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Editoras / Editors
Denise Trento Rebello de Souza - Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
Teresa Cristina Rego - Universidade de São Paulo, São Paulo, Brasil
ISSN 1517-9702
Educação e Pesquisa, v. 40, n. 4, 288 p., out./dez. 2014.
Trimestral
Publicação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
Continuação da Revista da Faculdade de Educação da USP
ISSN 1517-9702
1. Educação.
http://www.educacaoepesquisa.fe.usp.br
http://dialnet.unirioja.es
http://www.redalyc.com
http://www.scimagojr.com
http://www.scielo.org
http://www.scopus.com
E-mail: revedu@usp.br
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Entrevista
1109 Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no “conhecimento dos poderosos” à
defesa do “conhecimento poderoso”
Entrevistadoras: Cláudia Valentina Assumpção Galian; Paula Baptista Jorge Louzano
913 The credibility of information on the Internet: criteria stated and criteria used by
Mexican students
Marina Kriscautzky; Emilia Ferreiro
935 Individual competences of distance education tutors
João Paulo Fonseca Borges; Francisco Antonio Coelho Junior; Cristiane Faiad; Natália Ferreira
953 Perspectives and contemporary reflections on the triangle education-technology-society
and its influence in science teaching
Carla Morais; João Paiva
9 65 Contribution for the teaching of natural sciences: Mapuche and school knowledge
Segundo Quintriqueo; Daniel Quilaqueo; Héctor Torres
983 Epistemological views and educational research in the science teacher education
Alberes de Siqueira Cavalcanti
999 The magazine Ciência Hoje das Crianças in school literacy: the retextualization of
popular science articles
Sheila Alves de Almeida; Marcelo Giordan
1015 Literature and communicative competence: a wrong assorted matrimony?
Ximena Troncoso Araos
1029 Writreadings: a way of “reading-writing” amidst life
Sandra Mara Corazza; Carla Gonçalves Rodrigues; Ester Maria Dreher Heuser; Silas Borges Monteiro
1045 Faces and metamorphoses of power: a sociography of the Portuguese ministers of
education in the democratic era
Pedro Abrantes; Cristina Roldão
1061 A brief history of the Brazilian higher education and teacher education for secondary school
Núria Hanglei Cacete
1077 Possible relationships between students’ perceptions of violence, school climate, and
collective efficacy
Marcela Brandão Cunha
1093 The concept of compensation in the dialogue of Vygotsky with Adler: human
development, education and disability
Débora Dainêz; Ana Luiza Bustamante Smolka
Interview
1109 Michael Young and the curriculum field: from the emphasis on the “knowledge of the
powerful” to the defense of “powerful knowledge”
Interviewers: Cláudia Valentina Assumpção Galian; Paula Baptista Jorge Louzano
1125 Instructions to authors
1139 See also
Um rápido olhar sobre o sumário deste número de Educação e Pesquisa revela a forte presença de
autores estrangeiros no conjunto de artigos aqui reunido. Sete dos 14 textos são
provenientes de outros países, sendo cinco autores portugueses, dois da Espanha,
três do México e quatro chilenos, em diferentes coautorias. Embora possuam
alguns temas em comum, como veremos a seguir, todos os artigos resultam de
envio espontâneo por parte dos autores, o que comprova o interesse crescente por
nossa revista na América Latina e na Península Ibérica. Se parte dessa procura
se explica pela pressão sobre os pesquisadores para que publiquem os resultados
de seu trabalho em artigos – fenômeno de caráter internacional –, ela também
representa o reconhecimento da seriedade de nosso trabalho.
Por outro lado, é possível identificar aqui exemplos de algumas das tensões presentes no processo
de internacionalização da produção de conhecimentos no campo educacional
brasileiro e, particularmente, na internacionalização de nossas revistas acadêmicas.
Trata-se de um processo contraditório e complexo, que só pode ser compreendido
no contexto da divisão internacional do trabalho intelectual.
Diversos autores, no âmbito das ciências sociais, já indicaram o desequilíbrio de poder que marca
a produção de conhecimento em nível global, com grande concentração nos
países capitalistas centrais, metrópoles ou nações “do norte”, em sentido mais
político que geográfico (CONNELL, 2007; SANTOS; MENEZES, 2009; ROSA, 2014;
para citar apenas alguns). Não temos a intenção de desenvolver esse complexo
debate, que remonta às teorias da dependência e aos autores ligados aos estudos
pós-coloniais. De forma geral, podemos afirmar que, nas ciências sociais,
caberia aos intelectuais “do sul” fornecer material empírico para as construções
teóricas das metrópoles, teorias cujo sentido universal é estabelecido a priori, por
proclamarem a si mesmas como capazes de conhecer e classificar sem exceção
todas as sociedades, incluindo as periféricas (MARTUCCELLI, 2010). Além disso,
essas teorias estabelecem implicitamente a polaridade entre moderno e tradicional
ou presente e passado, representados respectivamente pelas metrópoles e pelo
“resto do mundo”.
A interatividade possibilitada pela internet e plataformas de ensino foi objeto de estudo do texto
“Mapeamento de competências individuais de tutores que atuam na modalidade
a distância”. Nesse artigo, Borges e colaboradores apresentam dados quantitativos
e a análise dos mesmos com o objetivo de elencar competências técnicas e
comportamentais dos tutores para o exercício de sua função no âmbito da
Universidade Aberta do Brasil, tutores esses cujas tarefas centram-se na instrução,
na motivação e na orientação para a realização de atividades on-line. Os resultados
apontam a percepção dos tutores da necessidade de domínio de técnicas e de
conteúdo para uma efetiva interação, bem como a relevância dada a aspectos da
interação social, como, por exemplo, a cordialidade, a honestidade e a ética.
Na interface com a discussão do papel da tecnologia para o ensino e no ensino de ciências, este
número da revista Educação e Pesquisa traz um artigo que focaliza as tecnologias
Acreditamos que a centralidade mesma das investigações sobre o ensino de ciências, assim como
os estudos sobre as tecnologias da informação, é reveladora de que a pesquisa
educacional feita fora dos países do norte global nada tem de tradicional ou
parada no tempo. E que a complexidade e originalidade das questões que nossa
realidade nos coloca exigem a permanente releitura e recriação das teorias capazes
de explicá-la e oferecer perspectivas de mudança. Como nos lembra Rosa (2014),
apesar de sua pequena visibilidade, a ciência social também é produzida no sul.
O terceiro grande tema que se articula ao estudo de Almeida e Giordan e engloba outros dois artigos
deste número de Educação e Pesquisa se refere à leitura e à comunicação em
contexto educacional. Em “Literatura y competencia comunicativa: ¿Matrimonio
mal avenido?”, Araos aborda a relação problemática entre aprender literatura e
desenvolver competências comunicativas, a partir do currículo escolar chileno.
Apostando na possibilidade de ensinar literatura sem perder suas especificidades
e de, ao mesmo tempo, desenvolver o enfoque comunicativo, a autora analisa
diversos textos literários, colocando em relevo as competências que seu estudo
permite desenvolver nos alunos de diferentes idades.
Um projeto amplo que também visa a desenvolver competências de leitura e de escritura, a partir
da coautoria entre leitor e escritor, é descrito por Corazza e colaboradores em
“Escrileituras: um modo de ler-escrever em meio à vida”. Desenvolvido em
quatro núcleos vinculados a diferentes universidades brasileiras, o projeto
envolve pesquisa, ensino e extensão, por meio de oficinas que operam com
a didática da tradução, articulando planos filosóficos, científicos e artísticos
para realizar processos de transcriação e ligar os conceitos de tradução poética e
intertextualidade na perspectiva do pensamento da diferença.
Ao lidar com questões como a retextualização, a tradução e a intertextualidade, este conjunto de estudos
fala de aspectos que também estão colocados às revistas acadêmicas, em especial
ao nos posicionarmos no plano internacional. Nós, que produzimos conhecimento a
partir do sul global, estamos habituados a traduzir nossos textos no sentido amplo da
ação de traduzir. Como indica Sonia Alvarez (2009), muito além da transferência de
significados linguísticos, traduzir em sentido amplo significa explicar e contextualizar,
a fim de tornar nossas análises e interpretações teóricas compreensíveis para o leitor
que não partilha o mesmo referencial cultural, histórico e político. Tal qual esses
artigos indicam ser necessário no contexto educacional, no contexto da divulgação de
conhecimento acadêmico, é preciso atuar como mediadores entre linguagens, culturas
e maneiras de pensar. Esse desafio está colocado com mais intensidade para Educação
e Pesquisa a cada artigo que é publicado também em inglês, ficando disponível para
acesso on-line em todas as versões.
Não nos parece fortuito o fato de que nossa revista venha ganhando leitores e autores principalmente
nos países da América Latina e Península Ibérica. Com eles partilhamos línguas
irmãs – português e castelhano – e também contextos culturais, históricos e políticos
próximos, referências que, mesmo em suas diferenças, nos são reconhecíveis. O
esforço de tradução em sentido restrito e amplo é muito menor nesses casos do que
em relação à pesquisa desenvolvida em outras partes do mundo.
Também partilhamos posições semelhantes nas desiguais relações de poder presentes na produção
de conhecimentos, pois Portugal e Espanha podem ser considerados uma espécie
de “sul dentro do norte global”. Dessa forma, essa troca de textos, autores, ideias
e leitores no âmbito da América Latina e países ibéricos vai na contramão da
circulação única do norte para o sul globais e significa um patamar de oposição a
poderosas forças políticas e econômicas, ao promover o diálogo “sul-sul”.
Esse tipo de internacionalização, contudo, é muitas vezes tomado como insuficiente, pois o grande
alvo seriam os países de língua inglesa, a verdadeira internacionalização seria a
publicação em inglês e o reconhecimento nos países capitalistas centrais, por meio
de leitores, autores e citações. A nós, ficam muitas questões: como efetivamente
traduzir nossas ideias, seu contexto de produção e seus significados? Como fazer-
-nos presentes no cenário global, sem perder o que de melhor nos traz nossa
inserção local, contextualizada? Como legitimar nossa revista no processo de
internacionalização, sem abrir mão da preciosa oportunidade de contribuir no
diálogo sul-sul?
Os quatro últimos artigos presentes neste exemplar tratam de temáticas variadas, todas elas
representativas da boa pesquisa educacional em nossos países. Uma articulação
entre os estudos sobre elites políticas e as pesquisas sobre política educacional
orienta a análise de Abrantes e Roldão sobre os 27 ocupantes do cargo de
ministro da educação em Portugal, desde a revolução de 1974. No artigo “Faces e
metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da educação no Portugal
democrático”, os autores mostram que os ministros foram homens, nascidos em
Este número se encerra com uma entrevista realizada por Galian e Louzano com o professor Michael
Young, da Universidade de Londres, quando de sua presença na Faculdade de
Educação da USP, em novembro de 2013. Esse é mais um texto que expressa as
riquezas e dificuldades do diálogo internacional e da tradução, além de destacar
quanto temos em comum no seio de nossas diferenças, desta feita no que tange
ao debate teórico em torno do currículo escolar. Com base no que define como
“conhecimento poderoso”, em oposição a sua noção anterior de “conhecimento dos
poderosos”, Young defende que as escolhas curriculares não se baseiem somente
nas disputas de poder, mas que, reconhecendo seu caráter de construção social,
deve-se buscar fundamentar o currículo também na objetividade e fidedignidade
dos conhecimentos, oferecendo oportunidades para o desenvolvimento dos
estudantes.
Mas até onde consegue ir uma revista em direção oposta às poderosas forças do mercado e da
divisão internacional do trabalho intelectual? Só o desenrolar do contraditório
processo de internacionalização em curso poderá marcar esse limite.
Referências
ALVAREZ, Sonia. Construindo uma política feminista translocal da tradução. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 17,
n. 3, p. 743-753, set./dez. 2009.
COSTA, Claudia de Lima; ALVAREZ, Sonia. A circulação das teorias feministas e os desafios da tradução. Revista Estudos
Feministas, Florianópolis, v. 21, n. 2, p. 579-586, maio/ago. 2013.
RICHARD, Nelly. “Globalización/traducción/diseminación.” In: SEMINAR INTELLECTUAL AGENDAS AND THE LOCALITIES OF
KNOWLEDGE, 2-5, Ciudad de Mexico, October 2001
ROSA, Marcelo C. Theories of the South: limits and perspectives of an emergent movement in social sciences. Current Sociology,
published online 24 February 2014. Avaiable at: <http://csi.sagepub.com/content/early/2014/02/24/0011392114522171>.
Access on: 30 set. 2014.
SANTOS Boaventura; MENESES, Maria Paula. Epistemologias do sul. Coimbra: Almedina/CES, 2009.
876
Artigos / Articles
Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas:
incidencia en el rendimiento escolar
Marcela RománI
F. Javier MurilloII
Resumen
Palabras clave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 869-895, out./dez., 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121528 879
The use and availability of ICT in Latin American schools:
the impact on school performance
Marcela RománI
F. Javier MurilloII
Abstract
Keywords
880 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121528 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 879-895, out./dez., 2014.
Introducción la exigencia se concretiza en los profesores y
profesoras, para que ellos integren estos recursos
Mientras América Latina se mantenga como parte sustantiva de la dinámica y práctica
como la región de mayores desigualdades cotidiana de enseñanza. En tal sentido, las TIC
sociales y con sistemas educativos que no logran se incorporan al escenario educativo con la
resolver los problemas de calidad y equidad de doble expectativa de apoyar la adquisición de
la educación ofrecida en ellos, seguirá siendo habilidades y competencias propias de este siglo,
necesario profundizar en las condiciones y al tiempo que aportar al mejoramiento de los
recursos con que cuentan y enfrentan sus desempeños de los estudiantes.
poblaciones escolares en el proceso de aprender. El estudio que se presenta, da cuenta
Mirada que resulta indispensable no solo para de la disponibilidad de recursos TIC en las
hacer más comprensible los aprendizajes o escuelas de 16 países de América Latina y
desempeños que alcanzan los niños y jóvenes profundiza en la relación entre acceso y uso
en los distintos países y contextos, sino que de la computadora y el rendimiento escolar
en tanto insumo relevante para la definición e en Lectura y Matemáticas, en estudiantes
implementación de políticas que contribuyan latinoamericanos de educación primaria. Dicho
a incrementar la calidad educativa y su justa rendimiento, corresponde al logro alcanzado
distribución. por los alumnos, controlado por factores
Dotar de computadoras, software externos tales como el nivel socio-económico
educativo y acceso a internet a las escuelas, ha y cultural de las familias. Para ello, se utiliza la
sido una compartida preocupación y esfuerzo base de datos del Segundo Estudio Comparativo
de los gobiernos latinoamericanos durante las y Explicativo, SERCE, de la UNESCO, que evalúa
últimas décadas. Ello bajo la premisa que tales el rendimiento de los estudiantes de 3º y 6º de
tecnologías de información y comunicación (TIC) primaria y estudia los factores asociados a tales
son quizás los recursos más relevantes en las desempeños. La información referida se analiza
dinámicas actuales de enseñar y aprender, no sólo mediante Modelos Multinivel de cuatro niveles
por su indiscutida condición de principal puerta de análisis: alumno, aula, escuela y país.
de acceso al conocimiento y a la información, En un primer apartado se revisa la
sino porque con su irrupción ha cambiado la literatura referida al acceso de TIC en las
gramática del cómo enseñar y qué aprender escuelas y sistemas educativos, así como de
en estas sociedades complejas, globalizadas e su aporte a los aprendizajes y desempeños
interconectadas (ENGEL, COLL; BUSTOS, 2010; escolares. El segundo capítulo comparte los
PELGRUM; LAW, 2003; ROSEN; NELSON, 2008; propósitos y estrategia metodológica que
KAZTMAN, 2010; SELWYN, 2011). Aparece así, sustenta el estudio, para posteriormente en un
del todo obvio y necesario que estos nuevos tercer punto, recorrer y describir los principales
estudiantes: aprendices del nuevo milenio (PEDRÓ, resultados de la investigación. Al finalizar,
2006) o nativos digitales (BENNETT, MATON; se discuten los resultados con la evidencia
KERVIN, 2008), puedan acceder a tales recursos disponible para desde allí, ofrecer algunas
e incorporarlos en su proceso de aprehender y conclusiones y recomendaciones al respecto.
construir la realidad, relacionarse y comunicarse
con el mundo y los otros (COLL, 2004). En este Revisión de la literatura
desafío, la escuela se constituye en el principal
espacio social y formativo que ha de permitir Diferentes estudios e investigaciones
que esto ocurra para todos los niños, niñas y internacionales son concluyentes respecto
jóvenes, independientemente del país, contexto o de las importantes brechas de acceso a TIC
condición socioeconómica familiar. En su interior, entre los estudiantes en función del nivel de
882 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
relevantes en el tiempo. Por una parte, el mayor TIC en las actividades destinadas al aprendizaje,
desarrollo técnico y metodológico para medir logran rendimientos significativamente
y controlar tales efectos, en estas últimas mayores tanto en lengua como en matemáticas.
décadas y, por otra, una mayor limitación de Por último y respecto de uso y
las posibilidades educativas de los recursos y aprendizaje, aparecen como relevantes i) la
herramientas tecnológicas disponibles en las frecuencia y tiempo de uso de TIC por parte
décadas anteriores. del estudiante; ii) desde los docentes: el nivel
El estudio de la OCDE (2010), a partir de dominio de estos recursos; la valoración
de datos de PISA - Program for International de las TIC como herramientas didácticas; la
Student Assessment 2006 y controlando por nivel confianza y seguridad en el uso; tiempo para
económico, social y cultural, encuentra mayor la planificación de la enseñanza, y iii) ciertas
efecto en el rendimiento de Ciencias en función condiciones institucionales y apoyos desde la
del tiempo de uso: treinta puntos porcentuales dirección de las escuelas y centros, entre otros
de ventaja para aquellos estudiantes que han (VENEZKY, 2002; KULICK, 2003; PELGRUM;
usado una computadora entre uno a tres años; LAW, 2003; SELWYN, 2004; WEB; COX, 2004;
51 puntos para los que lo han usado de tres a TRUCANO, 2005; DYNARSKI et. al., 2007; LAW
cinco años y 61 puntos para los que lo han usado et. al., 2008; ROMÁN, 2010). En todo caso, lo
durante más de cinco años. que si se observa es que cuando las TIC forman
Es importante señalar que la revisión parte de la experiencia cotidiana del aula,
realizada da cuenta de un importante grupo de hay mayores evidencias de su impacto en el
estudios que encuentran efectos muy limitados aprendizaje y el desempeño de los estudiantes
o simplemente nulos al analizar la relación (CONDIE et. al., 2007; CLARO, 2010).
entre TIC y logro escolar a nivel internacional
(ANGRIST; LAVY, 2002; GOOLSBEE; GURYAN, La investigación: objetivos y
2006; ROUSE y KRUEGER, 2004). estrategia metodológica
La investigación a nivel regional, sin
duda mucho menor, tampoco muestra grandes La investigación se plantea como
consensos ni es concluyente. Así por ejemplo, objetivos:
las pocas evaluaciones de las iniciativas 1 1. Estimar y caracterizar el acceso y uso de
a 1 (una computadora por estudiante) en la computadoras para estudiantes y docentes, en
región, tampoco llegan a consensos respecto escuelas primarias de América Latina.
de su aporte al rendimiento escolar (VALIENTE, 2. Determinar la incidencia del acceso y tipo de
2010). En el caso de Ecuador, se constata un uso de computadoras por parte de los estudiantes
efecto significativo en matemáticas, pero no en y docentes latinoamericanos de 6º de Primaria,
lenguaje (CARRILLO; ONOFA; PONCE, 2010), en el logro escolar que tales estudiantes
mientras que la experiencia en escuelas rurales alcanzan en las áreas de Matemáticas y Lectura.
peruanas, no encuentra evidencia de efectos en Se entiende por logro escolar el desempeño
los aprendizajes (SANTIAGO et. al., 2010). de los estudiantes controlado por factores
La Investigación Iberoamericana sobre externos tales como el nivel socioeconómico y
Eficacia Escolar (MURILLO, 2007), muestra que cultural de las familias; es decir, partiendo de un
la calidad y adecuación de los recursos TIC planteamiento de valor agregado.
aparecen relacionados con el rendimiento en Para ello, se utiliza la base de datos del
Lengua en 3º de Primaria. Hallazgos que son Segundo Estudio Comparativo y Explicativo,
ratificados mediante una explotación especial de SERCE, de la UNESCO (2008), que evalúa el
estos datos (ROMÁN, 2008), donde se constata rendimiento de los estudiantes de 3º y 6º de
que los alumnos cuyos docentes usan recursos primaria en Lectura y Matemáticas, y estudia
884 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
4. Número de computadoras en la escuela Con:
(dummy: diez o menos computadoras, [ε0ijkl]~N(0, Ωε): Ωε = [σ2ε0]
más de diez). [μ0jkl]~N(0, Ωμ): Ωμ = [σ2μ0]
[υ0kl]~N(0, Ωυ): Ωμ = [σ2μ0]
• Las variables fueron recogidas mediante los [φ0l]~N(0, Ωφ): Ωφ = [σ2φ0]
siguientes instrumentos:
Donde, para cada i=estudiante, j= aula, K= escuela
1. Variables de producto (Rendimiento y l= país:
en Matemáticas y en Lectura): recogidas Yijkl, son las diferentes medidas de desempeño
mediante pruebas estandarizadas validadas del estudiante,
para todos los países. Las pruebas NSEijkl, Nivel socioeconómico de la familia del
consideran dos dimensiones: los elementos estudiante,
curriculares comunes en la región y el NCultijkl, nivel cultural de la familia del estudiante,
enfoque de habilidades para la vida. Preescolijkl, años de preescolarización del estudiante,
2. Variables de ajuste: obtenidas Generoijkl, si el estudiante es niño o niña,
mediante cuestionarios dirigidos a LMijkl, lengua materna del estudiante: español/
estudiantes (género y lengua materna) portugués u otra,
sus familias (nivel cultural y situación Acce_compuijkl, si el estudiante tiene acceso a
socio-económica de la familia y años computadora en casa o no,
de preescolarización del estudiante). Frec_uso_escijkl, frecuencia del uso de la
3.Variables explicativas o independientes: computadora en la escuela por el estudiante,
obtenidas de diferentes cuestionarios: Uso_prof_casajkl, si el docente usa habitualmente
dirigidas a los estudiantes, docentes y la computadora en casa,
dirección de la escuela. Uso_prof_escjkl, si el docente usa habitualmente
la computadora en la escuela,
Se utilizaron Modelos Multinivel de Compues_esckl, si la escuela tiene 10 computadoras
cuatro niveles de análisis. Concretamente se o menos; o más.
desarrollaron dos procesos de Modelamiento
multinivel, uno de cada una de las variables de Resultados
producto. El procedimiento fue el siguiente: a)
estimar el modelo nulo; b) calcular el modelo En coherencia con los objetivos del
con las variables de ajuste; y c) incluir en el estudios, los resultados se presentan en dos
modelo ajustado cada las variables de acceso y grandes apartados: en primer lugar se describe
uso de TIC y estimar la aportación de las mismas. y caracteriza la situación de acceso y uso de
De esta forma se estimaron dos modelos las computadoras en Educación primaria en
multinivel análogos al siguiente: América Latina, referida a estudiantes, docentes
y escuelas, y, en segundo lugar, se estudia su
Yijkl = β0jkl + β1jklNSEijkl+ β2jklNCultijkl+ β3jkl Preescijkl+ incidencia en el logro escolar en Matemáticas
β4jklGeneroijkl+ β5jklLMijkl+ β6jklAcce_Compuijkl+ y Lectura.
β7jklFresc_uso_escijkl+ β8klUso_ prof_casajkl+
β9klUso_prof_escjkl+ β10lCompus_esckl+ εijkl Disponibilidad y uso de recursos TIC:
Disponibilidad Computadora en hogares estudiantes
β0jkl = β0 + φ0l + υ0kl + μ0jkl
β1jkl= β1+ φ1l + υ1kl+ μ1jkl ... β7jkl= β7 + φ7l + υ7kl+ μ7jkl Apenas un tercio de los niños y niñas
β8kl=β8+ φ8l + υ8kl . β9jkl= β9 + φ9l + υ9kl latinoamericanos que estudian 6º grado
β10l = β11+ φ10l dispone de un computadora en casa (31,8%)
El Salvador 27,83
Fuente: Elaboración propia.
Guatemala 25,98
México 43,20 Uso de la computadora en la escuela y hogares
Nicaragua 17,41
Panamá 40,37 Por otra parte, algo más de la mitad de
Paraguay 26,74 los estudiantes latinoamericanos afirma que
Perú 27,45 nunca utilizan al computadora en la escuela
Rep. Dominicana 42,39
(51,8%). Estas cifras superan el 70 por ciento
en Guatemala y Paraguay, mientras que está
Uruguay 40,70
en torno al 2 por ciento en Cuba (cuadro 3).
Promedio Países 34,38
Respecto de la frecuencia, sólo un 31,2 por
Total AL 31,76
ciento señala usarlo de forma habitual. Así,
Fuente: Elaboración propia. son cuatro los países en donde más de la
mitad de los estudiantes de 6º señalan usar la
El 71,4 por ciento de los estudiantes que computadora en la escuela una o más veces por
asisten a centros privados urbanos tiene acceso semana: Cuba (85,7%), Ecuador (58,2%), Costa
a computadora en casa, cifra que solo llega a un Rica (52,4%) y Colombia (51,5%). En el otro
29,6 por ciento para los estudiantes de centros extremo, Paraguay (18,0%) y Brasil (22,1%).
886 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
Cuadro 3. Frecuencia de uso de la computadora en la escuela según los estudiantes de sexto curso de Primaria de América Latina
(sobre quienes dicen usar PC en la escuela)
Una o más veces por Una o más veces por Cada dos o tres
Nunca
semana mes meses
Argentina 29,78 10,33 4,14 55,75
Brasil 22,12 10,45 8,50 58,93
Colombia 51,46 14,42 5,41 28,72
Costa Rica 52,43 12,93 5,67 28,97
Cuba 85,67 8,68 3,52 2,12
Chile 42,27 18,45 12,17 27,11
Ecuador 58,22 12,17 5,59 24,03
El Salvador 38,46 10,86 5,36 45,32
Guatemala 17,33 4,50 2,31 75,85
México 43,04 11,12 5,48 40,36
Nicaragua 18,15 6,25 6,10 69,50
Panamá 48,40 11,27 4,47 35,86
Paraguay 18,01 6,61 4,27 71,11
Perú 37,39 15,88 8,09 38,64
Rep. Dominicana 30,60 8,66 5,56 55,18
Uruguay 34,03 10,23 5,87 49,88
Promedio Países 39,21 10,80 5,78 44,21
Total AL 31,20 10,58 6,46 51,76
Por su parte, prácticamente la mitad de que es de apenas el 0,8 por ciento en Cuba o el
los docentes dice usar la computadora en su casa 6,4 por ciento en Costa Rica. Respecto del uso de
(48,2%), mientras que sólo un 36,12 por ciento la computadora en la escuela, los datos hablan
señala hacerlo en la escuela, con importantes también de importantes diferencias: mientras que
diferencias entre países (cuadro 4). Más del 70 por en algunos países es excepcional, en otros es una
ciento de los docentes salvadoreños y paraguayos práctica muy extendida, como en Cuba donde el
no usan computadora en ningún espacio, cifra 82 por ciento de los docentes afirma hacerlo.
Cuadro 4. Porcentaje de docentes que imparten 6º grado que usan la computadora todas las semanas en distintos lugares, por país
No usa Hogar Escuela
Argentina 22,30 62,59 17,03
Brasil* - - -
Colombia 18,99 57,83 30,38
Costa Rica 9,40 39,85 10,90
Cuba 0,76 1,78 81,93
Chile 6,45 66,31 43,82
Ecuador 33,48 33,48 18,34
El Salvador 72,97 36,09 31,94
Guatemala 38,62 44,31 6,91
México 28,44 40,83 47,25
Nicaragua 66,00 4,40 8,80
Panamá 38,95 21,40 20,70
Paraguay 72,30 5,76 3,96
Perú 19,92 42,54 23,13
Rep. Dominicana 39,43 29,14 2,29
Uruguay 17,16 64,36 30,03
Promedio Países 32,35 36,71 25,16
Total AL 29,93 48,21 36,19
Nota: (*) En Brasil no se aplicó esa pregunta a los docentes.
Fuente: Elaboración propia
Presentaciones 17,29 29,02 53,69 Los datos señalan que el 82,4 por ciento
de las escuelas latinoamericanas cuenta con
Otros fines 20,41 21,10 58,49
al menos una computadora. En Brasil, Chile y
Fuente: Elaboración propia Cuba todos los centros educativos de primaria
cuentan con al menos una computadora,
Los datos indican que el principal uso mientras que en Guatemala esta cifra es sólo
que los docentes dan a los computadores es de un 16 por ciento, en República Dominicana
como procesador de texto. Un 41,1 por ciento de de un 29,6 por ciento y en Paraguay de un 33
los docentes a nivel regional, dicen que lo usan por ciento (cuadro 6).
con frecuencia con dicho fin. La búsqueda de El 28 por ciento de las escuelas de
información aparece en segundo lugar (34,8%), América Latina no tiene ninguna computadora
seguido del uso dado para hacer presentaciones con conexión a Internet; el 23,2 por ciento no
(21,6%). Sólo un 19,0 por ciento lo utiliza dispone de ninguna computadora para uso de
frecuentemente como hoja de cálculo y un 14,1 los estudiantes de sexto grado y un 23,5 por
por ciento para comunicarse (cuadro 5). ciento no cuenta con este recurso para uso de
Un estudio detallado por países muestra los docentes.
interesantes perfiles (gráfico 2): Considerando las escuelas que tienen
• Cuba: país con el mayor porcentaje de alguna computadora, se observa que el número
docentes que usan computadora en la escuela; este promedio de computadoras por escuela es
uso es especialmente como Hoja de Cálculo y para muy bajo. Así, para el conjunto de la región
presentaciones audiovisuales, pero no lo usan ni el número medio de computadoras en cada
para comunicarse ni para buscar información. escuela es de 9,5. Cifra que en sus extremos
• México: país en donde cerca de la mitad es de 3,5 en Cuba y de 16,6 en República
de sus docentes señalan usar computadora Dominicana. Es interesante observar que
en la escuela; los principales usos dados existe una fuerte relación entre el porcentaje
son como procesador de textos (35%) y para de escuelas sin ninguna computadora y el
presentaciones (32%). número de computadoras promedio en las
• Chile: Los docentes de este país escuelas que tienen (r=0,61), lo que indica, en
declaran un uso especialmente importante para cierta medida, el énfasis en la distribución de
comunicarse (usar correo o chat, 41%) y buscar recursos educativos: o pocas para muchas o
información (72%). muchas para pocas.
888 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
Gráfico 2. Distribución de los docentes de 6º grado en función de la frecuencia de uso de la computadora para diferentes
fines, por país
COMUNICARSE BUSCAR INFORMACIÓN
Argentina Argentina
Brasil Brasil
Colombia Colombia
Costa Rica Costa Rica
Cuba Cuba
Chile Chile
Ecuador Ecuador
El Salvador El Salvador
Guatemala Frecuente Guatemala
Frecuente
México México
Ocasional Nicaragua Ocasional
Nicaragua
Panamá Nunca Panamá Nunca
Paraguay Paraguay
Perú Perú
Rep. Dominicana Rep. Dominicana
Uruguay
Uruguay
0% 20% 40% 60% 80% 100% 0% 20% 40% 60% 80% 100%
Cuadro 7. Porcentaje de escuelas de América Latina sin computadora y número medio de computadoras entre las escuelas que
tienen alguna para uso de los estudiantes de 6º, para uso de los docentes y para uso del personal administrativo, por país.
Para uso del personal
Para uso de los estudiantes de 6º Para uso de los docentes
administrativo
% sin Media % sin Media % sin Media
Argentina 52,25 9,80 44,43 4,23 28,79 1,63
Brasil ,00 10,78 ,00 4,46 ,00 2,73
Colombia 26,95 12,04 30,39 4,13 25,16 2,63
Costa Rica 60,47 14,79 53,65 4,32 46,68 2,39
Cuba 8,41 3,54 4,45 3,38 17,94 3,18
Chile 2,88 12,17 6,10 5,62 7,17 3,64
Ecuador 28,13 9,33 29,81 3,96 30,77 2,04
El Salvador 57,02 14,92 44,72 5,54 51,43 2,30
Guatemala 91,95 17,27 89,61 2,94 87,85 1,64
México 18,82 6,44 21,59 4,65 27,71 2,17
Nicaragua 37,66 15,23 37,58 4,72 35,75 1,84
Panamá 21,55 14,10 21,50 5,29 20,63 2,89
Paraguay 75,41 12,33 75,72 4,80 69,48 1,82
Perú 41,20 11,26 39,86 5,73 38,56 3,48
Rep. Dominicana 82,50 16,58 83,07 8,16 74,85 2,27
Uruguay 33,47 5,67 30,50 3,36 28,64 1,77
Promedio Países 39,92 11,64 38,31 4,71 36,96 2,40
Total AL 23,18 9,50 23,50 4,55 23,27 2,59
890 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
Cuadro 8. Resultados de proceso de modelamiento multinivel de cuatro niveles para Rendimiento en Matemáticas y Lectura
Rendimiento en Matemáticas Rendimiento en Lectura
B (EE) B (EE)
Parte fija
Intercepto 229,56 (5,00) 235,20 (5,87)
NSE(1) familia 1,92 (0,27 1,09 (0,26)
Nivel cultural familia 4,64 (0,26) 3,57 (0,24)
Género (varón/mujer) 2,22 (0,41) -3,96 (0,39)
Lengua materna (español o portugués /otra) -12,57 (1,06) -7,44 (1,02)
Años de preescolarización 1,01 (0,14) 1,03 (0,14)
El estudiante tiene computadora 4,99 (0,67) 4,45 (0,60)
Frecuencia de uso de la computadora en la escuela 1,28 (0,23) 0,77 (0,22)
El docente usa la computadora en casa 3,42 (0,97) 2,58 (1,11)
El docente usa la computadora en la escuela NS NS
La escuela tiene más de 10 computadoras 10,74 (1,33) 12,85 (3,08)
Parte aleatoria
Entre países 336,89 468,00
Entre escuelas 317,49 388,66
Entre aulas 96,27 159,96
Entre alumnos 1450,10 1300,01
(1): Nivel socioeconómico.
NS: No significativo a un α=0,05.
Fuente: Elaboración propia
Incidencia del acceso y uso de las TIC en el 2. Existe una relación significativa entre
aprendizaje logro escolar y frecuencia de uso de computadora
en la escuela. Efectivamente, cuanto más usan
Tal como se detalla en el apartado la computadora en su escuela los estudiantes
metodológico, para analizar la relación entre obtienen mejores puntuaciones en ambas materias
acceso y uso de TIC y desempeño se siguieron (tras haber controlado el nivel socioeconómico y
dos procesos de modelado simultáneos, uno cultural, el género, la lengua materna y los años
para la variable producto Rendimiento en de preescolarización). Concretamente, en una
Matemáticas y otro en Lectura. escala de 1 (no se utiliza nada) a 5 (se utiliza muy
Del análisis de los Modelos finales, frecuentemente), por cada punto de aumento los
tanto para Matemáticas como para Lectura estudiantes mejoran su rendimiento 0,8 puntos
(cuadro 8), es posible destacar: en Matemáticas y 1,2 en Lectura. De esta forma,
1. Los estudiantes que tienen acceso a las puntuaciones podrían mejorar 3,2 puntos en
computadora en casa tienen un logro académico Matemáticas y 4,8 en Lectura.
significativamente superior que los que no la 3. Los datos señalan que si el docente
tienen. Más concretamente, los datos indican que utiliza la computadora en su casa, el
los estudiantes de sexto grado que tienen acceso rendimiento de sus alumnos aumenta 3,4
a computadoras en casa obtienen 5 puntos en puntos en Lectura y 2,6 en Matemáticas. Sin
Lectura y de 4,4 en Matemáticas, tras controlarse embargo, si suele utilizar la computadora en
variables tales como nivel socioeconómico y la escuela o no, no parece tener efecto en el
cultural, género o preescolarización. rendimiento de los estudiantes.
892 Marcela ROMÁN; F. Javier MURILLO. Disponibilidad y uso de TIC en escuelas latinoamericanas: incidencia en...
el porcentaje de docentes que lo usan con Así, mientras más usan la computadora, los
frecuencia, no llega a al 45 por ciento. Tal estudiantes obtienen mejores logros en Lectura
como lo constatan otras investigaciones, el uso y Matemáticas.
de las TIC, no depende exclusivamente de la Se encuentra también que los estudiantes
existencia y disponibilidad de estos recursos en cuyos docentes señalan usar la computadora en
las escuelas. casa, exhiben un mejor desempeño, en ambas
De cualquier manera, la falta de TIC en disciplinas, que aquellos cuyos profesores
los hogares y el bajo uso de las computadoras en no la usan en casa. Sin embargo, el que los
las escuelas, está limitando en los estudiantes el profesores la usen en la escuela, no aparece
acceso y posibilidad de construir conocimiento, relacionado con el logro que alcanzan sus
al tiempo que los excluye de la comunicación estudiantes, una vez que se controla por las
e interacción que emerge y fluye en un mundo variables de ajuste en cuestión. Es muy probable
global, interconectado y estructurado en redes. que lo anterior esté relacionado con el tipo de
Los esfuerzos deben seguir puesto en que ocurra uso dado a la computadora, más que con la
una integración adecuada y eficaz de estos frecuencia de uso. Por ejemplo, un uso en casa
medios tecnológicos, al proceso cotidiano de mayormente enfocado a la preparación de las
enseñar y aprender en las escuelas. Disponer de clases (búsqueda de información, preparación
estos recursos, apoyar, incentivar y asegurar el de actividades y materiales, evaluación, otros),
uso entre profesores y estudiantes, es el primer mientras que en las escuelas se haga un uso más
paso para que ello ocurra. administrativo y relacional que pedagógico
El estudio constata mejores logros (completar planillas de notas, informes a
cognitivos (en Lectura y Matemáticas), en los los padres, etc.). Estos resultados, ameritan
estudiantes que disponen de una computadora seguir indagando y profundizando respecto
en su hogar respecto de quienes no cuentan de la finalidad de uso, tanto como en su
con este recurso en casa. En concreto, su incorporación en la práctica pedagógica.
desempeño se ve incrementando en cerca de Por último, y dado que todas las
cinco puntos, una vez que se controla por nivel variables analizadas han hecho una aportación
socioeconómico y cultural de la familia, género significativa y simultánea en el modelo final, es
o preescolarización del estudiante. Este aporte posible sostener que: un estudiante que cuente
al logro escolar, es aún más impresionante con una computadora en su hogar, que concurra
respecto de la disponibilidad de computadoras a una escuela con más de diez computadoras,
en las escuelas. Los estudiantes de 6° grado que que las utilice al menos una vez por semana y
asisten a escuelas con diez o más computadoras, tengan un profesor/a que use habitualmente la
ven incrementado su desempeño en cerca computadora en su casa, obtendrá 23 puntos
de trece puntos en Matemáticas y once en más en Matemáticas y 25 en Lectura. Es decir,
Lectura. Por su parte, la frecuencia con que los casi 0,5 desviaciones típicas, lo que implica
estudiantes usan la computadora en la escuela, cerca de un 17% más de puntuación que sus
se muestra relevante respecto del logro escolar. pares en la condición inversa.
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Aprobado en:16.10.2013
Marcela Román Investigadora principal del Centro de Investigación y Desarrollo de la Educación (CIDE) y académica de la
Facultad de Educación de la Universidad Alberto Hurtado, Chile. Investigadora asociada al Centro de Prácticas y Políticas
Educativas, CEPPE, de la Pontificia Universidad Católica de Chile. Directora de la Revista Iberoamericana de Evaluación
Educativa.
F. Javier Murillo Profesor Titular de Universidad en Métodos de Investigación y Evaluación en Educación, Universidad
Autónoma de Madrid. Director del Doctorado en Educación de la UAM, y coordinador de la Red Iberoamericana de Investigación
sobre Cambio y Eficacia Escolar (RINACE).
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 897-912, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014005000005 897
Best practices with ICT and the value attributed by the
students newly integrated in universityI
Abstract
Keywords
898 http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014005000005 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 897-912, out./dez. 2014.
As Tecnologias da Informação e • descobrir os benefícios ou a utilidade que
Comunicação (TIC) são dispositivos que podem atribuem às boas práticas com as TIC;
promover mudanças muito importantes nas dife- • identificar os inconvenientes que encontram
rentes facetas da vida das pessoas a partir das prá- nas boas práticas com as TIC;
ticas, dos serviços e do conhecimento que facili- • conhecer a extrapolação sobre o uso de boas
tam. Além das bibliotecas, a internet converteu-se práticas com as TIC que os estudantes projetam
no espaço preferencial para a procura de informa- no campo de trabalho da futura profissão.
ção, em particular para os estudantes universitá- Todos esses propósitos estão encami-
rios. As TIC são muito úteis no processamento, no nhados para a melhoria do processo de ensino-
armazenamento e na transmissão de informação. -aprendizagem a partir da inclusão das TIC.
Nesse sentido, Coelho, Rosário e Ferreira (2012) Além disso, supõem um ponto de partida para
também consideram que elas são instrumentos favorecer a renovação educativa baseada na in-
essenciais e que impulsionam transformações, tegração acadêmica das TIC.
atuando sobre os indivíduos e produzindo mo
dificações físicas, cognitivas e sociais. As TIC e as boas práticas
Afortunadamente, hoje em dia podemos pedagógicas
dizer que, em geral, a nova tecnologia já está
ao alcance dos alunos mais novos antes de Nos centros de educação superior,
frequentarem o ensino universitário (FERREIRO, as infraestruturas e os novos equipamentos
2011) e também daqueles que cursam a educação tecnológicos foram incrementados na última
superior. Cada vez em maior medida, os década. O desenvolvimento desse tipo de
dispositivos digitais proliferam particularmente recurso é vertiginoso. Apesar disso, no
entre os estudantes universitários, sendo âmbito educativo, o uso de boas práticas
necessários tanto em sua formação acadêmica avança lentamente. De fato, em muitos casos,
quanto no exercício profissional futuro. Para a aplicação das TIC encontra-se imersa em
isso, é importante aprofundar-se no uso dessa dinâmicas tradicionais. Por isso, coincidimos
tecnologia na qual se requer uma boa prática, já com De Pablos e Jiménez (2007) em que,
que, assim como ocorre na educação, a ela estão para fazer frente à referida situação, também
associadas grandes expectativas sociolaborais e é preciso o desenvolvimento de novas
de desenvolvimento. A utilização das TIC requer competências nos professores, assim como a
saber fazer a partir do ser e condiciona o saber utilização de metodologias inovadoras. Tudo
estar para conviver com os demais. isso a partir do papel que têm as universidades
A finalidade central deste trabalho é de empreender políticas favoráveis e da função
indagar sobre as experiências, as crenças e o dos docentes na capacitação do uso das TIC,
conhecimento prévio de boas práticas com as além da produção e difusão de conhecimento
TIC que têm os estudantes do 1º ano dos estudos para um melhor aproveitamento dos recursos
universitários. Isso permitirá contextualizar tecnológicos (VICENTINI, 2012).
e, em maior medida, adaptar a planificação No âmbito educativo, o termo inovação
do ensino com futuras turmas, assim como refere-se à incorporação de componentes novas
integrar as TIC ao currículo acadêmico a que permitam melhorar, produzir mudanças
partir da percepção dos estudantes. Para nos entendidas como elemento de renovação
aprofundarmos no referido, como objetivos pedagógica. Area, San Nicolás e Fariña (2010)
específicos consideram-se os seguintes: ressaltam que a inovação acadêmica traduz-se
• determinar os equipamentos fixos ou móveis na criação e disponibilização de materiais com
e/ou os aplicativos digitais que os alunos as TIC e enfatizam a promoção da interação e
associam às boas práticas com as TIC; da comunicação a partir das ferramentas das
900 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
tecnológica da informática e das comunicações, como aprendiz, a partir do uso de estratégias
é promovido pelo potencial econômico dos metodológicas capazes de outorgar-lhe mais
países industrializados e influencia a esfera responsabilidade e protagonismo (CANALES;
privada e pública do social, do cultural e do MARQUÉS, 2007).
político. Adicionalmente, relativiza os conceitos A identificação de boas práticas com TIC
de espaço, tempo e mobilidade, implicando o pelos alunos da educação superior permite-lhes
progresso de alguns e a desventura de muitos refletir e indagar sobre elas, assim como previ-
(COELHO, 2010). sivelmente transferi-las no futuro ao contexto
Além de suscitar a mudança dos recursos profissional por meio de uma visão crítica. Nesse
educativos, há que insistir que a penetração das caso, ganham especial relevância as vivências
TIC no processo de ensino-aprendizagem requer experimentadas e as crenças prévias; além dis-
uma utilização inovadora na tarefa didática. A so, tal identificação possibilita melhorar o grau
partir da formação inicial, o ensino superior de sensibilização e a resolução perante deter-
deve fomentar nos futuros profissionais a minadas problemáticas ou aproximar os alu-
aquisição das habilidades, das destrezas e dos nos aos âmbitos de trabalho da profissão. Por
conhecimentos exigidos de forma geral nos outra parte, essa análise favorece nos docentes
contextos de trabalho. Isso permitirá dotar os do ensino superior a planificação da práxis e
estudantes universitários das competências a implementação futura, bem como permite a
digitais reclamadas pelas atuais dinâmicas difusão à comunidade científica e educativa.
sociolaborais. Também pode contribuir, de acordo com Hong
As TIC podem ser agentes de e Songan (2011), para otimizar a execução e a
transformação na universidade e a partir dela gestão de programas e práticas futuras com as
sempre que passem pela alteração da práxis TIC na educação superior.
tradicional e se promovam preferencialmente
por meio de métodos colaborativos, com novas Metodologia de pesquisa
formas de interação em ambientes físicos e
virtuais. De fato, o desenvolvimento do processo Esta investigação insere-se numa mais
formativo exige a combinação dos espaços ampla, embora, por questões de espaço, a que
presenciais com os virtuais (DÍEZ GUTIÉRREZ, se aborda no presente artigo centre-se numa
2012; DIRCKINCK-HOLMFELD; LORENTSEN, parte. O trabalho aqui recolhido desenvolve-
2003). Esse aspecto também é necessário -se mediante uma metodologia qualitativa.
considerar para dar respostas adequadas, a Em concreto, enquadra-se na investigação
partir de uma nova configuração pedagógica narrativa (narrative inquiry). Esse tipo de
na educação superior. metodologia possibilita o conhecimento da
A integração de boas práticas no situação analisada a partir de sua própria
currículo universitário desperta especial idiossincrasia (GONZÁLEZ CUBILLÁN, 2009).
interesse, em particular no marco de O contributo feito focaliza-se num estudo
adaptação da docência ao Espaço Europeu de de caso de caráter descritivo-compreensivo que
Educação Superior (EEES), na medida em que pretende atribuir significado a partir da análise
condiciona e repercute, entre outros aspectos, e da interpretação decorrente das narrativas
na qualidade do processo formativo. Além dos participantes. Isso resulta factível mediante
disso, é imprescindível basear a construção a descrição extensiva, assim como pela análise
de aprendizagem na atividade do estudante, sistemática e em profundidade que se realiza da
encaminhando-a para o desenvolvimento informação recolhida. Yin (2005) entende que
das competências pertinentes. Nesse sentido, um estudo de caso consiste numa investigação
tem que ganhar relevância o papel do aluno empírica interessada num fenômeno dentro
Idade 18 19 20 21 22 23 24 26 27 28 37
Total de participantes
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
feminino
Gênero
N. de participantes 7 1 13 2 5 0 2 0 12 2 5 0 1 0 2 0 0 1 1 0 1 0
Ʃ 8 15 5 2 14 5 1 2 1 1 1 55
902 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
sobre as boas práticas com TIC, atribuindo-lhes Procedimento de recolha e análise da informação
um significado. A informação obtida a partir
desse instrumento dificilmente seria acessível Os relatos promovidos nos estudantes
com a utilização de outros meios, sendo, além tiveram uma finalidade pedagógica e outra
disso, um veículo idôneo para tornar explícito o expressa para a recolha da informação. A partir
pensamento dos próprios implicados. desse fato é possível apresentar à comunidade
O guião do relato planificou-se ad hoc científica uma contribuição com resultados
com a finalidade de responder aos objetivos e conclusões valiosas. A recolha de dados foi
definidos para uma parte da investigação impulsionada por uma professora (coautora
abordada. Esse protocolo esteve precedido da deste artigo) por meio da técnica do relato numa
identificação pessoal, com a garantia da proteção turma a partir de uma disciplina acadêmica da
dos dados de caráter privado. No relato sobre titulação do Grau em Educação Social.
o tópico central de estudo, a questão definida Para o desenvolvimento do relato de
foi formulada de forma aberta para conjugar modo autônomo e individual pelos estudantes
a espontaneidade dos participantes com a fora da sala de aula, foi prevista uma dedicação
amplitude de sua narração. Para desencadear de 60 a 90 minutos. Os participantes realizaram
a descrição, a reflexão e a valoração sobre a essas narrativas em formato escrito e em suporte
temática objeto de análise, solicitou-se aos digital num programa de processamento de
alunos a partir do seguinte: “Indica e comenta as textos. Depois de um debate promovido pela
boas práticas na educação com as Tecnologias docente, incluiram-nas nos e-portfólios de
da Informação e Comunicação que tiveste a aprendizagens seguindo as indicações. Essa
oportunidade de realizar ou que conheces, informação, que fora depositada na plataforma
considerando a sua repercussão ou utilidade”. de teleformação Claroline-Faitic (colocada
Para a validação da construção do à disposição dos alunos e professores pela
instrumento, recorreu-se ao juízo de especialistas, Universidade de Vigo) nos referidos e-portfólios,
submetendo-se o enunciado inicial do relato à foi retomada no final do período letivo de 2012,
análise de cinco entendidos (três mulheres e dois tendo sido analisada em profundidade.
homens) em metodologia qualitativa. A seleção Para a análise de conteúdo aplicada
atendeu ao grau de especialização tanto na aos documentos produzidos, procedeu-se
temática em causa quanto na elaboração desse primeiramente ao inventariado independente
tipo de técnica de recolha de informação. Os dos diferentes arquivos, atribuindo aos relatos
responsáveis por esse trabalho foram docentes e um número correlativo de 1 a 55 em função de
investigadores altamente qualificados de cinco sua totalidade. Posteriormente esses textos foram
universidades espanholas (Universidade de convertidos do formato Word para o de Rich Text
Alcalá de Henares, Universidade de Granada, Format (RTF). Com a finalidade de empreender
Universidade de Murcia, Universidade Nacional o processo de análise de conteúdo, a partir de
de Educação a Distancia e Universidade de uma importação individualizada, integraram-se
Vigo). A partir de seus juízos analíticos e no programa de Analysis of Qualitative Data
valorativos, reconstruiu-se a redação inicial (AQUAD), versão 6.0 para texto. Com essa
da formulação do relato. Esse conselho de abordagem, a informação recolhida tornar-se-ia
especialistas permitiu maior adequação e maior manejável por meio do sistema de codificação
clareza do enunciado da questão apresentada, categorial aplicado, que adicionalmente
possibilitando compreensão ao coletivo a que permitiria interpretá-la, responder aos objetivos
se dirigiu. Além disso, contribuiu para que os e compreender as dimensões de estudo.
participantes desenvolvessem narrativas que A categoria principal de análise ou de
respondessem às finalidades do estudo. primeiro nível foi definida a partir da questão
904 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
exemplo: WhatsApp), livro eletrônico, software práticas com TIC com dispositivos ou aplicativos
genérico, quadro interativo, salas de chat, digitais bastante atuais, que lhes resultam atrativos
plataformas educativas (por exemplo: Moodle e que contam com potencial inovador. Alguns
e Claroline-Faitic), vídeo digital/documentos desses recursos (computadores, smartphone e
multimídia, ferramentas da web 2.0 para publicar suas aplicativos) têm já um importante uso em
e difundir conteúdos on-line (em blogs, páginas contextos informais. Outros aparelhos estão
web e Google Drive) e e-mail (gráfico 1). mais diretamente relacionados com as práticas
Como se depreende dos resultados acadêmicas (quadro interativo, salas de chat e
apresentados, os participantes identificam as boas plataformas educativas de teleformação).
