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Tom sentiu um arrepio quando passou pela mesma viela que havia vindo 5
dias atrás, mesmo que agora não tivesse mais nada lá. Ele tirou de um envelope
marrom um papel, confirmando mais uma vez o endereço para onde tinha que ir.
O atraso na autópsia também atrasou seus planos, fazendo com que ele só
voltasse a agir na quinta-feira. No tempo que ele esteve esperando a autópsia,
analisou o perfil da vítima algumas vezes, e algumas coisas o chamaram atenção.
Mas, como ele mesmo apontou em seu caderninho, nada que fizesse ela parecer
um alvo.
Ele chegou à porta do convento do qual ela fazia parte, que era a única coisa
aparentemente moderna do local, era uma porta de madeira maciça, e bem alta. Ele
bateu duas vezes com o batedor de porta cinza que estava pendurado, e, após
alguns instantes, a porta foi aberta por uma senhora com um grande sorriso.
— Boa tarde! — Tom começou
— Boa tarde. — ela retribuiu — Em que posso ajudar?
— Eu sou detetive da polícia de Londres. — ele disse, mostrando um
distintivo — E estou aqui para investigar sobre o caso de Sophie Evans.
— Ah… — a senhora perdeu o sorriso — Por favor, entre. — ela disse,
abrindo a porta enquanto forçava um sorriso
Quando entrou, a primeira coisa com que se deparou foi uma capela
pequena, com cerca de apenas 6 bancos. No centro, como é comum, uma grande
cruz, com Jesus pendurado. Naquele momento, Tom sentiu que Ele o estava
olhando, e rapidamente virou o olhar novamente para a senhora.
— Eu obtive a informação de que Sophie morava aqui, é verdade?
— Sim, é verdade. Quando ainda era criança, ela foi deixada aqui pelos pais
que não tinham condições de criá-la. Ela era muito amada por todas, e quando
completou 19 anos decidiu se tornar uma freira. Essa notícia deixou todas muito
felizes… — depois que percebeu algumas lágrimas caindo, a senhora enxugou-as e
mudou de assunto — Nós ainda não tivemos coragem de desfazer o quarto dela,
então ele ainda está intocado. Eu imagino que você se interesse em vê-lo, não?
— Seria de grande ajuda, obrigado.
Ela o guiou para uma porta à direita da capela, e depois de andar algum
tempo em um corredor, ela parou na frente de uma porta. Enquanto ela testava as
chaves do molho, Tom percebeu que na porta havia um número, 19.
— Você falou várias vezes das “outras”, mas você está sozinha aqui.
— Ah, isso é porque cada uma tem sua própria vida né. — a senhora deu
uma risadinha rouca — A nossa vida não se resume a esse convento, quero dizer, a
delas não. Eu já estou muito velha, prefiro passar meus dias aqui, tranquila. Esse
também eram os planos dela… — logo que ela terminou de falar, a porta se abriu —
Ah, era essa.
Ela estendeu a mão para que ele entrasse, o quarto não era muito grande,
havia uma cama de solteiro bagunçada e uma cômoda logo ao seu lado. Na parede
oposta à cama, havia um grande armário, mas nada incomum, até então.
— Ela tinha amigos? — ele perguntou, enquanto andava pelo quarto
— Durante a escola, sim, muitos. Mas depois que saiu e decidiu se tornar
freira, eu nunca mais vi ninguém aqui. A não ser que ela tivesse amigos fora, mas
eu não saberia dizer, ela não falava muito de sua vida fora daqui.
— Quando… encontramos ela. Ela estava sem seu celular, ela usava algum?
— Ela tinha, mas quase nunca levava ao sair de casa, talvez você encontre
ele aí em algum lugar.
— Você se incomoda se eu abrir esse armário?
Ela negou com a cabeça. Quando ele abriu, não viu nada de mais, algumas
maquiagens, uma bolsinha, dois cadernos. Nada que chamasse a atenção, tirando
por uma coisa, uma grande taça de vidro, muito ornamentada e, aparentemente,
muito cara.
— Isso foi um presente. — a senhora disse — Porém eu nunca soube de
quem.
