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Curso de História

da Matemática
Origens e Desenvolvimento do Cálculo
Curso de História
da Matemática
Origens e Desenvolvimento do Cálculo

Unidade 3
NEWTON E LEIBNIZ

MARGARET E. BARON e H. J. M. BOS.


da equipe de preparação do Curso de História
da Matemática da Open Unirersity

Tradução du Professor RUDOLF MAIER.


do Departa111<·1110 de .\faremúrirn da L'nil'ersidade
de Brasília

BEJ &lzfom Universidade de Brasília Decanato de Extensão


Serviço de Ensino à Distância
Este livro ou qualquer parte dele
não pode ser reproduzido
sem autorização escrita do Editor.
19 8 5
Impresso no Brasil
EDITORA UNIVERSIDADE DE BRASfLIA
Campus Universitário, Asa Norte
70.910 BRASÍLIA, Distrito Federal
Copyright © 1974 The Open University
Direitos exclusivos· de edição em língua portuguesa:
Editora Universidade de Brasília
Equipe de preparação do Curso de História da Matemática (AM289) da
Open University:
Diretor Geral - ÜRAHAM FLEGG
Unidades AM289 Cl-C5, Origens e Desenvolvimento do Cálculo
Autores - MARGARET E. BARON e H. J. M. Bos
Edição brasileira
Revisão geral: JOSÉ RAIMUNDO BRAGA COELHO e REGINA COELI A. MARQUES
Editoração: GERALDO HUFF e MANUEL MONTENEGRO DA CRUZ (Editores);
FATIMA REJANE DE MENESES (Controle de Texto)
Serviço de Ensino à Distância :
Coordenador: TARCÍSIO MEIRA CÉSAR

Capa: CLARICE SANTOS


Ilustração: NEWTON e LEIBNIZ

O presente volume faz parte do Curso de História da Matemática:


Origens e Desenvolvimento do Cálculo da Universidade de Brasília.
Uma lista das unidades que compõem o curso pode ser encontrada ao
final desta unidade.
Para informações acerca da disponibilidade do material de leitura
citado neste texto, escreva à Universid~de de Brasília, Decanato de
Extensão, Serviço de Ensino à Distância. Campus Universitário, 70.910
Brasília, Distrito Federal.

FICHA CATALOGRÁFICA
elaborada pela Biblioteca Central da Universidade de Brasília

Baron, Margaret E.
B265h Curso de história da matemática: origens e desenvolvimento do
cálculo, por Margaret E. Baron e H. J. M. Bos. Trad. de José Raimundo
Braga Coelho, Rudolf Maier e M.• José M. M. Mendes. Brasília, Editora
Universidade de Brasília, 1985, cl974.
5v. ilust.
Título original: History of mathematics: origins and development of
the calculus.
51(09) 517(09)
Bos, H J M, , colab.

ISBN 85-230-0172-7 ísérie)/85-230-0175-1 (Unidade 3)


SUMÁRIO

Unidade 3: Newton e Leibniz


Objetivos 3
Nota sobre as questões 4

3.0. Introdução 5
3.1. Isaac Newton ( 1642-1727) 6
3.2. Os estudos matemáticos de Newton 8
3.3. A obra de Newton sobre o cálculo 12
3.4. O método das séries infinitas 14
3.5. De Analysi 19
3.6. As fluxões e os fluentes 25
3.7. As primeiras e as últimas razões 31
3.8. Que espécie de problemas Newton resolveu? 35
3.9. Resumo da contribuição de Newton ao cálculo 39
3.10. Gottfried Wilhelm Leibniz (1646-1716) 40
3.11. A charactl'ristica g<'nera/is 43
3.12. As raízes da descoberta de Leibniz 44
3.13. Aspectos de um processo de descoberta 52
3.14. Os conceitos do cálculo de Leibniz 58
3.15. A publicação do cálculo de Leibniz 61
3.16. Conclusão 68
Referências bibliográficas 73
Agradecimentos 74
Sir Tsaac New/on , uma gra vura de W. T. Fry ,
segundo um original de Kn eller (Manse/1
Col/ec rion) .

Go11fried Wilh elm Leibniz, Florence Gal/ery ,


gravura de B. Hall (Manse/1 Co/lection).
Objetivos

Ü propósito fundamental desta unidade é discutir o desen-


volvimento do cálculo infinitesimal de Isaac Newton e
Gottfried Wilhelm Leibniz no último quartel do século
XVII. Depois de estudar esta unidade, você deverá estar
apto a:
1. Descrever o desenvolvimento do primeiro trabalho de
Newton sobre cálculo infinitesimal, especificando as obras
nas quais ele baseou suas idéias.
2. Definir o significado do "método das séries infinitas",
indicando as etapas através das quais Newton desenvolveu
sua "série binomial".
3. Apresentar os aspectos que caracterizam o trabalho de
Newton sobre quadratura de curvas.
4. Explicar o significado dos termos fluxões e fluentes, dando
exemplos do "método de fluxões" de Newton.
5. Descrever algumas das idéias que estão implícitas nos
conceitos de primeira e última razões.
6. Listar alguns pontos da investigação de Newton sobre a
curvatura.
7. Descrever as três idéias básicas de Leibniz que influencia-
ram a invenção do seu cálculo.
8. Explicar as etapas principais no processo desta invenção,
relacionando-as com as três idéias básicas.
9. Estabelecer como Leibniz conceituou a diferencial e a
integral.
10. Analisar a primeira publicação de Leibniz sobre o cálculo.
esclarecendo a forma na qual foi apresentado e avaliando sua
clareza para os leitores contemporâneos.
11. Identificar as principais diferenças entre o cálculo de
Newton e o de Leibniz.
12. Identificar as diferenças fundamentais entre o cálculo de
Newton e Leibniz e o cálculo moderno.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 3


Nota sobre as questões

Várias questões foram incluídas no texto. Algumas delas


foram especialmente planejadas para que você se certifique
de ter entendido os principais pontos das seções correspon-
dentes; outros exercícios têm o objetivo de orientá-lo na
consulta dos livros indicados e na seleção de material suple-
mentar. Em alguns casos as questões requerem comentários
críticos e, em outros casos, pede-se que você resuma partes
do texto. A menos que haja instruções em contrário, suas
respostas devem limitar-se a duas ou três frases curtas. É pos-
sível que você também precise elaborar um resultado sozinho,
completar uma demonstração usando um método indicado,
ou ainda verificar um resultado usando seu próprio conheci-
mento de matemática contemporânea.
Recomenda-se que você resolva cad~\questão, ou con-
junto de questões antes de continuar a leitura do texto. Uma
resposta avaliativa (R.A.) aparece logo após cada questão,
seinpre que necessário. Naturalmente, é de seu próprio
interesse olhar a resposta somente após haver completado
sua tentativa de responder a respectiva questão.
Antes de continuar esta unidade, você deveria reler o
"Guia para a leitura das unidades", nas páginas 4-5 da
unidade 1.

4 - CURSÓ DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


3.0. INTRODUÇÃO

Ü desenvolvimento do cálculo infinitesimal seguiu um


caminho longo e irregular, que se estendeu das especulações
filosóficas ·dos antigos gregos e das demonstrações clássicas
de Arquimedes até o século XVII, quando mudanças sig-
nificativas ocorreram - tanto na quantidade de trabalho
realizado quanto na natureza dos métodos utilizados. O
grande número de resultados bem-sucedidos que tinham sido
acumulados tornou possível perceber mais claramente o
advento de um modelo padrão, que por sua vez despertou o
interesse para o estabelecimento de regras algorítmicas, gra-
ças às quais foi logo possível formular resultados e evitar
várias passagens intermediárias.
Simultaneamente, a crescente extensão e a variedade de
material que se tornou disponível - independentemente da
sua origem - sugeriu a necessidade do estabelecimento de
uma estrutura unificada e organizada pela qual, em primeiro
lugar, pudessem ser apresentados teoremas gerais para depois
poder obter resultados especiais dessa teoria geral. Por volta
de 1670, Gregory e Barrow tentaram estabelecer esse quadro
organizado, mas os seus esforços não foram reconhecidos,
já que eles preferiam referir-se aos métodos da geometria
euclidiana e à estrutura das demonstrações de Arquimedes,
enquanto a tendência da época ainda favorecia os métodos
algébricos não-rigorosos.
Nesta unidade vamos nos ocupar quase exclusivamente com
a obra de dois matemáticos - Is_aac Newton e Gottfried
Wilhelm Leibniz - aos quais a tradição atribuiu um papel
central na "invenção" do cálculo. Ainda que o cálculo não
tenha começado nem terminado com estes dois homens.
cabe a eles um grande mérito. Newton estendeu e unificou os
vários processos de cálculo e Leibniz ligou-os através de uma
notação eficaz e de um novo cálculo operacional.
O leitor pode imaginar a polêmica que surgiu entre Newton
e Leibniz e seus seguidores sobre a prioridade na invenção
do cálculo. Essa polêmica foi extremamente amarga e as suas
repercussões influenciaram,' de maneira significativa, a evo-
lução da matemática - especialmente na Inglaterra no século
XVIII. Não obstante, estamos lidando principalmente com
a história das idéias matemáticas. não com paixões nacionais;
por isso achamos que atingiremos melhor o nosso objetivo se
deixarmos de lado a polêmica, e cuidarmos direta e separada-
mente do desenvolvimento das obras de Newton, em Cam-
bridge e de Leibniz em Paris. Ainda que não haja dúvida de
que esses dois cientistas tivessem um grande débito com seus
predecessores imediatos, as pesquisas recentes mostram que
a influência mútua era insignificante durante os períodos
decisivos em que faziam as suas próprias invenções originais.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 5


Para o leitor interessado na controvérsia, sugerimos que leia
em primeiro lugar o relato da obra de Newton e ,Leibniz
feito nesta unidade e depois o relato da controvérsia contida
em L. T. More (1934), Isaac Newton: uma biografia (Do ver
reprint, 1962). Veja também a unidade 4.

Q.A. 1
Leia Boyer 1 , p. 302-3, e faça anotações concisas sobre a
polêmica Leibniz-Newton. Dê uma razão pela qual a mate-
mática, na Inglaterra do século XVIII, se desenvolveu lenta-
mente.

R.A. 1

A matemática britânica se alienou dos desenvolvimentos no


resto da Europa devido à polêmica Newton-Leibniz. (Isso
será discutido em maiores detalhes na unidade 4.)

3.1. ISAAC NEWTON (1642-1727)

A maioria dos textos sobre Isaac Newton começam com


o depoimento de que ele nasceu no dia de Natal de 1642,
no mesmo ano em que Galileu faleceu. Política e intelectual-
mente esse era um período tempestuoso. A guerra civil na
Inglaterra começou alguns meses antes; a revolução científica,
cujo começo pode ser considerado coincidente com a publica-
ção da ilustre obra de Copérnico De revolutionibus orbium
coelestium (Revolução das esferas celestes) em 1543, foi
amplamente desenvolvida pelas obras de outros astrônomos,
entre os quais se destacam Kepler e Galileu. Enquanto Co-
pérnico reintroduzia a idéia de que o sol estava no centro do
universo (uma idéia defendida antigamente por Aristarco
de Samos, 300 a.C.), outros cientistas verificavam algumas
das implicações dessa hipótese, do ponto de vista de uma
investigação científica. Durante o século XVII, dois conceitos
importantes e relacionados ganhavam crescente apoio:
a idéia de que os corpos celestes pudessem estar sujeitos
às mesmas leis dos corpos terrestres;
a idéia de que essas leis pudessem ser melhor compre-
endidas mediante a matemática.
Era mais fácil aplicar e desenvolver essas idéias num país
protestante, de sorte que a data e o lugar do nascimento de
Newton foram relevantes para a sua obra.
Os fundamentos do pensamento intelectual de um período, as
idéias que um homem encontra durante seus primeiros anos de

1 BoYER, C. B. História da matemálica. S. Paulo, Ed. Edgard Blücher, 1974.

6 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


estudos, os problemas que ele descobre através da leitura e de
seu contato com outros que trabalham no mesmo campo,
tudo isso influi na direção e no desenvolvimento das suas
próprias pesquisas. É relativamente fácil mostrar como
Newton começou seus estudos. Podemos tentar descrever a
maravilhosa extensão de sua obra matemática - explicar
seu gênio é naturalmente impossível.
Newton viveu uma vida longa e árdua, e mesmo antes de mor-
rer havia adquirido um papel dominante no pensamento inte-
lectual da sua época. Quando uma pessoa se torna lendária
ainda em vida, é muitas vezes dificil distinguir entre fato e
ficção ao reconstruir os detalhes da sua formação. Newton
não é uma exceção. Omitiremos as anedotas da sua adoles-
cência em Woolsthorpe e na escola em Grantham. Se o leitor
julgar que vale a pena, deixaremos para ele a função de indagar
sobre essas histórias, visando o próprio interesse.
Os esforços de Newton no campo da matemática e das ciências
foram herculanos e devemos ter em mente que a sua maior
obra foi sem dúvida a magistral exposição do Sistema do
mundo, dada no Principia,2 se bem que seja necessário nos
restringirmos à consideração da sua contribuição ao desen-
volvimento do cálculo infinitesimal nesta unidade. Além disso,
Newton fez também investigações extremamente significa-
tivas sobre a teoria da luz, propondo uma teoria de cores
segundo a qual a luz é composta de raios de refrangibilidades
e cores diferentes, cujas propriedades inerentes não podem
ser mudadas, nem por refração nem por reflexão (publicada
em Óptica, 1704). Newton não era tampouco desfavorável
a ocupar-se de artes manuais relacionadas com seu trabalho
científico. Em 1669, ele construiu um telescópio de espelho,
um instrumento altamente eficaz e de pequeno tamanho.
Durante muitos anos ele se ocupou na tentativa de trans-
formar metais comuns em ouro. Permanecia longos períodos
de tempo em seu laboratório. Se quisermos compreender as
condições sob as quais o trabalho de Newton sobre o cálculo
foi realizado, devemos recordar que ele não se concentrou
em uma só área de estudos. Por muito tempo, todos os seus
esforços e seu gênio extraordinário estavam voltados para
outros interesses. Newton foi ao Trinity College em Cam-
bridge em 1661 (aparentemente por não ter mostrado aptidão
para a agricultura) e no OJJtono de 1663 parece ter-se dedicado
seriamente ao estudo da matemática.

Q.A. 2 (opcional)
Leia Boyer, 3 itens 16.15, 16.19. 16.20, 16.21 e 19.1. Faça
anotações concisas com respeito ao desenvolvimento do tra-
tamento quantitativo da natureza e com respeito à dedução
das leis universais.

2 Phi/osophiae natura/is principia mathematica (Os princípios matemáticos


da filosofia natural), Londres, 1687.
3 BoYER, C. B. História da matemática. S. Paulo, Ed. Edgard Blücher, 1974.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 7


R.A . 2
Suas anotações deveriam incluir os seguintes itens:
1. Antes do século XVI os cientistas se contentavam com a
discussão do porquê da ocorrência dos fenômenos . Entre-
tanto, a nova linha de pensamento foi procurar fórmulas
matemáticas que descrevessem o comportamento da naturez.a.
Esse pensamento rejeitava a necessidade de deuses , demônios
etc. a fim de poder explicar os fenômenos.
2. Toda a ciência moderna depende desse conhecimento quan-
titativo. O fundador desse pensamento foi Galileu, que re-
jeitou os métodos de Aristóteles e de Arquimedes.
3. Galileu isolou e mediu as propriedades mais fundamentais
que apareciam como variáveis nas fórmulas. Aquelas caracte-
rísticas que ele escolheu - espaço , tempo , peso, etc. - não
foram sempre as mais óbvias ou as mais facilmente mensu-
ráveis.
4. Galileu esperava achar leis fundamentais que formassem
o fundamento para a ciência. Isso ele fez e essas leis funda-
mentais incluíam certas leis do movimento. Mas devemos
salientar que , embora ele estivesse interessado e fosse um
vivo observador dos céus , suas leis de movimento foram
apenas aplicáveis perto da superficie da terra.
5. Foi deixado a Newton deduzir as três leis de Kepler sobre
o movimento planetário , a partir da lei úniversal da gra-
vitação.

3.2. OS ESTUDOS MATEMÁTICOS


DE NEWTON

Embora a Universidade de Cambridge seja hoje um centro


de excelência matemática, nos tempos de Newton cursos de
matemática não eram oferecidos para os alunos de graduação.
A orientação de Newton foi atribuída a Barrow, mas é certo
que ele nunca foi o seu orientador, em qualquer sentido for-
mal. A relação entre Barrow e Newton sempre ficou como um
mistério. Durante a sessão 1664-5, Barrow deu um ciclo de
aulas de natureza filosófica, freqüentadas por Newton. Elas
abordavam problemas sobre espaço, tempo e movimento.
Sabemos também que a cópia dos Elementos de Euclides que
Newton tinha - publicada por Barrow em 1665 - foi
estudada, sem dúvida, com a maior atenção. Além disso,
Barrow teve uma excelente biblioteca e, provavelmente, em-
prestava e recomendava livros. Em todo o caso, entre 1665
e 1669 desenvolveu-se um relacionamento de trabalho entre
Isaac Barrow (Trinity College, Cambridge). os dois , que trocavam idéias e tentavam prestar-se ajuda.