Smartphone
Aplicativos da web 2.0 Computador
Um exemplo de boa prática com TIC parece- A criação de páginas web ou portais
-me o comunicador que funciona com o educativos é considerada uma boa prática pela
sistema MINSPEAK. É uma linguagem possibilidade que oferece de publicar e difundir
visual muito simples e bastante utilizada conteúdo de modo fácil e rápido, assim como
em comunicação aumentativa. Com esse por todos os links que se lhe podem associar
comunicador, os meninos autistas ou que e os tipos de formatos que permitem integrar.
padecem de tetraparesia espástica, sem Essas atividades são reconhecidas pelo seu
comunicação verbal, que apenas contam com potencial didático por alguns dos alunos. Além
comunicação gestual, conseguem comunicar- disso, os participantes refletem preocupação
-se com grande facilidade. (R3, feminino) pela escassa qualidade de conteúdos publicados
e pela grande difusão on-line que alcançam.
A utilização das plataformas educativas Como exemplo, veja-se o seguinte extrato:
(Moodle ou Claroline-Faitic) é referida
como exemplo de boas práticas com as TIC. Vou referir o aplicativo que mais me
Consideram que esse recurso de e-learning, chamou a atenção até este momento,
disponível em muitos centros educativos, reúne que foi a construção de uma página web.
um conjunto variado de potencialidades úteis Numa disciplina criamos uma e apreciei
para o processo de ensino-aprendizagem. Os essa atividade por ter relação com a nossa
participantes ressaltam que no mesmo cenário futura profissão. Aqui pudemos comentar
é possível dispor de conteúdos em distintos sobre os temas que quiséssemos e também
formatos (texto, áudio ou multimídia) e fazê-la mais aberta introduzindo perguntas,
906 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
questionários para partilhar informação, dos aparelhos, melhoria das aprendizagens,
fóruns para tratar de um tema a partir de aumento da motivação, maior comodidade
um artigo publicado previamente por mim. (pois argumentam que evita as deslocações),
(R41, feminino) dinamização nos debates, edição de conteúdos
em diferentes formatos, partilha de recursos,
Utilidade ou benefícios acesso à internet e comunicação. Eles
associados às boas concentram nesses aspectos as utilidades ou
práticas com TIC os benefícios derivados das boas práticas com
TIC, vinculando-os com diferentes dispositivos/
Os alunos ligam as boas práticas com aplicativos ou ferramentas (tabela 2). Alguns
TIC a vantagens que atribuem aos dispositivos aspectos estão diretamente focalizados no
e aplicativos digitais. Referem uma ampla campo educativo, enquanto outros têm um
gama de benefícios: poupança de tempo, caráter mais geral e são associados a âmbitos
diversidade de recursos, facilidade de utilização informais de aprendizagens e de lazer.
Facilidade de utilização
Aumento da motivação
Edição de conteúdos
Poupança de tempo
Partilha de recursos
Maior comodidade
Provoca o debate
Acesso à internet
Comunicação
Dispositivo, aplicativo ou
ferramenta
Computador
Smartphone
Aplicativos para smartphone
Livro eletrônico
Software informático
Quadro interativo
E-mail
Chat
Plataforma educativa
Vídeo digital
908 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
da web 2.0 (associando-as principalmente a professores, mas também é muito fácil ser
deficiências técnicas e à escassa privacidade). enganado. Também há que considerar que
Por outra parte, no livro eletrônico e no não permite expressar algumas emoções
software informático, somente encontram a do mesmo modo que em pessoa. Além
desvantagem do custo econômico. disso, é utilizado para abordagens de todo
Como se observa, os estudantes também tipo e, em algumas ocasiões, pode deixar-
atribuem alguma desvantagem às TIC, apesar -se de lado a vida real para atender à da
de considerarem que formam parte das boas rede. (R11, feminino)
práticas. A modo de exemplo, mostra-se um
excerto no qual se manifestam diferentes perigos A referência à perda de contato pessoal
associados à utilização das salas de chat: revelada por alguns alunos em relação à
utilização das salas de chat e/ou do e-mail põe
O uso do chat é uma boa prática porque em evidência uma grande preocupação com
facilita a partilha com os colegas e com os esse aspecto.
Perda de privacidade
Custo econômico
Perda de contato
Falta de respeito
pelos direitos do
Perda de tempo
Necessidade de
e de acesso
presencial
formação
Perigo
autor
Dispositivo, aplicativo ou ferramenta
Computador
Smartphone
Aplicativos para smartphone
Livro eletrônico
Software informático
Quadro interativo
E-mail
Chat
Plataforma educativa
Vídeo digital
Aplicativos da web 2.0
Fonte: Dados da pesquisa.
910 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
manejo de grande volume de dados em diversos Ainda que se trate de alunos que se in-
formatos, com independência física e temporal. corporaram recentemente aos estudos univer-
Dessa forma, é compreensível e desejável que sitários, com acerto e de forma fundamentada,
se potencie o uso dos recursos on-line para já extrapolam a utilização de alguns aparelhos
promover também a aprendizagem ubíqua a de TIC às diferentes áreas de trabalho da pro-
partir de novos paradigmas pedagógicos. fissão. Os participantes reconhecem principal-
Como obstáculos associados pelos mente a utilidade desses recursos no âmbito
participantes à utilização das boas práticas com da educação social para a atenção a coletivos
TIC, são de destacar as dificuldades técnicas que com algum tipo de deficiência ou limitação, na
eles encontram. Além disso, eles mencionam comunicação/partilha de conteúdos entre dife-
necessidades de formação, a distração que se rentes usuários de uma comunidade educativa.
pode gerar, a perda de privacidade e de tempo, o De fato, Bruno et al. (2006) têm apresentado
deterioramento do contato presencial, os perigos evidências da importância da utilização das TIC
da rede e o elevado custo de alguns dispositivos. como recursos educativos. Sustentam, ainda,
Vajargah, Jahani e Azadmanéh (2010) afirmam que tais tecnologias possuem um grande poten-
a importância do acompanhamento e da cial capaz de promover a melhoria da qualidade
interação oferecida pelos professores para que da formação, nomeadamente na utilização de
o alcance formativo responda às expetativas software específico para pessoas que apresen-
dos alunos. tam dificuldades de aprendizagem.
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María Carmen Ricoy é doutora com prêmio extraordinário (2001) e professora titular na Universidade de Vigo (Espanha).
Atua fundamentalmente na área de novas tecnologias aplicadas à educação.
Maria João V. S. Couto é doutoranda da Universidade de Vigo (Espanha) e bolsista da Fundação para a Ciência e a Tecnologia
(Portugal). Atua na linha de pesquisa de novas tecnologias aplicadas à educação matemática e como professora convidada.
912 María Carmen RICOY; Maria João V. S. COUTO. As boas práticas com TIC e a utilidade atribuída pelos alunos...
La confiabilidad de la información en Internet: criterios
declarados y utilizados por jóvenes estudiantes mexicanosI
Marina KriscautzkyII
Emilia FerreiroIII
Resumen
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121511 913
The credibility of information on the Internet: criteria
stated and criteria used by Mexican studentsI
Marina KriscautzkyII
Emilia FerreiroIII
Abstract
914 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121511 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 913- 934, out./dez. 2014.
Introducción modos de hacerlo: encuestas o algún tipo de
entrevista. Las encuestas permiten obtener
El uso de Internet para buscar datos de cientos o miles de individuos para
información con fines de estudio se va poder caracterizar a cierto tipo de población.
incorporando rápidamente a las prácticas Esta ventaja cuantitativa de las encuestas
pedagógicas en los distintos niveles educativos. tiene la limitación de obtener datos de tipo
En el ámbito universitario ya hace más de declarativo a través de preguntas de opción
una década que las búsquedas en Internet se múltiple. Por supuesto, se pueden plantear
han hecho indispensables. Pero también en la preguntas abiertas pero son muy difíciles de
educación básica se recurre a esa tecnología analizar y categorizar para tratarlas al mismo
con creciente frecuencia y en edades cada vez nivel que las preguntas cerradas. Las entrevistas
más tempranas. individuales, en parejas o en pequeños grupos,
Sin embargo, los educadores manifiestan por su parte, tienen la ventaja de la flexibilidad
inquietud por la manera en que los jóvenes y la adecuación a los casos singulares, siendo
estudiantes realizan las búsquedas. Suelen decir su desventaja evidente la imposibilidad de
que se limitan a poner una palabra de búsqueda caracterizar, a partir de pocos casos, a un grupo
en Google, entran al primer resultado, copian numéricamente importante.
y pegan, casi sin leer lo que han seleccionado No creemos que los métodos cualitativos
y mucho menos planteándose alguna pregunta y cuantitativos se opongan de tal manera que
acerca de la validez de la información obtenida. sean excluyentes. Por el contrario, buscamos
¿Hacen esto porque son incapaces de abordar la manera de aprovechar las virtudes de ambos.
cuestiones de validez y confiabilidad? ¿La Por esa razón, en la presente investigación
manera de plantear el problema, en términos el diseño de las preguntas de la encuesta
didácticos, contribuye a que esas cuestiones fue precedido por algunas entrevistas para
sean invisibles? Hay investigaciones didácticas incorporar en dichas preguntas el punto de
con niños de los últimos grados de la escuela vista de los jóvenes. No solo eso. También los
primaria y la escuela media (COIRO, 2005; resultados de las encuestas masivas sugirieron
PERELMAN, et al., 2009; VEGA DÍAZ; nuevas entrevistas. Volveremos sobre esto.
ROJAS-DRUMMOND, 2012; COLWELL; HUNT- Datos sobre el tema de la confiabilidad de la
BARRON; REINKING, 2013) que muestran información han sido recogidos desde hace
la posibilidad de plantear problemas que más de una década, especialmente en Europa y
suscitan la discusión en grupo y la puesta en Estados Unidos. La mayor parte de los estudios
práctica de estrategias de búsqueda, selección obtienen los datos mediante encuestas de
y evaluación de las informaciones que se van opción múltiple, ya sea en papel o en línea, con
encontrando. Niños de esas edades parecen jóvenes universitarios (WATHEN; BURKELL,
estar disponibles, bajo ciertas condiciones, para 2002; HAAS; WEARDEN, 2003; METZGER;
considerar problemáticas complejas relativas a FLANAGIN; ZWARUN, 2003; LIU, 2004; LIU;
la confiabilidad de la información. HUANG, 2005; BIDDIX; CHUNG; PARK, 2011;
Se espera de los jóvenes de niveles FRANCKE; SUNDIN; LIMBERG, 2011; HENKEL;
educativos superiores una mayor autonomía MATTSON, 2011; FRANCKE; SUNDIN, 2012;
en la búsqueda de información en Internet. EDWARDS, et al., 2013; LIM, 2013; LUCASSEN;
Por eso es importante saber si jóvenes que SCHRAAGEN, 2013). Como la edad de los
acaban de terminar el nivel secundario y usuarios de Internet ha ido bajando de manera
aspiran a ser estudiantes universitarios tienen acelerada, otros estudios recientes se ocupan
recursos para tomar decisiones en la selección de estudiantes de nivel secundario, 11 a 18
de información con fines de estudio. Hay dos años (FLANAGIN; METZGER, 2011; TERRA; SÁ,
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 915
2012). La Prueba PISA de lectura digital 2009, lengua dominante de los trabajos publicados, se
en la que participaron Chile y Colombia (OCDE, utilizan indistintamente los términos credibility
2011), también ofrece datos sobre confiabilidad or believability (confiabilidad y credibilidad)
de la información en jóvenes de 15 años. los cuales también se relacionan con
En este trabajo reportaremos los trustworthiness y plausibility. Estos términos
resultados de una encuesta en línea a 628 se vinculan con un listado de características
jóvenes de 14 y 18 años, aspirantes a ingresar a que tiene que tener la información o el mensaje
la educación media superior o a la universidad. para ser confiable o creíble. En esas listas, que a
En este sentido, nuestro trabajo se vincula menudo son muy largas, aparecen propiedades
con las investigaciones previas mencionadas, vinculadas con la fuente emisora del mensaje, el
particularmente en lo relativo a contar con receptor, el mensaje mismo, así como opiniones
una muestra amplia de sujetos encuestados. de autoridades o de compañeros, experiencias
Sin embargo, se diferencia en un aspecto clave: anteriores del receptor con la página visitada,
la encuesta se diseñó con algunas preguntas tiempo disponible para la búsqueda y
que plantean al encuestado una situación conocimientos, creencias o informaciones
lo más semejante posible a la selección real previas. Se sostiene que la credibilidad resulta
de sitios por medio de imágenes de páginas de una “interacción entre todos esos factores”
Web que debían seleccionar para obtener (WATHEN; BURKELL, 2002, p. 140) y se
información confiable con fines de estudio. presentan tentativas para clasificar de alguna
Tanto los criterios a seleccionar (en preguntas manera elementos tan diversos. Por ejemplo,
de opción múltiple) como las imágenes de Tseng y Fogg (1999) los agrupan alrededor de
los sitios propuestos fueron definidos a cuatro tipos de credibilidad (presumed, reputed,
partir de entrevistas cualitativas realizadas surface and experienced). Terra y Sá (2012)
previamente. Elegimos el contexto de estudio hacen también una clasificación en cuatro
porque consultar información para estudiar es grupos parcialmente coincidentes (credibilidade
uno de los propósitos lectores que involucra conferida, votada, por reputação, emergente).
la necesidad de validar la confiabilidad de la Rieh y Beikin (1998; 2000) listan siete
información. Cuando se trata de confiabilidad, criterios que afectan la credibilidad de la
lo declarativo no necesariamente coincide con información en Internet, dentro de los cuales
lo operativo. ¿Cómo operan los jóvenes cuando están las características de la fuente, el
deben tomar decisiones frente a una pantalla contenido, el formato y la presentación, pero
real? ¿Utilizan los indicadores que, de alguna incluyen también la velocidad de carga (speed
manera, aprendieron a enunciar? of loading), al mismo nivel que la actualidad y
precisión de la información.
¿Qué se entiende por ¿Cómo organizar esas listas de
confiabilidad? componentes de la credibilidad? Hablar de las
características del mensaje y del productor de
La información disponible en Internet ese mensaje parece ineludible, así como hablar
está constituida por textos, imágenes (fijas y de las características del receptor. Sin embargo,
en movimiento) y sonidos. Sin embargo, en en el listado de características de este último
este trabajo nos referimos primordialmente a la aparecen cosas tales como cultural background
información textual que se consulta con fines de y previous beliefs (bagaje cultural y creencias
estudio, tal como ocurre en casi todos los trabajos previas), lo cual indica que es muy difícil saber
de investigación publicados sobre este tema. qué queda fuera.
¿Qué se entiende por confiabilidad de la En un intento de tratar de ofrecer una
información en esos trabajos? En inglés, que es la aproximación diferente a esta manera de
916 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
caracterizar a los ingredientes de la confiabilidad hipótesis sobre el contenido del texto,
recurrimos a una fuente completamente distinta que la lectura, a posteriori, confirmará o
y a una disciplina aparentemente ajena a esta refutará. (ALVARADO, 1994, p. 2)
discusión. La disciplina es la teoría literaria y
el autor es Gérard Genette (1982, [1987] 2001). Tratándose de textos impresos
Este autor propuso el concepto de paratexto (libros, revistas, gacetas, etc.), los elementos
(1982, [1987] 2001) como aquello que rodea al paratextuales se refieren a las características
texto en sí y que lo presenta como tal ante el del formato gráfico que definen a cada tipo
lector, condicionando su recepción porque ofrece textual, los elementos gráficos (imágenes,
elementos al lector para anticipar el contenido del ilustraciones) que acompañan al texto, las
texto. Refiriéndose a la obra literaria en formato marcas que identifican a la editorial y al autor,
impreso como libro, Genette sostiene: la fecha de publicación junto con todos aquellos
textos (prólogos, reseñas, comentarios) que
(…) el texto raramente se presenta desnudo, refieren a la obra y dan elementos al lector para
sin el refuerzo y acompañamiento de cierto interpretarla. En el texto digital, se conservan
número de producciones, verbales o no, como algunos elementos paratextuales del objeto libro,
el nombre del autor, un título, un prefacio, pero aparecen elementos nuevos. Uno de ellos,
ilustraciones, que no sabemos si debemos que interesa particularmente en el contexto de
considerarlas o no como pertenecientes al esta investigación, es la dirección electrónica o
texto, pero que en todo caso lo rodean y lo URL la cual permite anticipar de qué tipo de sitio
prolongan precisamente por presentarlo, en el Web se trata: si tiene una institución de respaldo,
sentido habitual de la palabra, pero también de qué país proviene e, incluso, si es un sitio de
en su sentido más fuerte: por darle presencia, buena reputación, o por el contrario, un sitio que
por asegurar su existencia en el mundo, su no merece ser consultado.
recepción y su consumación, bajo la forma Los elementos paratextuales tienen un
(al menos en nuestro tiempo) de libro. Este carácter anticipatorio con respecto al contenido
acompañamiento, de amplitud y de conducta del texto pues permiten que el lector se formule
variables, constituye lo que he bautizado, hipótesis con respecto a la información, tanto
conforme al sentido a veces ambiguo de este en lo relativo a su contenido como a su calidad.
prefijo en francés, el paratexto de la obra. Es en ese último sentido en el que el paratexto
(GENETTE, [1987] 2001, p. 7) puede considerarse importante cuando se trata
de evaluar la confiabilidad de la información.
Alvarado (1994) retoma a Genette y La distinción entre elementos textuales y
define el paratexto como una guía de lectura, paratextuales coincide, de alguna manera, con
es decir, como el conjunto de elementos que la perspectiva desde la que se ha abordado la
permiten anticipar el contenido del texto: evaluación de la confiabilidad de la información
en diversos ámbitos de investigación (psicología,
Umbral del texto, primer contacto del comunicación, bibliotecología, educación)
lector con el material impreso, el paratexto distinguiendo, al menos, dos elementos básicos:
es un instructivo, una guía de lectura. la confiabilidad del mensaje (calidad de la
(…) Esto es particularmente evidente en información, redacción, tipo de argumentación)
el caso de la prensa (…) pero también y la confiabilidad de la fuente (autor, editor)
los géneros literarios, científicos o de (HOVLAND; JANIS; KELLEY, 1953). Otros autores
divulgación ofrecen al lector, desde su introducen el medio como tercer elemento a
formato, elementos de reconocimiento evaluar (WATHEN; BURKELL, 2002; FLANAGIN;
y la oportunidad de formular primeras METZGER, 2007; HILLIGOSS; RIEH, 2008). Por
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 917
medio entienden las formas en que circula la los que el orden en que aparecen las preguntas
información: televisión, Internet, lo impreso. y las opciones de respuesta (imágenes o texto)
Pareciera, entonces, que podemos distinguir entre cambia cada vez que se abre el instrumento.
la confiabilidad del mensaje como tal (elementos Por lo tanto, la distribución de las opciones de
textuales) y la confiabilidad del medio y la respuesta es diferente para cada entrevistado. Este
fuente (elementos paratextuales que permiten procedimiento de ordenamiento aleatorio distingue
anticipar la confiabilidad de la información). El al presente estudio de todos los otros considerados
conjunto de los elementos paratextuales no es como antecedentes (FLANAGIN; METZGER,
fácil de establecer en Internet pero consideramos 2011; BRATEN; STROMSO; SALMERÓN, 2011;
que la distinción antedicha contribuye a la KUBISZEWSKI; NOORDEWIER; COSTANZA,
necesaria discusión teórica sobre las maneras de 2011; TERRA; SÁ, 2012).
conceptualizar la confiabilidad. Para hacer posible la presentación de
En consecuencia, nos parece pertinente imágenes de sitios Web se desarrolló un script
mantener la distinción entre criterios de que permite la integración de imágenes como
evaluación de la confiabilidad referidos al texto, opciones de respuesta y su ampliación al dar
mensaje o contenido y criterios de evaluación clic sobre cada una.
de la confiabilidad referidos al paratexto. El TICómetro® se aplicó a 302 jóvenes
En el diseño de las preguntas de la aspirantes a ingresar a la Universidad Nacional
encuesta tuvimos en cuenta estos dos aspectos Autónoma de México (UNAM) en el nivel
(ver Metodología, donde se describen en estos Bachillerato (14 años) y 326 jóvenes en el nivel
términos los criterios incluidos en la pregunta 14): Licenciatura (18 años), pocas semanas antes del
a) valoración de los elementos textuales inicio del año escolar. En total, 628 jóvenes entre
(cómo está escrito, qué tan comprensible es 14 y 18 años. El 86% de la población encuestada
para el lector, cómo responde a las necesidades proviene de escuelas públicas gratuitas. Los
de información del que busca, escritura en el jóvenes participaron voluntariamente en un
idioma del país donde se realiza la encuesta o stand de la Feria de Orientación Educativa que
en inglés, lengua dominante de la comunidad anualmente organiza la UNAM para informar
científica internacional); a los jóvenes acerca de la oferta educativa que
b) valoración de los elementos ofrece. En dicho stand se les proponía conocer
paratextuales: de qué tipo de sitio se trata sus habilidades en el uso de tecnologías de
(educativo, de investigación, enciclopedia, información y comunicación obteniendo
o bien blog, revista, comercial); datos de automáticamente un puntaje expresado en
identificación (autor, creador del sitio, rangos como principiante, intermedio y experto.
institución de respaldo); fecha de publicación; Había cuatro computadoras con una persona
presencia o ausencia de publicidad, imágenes o disponible para ayudar a cada encuestado,
elementos multimedia, junto con características en caso necesario. No había límite de tiempo
tipográficas tales como color, tamaño, tipo de para responder. En promedio, cada participante
fuente elegida. contestó en el intervalo de 15 a 20 minutos.
El instrumento consta de cuatro ítems de
Metodología información general: género, edad, nivel educativo
al que ingresan (bachillerato o licenciatura)
Diseñamos una encuesta en línea, y tipo de escuela de procedencia (privada o
denominada TICómetro®. Para desarrollarla pública). Estos ítems aparecieron siempre al inicio
utilizamos la plataforma Moodle. Ésta es una y en el mismo orden. Luego, los estudiantes
plataforma de código abierto que cuenta con contestaron 26 preguntas relacionadas con cuatro
un módulo para desarrollar cuestionarios en temas: comunicación y colaboración en línea;
918 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
procesamiento de la información; uso seguro de La lista de opciones fue construida a
la computadora y de Internet; acceso, selección partir de criterios reportados en la bibliografía
y evaluación de la información. Las 26 preguntas analizada, datos de entrevistas cualitativas
aparecieron en diferente orden cada vez que un previas y la distinción que planteamos entre
estudiante ingresaba al cuestionario. No solo las elementos textuales y paratextuales. Para fines
preguntas sino también las opciones de respuesta expositivos mostramos las opciones ordenadas
de cada pregunta aparecían en diferente orden en según este último criterio:
cada intento.
En el presente trabajo sólo se analizarán Si la información que trae es fácil de entender
las preguntas 11, 14, 16 y 18 porque son las para mí (textual)
que se enfocan al problema de investigación: Si la información está bien redactada (textual)
criterios de evaluación de la confiabilidad de Si trae toda la información que busco (textual)
sitios de Internet con propósitos de estudio. Si el diseño es atractivo (paratextual)
La pregunta 14 (Para seleccionar Si la fecha en que se publicó la información es
información confiable te fijas en…) reproduce el reciente (paratextual)
modelo de información declarativa con respuesta Si el URL o dirección electrónica es .edu, .gob o
de opción múltiple. Se solicita al encuestado que de una universidad (paratextual)
seleccione de una a tres opciones de una lista de Si el sitio tiene fotos o imágenes (paratextual)
criterios para evaluar la confiabilidad. Si tiene autor (paratextual)
Opciones de respuesta de la pregunta 14.
a. Si el URL o dirección es .edu, .gob, o una universidad. Las preguntas 11, 16 y 18 son las más
b. Si trae toda la información que busco. originales del instrumento. Se trata de tríos
c. Si el sitio tiene fotos o imágenes. de imágenes de sitios Web frente a los cuales
d. Si la información que trae es fácil de entender para mí. el encuestado debe seleccionar uno o dos. La
e. Si el diseño del sitio es atractivo.
pregunta 11 solicita a los encuestados elegir sitios
f. Si tiene autor.
g. Si la fecha en que se publicó la información es reciente.
que sirvan para estudiar, sin hacer referencia
h. Si la información está bien redactada. explícita a la confiabilidad. (Figura 1)
Imágenes de tres sitios Web para seleccionar. Cada imagen se agranda al dar clic sobre ella a un tamaño de 800 x 600 pixeles.
Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 919
Los sitios presentados en esta pregunta nuestra investigación previa y porque es un
son Wikipedia, MedlinePlus e Ideas rápidas, con sitio que provoca debate con respecto a la
la opción “ninguno” como cuarta alternativa. confiabilidad (KUBISZEWSKI, NOORDEWIER;
Todas las páginas visibles se refieren al mismo COSTANZA, 2011; FRANCKE; SUNDIN, 2012;
contenido: las células madre, un contenido que LIM, 2013; LUCASSEN; SCHRAAGEN, 2013).
no forma parte aún de los contenidos biológicos MedlinePlus (Figura 2) es una
de la educación obligatoria, pero que tiene una enciclopedia virtual de temas médicos publicada
creciente presencia social por sus aplicaciones por la Biblioteca Nacional de Medicina de
médicas. Se escogió Wikipedia por ser el sitio Estados Unidos, reconocida en el ámbito de la
más consultado entre los entrevistados de salud por su información actualizada y rigurosa.
Figura 2
920 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
Figura 3
momias naturales encontradas en el Estado contenido del texto por estar en otro idioma.
de Guanajuato, que reciben muchos visitantes En este sentido, estos dos sitios dificultan
del país y del extranjero. La pregunta 16 se considerablemente la evaluación de los aspectos
formula así: ¿En qué sitio crees que puedes textuales. Finalmente, la última opción es el
encontrar información confiable? Presenta tres popular sitio Yahoo Respuestas (Figura 6), también
opciones de sitios Web en imágenes. Una es de con una pregunta sobre momias egipcias; es bien
un periódico de Egipto publicado en inglés que sabido que en este sitio cualquier persona puede
relata una noticia sobre el descubrimiento de publicar una pregunta y el público en general
una momia e incluye tres fotos. (Figura 4). responde a partir de su experiencia.
Otra es el Museo Británico, de renombre En la pregunta 18 se repite la situación
internacional, en la sección de su sitio oficial de selección de información confiable a partir
dedicada a las momias egipcias, con información de imágenes con otro grupo de páginas Web: un
muy breve en inglés y fotos. (Figura 5). blog (Figura 7), Yahoo Respuestas (el mismo de
Ambos sitios aparecen en inglés para la pregunta anterior) y monografías.com (Figura
indagar qué aspectos evalúan los encuestados 8), un sitio comercial donde se publican tareas
cuando no pueden comprender fácilmente el escolares que los usuarios pueden descargar.
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 921
Figura 4
Figura5
922 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
Figura 6
Figura 7
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 923
Figura 8
924 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
posiblemente se vincula con el conocimiento sea consecuencia de la experiencia de que
que tienen los jóvenes acerca de la inestabilidad cualquiera puede escribir en Internet y de los
de las publicaciones en Internet o con la criterios que predominan en el mundo de los
constatación diaria de que la información textos impresos, en el que el autor es un dato
se produce y cambia a gran velocidad. La importante para decidir la confiabilidad de la
localización o identificación del autor quizás información consultada.
Gráfica 1. Cantidad de veces que los 628 encuestados seleccionaron cada una de las opciones de la lista de criterios declarativos
para seleccionar información confiable. (Pregunta 14)
Para seleccionar información confiable te fijas en…
500
458
450 420
400
350 327
300 303 277
250 Para selecionar información
208
200 confiable te fijas en
150
100 91
50 41
0
te. ó
d. u,
ne e
tá
ión
tiv l
mí e es
ien blic
ge tien
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da .ed
.
tor
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o i sitio
.
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un cció
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nd n q
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sit el
co la
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fot el
na ire
n r fo
Si
nte ció
us da
bie la in
Si
o u od
os
Si
e e ma
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orm a
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b, L
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qu trae
Si
e
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fác la in
a f
Si
l
Si
Si
Si
la
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 925
Las tres combinaciones más frecuentes las expectativas del lector con respecto a la
incluyen un criterio textual vinculado con la información (trae toda la información que
calidad de la redacción. Aunque no podamos busco).
inferir con certeza qué entendieron los jóvenes Sin embargo, cuando los encuestados se
encuestados por información bien redactada, enfrentaron a la situación de elegir un sitio para
no cabe duda de que se refieren a aspectos estudiar a partir de las imágenes de los mismos,
específicamente textuales. Adicionalmente, los criterios antes enunciados no siempre
dos de las combinaciones más frecuentes fueron tenidos en cuenta, como se muestra en
incorporan otro elemento textual, que incluye la gráfica 2.
Gráfica 2. Cantidad de veces que los 628 encuestados seleccionaron cada una de las tres opciones de imágenes de sitios Web
para estudiar. (Pregunta 11)
Elige un sitio que sirva para estudiar.
600
533
500
400
300 261
Elige un sitio que
200 193
sirva para estudiar.
100
47
0
no
ia
gu
ine
ed
as
Nin
dL
kip
pid
Me
Wi
Ra
as
Ide
926 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
La consigna de la pregunta 11 habla de y nos permitirán observar si hay coincidencia o
sitios para estudiar sin hacer mención explícita discrepancia entre los criterios enunciados y los
a la confiabilidad. En cambio, las preguntas 16 utilizados al elegir sitios con información confiable.
y 18 se refieren explícitamente a la confiabilidad Las gráficas 3 y 4 presentan los datos obtenidos.
Gráfica 3. Cantidad de veces que los 628 encuestados seleccionaron cada una de las tres opciones de imágenes de sitios Web
donde creen que pueden obtener información confiable. (Pregunta 16)
Gráfica 4. Cantidad de veces que los 628 encuestados seleccionaron cada una de las tres opciones de imágenes de sitios Web
donde creen que pueden obtener información confiable. (Pregunta 18)
400
351
350
300
250
200 182
150 144
100
56 ¿En qué sitio podrías
50 encontrar información
confiable?
0 Blog monografias.com ninguno Yahoo respuestas
Se presentan los datos por orden de Es interesante ver que los dos sitios más
frecuencia, en números absolutos. No son elegidos son el periódico egipcio y el sitio del museo
sumables porque cada entrevistado eligió una o británico, ambos con imágenes sobre el mismo
dos opciones, o bien, la opción Ninguno. tema. Ambos están en inglés, lo cual hace muy
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 927
difícil el acceso al contenido textual. En el sitio del Esperábamos en esta pregunta 18 tener un
periódico puede observarse la fecha de publicación número considerable de respuestas rechazando
y otros elementos gráficos que indican que se trata las opciones ofrecidas. Tenemos apenas 144. Esto
de un periódico digital, donde es posible encontrar podría deberse a que los encuestados interpretaron
noticias (Ver Figura 4). El nombre del museo está esta pregunta como debo elegir una de las opciones
en inglés pero la palabra es próxima al español; ofrecidas. Sin embargo, también podemos
las fotografías muestran objetos de exposición interpretar este resultado, conjuntamente con los
museográfica y el diseño es consistente con un sitio anteriores, en el sentido de la hipótesis principal:
institucional. (Ver Figura 5). los criterios que los jóvenes declaran como
Se presentan los datos por orden de necesarios para seleccionar información confiable
frecuencia, en números absolutos. No son no se ponen en juego en todas las situaciones
sumables porque cada entrevistado eligió una o donde hay que elegir un sitio.
dos opciones, o bien, la opción Ninguno. El análisis de los datos en función del
Finalmente, en la pregunta 18 incluimos tipo de escuela de procedencia y el género no
tres sitios que no cumplen con los criterios de arrojó diferencias significativas. Sin embargo,
confiabilidad, con la hipótesis de que podrían aparecen diferencias que merecen ser tomadas
elegir la opción Ninguno. Sin bien esta opción fue en cuenta cuando comparamos las respuestas
elegida 144 veces, está muy lejos de ser la opción de los jóvenes de 14 años, que ingresan al
mayoritaria. El blog fue elegido 351 veces. La bachillerato, con las de los jóvenes de 18 años,
página del blog (como todas las otras) se refiere aspirantes a la licenciatura.
al mismo contenido: las momias del antiguo De los 413 estudiantes que eligieron tres
Egipto. Está diseñada en uno de los servicios más opciones de respuesta en la pregunta 14 sobre
utilizados para la creación de blogs (Wordpress) en criterios para saber cuándo la información es
una plantilla muy común, que le da la apariencia confiable, 210 son de licenciatura y 203 de
de un libro. Título y subtítulo podrían ser de un bachillerato. Con los totales de cada subconjunto
libro pero el texto está redactado en primera calculamos las frecuencias absolutas y relativas de
persona, en forma dialógica (inicia con: Muchas selección de las tres combinaciones más elegidas.
gracias a todos por vuestros comentarios de Observamos que las combinaciones más elegidas
felicitación). Solo la similitud de la página con la son diferentes en cada grupo de edad. Entre los
de un libro y el título (Momias del Antiguo Egipto) jóvenes de ingreso a la licenciatura la combinación
podrían justificar la elección, ya que ninguno de más elegida es: la información está bien redactada
los criterios declarados se ponen de manifiesto en + tiene autor + el URL o dirección es .edu, .gob,
este blog. (Ver Figura 7). o una universidad. La segunda combinación en
Con respecto a monografias.com la orden de frecuencia es: la fecha en que se publicó
distancia entre los criterios declarados y las la información es reciente + tiene autor + el URL
propiedades de este sitio es enorme. Aunque o dirección es .edu, .gob, o una universidad. La
haya recibido 182 preferencias, lo cierto es tercera es: el URL o dirección es .edu, .gob, o una
que no debería haber recibido ninguna porque: universidad + la información está bien redactada
está rodeado de publicidad manifiesta, incluso + trae toda la información que busco.
de una oferta para participar en un concurso y En cada una de estas tres combinaciones
ganar dólares; no contiene información textual aparece un criterio paratextual (el análisis del
a pesar de un título similar al anterior. Por lo sitio a partir del URL o dirección electrónica)
tanto, ninguno de los criterios declarados pudo que pertenece al ámbito digital de manera
haber sido utilizado. (Ver Figura 8). Algo similar exclusiva. En una de las combinaciones este
podemos decir con respecto a YahooRespuestas, criterio aparece junto a otros dos criterios
elegido 56 veces. paratextuales: la fecha de publicación y el
928 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
autor. En las otras dos combinaciones, la En consecuencia, los jóvenes de mayor
referencia al URL incluye un criterio textual: la edad tienden a tener en cuenta aspectos
buena redacción. paratextuales y los menores se enfocan más hacia
aspectos textuales. Esto podría indicar que los
Tabla 1. Combinaciones más frecuentes de criterios de mayores pueden, al menos desde el punto de vista
confiabilidad en licenciatura. declarativo, considerar elementos predictores de
Frecuencia Frecuencia la confiabilidad de la información, tal como el
Licenciatura
absoluta relativa URL. Los más jóvenes se enfocan en elementos
Redacción, autor, URL, 30 0.14 del texto que demuestran una preocupación por
el logro de los propósitos lectores (la información
Fecha, autor, URL 23 0.11
es entendible, está completa y bien redactada)
URL, redacción, completud 21 0.10 más que por la evaluación de la confiabilidad.
Frecuencias absolutas y relativas de selección de combinaciones de Nos resta considerar la concordancia o
criterios de confiabilidad entre estudiantes de licenciatura. Total = 210 discordancia entre el decir y el hacer, es decir,
Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
entre los criterios que declaran tener en cuenta
Veamos las diferencias con los jóvenes y los que efectivamente utilizan para seleccionar
de 14 años, de ingreso al bachillerato. En este un sitio confiable.
caso las combinaciones son las siguientes: Para verificarlo realizamos un análisis
de independencia entre dos variables usando la
Tabla 2. Combinaciones más frecuentes de criterios de expresión propia para la independencia estocástica
confiabilidad en bachillerato. P(A∩B) = P(A)*P(B), donde P es la probabilidad de
Frecuencia Frecuencia selección de un criterio o de una opción, A es el
Bachillerato
absoluta relativa conjunto de ternas o tríos de criterios declarativos
Redacción, entendible completud 30 0.15 y B es el conjunto de opciones de imágenes
de sitios Web. Esto, con el fin de determinar
Redacción, completud, fecha 26 0.13 la relación entre los criterios declarados en la
pregunta 14 y la selección de sitios en la pregunta
Redacción, autor, URL 13 0.06 18. Esta pregunta, como ya lo mencionamos, se
Frecuencias absolutas y relativas de selección de combinaciones de diseñó bajo la hipótesis de que elegirían la opción
criterios de confiabilidad entre estudiantes de bachillerato. Total = 203 ninguno, ya que los sitios propuestos no cumplen
Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
con los criterios de evaluación de la confiabilidad
En este grupo todas las combinaciones reportados en la literatura e incluidos en las
incluyen criterios textuales. En las tres opciones de la pregunta 14, de tipo declarativo.
combinaciones aparece la buena redacción La tabla 3 muestra, para el grupo de licenciatura,
de la información. El criterio paratextual, el cálculo de la probabilidad de selección de
análisis del URL, dominante en el grupo de los cada una de las tres combinaciones de criterios
jóvenes de 18 años, aparece en una sola de las declarativos y la probabilidad de selección de
combinaciones, la menos frecuente. cada una de las opciones de la pregunta 18:
Tabla 3. Frecuencias relativas de selección de las cuatro opciones de respuesta de la pregunta 18.
Licenciatura Blog Monografías.com Yahoo Ninguno Totales
Redacción, autor, URL, 0.2973 0.0676 0.0000 0.0405 0.4054
Fecha, autor, URL 0.1081 0.0811 0.0135 0.1081 0.3108
URL, redacción, completud 0.1216 0.0405 0.0541 0.0676 0.2838
Totales 0.5270 0.1892 0.0676 0.2162 1.0000
Cálculo de probabilidad de selección de cada terna de criterios de confiabilidad por la probabilidad de selección de cada opción de respuesta para el grupo
licenciatura. (Total = 210) Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 929
Con estos datos verificamos la relación entre de la opción ninguno. En las dos primeras
cada una de estas combinaciones y la respuesta ternas o combinaciones (0.0405 - 0.0877;
ninguno, siendo ésta la mejor respuesta en 0.1081 – 0.0672) las cifras distan mucho de
virtud de los criterios de selección de los sitios ser semejantes, indicando que tener en cuenta
presentados. Esto es lo que muestra la tabla 4. los criterios enunciados en las dos primeras
combinaciones influye en la probabilidad de
Tabla 4. Relación de independencia entre criterios declarativos selección de la opción ninguno. En cambio,
y la opción ninguno en la pregunta 18. en el caso de la terna tres, los resultados son
semejantes (0.0676 – 0.0614). Esto podría
P P(Ninguno=
Licenciatura P Terna indicar que hay una relación de independencia
Ninguno 0.2162)*P(Terna)
entre este trío de criterios y la selección de la
Autor, URL, redacción 0.0405 0.4054 0.0877 opción ninguno.
Fecha, autor, URL 0.1081 0.3108 0.0672 Veamos qué sucede en el grupo de menor
URL, redacción, edad, los que ingresan al bachillerato. La tabla
0.0676 0.2838 0.0614
completud 5 muestra el cálculo de la probabilidad de
Totales 0.2162 1.0000 selección de cada una de las tres combinaciones
de criterios declarativos en relación con la
Probabilidad de selección de cada terna de criterios de confiabilidad por la probabilidad de selección de cada una de las
probabilidad de selección de la opción ninguno en la pregunta 18 para el
grupo licenciatura. opciones de la pregunta 18:
Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
En la tabla 4 se observa la relación Tabla 5. Frecuencias relativas de selección de las cuatro
opciones de respuesta de la pregunta 18
entre los criterios declarativos y la selección
Bachillerato Blog Monografías.com Yahoo Ninguno Totales
Cálculo de probabilidad de selección de cada terna de criterios de confiabilidad por la probabilidad de selección de cada opción de respuesta para el grupo
bachillerato. (Total = 203)
Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
Con estos datos procedimos a verificar la y la respuesta ninguno. Esto es lo que muestra
relación entre cada una de estas combinaciones la tabla 6.
Probabilidad de selección de cada terna de criterios de confiabilidad por la probabilidad de selección de la opción ninguno en la pregunta 18 para el grupo
bachillerato. Fuente: elaboración propia, basado en el TICómetro® versión 2011.
930 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
En este grupo de menor edad los resultados problemas que les permitan discutir el tema de la
son diferentes para las tres ternas. Por tanto, no confiabilidad y poner en práctica lo que declaran.
hay congruencia entre los criterios declarativos y En un medio tan inestable y cambiante como
la probabilidad de seleccionar la opción ninguno, Internet, donde la oferta de páginas web y los
ya que cualquiera de las ternas de criterios modos de interacción crecen y se transforman
declarativos puede influir en la selección de la constantemente, no es posible imaginar una lista
opción ninguno. Podemos confirmar la hipótesis cerrada de criterios a tener en cuenta. Más bien,
de que lo que pueden declarar es diferente de lo hay que aprender a identificar propiedades de la
que pueden tomar en cuenta en un contexto de información digital que permitan decidir, ahora
selección de sitios confiables. y en el futuro impredecible, si dicha información
es confiable.
Conclusiones Esta falta de congruencia entre lo que
se puede enunciar y lo que efectivamente se
Los datos obtenidos muestran una hace en situaciones concretas debe ser tomada
diferencia interesante entre los dos grupos de en cuenta en la investigación, pues pone en
edad (14 y 18 años), diferencia que no aparece cuestión la manera en que se obtienen los datos,
en otros trabajos publicados (por ejemplo, casi siempre recurriendo a lo que los estudiantes
FLANAGIN; METZGER, 2011). Los más jóvenes declaran y no a lo que efectivamente hacen. Por
hacen referencia a las propiedades que debe supuesto, no hemos observado a los jóvenes
tener la información textual para ser accesible haciendo una búsqueda real, con propósitos
a ellos como lectores: estar bien redactada, ser definidos, pero las preguntas analizadas en
fácil de entender y presentar una información este estudio constituyen lo más próximo que,
completa. Se trata de criterios propios a la en una situación de encuesta masiva, logramos
información textual, ya sea en pantalla o en introducir. Datos preliminares de entrevistas
papel. Una propiedad específica del medio que estamos realizando con niños más
digital que permite anticipar confiabilidad pequeños, de escuela primaria, dejan entrever
antes de empezar a leer (el URL) es tomado una discordancia entre criterios declarativos
en cuenta de manera preponderante por los que, en muchos casos, son la simple repetición
jóvenes de mayor edad. Esto podría deberse a de informaciones verbales recogidas de otros
muchos factores sobre los que solo podemos adultos o compañeros (por ejemplo: en la
elucubrar. Podría ser que estos jóvenes hayan Wikipedia no se puede confiar porque cualquiera
acumulado más tiempo de exploración en puede escribir allí) y los criterios que ponen en
Internet, que su uso con fines de estudio haya práctica cuando hacen una búsqueda efectiva y
sido propiciado durante sus años de educación eligen Wikipedia porque siempre aparece entre
media superior, que considerar las propiedades los primeros resultados y ellos nunca pasan de
específicas del medio digital les haya resultado la primera página de resultados. Constatar esas
eficaz en previas ocasiones para ahorrar tiempo discrepancias es una cosa; tratar de comprender
en la búsqueda de información. cómo logran justificar lo que finalmente
Sin embargo, la discordancia entre lo deciden es otra cosa. Ese y otros problemas
que los jóvenes declaran y la selección que de índole cualitativa requieren entrevistas
realizan en una situación más próxima a las semiestructuradas con un número reducido de
búsquedas reales, es común a los dos grupos sujetos, de preferencia en parejas para suscitar
de edad. Esto sugiere que no basta con indicar intercambios de opiniones.
a los estudiantes que busquen información Consideramos que nuestro trabajo aporta
en Internet. Sería deseable idear situaciones datos importantes en la línea de investigación
didácticas donde los estudiantes se enfrenten a sobre la confiabilidad de la información en
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. out./dez, p. 913- 934, 2014. 931
Internet. En primer lugar, la construcción del Quedan pendientes varias tareas de
instrumento de investigación nos permitió investigación. Mencionaremos apenas dos de
plantear a los encuestados una situación muy ellas. Por una parte, disminuir la edad de los
cercana a la selección real de sitios confiables sujetos entrevistados, adecuando la metodología
a través de la presentación de las imágenes de empleada a distintos rangos de edad. Por
pantallas de sitios de Internet. El instrumento otra parte, casi todas las investigaciones se
ideado, el TICómetro®, nos permitió recabar focalizan en la información escrita (con pocas
datos con muestras relativamente extensas excepciones, por ejemplo PERELMAN et al,
que no podrían obtenerse en situaciones 2009). A pesar de las dificultades metodológicas,
de observación de individuos que buscan es necesario prestar atención a la gran cantidad
información en Internet. de información que circula en Internet en
Este instrumento no sustituye a la forma de imágenes (fotos fijas, videos, dibujos
observación y entrevista con jóvenes en e híbridos). Esas imágenes también transmiten
situación efectiva de búsqueda de información información con fines de estudio, y los criterios
y valoración de la misma. De hecho, estamos de confiabilidad que utilizan los estudiantes
conduciendo ese tipo de entrevistas no solo necesitan ser estudiados.
con jóvenes sino también con niños de 9 a 12 Los datos que presentamos son
años, ya que la edad de los usuarios de Internet relevantes también en lo que concierne a la
disminuye aceleradamente. enseñanza. La evaluación de la confiabilidad
Para intentar poner un poco de orden de la información presenta un reto para los
en los listados de elementos o factores que estudiantes, aún en el nivel de la educación
inciden en la percepción o juicio de credibilidad superior. En especial, constituye un reto difícil
hemos recurrido a la distinción entre lo textual de resolver en la acción. Aún cuando disponen
y lo paratextual, proveniente de otro campo de criterios para la selección de información
disciplinario (la teoría literaria) y de una época confiable a nivel declarativo, en la acción esos
pre-informática. En el análisis de las respuestas criterios pueden competir con requerimientos
obtenidas hemos usado esos términos, con las prácticos o con motivaciones singulares. Es
necesarias adaptaciones a textos informativos y evidente la pertinencia de diseñar situaciones
al medio digital. Es un tema que requiere, sin didácticas que promuevan el desarrollo de uno
duda, mayor elaboración pero que, en primera de los quehaceres del lector actual: distinguir
aproximación, nos permitió encontrar vínculos qué información es confiable en contextos de
significativos entre ciertas respuestas, sin perder búsqueda en Internet con diferentes propósitos,
las necesarias diferenciaciones. particularmente con fines de estudio.
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Marina Kriscautzky es maestra en Ciencias con especialidad en Investigación Educativa por el Departamento de
Investigaciones Educativas del Centro de Investigación y Estudios Avanzados de México. Coordinadora de Tecnologías para la
Educación de la Dirección General de Cómputo y de Tecnologías de Información y Comunicación de la Universidad Nacional
Autónoma de México.
Emilia Ferreiro es investigadora Emérita del Sistema Nacional de Investigadores de México. Muchos de sus libros han sido
traducidos en Brasil, desde Psicogênese da Língua escrita (con Ana Teberosky, Artes Médicas, 1986) hasta O ingresso na
escrita e nas culturas do escrito (Cortez, 2013).
934 Marina KRISCAUTZKY; Emilia FERREIRO. La confiabilidad de la información en Internet: criterios declarados y utilizados...
Diagnóstico de competências individuais de tutores que
atuam na modalidade a distância
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. p.935-951, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121642 935
Individual competences of distance education tutors
João Paulo Fonseca BorgesI
Francisco Antonio Coelho JuniorI
Cristiane FaiadI
Natália Ferreira da RochaI
Abstract
Keywords
I- Universidade de Brasília,
Brasília, DF, Brasil.
Contacts:
joaopaulofb@gmail.com;
acoelho@unb.br;
crisfaiad@gmail.com;
nataliafr29@gmail.com
936 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121642 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p.935-951, out./dez. 2014.
Introdução à aprendizagem são cruciais à efetividade
dessas ações aprendizes (BELLONI, 2006).
O advento e a consolidação de novas Seguindo a tendência contemporânea
tecnologias de informação e comunicação de incentivo à educação a distância (EaD),
vêm estabelecendo novos padrões na maneira o governo federal brasileiro promulgou, por
como as pessoas adquirem conhecimento. Nesse meio do Ministério da Educação, o decreto nº
contexto, a recondução do processo de ensino- 5.800/2006, instituindo o sistema Universidade
-aprendizagem a plataformas virtualizadas já é Aberta do Brasil (UAB), que tem como objetivo
realidade (CAVANAUGH; et. al., 2004). principal a expansão do acesso à educação
O ensino a distância, nesse cenário, vem superior em todo o território nacional, por meio
se tornando alternativa contumaz para o maior da educação a distância (BRASIL, 2006). Em uma
alcance de aprendizes em todo o território global, pesquisa empírica recente, Nunes e Sales (2013)
rompendo-se fronteiras de tempo e espaço já retratam componentes estruturantes da UAB
(SETZER; LEWIS, 2005; WATSON; WINOGRAD; e sua inserção no cenário educacional nacional.
