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Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de Minas Gerais

PROJETO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA

É o CRMV-MG participando do processo de atualização


técnica dos profissionais e levando informações da
melhor qualidade a todos os colegas.

VALORIZAÇÃO PROFISSIONAL
compromisso com você

www.crmvmg.org.br
Editorial
Caros Colegas,
Novamente temos o prazer de encaminhar à
comunidade veterinária mineira o volume 68 do
Cadernos Técnicos. A Escola de Veterinária e o
Conselho Regional de Medicina Veterinária de
Minas Gerias, com satisfação, vêm consolidando a
parceria e o compromisso entre as duas instituições
com relação à educação continuada da comunidade
dos médicos veterinários e zootecnistas de Minas
Gerais. O presente número aborda, de forma ob-
jetiva, a temática saneamento ambiental, gerencia-
mento de resíduos sólidos, um assunto de altíssima
relevância, pois o manejo de resíduos sólidos está
presente no dia a dia do profissional, tanto na clí-
nica veterinária como na propriedade rural. Desse
modo, este volume irá contribuir para o melhor
entendimento dessas questões pelos profissionais
da área. Com este número do Cadernos Técnicos,
esperamos contribuir tanto para a conscientização
quanto para a informação dos colegas e, assim, au-
xiliá-los na construção de melhores opções de ma-
nejo de animais no contexto em que estão inseridos.
Portanto, parabéns à comunidade de leitores que
Universidade Federal utiliza o Cadernos Técnicos para aprofundar seu co-
de Minas Gerais nhecimento e entendimento sobre o gerenciamento
Escola de Veterinária de resíduos sólidos, em benefício dos animais e da
Fundação de Estudo e Pesquisa em
Medicina Veterinária e Zootecnia sociedade.
- FEPMVZ Editora

Conselho Regional de Prof. Antonio de Pinho Marques Junior


Medicina Veterinária do Editor-Chefe do Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia (ABMVZ) -
Estado de Minas Gerais CRMV-MG nº 0918
- CRMV-MG Prof. José Aurélio Garcia Bergmann
Diretor da Escola de Veterinária da UFMG - CRMV-MG nº 1372
www.vet.ufmg.br/editora
Prof. Marcos Bryan Heinemann
Correspondência: Editor do Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia - CRMV-MG nº 1372
FEPMVZ Editora
Caixa Postal 567 Prof. Nivaldo da Silva
30123-970 - Belo Horizonte - MG Presidente do CRMV-MG - CRMV-MG nº 0747
Telefone: (31) 3409-2042
E-mail: editora.vet.ufmg@gmail.com
Conselho Regional de Medicina
Veterinária do Estado de Minas
Gerais - CRMV-MG
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CADERNOS TÉCNICOS DE
VETERINÁRIA E ZOOTECNIA
Edição da FEPMVZ Editora em convênio com o CRMV-MG
Fundação de Estudo e Pesquisa em Medicina Veterinária e
Zootecnia - FEPMVZ

Editor da FEPMVZ Editora:


Prof. Antônio de Pinho Marques Junior

Editor do Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia:


Prof. Marcos Bryan Heinemann

Editor convidado para esta edição:


Luciano dos Santos Rodrigues

Revisora autônoma:
Giovanna Spotorno

Tiragem desta edição:


9.000 exemplares

Layout e editoração:
Soluções Criativas em Comunicação Ldta.

Fotos da capa:
bigstockphoto.com

Impressão:
Imprensa Universitária

Permite-se a reprodução total ou parcial,


sem consulta prévia, desde que seja citada a fonte.

Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia. (Cadernos Técnicos da Escola de Veterinária da UFMG)

N.1- 1986 - Belo Horizonte, Centro de Extensão da Escola deVeterinária da UFMG, 1986-1998.

N.24-28 1998-1999 - Belo Horizonte, Fundação de Ensino e Pesquisa em Medicina Veterinária e Zootecnia, FEP
MVZ Editora, 1998-1999

v. ilustr. 23cm

N.29- 1999- Belo Horizonte, Fundação de Ensino e Pesquisa em Medicina Veterinária e Zootecnia, FEP MVZ
Editora, 1999¬Periodicidade irregular.

1.Medicina Veterinária - Periódicos. 2. Produção Animal - Periódicos. 3. Produtos de Origem Animal, Tecnologia
e Inspeção - Periódicos. 4. Extensão Rural - Periódicos.

I. FEP MVZ Editora, ed.


Prefácio
Luciano dos Santos Rodrigues
Israel José da Silva - CRMV-MG nº 1033
Marcos Bryan Heinemann - CRMV-MG nº 1372
Professores da Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais
Os sistemas de produção animal sempre foram alvo de inovações tec-
nológicas para melhorias de performances em conversão alimentar, qua-
lidade das carcaças, técnicas de reprodução, softwares de gerenciamento
e sanidade do plantel. Entretanto, muito pouco se trabalhou na vertente
de se obter um animal ou produto deste com menor quantidade de resí-
duos gerados por unidade de produção. Na concepção contemporânea
de produtividade, a escala por unidade de área ou tempo, com qualidade
da mercadoria, é o referencial exigido pelo mercado. Hoje, sabidamente,
como em outros nichos de produção, os produtos de origem animal terão
pela frente a barreira de serem produzidos de forma limpa, ou seja, sem
causarem impacto ambiental. Nesse aspecto, muito terá que ser feito para
se quebrarem paradigmas que predominam no sistema atual. Os profis-
sionais que atuam na área de produção deverão ter foco nos impactos
gerados pela forma de produção, além das metas de lucro. Precisarão ter
conhecimento de como mitigar os impactos ambientais, pois poderão
ser surpreendidos na hora da aprovação dos projetos agropecuários nos
fóruns de homologação das licenças ambientais ou outorga do uso da
água. Acreditamos que, em um futuro próximo, os profissionais de me-
dicina veterinária e zootecnia irão se deparar com situações em que o ge-
renciamento de resíduos sólidos, com a utilização dos preceitos de redu-
ção, reutilização e reciclagem, será visto como condição sine qua non para
o bom funcionamento das atividades desses profissionais. Logo, uma
visão em que o manejo de resíduos seja considerado no custo da matriz
de produção passa a ser um requisito para os profissionais, que terão que
andar em simbiose com os órgãos reguladores e fiscalizadores das leis
ambientais, evitando a reengenharia dos projetos com o somatório de
custos extras em adaptações e reformas, nem sempre adequadas financei-
ramente à matriz de produção. Esta edição do Cadernos Técnicos revisa
os principais aspectos do gerenciamento de resíduos sólidos, bem como
a legislação ambiental em relação à atividade dos médicos veterinários
e zootecnistas, entre outros profissionais. Esperamos, dessa forma, que
possa trazer o conhecimento da questão resíduos na agroindústria aos
leitores deste volume.
Sumário

1. Legislação sobre resíduos sólidos.................................................................9


Luciano dos Santos Rodrigues
Revisão sobre as principais leis ambientais sobre resíduos sólidos
2. Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento......................... 20
Luciano dos Santos Rodrigues
Israel José da Silva
Rosângela Francisca de Paula Vítor Marques
Camila Silva Franco
O artigo aborda os principais conceitos de manejo dos resíduos sólidos
domiciliares
3. Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde..................................... 35
Luciano dos Santos Rodrigues
Israel José da Silva
Anna Carolina Ferreira Spelta
Bruna Coelho Lopes
O capítulo trata sobre o gerenciamento de resíduos gerados em estabelecimentos
prestadores de serviços de saúde
4. Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e
agroindustriais........................................................................................... 49
Luciano dos Santos Rodrigues
Israel José da Silva
Bruna Coelho Lopes
Anna Carolina Ferreira Spelta
Revisão sobre as características gerenciais dos resíduos sólidos no setor rural
5. Aproveitamento energético de resíduos sólidos....................................... 65
Luciano dos Santos Rodrigues
Israel José da Silva
Ana Cristina Araujo Pinto
Como fazer e quais os tipos de aproveitamento energético de resíduos sólidos
Legislação sobre
resíduos sólidos
bigstockphoto.com

Luciano dos Santos Rodrigues


Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais
Contato: lsantosrodrigues@gmail.com

Introdução poder público. A PNRS também dispõe


sobre os instrumentos econômicos e as
A temática resíduos sólidos é mui- formas de destinação.
to atual e de grande relevância para O grande volume de resíduos só-
indústrias, comércio, agropecuária e lidos gerados nas diversas atividades
principalmente para os municípios domésticas, comerciais, industriais e
brasileiros, sobretudo após a edição da agrícolas tem sido considerado um dos
Lei Federal nº 12.305, que instituiu a maiores responsáveis pela poluição am-
Política Nacional de Resíduos Sólidos1 biental no Brasil e no mundo.
(PNRS). O aumento do consumo e a precária
A referida lei estabeleceu os princí- destinação que tem sido dada aos resí-
pios, os objetivos, os instrumentos, as duos sólidos, como o usual lançamen-
diretrizes e definiu as responsabilidades to em rios, córregos e terrenos baldios,
dos geradores de resíduos sólidos e do além dos grandes impactos ambientais
Legislação sobre resíduos sólidos 9
causados, são agravados da melhor tecnologia
Resíduos sólidos:
em razão de sérios pro- disponível.
material, substância,
blemas de saúde pública Outras definições
objeto ou bem
ocorridos. importantes da PNRS:
descartado resultante
A aplicação da
de atividades humanas 1. área contaminada:
PNRS, com destaque
em sociedade, a cuja local onde há conta-
para o aterramento dos
destinação final se minação causada pela
rejeitos, é fundamental
procede, se propõe disposição, regular ou
para que se possa rever-
proceder ou se está irregular, de quaisquer
ter a situação atual e pas-
obrigado a proceder, substâncias ou resíduos;
sa pelo gerenciamento
nos estados sólido ou 2. ciclo de vida do produ-
adequado dos resíduos
semissólido, bem como to: série de etapas que
pelos geradores.
gases contidos em envolvem o desenvol-
Política recipientes e líquidos vimento do produto, a
cujas particularidades
Nacional dos tornem inviável o seu
obtenção de matérias-
-primas e insumos, o
Resíduos lançamento na rede processo produtivo, o
Sólidos pública de esgotos ou em consumo e a disposição
A PNRS (Lei corpos d’água, ou exijam final;
Federal nº 12.305/10), para isso soluções técnica
ou economicamente 3. coleta seletiva: coleta
no art. 3º, define resídu- de resíduos sólidos pre-
os sólidos da seguinte inviável em face da
melhor tecnologia viamente segregados
forma: conforme sua constitui-
resíduos sólidos: ma-
disponível.
ção ou composição;
terial, substância, objeto
4. destinação final ambientalmente ade-
ou bem descartado resultante de ativi-
quada: destinação de resíduos que
dades humanas em sociedade, a cuja
inclui a reutilização, a reciclagem,
destinação final se procede, se propõe
a compostagem, a recuperação e o
proceder ou se está obrigado a proceder,
aproveitamento energético ou outras
nos estados sólido ou semissólido, bem
destinações admitidas pelos órgãos
como gases contidos em recipientes e
competentes do Sisnama (Sistema
líquidos cujas particularidades tornem
Nacional do Meio Ambiente),
inviável o seu lançamento na rede pú-
do SNVS (Sistema Nacional de
blica de esgotos ou em corpos d’água,
Vigilância Sanitária) e do Suasa
ou exijam para isso soluções técnica
(Sistema Unificado de Atenção à
ou economicamente inviável em face
Sanidade Agropecuária), entre elas

10 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


a disposição final ambientalmente outra destinação final ambiental-
adequada; mente adequada;
5. disposição final ambientalmente ade- 9. reciclagem: processo de transforma-
quada: distribuição ordenada de ção dos resíduos sólidos que envol-
rejeitos em aterros, observando vem a alteração de suas propriedades
normas operacionais específicas, de físicas, físico-químicas ou biológicas,
modo a evitar danos ou riscos à saú- com vistas à transformação em insu-
de pública e a segurança e a minimi- mos ou novos produtos, observadas as
zar os impactos ambientais adversos; condições e os padrões estabelecidos
6. geradores de resíduos sólidos: pessoas pelos órgãos competentes do Sisnama
físicas ou jurídicas, de direito públi- e, se couber, do SNVS e do Suasa;
co ou privado, que geram resíduos 10. rejeitos: resíduos sólidos que, de-
sólidos por meio de suas atividades, pois de esgotadas todas as possibili-
nelas incluído o consumo; dades de tratamento e recuperação
7. gerenciamento de resíduos sólidos: con- por processos tecnológicos dispo-
junto de ações exercidas, direta ou níveis e economicamente viáveis,
indiretamente, nas etapas de coleta, não apresentem outra possibilidade
transporte, transbordo, tratamento que não a disposição final ambien-
e destinação final ambientalmente talmente adequada;
adequada dos resíduos sólidos e dis- 11. reutilização: processo de aproveita-
posição final ambientalmente ade- mento dos resíduos sem sua trans-
quada dos rejeitos, de acordo com o formação biológica, física ou físico-
Plano Municipal de Gestão Integrada -química, observadas as condições
de Resíduos Sólidos (PMGIRS) ou e os padrões estabelecidos pelos
com o Plano de Gerenciamento de órgãos competentes do Sisnama e,
Resíduos Sólidos (PGRS), exigidos se couber, do SNVS e do Suasa.
na forma desta lei; Observa-se por esses conceitos que
8. logística reversa: instrumento de os resíduos sólidos são tudo aquilo que
desenvolvimento econômico e é remanescente da cadeia produtiva,
social, caracterizado por um con- mas que ainda pode sofrer processo de
junto de ações, procedimentos tratamento e recuperação para reutiliza-
e meios destinados a viabilizar a ção ou reciclagem, enquanto os rejeitos
coleta e a restituição dos resíduos são os resíduos sólidos que já sofreram
sólidos ao setor empresarial, para processo de tratamento e não apresen-
reaproveitamento, em seu ciclo ou tam outra alternativa a não ser a disposi-
em outros ciclos produtivos, ou ção final em aterros sanitários.

Legislação sobre resíduos sólidos 11


Objetivos e Princípios São princípios da PNRS:
da Política Nacional de 1. Princípio da prevenção e da precau-
Resíduos Sólidos ção: visa prevenir e precaver a ocor-
rência de danos ambientais, pois o
São objetivos da PNRS:
dano ambiental pode ter como ca-
1. proteção da saúde pública e da qua-
racterísticas a irreparabilidade e a
lidade ambiental;
irreversibilidade.
2. não geração, redução, reutilização, 2. Princípio do poluidor-pagador e do
reciclagem e tratamento de resídu- protetor-recebedor: o objetivo do
os sólidos, bem como a disposição poluidor-pagador é imputar ao po-
final ambientalmente adequada dos luidor o custo financeiro pela polui-
rejeitos; ção que ele tiver causado ao meio
3. estímulo à adoção de padrões sus- ambiente, ou seja, à ação de poluir,
tentáveis de produção e consumo cabe sempre uma devida e neces-
de bens e serviços; sária reação, que corresponde ao
custo pelo dano causado. É a partir
4. desenvolvimento e adoção de tec-
deste princípio que se tem funda-
nologias limpas como forma de mi-
mento a aplicação da responsabili-
nimizar impactos ambientais;
dade civil pelo dano ambiental, pois
5. redução do volume e da periculosi- o poluidor sabe perfeitamente que,
dade dos resíduos perigosos; ao poluir, será obrigado a pagar fi-
nanceiramente pelo dano que hou-
6. incentivo à indústria da recicla-
ver praticado.
gem, tendo em vista fomentar o
uso de matérias-primas e insumos O princípio do poluidor-pagador
derivados de materiais recicláveis e é evitar que danos sejam causados ao
reciclados; meio ambiente, porém não significa que
o poluidor possa comprar sua cota de
7. gestão integrada de resíduos sólidos; poluição, mas sim que o poluidor deverá
8. articulação entre as diferentes esfe- ser obrigado a ressarcir monetariamente
ras do poder público e destas com o dano que causar ao meio ambiente.
o setor empresarial com vistas à O protetor-recebedor é aquele que
cooperação técnica e financeira protege o meio ambiente em benefício
para a gestão integrada de resíduos da coletividade e que, portanto, deve
sólidos; receber uma compensação financeira
9. capacitação técnica continuada na como incentivo ao serviço prestado.
área de resíduos sólidos. Trata-se de remuneração indireta pelo

