Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
XP Macro Especial
Qual o ritmo de desaceleração do crédito?
Destaques:
Pelo lado positivo, a atividade econômica doméstica tem apresentado sinais de resiliência, justificando o
movimento de revisões altistas nas projeções para o PIB de 2022. A continuidade dos benefícios da reabertura
econômica, a recuperação sólida do emprego e estímulos de curto prazo que ampliam a renda disponível às
famílias explicam, em grande medida, a melhoria da atividade local. Dito isso, a economia doméstica deve
perder fôlego a partir da segunda metade do ano. Uma das razões dessa desaceleração é o mercado de
crédito, foco desta nota.
Na realidade, as concessões estão em rota de desaceleração desde o final do ano passado (especialmente
para pessoas físicas), mas permanecem em níveis relativamente altos. Além disso, o sistema financeiro
nacional segue capitalizado e com medidas de liquidez favoráveis. Por sua vez, as taxas de inadimplência
continuam próximas aos menores patamares da série histórica de dados, todavia existem sinais que requerem
monitoramento especial. Por exemplo, algumas modalidades de crédito para indivíduos registram elevação
não desprezível nas métricas de atraso de pagamento, o que geralmente antecede uma deterioração no
cômputo da inadimplência. E as perspectivas econômicas, mencionadas acima, intensificam as
preocupações. Afinal, o quadro de inflação e juros altos, endividamento crescente e maior percepção de risco
tende a piorar estatísticas do mercado de crédito ao longo dos próximos trimestres.
Mercado de crédito: política monetária atua e concessões desaceleram
(gradualmente)
O aperto das condições financeiras, com destaque à elevação das taxas de juros domésticas e maior
percepção de risco, vem arrefecendo as concessões de crédito. As últimas estatísticas oficiais do Sistema
Financeiro Nacional (SFN) divulgadas pelo Banco Central do Brasil (BCB) são referentes a fevereiro deste ano,
tendo em vista a greve dos servidores da instituição. Apesar deste fator limitante à avaliação tempestiva do
mercado de crédito doméstico, existem sinais de perda de tração das concessões no período recente. De fato,
os números oficiais já mostravam alguma desaceleração no final de 2021 e início de 2022, especialmente
para o segmento de pessoas físicas, e essa tendência deve ter sido reforçada no período mais recente. Afinal,
conforme discutido em diversos trabalhos acadêmicos recentes sobre o tema1, há indícios de que a política
monetária brasileira ganhou potência nos últimos anos, na esteira da menor participação dos bancos públicos
(que outrora praticavam taxas de juros consideravelmente abaixo da taxa de referência) no crédito total e da
implementação de regras que fortaleceram a agenda de consolidação fiscal. Essa dinâmica respalda nossa
projeção de crescimento de 1,6% para o PIB de 2022 (podendo ficar ao redor de 2% na esteira de medidas
governamentais de estímulo de curto prazo), com desempenho sólido no primeiro semestre e perda de fôlego
a partir do terceiro trimestre.
Crédito direcionado via bancos públicos teve grande Existem indícios de maior potência da política
participação na primeira metade da última década monetária nos últimos anos
Fonte: BCB, XP. Fonte: BCB, XP.
45 16
14 33
40 14
35 12 31
30 12
10 29
25 27 10
20 8
25 8
15 6
10 23 6
5 4
21 4
0 2
19 Taxa de Juros - Total SFN (% a.a.) 2
fev/16
fev/12
fev/14
fev/09
fev/10
fev/11
fev/15
fev/17
fev/19
ago/16
fev/22
ago/09
ago/12
fev/13
ago/19
ago/10
ago/11
ago/14
ago/15
ago/17
fev/18
fev/20
fev/21
ago/13
ago/20
ago/21
ago/18
fev/15
fev/16
fev/12
fev/09
fev/17
fev/19
fev/10
fev/14
ago/14
ago/16
ago/09
ago/12
fev/13
ago/17
fev/18
ago/19
fev/22
ago/10
ago/11
ago/15
fev/20
fev/21
ago/13
ago/20
ago/21
ago/18
Desembolsos BNDES, R$ bi, MM6M (esq.) Selic - % (dir.) TJLP - % (dir.)
1 Entre os estudos, destacamos: (I) Barboza, R.M.; Pessoa, S.A.; Ribeiro, E.P.; Roitman, F.B. 2020. O que aprendemos sobre o BNDES?