KALMON, 2004). Comunidades virtuais de A UAB foi planejada com a ideia de
aprendizagem vêm, a cada dia, institucionalizando- prover expansão pública da educação superior,
-se como perspectiva pedagógica para a aquisição considerando os processos de democratização
de competências. A organização escolar e o e acesso e visando ao aperfeiçoamento dos
processo educativo tendem a ser facilitados pelo processos de gestão das instituições de ensino
uso de recursos audiovisuais, pela possibilidade superior. E, ainda, com o propósito de consolidar
do estudante aperfeiçoar-se, ainda mais, em sua expansão em consonância com as propostas
algum conteúdo de interesse, pela sincronicidade educacionais dos estados e municípios. A UAB
da aprendizagem, enfim, por novas possibilidades tem grande inserção geográfica nacional,
que caracterizam a chamada aprendizagem e o estudo do efeito das ações aprendizes
móvel, como aquelas debatidas por Barbour desenvolvidas em seu âmbito tem grande
e Reeves (2009) e consideradas por Kukulska- relevância social, acadêmica e prática.
Hulme, Traxler e Pettit (2007) no contexto atual Aspecto imprescindível, também, para
do ensino a distância. o alcance efetivo da aprendizagem a distância
Revisões recentes (ABBAD, 2007; refere-se ao papel desempenhado pelo tutor.
ABBAD; ZERBINI; SOUZA, 2010; BARBOUR; O tutor representa a figura do ator social que
REEVES, 2009; RUSSELL, 2006; RICE, 2006; provê suporte e apoio contínuo ao aprendiz
KUKULSKA-HULME; SHIELD, 2008) apontam a (BARBOUR; COOZE, 2004; FORMIGA, 2009).
aprendizagem na modalidade a distância como No sistema UAB, existe a figura do tutor nas
aberta, ao longo da vida e com a premissa de modalidades presencial e a distância. Sua
educação adulta permanente. Abbad, Zerbini importância é essencial para a consolidação da
e Souza (2010) e Kukulska-Hulme, Traxler aprendizagem tanto no que se refere a aspectos
e Pettit (2007) consideram que o método de técnicos (desenvolver conteúdos ou tirar
aprendizagem a distância tem sido aplicado dúvidas, monitorar o progresso acadêmico do
de modo síncrono e assíncrono, com a estudante) quanto motivacionais (principalmente
disponibilização de hipertextos e materiais para estimulando o aprendiz a não evadir).
todos os participantes, os quais são, geralmente, Os tutores, assim, têm importância tática
separados geograficamente uns dos outros. na aprendizagem a distância. No entanto,
Aspectos tais como características instrucionais não existem estudos científicos publicados
dos cursos ofertados, situações e recursos de até o momento acerca do perfil diagnóstico
ensino-aprendizagem, interatividade e suporte de suas competências necessárias, ou mesmo
que identifiquem lacunas de competências
938 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
autores lembram, entretanto, que a expressão competências (BRANDÃO; BAHRY, 2005). Essa
da competência envolve mobilização de saberes lacuna representa a diferença existente entre
adquiridos ao longo do tempo, o que já permite as competências atualmente presentes junto
a percepção da importância dos conhecimentos, aos tutores que serão pesquisados e aquelas
habilidades e atitudes na formação profissional. que idealmente deveriam existir. Outra forma
Em linha semelhantemente voltada para a de se pensar na lacuna de competências é
expressão comportamental, a competência associando-a à necessidade de treinamento, em
pode ser definida como “o ‘tomar iniciativa’ e o que a diferença entre uma condição desejada e
‘assumir responsabilidade’ do indivíduo diante de uma condição real fornece o insumo necessário
situações profissionais com as quais se depara” à ação instrucional.
(ZARIFIAN, 2001). Brandão e Bahry (2005) diferenciam
Para fins deste trabalho, a competência o mapeamento em três grandes etapas:
será entendida como a interação sinérgica “identificar as competências necessárias”;
entre conhecimentos, habilidades e atitudes, “inventariar as competências existentes”; e
expressa por meio de ações verificáveis “mapear o gap de competências e planejar
ou comportamentos tangíveis por meio de captação e/ou desenvolvimento”. Para fins
desempenho em contexto de trabalho (BRUNO- deste paper, entender-se-á mapeamento como
FARIA; BRANDÃO, 2003). Será dada ênfase à o processo de identificação das competências
abordagem multicriterial da competência, em necessárias à execução das funções e elaboração
que a mesma deverá ser passível de verificação do inventário das competências existentes. Por
por meio da sua expressão no desempenho dos diagnóstico, entende-se o resultado da aplicação
tutores, numa perspectiva funcionalista. Essa do mapeamento, expresso pela identificação do
verificação é possível dada a atribuição de gap de competências.
condições e critérios para cada competência em Considera-se aqui que o mapeamento
termos de resultados esperados no trabalho. de competências consiste na identificação e na
Além desse conceito geral de competên- operacionalização das competências, no nível
cia, será relevante também neste trabalho a dis- individual, existentes na Organização UAB. O
tinção entre competências técnicas e comporta- agente de análise em investigação são os tutores.
mentais. Competências técnicas são aquelas cuja A metodologia para o mapeamento
expressão se deriva de conhecimentos e habili- de competências consiste de etapas que se
dades específicas de uma função, enquanto as complementam, de forma que o produto
competências comportamentais são aquelas ba- de uma fase serve de subsídio para a fase
seadas em habilidades mais transversais e atitu- subsequente. No presente trabalho, a coleta
des. As técnicas são consideradas competências de informações para fins do cálculo do gap
proximais ao cargo, por se relacionarem com se dará pela autoavaliação, já que os próprios
mais proximidade a características técnicas das tutores indicarão o domínio e a importância das
funções do empregado. As comportamentais são competências avaliadas.
consideradas proximais à pessoa (ou distais ao
cargo), por expressarem características mais in- Procedimentos metodológicos
trinsecamente relacionadas à pessoa que ocupa a
função na organização. O presente estudo é tipificado como
O aferimento de tais competências exploratório-descritivo, com delineamento
será feito pelo método do mapeamento de correlacional e baseado na triangulação
competências. Essa ferramenta consiste em metodológica. Quanto à abordagem de análise,
etapa fundamental da gestão por competências, o estudo é qualitativo e quantitativo. Em sua
pois nela será identificado o gap, ou lacuna, de fase inicial, foi predominantemente qualitativo
940 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
em grupo junto a tutores do sistema UAB/ de um instrumento totalmente estruturado, em
UnB, de modo a identificar qual era o corpo que cada competência ficou associada a uma
de competências técnicas e comportamentais escala de importância (de 1, nada importante
necessárias às suas atribuições. Foram para o meu desempenho, até 5, competência
realizadas, ao todo, 17 entrevistas individuais. imprescindível) e domínio (de 1, não possuo tal
Além das entrevistas, foram feitos dois competência, até 5, possuo grau de expertise
grupos focais (N=13) com tutores que estavam nessa competência). Esse instrumento deu a
em processo seletivo para a posição de tutoria base para o Estudo 2.
a distância no curso de administração pública
a distância, oferecido pela Universidade de Estudo 2 – Etapa quantitativa
Brasília em parceria com a UAB. A amostragem,
nessa etapa, portanto, foi construída de A primeira versão do instrumento
forma não-probabilística por conveniência, continha 120 afirmativas, sendo 64
já que apenas tutores vinculados à referida competências técnicas e 56 comportamentais.
universidade foram entrevistados. Os questionários formados pelas competências
As entrevistas e grupos focais tiveram enumeradas na etapa qualitativa foram
por finalidade a identificação das competências enviados eletronicamente. Os questionários
técnicas e comportamentais necessárias à digitais foram confeccionados na plataforma
função tutor de educação a distância, segundo Google Docs e enviados a tutores de diversos
a ótica de ocupantes da função, como sugerido cursos vinculados à UAB/UnB.
por Brandão e Bahry (2005). Tanto as entrevistas Após a identificação do baixo número de
quantos os grupos focais tiveram roteiro respondentes 15 dias depois do início da coleta
semiestruturado. O grupo focal teve como de dados, optou-se por reduzir a quantidade
vantagem o alcance de vários indivíduos em de itens do questionário para 70 competências,
uma única oportunidade, o que só enriqueceu 35 técnicas e 35 comportamentais. Para a
a coleta de dados. formulação do novo questionário, foram
As competências relatadas pelos tutores consideradas as 35 competências com maiores
foram analisadas e aperfeiçoadas, em termos médias de importância dentre técnicas e
de sua construção ou redação, conforme as comportamentais, segundo os respondentes
recomendações de Brandão e Bahry (2005). As que haviam participado até então. Após
competências extraídas durante as entrevistas a reformulação, o link para resposta do
e grupos focais expressariam determinado questionário foi reenviado a coordenadores de
comportamento esperado, indicando o que o tutorias de outras universidades e reenviado
tutor deveria fazer em face de uma determinada às coordenações da UAB, a fim de que o
situação no trabalho. Descreveram-se as repassassem a seu quadro de tutores.
competências em formato de um verbo que Inicialmente, almejava-se ter como
exprime um comportamento executado sob um população apenas os tutores dos cursos da
critério, e seguindo uma determinada condição UAB vinculados a cursos de graduação e
(BRANDÃO; BAHRY, 2005; BRANDÃO, 2009). pós da Universidade de Brasília. Todavia,
Efetuou-se validação semântica e por devido ao baixo número de respondentes
juízes das competências identificadas junto mesmo após a redução do número de itens, os
a três representantes do quadro de apoio envios passaram a abranger tutores de outras
pedagógico que atuavam na Organização UAB/ instituições de ensino superior (IES), inclusive
UnB, bem como junto a tutores da própria instituições privadas não vinculadas ao sistema
Universidade de Brasília. Após essas validações, UAB. Acredita-se que essa decisão, de variar o
as competências foram agrupadas no formato compósito amostral, não afetou os objetivos
942 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
Tabela 1 – Perfil dos participantes do Estudo 2
VARIÁVEL F % VARIÁVEL F %
- Entrevista 17:
“[...] É importante você ter um bom domínio da matéria, porque geralmente o 6) Acesso o ambiente virtual de aprendizagem diariamente, evitando
intervalo de tempo que você tem que responder não é muito grande. Se o aluno deixar perguntas sem respostas por mais de 24hs
fizer um questionamento hoje e você não responder no máximo amanhã, o aluno 12) Demonstro domínio do conteúdo a ser ministrado, visando a
já começa a ficar bastante impaciente, e, como o material é muito limitado, o melhor responder as dúvidas e questionamentos dos alunos.
material de estudo deles é bastante ruim, acaba que você fica sobrecarregado... 3) Tenho a capacidade de aplicar conhecimentos e habilidades
tem muito detalhe que às vezes um bom livro ajuda a esclarecer pro aluno, e específicas de acordo com minha área de atuação, zelando pelos
essa apostila não ajuda.[...]” interesses e necessidades tanto do curso quanto dos alunos.
- Entrevista 05:
“-[...] bom, primeiramente eu tenho que acessar a plataforma diariamente... 16) Identifico, nos fóruns, alunos pouco participativos, visando a
praticamente diariamente, responder às dúvidas dos alunos no prazo máximo procurá-los e trazê-los, efetivamente, para a discussão.
de 24hs... procurar esclarecer as dúvidas deles, corrigir as atividades... intervir 20) Oriento o aluno quanto a possíveis dúvidas, fornecendo a
nos fóruns né, de forma ativa, de forma que o aluno não se sinta desmotivado, resposta ou indicando canais pelos quais o aluno poderá obtê-la.
ter como se fosse uma “presença à distância”, porque, no EaD, se você não tiver 47) Busco proximidade com o aluno, para que este não se sinta
uma presença ativa do tutor, você acaba desmotivando o aluno[...]” isolado ou se perceba sozinho
- Entrevista 2:
- “[...] sim, você ensina pro outro as coisas e aprende com ele, então todos têm 52) Capacidade de manter bom relacionamento interpessoal (sou
que ter um estímulo a participar desse processo de busca do conhecimento. sociável, agindo com tato, ou seja, com habilidade e cautela no
Isso só acontece quando você se sente à vontade, se sente valorizado, você relacionamento com as pessoas).
tem que formar esse conceito de grupo, tem que ter esse apoio entre eles. Não 54) Capacidade de agir com civilidade, sendo polido e cortês ao
apenas entre os alunos, entre o tutor e os alunos também... Então, além de desempenhar minhas atribuições, tratando o outro com educação
mediar, ainda vai avaliar... Mas o apoio mútuo e essa questão da cordialidade, e respeito.
eu sinto que isso depende basicamente da atitude do tutor, especialmente no 51) Capacidade de agir com persistência, demonstrando interesse
começo do curso, porque todo mundo entrou, tem aquele gelo... O tutor tem e comprometimento com o trabalho (demonstro entusiasmo e
que ter essa habilidade de quebrar o gelo, formar associações, deixar todos à determinação; cumpro a tarefa, mesmo diante de dificuldades e
vontade pra participar [...]” contrariedades).
944 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
Entre os entrevistados, os temas como conhecimento de conteúdo, materiais de
preponderantes foram o domínio de conteúdo aula e didática no ensino; e aspectos funcionais
e motivação do aluno, citados por todos os da tutoria, ligados a execuções de tarefas
participantes. Quanto às competências técnicas, práticas, como a utilização do AVA e a operação
percebeu-se que, além do domínio do conteúdo de ferramentas tecnológicas.
da disciplina que se está tutorando, foram
considerados fundamentais aspectos relativos à Estudo 2
operação do ambiente virtual de aprendizagem
(AVA) e outras ferramentas tecnológicas que Competências referentes à participação
otimizam a interação com os alunos. Dentre no ambiente virtual foram aquelas que
as competências comportamentais, além do apresentaram maior gap sob a ótica dos tutores
incentivo ao fator motivacional dos alunos, pesquisados. A intervenção nos fóruns de
percebeu-se um grande valor dado a questões discussão, tarefa imprescindível à ação aprendiz,
como individualização do atendimento, também apresentou índices alarmantes quanto
cordialidade, empatia, persuasão, capacidade a gaps.
de trabalhar em equipe, comprometimento e O mapeamento das principais
capacidade de planejamento e de organização. competências identificadas pode ser visualizado
Nesse ponto, é importante ressaltar que as na Tabela 2, que contém as 10 competências com
competências comportamentais se ligam maior gap identificado. Optou-se por analisar
diretamente a atitudes ou habilidades mais distais, os dados com base na lacuna de competências
que são entendidas como fatores intrínsecos pelo fato dessa informação ser a mais central
ao indivíduo, de ordem afetiva e social, que para fins da consecução deste trabalho.
orientam seu comportamento na vida cotidiana De modo geral, é possível perceber que
(BRANDÃO; BORGES-ANDRADE, 2007). os gaps identificados foram baixos, estando
É possível perceber, pela análise das res- todos abaixo de 5 na escala proposta por
postas dos entrevistados, uma forte associação das Brandão (2012). Desse modo, entende-se, pelos
competências com o desempenho prático apre- dados obtidos, que os tutores da EaD estão
sentado no exercício de suas funções de tutores. com as competências dentro dos parâmetros
De um modo geral, os respondentes desejados em termos de domínio, considerando
diziam o que era preciso em termos de sua autoavaliação. Isso sinaliza que as
conhecimentos, habilidades e atitudes (CHAs), atividades de treinamento e desenvolvimento
fazendo constantes associações com as tarefas dos cursos de EaD parecem estar alinhadas com
cotidianamente executadas no exercício da as necessidades dos tutores a distância. Essa
tutoria. Esta análise corrobora a tese de que conclusão torna-se válida ao levar-se em conta
as competências devem ser representadas por que o mapeamento não apenas tem a utilidade
desempenhos perceptivelmente demonstrados de orientar futuras ações de capacitação
em situações práticas de tutoria (BRANDÃO; mas também serve como um mecanismo de
BAHRY, 2005; BRUNO-FARIA; BRANDÃO, controle e avaliação de iniciativas pretéritas
2003; NUNES; SALES, 2013). de treinamento e desenvolvimento (MATTAR,
Ressalta-se ainda que, durante a 2012; SIMONE, 2006).
formulação das competências com base nos Dentre as 10 competências com maior gap,
discursos dos respondentes, foi percebida uma as seis primeiras relacionam-se mais diretamente
divisão no escopo das competências técnicas. com a intervenção do tutor no AVA, que é o
De modo geral, elas descreviam duas dimensões principal “local” de atuação do tutor em sua relação
distintas, mas com interação entre si: aspectos com os alunos. As altas médias de importância
cognitivos da tutoria, relacionados a fatores ressaltam que o domínio de uso do AVA seria
T Aplico exercícios aos alunos, corrigindo-os em tempo hábil. 4.09 4.22 1.055 1.056 3.857
946 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
grupo de competências a capacidade de manter das correlações podem ser classificados como
boa comunicação verbal e escrita. Com base nos pequenos (0,10 a 0,29), médios (0,30 a 0,49)
dados, portanto, essas competências encontram-se ou grandes (0,50 a 1). O escore obtido neste
adequadas em termos de lacuna entre domínio e estudo, portanto, é bastante importante para as
importância. Além disso, é possível notar baixos proposições aqui testadas.
desvios-padrão de domínio e importância dessas Identificou-se que, quanto maior a
competências, o que demonstra homogeneidade importância atribuída à competência, maior é
entre os respondentes. o domínio da mesma. Essa correlação vai ao
Por outro lado, o menor gap de compe- encontro das descobertas de Nunes e Sales
tências comportamentais poderia ser explicado (2013), no estudo de professores do curso de
por uma provável leniência dos tutores ao res- pedagogia da UAB/UECE.
ponder o questionário, o que pode caracterizar- Outro ponto relevante é que a variável
-se como um possível viés da autoavaliação. “Você acha que o aluno da modalidade a
Ou seja, componentes atitudinais como ética, distância realmente aprende?” guarda correlação
responsabilidade, cordialidade e comprometi- negativa com importância e domínio. Na análise
mento, possivelmente por serem socialmente estatística dos dados, atribuiu-se valor 0 à
desejáveis, receberam altos valores na autoava- resposta sim e 1 à resposta não. Dessa forma, o
liação de domínio por parte dos respondentes. fato de as correlações serem negativas sinaliza
Na Tabela 3, encontram-se destacadas as que há uma correlação positiva entre “achar
correlações com significância estatística. Entre que o aluno aprende” e atribuir altos valores de
as várias identificadas, destaca-se a correlação domínio e importância. Isso leva à percepção de
entre domínio e importância das competências, que tutores com maior confiança no aprendizado
em 0.73, classificada como forte, segundo Hair do aluno tendem a atribuir maior importância e
Jr. et al (2005). Para estes autores, os escores a ter, também, maior domínio de competências.
treinamento ou preparação
Você acha que o aluno da
modalidade a distância
Faixa Etária
da tutoria?
Gênero
tutor
948 João P. F. BORGES; Francisco A. COELHO JR; Cristiane FAIAD; Natália F. ROCHA. Diagnóstico de competências...
diferença entre as medições (números), mas não à Características pedagógicas dos cursos a
razão/magnitude entre elas. distância também precisam ser relevadas ao se
Isto posto, sugere-se, para futuros considerarem futuras pesquisas sobre o tema.
pesquisadores, a construção de um instrumento Acredita-se que o presente estudo
mais fidedigno de cálculo de gap de tenha colaborado tanto com o campo teórico
competências, de maneira a permitir uma quanto para a EaD no Brasil. Até a presente
análise confiável dessa variável. Sugere-se, data, não há estudo científico disponibilizado
ainda, a realização de estudos que aprofundem em profundidade sobre as competências
os conhecimentos acerca das atribuições dos necessárias à ideal execução das tarefas dos
profissionais de EaD, visando a compreender tutores a distância, o que atesta a relevância
especificamente a realidade dos profissionais desta pesquisa para o campo teórico. Além
vinculados à UAB e até mesmo realizando disso, com a crescente importância atribuída
comparações destes com aqueles que atuam em à EaD como alternativa eficiente e viável de
instituições privadas. democratização do acesso à educação superior
Sugere-se também que se investiguem no Brasil, torna-se cada vez mais importante a
outras variáveis de nível de pertencimento existência de estudos que venham a colaborar
micro ou meso-organizacional, como clima com esse campo da educação.
organizacional, comprometimento com a tarefa Em síntese, é premente reafirmar a
e traços ou dimensões de cultura e estrutura importância de novos estudos tanto na área de
organizacional que são transversais ao trabalho mapeamento de competências, com criação de
do tutor. Essas variáveis podem moderar as novos instrumentos e estudos em áreas ainda
relações empíricas obtidas. O aumento do inexploradas, quanto naquela de EaD no Brasil.
número de participantes nos próximos estudos Afinal, essas são áreas em franca expansão,
é condição importante para a testagem de carecendo, portanto, de arcabouço teórico para
novas estatísticas mais robustas e complexas. guiar suas ações no futuro.
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Francisco Antonio Coelho Junior é doutor em Psicologia Social, do Trabalho e Organizacional pela Universidade de Brasília.
Atualmente é professor adjunto do Departamento de Administração da Universidade de Brasília e do Programa de Pós-
Graduação em Administração (PPGA/UnB). É coordenador do PPGA.
Cristiane Faiad é doutora em Psicologia Social, do Trabalho e Organizacional pela Universidade de Brasília. Atualmente é
colaboradora do Cespe/Universidade de Brasília e pós-doutoranda no PPGA/UnB.
Carla MoraisI
João PaivaI
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 953-964, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121411 953
Perspectives and contemporary reflections on the
triangle education-technology-society and its influence
on science teaching
Carla MoraisI
João PaivaI
Abstract
Keywords
954 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121411 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 953-964, out./dez. 2014.
A sociedade da informação, a os processos orgânicos, a geometria variável, a
metáfora da rede e o potencial complexidade, o fluxo e a mudança. Num am-
coletivo biente mecanicista, o “aluno-peça-de-máquina”
aprendia isolado, inserido numa multidão de
O advento da sociedade da informação outros “alunos-peças-de-máquina”, igualmente
é muitas vezes apresentado como um isolados. Embora se amontoasse, com os seus
acontecimento natural, resultante das tendências iguais, na sala de aula, construía a sua própria
modernizadoras e inovadoras nas sociedades aprendizagem quase sempre em solidão e em
ocidentais, cuja alavanca fundamental são as solidão era avaliado. Ressalve-se, no entanto,
tecnologias da informação e comunicação (TIC). que, a despeito da influência predominante de
Como nos adverte Almeida (2000), a modelos de aprendizagem S-R, houve sempre
expressão sociedade de informação, à semelhança concepções concorrentes.1
do conceito de globalização, surge recorrentemente Voltando aos ambientes em rede,
nos discursos científicos e nos discursos os “alunos-nós-de-rede”, membros de
quotidianos para explicar os fenômenos sociais comunidades, sentem que a construção do seu
em curso, às vezes, sem adquirir um significado conhecimento é uma aventura coletiva — uma
exato e abrigando conceções reducionistas de aventura onde constroem os seus saberes, mas
acordo com as quais a tecnologia per se é capaz onde contribuem, também, para a construção
de transformar as sociedades. dos saberes dos outros (FIGUEIREDO, 2002).
Na generalidade dos discursos e das A evolução rápida das TIC e a emergência
análises, a Sociedade da Informação é descrita da sociedade da informação têm estimulado
como um desafio em direção ao qual é suposto reflexões várias, a ponto de se tornar notória,
que todos os cidadãos se mobilizem. Por essa segundo alguns autores, a emergência de um
razão, os teóricos da Sociedade da Informação novo modelo de concepção das sociedades
invocam as escolas e os sistemas educativos contemporâneas. São abundantes os enunciados
como parte fundamental do processo de sobre uma nova era resultante da conjugação
mudança ambicionado, i.e., “levar os indivíduos da informática com as telecomunicações,
a perceber a dimensão das mutações em curso destacando e sublinhando a ideia de que a
e as suas consequências” (AFONSO; ANTUNES, prosperidade futura dependerá dos processos de
2001, p. 7). Se é verdade que a instituição escolar manipulação, de transmissão, de armazenamento
repercute as tensões e dilemas atuais, qual será e de controle da informação. A relação,
o seu papel — e o papel dos seus agentes — na porém, entre a tecnologia e a sociedade não é
transição de uma sociedade industrial para uma unívoca. Como nos diz Castells (1999, p. 25),
sociedade do conhecimento? “a tecnologia não determina a sociedade (…)
No dealbar da sociedade da informação, a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não
a metáfora da máquina – que nasceu no final pode ser entendida ou representada sem as suas
do século XVIII e se desenvolveu durante a so- ferramentas tecnológicas.” Recusando, assim,
ciedade industrial – já não tem sentido como qualquer espécie de determinismo tecnológico,
modelo inspirador da educação e da aprendiza- tanto Castells (2004) como Levy (1997) discutem
gem. Tal como nos indica Figueiredo (2002), a
metáfora da rede parece agora perfilar‑se para 1- Abreu (1999), por exemplo, discute detalhadamente as hipóteses concor-
nos inspirar. No passado, a metáfora da má- rentes de tarefa aberta e tarefa fechada, mostrando como diacronicamente
houve alternativas aos modelos conexionistas e comportamentalistas. Para
quina valorizava o individualismo, a ausência além disso, a máquina (o programa que sinaliza o erro e o sucesso) desem-
de contextos, a rotina, a mecanização, a pas- penha um papel fulcral nas derivações pedagógicas do comportamentalismo.
Assim, fica claro que a tecnologia em si mesma não é mais favorável a modelos
sividade. Atualmente, a metáfora da rede va- construtivistas do que a outros, refletindo, isso sim, as conceções pedagógicas
loriza a comunidade, a interação, os contextos, que estão na sua origem e que lhe sucedem na prática.
956 Carla MORAIS; João PAIVA. Olhares e reflexões contemporâneas sobre o triângulo sociedade-educação-tecnologias...
de Vygotsky (1978) e dão ânimo não apenas à As tecnologias e as “escolas que
reivindicação de métodos ativos de educação, aprendem”
mas sobretudo ao papel essencial da interação
(vertical e horizontal) como suporte essencial dos Senge trouxe da reflexão sociológica e
processos de cognição. No entanto, será que a econômica novos e grandes desafios para as
tecnologia pode configurar-se como “uma das “escolas que aprendem”. A esse autor se deve
chaves da concretização de um novo paradigma a difusão do conceito learning organizations
educativo, capaz de fazer incrementar os (SENGE, 1990, 2002), que se concretiza na reco-
vínculos entre os alunos e a comunidade, mendação da prática das suas cinco disciplinas.
enfatizar a descoberta e a aprendizagem, e de As disciplinas são um conjunto de prá-
fazer caducar a distinção entre aprender dentro ticas de aprendizagem, através das quais um
e fora da escola” (SOUSA; FINO, 2008, p. 25)? indivíduo se modifica, desenvolvendo novas
Ora, Paiva et al. (2010) defendem que a competências, construindo conhecimentos, vi-
mudança de paradigma de uma escola meca- venciando experiências e adquirindo progressi-
nicista, que encara o saber como fragmentado vamente diferentes níveis de consciência de si.
e estanque, para uma escola interdependente e Quando desenvolvidas em conjunto, as discipli-
global ou, segundo Senge (1990), de “pensa- nas podem ter um impacto significativo e ob-
mento sistêmico”, pode ser mediada através da jetivo sobre o desempenho de cada indivíduo.
utilização das TIC. As ferramentas tecnológicas O Quadro 1 sintetiza algumas das princi-
disponíveis poderão potenciar a desejável mu- pais ideias que globalmente caracterizam cada
dança pedagógica nas práticas e nos agentes uma das cinco disciplinas propostas por Peter
educativos, dentro e fora da escola. Senge (1990, 1995, 1998, 1999, 2000, 2002, 2005).
Tal como referem Paiva et al. (2010), entre vem reforçar a atitude de modelagem sistêmica.
as cinco disciplinas de Peter Senge, sobressai, Por outro lado, existem duas disciplinas que são
por um lado, a do Pensamento Sistémico, que colaborativas – Visão Partilhada e Aprendizagem
958 Carla MORAIS; João PAIVA. Olhares e reflexões contemporâneas sobre o triângulo sociedade-educação-tecnologias...
Com efeito, o aparelhamento tecnológico learning and improvement, publicado pela
das escolas pode contribuir para a superação British Educational Communications and
da defasagem digital entre comunidades Technology Agency (BECTA, 2006, p. 3) pode-
socioeconomicamente mais favorecidas e as -se ler: “a necessidade de desenvolver no staff
comunidades mais desfavorecidas (HOHLFELD; competências combinadas com entusiasmo pelo
RITZHAUPT; BARON, 2010). Adicionalmente, ensino à distância é vista como um elemento
a integração das TIC no quotidiano acadêmico essencial para incorporar as TIC e o ensino à
pode promover a comunicação entre as famílias distância em qualquer área do currículo.”
e as escolas (LEWIN; LUCKIN, 2010). O “espaço” de flexibilidade permitido
Contudo, na prática, os professores, no currículo, em conjunto com os níveis de
mesmo os mais entusiastas, sentem dificuldade confiança e de competência dos professores,
na articulação do “como” e do “para quê” usar parece, pois, definir o âmbito e a abrangência
as TIC em contexto educativo (HENNESSY; da inovação das TIC em contextos educativos
RUTHVEN; BRINDLEY, 2005). Por outras (BARAJAS et al., 2002). Também Miranda
palavras, o processo de integração pedagógica (2007) afirma que a integração benéfica das TIC
das TIC revela-se muito exigente para o depende das crenças e práticas exploratórias
professor, porque lhe compete organizar e das possibilidades tecnológicas pelos
estruturar as atividades por níveis crescentes de professores para: a) abordar a informação; b)
complexidade (POSTHOLM, 2006). apoiar os alunos no processo de construção de
Essa evidência sugere a necessidade de conhecimento; e c) integrá-las no currículo
clarificar o potencial das TIC para a criação de através de projetos criativos.
oportunidades de aprendizagem que permitam Ainda segundo Miranda (2007), através
a construção e o desenvolvimento sustentado desses novos sistemas de tratamento e
de saberes escolares, tendo em conta as representação da informação e de comunicação,
especificidades e os objetivos a alcançar em cada os professores podem desenvolver com os
área curricular. Nesse sentido, e considerando alunos atividades que favoreçam a aquisição
que a utilização das TIC, enquanto formação de conhecimentos disciplinares significativos.
transdisciplinar de caráter instrumental, não O Quadro 2 apresenta-nos as principais
se reduz à aquisição de saberes na área das características do processo de aprendizagem.
tecnologias, mas que (sem os dispensar) os Se parece inegável que a escola,
integra num processo de formação global, tal como hoje a entendemos, necessita sofrer
como nos alerta Roldão (1999, p. 17), é crucial, mudanças radicais, é igualmente verdade
do ponto de vista da teorização curricular, que essas mudanças terão forçosamente de
repensar a utilização das TIC no sentido de ocorrer com e pelos professores. Tal como
nos alerta Nóvoa (2007), a integração das
[…] se criarem quadros de referência cultural novas tecnologias na educação mostra-se
e científica, de integração de conhecimentos irremediavelmente associada à necessidade
e domínio de capacidades, de construção de reforço da profissionalização docente e de
de competências que viabilizem processos uma (re)organização marcada das dinâmicas
realistas de formação ao longo da vida e escolares. Ensinar hoje deve ser visto como um
não reduzam essa formação a uma retórica processo flexível, em conteúdos, metodologias,
bem-intencionada. outcomes e mesmo nos vetores tempo e espaço,
assentando assim em processos mais abertos
Nesse contexto, também no relatório ICT de pesquisa, interação e colaboração (PEDRO
and e-learning in further education: management, et al., 2010).
960 Carla MORAIS; João PAIVA. Olhares e reflexões contemporâneas sobre o triângulo sociedade-educação-tecnologias...
ser capaz de usar as TIC é uma das competên- no âmbito do ensino formal, o aprofundamento
cias-chave para o século XXI. Por outro lado, não é naturalmente o mesmo em diferentes
defendendo-se que a educação dos indivíduos níveis de ensino.
em ciências, bem como em qualquer outro domí- Ora, as últimas décadas foram particu-
nio, deverá ser um processo continuado ao longo larmente ricas no aumento da consciência so-
de toda a vida, o ensino formal deverá ter como cial sobre a importância das competências de
orientação de base o de preparar os indivíduos letramento dos indivíduos, em nível pessoal e
em saberes básicos e competências que lhes per- socioeconómico das nações, o que se traduziu
mitam continuar o processo de aprendizagem. no incremento da necessidade de precisar o(s)
Segundo Wan (2012), o conceito significado(s) do termo e de definir padrões
de letramento digital estrutura-se em três de letramento com aceitação internacional
dimensões: a) dimensão cognitiva: b) dimensão (MARTINS et al., 2004).
socioemocional; c) dimensão técnica3. De acordo Nesse contexto, parece-nos oportuna
com essa concepção, é possível e necessário uma referência ao PISA (OCDE, 2003), que de-
ensinar letramento digital às gerações mais fine o letramento científico em termos dos co-
jovens, uma vez que o domínio técnico se revela nhecimentos científicos e da capacidade de o
frequentemente insuficiente para fazer face aos indivíduo utilizar esses mesmos conhecimentos
desafios da sociedade moderna. para identificar questões para as quais a ciên-
Num sentido semelhante, a letramento cia pode dar resposta, para adquirir novos co-
científico, segundo Chassot (2000), deve nhecimentos, explicar fenômenos científicos e
dar prioridade à formação de cidadãos tirar conclusões fundamentadas sobre proble-
cientificamente cultos, capazes de participar mas de caráter científico. Igualmente, a com-
ativa e responsavelmente em sociedades que preensão das características próprias da ciência
se querem abertas e democráticas. Assim, o como forma de investigação e conhecimento
sentido da expressão “cientificamente culto” vai humano, a consciência do papel da ciência e
ao encontro do expresso por Hodson (1998), ou da tecnologia na sociedade e na constituição
seja, um conceito multidimensional envolvendo do nosso meio material, intelectual e cultural,
simultaneamente três dimensões: a) aprender bem como a vontade de se envolver, enquanto
ciência: relacionada com a aquisição e o cidadão consciente, em questões relacionadas
desenvolvimento de conhecimento conceitual; com ciência e com o conhecimento científico,
b) aprender sobre ciência: compreensão da constituem elementos essenciais da definição
natureza e métodos da ciência, evolução e de letramento científico.
história do seu desenvolvimento, bem como O Recommendation of the European
uma atitude de abertura e interesse pelas Parliament and of the Council on key
relações complexas entre ciência, tecnologia competences for lifelong learning (OJEU, 2006)
e sociedade; e c) aprender a fazer ciência: reconhece igualmente o papel das competências
dimensão relacionada com as competências basilares ao longo da vida para a construção
para desenvolver percursos de pesquisa participativa de um projeto político comum.
e resolução de problemas. Como referem A linguagem, a literacia, a competência
Cachapuz et al. (2004), importa atender ao fato matemática e as TIC constituem as ferramentas
de que o aprofundamento de tais dimensões fundamentais e coextensivas aos processos de
não é naturalmente o mesmo quando se trata da aprender e de aprender a aprender.
formação de futuros cientistas ou da perspetiva A articulação desejada entre a aprendi-
da educação para a cidadania. De igual modo, e zagem e a sociedade, instituindo um arco de
aprendizagem ao longo da vida, encontra-se
3- Para uma revisão do conceito de letramento digital, veja-se Bawden (2008). expressa no Memorando sobre Aprendizagem
962 Carla MORAIS; João PAIVA. Olhares e reflexões contemporâneas sobre o triângulo sociedade-educação-tecnologias...
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Carla Morais é Professora Auxiliar Convidada no Departamento de Química e Bioquímica (seção de Educação), da Faculdade
de Ciências da Universidade do Porto, Portugal. É membro da Unidade de Ensino de Ciências dessa Faculdade e do Centro de
Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP).
João Paiva é Professor Auxiliar, com agregação, no Departamento de Química e Bioquímica (seção de Educação), da
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, Portugal. É membro da Unidade de Ensino de Ciências dessa Faculdade
e coordenador do grupo de Química e Sociedade no Centro de Investigação em Química da Universidade do Porto (CIQUP).
964 Carla MORAIS; João PAIVA. Olhares e reflexões contemporâneas sobre o triângulo sociedade-educação-tecnologias...
Contribución para la enseñanza de las ciencias
naturales: saber mapuche y escolarI
Resumen
Palabras clave
I- El artículo es resultado de la estadía de
especialización en Québec, Universidad Laval,
proyecto UCT0804 MECESUP; comunica los Conocimiento mapuche — Relación con el saber — Ciencias
resultados del proyecto FONDECYT REGULAR naturales — Enfoque educativo intercultural.
N° 1110677 y 1110489.
II- Universidad Católica de Temuco,
Temuco, Chile y Université Laval, Québec,
Canadá.
Contactos: squintri@uct.cl; dquilaq@uct.cl;
III- Université Laval, Québec, Canadá.
Contacto: hector.torres-cuevas.1@ulaval.ca
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 965-982, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000009 965
Contribution for the Teaching of Natural Sciences:
Mapuche and school KnowledgeI
Segundo QuintriqueoII
Daniel QuilaqueoII
Héctor TorresIII
Abstract
Keywords
I- This paper is the result of a specialization Mapuche knowledge — Relationships to knowledge — Natural
stay in Quebec, Université Laval, UCT0804
MECESUP Project; it communicates the sciences — Intercultural educational approach.
results of the following projects: FONDECYT
REGULAR N° 1110677 and No 1110489.
II- Universidad Católica de Temuco,
Temuco, Chile and Université Laval,
Quebec, Canada.
Contacts: squintri@uct.cl; dquilaq@uct.cl
III- Université Laval, Quebec, Canada.
Contact: hector.torres-cuevas.1@ulaval.ca
966 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000009 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 965-982, out./dez. 2014.
Introducción articulación entre el conocimiento cultural y
el conocimiento escolar, para contextualizar la
Los métodos educativos mapuches, educación, a través de un enfoque educativo
utilizados en la educación familiar, han sido intercultural (QUINTRIQUEO; et al. 2011).
construidos y reconstruidos en relación con su El objetivo del presente artículo
desarrollo social, cultural, político, económico es vincular los contenidos conceptuales,
y espiritual. Aquí, se devela la relación con el procedimentales y actitudinales que subyacen en
saber de los métodos utilizados para enseñar a los métodos educativos propiamente mapuches,
los niños y jóvenes, basados en la racionalidad para revelar sus racionalidades, presentes
del conocimiento propio. Ésta, ha permitido en la relación con el saber, para aportar con
mantener vigente el conocimiento social, una base de conocimientos epistemológicos
espiritual y sobre la naturaleza en la memoria que fundamenten la implementación de una
social de los kimches o sabios, como expertos que educación intercultural en contexto mapuche,
guían la enseñanza, apoyándose en la educación en la asignatura de Ciencias Naturales.
familiar y escolar (QUILAQUEO, 2012). En ese
contexto, planteamos la hipótesis de trabajo Marco de referencia
en que la educación mapuche actual se realiza
considerando una doble racionalidad educativa, En el contexto familiar los saberes
permitiendo su subsistencia y adaptación al educativos mapuches admiten una base
formar a los niños y jóvenes en oficios como epistemológica que da cuenta de la sabiduría
machi (médica), logko (jefe), werken (mensajero), que proviene de los kimches y padres de
gürekafe (tejedoras), entre otros, tanto en familias que portan el conocimiento educativo
contextos rurales como urbanos. y cultural. Al mismo tiempo, estos saberes
En el razonamiento de la educación implican una racionalidad que le ha permitido
familiar, históricamente se han generado al pueblo mapuche subsistir con una identidad
desacuerdos entre la escuela y las familias sociocultural propia, en el ámbito personal,
mapuches, porque la educación escolar se familiar y comunitario (QUILAQUEO; et al.
fundamenta en contenidos eurocéntricos y el 2004). En la educación familiar, las personas son
monolingüismo en castellano. Sin embargo, formadas a partir de saberes y conocimientos
la racionalidad del conocimiento mapuche se culturales asociados a mitos, leyendas, relatos
construye en una relación con el saber, donde el orales, la historia de la ascendencia parental
componente central es la memoria social como y el territorio de procedencia de cada persona
conocimiento objetivo, subjetivo y resultado (QUINTRIQUEO; MUÑOZ, 2012). Quienes cultivan
de procesos de adaptación de la educación estos conocimientos se les reconoce como
familiar que expresan los kimches (QUILAQUEO; kimches. Éstos conocen los aspectos sociales
QUINTRIQUEO, 2010). Consecuentemente, y culturales de las familias y de las distintas
se asume que hay métodos propios que se comunidades territoriales, a partir de lo que
siguen reconstruyendo, para la formación de ellos denominan kuifike zugu o memoria social
las personas y la construcción de su identidad (LATCHAM, 1924; HOUSSE, 1939; NOGGLER,
sociocultural, desde la relación de saberes de 1972; QUILAQUEO, 2007). En esta perspectiva,
la escuela y la familia. La expresión concreta los métodos educativos mapuches son analizados
de esta relación se manifiesta en el diálogo considerando la relación con el saber (CHARLOT,
cultural de los estudiantes mapuches en las 1997; BEILLEROT, 1998; QUILAQUEO, 2007)
prácticas educativas de la escuela, expresada y la doble racionalidad sobre la cual enseñan
en la colaboración entre sabios mapuches y actualmente los padres de familias y los kimches
profesores. Este proceso permite avanzar en la (QUILAQUEO; QUINTRIQUEO, 2010).
968 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
como saber instituido, aceptable para una el alumno aprende un conjunto de información,
familia y comunidad, mediante su creación valores y prácticas socioculturales; 2) En el
histórico-social (CASTORIADIS, 2003). estado objetivado, donde el alumno conoce y
En el proceso de escolarización, la sabe acerca de prácticas socioculturales que le
relación con el saber se concibe en el marco de permiten relacionarse con objetos de saber y
las instituciones y del currículum escolar, donde 3) En el estado institucionalizado, en el que el
el vínculo personal con el saber emerge de una alumno adquiere un sello que asume una relación
pluralidad de proximidades institucionales, con el saber construido social y culturalmente,
en cuyo proceso las personas entran y se definiendo su forma de actuar con respecto a los
confrontan a los objetos de saber definidos e otros y evaluado en función de normas y valores
institucionalizados en la relación que establecen característicos de cada práctica (BRIAND;
con las instituciones (BERTHELOT, 1982; CHAPOULIE, 1993; MUTUALE, 2009; OLIVÉ,
BRIAND; CHAPOULIE, 1993; FALAVIGINA; 2009). Así, la relación con el saber en las tres
ARCANIO, 2011). En este sentido, la institución dimensiones, permiten pensar la construcción
se define como un sistema de prácticas sociales, de diferentes re laciones con el saber en las
constituida por grupos humanos, en las que trayectorias escolares y familiares, como
un saber existe como construcción social, que experiencias objetivas y subjetivas.
aparece en un momento específico, en acciones En contexto indígena, el enfoque
con fines determinados y utilizando medios educativo intercultural surge como una propuesta
específicos (OLIVÉ, 2009). Según Chevallard pedagógica, donde la subjetividad no es concebida
(1997), las prácticas sociales tienen un sentido como un obstáculo o como atentado contra la
de prácticas epistémicas que se construyen, se cientificidad, sino como fuente de conocimientos,
transmiten y se aplican, cuando un sujeto entra en la medida en que se reconoce el papel activo
en relación con un saber y se relaciona con una de los actores sociales que construyen su realidad
o más instituciones. Así, en contexto mapuche, (QUINTRIQUEO; TORRES, 2012; QUINTRIQUEO;
la escuela es un espacio social e institucional GUTIÉRREZ; CONTRERAS, 2012). Se valora así
donde el estudiante se forma relacionándose el componente de subjetividad e intersubjetividad
con prácticas socioculturales, mapuches y del conocimiento educativo mapuche, como un
no mapuches, tanto en forma objetiva como contenido que permite el diálogo de saberes en
subjetiva (QUINTRIQUEO, 2010). Entendida así la construcción de un conocimiento científico
la relación con el saber, aunque es singular y que parte del saber común y en cuya trama están
construida en correspondencia con la historia escondidos los significados y los sentidos de las
de cada persona, se enmarca en una dinámica acciones que emprenden los actores sociales
familiar, social, institucional e histórica. Es un en la vida cotidiana (MUTUALE, 2009). En esta
proceso dinámico que cambia a lo largo de la perspectiva, es urgente considerar los saberes
vida, a partir de lo que sabemos o no y de la educativos mapuches a partir de su racionalidad.
forma en que nos situamos en relación a estos El concepto de racionalidad de la educación
saberes y al hecho mismo de saber o de no mapuche, actualmente, lo podemos asociar con
saber, permitiéndonos adquirir nuevos saberes la noción de conocimiento como construcción
(HATCHUEL, 1999). y uso social que se le da. Al respecto, tanto la
En esa perspectiva, en el contexto educación escolar como la educación mapuche
escolar no podemos pensar la construcción de desempeñan una función vital, porque
conocimiento sin tener en cuenta los capitales posibilitan que el sujeto mapuche acceda a los
culturales y escolares que los sujetos adquieren códigos de la racionalidad en un contexto de
a lo largo de su trayectoria de vida, en tres diversidad sociocultural determinado. En ese
momentos: 1) En el estado incorporado, donde sentido, Habermas considera racional
970 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
históricos sobre La Araucanía, permiten (tesistas y egresados de la carrera de Pedagogía
comprender que el desarrollo del Pueblo en Educación Básica Intercultural de la
Mapuche se remonta a tiempos ancestrales. Al Universidad Católica de Temuco). Cada agente
respecto, Dillehay señala que en la zona Centro- clave ha facilitado el ingreso a las siguientes
Sur de Chile se constata que: comunas y sectores de la región: 1) Padre Las
Casas, sector Xüf-Xüf y Nueva Imperial, sector
(…) el largo período arcaico o Rulo, ubicadas en el área Wenteche; 2) Lumaco,
precerámico, desde alrededor del 7.000 sector Pantano y Quetrahue, ubicada en el
a.C. hasta aproximadamente 400-500 área Nagche; y 3) Saavedra, sectores Ranco,
d.C., durante el Formativo o el comienzo Daullico, Naupe, Dollinco y Collico , ubicada en
del período cerámico hasta 1000-1300 el área Lafkenche.
d.C., existieron asentamientos humanos La muestra total del trabajo de campo se
pequeños y dispersos lo que sugiere compone de 32 kimches, siendo entrevistados
la presencia de economías mixtas, 16 hombres y 16 mujeres. La edad de los
relativamente igualitarias, de cazadores kimches es heterogénea y fluctúa entre los 45
y recolectores, tribus incipientemente y 85 años de edad. Respecto a la ocupación
horticultores, y tal vez pequeñas jefaturas que desempeñan en su contexto familiar y
agrícolas (…) (2002, p. 174). comunitario se indica lo siguiente: 15 señalan
dedicarse a la agricultura, 12 como dueñas de
Es decir, los antecedentes arqueológicos casa, 3 como autoridad tradicional (lonko) y 2
evidencian la ocupación y transformación del como tejedoras.
territorio habitado por la población mapuche El instrumento de recolección de
durante milenios. Por ejemplo: Complejo Pitrén información utilizado fue la entrevista semi-
(400-1.100 d.C.) y Complejo El Vergel (1.000- -estructurada, que se aplicó en castellano
1.500 d.C.). A partir del siglo XVI se puede a cada uno de los kimches participantes de
identificar según el Informe de la Comisión de la investigación (CORBETTA, 2003), para
Trabajo Autónomo Mapuche (COTAM, 2003), identificar los métodos educativos asociados a
que el territorio mapuche, en lo que hoy es Chile, contenidos fundamentados en el conocimiento
se extendía entre el río Limarí, por el Norte, hasta cultural mapuche. Para realizar la aplicación
la Isla Grande de Chiloé, por el Sur, desde la de cada una las entrevistas se aplicó el
Cordillera de Los Andes al mar Pacífico. Mientras siguiente procedimiento: 1) Generar un primer
que en la actual Argentina, se extendía entre el encuentro con cada kimche, con la colaboración
río IV y el río Diamante, por el Norte, hasta el de egresados de la carrera de Pedagogía en
río Limay por el Sur, siendo su límite Este el río Educación Básica Intercultural, que realizaron
Salado en las cercanías de Buenos Aires y al sus tesis de grado en el marco de los proyectos
Oeste, la Cordillera de Los Andes. FONDECYT1, quienes en general provienen de
Considerando lo planteado, el trabajo dichas comunidades; 2) Concertar el día de la
de campo se realizó en territorios habitados entrevista, considerando la disposición de la
históricamente por población mapuche, en persona; 3) Asistir el día definido por cada kimche
tres áreas territoriales ubicadas en la región a su lugar de residencia; 4) Presentar, revisar y
de La Araucanía, Chile: Nagche (gente que firmar el consentimiento informado; 5) Solicitar
habita las tierras bajas), Wenteche (gente que la autorización para grabar la conversación; y
habita las planicies) y Lafkenche (gente que
habita el Borde Costero del Océano Pacífico). 1- Proyectos financiado por el Fondo de Desarrollo Científico y Tecnológico
(FONDECYT): “Tipificación de los métodos educativos mapuches” y
Con el propósito de favorecer el acceso a cada “Epistemología del conocimiento mapuche y el escolar: un análisis desde la
área territorial se trabajó con agentes clave pedagogía intercultural…”
972 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
3) Ciclo del küyen (fases lunares), se encuentra indicados para sembrar y plantar y 4) Vida
asociado con la observación de las fases del küyen saludable, se asocia con el código alimentación
y su relación con la determinación de los tiempos mapuche, prevención y autocuidado de la persona.
