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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

MESTRADO EM LINGUÍSTICA
DISCURSOS NA MÍDIA: DO ÓDIO AO AFETO – VISÃO SEMIOLINGUÍSTICA
Aluno: Beatriz Bezerra Carvalho Maia.
Texto: CHARAUDEAU, P. Patemização na televisão como estratégia de autencidade.
In______ Emoções no discurso. Vol II, Org. Emília Mendes, Ida Lúcia Machado.
Mercado de Letras.

O texto indaga se e como as emoções podem ser objeto de estudo


especificamente linguageiro. Para tal, diferencia a abordagem do estudo das emoções na
psicologia - que as entende como reação sensorial, disposição de humor ou caráter e
rações comportamentais do indivíduo - e na sociologia - que percebe-as para além da
pulsão, como algo de caráter social, tentando estabelecer categorias “interpretativas
ideal-típicas” por meio da reconstrução do que deveria ser o comportamento humano.
Assim tendo em vita o sentimento de pertença e as regras sociais –.
Na análise do discurso, considerando seu objeto de estudo como a linguagem,
que é constituída por signos, as emoções são uma “figura” a qual o sujeito pode
reconhecer, um discurso codificado, próximo a uma retórica de visada de feito ( sendo
esse efeito suposto o objeto de análise no discurso). Pode-se dizer, então que as
emoções se inscrevem no quadro da racionalidade, pois contém em si mesmas uma
orientação direcionada ao objeto. Além disso, as emoções também estão relacionadas ao
saber de crença, uma vez que é necessário que se possa avaliar uma informação para
exprimir emoções em relação a esta. Nesse sentido, entende-se crença como um saber
polarizado entorno de valores socialmente compartilhados. Tendo, então, um caráter
qualitativo de ordem afetiva que passa por estados eufóricos e disfóricos.
Ao mobilizar inferências propostas pelas crenças, um estado emocional pode ser
desencadeado e esse desencadeamento (ou falta dele) coloca o sujeito em contato com
uma sanção social que resulta em julgamentos sociais de ordens psicológica ou moral.
Assim, as emoções advêm de um estado mental intencional.
Ao considerar a noção de emoção como um estado mental intencional, é preciso
observar a construção consciência psíquica do sujeito por meio da representação – que
se dá por meio do movimento de simbolização e do movimento de auto-apresentação –.
Esse fenômeno de representação é problemático por não necessariamente ser
interiorizado pelo indivíduo, levantando duas questões: é possível falar de
representações patêmicas? Quando as representações podem ser chamadas de
sociodiscursivas?
Para primeira questão tem-se que a representação pode ser chamada “patêmica”
quando:
“ela descreve uma situação a propósito da qual um julgamento de valor
coletivamente compartilhado – e, por conseguinte, instituído em normal
social – questiona um actante que acredita ser beneficiário ou vítima, e ao
qual o sujeito da representação se encontra ligado de uma maneira ou de
outra” (p.31)

Para a segunda questão, reserva-se as representações que implicam o sujeito,


engajando-os a tomada de posição no que diz respeito aos valores. Ou seja, enunciados
que circulam na comunidade, criando vários intertextos que se agrupam na formação de
imaginários sócio discursivos. Desse modo, as emoções são ao mesmo tempo originem
de comportamentos e controladas pelas normas sociais.
Quanto ao discurso, pode-se enunciar a expressão patêmica – ao mesmo tempo
elocutiva e alocutiva – que descreve ou manifesta o estado emocional do locutor ou do
estado emocional no qual outro deveria se encontrar, e pode-se enunciar a descrição
patêmica que propõe ao destinatário uma cena dramatizante capaz de produzir o efeito
patêmico visado. Para analisar o efeito patêmico proposto por estas estratégias de
enunciação, é preciso também levar em consideração a situação de comunicação e o
universo de saber partilhado.
Assim, o efeito patêmico pode ser obtido tanto de forma explícita e direta quanto
de forma implícita e indireta. Há, então, palavras que descrevem emoções de maneira
transparente, palavras que não descrevem emoções, mas podem desencadeá-las e
enunciados que não possuem palavras patemizantes, mas por meio da situação de
enunciação, produzem esse efeito. Nessa produção estão envolvidas três condições : a
inscrição do discurso em um dispositivo comunicativo cuja a finalidade e lugares
atribuídos pelos parceiros da troca predispõe o surgimento do efeito patêmico, o
universo temático deste dispositivo preveja a existência de um universo de patemizaçã,
e que, no espaço de estratégias, “a instância da enunciação se valha da mise en scène
discursiva como visada patemizante” (p.40). No que concerne ao discurso televisivo, o
texto destaca a representação do espaço privado como meio de desencadear um efeito
patêmico de solidariedade a partir da identificação entre o espectador e o outro
representado.
Além disso, também destaca grandes tópicas ( ou imaginários sóciodiscursivos)
presentes no universo patêmico das mídias:
 Tópica da dor, considerada um estado insatisfação do desejo causada por
um actante-objeto que é interiorizado pelo sujeito como causa da dor.
Ela é enunciada de maneira elocutiva uma vez que é o próprio sujeito que
a enuncia e a interioriza.( É apresentada por meio de figuras como a
triteza, a vergonha, a humilhação e etc)
 Tópica da alegria, que tem as mesmas características que a tópica da dor,
mas sob o estado de satisfação do desejo. ( É apresenta apresentada pelas
figuras da satisfação, contentamento, vaidade, orgulho e etc)
 Tópica da angústia, considerada um estado de espera pelo desconhecido
que apresenta ameaça. É também enunciada de maneira elocutiva.
( Apresentada por figuras de melancolia, medo, terror e etc)
 Tópica da esperança, que tem as mesmas características que a tópica da
angústia, mas sob a espera de algo positivo que traz benefícios.
( Apresentadas por figuras de confiança,desejo, oração e etc)
 Tópica da antipatia, considerada uma atitude reativa dupla, sob um
estado de indignação, em que o actante-objeto desdobra-se em
perseguido e perseguidor. Pode ser proporcional a dor da vítima, é
orientada contra alguém. Se expressando de forma elocutiva e alocutiva
simultaneamente. ( Apresentada pelas figuras de indignação, acusação,
denúncia e etc)
 Tópica da simpatia, também de reativa dupla e expressa por elocução e
alocução, mas sob o estado da sensibilidade. ( Apresentada pelas figuras
de benevolência, compaixão, piedade e etc). Assim como a antipatia, pôe
o telespectador na posição de moralista.
 Tópica de atração, exprime-se de maneira delocutiva, na qual o sujeito se
volta para um actante benfeitor ao qual ele essencializa em uma imagem
positiva ideal com a qual se relaciona pelo movimento de aprovação.
( Apresentada pelas figuras de admiração, encantamento, fervor e etc)
 Tópica da repulsa, o sujeito se volta para um actante da qual ele possui
uma imagem negativa, essencializada como “Má” e com o qual se
relaciona pelo movimento de reprovação. ( Apresentada pelas figuras do
desprezo, fobia, aversão e etc)

Assim, uma vez que o efeito patêmico se dá pela busca de uma reação do
leitor/espectador a ser causada por meio das estratégias discursivas empregadas
no texto. Conclui-se que o espectador/leitor é convidado, mais do que
compreender, a crer e a sentir, confundindo em casos como o discurso televisivo
o efeito patêmico com as estratégias de captação.

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