8 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Newton aprendeu a matemática através dos livros, fazendo
anotações e experimentando idéias que o interessavam. Exis-
tiam poucos livros-texto dirigidos aos alunos naqueles dias;
para aprender era necessário estudar com os mestres, como
Newton fez. Imprimimos em seguida o seu próprio relato
(dado muitos anos depois) sobre suas leituras:
4 de julho de 1699. Ao consultar a conta das minhas despesas em
Cambridge nos anos 1663 e 1664, encontro que no ano 1664, um
pouco antes do Natal, quando era senior Sophister, comprei as Mis-
2 celâneas de Schooten e a Geometria de Cartes (tendo já lido esta
Geometria e o Cla·vis de Oughtred meio ano atrás). Emprestei as
obras de Wallis e em conseqüência disso fiz estas anotações do
3 Schooten e do Wallis no inverno entre 1664 e 1665. Nessa época
encontrei o método das séries infinitas. Tendo sido forçado a sair
de Cambridge pela peste no verão de 1665. calculei a área da hipér-
bole em Boothby, Lincolnshire, usando o método das séries infini-
tas com 52 termos. Is. Newton 4 •

Notas
1 Essa conta está perdida.
2 Senior Sophister = aluno do último ano.
3 Os livros listados são os seguintes:
Schooten, F. van. Exercitationes mathematicae, Leyden,
1657. O quinto livro, o Miscellanae, foi o que despertou
um interesse especial em Newton.
Descartes, R. Renati Descartes Geometria, editio secunda,
Amsterdam, 1659.
Oughtred, W. Arithmeticae in numeris et speciebus ins-
titutio, Londres, 1631 (usualmente chamado o Clavis ou a
chave da matemática). Era um tratado elementar sobre a
aritmética e a álgebra.
Wallis, J. Arithmetica infinitorum, Oxford, 1656.
É evidente que Newton esteve em contato com algumas das
melhores obras de matemática daquele período. Nos seus
cadernos (guardados na biblioteca da Universidade de
Cambridge) podemos notar o cuidado e a atenção que ele
dedicou à leitura da Arithmetica de Wallis. à Geometria de
Descartes editada por Schooten em 1659, com a sua ines~
timável coleção de comentários e material suplementar. 5
Sem dúvida é formalmente correto afirmar que Newton foi
um autodidata. Também é verdade que o fundamento das
suas pesquisas significativas da primeira fase foi elaborado
nos meses em que a universidade fechou as suas portas,
mandando os alunos para casa pelo receio de uma infecção
durante os anos da peste.
As seguintes observações, que Newton fez dos livros que leu,

4 WHJTESIDE, D. T., (ed.), The mathematical papers of Isaac Newton. Cam-


bridge University Press, 1967, 1, p. 7-8. Doravante tratado por NMP.
5 Veja unidade 2, p. 47-50.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 9


testemunham pac1encia, perseverança e a caI)&cidade de
vencer o dificil material que tão rapidamente fez emergir seu
gênio criativo e possibilitou-lhe realizar novas sínteses. Ci-
tamos de D.T. Whiteside, o pesquisador e publicista dos
tratados de Newton desde· 1956:
Um P'ate:nático precisa de uma notação adequada. um conhecimen-
to competente sobre a estrutura matemática e a natureza da demons-
tração axiomática. Ele precisa estar bastante versado no núcleo só-
lido da matemática existente e precisa de certo sentido que lhe pos-
sibilite prever as linhas do avanço futuro. De maneira geral, Newton
tomou seu simbolismo aritmético de Oughtred e o algébrico de
Descartes. Mas além disso foi necessário - particularmente no de-
senvolvimento dos seus métodos de cálculo - que impusesse novas
modificações próprias. Formas tradicionais de demonstração ele
aprendeu através de inúmeras leituras do Euclides de Barrow. Essas
e a lógica escolástica elementar. que aprendeu na escola secundária
e nos primeiros anos em Cambridge. deram-lhe um treinamento
adequado em simples procedimentos dedutivos. Entretanto. parece
que ele nunca gostou dos modelos de dedução mais complexos,
particularmente do método de exaustão.º

Whiteside também realizou uma descrição oportuna de como


as próprias investigações de Newton se desenvolveram di-
reta e imediatamente pela leitura de Wallis e Schooten:
Rapidamente ele avançou a fronteira dos conhecimentos cxi_stentes,
cortando um longo caminho na nova paisagem matemática. Logo
começou a preparar uma série de ensaios sobre a geometria analítica
e o cálculo que iam além de qualquer coisa conhecida. O ímpeto inicial
desse forte avanço serviu para dar continuidade ao seu futuro trabalho
matemático. O preço que ele pagou pela profundidade da sua pene-
tração foi, por um lado, o conflito eterno entre o instinto natural
de se orgulhar das suas descobertas, vinculado ao desejo de pu-
blicá-las ao mundo, e por outro, o seu conscien~ioso conhecimento
de quão longe ele sobrepujou seus colegas matemáticos e a sua re-
cusa de enfrentar os mal-entendidos. Esse impulso levou-o a mos-
trar seus ensaios não publicados áqueles cuja habilidade ele respeitava.
O outro impulso impediu a comunicação pública dos trabalhos ao
mundo (salvo algumas exceções notáveis). O resultante impasse con-
duziu à insuportável situação presente, na qual muitos dos seus
ensaios decisivamente importantes ficaram na obscuridade por mais
de dois séculos. desconhecidos e insuspeitos. 7

Imprimimos a seguir - na p. 11 - um fluxograma, esboçado


por Whiteside, que mostra as fontes através da quais Newton
elaborou suas idéias, e como ele conseguiu coordená-las e
desenvolvê-las num tratamento coerente e unificado, ex-
posto no seu primeiro tratado compreensivo sobre fluxões
(1666). O leitor encontrará referências sobre todas as fontes
mencionadas no diagrama na unidade 2 e aconselhamos que
releia as passagens relevantes.

Q.A. 3
Reporte-se à unidade 2. Faça uma lista concisa das idéias
mais importantes que Newton possa ter aproveitado através
da leitura de:
6 NMP, I, p. 11-2.
7 NMP, I, p. 10.

10 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Setembro de 1664: Método Setembro de 1664:
da subnormal para curvas Algoritmo para raízes
algébricas (Descartes). múltiplas (Huddc).

Fins de 1664: Integral


por indivisível (Wallis).

Outono de 1664: Inverno 1664;5:


Conferência de Barrow Método de curvatura para
sobre movimento. curvas algébricas.

Inverno de 1664/5: \
Procedimento de retificação Inverno de 1664;5: \
(Heuraet). Série binomial. \
\ Primavera de 1665: Método
\
\ de subtangentc para curvas
\ algébricas.
\
\
\
Primavera, verão de 1665: \ Primavera de 1665: Algoritmo di fcrencial:
Reconhecimento da natureza inversa notação com dois pontos para tkrivadas
entre a diferenciação e integração. totais.

1
Verão de 1665: Séries Verão de 1665: Tabulação 1 Maio de 1665: Tratamento
expansão da integral (hipérbole-úrea). sistemática de derivadas 1 algoritmo para curvatura
e integrais em colunas 1
de curvas algébricas;
1
paralelas. 1
notação com ponto para
--- ____ J derivadas parciais.

Começo do outono de 1665:


Outono(?) de 1665: conceito lluxional impreciso.
Ensaio para resolver teoricamente
equações lluxionais simples.

Outubro. novembro de 1665: Tratamento lluxional


de tangentes e curvaturas para curvas
-- -- .......... algébricas e "mecãnicas ...

..... .....

--- .....
-- ..... Maio de 1666: T ratamcnto
geométrico rigoroso do
limite de movimento.

Outubro de 1666: Conjunção de·ssas idéias 110 primeiro tratado


amplo sobre lluxões.
(a) Descartes, R. Renati Descartes Geometria, editio secunda,
Amsterdam, 1659.
(b) Wallis, J. Arithmetica infinitorum, Oxford, 1656.
Localize essas idéias no fluxograma.

R.A. 3
(a) Uma discussão completa dos métodos das tangentes.
As regras de Hudde.
O método de Huygens para encontrar um ponto de in-
flexão.
A retificação da parábola semicúbica segundo Heuraet.
A notação de Descartes.
(b) Um problema inacabado, quer dizer, a quadratura do
círculo pela expansão de ~ em série.
Um relato completo do problema de quadratura.
A extensão do sistema de índices para inclusão de am!n,
quando m e n são inteiros (n =I= O e m/n +- 1).
(Outras respostas são possíveis, mas estes itens devem ser
incluídos.)

3.3. A OBRA DE NEWTON SOBRE


O CÁLCULO

Os diversos ensaios de Newton sobre o cálculo ficaram aban-


donados por quase meio século de ineditismo. Isso se deveu
às reservas do próprio Newton quanto a fazer comunica-
ções e às dificuldades práticas de se publicar complexos
trabalhos matemáticos naquela época (o tipógrafo de Barrow,
por exemplo, faliu logo depois de ter publicado as suas aulas
sobre óptica e geometria). Até há pouco tempo, os únicos
ensaios pelos quais o cálculo de Newton tornou-se conhecido
no mundo eram os seguintes:
1. De ana/ysi per aequationes numero terminorum infinitas
(Sobre a análise de equações com número ilimitado de ter-
mos). Esse pequeno tratado foi enviado por Barrow à So-
ciedade Real (1669) em nome de "um amigo meu daqui
que tem uma certa qualidade para tratar este assunto" e
circulou em forma de manuscrito para diversos membros
da sociedade. Informações acerca dele chegaram a James
Gregory na Escócia e a outros matemáticos na França.
Planos de uma breve publicação só foram realizados em
1711.
2. Um tratado sobre fluxões, escrito em 1671, conhecido
como Methodus jluxionum et serierum infinitarum (O método

12 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


de fluxões e series infinitas) não foi publicado durante a
vida de Newton. Traduções em inglês apareceram em 1736
e 1737 - uma versão no latim original, só bem mais tarde.
3. Tractatus de quadratura curvarum (Um tratado sobre a
quadratura de curvas) foi escrito em 1693, porém não pu-
blicado até 1704 (como apêndice à Óptica de Newton).
4. No Principia (1687) existiam muitas passagens relevantes,
porém expostas na forma geométrica.

Q.A. 4
Faça uma lista de rev,sao dos títulos dos três tratados de
Newton que foram publicados. Indique as datas, quando
foram escritos e quando foram publicados.

Em face aos grandes atrasos nos processos de publicações,


não deve surpreender a quantidade de conflitos surgida
quanto à prioridade na invenção do cálculo. Por fim, um dos
resultados dos esforços de Whiteside em Cambridge, nos
últimos dezessete anos, possibilitou esboçar um retrato
mais claro sobre as origens da obra matemática de Newton
na sua primeira fase.
Se você olhar atenciosamente o fluxograma (p. 11) verá
como Newton foi capaz de desenvolver, a partir do método
subnormal de Descartes e das regras de Hudde, um algoritmo
para a diferenciação; como ele conseguiu estendê-lo à cur-
vatura (1665), usando a notação dois pontos e um ponto para
representar o equivalente das derivadas completas e das
parciais, respectivamente. Ao mesmo tempo, e mais ou
menos paralelamente, ele elaborou idéias sobre indivisíveis
e quadraturas que levaram à integração de Wallis (unidade 2.
p. 21-6). A busca incessante desse caminho levou-o à ex-
pansão por séries infinitas. O reconhecimento de que a di-
ferenciação e a integração são processos recíprocos deve-se
ao processo de retificação de Heuraet (ver unidade 2, p. 52-4)
e daí seguiu-se uma listagem sistemática de derivadas e in-
tegrais.
Por volta de 1666, Newton conseguiu uma primeira síntese
desses diversos fragmentos num estudo coerente baseado no
que ele chamava "métddo de fluxões". No quadro desse
método, as noções de movimento (que Newton parece ter
recebido de Barrow) desempenharam um papel central e
significativo. As séries infinitas constituíram a ferramenta
mais poderosa no desenvolvimento dos métodos sistemáticos
de integração. O próprio Newton sempre se dedicou tanto
ao método das séries infinitas quanto às suas fluxões. No
De analysi (1669) concedeu um espaço considerável ao
método das "séries infinitas" (e o seu uso na quadratura
de curvas).

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 13


3.4. O MÉTODO DAS SÉRIES INFINITAS

Por que "o método das séries infinitas" era tão importante
para Newton? De que maneira ele o desenvolveu?
Deixemos Newton relatar a sua própria história: numa
carta de Oldenburg (secretário da Sociedade Real de Lon-
dres) enviada a Leibniz (24 de outubro de 1676), Newton
dá uma exposição das suas pesquisas na área das séries
infinitas:
Ao iniciar meus estudos matemáticos, tendo já conhecimento dos
trabalhos do nosso célebre Wallis sobre a série por intercalação,
cuja área do círculo e da hipérbole ele próprio enuncia, considerei
o fato de que, na série de curvas cujo eixo ou base comum é x e cujas
ordenadas são (1 - x 2 )º 2 , (1 - x 2 ) 1 2 , (1 - x 2 ) 2 2 , (1 - x 2 ) 3 ' 2 ,

2 (1 - x 2 ) 4 2 , (1 - x 2 ) 5 2 etc., se as áreas dos fatores intercalados,


. , I 3 2 _3 1 5 _ 3 _3 3 5 1 7
nominalmente x, x- 3 x , x - 3 .x + 5x , x - 3 .x + 5 x - 7 x ,

etc., pudessem ser interpolados, deveríamos obter as áreas dos fato-


res intermediários das quais o primeiro (1 - x 2 ) é o círculo: de modo
a interpolar essa série, notei que em todas elas o primeiro termo
era x e que os segundos termos o x 3 , 1 x 3 , 2 .x.3 , 3 .x.3 • etc.• esta-
3 3 3 3

+(-i-
vam numa progressão aritmética. Portanto, os primeiros dois ter-
mos das séries a serem intercaladas deveriam ser x - x 3) ,

x - +(~ x 3 ), x - +(+ x 3 ) , etc. Pata intercalar o resto, co-

3 mecei a refletir que os denominadores 1, 3, 5, 7. etc. estavam numa


progressão aritmética de sorte que somente os coeficientes numé-
ricos dos numeradores ainda necessitavam ,de uma investigação.
Mas nas áreas dadas alternadamente, essas eram as figuras das po-
°,
tências do número 11, a saber I 1 11 1 , 112, 11 3 ; 11 4 , quer dizer,
primeiro 1, depois 1, 1 ; em terceiro lugar I, 2, 1 ; em quarto 1, 3, 3, 1 ;
4 em quinto 1, 4, 6, 4, 1, etc. Assím, comecei investigando como as
figuras restantes nessas séries poderiam ser deduzidas das primei-
ras duas figuras dadas e achei que, colocando-se m para a segun-
da figura, o resto seria produzido por multiplicação repetida dos
termos dessa séríe,

m-0 m-1 m-2 m-3 m-4


5 - 1 - x - 2 - x - 3 - x ·-4- x -5-. etc.

Por exemplo, seja m = 4 então 4 x _!_ (m - 1) igual a 6 será o ter-


2
. 1 . 1
cetro termo; 6 x - (m - 2) igual a 4, o quarto; 4 x - (m - 3),
3 4
igual a 1, o quinto e I x _!_ (m - 4), igual a O, o sexto termo, no
' 5
qual a série termina. Em conseqüência disso, apliquei esta regra
para interpor séries entre séries. Já que para o círculo o segundo
termo era - 1 ( - 1 x
3 2
3) , coloquei. m = -21 e surgiram
. os termos

_!_ - 1
2
6 - X OU
2 2

14 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


1
- -3
1 1 2 5
OU + 16 , l6 X ---ou
4 128'

e assim por diante ad infinitum. Daí cheguei a compreender que a


área do segmento circular que queria era

_l_ x 3 _l_ x 5 _l_ x' _2._ x 9


2 8 16 128
x - - - - - - - - - - - - - , etc.
3 5 7 9
E pelo mesmo raciocínio, as áreas das curvas restantes que deve-
riam ser inseridas podem ser obtidas igualmente: assim também a
área da hipérbole e das outras curvas alternadas na série
7 (1 + x2)0·.2, (l + x2)1 2, (l + x2)2 2, (I + x2)3 2, etc.
A mesma teoria serve para intercalar outras séries por intervalos de
dois ou mais termos, quando estiverem ausentes ao mesmo tempo.
Essa foi a minha primeira nota sobre esses estudos. Teria certa-
mente escapado da minha memória se não tivesse lançado um olhar
retrospectivo a algumas anotações.
Mas quando examinei isso, comecei a perceber imediatamente que
os termos
(I _ x2)0 2, (l _ x2)2 2, (1 _ x2)• 2, (l _ x2)ó"2, etc.,

quer dizer,
1, 1 - x 2, 1 - 2x 2 + x 4, 1 - 3x 2 + 3x 4 - x 6 , etc.
poderiam ser interpolados do mesmo modo como as áreas geradas
por eles: e que nada foi requerido para essa finalidade a não ser
a omissão dos denominadores 1, 3, 5, 7, etc., que estão nos termos
que expressam as áreas; isto significa que os coeficientes dos ter-
mos da quantidade a ser intercalada, a saber, (l - x2)1 2 ,ou(J -x 2) 312 ,
8 ou em geral (1 - x 2 r,
surgem pela multiplicação repetida dos ter-
mos dessa série
m-1 m-2 m-3
m x--x --X etc.,
2 3 4
tal que (por exemplo)
1
(l - x2)1 ·2 é o valor de· 1 - -x-' - _l_ x 4 - _l_ x 6 etc.,
2 8 16

(1 - x 2 ) 312 o de 1 - 2_ x 2 + 2_ x 4 + _l_ x 6 etc ..


2 8 16
e

(1 - x2)1 3 o de 1 - 31 :e' - 91 x4 - 5 x ó,
81 etc.

Assim, a redução geral de radicais a séries infinitas, através da regra


que expus no começo da minha carta anterior, chegou ao meu co-
nhecimento antes que ,eu tivesse estado familiarizado com a extra-
ção de raízes. Mas uma vez conhecido isso, o outro não podia ficar
oculto de mim por muito tempo. Pois, para testar esses processos,
multipliquei

- _l_ x2 - 1 x4 - 1 6
2 8 16 x etc.,

por si mesmo; tornou-se 1 - x 2 , porque os termos que ficavam


desapareciam pela continuação da série até o infinito. Da mesma ma-
l 2 1 4 5 6
9 neira, multiplicando-se 1 - - x - - x - - x , etc., duas vezes
3 9 81
por si mesmo, resultou 1 - x 2 também. Com isso não _obtive apenas
a demonstração segura dessas conclusões, fui conduzido também a

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 15


verificar se, reciprocamente, as séries assim formadas, que repre-
sentavam as raízes da quantidade 1 - x 2 , não poderiam ser extraí-
das dela aritmetic:imente. E deu certo. Era essa a forma de traba-
lhar com raízes quadradas.

O- x2

- _!__,.
4

1
_ _ ,4 + _1 X6 + _1 XB
4 8 64

0 - -1x 6 - -1x 8
·s 64
1O Depois de ter esclarecido isso, abandonei totalmente a interpolação
de séries e usava somente essas operações, pois davam fundamen-
tações mais naturais. Tampouco existia um segredo qualquer acer-
ca da redução pela divisão que, em todo caso, é um assunto mais
fácil. 8
Notas
1. 1663/64; veja o fluxograma, p. 11 (veja também Wallis -
unidade 2, p. 24).
Newton "intercala" uma expressão entre duas expressões
dadas.
Integral
2. Curva Quadratura

y= (1-xz)o 2
equivalente

X r (l -x2)0 zdx

r
o

y=(l-x2)1 2 ? (l-x2)1 zdx

y=(l-x2)22 X - x 3/3 r
o

(l -x2)2 ·2 dx

Y= (l -x2)3 2 ? r (l-x2)3 zdx

Y= (1 -x2)4 z X - 2x 3/3 + x 5/5 f (1 -xz)4 zdx

y=(l -xz)s 2 ? r (1-x2)s2dx

y= (l -x2)6 2 x- 3x 3 /3 + 3x 5 /5-x 7 /7 r
o

o
(l -x2)6/2 dx

8 TURNBULL. H. W., (ed.}, The correspondence of.f:saac Newron. Cambridge


X University Prcss, 1959, II, p. 130-2.

16 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Estamos procurando a quadratura das curvas y = (l -x 2 ) 1 '2,
y= (1 -x 2 ) 3 ' 2 , ••• , (a primeira delas fornece a quadratura
do círculo). Newton "interpola" expressões dadas colocando
uma outra expressão entre elas.
3. Se listarmos os coeficientes dos termos consecutivos na
série acima, teremos:
0/3
? ? ?
-1/3
? ? ?
-2/3 + 1/5
? ? ?
-3/3 +3/5 -1/7
O primeiro coeficiente em cada uma das séries é l ; como os
segundos termos estão numa progressão aritmética, isto é,

O (+), +), +), +), . . ,


1( 2( 3( os segundos termos

. . .mterca!d
na sene 3 , 23(1)
_ 21(1)
a a serao 3 , 25(1)
3 , ....
4. Este é o triângulo aritmético (conhecido como triângulo
de Pascal, porém familiar na Europa Ocidental muito antes
de Pascal). É usado para encontrar os coeficientes binomiais
(para algum expoente positivo inteiro):
(11 )º = 1
1 (11) 1 =11
2 1 (11) 2 = 121
3 3 1 (11) 3 = 1331
4 6 4 (11) 4 = "14641
Para as potências além de 4, a regra exige um reajuste.