12 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


serviço ambiental prestado. Consiste e futuras. Na PNRS, o desenvolvi-
em uma remuneração, em geral, conce- mento sustentável aparece na obri-
dida por meio da redução de alíquotas gatoriedade da coleta seletiva e da
do IPTU (Imposto Predial e Territorial reciclagem de resíduos, incluindo a
Urbano), isenção de ITR (Imposto produção de embalagens que pro-
Territorial Rural), ou redução de alíquo- piciem a reciclagem e a reutilização.
tas do ICMS (Imposto sobre Circulação 5. Princípio da ecoeficiência: decorre
de Mercadorias e do princípio do consu-
Serviços). No caso do
Os instrumentos da mo sustentável, ou seja,
ICMS, a compensa-
Politica Nacional de a necessidade de gera-
ção foi denominada de
Resíduos Sólidos são: ção de produtos que
ICMS Ecológico ou
i) os planos de resíduos atendam ao princípio
ICMS Verde.
sólidos; ii) os inventários da sadia qualidade de
3. Princípio da visão sis- e o sistema declaratório vida e, ao mesmo tem-
têmica na gestão de anual de resíduos po, permitam a redução
resíduos sólidos: na sólidos; iii) a coleta do impacto ambiental
gestão de resíduos seletiva, os sistemas causado pelo consumo.
sólidos, as variáveis de logística reversa e 6. Princípio da respon-
ambiental, social, outras ferramentas sabilidade compartilha-
cultural, econômica, relacionadas à da pelo ciclo de vida dos
tecnológica e de saú- implementação da produtos: tal princípio
de pública devem ser responsabilidade envolve as cadeias pro-
analisadas de modo compartilhada pelo ciclo dutivas, o poder públi-
abrangente e em de vida dos produtos; co e a coletividade titu-
conjunto. iv) o incentivo à criação lar do bem ambiental,
4. Princípio do desenvol- e ao desenvolvimento de todos unidos no senti-
vimento sustentável: cooperativas o outras do de produzir e desti-
o desenvolvimen- formas de associação de nar corretamente os re-
to sustentável tem catadores de materiais síduos, com a finalidade
como fundamento, reutilizáveis e recicláveis; de reduzir o impacto
o crescimento eco- v) o monitoramento e a ambiental.
nômico, sem afetar o fiscalização ambiental,
sanitária e agropecuária; Os instrumentos
meio ambiente eco- da Politica Nacional de
logicamente equili- vi) a pesquisa científica
e tecnológica; vii) a Resíduos Sólidos são:
brado e a sadia qua- i) os planos de resíduos
lidade de vida das educação ambiental e os
acordos setoriais. sólidos; ii) os inventá-
gerações presentes
Legislação sobre resíduos sólidos 13
rios e o sistema declaratório anual de Classificação dos resíduos
resíduos sólidos; iii) a coleta seletiva, os sólidos
sistemas de logística reversa e outras fer-
Os resíduos sólidos são classificados
ramentas relacionadas à implementação
quanto à origem em:
da responsabilidade compartilhada pelo
1. resíduos domiciliares: os originários
ciclo de vida dos produtos; iv) o incen-
de atividades domésticas em resi-
tivo à criação e ao desenvolvimento de dências urbanas;
cooperativas o outras formas de associa- 2. resíduos de limpeza urbana: originá-
ção de catadores de materiais reutilizá- rios da varrição, limpeza de logra-
veis e recicláveis; v) o monitoramento douros e vias públicas e outros ser-
e a fiscalização ambiental, sanitária e viços de limpeza urbana;
agropecuária; vi) a pesquisa científica e 3. resíduos sólidos urbanos: os resídu-
tecnológica; vii) a educação ambiental e os englobados como domiciliares e
os acordos setoriais. de limpeza urbana;
4. resíduos de estabelecimentos comer-
No art. 9º da PNRS, são determina-
ciais e prestadores de serviços: os gera-
das as prioridades de ações na gestão e
dos nessas atividades, exceto os de
no gerenciamento de resíduos sólidos,
limpeza urbana, saneamento básico,
sendo estabelecida a seguinte ordem: a serviços de saúde, construção civil e
não geração, a redução, a reutilização, a serviços de transporte;
reciclagem, o tratamento dos resíduos 5. resíduos dos serviços públicos de sane-
sólidos e a disposição final ambiental- amento básico: os gerados nessas ati-
mente adequada dos rejeitos. Com isso, vidades, exceto os resíduos sólidos
observa-se claramente que a a gestão e urbanos;
o gerenciamento dos resíduos priorita- 6. resíduos industriais: os gerados nos
riamente passam pela redução do con- processos produtivos e nas instala-
sumo e pela reciclagem, sendo aterrados ções industriais;
apenas os rejeitos. 7. resíduos de serviços de saúde: os gera-
dos nos serviços de saúde, confor-
A recuperação energética de resí- me definido em regulamento ou em
duos sólidos poderá ser utilizada desde normas estabelecidas pelos órgãos
que a tecnologia empregada seja com- do Sisnama e do SNVS;
provadamente viável técnica e ambien- 8. resíduos da construção civil: os ge-
talmente e que haja implantação de ri- rados nas construções, reformas,
goroso programa de monitoramento de reparos e demolições de obras
emissão de gases tóxicos, aprovada pelo da construção civil, incluídos os
órgão ambiental. resultantes da preparação e es-
14 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
cavação de terrenos para obras e municipal. No âmbito municipal, o
civis; Plano de Gestão Integrada de Resíduos
9. resíduos agrossilvopastoris: os gera- Sólidos deve ter, no mínimo, o seguinte
dos nas atividades agropecuárias e conteúdo:
silviculturais, incluídos os relacio-
1. diagnóstico da situação dos resí-
nados a insumos utilizados nessas
duos sólidos gerados no respectivo
atividades;
território, contendo a origem, o vo-
10. resíduos de serviços de transporte: os
lume, a caractterização dos resíduos
originados de portos, aeroportos,
e as formas de destinação e disposi-
terminais alfandegários, rodovi-
ários, ferroviários e passagens de ção final adotadas;
fronteira; 2. identificação de áreas favoráveis
11. resíduos de minerais: os gerados na para disposição final ambiental-
atividade de pesquisa, extração ou mente adequada de rejeitos;
beneficiamento de minérios.
3. identificação de possibilidades de
implantação de soluções consorcia-
Quanto à periculosidade, os resídu-
das ou compartilhadas com outros
os são classificados em:
municípios, considerando, nos cri-
1. perigosos: os resíduos perigosos são
térios de economia de escala, a pro-
denominados aqueles que, em razão
de suas características de inflamabi- ximidade dos locais estabelecidos e
lidade, corrosividade, reatividade, as formas de prevenção dos riscos
toxicidade, patogenicidade, carcino- ambientais;
genicidade, teratogenicidade e muta- 4. identificação dos resíduos sólidos
genicidade, apresentam significativo e dos geradores desses resíduos
risco à saúde pública ou à qualidade sujeitos a plano de gerenciamento
ambiental, de acordo com o regula- específico ou a sistema de logística
mento ou a norma técnica; reversa da PNRS, bem como às nor-
2. não perigosos: são aqueles que não mas estabelecidas pelos órgãos do
se enquadram na definição dos Sisnama e do SNVS;
perigosos.
5. procedimentos operacionais e
Planos de resíduos especificações mínimas a serem
sólidos adotados nos serviços públicos de
limpeza urbana e no manejo de re-
Os planos de resíduos sólidos são síduos sólidos, incluída a disposição
executados em âmbito nacional, esta- final ambientalmente adequada dos
dual, microrregional, intermunicipal rejeitos;
Legislação sobre resíduos sólidos 15
6. indicadores de desempenho opera- 14. metas de redução, reutilização, co-
cional e ambiental dos serviços pú- leta seletiva e reciclagem, entre ou-
blicos de limpeza urbana e manejo tras, com vistas a reduzir a quanti-
de resíduos sólidos; dade de rejeitos encaminhados para
7. regras para o transporte e outras disposição final ambientalmente
etapas do gerenciamento de resídu- adequada;
os sólidos; 15. descrição de formas e dos limites
8. definição das responsabilidades da participação do poder público
local na coleta seletiva e na logística
quanto à sua implementação e ope-
reversa;
racionalização, incluídas as etapas
do Plano de Gerenciamento de 16. meios a serem utilizados para o con-
Resíduos Sólidos (PGRS); trole e a fiscalização, no âmbito local,
da implementação e operacionaliza-
9. programas e ações de capacitação
ção dos Planos de Gerenciamento
técnica voltados à sua implementa-
de Resíduos Sólidos;
ção e operacionalização;
17. ações preventivas e corretivas a se-
10. programas e ações de educação am-
rem praticadas, incluindo programa
biental que promovam a não gera-
de monitoramento;
ção, a redução, a reutilização e a re-
ciclagem de resíduos sólidos; 18. identificação dos passivos ambien-
tais relacionados aos resíduos sóli-
11. programas e ações para participação
dos, incluindo áreas contaminadas
dos grupos interessados, em espe-
e respectivas medidas saneadoras.
cial as cooperativas ou outras for-
mas de associação de catadores de Estão sujeitos à elaboração do Plano
materiais reutilizáveis e recicláveis, de Gerenciamento de Resíduos Sólidos:
formados por pessoas físicas de bai- 1. os geradores de resíduos sólidos tais
xa renda; como: resíduos dos serviços públi-
12. mecanismos para a criação de fon- cos de saneamento, resíduos indus-
tes de negócios, emprego e renda, triais, resíduos de serviços de saúde,
mediante a valorização dos resíduos e resíduos de mineração;
sólidos; 2. as pessoas jurídicas que tenham
13. sistema de cálculo dos custos da como finalidade social a atuação no
prestação dos serviços públicos de tratamento ou em qualquer outra
limpeza urbana e de manejo de resí- etapa do gerenciamento de resíduos
duos sólidos, bem como a forma de sólidos, incluídas a destinação e a
cobrança desses serviços; disposição final;
16 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
3. os estabelecimentos comerciais e de pelos órgãos do Sisnama, do SNVS
prestação de serviços que: e do Suasa e, se houver, o Plano
a) gerem resíduos perigosos; Municipal de Gestão Integrada de
Resíduos Sólidos:
b) gerem resíduos que, mesmo ca-
racterizados como não perigosos, 4. explicitação dos responsáveis por
por sua natureza, composição ou etapa do gerenciamento de resíduos
volume, não sejam equiparados sólidos;
aos resíduos domiciliares pelo 5. definição dos procedimentos opera-
poder público municipal; cionais relativos às etapas do geren-
4. as empresas de construção civil, nos ciamento de resíduos sólidos sob
termos do regulamento ou de nor- responsabilidade do gerador;
mas estabelecidas pelos órgãos do 6. identificação das soluções consor-
Sisnama; ciadas ou compartilhadas com ou-
5. os responsáveis pelos terminais e tros geradores;
por outras instalações de transpor- 7. ações preventivas e corretivas a
te, nos termos do regulamento ou serem executadas em situações
de normas estabelecidas pelos ór- de gerenciamento incorreto ou
gãos do Sisnama e, se couber, do acidentes;
SNVS, as empresas de transporte;
8. metas e procedimentos relaciona-
6. os responsáveis por atividades
dos à minimização da geração de
agrossilvopastoris, se exigido pelo
resíduos sólidos e, observadas as
órgão competente do Sisnama, do
normas estabelecidas pelos órgãos
SNVS ou do Suasa.
do Sisnama, do SNVS e do Suasa, à
O Plano de Gerenciamento de reutilização e reciclagem;
Resíduos Sólidos (PGRS) deve ter o se-
9. ações relativas à responsabilidade
guinte conteúdo mínimo:
compartilhada pelo ciclo de vida
1. descrição do empreendimento ou dos produtos;
da atividade;
10. medidas saneadoras dos passivos
2. diagnóstico dos resíduos sólidos ge- ambientais relacionadas aos resídu-
rados ou administrados, contendo a os sólidos;
origem, o volume e a caracterização
dos resíduos, incluindo os passivos 11. periodicidade de sua revisão, obser-
ambientais a eles relacionados; vado, se couber, o prazo de vigência
da respectiva licença de operação a
3. observadas as normas estabelecidas cargo dos órgãos do Sisnama.
Legislação sobre resíduos sólidos 17
A PNRS instituiu a 6. propiciar eficiência e
A PNRS instituiu
responsabilidade com- sustentabilidade para as
a responsabilidade
partilhada pelo ciclo de atividades produtivas;
compartilhada pelo
vida dos produtos, a qual ciclo de vida dos 7. incentivar as boas
deve abranger fabrican- produtos, a qual deve práticas de responsabi-
tes, importadores, distri- abranger fabricantes, lidade socioambiental.
buidores e comerciantes, importadores, De acordo com o
consumidores e titulares distribuidores art. 33, estão obrigados
dos serviços públicos de e comerciantes, a estruturar e imple-
limpeza urbana e de ma- consumidores e titulares mentar sistemas de lo-
nejo de resíduos sólidos. dos serviços públicos
gística reversa, median-
Os principais objetivos de limpeza urbana e
te retorno dos produtos
da responsabilidade de manejo de resíduos
após o uso pelo consu-
compartilhada são: sólidos.
midor, de forma inde-
1. compatibilizar inte- pendente do serviço
resses entre os agentes econômicos público de limpeza urbana e manejo de
e sociais e os processos de gestão resíduos sólidos, os fabricantes, impor-
empresarial e mercadológica com tadores, distribuidores e comerciantes
os de gestão ambiental, desenvol- de: i) agrotóxicos, seus resíduos e em-
vendo estratégias sustentáveis; balagens, assim como outros produtos
cuja embalagem, após o uso, constitua
2. promover o aproveitamento de resí- resíduo perigoso, observadas as regras
duos sólidos, direcionando-os para de gerenciamento de resíduos perigo-
a sua cadeia produtiva ou outras ca- sos previstas em lei ou regulamento, em
deias produtivas; normas estabelecidas pelos órgãos do
3. reduzir a geração de resíduos sóli- Sisnama, do SNVS e do Suasa, ou em
dos, o desperdício de materiais, a normas técnicas; ii) pilhas e baterias;
poluição e os danos ambientais; iii) pneus; iv) óleos lubrificantes, seus
resíduos e embalagens; v) lâmpadas flu-
4. incentivar a utilização de insumos orescentes, de vapor de sódio e mercú-
de menor agressividade ao meio am- rio e de luz mista; vi) produtos eletroe-
biente e de maior sustentabilidade; letrônicos e seus componentes.
5. estimular o desenvolvimento de No art. 47 da PNRS, foram estabele-
mercado, a produção e o consumo cidas as proibições das seguintes formas
de produtos derivados de materiais de destinação ou disposição final de re-
reciclados e recicláveis; síduos sólidos ou rejeitos:
18 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
• lançamento em de aterros sanitários ou
Quando decretada
praias, no mar ou industriais, em unida-
emergência sanitária,
em quaisquer corpos des de conservação e
a queima de resíduos
hídricos; em áreas de preservação
a céu aberto pode
permanente ou de pro-
• lançamento in natura ser realizada, desde
teção de mananciais.
a céu aberto, excetu- que autorizada e
ados os resíduos de acompanhada pelos Já o art. 49 trata das
mineração; órgãos competente do atividades proibidas em
• queima a céu aberto Sisnama, do SNVS e do áreas de disposição final
ou em recipientes, Suasa. de resíduos ou rejeitos,
instalações e equi- sendo as seguintes:
pamentos não licenciados para esta • utilização dos rejeitos dispostos
finalidade; como alimentação;
• outras formas vedadas pelo poder • catação;
público. • criação de animais domésticos;
Quando decretada emergência sani- • fixação de habitações temporárias ou
tária, a queima de resíduos a céu aberto permanentes;
pode ser realizada, desde que autorizada
e acompanhada pelos órgãos competen- • outras atividades vedadas pelo poder
te do Sisnama, do SNVS e do Suasa. público.
Assegurada a devida impermeabi- Referências
lização, as bacias de decantação de re- 1. BRASIL, Lei Federal nº 12.305, de 2 de agosto
síduos ou rejeitos industriais ou de mi- de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos
neração, devidamente licenciadas pelo Sólidos; altera a Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de
1998. Disponível em: https://www.planalto.gov.
órgão competente do Sisnama, não são br/ccivil_03/_ato2007-2010/2010/lei/l12305.
consideradas corpos hídricos. htm. Acesso em março de 2013.

Também fica proibida a disposição


final de rejeitos, incluída a instalação

Legislação sobre resíduos sólidos 19


Resíduos sólidos
domiciliares:
geração e
gerenciamento
Luciano dos Santos Rodrigues1*
Israel José da Silva1 CRMV 1033
Rosângela Francisca de Paula Vítor Marques1**
Camila Silva Franco1***
1
Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas
Gerais
* Autor para correspondência: lsantosrodrigues@gmail.com
** Engenheira florestal autônoma
*** Engenheira ambiental autônoma
bigstockphoto.com

Introdução Resíduos sólidos, definições


Os resíduos domiciliares são ge- Na literatura, é possível encon-
rados em residências e também em trar diversas definições e classificações
estabelecimentos particulares, como para resíduos sólidos, uma vez que
clínicas, agroindústrias e propriedades estas dependem dos objetivos deseja-
rurais, entre outros. É o lixo comum ge- dos. Segundo a Norma Brasileira NBR
rado pelas pessoas, e a prefeitura assume 10004, de 20041, resíduos sólidos são
responsabilidade de coleta, tratamento definidos como:
e destinação final adequados. “aqueles nos estados sólidos e se-
Outro aspecto relevante desse tipo missólidos, que resultam de atividades
de resíduo está relacionado à educação da comunidade de origem industrial,
ambiental, pois como esses resíduos doméstica, hospitalar, comercial, agrí-
são gerados por toda a população, to- cola, de serviços e de varrição. Ficam
dos devem saber das responsabilidades incluídos nesta definição os lodos pro-
nas etapas de gerenciamento desses venientes de sistemas de tratamento de
resíduos. água, aqueles gerados em equipamentos
20 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
e instalações de controle micamente inviáveis em
Resíduo: o que sobra
de poluição, bem como face da melhor tecnologia
de uma atividade
determinados líquidos disponível.”
qualquer.
cujas particularidades Em abordagens para
Lixo: o que sobra
tornem inviável o seu de uma atividade a educação ambiental,
lançamento na rede pú- qualquer e é Logarezzi3 difere resíduo
blica de esgotos ou em descartado sem de lixo da seguinte forma:
corpos d’água, ou exijam que seus valores a) Resíduo: o que sobra
para isso soluções técnica (sociais, econômicos e de uma atividade qual-
e economicamente invi- ambientais) potenciais
áveis em face da melhor quer. Antes de ser gerado,
sejam considerados.
tecnologia disponível.” o resíduo pode ser evita-
A Política Nacional do e, após, reutilizado ou
dos Resíduos Sólidos, instituída pela reciclado. Os resíduos sólidos são os
Lei n 12.305, de 2 de agosto de 2010 ,
o 2
de disposição inviável na rede de es-
define os resíduos sólidos como: goto ou de lançamento na atmosfera.
“Qualquer material, substância, ob- b) Lixo: o que sobra de uma ativida-
jeto, ou bem descartado resultante de de qualquer e é descartado sem que
atividades humanas em sociedade, a cuja
seus valores (sociais, econômicos e
destinação final se procede, se propõe
ambientais) potenciais sejam consi-
proceder ou se está obrigado a proceder,
derados. Incluem-se nesta categoria
nos estados sólido ou semisssólido, bem
como gases contidos em recipientes, e tanto os rejeitos como os recicláveis
líquidos cujas particularidades tornem e reutilizáveis quando destinados de
inviável seu lançamento na rede pública forma ambientalmente inadequada,
de esgotos ou em corpos d’água, ou exi- adquirindo aspectos de inutilidade,
jam para isso soluções técnica ou econo- estorvo, imundice e risco.
Tabela 1. Classificação dos resíduos sólidos quanto aos riscos potenciais
são aqueles que, em função de suas propriedades físicas, químicas ou infecto-
Classe I
contagiosas, podem apresentar riscos à saúde pública ou ao meio ambiente,
perigosos
ou ainda os inflamáveis, corrosivos, reativos, tóxicos ou patogênicos.
Classe II-A são aqueles que não se enquadram na classe I e que podem ser combustíveis,
não inertes: biodegradáveis ou solúveis em água.
são aqueles que, ensaiados segundo o teste de solubilização apresentado
Classe II-B pela NBR 10006/2004, não apresentam qualquer de seus constituintes solu-
inertes bilizados em concentrações superiores aos padrões de potabilidade da água,
excetuando os padrões de cor, turbidez, sabor e aspecto1.

Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 21


Classificação dos resíduos j) resíduos provenientes da mineração.
sólidos Nessa classificação, destaca-se a
necessidade de tratamento especial
Os resíduos sólidos podem ser clas-
aos resíduos industriais, RSS, RCC e
sificados quanto aos riscos potenciais e
agrossilvopastoris2.
à origem.
A classificação dos resíduos sólidos
Quantos aos riscos potenciais pode ter como base as possibilidades
de reaproveitamento, já com vistas à
A Tab. 1 mostra a classificação dos
triagem adequada. Os resíduos sólidos
resíduos sólidos quanto aos riscos
podem ser aproveitados como fonte
potenciais.
energética, em processos como a bio-
O conhecimento das característi-
digestão da matéria orgânica e a utili-
cas químicas possibilita a seleção de
zação do biogás ou pirólise, também
processos de tratamento e técnicas de
como matéria-prima no processo de
disposição final4. Percebe-se, então, a
reciclagem.
necessidade de maior rigor na coleta, no
armazenamento, no transporte e na des- Caracterização física dos
tinação final dos resíduos da classe I, se- resíduos sólidos
guidos pelos resíduos da classe II-A, em A composição gravimétrica do lixo
comparação aos resíduos da classe II-B. pode variar tanto qualitativa quanto
Quanto à origem quantitativamente, de acordo com os
seguintes fatores: sociais, econômicos,
Segundo a Lei nº 12.305, de 2 de
agosto de 20102 , classificam-se os resí- Outros Recicláveis
duos sólidos quanto à origem como:
a) resíduos sólidos domiciliares (RSD); 16,7%
b) resíduos de limpeza urbana;
31,9%
c) resíduos sólidos urbanos (RSU), en-
globados em i e ii;
d) resíduos provenientes do comércio e
de prestadores de serviços; 51,4%
e) resíduos provenientes da indústria;
f)resíduos provenientes de serviços de Matéria
saúde (RSS); Orgânica
g) resíduos da construção civil (RCC);
Figura 1. Composição gravimétrica de
h) resíduos provenientes de atividades
resíduos sólidos no Brasil.
agrossilvopastoris;
i) resíduos de serviços de transportes; Fonte: Plano Nacional de Resíduos Sólidos.

22 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


culturais, geográficos e cli- de extrema importância,
A composição
máticos. Neste contexto, é
gravimétrica do lixo no sentido de identificar
de interesse obter infor- sua densidade e utilizar
pode variar tanto
mações que relacionam os valores para o dimen-
qualitativa quanto
os resíduos às classes so- quantitativamente, sionamento de áreas de
cioeconômicas e à época de acordo com os disposição final, galpões
do ano . A Fig. 1 permite
4
seguintes fatores: de triagem, capacidade
visualizar, de um modo sociais, econômicos, de coleta, entre outros.
geral, a participação de culturais, geográficos A geração de RSU
diferentes materiais na e climáticos. no Brasil registrou cres-
fração total dos RSU no cimento de 1,8%, de
ano de 2011, porém esta 2010 para 2011, como
varia de acordo com as diferentes re- reportado pela Associação Brasileira
giões do país. de Empresas de Limpeza Pública e
Qualquer que seja a classificação Resíduos Especiais8 (Abrelpe), no
dos RSU, sua caracterização e o co- panorama dos resíduos sólidos no
nhecimento de aspectos relativos à Brasil. Observou-se uma taxa de cres-
sua produção são elementos impor- cimento de 0,8% na geração de RSU
tantes para o planejamento correto per capita, inferior à taxa de cresci-
dos serviços de limpeza pública, em mento populacional urbano (1,8%),
todas as suas etapas5. totalizando 61.936.368 ton. ano -1.
A quantidade exata de resíduos Entretanto, 6,4 milhões de tonela-
gerados é de difícil determinação das de RSU ainda deixaram de ser
pelo fato de esta sofrer interferências coletados no Brasil, no ano de 2011
pelo armazenamento, pela reutiliza- e, por consequência, tiveram destino
ção, pela reciclagem e pelo descarte impróprio.
em locais clandestinos, o que acaba No Brasil, são gerados mais 300
por desviar parte dos materiais antes g.hab-1dia de resíduos de varrição, limpe-
do descarte em local de domínio pú- za de logradouros e entulhos. Portanto,
blico. Em razão dessas interferências, a média nacional de produção de RSU
na prática, determina-se a quantida- é de 900 g.hab-1 dia,.porém há variação
de de resíduos sólidos coletados4. de acordo com o tamanho da cidade,
Contudo, são inúmeras as metodolo- podendo chegar até a 1300 g.hab-1 dia
gias utilizadas na caracterização dos em cidades como Rio de Janeiro9.
resíduos sólidos 6,7. Segundo a Pesquisa Nacional de
A caracterização volumétrica dos Saneamento Básico10 (PNSB), os va-
resíduos sólidos é também um estudo zadouros a céu aberto, conhecidos
Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 23
Emissão de gases e odores Fumaça com possíveis
gases tóxicos
Resíduos levados
pelo vento

Curso d'água

Alimento e abrigo de Escoamento Contaminação do Contaminação


animais e insetos superficial lençol freáco do solo
(vetores de doenças) de chorume pelo chorume

Figura 2. Impactos ambientais e sociais da disposição de resíduos sólidos urbanos em


vazadouro a céu aberto (lixão).

Fora de área de preservação 300 m de coleção hídrica


permanente (APP) Coleção hídrica
Coleção hídrica
Aterro controlado
500 m de núcleo populacional
Núcleo
populacional

Figura 3. Esquema de um aterro controlado, com destaque para as medidas mínimas de


redução dos impactos ambientais.