(II) Furtado, M.B.; Barboza, R.M. 2021. As implicações monetárias do BNDES: uma abordagem didática. (III) Estudo Especial do Banco
Central do Brasil, 2020. Potência da política monetária.
Isto posto, alguns sinais despertam preocupação. Destacamos os níveis elevados de endividamento e
comprometimento de renda das famílias, assim como a participação crescente das modalidades de crédito
de “pior qualidade” (linhas emergenciais, com taxas de juros significativamente mais altas).
Endividamento das famílias em trajetória de forte Comprometimento de renda das famílias com o serviço
expansão desde o final de 2020 das dívidas "acende luz amarela"
% renda acumulada nos últimos 12 meses. Fonte: BCB, XP. Séries com ajuste sazonal. Fonte: BCB, XP.
55 30 27,9
Principal Juros
50 Endividamento Total 23,6
25
45 Endividamento ex-Crédito Habitacional
20
40
15
35
30 10
25 5
20 0
dez/11
dez/15
ago/16
abr/17
dez/17
dez/19
dez/09
dez/13
abr/11
abr/15
abr/19
ago/10
ago/12
ago/14
abr/13
dez/21
abr/09
ago/18
abr/21
ago/20
dez/11
dez/15
ago/16
abr/17
dez/17
dez/19
dez/09
dez/13
abr/19
abr/11
abr/15
ago/10
ago/12
ago/14
dez/21
abr/09
abr/13
ago/18
abr/21
ago/20
No final de 2021, conforme apresentado na figura logo acima, as principais métricas de endividamento e
comprometimento de renda mostravam deterioração significativa, sem indício de alívio na margem (os
últimos dados consolidados do BCB são relativos a dezembro). Ao longo do primeiro semestre de 2022, por
sua vez, observamos avanços relevantes na massa de renda disponível às famílias, em linha com o aumento
do emprego e o maior volume de transferências do governo. Ademais, houve implementação de algumas
medidas de estímulo de curto prazo, como a liberação de saques extraordinários do FGTS. Segundo
levantamento de dados da Sondagem do Consumidor da FGV (Fundação Getúlio Vargas), por exemplo,
proporção relevante dos recursos do FGTS será destinada para a quitação de dívidas e contas em atraso,
particularmente entre os estratos inferiores de renda - cerca de 42% entre os que ganham até R$ 2.100/mês
e 24% considerando todas as faixas. Esses fatores, a nosso ver, devem contribuir para suavizar (mas não
reverter) a tendência altista dos indicadores de endividamento e comprometimento, em linha com a contínua
elevação das taxas de juros e a expectativa de ritmo mais fraco da atividade doméstica adiante.
Outras pesquisas e indicadores reforçam o temor acerca do grau de endividamento das pessoas físicas. De
acordo com a PEIC (Pesquisa Nacional de Endividamento e Inadimplência do Consumidor) da Confederação
Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo, os percentuais de famílias endividadas e com contas em
atraso vêm aumentando substancialmente. No caso da proporção de famílias com dívidas, houve elevação
de quase 9,5pp entre maio de 2021 e maio de 2022 (de 68,0% para 77,4%). O conceito ampliado de
endividamento da CNC não é diretamente comparável ao do BCB, devido a diferenças metodológicas, mas
também mostra deterioração importante na margem. Destaque para a proporção crescente de famílias com
dívidas de cartão de crédito e cheque especial nos últimos meses. No mesmo sentido, o número de pesquisas
na internet (Google) pelo termo “empréstimo” e correlatos mostra elevação acentuada recentemente, tendo
atingido o pico em março. O aumento da massa de renda disponível, já discutido acima, pode ter contribuído
para o recuo do índice de consultas entre abril e junho, mas os patamares permaneceram altos. O aumento
deste tipo de buscas na internet geralmente reflete condições mais apertadas no balanço financeiro das
famílias.
jan/14
jul/16
set/20
jul/11
mai/17
jul/21
jun/19
mai/12
ago/13
fev/16
dez/16
ago/18
fev/11
nov/19
mai/22
dez/11
out/12
jun/14
jan/19
fev/21
nov/14
abr/15
out/17
dez/21
abr/20
mar/13
mar/18
10
0
ago-19
fev-19
abr-19
jun-19
out-19
dez-19
fev-21
fev-22
fev-20
jun-21
jun-22
abr-20
jun-20
ago-20
dez-20
abr-21
out-21
dez-21
abr-22
out-20
ago-21
Proporção de famílias endividadas - CNC (%) - eixo esq.