5. Esta é uma regra para gerar os coeficientes binomiais na


m-ésima linha do triângulo, isto é,

(
m) = m(m - l)(m - 2) • ... • (m - r + 1)
r 1·2•3• ... •r

6. Para a série

J x

0
(1 - x 2 ) 1 / 2 dx temos m =2,
I m(m-1)
1•2

m(m-1) (m-2)
l •2 •3 16
e assim por diante.
Esses são os numeradores (os denominadores são sucessiva-
mente 1, 3, 5, 7, ... ), de sorte que, para a quadratura do
._ _____ X - - - - - ~
círculo, temos:

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 17


1 3 1 5 1 7

I
-X -X -X
2 1/1. d 2 8 16
X
o (1-x) X= 1-
X
-3- - -5- - -7-- ...

= 1 é dada
f
7. A quadratura da hipérbole retangular y 2 - x2

por (1 + x 2 ) 1 2 dx, para a qual a série é facilmente obtida

pelo mesmo método.


8. Pela primeira vez Newton considera a própria série bino-
mial ao invés das séries obtidas pela integração de uma série
binomial termo por termo. Isso permite-lhe enunciar a regra
para gerar uma série binomial (m é uma fração racional,
positiva, negativa ou zero). (Exposto numa carta anterior
em 13 de junho de 1676.)
9. Não satisfeito, Newton começa a verificar o resultado por
·:u~ti~l:?ão, quer dizer (1 - x2 x8 (1 - x2 x8
2
-
4
··)
2
-
4
.. -)

Nessa fase, ele percebeu que podia obter a série requerida


pelo uso do método aritmético de extração de raízes.
10. Newton obteve a série para (1 + x)- 1 através de um longo
processo de divisão e utilizou-a na quadratura da hipérbole
1
retangular y = - - .
I+x

Q.A. 5
Faça um resumo das etapas pelas quais Newton foi levado
a descobrir a série binomial geral. Quais as operações que
ele preferiu posteriormente? Você pode sugerir por que e
para que ele queria a série?

R.A. 5
Newton dispõe-se a encontrar a quadratura do círculo pela
consideração de uma série de curvas da forma y = (1 - x 2 r.
Cada segundo membro da série tem uma quadratura conhe-
cida e assim Newton espera encontrar a quadratura das
outras por "interpolação", o que requer a consideração dos
coeficientes de termos consecutivos na série das áreas. Isso
conduz ao triângulo de Pascal e a uma regra para gerar os
coeficientes binomiais. Daí Newton passa para a série bi-
nomial.
Posteriormente ele preferiu um longo processo de divisão e a
extração de raízes. Isso era, como ele sentiu, um método mais
natural. Ele queria a série para a quadratura de certas curvas e
particularmente para a quadratura do círculo.

18 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


A história da descoberta da série binomial geral de Newton
(l 664-5) e a posterior preferência pela extração de raízes
e pelos longos processos de divisão é realmente estranha.
Parece que ele sentia tanta desconfiança dos métodos de in-
terpolação de Wallis que se sentiu pouco disposto a usar a
série mais geral, com exceção dos casos nos quais uma
verificação por outros meios foi possível. Em ambas as
obras, no De analysi (l 669) e no tratado de 1671 sobre as
fluxões ele somente usou a extração de raízes e o longo pro-
cesso de divisão. Como ele dizia, esses métodos dão funda-
mentações mais na_turais. Mas, por que então ele dedicou
considerável atenção ao teorema na sua carta a Leibniz em
1676?
Em todo caso, o método das séries infinitas foi uma fer-
ramenta indispensável para Newton na quadratura das
curvas e na retificação dos arcos; mediante a expansão em
séries, ele foi capaz de resolver a integral de expressões que
envolviam raízes, integrando-as termo a termo.
Implícito em todas as operações com séries, surge o contro-
vertido problema de convergência. Newton estava bem ciente
das dificuldades envolvidas e assumiu a noção "convergente"
de James Gregory (veja unidade 2, p. 43). Na expansão em
séries, Newton menciona constantemente a necessidade de
assegurar que x deva ser "suficientemente pequeno" e no
De analysi ele sugere um teste que depende da convergência
da série geométrica 1/2 + 1/2 2 + 1/2 3 + .. . . Não parece,
porém, que ele tenha feito muito progresso no problema
geral e as suas opiniões sobre a convergência nunca foram
firmemente estabelecidas.

3.5. DE ANAL YSI

A que se assemelha a obra de Newton? Em princ1p10 ele D


estava interessado em métodos algébricos. Através dos seus
estudos profundos da Geometria de Descartes ele apanhou
a idéia essencial de aplicar a álgebra nos estudos de geome-
tria. Imprimimos aqui a introdução a De analysi: 9

SOBRE A ANÁLISE DE EQUAÇÕES


COM NÚMERO ILIMITADO DE TERMOS

O método geral que inventei há algum tempo atrás para medir a


quantidade de curvas por uma série infinita de termos será apresen-
tado a seguir com explicações concisas sem demonstrações profundas. A
A base AB de uma curva AD é perpendicular á ordenada BD. Chame
AB de x e BD de y. Sejam ainda a, b, e, ... quantidades dadas e sejam
m, n inteiros. Então
A quadratura de curvas simples

9 NMP, II, p. 207-9.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 19


2 REGRA 1. Se axmin = y, então [na/(m + n)]x<m+nltn será igual à área ABD.
Este assunto será evidenciado por um exemplo.
Exemplo 1. Se x 2 ( = 1 x x 2 1 ) = y, quer dizer, se a= n = 1 e m = 2,
então _!_ x 3 = ABD.
3

Exemplo 2. Se 4p(=4 • x 1 2 )= y, então ~x 3 2 (= ~P)=ABD.


A 3 3

Exemplo 3. Se Jx 5 ( = x
5 3) = _r, então¾ x 8 3 ( = !.;jx8) = ABD.

3 Exemplo 4. Se (l/x 2 ) ( = x- 2 ) = y. quer dizer, se a= n = 1 em= - 2,


então ((1/ - l]x- 111 =) - x- 1 ( = - [1/x]) = '1.BD, que é uma área,
infinitamente estendida em direção a 'J.: o cálculo ajusta os sinais
negativos porque ele está inclinado sob o lado adicional da linha BD.

Exemplo 5. Se 2/3 P( ! = x- 32 ) = y, então (2/ - l)x- 1 2 =

= - (2/ .jx) = BD'J..


Exemplo 6. Se (1/x) (= x- 1 ) = y, então (1/0)xº" = (1/0)xº =
= (1/0) x 1 = oo, já que a área da hipérbole está de ambos os lados
4 da linha BD.
A quadratura de curvas compostas de curvas simples.
REGRA 2. Caso o valor de y seja composto de vários termos daquela
espécie, a área também será composta das áreas que resultam de
cada um dos termos separadamente.
Sejam estes os primeiros exemplos:

Se x 2 + x 312 = y então _!_ x 3 + 2 x 5 2 = ABD. Pois se sempre


' 3 · 5 '

BF = x 1 e FD = x 3 2, então pela regra precedente,_!_ x 3 = a área A FB


3
descrita pela linha BF e 2 x5 2 = AFD descrito por DF; conseqücn-
5
temente_!_ x 3 + 2 x 511 = o ABD todo. Portanto, se x 2 - x 3 2 = v.
3 5 .
1 2 1

então - x 3 - - x 5 : 2 = ABD: e se 3x - 2x 2 + x 3 - 5x 4 = y. en-


3 5

B
tão 2_ x 2 - 2 x3 + _!_ x 4 - x 5 = ABD.
2 3 4

I
I
I
I
I
/
'\\ ✓
/

\
\
\
\ A B
\
\
Segundos exemplos. Se x- 2 + x- 3 2 = y, então - x- 1 - 2x- 1 2 = CJ.BD.
'' '
F
Ou se
x- 2 - x- 3 · 2 = y, então - x- 1 + 2x- 1 : 2 = 'J.BD.
Se você mudar os seus sinais, terá um valor positivo (x- 1 + 2x- 1 • 2
ou x- 1 - 2x- 1 : 2 ) para a área '1.BD, contanto que ela esteja situada
inteiramente do lado superior da base ABCJ.; mas se uma parte qual-
A B quer dela estiver situada inferiormente (o que acontece quando a

20 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


curva cruza a sua base entre B e ex como você vê aqui em b) , terá
o valor da diferença quando aquela parte for eliminada da parte
superior. Se, de fato, desejar a sua soma, ache cada área separa-
damente e adicione-as. O leitor vai perceber o mesmo nos exemplos
restantes desta regra. 1
1
Terceiros exemplos. Se x 2 + x - 2 = y , então - x3 - x- 1 = a área A
3
descrita.
5 Mas aqui o leitor deveria notar que as partes da referida área assim
encontradas ficam de lados opostos da linha BD: precisamente , co-
1
locando-se BF=x 2 e FD = x - 2 , então - x 3 =a área ABFdescrita
3
por BF e - x - 1 • = Dfo. descrita por DF. E isto sempre acontecerá
quando os índices (m + n)/n das razões da base x no valor da área
procurada estiverem afetados por sinais diferentes. Nos casos dessa
espécie, qualquer porção média da área BDbfJ (e nenhuma outra po-
6 derá ter sido dada , já que a área é infinita de ambos os lados) será
encontrada desta maneira. Subtraia a área que se refere à menor
base A/1 da área que se refere à maior base AB e terá a área {J BDb
acima da diferença daquelas bases. Po rtanto , po r exem pl o , se A B = 2 e
A/1 = 1, então fJBDb = .!.2. Pois, a área que se refere a AB (a saber
6

Extraído da obra De analysi, de Newton , edi-


tada por William fones , 1711 (Turner Col/ec·
tion , University of Keele).

~ . . ~

n
m .:·
IJI

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 21


, 8 1 13 ,
ABF - Dfo.) sera - - - ou - ; e a area que se refere a Afi (a saber
3 2 6
A</>P - b</>~) será _!_ _ 1 ou - 2; assim, a sua diferença (a saber
3 3
13 2 17
ABF- Dfo - A</>P + b</>~ = fiBDb) será - + - ou - . Da mesma
6 3 6
maneira, se Afi = l e AB = x, então fiBDb = 2 + _!_ x 3 - x- 1 . E por-
3 3
tanto, se 2x 3 - 3x 5 --=-3 x-1
4 + x- 3 5 = y e Afi = 1,

7 então

A B PBDb = -1X 4 -
1 6 2 -3
-x + -X + -5X 2 ;<. -
49
-.
2 2 9 2 18
Finalmente, devemos notar que, se a quantidade x- 1 estiver envol-
vida no próprio valor de y, aquele termo (que gera um espaço hiper-
bólico) deve ser considerado separadamente do resto. Se x 2 + x- 3 +
+x-•=y: seja BF=x- 1 , FD=x 2 +x- 3 e A/J=I; temos
8 b<f>FD = _!_ + _!_ x 3 - _!_ x- 2 , visto que é gerado pelos termos
6 3 2
x 2 + x- 3 : portanto, se a área restante P</>FB, que é hiperbólica, for
<P ' ,, dada através de algum procedimento de cálculo, o total PBDb será
dado .

A Q B
-------
...... ..., F

Notas
1. "Quantidade de curvas" significa uma investigação geral
das propriedades de linhas curvadas ou "corcovadas".

2. Se r = axP. então
. f x

o
p+I
ydx = ~ e se p = m/n, a fórmula
p + 1
de Newton é aplicável, As dificuldades que surgem na apli-
cação da fórmula para p negativo são tratadas pela troca
das fronteiras de integração.

3. Se y = l;x 2 , então f' X


y dx = [ - 1/x]; = [1/x]:; como a

ordenada torna-se infinita na origem e zero quando x-:+ oo


trata-se da área à direita da ordenada e o sinal negativo
significa a inversão das fronteiras.
4. A regra fracassa para p = - 1, (p + 1 = O). A enunciação
(1/0) x I = oo claramente procede de Wallis (veja unidade 2,
p. 23).
5. Newton está explicando com uma exatidão metódica o
que pode ser feito nos casos quando y = f 1 (x) + f 2 (x),f1 (x)-+ oo
com x-+ 0,f2 (x)-+ oo com x-+ XJ, Em tais casos, só podemos
obter uma parte intermediária, f1
Py dx.

6. f2

1
(x 2 +x- 2 )dx = [x 3/3-x- 1/l]i = (8/3-1/2)
= 13/6 + 2/3
- (1 /3 - 1) = 17/6.
22 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA
2 -3 5x2!5 ]X
+-x +--
9 2 1

8. fq dx/x, se for necessário, deve ser obtida por algum


a
outro procedimento (veja a nota 4, p. 22).

Q.A. 6
Faça comentários concisos sobre a notação usada por Newton.
Newton demonstra alguma coisa?

R.A. 6
Você deve ter notado alguns dos seguintes pontos gerais:
(1) A notação x, y foi naturalmente introduzida por Des-
cartes; Newton está utilizando-a consistentemente para a
abcissa e a ordenada.
(II) Os eixos foram traçados de modo usual e em posição
retangular. Newton fez isso quase regularmente no caso das
curvas algébricas, se bem que ocasionalmente tenha usado
eixos oblíquos. Também usava de vez em quando coorde-
nadas polares e bipolares. Isso ele fez principalmente para
estabelecer a generalidade dos seus métodos, mas também
porque essas coordenadas são mais convenientes para certas
curvas.
(Ili) O uso da notação exponencial para potências negativas
e fracionárias (a qual Newton explica cuidadosamente) pro-
veio de Wallis (veja unidade 2, p. 25).
(IV) Não se usa um símbolo especial para denotar o processo
da integração. O integrando é uma ordenada, a integral é
uma área.
(V) Na "explicação concisa'' sobredita, Newton estava in-
teressado em enunciar regras. Isso foi a sua prática usual - as
demonstrações seguiram mais tarde. Para poder realizar essas
demonstrações ele teve que introduzir uma notação especial.

Imprimimos em seguida a demonstração que Newton fornece


para as regras expostas nas páginas anteriores:
Retrospectivamente, dois pontos antes de todos os outros preci-
sam de uma demonstração.
Preparação para demonstrar a primeira regra.
1 A quadratura de curvas simples segundo a regra 1. Seja então
A Dó uma curva qualquer que tem a base AB = x, a ordenada per-
pendicular BD= y e a área ABD = z, como antes. Simultaneamente

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 23


seja B{J = o, BK = ,. e seja o retângulo B{JHK(ov) igual ao espaço
B{JiJD. Portanto, Afi = x + o e A/J{J = z + 01•. Com essas premissas
2 procuro y 1 a partir de um relacionamento arbitrário entre x e z da
seguinte maneira.
Tome 2 x3 2 =z ou ~ x 3 = z2. Então, se x + o (A{J) for substituí-
3 9
do cm lugar de x e z + 01·(Aiifi) em lugar de z surgirá (pela natureza
da curva)

~ (x + 3 3x 2 o + 3xo 2 + o 3 ) = z 2 + 2zol' + o 2 ,· 2 .
9

Eliminando-se as quantidades (-¼ x 3 e z 2 ) e dividindo-se o resto


4
por o sobra - (3x 2 + 3xo + o 2 ) = 2ZI' + ov 2 • Se supusermos que B/J
9
é infinitamente pequeno, quer dizer, que o seja zero, 1· e y serão iguais
e os termos multiplicados por o desaparecerão e conseqüentemen-
te restará ~
9
x 3x 2 = 2zv ou 23 x 2 ( =
.
zy) = 23 x 3 2 r, quer dizer,

x 1 ' 2 ( = x 2 /x 3 2) = y. Reciprocamente, portanto, se x 1 ' = _r, tere-


mos 2 x3 2 = z.
3
Demonstração.
Ou em geral, se [n/(m + n))ax<m+ni • = z, quer dizer, ao colocar
na/[(m + n)] = e em+ n = p, se ex•"= z ou c"x• = z", então, se x + o
for substituído em lugar de x e z + 01· (ou equivalentemente, z + o_r)
em lugar de z, surgirá
c"(x• + poxP- 1 ... ) = z" + noyz•- 1 •• .,
omitindo-se os outros termos, os quais foram desprezados, para
sermos exatos. Agora, eliminando-se os termos iguais c"x• e z" e
dividindo-se o resto por o, vai sobrar c"pxP- 1 = nyz.- 1 ( = nyz"/z) =
= nyc"x•jcx• ". Quer dizer, ao dividir por c"x•, obtemos px- 1 =
= ny/cx•" ou pcx"-"'" = ny; em outras palavras, pela restauração
3 de na/(m + n) para e e m + n para p, quer dizer, m para p - n e na
4 para pc. teremos axm • = _\'. Reciprocamente, portanto. se axm • = y.
então [n/(m + n)]ax<m+nl" = z. Como queríam_os demonstrar.
O descobrimento de curvas que podem ser quadradas.
De passagem podemos mencionar aqui um método pelo qual po-
dem ser encontradas tantas curvas de áreas conhecidas quantas qui-
sermos: a saber, assumindo-se uma equação arbitrária para o re-
lacionamento da área z, podemos procurar conseqüentemente a
ordenada y.
Assim, se supusermos J[a 2 + x 2 ) = z. podemos determinar
xiJ[a 2 + x 2 ] = y. E semelhantemente em outros casos. 10

Notas
l. A notação aqui encontrada é do mesmo tipo da usada por
Schooten (veja p. 8-10 e unidade 2, p. 36-8). O "o" pequeno
que Newton usa foi um substituto para o "E" de Fermat
(escrito como "e" por Schooten). Newton usou-o desde 1664.
A escolha de "o" para uma quantidade pequena, que sub-
seqüentemente deve ser colocada igual a zero, parece uma
boa idéia à primeira vista. Jean de Beaugrand usou-o por
volta de 1638 ao dar um relato sobre o método de tangentes
de Fermat; James Gregory também fez uso dessa notação
no mesmo sentido no Geometriae pars Universalis (1668).
IO NMP, 11, p. 243-5.

24 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


2. O leitor pode considerar a introdução de v (onde v deve
ser colocado por último igual a y) como algo parecido a
um disfarce. Newton supôs a existência de v, onde
j(x) < v < f(x + o), tal que o retângulo ov = a área cur-
vilínea B/3bD; como isso sempre é possível para uma curva
simplesmente convexa, a equação que ele formou era exata.

3. Em notação moderna, se f'


o
y dx = z, onde z = j(x), en-

tão y = dz/dx = f (x): particularmente, se


z = [n/(m + n)]ax<m+n)/n, então y = axm'n.