24 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


como “lixões”, ainda são o destino nos últimos 20 anos. Em 1989, eles re-
final dos resíduos sólidos em 50,8% presentavam o destino final de resídu-
dos municípios brasileiros, mas esse os sólidos em 88,2% dos municípios.
quadro teve uma mudança significativa As regiões Nordeste (89,3%) e Norte

Drenagem superficial
Grama
EM Drenagem interna
E T OR O
S
PA R Drenagem de gás
EM
O R ÃO PRE
E T Célula de lixo
S Ç
CU
EXE
OR O Saída do chorume
S E T C LU Í D para estação de
N
CO tratamento
Camada de solo de
cobertura
Lençol freáco

Frente de trabalho

Camada impermebializante

Dreno de chorume na base do aterro

Figura 4. Esquema de um aterro sanitário, com detalhamento de suas estruturas.

Figura 5. Usina de triagem e compostagem de lixo.

Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 25


(85,5%) registraram as 52,8%, respectivamente,
Segundo a
maiores proporções de conheciam a existência
Pesquisa Nacional
municípios que destina- de catadores) e, na região
de Saneamento
vam seus resíduos aos li- Nordeste, os municípios
Básico10 (PNSB),
xões, enquanto as regiões de Pernambuco (67%),
os vazadouros a céu
Sul (15,8%) e Sudeste Alagoas (64%) e Ceará
aberto, conhecidos
(18,7%) apresentaram (60%)10.
como “lixões”,
os menores percentuais. Dos 5.507 municí-
ainda são o destino
Paralelamente, houve pios brasileiros, 4.026, ou
final dos resíduos
uma expansão no desti- seja, 73,1% têm popula-
sólidos em 50,8%
no dos resíduos para os ção até 20.000 habitan-
dos municípios
aterros sanitários, solu- tes. Nestes municípios,
brasileiros.
ção mais adequada, que 68,5% dos resíduos gera-
passou de 17,3% dos mu- dos são vazados em lixões
nicípios, em 2000, para 27,7%, em 2008 e em alagados . 10

(Tab. 2). Já no estado de Minas Gerais, como


Em todo o país, aproximadamente forma de disposição final de resíduos,
26,8% dos municípios que possuíam 30,61% dos municípios são atendidos
serviço de manejo de resíduos sólidos com vazadouros a céu aberto, 17,86%
tinham o conhecimento da presença de com aterros controlados, 45,87%
catadores nas unidades de disposição fi- com aterros sanitários e 5,44% com
nal de resíduos sólidos. A maior quanti- UTCs11.
dade estava nas regiões Centro-Oeste e O município presta serviços de
Nordeste: 46% e 43%, respectivamente. gestão e gerenciamento dos resíduos
Destacavam-se os municípios do Mato sólidos aos moradores, o que abrange
Grosso do Sul e de Goiás (57,7% e as atividades referentes à tomada de
decisões estratégicas,
Tabela 2. Destino final dos resíduos sólidos, por unidades de
envolvendo políticas,
destino dos resíduos no Brasil, 1989/2008
instrumentos, meios e
Destino final dos resíduos, por unidades de boas práticas ambien-
destino (%) tais, e aos aspectos
Ano
Vazadouro a céu Aterro Aterro tecnológicos e opera-
aberto controlado sanitário cionais, envolvendo
1989 88,2 9,6 1,1 fatores administrati-
2000 72,3 22,3 17,3 vos, gerenciais, econô-
2008 50,8 22,5 27,7 micos, ambientais e de
desempenho. Tais ser-
Fonte: IBGE.10

26 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


viços relacionam-se à coleta, redução, área hidrológica, geológica, ecológica,
segregação, reutilização, acondiciona- cultural, topográfica, econômica e em
mento, transporte, tratamento, recu- tantas outras, para que sejam respeita-
peração de energia e destinação final dos os aspectos ambientais. Do contrá-
de resíduos sólidos12 e podem atingir rio, a consequência será a degradação
cerca de 20% dos gastos municipais, dos recursos naturais, podendo ainda
segundo o IBGE10. As diretrizes das se produzirem líquidos de percolação,
estratégias de gestão e gerenciamento dependendo do resíduo depositado no
de RSU objetivam, evitar ou reduzir a solo. Esses líquídos irão poluir as águas
geração de resíduos e poluentes pre- superficiais ou subterrâneas, produzir
judiciais ao meio ambiente e à saúde gases, maus odores, bem como compro-
pública. Desse modo, busca-se prio- meter o aspecto estético com a poluição
rizar a redução na fonte de geração, visual.
o reaproveitamento, o tratamento e a Em Minas Gerais, destacam-se qua-
disposição final. tro formas destinação final dos resíduos
A responsabilidade direta ou in- sólidos14:
direta da geração dos resíduos sóli- Vazadouro a céu aberto: caracteriza-
dos é disposta na Lei nº 12305/2010 do pela descarga dos resíduos sólidos
de Política Nacional de Resíduos sobre o solo, sem critérios técnicos e
Sólidos, que estabelece diretrizes re- medidas de proteção ambiental ou saú-
lativas à gestão integrada e ao geren- de pública, chamados “lixões”, não sen-
ciamento de resíduos sólidos, incluí- do passíveis de licenciamento (Fig. 2).
dos os perigosos, às responsabilidades Aterro controlado: é uma é uma
dos geradores e do poder público e aos técnica utilizada para confinar os
instrumentos econômicos aplicáveis2. resíduos sólidos urbanos sem poluir o
Contudo, a responsabilidade pela ge- ambiente externo; porém sem a imple-
ração e correto destino dos resíduos mentação de elementos de proteção
sólidos é atribuída às indústrias, trans- ambiental. Neste caso, deve ocorrer co-
portadoras, comércios, municípios e bertura dos resíduos por um material
consumidores pela Lei nº 9605 de cri- inerte após cada jornada de trabalho
mes ambientais13. e drenagem pluvial. O aterro contro-
lado deve localizar-se como determi-
Formas de disposição de na a Deliberação Normativa nº 11814
resíduos do Conselho Estadual De Política
A deposição dos resíduos sólidos Ambiental (Copam). Também não é li-
diretamente no solo requer um estu- cenciado (Fig. 3).
do das condições do ambiente, seja na Aterro sanitário: é uma técnica de
Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 27
disposição de resíduos sólidos urbanos um conjunto de estruturas físicas que se
no solo, que visa minimizar os danos compõem de setores como:
à saúde pública e os impactos sobre o Galpão de recepção
meio ambiente. Esse método utiliza Triagem do lixo
princípios de engenharia para confinar
Galpão para armazenamento dos
os resíduos sólidos à menor área e recicláveis
reduzi-los ao menor volume possível, Pátio de compostagem
recobrindo-os com uma camada de Armazenagem e qualidade do
terra na conclusão de cada trabalho, ou composto
intervalos menores, se necessário (Fig. Valas de aterro de rejeitos
4). Este utiliza sistema de impermeabi- Armazenagem e qualidade do
composto
lização de base e laterais, recobrimento
diário, coleta e drenagem de líquidos Danos e impactos ambientais
percolados, coleta e tratamento de causados pela disposição de
gases, sistema de drenagem superfi- resíduos sólidos
cial e monitoramento. Sua localização Os líquidos percolados (chorume)
também segue a DN 118 . O aterro e os gases produzidos nas áreas de dis-
14

sanitário é a forma mais adequada de posição final do RSU representam os


disposição final de resíduos sólidos, maiores problemas ambientais causa-
segundo a Lei nº 12.305/20102, e pode dos pela decomposição do lixo. Porém,
ser licenciado. outros danos podem ser destacados,
Usinas de triagem e compostagem tais como: poluição do solo e das águas
(UTC): constituídas por uma unidade superficiais; poluição de águas subterrâ-
de triagem manual de recicláveis, pátio neas; poluição visual; odores desagra-
de compostagem, galpões de armazena- dáveis; presença de animais, os quais
mento e área de aterramento de rejeitos representam vetores de doenças asso-
(Fig. 5). ciadas; presença de cata-
Para que a UTC apre- Os líquidos dores irregulares; intensa
sente bons resultados, é percolados degradação da paisagem;
necessário que se tenha (chorume) e os gases instabilidade dos taludes e
uma eficiente operação em produzidos nas áreas desvalorização imobiliária
todos os setores. As usi- de disposição final do no entorno15.
nas implantadas em áreas RSU representam os Em termos ambien-
apropriadas e licenciadas maiores problemas tais, os lixões agravam a
pela Fundação Estadual ambientais causados poluição do ar, do solo e
do Meio Ambiente14 de pela decomposição das águas, além de provo-
Minas Gerais dispõem de do lixo. car poluição visual. Nos
28 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
casos de disposição
de pontos de lixo nas Expressão
encostas, é possível da
ainda ocorrer a insta- Identidade
Responsa-
bilidade dos taludes bilidade e Cultura
pela sobrecarga e ab- descarte
sorção temporária da
água da chuva, provo-
cando deslizamentos. Estratégias
da globali- Momento
CONSUMO
histórico
Órgãos gestores zação
associados aos
resíduos sólidos
Senso de
No âmbito fe- conforto,
Mídia
deral, o Conselho modernidade
e higiene
Nacional do Meio Valores
Ambiente (Conama) emocionais
é o órgão consulti-
vo e deliberativo do
Sistema Nacional Figura 7. Consumo e hábitos da sociedade e a geração de
de Meio Ambiente resíduos sólidos.
(Sisnama), presidi-
do pelo Ministério do Meio Ambiente, do Conama, as resoluções quando se
e dispõe sobre a Política Nacional do trata de deliberações vinculadas a dire-
Meio Ambiente. São responsabilidades trizes e normas técnicas, critérios e pa-

Reflexivo
Consumo
Irreflexivo

Responsável
Resíduos sólidos Geração
Irresponsável

Sele vo
Descarte
Aleatório

Figura 8. Relação entre consumo e geração de resíduos sólidos.

Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 29


drões relativos à proteção ambiental e Hábitos da sociedade e a
ao uso sustentável dos recursos ambien- geração de resíduos sólidos
tais; moções relacionadas com a temáti-
Os problemas ambientais não são
ca ambiental; recomendações acerca da apenas do entorno, mas sim problemas
implementação de políticas, programas sociais, tanto por suas origens quanto
públicos e normas relacionadas à prote- por suas consequências. Aliado à gera-
ção ambiental; proposições e decisões16. ção e disposição final de resíduos sóli-
Em Minas Gerias, vinculados à dos está o ato de consumir.
Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Os atos de consumo são permeados
Desenvolvimento Sustentável (Semad) por valores culturais e emocionais com-
e integrantes do Conselho Estadual de plexos. Dada a complexidade das socie-
Política Ambiental (Copam), os órgãos dades contemporâneas, o consumo não
executivos, atuantes na tomada de ações se refere apenas ao resultado lógico da
para medidas adequadas do uso da água produção na cultura de consumo; há
e do solo são: a Fundação Estadual do dimensões estéticas e até lúdicas, cuja
Meio Ambiente (Feam), o Instituto relevância não pode ser subestimada.
Estadual de Florestas (IEF) e o Instituto Nesse contexto, destaca-se a ação da mí-
Mineiro de Gestão das Águas (Igam). O dia, responsável por adentrar o mundo
Igam, criado em 17 de julho de 1997, do indivíduo, por meio de sentimentos
orienta e incentiva a criação dos comitês de desejo em torno de produtos e ser-
de bacias hidrográficas, entidades que, viços. Portanto, o consumo pode ser
de forma descentralizada, integrada e analisado como relação entre classes
participativa, gerenciam o desenvolvi- sociais, gêneros, raças, períodos históri-
mento sustentável da bacia hidrográfica cos, entre outros18.
onde atuam17. O consumo de produtos e serviços
Por meio do programa Minas sem (Fig. 7) é definido por Logarezzi3 como
Lixões, a Feam promove uma das ações “o ato de adquirir e usar produtos e ser-
do Projeto Estruturador de Resíduos viços no desenvolvimento de atividades
Sólidos do Governo de Minas, o qual humanas entendidas como necessárias,
tem como objetivo promover e fomen- em determinado contexto cultural e em
tar a redução, o reaproveitamento, a determinado momento. O provimento
reciclagem e a disposição adequada de desses produtos e serviços envolve pro-
resíduos sólidos em Minas Gerais11. cessos diversos que estão associados a
Para isso, esse órgão atua mediante impactos socioambientais, como a de-
publicações de deliberações normati- manda por trabalho humano e explora-
vas, fiscalizações e orientações para o ção de recursos naturais (muitas vezes
licenciamento. em interações insustentáveis); adicio-

30 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


nalmente, em muitas atividades, surgem dos de evolução na produção e recicla-
sobras, chamadas resíduo.” gem de garrafas PET (politereftalato de
O nível de consumo deve ser re- etileno)19 , resumidos na Tab. 3.
lacionado não apenas às quantidades Pelos dados da Tab. 3, observa-se
dos itens consumidos, mas também à que, enquanto a reciclagem anual de
diversidade e descartabilidade (Fig. 8). garrafas PET representa cerca de 50%
O consumo e a geração de resíduo (ato do total produzido em 2009, a produção
de gerar uma sobra) podem ocorrer de de novas garrafas também representa a
forma responsável, quando há preocu- mesma porcentagem. Embora a reci-
pação do consumidor com a quantida- clagem de garrafas PET tenha crescido
de, a natureza, os processos e o contexto 56% de 2004 a 2009, a produção de
em que os resíduos são gerados, o que novas garrafas ainda cresceu 35%, refle-
contribui para sua redução. Já o descarte tindo, assim, no crescimento acelerado
pode ocorrer de forma aleatória, ou seja, de extração de recursos naturais e con-
desperdiçando suas potencialidades de sequente geração de resíduos. O ato da
reaproveitamento e contribuindo para separação na fonte para reciclagem não
destinação final inadequada. O descarte deixa de ser uma ação positiva na redu-
seletivo preserva as potencialidades de ção dos resíduos, porém o foco dessas
reaproveitamento e reciclagem dos re- ações não pode continuar centrado no
síduos, o que implica a separação deles contexto em que o resíduo já foi gerado.
pelo gerador3. O estilo de vida das pessoas pode
Quando as pessoas realizam o des- ser alterado a fim de incentivar a prática
carte seletivo3, contudo, em alguns dos ciclos naturais, para que os mate-
casos, sentem-se autorizadas para um riais descartados sejam utilizados como
consumo irresponsável, ou seja, sem recurso, e o lixo reduzido.
preocupação com a quantidade e a natu-
Coleta seletiva
reza dos produtos e serviços adquiridos.
Nesse contexto é que muitas empresas A coleta seletiva é a última alternati-
têm estimulado o descarte seletivo. Essa va que o consumidor tem para evitar da-
situação pode ser evidenciada por da- nos ao meio ambiente pelo descarte de

Tabela 3. Evolução da produção anual de novas garrafas PET no Brasil


Produção anual Reciclagem Produção de novas garrafas
Ano
total (ton) anual (ton) (ton)
2004 360 167 193
2009 522 262 260

Fonte: ABIPET20 modificado.

Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 31


resíduos sólidos. É importante ressaltar to. Consiste em separar o lixo em grupos
aqui que as responsabilidades dos con- distintos, cada um com tipos de lixo cor-
sumidores compreendem: respondente com sua classificação. Sem o
processo da separação do lixo, não é possí-
Consumo reflexivo
vel fazer reciclagem, pois, nas usinas de tra-
tamento e reciclagem, idealmente, o lixo já
Redução deve chegar o mais separado possível.
Nas cidades, a coleta seletiva é um
instrumento concreto de incentivo à
Coleta sele va
redução, à reutilização e à separação do
material para a reciclagem, buscando
Aterramento uma mudança de comportamento, prin-
cipalmente em relação aos desperdícios
Reciclagem é um conjunto de pro- inerentes à sociedade de consumo.
cessos baseados em técnicas que têm Para se proceder à coleta seletiva,
por finalidade aproveitar os detritos e é essencial que o material seja separa-
reutilizá-los no ciclo de produção do do e acondicionado; em um programa
qual saíram. É o resultado de uma série de coleta seletiva, o lixo é separado no
de atividades, pela quais os materiais próprio local onde é gerado, como resi-
que se tornariam lixo, ou dências, fábricas, comér-
estão no lixo, são desvia- Reciclagem é cios ou outros estabeleci-
dos, coletados, separados um conjunto de mentos. O procedimento
e processados para serem processos baseados mais comum é separá-lo,
usados como matéria- em técnicas que inicialmente, em 3 (três)
-prima na manufatura de têm por finalidade categorias:
novos produtos. Já a reu- aproveitar os detritos 1. Reciclável ou reutilizá-
tilização está relacionada e reutilizá-los no ciclo vel: correspondente ao
ao ato de desviar o resí- de produção do qual lixo que pode ser recicla-
duo da disposição final saíram. do ou reutilizado. Como
sem submetê-lo aos pro- Coleta seletiva exemplos, citam-se emba-
cessos do ciclo produtivo é o processo lagens plásticas, latas, pa-
novamente. de separação e pel, madeira, etc.
Coleta seletiva é o pro- recolhimento dos 2. Orgânico: correspon-
cesso de separação e re- resíduos conforme dente à parcela de resídu-
colhimento dos resíduos sua constituição: os constituída por matéria
conforme sua constituição: orgânico, reciclável e orgânica putrescível (que
orgânico, reciclável e rejei- rejeito. apodrece), isto é, são re-
32 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
síduos facilmente degradáveis pela tam a vida útil dos aterros sanitários,
ação de microrganismos. Podem ser diminuem a exploração de recursos
citados como exemplos restos de ali- naturais, reduzem o consumo de
mentos, pó de café ou chá, verduras, energia e constituem um grande pas-
frutas, folhas, palhas de cereais, po- so para a conscientização de inúme-
das de jardim, esterco animal, serra- ros outros problemas ecológicos;
gem, etc. c) econômicos: contribuem para a econo-
mia de recursos naturais (extração),
3. Rejeito: correspondente à parcela do
diminuem os gastos com tratamen-
lixo que, embora não seja orgânica,
to de doenças, controle da poluição
não pode ser reciclada. Alguns exem-
ambiental, remediação de áreas de-
plos são o papel higiênico usado, as gradadas e uso de espaços de reser-
fraldas descartáveis, os absorventes va, promovem valorização, venda e
higiênicos e algumas embalagens processamento industrial de produ-
metalizadas. tos descartados, reduzem os gastos
com a limpeza urbana, geram em-
Reciclável pregos e estimulam a concorrência,
uma vez que produtos fabricados a
partir dos recicláveis são comerciali-
Resíduo Orgânico zados em paralelo àqueles feitos com
matéria-prima virgem, melhoram a
produção de compostos orgânicos,
Rejeito a partir da reciclagem de resíduos or-
gânicos (compostagem), e, ainda, o
município se beneficia com o ICMS
Vantagens e benefícios da Ecológico;
reciclagem d) sociais: geram empregos diretos, pos-
As vantagens e os benefícios da sibilitam a união e a organização da
reciclagem devem-se ao fato de ela força trabalhista em cooperativas de
estar inter-relacionada aos seguintes reciclagem e incentivam a mobiliza-
componentes: ção comunitária para o exercício da
a) sanitários: contribuem decisivamente cidadania, em busca de solução de
para a melhoria da saúde pública, ba- seus próprios problemas;
sicamente evitando a transmissão de e) educacionais: possibilitam que as ati-
doenças por vetores; vidades de reciclagem, além de unida-
b) ambientais: diminuem a poluição do des de tratamento do lixo, funcionem
ambiente (água, ar e solo), aumen- como grande laboratório de ciências
Resíduos sólidos domiciliares: geração e gerenciamento 33
para que professores e alunos tenham ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional de Saneamento
Básico. 2010. Disponível em: http://www.ibge.
aulas práticas e discorram sobre as gov.br/home/estatistica/populacao/condicao-
várias áreas e atividades relacionadas devida/pnsb2008/PNSB_2008.pdf. Acesso em
março de 2013.
com a reciclagem do lixo urbano, e,
11. 
FUNDAÇÃO ESTADUAL DE MEIO
ainda, promovem a mobilização e a AMBIENTE. Situação do tratamento e/ou dis-
participação comunitária. posição final dos resíduos sólidos urbanos de Minas
Gerais. 2010. Disponível em: http://www.feam.
Referências br/minas-sem-lixoes. Acesso em março de 2013.
12.  LIMA, J. D. Gestão de resíduos sólidos urbanos no
1.  ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS Brasil. ABES. Campina Grande. 2004. 267 p.
TÉCNICAS. NBR 10004. Resíduos sólidos. Rio de
Janeiro, 2004. 13.  BRASIL. Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro
de 1998. Dispõe sobre as sanções penais e admi-
2.  BRASIL, Lei Federal Nº 12.305, de 2 de agosto
nistrativas derivadas de condutas e atividades le-
de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos
sivas ao meio ambiente e dá outras providências.
Sólidos; altera a Lei Nº 9.605, de 12 de fevereiro de
1998. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ Disponível em http://www.planalto.gov.br/cci-
ato2007-2010/2010/lei/l12305.htm. Acesso em vil_03/leis/L9605.htm. Acesso em março. 2013.
março de 2013. 14. CONSELHO ESTADUAL DE POLÍTICA
3.  LOGAREZZI, A. Educação ambiental em re- AMBIENTAL. Estado de Minas Gerais.
síduo: o foco da abordagem. In: CINQUETTI, Deliberação Normativa nº 118, de 27 de junho de
H.C.S.; LOGAREZZI, A. (Org.). Consumo e 2008. Altera os artigos 2º, 3º e 4º da Deliberação
resíduo: fundamentos para o trabalho educativo. Normativa nº 52/2001, estabelece novas diretri-
EdUFSCar. São Carlos. 2006. p. 119-144. zes para adequação da disposição final de resíduos
sólidos urbanos no Estado e dá outras providên-
4.  CASTILHO JÚNIOR, A.B. Resíduos sólidos urba-
cias. Disponível em http://www.siam.mg.gov.br/
nos: aterros sustentáveis para município de pequeno
sla/download.pdf?idNorma=7976. Acesso em
porte. Rio de Janeiro. ABES. RiMa. 2003. 294 p.
março de 2013.
5.  GÓMEZ, G. et al. Seasonal characterization of
urban solid waste in Chihuahua, Mexico. Waste 15.  LANZA, V. C. V. Caderno técnico de reabilitação
Management & Research, n. 29, p. 2018-2024, de áreas degradadas por resíduos sólidos urbanos.
2009. Fundação Estadual do Meio Ambiente. Belo
Horizonte. 2009. 28 p.
6.  AMERICAN SOCIETY FOR TESTING AND
MATERIALS. Standard D 792 2003: standard 16. 
CONSELHO NACIONAL DO MEIO
test method for determination of the composition AMBIENTE Conama. Disponível em: http://
of unprocessed municipal solid waste. Filadelfia, www.mma.gov.br/port/conama/estr.cfm . Acesso
2003. em março de 2013.
7.  EUROPEAN RECOVERY & RECYCLING 17. INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DAS
ASSOCIATION. Waste analysis procedure: refer- ÁGUAS. Igam. Disponível em: http://www.igam.
ence multimaterial recovery, S.l, 1993. mg.gov.br/instituicao. Acesso em março de2013.
8.  ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE EMPRESAS 18.  FURNIVAL, A. C. Dimensões culturais do consu-
DE LIMPEZA PÚBLICA E RESÍDUOS mo: reflexões para pensar o consumo sustentável. In:
ESPECIAIS. Panorama dos resíduos sólidos no CINQUETTI, H. C. S.; LOGAREZZI, A. (Org.).
Brasil. 2011. Disponível em: http://www.abrelpe. Consumo e resíduo: fundamentos para o trabalho
org.br/Panorama/panorama2011.pdf. Acesso em educativo. : EdUFSCar. São Carlos 2006. p. 61- 84.
março de 2013
19. 
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE
9.  PEÑIDO MONTEIRO, J.H.; H. ZVEIBIL, V. Z. INDÚSTRIAS DE PET. Indústria do Pet no Brasil.
(Coord). Manual de gerenciamento integrado de re- 2011. Disponível em: http://www.abipet.org.br/
síduos sólidos. IBAM. Rio de Janeiro. 2001. 200 p. UserFiles/File/Site%201.pdf. Acesso em: março
10.  INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E de 2013.

