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O OYA BAGAN E O MITO FOLCLÓRICO DA “MULA SEM CABEÇA” OYA IGBALE E OYA

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ONIRA QUE SERIAM?
Inicialmente, deixo claro que não pretendo aqui criar um tratado sobre Oya (quem sou eu?), ou muito
menos criticar àqueles que acreditam nestes caminhos ou que são iniciados para Oya nesses esés.
Mas uma coisa que não podemos ignorar é que não tão somente estas Oyas, mas como muitos outros
caminhos de òrìsà, considerando possuírem matriz africana, soam estranhos aos mitos, e com eles são

á
desconexos, assim como aos itón e, porque não, ao próprio dialeto.
Pois bem. Vamos uma por uma.
O que dizem sobre Oya Bagan? Dizem que é a Oya sem cabeça. Por isto é agitada, até chamada por alguns
de “meio louca”. A perda de sua cabeça, segundo o que contam os que nela acreditam, teria sido por uma
traição a Èsù que, por isto, a decapitou fazendo-a de sua escrava e aprisionando-a, fazendo com que ela
com ele morasse, ou seja, em sua casa. Por isto, dizem, esta Oya moraria na casa de Èsù.
Algo já soa estranho: se Oya Bagan, que dizem, é uma Oya que de igbale, como poderia morar na casa de
Èsù? Afinal onde ela ficaria, no Igbalé ou na casa de Èsù? Outra: se Èsù é um òrìsà como outro qualquer,
como iria decapitar outro òrìsà? Vou mais longe... Se a função do òrìsà Èsù é ser ojisé (mensageiro –

B
existem mil cantigas que o impinge esta condição, inclusive de ìpádé) – e, por isto, afirmam ser escravo do
òrìsà, como pode fazer um òrìsà de seu escravo? Como é isso?
Bom, certo que nossa religião é calcada em mitos e não é a primeira vez que, afirmo isto. Mitos. Por isto,
que apregôo o conhecimento dos itons inteiramente aliado a coerência, porque por ser mito não se sabe até
onde prevaleceria “uma verdade”. Por isto, entendo e já afirmei inúmeras vezes que o candomblé não

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existe sem coerência, sem conhecimento de significados e relações entre natureza x energia x dialeto. Nos
mitos o òrìsà òlóògúnode é homossexual; Èsùmare é metade homem, metade mulher. Prevalece isto?
É a coerência que sempre apregoo que me faz entender Odé inlé, erinlé, Odé igbó, Odé igbualamo, como
sendo uma única coisa, ou seja, o caçador de elefantes que mergulhou em águas profundas. Isto porque
igbo é uma palavra do dialeto que se entende como algo fechado, tapado. Daí se entender matas, florestas

g
como igbo. Daí o Koloigbo de Omolu, entre outros. COERÊNCIA E CONHECIMENTO SEM
INVENCIONISMO.
Mas voltemos a “Oya Bagan” (a sem cabeça). O que faz um elegun? Ori (cabeça) x Àra (corpo). Sem isto
não existe estrutura nem física e nem espiritual. Daí a necessidade de coexistirem em qualquer elegun o
“igba ori” e o “bara”. Sem isto não há equilíbrio e nem, estrutura, se repita.

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Ora, se a Oya não tem cabeça, para iniciá-la é dispensável o osú? Porque não há outra solução! Onde é
feito o elo elegun x òrìsà (posto o osú), quando se inicia uma Oya desta? Nos pés? Na barriga? Onde?
Partindo deste princípio, é possível admitir este itón ou este caminho de Oya? Que exista um òrìsà que não
tenha cabeça ou que tenha sido decapitado? Se entenderem afirmativo, como Iroco, não se deveriam
iniciar ninguém para esta Oya, pois do contrário a vida do noviço nunca teria equilíbrio, seria um louco,

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um infeliz, fadado a loucura e ao desassossego, talvez.
Tenho que concluir, pois, que não existe Oya sem cabeça. Isto é uma loucura inventada. A personagem
sem cabeça faz parte de nossa cultura folclórica que é a mula. A famosa mula sem cabeça que dizemos as
crianças que ela aparecerá se fizerem malcriação. A mula sem cabeça, assim como o Saci Perere, o
Curupira, Lobisomem, o Touro encantado, entre outros.