4. Embora, nas pesquisas anteriores, Newton tenha traçado


o esboço de uma demonstração geométrica do teorema fun-
damental do cálculo (nas linhas das demonstrações que
foram subseqüentemente publicadas por Barrow e Gregory)
parece que preferiu posteriormente referir-se à reversibilidade
das operações, de sorte que a diferenciação e a integração
são essencialmente consideradas mutuamente inversas (isto é,
se z = f(x) = f y dx, então ~
dx
= f(x) = y e reciprocamente,

se y = f(x) = ~ então z =
dx
f y dx = f(x)).

Q.A. 7
Use o método de Newton para mostrar que se
z = J(a 2 + x 2) então y = x/J(a 2 + x 2 ).
R.A. 7
z=J(a 2 +x 2 ), z 2 =a 2 +x 2 , (z+ov) 2 =a 2 +(x+o) 2
z 2 +2ovz+o 2 v 2 =a 2 +x 2 + 2ox+o 2
2ovz + o 2 v 2 = 2ox + o 2
ZV =X= 2'J'. (\' = _\')
y=x ==x J(a 2 +x 2 ).

3.6. AS FLUXÕES É OS FLUENTES


Já antes de escrever o De analysi. Newton experimentou
outros tipos de notações e outras formas de demonstrações
(veja o fluxograma, p. 11 ). No pequeno tratado que escreveu
em 1666, ele desenvolveu um tratamento bastante compre-
ensivo de uma variedade de problemas de cálculo baseado na
idéia da geração de curvas por movimentos. Essas idéias
constituíram a fundamentação daquilo que ele chamava o
seu "método das fluxões" e que foram desenvolvidas mais
completamente no tratado de 1671, o qual citaremos. A pas-

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 25


F

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ill \ 1\1111;,tt \it11111.1w11 .!Nllk.11,1 ttd.tn~ul,1 .Jt \,ill.t HH 1,;
!:,traido da ohrn Tractatus de
quadratura cu rvarum, de Ne,r-
..ihkill:t ;;ll , utl, . , • Jll: l , 111'\,r urfo,; ,,1,tw.H I t'H ~
ton , editada por William Jones , }.!lo ;ttltém ft'>í.:tl,p •t h.h 1 1mni,1 p..ttd•H i 1
171 I (Tumer Col/lectio11 , U11i-
1·ersi1y of Keele).

sagem que escolhemos manifesta bem o "sabor' ' das jluxões


e dos fluentes de Newton e sugere vínculos claros com idéias
medievais sobre o movimento , desenvolvidas por Galileu ,
T o rricelli e Barrow. Por isso talvez não seja tão fácil acom-
panhar seu raciocínio.

Falta agora , como ilu stração dessa arte analí tica , ex pli citarmos al -
gun s problemas típi cos e tão es peci ais corno a natureza de curvas
que os represe ntam . Mas so bretudo cu observar ia que as di liculda-
des dessa espécie podem se r todas reduzidas a so mente do is proble-
mas que propore i co m vista ao espaço percorrido por qualquer mo-
vimento local acelerado o u retardado:
1 Dado o comprimento do espaço perco rrido continuamente (quer

26 - CURSO DÉ HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


dizer. em cada [instante do] tempo), ache a velocidade do movi-
mento num instante qualquer.
2 2 Dada continuamente a velocidade do movimento. ache o compri-
mento do espaço percorrido num instante q ualqucr.
Assim, na equação x 2 = y se y significa o comprimento do espaço
percorrido num instante qualquer que é mcdiJo e representado por
um segundo espaço x, que cresce com velocidade uniforme, então,
3 2.xx designará a descrição da velocidade pela qual o espaço no mes-
mo momento de tempo está sendo percorrido. E. portanto. consi-
derarei em seguida as quantidades como se fossem geradas por um
aumento contínuo do espaço no qual um objeto se move descre-
vendo sua trajetória.
Não podemos ter, porém, uma estimativa do tempo. exceto no sen-
tido de ser exposto e medido por um movimento local uniforme.
Além disso. somente quantidades da mesma espécie e. do mesmo
modo. as suas taxas de crescimento e decrescimento podem ser com-
paradas entre si. É por essas razões que no que se segue não consi-
derarei o tempo como tal. Portanto. de uma das quantidades apre-
4 sentadas que são da mesma espécie. suporei que elas aumentem num
fluxo uniforme: a ela, e a todas as outras. podemos nos referir como
se fossem o tempo. Assim, a palavra .. tempo" não deve ser transfe-
rida erradamente a ela por simples analogia. Desta forma, se você
encontrar em seguida a palavra "tempo" (como a tenho tratado no
meu texto a fim de obter mais clareza e distinção) esse nome não
deve ser entendido como tempo formalmente considerado, mas
como sendo aquela outra quantidade cujo aumento ou fluxo uniforme
interpreta e mede o tempo.
Mas. para distinguir as quantidades que considero perceptíveis. po-
rém indefinidamente crescentes, das outras que em todo caso de-
vem ser consideradas como conhecidas e determinadas e que são de-
signadas pelas letras iniciais a. b, e. etc., chamarei as primeiras de
fluentes e designá-las-ei pelas letras tinais 1·, x, y e z. As velocida-
5 des com as quais elas fluem e que aumentam pelo mo\'imento gera-
dor (que eu chamaria mais adequadamente de fluxões ou simples-
mente de velocidade) designarei pelas letras i· •.'i:, .i· e z: a saber para
a velocidade da quantidade ,, colocarei i· e para as velocidades das
outras quantidades colocarei .i:. _i· e :: . respectivamente.

Notas
Embora possa parecer útil expressar alguns dos enunciados
de Newton na notação do cálculo, devemos considerar que,
ao fazê-lo, correr-se-á o risco de distorcer o trabalho dele
ao dar-lhe um grau de clareza e rigor que ele não possui.
1. Ses= f(f), onde t é o témpo e .1· é a distância, ache a veloci-
dade, isto é, "= ds = j'(f).
dt

2. Se 1· = [ds/dt] = </J(t), ache s = f </>(t)dt.

São esses os dois problemas inversos a partir dos quais Newton


desenvolveu o seu cálculo.
3. Se y = x 2 , dy/dt = 2xdx/dt. Como x aumenta uniforme-
mente, dx/dt = .x é uma constante.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 27


4. Como o tempo só pode ser medido considerando-se um
movimento uniforme, podemos escrever dx/dt = x = 1, x = t.
A variável independente x, que aumenta uniformemente, pode
ser usada como uma "medida" de tempo.
5. Se v, x, y, z são os fluentes, isto é, são variáveis que au-
mentam ou diminuem com o tempo, então i·, x, y, i repre-
sentam as fluxões ou as velocidades (dv/dt, dx/dt, dy/dt,
dz/dt) dessas quantidades.
Chegamos a um momento adequado para falarmos algo sobre
a notação newtoniana "com ponto", particularmente porque
o leitor vai finalmente querer compará-Ia com a notação
desenvolvida por Leibniz. Newton utilizava a notação "com
ponto", de uma ou de outra maneira, desde 1665 (veja o
fluxograma, p. 11 ). Ele não se decidiu pela forma "padrão"
da notação "com ponto" até meados de 1691 e, na versão
original do tratado de 1671, usou símbolos literais /, m, n, r
para apresentar as fluxões de v, x, y, z. Em 1710, William
:Jones fez uma transcrição do tratado de 1671 sobre as fluxões,
onde inseriu a notação "com ponto", a qual foi copiada em
todas as edições publicadas. Na tradução nós estamos usan-
do-a, mas Whiteside preferiu ficar com a notação "padrão"
"com ponto" já que ela é de grande ajuda para a compreensão.
Na Inglaterra, em todo caso, essa notação tem-se tornado
comum e útil para denotar a diferenciação em relação a
t (t é o tempo). Ao comparar a notação newtoniana "com
ponto" com a notação (dx, dy) desenvolvida por Leibniz,
devemos ter em mente que Newton decidiu aderir ao uso de
uma forma "padrão" de notação certamente em pleno
conhecimento da existência da notação de Leibniz na Europa.

Q.A. 8
Se y = x 3 , qual é a fluxão de x? Qual é a fluxão de y? Qual
é o relacionamento entre a fluxão de x e a fluxão de y? Como
se chamam x e y? Que variável foi escolhida por Newton
para se mover uniformemente?

R.A. 8
x; y; y = 3x 2.x; x
e y são chamados os fluentes, x possui um
movimento uniforme tal que x = k (k, usualmente, toma-se
igual a I).

Consideraremos agora como Newton achou uma relação


entre as fluxões das quantid_ades quando uma relação entre
os seus fluentes era conhecida.
DEMONSTRAÇÃO

Os momentos das quantidades fluentes (quer dizer, as suas partes


infinitamente pequenas, pela adição das quais elas aumentam durante
um período qualquer de tempo infinitamente pequeno) estão rela-
cionados com as suas velocidades de fluxo. Por essa razão, se o mo-
mento de cada uma e em particular se x for expresso pelo produto

28 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


da sua velocidade x por uma quantidade o que é infinitamente pe-
quena (quer dizer, por xo) então os momentos das outras 1·, y, z, ... ,
serão expressos por vo, yo, zo, ... o que mostra que i•o, xo, j,·o e io
estão relacionados como v, x, y, e i.
Agora, como os momentos (digamos xo e _ilo) das quantidades íluen-
tes (digamos x e y) são os incrementos infinitamente pequenos, pelos
quais aquelas quantidades aumentam durante cada intervalo de tem-
2 po infinitamente pequeno, segue que aquelas quantidades x e y, de-
pois de qualquer intervalo infinitamente pequeno, tornar-se-ão x + xo
e y + yo. Conseqüentemente, uma equação que expressar uma rela-
ção uniforme entre as quantidades íluentes em todos os instantes ex-
pressará aquela relação uniforme entre x + .xo e y + .i•o da mesma
maneira como entre x e y.
3 Portanto, x + .\'o e y + _i'<1 podem ser substituídos pelas últimas quan-
tidades x e y na equação considerada. Dada a equação x 3 - ax 2 +
+ axy - y 3 = O, substitua x + xo em lugar de x e y + yo em lugar
de y: surgirá
4 + 3xox 2 + 3x 2o 2 x + .x 3 o 3 ) - (ax 2 + 2axox + a.x 2 o 2 ) +
(x 3
+ (axy + axoy + ayox + axyo 2 ) -
- (y 3 + 3yoy 2 + 3y 2 o 2 y + y3 o 3 ) = O.
Agora, pela hipótese x 3 - ax 2 + axy - y 3 = O quando esses termos
forem cancelados e o resto dividido por o, restará
3xx 2 + 3.i 2 ox + x 3 o 2 - 2axx - ax 2 o + a.xy + a.i·x + a.(vo -
- 3yy 2 - 3y2oy - _il3o 2 = O.
Supondo-se o infinitamente pequeno, a fim de expressar os momen-
5 tos das quantidades, os termos que contêm o como fator podem
ser desprezados. Portanto, restará 3xx 2 - 2a:i:x + axy + a.i·x - 3_yy 2 = O,
como no exemplo acima.
Deve-se observar que os termos não multiplicados por o sempre de-
saparecerão, como também os que são multiplicados por o em mais
de uma dimensão. Da mesma forma, os termos restantes depois da
divisão por o sempre aceitarão a forma que devem ter de acordo
com esta regra. É isso que queria mostrar' 1 •

Notas
l. O minúsculo "o" que conhecemos como incremento geral
do De analysi tornou-se agora '"um período de tempo infi-
nitamente pequeno", ou seja, ôr.
2. Todas as variáveis são quantidades fluentes e os seus mo-
mentos são correspondentemente expressos pelos produtos
das suas respectivas velocidades e o tempo "o". Podemos
pensar em xo, yo como sendo (dx/dr)ôr, (dy/dt)ôr, ...
3. Se j(x, y) = O expressa uma relação entre x e y, o que é
válido em todos os instantes, então
f(x, y) = f(x + xo, y + yo)
= j(x + (dx/dr)br, y + (dy/dt)ôt)
4. x 3 - ax 2 + axy - y 3 = O
= (x+xo) 3 - a(x+xo) 2 + a(x + xo) (y + yo)-
- (y + yo)3.

11 NMP, Ili, p. 79-81.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 29


Os passos que se seguiram são sucessivamente: (i) expansão,
(ii) remova os termos comuns de ambos os lados, (iii) divida
por o, (iv) despreze os termos que contêm o, "já que o é infi-
nitamente pequeno".
5. A relação 3.xx 2 -2axx+axy+ayx-3jy 2 =0 pode seres-
.
cnta e
na ,arma . ..
y/x =
3x 2 - 2ax + ay = -dy = - f x /'Jy,
1' onde
2
3y - ax dx
fx e fy são as derivadas parciais de j(x, y) com respeito a
x e y respectivamente. (f, é a derivada de j(x, y) com y cons-
tante. Logo para j(x, y) = x 3 - ax 2 + axy - y3 temos
fx = 3x 2 - 2ax + ay e
fy = ax - 3y 2
então - fx/fy é a expressão dada.)

Q.A. 9
Verifique o resultado acima por qualquer método, usando
qualquer notação que você conheça.

Não é fácil expressar as operações newtonianas em termos


de limites, mas devemos tentar compreender o que está
acontecendo realmente. Se o ponto P 1 (x, y) está na curva
Pz
e se x = dx/dt, y = dy/dt e se o é um intervalo de tempo
"infinitamente pequeno", a razão y/x representa o gradiente
da tangente em P 1 • Neste caso o ponto P 2 (x+xo.y+yo)
não está na curva, mas na tangente, de tal maneira que
f(x, y) -f j(x + xo, y + yo) (a não ser que o= O). Newton
enuncia claramente que uma equação que expressa uma
relação entre quantidades fluentes. "sem variação em todos
os instantes", expressa essa relação tanto entre x + xo e
y+ yo quanto entre x e y. Devemos supor, portanto, que
ambos, P 1 e P 2 , estejam na currn. Mas .x e y também são
constantes ao longo do inter\'alo de tempo o que é infinita-
mente pequeno. Embora isso não seja estritamente verdadeiro
a não ser que o= O. Qualquer que seja o seu modo de con-
siderar o assunto. note que há erros envolvidos que Newton
o desprezou. Você pode achá-los insignificantes, talvez por
pensar em termos de limites, ou por achar que os infinité-
simos desempenham um papel satisfatório, num certo sentido.
A introdução do conceito dos fluentes e das jluxões teve um
efeito intuitiYo. mas não eliminou o uso de infinitésimos -
nem a identificação do pequeno incremento do arco com o
pequeno incremento da tangente.
Ne\\ton declarou posteriormente que "erros, por pequenos
que sejam. não devem ser negligenciados na matemática" e
tentou estabelecer uma fundamentação para o seu cálculo
fluxional sob uma base diferente.

30 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


3. 7. AS PRIMEIRAS E AS ÚLTIMAS
RAZÕES

No livro I do Principia ( 1687) e no A quadratura das curvas


(1693) Newton baseia o seu método no conceito das primeiras
e das últimas razões. No Lema L Livro L ele começa:

As quanridades e as razões das quanridades que conrergirem conrimw-


menre para a ig1w!dade, num i!lferralo de lempo J1ni10. e que unles
do final do intermlo de 1empo se aproximarem mais enlre si do ,1111.>
entre qualquer umu diferençu. /ornar-se-ão iguais.
Se você não aceitar isso, suponha que sejam ultimamente diferentes.
Seja D a sua última diferença. Elas não poderão aproximar-se mais
perto do que aquela diferença dada D; isso é contra a suposição.

O que Newton parece estar dizendo aqui é que se tivermos


duas quantidades, digamos Q1 e Q2 que variam no tempo
e se a diferença entre Q1 e Q2 diminuir continuamente de
tal maneira que, dentro de um intervalo de tempo finito,
se aproximem cada vez mais uma da outra, então teremos
finalmente Q1 = Q2 , ou lim (Q 1 ) = lim (Q 2 ).
t-+ OC· t___. 00

Numa seqüência de outros lemas, Newton desenvolve algu-


mas das "últimas razões" ligadas a linhas curvas que possi-
bilitam-lhe trocar a corda, a tangente e o arco, já que as "úl-
timas razões entre o arco, a corda e a tangente é a igualdade".
No De quadratura Newton explica o método das fluxões em
termos das primeiras e das últimas razões:

A QUADRATURA DAS CURVAS,


Não considerarei aqui as quantidades matemáticas como sendo com-
postas de partes exrremamenre pequenus, mas como sendo 1:eradas
por um movimenro conrínuo. Linhas são descritas, e ao descrevê-las
são geradas. Não por um alinhamento de partes. mas por um mo-
vimento contínuo de pontos. As superfícies são geradas pelo mo-
vimento de linhas, os sólidos pelo movimento de superfícies, os
ângulos pela rotação dos seus lados, o tempo por um fluxo contí-
nuo, etc. Essa gênese está baseada na natureza e pode ser vista dia
a dia no movimento dos corpos.
2 E desta maneira os antigos nos ensinaram a gerar retângulos jus-
tapondo-se linhas retas móveis a9 longo de retas imóveis numa po-
sição ou situação normal a elas.
H
Percebe-se que as quantidades que aumentam em tempos iguais e
que são geradas por esse aumento serão maiores ou menores con-
forme a sua velocidade. na qual aumentam e são geradas. seja maior
ou menor; esforcei-me para encontrar um método que determinas-
se as quantidades das velocidades. dos movimentos ou incrementos.
que as geraram. Chamando de j711xões às ,elocidades dos movimentos
3 ou dos aumentos e de j711en1es às quantidades geradas. esclareci aos
poucos (nos anos 1665 e 16661 o método das fluxões. que aproveito
aqui na Quadrarura das curras.
As fluxões são semelhantes aos aumentos dos fluentes. os quais são
gerados em intervalos de tempos iguais. mas são infinitamente pe- V A B lb
1
1
quenos; e para ser mais exato, diria que estão na primeira razão
dos aumentos nascentes, mas podem ser representados por quaisquer G D d

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 31


p I Pf-11 TR ll
F

P R l N C. I P l ~\

Fronlispício do Principia mathema ti ca, de Sir Ex1raído da obra Tractatus de quadratura


Isaac New/On , 1687 (Turner Colleclion , Uni- curvarum , de Sir Isaac Newlon , 1704 (Turner
versily of Keele). Collection, University of Keele) .