34 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Gerenciamento de
resíduos de serviços
de saúde

bigstockphoto.com
Luciano dos Santos Rodrigues1*
Israel José da Silva1 CRMV 1033
Anna Carolina Ferreira Spelta1**
Bruna Coelho Lopes1 CRMV 11308
1
Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais
* Autor para correspondência: lsantosrodrigues@gmail.com
** Estudante de biologia

Introdução Resolução da Diretoria Colegiada


(RDC) nº 306/043, da Resolução nº
O gerenciamento correto dos re-
358/20054 do Conselho Nacional
síduos gerados em estabelecimentos
do Meio Ambiente
prestadores de serviços de
O gerenciamento (Conama) e, no âmbi-
saúde é importante para
garantir a qualidade da correto dos resíduos to do Estado de Minas
saúde coletiva e a preser- gerados em Gerais, pela Deliberação
vação do meio ambiente1. estabelecimentos Normativa nº 97/20065
Os regulamentos so- prestadores de do Conselho Estadual
bre o gerenciamento de serviços de saúde de Política Ambiental
resíduos de serviços de é importante para (Copam).
saúde são determinados garantir a qualidade O objetivo deste arti-
pela Agência Nacional da saúde coletiva e a go é apresentar as orienta-
de Vigilância Sanitária 2 preservação do meio ções técnicas básicas para
(Anvisa), por meio da ambiente. o gerenciamento de resí-
Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 35
duos gerados em estabelecimentos de dores e produtores de materiais e con-
saúde humana e animal. troles para diagnóstico in vitro, unidades
móveis de atendimento à saúde; servi-
Definição ços de acupuntura, serviços de tatua-
Os resíduos sólidos de serviços de gem, entre outros similares.
saúde (RSSS) gerados nos centros urba- É de responsabilidade dos dirigentes
nos e na área rural, apesar de baixa re- dos estabelecimentos elaborarem,
presentatividade, aproximadamente 2%, desenvolverem, submeterem às
perante a produção total dos resíduos autoridades competentes e implantarem
sólidos urbanos (RSU), constituem um o Plano de Gerenciamento de Resíduos
dos sérios problemas a ser gerenciado de Serviços de Saúde (PGRSS), que
pelas empresas prestadoras de serviços deve contemplar, entre outros fatores,
na área da saúde (Spina, as medidas preventivas
2005), principalmente É de e corretivas de contro-
pelo potencial de risco responsabilidade le integrado de insetos e
que representam à saúde e dos dirigentes dos roedores e as rotinas de
ao meio ambiente6. estabelecimentos higiene e limpeza de su-
De acordo com a elaborarem, perfícies; além disso, os fa-
RDC Anvisa nº 306/043 desenvolverem, bricantes e representantes
e a Resolução Conama nº
submeterem legais de medicamentos
358/20054, são definidos
às autoridades passíveis de gerar resíduos
como geradores de RSSS
competentes e de saúde são correspon-
todos os serviços relacio-
implantarem o Plano sáveis pelo tratamento e
nados com o atendimento
de Gerenciamento de pela disposição final dos
Resíduos de Serviços resíduos gerados na área
à saúde humana ou ani-
de Saúde (PGRSS). de fabricação, distribuição
mal, inclusive os serviços
de assistência domiciliar e utilização7.
e de trabalhos de campo; laboratórios
analíticos de produtos para a saúde; ne- Classificação
crotérios, funerárias e serviços que rea- Com o intuito de conhecer as espe-
lizem atividades de embalsamamento, cificações do resíduo e, consequente-
serviços de medicina legal, drogarias e mente, destiná-lo corretamente, os RSS
farmácias, inclusive as de manipulação; são classificados de acordo com suas
estabelecimentos de ensino e pesquisa características e riscos que podem acar-
na área da saúde, centro de controle de retar ao meio ambiente e à saúde3,4. Os
zoonoses; distribuidores de produtos RSS são classificados em cinco grupos:
farmacêuticos, importadores, distribui- A, B, C, D e E.
36 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
1. Grupo A: engloba os componentes tes ou escarificantes, tais como lâ-
com possível presença de agentes minas de barbear, agulhas, ampolas
biológicos que, por suas caracterís- de vidro, pontas diamantadas, lâmi-
ticas de maior virulência ou con- nas de bisturi, lancetas, espátulas e
centração, podem apresentar risco outros similares.
de infecção. Exemplos: placas e lâ- A correta segregação desses resídu-
minas de laboratório, carcaças, pe- os, ou seja, a separação ou seleção apro-
ças anatômicas (membros), tecidos, priada segundo a classificação adotada
bolsas transfusionais contendo san- torna-se indispensável para separar os
gue, entre outros. materiais infectantes e diminuir a quan-
2. Grupo B: contém substâncias quí- tidade de resíduos que necessitam de
micas que podem apresentar risco à tratamento especial, além de evitar aci-
saúde pública ou ao meio ambiente, dentes ocupacionais. Segundo a Anvisa2,
dependendo de suas características sem uma segregação adequada, cerca de
de inflamabilidade, corrosividade, 70 a 80% dos resíduos gerados em servi-
reatividade e toxicidade. Exemplos: ços de saúde que não apresentam risco
medicamentos apreendidos, rea- acabam potencialmente contaminados.
gentes de laboratório, resíduos con- Dessa forma, o objetivo principal da se-
tendo metais pesados, entre outros. gregação não é reduzir a quantidade de
3. Grupo C: quaisquer materiais re- resíduos infectantes a qualquer custo,
sultantes de atividades humanas mas, acima de tudo, criar uma cultura
que contenham radionuclídeos em organizacional de segurança e de não
quantidades superiores aos limites desperdício8. Entretanto, essa prática
de eliminação especificados nas envolve mudanças de hábitos das pes-
normas da Comissão Nacional de soas, relacionadas com a geração dos
Energia Nuclear (CNEN), como, resíduos, sendo necessária a realização
por exemplo, serviços de medicina de treinamentos e capacitações de pes-
nuclear e de radioterapia etc. soal que propiciem condições para que
4. Grupo D: não apresentam risco os profissionais saibam com clareza suas
biológico, químico ou radiológico à responsabilidades, em relação ao meio
saúde ou ao meio ambiente; podem ambiente, dentro e fora da unidade de
ser equiparados aos resíduos do- saúde, e seu papel de cidadãos2.
miciliares. Exemplos: sobras de ali- A separação dos RSS, quando é ro-
mentos e do preparo de alimentos, tina no estabelecimento de saúde, en-
resíduos das áreas administrativas volve distintas rotas para os diferentes
etc. tipos de resíduos, de acordo com suas
5. Grupo E: materiais perfurocortan- origens. Assim, resíduos infectantes de-
Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 37
veriam ser pré-acondicio- os materiais perfurocor-
Após a separação dos
nados para a disposição tantes2 (Fig. 1b).
materiais, eles devem
em aterros sanitários, pe- Os sacos devem ser
ser acondicionados
ças anatômicas deveriam constituídos de material
corretamente de
ser sepultadas, resíduos resistente a ruptura e va-
acordo com sua
dos serviços de radiologia, zamento, impermeável,
classificação, sendo
gerenciados pelo CNEN respeitando-se os limites
embalados em
(Conselho Nacional de de peso de cada saco, sen-
sacos ou recipientes,
Energia Nuclear), e os do proibido o seu esva-
de forma que a
resíduos recicláveis deve- ziamento ou reaproveita-
capacidade dos
riam ser destinados aos mento. Esses sacos devem
recipientes de
galpões de separação para estar contidos em reci-
acondicionamento
posterior venda9. pientes de material lavá-
comporte a geração
Após a separação dos vel, resistente a punctura,
diária de cada tipo
materiais, eles devem ser ruptura e vazamento, com
de resíduo.
acondicionados correta- tampa provida de sistema
mente de acordo com sua de abertura sem contato
classificação, sendo embalados em sacos manual, com cantos arredondados, e ser
ou recipientes, de forma que a capacida- resistentes ao tombamento; no caso de
de dos recipientes de acondicionamento recipientes de acondicionamento exis-
comporte a geração diária de cada tipo tentes nas salas de cirurgia e nas salas
de resíduo. Normalmente, utilizam-se de parto, estes não necessitam de tampa
sacos plásticos para os resíduos sólidos para vedação, de forma que os resíduos
infectantes (Fig. 1a) e recipientes rígi- devem ser recolhidos imediatamente
dos, conhecidos como coletores, para após o término dos procedimentos2.

Figura 1a. Recipiente de acondicionamento Figura 1b. Recipiente de acondicionamento


de resíduos infectantes. de material perfurocortante.

38 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Símbolo de
Característica Identificação Onde usar
segurança e nome
Indica a possível Rótulo de fundo branco, Recepientes de
presença de desenho e contornos acondicionamento (sacos
agentes biológicos pretos, contendo o plásticos, caixas de materiais
sÍmbolo e a inscrição de perfurantes e cortantes, etc.),
RESÍDUO INFECTANTE carro de coleta interna,
RESÍDUO contêineres e na porta do abrigo
INFECTANTE de resíduos dos grupos A e E

O pictograma depende Indica a Rótulo com desenho e Identificar os recepientes de


do tipo de periculosida- periculosidade do contornos pretos, acondicionamento (sacos
de: corrocividade, resíduo químico contendo o símbolo que plásticos, caixas, etec.), carro de
reatividade, toxicidade caracteriza a coleta interna, contêineres e
e inflamabilidade. periculosidade do abrigo de resíduos químicos.
resíduo químico Usar rótulo de acordo com o
risco, preconizado na NBR
7500/2003 da ABNT, e a
inscrição de RESÍDUO QUÍMICO

Indica a presença Rótulo amarelo com o Recepientes de


de radiação símbolo internacional de acondicionamento (sacos
ionizante presença de radiação plásticos, caixas, frascos, etc.),
ionizante-trifólio de cor carro de coleta interna e os
púrpura em fundo locais de armazenamento para
REJEITO amarelo e a inscrição decaimento
RADIOATIVO REJEITO RADIOATIVO

A cor do pictograma Indica o tipo Rótulos com fundo Recipientes de


depende do tipo de de material de corres acondicionamento, contêiners,
material reciclável reciclável específicas, de carro de coleta interna e os
acordo com o tipo locais de armazenamento de
do material recicláveis
reciclável:
Papel: azul
Plástico: vermelho
Vidro: verde
Metal: amarelo
Orgânico: marrom
Madeira: preto
Rejeito: cinza para o
resíduo que não
tem mais utilidade

Indica a presença de Rótulo de fundo branco, Recipientes de acondicionamen-


materiais perfuran- desenho e contornos to de materiais perfurantes,
tes, cortantes ou pretos, contendo o cortantes e abrasivos; carro de
abrasivos, que símbolo de resíduo coleta interna; contêineres e na
podem abrir porta infectante e a inscrição porta do abrigo de resíduos dos
RESÍDUO de entrada para RESÍDUO grupos E, se estes forem
PERFUROCORTANTE agentes de risco PERFUROCORTANTE exclusivos

Figura 2. Esquema de classificação dos resíduos por meio de cores (branco para os infec-
tantes, preto para os comuns e verde para os recicláveis), símbolos e indicações visíveis
sobre o seu tipo e risco.

Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 39


Os coletores de perfurocortantes (PC) ser coletados (transporte interno) para
também devem ser resistentes, estáveis armazenagem temporária ou externa ao
e de tamanho pequeno, sendo o papelão local de geração do resíduo. O local de
ou o metal os materiais mais utilizados armazenagem externa deve consistir em
para essas embalagens10. Os recipientes local apropriado, de fácil acesso para o
que acondicionam os PC devem ser transporte externo encaminhar os re-
descartados quando o preenchimento síduos ao local de tratamento, recicla-
atingir 2/3 de sua capacidade ou o nível gem e disposição final. A armazenagem
de preenchimento ficar a 5 cm de distân- temporária pode ser dispensada depen-
cia da boca do recipiente, dendo da distância entre
sendo proibido o seu esva- O local de o local de geração e o de
ziamento ou reaproveita- armazenagem armazenagem externa.
mento. No caso de rejeitos externa deve consistir A coleta e o transporte
radioativos, estes devem em local apropriado, devem atender ao roteiro
ser colocados em reci- de fácil acesso para previamente definido e
pientes de chumbo, com o transporte externo devem ser feitos em horá-
blindagem adequada ao encaminhar os rios, sempre que possível,
tipo e ao nível de radiação resíduos ao local não coincidentes com a
emitida, e ter a simbologia de tratamento, distribuição de roupas,
específica2. reciclagem e alimentos e medicamen-
O acondicionamen- disposição final. tos, períodos de visita ou
to deve observar as exi- de maior fluxo de pessoas
gências de compatibilidade química ou de atividades. A coleta
dos componentes entre si, assim como deve ser feita separadamente, de acordo
de cada resíduo com os materiais das com o grupo de resíduos e em recipien-
embalagens, de modo a evitar reação tes específicos a cada grupo de resídu-
química entre eles, tanto quanto o en- os . O transporte interno deve ser feito
2

fraquecimento ou a deterioração de tal em carros de coleta, constituídos de


embalagem, ou a possibilidade de que material rígido, lavável, impermeável e
seu material seja permeável aos com- providos de tampa articulada ao próprio
ponentes do resíduo2. As classes dos corpo do equipamento, cantos e bordas
resíduos são identificadas por meio de arredondados, rodas revestidas de ma-
cores (branco para os infectantes, preto terial que reduza o ruído e identificação
com o símbolo correspondente ao risco
para os comuns e verde para os reciclá-
do resíduo neles contido; além disso, o
veis), símbolos e indicações visíveis so-
transporte interno dos recipientes deve
bre o seu tipo e risco (Fig. 2).
ser realizado sem esforço excessivo ou
Posteriormente, os rejeitos devem
40 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
risco de acidente para o funcionário2. va, ventos etc., bem como o acesso de
Segundo a Anvisa2, a armazenagem pessoas não autorizadas ou animais ao
temporária, obrigatoriamente, deve: local. A capacidade do abrigo deve ser
• conter recipientes para acondiciona- compatível com a periodicidade de co-
mento dos sacos contendo os resídu- leta do sistema de limpeza urbana local.
os, de forma que os sacos não tenham Deve possuir, no mínimo, um ambiente
contato direto com o chão; separado para atender o armazenamen-
• ter pisos e paredes lisas e laváveis, sen- to de recipientes de resíduos do grupo
do o piso, além disso, resistente ao trá- A juntamente com o grupo E e um am-
fego dos carros coletores; biente para o grupo D2.
• possuir iluminação artificial e área su- O abrigo de resíduos dos grupos A,
ficiente para armazenar, no mínimo, D e E (Fig. 3) deve:
dois recipientes coletores, para o pos- • ser construído em alvenaria, fechado,
terior traslado até a área de armazena- dotado apenas de aberturas para ven-
mento externo; tilação, teladas, que possibilitem uma
• ser identificado como sala de resíduo, área mínima de ventilação correspon-
se a sala for exclusiva para armazena- dente a 1/20 da área do piso e não in-
gem. A quantidade de salas de resídu- ferior a 0,20 m²;
os será definida em função do porte, • ser revestido internamente (piso e pa-
da quantidade de resíduos, da distân- redes) com material liso, lavável, im-
cia entre pontos de geração e do layout permeável, resistente ao tráfego e ao
do estabelecimento; impacto;
Obs.: Recomenda-se a existência de • ter porta provida de tela de proteção
ponto de água e ralo sifonado com tam- contra roedores e vetores, de largura
pa escamoteável . compatível com as dimensões dos re-
Os resíduos de fácil putrefação de- cipientes de coleta externa;
vem ser conservados sob refrigeração e, • possuir símbolo de identificação, em
quando não for possível, submetidos a local de fácil visualização, de acordo
outro método de conservação. com a natureza do resíduo;
• possuir área específica de higienização
Armazenamento externo para limpeza e desinfecção simultânea
A armazenagem externa segue as dos recipientes coletores e demais
mesmas recomendações anteriores, po- equipamentos utilizados no manejo
rém deve ser um local exclusivo para o de RSS. A área deve possuir cober-
armazenamento de resíduos, além de tura, dimensões compatíveis com os
reunir condições físicas estruturais ade- equipamentos que serão submetidos
quadas, impedindo a ação do sol, chu- à limpeza e à higienização.
Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 41
Venlação

Grupo D Grupo A/Grupo E Área de


Higienação

Figura 3. Ilustração de um abrigo de resíduos dos grupos A, D e E

O abrigo de resíduos do grupo B dência direta de luz solar;


(Fig. 4) deve ser projetado, construído • ter sistema de combate a incêndio por
e operado de modo a: meio de extintores de CO2 e PQS (pó
• ser em alvenaria, fechado, dotado ape- químico seco);
nas de aberturas teladas que possibili- • ter kit de emergência para os casos
tem uma área de ventilação adequada; de derramamento ou vazamento, in-
• ser revestido internamente (piso e cluindo produtos absorventes;
parede) com material de acabamento • armazenar os resíduos constituídos de
liso, resistente ao tráfego e impacto, produtos perigosos corrosivos e infla-
lavável e impermeável; máveis próximos ao piso;
• ter porta dotada de proteção infe- • observar as medidas de segurança re-
rior, impedindo o acesso de vetores e comendadas para produtos químicos
roedores; que podem formar peróxidos;
• ter piso com caimento na direção das • não receber nem armazenar resíduos
canaletas ou dos ralos; sem identificação;
• estar identificado, em local de fácil • organizar o armazenamento de acor-
visualização, com sinalização de segu- do com critérios de compatibilidade,
rança – com as palavras: RESÍDUOS segregando os resíduos em bandejas;
QUÍMICOS – com símbolo; • manter registro dos resíduos
• prever a blindagem dos pontos in- recebidos.
ternos de energia elétrica, quando
houver armazenamento de resíduos Transporte externo
inflamáveis; O transporte externo consiste no
• ter dispositivo de forma a evitar inci- recolhimento, por veículos coletores,
42 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
dos resíduos armazenados nas unidades Para a coleta de RSS do grupo A,
para serem transportados para trata- o veículo deve apresentar os seguintes
mento ou disposição final11, mantendo- requisitos:
se as condições de acondicionamento, • ter superfícies internas lisas, de cantos
além de seguir as regulamentações dos arredondados e de forma a facilitar a
órgãos de limpeza. Os veículos podem higienização;
ser de pequeno até grande porte, de- • não permitir vazamentos de líquidos
pendendo das definições técnicas dos e ser provido de ventilação adequada;
sistemas municipais2. Os responsáveis • sempre que a forma de carregamento
pelo transporte externo, assim como for manual, a altura de carga deve ser
os demais funcionários responsáveis inferior a 1,20 m;
pela coleta interna, devem utilizar EPI • quando possuir sistema de carga e
(Equipamento de Proteção Individual) descarga, este deve operar de forma
e EPC (Equipamento de Proteção a não permitir o rompimento dos
Coletivo) adequados. Esse serviço de recipientes;
coleta pode ser terceirizado ou realiza- • quando forem utilizados contenedo-
do pelo próprio sistema de limpeza do res, o veículo deve ser dotado de equi-
município, que devem seguir algumas pamento hidráulico de basculamento;
recomendações de acordo com a classe • para veículo com capacidade supe-
do resíduo2. rior a 1 tonelada, a descarga pode ser