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Ainda quanto a este possível caminho de Oya, eu afirmo e concluo que não é possível existir. Primeiro por
tudo o que foi dito acima. Por segundo que este nome (Bagan), que é uma forma contrata da palavra
Ìyádagan, se erige com o significado de posto, ou cargo, no egbé, e não como sendo um caminho de Oya.
Forma contrata é quando existem junções de palavras de criam somente uma. Isto existe várias línguas
como Inglês, Francês e até Português e também no dialeto yoruba. Outra situação que ajudou à confusão,

e
certamente, foi a onomatopéia, como ocorrem com os orins onde pessoas ouviram e, pela distorção e
adaptação, criaram palavras que não existem no dialeto e que são entoadas como se tivessem louvando
sem dizer nada. Daí, Ìyádagan foi se transformando em Ìyábagan que, finalmente, virou Oya Bagan e hoje
cultuam como um caminho de Oya, com esé e tudo. Inventado, claro, porque isto é cargo/posto. Aliás, não

u
é por outro motivo, que dizem que esta Oya não se inicia em homem, exatamente porque Ìyádagan é um
cargo ou posto de mulher. Acho que ficou clara a idéia.
Quanto a Oya igbalé, que as pessoas chamam balé, temos a mesma situação. Oya Igbalé deriva de uma
contração de duas palavras: Igbá = acento/assentamento e lé ou ilê = terra. O igbalé é uma repartição, uma
parte, um pedaço do ile igbo aku, onde concentramos os òrìsàs que lá moram como um Èsù, Osanyin, Oya
e Nana. O igbale, portando, é uma parte do ile igbo aku, onde os òrìsàs que lá moram se posicionam,
inclusive Oya. Entretanto, a Oya que mora lá é do Igbale, assim como o Èsù que lá mora também é do
igbale, assim como Osanyin e Nana que também são do igbale, se repita, porque moram lá neste espaço
destinado a eles.
Da mesma forma a tão famosa Onira. Onira não existe. Onira é titulo de Oya e não um caminho – ou uma
fase – dela. Onira é o resultado de uma contração de duas palavras: Oni (rei/rainha), Irá (a Cidade onde
reinou Oya). Significado, pois, é Rainha de Irá. Isto é fase dela? É caminho?
Vários òrìsàs possuem títulos, como Ògún (Onire), Odé (Oni igbo), Osún (Iyalode), Osòguian (Akinjolé,
Elemoso, Bàbá Olorogun) e, no entanto, nunca fizeram destes títulos, seus caminhos, ou estou enganado?
Outros òrìsàs que são feitos, a guisa de exemplo, sem que se saibam o seu significado e alguns nem
existem, ou são títulos como Ògún sórókè (Ògún que se lavou de sangue na montanha); Sàngó Obá Kosso
(Sángó Rei de Kosso), Obáluaiye (Rei da Terra); Omolu (filho da terra).
Sei que muitos, possivelmente, discordarão. Mas estou aqui para debatermos as idéias, sem que se
imponha o conhecimento. Mas precisamos de fundamentos e não se venha com a malfadada desculpa de
que (minha mãe disse, meu pai disse, fulana que era a maior Iyalorisá do mundo disse, ou sempre foi
assim e por isto assim farei). Isto é desculpa de quem não sabe, não pensa, ou sei lá.
Por isto, eu entendo e sempre entendi que o conhecimento repassado pelos mais velhos tem a sua valia
sim, claro. Mas como não sou um “burro de cargas” que é domado por alguém e, também, sou um ser que
pensa, eu faço uma aliança ao conhecimento repassado e a coerência destes ensinamentos, engendrados
com o conhecimento do culto e a dialética.
Portanto, eu concluo que esses caminhos de Oya, não existem, por todos os motivos acima expostos.
Um agradecimento mais que especial ao meu amigo e Pai Evanilto que me forneceu os dados, me incitou a
escrever o texto e me ajudou a concluí-lo, assim como o revisou.
ESTE É O MEU CANDOMBLÉ, OU MELHOR, O NOSSO CANDOMBLÉ.
Bàbálóòrìsà Luiz D’Osun.

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