linhas proporcionais a elas. Se as áreas ABC, A BDG forem descri-


4 tas pelas ordenadas BC e BD , que se movem uniformem ente ao lon-
go da base AB, então as fluxões dessas áreas estarão entre si como as
ordenadas BC e BD que as descrevem e poderão ser representadas
por aquelas ordenadas; isto é, tais ordenadas estão na mesma pro-
porção que os aumentos nascentes das áreas.
Deixe a ordenada BC deslocar-se da sua posição BC para uma nova
posição bc ; complete o paralelogram o BCEb , trace a linha reta VTH
tocando a curva em C e cortando os prolongamentos de bc e BA
em T e V ; agora os aumentos gera dos da abcissa AB, da ordenada
5 BC e da curva ACc serão Bb, Ec e Cc; e os lados do triângulo CET
estão na primeira razão desses aumen tos nascentes . -Portanto, as flu-
xões de AB, BC e AC são como os lados CE, ET e CT do triângulo
C ET e poderão ser representadas por aqueles lados , ou, equivalen-
temente , pelo la dos do triâ ngulo VBC que é semelhante a CET.
O mesmo acontece se tomarmos as flux ões na ú/1ima razão das partes
ín fimas. Trace a linha reta Cc e prolongue-a até K. Com a ordenada
bc em sua posição o riginal BC faça os pontos C e e se aproxima-
rem. linh a reta C K va i co inci dir com a tangente CH e o triângulo
6 ínfimo C Ec tornar-se-á semelha nte ao triâ ngulo CET. Seus lados
ínfimos CE , Ec e Cc es tarão na mesma proporção que os lados CE,
ET e CT do outro triângulo CE T. Portanto, as fluxões das linhas
A B , BC e AC terão a mesma razão. Se os pontos C e e estiverem
numa distância pequena qualquer , CK estará a uma distância pe-
quena da tangente CH. Quando a linha reta CK coincidir com a
tangente CH , e quando as últimas razões das linhas CE, Ec e Cd

32 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


forem encontradas, os pontos C e e deverão se aproximar e coin-
cidir exatamente. Erros, por menores que sejam, não devem ser ne-
gligenciados na matemática. 12

Notas
1. Os indivisíveis são rejeitados: o movimento é central.
2. Newton refere-se à geração de um retângulo pelo movi- ----------►--------- e
mento de um segmento de linha (digamos BC) ao longo de
uma linha (digamos AB). Não fica claro a quais dos "antigos"
ele se refere.
3. As quantidades são geradas por movimento; as velocidades
dos movimentos são chamadas de fluxões e as quantidades
geradas de fluentes. Em notação moderna, se x, y, z são os A B
fluentes, dx/dt, dy/dt, dz/dt (representados por y, z) são x,
as fluxões.
4. Essa passagem poderá ser melhor compreendida se con-
siderarmos o exemplo que Newton expõe: as áreas ABC,
ABDG (veja a figura na p. 31) são geradas pelo movimento
das ordenadas BC, BD. Como a linha BCD move-se unifor-
memente sobre a base AB, temos que
fluxão de ABC BC
-------=
fluxão de ABDG BD
Um aumento é um incremento pequeno, nascente significa
"chegar a existir". Newton diz que as razões das fluxões são
muito parecidas aos aumentos. Se você der uma olhada na
figura, perceberá que a razão dos aumentos atuais é dada por
área
- --BC- cb, porem,
, se cons1.derarmos as pnme1ras
· · - d os
razoes
área BbdD
aumentos, quer dizer, as razões quando chegam à existência,
então

-fluxão
--- de ABC . .
- - - = a primeira _ d
razao os aumentos nas-
tluxão de ABDG centes
isto é
fluxão de ABC BC
fluxão de ABGD BD

Surge então uma dificulcÍade: quando os aumentos forem


iguais a zero eles não terão uma razão e dentro de um intervalo
de tempo finito, ainda que seja pequeno. a razão dos au-
mentos não poderá ser igual à razão das tluxões. O que acon-
tece então se o tempo é infinitamente pequeno? (É esse o

12 WHITESIDE, D. T. The marhemarica/ 1rorks of !saa,· .\'e111011. Johnson


Reprint, New York, 1964, I, p. 141. A tradução inglesa do tratado origi-
nal cm latim foi, aparentemente, autorizada por '.\ewton e: apareceu
pela primeira vez no Lexicon rechnicum. Or. un wli1·ersal dicrionar_1· of
arrs and sciences. impresso por John Harris em 1710.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 33


assunto central da fundamentação do cálculo fluxional que
vai ser discutido na unidade 4.)
5. Os aumentos ou incrementos de AB, BC, AC (digamos
x, y, s) são dados por Bb, Ec, Cc (digamos bx, by, bs) res-
pectivamente.
(Os aumentos atuais estão nas razões eh :by :bs.) Se CT é a
reta tangente, as primeiras razões dos aumentos nascentes são
dadas por CE: TE :CT, ou x :y :s. Portanto, em notação
moderna, as derivadas dx/dt, dy/dt, ds/dt estão entre si nas
prime.iras razões dos aumentos nascentes, quer dizer x: y: s.
6. -A ênfase está na idéia do movimento de um ponto na curva
de c para C. Obtém-se isso diminuindo os aumentos Cc,
cE, CE, tal que c-. C; o triângulo CcE-. triângulo CTE
(a corda Cc-. a tangente C n.
A necessidade de falar claramente sobre aumentos nascentes
e aumentos ínfimos tem uma relação à praxe atual que esta-
belece uma diferença finita (ou incremento) e considera
depois o limite quando essa diferença se reduz (ou aproxima-se
de zero).
Freqüentemente é mais fácil compreender o que Newton
está fazendo do que está dizendo. Vejamos então o primeiro
exemplo que ele dá para uma aplicação dessas idéias a uma
curva algébrica:

Suponhamos que a quantidade x flua uniformemente. Encontre a fluxão


de x". No mesmo intervalo de tempo em que a quantidade x torna-se
x + o pelo fluxo, a quantidade x" torna-se x + pln. quer dizer, pelo
método das séries infinitas x" + nox" - 1 + nn - n oox" - 2 + , ... e
2
os aumentos o e nox•- 1 + nn - n oox" - 2 + .... estão relacionados
2
entre si como I e nx" - 1 + + .... Agora faça aque-
nn - n oox" - 1
2
les aumentos desaparecerem e a sua última razão será de I a nx•- 1 ;
portanto, a fluxão da quantidade x está relacionada à fluxão da
quantidade x" como I a nx•- 1 .
Através de argumentos semelhantes e pelo método das primeiras e
das últimas razões podemos obter, qualquer que seja o caso, as flu-
xões de linhas. sejam elas retilineas ou curvadas como também as
fluxões de áreas. de ângulos e de outras quantidades. Assim, formar
um cálculo de quantidades finitas e investigar, conseqüentemente,
as primeiras e as últimas razões das quantidades finitas,que nascem
ou desaparecem está de acordo com a geometria dos antigos; estava
querendo mostrar que no método das fluxões não há necessidade
2 de introduzir figuras infinitamente pequenas à geometria. Esta aná-
lise pode ser executada em figuras quaisquer, sejam elas finitas ou
infinitamente pequenas, desde que possam ser imaginadas semelhan-
tes a figuras ínfimas; também em figuras que podem ser considera-
das infinitamente pequenas, mas você deve proceder com cuidado.
F.ncontrar os fluentes a partir das fluxões é o problema mais dificil
e o primeiro passo da sua solução é equivalente à Quadratura de curvas;
concernente a isso escrevi anteriormente o seguinte Tratado. 13

13 lbid., p. 142-3.

34 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Notas
l. Se y=x",

!~ Cx +o;" - x") = n}n- 1 = ; ·


2. As fluxões de áreas, ângulos ou de outras quantidades
estão relacionadas como as primeiras ra=ões de quanridades
finitas nascentes, por exemplo. :i: _i· •...• ou como as últimas
razões de quantidades ínfimas (ou desvanecentes). isto é. os
limites dos aumentos (ou incrementos) quando tendem a
zero.

Q.A. 10
Teste se você compreendeu os terrnosjluxão,jluente,primeira
razão, aumento, aumento nascente, aumento ínfimo, primeira
razão de aumentos nascentes, última razão de aumentos ínfimos.
Qual é a dificuldade principal na doutrina newtoniana das
primeiras e das últimas razões?

R.A. 10
O problema real, como o leitor vai ver depois de ter tratado
cuidadosamente esta. passagem (e as observações), é se os
aumentos (ou incrementos) realmente desaparecem, tornam-se
finalmente iguais a zero, ou se eles somente tornam-se cada
vez menores? Newton diz que desaparecem e ao fazerem isso
têm uma última razão. Mas como é possível que duas quanti-
dades (ambas iguais a zero) tenham uma razão? O leitor verá
que, depois da morte de Newton, a fundamentação dada ao
"método das fluxões" pelas primeiras e as últimas razões
tem sido fortemente criticada.

3.8. QUE ESPÉCIE DE PROBLEMAS


NEWTON RESOLVEU?

Nos cursos das escolas e dos colégios é desnecessário, hoje


em dia, salientar toda a variedade de técnicas e substituições
necessárias à diferenciação e integração de qualquer tipo de
função. Tampouco é usual investigar detalhadamente as
propriedades de linhas curvas. Há três séculos atrás. quando
somente uma pequena parte do padrão total tinha surgido
e quando o modelo geométrico ainda estava na posição
central, Newton reconheceu a necessidade de um tratamento
sistemático para todos os problemas referentes às proprie-
dades das linhas curvas ou "corcovadas ...
Depois de ter reconhecido a natureza inversa da diferenciação
e da integração e estando convencido de que a diferenciação

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 35


era a mais fácil das duas operações, Newton, desde o início
dos seus estudos, estabeleceu tabelas de resultados que lhe
possibilitassem a integração e a diferenciação diretas sem
atacar cada um dos problemas novamente. Está claro que
seu objetivo era estabelecer regras compreensivas através
das quais todas as propriedades identificáveis das curvas que
conhecia pudessem ser deduzidas com um mínimo de esforço.
Em todos os seus tratados sobre o cálculo, ele adotou um
esquema de resolver problemas, redigindo listas de problemas
em termos gerais, deduzindo métodos, fórmulas, regras e
algoritmos, ilustrando depois, com consideráveis pormenores,
exatamente como esses poderiam ser aplicados a uma ampla
classe de curvas.
No tratado de 1671 sobre fluxões encontram-se formulados
os dois problemas fundamentais que correspondem à dife-
renciação e à integração nos seguintes termos:
1. Dada a relação mútua entre as quantidades fluentes, de-
termine as relações entre as fluxões.
2. Quando for exibida uma equação que envolva as fluxões
das quantidades, determine a relação das quantidades entre si.
Newton então prossegue a investigação sistemática das
propriedades das curvas, considerando em primeiro lugar
problemas que possam ser resolvidos por diferenciação e em
segundo lugar problemas que possam ser resolvidos por
integração.
O método "padrão" de traçar tangentes a curvas foi o de usar
x/y = -fy/fx = t/y, onde fix, y) = O é a equação da curva
e t a subtangente. As expressões fx,fy, que são formadas
obedecendo regras algorítmicas, correspondem às derivadas
parciais que usamos hoje.
+--t--+ Newton mostra como adaptar esse método para o uso de
coordenadas polares e bipolares e nos casos quando a equa-
ção da curva é dada numa variedade de formas diferentes.
Pontos estacionários máximos e mínimos e pontos de in-
flexão também são considerados. Newton também se dedi-
cava, desde 1665, à formulação de teoremas para achar "a
quantidade da sinuosidade em linhas", isto é, a investigação
da curvatura.

Uma digressão
C'
Talvez o leitor não tenha encontrado o conceito da curvatura
antes, portanto. é necessário digressionarmos rapidamente a
fim de explicarmos o que Newton estava investigando.
Intuitivamente, é claro, uma linha reta tem a sua curvatura
igual a zero, isto é, ela não se curva em ponto algum; um círcu-
lo, por outro lado, parece se curvar uniformemente. Se cons-
truirmos as normais em dois pontos vizinhos P e Q numa curva

36 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


.
1isa . . C _ ângulo PCQ e
e se essas normais se mterceptam em , entao - - - - -
arco PQ
é uma medida para a "curvatura média" do arco PQ, isto é,
se P'Q' = PQ e o ângulo P'C'Q' < ângulo PCQ (veja a
figura) então a curvatura do arco P'Q' < a curvatura do
arco PQ. Se are PQ = 6s, PC°çl = ô\jl; definimos a curvatura
da curva em P como sendo lim (6\j,/6s). O centro de curva-
Q-P
tura em P é a posição limite do ponto de interseção das
normais em P e Q com Q-+P. Segue que lim (bs/6\j,)= p, o
Q-P
raio de curvatura em P. A curvatura é o recíproco do raio de
curvatura, quer dizer 1/p.
Newton desenvolveu vários métodos para resolver o problema
da curvatura; pretendemos esboçar concisamente aquele
que o leitor poderá achar o mais fácil para seguir: sejam
D(x, y) e d(x+xo, y+ yo) dois pontos vizinhos na curva
ADd e seja C a interseção das normais nesses pontos. Deseja-se
determinar o raio de curvatura em D. Trace DG paralelo
ao eixo AB e CG paralelo à ordenada BD (DC 2 = DG 2 + CG 2 );
seja e a interseção de DG com a ordenada d e seja F a inter-
seção de DG com a normal dC. Finalmente, trace bfg, para-
lelo a DG, que corta dC em f e tal que Cg = 1; Seja bg = z;
segue ôf = io (o momento de z).
Temos De= xo, de= yo, de/De= y/x; mas, por semelhança
de triângulos, de/De= ôg/gC, gC = 1, bg = z, de sorte que
z = y/x (a linha bg foi construída para representar y/x).

Ainda por semelhança de triângulos, DF/bf = DC/ôC =


= DG/bg = CG/Cg; mas DF= De+ eF, De= xo, eF/ed=
= ed/ De, de sorte que eF = y 2 o/x (já que ed = yo ), DF =
•2
= .
XO + y·2 O/.X= X +. y· 2 O.
X
DF • C ·z
y· : agora, seja x = 1; então
2
Segue que CG = bf g x :

z= y/x= y e CG = 1 ~ z2, DG = z(I: z2) e DC = (1 + ~2)3;2 .


z z z
Em notação moderna, se y = f(x), z = y/x = f(x), i = f'(x),
(1 + f(x)2)3;2
e DC = p = f'(x) , que é uma fórmula atualm~nte
usada.
Newton foi capaz de vincular o problem~ da curvatura aos
pontos de inflexão, considerando um ponto de inflexão numa
curva como sendo um ponto no qual a curvatura se anulasse
ou, alternativamente, onde o raio de curvatura se tornasse ,.
infinito.

Q.A. 11
Use a fórmula de Newton para achar o raio de curvatura
da parábola ay = x 2 no ponto (a, a).

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 37


R.A. 11
ay=x 2 , ay=2xx, x= 1, y=z, az=2x, az=2x=2 Uá que
x= 1) x=a, y=a, z=2x/a=2, i=2/a.
(1 + 4)3/2 (5)3/2
Raio de curvatura = - - - - = - - a.
2/a 2

Integração
Os dois problemas centrais tratados aqui referiam-se à qua-
dratura de curvas e à retificação de arcos. Ambos foram
reduzidos ao problema 2, p. 36 (dada uma relação entre as
fluxões, ache os fluentes), através do conceito de momento.
Muito concisamente (uma vez que isso já foi discutido com
algum detalhe), se y = f(x) e a área= z, então~= L1 , i = y,
X

X
Uá que x = 1) e z = f fydx = J(x)dx, sendo que os extre-
mos do intervalo são determinados pela forma da curva.

Para a retificação de arcos, Newton usava a fórmula


s2 = .x: 2 + j,,2, onde s
é a fluxão do arco s; segue
s/x = ✓ o+ (j,/.:i:) 2 ) e se :i: = 1, s = j(I + /).

Em notação modernas=
p. 45).
fJO + f'(x) 2 )dx (~eja unidade 2,

A classe dos exemplos


A fim de estabelecer o pleno poder e a generalidade do método
das fluxões, foi necessário para Newton provar que podia
ser aplicado a toda classe de problemas reconhecidos no
século XVII. Portanto, ele incluiu exemplos elaborados para
cobrir:

as curvas algébricas simples


as expressões algébricas que envolvem raízes
as seções cônicas (elipse, parábola, hipérbole, círculo)
as curvas especiais herdadas dos gregos, incluindo a
concóide de Nicomedes, a quadratriz de Hípias, a cis-
sóide de Diocles e a espiral de Arquimedes
as curvas que foram introduzidas no século XVII, par-
ticularmente como desafio aos que propunham métodos
novos, por exemplo, a ciclóide e o folium de Descartes.

38 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


3.9. RESUMO DA CONTRIBUIÇÃO
DE NEWTON AO CÁLCULO

1. Newton formulou regras e procedimentos sistemáticos


para cobrir as soluções gerais da maioria dos problemas rela-
tivos ao cálculo infinitesimal que eram conhecidos no seu
tempo.
2. Embora muitas dessas regras tivessem sido estabelecidas
ou introduzidas de urria ou de outra maneira pelos seus pre-
decessores, ele estabeleceu uma estrutura unificada e um
quadro dentro do qual todos os problemas podiam ser for-
mulados.
3. O uso das séries infinitas foi uma ferramenta importante
ao estender-se à classe das curvas "quadráveis", isto é,
curvas cuja quadratura podia ser determinada. A aplicação
de tais séries em problemas que se referiam à retificação
foi particularmente útil.

4. Com Newton a idéia de que a diferenciação e a integração


eram operações inversas foi firmemente estabelecida con-
siderando a ordenada móvel proporcional ao momento ou
à fluxão de uma área. De Arquimedes em diante, e durántc
todo o século XVII, os procedimentos de integração foram
baseados na adição. (Veremos que os matemáticos que pro-
curavam estabelecer o cálculo numa base rigorosa, posterior-
mente restabeleceram a integração com base na adição.)

5. A síntese que Newton atingiu foi possibilitada pelo uso


do simbolismo algébrico e das técnicas analíticas. Ele esta-
beleceu muito tarde a notação . .-padrão" com ponto para
representar a diferenciação e, aparentemente, não sentiu
grande necessidade de introduzir qualquer notação específica
para a integração. Esse fato pode muito bem estar ligado à
ausência de publicações. Nos primeiros anos Newton tra-
balhou sozinho e não parece ter discutido com outros suas
inovações de notação - uma necessidade que poderia ser
relevante. Será que a notação é importante? Talvez não para
um gênio isolado que podia atingir a maior parte do que
quisesse sem grande esforç9 através de um simbolismo suges-
tivo, mas certamente teria sido importante para aqueles que
o seguiriam posteriormente.
6. Os fundamentos do cálculo foram apresentados por
Newton de várias maneiras em épocas diferentes. Ele cons-
tantemente procurava estabelecer os seus métodos analíticos
sobre uma base mais segura.
Como o único modelo para o rigor na matemática jazia na
"geometria dos antepassados" e como Newton trabalhava
principalmente no contexto de "métodos de descobertas",
a tarefa de conseguir justificar em termos de seus próprios

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 39


métodos foi praticamente irrealizável. As demonstrações
geométricas no Prin'cipia (livro 1) representam o melhor que
podia fazer. Veremos que as bases lógicas para o cálculo
de Newton causaram preocupação e controvérsia por mais
de um século depois da sua morte.

Q.A. 12
Tente dar respostas concisas às seguintes questões:
1. Que es~cie de regras Newton formulou?
2. Até que ponto essas regras constituíram um avanço da
obra dos seus predecessores?
3. Qual foi a importância do "método das séries infinitas"?
4. Como Newton estabeleceu.o vínculo entre a diferenciação
e a integração?
5. Newton introduziu uma notação específica?
6. Quais foram as idéias fundamentais nas quais o cálculo
fluxional foi baseado?