— Entendo… — ele guardou novamente a taça no armário — Tenho apenas
mais uma pergunta. Eu sei que você disse que ela não falava muito da vida dela
fora do convento. Mas ela já lhe contou alguma coisa sobre o trabalho dela?
— Perdão, que trabalho? — a senhora perguntou, confusa
— Sophie trabalhava em um pub a apenas uma rua daqui.
— Eu não… sabia. Quer dizer, eu sabia que ela tinha algum trabalho, pois ela
fazia doações mensais para nós, doações essas que, inclusive, nos ajudaram
muitas vezes. Mas eu nunca soube de onde ela tirava esse dinheiro. Fico aliviada
de saber que não era nada ilícito, mesmo sabendo que ela nunca faria nada desse
tipo.
— Não se preocupe, pelos registros que nós temos, ela nunca fez nada de
ilícito. — ele disse, abrindo um sorriso caridoso — E não se preocupe, essa visita já
foi informativa o suficiente.
— Fico feliz em saber, espero que o culpado seja encontrado logo. Deixe que
eu te leve até a saída.
Depois de se despedir mais uma vez, Tom saiu do convento e voltou a andar
pela mesma viela. Novamente sentiu um arrepio ao passar pelo local onde tinha
visto aquele corpo, mas seguiu reto sem pensar muito sobre o assunto. Ele seguiu
caminhando por cerca de 15 minutos até chegar em frente ao pub, que era seu
próximo destino.
A frente dele era branca e muito bem arranjada, ele ficava em uma esquina e
a porta de entrada era bem na quina. Duas portas de madeira escura, com uma
clarabóia acima delas. Depois de bater algumas vezes foi recebido por uma
atendente um pouco impaciente, mas que logo o deixou entrar ao saber do que se
tratava.
O lugar era relativamente grande, havia muitas mesas espalhadas por um
grande salão. Bem no meio havia um balcão oval, com um armário cheio de uma
variedade quase infinita de bebidas. Logo que o viu, o gerente veio pessoalmente
conversar com ele.
— Boa tarde. Peço desculpas mas nós não abrimos ainda. — ele disse,
alternando o olhar bondoso com Tom e julgador com a funcionária que o deixou
entrar
— Eu que peço desculpas por não ter avisado antes que vinha, mas eu não
estou aqui para beber. — ele retirou o distintivo do bolso de sua camisa, mudando a
feição do homem — Estou investigando o caso de Sophie Evans.
— Sophie… Entendo. Por favor, sente-se. — ele disse, apontando para uma
mesa ao lado deles
— Meu nome é Tom.
— Muito prazer, meu nome é Josh.
— Então, Josh. Eu sei que você também não tem muito tempo, já que logo
estará na hora de você abrir o estabelecimento. Então serei bem direto em minhas
perguntas, tudo bem?
— Eu acho ótimo.
— Qual foi a última vez que ela esteve aqui?
— Foi em um sábado, ela não costumava trabalhar nos finais de semana,
mas nós tivemos um evento nesse dia, e consegui convencê-la a vir. Sinceramente,
eu fico me perguntando se, caso eu não tivesse feito ela trabalhar esse dia, algo
teria sido diferente.. — ele disse, abaixando a voz
— Bem, é isso que eu estou tentando descobrir. Se serve de algum consolo.
— É, talvez…
— Mas, continuando. Ela tinha intimidade com algum cliente da loja? — Tom
finalmente tirou o caderninho de seu bolso
— Eu sinto não saber responder essa pergunta, já que não fico aqui todos os
dias. Mas a Clary deve saber, ela era a amiga mais próxima de Sophie aqui.
Josh deu um grito, chamando a garota, que saiu rapidamente da cozinha e
veio devagar até a mesa. Era a mesma garota que havia atendido a porta para que
Tom entrasse. Ela era negra e tinha o cabelo curto bem cacheado, ela estava com o
uniforme de garçonete do pub.
— Sim?
— Sente-se aqui, por favor. — depois que ela o fez, ele continuou — Você
era a mais próxima de Sophie, gostaria que você ficasse aqui enquanto ele continua
com algumas perguntas, tudo bem?
— Ah, sim… — ela abaixou um pouco a cabeça
— Não se preocupe, isso não vai demorar muito. — Tom a reconfortou —
Agora, deixe-me repetir a pergunta. Você saberia me dizer se ela tinha alguma
intimidade com algum cliente da loja?