Proporção de famílias com contas em atraso - CNC (%) - eixo dir.
As taxas de inadimplência de pessoas físicas seguiram próximas às mínimas históricas no início de 2022,
porém com tendência ascendente. Considerando apenas as operações com recursos livres, houve alta de
4,1% em agosto do ano passado para 4,7% em fevereiro do ano corrente. Ademais, algumas modalidades de
crédito para indivíduos mostraram aumento expressivo nos indicadores de atraso de pagamento (até 90 dias)
nas últimas divulgações mensais, o que geralmente antecede piora no cômputo da inadimplência. No caso da
linha do rotativo do cartão de crédito, a taxa de atrasos saltou de aproximadamente 10,5% em fevereiro de
2021 para 19,0% em fevereiro de 2022 com base na média móvel de três meses. Nossos modelos indicam
que a taxa de inadimplência total de pessoas físicas atingirá 4,0% no final deste ano, o que significaria o maior
nível desde abril de 2020 (e praticamente a média da série histórica de dados iniciada em março de 2011).
Taxas de atraso de pagamento (até 90 dias) em alta Inadimplência ainda perto das mínimas históricas,
Modalidades de Crédito PF. MM3M (%). Fonte: BCB, XP. mas com sinais de piora na margem
20 Taxas de Inadimplência PF (%). Fonte: BCB, XP.
10
8 7,2
18
6,3
8 16 6 5,4 5,6
4,3 4,7
4,1 4,0
6 14 4 3,3
2,9
2,0 2,1 2,4
12 2 1,6 1,6
4
Crédito Pessoal - Não Consignado Aquisição Veículos 10 0
Cheque Especial Cartão de Crédito - Rotativo (dir.)
set/16
out/13
dez/12
fev/12
jun/15
dez/17
mar/19
set/11
fev/17
abr/21
mai/13
mar/14
jun/20
mai/18
out/18
nov/20
fev/22
jul/12
abr/16
ago/19
jan/20
jul/17
set/21
abr/11
ago/14
jan/15
nov/15
2 8
fev/22
set/16
dez/12
jun/15
dez/17
mar/19
set/11
fev/12
mar/14
fev/17
mai/18
jun/20
abr/21
mai/13
out/13
out/18
nov/20
jul/12
abr/16
ago/19
jul/17
set/21
abr/11
ago/14
jan/15
nov/15
jan/20
Nossos modelos preditivos relacionam as concessões reais de crédito com a taxa de juros média para
pessoas jurídicas (defasada entre 5 e 8 períodos mensais), o IBC-Br (proxy mensal do PIB calculada pelo Banco
Central do Brasil) e o nível de confiança empresarial. Definimos trajetórias para a taxa de juros PJ com base
em sua relação estatística com a taxa Selic e nosso cenário de política monetária.
0 set/16 0
set/11
set/21
ago/19
jul/12
ago/14
jul/17
fev/12
abr/16
mar/19
abr/11
dez/12
jan/15
fev/17
dez/17
fev/22
mai/13
mar/14
jun/15
nov/15
out/13
mai/18
jan/20
out/18
jun/20
nov/20
abr/21
abr/16
fev/12
dez/12
mar/14
set/16
dez/17
mar/19
fev/22
set/11
fev/17
abr/11
ago/19
jul/12
jan/15
ago/14
nov/15
jul/17
jun/15
jun/20
mai/13
mai/18
out/13
out/18
set/21
jan/20
abr/21
nov/20
Os principais programas de acesso a crédito instituídos pelo governo foram: (I) Pese – Programa Emergencial
de Suporte a Empregos; (II) Peac-FGI - Programa Emergencial de Acesso a Crédito na modalidade de garantia;
e (III) Pronampe – Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte. A tabela a
seguir traz a identificação do público-alvo dos programas.
Público-alvo Pese Peac-FGI Pronampe
Descrição (resumida) Empresários, sociedades simples, cooperativas Empresas de pequeno e médio porte Microempresas e empresas de pequeno porte
Superior a R$ 360 mil Superior a R$ 360 mil Igual ou inferior a R$ 360 mil (microempresas)
Segundo dados oficiais do Banco do Brasil, BNDES e avaliação do TCU (Tribunal de Contas da União), os
programas Pese, Peac-FGI e Pronampe atingiram, respectivamente, cerca de 132 mil, 114 mil e 468 mil
agentes econômicos. Em relação ao Peac-FGI, por exemplo, as empresas de pequeno porte responderam por
67%, contra 32% das empresas de médio porte e 1% de empresas consideradas de grande parte. No que diz
respeito ao Pronampe, as microempresas e empresas de pequeno porte foram responsáveis por 45% e 55%,
respectivamente.