3.10. GOTTFRIED WILHELM LEIBNIZ


(1646-1716)

Quando, aos 26 anos, Leibniz foi a Paris, seus conhecimentos


de matemática eram muito superficiais, apesar de ter escrito
um pequeno tratado matemático sobre a combinatória. Che-
gou a interessar-se pela combinatória através da lógica que
fez parte dos seus estudos de filosofia e de direito. na universi-
dade de Leipzig, sua cidade natal. Em 1666 recebeú o grau
de doutor em direito pela Universidade de Altdorf, já que a
Universidade de Leipzig o considerou jovem demais (ele tinha
20 anos) para receber o grau. Dois anos mais tarde entrou nos
serviços de um dos estados alemães e em 1672 foi a .Paris
cumprindo uma missão diplomática. Mostrou-se logo que a
missão deixar-lhe-ia espaçoso tempo para satisfazer seus
vários interesses em todos os campos de erudição e arte.
Leibniz encontrou um conselheiro simpático no matemático
holandês Huygens, que trabalhava nessa época na Academia
Real de Paris. No período depois de Galileu e Descartes e antes
de Newton, Huygens era o primeiro cientista natural e ma-
temático da Europa. Na matemática infinitesimal ele defen-
dia o rigoroso estilo arquimediano como sendo o mais sério,
mas também tinha conhecimento e aplicava os novos métodos
infinitesimais do século XVII. Nos primeiros meses de 1673,
uma missão diplomática levou Leibniz a Londres aonde
atendeu a reuniões da Sociedade Real da qual posteriormente
Christiaan Hu ygens (Ronan Piclllre Library, tornou-se sócio. Em um dos encontros apresentou um modelo
Royal Astronomica/ Society). de uma máquina calculadora que inventou, em outro ouviu

40 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


um novo método de Sluse relativo à determinação de tan-
gentes (veja unidade 2, p. 48). Leibniz encontrou-se com vários
cientistas ingleses tais como Hooke, Boyle e Pell. Não se
encontrou, porém, com Newton. Estava informado sobre a
bibliografia matemática corrente e comprou alguns livros
inclusive o Geometrical Lectures de Barrow e um sobre técnicas
logarítmicas de Mercator. O resultado principal dos seus
encontros na Inglaterra foi que ficou diretamente confrontado
com a sua própria ignorância matemática. Regressando a
Paris, Leibniz começou a estudar intensivamente matemática
e esses quatro anos chegaram a ser os seus melhores anos.
Nesse período originaram-se muitas das suas idéias e des-
cobertas matemáticas e em outros campos, sendo uma delas
o cálculo (em 1675).
Em 1676, deixou Paris contra vontade e foi para Hanôver
onde foi nomeado bibliotecário e vereador da corte ducal.
Ambas, a folga (o ócio) e a plenitude da vida intelectual
que tinha experimentado em Paris pertenciam agora ao
passado. Suas várias atividades (inclusive a de historiador
da corte) e as freqüentes viagens deixaram-lhe pouco tempo
para seus próprios interesses e poucas pessoas do seu ambiente
participavam desses interesses. Leibniz remediou essa defi-
ciência de contatos diretos por meio de uma correspondência
muito intensa. Ele também promoveu contatos entre eruditos
de toda a Europa Ocidental de outras maneiras: em l 700
fundou a Academia das Ciências de Berlim e contribuiu
com muitos artigos para os jornais eruditos da França e da
Alemanha.
Ele esteve nos serviços de três duques de Hanôver, o último
dos quais virou George Ida Inglaterra. A corte mudou para
Londres e o rei, cujas relações com Leibniz sempre estiveram
bastante frias, ordenou que ficasse em Hanôver. Leibniz
morreu dois anos depois.
Agora nos concentraremos na invenção do cálculo de Leibniz,
que fez mais para a matemática do que presenteá-la com
uma nova invenção. Não podemos falar muito sobre as
outras contribuições à matemática, mas devemos mencionar
algumas delas.
Depois da invenção do seu cálculo, Leibniz contribuiu com
seu posterior desenvolvimento através da publicação de
muitas técnicas, tais como: o uso dos coeficientes indeter-
minados (veja Q.A. 13), a determinação dos contornos. a
integração das funções racionais mediante as frações parciais
e a chamada "regra de Leibniz" (veja Q.A. 14). Ele foi tam-
bém ativo em outros campos da matemática: projetou e
construiu uma máquina calculadora que executava a adição.
a subtração, a multiplicação e a divisão; investigou o sistema
dos números binários e explorou a teoria dos determinantes
na qual o moderno uso dos índices duplos tornou-se muito
útil. Também dedicou muito tempo aos estudos algébricos
(veja Boyer, p. 295-8, §§ 8-9 e 10). Com toda essa diwrsidade

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 41


de contribuições no campo matemático, esse era somente
um dos muitos interesses que Leibniz tinha. Ele muitas vezes
tem sido considerado um erudito universal, pois se interes-
sava por diversos campos de estudos, tais como a história,
a religião, a política, a história natural, a geologia, a fisica,
a mecânica, a matemática e a tecnologia. Esses interesses
não eram incoerentes. Na maioria dos seus estudos Leibniz
foi conduzido por algumas idéias muito gerais que ele tentou
apurar ou ilustrar em vários campos especiais.

Q.A. 13
(a) Verifique que f(x) = log(l + ~) satisfaz à equação dife.
rencial
(1 + x)f'(x) = I
e que f(O) = O.
(b) Escreva f(x) = ax + bx 2 + cx 3 + dx 4 + etc. (omitindo um
teimo constante já que f(O) = O) e calcule f (x) por diferen-
ciação, termo por termo.
(c) Insira em (I) a expressão em série para f encontrada em (b)
e calcule os coeficientes a, b, e, d, etc.
(d) Escreva a expansão em série para log(l + x).

R.A. 13
I
(a) f (x) = - - , de sorte que (1 + x)f'(x) = 1;
x+I
f(O) = log 1 = O.
(b) f'(x) =a+ 2bx + 3cx 2 + 4dx 3 + etc.
então
xf'(x) = ax + 2bx 2 + 3cx 3 + etc.
e
(I + x)f'(x) = a+ (a+ 2b)x + (2b + 3c)x 2 +
+ (3c + 4d)x 3 +etc.= 1.
(c) Portanto a = l ; a + 2b = O; 2b + 3c = O; 3c + 4d = O etc.
de onde segue
a l 2b 1 3c 1
a=l; b=-2=- 2; c=-3=3; d=-4=-4;
etc.
(d) A expansão em série geral para f(x) torna-se
1 2 1 3
Iog (1 +x)=x--x +-x - -1x4 +etc
2 3 4
(0 leitor acaba de usar o método dos coeficientes indetermi-
nados para a determinação da expansão em série de log(l + x ).
Exceto pela diferença na notação, Leibniz publicou este
método em 1693. Com seu auxílio ele deduziu expansões em
séries para a função logarítmica, a função exponencial, o
seno e o co-seno.)

42 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


3.11. A CHARACTERISTICA GENERALIS

Uma dessas idéias gerais deve ser mencionada aqui, já que


ela influenciou na descoberta do cálculo de Leibniz. A idéia
é uma characteristica generalis, uma linguagem simbólica
geral .com a qual poderiam ser traduzidos todos os processos
de raciocínio e de argumento. Essa linguagem simbólica te-
ria certas regras lógicas (como se fossem regras de cálculo
para os símbolos), que garantissem, se fossem obedecidas,
que o argumento seria correto. Serviria também de instru-
mento para invenções e descobertas; uma vez traduzido um
problema na linguagem simbólica, a aplicação das regras
conduziria quase mecanicamente a sua solução. Portanto a
characteristica generalis seria importante como uma ars
inveniendi, uma arte de invenção, como Leibniz a chamou.
O leitor não ficará surpreso ao ouvir que Leibniz não achou
uma tal linguagem simbólica. Não obstante, a idéia em si
foi muito fecunda já que ela estimulou o interesse de Leibniz
pelos símbolos, pelas notações e pelas regras algorítmicas
que dirigem a manipulação dos símbolos. Esse interesse o
conduziu nos seus estudos da combinatória, nos estudos pos-
teriores sobre um cálculo para as relações de figuras geomé-
tricas, no uso de notações aprimoradas em álgebra (o historia-
dor de matemática, Cajori, chamou Leibniz "o construtor
mestre das notações matemáticas") e, particularmente, na
sua invenção e elaboração do cálculo infinitesimal. Mostrare-
mos mais detalhadamente, na seção sobre a "invenção" do
cálculo, como esse interesse nos símbolos e nas suas regras
dirigiam a exploração na qual ele estabeleceu o simbolismo
do cálculo.

Q.A. 14
A regra de Leibniz, em notação moderna, é
(uv)<n) = u<n>v< 0 > + nu<n- I >v< 1 ) + ...
...
n(n-l)
+ - --U
<n-2><2>+n(n-I)
V ---U
<2><n-2>+
V
2 2
+ nu(! )V(n- 1) + u<º\,(n)

onde u e v são funções de x e u(kJ é a k-ésima derivada de


u (u< 0 > = u).
Ao considerar o que você leu sobre o método de Leibniz
na matemática, por quais das seguintes razões você pensa
que Leibniz achou a regra importante?
(a) A regra providencia um método para calcular derivadas
de ordens superiores de funções complicadas.
(b) A regra mostra uma analogia entre as derivadas de um
produto uv de funções e as potências de uma soma a+ b.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 43


R.A. 14

Razão (b): Leibniz estava mais interessado em relações su-


gestivas na matemática e em notações que tornassem essas
relações explícitas do que em auxílios computacionais.

3.12. AS RAÍZES DA DESCOBERTA


DE LEIBNIZ

Trataremos agora de alguns estudos que Leibniz realizou


durante seu primeiro período em Paris e que se referem às
seqüências de diferenças, aos triângulos característicos, à
transmutação e à série n. Esses estudos são importantes, já
que contêm idéias que Leibniz utilizou posteriormente (1675)
na sua "invenção" do cálculo.

Seqüência de diferenças
No outono de 1672 Huygens pediu a Leibniz que resolvesse
o problema de somar a série cujos termos são os valores
recíprocos dos números triangulares. Os números triangula-
res são 1, 3, 6, I O, I 5, ... , r(r + l), etc. (veja unidade 1, p. I 5-9).
2
Assim Huygens pediu a Leibniz que calculasse I -- 2- .
r=l r(r+l)

Leibniz já havia estudado seqüências de diferenças. Para as


seqüências a 1, a 2, a 3 ... formou a seqüência b 1=a 1 -a 2,
b 2 =a 2 -a 3, ... , b,=a,-a,+ 1, etc., e observou que
b1 +b2 + ... +bn=a1 -a2 +a2 -a3 ... +an-an+ 1 =a1 -an+ 1 •
Portanto, ele descobriu que as seqüências, cujos termos
podem ser expressos como diferenças, são facilmente so-
madas. Essa idéia pode ser aplicada ao problema de Huygens:
-- 2 - = -2 - -2- ; d e sorte que a sequencia
.... d os ,
numeros
r(r+ l) r r+ l
triangulares recíprocos é a seqüência das diferenças de
2 2 2 2 2 ,
l ' 2 ' 3 ' 4 ' 5' .... Dai

n 2 n (2 2 ) 2
r ~1 r (r + l) = r~ 1 7 - r + l - 2 - n+ l

44 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


e

f
,=!
_2_= 2.
r(r+l)
Leibniz deduziu muitos resultados sobre a adição de seqüên-
cias semelhantes juntando-as no chamado triângulo harmô-
nico, a contrapartida do triângulo aritmético de Pascal como
ilustrado na figura (veja Boyer p. 264-7 e p. 293-4). O tri-
ângulo de Pascal abrange os coeficientes binomiais (:) ; os

números correspondentes no triângulo harmônico são

(n+l)•(:)r'
Toda seqüência diagonal é a sequencia das diferenças da
diagonal acima tal que todas as espécies de fórmulas sobre
a adição podem ser obtidas diretamente no esquema:
por exemplo:

1 1 1 1 1 1
-+-+-+-+-+ ... =-
3 12 30 60 105 2

2 2
1 1 1
- - -
3 6 3
1 1 1
- - -
4 12 12 4
1 1 1
- - -
5 20 30 20 5
1 1 1 1 1
- - - - -
6 30 60 60 30 6
1 1 1 1 1
- - - - -
7 42 105 140 105 42 7

Q.A. 15
Antes que Huygens lhe perguntasse a questão discutida
acima, Leibniz observou _que, relacionado às seqüências de
diferenças, todo número ímpar poderia ser escrito como a
diferença de dois quadrados. Imagine como ele achou esse
resultado.

R.A. 15
Leibniz considerou a seqüência dos quadrados com a sua
seqüência de diferenças:
o 4 9 16 25 36
3 5 7 9 11

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 45


Em Londres, Leibniz percebeu que tudo isso não era novo.
Se ele tivesse, naquela época, melhores conhecimentos da
bibliografia matemática corrente, poderia ter encontrado re-
sultados parecidos em vários livros. Entretanto, ele não os
tinha e deduziu os resultados por si mesmo. Através disso
ele adquiriu um conhecimento que se tornou muito im-
portante para sua "invenção" do cálculo
Somar seqüências e tomar as suas seqüências de dife-
renças são operações mutuamente inversas num certo
sentido.
Leibniz aplicou esse conhecimento, com algum sucesso, à
O l l 1 1 1 1 1 1B adição de inúmeras séries diferentes, mas também estendeu
a idéia à geometria. Ele observou que o problema da qua-
dratura poderia ser considerado (como Cavalieri e muitos
outros o fizeram) como a adição de uma seqüência de orde-
nadas eqüidistantes (veja a figura). Se a distância entre as
ordenadas é igual a 1, então a soma das ordenadas é apro-
ximadamente igual à área da curva. As diferenças das orde-
nadas consecutivas na seqüência dão aproximadamente o
declive das tangentes. Se a unidade 1 for escolhida menor,
as aproximações da área e do declive da tangente tornar-se-ão
melhores. Leibniz esperava que, se a unidade fosse escolhida
infinitamente pequena, as aproximações tornar-se-iam exatas.
Dessa maneira Leibniz viu uma analogia entre o cálculo de
diferenças finitas e de somas, por um lado, e a determinação
de áreas e de tangentes pelo outro: a adição das seqüências
corresponderia à quadratura de curvas; tomar as diferenças
corresponderia à determinação das tangentes. A relação
inversa entre tomar somas e diferenças sugeriu a Leibniz que
As determinações de áreas e de tangentes também são
operações inversas.
Assim surgiu, apesar de estar indefinida nesse período, a
idéia de um cálculo de diferenças infinitamente pequenas e de
somas de seqüências de ordenadas que servissem para re-
solver os problemas de quadraturas e de tangentes, problemas
cuja reciprocidade foi reconhecida.

x2
Y=-
a Q.A. 16
Considere a parábola y = x 2 /a. Tome sucessivamente a/2 e
a/3 como unidades e determine as aproximações correspon-
dentes para o declive da tangente em C(a, a).

R.A. 16

No primeiro caso temos as ordenadas sucessivas de a e 9a/4;


a sua diferença, 5a/4, é 5/2 vezes a unidade a/2. Assim a
o a- 4a 3a 2a aproximação neste caso é 5/2 = 2 _!__.
32 2

46 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


No segundo caso as duas ordenadas são a e l 6a/9, a sua
diferença, 7a/9, é 7/3 vezes a unidade a/3. Assim a aproxima-
ção é 7/3 = 2 +· A última aproximação é melhor, já que
o valor correto para o declive da tangente em C é 2.

O triingulo característico
Huygens, satisfeito com os resultados de Leibniz sobre a
adição de séries, observou que este possuía limitados co-
nhecimentos das obras de outros autores sobre cálculo in-
finitesimal. Aconselhou-lhe que estudasse as obras de
Descartes, Sluse, Pascal, Gregory e outros. Seguindo esse
conselho, Leibniz encontrou uma passagem nas anotações
de Pascal na qual ocorre o "triângulo característico" (a pas-
sagem é discutida em Boyer p. 294-5, §7; o termo "caracte-
rístico" deve-se a Leibniz).
Leibniz viu que o uso desse triângulo por Pascal no caso do
círculo e a sua relação a outros triângulos na figura poderia e
ser generalizado e aplicado a curvas arbitrárias. A figura
OcC é uma curva arbitrária, r = cg é a tangente em e e n = ce
é a normal em e. Tome e' na tangente perto de e, tal que
numa boa aproxim.ação, cc' possa ser considerado coinci-
dente com a curva. O triângulo pequeno cdc' é o "triângulo
característico" em e. Ele é semelhante aos triângulos grandes
cbe e gbc:
cd: de' : cc' = y : v:n = t : y : r.

Essas relações são úteis em todos os tipos de transformações


de quadraturas. Discutiremos um exemplo da sua utilização
na próxima seção. Leibniz não foi o primeiro a usar tais
relações, pois triângulos característicos haviam ocorrido em
muitos trabalhos anteriores. Entretanto, a generalização de
um resultado, que ele leu no livro de Pascal, caracteriza os
interesses de Leibniz e a maneira como estudava nesse período.
Ele estava interessado primeiramente em métodos, não em
resultados especiais, pois queria achar métodos tão gerais
quanto possível.

A transmutação
Leibniz utilizou o triângulo característico para deduzir uma
regra geral de transformação para as áreas sob curvas, que
ele chamou "a transmutação". O teor dessa regra, que encon-
trou em 1673, pode ser resumido da seguinte maneira: a
área sob uma curva pode ser considerada como sendo a soma
das áreas de retângulos pequenos, mas também como sendo

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 47


a soma das áreas de triângulos pequenos, situados como na
figura. Portanto
área OcCB = (1: triângulos Occ') + l:::,. OCB.
Considere agora a tangente cg que intercepta o eixo vertical
em s, e seja Op perpendicular à tangente. Então

'
area O CC ' = - l CC ' X O'P.
2
O triângulo característico cdc' é semelhante ao l:::,.Ops, de
sorte que
cd : cc' = Op : Os
o logo
1 cc' x Op = cd x Os.

Agora, trace sq paralelo ao eixo interceptando as ordenadas


bc e b' e' em q e q' respectivamente; então:

área 0cc' = + Op x cc' =+Os x cd =+área bqq'b'.

Queremos agora somar as áreas 0cc', a fim de encontrarmos


g
a quadratura da curva OcC. Para realizarmos isso, marcamos
para cada ponto e na curva o ponto correspondente q, o
qual gera uma nova curva OqQ. Temos então:

área OcCB = (1:l:::,.Occ') + t:::,.OCB


= J_ (1:bqq'b') + t:::,.OCB
2
= J_ área OqQB + t:::,.OCB.
2

Essa é a regra de transformação. Ela reduz a quadratura de


uma curva dada OcC à quadratura de uma outra curva OqQ,
que pode ser construída a partir da curva dada, mediante
suas tangentes. Portanto a regra é útil nos casos quando a
quadratura de uma curva OqQ é por acaso mais simples
do que a quadratura da curva OcC.