Venlação

EPI
EXTINTOR
CO2 E PQS

Piso convergente para canaleta

Figura 4. Ilustração de um abrigo de resíduos do grupo B

Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 43


mecânica; para veículo sua adequação, emitidos
Entende-se por
com capacidade inferior pelo Instituto de Pesos e
tratamento dos
a 1 tonelada, a descarga Medidas ou entidade por
resíduos sólidos,
pode ser mecânica ou ele credenciada.
de forma genérica,
manual;
quaisquer processos
• o veículo coletor deve manuais, mecânicos,
Tratamento
contar com os seguintes físicos, químicos O tratamento do re-
equipamentos auxilia- ou biológicos síduo pode ser realizado
res: pá, rodo, saco plás- que alterem as no próprio local de ge-
tico de reserva, solução características dos ração ou em outro local.
desinfetante; resíduos, visando Entende-se por tratamen-
• devem constar em local à minimização to dos resíduos sólidos, de
visível o nome da mu- do risco à saúde, forma genérica, quaisquer
nicipalidade, o nome à preservação processos manuais, me-
da empresa coletora da qualidade do cânicos, físicos, químicos
(endereço e telefone), meio ambiente, à ou biológicos que alterem
a especificação dos re- segurança e à saúde as características dos resí-
síduos transportáveis, duos, visando à minimi-
com o número ou código estabelecido zação do risco à saúde, à
na NBR 10004, e o número do veículo preservação da qualidade do meio am-
coletor com sinalização externa; biente, à segurança e à saúde2. No Brasil,
as principais formas de tratamento são
• exibir a simbologia para o transporte a esterilização (autoclaves, micro-ondas
rodoviário; e radiofrequência) ou incineração10. A
• ter documentação que identifique a autoclavagem é um tratamento que con-
conformidade para a execução da co- siste em manter o material contaminado
leta, pelo órgão competente. em contato com vapor de água, a uma
Para a coleta de RSS do grupo B, temperatura elevada, durante período
resíduos químicos perigosos, o veículo de tempo suficiente para destruir poten-
deve atender aos seguintes requisitos: ciais agentes patogênicos ou reduzi-los
a um nível que não constitua risco. O
• observar o Decreto Federal nº 96.044, processo de autoclavagem inclui ciclos
de 18 de maio de 1988, e a Portaria de compressão e de descompressão, de
Federal nº 204, de 20 de maio de forma a facilitar o contato entre o va-
1997; por e os resíduos. Os valores usuais de
• portar documentos de inspeção e ca- pressão são da ordem de 3 a 3,5 bar e a
pacitação, em validade, atestando a temperatura atinge 135ºC. Esse proces-
44 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
so tem a vantagem de ser Diminuição gradual da
Os efluentes líquidos
familiar aos técnicos de pressão até a pressão de 1
gerados pelo sistema
saúde, que o utilizam para atmosfera;
de autoclavagem
processar diversos tipos
devem ser tratados, • arrefecimento da carga:
de materiais hospitalares.
se necessário, redução da carga até uma
O processo normal de e atender aos temperatura que permita
autoclavagem comporta limites de emissão a retirada dos resíduos da
basicamente as seguintes dos poluentes autoclave.
operações: estabelecidos na Os efluentes líquidos
• pré-vácuo inicial: criam-
legislação ambiental gerados pelo sistema de
-se condições de pres-
vigente, antes de autoclavagem devem ser
sões negativas, de forma
seu lançamento em tratados, se necessário,
a que, na fase seguinte, o
corpos d’água ou rede e atender aos limites de
de esgoto. emissão dos poluentes es-
vapor entre em contato
com os resíduos; tabelecidos na legislação
ambiental vigente, antes de seu lança-
• admissão de vapor: introdução de va-
mento em corpos d’água ou rede de
por na autoclave e aumento gradual
esgoto.
da pressão, de forma a criar condições
para o contato entre o vapor e os resí- O tratamento com micro-ondas é
duos e para destruição de invólucros uma tecnologia relativamente recente
que limitem o acesso do vapor a todas de tratamento de resíduo de serviços de
as superfícies; saúde e consiste na descontaminação
dos resíduos com emissão de ondas de
• exposição: manutenção de tempe-
alta ou de baixa frequência, a uma tem-
raturas e pressões elevadas durante
peratura elevada (entre 95 e 105ºC).
um determinado período de tem-
Os resíduos devem ser submetidos
po até se concluir o processo de
previamente a processo de trituração e
descontaminação;
umidificação.
• de acordo com a carga a tratar, o ope-
A incineração é um processo de tra-
rador define o tempo e a temperatura
tamento de resíduos sólidos que se de-
de cada ciclo;
fine como a reação química em que os
• exaustão lenta: libertação gradual do materiais orgânicos combustíveis são
vapor que passa por um filtro poroso gaseificados, num período de tempo
com uma malha suficientemente fina pré-fixado. O processo se dá pela oxida-
para impedir a passagem de microrga- ção dos resíduos com a ajuda do oxigê-
nismos para o exterior da autoclave. nio contido no ar.
Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 45
A incineração dos re- desse sistema de tratamen-
A disposição final
síduos é um processo fí- to. As cinzas e as escórias,
implica a deposição
sico-químico de oxidação em geral, contêm metais
definitiva dos
a temperaturas elevadas, pesados em alta concen-
resíduos no solo ou
o qual resulta na transfor-
em locais adequados. tração e não podem, por
mação de materiais com isso, ir para aterros sanitá-
redução de volume dos re- rios, sendo necessário um
síduos, destruição de matéria orgânica, aterro especial para resíduos perigosos.
em especial de organismos patogênicos. Os efluentes líquidos gerados pelo sis-
A concepção de incineração em dois tema de incineração devem atender aos
estágios segue os seguintes princípios: limites de emissão de poluentes estabe-
temperatura, tempo de resistência e tur- lecidos na legislação ambiental vigente.
bulência. No primeiro estágio, os resídu-
Não há consenso sobre quais méto-
os na câmara de incineração de resíduos
dos devem ser utilizados, já que a me-
são submetidos à temperatura mínima
lhor solução deverá ser resultante da
de 800ºC, resultando na formação de
combinação entre variáveis locais, como
gases, que são processados na câmara de
condições geográficas e infraestrutura,
combustão. No segundo estágio, as tem-
combinadas com a disponibilidade de
peraturas chegam a 1000ºC-1200ºC.
recursos e a quantidade de resíduos11.
Após a incineração dos RSS, os
poluentes gasosos gerados devem ser
processados em equipamento de con-
Disposição final
trole de poluição (ECP) antes de serem A disposição final implica a deposi-
liberados para a atmosfera, atendendo ção definitiva dos resíduos no solo ou
aos limites de emissão estabelecidos em locais adequados. O aterramento
pelo órgão de meio ambiente. Entre os em solo, em local licenciado (aterro sa-
poluentes produzidos destacam-se áci- nitário), dos subgrupos A1 e A2, após
do clorídrico, ácido fluorídrico, óxidos tratamento prévio, e do subgrupo A4
de enxofre, óxidos de nitrogênio, me- (sem exigência de tratamento) é técni-
tais pesados, particulados, dioxinas e ca reconhecida e permitida atualmen-
furanos. te no Brasil (Resolução nº 358/2005
Além dos efluentes gasosos gera- do Conama e Portaria da Fundação
3

dos no sistema de incineração, ocorre a Estadual do Meio Ambiente - Feam nº


geração de cinzas e escórias da câmara 361/2008), além de ser economica-
de incineração de resíduos e de outros mente mais compatível com a realidade
poluentes sólidos do ECP, bem como econômica do Brasil .
1

efluentes líquidos gerados da atividade Para municípios ou associações de


46 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
municípios com população urbana de canaletas; cobertura final e plano de
até 30.000 habitantes que não dispo- encerramento.
nham de aterro sanitário licenciado, a Para os resíduos da classe B (quími-
Resolução Conama nº 358/20053 admi- cos), o apropriado é o aterro industrial
te, de forma excepcional e com a devida classe I ou II, em função da classifica-
aprovação do órgão ambiental, a dispo- ção do resíduo pela Norma Brasileira nº
sição final em solo, desde que a alterna- 10.004 da ABNT. Deve ser construído
tiva obedeça aos seguintes critérios: segundo padrões rígidos de engenharia,
a)  quanto à seleção de área, não possuir de forma a não causar danos ao meio
restrições quanto ao zoneamento ambiente e à saúde pública.
ambiental (afastamento de unidades É preciso lembrar que todas as eta-
de conservação ou áreas correlatas) pas envolvidas no gerenciamento cor-
e respeitar as distâncias mínimas es- reto de resíduos são importantes e de-
tabelecidas pelos órgãos ambientais pendentes, ou seja, interferem no bom
competentes de ecossistemas frá- desempenho das outras etapas envolvi-
geis, recursos hídricos superficiais e das. Dessa forma, as políticas de geren-
subterrâneos; ciamento de RSS devem ter uma visão
b) quanto à segurança e sinalização, geral acerca do problema e, assim, possi-
ter sistema de controle de acesso de bilitar os devidos procedimentos sobre
veículos, pessoas não autorizadas e a segregação, o acondicionamento, a co-
animais, sob vigilância contínua e si- leta, o armazenamento, o transporte, o
nalização de advertência com infor- tratamento e a destinação final.
mes educativos quando aos perigos
envolvidos; Referências
c) quanto aos aspectos técnicos, ter
sistemas de drenagem de águas plu- 1. FUNDAÇÃO ESTADUAL DO MEIO
AMBIENTE. Feam. Manual de Gerenciamento
viais; coleta e disposição adequada de Resíduos de Serviços de Saúde. Feam. Belo
dos percolados; coleta de gases; im- Horizonte.. 2008.
permeabilização da base e taludes e
2.  AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA
monitoramento ambiental; SANITÁRIA. Anvisa. Manual de Gerenciamento
d)  quanto ao processo de disposição fi- dos Resíduos de Serviços de Saúde. Ministério da
Saúde. Brasília. 2006. Disponível em http://bvs-
nal de resíduos de serviços de saúde, ms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/manual_ge-
ter disposição dos resíduos direta- renciamento_residuos.pdf. Acesso em março de
2013.
mente sobre o fundo do local; aco-
modação dos resíduos sem compac- 3.  AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA
SANITÁRIA. Anvisa. Resolução da Diretoria
tação direta; cobertura diária com Colegiada – RDC nº 306, de 07 de dezem-
solo, admitindo-se disposição em bro de 2004, que dispõe sobre o Regulamento

Gerenciamento de resíduos de serviços de saúde 47


Técnico para o Gerenciamento de Resíduos 7.  CAMARGO, M. E.; MOTTA, M. E. V.; LUNELLI,
de Serviços de Saúde. Disponível em http:// M. O.; SEVERO, E. A. Resíduos sólidos de servi-
portal.anvisa.gov.br/wps/wcm/connect/ebe- ço de saúde: um estudo sobre o gerenciamento.
26a00474597429fb5df3fbc4c6735/RDC_306. Scientia Plena, v. 5, n.7, 14p., 2009.
pdf?MOD=AJPERES. Acesso em março de 2013.
8.  BARROS JÚNIOR, C. DE.; AMANTHEA, E.;
4. CONSELHO NACIONAL DO MEIO LAZARIN, F. B.; XAVIER, G. A.; TSUJIOKA,
AMBIENTE. Conama. Resolução Nº 358, de 29 R. Y. D.; BELLI, R.; RODRIGUES, R.;
de abril de 2005, que dispõe sobre o tratamento e a DAMASCENO, J. W. Geração e caracterização
disposição final dos resíduos dos serviços de saúde dos resíduos sólidos de serviços de saúde em labo-
e dá outras providências. Disponível em http:// ratório de análises clínicas de Maringá, Estado do
www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/ Paraná. Acta Sci. Technol., v. 29, n. 1, p. 17-21, 2007.
res35805.pdf. Acesso em março de 2013.
9.  BIDONE, F. A. Resíduos sólidos provenientes de
5.  CONSELHO ESTADUAL DE POLÍTICA coletas especiais: eliminação e valorização. PROSAB
AMBIENTAL. Copam. Deliberação Normativa - Programa de Pesquisa em Saneamento Básico.
Copam nº 97, de 12 de abril de 2006, que estabe- Porto Alegre. 2001.
lece diretrizes para a disposição final adequada dos
resíduos dos estabelecimentos dos serviços de saú- 10. OLIVEIRA, J. M. Análise do gerenciamento
de no Estado de Minas Gerais e dá outras provi- de resíduos de serviços de saúde nos hospitais de
dências. Disponível em http://www.inteligencia- Porto Alegre. Dissertação. (Mestrado). Escola
ambiental.com.br/sila/pdf/edelcopammg97-06. de Administração. Universidade Federal do Rio
pdf. Acesso em março de 2013. Grande do Sul. 2002.

6.  SPINA, M.I.A.P. Características do gerenciamento 11.  NAIME, R.; SARTOR, I.; GARCIA, A.C. Uma
dos resíduos sólidos dos serviços de saúde em Curitiba abordagem sobre a gestão de resíduos de serviços
e análise das implicações socioambientais decorren- de saúde. Revista Espaço para a Saúde, v. 5, n. 2, p.
tes dos métodos de tratamento e destino final. Ed. 17-27, 2004.
UFPR.. Curitiba. n. 9, p. 95-106, , 2005.

48 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Gerenciamento de
resíduos sólidos
agrossilvopastoris e
agroindustriais

bigstockphoto.com
Luciano dos Santos Rodrigues1*
Israel José da Silva1 - CRMV 1033
Bruna Coelho Lopes1 - CRMV 11308
Anna Carolina Ferreira Spelta1**
1
Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais
* Autor para correspondência: lsantosrodrigues@gmail.com
** Estudante de biologia

Introdução e à elevação da produção de diferentes


culturas, além do ganho de produtivi-
A poluição ambiental causada
dade. Aliado a esta nova realidade está o
pela atividade animal representa uma
ameaça à saúde humana e de animais. aumento da produção de resíduos, tanto
Segundo o IBGE1, o ano de 2010 apre- orgânicos como inorgânicos, que neces-
sentou crescimento do setor agrossilvo- sitam de manejo, tratamento e disposi-
pastoril de 3,9%, liderando em relação ção adequados, já que essas atividades
aos demais setores. Esse aumento foi dependem prioritariamente de recursos
devido ao crescimento da agropecuária naturais para existirem.
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 49
Os resíduos gerados nas ativi- sólidos e a disposição ambientalmente
dades agrossilvopastoris podem ser adequada dos rejeitos. No entanto, ain-
classificados como da há uma confusão
orgânicos e inor- Os resíduos gerados sobre as formas de
gânicos. Os resí- nas atividades classificação dos re-
duos orgânicos são agrossilvopastoris síduos gerados pela
aqueles gerados nos podem ser classificados atuação veterinária
setores de agricul- como orgânicos e em áreas rurais, pois
tura e agropecuária inorgânicos. Resíduos estes não podem ser
como os rejeitos orgânicos: rejeitos classificados com o
das culturas (café, das culturas, dejetos rigor de resíduos de
cacau, banana, gerados nas criações saúde hospitalares,
soja, milho, etc.), animais e os efluentes e mas também há um
dejetos gerados nas resíduos produzidos nas risco à saúde que os
criações animais e agroindústrias, como impede de serem tra-
os efluentes e resí- abatedouros, laticínios e tados como resíduo
duos produzidos nas graxarias. comum.
agroindústrias, como Para se ter a di-
abatedouros, laticínios e graxarias. O mensão do problema a ser abordado
tratamento de efluentes e de resíduos neste trabalho, a Tab. 1 apresenta o re-
orgânicos já se encontra bem estabeleci- banho efetivo nacional. A população
do no âmbito tecnológico, entretanto o bovina superou a população brasileira
mesmo fato não ocorre com os resíduos no ano de 2010, que foi de 190.733 mi-
inorgânicos produzidos neste setor. Os lhões de pessoas. Os maiores efetivos da
resíduos sólidos inorgânicos gerados espécie bovina encontram-se no estado
no setor agrossilvopastoril abrangem as de Mato Grosso, seguido pelos estados
embalagens produzidas nos segmentos de Minas Gerais e Mato Grosso do Sul.
de agrotóxicos, fertilizantes e insumos Já o maior efetivo equino encontra-se na
farmacêuticos veterinários, além dos re- região Nordeste, e de suínos na região
síduos sólidos domésticos da área rural. Sul, com 47,9% de todo o efetivo suíno
A Lei nº 12.305/20102 instituiu a nacional2.
Política Nacional de Resíduos Sólidos, Vale ressaltar que a maior parte
que obriga os municípios a criarem pla- do rebanho de corte e leite é criada
nos de gerenciamento desses resíduos de forma extensiva e, desta maneira, a
em suas regiões, sendo que a prioridade produção de resíduos veterinários são
é a não geração, a redução, a reutilização, produzidos e descartados de maneira
a reciclagem, o tratamento dos resíduos dispersa. A bovinocultura de corte e de
50 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
leite aparece como o maior mercado animais voltadas para o consumo hu-
consumidor de produtos veterinários mano, como frangos e suínos. Estes são
do país, responsável por 55% do fatu- criados de forma intensiva e confinados
ramento total do seguimento, seguido em granjas com elevada densidade po-
pela suinocultura (15,3%), avicultura pulacional, as quais se situam, normal-
(14,2%) e o restante distribuído pelas mente, próximo aos polos regionais de
outras espécies3 . comercialização da carne, tornando a
relação entre integrado (produtor rural)
Tabela 1. Rebanho efetivo no Brasil segundo e a integradora (empresa) mais próxima.
as diversas espécies Tendo em vista que a coleta de lixo
Espécie Nacional (milhões) rural no Brasil cobre apenas 31,6% dos
Bovinos 209541 domicílios4, a ineficiência no trato com
Bubalinos 1.185 o resíduo sólido doméstico produzido
Equinos 5.514 na zona rural é refletida nas práticas de
Asininos 1.002 destinação dos resíduos. Galho et al.5
Muares 1.277 realizaram entrevistas semiestruturadas
Suínos 38.957 com 13 famílias da zona rural no Rio
Caprinos 9.313 Grande do Sul e verificaram a prática
Ovinos 17.381 comum de todo o país, onde 45% do
Aves 1.028.181
lixo produzido é queimado e 34% enter-
rado no solo sem qualquer tipo de trata-
Fonte: IBGE (2011).
1
mento anterior. Esse tipo de disposição
tem como consequência a contamina-
Dada a importância dos elevados ção de águas superficiais e subterrâne-
números que a bovinocultura represen- as, as quais são as fontes de captação de
ta nos setores econômico e produtivo água para consumo humano. Tal fato
do país, pressupõe-se pode ser verificado no
que a geração de resí- Diversas zoonoses podem mesmo trabalho, o qual
duos inorgânicos, como ser transmitidas pelo mostrou que 66% da
recipiente de fármacos, contato com os materiais captação de água dessas
de vacinas e de insumos utilizados na prática famílias eram realizadas
veterinários, será mais clínica veterinária em em açudes.
expressiva que nas de- fazendas e também pelo Diversas zoonoses
mais atividades pecuá- contato com os dejetos podem ser transmitidas
rias. Isto porque uma si- dos animais, como a pelo contato com os
tuação diferente ocorre brucelose, a leptospirose e materiais utilizados na
para as demais criações parasitoses. prática clínica veteriná-
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 51
ria em fazendas e também pelo conta- de antígenos contra a doença. Ao avalia-
to com os dejetos dos animais, como a rem médicos veterinários de pequenos
brucelose, a leptospirose e parasitoses. animais, os mesmos autores obtiveram
São doenças consideradas de risco ocu- 13,0% desses profissionais infectados
pacional, que afetam principalmente no último ano do curso de medicina
açougueiros, veterinários, magarefes e veterinária, e 62,0% infectados entre os
trabalhadores rurais e são endêmicas primeiros quatro anos e os quatro anos
em várias regiões do país. Entretanto, há posteriores ao período da graduação, na
uma discussão de que a leptospirose não dependência dos hábitos pessoais.
seja inteiramente uma doença ocupa- Outro inquérito epidemiológico re-
cional, associando-se mais a atividades alizado analisou se houve diferença sig-
recreativas6. nificativa de infecção por leptospirose
As vacinas são compostas por mi- entre pessoas que mantinham contato
crorganismos inativos ou atenuados e, íntimo com os animais, normalmen-
quando manuseadas de forma correta, te trabalhadores rurais, e os que não
não promovem riscos (diretos) à saúde tinham contato. Os resultados deste
humana. Entretanto, cabe ressaltar que trabalho sugeriram que a população
a necessidade de descarte apropriado da zona rural encontra-se exposta à in-
das embalagens vazias é extremamente fecção por leptospiras e que o auxílio a
importante. Isso porque o homem pode partos em animais pode ser um fator de
atuar como participante acidental da ca- risco, necessitando de maior vigilância
deia epidemiológica das doenças como por parte das autoridades sanitárias6.
a brucelose. Por meio da manipulação A vacina antirrábica é composta
das secreções do animal infectado ou por vírus inativo. Sua manipulação não
de vacina atenuada (cepa B-19) de uso é considerada um risco ocupacional.
comercial, pode haver uma inoculação Entretanto, o desenvolvimento da do-
acidental ou inalação de aerossóis no ença no animal até o seu diagnóstico e
momento da vacinação quando esta é o contato das secreções animais pelos
manuseada inapropriadamente. Desta trabalhadores é a questão mais preocu-
maneira, pode provocar a doença no pante, pois o período de incubação é
animal e no aplicador, além de contami- muito variável, podendo durar de dias
nar o meio ambiente. a meses, a sintomatologia é inespecí-
Schnurrenberger et al.7, em estudo fica e o diagnóstico é dado somente
com 1.315 médicos veterinários, que após exame laboratorial post mortem.
realizaram vacinação para brucelose no Por isso, o tratamento adequado dos
estado americano de Illinois, observa- materiais utilizados no atendimento
ram que 17,8% apresentaram produção clínico dos animais que apresentem sin-
52 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
tomatologia neurológica é de extrema duos do país, onde apenas 31,6% dos
importância. municípios rurais possuem coleta de
lixo, não sendo levado em consideração
Classificação dos resíduos a forma de disposição e tratamento dele.
Os resíduos sólidos foram classifi- Percebe-se que os resíduos inorgânicos
cados pela NBR 12808/19938 em três oriundos das atividades agropecuárias
tipos: a classe A, composta por resídu- não se enquadram na legislação vigente
os infectantes; a classe B, composta por e merecem um estudo diferencial com o
resíduos especiais; e a classe C, pelos intuito de se definirem as formas de dis-
resíduos comuns. Os detalhes são apre- posição e de tratamento que podem ser
sentados na Tab. 2. aplicadas.
Os resíduos infectantes são os de As pessoas que manipulam esse resí-
serviços de saúde que, por suas caracte- duo é a população rural de todas as fai-
rísticas de maior virulência, infectivida- xas etárias, inclusive crianças, que não
de e concentração de patógenos, apre- possuem uma instrução suficiente para
sentam risco potencial adicional à saúde realizar esse tipo de serviço. Segundo a
pública. Já os resíduos farmacêuticos legislação americana, o manipulador é
são enquadrados na classe B e consis- definido como a pessoa que pode entrar
tem em produtos medicamentosos com em contato com os produtos médicos
prazo de validade vencido, contamina- veterinários ou componentes antes da
do, interditado ou não utilizado. aplicação no animal (por exemplo, du-
A Resolução Conama nº 358/20059 rante a preparação e o armazenamento),
caracteriza o resíduo produzido pelo durante a aplicação e após a aplicação
atendimento à saúde humana ou animal (por meio do contato com animais
como resíduo de saúde, inclusive nos tratados ou dos resíduos gerados). A
serviços de atendimento domiciliar e de avaliação da segurança do usuário deve
trabalho no campo. Nessa mesma legis- abordar as situações de exposição resul-
lação, a responsabilidade da destinação tantes de condições normais de uso e
final de tais componentes é delegada ao de acidentes previsíveis, como ingestão
gerador do resíduo, ou seja, a proprieda- acidental por crianças e injeções aciden-
de rural ou o próprio profissional veteri- tais de medicamentos. Substâncias de
nário, assim como a implantação de um uso controlado que podem ser mal uti-
plano de gerenciamento de resíduos de lizadas, como hormônios e drogas psi-
saúde, que deverá ser requerido durante cotróficas, exigem uma atenção especial
o licenciamento ambiental da proprie- para as condições de estocagem, no sen-
dade rural. De fato, esse tipo de exigên- tido de prevenir acesso de pessoas não
cia não condiz com a situação dos resí- autorizadas.
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 53
Tabela 2. Classificação dos resíduos sólidos segundo a NBR 12808/1993