Figura 1- Red conceptual n. 1. Asignatura Ciencias Naturales asociada con métodos educativos mapuche
ASIGNATURA CIENCIAS
NATURALES
is associated with
is p is pa t of
art rt of is par
t of is part o
f rt of is par
of is pa
Günezuam
Kimkintum Güneytun Gübam Pepilün
Güxam
Relación con el medio natural ekun como una forma de respeto en la relación
con el medio natural,
El respeto a la naturaleza se constata como
un aspecto vital en la formación de los niños y [...] para aprender a comportarse, para
jóvenes, siendo su propósito desarrollar una actitud prevenir accidentes y evitar actitudes que
basada en el equilibrio y armonía en la relación dañen la relación con fuerzas sobrenaturales
con el medio natural, lo cual alcanza un 21,4% de como los gen o fuerza espiritual que
recurrencia, de un total de 173 frecuencias. Dicho resguarda el espacio natural. (KL3 [41:41])
valor es aprendido mediante el método gübam,
como un conocimiento que sustenta un estilo de Por lo tanto, el respeto a la naturaleza
vida, en el que la persona se siente parte de la engloba todo el marco de relaciones que se
naturaleza. En este sentido, las personas deben generan con la Tierra, donde se incluye la
ser conscientes de códigos socioculturales clave relación con los animales, los vegetales y el
en la interacción cotidiana con la naturaleza. Se agua. En la base del proceso de relación con la
señala que para los mapuches la naturaleza se naturaleza están los valores y procedimientos
debe respetar “porque es una de las cosas más que configuran los contenidos de la educación
importante y es lo primero que se le enseña a los familiar de los niños y jóvenes.
niños, sea hombre o mujer” (K13X [22:22]). En el En la educación familiar, pedir permiso
discurso de los kimches se reconoce el concepto para ingresar en espacios naturales alcanza una
974 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
Bajo este marco, los niños y jóvenes Ciclo del küyen
se exponen a una formación en la acción,
participando activamente en la crianza de los El conocimiento con respecto al tiempo
animales, para aprender y comprender procesos para sembrar alcanza una recurrencia del 8,1%,
asociados con la alimentación de los mismos, esto se encuentra asociado a la definición de las
su reproducción, la forma de atenderlos cuando fases del küyen (fases lunares) para desarrollar
se enferman y los productos que aportan a la el trabajo de la siembra de cereales y la huerta.
vida familiar. El conocimiento sobre el uso de De esta forma, en la educación familiar el
los vegetales alcanza una recurrencia del 12,7%, aprendizaje de estos contenidos se desarrolla a
de lo que los niños y jóvenes mapuches deben través de métodos como el güneytun y asociado
aprender sobre la vegetación del medio natural. a la ejercitación de procesos de observación de
Es decir, a través de métodos como el pepilün las fases lunares. En el testimonio de un kimche
y el güxam se busca desarrollar el aprendizaje se destaca lo siguiente:
para aplicar, dominar y distinguir los tipos
de vegetales (árboles, plantas, arbustos), sus […] para saber cuándo sembrar miro la
características y la utilidad en el diario vivir. Una luna y se siembra cuando es luna llena.
kimche señala: Por ejemplo, en abril empezaba la gente
a sembrar, ahora parece que siembran en
[...] a los niños se les debe enseñar a cuidar mayo[…]. (K11X [88:88])
las plantas. Enseñarles para qué sirven, que
conozcan las plantas medicinales, los nombres Entonces, la observación constituye
que tienen, el tiempo para recolectarlos y un aspecto clave en la definición de tiempos
cómo ocuparlas. (K13X [100:100]) apropiados para sembrar, identificándose dos
fases: luna menguante y luna llena. “La valoración
El conocimiento sobre el cuidado de los de ambos períodos se debe a que benefician un
animales alcanza una recurrencia del 9,2%, mejor crecimiento de los vegetales (K4L [98:98]).
asociado al trato cariñoso y respetuoso que Por el contrario, no es recomendable sembrar o
sustenta su crianza doméstica. Al igual que la plantar en luna nueva, porque se limita el buen
crianza de animales los niños y jóvenes aprenden desarrollo de los vegetales. En este sentido, los
por medio de métodos como el kimkintun. Es niños y jóvenes necesitan aprender a reconocer
decir, la persona aprende por medio de actividades las fases lunares apropiadas para sembrar y
concretas las funciones vinculadas al cuidado plantar vegetales (K17S [91:91]).
como: 1) Saber alimentarlos; 2) Saber atender La observación de las fases del küyen
los partos y conocer los tiempos de reproducción (luna) alcanza una recurrencia del 8,1%, como
y 3) Preparar remedios en situaciones de parte importante de la identificación de los
enfermedad. Esto se relaciona con el gübam, períodos asociados al recorrido de las fases
consejos para mantener una actitud responsable lunares y su relación con procesos sociales,
en el cuidado de los animales. Al respecto una culturales, biológicos y productivos. De esta
kimche señala: “Antes los viejos daban consejo forma, en el medio familiar se utilizan métodos
para cuidar ovejas, enseñaban la forma de cuidar como el güneytun y el güxam con el propósito
animales, por eso dejábamos de ir al colegio, que los niños y jóvenes aprendan a distinguir los
porque teníamos que cuidar las ovejas…” (K10X períodos de las fases lunares. Un kimche señala:
[39:39]). Así, los niños y jóvenes son preparados
por los mayores para realizar un buen cuidado Los niños debieran aprender sobre la luna.
de los animales, ya que se reconoce como un Antes los abuelos nos hablaban del we küyen
pilar fundamental de la economía familiar. (luna nueva) y ahora los niños no saben
976 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
reproducción, el parto, el cuidado y la producción y respetarse recíprocamente en la relación de
de productos que benefician la vida familiar. uso, aprovechamiento, producción y protección
Asimismo, con respecto al conocimiento sobre de la naturaleza. Así, los aspectos que son
la naturaleza los métodos educativos están en incorporados a la educación familiar de los
relación a la identificación de nombre de plantas, niños y jóvenes, se relacionan con una base
animales y la codificación de elementos, sucesos de conocimientos para formar la actitud de las
y hechos que configuran el nombre del espacio personas y mantener una relación de equilibrio
físico, geográfico, territorial y los ecosistemas. y de armonía con los entes sobrenaturales que
También, en relación a los tiempos para cultivar, habitan el medio natural.
recolectar y cosechar, la producción de la Según Beillerot (1998) en la relación con
medicina para el tratamiento de enfermedades el saber distingue el imitador del transgresor y
locales, de las personas y los animales, y hacer el deseo de aprender del deseo de saber, como
uso adecuado de los recursos que entrega la dos mo dalidades diferentes de relacionarse
naturaleza. En consecuencia, los métodos para con los saberes. Afirma que el imitador desea
la enseñanza y el aprendizaje están en relación aprender, el transgresor desea saber. La figura
permanente con la observación empírica de del aprendiz es la de aquel que aprende el
elementos objetivos, subjetivos, intersubjetivos y saber en conformidad, para quien el saber es
espirituales de la realidad como objeto de saber un objeto determinado, cerrado y construido.
asociado a las prácticas socioculturales (OLIVÉ, En tanto, la figura del transgresor es la de
2009; OSES, 2009; QUILAQUEO; FERNÁNDEZ; aquel que aprende al margen de las normas o
QUINTRIQUEO, 2010; FALAVIGINA; ARCANIO, en contra de ellas, para quien el saber es una
2011). Esto se observa, por ejemplo, en la interrogación. Por su parte en el conocimiento
recolección de vegetales para uso alimenticio, mapuche el aprendizaje está asociado a los
medicinal, ceremonial, espiritual en el medio siguientes métodos educativos: 1) Inatuzugu,
familiar y comunitario como prácticas que cuyo significado es estudiar, buscar e indagar en
configuran la relación con el saber. el conocimiento que ya existe para lograr una
Lo explicitado favorece el desarrollo de comprensión de procesos, fenómenos, hechos,
los siguientes aspectos en la educación de niños sucesos e interpretar la realidad desde una
y jóvenes: 1) Desde un aspecto conceptual se racionalidad propia; 2) Nampülkan, explicitada
enseña el nombre de los vegetales, lo que va como la racionalización y representación del
acompañado de la generación de criterios viaje por el territorio como también una forma
de clasificación de acuerdo al origen, uso y de interpretar la memoria individual y social,
forma de los vegetales; 2) Desde un aspecto para aprender y comprender sobre la realidad
valórico, se enseña el respeto a la naturaleza como producto de la propia experiencia y
en el proceso de obtención y relación con su confrontación con otras realidades; 3)
las fuerzas espirituales que protegen a los Mümülkan, como método para entender procesos
vegetales y de los elementos del medio natural de construcción de conocimientos con respecto
y 3) Desde lo procedimental se enseña la a un objeto (natural, artístico y tecnológico),
utilización de los vegetales; principalmente para ordenar el propio conocimiento y la
lo referido a las aplicaciones medicinales, formación de las personas y 4) Zapilüwün, este
alimenticias y ceremoniales. Todo este proceso método se refiere a una lógica para aprender y
metodológico de enseñanza de contenidos comprender el desarrollo de las cosas y de las
conceptuales, valóricos y procedimentales, se propias personas como producto del cultivo que
enmarca en el respeto a günechen y los gen, encierra intereses, contenidos y finalidades. En
como fuerzas espirituales que definen una el caso mapuche constatamos que los métodos
base de la racionalidad mapuche para respetar referidos al aprendizaje como imitador son el
La ciência occidental se enfoca en lograr la construcción de Los saberes se construyen a nivel subjetivo e intersubjetivo, articulándose la
conocimientos objetivos y universales. La diversidad es vista de experiencia, el saber dei pasado, el contexto de vida local, la espiritualidad. La
manera problemática y necesita ser superada. diversidad es vital para el desarrollo de la naturaleza y la persona.
Fuente: Elaboración sobre la base de los autores Escobar (2010) y Olórtegui (2007).
978 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
El cuadro n°1 muestra dos situaciones. mapuches. En consecuencia, se propone generar
Primero, la distancia epistemológica entre el una educación intercultural que incorpore
conocimiento escolar y los saberes educativos saberes socioculturales como un conjunto de
mapuches. Segundo, la necesidad de proponer principios y de prácticas de las familias y las
la ruptura epistemológica con el conocimiento comunidades que le dan estatus epistemológico
dominante de las ciencias occidentales que al conocimiento educativo mapuche en el
es sintetizado e incorporado en los marcos contexto escolar. Esto permitirá dar sentido a las
de referencia en Ciencias Naturales. De relaciones socioculturales ligadas a la relación
esto se desprende un marco de acción que con el saber en las actividades cotidianas
compromete ambas matrices epistémicas en el medio familiar, en su relación con la
en el contexto escolar, en el sentido de naturaleza y el aprendizaje escolar. Finalmente,
avanzar hacia una transdisciplinariedad, las investigaciones educativas en contexto
que favorezca la incorporación de métodos mapuche permiten avanzar en la construcción
educativos configurados por racionalidades de una epistemología pluralista, contextual, que
que no responden a posiciones hegemónicas, aporte a comprender y explicar las diferentes
y que articulan saberes ambientales. Este posibilidades de validez y legitimidad del
proceso permitiría superar progresivamente conocimiento indígena en relación a procesos
el desprecio epistemológico del conocimiento de construcción, transmisión, apropiación social
educativo indígena en el contexto escolar, y aplicación, como base para la formación de
para avanzar hacia un diálogo intercultural personas en diferentes niveles educativos:
más simétrico (TUBINO, 2011). preescolar, básica, media y universitaria. Al mismo
En conclusión, este estudio nos tiempo, contribuir con categorías de contenidos
ha permitido develar prácticas culturales educativos fundados en la racionalidad de los
tradicionales, como métodos educativos métodos educativos mapuches en el contexto
mapuches, dotados de contenidos epistémicos escolar, lo cual permita mejorar procesos de
que permiten mejorar el aprendizaje escolar de intervención educativa intercultural, en base a
todos los estudiantes en la enseñanza de las objetos y redes sociales de colaboración mutua
ciencias naturales, sean éstos mapuches y no entre familia-escuela-comunidad.
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Segundo Quintriqueo es doctor en Educación, profesor asociado de la Universidad Católica de Temuco, Chile, investigador
del Centro de investigación en Educación en Contexto Indígena e Intercultural (CIECII) del Núcleo de Iniciativa Científica
Milenio (ICM), investigador Titular del Núcleo de Estudios Interétnicos e Interculturales (NEII) de la UC Temuco e investigador
asociado del Centre Interuniversitaire d’Études et de Recherches Autochtones (CIÉRA) de l’Université Laval, Québec, Canadá.
Daniel Quilaqueo es doctor en Sociología, investigador responsable del Núcleo Milenio CIECII, profesor titular de la Facultad
de Educación de la UC Temuco, investigador titular del Núcleo de Estudios Interétnicos e Interculturales (NEII) de la UC
Temuco y también es investigador Asociado del Centre Interuniversitaire d’Études et de Recherches Autochtones (CIÉRA) de
l’Université Laval, Québec, Canadá.
Héctor Torres es estudiante de Doctorado en Antropología e investigador joven del Centre Interuniversitaire d’Études et de
Recherches Autochtones (CIÉRA) de l’Université Laval, Québec, Canadá.
982 Segundo QUINTRIQUEO; Daniel QUILAQUEO; Héctor TORRES. Contribución para la enseñanza de las ciencias...
Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na
formação de professores de ciências
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 983-998 out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121459 983
Epistemological views and educational research in the
science teacher education
Abstract
Keywords
984 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121459 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 983-998, out./dez. 2014.
Introdução tradicionais manuais de pesquisa. Esses
“reducionismos” poderão ser superados
Tanto as discussões atuais no campo intensificando a formação filosófica dos
acadêmico como a legislação referente à educadores e principalmente sua formação
formação docente tendem a apresentar um epistemológica. (GAMBOA, 2012, p. 105)
modelo de formação interdisciplinar ou
transdisciplinar, que rompa com um modelo Sempre que estamos no campo
disciplinar fechado e fragmentado e possibilite da epistemologia, fazemos filosofia do
ao professor uma visão mais aberta, crítica e conhecimento científico. Seja esta filosofia,
relacional da sua área de conhecimento com reflexão ou teoria da ciência desenvolvida
os demais saberes e da própria reformulação por filósofo ou cientista, não mudará a sua
da concepção de ciência. No entanto, ainda é natureza filosófica, uma vez que as questões
possível observar nos cursos de licenciatura a epistemológicas são questões filosóficas que
persistência de uma perspectiva reducionista permanecem em aberto.
de formação docente, que tende a reproduzir O texto nasceu de uma preocupação
eufemisticamente uma formação bacharelesca, didática num contexto de ensino, da necessidade
com um verniz de licenciatura. Tal perspectiva sentida em sala de aula de ter um recurso
reducionista leva a considerar o ensino como a introdutório e didático que possibilitasse discutir
transmissão de conteúdos de áreas específicas com acadêmicos de licenciaturas a importância
(física, química, biologia...). Por essa ótica, um e o papel das epistemologias na formação de
bom professor será formado para dominar e professores, especialmente dos professores de
transmitir o conteúdo de sua área. ciências. Nesse sentido, o texto é limitado em
No contexto atual de crise da razão sua pretensão teórica, não podendo dar conta
e mudanças paradigmáticas, a formação de questões epistemológicas outras (como a
docente não pode mais contentar-se com natureza da ciência, o ceticismo, o relativismo)
uma perspectiva reducionista. No bojo dessas que requerem uma discussão específica, pois
mudanças repercutidas na educação em envolvem conceitos complexos de verdade e
ciências, alguns estudos vêm demonstrando de de ciência, remontando a um longo percurso
forma consensual a relevância da epistemologia histórico e filosófico.
na formação e no exercício profissional dos O propósito do texto é apresentar, de
professores de ciências (PORLÁN; GARCÍA; forma introdutória e didática, algumas das
POZO, 1998; PRAIA; CACHAPUZ; GIL-PÉREZ, principais abordagens epistemológicas no campo
2002). A formação acadêmica e a produção da educação (materialismo histórico dialético,
do conhecimento científico pressupõem a positivismo, fenomenologia, estruturalismo e
pesquisa, que por sua vez envolve a questão complexidade). A sua organização é feita de
epistemológica, ou seja, como apreendermos o forma a oferecer uma compreensão conceitual e
real. Em termos de produção de conhecimento as categorias norteadoras de cada epistemologia
filosófico ou científico, não nos é possível e, por fim, buscar os elementos de procedimentos
iniciar e levar a cabo tal produção sem o aporte metodológicos para a pesquisa educacional.
epistemológico e metodológico: Cada uma dessas epistemologias é abordada a
partir da metáfora do olhar, na relação entre
A falta da formação filosófica reduz a sujeito e objeto do conhecimento.
problemática da pesquisa científica a uma Quando opto pela metáfora do olhar,
simples questão de opções técnicas relacio- tenho consciência da ruptura bachelardiana
nadas à seleção de alguns encaminhamen- em relação à hegemonia da ocularidade na
tos, fórmulas ou receitas, apresentados nos tradição filosófica ocidental. Nesse sentido, o
986 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
dos seus resultados, sobre o papel da neutralidade, dicotomia sujeito-objeto, verdade
comunidade científica e suas relações única e absoluta, elitismo) (CAVALCANTI;
com a sociedade. [...] a epistemologia SILVA; MACÊDO, 2013).
ajuda os professores a melhorarem as Uma epistemologia, enquanto teoria do
suas próprias concepções de ciência e a conhecimento científico, busca explicitar o
fundamentação da sua acção pedagógico- processo de produção da ciência, fornecendo
didáctica. (2002, p. 128). uma elucidação da natureza da ciência,
o critério de cientificidade, a maneira de
No contexto contemporâneo, em que intelecção e explicação científica da realidade.
a ciência é posta em questão, não é possível É fundamental que, na formação docente,
pensar a formação docente à margem das especialmente de professores de ciências,
discussões epistemológicas. No paradigma e na pesquisa educacional, a dimensão
científico da modernidade, a ciência é vista epistemológica esteja presente como um grande
como um conhecimento racional, universal, pano de fundo que perpassa e interliga educação
que aspira à formulação de leis, à luz de e ciência, ensino e pesquisa.
regularidades observadas, com vistas a prever A pesquisa educacional integra a forma-
o comportamento futuro dos fenômenos. Daí o ção e a profissionalidade docente, isto é, o pro-
mundo mecanicista do racionalismo cartesiano fessor forma-se pela pesquisa e pela pesquisa
e da mecânica newtoniana reduzindo a também exerce a docência. No entanto, não há
complexidade do mundo a leis simples de um pesquisa propriamente dita sem uma base epis-
conhecimento utilitário e funcional que aos temológica. Assim, para se formar o professor
poucos avançou de um estudo da natureza para pesquisador, há que se enfrentar o desafio da
o estudo da sociedade (CAVALCANTI; BRUSSIO, formação epistemológica e a consequente dis-
TOURINHO, 2006). Tal paradigma consolidou cussão sobre os olhares epistemológicos.
a imagem de ciência que ainda perdura na
formação docente e na orientação de boa parte O olhar em movimento
do ensino e das pesquisas realizadas pelos
professores de ciências. Na crise paradigmática O olhar em movimento é característico
que vivenciamos, assistimos à emergência de da dialética, é um olhar que busca captar o
novos olhares epistemológicos, que aos poucos objeto na sua totalidade, desde uma perspectiva
passam a influenciar tanto a formação como histórica de mudanças e contradições. Esse
a prática docente. Ter ciência desse campo de olhar foi introduzido na tradição filosófica
batalha epistemológico faz parte da agenda ainda na antiguidade grega por Heráclito.
formativa dos professores. Passou um longo tempo esquecido e, só a
Não existe professor de ciências sem partir da filosofia de Hegel (1770-1831), a
uma epistemologia de fundo, sem uma base concepção dialética da realidade foi retomada
epistemológica que lhe dê sustentação para na história do pensamento ocidental. Karl
o seu trabalho pedagógico. Mesmo que essa Marx (1818-1883) e Friedrich Engels (1820-
epistemologia esteja subjacente, de forma 1899) deram continuidade ao pensamento
implícita, inconsciente e acrítica, ela permanece dialético, rompendo, contudo, com o idealismo
orientando a prática docente. A ignorância ou hegeliano e concebendo a dialética com base
o silêncio sobre as bases epistemológicas na no materialismo histórico. Do ponto de vista
formação dos professores é condição relevante educacional, o materialismo histórico-dialético
para uma prática docente que fossiliza uma exerce forte influência, especialmente pelas
imagem distorcida da ciência, que corrobora para contribuições filosóficas de Antonio Gramsci, o
a manutenção do status quo (individualismo, sociointeracionismo advindo de Lev Vygotsky,
988 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
ou qualitativos. Quantidade e qualidade estão positivismo é caracterizado como uma corrente
dialeticamente em relação. Portanto, para analisar filosófica que defende o primado da ciência
o fenômeno pesquisado, devemos estabelecer a no conhecimento da realidade. Nessa corrente,
relação quantidade e qualidade. toda a concepção da realidade, parte da adoção
e) Lei do desenvolvimento em espiral – do método das ciências naturais como única
o objeto por nós estudado deve ser tomado na possibilidade de conhecimento do real.
continuidade do movimento da totalidade na Partindo de uma concepção da “evolução
qual está inserido. Ele pode ser uma superação intelectual da humanidade”, Comte conclui
de algo que o antecedeu, mas também pode ser que qualquer especulação que façamos sobre
superado. Mas o pesquisador deverá perceber o “indivíduo” ou a “espécie” passará por três
que o passado e que a possibilidade do devir se estados teóricos: o teológico, o metafísico e o
encontram no fenômeno por ele estudado. positivo. No entanto, o estado positivo constitui
Podemos sinteticamente concluir o o ápice da evolução humana, quando a
seguinte acerca da pesquisa que se proponha humanidade atinge a sua maturidade e adquire
numa abordagem dialética: o seu objeto, seja a capacidade de conhecer efetivamente o real.
ele qual for, deverá ser estudado na sua relação Contrapondo-se à teologia e à metafísica,
com a totalidade da qual é parte. O pesquisador afirma que, no estado positivo,
dialético não isola o seu objeto do contexto
maior no qual está inserido. Da mesma forma, [...] o espírito humano renuncia de vez às
o pesquisador dialético não se aproximará pesquisas absolutas, que só convinham à
do seu objeto como se ele fosse estático. Ao sua infância. Circunscreve seus esforços ao
contrário, o apreenderá nas suas contradições domínio, que agora progride rapidamente, da
internas, percebendo o seu movimento e verdadeira observação, única base possível de
as possibilidades de mudança. Assim, o conhecimentos verdadeiramente acessíveis,
pesquisador dialético buscará conhecer para sabiamente adaptados a nossas necessidades
transformar o conhecido e, dialeticamente, ao reais. Reconhece de agora em diante, como
fazer isso, também se transformará. regra fundamental, que toda proposição que
não seja estritamente redutível ao simples
O olhar de fora enunciado de um fato, particular ou geral,
não pode oferecer nenhum sentido real e
O olhar que toma distância do inteligível. A revolução fundamental, que
seu objeto, o olhar de fora, é o olhar do caracteriza a virilidade de nossa inteligência,
positivismo. O positivista busca quantificar consiste essencialmente em substituir em
e mensurar o objeto, de tal forma que a sua toda parte a inacessível determinação das
descrição esteja imune da subjetividade daquele causas propriamente ditas pelas simples
que o descreve. Esse olhar que pretende a pesquisas das leis, isto é, relações constantes
objetividade e a neutralidade já era buscado que existem entre os fenômenos observados.
nas filosofias modernas do empirismo (Bacon) (COMTE, 1973, p. 55).
e do racionalismo (Descartes). Coube a Augusto
Comte (1798-1857) a elaboração de uma síntese O positivismo, enquanto uma teoria que
entre empirismo e racionalismo, resultando no busca explicar a realidade, tratará a realidade
positivismo. Se Comte é considerado o grande a partir dos fatos e, a exemplo das ciências
idealizador do positivismo, Émile Durkheim naturais, buscará descobrir as leis necessárias e
(1855-1917) é por sua vez o teórico que forneceu universais presentes nos fenômenos. Os fatos se
as bases metodológicas para a produção do apresentam para o positivismo dentro de uma
conhecimento na perspectiva positivista. O realidade, de um todo, que observa uma ordem
990 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
é de forma objetiva e neutra. E ao fazer isso, o não escutamos uma aparência de música, mas
pesquisador positivista conservará o seu objeto a música, muito embora, essa música seja
e a si próprio, pois buscará a identidade das um fenômeno vivenciado no aqui e agora,
coisas sem as suas contradições internas. seja contingente, nesse fenômeno, nossa
consciência não capta só o que é aparente, ela
O olhar de dentro capta também uma essência, de tal forma que
identificamos o que escutamos como música,
O olhar de quem está inserido, ou seja, intuímos o que ela é essencialmente
vivenciando um fenômeno; o olhar de dentro é e não apenas a sua particularidade. Por isso,
o da fenomenologia. A postura fenomenológica Husserl define a fenomenologia como “a
e semelhante àquela do etnólogo: há que se doutrina das vivências em geral, [...] a doutrina
vivenciar, estar presente, para se interpretar e das essências” (HUSSERL, 1996, p. 207), cujo
compreender os fenômenos a partir dos sujeitos conhecimento das essências se dá pela intuição
de processo, num determinado momento. A eidética, ou seja, nossa consciência capta, nos
fenomenologia surge antepondo-se criticamente fatos particulares, as essências.
ao positivismo e ao psicologismo do final do
século XIX e início do século XX. O principal A fenomenologia não é ciência dos fatos,
nome da fenomenologia é o filósofo Edmund e sim ciência de essências. Para o fenome-
Husserl (1859-1938). A ele se atribui a criação nólogo, não interessa a análise desta ou
da filosofia e do método fenomenológicos, daquela norma moral, porém compreender
muito embora o uso do termo fenomenologia por que esta ou aquela norma são normas
e algumas de suas ideias já terem indícios ou morais e não, por exemplo, normas jurídi-
precedentes na história da filosofia. cas ou regras de comportamento. Da mes-
A intenção inicial de Husserl era tornar ma forma, o fenomenólogo não se interes-
a filosofia uma ciência rigorosa que fosse a sará (ou, pelo menos, não se interessará
base segura, um conhecimento apodítico, para principalmente) em examinar os ritos e os
todas as ciências. Por isso, era necessário fazer hinos desta ou daquela religião; ao contrá-
a “redução fenomenológica”, como veremos rio, ele se interessará por compreender o
adiante, para atingir os fenômenos como eles se que é a religiosidade, ou seja, o que trans-
apresentam à consciência, ou seja, as essências forma ritos e hinos tão diferentes em ritos
(eidos). Para Husserl, o conhecimento começa e hinos religiosos.
com a experiência de coisas existentes, de fatos, [...] Eis, portanto, o que a fenomenologia
de fenômenos que se apresentam à consciência. pretende ser: ciência, fundamentada
O fenômeno é “tudo aquilo que é vivência, na estavelmente, voltada à análise e à descrição
unidade de vivência de um eu” (HUSSERL, 1996, p. das essências. (REALE, 1991, p. 555).
207). Assim, tudo o que se apresenta à consciência
é um fenômeno, um fato dado no aqui e agora É em Franz Bretano (1838-1917) que
para o sujeito que o vivencia. Contudo, quando a Husserl encontra a inspiração para o conceito
consciência intenciona um fenômeno contingente central da fenomenologia: a intencionalidade.
que a ela se apresenta, capta-se no fenômeno uma Para Bretano, a consciência sempre está
essência. Portanto, para o pensamento husserliano direcionada para algo, é sempre consciência
devemos superar a contraposição subjacente entre de alguma coisa. Husserl retoma esse conceito
aparência e essência, onde o fenômeno é apenas a de intecionalidade da consciência. Para ele, a
aparência da coisa em si. “consciência não é uma substância (alma), mas
Assim sendo, podemos compreender, uma atividade constituída por atos (percepção,
por exemplo, que, ao escutar uma música, imaginação, especulação, volição, paixão etc.),
992 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
entanto, a vivência é singular e subjetiva. sabe que é um intérprete. E, também buscando
Como então podemos obter um conhecimento compreender a descrição desses sujeitos, o pes-
apodítico, partindo da vivência? Não cairia a quisador fará a epoché, que identificará a con-
fenomenologia num solipsismo? A resposta sistência dos discursos, depurando-os do que é
de Husserl será a noção de intersubjetividade. secundário e manifestando o que é essencial,
Para ele, a fenomenologia é conhecimento das através das convergências dos discursos. Chega,
essências e essas são universais. Uma vez que assim, a uma generalização, não mais a uma
o sujeito realizou a epoché, o que ele vivencia descrição individual do fenômeno. Essa genera-
é a essência do fenômeno. Portanto, o que é lização contribuirá, junto com outras de outros
universal e válido para todos os sujeitos: “O pesquisadores, para compreender o fenômeno
mundo que eu conheço – diz Husserl – é o mundo em sua inteireza.
que pode ser conhecido por todos” (TRIVINÕS,
1987, p. 46). Assim, a validade e a universalidade O olhar por baixo
do conhecimento são garantidas pela
intersubjetividade. Transportando para o campo O olhar por baixo ou por trás, aquele que
da pesquisa, dizemos que a verdade do fenômeno busca captar o que dá sustentação, o que alicerça
não é a minha interpretação individual, subjetiva os fenômenos sociais, independente dos seus
e isolada enquanto pesquisador, ela é apenas condicionamentos históricos, ou seja, a estrutura.
uma percepção, uma perspectiva, que iluminará Esse é olhar do estruturalismo. Surgido no início
junto com outras perspectivas de outros sujeitos, do século XX, o estruturalismo tem em Ferdinand
outros pesquisadores, o fenômeno estudado. de Saussure (1857-1913), na linguística, e Claude
Podemos sinteticamente concluir o Lévi-Strauss (1908-2009), na antropologia, seus
seguinte acerca da pesquisa que se proponha numa maiores formuladores. O estruturalismo é, no
abordagem fenomenológica: o objeto de pesquisa entanto, um complexo teórico muito abrangente
é visto como um fenômeno que se manifesta à e diversificado que perpassa além da linguística
consciência do pesquisador. Este, por sua vez, e da antropologia, a filosofia, a história, a
intenciona o fenômeno, sente-se atraído por ele psicologia, a sociologia. Em termos educacionais
e, por vivenciá-lo numa determinada situação, ,o estruturalismo teve forte influência da
busca compreendê-lo. Mas, para compreendê-lo sociologia de Pierre Bourdieu e especialmente do
o pesquisador deverá inicialmente fazer a epoché, construtivismo advindo de Jean Piaget.
ou seja, deverá questionar tudo o que sabe sobre Do ponto de vista filosófico, o
o fenômeno, pôr entre parênteses os seus juízos estruturalismo representa uma reação ao
e conhecimentos, sejam eles de que ordem for existencialismo. Esse último, na esteira
(crenças, preconceitos, teorias, explicações etc.). do método fenomenológico, acentuava a
O fenomenólogo compreenderá também individualidade e a autonomia do sujeito, do
que o fenômeno que estuda não é uma “coisa”, “eu”, como um ser livre e autor da sua história.
mas envolve a vivência humana daqueles que Os estruturalistas, ao contrário, observaram que
estão implicados no fenômeno. Portanto, o pes- esse eu-sujeito-indivíduo livre não existe senão
quisador buscará a vivência, a experiência dos determinado por estruturas.
sujeitos que vivenciam o fenômeno numa situ- Ferdinand de Saussure já havia
ação real. O pesquisador que vivencia o fenô- demonstrado, no estudo da linguística, que a
meno de alguma forma sabe que a sua descrição língua não é formada por vocábulos e sim por
do fenômeno não é suficiente para compreen- estruturas fonéticas. Demonstração semelhante
dê-lo. Portanto, pela intersubjetividade, nos dis- fez Lévi-Strauss ao estudar as relações de
cursos, nas descrições dos outros sujeitos, ele parentesco, em que apresenta pela primeira vez
capta a essência do fenômeno. O pesquisador a abordagem estruturalista.
994 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
Podemos afirmar que o estruturalismo fragmentação disciplinar da ciência, nem com
apresenta metodologicamente a seguinte a sua pretensão de verdade única e universal.
perspectiva: só explicamos a variação, Edgar Morin (1921-) é o principal teórico
quando descobrimos como ela invaria- do pensamento complexo. Morin denomina
velmente varia. Toda variação como fe- o paradigma científico da modernidade de
nômeno estruturado que é, apresenta paradigma simplificador, ao qual contrapõe o
modos constantes de variar. Nestes mo- paradigma da complexidade. Para ele “os modos
dos constantes de variar está, ao mesmo simplificadores de conhecimento mutilam mais
tempo, sua natureza mais profunda e sua do que exprimem as realidades ou os fenômenos
explicação. Por outra: a manifestação va- de que tratam, e torna-se evidente que eles
riável é secundária e menos explicativa. produzem mais cegueira do que elucidação”
(DEMO, 1995, p. 178, grifo do autor). (MORIN, 2006, p. 5).
Trata-se de uma patologia do saber,
Como existem as invariantes que são a inteligência cega, que impôs os princípios
constantes supratemporais e supra-espaciais, o de disjunção, de redução e de abstração,
estruturalismo não prioriza o estudo histórico constitutivos do paradigma simplificador. Tal
como fundamental para a explicação dos paradigma foi formulado e legado ao Ocidente
fenômenos. A história tem um papel secundário por Descartes, “ao separar o sujeito pensante
e derivado, pois os acontecimentos não são (ego cogitans) e a coisa entendida (res extensa),
explicados senão dentro de uma estruturação isto é, filosofia e ciência, e ao colocar como
do real. Assim, não tem sentido estudar princípio de verdade as ideias claras e distintas,
com primazia o desenrolar histórico de um isto é, o próprio pensamento disjuntivo”
fenômeno; o que se deve buscar é o invariante (MORIN, 2006, p.11).
que o explica, independente de tempo e lugar. A Para Morin (2010), existe uma
estrutura é explicada a partir dela mesma e não ambivalência, o lado bom e o lado mau da
a partir da história. Por outro lado, a história é ciência, a complexidade intrínseca no cerne da
explicada a partir da estrutura. ciência. A ciência é elucidativa, enriquecedora,
Podemos sinteticamente concluir o conquistadora, triunfante e, ao mesmo tempo,
seguinte acerca da pesquisa que se proponha um problema, com possibilidades de subjugação
numa abordagem estruturalista: o seu objeto e aniquilamento. O pensamento complexo
de estudo é tomado como uma estrutura. é capaz de compreender tal ambivalência e
O pesquisador buscará captar os elementos romper com o pensamento simplificador e
estruturadores e estruturantes do seu objeto. disjuntivo. Mas é necessário desfazer duas
Tal estudo do objeto não será feito de uma ilusões quanto à complexidade: acreditar que
perspectiva histórica, mas a partir de uma análise conduza à eliminação da simplicidade (ao
interna, em que o pesquisador estruturalista contrário, a complexidade integra em si tudo
observará as relações que aí ocorrem e se o que põe ordem, clareza, distinção, precisão
estabelecem, percebendo quais são as variações no conhecimento); confundir complexidade
ocorridas e identificando o que não varia, o e completude (o pensamento complexo aspira
invariante que explica a estrutura estudada. ao conhecimento multidimensional). O que
o olhar multidimensional do paradigma da
O olhar multidimensional complexidade intenciona é romper com a
fragmentação, a mutilação, a separação e
O olhar complexo ou multidimensional a redução que o olhar unidemensional do
nasce no seio da crise paradigmática da ciência paradigma simplificador lança sobre a realidade
moderna. É um olhar que não se satisfaz com a natural e social. Na sua pretensão de verdade,
996 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
complexo compreenderá: que ele e o objeto são mundo, uma compreensão subjacente da
partes de um todo e que nele e no objeto também realidade, que vincula aquele estudo específico
está o todo; que ele produz o objeto, mas que este a uma ou mais epistemologias. Nesse sentido,
também o produz; que ele dialoga com o objeto, a pluralidade de epistemologias na pesquisa
que dialoga com o mundo, que dialoga com outros em educação, longe de ser interpretada como
sujeitos, que também dialogam com o objeto e um “obstáculo epistemológico ou obstáculo
com o mundo. Ou seja, por um lado, o pesquisador pedagógico” (BACHELHARD, 1996) para a
compreende que existem conexões, redes, teias de compreensão dos fenômenos educacionais,
significados, uma complexidade na pesquisa que deve ser vista como um fator de enriquecimento
faz com que a produção do conhecimento seja epistemológico: “A presença de várias opções
sistêmica. Por outro lado, assume uma regra de epistemológicas na produção científica em
complexidade: “o observador-conceptor deve se educação enriquece a dinâmica da produção,
integrar na sua observação e na sua concepção” permite uma melhor definição metodológica
(MORIN, 2010, p. 185). e uma maior profundidade na reflexão sobre a
problemática educativa” (GAMBOA, 2012, p. 104).
Considerações finais As epistemologias aqui apresentadas
são vistas como possibilidades de olhares
Após essa visão panorâmica de algumas diversos sobre os fenômenos educacionais; ora
das principais epistemologias, vale considerar convergentes, ora divergentes, completando-se
a importância da teoria e do referencial ou excluindo-se. O que um olhar epistemológico
metodológico na pesquisa científica em educação. enxerga outro pode não enxergar. Nessa ótica
Todas as epistemologias, a partir de categorias da pesquisa educacional, estaremos numa
diversas, propõem-se a explicar a realidade. Com dinâmica constante entre visão e/ou cegueira, a
as epistemologias, temos os elementos teóricos, possibilidade de lucidez e/ou obscuridade. Como
por assim dizer, de fundo, que nos fornecem os diz Bachelard (1996, p. 17), “O conhecimento do
fundamentos e a chave de leitura para a realidade. real é luz que sempre projeta algumas sombras.
Cada epistemologia, enquanto teoria que se Nunca é imediato e pleno”.
constitui, oferece uma possibilidade de leitura Por fim, é oportuno considerar que o
de mundo, uma visão da realidade, e, ao mesmo processo de produção do conhecimento, em
tempo, esclarece como metodologicamente se qualquer área que ocorra, não é neutro: ou
produz o conhecimento desse mundo, como é contribui para a manutenção e conservação da
possível conhecermos a realidade. realidade ou contribui para mudar e transformar
Uma metodologia vincula-se a uma a realidade. Fazer pesquisa em educação e definir
teoria/epistemologia. Toda teoria/epistemologia uma metodologia de investigação educacional
tem seus limites, não consegue apreender e não é apenas definir um rol de procedimentos
explicitar tudo do real, pelo simples fato de nós, práticos e experimentais, mas envolve
seres humanos, sermos também limitados. Não mudança de olhar, o que tem implicações
somos oniscientes. No entanto, sem uma teoria, no direcionamento político e pedagógico da
não é possível o senso crítico da realidade. A docência. Não considerar esse aspecto é já por
teoria explica a realidade, enquanto produz uma si só posicionar-se por uma atitude não crítica,
metodologia que torna possível a aproximação baseada numa pretensa neutralidade científica.
da realidade pesquisada. No caso de cada área Vale dizer que não é a teoria em si que
específica de formação (como as licenciaturas), transforma o real. A teoria sem dúvida já é uma
no processo de elaboração de um determinado ação, é um fazer. Mas uma ação e um fazer
estudo ou pesquisa e no trato, na abordagem, do pensamento, à maneira do pensamento, ou
que faz do seu objeto, tem-se uma leitura de seja, uma abstração que nos leva a construir
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Recebido em: 12.06.2013
Aprovado em: 11.12.2013
Alberes de Siqueira Cavalcanti é doutorando em Educação em Ciências pelo Programa de Doutorado em Educação em
Ciências e Matemática (REAMEC), Polo UFPA, mestre em Educação pela UFMA e professor de Filosofia do Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA), Campus São Luís Monte Castelo.
998 Alberes de Siqueira CAVALCANTI. Olhares epistemológicos e a pesquisa educacional na formação de professores...
A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento
escolar: a retextualização de artigos de divulgação científicaI
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 999-1014, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014041219 999
The magazine Ciência Hoje das Crianças in school
literacy: the retextualization of popular science articlesI
Abstract
Keywords
1000 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014041219 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 999-1014, out./dez. 2014.
As interações do leitor com o texto têm sustentam essa ideia, estão: Sutton (2003),
sido objeto de preocupação crescente de muitas Cassiani (2006), Zimmermann e Silva (2007),
pesquisas no campo da educação em ciências Almeida (2010), Mortimer, Vieira e Araújo
(ALMEIDA; GIORDAN, 2012; ALMEIDA, 2010; (2010), Espinoza (2010) e Paula e Lima (2011).
ESPINOZA, 2010; ESPINOZA; CASAMAJOR; Para Espinoza, Casamajor e Pitton (2009),
PITTON, 2009). No entanto, a maior parte da um texto informativo no campo das ciências se
produção nessa área está concentrada nas apresenta como uma possibilidade de conhecer
últimas séries do Ensino Fundamental. As algumas características do trabalho e do discurso
relações entre leitura, linguagem e ensino científico. De acordo com Espinoza (2010), nas
nas aulas de ciências nas séries iniciais têm aulas de ciências, normalmente não se pensa
sido pouco estudadas. Talvez a preocupação em situações de leitura como cenários de ensino
desse segmento com a alfabetização da língua e aprendizagem envolvendo, simultaneamente,
materna – no sentido estrito desse termo – e a conhecimentos da área e também de leitura, de
ausência de práticas significativas em educação modo geral. As situações propostas costumam
em ciências nos primeiros anos justifiquem partir do princípio de que os alunos já sabem ler
tal lacuna. Prova disso é que as crianças não e de que isso é suficiente para a interpretação
guardam lembranças significativas das leituras do texto.
realizadas nas aulas de ciências (ALMEIDA, Massarani (2007) considera que os
2005; ESPINOZA; CASAMAJOR; PITTON, 2009). textos de divulgação científica para crianças
A maioria dos alunos não se lembra dos livros são instrumentos úteis para a educação formal.
e das imagens, não tem memória do prazer e da Em sua opinião, é importante que as crianças
curiosidade que um mergulho em um texto de tenham acesso à discussão de temas atuais e
ciências pode proporcionar (ALMEIDA, 2005). polêmicos. Por sua vez, a tese de doutorado
Em seus estudos, Silva (1999) denomina de Gouvêa (2000) constitui uma iniciativa
como reducionistas as concepções que consideram importante para a compreensão de como se
a leitura um simples ato de oralização de um texto, processa a leitura de textos de divulgação
decifração de um código ou expressão de uma científica veiculados na revista Ciência Hoje das
ideia fixa contida no texto. Em suas investigações, Crianças (CHC) e de como a leitura desse tipo
o autor enfatiza a importância de uma concepção de texto aproxima esse público da linguagem
interacionista da leitura. Nessa direção, Kleiman científica. Em sua investigação, o estudo
(2004, p. 10) argumenta que a aprendizagem das práticas de leitura foi realizado mediante
da leitura é um processo que acontece na entrevistas com crianças que liam regularmente
interação, isto é, “na prática comunicativa em a revista em suas casas e eram assinantes do
pequenos grupos” – seja com o professor, seja periódico. Uma das indicações apontadas pela
com seus pares –, bem como na promoção de um autora é de que a maioria das crianças pode
contexto adequado para que a criança que não não entender todos os conceitos expostos, mas
entendeu a leitura possa compreendê-la. Também acompanha a linha de exposição do texto.
compartilham de tal concepção Zilberman (1982), Embora esses trabalhos ressaltem a
Marinho (1993), Soares (1998), Marcuschi (2001b), importância do discurso de divulgação científica
Geraldi (2002), Solé (2003), Rojo (2004), Colello para as crianças, nenhum deles se debruçou
(2004) e Goulart (2006). sobre o aspecto que aqui nos interessa: Como o
Nessa mesma vertente, na área de discurso de divulgação científica é (re)produzido
educação em ciências, a leitura e a escrita pelas crianças no contexto da sala de aula? Quais
têm se destacado nas pesquisas como aspectos aspectos do discurso de divulgação científica são
importantes para o desenvolvimento do apropriados pelas crianças na leitura dos artigos
letramento. Dentre os pesquisadores que da revista CHC nas aulas de ciências?
1002 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
textos sociais e de interpretação e apropriação uma forma de diálogo que se estabelece pela
desses discursos. Como consequência de tal oposição e pela recontextualização de palavras.
posicionamento, a expressão letramento escolar Nesse sentido, qualquer compreensão verdadeira
é utilizada pelo autor como um conjunto de é dialógica por natureza. Em uma perspectiva
práticas discursivas que envolvem os usos da confluente entre Marcuschi e Bakhtin, a
escrita da/na esfera escolar. retextualização envolve construção de sentido e
Marcuschi (2001b) afirma que o termo trabalho de compreensão.
letramento está semanticamente saturado. Kleiman (2002) também propõe que as
Segundo ele, esse termo significou coisas práticas orais sejam analisadas em eventos de
diversas ao longo da história e também em letramento. Para essa autora, a inserção do aluno
uma mesma época. Em seus estudos, o autor nas práticas sociais de uso da escrita sustenta-se
defende que é impossível investigar questões na oralidade letrada do professor. Dessa forma,
relativas às práticas da leitura e da escrita sem segundo ela, o trabalho com a linguagem na
uma abordagem etnograficamente situada e escola deve privilegiar a leitura e a discussão
uma inserção cultural das questões no domínio sobre as várias possibilidades de ler, falar e de
cognitivo. Ainda segundo Marcuschi (2001b), escrever um texto, dependendo do contexto, do
investigar o letramento é observar práticas objetivo do texto e de quem vai recebê-lo.
linguísticas em situações em que tanto a escrita Por sua vez, Mortimer, Vieira e Araújo
quanto a fala são centrais para as atividades em (2010) afirmam que o aprendizado nas aulas de
curso. De acordo com esse autor, o conceito de ciências depende do diálogo estabelecido entre
letramento se institui e se constitui na interface a linguagem científica escolar e a linguagem
com a oralidade. Assim, tanto o discurso cotidiana. Em suas investigações, eles lançam
falado quanto o discurso escrito dispõem do mão da teoria dos gêneros de discurso e
mesmo sistema linguístico para organizar gêneros textuais para a compreensão dos
seus enunciados, sendo mobilizados de acordo textos produzidos pelos alunos. De acordo com
com os eventos sociais comunicativos. Nessa esses autores, a aprendizagem das ciências
interação entre a oralidade e a escrita, Marcuschi depende de um processo em que os alunos vão
(2001a) chama de retextualização o processo construindo habilidades no uso de diferentes
que envolve a passagem do texto falado para gêneros da ciência escolar. Essa construção
o escrito e vice-versa. Para ele, o processo de passa necessariamente pela leitura e escrita dos
retextualização não consiste, simplesmente, em diversos gêneros e tipos de textos.
repetir o texto-fonte. Trata-se de produzir um
discurso, isto é, dizer de outro modo, em outra Metodologia
modalidade ou em outro gênero, o que foi dito
ou escrito por alguém. A produção oral das crianças nas aulas
Segundo Marcuschi, há, nas atividades de de ciências com base na leitura da revista CHC
retextualização, um aspecto muito importante: é o principal objeto desta reflexão. Assim, antes
a compreensão. Para Bakhtin (1997), a de apresentar os procedimentos que levaram
compreensão envolve a busca de contrapalavras a cabo este estudo, é importante apresentar e
em resposta às palavras do outro. O locutor analisar sumariamente a revista CHC, objeto
produz o enunciado aguardando uma resposta de leitura privilegiado em nossa investigação.
de seu interlocutor, na forma de concordância, Além disso, o destaque para a CHC se justifica
objeção, execução ou outra atitude responsiva, porque esse periódico é enviado pelo Ministério
e isso se dá em razão de ele ter em mente a da Educação (MEC) para as escolas públicas
existência de enunciados anteriores aos quais seu brasileiras, mas é pouco conhecido pelas crianças
enunciado responde. A compreensão é, portanto, e professoras das séries iniciais e ainda pouco
1004 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
Fundamental – de uma escola pública da rede para que lessem em casa. Na aula subsequente,
municipal da cidade de Belo Horizonte. A segunda aula de que o episódio selecionado
professora atuava nas séries iniciais há 20 anos e foi extraído, a professora indagou às crianças
havia se formado em pedagogia há menos de 10 sobre a experiência de leitura da revista CHC no
anos. A professora e todos os responsáveis pelas ambiente doméstico. Diferentemente da primeira
crianças assinaram um termo de consentimento aula, em que as crianças pouco participaram,
livre e esclarecido para participar da pesquisa, nessa segunda aula, muitas crianças levantaram
no qual foram descritos os procedimentos de a mão, pedindo autorização para partilhar suas
registro e a não identificação dos sujeitos de leituras. Assim, a escolha desse episódio se
pesquisa quando da publicação dos resultados. justifica por considerarmos que nele ocorrem
No que concerne ao trabalho com esses eventos, eventos-chave que apontam para indícios de
optou-se pela análise microgenética (GÓES, apropriação da revista e de formas de dizer a
2000), dada sua vinculação com a matriz leitura de um texto de divulgação científica na
sociocultural, resultando num relato minucioso sala de aula. Nesse dia, o desafio das crianças
dos acontecimentos, conforme descrito a seguir. consistia em falar sobre o texto a partir das
Os procedimentos metodológicos incluíram compreensões por elas construídas.
registros em vídeo, notas de campo e gravações
em áudio de reuniões com a professora. O Resultados e discussão
evento extraído dessa aula compõe parte dos
dados da tese de Almeida (2011). Na manhã do segundo dia de trabalho
Durante três meses, acompanhamos as com as revistas, a aula de ciências era a última
aulas de ciências em uma das turmas em que do horário. Ao sinal para a troca de professores,
a professora atuava, e o acervo da pesquisa as crianças guardaram na pasta os cadernos
corresponde a 18 horas de filmagem ordenadas da aula de português e colocaram sobre as
por data, um caderno de campo, entrevistas carteiras os cadernos de ciências e as revistas
gravadas e transcritas e documentos normativos CHC. Quando entrou na sala, a professora
da escola. Com efeito, foi possível construir um cumprimentou as crianças com afeição e ocupou
cronograma fixo para as filmagens: na última o mesmo lugar, à frente da turma, para falar
aula das terças-feiras e nos dois primeiros aos alunos. Depois de chamar a atenção para o
horários das quintas-feiras. Após cada filmagem, “tempo curto da aula”, quis saber das crianças
seguiam-se os seguintes procedimentos: assistir sobre a experiência de leitura da revista no
às fitas repetidas vezes, com o objetivo de ambiente doméstico. Muitas sinalizaram, com
representar as interações das crianças e da gritos e dedos em riste, o desejo de falar. Então,
professora com a CHC, os padrões discursivos a professora solicitou que abrissem as revistas
das aulas e a organização do trabalho com a e comentassem “com as próprias palavras” o
revista. A partir desse minucioso exame das que haviam encontrado de mais interessante
aulas, procedeu-se à construção de mapas que na CHC. Eram muitas as crianças que queriam
dimensionam em uma tabela as ações mediadas partilhar suas leituras. Em meio a essas vozes,
pelo discurso dos participantes, as formas temas diversos tratados pela revista surgiram
de uso da revista, o tempo transcorrido e as nos relatos de leitura. Em silêncio, com uma
observações de campo. postura corporal ereta, algumas crianças
Os mapas de ações apontam que, buscaram a voz e o olhar do relator.
na primeira aula em que a revista CHC foi A seguir, apresentamos parte dessa aula
apresentada às crianças, a professora trabalhou dividida em duas sequências discursivas extraídas
a capa e o índice da revista. Ao fim dessa aula, do primeiro evento de relatos de leitura de
ela distribuiu às crianças alguns exemplares artigos da CHC pelas crianças na sala de aula.