Q.A. 17
Seja a curva OC (veja a figura) a parábola
y=fo.
Calcule a equação da curva correspondente OQ. Depois
verifique se a regra de transmutação ajuda, neste caso, achar
a quadratura OCB da parábola.

48 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


R.A. 17
Já que a curva é uma parábola, temos

OS= _!_BC 14 .
2
Daí, sendo BQ = z, obtemos
1 1
Z=-y=-fo.
2 2
A regra de transmutação fornece

OêB = + OQB + t:.OCB


1 1 ~
= 2 ,2 OCB + l::J.OCB.
Portanto

! OCB = t:.OCB, logo OCB = 1t:.OCB

que é a área da parábola.

Q.A. 18

Reescreva a regra de transmutação usando a (d, notação f)


moderna.
Estabeleça explicitamente, em palavras e diagramas, as van-
tagens da formulação em notação moderna comparando-a
com a formulação de Leibniz.

R.A. 18
A curva OqQ pode ser dada analiticamente: e

cq = X~
dx
tal que
d)'
bq=z=y-x-.
d~
Portanto a regra de transmutação pode ser traduzida assim:

Jxo
o
y dx = 2
1 fxº z dx +
o
1
2 x 0 _r 0 =

= 2I IXº ( y -
0
dy)
x ~ dx + 2I x 0 y0 (1)

14 Verifique isso por diferenciação. Essa propriedade era bem conhecida


no século XVII.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 49


Esta fórmula pode ser reduzida a

-
2
1 f
xo
y dx + -1
2
f Yo 1
x dy = - XoYo,
2
(2)
o o
cujo resultado é equivalente à integração por partes.
As vantagens da regra na fórmula (1) comparadas com a
sua enunciação em palavras e diagramas são:
1. Esta formulação dispensa a necessidade de descrever a
nova curva OqQ mediante uma construção geométrica.
2. A formulação acarreta a demonstração da regra; parti-
cularmente na fórmula (2) a regra é tão óbvia que quase se
torna trivial.
(Observação: como veremos depois, a notação usada na
R.A. 18 foi inventada por Leibniz em 1675, dois anos depois
da descoberta da regra de transformação. Uma das primeiras
coisas que fez depois da invenção da notação foi exatamente
o· que exigimos que o leitor fizesse nesta questão: traduzisse
a regra de transformação para o novo simbolismo.)

A série para n
Leibniz aplicou a transmutação a um grande número de
curvas. Com sua ajuda, ele pode deduzir facilmente, por
exemplo, a quadratura das parábolas e das hipérboles su-
periores. Porém, o mais importante foi a aplicação da trans-
mutação à quadratura do círculo, através 'da qual ele en-
controu a famosa série
1
C=Q
n
1- - + -1 - -1 + -1 - -1 + ... etc.
4 3 5 7 9 11
Leibniz chamava isso "a quadratura aritmética do círculo".
Na Europa a série é assim chamada em homenagem a Leibniz;
na Inglaterra ela se chama "a série de Gregory", já que
Gregory de fato a encontrou mais cedo (em 1671 ). Daremos
uma paráfrase de como Leibniz deduziu a série mediante a
transmutação: seja OcC um círculo de raio a. A sua equação é
y2 = x(2a-x) = 2ax - x 2 .
Constroe-se a curva correspondente OqQ tomando-se a tan-
gente cg. determinando-se a sua interseção s com o eixo-y
e colocando-se : = Os. Já que /:::,.sOB ~ /:::,.cbL, temos
= \' ~ ~
-; = 2a--x = ✓~ = ✓ 2~'
de sorte que a equação da curva OqQ é
2az 2
X= -2--2.
a +z
50 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA
De acordo com a regra de transmutação:

área OêCB = _!_ área OqOB + !::,,OCB


2
portanto

o quadrante do círculo = + área OqQB + + a2 •

A fim de calcular a área OqQB, Leibniz troca os eixos (nós


diríamos que ele tomava x como função de z) e expressa
a - x como uma série de potências em z, obtida através de
um vagaroso processo de divisão (Leibniz encontrou essa
técnica na obra de Mercator):
2az 2
a-x=a- 2 2
a +z
z2 z4 z6 zs
= a - 2 - + 2 3 - 2 5 + 2 7 - ... etc. B ---a----..C Q z
a a a a
OqQB, a quadratura de a - x com respeito ao eixo-z (BC),
pode ser calculada tomando-se a quadratura da série termo
por termo e aplicando a regra para a quadratura das po-
tências de z:
2 z3 2 z5 2 z7 2 z9
OqfB = az - - • - + - • - 3 - - • - 5 + - . - 7 - ...
3 a 5 a 7 a 9 a
etc.
de forma que, para z = a,

QqQB = ª2 _ 2 ª2 + 2 ª2 _ 2 ª2 + 2 ª2 _ ... etc.


3 5 7 9

= a2 ( 1 - ~ + ~ - ~ + !-.. etc.) .

Inserindo isso no resultado anterior achamos

A importância da regra de transmutação


Após termos visto um exemplo da aplicação da regra de
transmutação devemos perguntar: Qual foi a sua impor-
tância para o cálculo que Leibniz inventou mais tarde?

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 51


Leibniz não foi o primeiro a deduzir essa espécie de regras
de transformação para quadraturas; ocorrem, por exemplo,
nas obras de Barrow e de Gregory. Entretanto, Leibniz a
encontrou por si mesmo e ficou impressionado com seu
poder para resolver problemas de quadraturas. Portanto,
ele estava ciente, conforme demonstraram suas pesquisas
posteriores, de uma linguagem simbólica geral para a ma-
temática infinitesimal e que tal linguagem deveria cobrir
em particular essas regras de transformação. Como o leitor
viu na Q.A. 18, foi exatamente isso que o ( d, J) simbolismo
de Leibniz, inventado em 1675, conseguiu. Veremos na pró-
xima seção como foi inventado esse simbolismo.

3.13. ASPECTOS DE UM PROCESSO


DE DESCOBERTA

Mencionaremos agora as três idéias importantes que funda-


mentaram a invenção do cálculo de Leibniz:
1. O interesse de Leibniz pelo simbolismo e pela notação,
vinculado à sua idéia de uma linguagem simbólica geral;
2. O reconhecimento de que somar seqüências e tomar as
suas diferenças são operações inversas e gue, semelhante-
mente, a determinação de áreas e a de tangentes são opera-
ções inversas;
3. O triângulo característico e o seu uso para deduzir trans-
formações gerais de áreas (por exemplo a transmutação).
No período entre 25 de outubro e 11 de novembro de 1675,
Leibniz reuniu essas idéias numa série de estudos sobre o
tratamento analítico de problemas infinitesimais, que con-
têm a invenção do cálculo. Temos conhecimento delas porque
os manuscritos nos quais Leibniz registrava os seus pensa-
mentos ainda existem. Esses manuscritos, datados de 25,
26 e 29 de outubro, 1 e 11 de novembro de 1675, formam uma
coleção bastante preciosa de um processo de invenção. Não
é sempre que estamos em condições de seguir os passos
sucessivos de uma importante descoberta matemática. Nesta
seção queremos indicar esses passos ilustrando-os com frag-
mentos dos textos originais.
Leibniz iniciou seus estudos a partir das relações entre
áreas, expressas analiticamente (em fórmulas) mediante o
simbolismo introduzido por Cavalieri (veja unidade 2, p. 11-7).
Quer dizer, ele escreveu "omn.f" (a abreviação para omnes f,
"todos os f ") para indicar a área de uma curva cujas orde-
nadas são f.

52 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Para dar-lhe uma amostra do início dos estudos de Leibniz, o D
temos aqui um argumento do manuscrito de 26 de outubro. t t
1 -........J
1
O texto é muito curto, contendo apenas frases que citaremos 15
"'
1
1
1
1
e uma série de fórmulas, por isso acrescentamos algumas X w
explicações.
1
1
i I"\
1 w
ult. x
1
1 ....L
y \
Considere uma seqüência de ordenadas y de uma curva que 1 w~
1
são eqüidistantes como na figura (que é uma ampliação da 1 w,
figura de Leibniz). As diferenças dos y's são chamadas de w. 1
1 w
A área OCD é a soma de todos os retângulos xw. Agora 1

x x w é o momento estático <le w com respeito ao eixo hori- ...1


zontal. (Momemo estático = peso x distância ao eixo; nesse B 1
e
caso o peso de w foi tomado igual ao seu comprimento.)
Portanto a área OCD é a soma dos momentos das diferenças
w. Agora, a área OCD é o complemento da área OCB no
retângulo OBCD e a área OCB é, na terminologia de Cavalieri,
a soma de todos os "termos" y. Logo:
Os momentos das diferenças de uma reta perpendicular ao eixo são
iguais ao complemento da soma dos termos.

Agora, os w's são as diferenças dos y's, tal que, reciproca-


mente, os "termos" y são as somas dos w. Assim, se tomarmos
qualquer seqüência com termos w e se substituirmos na frase
precedente "diferenças" por "termos", e "termos" por "soma
dos termos" obteremos:
e os momentos dos termos são iguais ao complemento da soma
das somas.

Leibniz expressa esse resultado no simbolismo de Cavalieri:

omn. xw, n ult. x, omn. w., - omn. omn. w


L___-,,----.J ~~
os momentos total soma das somas
dos termos w dos termos

complemento da soma das somas


dos termos

n é o símbolo de Leibniz que indica a igualdade; ele usa a


barra onde nós usaríamos parênteses ; as vírgulas são sím-
bolos que separam; ult. é uma abreviação de ultimus (último),
e significa os últimos termos da seqüência. O leitor notará
o papel central da teoria das seqüências de diferenças nesse
argumento. Veja a seção 12 desta unidade.
Agora Leibniz usa essa fórmula e deduz outras fórmulas de
maneira puramente analítica, sem fazer uso da figura. Ele
consegue isso pela substituição de variáveis especiais no
lugar de w, e interpreta os resultados como relações entre
áreas. Dessa maneira ele encontra por exemplo:

15 CHILD, J. M. The Early Mathematical Manuscripts of Leibniz. Londres,


1920.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 53


az az
omn, az n ult. x. omn. - - omn. omn -
X X

. . _ xw
( pe1a su bstitmçao az)
=az, w =-; e

"omn. a n ult. x, omn. -"- - omn. omn.-"-


x X

(pela substituição xw = a, w = ; ) .

Leibniz interpreta a última equação assim:


o último teorema expressa a soma dos logaritmos em termos da
conhecida quadratura da hipérbole.

y = .!!_ é a equação da hipérbole retangular. Portanto


X

omn • .!!_éa quadratura da hipérbole. Agora, essa quadratura


X

e' um 1ogantmo
. (nos
' d"mamos
' Iªdx
-_;- = 1og x para a1guma

base do logaritmo), tal que omn.omn ..!!_ é a soma dos loga-


x
ritmos. Assim, a fórmula de fato expressa a soma dos logarit-
mos em termos da quadratura da hipérbole.
O leitor deve comparar essa maneira de derivar transforma-
ções de quadraturas com os estudos de Leibniz sobre as
transmutações, para perceber a vantagem de um simbolismo
pelo qual essas transformações podem ser explicitadas me-
diante fórmulas, ao invés de uma inspeção de figuras com-
plicadas.

Q.A. 19
Leibniz também deduziu da sua fórmula fundamental a
relação
a a a
omn. - n x, omn. - 2 - omn.omn. ----, .
X X :C

Você pode imaginar como?

R.A. 19
a
Pelo uso da substituição 1r = -xz .

Três dias mais tarde (29 de outubro) encontramos Leibniz


explorando as regras operacionais para o símbolo omn.
Ele percebe por exemplo que omn.yz não é igual a
omn.y x omn.z. Nessa investigação Leibniz subitamente es-
colhe um novo símbolo que substituirá omn.:
Será útil escrever f
para omn., tal que fe= omn. t. ou a soma dos f's.

54 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


f é o s estilizado de calígrafo, que significa suma (soma),
tal que o símbolo menor é mais conveniente para a concepção
da quadratura de Leibniz: a soma dos termos ao invés de
"todos os termos" de Cavalieri. Leibniz escreve Jf para
omn.omn. e salienta que as diferenças entre os termos são
infinitamente pequenas. Ele escreve simples relações de
quadratura no novo simbolismo.
NB. Se f{ i: dado analiticamente, então também { é dado; portan-

to. se f{ for dado, também { o será; porém, se { for dado, ft não

será dado. Em todos os casos f x = x 2 /2.

NB. Todos esses teoremas são verdadeiros para séries nas quais as
diferenças dos termos impõem aos próprios termos uma razão que é
menor do que uma quantidade qualquer determinável f x2 = x 3/3.

Leibniz encontra regras para J: Ja{ = a f{, se a é uma


constante; J(y + z) = f fy + z.

O próximo passo é formular o problema geral das quadra-


turas. Ao fazer isso Leibniz introduziu o símbolo d para
denotar a diferenciação e a operação inversa de tomar qua-
draturas:
Dado f e a sua relação com x. ache f{. Isso obtém-se do cálculo

contrário, quer dizer, suponha que f f = yu. Seja { = ya/d; então,

ú medida que a f aumentar. d diminuirá as dimensões. Mas f sig-

nifica uma soma e d uma diferença. Para um _r dado sempre pode-


mos achar _r,d ou {. quer dizer, a diferença dos y's.
Para compreendermos por que Leibniz escreve y/d para as
diferenças dos y's, devemos esclarecer algo sobre as dimen-
sões. As variáveis como x, y, { e as constantes que foram
consideradas como sendo segmentos de reta, isto é, grande-
zas unidimensionais. Portanto, o produto de dois segmen-
tos de reta será uma área bidimensional. Assim, Leibniz es-
creve J{= ya onde a é i~troduzido para igualar as dimen-
sões em ambos os lados. Na fórmula f{, o símbolo Jatua,
com respeito às dimensões, do mesmo modo que qualquer

outra letra; Jsignifica a dimensão de um comprimento. f f

é uma soma e, portanto, as diferenças dos valores consecuti-


vos de J f são iguais a f:

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 55


e= as diferenças de fe = as diferenças de ya.
O uso da letra d como símbolo para indicar a diferença é
bem sugestivo. Como ya é uma área sua diferença e é uma
reta. Assim, se o símbolo d possuir a mesma propriedade
de f, com respeito à dimensão, d terá de ser escrito no de-

nominador:

diferenças de ya = ;.

Observe que f e d não são variáveis, são símbolos que se

usa para operações. Mas Leibniz os escolhe de maneira que


atuem com respeito à dimensão do mesmo modo que as va-
riáveis ordinárias. Entretanto, Leibniz não se prendeu a essa
interpretação dimensional de f e d, já que o uso de 1/d torna

a fórmula bastante complicada. Já no manuscrito de 11 de


novembro ele escreveu dy ao invés de y/d para indicar as
diferenças dos y's. A partir de então, Leibniz foi capaz de
escrever relações como f ydy = y2/2 exatamente como no

cálculo moderno, mas ainda existiam falhas. Por exemplo,


ele ainda escreveu f y para indicar a área sob a curva y(x).

Mais tarde chegou a escrever consistentemente f ydx para

essa área, considerando-a como uma soma de retângulos de


área y x dx; nessa fase, porém, ele omitiu o dx, provavel-
mente por tomar a distância entre as ordenadas consecutivas
igual a 1 (uma unidade infinitamente pequena), suprimin-
do-o conseqüentemente das fórmulas. Como já vimos, ele
escreveu fx 2 = x 3 /3 para o qual escreveria posteriormente

na forma f x 2 dx = x 3 /3.

No manuscrito de 11 de novembro Leibniz continuou a in-


vestigação das regras para o símbolo d. Ele estava conven-
c1'd o d e que d ( -u ) nao
- e' 1gua
. 1 a-,
du e que d (uv) nao
- e' 1gua
. 1
,. d,·
a dudv. O último é demonstrado através de um contra-exem-
plo: Se u = v = x e se colocarmos dx = /3, então d(uv) =
= d(x 2 ) = (x + {3) , (x + {3) - x 2 = 2xf3 (suprimindo-se {3 2 que
é infinitamente pequeno comparando com 2x/J), mas dudv =
= (x + /3 - x) • (x + fJ - x) = /32, tal que dudv-=/= d(uv). Num
manuscrito posterior verificou-se que Leibniz encbnt-rou a
regra correta: d(uv) = udl' + vdu.

56 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Q.A. 20
Faça um resumo das principais etapas dos estudos de Leibniz
discutidas acima.

R.A. 20
1. O tratamento analítico das transformações de quadratu-
ras mediante o simbolismo de Cavalieri.
2. A introdução do novo símbolo f-
3. A introdução do símbolo d para a operação inversa de f-
4. A exploração das regras para f e d.

Q.A. 21
O que mostram essas pesquisas sobre o método de Leibniz
com relação aos símbolos e à notação?

R.A. 21

O uso das letras f (s estilizado de calígrafo) e d para a soma

e a diferença indica que Leibniz escolheu conscientemente


um simbolismo que mostrasse a analogia entre o cálculo de
somas e diferenças e entre o cálculo das áreas e das tangentes.

A exploração da interpretação dimensional de f e de d (ou

também 1/d) e a sua rejeição posterior mostram o interesse


de Leibniz em achar os símbolos mais apropriados com res-
peito à simplicidade nas fórmulas.

A busca das regras operacionais para f e d mostra que


Leibniz estava procurando símbolos que possibilitassem a
tradução de argumentos (no caso os argumentos sobre as
quadraturas e as tangentes) em cálculos com fórmulas (veja
a p. 43 sobre a idéia de Leibniz de uma linguagem simbólica
geral).
Essas são as linhas principais da descoberta de Leibniz no
período outubro-novemqro de 1675. As idéias mais impor-
tantes do cálculo são: os símbolos f e d para somas e di-

ferenças, a sua relação inversa e algumas das (não todas)


regras para a sua aplicação em fórmulas. Virtualmente não
existem demonstrações e os manuscritos contêm muitos erros,
de simples erros de contas a grandes inconsistências. Passa-
ram-se mais de dois anos para que Leibniz conseguisse eli-
miná-los.
Não obstante, os manuscritos que discutimos contêm a gê-
nese do cálculo de Leibniz. O que Leibniz fez depois foi

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 57


principalmente aperfeiçoar sua invenção a um sistema con-
sistente. Não queremos mostrar aqui como ele o fez. Da-
remos na próxima seção um resumo dos conceitos básicos
do cálculo de Leibniz depois de removidas as inconsistências
da versão de 1675.

3.14. OS CONCEITOS DO CÁLCULO


DE LEIBNIZ

(a) Diferenciais
A diferencial de uma variável y é a diferença infinitamente
pequena entre dois valores consecutivos de y. Para uma
curva traçada em relação a um eixo-x e a um eixo-y (veja
a figura) Leibniz considera a seqüência das ordenadas y e
a seqüência correspondente das abcissas x. As ordenadas
estão situadas infinitamente próximas; dy é a diferença infi-
nitamente pequena entre duas ordenadas y e dx é a dife-
rença infinitamente pequena entre duas abcissas x; portan-
to, dx é a distância entre duas ordenadas y consecutivas.

