (2004, p.
17 e 18) afirma que: “Encontramos aqui, pela primeira vez, essa ideia de que o
homem não é um espírito e um corpo, mas um espírito com um corpo, que só
alcança a verdade das coisas porque seu corpo está como que cravado nelas.”
E nesta relação do ser humano com o mundo estão presentes não apenas
coisas e mundo, mas também os outros, aqueles que se relacionam com este
mundo também sendo corporeidade, tão enraizados nas coisas quanto nós. Para
Merleau-Ponty (2004) não há vivência de si mesmo para o ser humano que seja
individual e solitária, pois a “consciência” de si mesmo só se dá a partir da
experiência com o outro.
É no outro que o ser humano se reconhece, ao ver e ser visto, tocar e ser
tocado, falar e ser falado. A partir da experiência de uma pessoa com outra é
que se torna possível uma reflexão de si, um retorno a si mesmo. Neste sentido,
o ser si mesmo se faz possível na coletividade, por meio da linguagem e da
experiência de viver no mundo com os outros:
6
No capítulo reservado à análise, estas questões sobre a escola pesquisada e as compreensões
de corporeidade ali presentes serão mais profundamente exploradas.
42
7
O termo “ciência exata” aparece traduzido desta mesma forma nos exemplares de 1994, 1999
e 2015 da obra “Fenomenologia da percepção”, de Merleau-Ponty, da editora Martins Fontes.
Apesar de acreditarmos que o termo não condiz com a natureza de seu pensamento filosófico,
consideramos que o autor tenha feito uso das aspas (“”) para sinalizar que estava dando a este
termo um outro significado que não o original ou comumente utilizado à época. Possivelmente,
Merleau-Ponty considerava que a fenomenologia fazia uma tentativa de elevar-se ao mesmo
estatuto das ciências ditas “exatas”, mas ao mesmo tempo mantendo sua proximidade e
fidelidade ao mundo vivido, ou seja, uma ciência que seja respeitada e considerada como tal,
mas que não se afasta do mundo e das coisas para elevar-se a tamanha potência.
48
Nesta intenção da busca por acessar aquilo que precede a ciência e suas
pré-concepções, adotando uma postura fenomenológica, como sugere Merleau-
Ponty, nossa pesquisa valeu-se de uma etapa de observações no contexto de
realização da investigação. Por meio destas observações, foi possível conhecer
a rotina da escola, as pessoas que ali estavam, e os sentidos que se mostravam.
53
que pudéssemos estar atentas àquilo que nos pertencia enquanto compreensão
e àquilo que podíamos perceber na escola e junto às pessoas com as quais nos
encontramos.
Esta redução será sempre uma tentativa, limitada e incompleta, uma vez
que não é possível empreender uma reflexão sem que haja um mundo a ser
refletido. Assim, o filósofo atesta que:
3.1.3. Intencionalidade
necessário considerar também o mundo enquanto algo que está sendo refletido
e, por outro lado, como algo que toca a existência antes mesmo de ser pensado.
Estas são as dimensões reflexiva e pré-reflexiva do mundo no pensamento
merleaupontiano.
É neste sentido que se considera cada pesquisa uma forma única de olhar
o mundo, as pessoas e os fenômenos. Cada pesquisador carrega consigo uma
pré-compreensão do mundo que se formou ao longo de sua história e das
experiências que vivenciou. Esta singularidade também está no modo como as
coisas e as pessoas mostram-se em cada situação, a cada vez.
contrapartida, nos disponibilizamos nesta escola com um olhar que carrega uma
forma única de estar no mundo. Neste sentido, a intencionalidade revela o
encontro único e singular que cada pesquisa pode propiciar àqueles que se
colocam à disposição do mostrar-se dos fenômenos.
3.2.1. O território
3.2.2. A escola
8
Nome fictício.
62
9
O PEA e o Horário Coletivo compõem a JEIF (Jornada Especial Integral de Formação). Além
das 25 horas-aula dedicadas à regência, os professores que optam por essa jornada cumprem
mais 11 horas/aula, sendo 4 horas/aula dedicadas ao PEA (Projeto Especial de Ação), dedicado
ao estudo de um tema específico
63
3.3. Procedimentos
de análise, pois muitos elementos destas descrições foram utilizados para ampliar
a percepção sobre os aspectos analisados em nossa investigação.