1006 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
Depois de receber autorização para falar, de divulgação científica é a informação, é
um aluno, no turno 2, conta sua experiência de necessário que nos discursos orais ela apareça
leitura sobre o código Morse, o que podemos nítida. No entanto, o que se vê nesses turnos
analisar como uma ação de retextualizar. Ele é um apagamento da informação, acarretando
apresenta formalmente o texto, destacando, comprometimento na compreensão do texto.
em primeiro lugar, o título do artigo lido, como No turno 9, um aluno retextualiza o
uma estratégia que envolve a compreensão de texto da revista com o propósito de explicar
como se deve anunciar um texto informativo a chuva de granizo. A maioria dos termos por
e iniciar a apresentação na sala de aula. Em ele empregados coincide com os utilizados no
seguida, ele se concentra na explicação do que artigo, porém podem não compartilhar o mesmo
seria o código Morse e na história da invenção significado. A informação foi tão reduzida pela
dos códigos. O dizer “que eu lembro” permite criança que não há garantias de compreensão
indiciar uma percepção em torno do nível de do conteúdo do texto.
informação do texto, especialmente em relação No turno 13, uma aluna reclama a falta
à falta, à informação ausente – um fator que da revista. Esse é um indício importante do
se concretiza para a criança, de modo mais valor que a CHC passou a ter para as crianças.
claro, durante o processo de apropriação do Aliás, durante a pesquisa de campo, elas nunca
texto. O aluno tem consciência de que outras reclamaram da falta dos textos fotocopiados
informações existem no texto e não são ditas que não receberam, mas, no caso das revistas,
por ele, e por isso seleciona intencionalmente todos cobravam da professora o número que
partes que julga mais importantes para si e para não receberam quando faltavam à aula.
seus endereçados. Ainda no turno 2, o aluno, ao No turno 16, uma aluna também anuncia
mesmo tempo em que cita o discurso do outro – o texto com o título e, além disso, recorre à voz
“eu li o texto”-, assume-se como sujeito de seu dos cientistas para a construção de sua fala – “são
discurso, misturando formalidade e aproximação eles que dizem, eles acreditam”. Dessa maneira,
com o discurso cotidiano. No discurso desse na construção de um discurso indireto, as
aluno, também se percebe um apagamento do crianças iam se tornando autoras de seu próprio
sujeito, o que gera um discurso indireto e, ao discurso. Esse trabalho de compreensão dos
mesmo tempo, uma costura narrativa, presente artigos denota a diferença de investimento, por
no texto escrito e no oral, envolvendo o leitor e parte da criança, entre a narrativa do vivido e
o ouvinte. a retextualização de um texto informativo. No
No turno 3, o feedback da professora é relato do texto informativo, o vivido é evitado,
avaliativo, com a função de confirmar a resposta deslocando a ênfase para a voz de autoridade
e redimensionar o discurso. Sua audiência são do texto – o cientista –, o outro que fala.
os alunos e seu propósito é ensinar a ideia de No entanto, no turno 18, esse vivido
código por meio da retextualização realizada aparece em uma situação que mostra a
pelo aluno. O convite da professora tem o importância da relação dialógica no trabalho
caráter mais de persuasão do que de imposição. com a leitura nas aulas de ciências. A criança
Já o turno 4 caracteriza-se pelo compara o tempo de vida das bactérias na Terra
entusiasmo das crianças e pelo desejo de ao tempo das avós. Ainda que a dimensão do
falar sobre o texto lido. E os turnos 6 e 22 tempo seja difícil para a compreensão desse
caracterizam-se pelo comprometimento na aluno, ao ouvir a informação, ele compara e
compreensão do artigo. A retextualização, internaliza as ideias e, nesse processo, vai
nesses turnos, reduz tão exageradamente as elaborando uma forma de diálogo do vivido
informações que é difícil ao ouvinte entender com as questões relativas à ciência do texto
o discurso. Ora, se o traço principal do gênero oral e escrito. O que detectamos aqui é outra
Quadro 2 – Episódio 2: primeiro evento dos relatos de leitura, sequência 2, retextualizações narrativas
25 Professora vamos ouvir a Lourdes... ela quer fazer um comentário sobre o que ela leu
é [...] eu li que uma pesca lá dos golfinhos com os seres humanos [...] que
os golfinhos [...] eles ajudam os pescadores a pescar porque quando eles Estudantes voltam a atenção para a
26 Lourdes
[...] é [...] os golfinhos estão [...] acho que na beira da maré da praia eles aluna e ficam em silêncio.
encurralam os peixes e os pescadores e jogam é [...] coisinhas lá neles/
27 Catarina a rede/
é [...] a rede e pescam os peixes e [...] e [...] eles [...] os golfinhos [...]
eles também gostam [...] eles são muito brincalhões porque eles não têm
28 Lourdes Faz gesto de onda com a mão.
medo de seres humanos, né? eles gostam de brincar nas ondas, gostam de
brincar [...] sabe umas plantas que ficam flutuando assim?/
29 Professora sei/
30 Fátima algas marinhas/
é [...] as algas marinhas [...] eles gostam de afundar aquelas coisinhas e
A aluna gesticula, ri, altera o tom de
31 Lourdes [...] e [...] aí também descobri que os PASSARINHOS NÃO TÊM DENTES!
voz e fala espantada sobre o artigo.
[...]/
olha que interessante! conta para os seus colegas o que você descobriu
32 Professora
através do texto
que os passarinhos, cada um, de acordo com a forma deles [...] eles é [...]
conseguem pegar a comida e cortar de um jeito... tipo os carnívoros com
33 Lourdes seu bico mais afiado que consegue cortar a carne, tem uns pássaros que
têm um bico que eles tem [...] tipo [...] umas barras assim que... que...
ajuda a prender o inseto/
34 Professora o inseto/
35 Tito quando ele vai comer [...]
36 Professora interessante, né, gente? gostaram da descoberta dela através do texto?
37 Tito anhan, anhan
1008 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
No turno 25, a professora, mais uma vez, os discursos da sala de aula. A professora
intervém para distribuir a fala. No turno 26, incentiva a criança a relatar sua leitura,
uma aluna inicia a retextualização do artigo da referindo-se ao ato de ler o artigo como uma
CHC sobre os golfinhos e os alunos ficam em descoberta. Esse sentido que a professora
completo silêncio. Nesse turno, ao falar sobre encontra para a leitura leva a aluna à
o artigo, a aluna incorpora em seu discurso construção de um texto explicativo no turno 32
uma estrutura de sucessão em uma espécie de em que ela apresenta o tema – os tipos de bicos
gramática narrativa dos acontecimentos entre dos pássaros e suas funções – e o categoriza
golfinhos e seres humanos. E como também quando faz menção a diferentes formas de aves
nesse turno há omissões de palavras do texto, e bicos. O discurso expressa a compreensão das
outra aluna, no turno 27, a auxilia no relato. relações que ordenam o texto científico: forma
Assim, pode-se observar que a construção do (os diferentes bicos dos pássaros) e função (os
texto oral ocorre entre os estudantes que se pássaros têm bicos diferentes e apresentam
tornam referentes e andaimes na elaboração características alimentares diferentes). Assim,
narrativa. Ao retextualizar, a aluna recorre ao na habilidade dessa aluna em retextualizar
discurso narrativo e explicativo, imprimindo o artigo, é possível identificar a comparação,
um tratamento particular à informação. O uso a seleção das informações, a ordenação e a
de uma linguagem narrativa constitui formas categorização.
de ordenar a memória e o conhecimento Outro aspecto observado nos relatos é
(BRUNER, 1997). Nessa sequência, ao narrar, que, ao retextualizar, a criança vai construindo
a aluna imprime à informação um significado uma espécie de revisão da própria fala. Assim,
individual e o sentido que o evento tem para no turno 33, o discurso de uma aluna revela
si, pelo uso explícito de avaliações e gestos. que o conceito expresso no texto vai sendo
No turno 31, a criança altera o tom de voz ao ampliado, reconstruído, englobando ideias
informar, impressionada, que os pássaros não cada vez mais sofisticadas acerca do assunto. A
têm dentes. Essa explosão vocal é a dimensão princípio, ela cita, de maneira generalizada, os
emotiva do texto oral que não aparece no passarinhos que, “de acordo com a forma deles,
discurso escrito. A informação envolve tanto a conseguem pegar a comida”. Mais adiante,
aluna que vem acompanhada de movimentos cita os pássaros que, “com seu bico afiado,
corporais que ajudam a significar as palavras conseguem cortar a carne”. Esse processo
no processo de interação verbal. O artigo é de retificação e de retomada das ideias é
muito curioso para a criança, e o envolvimento fundamental nos textos oral e escrito, sendo
dela no conteúdo do texto é tão forte que ela constituinte do ato de revisar. O movimento de
ri, gesticula, balança o corpo e altera o tom de avanços e recuos assinala a possibilidade de o
voz. Dessa forma, os outros ouvintes ficaram aprendiz lidar com o texto de sua autoria. Tal
entusiasmados pelo artigo e presos na fala construção é um movimento de um sujeito que
dessa aluna. A voz, assim, acompanha e apoia é capaz de pensar, com autonomia, a leitura
a organização e a complementação de sentidos que faz do texto, porque está se apropriando de
constitutivos do discurso. mecanismos que permitem a (re)construção de
No turno 32, o convite da professora um texto a partir da interação com ele.
para que a aluna continue seu relato é uma Assim, expor um texto viabiliza
estratégia didática que busca sustentar um a interação do leitor com o escritor, a
tipo de interação que demanda a opinião ou explicitação das vozes do texto e o surgimento
interpretação da criança, conforme identificado de um autor. Dessa forma, a retextualização
por Mehan (1979) em seus estudos. A voz da constitui uma prática de letramento que
professora aparece para colaborar ou orquestrar concretiza, para o leitor, uma oportunidade
Os botos ajudam muito os pescadores a é [...] eu li que uma pesca lá dos golfinhos 1
achar peixes nas águas turvas da barra de com os seres humanos [...] que os golfinhos... 2
Tramandaí, pois, ao localizar um cardume, eles ajudam os pescadores a pescar porque 3
eles se comportam de forma especial: dão quando eles [...] é [...] os golfinhos 4
saltos, viram o corpo, batem com a cabeça estão [...] acho que na beira da maré da praia 5
na água... Além disso, para encurralar os eles encurralam os peixes e os pescadores 6
peixes e dificultar sua fuga, procuram e jogam é [...] coisinhas lá neles 7
levá-los até as margens, onde ficam os [a rede] 8
pescadores! Portanto, não é à toa que, ao 9
ver Barata e companhia na barra de 10
Tramandaí, os pescadores preparam suas 11
tarrafas – redes circulares arremessadas 12
abertas na água. Como sabem identificar o 13
comportamento que os botos apresentam 14
quando acham peixes e ainda têm a ajuda 15
deles para levar o cardume até a margem, 16
a pesca é certa! 17
Na linha 1, observa-se que a aluna inicia os seres humanos”. Essas duas linhas demonstram
seu discurso com a expressão “eu li”. Assim, já a repetição e a compreensão do texto pela
na primeira linha, ela faz referência ao artigo, criança. Ela não usa as mesmas palavras do
deixando flagrante a preocupação em indicar o texto, mas repete as ideias. Esse movimento
discurso do outro. Depois, o discurso aparece em indica o trabalho de compreensão realizado pela
3ª pessoa, o que revela um apagamento do autor. criança. A palavra pescadores não aparece na
Ainda na linha 1, ela usa a palavra “golfinho”, linha 1; em vez disso, ela usa “seres humanos”,
apesar de o animal ser denominado boto em o que parece indicar consciência da situação de
quase a totalidade do texto. Segundo Vigotski produção do discurso – uma escola, uma aula de
(1991), são as experiências cotidianas da criança ciências, um texto de divulgação científica.
com o uso da palavra que levam à generalização. Já na linha 3, a aluna reformula sua fala,
Nas linhas 1 e 2, a criança define a pesca reportando-se ao discurso da CHC na linha 1:
cooperativa como a “pesca dos golfinhos lá com “eles [os golfinhos] ajudam os pescadores”.
1010 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
Para Bakhtin (1981, p. 144), “o discurso Considerações finais
citado é o discurso no discurso, a enunciação
na enunciação, mas é, ao mesmo tempo, um A análise desses fragmentos mostra que
discurso sobre o discurso, uma enunciação as crianças deixam transparecer, nas formas de
sobre a enunciação”. Marcuschi (2001a, p. 54) falar, suas experiências com a revista CHC. Nesse
aponta, como uma das variáveis relevantes para processo, em que as crianças são instigadas a
a retextualização, a “relação entre o produtor interpretar e produzir sentidos em torno do texto,
do texto original e o transformador”, dizendo gera-se um mecanismo no qual elas e também a
que, quando é o próprio autor que retextualiza, professora vão se apropriando de certas formas
as mudanças são muito mais radicais; já no de dizer o texto, caracterizando-se, portanto,
caso de outra pessoa, ela fará menor número como um exercício de metalinguagem. Nessa
de mudanças no conteúdo, embora possa fazer perspectiva, a retextualização constitui uma
muitas mudanças na forma. Em se tratando prática de letramento do contexto dessa sala
da retextualização de um texto de divulgação de aula que imprime ao texto oral uma forma
científica, cujo discurso é de autoridade e traz particular de falar sobre o texto. Tal exercício de
implícita a ideia de que, sob a presença de metalinguagem é um trabalho de compreensão
fatos, há que se construirem argumentos, o que cada criança produz ao tentar fazer com
discurso tende a ser o mais próximo possível que seu dizer seja mais inteligível e próximo
do discurso do artigo. No caso da aluna em das explicações do artigo de divulgação
questão, ela valoriza o conteúdo da mensagem científica. Afinal, é preciso dizer o texto e, para
de divulgação científica como ideal para ser isso, é necessário fazê-lo de acordo com as
transmitido. Desse modo, as linhas 3, 4 e 5 do convenções da aula, da audiência, do conteúdo
artigo descrevem em detalhes o comportamento do texto e de sua forma. Segundo Geraldi
dos botos quando localizam um cardume. (2002), ao produzir um texto, o sujeito faz uma
A criança resume essa informação e proposta de compreensão ao seu interlocutor,
preserva a fidelidade ao texto escrito ao usar a desenvolvendo ações com a linguagem e ações
palavra “encurralar”. A partir da linha 10, ela sobre a linguagem. Isso se realiza por meio
privilegia outro fragmento do artigo, citando de escolhas de estratégias para o dizer, o que
características do comportamento dos golfi- envolve a atividade cognitiva.
nhos que, para ela, são mais significativas e Na medida em que essa forma de se referir
passíveis de ser informadas. Dessa forma, essa ao texto exige compreensão e construção de sig-
aluna se apropria das formas do discurso de di- nificados, as consequências das retextualizações
vulgação científica e, ao mesmo tempo, torna nas aulas de ciências são a possibilidade de ex-
a linguagem próxima e também objetiva, eli- pressão de conhecimentos, a construção de ideias
minando, na retextualização, o nome do lugar, e a habilidade de uso de uma linguagem explica-
alguns detalhes do comportamento dos botos, tiva. Trata-se de uma operação em que as crianças
nomes próprios e a explicação da palavra tar- necessitam negociar os sentidos, contextualizar as
rafa. Tudo isso pode ser visto nas linhas de 5 informações, compartilhar conhecimentos e pre-
a 9. A linha 8 mostra outras crianças acom- encher as lacunas implícitas do texto, demons-
panhando e entendendo a narrativa. Assim, a trando um trabalho de compreensão da leitura dos
retextualização obriga a criança ao trabalho artigos de divulgação científica. Assim, o dizer os
de metalinguagem, pois a leva a rever o texto, textos de divulgação científica na sala de aula
sua forma e seu conteúdo, e assim, afirma e se constituiu como estratégia importante para a
amplia sua experiência discursiva, incluindo a criança não apenas falar melhor sobre artigo, mas
experiência de tomar a própria linguagem – ou falar de outro jeito e compreender de outro modo
aspectos dela – como objeto. os textos e a linguagem das aulas de ciências.
1012 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
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Sheila Alves de Almeida é doutora em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e professora do Departamento de
Biodiversidade, Evolução e Meio Ambiente da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP).
Marcelo Giordan é doutor em Ciências pelo Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), livre-
-docente pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e professor do Departamento de Metodologia de
Ensino dessa mesma Faculdade.
1014 Sheila Alves de ALMEIDA e Marcelo GIORDAN. A revista Ciência Hoje das Crianças no letramento...
Literatura y competencia comunicativa: ¿Matrimonio mal
avenido?I
Resumen
Palabras claves
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1015-1028, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014051453 1015
Literature and communicative competence: a wrong
assorted matrimony?I
Abstract
Keywords
1016 http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014051453 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1015-1028, out./dez. 2014.
La literatura en el currículo Como señala Teresa Colomer (2010), el
escolar diseño curricular con enfoque comunicativo,
en España (también en Chile), no mejoró los
El actual currículo escolar chileno en aprendizajes en el área de literatura. El enfoque
Lenguaje y Comunicación se caracteriza por la historicista derivó a un aprendizaje centrado
presencia del enfoque comunicativo (MINEDUC, en los mecanismos de lectura, debido al influjo
2009, 2012), adoptado a partir de la reforma de la lingüística cognitiva y la psicolingüística;
educacional chilena, iniciada en 1990 y con en tanto, por influencia de la animación a la
variaciones a lo largo del tiempo1. Desde este lectura, se enfatizó la idea de crear el gusto por
enfoque, interesa que los alumnos desarrollen leer. Pero, plantea Colomer, hubo poca o nula
competencia comunicativa, lo que ya plantea articulación entre ambos objetivos. Esto, agrego,
una interrogante con respecto al lugar que a causa de que ambas propuestas provienen de
cabe a la literatura en esta propuesta. Si bien la distintas fuentes y se concretan en distintos
literatura está presente, el asunto problemático contextos: la primera funciona en el aula y en
es de qué manera lo está. Se transita desde una el currículo escolar; en cambio, la animación
enseñanza de la literatura como contenido a un lectora se concibió para ser implementada fuera
saber relacionarse con la literatura, atendiendo del currículo y surgió como una reacción a los
a habilidades lectoras y también de escritura. efectos contraproducentes de este para formar
La idea, en general, es admisible si pensamos lectores asiduos.
en los saberes pertinentes para la educación Felipe Munita (2010), al examinar el
escolar, especialmente a la Educación Básica. Marco curricular y los programas de Educación
Sin embargo, las preguntas que surgen Básica, identifica tres aspectos que orientan el
son, por una parte, si el currículo apunta sentido de enseñar literatura: enriquecimiento
efectivamente a ello y, por otra, si un enfoque lingüístico, formación personal y desarrollo de
absoluto es conveniente. A lo anterior se valores éticos y estéticos. El primer aspecto se
añade una complicación conceptual: las relaciona con las competencias lingüísticas.
llamadas competencias del currículo nacional Como señala el autor, la importancia que se
corresponden a las macrohabilidades lingüísticas: le atribuye a la literatura queda restringida
hablar, escuchar, leer y escribir, las que difieren por su función instrumental en pro de
de la competencia comunicativa formulada por desarrollar habilidades lingüísticas. En los
los estudios en las distintas taxonomías. otros dos aspectos podemos reconocer que se
Bajo el enfoque comunicacional, la incorporan nuevos aportes, como los estudios
práctica de la lectura ha ganado mayor presencia, de la literatura infantil desde la psicología,
especialmente en Educación Básica, y se han la escritura creativa, y se da cierta presencia
superado visiones didácticas restrictivamente a la apreciación estética. Pero el discurso
historicistas y estructuralistas. Sin embargo, literario sigue teniendo una presencia menor
no se ha ganado suficiente presencia desde la comparado con lo lingüístico, los valores y las
especificidad de lo literario. Más bien ha tendido normas. En este sentido, la literatura se concibe
a diluirse entre competencias más genéricas. Esto en función de algo, con lo que la literatura no
hace pertinente los cuestionamientos con respecto es más que un medio, un pasaje a otra cosa
a la aplicación de este enfoque en la enseñanza. que es la que interesa. De esta manera, el
tratamiento de la literatura en el ámbito escolar
1- Se distinguen tres etapas: prerreforma (1990 a 1995); implantación ha fluctuado y sigue fluctuando entre justificar
y aplicación (1996 a 2000) y consolidación (DONOSO, 2005), la que la literatura por la literatura, sin entender qué
ha enfrentado serias críticas de los especialistas y, sobre todo, del
movimiento estudiantil: Revolución Pingüina de secundarios seguida de implica, y justificarla por algo ajeno o que poco
la movilización universitaria. tiene que ver con ella.
1018 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
A esto podría objetarse la idea de que existe, comunicativo, es necesario entenderlo con sus
aun en ese acto monológico, un destinatario énfasis específicos y considerando su carácter
potencial, ya se trate del lector modelo, el lector artístico. Esto tiene que ver con la primacía
implícito o lector real, en cuyo caso es un acto de la función estética o principio artístico y
diferido, esto es, con distancia temporal entre la polisemia o apertura a la significación. En
el sujeto real y aquello que enuncia. Si bien este sentido, al decir de Mansilla (2003), la
también podría aceptarse que todo texto en literatura no tiene como condición sine qua
tanto discurso es una puesta en escena de un non asegurar la comunicabilidad del mensaje
enunciador y un mensaje (CHARAUDEAU apud anulando o transparentando la connotación.
ALVAREZ, 2001), así como que en todo discurso Estas consideraciones tienen relevancia
escrito hay diferimiento, en la literatura como desde una perspectiva didáctica, puesto que
ficción la relación del autor con la realidad las características de los textos inciden en la
no funciona en términos de correspondencia actividad de lectura. Así, no toda estrategia o
directa entre la intención del autor y el mensaje. técnica planteada en general es provechosa
Lo anterior tiene sentido si pensamos en para la lectura literaria.
observaciones recurrentes por parte de escritores, A continuación, muestro cómo es
como que les resulta difícil interpretar su propia posible abordar la literatura en relación
obra, que su creación adquiere independencia con la competencia comunicativa. Recurro
del autor o que les complica adjudicarle un intencionalmente a obras literarias sin distinción
sentido determinado a algún aspecto de sus de edad ni nivel de escolaridad, de modo a
creaciones. En el texto funcional, el emisor evidenciar si es o no factible desarrollar aspectos
construye una imagen, pero una imagen de de las competencias en distintos niveles. En
sí mismo, que lo representa; esto, aun en los algunos casos, se trata de obras infantiles; en
casos en que se recurre a la ficción, como en otros, aunque sean textos para adultos, son
la publicidad. En la ficción literaria, el autor lecturas adecuadas para jóvenes escolares.
construye un emisor que puede o no coincidir
con él. De ello se deriva que la identidad del Lo que dicen y no dicen las
emisor no se corresponde de manera equivalente palabras: lo léxico-semántico
con la identidad del autor, y que, por lo tanto, el
autor no es el llamado a dilucidar los sentidos El contacto con la literatura nos vuelve
de su obra; el autor no está obligado a ser más perceptivos a la variedad léxica, al hecho,
fiel a la realidad empírica y tampoco puede por ejemplo, de que los sinónimos como palabras
cuestionarse la verdad o falsedad de su obra en que significan lo mismo se dan de manera escasa
ese sentido. y que entonces importa y mucho la selección de
Con esto no defiendo la muerte del autor. las palabras. En el poema Sebastián Acevedo, de
Me parece válido y de posible interés lo que Gonzalo Rojas (1988), encontramos la palabra
pueda decir el autor sobre la gestación de su inmolado de manera recurrente en referencia
obra, de los significados que le otorga como a Acevedo. No se cambia la palabra por un
lector actual y de las intenciones que tuvo en sinónimo porque ninguna de las palabras que
el momento de producción. Todo esto puede el diccionario da como sinónimas significa lo
aportar a la comprensión del texto, aunque con mismo que inmolado en su matiz diferencial:
diferencias según la obra. El escritor asume la sacrificar algo por una causa o por alguien2; es
independencia de su creación respecto de sí eso precisamente lo que hace Acevedo cuando
mismo y de la realidad empírica.
2- El Diccionario de la lengua española de la Real Academia Española
Lo que me interesa destacar es que lo consigna como sigue en su tercera acepción: “3. prnl. Dar la vida, la
si se considera la literatura como acto hacienda, el reposo, etc., en provecho u honor de alguien o algo”.
1020 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
se conjugan para nominar y caracterizar al que consideren también las particularidades
conjunto de textos: algo tienen de fabulario y del lenguaje de cada obra y cómo aportan al
algo tienen de confabulación. Pasamos así de conjunto del texto.
reconocer significados de palabras a establecer Así, podemos hacer que los lectores
asociaciones entre esas palabras y diferentes observen que en una obra narrativa no solo
aspectos del texto. Vemos que la palabra se cuenta algo, sino que también se describe o
confabulación adquiere nuevas connotaciones. los personajes interactúan entre sí por medio
En este caso, podríamos interpretar que el autor, del diálogo. En esta línea, podemos comparar
a través del texto, confabula con el lector, textos con diálogo y sin diálogo, textos con
ambos son cómplices en subvertir la realidad mayor o menor presencia de descripciones o
para mirarla desde otro ángulo, lo que nos lleva comparar obras que tengan un referente común
a preguntarnos por las formas de subversión pero que se aborden desde formas textuales y
que podemos identificar en el texto, tanto discursivas diferentes. Como ejemplo de esto
subversiones formales como de ideas relativas último, podemos leer un texto expositivo sobre
a la sociedad. Otro ejemplo de neologismo el ciclo del agua y leer el cuento Las nieves
literario conocido es Altazor, título de una obra eternas (Sub sole, de Baldomero Lillo).
de Vicente Huidobro (2012); además, puede Como lo muestran Adam y Lorda (1999)
decirse que es uno de los principales recursos en el caso de los mitos, encontramos versiones
lingüísticos del texto, el que se entiende desde la que se enmarcan en textos explicativos, mientras
poética creacionista de Huidobro. que otras, del mismo mito, corresponden a
textos narrativos. El libro de Mercedes Franco
Un texto, varios textos (2007), Diccionario de fantasmas, misterios y
leyendas de Venezuela, resulta particularmente
La tipología textual no ha tenido interesante por su estructura externa e interna.
un tratamiento didáctico productivo para el Los textos se organizan según el formato de
aprendizaje en el contexto escolar. Clasificar los diccionario; sin embargo, internamente existe
textos con criterio homogéneo, sin vincularlos diversidad de formas textuales; encontramos
con otras características de la obra, no secuencias descriptivas, narrativas, explicativas.
parece ser muy provechoso. Los textos suelen El criterio que define la estructura no responde
ser heterogéneos (ADAM; LORDA, 1999); tanto a un formato previo como a lo que el
pueden contener una variedad de secuencias concepto a definir demanda, así como a la
correspondientes a distintos tipos de textos. comprensión y la amenidad de la lectura.
Los textos literarios, particularmente los También podemos derivar hacia la
narrativos, contienen diversas formas textuales, reflexión sobre la ficción literaria en el sentido
diversas secuencias tipo: descripciones, diálogo, de reconocer el aporte de lo literario en el
narración, argumentación, explicación. En este tratamiento de un tema, hecho histórico,
sentido, los profesores, al analizar una obra, fenómeno cultural, conocimiento científico.
pueden llamar la atención sobre este aspecto Por ejemplo, en relación con un hecho histórico
para que los alumnos identifiquen tipos de como la matanza en la Escuela Santa María de
secuencias, preguntándose por la función que Iquique3, podemos leer textos historiográficos,
cumplen en el texto y de qué manera aportan como Los que van a morir te saludan: historia
a los sentidos de la obra y al ritmo. De aquí de una masacre, de Eduardo Devés (2002), y
podría avanzarse a una lectura que desarrolle
la capacidad de valorar un texto a partir de 3- Masacre de los mineros del salitre y sus familias, ocurrida en la
Escuela Santa María de la ciudad de Iquique, Chile, en 1907, a raíz de
nociones de tipos de textos que no se queden la movilización sindical y huelga obrera para demandar mejoras de las
en las superestructuras o esqueletos, sino míseras y opresivas condiciones laborales que padecían.
1022 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
ingresan y de qué manera. Básicamente, subversión del género instructivo. Así, en estos
podríamos identificar dos formas en que se textos el contenido tiene su correlato en el
incorporan a la obra: impregnando el conjunto tratamiento discursivo.
del texto y afectando la macroestructura, o En el libro álbum Willy el tímido, de
bien, insertándose parcialmente en distintos Anthony Browne (2009), por ejemplo, se inserta
momentos de la obra. En el primer caso, tenemos un texto reconocible como aviso publicitario, el
textos con géneros apócrifos, es decir, una obra que considera lo lingüístico y lo visual (semeja un
literaria escrita a modo de. Por ejemplo, a modo recorte de diario); además, el aviso adquiere un
de diario de vida, como Papelucho perdido, significado particular en el contexto de la obra:
de Marcela Paz (1995); Nuestras sombras, de pierde su carácter funcional y adquiere nuevos
María Teresa Budge (1996), o la mayor parte sentidos. Si lo relacionamos con la historia, y
de El niño que enloqueció de amor, de Eduardo especialmente con el final, se revela la ironía, pues
Barrios (2004); o a modo de género epistolar, en la obra incorpora el discurso publicitario para
que la historia se narra a través de cartas, como subvertirlo. De esta manera, el texto contribuye
Papito piernas largas, de Jean Webster (2001). de forma virtual al aprendizaje de niñas y niños,
A partir de lo anterior, es importante a través de la experiencia del personaje - como
hacer notar la diferencia entre ficción literaria plantea Bettelheim (2010). Por ello, con lectores
y géneros que ingresan a la obra como recursos pequeños o primeros lectores, no es necesario que
de la ficción, pues puede ocurrir que los lectores la profesora dé un discurso sobre las cuestionables
se queden con la impresión de que están en premisas y recursos disuasivos de la publicidad.
presencia de un género no ficcional, es decir, Sí es atendible que obtenga información de
pueden creer que se trata, por ejemplo, de un cómo los niños entienden la historia y que dirija
diario de vida y no de una novela (y ocurre, la atención hacia algunos aspectos específicos
lo he comprobado en mis clases). Por esto para formarlos como lectores reflexivos. En el
es importante que los lectores reparen en los caso de esta obra, es fundamental que los niños
indicios del texto y de los paratextos que infieran que Willy no cambió interiormente, solo
permiten reconocer el género y el carácter lo hizo físicamente.
ficcional o no ficcional de la obra. Algunas Podemos hacer que los alumnos se
preguntas que podemos plantearnos al momento percaten del sentido del intertexto publicitario
de considerar este aspecto en la lectura son: en esta obra con preguntas para el diálogo:
¿por qué los identificamos como un género en ¿han escuchado algo como lo que dice este
particular?, ¿qué los caracteriza como tales?, aviso?, ¿por qué creen que Willy hizo lo que
¿con qué ámbitos y sujetos los identificamos?, decía el aviso comercial?, ¿le sirvió hacer lo que
¿qué sentido tienen en la obra? decía el aviso para superar su timidez? Luego
En Historias de cronopios y de famas, los alumnos podrían comparar la experiencia
de Julio Cortázar (2003), encontramos algunos del protagonista de esta historia con personajes
textos a los que el autor denomina instrucciones, como Pulgarcito y Pulgarcita, quienes no
que toman prestadas características lingüísticas cambian su tamaño pero son capaces de
del texto instructivo sin llegar a serlo. Esto nos enfrentar y superar situaciones adversas.
muestra la esencia cortazariana de la función Browne (2009) muestra en Willy el
crítica de la literatura: provocar a través del tímido que es plausible concebir obras literarias
lenguaje, la ficción y el arte. Las instrucciones infantiles en que no haya final feliz y que, sin
de Cortázar le hacen una jugarreta a este género, embargo, pueden ser efectivas en términos
con lo que la crítica social implícita relativa a de satisfacer las necesidades psicológicas del
una sociedad encorsetada por normas, rutinas niño, algo que ya había logrado Roald Dahl.
y falta de libertad creadora coincide con la El lector infantil puede aceptar una historia
1024 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
conocemos lo que pasa en nuestra cultura. dados por la cultura para entenderse, lo que a
(VAN DIJK, 1994, p. 9) menudo trasciende la competencia lingüística
de una lengua e involucra a las personas como
La literatura contribuye a ello al ampliar seres sociales en interacción con la(s) cultura(s).
nuestro conocimiento cultural, en cuanto a Una pregunta que podríamos hacernos
mundo objetivo y a formas de entender las y plantear a los lectores que formamos es si
interacciones en él. Según Van Dijk, “el discurso podemos inferir algunos rasgos de identidad
y la comunicación tendrán diferentes propiedades del autor (de género, nacionalidad, política,
en las diferentes culturas (…) los actos de habla y etc.). Esto podría conseguirse inductiva o
las interacciones están íntimamente relacionados deductivamente: los estudiantes investigan
con los contextos y marcos sociales” (1996, previamente acerca del escritor y luego
p. 112), en los que la ideología determina la relacionan algunos aspectos con el texto; o
selección de normas y valores. bien que primero lean la obra, infieran posibles
Esta competencia funciona íntimamente rasgos de identidad cultural y comparen
ligada a la competencia cultural, la que podría posteriormente con información aportada por
sintetizarse como conocimiento cultural que la profesora o investigada por ellos mismos.
permite entenderse y actuar en una comunidad Esto dependerá de la obra en particular, de la
hablante, y que involucra valores, creencias, cantidad y cualidades de los indicios del texto
actitudes y comportamientos sociales. Como y del conocimiento previo de los estudiantes
señala De Santiago (2010), además de la sobre el autor y la cultura a la que pertenece.
comprensión lingüística La literatura, en muchas ocasiones,
objetiva y cuestiona algunos esquemas. En
(…) también debemos extraer del contexto otras, el autor asimila esquemas culturales de
las reglas culturales, las costumbres y los que participa. Esto lo podemos apreciar,
5hábitos sociales que son igualmente por ejemplo, en la diferencia de perspectiva
necesarias para interpretar un mensaje que puede adoptar un mismo relato mítico en
y no caer en constantes interferencias diferentes versiones: cuando lo cuenta una
comunicativas. El problema es que esos persona que participa de la comunidad de origen
datos, en numerosísimas ocasiones faltan. y de la cosmovisión presente en la historia y
(2010, p. 113-114) cuando se evidencia que el autor no participa de
ella y se distancia. La literatura latinoamericana
Un ejemplo de fallo en la competencia resulta especialmente interesante en cuanto
es la frase que el presidente Sebastián Piñera a la presencia de esquemas sociocognitivos
estampó en el libro de visitas del palacio provenientes de distintas fuentes culturales que
presidencial de Alemania, como corolario de dialogan y se relacionan conflictivamente.
su estadía: Deutshland über alles (Alemania En algunas obras, ciertas visiones
sobre todo). La frase comporta una connotación implícitas en el discurso se relacionan de manera
nazi para los alemanes; por esto la sacaron problemática. Existen textos que socavan
del himno nacional. Cualquier manifestación ideologías e imaginarios culturales a través
de adherencia al nazismo es considerada de la ironía y del contraste entre visiones de
inaceptable en el discurso político público de ese mundo. Un ejemplo de ello es el cuento El
país. Es evidente que el emisor ignoraba algo: la eclipse, de Augusto Monterroso (1995), en que
asociación de la frase con el régimen nazi o la se ficcionaliza el encuentro y desencuentro
implicancia política de la frase para la sociedad entre españoles y mayas, y se echa por tierra la
alemana. Este caso nos muestra la importancia supuesta superioridad del conquistador. También
de compartir ciertos valores o conocimiento los textos de Eduardo Galeano (2013 y 2006)
1026 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
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1028 Ximena Troncoso ARAOS. Literatura y competencia comunicativa: ¿matrimonio mal avenido?
Escrileituras: um modo de ler-escrever em meio à vidaI
Resumo
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1029-1044, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121435 1029
Writreadings: a way of “reading-writing” amidst lifeI
Abstract
1030 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014121435 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1029-1044, out./dez. 2014.
Do projeto postura multivalente de coautoria entre leitor
e escritor para tornar-se, dessa maneira, um
Ao considerar as atuais metas estabele- exercício de pensamento (CORAZZA, 2007). A
cidas pelo Ministério da Educação (MEC), me- concepção de escrita-pela-leitura (e de leitura-
diante o Plano de Desenvolvimento da Educação pela-escrita) supõe textos permanentemente
(PDE), dentre as quais a elevação do Índice de abertos às interferências do leitor e, logo,
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), sempre escrevíveis de múltiplos modos e
estipulado pelo Instituto Nacional de Estudos e traduzíveis para diferentes línguas. O projeto
Pesquisas Educacionais (INEP), o nosso coletivo funciona, principalmente, por meio de oficinas
de pesquisadores afirma a importância de criar que, em seus procedimentos de leitura-e-escrita,
propostas de trabalho empenhadas na qualifi- implicam o campo do vivido, dos sentidos, das
cação da educação básica brasileira. Para que sensações e das invenções; solicitam um tempo
essa meta seja efetivada, acreditamos ser im- que não é o cronológico, mas o da duração;
prescindível redobrar a atenção aos processos autorizam-se a fazer atravessamentos na
de alfabetização de crianças, jovens e adultos, ortodoxia dos textos, para existir a seu modo;
em suas diferentes etapas de aprendizagem, de reivindicam outras maneiras possíveis de
maneira a contribuir para a formação de recur- inscrever signos e de escriturar sentidos.
sos humanos em educação, através de experi- Essas mudanças na significação dos
mentações com a pesquisa educacional, a for- códigos e nas próprias codificações, no entanto,
mação de professores e o exercício da docência, abrem passagem também às escritas formais,
tanto na rede pública de ensino como nos cur- mesmo que realizadas de modo diferenciado,
sos de formação pedagógica das licenciaturas. desde que aquilo que é considerado como sucesso
O projeto de pesquisa, ensino e extensão escolar implica o exercício das práticas sociais
intitulado Escrileituras: um modo de ler- legitimadas de leitura, numeramento, oralidade
escrever em meio à vida, apoiado pela CAPES/ e escrita. Por meio do projeto Escrileituras,
INEP, insere-se nessas ações. Busca alternativas viabilizamos a nossa aposta na alfabetização,
para a compreensão e a superação dos índices enquanto prática e conceito, situada além
apontados pelo INEP, especialmente no que se da simples apropriação do código escrito,
refere às dificuldades de aquisição e utilização reconhecidamente indispensável para responder,
da linguagem nas escolas, expressas pela maioria de maneira satisfatória, às demandas sociais.
dos estudantes da educação básica, por meio da Para o nosso coletivo de pesquisa, os atos de ler
Prova Brasil. Essas dificuldades encontram-se e de escrever são tomados como ações criadoras
ligadas ao próprio uso e produção da linguagem, de sentidos diferentes, para cada leitor-escritor,
enquanto relacionados ao conjunto formado em seus processos de subjetivação, bem como
por conteúdos escolares e operações mentais, exercem importantes funções sociais, culturais,
que envolvem: leitura, escrita e interpretação; comunitárias e políticas.
variações contínuas de temas e imagens;
singularizações de leitura e raridades de escritura; Núcleos
processos de pensamento, formas de conteúdos
e de expressão; relações espaciais, temporais O projeto desenvolve-se, simultanea-
e históricas; sensibilidade para as artes como mente, em quatro universidades públicas, quais
modos de criação; habilidades e competências de sejam: Universidade Federal do Rio Grande do
formular e desenvolver problemas, em ciências Sul – UFRGS (sede do projeto); Universidade
humanas, sociais, exatas e assim por diante. Federal de Pelotas – UFPel; Universidade
Conceitualizamos o resultado da Federal do Mato Grosso – UFMT; e Universidade
escrileitura como um texto que reivindica uma Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Cada
Fonte: Inep
1032 Sandra M. Corazza; Carla G. Rodrigues; Ester M. Dreher Heuser; Silas B. Monteiro. Escrileituras: um modo de ler...
Como é possível observar, constatamos anual, questão cultural fortemente arraigada,
que a Escola Estadual Dom José do Despraiado, carreia um desequilíbrio inicial, fazendo com
de Cuiabá/MT, conseguiu superar, em 2009, que fiquem agravados os problemas inerentes
a meta estabelecida para os anos iniciais do ao processo de alfabetização. Essas fragilidades
ensino fundamental e, em 2011, atingiu a meta repercutem na adoção dos ciclos, do ponto de
prevista para 2015. Para os anos finais do vista legal, que não são efetivados na prática,
ensino fundamental, em 2007, a mesma escola ou seja, observa-se a adoção dos ciclos no
já superou a meta projetada para 2011, enquanto papel e a manutenção da seriação no cotidiano
que, em 2009, ultrapassou, antecipadamente, das escolas.
a meta de 2013 e, em 2011, também a meta Entretanto, os aspectos positivos,
projetada para 2017. Importante destacar que percebidos em uma década de organização do
a escola não realizou a Prova Brasil em 2005. ensino por ciclos, consistem em redução da
A partir de 1999, adotou os Ciclos de Formação evasão, flexibilização do processo avaliativo e
Humana como a sua forma de organização novas metodologias de ensino. Incorporando os
do ensino. Quando a Secretaria de Estado de princípios do ciclo, mostra-se possível aprender
Educação iniciou o processo de ciclagem na a lidar com a retenção, encontrando novos
rede estadual de ensino, em 2000, todo o ensino formatos para os relatórios no 3º ciclo, sem
fundamental já estava organizado em ciclos. prejuízo da avaliação descritiva e, finalmente,
Num primeiro momento, verificamos, busca-se condições para que os alunos aprendam.
nessa rede, a ausência de condições físicas Essa forma de organização do ensino vem sendo
e estruturais, bem como a instabilidade e cada vez mais consolidada, na rede estadual,
insegurança dos professores diante das mudanças visto que, na escola do projeto Escrileituras,
como fatores que desencadeiam uma flagrante constroem-se algumas condições necessárias
situação de queda no rendimento dos alunos. para o trabalho com ciclos, manifestando-se
Além disso, a brusca retirada da reprovação vantagens reais para a aprendizagem.
Fonte: Inep
O colégio Estadual Jardim Europa, pequena queda no IDEB observado. Esse fato
Toledo/PR, conseguiu superar a meta projetada passa a ser objeto de avaliação pela direção e
para 2013, referente aos anos finais do ensino pelo corpo docente da escola. Em razão de os
fundamental em 2007; em 2009, superou dados serem recentes, o projeto Escrileituras
também a meta de 2015. Já em 2011, registrou ainda não tem disponibilizado o parecer a
1034 Sandra M. Corazza; Carla G. Rodrigues; Ester M. Dreher Heuser; Silas B. Monteiro. Escrileituras: um modo de ler...
Nos circuitos e transcursos tradutórios, reinventa novas significações, posições de
a didática das oficinas privilegia e honra indivíduos, comunidades e grupos. Criando
elementos de funções científicas, de conceitos linhas de saberes, sentires, fazeres e dobrando-
filosóficos, de perceptos e afetos artísticos, os, uns sobre os outros, realiza atos minoritários
extraídos de obras já realizadas, que outros de ruptura e consonâncias. Instalando-se
autores criaram, em outros planos, tempos, em regiões desconhecidas de problemas,
espaços, línguas, como as suas efetivas revela aspectos ocultos dos seres e circuitos
condições de possibilidade, necessárias para a inéditos de pensamento. Não comportando
própria execução, e, ao mesmo tempo, como determinismos, transforma momentos, lugares,
o seu privilegiado campo de experimentação, incidentes e circunstâncias em móveis fecundos
necessário para as próprias criações de leitura- de experimentações.
e-escrita. Com esses elementos originais, Esse construcionismo didático do
constitui um campo artistador de variações projeto implementa procedimentos crítico-
múltiplas e disjunções inclusivas, que compõe -genealógicos e exploratório-experimentais de
linhas de vida e devires reais, promove fugas análises e ações (CORAZZA, 2012b), que partem
ativas e desterritorializações afirmativas. de clichês (forma, sentido, interpretação,
Comportando mais do que o transporte indivíduo, subjetividade, conhecimento, certeza,
do significado daquilo que é traduzido, ou seja, verdade). Identificam a imagem dogmática
comportando os próprios signos, a didática- do pensamento, que lhe corresponde, em seus
artista traduz: linguagem verbal e não verbal; pressupostos explícitos e implícitos de doxa e
elementos de estrutura e visuais; homologias senso comum (HEUSER, 2010). Dessa maneira,
fônicas e sintáticas; espacialização e imagética borra e raspa os clichês, criando diagramas ou
visual; filmes e cartazes publicitários; conjuntos operatórios de traços pré-individuais,
combinações sonoras e coreografias logopaicas; irracionais, involuntários, acidentais, não-
assonâncias, rimas, aliterações, métrica, ritmo, -representativos, não-ilustrativos, não-
melodias de canções; fórmulas geométricas -figurativos, não-narrativos.
e equações matemáticas etc. Essas traduções Para realizar essa apropriação criadora,
não são literais, funcionais, automáticas, os participantes das oficinas de escrileituras
etimológicas, estruturalistas, hermenêuticas, necessitam ter: “nível curricular”, para
celebrações epifanísticas, sobretradução, selecionar os mais importantes elementos
semidecalques, superafetações. Também não perceptivos, afetivos, conceituais e funcionais
soam como extravagâncias, não traduzem do seu tempo e espaço; “irreverência temática”,
palavra por palavra, não transmitem supostas para privilegiar elementos, obras e autores
mensagens dos originais, não contêm purismos, marginalizados ou anômalos, que introduzem
não explicam os textos por seus contextos. Ao novos e heterodoxos problemas, questões e
contrário, consistem em traduções nas quais temas; usar a linguagem como instrumento,
são postas potências criadoras, de modo que o para experimentar variados elementos de uma
resultado vale como se as traduções fossem as língua; realizar um “trabalho de estruturação e
próprias obras originais, vivas e abertas (PAES, de ajuste”, em termos de artesanato (MILTON,
1990; LARANJEIRA, 1993; WANDERLEY, 1993). 1998, p. 209-210).
Capturando e liberando escrileituras As recriações, feitas pela didática do
inéditas, a didática-artista trabalha as potências projeto, possuem uma ampla gama de formas
que essas carregam. Substituindo a relação à disposição: orgânicas, analógicas, miméticas,
forma-matéria pela relação força-material, mais ou menos fiéis ao original, qualidades
associa obras, autores e tradutores, em devires musicais, ironia, humor, tragédia, comédia,
de mutação. Favorecendo culturas do dissenso, intertextualidade, metáfrase (tradução literal,
1036 Sandra M. Corazza; Carla G. Rodrigues; Ester M. Dreher Heuser; Silas B. Monteiro. Escrileituras: um modo de ler...
atributo do espaço, como ordem das distâncias eternamente movente, maximamente diferen-
entre pontos de vista, que torna possível a ciado, em suma, perspectivado. É um método
repetição. Portanto, o perspectivismo do projeto que reordena formas de organização preesta-
consiste em um tipo de singularidade, no espaço belecidas, enceta prolongamentos de leituras e
das oficinas, enquanto envoltório, de acordo curvaturas de escritura, traceja outras imagens
com relações indivisíveis de distância. textuais e dispõe superposições interculturais,
Na multiplicidade das traduções numa ordem estratigráfica, com mudanças de
das oficinas, não existe, assim, centro de orientação para a renovação didática.
configuração, hierarquia transcendente ou
caráter de generalidade; porém, nem todas Tipologia
as matérias-movimentos são consideradas
equivalentes. A perspectiva do método O desenvolvimento do projeto compre-
seleciona, dispõe e põe em funcionamento ende modos de intervenção investigativa, nas
instrumentos (representacionais, cognitivos, formas de ensinar e aprender, as quais se cen-
esquematizantes, corporais), em relação à tralizam na modalidade de planejar, organizar e
vontade de potência (Wille sur Macht). Por desenvolver oficinas de escrileituras. Contudo,
isso, as traduções derivadas, como formas da não adotamos a ideia de oficina enquanto um
vontade para a potência, têm existência como local para a execução de consertos, ajustes ou
afetos, isto é, não como seres, mas enquanto retificações. Interessa-nos essa concepção como
processos e devires. um lugar em que se exerce algum ofício, no caso,
Assim, cada procedimento de tradução a escritura e a leitura, em via de mão dupla. Para
apresenta valor mais forte ou mais fraco, em função tanto, optamos por planos de trabalho organiza-
da abrangência multiforme e plural do seu campo dos em tempos, espaços e propostas específicas
tradutório; maior ou menor desconhecimento a cada encontro das oficinas. Na articulação dos
do próprio caráter ficcional (o que leva a três planos do pensamento filosófico, artístico e
graus também diversos de substancialização); científico, construímos territórios que compor-
delimitação interperspectivista, na relação com tam uma tipologia de oficinas criadas, quais se-
outras traduções necessárias; possibilidade de jam: filosofia, teatro, lógica, música, biografema
realizar experimentações marginalizadas por e artes visuais (DALAROSA, 2011).
outras traduções e perspectivas, considerando
que alguns desses procedimentos não tomam Oficinas em ação
sentido e direção, senão como atalhos ou desvios
de caminhos que foram apagados. No Núcleo UFRGS, sede do projeto
Na medida em que realizam traduções Escrileituras, foi desenvolvido o curso
didáticas transcriadoras, os procedimentos di- de extensão denominado Transcriações
dáticos que integram o método da cartogra- no cotidiano, totalizando 40 horas-aula e
fia instauram sentidos, ideias, generalizações, destinado a professores das escolas, alunos de
empirias, abstrações, imagens, vocabulário, graduação, mestrado e doutorado, envolvidos
recorrências, paráfrases, metáforas, polêmicas, no projeto, bem como ao público e interessados
esquemas de inteligibilidade, vozes, referentes em geral. Esse curso foi pensado durante a
enunciativos, condições de validade, regras de pesquisa do conceito de criação, na filosofia da
leitura, operadores textuais etc. Apresentando diferença, como algo pertinente ao campo do
os seus componentes, associados aos de outros vivido, da violência, do problema, da estética
campos semânticos, lógicos e ontológicos, áreas e da afeição.
de saber-fazer, planos precedentes de pensa- Abrangeu a composição de cinco módu-
mento, o método do projeto é não totalizante, los de oficinas, quais sejam: a) bio-oficinas de
1038 Sandra M. Corazza; Carla G. Rodrigues; Ester M. Dreher Heuser; Silas B. Monteiro. Escrileituras: um modo de ler...
da tarefa de tratar os movimentos improvisados desprovido de certezas e fixações; oferecer-lhe
do corpo, até mesmo do desejo de evitar a experimentação mais do que recomendação
doença e de viver a vida. Ainda, dispõe-se a ou interpretação. Convite à transcriação, à
rever procedimentos educacionais em saúde, (anti)produção singular, numa linha de fuga
dando privilégio à fluidez criadora de cada às normatizações que amputam ou esticam o
participante e tomando-a em sua singularidade, corpo, a fim de adequá-lo ao leito de Procusto4.
numa provocação às invenções de novas formas As fantasias tomam a forma de oficina, num
de lidar com o corpo, movida pela ingestão tema prescritivo, pelo menos a priori. Tarefa
ou apreensão sensível da alimentação. Num nossa de despovoar o discurso legitimado
primeiro momento, foi realizada com membros pelo aparato médico-científico, que se oferece
do núcleo da UFMT; depois, com os alunos da como logos. O corpo põe a vida em cena, em
turma de Comunicação e Educação em Saúde gestos únicos, insubstituíveis, imprevisíveis e
do curso de Nutrição da UFMT, com o intuito imprescritíveis (BIATO, 2013).
de prepará-los para realizarem atividades No núcleo UNIOESTE, foi elaborada
educacionais em saúde nas escolas. Por último, a oficina Nomes com o objetivo de abrir um
desenvolveu-se com as turmas de quinto ano caminho de reflexão filosófica a partir da
da Escola Estadual Paciana Torres de Santana. problematização de um conceito, retirado
Como estabelecer os engates entre do cotidiano das crianças, e considerado
saúde (via alimentação), educação e filosofia algo necessário, inquestionável. A discussão
da diferença? Tomamos como pano de fundo desdobra-se na questão de determinar o
a possibilidade do corpo estabelecer relações desmembramento ou não da associação
permutáveis, num exercício de lançar fora o dever- entre linguagem e conhecimento, ou seja, em
-ser e dever-comer (ali incluído), que permeiam determinar a possibilidade ou não da linguagem
as normas para se viver com saúde. Estudar, dizer dizer as coisas tais como estas são. Se os nomes,
e escrever do próprio corpo, a partir de fantasias pensados enquanto imitações da realidade,
em cores, sabores e texturas. De alimentos, do abarcam ambiguidade de significados, poderiam
comer e dos sentidos. Alimentos, e a experiência tanto significar a imagem de uma realidade que
com eles, como fonte de inspiração e criação de é puro fluxo quanto uma que se constitui como
si. Foram ações do tipo comer, provar, ver, pintar, permanência do mesmo (HEUSER; PINTO;
cheirar, criar personagens e estórias, desenhar, CABRAL, 2013). Como resultado, tornar-se-
dizer, escrever (BIATO, 2013). Práticas de fuga a -ia impossível determinar um critério legítimo
um centro controlador do corpo, de onde surgem capaz de nortear a demarcação da verdade, o
normatizações. Práticas de esquecimento e que colocaria em risco a própria possibilidade
liberdade (DELEUZE; GUATTARI, 1996). do conhecimento. Do resultado dessa discussão,
Falar, pintar e escrever com intensidade depende toda a dimensão dialógica e pedagógica
faz crescer as vias fantásticas, em sobrevoos, da filosofia e do conhecimento como um todo,
encontro com o mesmo, produção de si num na medida em que esse depende do elemento
corpo pleno sem órgãos (DELEUZE; GUATTARI, linguístico para se concretizar e garantir sua
1996). A escola parece ter espaço disponível universalidade e objetividade.
para a construção desse tipo de percurso: “O Num primeiro momento da oficina, a
abacaxi colorido chamou sua melhor amiga... intenção foi instigar os estudantes a refletirem
E eles fizeram uma grande festa do pijama!”; acerca da relação entre os nomes e os objetos que
“Meu rosto... é um limão... é um menino esses indicam, de modo a inserir o questionamento
muito triste.”3 É possível olhar para o corpo
4- Procusto é um ladrão da mitologia grega que oferecia um leito a seus
3 - Escritas de estudantes do quinto ano da Escola Estadual Paciana hóspedes. Caso não coubessem nele, exatamente na medida da cama,
Torres de Santana (MT). eram amputados ou esticados até o ajuste necessário.