Classe
Cultura, inóculo, mistura de microrganismos e meio de cultura
inoculado proveniente de laboratório clínico ou de pesquisa, vaci-
A.1 Biológico na vencida ou inutilizada, filtro de gases aspirados de áreas conta-
minadas por agentes infectantes e qualquer resíduo contaminado
por esses materiais.
Bolsa de sangue após transfusão, com prazo de validade vencido
A.2 Sangue e
ou sorologia positiva, amostra de sangue para análise, soro, plas-
hemoderivados
ma e outros subprodutos.
A.3 Cirúrgico, ana- Tecido, órgão, feto, peça anatômica, sangue e outros líquidos
A tomopatológico e orgânicos resultantes de cirurgia, necropsia e resíduos contami-
exsudato nados por esses materiais.
A.4 Perfurante ou
Agulha, ampola, pipeta, lâmina de bisturi e vidro.
cortante
Carcaça ou parte de animal inoculado, exposto a microrganismos
A.5 Animal
patogênicos ou portador de doença infectocontagiosa, bem como
contaminado
resíduos que tenham estado em contato com esse animal.
Secreções, excreções e demais líquidos orgânicos procedentes de
A.6 Assistência ao
pacientes, bem como os resíduos contaminados por esses mate-
paciente
riais, inclusive restos de refeições.
Material radioativo ou contaminado, com radionuclídeos prove-
B.1 Rejeito
nientes de laboratório de análises clínicas, serviços de medicina
radioativo
nuclear e radioterapia (ver Resolução CNEN- 6.05).
B B.2 Resíduo Medicamento vencido, contaminado, interditado ou não
farmacêutico utilizado.
B.3 Resíduo quími- Resíduo tóxico, corrosivo, inflamável, explosivo, reativo, genotóxi-
co perigoso co ou mutagênico conforme a NBR 10004

Todos aqueles que não se enquadram nos tipos A e B e que, por


sua semelhança aos resíduos domésticos, não oferecem risco
C Resíduo comum adicional à saúde pública. Por exemplo: resíduo da atividade ad-
ministrativa, dos serviços de varrição e limpeza de jardins e restos
alimentares que não entraram em contato com pacientes.

54 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Chaicouski et al. 10 realizaram um es- normas e/ou regras para o destino das
tudo sobre manejo dos resíduos sólidos embalagens vazias.
de saúde de origem veterinária em uma Na legislação da União Europeia, o
comunidade rural no estado do Paraná. termo produto veterinário engloba não
Como na região não há coleta de lixo, apenas os compostos farmacêuticos
as soluções adotadas pelos proprietá- como também os produtos ectoparasi-
rios geram um risco para o ambiente e tas, as vacinas e outros produtos que são
para os seres humanos, pois pode haver adicionados intencionalmente na ali-
a contaminação do lençol freático e do mentação animal. Essa definição inclui
solo e de crianças e/ou adolescentes que substâncias ou combinações utilizadas
entrarem em contato com algum tipo de para tratar ou prevenir doenças que são
resíduo disposto a céu aberto. A desti- administradas para restaurar, corrigir
nação dos resíduos veterinários era re- ou modificar alguma função fisiológica,
alizada de forma inadequada, por meio como os produtos que promovem alte-
da queima na propriedade, descartados ração do ciclo estral.
com o lixo comum ou descartados dire- Os praguicidas de uso veterinário e
tamente no solo, na propriedade rural. de uso agrícola têm semelhanças quími-
cas e/ou estruturais; assim, é razoável
Agrotóxicos X insumos esperar que os antiparasitários veteri-
nários recebam atenção semelhante aos
veterinários
agrotóxicos, o que não se observa atual-
A estrutura legal sobre os produtos mente, conforme apresentado na Tab. 3.
veterinários no Brasil é regida pelos Os agrotóxicos de uso veterinário
Decretos-Lei 467/1969, 1.662/2005, são analisados exclusivamente pelo
5.053/2004, 6.296/2007, Lei n° Ministério da Agricultura, Pecuária e
6.198/1974 e é de responsabilidade Abastecimento (Mapa). Desta manei-
exclusiva do Ministério da Agricultura, ra, produtos formulados com o mesmo
Pecuária e Abastecimento (Mapa). Os princípio ativo, numa mesma concen-
Decretos-Lei dispõem sobre a fiscaliza- tração, podem ter avaliações distintas,
ção de produtos de uso veterinário, dos para fins de registro, dependendo da
estabelecimentos que os fabricam, defi- sua utilização na agricultura ou na pe-
nem os produtos da indústria veteriná- cuária. A inclusão dos agrotóxicos no
ria e dão outras providências, estabele- rol de produtos de uso veterinário cria
cendo a obrigatoriedade da fiscalização uma confusão jurídica com sérias impli-
da indústria, do comércio e do emprego cações práticas: ao mesmo tempo, pro-
dos produtos veterinários em todo o dutos formulados a partir dos mesmos
país. Entretanto, não há menções sobre princípios-ativos, voltados ao combate a
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 55
Tabela 3. Análise comparativa de aspectos presentes na legislação sobre
produtos veterinários e agrotóxicos

Itens Agrotóxicos Produtos veterinários


Ministério da Agricultura, Pecuária e Ministério da Agricultura,
Órgãos regula-
Abastecimento, Ministério da Saúde e Ministério Pecuária e Abastecimento
mentadores
do Meio Ambiente (Lei nº 7.802, de 1989) (Decreto nº 5.053, de 2004)
Exigida por Lei (Lei nº 7.802, de 1989) e de
Não há exigência quanto à
responsabilidade do Ministério da Saúde (por
Classificação avaliação de toxicidade nem
meio da Anvisa). Obrigatoriedade de constar tais
toxicológica de seu registro no rótulo
informações nos rótulos (incluindo destaque por
dos produtos
cores)
Produtos para
Recebem um registro especial temporário (Lei nº São dispensados de registro
pesquisa e
7.802, de 1989) (Lei nº 6.198, de 1974)
experimentação
Deve ser aprovada pelo
MAPA e deve ser de
Deve ser provida de lacre irremediavelmente
primeiro uso, garantindo
Embalagem destruído após aberta pela primeira vez. (Lei nº
qualidade e inviolabilidade
7.802, de 1989)
do produto (Lei nº 6.198,
de 1974)
Na comercialização a granel
de produtos destinados à
Somente poderão ser realizados pela empresa alimentação animal, a res-
produtora ou por estabelecimento devidamente ponsabilidade pela manu-
Fracionamento
credenciado, sob responsabilidade da produtora, tenção da qualidade passa a
do produto
em locais previamente autorizados por órgãos ser do estabelecimento que
competentes. (Lei nº 9.974, de 2000) o adquiriu, a partir de seu
efetivo recebimento (Lei nº
6.198, de 1974)
Embalagens vazias devem ser devolvidas no pon-
Descarte de em-
to de venda no prazo de até um ano após a data
balagens pelo Não há menção
da compra. Esta informação deve vir em bula (Lei
produtor
nº 9.974, de 2000)
As empresas produtoras e comercializadoras são
responsáveis pela destinação destas com vistas
Destinação de à sua reutilização, reciclagem ou inutilização,
Não há menção
embalagens obedecendo a normas e instruções de órgãos
registrantes e sanitário-ambientais competentes
(Lei nº 9.974, de 2000)
Fonte: Silva et al.11 (2012).

56 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


pragas, são classificados, autores citados, os proble-
Os efeitos adversos à
controlados e legislados mas mais observados são
saúde relacionados
de maneira bastante dis- as neuropatias periféricas
à exposição a
tinta, dependo de seu de efeito retardado, as ta-
organofosforados
uso primário .11
são problemas quicardias, as fraquezas
Publicações recen- comumente enfrentados musculares e as midríases,
tes ao tema relacionan- por profissionais efeitos geralmente asso-
do o trabalhador rural relacionados à cultura ciados a episódios de into-
à exposição de pragui- de gado leiteiro, entre xicação aguda.
cidas mostram que a estes, autoridades Nos Estados Unidos,
utilização de defensivos sanitárias, veterinários tem sido recomendado
agrícolas promove ris- e produtores. o descarte de medica-
cos de acidentes e doen- mentos no esgoto e não
ças relacionadas ao tra- no lixo. Esta iniciativa foi
balho. Schmidt e Godinho realizaram tomada para proteger os humanos e
12

um estudo com 50 produtores rurais, os animais de contaminação acidental,


numa região do interior além de envenenamentos
de São Paulo conhecida As experiências por ingestão ou por con-
pela elevada produção positivas de tato, pois permitir que
de grãos, principalmente logística reversa das medicamentos sejam ar-
soja e milho, e identifica- embalagens vazias de mazenados em lixo pode
ram falta de treinamento agrotóxicos podem promover sua acumulação
técnico para utilização de servir de modelo para e recuperação do conteú-
agrotóxicos, sobretudo os demais segmentos do a partir do lixo.
erro de dosagem, além que ainda carecem de Em 2011, o
de relatos de crianças que políticas específicas InpEV lançou o pri-
13

pegam as embalagens de para a destinação meiro Relatório de


agrotóxicos vazias para ambientalmente Sustentabilidade. Houve
brincar. correta dos resíduos recolhimento de 34.202
Os efeitos adversos gerados. toneladas de embalagens
à saúde relacionados à de agrotóxicos, que fo-
exposição a organofos- ram retiradas do campo
forados são problemas comumente e enviadas para a destinação ambien-
enfrentados por profissionais rela- talmente adequada para reciclagem e
cionados à cultura de gado leiteiro, incineração, o que representou 80% das
entre estes, autoridades sanitárias, vete- embalagens comercializadas.
rinários e produtores. De acordo com os As experiências positivas de logísti-
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 57
ca reversa das embala-
A maior geração Resíduos orgânicos
gens vazias de agrotó-
de resíduos na produção
xicos podem servir de animal
agrossilvopastoris na
modelo para os demais
produção animal está A maior geração de
segmentos que ainda ca- relacionada a resíduos resíduos agrossilvopas-
recem de políticas espe- orgânicos provenientes toris na produção ani-
cíficas para a destinação da produção, sendo mal está relacionada a
ambientalmente correta esses dejetos restos de resíduos orgânicos pro-
dos resíduos gerados. alimentos, cama de venientes da produção,
No tocante ao retor- frango, carcaças de sendo esses dejetos res-
no de embalagens va- animais mortos e restos tos de alimentos, cama
zias de insumos farma- de parição. de frango, carcaças de
cêuticos (pesticidas) O gerenciamento desses animais mortos e restos
veterinários, tramitam resíduos está vinculado de parição.
no Congresso projetos diretamente ao manejo, O gerenciamento
de lei (PLS 134/2007 que pode ser seco ou desses resíduos está vin-
e PLS 718/2007) que úmido. culado diretamente ao
propõem a alteração manejo, que pode ser
do Decreto-Lei nº seco ou úmido. No ma-
467/196914, passando a vigorar a res- nejo úmido, adota-se sistema de trata-
ponsabilidade para a destinação das em- mento de efluentes líquidos (ETE); já
balagens vazias de insumos veterinários. no caso do manejo seco ou de resíduos
No plano interna- sólidos gerados na ETE,
cional, diferentes países O processo de o ideal é adotar o apro-
já adotaram políticas compostagem pode ser veitamento de resíduos.
para a gestão de resí- definido como sendo a Entre as principais for-
duos sólidos. Na União decomposição biológica mas de aproveitamento
Europeia, o principal controlada de resíduos estão a compostagem,
instrumento utilizado orgânicos, realizada o uso de esterqueiras
para subsidiar o siste- por microrganismos ou bioesterqueiras e os
ma de logística reversa autóctones, num biodigestores.
é uma tarifa paga pelo ambiente úmido,
setor produtivo (distri- aquecido e aeróbio, com Compostagem
buidores, produtores produção de dióxido de O processo de com-
de embalagens, etc.) carbono, água, minerais, postagem pode ser de-
por tipo de produto e tendo como resultado finido como sendo a
reciclável. final o composto orgânico decomposição biológica
58 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
controlada de resíduos
A relação C/N deve estar energética para o meta-
orgânicos, realizada por bolismo e o material bá-
no intervalo de 25:1 a
microrganismos autóc- sico para construção de
40:1.
tones, num ambien- células microbianas. Já o
te úmido, aquecido e nitrogênio é o elemen-
aeróbio, com produção de dióxido de to essencial na formação de proteínas,
carbono, água, minerais, e tendo como ácidos nucleicos, aminoácidos, enzimas
resultado final o composto orgânico, e coenzimas necessários para o cresci-
que constitui um material humidificado, mento e o funcionamento celular.
com odor de terra, facilmente manuse- A relação C/N deve estar no inter-
ado e estocado, o qual contribui para a valo de 25:1 a 40:1, pois valores eleva-
fertilidade e a estrutura do solo15, 16. dos significam que não há nitrogênio su-
A compostagem se desenvolve em ficiente para um ótimo crescimento das
três fases distintas: populações microbianas, e a velocidade
• Fase mesofílica: é a fase em que pre- de decomposição será reduzida. Por
dominam temperaturas moderadas, outro lado, baixos valores de C/N indu-
até cerca de 40ºC, tendo em média de
zem perdas de nitrogênio na forma de
dois a cinco dias.
amônia, causando odores indesejáveis16.
• Fase termofílica: nessa fase, predomi-
Na Tab. 4 estão listadas as relações
nam as altas temperaturas, e ela pode
C/N de diferentes resíduos.
ter a duração de poucos dias a vários
meses, de acordo com as característi-
Tabela 4. Relações C/N de diferentes
cas do material a ser compostado.
resíduos para compostagem
• Fase de maturação: é a fase em que
ocorre a humificação da matéria or- Material Relação C/N
gânica, tendo duração de semanas a Esterco bovino 18:1
meses. Esterco de aves 10:1
Os fatores que afetam o processo de Esterco suíno 19:1
compostagem são: Esterco de ovinos 15:1

1. Relação carbono/nitrogênio Esterco de equinos 18:1

(C/N) Cama de aviário 14:1


Café: casca 53:1
O carbono e o nitrogênio são os ele-
Cana-de-açúcar 22:1
mentos mais importantes requeridos
para que a decomposição microbiana Serragem 865:1

se desenvolva plenamente. O carbono Fonte: Adaptado de Kiehl15


fornece, simultaneamente, uma fonte
Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 59
2. Tamanho das partículas dos por se tratar de um processo aeróbio de
resíduos agrícolas oxidação, a disponibilidade de oxigênio
Os resíduos a serem compostados é um fator primordial.
não devem conter partículas muito pe- A aeração é feita por meio do revi-
quenas, a fim de se evitar a compactação ramento das leiras, de forma manual ou
durante o processo, o que comprome- mecânica, ou por meio de aeração for-
teria a aeração. Por outro lado, resídu- çada, utilizando compressores e tubos
os com partículas maiores retardam a perfurados dentro da leira.
decomposição por reterem pouca umi- O reviramento das leiras é indicado
dade e apresentarem menor superfície a cada três dias, durante os primeiros 30
de contato com os microrganismos. As dias, e a cada seis dias até o término da
partículas devem ter o tamanho do in- primeira fase (temperaturas inferiores a
tervalo de 10 a 50 mm. 40ºC).

3. Umidade 5. Temperatura

O teor de umidade do material a ser A temperatura constitui o fator mais


compostado deve estar entre 40 e 60%, importante no indicativo do equilíbrio
pois, com valores inferiores a 40%, a ati- biológico, refletindo a eficiência do pro-
vidade microbiana é restringida, e com cesso de compostagem. Segundo Pereira
teores acima de 60%, começa a haver Neto (1996), na fase de degradação ati-
comprometimento da aeração, provo- va, a manutenção de temperaturas ter-
cando condições anaeróbias e conse- mofílicas (45 a 65ºC) controladas é um
quente liberação de maus odores. dos requisitos básicos, pois é por meio
Para corrigir o problema, em caso desse controle que se consegue aumen-
de baixo teor de umidade, deve-se irri- to da eficiência do processo. Já na 2ª fase
gar uniformemente a pilha de resíduos ocorre desenvolvimento de temperatu-
e, quando o teor de umidade estiver ex- ras mesofílicas (30 a 45ºC), sendo que
cessivo, deve-se fazer o revolvimento do temperaturas inferiores a 45ºC indicam
material. o início da fase de maturação17.
O controle da temperatura pode ser
4. Aeração realizado por meio da configuração da
A aeração é o principal mecanismo leira, aumentando ou diminuindo a área
capaz de evitar os altos valores de tem- superficial, e por reviramentos periódi-
peratura durante o processo de com- cos. Nesse processo, a aeração da massa
postagem, o aumento da velocidade de de compostagem passa a ser o mecanis-
oxidação do material orgânico e a di- mo de controle da temperatura na faixa
minuição da emanação de odores, pois, ótima17.
60 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
70% 30%

Capim ou qualquer Resíduo orgânico Leira de compostagem


material palhoso (lodo, esterco, etc.) balanceada

Figura 1. Preparo de leiras

Termômetro

Leira nº ___
1,20 m a 1,50m

Data de
montagem:_____

Figura 3. Placa de identifi-


2,00 m
cação da leira
Figura 2. Formato da leira.