No que tange aos montantes das operações de crédito realizadas em 2020 e 2021, as estatísticas mostram:
R$ 8 bilhões no âmbito do Pese; R$ 92 bilhões com o Peac-FGI; e R$ 57,5 bilhões sob o Pronampe. Tais
programas parecem ter contribuído de forma relevante para mitigar o impacto econômico da pandemia sobre
as companhias, abrangendo um público que normalmente encontra maior dificuldade de acesso a crédito.
O governo federal reeditou este ano o Peac e o Pronampe, com ampliação do escopo para, por exemplo, incluir
microempreendedores individuais (MEIs). As novas concessões no âmbito desses programas devem
colaborar para o arrefecimento suave do mercado de crédito PJ.
Considerando esses fatores, apresentamos na tabela abaixo as nossas projeções para os principais
indicadores de crédito relativos a pessoas jurídicas (saldo e inadimplência) em 2022.
O quadro de desaceleração gradual do mercado de crédito ao longo dos próximos trimestres está em linha
com as nossas projeções de crescimento de 1,6% para o PIB de 2022 - com viés de alta, devido a medidas de
estímulo de curto prazo que sustentam o consumo das famílias - e 0,5% para o PIB de 2023. A política
monetária contracionista deve impactar fortemente a demanda interna no próximo ano, o que explica, em
grande medida, o cenário de baixo dinamismo em comparação ao ano corrente.
XP Macro
Contato: economiaxp@xpi.com.br
Disclaimer
Este relatório foi preparado pela XP Investimentos CCTVM S.A. (“XP Investimentos”) e não deve ser considerado um relatório de análise
para os fins do artigo 1º na Resolução CVM 20/2021. Este relatório tem como objetivo único fornecer informações macroeconômicas
e análises políticas, e não constitui e nem deve ser interpretado como sendo uma oferta de compra/venda ou como uma solicitação
de uma oferta de compra/venda de qualquer instrumento financeiro, ou de participação em uma determinada estratégia de negócios
em qualquer jurisdição. As informações contidas neste relatório foram consideradas razoáveis na data em que ele foi divulgado e
foram obtidas de fontes públicas consideradas confiáveis. A XP Investimentos não dá nenhuma segurança ou garantia, seja de forma
expressa ou implícita, sobre a integridade, confiabilidade ou exatidão dessas informações. Este relatório também não tem a intenção
de ser uma relação completa ou resumida dos mercados ou desdobramentos nele abordados. As opiniões, estimativas e projeções
expressas neste relatório refletem a opinião atual do responsável pelo conteúdo deste relatório na data de sua divulgação e estão,
portanto, sujeitas a alterações sem aviso prévio. A XP Investimentos não tem obrigação de atualizar, modificar ou alterar este relatório
e de informar o leitor. O responsável pela elaboração deste relatório certifica que as opiniões expressas nele refletem, de forma precisa,
única e exclusiva, suas visões e opiniões pessoais, e foram produzidas de forma independente e autônoma, inclusive em relação a XP
Investimentos. Este relatório é destinado à circulação exclusiva para a rede de relacionamento da XP Investimentos, incluindo agentes
autônomos da XP e clientes da XP, podendo também ser divulgado no site da XP. Fica proibida a sua reprodução ou redistribuição
para qualquer pessoa, no todo ou em parte, qualquer que seja o propósito, sem o prévio consentimento expresso da XP Investimentos.
A XP Investimentos não se responsabiliza por decisões de investimentos que venham a ser tomadas com base nas informações
divulgadas e se exime de qualquer responsabilidade por quaisquer prejuízos, diretos ou indiretos, que venham a decorrer da utilização
deste material ou seu conteúdo. A Ouvidoria da XP Investimentos tem a missão de servir de canal de contato sempre que os clientes
que não se sentirem satisfeitos com as soluções dadas pela empresa aos seus problemas. O contato pode ser realizado por meio do
telefone: 0800 722 3710. Para maiores informações sobre produtos, tabelas de custos operacionais e política de cobrança, favor
acessar o nosso site: www.xpi.com.br.