1040 Sandra M. Corazza; Carla G. Rodrigues; Ester M. Dreher Heuser; Silas B. Monteiro. Escrileituras: um modo de ler...
(UNIOESTE). Após a sua aprovação pelos órgãos política nunca pode manipular seus conjuntos
de financiamento macropolíticos, o Escrileituras, molares sem passar por essas microinjeções,
enquanto uma micropolítica, ultrapassa essas infiltrações que a favorecem ou que
fronteiras, tanto por meio da extensão quanto lhe criam obstáculo”; e que, mesmo, “quanto
da pesquisa e do ensino. Trata-se de fronteiras maiores os conjuntos, mais se produz uma
extensivas, mas, ao mesmo tempo, intensivas, no molecularização das instâncias que eles põem
que diz respeito a formas de pensar, ler, escrever em jogo” (DELEUZE; GUATTARI, 1996, p.
e criar modos de fazer educação, atravessados 78). Nessa interdependência, os trabalhos de
pela filosofia, pelas artes e pelas ciências. pesquisa, extensão e ensino que conformam o
São modos de viver constituídos por macro e projeto Escrileituras ultrapassam fronteiras para
micropolíticas de escrileituras que coexistem e dar consistência ao prazer de ler e ao desejo de
pressupõem umas às outras, passando uma pela escrever, os quais vêm sendo intensificados, em
outra (DELEUZE; GUATTARI, 1996). seus participantes e no seu porvir.
O projeto cria e realiza, em escolas públicas, Isso porque Escrileituras é, sempre, um
desde os anos iniciais até o final do ensino ato político, que não assimila o outro a si mes-
médio, bem como na universidade, oficinas de mo, mas aproxima distâncias e transpõe cul-
escrileituras, orientadas pelo pensamento da turas estrangeiras umas às outras. Utilizando
filosofia da diferença em educação, pensamento a didática-artista da tradução e o método car-
que funciona como uma ferramenta que possibilita tográfico, não é nunca cópia, mas transcria-
a seus participantes experimentar e formular ção, que modifica os originais, como uma he-
novos problemas, sugerir novos conceitos, ideias terofilia, desfazendo identidades sedentárias.
e procedimentos criadores, tanto para si próprios Operando sob o fascínio das interinfluências
quanto para as crianças, jovens e adultos, junto aos trazidas pelas linguagens contemporâneas, im-
quais experienciam escrileituras em meio à vida. plica a invenção de um corpus crítico-seletivo,
Destacam-se, nesse caminho já traçado, que liga criteriosamente os conceitos de tradu-
procedimentos realizados entre as duas ção poética, intertextualidade e relações entre
dimensões políticas: a macro, planificadora diversos sistemas de signos. Compartilhando
da educação nacional, que demanda cidadãos espaços e tempos heterogêneos e simultâneos,
brasileiros alfabetizados, dotados de raciocínio o projeto introduz, nas relações de estudantes,
lógico-matemático bem desenvolvido6; ao professores e pesquisadores com o mundo, no-
lado da dimensão micropolítica, desenvolvida vos modelos, formas, ideias, gostos, vocabulá-
pelas oficinas de escrileituras, que lidam com rios, sintaxes, em variação contínua. Operando
fluxos e partículas de leituras, escritas e vidas, com a força motriz de ideias e estilos novos,
os quais escapam dos gráficos e índices da mudanças e desenvolvimentos, nos atos de
grande política estatal. Não parece equivocado ler, escrever e pensar, dá sobrevida aos textos
afirmar que o Ministério da Educação necessita originais da filosofia, da ciência e da arte, os
dessas microações, propostas pelas instituições quais passam a viver mais tempo e de modo
educacionais, enquanto, nós, pesquisadores e diverso. É que, sendo capaz dessas anamor-
professores, precisamos das macroações de Estado. foses tradutórias, quando reescreve e repensa
Essa condição de necessidade mútua os elementos originais, o projeto Escrileituras
deve-se, por certo, ao fato de que “a grande considera que todas as vidas, como processos
6 - Edital 38/2010 do Observatório da Educação CAPES/INEP, disponível em: de criação, precisam ser bem traduzidas, de
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Sandra Mara Corazza é licenciada em Filosofia, mestre e doutora em Educação. Por 21 anos, professora de currículo por
atividades na rede pública do Estado do Rio Grande do Sul, em escolas da periferia urbana, alfabetizando crianças, jovens e
adultos. Professora Associada IV da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação, Departamento de
Ensino e Currículo.
Carla Gonçalves Rodrigues é formada em Psicologia pela UCPel, Doutora em Educação pela UFRGS. Atualmente é professora
adjunta da UFPel.
Ester Maria Dreher Heuser é professora-pesquisadora adjunta da UNIOESTE, Campus Toledo (PR). Atualmente é
coordenadora do Colegiado da graduação em Filosofia da UNIOESTE.
Silas Borges Monteiro é doutor em Educação pela Universidade de São Paulo. Atualmente é professor associado da
Universidade Federal de Mato Grosso.
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1045-1060, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014041384 1045
Faces and metamorphoses of power: a sociography of the
Portuguese ministers of education in the democratic era
Pedro AbrantesI
Cristina RoldãoII
Abstract
Keywords
1046 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014041384 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1045-1060, out./dez. 2014.
O presente artigo caracteriza o perfil e a apologistas das democracias liberais como dos
trajetória social dos 27 ministros da Educação sistemas comunistas. Embora sem constituir
de Portugal, entre 1974 e 2012, com base num uma teoria geral das elites, também Max Weber
conjunto de indicadores sociológicos, enquanto (1968) marcou profundamente esse debate
contribuição para a análise dos grupos, interesses com as suas reflexões a respeito da formação
e ideologias que têm sido dominantes na definição do Estado, da burocracia e dos mecanismos de
das políticas educativas. Apesar do interesse da poder e autoridade. Se o autor apresenta uma
pesquisa educativa recente por conceitos como visão relativamente aberta e multidimensional
o poder, a política e a democracia, raramente se do poder nas sociedades modernas, apoiado
têm estudado os atores sociais nomeados para na sua conhecida diferenciação de classes
liderar as políticas educativas.1 (econômicas), status (social) e partidos (política),
O artigo primeiramente apresenta a reconhece também poderosos mecanismos de
fundamentação teórica do estudo, colocando fechamento social que acionam os grupos, no
em diálogo contributos de duas linhas de sentido de preservar a sua posição privilegiada.
investigação: uma sobre a formação das Nos anos 1950, Wright Mills (1959)
elites e, em particular, das elites políticas; e apoia-se nessas teorias clássicas para
outra que versa sobre políticas educativas e fundamentar o seu estudo acerca da elite de
a estruturação dos sistemas de ensino. Após poder norte-americana. O autor critica as
uma breve apresentação do modelo de análise perspectivas pluralistas, mostrando as intensas
e da metodologia, discutem-se os principais interligações e sobreposições entre as elites
resultados do estudo, em cinco eixos: período econômica, política, intelectual e militar. Uma
de permanência no cargo; sexo e origem social; hierarquia institucional, interesses e objetivos
estudos universitários; relação com os partidos; comuns, bem como uma unidade psicológica e
e trajetórias profissionais. social – formada pela participação duradoura
nos mesmos círculos sociais – asseguram essa
Elites, política e educação integração de várias fações numa mesma elite,
bem como o seu relativo fechamento com
O estudo das elites tem uma longa relação aos restantes grupos sociais.
tradição na sociologia e na ciência política. Nessa linha, importa considerar os
Relembre-se a influência das teorias clássicas, trabalhos que Pierre Bourdieu desenvolveu
de autores como Pareto, Mosca e Michels a acerca da sociedade francesa, entre os anos
respeito da existência, em todas as sociedades, 1960 e 1990. Na sua obra dedicada à formação
de elites que dirigem as massas, enquanto das elites, Bourdieu (1989) coloca a tônica
procuram conservar a sua posição distintiva na forma como o Estado, através do sistema
(BOLÍVAR MEZA, 2002). Para isso, buscam educativo, tende a separar os jovens em
renovar-se com as ideias e as pessoas mais diferentes vias de ensino, reservando algumas
aptas de outros meios sociais (circulação das instituições específicas (as grandes escolas) para
elites). Segundo esses autores, quando não a formação de um grupo restrito, privilegiado
existe tal regeneração, surgem condições em conhecimentos, representações e disposições
propícias para uma mobilização das massas, a e que ocupará a classe dirigente.
largo prazo, originando a substituição da elite, O autor centra a sua análise nessas
não a sua dissolução. Essas propostas tiveram escolas, cujas classificações e ordenações
um profundo impacto no início do século XX, permitem produzir um habitus distintivo
contrariando as visões otimistas, tanto dos e um esprit de corps que dão origem a uma
1- Gostaríamos de agradecer à professora Leonor Torres, da Universidade elite coesa, solidária entre si e profundamente
do Minho, pela leitura atenta do artigo e as sugestões para melhorá-lo. convencida da sua superioridade e legitimidade,
1048 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
Ao contrário do que se passou em muitos propósito, ganha expressão uma tensão entre,
países europeus durante a década de 50 e 60, por um lado, as elites política e econômica e, por
em Portugal, os partidos nunca chegaram outro, os grupos profissionais (de professores,
a ter uma verdadeira ancoragem a estratos e sobretudo), organizados em associações e
grupos específicos da sociedade civil. Quando sindicatos. Outros atores, como a comunidade
se assiste à democratização político-partidária, científica, a comunicação social, organizações
já a dinâmica de afastamento dos partidos face de pais, as administrações educativas e locais
à sociedade civil estava em marcha, daí que ou os diretores de escola, tendem a funcionar
Panebianco (1988) descreva o surgimento dos como mediadores dessas tensões, ganhando
partidos do arco da governação como resultante protagonismo em certas conjunturas e não
principalmente da mobilização de elites e não deixando de mobilizar estratégias, culturas e
tanto das suas bases sociais de apoio. agendas próprias (ABRANTES, 2008).
Como nota Lobo (2003), a escolha Outros autores têm observado, sobretudo
dos membros do governo parece estar mais a partir dos anos 1980, uma reconfiguração
dependente do primeiro-ministro indicado dos sistemas educativos, segundo as lógicas
do que dos militantes, elites intermédias de mercado, em grande medida segundo
ou dos órgãos dirigentes dos partidos. Em os auspícios de poderosas instituições
simultâneo, a autora assinala uma crescente internacionais (ALTMANN, 2002; APPLE,
“governamentalização” das elites político- 2004; DALE, 2004; TEODORO; ANÍBAL, 2007).
-partidárias, expressa na tendência para os Nesse sentido, assiste-se a uma penetração dos
membros de órgãos executivos dos partidos interesses, lógicas e linguagens empresariais
mais votados integrarem o governo ou serem no currículo, na gestão escolar, no controle
deputados. Desde logo, o titular do cargo disciplinar e na avaliação dos agentes
de primeiro ministro é simultaneamente o educativos, a par de políticas que promovem a
dirigente máximo dos partidos no governo competição entre escolas e a “livre escolha” das
(secretário-geral ou presidente do partido). Essa famílias (POPKEWITZ, 1991; 2008; BARROSO,
situação pode ser interpretada, como faz Freire 2005). Outro indicador desse processo é a
(2003): quer como uma crescente partidocracia presença crescente de governantes educativos
do recrutamento para o governo e parlamento, com formação em economia, algo que também
que coloca o problema da subalternização se observa no Brasil (ALMEIDA, 2008) e que
da lógica do Estado à lógica dos partidos; acompanha uma dinâmica de recomposição
quer como uma crescente profissionalização mais geral dos governos em Portugal (ALMEIDA;
das carreiras políticas, observada como um PINTO, 2006), na Espanha (LINZ; JEREZ;
indicador de modernização e desenvolvimento CORZO, 2006) e na Grécia (SOTIROPOULOS;
político, no sentido em que representa uma BOURIKOS, 2006), entre outros países.
maior autonomia da esfera política em face de Note-se que as instituições e redes
outros subsistemas sociais. internacionais há muito tempo desempenham
Por seu lado, os estudos sobre os um papel central na formação e afirmação dos
sistemas educativos têm enfatizado que, nas governantes educativos, sobretudo em países
sociedades modernas e democráticas, a sua periféricos, como está bem patente num estudo da
estruturação se desenrola segundo um modelo biografia de Anísio Teixeira (BITTENCOURT, 2009).
de multirregulação, a partir das relações de Acresce que a ideologia neoliberal não constitui
força (estratégias, conflitos e negociações) entre um conjunto unificado e universal de políticas
diferentes grupos, em múltiplos níveis de escala (NÓVOA, 2000). No caso português, considerando
(ARCHER, 1979; PETITAT, 1982; BOWE; BALL, um padrão histórico de altas desigualdades sociais
1992; FERNÁNDEZ ENGUITA, 2007). A esse e de um campo empresarial, como se referiu,
1050 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
ministros. A pesquisa de Almeida e Pinto Sendo certo que, em alguns casos, o
(2006), para o período entre 1976 e 1999, afastamento do cargo decorreu da demissão do
revela uma maior proporção de mandatos governo, foi frequente também a sua substituição
longos (19,2% dos ministros teve mandatos durante a legislatura (8º e 9º GC e, por duas vezes,
de quatro ou mais anos) do que aquela que nos 12º e 13º GC). Será útil lembrar que se trata do
observamos para os ministros da Educação no ministério que tem a seu cargo o maior número de
mesmo período (15%). A hipótese da elevada funcionários públicos e que as mudanças no setor
volatilidade desse cargo – devido a um maior educativo são necessariamente lentas e complexas.
escrutínio social, ao peso no orçamento de Tendo em conta que, a cada mudança de ministro,
Estado e consequente concorrência face a sucede a substituição de diversos outros titulares
outros ministérios, à grande dimensão e forte de cargos de topo na administração educativa, é
dinâmica sindicalista da classe profissional, patente o enorme desperdício que representa tal
entre outros fatores – surge reforçada das instabilidade, não apenas de recursos financeiros,
palavras de vários dos ministros da Educação, mas também de tempo, competências e confiança,
entrevistados por António Teodoro (2002). num pequeno país como Portugal.
Essa volatilidade – que, como se viu, não momentos, influenciando também a decisão
se pode reduzir a períodos revolucionários ou de de prosseguir as reformas ou, pelo contrário,
instabilidade governamental – deve ser entendida “reformar” os ministros. Se os conflitos entre os
pelas dificuldades de integração dos diferentes referidos atores coletivos (e, por vezes, no seio de
poderes capazes de influenciar o campo educativo. cada um), exacerbados pelos media (ABRANTES,
Destaca-se a incapacidade de encontrar políticas, 2008; 2009), afiguram-se frequentemente
e políticos, firmados em acordos entre a elite e insanáveis, importa não esquecer que as
as massas ou, numa formulação mais rigorosa, democracias representativas, em diferentes partes
entre os interesses da elite político-econômica, da do mundo, têm-se baseado nesse tipo de alianças,
elite cultural-intelectual e dos agentes do campo ainda que frágeis e temporárias (FREIRE, 2003;
educativo, nomeadamente, a classe docente, cujos HIGHLEY; BURTON, 2006; GILL, 2000).
líderes sindicais estabelecem frequentemente
contraelites (SAVAGE; WILLIAMS, 2008). A b) Homens, oriundos das áreas metropolitanas e
participação de outros grupos, como os pais, os dos “grandes liceus”
alunos ou as autarquias, pelas suas dificuldades
organizacionais, têm desempenhado um papel Apenas quatro das 27 pessoas que
menos central no campo educativo, ainda que a ocuparam o cargo desde 1974 são do sexo
sua mobilização tenha sido relevante em alguns feminino (Quadro 2). Esse dado não deixa de ser
Ainda que as informações recolhidas 15% população, mas a maioria dos recursos
apontem para uma primazia de meios sociais econômicos, culturais e políticos, segundo
favorecidos, os dados sociográficos que o modelo dual de desenvolvimento que
conseguimos recolher sobre as famílias de caracterizava o país (SEDAS NUNES, 1964).
origem é exígua, não permitindo extrapolações. Esse padrão parece inclusive acentuar-
Contudo, observando o local de nascimento -se, sendo os últimos cinco ministros naturais
e residência durante a infância, podemos da região de Lisboa. As escassas exceções vêm
identificar uma clara prevalência do distrito de alguns atores provenientes do distrito do
de Lisboa (16 de 27). Note-se que, nos anos 50 Porto e ou de cidades da zona centro (Leiria,
e 60, essa região concentrava apenas cerca de Castelo Branco, Tomar, Cantanhede). Não
1052 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
existem originários das ilhas, do Algarve ou de vista pessoal, tanto pela homogeneidade social
Trás-os-Montes. É importante, aliás, referir que como pela capacidade de penetração e molda-
essa sobrerrepresentação da capital, apesar de gem de diferentes dimensões, internas e exter-
generalizada aos diferentes governos e pastas nas, da vida dos alunos. A preocupação com a
ministeriais, é particularmente saliente na pasta educação integral ganha terreno a partir do iní-
da educação. Almeida e Pinto (2006), para o cio do século XX, destacando-se, entre outras,
período 1976-99, observaram que um terço dos as atividades relativas às associações escolares
ministros era natural de Lisboa, quando na nossa e outras formas de ação coletiva de iniciativa
amostra representam mais de metade dos casos. estudantil (caixas escolares; sessões culturais;
Quase todos, entre aqueles para os quais visitas de estudo e excursões; jornais escolares;
conseguimos obter informação (17), realizaram campeonatos desportivos; grupos corais, de te-
os seus estudos secundários em cursos científicos atro etc.), extintas em 1942, e as atividades ex-
ou humanísticos (via orientada para o ensino tracurriculares de participação obrigatória pro-
superior), em certos liceus, designação das movidas pela Mocidade Portuguesa e Mocidade
escolas públicas com um ensino orientado para o Portuguesa Feminina, que vieram substituir as
prosseguimento de estudos universitários, antes organizações autônomas geridas pelos alunos
de 1974 (Quadro 2). É significativo que apenas (BARROSO, 1995).
um ministro é formado num colégio privado, O confinamento social produzido pelos
via frequentemente associada à formação das mecanismos de recrutamento das escolas de
elites, e que nenhum tenha frequentado o elite, assim como a capacidade de penetração
ensino técnico-profissional, sendo o caso mais simbólico-ideológica, contribuíram para uma
próximo disso a frequência no Colégio Militar. relativa homogeneização desses grupos e
Os liceus encontram-se entre as escolas construção de redes sociais intraelites, forjadas
públicas mais antigas e prestigiadas do país. numa socialização contínua e prolongada numa
Apesar das diferenças de estatuto (1a classe/2ª fase marcante do desenvolvimento de qualquer
classe; nacionais / centrais / municipais etc.), indivíduo. Essa rede de relações, assim como
existia, durante o Estado Novo, uma grande a interiorização profunda de um conjunto de
proximidade entre liceus e elites. Não só os códigos comuns, persiste e opera para lá da
liceus eram poucos, na maior parte localizados vida escolar (BOURDIEU, 1989).
em capitais de distrito e no litoral, como eram
um elemento de forte distinção local. Eram c) A primazia de certas universidades (públicas)
liderados por reitores nomeados pelo governo, e áreas de formação
tendo muitos deles (assim como professores)
desempenhado posições prestigiadas nas Todos os ministros da Educação, desde
elites política, burocrático-administrativa, 1974, eram detentores de uma licenciatura e a
econômica e artístico-cultural (NÓVOA et al., maioria contava com estudos de mestrado e/ou
2003; BARROSO, 1995). Do ponto de vista doutorado, quando exerceram o cargo (Quadro
socioeconômico, os alunos que chegavam 3). Quando olhamos para o perfil escolar da
ao liceu correspondiam a uma minoria que globalidade dos ministros entre 1976-1999,
contrastava profundamente, desde logo, com os menos de um terço tinha mestrado ou doutorado
alunos das escolas comerciais e industriais, mas, (ALMEIDA; PINTO, 2006), quando na população
sobretudo, com a massa de população ligada aqui analisada esse é o perfil dominante.
à agricultura no interior do país (CRUZEIRO; Além disso, exceto no período
ANTUNES, 1978; GRÁCIO, 1986). revolucionário, em que quatro militares
Os liceus proporcionavam um enquadra- ocuparam o cargo de ministro de Educação,
mento socioeducativo marcante do ponto de a larga maioria (17) permaneceu ligada
às universidades, sendo a docência e/ou a com alguma primazia para a engenharia química
investigação uma das suas principais ocupações (4), número ao qual devemos acrescentar três
laborais, ao longo da vida. Alguns foram que se licenciaram em ciências físico-químicas
inclusive reitores das respectivas instituições e um em farmácia. Uma nota evidente a fazer
(3), antes da sua integração no governo. Fica é a ruptura drástica com o perfil de formação
patente que a legitimidade do governo educativo dos ministros da Educação durante o Estado
não dispensa a preservação da forma piramidal Novo (BRAGA, 2010), em que a frequência
(simbólica) do sistema educativo, encontrando- das Faculdades de Direito das Universidades
-se no topo a academia e conferindo um lugar de Coimbra e de Lisboa era predominante,
subordinado ao ensino orientado para a prática, assemelhando-se às grandes écoles francesas,
dos institutos politécnicos e das escolas técnicas. pela importância que revelavam nos processos
Apenas algumas universidades de recrutamento da elite política (BOURDIEU,
estão presentes e, dentro delas, certas áreas 1989; PINTO, 2000).
disciplinares. Com relação à licenciatura, É possível identificar três períodos:
podemos observar uma clara prevalência das um primeiro em que se alternaram militares e
licenciaturas em universidades públicas (26), em filósofos-historiadores (1974-78), um segundo
particular, da Universidade Técnica de Lisboa (9) – quase totalmente dominado por engenheiros
e, dentro desta, do Instituto Superior Técnico (1978-1999), aspecto que vai ao encontro
(IST) (6) – tão mais surpreendente quando ao seu aumento entre a generalidade dos
não existe, nessa instituição, investigação titulares ao cargo de ministro e, finalmente,
ou docência na área da educação. Assim, dez um terceiro com formações mais diversas, mas
ministros foram licenciados em Engenharia, com vantagem para economistas e sociólogos,
1054 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
sendo que, no caso dos primeiros, corresponde ANÍBAL, 2007). A própria transferência de
a uma dinâmica transversal a diferentes pastas uma esfera de influência francófona para
ministeriais (ALMEIDA; PINTO, 2006). outra anglo-saxônica é representativa das
Com relação às pós-graduações, metamorfoses nas relações (globais) de poder,
sente-se uma presença maior de instituições entre os campos político e educativo, tanto
internacionais (11 em 21): francesas, nos anos mais que é concomitante com um processo de
1970, inglesas e norte-americanas desde os anos aprofundamento da integração europeia, no qual
1980. Apesar de alguns dos ministros terem seria de esperar um maior peso dos sistemas do
experiência de trabalho no domínio educativo centro do continente, mas não tanto do Reino
antes da entrada no cargo, nenhum dos 27 foi Unido e, menos ainda, dos Estados Unidos. O
licenciado em educação ou pedagogia e apenas trabalho recente de Bittencourt (2009) mostra
dois realizaram pós-graduações na área. como a formação pós-graduada em certas
Com paralelismos ao observado instituições internacionais, particularmente
por Bourdieu (1989 e 2005), na França, influentes em certas épocas e regiões, pode
a nomeação para o cargo de ministro da ser decisiva no acesso a lugares de topo no
Educação parece ser favorecida por uma longa governo educativo, sobretudo em países da
socialização em certas escolas (públicas), do periferia do sistema-mundo, conferindo uma
ensino secundário e superior, produtoras de legitimidade (interna e externa) que resulta
redes, disposições e capitais distintivos. O tanto da socialização como da rede de relações
IST é um caso paradigmático. Sendo mais em que se integram os agentes e dos recursos
recentes e menos reconhecidas (ou mesmo um que podem daí advir.
handicap) as formações em educação e em
administração pública, nos círculos de poder, d) A preponderância dos centro-direita e dos
ganhou preponderância a formação em letras, independentes
no período revolucionário, em engenharia,
nas últimas duas décadas do século XX e, Oito dos ministros estavam filiados ao
mais recentemente, em economia e sociologia. Partido Social Democrata (PSD), cinco ao Partido
Refletindo mudanças nas relações de poder entre Socialista (PS), sendo os demais considerados
áreas do saber, em particular, sobre o campo independentes, por não assumirem o seu vínculo
educativo, e mantendo as ciências da educação partidário ou por não ser conhecida a sua
numa posição subalterna, essas flutuações não participação em cargos ou militância partidária,
deixam de corresponder a diferentes estratégias à época (Quadro 4). Essa primazia do PSD
das elites para o governo da educação (e, (partido habitualmente situado no centro-direita
em particular, dos professores). A tendência do espectro político-ideológico) explica-se não
internacional (POPKEWITZ, 1991; ALMEIDA, apenas por ser o partido que, entre 1974 e 2012,
2008) tem identificado, grosso modo, uma mais tempo esteve no governo mas também
sequência de períodos de orientação humanista, porque nas coligações governamentais, quer
tecnocrática e economicista. com o PS quer com o CDS-PP, fez prevalecer o
Além disso, a frequência dos estudos seu domínio sobre a educação.
de pós-graduação no estrangeiro mostra Em todo o caso, não deixa de ser
como esses constituem capitais importantes significativo o número de independentes
no seio de estratégias de internacionalização, a ocuparem o cargo (14), a larga maioria
cosmopolitismo e isomorfismo institucional com uma posição dominante no mundo
que marcaram as políticas educativas, nas universitário, refletindo uma estratégia de
décadas mais recentes (POPKEWITZ, 1991; amenizar a tensão entre elites e massas ou,
2008; NÓVOA, 2000; DALE, 2004; TEODORO; com mais rigor, entre elite político-econômica,
Quadro 4 – Duração dos mandatos dos ministros da Educação, segundo filiação partidária, duração dos governos e orientação
político-ideológica (1974-2011)*
N.º dias Nº de anos
< =1 ano 1 a 3 anos > 3 anos
Total Média Total
(<365 dias) (366-1095 dias) (>1095 dias)
PSD 5037 630 25 (2) 75 (6) - 100 (8)
Filiação partidária do titular do cargo PS 3119 624 60 (3) 20 (1) 20 (1) 100 (5)
de ministro “Independentes” 5393 415 76,9 (10) 7,7(1) 15,4 (2) 100 (13)
Total 13549 521 57,7 (15) 30,8 (8) 11,5 (3) 100 (26)
Centro-Direita 5967 746 25 (2) 50 (4) 25 (2) 100 (8)
Centro-Esquerda 5192 1038 20 (1) 40 (2) 40 (2) 100 (5)
Orientações político-ideológicas dos
Esquerda 799 133 100 (6) - - 100 (6)
partidos no governo** (1974-2011)
Heterogêneo 1591 318 80 (4) 20 (1) - 100 (5)
Total 13549 565 54 (13) 29 (7) 17 (4) 100 (24)
Fonte: Biogramas dos Ministros da Educação 1974-2013.
* Neste cálculo, foram apenas considerados os mandatos dos dezoito primeiros governos constitucionais, uma vez que o décimo nono ainda se encontrava
em funções à data do encerramento do artigo.
** Neste caso, foi tida em conta a duração dos governos e não dos mandatos dos ministros da Educação.
1056 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
secundário (somente dois) ou em organizações um conjunto de reformas progressistas para
(profissionais e da sociedade civil) dedicadas a educação portuguesa, enfrentando as alas
à educação. Nesse sentido, poderão estar mais mais conservadoras, não deixou de participar
à vontade para mediar as relações entre elites no regime autoritário imposto pelo Estado
político-econômica e cultural-intelectual, mas Novo (ABRANTES, 2008). A presença desse
dificilmente a relação entre essas e os agentes grupo dá razão à tese, referida anteriormente,
escolares, em particular, aqueles que se inte- do desprendimento como modelo de transição
gram no ensino básico e secundário. É provável para a democracia (GILL, 2000). Por outro
que esse traço contribua para que a classe do- lado, alguns desempenharam funções na
cente sinta frequentemente que, em vez de uma Fundação Calouste Gulbenkian. Sendo uma
mediação, os ministros da Educação represen- organização privada sem fins lucrativos,
tam políticas de imposição, por parte das elites, dedicada a diferentes áreas, tem tido um
o que tem reforçado a contestação e, logo, a papel importante na estruturação do campo
volatilidade do cargo. educativo, financiando programas, projetos
e investigadores. Nesse sentido, a sua
e) O fluxo incessante entre universidades, participação encontra-se próxima do modelo
administração pública, fundações e empresas de democracia orgânica, observado noutros
países europeus e nos Estados Unidos, em que
Analisando as ocupações socioprofis- os partidos buscam apoio e legitimidade em
sionais ao longo da vida, é possível constatar poderosas organizações não governamentais,
que a maioria dos ministros da Educação não pela sua estabilidade, (relativa) neutralidade,
revela uma carreira política longa, entendendo capital técnico e relações externas (BURNS;
a política representativa no seu sentido estrito CARSON, 2002; SAVAGE; WILLIAMS, 2008).
(cargos de governação, em parlamentos, autar- Além disso, a passagem pelo cargo tem
quias ou direção de partidos). Como se referiu, um impacto nas carreiras profissionais. Como
muitos deles apresentam-se, profissionalmente, já mencionado, antes de serem nomeados
como docentes universitários, sendo, aliás, esse ministros, muitos ocuparam posições técnicas
o perfil dominante do recrutamento ministerial ou de direção em organismos públicos. Depois
(ALMEIDA; PINTO, 2006). Todavia, observando de exercer funções dentro do governo, vários
com mais detalhe, quase todos ocuparam car- desses atores tornaram-se administradores de
gos de gestão e administração, em diferentes fundações e empresas, tanto públicas como
organismos públicos e privados, para além dos privadas. Essa transição representa não apenas a
nove que exerceram, antes e/ou depois da pas- ascensão de um novo grupo social na sociedade
sagem por esse ministério, funções governati- portuguesa, com uma capacidade enorme de
vas em outros ministérios. concentração de poderes materiais e simbólicos
Em termos da trajetória anterior, além (os administradores), associada a uma diluição
da já referida experiência na direção de das fronteiras entre o setor público e privado,
(certas) faculdades e universidades, é possível mas também o peso das funções de governo
identificar duas organizações centrais na enquanto porta de acesso de uma fração
formação de vários ministros da Educação. Por favorecida dos técnicos superiores e quadros
um lado, alguns dos titulares dessa pasta no dirigentes a esse grupo, devido ao capital público
período democrático colaboraram, durante os acumulado, como, aliás, descrevem Costa et al.
anos finais do Estado Novo, com o Grupo de (2010). Abre-se, dessa forma, caminho a novas
Avaliação e Planeamento da Ação Educativa estratégias de concentração de poder, através
(GEPAE) do então Ministério da Educação dos laços estreitos entre as elites política e
Nacional. Se bem que esse grupo defendeu econômica, nacional e internacional.
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Pedro Abrantes é professor auxiliar de sociologia na Universidade Aberta e membro do Centro de Investigação e Estudos de
Sociologia do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, onde tem participado em diversas pesquisas nacionais e internacionais,
nas áreas da educação, juventude e desigualdades.
Cristina Roldão é assistente de investigação no Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES-IUL) e doutoranda em
Sociologia no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.
1060 Pedro ABRANTES; Cristina ROLDÃO. Faces e metamorfoses do poder: uma sociografia dos ministros da...
Breve história do ensino superior brasileiro e da
formação de professores para a escola secundáriaI
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1061-1076, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000011 1061
A brief history of Brazilian higher education and teacher
education for secondary schoolI
Abstract
Keywords
1062 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000011 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1061-1076, out./dez. 2014.
A Faculdade de Filosofia, Ciências de humanidades e ciências teria de ser
e Letras inevitavelmente precário e deficiente, como
sempre foi durante essa longa experiência de
Do ponto de vista político, o período ausência da universidade ou das respectivas
que se estende de 1930 aos anos de 1970 foi escolas superiores para licenciar os docentes.
marcado pelo rompimento com a velha ordem
oligárquica brasileira e pelo aparecimento, Essa situação começou a mudar. O
evolução e destruição do populismo. No governo provisório de Getúlio Vargas criou,
confronto das forças que desejavam a entre outros, o Ministério da Educação e Saúde
internacionalização da economia e as que Pública, cujo primeiro ministro, Francisco
defendiam um desenvolvimento independente, Campos, por meio de uma série de decretos,
teremos a vitória da primeira no âmbito da instituiu a chamada Reforma Francisco
ruptura que se estabelece nos anos de 1960. Campos, fruto da Revolução de 1930 e de um
A partir de 1930, temos uma sociedade que conjunto de interesses que assumiram o poder
lenta, mas progressivamente, industrializava-se naquele momento. Entre esses decretos, esteve
com uma concentração cada vez mais ampla da o de número 19.851, de 11 de abril de 1931 –
população nos centros urbanos, o que contribuiu Estatutos das universidades brasileiras – que, ao
para a promoção de exigências cada vez maiores dispor sobre a organização do ensino superior
em relação à educação. Foi particularmente instituindo o regime universitário, elevava para
na região sudeste, sobretudo em São Paulo e o nível superior a formação de professores
Rio de Janeiro, onde a demanda por ensino, e secundários. Por esse decreto o ensino superior
particularmente ensino superior, foi mais sentida. deveria ser ministrado na universidade a partir
O surgimento do ensino superior no país da criação de uma Faculdade de Educação
deu-se inicialmente sob a forma de cadeiras Ciências e Letras, onde deveriam ser formados
que foram sucedidas por cursos, posteriormente os professores secundários. Do ponto de vista da
por escolas e por faculdades de medicina, organização do sistema, a reforma previa duas
direito, engenharia, agronomia etc., todas situações: o sistema universitário oficial, mantido
eminentemente profissionais. Não existiam pelo governo federal ou estadual, ou livre,
estudos superiores de humanidades, ciências ou mantido por particulares, e o instituto isolado.
letras. Segundo Anísio Teixeira (1989, p. 73-74), Para Francisco Campos, “O ensino no
Brasil é um ensino sem professores, isto é, em que
[...] a falta de estudo superior de tipo os professores criam a si mesmos, e toda a nossa
acadêmico havia de tornar extremamente cultura é puramente autodidata” (Exposição de
precária a formação dos professores para os motivos do ministro Francisco Campos sobre a
colégios secundários [...]. Sabemos que todo reforma do ensino superior, Diário Oficial, de 15
sistema de educação, em seus diferentes níveis de abril de 1932, apud FÁVERO, 2000). Assim, a
de estudos e em seus diferentes currículos e Faculdade de Educação Ciências e Letras deveria
programas, só pode ensinar a cultura que na ter um caráter especial e misto e ser, antes de
universidade ou nas escolas superiores do tudo e eminentemente, um Instituto de Educação.
país se produzir. Não seria possível um curso A Faculdade de Educação Ciências e
secundário humanístico ou científico sem Letras assim concebida tinha como principal
que a universidade ou as escolas superiores função a formação de professores para a escola
tivessem estudos humanísticos ou científicos secundária, sendo compatível com a produção
avançados. Como só teve o Brasil, no nível do conhecimento e a prática da pesquisa. Essa
superior, escolas profissionais de saber dupla função, segundo Newton Sucupira (1969,
aplicado, o seu ensino secundário acadêmico p. 261), se justificava:
1064 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
As condições necessárias para que se até 1930, marginalizada, em função das
realizassem, ainda que de forma aproximada, os características da então escola secundária
ideais da Reforma Francisco Campos vão ocorrer em número bastante restrito, em sua maioria
em São Paulo com a criação da Universidade de privada e de caráter propedêutico:
São Paulo, em 1934.
Em 25 de janeiro de 1934, o Decreto A escola secundária está longe de ser, na
6.284 instituiu a Universidade de São Paulo, época, considerada como formativa [...]
cuja história de criação envolve negociações surge, historicamente, como um desdobra-
e conflitos relacionados à resistência da mento da escola superior – instância pro-
elite paulista ao governo central no Rio pedêutica em que se transformam as artes
de Janeiro. Segundo Cardoso (1982), a liberais quando se estruturam nas univer-
criação da Universidade de São Paulo não sidades medievais, os três primeiros cursos
se configura propriamente como resultado profissionais, considerados propriamente
de iniciativas educacionais renovadoras, “superiores” e “especializados”: Direito,
mas como produto de um projeto político e Medicina e Teologia. Assim, a escola média
ideológico. A universidade se implanta com vem atavicamente, voltada para o ensino
uma clara missão: formar as elites intelectuais superior como sua instância preparatória,
e dirigentes do país. condição que, no caso brasileiro, explica,
Apenas três seções foram previstas na parcialmente, sua tardia organização no
Faculdade de Filosofia (e não de Educação) sistema público. (FÉTIZON, 1984, p. 141)
Ciências e Letras: Filosofia, Ciências e Letras.
Os estudos de educação, ou uma Seção de As faculdades de filosofia ciência e
Educação, não foram contemplados. Interessada letras foram criadas no Brasil sem referências,
na integração das escolas e no cultivo de estudos pois faltaram modelos para esse tipo de
não profissionais, a Faculdade de Filosofia ensino, em função da tradição no país de
Ciências e Letras, assim concebida de princípio, escolas profissionais isoladas. Fundada como
negou a formação de professores no seu quadro. centro de alto saber, a nova instituição surgiu
Entretanto, por razões de força puramente marcada pela missão estrangeira de professores
conjunturais, o curso de formação de professores responsáveis pela docência e pesquisa. Nesse
secundários do Instituto de Educação de São sentido, as faculdades de filosofia acabaram
Paulo foi incorporado à universidade: por desempenhar papel importante no ensino
superior brasileiro. Entretanto, para Teixeira
[...] em 1931, o Estatuto das Universidades (1969), essa experiência se frustrou, salvo o
Brasileiras elevara a nível superior a caso das duas maiores, a do Rio e a de São
formação do professor secundário e meses Paulo, as quais se multiplicaram muito mais:
antes da publicação do decreto de fundação
da Universidade de São Paulo, criara-se, [...] como escolas normais de professor
no Instituto de Educação de São Paulo, um secundário do que como Faculdades de
curso para a formação de tal professor – Filosofia, Ciências e Letras [...]. Depois
o que o colocou, como de ensino superior dessas duas tentativas de implantação
(e só a ele no Instituto), no âmbito da da universidade moderna, entre nós,
Universidade quando, em 1934, ela mesma voltamos à linha de menor resistência
é fundada. (FÉTIZON, 1984, p. 130) da simples criação de novas escolas,
guardando o molde antigo de isolamento,
A formação de professores para autossuficiência e independência de cada
o magistério secundário encontrava-se, escola. (TEIXEIRA, 1969, p. 46)
1066 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
de certas corporações profissionais à ampliação na aliança entre o empresariado, os tecnocratas e
de matrículas e escolas (como, por exemplo, os militares, na gestão de um modelo econômico
em medicina). A ampliação ocorreu em áreas concentrador de renda e progressivamente
de menor resistência e seguindo a lógica de internacionalizado.
implantação de cursos a custos baixos. Por essa A educação, nos marcos do regime
razão, as faculdades de filosofia apresentavam- autoritário, tinha papel estratégico no processo de
-se como alternativa à expansão. reorientação da política e da economia brasileira.
Em 1957, dos 28 cursos de formação de O governo militar promoveu uma ampla reforma
professores secundários no país, ministrados educacional, atingindo os diferentes níveis do
em faculdades de filosofia ciências e letras, 21 sistema com o objetivo de adequar a educação
eram em instituições particulares. Dos 1.991 às necessidades do desenvolvimento.
alunos matriculados nesses cursos, 1.401 estu- No início dos anos 1960, já se
davam em instituições particulares. A maioria prenunciavam as mudanças significativas que
dessas instituições era, até aquele momento, iriam ocorrer no âmbito do ensino superior e,
fundamentalmente católica (IBGE, 1957). particularmente, no que diz respeito ao rumo
No período analisado, os cursos de que tomariam as faculdades de filosofia.
formação de professores em faculdades de Com a aprovação da Lei de Diretrizes e
filosofia realizavam-se, predominantemente, Bases da Educação Nacional (LDB) nº 4.024,
em universidades. Em 1957, dos 28 cursos promulgada em 20 de dezembro de 1961,
existentes, 15 eram em universidades e 13 em após um longo período de debates nos órgãos
instituições isoladas. Essa situação mudou no legislativos, não mais se exigia a presença
início de 1960, com a expansão das faculdades obrigatória de uma faculdade de filosofia para
de filosofia sob a forma de estabelecimentos a constituição de universidades.
isolados privados não confessionais. O desprestígio das faculdades de filosofia
As faculdades de filosofia não consegui- se acentuava e eram muitas as críticas que diziam
ram cumprir adequadamente seus objetivos ini- respeito, entre outras, à sua função integradora.
ciais fundadores e tampouco se constituir como Nesse sentido, a exigência que constava do
escolas de formação consistente de professores. projeto da LDB, aprovada em dezembro de 1961,
A existência das faculdades de filosofia, como de que, no conjunto universitário, houvesse
instituições voltadas à formação do professor obrigatoriamente uma faculdade de filosofia,
para a escola secundária, instituindo um mo- ciências e letras foi vetada e assim justificada:
delo de referência para essa formação está, a
nosso ver, intimamente relacionada às caracte- A rede nacional de ensino superior conta
rísticas assumidas pelo crescimento do sistema já com mais de 70 faculdades de filosofia,
de ensino superior no Brasil. que vêm exercendo, salvo raras exceções,
exclusivamente a função de formar profes-
Das originais faculdades de sores de grau médio. Nessas circunstâncias,
filosofia, ciências e letras à a exigência de que toda universidade man-
faculdade de educação tenha uma dessas faculdades torna-se des-
necessária. Acresce que as funções de ór-
A partir dos anos de 1960, houve a ruptura gão integrador que se deseja atribuir a tais
do pacto populista que se constituía dentro de faculdades também podem ser exercidas
uma ordem de interesses diferenciados, como por outros órgãos, tais como os institutos
forma de representação dos setores populares. centrais que já vêm sendo estruturados em
O regime estabelecido pós 1964 consolidou a algumas universidades federais. (BRASIL,
hegemonia do grande capital, consubstanciada 1961 apud CARNEIRO, 1968, p. 331-332)
1068 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
a comparação com a necessidade bélica, um etc. após três (às vezes quatro) anos de es-
treinamento em serviço, um treinamento em tudos, recebem certificado ou diploma de
batalha. Ora, a primeira necessidade da guerra Bacharel. Só então passam a freqüentar
é a de um estado-maior com a capacidade de a Faculdade de Educação, preparando-se
estudo e decisão acertada. [...] Estas [Escolas para a carreira escolhida [...]. Tal sistema
de Educação] seriam os estados-maiores oferece a vantagem de simplificar a admi-
centrais, com a responsabilidade de formular nistração e a planificação dos estudos, vis-
o pensamento condutor de todo o esforço, to que uma única autoridade (a Faculdade
elaborar as técnicas e programas de ação, de Educação) é responsável pela direção.
levantar e caracterizar a situação educacional Além disso, permite aos estudantes con-
existente e formar e treinar o corpo de mestres centrar efetivamente seu interesse sobre
e especialistas destinado a conduzir a prática uma coisa de cada vez. E tem a vantagem
educativa. (TEIXEIRA, 1969, p. 240-241) de não sobrecarregar os alunos durante o
terceiro ou quarto ano de estudos. Se for
A desarticulação das faculdades de exigido dos futuros professores, e só de-
filosofia, cingida em diferentes institutos les, acrescentar aos estudos científicos, já
com a consequente criação das faculdades de tão difíceis, um pesado fardo pedagógico,
educação, não era, entretanto, uma solução como é possível esperar que eles obtenham
consensual e causava preocupações. Temia- resultados correspondentes aos dos colegas
-se que a falta de integração entre a formação que se destinam unicamente à pesquisa
pedagógica e a formação específica, além do científica? (LAUWERYS, 1969, p. 313-314,
caráter excessivamente teórico dos cursos, grifo nosso).
agravasse-se com a separação e a distância
física entre as diferentes unidades. Entretanto, Esse modelo, que de certa forma já vinha
essa distância era o corolário de uma prática sendo praticado, consolidava o bacharelado
que havia imposto, desde a criação dos como via ou como requisito para a formação
primeiros cursos de formação de professores nas de professores para a escola secundária,
faculdades de filosofia, uma incompatibilidade estabelecendo uma hierarquização dos estudos
de objetivos dentro do mesmo curso e uma em que a formação pedagógica tinha um caráter
oposição entre as disciplinas científicas e as complementar e fundamentalmente prático.
disciplinas didático-pedagógicas.
O relatório da missão da UNESCO, Não se trata de compreender simplesmente
encarregada de orientar a implantação das a teoria, mas de levá-la à prática. A
faculdades de educação, a convite do governo experiência tem demonstrado que o sistema
brasileiro, deixava clara a preferência por uma de cursos não constitui método idealmente
concepção de curso de formação de professores eficiente de preparar os futuros professores
que reforçava essa prática e que consistia em: para a carreira; urge reduzir a proporção
de tempo atribuído aos cursos teóricos,
[...] separar completamente o trabalho pro- didáticos, de História da Educação, etc.
priamente científico do trabalho profissio- (LAUWERYS, 1969, p. 314).
nal. Neste sistema, os futuros professores
freqüentam nos institutos ou departamen- Os problemas existentes nos cursos
tos exatamente os mesmos cursos que de formação de professores secundários nas
seus colegas pretendentes a outras carrei- faculdades de filosofia não foram sanados com
ras que não o magistério. Estudam física, a criação das faculdades de educação. Pelo
Matemática, História, Línguas estrangeiras contrário, a mesma precariedade e desprestígio
1070 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
superiores, diferentemente da faculdade de claro que não era mais possível o esquema de
filosofia, o indispensável registro para lecionar três anos de bacharelado mais um de didática:
onde houvesse a falta de diplomados por essas
faculdades, instituindo um regime permanente [...] não há que se inferir que todo o ensino
de emergência, e podemos dizer de improvisação, profissional deva ser feito concomitantemente,
para assegurar a quantidade de professores como num ciclo à parte e sem qualquer ligação
exigida pela escola secundária. com as matérias de conteúdo [...]. Ademais, é
Essa situação justificava a necessidade por todos os títulos desaconselhável separar
de mudanças que deveriam ser operadas na o “como ensinar” do “que ensinar” [...]. A
estrutura funcional da faculdade de filosofia. licenciatura é um grau apenas equivalente ao
Nas universidades, a faculdade de filosofia bacharelado e não igual a este mais Didática
já vinha sendo substituída por institutos como acontece no conhecido esquema 3 + 1.
e faculdades, que assumiam a formação (BRASIL, Parecer CFE 292/62)
profissional e acadêmica dedicada à pesquisa nas
diferentes áreas do conhecimento. À faculdade A licenciatura e o bacharelado seriam então
de educação caberia a formação pedagógica graus distintos, que poderiam ser obtidos através
dos professores, consagrando-se assim o de disciplinas comuns. Dois conjuntos de estudos
bacharelado como passagem obrigatória para comporiam a licenciatura: o primeiro reunindo as
a obtenção da licenciatura. Restavam ainda as matérias de conteúdo, que variavam conforme o
instituições isoladas ou não universitárias, que endereço profissional do estudante; e o segundo
deveriam também ser reformuladas. composto pelas matérias pedagógicas comuns
a todos. Seriam elas: psicologia da educação,
A situação está a exigir profunda compreendendo adolescência e aprendizagem;
transformação dos cursos das faculdades didática; elementos de administração escolar
de filosofia, pela adoção de currículos (substituída posteriormente por estrutura e
especiais, para a preparação da grande funcionamento de ensino de 2º grau) e prática
variedade de professores secundários de 1º de ensino, sob a forma de estágio supervisionado,
e 2º ciclos. (TEIXEIRA, 1969, p. 286). cujas horas de atividades foram distribuídas ao
longo de cinco semestres e não mais concentradas
Essas transformações iriam se realizar, em um ano. A duração da formação pedagógica
sendo o Conselho Federal de Educação (CFE) a foi reduzida de um quarto (no esquema 3 + 1)
instância definidora desse processo. Ao Conselho para um oitavo do período total de duração
Federal de Educação, criado pela LDB 4.024/61, do curso, mantido em quatro anos. O Parecer
caberia uma série de atribuições que lhe confe- destacava a necessidade de articulação entre esses
riam substancial soma de poder, como a de esta- dois conjuntos de estudos, embora os tratasse de
belecer o currículo mínimo e a duração dos cursos forma separada.
superiores, além do controle sobre o funciona- Segundo Castro (1974, p. 639), o texto
mento dos estabelecimentos isolados federais e do Parecer 292/62 “consagra o uso do termo
particulares. Cabia, portanto, ao CFE um papel ‘licenciatura’ para a totalidade do curso que
importante no processo de reestruturação das fa- prepara o professorado”. O Parecer assinala:
culdades de filosofia, assim como na ordenação
da expansão do ensino superior no país. Os currículos mínimos dos cursos de
No início dos anos 1960, o CFE licenciatura compreendem as matérias fixadas
estabeleceu, através do Parecer 292/62, as para o bacharelado, convenientemente
matérias pedagógicas para a licenciatura. O seu ajustadas em sua amplitude, e os estudos
relator, o Conselheiro Valnir Chagas, deixava profissionais que habilitem ao exercício do
1072 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
sociais e as matérias pedagógicas, conforme o O estabelecimento de um novo currículo
Parecer 292/62, num tempo útil de 2025 horas para a escola de 1º e 2º graus determinou uma
aula, em cerca de três anos. mudança nos modelos existentes para a formação
Segundo o Parecer CFE 106/66, as de professores, dando força à ideia de polivalência.
licenciaturas polivalentes em letras, ciências e Nos anos 1960 e início dos anos 1970,
estudos sociais: uma parcela das faculdades de filosofia já havia
abdicado da formação do bacharel e da condição
[...] Sendo de mais modestas exigências, [...] de instituição dedicada à pesquisa científica,
se tornam mais acessíveis às Faculdades do assumindo exclusivamente a formação do
interior que embora continuem a ostentar licenciado. Com o advento das licenciaturas
o nome de Faculdade de Filosofia, Ciências polivalentes e das licenciaturas curtas, muitas
e Letras, são na realidade algo como os faculdades de filosofia assumiram esses cursos.