Neste caso, o papel de “Doc” nesta pesquisa foi ocupado pela professora
de Educação Física já mencionada, Isadora. Além de se colocar à disposição
frente à proposta, permitiu nossa participação em suas aulas, convidou-nos para
uma atividade extracurricular (visita a uma exposição), facilitou nossa
comunicação com outros professores, além de estar a todo momento tirando
dúvidas sobre funcionamentos locais, situações corriqueiras, eventos da escola
e sobre seus planejamentos e propostas de aulas e atividades.
10
O projeto de intervenção apresentado à equipe gestora da instituição escolar onde a pesquisa
foi realizada e o conteúdo programático das atividades realizadas nos encontros estão
disponíveis nos Anexos I e II.
73
11
Os materiais e recursos utilizados nos encontros reflexivos estão descritos detalhadamente e
com as referências no Apêndice II.
74
1º Encontro
12
Referimo-nos ao grupo de pessoas que participou dos encontros reflexivos com palavras do
gênero feminino (as participantes, as professoras, etc), pois este grupo foi composto em sua
maioria por participantes do sexo feminino.
76
13
Referência no Apêndice II
77
O limite do corpo foi outro tema que envolveu o grupo, trazendo para a
conversa um número maior de participantes. O corpo foi identificado como um
limite, no qual a agressividade, o toque e a movimentação excessiva foram
considerados elementos negativos no comportamento dos alunos.
2º Encontro
3º encontro
O terceiro grupo propôs uma visita dos alunos dos nonos anos a um asilo,
diante da qual fariam um planejamento de atividades a serem realizadas com os
moradores do local e mobilizariam a comunidade escolar e local com
arrecadação de fraldas geriátricas, roupas, alimentos e outros utensílios.
Indicaram que os adolescentes, de maneira geral, não costumam ter paciência
e respeito às pessoas idosas, e que esta atividade envolve a necessidade de
cuidar do outro e ter um olhar sensível às necessidades de uma pessoa que
apresenta limitações de idade.
Com esta proposta, a intenção deste grupo foi oferecer aos alunos
oportunidades de vivenciar diferentes lugares e culturas, ampliando seu olhar
sobre o mundo e sobre suas próprias possibilidades, pois seus alunos pertencem
a uma classe social que não pode custear este tipo de atividade, e o território
onde vivem não oferece tais dispositivos culturais.
81
Neste mesmo sentido, a análise dos materiais foi feita tendo clareza da
“intencionalidade” que dirigiu nosso olhar ao fenômeno da corporeidade nesta
escola, pois, como aponta Szymanski, H (2004), a forma como as constelações
são organizadas revelam a compreensão do pesquisador frente aos fenômenos.
14
Descritos no capítulo anterior.
84
4.3.1. “Então, a minha didática quem faz sou eu” - cuidar de ser professora
Apesar da escuta aos alunos ser uma atitude valorizada pelo grupo,
revela-se nesta fala que há uma dificuldade em manter-se atenta às
necessidades dos alunos. Quando esta participante revela que “não são todos
os professores que dão a oportunidade para o aluno falar”, sugere que a escuta
aos alunos não é uma prática docente ou uma exigência da escola ou do modelo
educacional escolar, mas sim uma escolha que cabe a cada professora,
dependendo da disponibilidade particular de cada uma.
Podemos pensar também que, além das professoras não terem respaldo
e cobrança do modelo educacional para realizarem esta atitude de escuta, estas
86
O outro tema que aparece enquanto atitude docente para este grupo
revela a compreensão de que a professora é a responsável pelo modo como o
ensino e os conhecimentos serão apresentados aos alunos. Este assunto
apareceu em dois relatos. No primeiro, a professora indicou que o seu
preconceito pessoal em relação a uma palavra poderia ter privado seus alunos
de uma atividade, como revela o trecho a seguir:
É neste sentido que este grupo considera que o papel que a professora
desempenha é fundamental na forma como os alunos serão apresentados aos
conhecimentos e também na seleção de quais conteúdos estarão disponíveis ou
não para serem acessados. Este outro trecho revela este mesmo tema de outra
forma:
Este relato carrega muitos elementos que indicam atitudes valorizadas por
esta participante em relação ao seu papel enquanto professora. Ela afirma que
a didática, que entendemos aqui como metodologia didática, é uma escolha
particular de cada professora, ou seja, cada professora escolhe o modo como
quer ministrar suas aulas, apresentar os conteúdos e se relacionar com seus
alunos.
15
É importante relembrar aqui que os encontros reflexivos que foram realizados com este grupo
de professoras tiveram o tema “o corpo na escola”, nos quais a concepção de aprendizagem por
meio de vivencias e experiências foi assunto recorrente. Assim, consideramos que o grupo achou
importante destacar esta compreensão como uma atitude docente a ser valorizada frente à
proposta trabalhada aos longo dos encontros.