Ela pareceu pensar bastante antes de responder.
— Eu… só consigo pensar em duas pessoas. Ela não era de fazer amizade
com quase ninguém, eu mesmo demorei pra conseguir me tornar amiga dela.
— Você saberia me dizer quem são esses dois? — ele já preparou a caneta
— Eu não sei os nomes deles, mas sei com certeza a aparência. Eram dois
clientes recorrentes.
— Eu conheço alguém que faz retratos falados… Mas não sei se essa
pessoa poderia vir aqui agora. — Tom reclamou, olhando para baixo enquanto
pensava
— Eu posso tentar. — Josh disse — Não sou nenhum profissional, mas acho
que consigo fazer algo bom o suficiente.
— Eu acho que vale a tentativa. — Tom emprestou seu caderninho e sua
caneta para Josh — Pode começar.
— Certo! — ela exclamou — O primeiro era mais novo, eu diria que por volta
dos 20 anos, ele era mais gordinho então tinha um rosto bem redondo. Hm, cabelo
curto, bem curto mesmo, e castanho. Eu lembro que o nariz dele era bem pontudo,
isso me chamou atenção de cara. E ele usava roupas bem formais para quem
estava vindo a um pub.
— Ficou parecido? — Josh perguntou
— Sim, ficou ótimo.
— Ótimo, vamos para o próximo.
— O segundo eu me lembro melhor pois normalmente eu atendia ele. Ele era
mais velho que o primeiro, provavelmente com seus 30 ou 35 anos. Tinha um
cabelo mais longo, mas que não passava do ombro, e era loiro. Ele tinha um rosto
bem quadrado, o exato oposto do primeiro, seus olhos eram bem grandes e ele
tinha um nariz parecido com o primeiro, mas menos pontudo. Ele também era bem
forte, provavelmente fazia academia.
— Você diria que apenas esses dois seriam suspeitos? — Tom disse,
enquanto analisava os dois retratos
— Ela raramente conversava com alguém, e esses foram os únicos com
quem eu já vi ela tendo uma conversa mais casual.
— Com que frequência eles vêm para esse pub?
— O loiro vem apenas nos finais de semana. Já o outro é muito difícil de
saber, mas dificilmente ele vêm durante os finais de semana. Normalmente segunda
ou quinta feira são dias em que ele aparece. Mas até o momento, ele não veio
nenhuma vez essa semana.
— Bem, eu agradeço. Vocês foram de muita ajuda. Eu vou sair agora, e vou
deixar com vocês meu número. Gostaria de pedir apenas que, caso algum deles
venha para o estabelecimento nos próximos dias, que me chame. — ele arrancou
um pedaço de folha do seu caderninho com seu número anotado, e entregou Josh
— Tudo bem. E eu que agradeço, espero que sejamos capazes de ver o
culpado por esse crime atrás das grades o quanto antes.
— Eu espero o mesmo. — concordou Tom
— Deixe que eu te leve até a porta. — pediu Clary
— Obrigado pela ajuda. — Tom disse, já na porta do estabelecimento
— Eu que agradeço pelo seu trabalho. Avisaremos qualquer coisa.
Tom seguiu andando pela calçada, seguindo sem direção, enquanto pensava
sobre tudo que havia ouvido até agora. Depois de alguns minutos ele tirou o celular
do bolso e ligou para Sarah.
— Sarah?
— Sim, quem mais seria. — ela brincou
— Engraçada como sempre.
— Obrigada.
— Enfim, agora falando sério. Eu acho que esse caso será mais simples do
que imaginamos. Eu vou te mandar dois retratos falados que eu acabei de
conseguir dos meus dois suspeitos. Você teria como me conseguir todas as
informações sobre eles em até 2 dias?
— Hmm, 2 dias… Sim, acho que consigo. Mas tem algo em específico que
você queira saber?
— Sim, renda e se algum deles tem porte legal de armas.
— Certo. No sábado eu te enviarei por e-mail essas informações.
— Ok, obrigado.