Teachers Colleges americanos. Missão, aliás, Esse período foi marcado pela grande
importantíssima na atual fase de expansão expansão do setor privado a partir da criação
da escola média e de que se deveria dar conta de inúmeras faculdades de filosofia, ciências
a grande maioria de nossas Faculdades de e letras, criadas, em sua grande maioria, nos
Filosofia, renunciando à pretensão de formar anos de 1960 e 1970, tendo as licenciaturas
também pesquisadores. É desejável mesmo polivalentes e as licenciaturas curtas como
que as novas Faculdades a se instalarem no cursos inaugurais. São essas que estamos
interior, comecem com as licenciaturas de 1º denominando de novas faculdades de filosofia,
ciclo, podendo, posteriormente, evoluir para ciências e letras, que surgiram então com sua
Faculdades de Filosofia com as licenciaturas denominação apresentando esses três títulos
tradicionais, assim como nos Estados Unidos, isolados ou combinados dois a dois. Encerrou-
os Teachers Colleges igualando-se aos Liberal -se assim o ciclo das faculdades de filosofia
Arts Colleges, terminando alguns por se concebidas como modelo integrador/articulador
transformarem em universidades. (BRASIL, das universidades. Abriu-se, entretanto, uma
Parecer CFE 106/66) nova fase na qual as novas faculdades de
filosofia se expandiram e se multiplicaram
Com a Lei de Diretrizes e Bases do Ensino como escolas isoladas, constituindo-se em
de 1º e 2º graus, a LDB 5.692, de 25 de agosto agências de formação compulsória (e reduzida)
de 1971, instituem-se as licenciaturas curtas, do professor da escola secundária.
estabelecendo-se uma integração geral do sistema Um fator que contribuiu para a criação
educacional, desde o 1º grau até o nível superior. dessas instituições isoladas, que exigiam
Pela nova LDB, o ensino primário e o 1º ciclo do pequenos investimentos, foi o processo de
ensino médio (ginásio) foram transformados em interiorização. Reforçado pelo conceito de
um único ciclo de 1º grau, com oito séries. O 2º que a educação levava ao desenvolvimento
ciclo de ensino médio (colégio) foi transformado econômico, o provincialismo das cidades do
em 2º grau (três ou quatro anos) universal e interior encontrava na criação de uma escola
compulsoriamente profissional. superior a oportunidade de a cidade adquirir
A formação de professores, para essa o prestígio perdido pelo desenvolvimento das
nova estrutura do ensino, seria feita da seguinte áreas metropolitanas. (FONSECA, 1992).
forma: para o ensino nas quatro primeiras séries Foi no sudeste e particularmente em São
do 1º grau , em escola de 2º grau; para o ensino Paulo que esses cursos proliferaram. O estado de
nas quatro últimas séries do 1º grau, em curso São Paulo é o exemplo mais completo do processo
superior de curta duração; e para o ensino no 2º de interiorização por meio das faculdades de
grau, em curso superior de longa duração. filosofia. Esse processo iniciou-se nos anos de
1074 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
grupos confessionais e caracterizava-se pela mera Foram esses mesmos cursos que
transmissão de conhecimentos e pela questionável permitiram a acumulação necessária para que
qualidade. Considerado um setor de menor pres- essas instituições, em um segundo momento,
tígio, estava dirigido às camadas sociais médias já com capital suficiente, abandonassem os
urbanas mais desprovidas de capital econômico e cursos de licenciatura e oferecessem novos
consideradas com menor vocação acadêmica. cursos, que exigiam investimentos mais
As novas faculdades de filosofia cumpriram significativos, porém com maiores garantias
um papel importante na ampliação do setor de rentabilidade.
privado de ensino superior. Foi a partir delas que Nesse contexto, muitas instituições
se fundaram muitas das primeiras instituições evoluíram para a condição de grandes em-
privadas, inicialmente como um pequeno negócio presas, algumas delas ascendendo ao status
funcionando como uma espécie de acumulação de universidade, passando, nos anos de 1980
primitiva. Os cursos de licenciatura nos anos de e 1990, a constituírem-se, verdadeiramen-
1960 e 1970 se constituíram como estratégicos para te, como um poderoso empreendimento ca-
um empreendimento que exigia pequeno capital pitalista. (SAMPAIO, 2000; MARTINS, 1988;
inicial e que iria operar a um custo reduzido. CALDERÓN, 2000).
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Núria Hanglei Cacete é professora do Departamento de Metodologia do Ensino e Educação Comparada e do Programa de
Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
1076 Núria Hanglei CACETE. Breve história do ensino superior brasileiro e da formação de professores para a escola...
Possíveis relações entre percepções de violência dos
alunos, clima escolar e eficácia coletiva
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1077-1092, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000010 1077
Possible relationships between students’ perceptions
of violence, school climate, and collective efficacy
Abstract
Keywords
1078 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014005000010 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1077-1092, out./dez. 2014.
Introdução Eficácia coletiva
1080 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
Estudos realizados a partir da década de recíprocas entre os integrantes de uma instituição
1970 passam a enfatizar a dinâmica interna das de ensino. Peterson e Skiba (2001), por exemplo,
escolas para o entendimento de seus resultados, abordam o clima escolar em seu estudo, cujo
sendo destacadas as variáveis referentes aos tema é a violência nas instituições de ensino e o
processos escolares. Constatações importantes definem como os sentimentos que os alunos, e os
resultaram de tais estudos, no que diz respeito demais integrantes da escola possuem a respeito
ao desempenho escolar, à frequência às aulas do espaço escolar. Segundo os autores, tais
e a aspectos comportamentais dos alunos sentimentos se referem às percepções individuais
(BROOKE; SOARES, 2008). de bem-estar nesse ambiente, às opiniões sobre
Resultados relevantes foram obtidos no a qualidade do ensino e sobre a segurança que
estudo de Rutter et al. (1979), no qual se concluiu possuem no interior da escola.
que o efeito das variáveis escolares de processo Estudos referentes ao clima escolar são
atuando conjuntamente apresentava-se superior predominantemente voltados para a investigação
quando comparado ao efeito de uma variável do desempenho acadêmico dos alunos. Porém, há
de processo agindo sozinha. A respeito dessa pesquisas que priorizam aspectos não cognitivos,
constatação, o autor aborda a escola enquanto principalmente os que são relacionados a
organização social e menciona a existência de fatores comportamentais. Dessa forma, além
um ethos ou clima escolar que representaria a dos resultados a respeito do rendimento escolar
totalidade das referidas variáveis de processo dos alunos, há outras constatações importantes,
atuando de forma conjunta. Assim, ganham foco como defendem Rutter et al. (1979). Os autores
os estudos cujo objeto de investigação passou a afirmam que as escolas com clima escolar
ser denominado clima escolar. positivo tendem a ter alunos e funcionários
Da forma pela qual esse tema vem mais satisfeitos e motivados e possuem baixos
sendo abordado, principalmente em estudos índices de evasão, sendo vistas como ambientes
internacionais, as percepções dos integrantes acolhedores e seguros.
da instituição de ensino são apontadas como a É possível citar também o estudo de
melhor maneira de se traduzir elementos gerais Haselswerdt e Lenhardt (2003), que traz a
que compõem o clima escolar (BRESSOUX, violência escolar como tema. Os autores
2003). Como exemplos de aspectos investigados constataram que a maior parte dos alunos se
nesses trabalhos, podem ser citados: o conjunto cala diante de transgressões presenciadas na
de relações estabelecidas entre os integrantes da instituição de ensino, as quais são geralmente
instituição de ensino; a existência de objetivos cometidas por outros alunos. Segundo os
claros e aceitos por todos os membros da escola; jovens, a razão para essa cumplicidade se dá pela
oportunidades concedidas de participação ausência de relações de confiança entre alunos e
nos assuntos escolares e a percepção que outros membros da escola, principalmente entre
os integrantes possuem acerca da escola e a alunos e professores. Dessa forma, não havendo
respeito da própria participação nesse espaço. liberdade suficiente para que os estudantes
Talvez devido à abstração característica do expressem suas percepções e opiniões, cria-se
termo clima escolar, os estudos expõem diferentes um clima escolar indiferente e permissivo a
formas de defini-lo e de operacionalizá-lo. Apesar episódios de violência.
de não haver uma definição objetiva, os trabalhos Com base na literatura acerca do clima
convergem ao se referirem a uma síntese de escolar, os autores concluem que seria a
características específicas que dão a determinada desarticulação entre os membros da instituição
instituição uma imagem própria. Também é de ensino o possível fator responsável pelo
possível entender o conceito como processos de aumento da violência escolar, afirmação que
estabelecimento e manutenção de expectativas converge com um dos principais indicadores
1082 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
coletiva é associada à redução do índice de em determinada vizinhança. Porém, quando,
criminalidade, mas, de forma similar, consiste além de relações baseadas em objetivos comuns,
essencialmente em relações coesas baseadas em em solidariedade e confiança, há a participação
objetivos comuns, neste caso, entre moradores efetiva dos integrantes de determinado grupo
de uma mesma localidade, e articulação em em ações que visam a beneficiar sua localidade,
torno desses objetivos. obtêm-se resultados significativos com relação
Ao analisar ambas as teorias de forma aos índices de violência. Da mesma forma,
comparada, a afinidade teórica pode ser pensada os estudos sobre clima escolar caracterizam
a partir dos seguintes aspectos: claramente uma instituição que possui um clima
a) coesão social – relações de confiança e de so- escolar positivo: aquela na qual prevalecem
lidariedade entre integrantes de um determinado não apenas relações de confiança e cooperação
grupo e existência de objetivos compartilhados; mútua mas principalmente ações baseadas
b) controle social informal – articulação entre em objetivos consistentes e compartilhados, e
integrantes de determinado grupo, visando à efetivas oportunidades de participação de todos
concretização de metas compartilhadas. os membros da comunidade escolar no cotidiano
Estudos a respeito da eficácia coletiva da instituição de ensino, inclusive pais ou
evidenciam que a participação ativa dos responsáveis. A existência de boas relações por
moradores no que se refere à vigilância e si só não caracteriza um clima escolar positivo
controle do que ocorre na vizinhança – controle (BROOKE; SOARES, 2008).
social informal –, quando aliada a boas relações Ao analisarmos pontos gerais de ambas
e objetivos estabelecidos em benefício da as teorias, podemos dizer que, tanto no que diz
comunidade – coesão social –, resulta na queda respeito aos estudos referentes ao contexto dos
de indicadores de violência. No mesmo sentido, bairros ou comunidades quanto aos que abor-
constata-se, em estudos sobre o clima escolar dam o contexto escolar, os resultados positivos
,que a maior participação dos alunos, pais de relatados são comumente relacionados à eficá-
alunos, professores, direção e funcionários no cia das relações grupais, ou ao que se chama de
cotidiano da escola – forma de controle social eficácia coletiva no campo da sociologia urba-
informal – e a existência de boas relações na e de clima escolar positivo nos estudos de
entre esses, objetivos comuns, senso de âmbito educacional.
pertencimento à escola e comprometimento em Entretanto, mesmo considerando a
relação à instituição – coesão social – refletem importância e a convergência dos aspectos
-se tanto no rendimento escolar dos alunos e citados, não se pode deixar de citar a relevância
no trabalho desempenhado pelos funcionários de fatores intervenientes que influenciam na
em geral quanto no comportamento e atitudes eficácia das relações grupais. Neste caso, trata-
dos estudantes e demais membros da instituição -se das características estruturais de localidades
(FELNER et al., 2001). e de seus moradores, no caso da abordagem
A importância da coexistência de coesão da eficácia coletiva; e das características da
e controle social informal em si já é destacada em escola, de seu entorno e do perfil do alunado
estudos cujo tema é a eficácia coletiva e clima e funcionários, em relação à perspectiva do
escolar. Exemplos referentes aos dois modelos clima escolar. Assim, quando se fala em eficácia
teóricos podem ser citados. Em relação à eficácia coletiva, não se subestimam as características
coletiva, Browning, Feinberg e Dietz (2004) sociais das vizinhanças pesquisadas, sendo
verificaram que a existência de um grupo que importante analisar conjuntamente os fatores
mantenha boas relações, as quais sejam baseadas estruturais da comunidade (SAMPSON;
em intenções compartilhadas, não basta para RAUDENBUSH; EARLS, 1997). De forma
que haja uma redução na ocorrência de crimes convergente, no que diz respeito aos estudos
1084 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
bebidas alcoólicas na instituição. Portanto, bém seriam considerados outros tipos de drogas,
será abordada uma variável referente a drogas como solventes, drogas sintéticas e o crack.
e bebidas alcoólicas, de forma a verificar uma
possível associação com contextos de violência e c) Alunos com armas na escola
analisar o modo como essa variável se relaciona
com os indicadores de clima escolar. A seguir, Esta variável foi construída a partir da
serão especificadas as variáveis utilizadas. junção de dois itens da pergunta do questionário
sobre a frequência de determinadas situações na
Variáveis dependentes escola, a qual foi citada nos tópicos anteriores.
Os itens referentes ao porte de armas são:
a) Violência intraescolar “alunos portando armas de fogo” e “alunos com
outras armas: facas, canivetes etc.”.
Testemunhos dos estudantes sobre
situações envolvendo brigas e agressões Variáveis independentes
físicas entre alunos. Nesse caso, vale destacar
que as brigas se referem tanto a agressões a) Indicadores de clima escolar
verbais quanto a agressões físicas, visto que
os dois tipos de agressão citados costumam ser • Variável referente à avaliação dos
imbricados em determinadas circunstâncias. alunos sobre diferentes dimensões escolares:
Os testemunhos foram obtidos através de uma organização; segurança; professores; direção/
questão do survey que pede aos alunos que coordenação; funcionários em geral; qualidade
sinalizem a frequência com a qual observaram, do ensino; limpeza; beleza; merenda/refeição;
ao longo dos 12 meses antecedentes, situações • Percepções sobre como os alunos se
de brigas e agressões físicas. sentem na instituição (escala de cinco opções
de resposta: muito bem; bem; mais ou menos;
b) Alunos com drogas e bebidas alcoólicas na escola mal; muito mal);
• Visão geral que os alunos possuem a
Esta variável se refere às respostas dos respeito da escola, comparada a outras da re-
alunos sobre a frequência com a qual viram ou- gião (escala de cinco opções de resposta: mui-
tros estudantes portando drogas ou bebidas al- to melhor que as outras; melhor que as outras;
coólicas na escola. No questionário, trata-se de igual às outras; pior que as outras; muito pior
uma pergunta que pede para que o aluno assi- que as outras).
nale a frequência com que determinadas situa- b) Número de homicídios no entorno da escola:
ções ocorreram na escola ao longo dos 12 meses registro de homicídios a até 300 metros da escola,
precedentes, sendo cada item uma circunstância realizado por meio de georreferenciamento2.
diferente, entre eles: “alunos com bebidas alco- c) Exposição à violência: situações de violência
ólicas” e “alunos com drogas como maconha ou presenciadas pelos jovens.
cocaína”. As respostas para os dois itens foram d) Abordagem policial: experiências que
somadas, dando origem à variável “alunos com envolvem a presença de policiais.
drogas e bebidas alcoólicas na escola”. É im- e) Experiências de violência: situações
portante enfatizar que, durante a aplicação do envolvendo agressão física e/ou ameaças com
questionário, a qual foi orientada por dois pes- faca ou arma de fogo.
quisadores, os alunos foram informados de que
poderiam considerar outras drogas, além de ma- 2 - Para a seleção das escolas deste estudo, foi estabelecido o registro
de ocorrência de homicídios a até 1km da escola; já neste caso, verifica-se
conha e cocaína, sendo a menção das referidas a ocorrência a até 300m, com o intuito de verificar as escolas situadas em
somente para fins ilustrativos. Dessa forma, tam- áreas ainda mais violentas.
Tabela 1 – Percepções dos alunos sobre violência intraescolar, porte de armas e drogas na escola, de acordo com a visão geral
que possuem a respeito da instituição3
Brigas e agressões físicas Alunos com armas de Alunos com outras armas Alunos com drogas/
entre alunos fogo na escola (facas, canivetes etc.) bebidas na escola
3- Os alunos puderam citar mais de uma situação de violência, porte de armas e drogas. Por isso, os valores ultrapassam os 100%.
1086 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
• Situações de violência: “brigas e circunstâncias de violência dentro da escola e as
agressões físicas entre alunos”; dificuldades de se estabelecer um clima escolar
• Armas na escola: “alunos com armas propício à aprendizagem. (RUTTER et al. 1979;
de fogo na escola”, “alunos com outras armas SOLOMON et al., 2000; FELNER et al. 2001;
(facas, canivetes etc.)”; PETERSON; SKIBA, 2001; HASELSWERDT;
• Drogas na escola: “alunos com drogas/ LENHARDT, 2003, CASASSUS, 2007). A
bebidas alcoólicas na escola”; existência de drogas e armas na escola mostra
• Avaliação dos alunos sobre as escolas, também uma provável falha na supervisão e
comparadas a outras da região: “muito melhor controle, seja da escola ou de órgãos superiores
que as outras”, “melhor que as outras”, “igual responsáveis pela manutenção de um ambiente
às outras”, “pior que as outras”, “muito pior que seguro para alunos e funcionários em geral.
as outras”.
Correlações: aspectos escolares e
A partir da tabela acima, na segunda experiências de violência
coluna, é possível observar altos percentuais
de alunos que já presenciaram circunstâncias Abaixo são apresentadas correlações
de brigas e agressões físicas em suas escolas, entre variáveis referentes a percepções de vio-
independentemente da forma como esses as lência dos alunos e percepções sobre aspectos
avaliam. Entretanto, destacam-se os alunos gerais de suas escolas.
que consideram suas respectivas escolas como A correlação positiva verificada entre
muito piores que as outras, na medida em que a incidência de alunos com drogas e bebidas
76% desses afirmam existir brigas e agressões alcoólicas na escola e a violência intraescolar,
na escola. Em relação ao testemunho dos alunos com coeficiente igual a 0,5, considerado
sobre armas de fogo nas instituições, os dados moderado, permite-nos supor uma associação
seguem a mesma tendência, já que 13% dos entre essas duas situações no espaço escolar.
estudantes que presenciaram tal circunstância É possível verificar também que todas
avaliam suas escolas como muito piores que as as variáveis de percepções de violência extra-
outras, percentual que se destaca dos demais. O escolar estão positivamente correlacionadas às
mesmo ocorre quando se trata de outras armas, percepções de violência intraescolar, e ambas
visto que 28% dos alunos que já testemunharam estão negativamente correlacionadas à variá-
estudantes com outras armas avaliam suas vel de avaliação geral da escola, um dos indi-
escolas como muito piores. Por fim, quanto às cadores de clima escolar. Por suposição, esse
percepções sobre ocorrências de alunos com dado pode ser interpretado como a existência
drogas na escola, observa-se novamente a de direções equivalentes entre as percepções
avaliação da instituição como muito pior que de violência dentro e fora da escola, ou seja,
as outras sendo o diferencial, na medida em alunos que relataram ocorrências de violên-
que 41% dos alunos que afirmam terem visto cia dentro da escola também tendem a rela-
alunos com drogas/bebidas na escola avaliam tar ocorrências de violência fora da escola e
suas escolas dessa forma. vice-versa. No que se refere à satisfação dos
Assim, esses dados apontam para uma alunos com a instituição de ensino e percep-
possível associação entre escolas muito mal ções de violência dentro e fora da escola e de
avaliadas pelos alunos, que seria um indicador drogas dentro da escola, verificam-se também
de clima escolar negativo, e um ambiente direções opostas, ou seja, nas instituições em
mais propício à violência. A constatação que muitos alunos já testemunharam ocorrên-
dessa associação é consonante aos estudos cias de violência e drogas, a avaliação geral da
que mostram a relação entre incidência de escola tende a ser negativa.
Certamente, há fatores que são interve- regressão seguinte, verificar quais fatores re-
nientes aos observados e que podem contribuir lacionam-se à variável referente a alunos com
para a explicação das referidas relações. O obje- drogas e bebidas alcoólicas na escola.
tivo da próxima seção é justamente aprofundar
esta investigação por meio de análises multi- Tabela 3 – Regressão linear para percepções de violência
variadas, levando em conta outros fatores que intraescolar
podem exercer influência sobre os resultados. Cor (negros) ,034
Sexo (masculino) ,043
Regressões lineares: violência Idade (maior faixa etária) -,030
intraescolar, alunos com drogas e bebidas Nível socioeconômico -,016
alcoólicas na escola e percepções sobre a Lares monoparentais -,024
instituição de ensino N° de homicídios a 300 metros da escola -,016
Avaliação geral da escola ,005
Tendo como variável dependente as per- Alunos com drogas e bebidas alcoólicas ,524**
cepções dos alunos sobre violência intraescolar, Exposição à violência ,000
dentre as variáveis significativas do modelo, Abordagem policial ,075*
destacam-se: os coeficientes positivos de alu- Experiências de violência ,120**
nos com drogas e bebidas alcoólicas na escola, Variável dependente: Violência intraescolar - ** p < 0,001 *p < 0,05 - R2
igual a 0,524; abordagem policial, igual a 0,075; ajustado: 0,33
e experiências de violência, igual a 0,120. Com Coeficientes de regressão padronizados (Beta)
Fonte: Dados da pesquisa
o coeficiente mais alto do modelo, sobressai-
-se a variável referente a alunos com drogas e
bebidas alcoólicas na escola, dado que indica a Antes disso, vale destacar alguns
associação positiva dessa variável às percepções resultados, mesmo que não sejam significativos,
de violência intraescolar, confirmando a tendên- isso porque, em determinados casos, a direção
cia verificada nas análises anteriores. Também é dos coeficientes é convergente ao que se afirma
possível supor associações entre percepções de pela literatura e, em outros, há resultados
violência intraescolar e percepções de violência interessantes que valem ser mencionados.
extraescolar, no caso dos coeficientes positivos A começar pelos coeficientes positivos das
relativos a “experiências de violência” e “abor- variáveis referentes à cor e ao sexo, iguais a
dagem policial”. Essa tendência é igualmente 0,34 e a 0,43, os quais indicam que jovens
verificada na matriz de correlações precedente. negros e do sexo masculino são os que mais
Considerando esses resultados, pretende-se, na relatam situações de violência, verifica-se que
1088 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
são consonantes à literatura, a qual evidencia são também as percepções de violência
maior envolvimento de jovens do sexo intraescolar, resultado oposto ao evidenciado
masculino e negros em contextos de violência pela literatura, e contrário também às análises
(BEATO, 2000; ZALUAR; LEAL, 2001; SOARES; realizadas até então. Contudo, esse possui um
CANO, 2002, RAMOS; LEMGRUBER, 2004). dos mais baixos coeficientes da regressão, além
Vale destacar também o coeficiente relativo ao de não ser significativo, assim como os demais
nível socioeconômico (NSE), igual a -0,16, que mencionados anteriormente. Parte dos dados
significa que alunos de NSE mais alto relatam não significativos foi destacada com o intuito
menos situações de violência intraescolar, e de prestar esclarecimentos, e pelo fato de
vice-versa. Uma suposição que pode ser feita alguns apresentarem resultados interessantes.
nesse sentido é o fato de alunos com maior Entretanto, por não serem significativos, seus
NSE estudarem em escolas que possuem menor resultados não podem ser considerados para a
incidência de violência intraescolar. Outra realização de associações e inferências.
hipótese é a possibilidade de alunos com esse
perfil estudarem em escolas localizadas em Tabela 4 – Regressão linear para percepções sobre alunos
áreas menos violentas, de forma que sofrem com drogas e bebidas alcoólicas
menor influência do contexto externo. Mas Cor (negros) -,011
essas são somente suposições. Sexo (masculino) -,033
O coeficiente de -0,016, referente ao Idade (maior faixa etária) ,058*
número de homicídios a até 300 metros da Nível socioeconômico -,002
escola, também chama a atenção, na medida Lares monoparentais ,018
em que indica que quanto maior é o número N° de homicídios a 300 metros da escola -,041
de homicídios no entorno da escola menor Avaliação geral da escola -,092**
é percepção de violência intraescolar. Em Violência intraescolar ,526**
primeiro lugar, é preciso destacar que esse Abordagem policial -,014
dado não se refere a percepções, já que o Experiências de violência ,060*
número de homicídios foi obtido através de Exposição à violência ,101**
georreferenciamento. De acordo com o que se
Variável dependente: alunos com drogas e bebidas alcoólicas na escola -
espera, esse resultado deveria estar justamente ** p < 0,001 *p < 0,05 – R2 ajustado: 0,32 – Coeficientes de regressão
na direção oposta, considerando a provável padronizados (Beta)
Fonte: Dados da pesquisa
influência do contexto externo sobre o interno.
Entretanto, como se trata de percepções, é
possível que alunos de escolas localizadas em A idade é o primeiro coeficiente significa-
áreas mais violentas, por circularem nelas com tivo observado no modelo, o que significa dizer
maior frequência, tendam a naturalizar algumas que a percepção sobre alunos com drogas e be-
circunstâncias que são vistas como mais graves bidas alcoólicas pode ser mais frequente entre os
por jovens que estejam menos expostos a tais estudantes de maior faixa etária. Uma hipótese
contextos. possível seria a maior exposição desses jovens
Outra hipótese é a existência de ações a circunstâncias de uso de drogas e de consu-
mais enérgicas e efetivas por parte da equipe mo de bebidas alcoólicas. De forma convergente,
pedagógica de tais escolas, de supervisão Figueiredo et al. (2012), como citado na revisão
e controle, devido ao contexto de extrema bibliográfica, apontam o uso de drogas entre jo-
violência externa. Outro resultado intrigante é vens de maior faixa etária, que no caso são alu-
o coeficiente positivo, igual a 0,005, referente nos de classes de Educação de Jovens e Adultos
à avaliação da escola, o qual indica que, (EJA), sendo constatado também maior envolvi-
quanto mais satisfeitos com a escola, maiores mento desses com o tráfico de drogas.
1090 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
também a queda nas ocorrências de indisciplina e ao clima escolar, teve por objetivo investigar
e de violência nas escolas. os processos intraescolares, as circunstâncias de
Também é possível destacar a importância violência que os perpassam e suas implicações,
das constatações de Sampson, Raudenbush e além de pretender suscitar questões para a
Earls (1997), pioneiros nos estudos a respeito realização de estudos subsequentes.
da eficácia coletiva. Entre seus achados, os É possível atribuir um caráter explora-
autores apontaram a supervisão e o controle tório aos resultados e às articulações teóricas
dos grupos de adolescentes como indicador mais realizadas, devido à escassez de abordagens que
significativo para o combate das ocorrências de relacionem as contribuições das duas linhas
violência. No mesmo sentido, Shaw e McKay teóricas em questão. Apesar de haver estudos
(1942) já abordavam, na década de 1940, o acerca das percepções de alunos a respeito da
envolvimento de jovens em circunstâncias de violência nas escolas, são escassos também en-
violência como fenômeno de grupo, resultante foques que articulem a essa questão evidências
de frágeis e ineficientes meios de supervisão e sobre o clima escolar.
controle. Esses autores falam principalmente de A partir dos resultados evidenciados,
controle e supervisão e fatores relacionados ao podemos pensar em estudos subsequentes que
grau de coesão da comunidade. Com perspectiva explorem as relações mostradas e questões
similar, alguns estudos na área da educação relacionadas, tais como: (1) relação entre clima
constatam que a coesão interna e ações baseadas escolar, violência e suas implicações para o
em objetivos compartilhados são fatores desempenho escolar dos alunos; (2) influência da
importantes para que haja um bom clima escolar. participação dos pais/responsáveis no cotidiano
escolar sobre as percepções dos alunos a respeito
Considerações finais da violência intraescolar; e (3) impacto das UPPs
(Unidades de Polícia Pacificadoras), no caso do
O esforço teórico deste estudo, ao município do Rio de Janeiro, sobre as percepções
articular as teorias referentes à eficácia coletiva dos alunos acerca da violência intraescolar.
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Marcela Brandão Cunha possui graduação em Pedagogia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2007) e mestrado
em Educação pela mesma universidade (2010). Atualmente é doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica
do Rio de Janeiro.
1092 Marcela Brandão CUNHA. Possíveis relações entre percepções de violência dos alunos, clima escolar e eficácia...
O conceito de compensação no diálogo de Vigotski
com Adler: desenvolvimento humano, educação e deficiênciaI
Débora DainezII
Ana Luiza Bustamante SmolkaII
Resumo
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1093-1108, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014071545 1093
The concept of compensation in the dialogue of Vygotsky
with Adler: human development, education and disability I
Débora DainezII
Ana Luiza Bustamante SmolkaII
Abstract
Keywords
I- Esta produção refere-se a uma
parte dos resultados do projeto
- Processo no. 2010/08782-0, Human Development — Education — Disability — Compensation —
Fundação de Amparo à Pesquisa do Lev S. Vygotsky.
Estado de São Paulo (FAPESP).
II- Faculdade de Educação da
Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, SP, Brasil.
Contacts: ddainez@yahoo.com.br;
asmolka@unicamp.br
1094 http://dx.doi.org/10.1590/s1517-97022014071545 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1093-1108, out./dez. 2014.
Introdução mencionam o principal conceito trabalhado
por Vigotski quando aborda o desenvolvimento
As ideias do russo Lev S. Vigotski1 da pessoa com deficiência: o conceito de
chegaram ao Brasil na década de 1980. A sua compensação (GÓES, 2002; CARVALHO, 2006;
primeira obra disponível no nosso país foi A GARCÍA; BEATÓN, 2004; KOZULIN; GINDIS,
formação social da mente, em 1984 e, mais 2007; FICHTNER, 2010; AKHUTINA; PYLAEVA,
tarde, em 1988, foi publicada a coletânea 2012; BOTTCHER, 2012, dentre muitos outros).
Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem Diferentes são os posicionamentos dos autores
(textos escolhidos de Vigotski, Luria e Leontiev). e múltiplos são os sentidos produzidos. Essa
A divulgação dos estudos desse autor impactou ampla disseminação do conceito nos mostra a
o âmbito da educação e repercutiu como uma pertinência das ideias produzidas por Vigotski.
nova forma de pensar a respeito dos aspectos Contudo, em nossa avaliação, o risco é de que
do ensino e do desenvolvimento de crianças, o conceito de compensação torne-se um lugar
produzindo efeitos nas políticas públicas e nas comum (SMOLKA, 2010), que seja assumido como
práticas educativas. No entanto, os trabalhos já naturalizado – compensação social do defeito
de Vigotski no campo da defectologia, orgânico; a deficiência precisa ser compensada – e,
nomenclatura usada na sua época (final do dessa forma, desloque os princípios explicativos
século XIX e início do século XX) para se e os argumentos, enrijecendo o potencial
referir ao estudo de pessoas com deficiência, analítico desenvolvido por Vigotski no que se
tardou a chegar ao país. Um primeiro texto refere ao desenvolvimento humano (atípico)
veio na década de 1990, na versão inglês The pensado nas condições sociais concretas de
problem of mental retardation (a tentative produção. Isso nos move a indagar a respeito
working hypothesis), pela assinatura da revista das raízes e implicações teórico-conceituais do
Soviet Psychology. A versão completa da obra conceito em questão.
Defectología, em espanhol, tornou-se acessível Assim sendo, diante das condições
ao público brasileiro somente no final dos que possibilitam a divulgação das ideias do
anos 1990, mas é de difícil disponibilidade no autor — as traduções iniciais para o português;
mercado. Esse conjunto de textos permaneceu a consideração da pertinência de seus princípios
sem tradução até 2006, quando apareceu o para o campo da educação e da psicologia do
primeiro texto: “Sobre a questão da dinâmica desenvolvimento humano, ou ainda, para o
do caráter infantil”, traduzido por Zoia Prestes trabalho na interface dessas áreas; o interesse dos
diretamente do russo para o português. No ano autores contemporâneos em disseminar e aderir
de 2011, Martha Kohl de Oliveira, juntamente ao conceito de compensação —, indagamos: Que
com Denise Regina Saler e Priscila Nascimento concepção esse autor traz a respeito da deficiência
Marques, traduziram também diretamente do e do desenvolvimento humano quando elabora
russo o texto: “A defectologia e o estudo do o conceito de compensação? Qual a possível
desenvolvimento e da educação da criança relevância desse conceito na contemporaneidade,
normal”. Contudo, a obra completa permanece quase 100 anos após sua elaboração?
ainda sem tradução, o que inviabiliza, portanto, Nesse sentido, a proposta deste texto
o acesso ao conhecimento das ideias de Vigotski é apresentar um estudo a respeito da história
no que tange ao tema da deficiência. de elaboração conceitual de compensação na
Por outro lado, na produção acadêmica perspectiva histórico-cultural, compreendendo
contemporânea, muitos são os estudos que a emergência e o movimento das ideias e
dos argumentos produzidos por Vigotski na
1- Tendo em vista que a grafia do nome do autor varia em diferentes traduções,
optamos por utilizar preferencialmente Vigotski. Nas referências, estão interlocução com os seus contemporâneos
preservadas as grafias diferenciadas conforme constam nas obras publicadas. a respeito das condições orgânicas e sociais
1096 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
baseada na teoria do dom, atribuía ao deficiente As críticas realizadas por Vigotski (1997) se
uma espécie de forças, de origem divina, em que intensificaram ainda mais quando analisou como
um conhecimento, uma sensibilidade especial as concepções acerca da compensação (mística,
compensaria determinada ausência (visão, sensorial, suprimento social) compunham o
audição, inteligência...). A outra vertente era cenário de uma educação filantrópica, insípida,
biológica, que considerava que a perda de uma assistencialista e piedosa das pessoas com
função perceptiva seria compensada naturalmente deficiência, que fragmentava o conhecimento e
com o funcionamento de outros órgãos. Fundada não ampliava a visão de mundo. É nesse sentido
na ideia de uma pré-disposição orgânica contida que o autor defendeu que “o ensino especial deve
no organismo, essa concepção se concentrava perder o seu caráter especial e então passará
no plano sensorial, identificando os limites e a fazer parte do trabalho educativo comum”
impedimentos que a deficiência impunha, na (VIGOTSKI, 1997, p. 93, tradução nossa). Em
busca pela causa que caracterizava o defeito. A outro momento, Vigotski (1997) novamente
análise do desenvolvimento humano era reduzida apontou que “em essência, não existe diferença
àquilo que era mensurável, o que conduzia a no enfoque educativo de uma criança deficiente
uma ideia de insuficiência das capacidades desses e de uma criança normal, nem na organização
indivíduos frente ao déficit orgânico. psicológica de sua personalidade” (VIGOTSKI,
Ao entrar em contato com essas 1997, p. 62, tradução nossa).
tendências, Vigotski (1997), nos dois textos É interessante notar que ele trouxe como
supracitados, marcou o seu desacordo por essas metodologia da educação social a compensação
abordagens privilegiarem um viés naturalista social, cujo princípio é a inserção da pessoa
do desenvolvimento humano e por conceberem com deficiência na vida laboral, nos diferen-
a compensação como uma correção biológica tes espaços de atividade do cotidiano. É esse o
automática do defeito, o que prescreve um caráter pressuposto que ancora a sua contraposição a
médico e terapêutico à pedagogia, reduzindo um ensino embasado no defeito orgânico, em
as ações educativas ao desenvolvimento dos defesa de uma instrução orientada para o po-
sentidos imunes ou ao reestabelecimento de tencial de desenvolvimento das funções huma-
determinadas formas de conduta. Ao contrário nas complexas (atenção voluntária e orientada,
disso, defendeu que a função da educação é a memória mediada, percepção verbalizada, tra-
criação de novas formas de desenvolvimento. balho de imaginação, pensamento generaliza-
É importante notar que Vigotski (1997) do, nomeação e conceptualização do mundo).
também explicitou as suas divergências com as Portanto, nesses primeiros ensaios de
ideias da educação no ocidente/norte-americana, Vigotski (1997) para elaborar conceitualmente
por essa conceber a compensação como suprimento a compensação a partir de uma perspectiva
social: “Ali os problemas são tratados como histórico-cultural, observamos que o termo é
caridade social, em mudança, para nós se trata qualificado com a palavra social e, ainda, que a
de questões de educação social” (VIGOTSKI, 1997, compensação social é trazida como metodologia
p. 71, tradução nossa). Nesse sentido, para ele, a da educação. Por meio disso, é possível analisar
educação não é vista como auxílio, complemento que, nessas primeiras reflexões, a problemática
e/ou suprimento de uma carência (orgânica e/ou da deficiência é deslocada da ordem do orgânico,
cultural), mas é a produção de uma ação que torna do patológico em que se estudava a estrutura
possíveis novas formas de participação da pessoa biológica da personalidade, e é colocada como
na sociedade. Por meio dessa discussão, aborda o problema no campo educacional, com o foco
problema da educação da criança com deficiência nos processos sociais de desenvolvimento e de
e as possibilidades de seu desenvolvimento como formação da personalidade. Nesse sentido, o
responsabilidade do meio social. que ressaltamos é a importância da mudança
1098 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
superioridade e perfeição – compõem o processo que nossa cultura é baseada na saúde e na
em que ocorre a elevação da personalidade. adequação de órgãos plenamente desenvolvidos.
Dito de outro modo, a personalidade reúne, no Sendo assim, uma criança que apresenta
processo de expressão e ascensão, o sentimento de um defeito orgânico acha-se em situação de
inferioridade que se torna consciente na situação desvantagem para resolver seus problemas de
social e o propósito de ser superior que permanece vida, pois não será tratada com ternura por um
não consciente, é impedido de se manifestar, mas mundo que não é feito para ela nem a ela se ajusta.
imposto como necessário na vida social. Segundo o autor, essa criança irá carregar consigo
Notamos o lugar que ocupa a questão do um fardo do sofrimento corpóreo e psíquico
objetivo futuro a ser alcançado pelas forças in- adicional. Mas é possível que esse indivíduo, no
dividuais na teorização de Adler, uma vez que, decurso do tempo, manifeste automaticamente o
na vida psíquica, todos os seus movimentos são desenvolvimento das condutas compensatórias, o
administrados por uma meta criada no indi- que depende do rumo tomado pelo sentimento de
víduo pela necessidade de adaptação ao meio. inferioridade da situação social ocupada.
Todavia, para atingir o objetivo vislumbrado, o Entretanto, o sentimento de inferiorida-
sentimento de inferioridade precisa ser compen- de, quando muito intensificado devido ao exa-
sado. O sentimento social/senso de sociabilidade gero dos obstáculos encontrados na coletivida-
é influenciado juntamente pelo sentimento de de, ao invés de despertar no indivíduo formas
inferioridade e pelo seu contrapeso compensa- de compensação, confirma a sua incapacidade,
dor, que é o esforço pelo predomínio/superio- desenvolvendo assim um complexo de inferio-
ridade. A compensação está relacionada à ideia ridade. Nesse caso, a luta pela compensação já
de equilíbrio/adequação/adaptação/acomodação não satisfaz mais a realização do equilíbrio das
do indivíduo ao meio. O mecanismo pelo qual forças, exigindo uma supercompensação que
o mal-estar individual decresce é nomeado por procura um superequilíbrio.
Adler (1967, 2003) como compensação. Consideramos que, no raciocínio de Adler
Poderíamos inferir que Adler traz uma (1967), não existe órgão, sejam quais forem as
concepção assentada na corrente do evolucionismo, condições orgânicas, que necessariamente obrigue
o que implica considerar a compensação como um o indivíduo a assumir uma atitude tensa em face
mecanismo de adaptação orgânica ao meio; no da vida, não permitindo ocupar uma posição
entanto, o autor adicionou um fator psicológico, igual ao seu semelhante. O fato, diz ele, é que
o sentimento subjetivo que impulsiona o indivíduo ninguém tentou ainda remediar as dificuldades
a atravessar seus limites orgânicos. A tese é: o do desenvolvimento psíquico da criança com
aperfeiçoamento do órgão psíquico permite a deficiências orgânicas. E é, necessariamente,
compensação do órgão orgânico incapacitado. isso que Adler (1967) aponta com a sua nova
Nesse sentido, Adler (1967, 2003) traz psicologia individual, com orientação para a
a compensação no sentido de luta — luta pela situação social em contraponto de uma psicologia
adaptação ao meio, pela consideração social, que privilegia a disposição orgânica dos órgãos,
pela equilibração da vida psíquica e harmonia da pois somente dada situação vivida determina se
vida social —, como uma tendência que acontece algo é qualidade ou defeito.
em todos os indivíduos, sendo eles deficientes
ou não, crianças ou adultos; um mecanismo O diálogo de Vigotski com Adler:
que é mobilizado diante de uma dificuldade, um primeiras aproximações (1927)
obstáculo, que resulta na atrofia ou no desvio do
sentimento/senso de sociabilidade. Imerso num contexto de reformulação
Em seu estudo acerca da criança na área da defectologia, Vigotski (1997)
organicamente debilitada, Adler (1967) pondera encontrou em Adler elementos que afetaram
1100 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
fundamental e determinante da/na vida humana; social, do engajamento do meio, do compromisso
necessidade de viver em um meio histórico e social e da responsabilidade da sociedade para com
como ponto de avanço do desenvolvimento da a educação e o desenvolvimento dessa pessoa.
humanidade –, deslocou a formação individual O que se evidencia na discussão do autor em
e não consciente do objetivo para a sua criação relação a esse caso são as condições sociais
coletiva e consciente. Os objetivos são, para ele, particularmente favoráveis que se criaram e
as exigências sociais produzidas no e pelo meio criaram potencialidade em Helen Keller.
social no qual a pessoa está inserida, e afetam Vamos percebendo como Vigotski
o curso de seu desenvolvimento, impactam no (1997) vai incorporando as ideias dialogadas,
funcionamento psicológico, fazem o cérebro redimensionando-as. O argumento a que ele
operar; tornam possível antecipar, programar, continuou dando visibilidade por meio do
planejar uma ação, uma atividade humana. conceito de supercompensação diz respeito ao
A partir desse ponto de vista, produzido adensamento da ideia que inicia nos textos já
acerca do conceito de supercompensação, apresentados quando usa o termo compensação
Vigotski analisou a história do desenvolvimento social, mas com uma maior expansão teórica. O
de Hellen Keller (1880-1943), norte-americana autor situa o lugar do social no desenvolvimento,
que ficou cega e surda em tenra idade devido a bem como a função e a orientação da educação
uma doença diagnosticada na época como febre nessa problematização conceitual. O que
cerebral. Ela tornou-se escritora e doutorou-se em aparece de modo mais intenso com a discussão
filosofia, desenvolvendo importantes trabalhos da questão do objetivo é o desenvolvimento
em favor de pessoas deficientes e escreveu livros prospectivo, em processo e orientado pelas
sobre sua vida. Anne Sullivan foi sua professora, exigências sociais e não como algo determinado
a qual ficou conhecida pelo filme O milagre de organicamente e, portanto, estagnado. Ou seja,
Anne Sullivan. Ao trazer para discussão a história a ideia de projeto do humano se evidencia, o
desse caso, Vigotski criou partituras que refletem, como o grupo social pode vislumbrar e projetar
ressoam seus argumentos em construção. formas outras de vida e condições educacionais
O autor mostrou que as graves deficiências que viabilizem novos modos de participação
de Keller colocaram em jogo enormes forças de social da pessoa com deficiência na cultura.
superação, enfatizando que esse processo só é
possível por meio de condições concretas que Uma mudança de lugar das
possibilitam converter o defeito em vantagens (pro)posições de Adler: a revelação
sociais. No caso analisado, a aprendizagem de da controvérsia no pensamento de
Keller se converteu em causa de todo o país: Vigotski (1928-1929)
1102 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
No texto de 1929, “Tesis fundamentales na elaboração conceitual da compensação. As
del plan para el trabajo paidológico de ideias de Adler continuaram sendo trabalhadas,
investigación en el campo de la infancia difícil”, mas as diferenças se explicitaram e as posições
Vigotski apresentou o problema da plasticidade. teóricas foram enfaticamente marcadas.
Suas considerações apontam para a compreensão Vigotski apresentou a psicologia indivi-
da plasticidade como a capacidade de mudança dual de Adler tecendo contundentes críticas:
do organismo vivo e, mais especificamente, do 1) Apontou o problema da não consciência
condicionamento social do desenvolvimento e da tomada de consciência na perspectiva de
humano, da flexibilidade do funcionamento Adler, questão essa que aparece de um modo
psicológico. Isso quer dizer que a condição implícito no texto de 1924/1927, quando
plástica do cérebro precisa ser pensada na discute a ideia de objetivo futuro. Reiterou:
relação com a ação social e educativa. “os processos de compensação estão ligados
Outra questão que começa a aparecer ao funcionamento da consciência” (VIGOTSKI,
na elaboração do conceito de compensação é 1997, p.136, tradução nossa), e considerou que
a noção de instrumentos psicológicos/signos a teoria de Adler ancorava-se num ponto de
e, juntamente com isso, surge a ideia de vista idealista para propagar uma concepção
desenvolvimento cultural: “O desenvolvimento subjetiva da compensação, fornecendo uma
cultural é a principal esfera em que é possível resposta “com um espírito vitalista” (VIGOTSKI,
compensar a deficiência” (VIGOTSKI, 2011, 1997, p.136, tradução nossa);
p.869, tradução Oliveira; Saler; Marques). 2) Mostrou que o elemento mediador
O que ressaltamos nessas passagens dos do processo de compensação não é criado
escritos de Vigotski (1997) é a complexidade subjetivamente, mas socialmente, na dinâmica
do psiquismo, condição essa que mostra novas da vida, sendo esses os recursos auxiliares/
possibilidades de organização das funções instrumentos técnicos e signos;
psíquicas, abrindo novas perspectivas diante da 3) Reiterou que as oportunidades
educação da criança com deficiência. objetivas produzidas na coletividade é que
merecem destaque na ideia de compensação e
Novas possibilidades de não o sentimento subjetivo de inferioridade.
apropriação e elaboração O empenho de Vigotski (1997) é tratar
conceitual (1930-1935) a compensação sob o ponto de vista de uma
concepção materialista, pontuando que, para
No texto “Acerca de los procesos compreender os processos compensatórios, é
compensatorios en el desarrollo del niño preciso entender a premissa da unidade das
mentalmente retrasado” (1931), Vigotski (1997) leis que regem o desenvolvimento da criança
pondera que ainda resta um extenso e fecundo normal e da criança deficiente, assumindo
caminho a seguir em relação à elaboração teórica como princípio fundamental a correlação
da compensação, sendo que a tarefa consiste em entre as regularidades sociais e biológicas no
levantar questões e estabelecer princípios que desenvolvimento humano.
conduzam à compreensão desse fenômeno. O autor afirma que o plano primário, que
Se, no período de 1928 a 1929, Vigotski diz respeito ao biológico/funções elementares,
(1997) afirmou a tese de que as funções é reiteradamente transformado pelas novas
psicológicas superiores são formadas na relação formações qualitativas que se originam na
social, em 1931, procurou analisar como essas relação da pessoa com o meio social, dando
funções são constituídas socialmente, como o origem a um novo plano – o das funções
social impacta o funcionamento orgânico e, com psicológicas superiores. O que se revigora
isso, vamos notando o impacto desse interesse como argumento é que o orgânico, ao ser
1104 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
nexos entre elas, configurando-se de modo ain- e, depois, os limites de determinada posição
da mais complexo. Ao contrário do que Lewin teórica, pontos de convergência e divergências.
postulava, Vigotski (1997) orientou a análise da Tratou-se, portanto, de um esforço de trabalhar
relação afeto-intelecto num movimento cons- a conceituação a partir dos problemas e das
tante de (trans)formações de novas tendências discussões científicas daquele momento histórico.
psicológicas, novos modos de pensamento e Ressaltamos a importância do diálogo
novas formas de condutas/ações. O argumento que Vigotski (1997) estabeleceu com Adler
construído foi: o afeto é orientado/movido pelo no processo de formulação conceitual da
sentido produzido na relação, gerando possibili- compensação. Um diálogo que foi marcado
dades outras de (inter)ação. pelo entusiasmo, pela adesão, pela suspeita,
Vale notar que nesse texto o autor não por embates e crítica da teoria como um todo e,
enunciou o termo compensação e não fez mais detidamente, no que se refere ao conceito
referência a Adler. Contudo é interessante o fato de compensação. Do nosso ponto de vista, não é
de ele abordar a problemática do retardo mental possível demarcar temporalmente de modo tão
em relação com o afeto, sendo que Adler trazia o preciso o movimento de adesão e rompimento
sentimento, mais especificamente, o sentimento de Vigotski com as ideias de Adler, conforme
de inferioridade e de sociabilidade, como aspecto a análise de Van Der Veer e Valsiner (2009).
central da formação da personalidade humana. Isso porque esses movimentos acontecem já
A hipótese que formulamos, após per- no primeiro contado de Vigotski com Adler
correr esse caminho da elaboração conceitual (texto de 1927) e persistem até os últimos
da compensação é que Vigotski (1997) se voltou ensaios; consistem na dinâmica de construção
a essa questão justamente para redimensionar o das elaborações de Vigotski. A posição de
modo de conceber essa dimensão afetiva, ain- Adler integra esse processo de compreensão,
da não resolvida, e avançar na compreensão teorização e conceptualização, seja pelo
do funcionamento psicológico humano, inves- movimento de adesão seja pelo movimento de
tindo em novas vias possíveis de desenvolvi- rejeição estabelecido a partir do encontro de
mento. Nesse texto, o autor não usou o termo Vigotski (1997) com outros interlocutores e pela
sentimento como Adler, e sim, o termo afeto. incorporação dos princípios do materialismo
O argumento que foi sendo produzido também histórico-dialético.
diferiu. Adler (1967, 2003) situou o sentimento Na análise da interlocução de Vigotski
de inferioridade, de superioridade e de sociabi- com Adler, foi possível notarmos os pontos
lidade na dimensão subjetiva do indivíduo. Já de acordos e a explicitação das diferenças das
Vigotski (1997) localizou o afeto na dimensão perspectivas e, consequentemente, dos modos de
simbólica, nas relações e condições concretas abordar a compensação. Os autores se tangenciam
de produção e uso de signos e sentidos; esfera nos argumentos de que a compensação orienta
em que residem as possibilidades do humano. um modo positivo de se conceber a deficiência
e de que a condição de lesão orgânica pode
Considerações finais ser, justamente, o lugar da produção de novas
possibilidades (a dialética defeito-superação).