Figura 4. Esquema de esterqueira.


Fonte: Adaptado de Freitas21 e www.banet.com.br.

Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 61


6. Preparo das leiras alvenaria, dimensionadas para receber
No processo de compostagem, são carcaças em períodos curtos, em mé-
necessários materiais que forneçam dia dois anos, sendo que geralmente
carbono (restos de capina e poda, ser- se esgotam antes do período projeta-
ragem, palha de milho, casca de arroz, do. Quanto à incineração, sabe-se que
etc.), e materiais que forneçam nitrogê- a umidade das carcaças, em torno de
nio (restos de alimentos, casca de fru- 6-70%, dificulta a queima em baixa tem-
tas, legumes, hortaliças, esterco, etc.). peratura, determinando a necessidade
A proporção em peso da mistura desses de se utilizar combustível para se obte-
materiais é de 70% de material palhoso rem altas temperaturas e injeção de ar
(fonte de carbono) para 30% de esterco para aumentar a eficiência da queima, o
ou lixo orgânico (fonte de nitrogênio), que eleva os custos, tanto em termos de
como mostra a Fig. 117. estrutura dos queimadores quanto em
Após a mistura dos resíduos, as termos operacionais, além de gerar odo-
leiras devem ser montadas imediata- res. No caso do enterramento de carca-
mente para que se inicie o processo de ças, são feitas valas, que ocupam muito
compostagem. A leira deve ter altura de espaço e muitas vezes não podem ser
1,20 a 1,50 metro e largura de 2,0 me- utilizadas na época das chuvas18, 19.
tros (Fig. 2). Já o comprimento depende Neste sentido, a compostagem de
da quantidade de material e da área de carcaças de animais, como também de
compostagem. restos de parição, tem se tornado uma
Depois de montada, cada leira deve alternativa atraente. No caso das carca-
receber uma placa de identificação, ças de animais, a compostagem é feita
constando número da leira e data de em estrutura de alvenaria, protegida da
montagem, como mostra a Fig. 3. chuva e com drenos para coleta de even-
O tempo necessário para a conclu- tuais percolados gerados pela compos-
são do processo de compostagem de teira, na qual as carcaças são colocadas,
forma natural é de 60 a 120 dias. em camadas alternadas com maravalha
ou serragem de madeira, de forma que
Compostagem de todos os fatores que influenciam o pro-
carcaças de animais cesso (relação C/N, umidade, aeração e
mortos temperatura) estejam adequados.
Tradicionalmente, os métodos uti-
lizados para disposição de carcaças de Esterqueiras e
animais mortos incluem fossas anaeró- bioesterqueiras
bias, incineração e enterramento. As As esterqueiras constituem depó-
fossas anaeróbias são construções em sitos que têm por objetivo principal o
62 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
armazenamento dos dejetos provenien- 4.  INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA
E ESTATÍSTICA. IBGE. Pesquisa Nacional de
tes de sistemas de produção, sendo di- Saneamento Básico. 2008. Disponível em http://
mensionados para período mínimo de www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/
condicaodevida/pnsb2008/PNSB_2008.pdf.
120 dias, de forma a permitir pequena Acesso em março de 2013.
estabilização dos dejetos20.
5.  GALHO, V.M.; LIMA, M.C.; GIL, R.L.; ISOLDI,
As esterqueiras, geralmente, são L.A. Educação Ambiental: o lixo em zona rural
do município de Arroio Grande - RS. Anais: XVI
de formato cilíndrico, trapezoidal ou Congresso de Iniciação Científica. IX Encontro
retangular, sendo recomendado o re- de Pós-Graduação, 27 a 29 de novembro de 2007.
vestimento para evitar percolação no
6.  GARCIA, J.L.; NAVARRO, I.T. Avaliação soro-
solo, com consequente contaminação lógica da leptospirose e brucelose em pacientes
da água subterrânea. Os materiais mais moradores da área rural do município de Guaraci,
Paraná, Brasil. Revista Sociedade Brasileira de
comuns utilizados para o revestimento Medicina Tropical. v. 34, n. 3, p. 299-300. 2001.
são pedras argamassadas, alvenaria de
7.  SCHNURRENBERGER P.R.; WALKER J.F.;
tijolos, lonas de PVC ou PEAD20. MARTIN, R.J. Brucella infections in Illinois veteri-
narians. Journal of the American Veterinary Medical
Os locais mais adequados para a Association. v.167, n.12, p.1084-1088. 1975.
construção de esterqueiras são os ter-
8.  ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS
renos inclinados, que permitem a exe- TÉCNICAS. ABNT NBR 12808:1993, Resíduos
cução de forma semienterrada, o que de serviço de saúde – Classificação. Associação
Brasileira de Normas Técnicas. Rio de Janeiro.
reduz os custos de construção e facilita 1993. 5p
a carga e descarga dos dejetos21 (Fig. 4).
9. CONSELHO NACIONAL DO MEIO
AMBIENTE. Conama. Resolução nº 358, de 29
Referências de abril de 2005, que dispõe sobre o tratamento e
a disposição final dos resíduos dos serviços de saú-
de e dá outras providências. Disponível em http://
1.  INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/
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Municipal. 2011. Disponível em ftp://ftp.ibge.gov.
br/Producao_Pecuaria/Producao_da_Pecuaria_ 10.  CHAICOUSKI, A.; SILVA, J.E.; NIGELSKI, S.B.;
Municipal/2011/ppm2011.pdf. Acesso em março NATUME, R.Y.; MENEGUZZO, I.S. Destinação
de 2013. final dos resíduos sólidos de serviços de saú-
de em pequenas propriedades rurais da colônia
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de 2010. Institui a Política Nacional de Resíduos Agroindustrial. v.4, n.2, p.207-217. 2010.
Sólidos; altera a Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de
1998. https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ 11.  SILVA, T.P.P.; MOREIRA, J.C.; PERES, F. Serão
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cuária leiteira. Ciências e Saúde Coletiva. v.17, n.2,
3.  SINDICATO NACIONAL DA INDÚSTRIA p.311-325. 2012.
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Disponível em http://www.sindan.org.br/sd/ estudo acerca do cotidiano do trabalho de produ-
base.aspx?controle=8. Acesso em março de 2013. tores rurais: intoxicações por agrotóxicos e subno-

Gerenciamento de resíduos sólidos agrossilvopastoris e agroindustriais 63


tificação. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional. 18.  PAIVA, D.P.; BLEY JR, C. Emprego de composta-
v.31, n.113, p.27-40. 2006. gem para destinação final de suínos mortos e restos de
parição. Circular Técnica 26. Embrapa. Concórdia.
13. 
INSTITUTO NACIONAL DO 2001. Disponível em www.cnpsa.embrapa.br/sgc/
PROCESSAMENTO DE EMBALAGENS sgc_publicacoes/CiT26.pdf. Acesso em março de
VAZIAS. InpEV. Relatório de Sustentabilidade de 2013.
2011. Disponível em: www.inpev.org.br. Acesso
em março de 2013. 19. ABREU, P.G.; CESTONARO, T.; ABREU,
V.M.N.; COLDEBELLA, A.; LOPES, L.S.;
14.  BRASIL. Decreto-Lei nº 467, de 13 de fevereiro TOMAZELLI, I.L. Modelos de Composteira para
de 1969. Dispõe sobre a fiscalização de produtos Compostagem de Aves Mortas. Circular Técnica
de uso veterinário, dos estabelecimentos que os 57. Concórdia. Embrapa, 2010. Disponível em
fabricam e dá outras providências. Disponível em http://www.cnpsa.embrapa.br/sgc/sgc_publica-
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-lei/del0467.htm. Acesso em março de 2013. de 2013.

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Brasília. Embrater. 1985. 14p. M.M.; SANGOI, V. Recomendações para uso de
esterqueiras para armazenagem de dejetos de suínos.
16. VALENTE, B.S.; XAVIER, E.G.; MORSELLI, Concórdia. EMBRAPA, 2004. Disponível em
T.B.G.A.; JAHNKE, D.S.; BRUM JR, B.S.; http://www.cnpsa.embrapa.br/sgc/sgc_publica-
CABRERA, B.R.; MORAES, P.O.; LOPES, coes/publicacao_c6f75b0x.pdf. Acesso em março
D.C.N. Fatores que afetam o desenvolvimento da de 2013.
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v.58, p.59-85. 2009. 21. FREITAS, J.Z. Esterqueiras para dejetos bovinos.
Manual Técnico 4. Programa Rio Rural. Secretaria
17.  PEREIRA NETO, J.T. Manual de Compostagem: de Estado de Agricultura, Pecuária, Pesca e
processo de baixo custo. Unicef. Belo Horizonte. Abastecimento do Estado do Rio de Janeiro. 2008.
1996. 56p. 8p. Disponível em http://www.pesagro.rj.gov.
br/downloads/riorural/04%20Esterqueira.pdf.
Acesso em março de 2013.

64 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Aproveitamento
energético de
resíduos sólidos
Luciano dos Santos Rodrigues1*
Israel José da Silva1 - CRMV 1033
Ana Cristina Araujo Pinto1 - CRMV 13510
1
Escola de Veterinária, Universidade Federal de Minas Gerais
*
Autor para correspondência: lsantosrodrigues@gmail.com

Introdução mes de resíduos e apresentam dificul-


dades no tratamento e na disposição
O atual crescimento populacional final destes. Isso favorece a criação de
e tecnológico se reflete no elevado au- alternativas para o aproveitamento des-
mento no consumo de energia, o que ses resíduos na sua já comprovada pro-
leva à construção de mais usinas, com dução energética, agregando a redução
consequente impacto ao meio ambien- do impacto ambiental ao aumento da
te, saturação das fontes fornecedoras e geração de uma energia limpa, barata e
altos investimentos na pesquisa de al- renovável.
ternativas energéticas. Além disso, esse Diferentemente do que se imagina,
crescimento faz aumentar a necessidade as indústrias e os grandes centros urba-
de maior produção de alimentos por nos não são os únicos responsáveis pela
meio de atividades como a agricultura poluição ambiental; a área rural tam-
e a pecuária, que geram grandes volu- bém tem grande participação pela uti-
Aproveitamento energético de resíduos sólidos 65
lização de dejetos de adiciona adubo nitrogena-
É de grande importância
animais sem qualquer do ao solo.
o aproveitamento de
tratamento, como É de grande im-
resíduos e dejetos,
adubo, ou lançamen- portância o aprovei-
contribuindo para a
to direto em corpos conservação do meio tamento de resíduos e
d’água, poluindo o ambiente e utilização dejetos, pois, além de
solo, águas superficiais desse material na contribuir para a conser-
e subterrâneas. cadeia produtiva, vação do meio ambiente
Além da polui- reduzindo-se os custos por meio da diminuição
ção, a agricultura e a com a produção de da poluição e da redução
pecuária são grandes uma energia limpa e da liberação de gases de
produtoras de gases de renovável, e diminuindo efeito estufa, pode-se utili-
efeito estufa. Estima- a dependência de zar esse material na cadeia
se que 20% dos gases combustíveis fósseis não produtiva, reduzindo-se
metano, óxido nitroso renováveis e poluentes. os custos com a produção
e gás carbônico são de uma energia limpa e
liberados pelo setor renovável, e diminuindo
agrícola, e no setor pecuário, os princi- a dependência de combustíveis fósseis
pais gases emitidos são o metano (15%) não renováveis e poluentes.
e o óxido nitroso (6%). A energia gerada por meio da bio-
Por ser o gás de massa pode ser aplicada tan-
efeito estufa mais to em pequena escala, para
abundante na at- O biogás é o subproduto pequenos povoados, meios
mosfera, o CO2 se oriundo da degradação rurais e populações remo-
tornou referência no
anaeróbia da biomassa, tas, quanto em grande escala
cálculo de emissão
sendo composto por para indústrias e áreas alta-
de gases e do poten-
metano, dióxido de mente povoadas.
carbono, nitrogênio e
cial de aquecimento Segundo o Ministério
outros gases em menores
global, que mede o da Agricultura, Pecuária e
escalas.
quão potente um Abastecimento, em 2009,
gás é para aquecer a 13% da energia consumida
terra. O metano é 25 vezes mais poten- no Brasil foi gerada do bagaço da cana-
te para aquecer a Terra que o CO2. E o -de-açúcar, subproduto da indústria
óxido nitroso, 298 vezes mais potente. sucroalcooleira.
Na pecuária, o metano é emitido pela No Brasil, existe o Decreto nº 7.404,
fermentação intestinal de ruminantes. de 2010, que regulamenta a lei da
Já o óxido nitroso é lançado quando se Política Nacional de Resíduos Sólidos e
66 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
estimula o aumento da oferta de energia A experiência chinesa e a indiana
no país com o aproveitamento de bio- com digestão anaeróbia de resíduos
massa (matéria orgânica de animais e agrícolas constituem um importante
vegetais). marco para difusão da digestão anaeró-
bia, pois elas asseguraram melhoria das
Biogás condições sanitárias e permitiram a pro-
O biogás é o subproduto oriundo da dução de biogás, insumo energético de
degradação anaeróbia da biomassa, sen- grande utilidade para a população do
do composto por metano, dióxido de meio rural .
1

carbono, nitrogênio e outros gases em A digestão anaeróbia pode ser con-


menores escalas. siderada como um ecossistema em que
A biomassa é qual- diversos grupos de mi-
quer matéria orgânica O biogás é o subproduto crorganismos trabalham
(animal ou vegetal) que oriundo da degradação interativamente na con-
possa ser transformada anaeróbia da biomassa, versão da matéria orgâ-
em energia mecânica, sendo composto por nica complexa em meta-
térmica ou elétrica. De metano, dióxido de no, gás carbônico, água,
acordo com a sua ori- carbono, nitrogênio e gás sulfídrico e amônia2.
gem, pode ser: florestal outros gases em menores A produção de metano
(madeira, principal- escalas. ocorre em diferentes
mente), agrícola (soja, ambientes naturais, tais
arroz e cana-de-açúcar, entre outras), como pântanos, solo,
pecuária (dejetos e ração) e rejeitos ur- sedimentos de rios, lagos e mares, assim
banos e industriais (sólidos ou líquidos, como nos órgãos digestivos de animais
como o lixo e o esgoto). Os derivados ruminantes.
obtidos dependem tanto da matéria-pri- A degradação da matéria orgânica
ma utilizada (cujo potencial energético por via anaeróbia requer a participação
varia de tipo para tipo) quanto da tecno- de diferentes grupos microbianos com
logia de processamento para obtenção funções e comportamentos fisiológicos
dos energéticos. diferenciados. As várias rotas metabó-
O biogás é também produzido de licas que ocorrem neste processo de di-
diversos resíduos orgânicos: gestão são as seguintes1,2:
• excrementos de animais; • hidrólise: conversão, por meio da ação
• lodos de esgoto; de exoenzimas excretadas por bac-
• lixo doméstico; térias fermentativas hidrolíticas, de
• resíduos agrícolas; materiais particulados complexos em
• efluentes industriais e urbanos. materiais dissolvidos mais simples,
Aproveitamento energético de resíduos sólidos 67
permitindo que atra- dem afetar diretamente
As arqueas
vessem a parede celu- o resultado final, tais
metanogênicas é que
lar das bactérias; como:
produzem o metano;
• acidogênese: resulta-
se houver oxigênio no Ausência de oxigênio
do da metabolização ambiente, as arqueas
fermentativa dos pro- deixam de se desenvolver As arqueas metano-
dutos solúveis pelas e será produzido somente gênicas é que produzem
bactérias, produzindo o metano; se houver
CO2, sendo necessário o oxigênio no ambiente,
diversos compostos completo vedamento do as arqueas deixam de se
mais simples, como: biodigestor.
ácidos orgânicos, ál- desenvolver e será pro-
coois, cetonas, dióxi- duzido somente CO2,
do de carbono e hidrogênio e novas sendo necessário o completo vedamen-
células bacterianas; to do biodigestor.
• acetogênese: oxidação realizada pelas Temperatura adequada
bactérias sintróficas acetogênicas de
As arqueas metanogênicas são sensí-
compostos orgânicos intermediários,
veis a alterações de temperatura, sendo
como propionato e butirato, em subs-
que dois níveis ótimos de temperatura
trato apropriado (acetato, hidrogênio
têm sido associados à digestão anaeró-
e dióxido de carbono) para os micror-
bia: a faixa mesófila (30 a 35ºC) e a fai-
ganismos metanogênicos;
xa termófila (50 a 55ºC), sendo que a
• metanogênese: última fase do proces- maioria dos digestores anaeróbios têm
so de conversão anaeróbia de compos- sido projetados na faixa mesófila.
tos orgânicos em metano e dióxido de
carbono, realizada pelas arqueas meta- Alcalinidade e pH
nogênicas, as quais podem ser dividi- A alcalinidade é uma medida da
das em: metanogênicas acetoclásticas, quantidade de carbonato na solução
quando usam o acetato como fonte (proveniente do CO , produzido duran-
2
de carbono e energia, produzindo gás te a digestão anaeróbia). Esta é impor-
carbônico e metano; e metanogênicas tante, pois à medida que se produzem
hidrogenotróficas, quando utilizam o ácidos no meio, o carbonato reage com
gás carbônico como fonte de carbono estes, permitindo o controle de acidez
e aceptor final de elétrons e o hidrogê- do meio. As bactérias produtoras de
nio como fonte de energia. metano têm um crescimento ótimo na
Em razão de a produção de biogás faixa de pH entre 6,6 e 7,4. Valores de
ser realizada por arqueas, existem con- pH abaixo de 6,0 e acima de 8,3 devem
dições de sobrevivência destas que po- ser evitados, pois podem inibir comple-
68 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
tamente as arqueas produtoras Tabela 1. Principais gases que compõem o biogás3
de metano. Composição Volume (%)
Nutrientes Metano (CH4) 50 a 75
Dióxido de carbono (CO2) 25 a 40
Os tratamentos biológicos
necessitam de nutrientes inor- Hidrogênio (H2) 1a3

gânicos em quantidades sufi- Azoto (N2) 0.5 a 2.5

cientes e em equilíbrio para um Oxigênio (O2) 0.1 a 1

funcionamento eficiente. O Sulfureto de hidrogênio (H2S) 0.1 a 0.5

conhecimento da composição Amoníaco (NH3) 0.1 a 0.5

química e do tipo de biomassa Monóxido de carbono (CO) 0 a 0.1

utilizado é muito importante, Água (H2O) Variável

como no caso dos dejetos ani-


mostrados os principais deles.
mais, que são ricos em nitrogênio, e os
resíduos de culturas vegetais, que são • O poder calorífico do biogás é aproxi-
ricos em carbono. madamente 21600 kJ/m3.
Teor de água • O principal componente do biogás,
O produto que for para a câmara de quando usado como combustível, é o
fermentação precisa ter um percentual de metano (CH4).
água de 90 a 95% em relação ao peso dele.
• O metano não tem cheiro, cor ou sa-
Tanto o excesso quanto a falta de umidade
bor, mas outros gases presentes confe-
são prejudiciais à produção de gás.
rem-lhe um ligeiro odor de alho ou de
No esterco bovino, que possui, em
ovo podre.
média, 85% de umidade, é necessário
acrescentar 100% de água em relação • Apresenta menor perigo de explosão
ao seu volume, atingindo a proporção – não tóxico.
1:1. No suíno, é necessário acrescentar • A densidade do metano é pouco mais
130% de água, já que este apresenta ape- da metade do peso do ar (ρ= 0,72 kg/
nas 19% de umidade. Os que precisam m3).
de mais água são o esterco dos ovinos
e o dos caprinos, que exigem 320% de • Apresenta-se como fonte de energia
água, já que a sua umidade é extrema- alternativa e renovável.
mente baixa. Um metro cúbico (1 m³) de biogás
equivale4 energeticamente a: i) 1,50 m³
Características do biogás de gás natural; ii) 0,98 litros de gasolina;
O biogás é uma mistura gasosa com- iii) 1,34 litros de álcool; iv) 2,21 kW/h
posta por diferentes gases. Na Tab. 1 são de eletricidade; v) 1,51 m³ de carvão.
Aproveitamento energético de resíduos sólidos 69
Pode-se produzir 1 m3 de biogás Vantagens e desvantagens
com os seguintes ingredientes: i) 25 kg
As vantagens do uso do biodigestor
de esterco fresco de vaca; ou ii) 5 kg de
são:
esterco seco de galinha; ou iii) 12 kg de
1. em termos de tratamento de resíduos:
esterco de porco; ou iv) 25 kg de plantas
i) é um processo natural para tratar
ou casca de cereais; ou v) 20 kg de lixo.
resíduos orgânicos; ii) requer menos
Os dados presentes na Tab. 2 mos-
espaço que aterros sanitários ou com-
tram as diferentes produções de biogás
postagem; iii) diminui o volume de
de cada biomassa, bem como a concen-
resíduo a ser descartado;
tração de metano. Nota-se, também, 2. em termos de energia: i) é uma fonte
que os dejetos suínos constituem a bio- de energia renovável; ii) produz um
massa com melhor rendimento, biogás/ combustível de alta qualidade;
tonelada, cerca de 560 m³ de biogás, e 3. em termos ambientais: i) soluciona o
apresenta um ótimo nível de gás meta- problema de saneamento ambien-
no (50%). Apenas como comparação, tal, com aproveitamento dos dejetos
convém notar que os dejetos de bovinos animais e vegetais; ii) reaproveita a
produzem apenas 270 m³ de biogás/ matéria orgânica; iii) produz como
tonelada, sendo o índice de presença de resíduo um biofertilizante; iv) reduz
metano neste biogás de 55%, ou seja, significativamente a quantidade emi-
apenas 5% a mais que o índice alcan- tida de metano na atmosfera.
çado pelo estrume de suínos. Isso pro- 4. em termos econômicos: i) reduz gastos
va que a excelente produção de biogás com eletricidade, esgotos, descarte
oriundo de dejetos suínos é o fator que de resíduos, etc.; ii) constitui uma
melhor compensa a demora desses de- fonte de renda para propriedades
jetos em produzir o biogás. rurais; iii) contribui para a geração

Tabela 2 . Expectativa de produção de biogás por biomassa


Produção de biogás
Biomassa Percentual de metano
(m³ / tonelada de matéria
(dejetos) produzido
seca)
Bovinos 270 55%
Suínos 560 50%
Equinos 260 Variável
Ovinos 250 50%
Aves 285 Variável

Fonte: Sganzerla5.