Tom tocou a campainha da grande casa branca, depois de uma espera que
pareceu eterna, finalmente atenderam a porta. Um homem, o mesmo suspeito que
havia visto na câmera a poucos dias estava a frente dele, vestindo apenas um
roupão azul.
— Harry Scott? — Tom começou
— Sim, porque? — ele olhou os Tom e os dois policiais de pé a cabeça com
desprezo
— Nós somos da polícia. — ele levantou seu distintivo, e junto dele um
mandato — Temos permissão para entrar e interrogá-lo.
— Eu tenho a opção de recusar?
— Infelizmente não.
— A que devo essa visita?
— Nós estamos investigando o caso de Sophie Evans, por acaso conhece
ela?
— Sim, conheço. — ele disse, já mudando a forma com que falava — Mas
nunca fui muito próximo dela.
— Sim… sei. Bem, podemos entrar? Tenho muitas perguntas ainda.
— Ah, claro.
Ele terminou de abrir a porta, e ambos os 3 entraram, um atrás do outro, na
mansão. Era uma casa que parecia feita para visitas, móveis e decorações de luxo
estavam em toda sala, tudo parecia feito para impressionar qualquer um que
entrasse.
— Sentem-se. — Harry apontou para o sofá e duas poltronas bem no meio
da sala
Harry foi o primeiro a se sentar, em uma das poltronas e Tom logo em
seguida, na outra. E por fim, os dois agentes se sentaram no sofá, entre os dois.
Tom retirou seu caderninho do bolso, e pediu para que um dos agentes gravasse a
conversa.
— Bom, começando com uma pergunta simples. Qual foi a última vez que
você a viu?
— Hã… Não sei. Não me lembro.
— Você tem certeza?
— Sim. Quer dizer, talvez na última quinta-feira antes de ela morrer,
normalmente eu ia para lá nas quintas,
— Entendo. Mas sabe o que é estranho?
— O- o que? — sua face congelou em medo
— De acordo com as câmeras de segurança desse mesmo Pub, a última vez
que você esteve lá foi no sábado em que Sophie foi morta.
— E… é por isso que você está suspeitando de mim?
— Por mais algumas outras coisas também, gostaria de ouvir?
Harry não conseguiu responder, e Tom continuou.
— Eu acredito que você tenha cometido o ato logo após vê-la conversando
com outro homem de forma tão descontraída. Não sei o que passou na sua cabeça
neste momento, mas digamos que você tenha se sentido traído. Além disso, outras
coisas que provam a sua culpa são o fato de Sophie ter recebido um presente bem
estranho… e caro, de uma taça muito ornamentada. Acho difícil que outra pessoa
conseguisse comprar um presente dessa magnitude, e como podemos ver na sua
própria casa, você parece gostar de mostrar o dinheiro que tem. Ah, e claro, não
posso esquecer do sapato que você jogou no lixo do lado da vítima, um descuido e
tanto que praticamente selou sua cova. E claro, para finalizar, a vítima foi baleada
com uma arma de baixo calibre, mais especificamente 9mm curto, sendo assim uma
arma permitida pelo estado, contanto que você tenha uma permissão de tê-la. E, por
uma grande coincidência, seu pai tem uma. Isso foi o que eu descobri, e imagino
que seja o suficiente.
— E- eu… — Harry estava chorando, seu rosto havia travado e ele não
conseguia falar — Eu não fiz por querer. — ele gritou, chorando
— Eu estava bêbado… eu, eu. — ele soluçava muito enquanto falava — Eu
estava irritado, e a bebida não me ajudou, eu estourei e acabei…
— O resto você pode falar com o Juíz, eu já consegui as provas que eu
precisava. — Tom disse, se levantando — Mark, John, algemem ele e o levem para
a delegacia, por favor.
Harry não reagiu, estava chorando ainda quando foi levado até a viatura da
polícia. Tom saiu por último, fechando a porta da casa e andando sozinho pela
calçada em direção à sua casa. Já estava escuro e ele andava sozinho na calçada,
pensando nas suas últimas duas semanas.
Sophie era mais uma pessoa que havia entrado na sua vida dessa forma, e
que ele nunca mais a esqueceria. Era uma pena que ela tivesse ido tão cedo, pelo
menos, assim ele pensou, ele pôde ajudá-la também.