Na tentativa de compreender os modos de Contudo, divergem quanto aos modos de teorizar
produção do conceito de compensação na teoria e aos princípios explicativos que assumem.
histórico-cultural, considerada a relevância do Adler (1967, 2003) teorizou a respeito
diálogo na época, fomos notando o poder analítico do humano na busca da harmonia na vida,
do estilo de argumentar de Vigotski, que condiz concebeu a personalidade como um contínuo
com a frequente e explícita interlocução com determinado no período da infância e abordou
seus contemporâneos, marcando a contribuição a esfera social como externa ao indivíduo e à
1106 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
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Débora Dainez é fonoaudióloga, mestre em educação pela Universidade Metodista de Piracicaba e doutoranda em educação
na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Ana Luiza Bustamante Smolka concluiu a livre docência na FE/Unicamp (2012). É coordenadora do Grupo de Pesquisa
Pensamento e Linguagem na Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).
1108 Débora DAINEZ; Ana Luiza Bustamante SMOLKA. O conceito de compensação no diálogo de Vigotski com Adler:...
Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no
“conhecimento dos poderosos” à defesa do “conhecimento
poderoso”I
Resumo
Palavras-chave
Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1109-1124, out./dez. 2014. http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014400400201 1109
Michael Young and the curriculum field: from the emphasis
on the “knowledge of the powerful” to the defense of “powerful
knowledge”
Abstract
Keywords
1110 http://dx.doi.org/10.1590/S1517-97022014400400201 Educ. Pesqui., São Paulo, v. 40, n. 4, p. 1109-1124, out./dez. 2014.
Apresentação [do currículo] como monolítico, já que outras
intenções podem ser identificadas, tanto em
suas manifestações iniciais como nos estágios
subsequentes”. De todo modo, nas suas origens,
as diferentes intenções presentes no campo,
“de formas diversas, procuraram adaptar a
escola e o currículo à ordem capitalista que se
consolidava” (2002, p. 11).
A NSE introduziu uma nova forma de
analisar o currículo, que incidia exatamente
sobre as escolhas que se fazia para definir o que
deveria ser ensinado, afirmando que a seleção
de conhecimento definida era a expressão dos
interesses dos grupos que detinham maior poder
para influir nessa definição. Assim, de uma
visão de currículo supostamente neutra, não
problematizadora das escolhas realizadas em
torno do conhecimento, passava-se a uma visão
crítica dessas escolhas, que claramente assumia
Fonte: arquivos do entrevistado. o viés político da temática do currículo. Moreira
e Silva (2002) consideram que:
Em 1971, Michael Young editou uma
obra que se tornou a expressão de uma A NSE constituiu-se na primeira corrente
importante mudança na forma de compreender sociológica de fato voltada para o estudo
o currículo no contexto europeu. Intitulado do currículo. O grande marco de sua
Knowledge and Control: New Directions for emergência tem sido considerado o
the Sociology of Education, o livro reuniu livro editado por Young, Knowledge and
textos de diversos autores que compunham o Control: New Directions for the Sociology
denominado movimento da Nova Sociologia of Education (1971). [...] foi considerável
da Educação (NSE), entre eles Pierre Bourdieu, a influência da NSE no desenvolvimento
Geoffrey Esland, Neil Keddie, Basil Bernstein e inicial e nos rumos posteriores da Sociologia
o próprio Michael Young. do Currículo, tanto na Inglaterra como nos
A perspectiva a que se opunham esses Estados Unidos. (p. 19-20, grifos do autor)
autores era aquela que defendia uma concepção
técnica do currículo, centrada em questões É nesse contexto de identificação das
tais como: quais os melhores métodos ou relações de poder incrustradas no currículo,
as melhores estratégias para garantir que se de denúncia do silenciamento de muitas vozes
atinjam os resultados esperados em relação ao na definição do que é relevante, em especial
processo de escolarização e quais as melhores daquelas oriundas das classes economicamente
formas de organizar o ensino e o currículo menos favorecidas, que Michael Young
para esse mesmo fim. Nessa abordagem, não apresenta sua primeira forma de abordagem
havia espaço para discutir o que se ensinava, do currículo. O próprio autor, em texto de
o que era tomado como um dado sobre o qual produção recente (YOUNG, 2010), ao voltar a
seria desnecessário refletir. Cumpre destacar, atenção para suas ideias nesse período, destaca
entretanto, que, como afirmam Moreira e duas delas, que ele ainda hoje assume como
Silva (2002): “não se deve entender o campo verdadeiras: (1) educação e conhecimento
1112 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
conhecimento, sempre sujeito a revisões, o que os alunos igualmente e não apenas como
identifica como o diferencial de sua perspectiva membros de classes sociais diferentes,
em relação a uma visão tradicional de currículo: grupos étnicos diferentes ou como meninos
e meninas. (YOUNG, 2011, p. 619-620)
Em contraste com a visão tradicional, as
disciplinas não são vistas como parte de Apresentadas, em linhas gerais, as
algum cânone fixo definido pela tradição, diferenças nas formas de abordagem do
com conteúdos e métodos imutáveis. [...] Ao currículo nesses dois momentos da trajetória
adquirirem conhecimentos das disciplinas, intelectual de Michael Young, a entrevista com
[os estudantes] estão ingressando naquelas o autor pretende trazer mais elementos para a
“comunidades de especialistas”, cada uma compreensão das transformações em suas ênfases
com suas diferentes histórias, tradições e nos dois momentos, o que é especialmente
modos de trabalhar. (YOUNG, 2011, p. 617) relevante no contexto brasileiro, em que não se
conta com a tradução de muitas de suas obras.
Assume e defende, portanto, o valor Além disso, suas afirmações incidem no que
social de uma distribuição mais justa do pode ser considerado o ponto nevrálgico das
conhecimento poderoso, cujo acesso deveria ser discussões atuais sobre o currículo: a relação
possibilitado a todos: entre a definição de um currículo comum e o
atendimento às especificidades, às diferenças
a escolarização representa (ou pode de múltiplas naturezas presentes nas escolas.
representar, dependendo do currículo) os Provocam-nos, assim, a pensar na tensão entre
objetivos universalistas de tratar todos igualdade e equidade.
Referências
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Cláudia Valentina Assumpção Galian é graduada em biologia, completou o mestrado e o doutorado em Educação no
Programa de Estudos Pós-graduados em Educação: História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, é docente da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.
Paula Baptista Jorge Louzano é pedagoga formada pela Universidade de São Paulo, mestre em Educação Internacional
Comparada pela Universidade de Stanford, doutora em Política Educacional pela Universidade de Havard. Atualmente realiza
pesquisa de pós-doutorado no Centro de Estudos e Pesquisas em Políticas Públicas em Educação da Faculdade de Educação
da USP.
1116 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
currículo. Também tem havido uma grande de investigações que incidam sobre situações
pressão dos governos para impor sistemas de atuais. Essa é uma área de pesquisa.
responsabilização e controlar mais a formação O outro tipo de pesquisa no qual
de professores, preocupados que estão com precisamos nos concentrar é o que incide sobre
uma excessiva influência das universidades. o processo de recontextualização, ou seja, sobre
Portanto, a pressão sobre a formação dos a maneira como o conhecimento especializado,
professores tem sido enorme. produzido pelos pesquisadores de diferentes
campos, é retirado do contexto onde foi
E qual deveria ser o papel dos teóricos do desenvolvido e inserido noutro contexto, que tem
currículo? como principal objetivo a transmissão e o acesso
a esse conhecimento. E, também, sobre como
Há diferentes tradições de teorias do esse conhecimento é selecionado para compor o
currículo. Sou um sociólogo e, portanto, ofereço currículo. Precisamos saber muito mais sobre esse
uma tradição específica de teoria social para o processo do que sabemos hoje. Acho que essa é
currículo; outras pessoas trazem outras tradições. uma grande prioridade para a pesquisa.
Acho muito importante que as diferentes O que é triste na área do currículo é que,
tradições aprendam umas com as outras e, assim, como a teoria do currículo perdeu contato com
não se tornem exclusivas. Mas acho que o que seu objeto, há pouca pesquisa, não sabemos
eu posso fazer é desenvolver uma espécie de quase nada sobre como o currículo está sendo
esquema teórico geral para analisar o currículo implementado nas escolas. Como os teóricos do
existente, expondo as premissas sobre as quais currículo estão lendo os filósofos e as teorias
os currículos são organizados, para, só então, literárias, eles não tratam dessa questão.
decidir se podemos mudá-los de alguma forma.
Acho que precisamos nos concentrar Sua produção mais recente trata do
em dois tipos de questões para pesquisa em “conhecimento poderoso”. O que quer dizer
currículo, que partem das ideias de Bernstein. com essa expressão?
Uma delas é a que focaliza a tensão entre
a pressão externa, exercida pelos governos, Vou tentar primeiro explicar sua origem.
e a pressão interna, exercida pelos próprios Inicialmente, não concebi essa expressão como
professores. De um lado, sempre haverá a pressão um conceito isolado. Eu estava preocupado
dos governos sobre a definição de qual é o com a forma pela qual o currículo estava sendo
conhecimento que deve estar nos currículos; de abordado, particularmente sob a perspectiva
outro, também sempre haverá, ou deveria haver, da sua identificação com as relações de poder.
certas pressões dos profissionais da educação A teoria do currículo estava estudando o
envolvidos no processo de escolarização currículo com uma abordagem que eu chamei
de crianças e jovens e dos professores de de “conhecimento dos poderosos”, mostrando
áreas disciplinares específicas. Eles deveriam quem tomava as decisões, quem selecionava
ter influência sobre como o currículo é o que entrava ou não no currículo. Num
desenvolvido e, particularmente, sobre como certo sentido, o conceito de “conhecimento
o conhecimento produzido nas universidades, poderoso” foi uma mudança de perspectiva,
no que chamamos de campos de conhecimento, pois dizia: “não olhem apenas para os que
pode ser recontextualizado na escola para ser estão decidindo sobre o currículo, olhem para
ensinado como disciplinas a alunos de idades o próprio conhecimento e se perguntem como
diferentes. Podemos explorar essa tensão entre esse currículo específico pode incorporar um
a pressão externa e a pressão interna em casos conhecimento que, uma vez adquirido pelos
diferentes, por meio de pesquisa histórica ou jovens, será poderoso para eles, em termos
1118 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
elementos para a construção de identidade, bem Se você ler Bernstein, ele deixa muito clara a
como segurança como aprendizes. Vão chegar a distinção entre o currículo do tipo coleção e o
um ponto em que desejarão romper os limites, currículo do tipo integrado1. O problema com o
ultrapassar as fronteiras, mas, se não souberem currículo integrado, diz ele, é que você precisa
identificar os limites, tampouco poderão rompê- ter algum princípio para integrar. Quais são
-los e, se conseguirem, não saberão avaliar se as premissas subjacentes? Não sabemos isso
conseguiram ou não. Então, nunca saberão necessariamente, o que significa que os alunos
se estão aprendendo mais ou não. Portanto, não compreendem o arranjo e acabam perdidos.
os limites também desempenham um papel
importante para os alunos. O senhor poderia dar alguns exemplos do
O que eu diria, como alguém que poder implícito da disciplina no currículo
lecionou ciências no ensino médio, é que os escolar?
limites entre química e física, por exemplo,
têm um papel importante para ajudar os Acho que a primeira coisa a dizer é que
alunos a focalizar certos tipos de problemas. o currículo escolar é constituído a partir dos
Nesse sentido, eles captam uma mensagem campos do conhecimento e das disciplinas. Os
sobre como estamos interpretando o mundo campos do conhecimento são a base sobre a
natural. Você deve lembrar do conceito da qual desenvolvemos novos conhecimentos. As
periodicidade dos elementos, por exemplo. É disciplinas são a base sobre a qual transmitimos
um conceito incrivelmente importante, porque conhecimento para as próximas gerações.
permite entender do que é feito o mundo. Todo Portanto, as disciplinas escolares são sempre
mínimo pedacinho do Universo, não importa contextualizadas a partir dos campos do
a quantos milhões de anos-luz esteja de nós, conhecimento.
todo pedacinho é feito dos mesmos elementos Acho que já falei bastante do papel
da tabela periódica. E esse é um pensamento das disciplinas em termos de identidade
notável. De repente, ao focalizar a tabela dos professores, de identidade dos alunos
periódica, você vê uma unidade no Universo, e de evidências para os avaliadores sobre a
capta uma mensagem sobre como entendemos progressão dos alunos. A força da disciplina é
o mundo natural. que você pode realmente ver como os alunos
progridem de um conceito para outro. Se não
Então o senhor acha que a escola não deve houver a disciplina, você não tem como saber
trabalhar de forma interdisciplinar ou se o aluno aprendeu ou não.
transdisciplinar? Obviamente, as disciplinas das ciências
naturais são mais diretas, os conceitos são
Não, não é isso que estou dizendo. O inequívocos, pois há definições precisas dos
que digo é que devemos construir o currículo conceitos. Quando se trata de ciências sociais e das
de forma a habilitar os alunos a se engajar ciências humanas em geral, as coisas ficam mais
com as disciplinas, de forma a que cheguem complicadas, porque há debates inerentes a elas.
depois a conseguir constatar que os limites O que você precisa tentar fazer é dar aos alunos
entre as disciplinas não são inteiramente fixos uma ideia da natureza desses debates, em vez de
e que é possível avançar para além deles. passar todos os conceitos. Eu não recomendaria
Não vejo problema algum com o currículo ter algumas disciplinas das ciências sociais no
interdisciplinar, desde que, antes, os alunos já
tenham tido acesso às disciplinas que compõem 1- O currículo coleção, para Bernstein, é aquele que mantém fronteiras
bem claras entre as disciplinas, que se mantêm distanciadas; no currículo
o currículo interdisciplinar. Caso contrário, integrado, as fronteiras entre as disciplinas são enfraquecidas, com
eles não saberão onde estão, ficarão confusos. tendência à aproximação entre elas.
1120 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
poderoso, na África do Sul, é o conhecimento Ao longo dos anos, criamos vários currículos
da língua inglesa e você não pode escapar disso. especiais para esse grupo, com nomes do
Então, a primeira coisa que eu queria dizer é tipo “Matemática para alunos em risco de
essa, não importa quão diversa seja a sociedade. evasão”, “Geografia ou Ciências para alunos
A segunda coisa é que o currículo nacional deve em risco de evasão” e tivemos um currículo
consistir num conjunto de diretrizes sensíveis chamado “Matemática para a maioria”. Todos
aos diferentes campos do conhecimento, mas esses currículos partem do princípio de que há
suficientemente abertas para permitir que as conhecimentos especiais para certos tipos de
escolas as interpretem nos diferentes contextos. alunos. O que esse tipo de currículo afirma é:
As escolas vão ter mais margem para interpretar “o contexto em que você vive vem em primeiro
em certas disciplinas – digamos, geografia lugar e o conhecimento vem em segundo lugar.
e história – e não terão tanta margem para a Você vai sentir que é mais fácil, não terá de se
interpretação em física e química, por exemplo. esforçar tanto para progredir para além disso”.
Mas as diretrizes são necessárias. Eu penso que tudo isso nega aos alunos o acesso
Se vocês caminharem em direção à ao seu direito democrático ao conhecimento.
definição de um currículo nacional no Brasil, é Não digo que seja fácil ensinar. É muito mais
importante deixar sob a responsabilidade integral fácil oferecer experiências felizes, organizar
das escolas um terço ou um quarto da semana visitas e pequenas excursões. Mas ensinar esse
letiva. Ou seja, não esperem que o currículo conhecimento é uma responsabilidade dos
nacional seja aplicado a semana inteira, mas professores e, nas universidades, devemos fazer
talvez quatro dias, não sei, é discutível. É aqui que todo o possível para apoiá-los.
entra a gestão do currículo. A equipe da escola
precisa ter um conhecimento suficiente de teoria Em um de seus artigos, o senhor propõe que
do currículo para poder interpretar na sua escola se estabeleça claramente a distinção entre
esse currículo comum, de forma que haja algum currículo e didática. Como isso pode nos
tipo de diálogo entre o nacional e o local. E isso é ajudar na busca por qualificar o debate no
perfeitamente factível! É uma coisa sempre tratada campo do currículo?
como um problema, mas, mesmo que você tenha
nascido e crescido numa comunidade no meio Nas coisas que escrevi recentemente,
da Amazônia, você tem o direito democrático ao afirmo que a distinção entre currículo e
conhecimento poderoso. Essas crianças precisam didática é importante por duas razões. Uma
ter algum conhecimento de coisas como a delas é que, se não houver a distinção, corre-se
matemática, onde quer que estejam. Não existe o risco de colocar no currículo muitas coisas
uma versão “especial” da matemática para cada relacionadas à experiência dos alunos, coisas
comunidade cultural, embora haja quem diga que não deveriam estar lá. A experiência dos
coisas desse tipo, como alguns antropólogos. alunos é essencial para o professor, porque
Pessoalmente, acho isso uma bobagem. é por aí que ele deve começar, com aquilo
que os alunos trazem para a sala de aula;
O senhor poderia dar algum exemplo concreto esse é o principal recurso do professor. Mas
de adaptação desse conhecimento poderoso o trabalho do professor é sempre levá-los
ao nível local em qualquer país, mesmo a desse ponto inicial para algum outro lugar.
Inglaterra, a Nova Zelândia ou a África do Sul? Então, essa distinção é fundamental porque,
no currículo, você só tem coisas que não
A área com que tive mais contato foi estão relacionadas à experiência pessoal
com os alunos entre 15 e 16 anos de idade, dos alunos. Não há, por exemplo, nada
que estão abandonando a escola, entediados. relacionado à maneira como as pessoas usam
1122 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
equivocados. E tanto a experiência deles como com política, tirar do poder o partido que estiver
seus pontos de vista equivocados têm de valer no poder etc.
alguma coisa. Há muitas crianças de quem os No caso específico das escolas, não
professores simplesmente desistiram. Decidiram deveríamos sequer esperar que elas façam tudo.
que essas crianças não conseguem aprender. E Na verdade, o que estou tentando argumentar
elas provavelmente conseguem! Isso tem a ver é que já esperamos que as escolas façam coisas
com as expectativas que eles têm em relação aos demais! Esperamos que sejam agências de
seus alunos. Claro que nem tudo é expectativa, assistência social, esperamos que ajudem as
mas ela é muito importante. Em meu país, e pode pessoas a encontrar emprego, esperamos que
ser que o mesmo aconteça aqui, os professores mudem os hábitos alimentares das crianças, que
estão acuados, eles se sentem ameaçados, as impeçam de se contaminarem com Aids, que
vítimas de imposições, por causa das infindáveis combatam a gravidez adolescente... Tenho uma
mudanças que o governo faz ao longo do tempo, amiga que passa a maior parte de seu tempo de
e acabam ficando numa oposição pétrea. Se pesquisa tentando pensar maneiras de evitar que
você visitar os países escandinavos ou mesmo a meninas engravidem! Porque esse é mesmo um
França ou a Alemanha, os professores não estão problema grave, tanto aqui quanto na Inglaterra,
em oposição, porque sempre foram vistos como e ela faz um trabalho muito sério a respeito.
parte da conversa. Nós temos que caminhar nessa Mas a verdade é que, quando você tem jovens
direção, mas não estamos avançando muito. entediados, sem nada para fazer em suas vidas,
uma das coisas que eles fazem é isso mesmo.
Por onde começar uma reforma curricular? Eu tenho duas filhas que têm muitos outros
interesses na vida – e nenhum deles é engravidar.
Nos últimos dez ou 15 anos, a ideia de Elas estiveram envolvidas com o aprendizado, e
que estou mais convencido é esta: você tem o aprendizado tem importância para elas. Não
de começar pelo conhecimento. Se você não cabe à escola resolver os problemas sociais, de
começar pelo conhecimento, você não está forma alguma. Mas, se a escola for bem-sucedida
começando pelo que é específico da escola, em seu papel específico, alguns desses problemas
é o propósito dela e é o que a sociedade está podem diminuir.
esperando dela. Por um lado, os teóricos do Quando eu era um jovem sociólogo
currículo, particularmente alguns da esquerda radical, costumávamos assumir aquele slogan:
começam pela ideia da reprodução. As escolas “o pessoal é político”. E, então, tudo era político,
estão envolvidas na reprodução das relações tudo que você fazia era político. Mas cheguei à
de classe, é fato. Mas, se você começa por aí, conclusão de que esse slogan não ajuda. É claro
você não sabe para onde ir em seguida! É isso que ele não é totalmente falso: quando se pensa
que penso. No entanto, se você começa pelo nas relações professor-aluno, são relações
conhecimento, você também começa a ver em políticas. Então, você começa a construir uma
que áreas o acesso ao conhecimento não ocorre. espécie de situação de conflito entre o aluno
A outra coisa que penso tem um pouco a destituído de poder e o professor poderoso, e
ver com o que o Antônio Flávio disse. E é claro você começa a estimular os alunos a resistirem,
que eu sei que o conhecimento não é a única e os sindicatos também resistem... No fim, o
coisa a considerar, há também a desigualdade slogan não ajuda a entender o contexto. Mas
social, a infraestrutura das escolas, os recursos é terrivelmente atraente para teóricos radicais
destinados à educação. São questões muito do currículo. São boas intenções, mas, na
importantes, mas são de um tipo diferente. São verdade, não ajudam nada. Essa foi uma das
questões políticas: quais são as prioridades de coisas que aprendi quando trabalhei na África
gasto em um país? Aí você tem de se envolver do Sul, nos anos 1990. Os alunos tiveram um
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YOUNG, Michael F. D.; MULLER, Johan. On the powers of powerful knowledge. Review of Education, London, v. 1, n. 3, p. 229-
250, oct. 2013.
1124 Cláudia Valentina A. Galian; Paula B. Jorge Louzano. Michael Young e o campo do currículo: da ênfase no...
Instruções aos colaboradores
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e de eventuais modificações sugeridas e realizadas. As datas de recebimento e aprovação de cada
colaboração serão informadas no texto publicado. Cabe à Comissão Editorial definir, a cada nú-
mero da revista, os critérios para reunir os artigos já aprovados.
• O texto pode ser apresentado em português, espanhol ou inglês, devendo ser digitado em
processador de texto Word for Windows, fonte Times New Roman, tamanho 12 e espaça-
mento 1,5. Todas as páginas do original devem estar numeradas sequencialmente. O texto
deve contar, ainda, com o mínimo de 35.000 e o máximo de 50.000 caracteres, considerados
os espaços e excluído o resumo.
• O resumo deve conter entre 200 e 250 palavras e explicitar, em caráter informativo
e sem enumeração de tópicos, os seguintes itens: tema geral e problema da pesquisa;
objetivos e/ou hipóteses; metodologia utilizada; principais resultados e conclusões.
Recomenda-se o uso de parágrafo único, voz ativa e na terceira pessoa do singular, frases
concisas e afirmativas. Devem-se evitar: neologismos, citações bibliográficas, símbolos
e contrações que não sejam de uso corrente, bem como fórmulas, equações, diagramas
etc. que não sejam absolutamente necessários. A revista não solicita versão do resumo
em inglês na entrega dos originais, sendo o abstract por ela encomendado a um tradutor
após a aprovação do artigo.
• Os agradecimentos (opcionais) devem ser citados junto ao título, mas em nota de rodapé
e sem quaisquer referências, diretas ou indiretas, à autoria.
• Tabelas, quadros, gráficos e figuras (fotos, desenhos e mapas) devem estar numerados
em algarismos arábicos conforme a sequência em que aparecem, sempre referidos no corpo
do texto e encabeçados por seu respectivo título. Imediatamente abaixo das figuras devem
1125
constar suas respectivas legendas textuais. Os mapas devem conter escalas e legendas gráficas.
• Notas de rodapé de caráter explicativo devem ser evitadas, sendo utilizadas apenas quando
estritamente necessárias para a compreensão do texto e tendo a extensão máxima de três
linhas. As notas devem estar numeradas em algarismos arábicos conforme a sequência em
que aparecem no texto.
Métodos de estatísticas
Quando utilizados, os métodos estatísticos precisam ser descritos com o pormenor necessário
para permitir o acesso aos dados originais e a verificação dos resultados apresentados por um leitor
versado no assunto; ao mesmo tempo, deve-se evitar linguagem excessivamente técnica e apresentá-
los com suficiente clareza de modo a favorecer a compreensão de um leitor não especializado. Tal
solicitação aos autores requer providências como: procurar, sempre que possível, quantificar os
resultados e apresentá-los com os correspondentes indicadores de erro de medição ou de incerteza
(por exemplo, intervalos de confiança); evitar basear-se apenas em testes de inferência estatística,
que não veiculam informação quantitativa relevante; discutir a elegibilidade das unidades de
experimentação; fornecer informação pormenorizada sobre a aleatorização e sobre as observações;
discutir a razoabilidade dos resultados e relatar possíveis limitações do método utilizado; especificar
os programas informáticos utilizados; restringir quadros e figuras à quantidade necessária para
explicitar a fundamentação do artigo e sua solidez; evitar quadros com muitos tópicos e duplicação
de dados; definir termos estatísticos, abreviaturas e símbolos utilizados no artigo.
1126
Processo de avaliação pelos pares
Autoria
Entende-se como autor todo aquele que tenha efetivamente participado da concepção do
estudo, do desenvolvimento da parte experimental, da análise e interpretação dos dados e da
redação final. Recomenda-se não ultrapassar o número total de quatro autores. Caso a quantidade
de autores seja maior do que essa, deve-se informar ao editor responsável o grau de participação
de cada um. Em caso de dúvida sobre a compatibilidade entre o número de autores e os resultados
apresentados, a Comissão Editorial reserva-se o direito de questionar as participações e de recusar
a submissão se assim julgar pertinente.
Ao submeter um artigo para publicação em Educação e Pesquisa, o autor concorda com
os seguintes termos:
1. O autor mantém os direitos sobre o artigo, mas sua publicação na revista implica, au-
tomaticamente, a cessão integral e exclusiva dos direitos autorais para a primeira edição,
sem pagamento.
2. As ideias e opiniões expressas no artigo são de exclusiva responsabilidade do autor, não
refletindo, necessariamente, as opiniões da revista.
3. Após a primeira publicação, o autor tem autorização para assumir contratos adicionais,
independentes da revista, para a divulgação do trabalho por outros meios (ex.: publicar em
repositório institucional ou como capítulo de livro), desde que feita a citação completa da
mesma autoria e da publicação original.
4. O autor de um artigo já publicado tem permissão e é estimulado a distribuir seu trabalho
on-line, sempre com as devidas citações da primeira edição.
1127
Conflitos de interesse e ética de pesquisa
Correspondência:
Faculdade de Educação - USP
Educação e Pesquisa
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Instructions to authors
Educação e Pesquisa publishes only previously unpublished articles in the field of education
and does not consider manuscripts concurrently submitted for publication in books or other
periodicals in Brazil or abroad. Manuscripts must be submitted via the journal’s page in SciELO
publishing system (http://www.scielo.org/php/index.php).
The time frame necessary for submissions to complete the review process – and be selected
or rejected – varies according to the complexity of the reviews and possible changes suggested and
implemented. The dates of receipt and approval of each article are stated in the published text. For each
of the journal’s issues, the Editorial Board establishes the criteria of organization of the articles approved.
Upon submission of an article, authorship and the author’s institutional affiliations must
be filled out in proper spaces in SciELO System and should not be mentioned in the text, which
will be submitted to blind peer review. Any references that enable reviewers to infer indirectly the
authorship of the work are not accepted either. Authorship information is recorded separately, as
metadata, and it is accessed only by the editors.
When preparing the manuscript, the following guidelines should be followed:
• The abstract should contain between 200 and 250 words and describe, in an informative
manner and without listing topics, the following items: general theme and research problem;
objectives and/or hypotheses; methodology; main results and conclusions. It is recommended
that the abstract should be written as a single paragraph, in the active voice, in the third
person of the singular, in concise and affirmative sentences. The following items should be
avoided: neologisms, bibliographical citations, symbols and abbreviations except those in
common use, as well as formulae, equations, diagrams etc., unless absolutely necessary. The
journal does not require an English version of the abstract along with the original text; if an
article is accepted for publication the journal will provide an English version of its abstract.
• Possible acknowledgements should be cited with the title, but in a footnote, and without
any direct or indirect reference to the authorship.
• Tables, charts, graphs, and figures (photos, drawings and maps) should be numbered
with Arabic numerals in the order in which they appear in the text and should include
appropriate headers. Legends should appear right below each figure. Maps should contain
graph scales and legends.
1129
• Images must be grayscale, be scanned electronically in JPG format with 300 dpi or
higher resolution and have dimensions that allow reducing or enlarging them without
impairing their readability. All images must be submitted as separate files and named
according to their references in the text (e.g., Graph 1).
• Explanatory footnotes should be avoided and used only when strictly necessary for
understanding the text. Their maximum length should be three lines. Notes should be
numbered in Arabic numerals according to the order in which they appear in the text.
• References must conform strictly with the technical standard NBR6023 of August 30,
2002 of the Brazilian Association of Technical Standards (ABNT). Only works cited in the
text should be included in the reference list, under the heading References, at the end of
the article and on a separate page.
Statistical methods
When employed, statistical methods must be described in sufficient detail to allow a com-
petent reader access to the original data and verification of the results presented, whilst avoiding
excessively technical language and presenting results with enough clarity so as to facilitate their
understanding by a non-specialized reader. This guidance to authors requires steps such as:
seeking, as much as possible, to quantify the results and present them with corresponding indi-
cators of measurement error or uncertainty (for example, confidence intervals); avoiding relying
solely on statistical inference tests that convey no relevant quantitative information; discussing
the eligibility of the experimentation units; supplying detailed information about randomization
and about the observations; discussing the reasonableness of the results, as well as the possible
limitations of the method used; specifying the software employed; restricting tables and graphics
to the amount necessary to explain the foundations of the article and their robustness; avoiding
tables with too many topics and duplication of data; defining statistical terms, abbreviations and
symbols used in the article.
1130
Peer review process
The articles received for their eventual publication in Educação e Pesquisa will be
previously read by the Editorial Board. The articles that do not meet the editorial requirements
shall be returned, and the rest of them will be forwarded to three evaluators for their analysis. At
the most, one of the evaluators will be a member of the School of Educaton of the Universidade
de São Paulo, to which the journal is subordinated. All evaluators have at least a doctor’s degree
and belong to various scientific institutions. The names of the authors, the evaluators and the
institutions they belong to will remain undisclosed throughout the entire process. The journal
publishes annually the names of its body of evaluators ad hoc.
The aspects that guide the evaluation of the articles are: theoretical and empirical content,
author’s knowledge of scientific literature, current relevance of the topic, contribution to the specific
area of knowedge, originality of the approach, text structure and writing style. The evaluators may
recommend the integral acceptance of the text or its rejection, or they may suggest modifications
for a new evaluation. The Editorial Board may submit such suggestions to the author of the article,
and after the changes have been included, the Board will send the article again to the evaluators
for a final evaluation
Authorship
Author is understood here as anyone who has effectively taken part in the conception of the
study, in the development of the experimental sections, in the analysis and interpretation of data
and in the final writing. It is recommended that the total number of authors should not be greater
than four. If the number of authors is larger than that, the editor in charge must be informed of
the degree of participation of each author. In the case of doubt about the compatibility between
the number of authors and the results presented, the Editorial Board has the right to question the
participation of authors and to refuse submission at its discretion.
By submitting an article for publication in Educação e Pesquisa the author agrees to the
following terms:
1. The author holds the article copyrights, but its publication in the journal automatically
implies the author’s agreement to release its complete copyright to the journal’s first issue,
without financial compensation.
2. The ideas and opinions expressed in the article are the author’s exclusive responsibility
and they do not necessarily reflect the opinions of the journal.
3. After the article’s first publication, the author is authorized to assume additional contracts,
independent from the journal, to publish or present the work through other means (e.g.
in an institutional repository or as a book chapter), as long as a complete quote of the
authorship and of the original publication are provided.
4. The author of an article published in the journal has the right to, and is encouraged to,
distribute the work on-line, always quoting its first publication in the journal.
1131
Conflicts of interest and research ethics
When the research developed or the publication of the article may raise doubts about
potential conflicts of interest, the author should declare in an endnote that no links to funding
agencies or to commercial or political institutions have been omitted. Similarly, the institution to
which the author is associated, or that has collaborated in the conducting of the study, should also
be mentioned to guarantee that there are no conflicts of interest with the results being presented.
It is also necessary to inform that the interviews and experiments involving human beings have
followed the ethical procedures established for scientific research.
The names and email addresses entered in this journal site will be used exclusively for the
stated purposes of this journal and will not be made available for any other purpose or to any
other party.
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1132
Instrucciones a los autores
• El resumen debe contener entre 200 y 250 palabras y explicitar, con carácter informativo
y sin enumeración de tópicos, los siguientes ítems: tema general y problema de la investiga-
ción; objetivos y/o hipótesis; metodología empleada; principales resultados y conclusiones.
Se recomienda el uso de un único párrafo, voz activa y tercera persona del singular, frases
concisas y afirmativas. Se deben evitar: neologismos, citaciones bibliográficas, símbolos
y contracciones que no sean de uso corriente, así como fórmulas, ecuaciones, diagramas,
etc. que no sean absolutamente necesarios. La revista no solicita la versión en inglés en la
entrega de los originales, sino que le encarga el abstract a un traductor una vez aprobado
el artículo.
• Los agradecimientos (opcionales) se deben mencionar junto al título, pero en nota de pie
de página y sin ninguna referencia, directa o indirecta, a la autoría.
• Tablas, cuadros, gráficos y figuras (fotos, dibujos y mapas) deben estar numerados con
números arábigos según la secuencia en que aparezcan, siempre referidos en el cuerpo del
1133
texto y encabezados por su respectivo título. Inmediatamente debajo de las figuras deben
constar sus respectivos subtítulos. Los mapas deben presentar escalas y subtítulos gráficos.
• Las imágenes deben figurar en blanco y negro y deben estar digitalizadas electrónicamente
en formato JPG con resolución a partir de 300 ppp. Deben presentarse en dimensiones
que permitan ampliarlas o reducirlas sin perjudicar su legibilidad. Todas las imágenes
deben enviarse separadamente, en sus archivos originales. El nombre de cada archivo debe
corresponder al nombre de la imagen (por ejemplo: Gráfico 1).
• Las citas en el cuerpo del texto deben obedecer a los siguientes criterios:
a) Citas textuales que tengan hasta tres líneas se deben incorporar al párrafo, transcritas
entre comillas y acompañadas de las siguientes informaciones entre paréntesis: apellido
del autor de la cita, año de publicación y número de página;
b) Citas textuales que tengan más de tres líneas deben estar en párrafo aislado, con margen
izquierdo de 4 cm, letra tamaño 11 y sin comillas;
c) Si no hay cita textual sino cita bibliográfica, el apellido del autor tiene que estar indicado
entre paréntesis, con letras mayúsculas, junto al año de la publicación mencionada.
Métodos y estadísticas
Cuando utilizados, los métodos estadísticos se tienen que describir con el detalle necesario
para permitir el acceso a los datos originales y la comprobación de los resltados presentados por
un lector versado en el asunto; por otro lado, se debe evitar un lenguaje excesivamente técnico y
presentarlo con suficiente claridad de modo a favorecer la comprensión de un lector no especia-
lizado. Tal solicitud a los autores requiere providencias tales como: buscar, siempre que posible,
cuantificar los resultados y presentarlos con los correspondientes indicadores de error de medición
o de incertidumbre (por ejemplo, intervalos de confianza); evitar basarse solamente en tests de
inferencia estadística, que no vehiculan información cuantitativa relevante; discutir la elegibilidad
de las unidades de experimentación; proveer información pormenorizada sobre lo aleatorio y sobre
las observaciones; discutir la razonabilidad de los resultados y dar a conocer posibles limitacio-
nes del método utilizado; especificar los programas informáticos empleados; restringir cuadros y
figuras a la cantidad necesaria para explicitar la fundamentación del artículo y su solidez; evitar
cuadros con demasiados tópicos y duplicación de datos; definir términos estadísticos, abreviaturas
y símbolos utilizados en el artículo.
1134
Proceso de revisión por pares
Los artículos enviados para eventual publicación en la Educação e Pesquisa serán previamente
evaluados por el Comité Editorial. Los que no estén de acuerdo con los criterios editoriales de la
revista se devolverá a sus autores y los demás enviados para análisis de tres evaluadores, como
máximo uno de ellos será miembro de la Facultad de Educación de la Universidad de São Paulo,
a la que la revista está subordinada. Los evaluadores consultados pertenecen a instituciones
científicas diversas y tendrán, como mínimo, el título de doctor. Los nombres de los autores, de
los evaluadores y de las instituciones a que pertenecen permanecen anónimos durante todo el
proceso. La revista publica a cada año los nombres de sus evaluadores ad hoc.
Los aspectos que orientan la evaluación de los originales enviados a los pares para el
análisis son: contenido teórico y empírico, dominio de la literatura científica, actualidad del tema,
contribución para el área de conocimiento específica, originalidad del abordaje, estructura del
texto y calidad de redacción. Los evaluadores podrán recomendar la aceptación del texto en su
íntegra, o su rechazo, o aun sugerir modificaciones para nueva evaluación. El Comité Editorial
podrá someter las sugerencias de reformulación al autor y el artículo, ya reformulado, retornará
a los mismos evaluadores para una evaluación final.
Autoría
Se entiende por autor todo el que haya participado efectivamente de la concepción del estu-
dio, del desarrollo de la parte experimental, del análisis e interpretación de datos y de la redacción
final. Se recomienda no exceder el número total de cuatro autores. En el caso de que la cantidad
de autores exceda ese número, se debe informar al editor responsable el grado de participación
de cada uno. Si hay alguna duda sobre la compatibilidad entre el número de autores y los resul-
tados presentados, el Comité Editorial se reserva el derecho de cuestionar las participaciones y de
rechazar la sumisión del artículo si lo juzga pertinente.
Al someter un artículo para publicación en Educação e Pesquisa el autor está de acuerdo
con los siguientes términos:
1. El autor mantiene los derechos sobre el artículo, pero su publicación en la revista implica,
automáticamente, la cesión total y exclusiva de los derechos de autor para la primera
edición, sin pago.
2. Las ideas y opiniones expresadas en el artículo son de exclusiva responsabilidad del
autor y no reflejan necesariamente las opiniones de la revista.
3. Después de la primera publicación, el autor tiene autorización para asumir contratos
adicionales, independientes de la Revista, para la divulgación del trabajo por otros medios
(ex.: publicar en repositorio institucional o como capítulo de libro), desde que hecha la cita
completa de la misma autoría y de la publicación original.
4. El autor de un artículo ya publicado tiene permiso y es estimulado a distribuir su trabajo
online, siempre con las debidas citas de la primera edición.
1135
Conflictos de interés y ética de investigación
Correspondencia:
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Educação e Pesquisa
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1136
Leia também / See also
Educação e Pesquisa
revista da faculdade de educação da usp
Sumários
Artigos Artigos
MENDOZA, Miguel Ángel Gómez; PIEDRANHITA, María PACKER, Abel Laerte. A eclosão dos periódicos do Brasil e
Victoria Alzate. La enseñanza y su relación con el saber cenários para o seu porvir, p. 301-323.
en los estudiantes universitarios colombianos. p.599-616. REGO, Teresa Cristina. Produtivismo, pesquisa e comunicação
BICALHO, Maria Gabriela Parenti; SOUZA, Maria Celeste científica: entre o veneno e o remédio, p. 325-346.
Reis Fernandes. Relação com o saber de estudantes BENCHIMOL, Jaime L.; CERQUEIRA, Roberta C.; PAPI,
universitários: aprendizagens e processos. p. 617-636. Camilo. Desafios aos editores da área de humanidades
METZNER, Andreia Cristina. Proposta didática para o no periodismo científico e nas redes sociais: reflexões e
curso de licenciatura em educação física: aprendizagem experiências, p. 347-364.
baseada em casos, p. 637-650. ALVES, Mariana Gaio; AZEVEDO, Nair Rios; GONÇALVES,
HOFFMANN, Celina; ZANINI, Roselaine Ruviaro; CORRÊA, Teresa N. R. Satisfação e situação profissional: um estudo
Ângela Cristina; SILUK, Julio Cezar Mairesse; SCHUCH com professores nos primeiros anos de carreira, p. 365-382.
JÚNIOR, Vitor Francisco; Ávila, Lucas Veiga. O RAMOS, Madalena; PARENTE, Cristina; SANTOS, Mónica.
desempenho das universidades brasileiras na perspectiva Os licenciados em Portugal: uma tipificação de perfis de
do Índice Geral de Cursos (IGC), p. 651-666. inserção profissional, p. 383-400.
LIMA, Laísy de; ALVES, Simone Salviano; RAMALHO, Jaqueline ABREU, Daniela Gonçalves de; MOURA, Manoel Oriosvaldo
Vilar; AQUINO, Fabíola de Sousa Braz. Contribuições de. Construção de instrumentos teórico-metodológicos
da perspectiva crítica de base histórico-cultural para a para captar a formação de professores, p. 401-414.
produção científica em psicologia educacional, p. 667-682. FERNANDES, Priscila Correia; MUNFORD, Danusa;
FREITAS, Marcos Cezar de. Desempenho e adaptação da FERREIRA, Marcia Serra. Sentidos de prática pedagógica
criança pobre à escola: o padrão de pesquisa do CRPE- na produção brasileira sobre formação inicial de
SP. p. 683-698. professores de ciências (2000-2010), p. 415-434.
LÓPEZ-VELARDE, Jaime Rogelio Calderón. La investigación PAULA, Benjamin Xavier de; GUIMARÃES, Selva. 10 anos
sobre educación de personas jóvenes y adultas: las tesis da lei federal nº 10.639/2003 e a formação de professores:
de un concurso latinoamericano, p. 699-716. uma leitura de pesquisas científicas, p. 435-448.
CARVALHO, Marília Pinto de; SENKEVICS, Adriano Souza; MONTEIRO, Sara Mourão; SOARES, Magda. Processos
LOGES, Tatiana Avila. O sucesso escolar de meninas cognitivos na leitura inicial: relação entre estratégias de
de camadas populares: qual o papel da socialização reconhecimento de palavras e alfabetização, p. 449-466.
familiar? p. 717-734. MARCHIORI, Patricia Zeni; GREEF, Ana Carolina. Atividade
PIRES, Carlos Manoel Pimenta.As mortificações da carne e de escrita colaborativa: percepção de alunos, princípio
o desejo exposto: controle sobre meninas em instituições cooperativo de Grice e social loafing, p. 467-482.
católicas, p. 735-750. VALLERA, Tomás; PAZ, Ana Luísa. O sábio-aprendiz e o
MELO, Victor Andrade de. Educação do corpo – bailes no Rio efêmero lugar da escrita: para uma ética da inventividade
de Janeiro do século XIX: o olhar de Paranhos. p. 751-766. acadêmica, p. 483-498.
KANAMARU, Antonio Takao. Autonomia, cooperativismo e CORRÊA, Humberto. Antecedentes do baixo nível de
autogestão em Freinet: fundamentos de uma pedagogia escolarização alcançado por uma coorte de jovens mães
solidária internacional, p. 767-782. brasileiras, p. 499-516.
BRANCO, Maria Luísa Frazão Rodrigues. A educação progres- FONSECA, Maria da Conceição Ferreira Reis; SIMÕES, Fernanda
siva na atualidade: o legado de John Dewey. p. 783-798. Maurício. Apropriação de práticas de numeramento na EJA:
DALBOSCO, Claudio Almir. Condição humana e formação valores e discursos em disputa, p. 517-532.
virtuosa da vontade: profundezas do reconhecimento TOMMASI, Livia De. Tubarões e peixinhos: histórias de
em Honneth e Rousseau. p. 799-812. jovens protagonistas, p. 533-548.
PIRES, Eloiza Gurgel. Experiência e linguagem em Walter
Benjamin. p. 813- 826. Entrevista
1139
Educação e Pesquisa Educação e Pesquisa
v. 40, n. 1, jan./mar. 2014 v. 39, n. 4, out./dez. 2013
Artigos Artigos
ROSISTOLATO, Rodrigo; VIANA, Guilherme. Os gestores URZÊDA-FREITAS, Marco Túlio de. Do pensamento abissal
educacionais e a recepção dos sistemas externos de à ecologia de saberes na escola: reflexões sobre uma
avaliação no cotidiano escolar, p. 13-28. experiência de colaboração, p. 843-858.
FREITAS, André Luís Policani; SILVA, Vinicius Barcelos da. SOUZA, Ana Paula Gestoso de; OLIVEIRA, Rosa Maria Moraes
Avaliação e classificação de instituições de ensino médio: Anunciato de. Aprendizagem da docência em grupo
um estudo exploratório, p. 29-47. colaborativo: histórias infantis e matemática, p. 859-874.
OSTI, Andréia; MARTINELLI, Selma de Cássia. Desempenho OLIVEIRA, Adolfo Samuel de; BUENO, Belmira Oliveira.
escolar: análise comparativa em função do sexo e Formação às avessas: problematizando a simetria inver-
percepção dos estudantes, p. 49-59. tida na educação continuada de professores, p. 875-890.
BARREYRO, Gladys Beatriz; ROTHEN, José Carlos. Percurso da GUZMÁN-VALENZUELA, Carolina; BARNETT, Ronald.
avaliação da educação superior nos governos Lula, p. 61-76. O desenvolvimento da autocompreensão em posturas
BROOKE, Nigel; FERNANDES, Neimar da Silva; MIRANDA, pedagógicas: explicitando o implícito entre os novos
Isabela Pagani Heringer de; SOARES, Tufi Machado. docentes. p. 891-906.
Modelagem do crescimento da aprendizagem nos anos RABELO, Amanda Oliveira. Professores discriminados: um
iniciais com dados longitudinais da pesquisa GERES, p. estudo sobre os docentes do sexo masculino nas séries do
77-94. ensino fundamental, p. 907-926.
MONTEIRO, Maria Inês Bacellar; FREITAS, Ana Paula de. CHAGURI; Jonathas de Paula; JUNG , Neiva Maria.
Processos de significação na elaboração de conhecimentos Letramento no ensino fundamental de nove anos
de alunos com necessidades educacionais especiais, p. no Brasil: ações legais e pedagógicas previstas nos
95-107. documentos oficiais, p. 927-942.
SOFIATO, Cássia Geciauskas; REILY, Lucia Helena. ROCHA, Eloísa Acires Candal; BUSS-SIMÃO, Márcia.
Dicionarização da língua brasileira de sinais: estudo Infância e educação: novos estudos e velhos dilemas da
comparativo iconográfico e lexical, p. 109-126. pesquisa educacional, p. 943-954.
SILVEIRA, Kelly Ambrosio; ENUMO, Sônia R. Fiorim; OLIVEIRA, Carolina Bessa Ferreira de. A educação escolar
POZZATTO, Renata N.; PAULA, Kely M. Pereira de. nas prisões: uma análise a partir das representações dos
Indicadores de estresse e coping no contexto da educação presos da penitenciária de Uberlândia (MG), p. 955-968.
inclusiva, p. 127-142. PADOVANI, Andréa Sandoval; RISTUM, Marilena. A
GOMES, Rosana Carvalho; NUNES, Débora R. P. Interações escola como caminho socioeducativo para adolescentes
comunicativas entre uma professora e um aluno com privados de liberdade, p. 969-984.
autismo na escola comum: uma proposta de intervenção, MENDONÇA, Ana Waleska P. C. ; LOPES, Ivone Goulart;
p. 143-161. SOARES, Jefferson da C.; PATROCLO, Luciana B. A criação
BARBOSA, Heloiza H. Conceitos matemáticos iniciais e do Colégio de Pedro II e seu impacto na constituição do
linguagem: um estudo comparativo entre crianças surdas magistério público secundário no Brasil, p. 985-1000.
e ouvintes, p. 163-179. ALMEIDA, Rogério de. Aprendizagem de desaprender:
FONSECA, Eduardo Nuno. Nos interstícios da cidadania: a Machado de Assis e a pedagogia da escolha, p. 1001-1016.
inevitabilidade e urgência da dimensão da virtude cívica GARCÍA, Vicente Javier Llorent; IVANESCU, Carolina. La
na educação, p. 181-196. religión como currículo social: educación, valores e Islam
CADAVID, Luz Elena Gallo. Expresiones de lo sensible: en Europa, p. 1017-1028.
lecturas en clave pedagógica, p. 197-214. Dias, Juliana Maddalena Trifilio. Desenhos e vozes no
ADADE, Mariana; MONTEIRO, Simone. Educação sobre ensino de geografia: a pluralidade das favelas pelos
drogas: uma proposta orientada pela redução de danos, olhares das crianças, p. 1029-1048.
p. 215-230. GORDON, Colin. Governamentalidade e a genealogia da
CARVALHO, Rodrigo Saballa de. O imperativo do afeto na política, p. 1049-1066.
educação infantil: a ordem do discurso de pedagogas em
formação, p. 231-246. Entrevista
Entrevista JARDIM, Fabiana. Breve genalogia dos estudos da governa-
mentalidade: o efeito Foucault e seus desenvolvimentos.
SOUZA, Denise Trento Rebello de; ZIBETTI, Marli Lúcia Uma entrevista com Colin Gordon, p. 1067-1088.
Tonatto. Formação de professores e saberes docentes:
trajetória e preocupações de uma pesquisadora da
docência – uma entrevista com Ruth Mercado, p. 247-267.
Relação de pareceristas ad hoc (2012-2013)
Nome/Instituição: _________________________________________________
Endereço: ______________________________________________________
CNPJ: _________________________________________________________
CEP: __________ Cidade: __________________ Estado: _____ País: ________
E-mail: ________________________________ Tel.: ( ) _________________
Contato: _______________________________ Data: _____/ _____/ _____
Estou enviando:
[ ] comprovante de depósito bancário
[ ] cheque nominal à Faculdade de Educação da USP, do banco____________,
nº do cheque: _____________________ valor: R$ _________________.
Referente a:
[ ] assinatura de Educação e Pesquisa (especificar quantidades de assinaturas: ____)
[ ] números avulsos: __________________________________________.