70 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


dos créditos de carbono digestores, sendo esses
O reator UASB tem
(Protocolo de Kioto). os mais frequentemente
sido amplamente
encontrados no Brasil,
estudado devido
As desvantagens do sobretudo nas granjas de
a sua vantagem
seu uso são: suinocultura.
de combinar
1. formação de gás sulfídri- construção
co (H2S), que é tóxico Reator UASB
e operação
e altamente corrosivo simplificada com O reator UASB tem
para os equipamentos, capacidade de sido amplamente estuda-
aumentando os custos acomodar altas do devido a sua vantagem
de manutenção; cargas orgânicas e de combinar construção e
2. a variabilidade na produ- hidráulicas. operação simplificada com
ção do biogás; capacidade de acomodar
3. remoção periódica do altas cargas orgânicas e hi-
lodo (1 a 5 anos); dráulicas . O interesse pelo UASB vem
6

4. custo elevado e alto período de retor- crescendo ao longo dos anos devido às
no do investimento. vantagens por ele proporcionadas: ocu-
pa pequenas áreas, produz pouco lodo,
Digestores anaeróbios não consome energia e não necessita de
Os reatores anaeróbios mais utili- equipamentos mecânicos7.
zados para obtenção de biogás são os No Brasil, o reator UASB tem sido
reatores anaeróbios de fluxo ascenden- utilizado para tratamento de esgotos
te de manta de lodo (UASB) e os bio- desde o início da década de 1980, prin-
Saída de
Coleta do efluente gás

Comparmento de decantação Separador trifásico

Defletor degás Abertura para o


decantador

Manta de lodo
Comparmento
Bolhas de gás
de digestão
Leito de Lodo
Parculas de lodo

Figura 1. Reator UASB

Aproveitamento energético de resíduos sólidos 71


cipalmente no Paraná, onde tem evo- sas que difundiram o uso de biodiges-
luído em forma e função, mediante a tores, foi criado, em 1939, na cidade de
experiência de centenas de unidades Kampur, na Índia, o Institute Gobár Gás
construídas. Atualmente, o reator já se (Instituto de Gás de Esterco), onde foi
encontra em praticamente todos os es- criada a primeira usina de gás de esterco,
tados do país8. que tinha por objetivos tratar os dejetos
O volume desse tipo de biodigestor, animais, obter biogás e aproveitar o bio-
em relação a outros, é sensivelmente fertilizante. Foi esse trabalho pioneiro
menor, o que o torna extremamente efi- que permitiu a construção de quase
ciente, em virtude da retenção do lodo meio milhão de biodigestores na Índia,
por períodos longos (semanas, meses o que motivou a China a adotar tal tec-
ou até mesmo anos), enquanto o tempo nologia a partir de 1958, e em 1972, já
de retenção da parte líquida pode ser possuíam aproximadamente 7,2 mi-
baixo (horas). lhões de biodigestores em atividade10.
A configuração de um reator UASB Essa tecnologia só foi trazida ao Brasil
(Fig. 1) é feita no regime hidráulico de na década de 70, com a crise do petró-
fluxo ascendente e na incorporação de leo. Diversos programas de difusão fo-
um dispositivo interno de separação só- ram implantados na região Nordeste,
lido/gás/líquido, dispensando o uso de porém os resultados não foram satisfa-
um meio suporte para crescimento da tórios e os benefícios obtidos não foram
biomassa. Esse separador trifásico faz suficientes para dar continuidade ao
com que os produtos oriundos do trata- programa.
mento saiam separadamente do reator, o O biodigestor pode ser definido
que permite prontamente sua utilização, como uma câmara de fermentação fe-
podendo o efluente ser lançado num chada, onde a biomassa sofre a digestão
corpo receptor ou como biofertilizante; pelas bactérias anaeróbicas, produzindo
o lodo, que já sai estabilizado, também biogás. Em outras palavras, trata-se de
pode ser aproveitado como biofertili- um recipiente completamente fechado
zante; e o biogás pode ser queimado, ou e vedado, que impede qualquer entrada
seu potencial energético utilizado. de ar, construído de alvenaria, concreto
ou outros materiais, onde é colocado o
Biodigestor material a ser degradado para posterior
O primeiro biodigestor data do ano fermentação11.
de 1857, em Bombaim, na Índia. Foi Existem vários tipos de biodigesto-
destinado com o intuito de produzir res, porém os mais difundidos são chi-
gás combustível para um hospital de neses, indianos e canadenses. Cada um
hansenianos9. Mediante várias pesqui- possui sua peculiaridade, entretanto to-
72 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013
dos têm como objetivo câmara de fermentação
O modelo indiano de
criar condição anaeróbi- de forma homogênea.
biodigestor, que tem
ca, ou seja, total ausên- O biodigestor possui
como característica
cia de oxigênio para que pressão de operação
principal o uso de uma
a biomassa seja comple- constante, ou seja, à
campânula flutuante
tamente degradada . 11
medida que o biogás
como gasômetro,
Atualmente, o mode- produzido não é consu-
sendo que esta pode
lo de biodigestor mais mido, o gasômetro des-
estar mergulhada
difundido no Brasil é loca-se verticalmente,
sobre a biomassa em
aquele feito de manta de aumentando o volume
fermentação.
PVC, de baixo custo e deste, mantendo, dessa
fácil instalação, se com- forma, a pressão cons-
parado com os modelos antigos, e com a tante em seu interior. Do ponto de vista
vantagem de poder ser usado tanto para construtivo, apresenta-se de fácil cons-
pequenos produtores como para gran- trução, contudo o gasômetro de metal
des projetos agroindustriais. pode encarecer o custo final, e também
a distância da propriedade pode dificul-
Tipos de biodigestores
tar e encarecer o transporte, inviabili-
Basicamente, existem três modelos zando a implantação deste modelo de
de biodigestor: o modelo indiano; o biodigestor12.
modelo chinês e o modelo canadense
2. Modelo chinês
ou de fluxo tubular.
O modelo chinês (Fig. 3) é confec-
1. Modelo indiano
cionado sob a forma de uma câmara de
A Fig. 2 mostra o modelo indiano de fermentação cilíndrica em alvenaria (ti-
biodigestor, que tem como característi- jolo ou blocos), com teto impermeável,
ca principal o uso de uma campânula destinado ao armazenamento do biogás.
flutuante como gasômetro, sendo que Esse biodigestor fun-
esta pode estar mergu- ciona com pressão hi-
lhada sobre a biomassa O modelo chinês é dráulica; o aumento de
em fermentação. Existe confeccionado sob a pressão em seu interior
ainda uma parede cen- forma de uma câmara de resulta no acúmulo do
tral que divide o tanque fermentação cilíndrica biogás na câmara de fer-
de fermentação em duas em alvenaria (tijolo mentação, induzindo-o
câmaras. A função dessa ou blocos), com teto para a caixa de saída. O
divisória é fazer com impermeável, destinado biodigestor é constituí-
que o material circule ao armazenamento do do quase que totalmen-
por todo o interior da biogás. te em alvenaria, dispen-
Aproveitamento energético de resíduos sólidos 73
sando o uso de gasômetro com chapa impermeabilizada. Nesse tipo de biodi-
de aço e, com isso, obtendo-se uma re- gestor, uma parte do biogás produzido
dução de custos. Porém, podem ocorrer na caixa de saída é liberada na atmosfe-
problemas com vazamento do biogás, ra, reduzindo em parte a pressão interna
caso a estrutura não seja bem vedada e do gás, e, devido a isso, tal modelo não

Alimentação Campânula Saída de gás


Válvula
Bio-ferlizante

Nível do Cano de
terreno entrada
Cano de saída
Camada de
fermentação

Figura 2. Biodigestor indiano.

Alimentação
Saída de gás
Campânula Válvula
Bioferlizante

Nível do
terreno

Entrada
Descarga

Saída

Figura 3. Biodigestor do tipo chinês.

74 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


Figura 4. Biodigestor do tipo canadense ou de fluxo tubular.

é indicado para instalações de grande separado, permitindo maior controle.


porte12. Embora este apresente a vantagem de
3. Modelo canadense ou de fluxo ser de fácil construção, possui menor
tubular durabilidade em razão do perfuramento
da lona plástica ou do escapamento de
Este modelo de biodigestor (Fig. gás.
4) é mais recente e apresenta uma tec-
nologia bem mais moderna e avançada, Utilização do biogás
porém menos complexa. É um modelo
tipo horizontal, que apresenta uma cai- O biogás é um combustível gasoso
xa de carga em alvenaria com a largura que apresenta um conteúdo energético
maior que a profundidade, possuindo, semelhante ao gás natural. A Fig. 5 mos-
portanto, uma área maior de exposição tra o esquema das possíveis aplicações
ao sol, o que possibilita grande produ- para utilização / conversão do biogás.
ção de biogás e evita o entupimento10. O biogás poderá ser utilizado como
Durante a produção de biogás, a cúpu- uma das seguintes formas de energia:
la do biodigestor infla porque é feita de elétrica, térmica ou mecânica. Ele pode
material plástico maleável (PVC), po- ser usado diretamente em equipamen-
dendo ser retirada. tos que funcionam com GLP ou em
O biodigestor de fluxo tubular é am- conjuntos geradores para produção de
plamente difundido em propriedades energia elétrica. Para sua perfeita utiliza-
rurais e é, hoje, a tecnologia mais utiliza- ção, os aparelhos devem ser específicos
da. Nesse tipo de biodigestor, o biogás ou adaptados, por se tratar de um gás
pode ser enviado para um gasômetro que será utilizado, geralmente, com flu-
Aproveitamento energético de resíduos sólidos 75
apresentam melhores
BIOGÁS
rendimentos5.
Rede de gás Introdução na rede pública A porcentagem
Introdução em rede privada de metano confere ao
biogás um alto poder
calorífico, o qual varia
Motor Cogeração
de 5.000 a 7.000 kcal
Energia mecânica por metro cúbico, e,
Transportes submetido a um alto
índice de purificação,
Combustão direta
pode gerar um índi-
Aquecimento de ambientes
ce de até 12.000 kcal
Aquecimento de águas por metro cúbico, po-
Produção de vapor dendo ser obtido por
Secagem meio de filtragem do
Produção de frio
gás pelos chamados
filtros úmidos, que
Turbinas a gás
consiste na passagem
Células de combusvel do gás por filtros de
Figura 5. Principais opções para utilização/conversão do biogás. água e outros, como
os de limalha de ferro.
xo de baixa pressão. A adequação, quan-
O poder calorífico do gás influi signifi-
do necessária, consiste somente em au-
cativamente sobre a possível aplicação
mentar o diâmetro de vazão do injetor.
dele.
Para transformá-lo em energia elé-
trica, é necessária a utilização de gera-
dores e, para obtenção de energia tér-
Cogeração de energia
mica, é necessário o uso de fornos para elétrica
que ocorra a queima e sua consequen- Cogeração é a produção combinada
te transformação. Para a utilização em de calor e eletricidade, independente-
motores à gasolina, mente do processo
é necessário que Para transformá-lo em ou do equipamento
se faça a conver- energia elétrica, é necessária a utilizado (caldeira
são para biogás. Ela utilização de geradores e, para com gerador a vapor,
não exige grandes obtenção de energia térmica, grupo motor gera-
alterações nos mo- é necessário o uso de fornos dor, turbina, etc.).
tores, porém mo- para que ocorra a queima e sua Para grupos motor-
delos específicos consequente transformação. gerador, a eficiência

76 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


de conversão em energia produção de energia, o
Cogeração é a
elétrica é relativamente que gera altos custos e
produção combinada
reduzida. Dependendo prejudica o desenvolvi-
de calor e eletricidade,
da potência, a eficiência mento da região15.
independentemente
varia entre 25% e 38%, do processo ou do Pode-se mencionar
em relação à energia ini- equipamento utilizado o surgimento de tec-
cial presente no biogás. (caldeira com gerador nologias promissoras,
Geralmente, os motores a vapor, grupo motor porém não comerciais
diesel apresentam ren- gerador, turbina, etc.). atualmente, como o da
dimentos de 3% a 5% a célula de combustível,
mais que os motores ci- enquanto as turbinas a
clo Otto, operados a gás13. gás e os motores de combustão interna
A cogeração de energia é uma ati- do tipo ciclo Otto são as tecnologias
vidade tradicional nas indústrias de mais utilizadas para esse tipo de conver-
processamento de cana-de-açúcar no são energética.
estado de São Paulo, e 92% da energia
elétrica dessas indústrias provêm desse Estudo de viabilidade
tipo de sistema, sendo que, na década
passada, esse índice atingia somente
econômica
60%. Sendo assim, a cogeração é uma Randi16 realizou um estudo sobre a
excelente opção para o Brasil14. viabilidade da produção de energia elé-
Em propriedades rurais localizadas trica com biogás de dejetos de suínos em
em áreas afastadas, é comum a falta de granjas. Nesse trabalho, foi realizado um
acesso à rede elétrica, sendo necessário levantamento dos investimentos para
o uso de geradores a óleo diesel para implantação de uma planta geradora de
Tabela 3. Tabela comparativa dos preços de conjuntos geradores
Potência em regime Preço Preço
Consumo (m3/hora)
contínuo (kW) (R$) por kWh
72 40 115.222,00 1.600,31
80 44 120.089,00 1.501,11
100 55 140.544,00 1.405,44
120 64 160.000,00 1.333,33
152 79 185.215,00 1.218,52
180 93 200.000,00 1.111,11
200 108 218.000,00 1.090,00
232 118 238.410,00 1.027,63

Aproveitamento energético de resíduos sólidos 77


energia elétrica por meio do biogás em ção, que será feita pelos próprios fun-
granjas de suínos de ciclo completo e cionários da propriedade, com o valor
mostrou-se como isso pode influenciar anual de R$ 2.000,00.
os custos de produção do suinocultor. Outros custos envolvidos para a ge-
Foram estimados os custos adicio- ração de energia elétrica são o custo da
nais da planta, tais como a construção construção do abrigo, estimado em R$
de um abrigo em alvenaria para o con- 5.000,00, e o custo das instalações elétri-
junto gerador, o custo das instalações cas para conexão à rede local, incluindo
elétricas para conexão à rede local, in- painel com chave seletora, instrumen-
cluindo painel com chave seletora, ins- tos de medição e rede de interligação.
trumentos de medição, transformador e Esses são estimados em R$ 15.000,00.
rede de interligação. Portanto, deverá ser acrescido no custo
O custo do investimento do biodi- apresentado na Tab. 3 o montante de R$
gestor foi desconsiderado, uma vez que 20.000,00. Na Tab. 4 são apresentados
ele pode ser financiado e pago com os os preços de vários conjuntos geradores
créditos de carbono gerados. Esse finan- de diferentes modelos com potência va-
ciamento não tem prazo estipulado para riando de 72 a 232 kW.
pagamento. Sendo assim, o biodigestor Ao se analisar a Tab. 4, percebe-se
apresenta apenas um custo de manuten- que o empreendimento só é viável para

Tabela 4. Análise de viabilidade em função da quantidade


de matrizes do ciclo completo em uma granja
Custo Relação entre po-
Potencial Potência
Nº de do kWh tencial energético TRI Viabilidade
energéti- do gera-
matrizes produzi- e capacidade do (anos) (sim/não)
co (kW) dor (kW)
do (R$) gerador
400 61,7 72 0,0830 86% 17,7 N
500 77,1 100 0,0706 77% 14,6 N
600 92,6 120 0,0661 77% 12,7 N
700 108,0 152 0,0594 71% 11,7 S
800 123,4 152 0,0594 81% 9,7 S
900 138,8 180 0,0538 77% 8,8 S
1.000 154,3 180 0,0538 86% 7,6 S
1.100 169,7 200 0,0523 85% 7,4 S
1.200 185,1 232 0,0489 80% 7,2 S
1.300 200,5 232 0,0489 86% 6,5 S

78 Cadernos Técnicos de Veterinária e Zootecnia, nº 68 - maio de 2013


produtores que apresentam um plantel 5.  SGANZERLA, E. Biodigestor: uma solução. Ed.
Agropecuária. Porto Alegre. 1983. 88p.
com, no mínimo, 700 matrizes em ciclo 6.  LETTINGA, G.; VAN VALSEN, A.F.M. Use of
completo. Esse produtor tem o poten- the upflow sludge blanket (USB) concept for bio-
cial energético de 108 kW, que deman- logical wastewater treatment, especially anaerobic
treatment. Biotechnology and Bioengineering. n.22,
da um conjunto gerador de 152 kW em p.699-734. 1980.
regime contínuo, apresentando uma 7. VAN HAANDEL, A.C.; LETTINGA, G.
Tratamento anaeróbio de esgotos: um manual para
relação de potencial energético e capa- regiões de clima quente. Ed. Universidade Federal
cidade em regime contínuo do gerador da Paraíba. Campina Grande. 1994. 208 p.
de 72%. Para esse, o tempo de retorno 8.  NETO, C.O.A; CAMPOS, J.R.. Introdução. In:
Campos Jr.(coordenador). Tratamento de esgo-
de investimento (TRI) ocorre em 11,7 tos sanitários por processo anaeróbio e disposi-
anos. Para uma granja de 700 matrizes ção controlada no solo. PROSAB. Rio de Janeiro.
1999, p.1-28.
do ciclo completo, o custo de geração 9.  NOGUEIRA, L.A.H. Biodigestão: a alternativa
de energia elétrica é de R$ 0,0594, o energética. São Paulo: Nobel, 1986.
que acarreta uma economia anual de R$ 10.  DEUBLEIN, D.; STEINHAUSER, A. Biogas from
waste and renewable resources: an introduction. 2a
26.177,57. ed. Wiley-VCH. Weinhein. 2010. 578p.
O produtor de 1000 matrizes apre- 11.  GASPAR, R.M.B.L. Utilização de Biodigestor em
Pequenas e Médias Propriedades Rurais com Ênfase
senta melhores resultados em relação ao na Agregação de Valor: Um Estudo de Caso na Região
produtor de 700 matrizes, pois possui de Toledo-PR. 2003. 106f. Dissertação (Mestrado
em Engenharia de Produção). Faculdade de
um potencial energético de 154,3 kW, Engenharia de Produção e Sistemas. Universidade
requerendo um gerador de 180 kW. O Federal de Santa Catarina. 2003.
investimento para a instalação da plan- 12. PEREIRA, M.F. Construções Rurais. Editora
Nobel. São Paulo. 1999. 330p.
ta é de R$ 220.000,00. O TRI é de 7,6
13.  COLDEBELLA, A. Viabilidade do uso do biogás da
anos. O preço do quilowatt-hora gerado bovinocultura e suinocultura para geração de energia
é de R$ 0,0538, o que acarretando uma elétrica e irrigação em propriedades rurais. 2006. 74 f.
Dissertação (Mestrado em Engenharia Agrícola).
economia anual de R$ 38.247,18. Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas,
Universidade Estadual do Oeste do Paraná. 2006.
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como alternativa no equacionamento da deman-
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Horizonte. 2007. 380p. Paulo:NIPE/UNICAMP, Campinas – SP, 2002.
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Faculdade de Ciências e Tecnologia. Universidade para cogeração energética. 2012. 20f. Monografia
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de Engenharia, Universidade Federal de Minas
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Gerais. 2012.
de energia elétrica. Ed. UFSM. Santa Maria. 1999.
242p.

Aproveitamento energético de resíduos sólidos 79

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