89
Percebemos que esta professora faz uma crítica ao modo como o ensino
e a aprendizagem se dão no ensino fundamental. Nossa pesquisa e os encontros
reflexivos realizados com este grupo também apontaram críticas neste mesmo
sentido. Como revela não saber outra forma de realizar sua atividade docente
frente à imposição do sistema de ensino formal, esta professora encontrou nas
brincadeiras com o corpo e o movimento uma saída para experimentar com seus
alunos outras formas de estar na escola.
alunos o modo como os temas escolares estão repletos de vida, fazem parte do
mundo vivido, se dão na dimensão da existência.
- O problema é o boicote!
100
Neste trecho, a participante indica que a idade dos alunos faz com que
optem por conteúdos e metodologias mecânicas, com relevância e importância
social. Para ela, a aprendizagem desses conteúdos faz com que os alunos
sintam-se valorizados em seus grupos sociais. Frente a isso, as professoras
sentem-se impedidas de propor atividades que tratem de outros temas.
Umas das questões levantadas pelo grupo como uma crítica ao longo dos
três encontros foi a diferenciação entre práticas e possibilidades estruturais e
curriculares da educação infantil e do ensino fundamental, e também entre
ensino fundamental I e II.
Outras críticas neste sentido foram feitas pelo grupo, como o crescente
desinteresse dos alunos frente às atividades realizadas e o estranhamento dos
alunos diante da fusão de assuntos de diferentes disciplinas. Ao relatar uma
situação vivenciada em sua sala de aula, uma das participantes considera que
estes comportamentos e reações dos alunos são gerados pelo modo como a
escola organiza o ensino dos conhecimentos.
105
Neste relato, a participante faz uma crítica direta ao modo como a escola
organiza os conhecimentos em disciplinas que não se articulam entre si, o que
faz com que os alunos aprendam que a inter-relação entre assuntos de
diferentes áreas do conhecimento não é possível.
16
Citamos órgãos municipais de ensino, pois nossa pesquisa realizou-se numa escola municipal
de ensino fundamental da cidade de São Paulo.
108
O grupo compreende que a educação dos seus alunos deve ser mais
ampla do que apenas os conteúdos apresentados pelas disciplinas e que, para
isso, deve haver projetos e atividades que rompam a segmentação dos
conhecimentos e tratem de temas e assuntos da vida, das relações, das pessoas
e do mundo. A escola pode ser um lugar onde a vida pode ser ressignificada,
compreendida a partir de diversos aspectos, vislumbrada em suas diferentes
possibilidades.
109
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Nosso percurso por este tema nos revelou que é fundamental chamar a
atenção da escola e da comunidade escolar para olhar o modo como ela vem se
organizando e que tipo de formação vem oferecendo aos seus alunos. É neste
sentido que nossa escolha pelo pensamento de Merleau-Ponty evidencia-se,
pois ele reivindica um olhar que se coloca no meio das coisas e não pairando
sobre elas.
111
diálogo. Foi proveitoso, fez surgir sentidos e reflexões, frutos que gerarão novos
planos e práticas na escola.
Nossa pesquisa nos mostrou que resistir não é se portar como um muro,
que impede a passagem daquilo que se deseja evitar; resistir é deixar virem as
adversidades para que a partir delas possamos, juntos, encontrar e reencontrar
formas de fazer aquilo em que acreditamos. Resistir é ser rio, correnteza, que se
mantém passando, não importa a largura ou estreiteza das margens que o
contém. Sejamos rio.
115
REFERÊNCIAS
CARMO, Paulo Sérgio do. Merleau-Ponty: uma introdução. 2ª ed. São Paulo:
EDUC (Série Trilhas), 2011.
ANEXO I
Visto da instituição:____________________________
Assinatura do pesquisador:____________________________
Assinatura do orientador:_____________________________
119
ANEXO II
Assinatura do participante:____________________________
Assinatura do pesquisador:____________________________
Assinatura do orientador:_____________________________
120
ANEXO III
Bibliografia Básica:
ANEXO IV
O corpo no dia-a-dia
Questões a perceber:
Concepção de corpo
A palavra CORPO
17
NARANJO, Javier (Seleção). Casa das estrelas: o universo contado pelas crianças.
Tradução por Carla Branco. Ilustração por Lara Sabatier. Rio de Janeiro: Foz, 2013.
18
PESSOA, Fernando. Poesia completa de Alberto Caeiro. Edição por Fernando Cabral
Martins e Richard Zenith. São Paulo: Companhia das letras, 2008.
124