As diferenciais são "infinitamente pequenas". Isso significa


que podem ser comparadas entre si (a razão dy :dx é finita).
Mas com respeito às quàntidades finitas ordinárias as dife-
renciais podem ser desprezadas :
x + dx = x.
Produtos de diferenciais podem ser desprezados com respeito
às próprias diferenciais:
adx + dydx = adx
já que
X
a+ dy = a.

Para cada ponto (x, y) na curva podemos formar o "triân-


gulo característico" dx, dy, ds (ds é a diferencial do com-
primento de arcos). Se o segmento de reta ds, infinitamente
pequeno, for prolongado, formará a tangente à curva em
(x, y) e teremos
dx : d y : ds = t : y : r.

Portanto, para determinar as tangentes é suficiente deter-


minar a razão dy: dx. A relação entre y e x usualmente é
dada em forma de uma equação (a equaçãb da curva); a
fim de calcular a razão entre dy e dx é preciso diferenciar
essa equação, ou seja, é preciso formar a equação diferen-

58 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


cial da curva. Para fazer isso deve-se aplicar as regras de
cálculo:
da = O se a é constante, d(u + v) = du + dv
d(uv) = udv + vdu d(~)= vdu - udv
V V2

d(u") = nu"- 1 du (também se n for uma fração ou ne-


gativo, porém não para n = - l ).
Essas regras seguem o fato de que as diferenciais podem
ser desprezadas. Por: exemplo:
d(uv) = (u + du)(v + dv) - uv = udv + vdu + dudv
= udv + vdu
desprezando-se o produto das diferenciais dudv.
Exemplo: A hipérbole tem a equação
xy - a 2 = O.
y
Diferencie a equação:
d(xy - a 2 ) = dO = O.
Aplique as regras:
O = d(xy - a 2 ) = d(xy) - d(a 2 ) = xdy + ydx - O
- - --x-- --++---t---. X
xdy + ydx = O
Calcule a razão:
y
y: t = dy: dx = Daí t = -x,
X

o que fornece a construção da tangente.

Q.A. 22
Determine, pelas regras do cálculo, a subtangente t da cur-
va conhecida como "folium de Descartes", axy = x 3 + y 3 .

R.A. 22

d(axy) = d(x 3 + y 3 )
axdy + aydx = 3x 2 dx + 3y 2 dy
(ax - 3y2)dy = (3x 2 - ay)dx.
Daí
y dy 3x 2 - ay
dx 3y 2 - ax'
tal que
3y2 - ax
1=-y~-c----
3x2 - ay ·

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 59


(b) Integrais ou somas

A soma, ou integral, f ydx é a soma de retângulos infini-

tamente pequenos yxdx; portanto


va y(x).
f ydx é a área da cur-

Leibniz não indica o intervalo de integração. Portanto as


fórmulas não explicitam as constantes de integração.

y Normalmente a fronteira esquerda é a origem e f ydx in-

dica a área entre O ex. Não existem regras gerais pelas quais
f ydx possa ser calculada em todos os casos ou reduzida
a integrais conhecidas. Porém, existem muitas regras e tru-
o ques especiais que são aplicáveis aos casos especiais.
A diferencial da área OCB (a diferença de dois valores con-
secutivos daquela área) é o retângulo ydx à extrema direita:

d f ydx = ydx

o que mostra a relação inversa entre d e f-


Reciprocamente

f dy = y
que é imediatamente evidente.
Normalmente supõe-se que os dx's sejam iguais entre si
(ordenadas eqüidistantes) mas isso não é necessário. Se
na figura todos os dx's forem iguais, os dy's serão diferen-
tes (caso contrário a curva seria uma reta). Assim, quando
tratarmos de curvas, os dx's e os dy's, não ambos, poderão
ser iguais. Portanto, não existe nenhuma razão para supor-se
que em todos os casos os dx's sejam iguais. Realmente, às
vezes os dx's são supostos iguais, às vezes os dy's e às vezes
os ds's. Isso depende do que é natural e útil no problema
que está sendo tratado. Isso significa que as próprias dife-
renciais são variáveis; elas dependem do local ao longo da
curva onde estão situadas.

(e) Diferenciais de ordens superiores


Se os dy's consecutivos são diferentes, essa diferença (veja
a figura) chama-se uma diferencial de sef •mda ordem: é in-
finitamente pequena comparada com as liferenciais de pri-
meira ordem e será denotada por ddy:
ddy = dy 1 - dy.
De maneira semelhante pode-se formar ddx, dds, etc. Se os
dx's são iguais entre si, ddx = O. Da mesma maneira podem

60 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


ser introduzidas as diferenciais de terceira, quarta, etc. or-
dens que serão denotadas por d 3 y, d 4 y, etc. Restringiremo-
nos aqui somente à menção dessas diferenciais de ordens
superiores. Veja a unidade 5 que contém exemplos de como
elas foram usadas.
No momento este resumo conciso dos conceitos básicos do
cálculo de Leibniz é suficiente. Na unidade 4 os ilustraremos
mais detalhadamente através dos textos originais.
Os conceitos formaram a base de um sistema extremamente
conveniente e poderoso para a solução de problemas. Mas
o leitor verá que eram muito insatisfatórios, considerados
sob o rigor matemático.

Q.A. 23
Quais suas objeções, concernentes ao rigor matemático dos
conceitos do cálculo de Leibniz descritos acima?

R.A. 23
As quantidades infinitamente pequenas não foram definidas
e não foi provado que podem ser desprezadas com respeito
às quantidades finitas. Portanto, não esclarece se tais quan-
tidades existam e se os resultados obtidos através do uso de
tais quantidades são corretos.

Veremos na unidade 4 que essas objeções formaram o as-


sunto de uma longa discussão que ocupou parte do século
XIX. Leibniz estava ciente dessas objeções e tentou resol-
vê-las; entretanto, ele aplicou o cálculo apesar da falta· de
rigor - o mesmo fazendo outros matemáticos por mais de
um século depois dele.

3.15. A PUBLICAÇÃO DO CÁLCULO


DE LEIBNIZ

Leibniz não publicou a sua descoberta imediatamente, mas


apenas depois de nove íJ.nos, em 1684. Ele teria esperado
ainda mais se alguns artigos de E. W. von Tschirnhaus
(1651-1708) não o tivessem alertado. Esses artigos aparece-
ram no Acta Eruditorum Lipsiensium (Atas dos eruditos de
Leipzig), o primeiro periódico científico da Alemanha, fun-
dado em 1682. O Acta era mensal e publicava principalmente
sumários de livros em todos os campos do conhecimento.
Artigos curtos também foram incluídos, muitos dos quais
eram em matemática. Tanto Leibniz quanto Tschirnhaus
contribuíram para o periódico desde o seu início.
Leibniz encontrou-se com Tschirnhaus em Paris mostran-
do-lhe o seu novo método. Mas, naquele tempo, Tschirnhaus

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 61


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I PR(/ ,+Ut:XUUS 'la 1' ,'IJJ.
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vt 6 A4,u,it,:tl'. & 1uhtc~•
ft<l :aJ t~"Cftl\ v1[oovu
\Nl"'lnU'1•1-'<lt•illlJ''NMiH1'<<1,>l1" $d;~> t'1tl\ ~f'J'4-• >f>
Exrraído do arrigo de Leibniz do Acta sobrr lli<lllJf&Hll!fU1,Am••· •li '111Hlt> !lll'llUr Ítím{~\tíO
·· Um novo , m é rodo para máximos e mínimos "(}" ,a
assim como rangenres . . :· , 1684 (Turn er Collec-
rion , Universiry of Keele).

não o :Compreendeu e não licou interessado. Porém , em 1682


e 1683, Tschirnhaus publicou no Acta um método para de-
terminar tangentes e uma teoria sobre a quadratura de cur-
vas algébricas. O método não era aplicável universalmente ,
era parcialmente incorreto e muito obscuro. Não obstante,
dy infinitamente Leibniz sentiu que , se ele não publicasse naquele momento
pequena
dx infinitamente
o seu próprio método , poderia perder a prioridade. Portan-
pequena to , em outubro de 1684 ele publicou o artigo intitulado
•- - - - - t ----+ 1-----l "Um novo método para máximos e mínimos assim como
dx finito
tangentes ... " 16 , no qual expôs as regras do seu cálculo di-
ferencial e alguns exemplos de sua aplicação. Exemplos do
uso do seu cálculo integral seguiram num artigo em 1686. 1 7
Daremos em seguida algumas amostras desses dois artigos.
Mas a fim de compreendê-los devemos discutir em primeiro
lugar uma dificuldade que Leibniz tinha que enfrentar ao
publicar seu método. Isso ex plicará parcialmente sua inicial
relutância em publicá-lo .
Leibniz sabia muito bem que seu cálculo era vulnerável de-
vido ao uso de quantidades infinitamente pequenas. Assim ,

16 " Nova meth odus pro maximus et minimi s ... " /11 : A cra erudiror111n .
outubro de 1684.
17 " De geometria recondita ... " ln : A era erudiro r111n. junho de 1686.

62 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


a publicação foi um risco e Leibniz adotou uma tática radical
para enfrentar esse risco: mudou a definição da diferencial.
Como já vimos nos estudos precedentes , a diferencial dy era
a diferença infinitamente pequena entre duas ordenadas su-
cessivas y e uma distância dx infinitamente pequena (veja a
figura) . Em seu artigo de 1684 ele introduziu um segmento
fixo de reta finito , que chamou de dx e definiu a " diferen-
cial" dy como sendo o segmento de reta finito que satisfaz
dy: dx = y: t

tal que dy = L dx (por definição).


f

Leibniz manteve o termo differentia (diferença) para deno-


tar essas novas diferenciais. Agora as velhas diferenciais in-
finitesimais têm a mesma proporção entre si como as novas ,
já que em ambos os casos
dy: dx = y: t.
Portanto as regras do cálculo são aplicáveis tanto às novas
diferenciais quanto às velhas. Assim , escolhendo essa defi-
nição, Leibniz foi capaz de publicar as regras do cálculo
diferencial evitando o problema fundamental da natureza
das quantidades infinitamente pequenas. Uma desvantagem
da nova definição foi a não-aplicabilidade às diferenciais
como ocorre no cálculo integral. Na fórmula Jydx, o dx
não é um elemento fixo de reta finito , mas sim uma dife-
rencial infinitamente pequena. Também o termo diferença
é uma denominação bastante equívoca para o dy no sentido
da nova definição. De fato, no artigo de 1686, Leibniz es-
creveu sobre diferenciais que são. infinitamente pequenas e
continuou fazendo isso em quase todo seu trabalho futuro .
Ele voltou à definição da sua primeira publicação do cál-
culo apenas nos estudos sobre os fundamentos do cálculo.
Depois dessa introdução podemos proceder ao texto.

UM NOVO MÉTODO PARA MÁXIMOS E MÍNIMOS ASSIM CO MO TANG ENTES


NÃO IMPEDIDO PO R Q ANTlDADES NE M FRAC IONA IS NE M IRRA CIONA IS
E U M IMPORTA NTE TIPO DE CÁLCULO PARA ELAS; POR G. W. L.
Sejam dados um e ixo AX e vária curvas , digamos VV, WW, YY ,
ZZ. cujas ordenadas perpend iculares ao eixo sejam cha madas 1•, 11 •,
2 y, z res pectivamente. O segmento AX cortado do eixo é chamado x.
Sejam VB , WC , YD , ZE as tangent es que interceptam o eix o em
B , C, D, E respectivamente. Seja dx uma reta e colhida arbitra ria -
3 mente. A reta que es tá relacionada com dx como v (ou 11•. ou y, o u ~)
está re lacionado com XB (ou XC , ou XD , ou XE) é chamada de
dv (ou chv, ou dy, o u dz) ou as suas diferenças (ou 11·, ou y . ou z). es -
sas con dições temos as seguintes regras do cá lculo :
Se a é constante , então da= O e d (ax) = adx. Se y = v (q uer di ze r,
se a orde nada de qualquer curva Y Y for igual a qualquer ordenada
co rrespo ndente da curva VV) , então dy = dv. Para a adição e a s11b-
traçcio temos : z - y + w + x = v, en tão d (z - y + 1v + x) = d v = d z _:
B
- dy + dw + dx. Para a nwlliplicaçào: d (xv) = xdv + vdx , ou , colo-
cando-se y = xv, dy = xdv + vdx. Não importa se tomamos uma fór-
mula como xv ou a sua letra de subst ituição como y. De vemos notar

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 63


que x e dx são tratados neste cálculo da mesma maneira como y e
dy, ou como qualquer outra letra indeterminada com a sua dife-
4 rença. Deve ser observado também que nem sempre será possível
voltar de uma equação diferencial sem alguma precaução. Algo que
discutiremos em outro lugar.

Agora a divisão: d -v ou ( se z = -v ) , dz = +
- vdy + ydv . 18

y y yy

Notas
1. As "quantidades fracionais ou irracionais" referem-se ao ca-
so de regras para tangentes (por exemplo a de Sluse na p. 40-1)
que foram aplicáveis somente quando a curva foi escrita na
forma (Laiixixi = O). Quer dizer, antes que uma tal regra pu-
2
desse ser aplicada a uma equação como y = -ª-
x+y
- Ja 2 - x2,
·a fração deve ser removida por uma multiplicação e a raiz
por uma quadratura. No método de Leibniz isso não era
necessário (veja a Q.A. 24).
2. Agora segue a definição das diferenciais.
3. Neste ponto o artigo originalmente contém um erro muito
confuso, a saber, ao invés de "XB (ou XC, ou XD, ou XE)"
continha "VB (ou XC, ou YD, ou ZE)". Corrigimos o erro.
4. "Voltar": significa que, para qualquer equação, se pode
achar a equação diferencial através de uma aplicação das
regras. Calcular a equação original a partir da equação di-
ferencial é um outro problema, para o qual não existem re-
gras umversais.
Agora segue uma longa seção sobre> a escolha dos sinais na
última fórmula. A ambigüidade foi causada pela definição
da diferencial de Leibniz, que não associa um sinal à subtan-
gente (veja a figura). Tanto em C quanto em C' a subtan-
gente é tomada positivamente. Por outro lado, ao trabalhar
com as regras do cálculo, os sinais estão sendo introduzi-
dos na fórmula, tal que, particularmente no caso das fra-
ções, deve-se ajustar os sinais por argumentos ad hoc.
Leibniz também menciona a condição dy = O para valores
extremos assim como condição para convexidade, concavi-
dade e pontos de inflexão. Essas condições envolvem dife-
renciais da segunda ordem. Depois disso ele prossegue uti-
lizando as regras dos cálculos:

As potências: dxª =ax•- 1 dx; por exemplo dx 3 = 3x 2 dx. d_!_= - adx;


xª xª+ 1

l _ 3dx
por exemplo, se w = -, entao dw =
x 3 x4

As raízes: d d;r,;-' já
1/7 = !!._b dx ~ '(daí d !jy = 2,;, que neste
y

18 Citado de STRUIK, D. J. A source book in mathematics, Harvard Univer-


sity Press, 1969. p. 272.

64 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


caso a = 1, b = 2), portanto : ~= +~. Mas y- 1 é o

1
mesmo que - ; da natureza dos expoentes numa progressão geo-

. . JT
metnca, e
y
1 1
- = i1..' d br.;ii =
y ~y Vx' b V
- adx
br:;ãIT'.
x•+•
19

Observe que Leibniz restringe as regras aos relacionamentos


algébricos. Ele não menciona as regras para a diferencia-
ção de relações logarítmicas ou trigonométricas; essas apa-
receram num artigo seu de 1693.

Conhecendo-se assim o algoritmo (como posso dizer) deste cálculo,


o qual chamo de cálculo diferencial, as demais equações diferenciais
podem ser encontradas por um método comum. Podemos achar má-
ximos e mínimos, assim como tangentes, sem necessidade de remover
frações irracionais e outras restrições, o que tinha de ser feito de
acordo com os métodos publicados até agora. A demonstração será
fácil para alguém que tiver experiência nesse assunto e quem con-
siderar para o fato ainda não explorado suficiente que dx, dy, dv,
dw, dz podem ser tomados proporcionais às diferenças instantâneas,
quer dizer, aos acréscimos ou decréscimos dos correspondentes
X, Y, V, w, z. ( ... )

Só devemos ter em mente que achar uma tangente significa traçar


uma reta que liga dois pontos da curva numa distância infinitamente
pequena, ou o lado contínuo de um polígono que tem um número
infinito de ângulos, o qual pogemos considerar uma curva. 20

Então Leibniz dá a relação da diferencial como foi definida


no começo do artigo através de diferenciais infinitamente
pequenas ou "diferenças instantâneas". Também a relação
dessas às tangentes está explicada: Leibniz considera a curva
como sendo um polígono de infinitos ângulos; os lados in-
finitamente pequenos desse polígono são as diferenciais do
comprimento de arco que formam as tangentes quando são
prolongados.
Agora Leibniz tratará de um exemplo geral. Ele considera
uma curva que tem uma equação muito complicada, a saber
x
~
(a + bx)(c - x )
+- ------ +
2
ax
Jg 2
+ y2 +
y (ef + fx2)2
y2
+---====== O.
jh +
2 2 lx + mx

Ele deduz a equação diferencial da curva por aplicação das


regras. Ele calcula dy/dx e acha assim uma fórmula pela
qual as tangentes à curva podem ser determinadas. Não da-
remos as fórmulas aqui; são muito complicadas. Mas o leitor
pode notar que esse modo de tratar uma equação (sem re-
mover frações e raízes) provou-se muito conveniente com-
parado com outros métodos.

19 lbid., p. 275.
20 lbid., p. 276.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 65


Q.A. 24
Diferencie o último termo da equação e verifique se o mé-
todo de Leibniz realmente não está comprometido por fra-
ções e quantidades irracionais.

R.A. 24
Seja h 2 + ex + mx 2 u
Então temos
d(/u-1;2) = /d(u-112) + u-112d(y2)

= y2 • - _!_ u- 312du + u-112 • 2ydy


-2
- -1y 2
2
--,,---------,--....,..--,- (e + 2mx)dx +
(h 2 + eX + mx 2) 312
+ 2ydy
jh 2 +ex+ mx 2

O texto seguinte foi extraído do artigo de 1686 "Sobre geo-


metria abstrusa e análise de indivisíveis e ínfimos". Contém
os primeiros exemplos que Leibniz publicou sobre o seu
cálculo integral. Neste texto conciso o leitor encontrará
quatro pontos importantes: contém um exemplo de uma equa-
ção diferencial com a sua solução por integração. Salienta-se
a relação inversa de d e J Justifica-se a escolha do símbo-
lo dx.
Leibniz também realça que o cálculo possibilita escrever as
equações para curvas não-algébricas, considerando este úl-
timo ponto uma das grandes vantagens do seu cálculo.
Ele desenvolveu um método matemático que foi mais abran-
gente do que a análise cartesiana, que ficou restrita às cur-
vas algébricas.

Seja x a ordenada, y a abcissa e seja p o intervalo entre a perpen-


dicular e a ordenada descrita antes. De acordo com meu método
segue imediatamente que pdy = xdx. ( ... ). Se sujeitarmos agora essa
equação diferencial ao somatório, obteremos f f
pdy = xdx (como

potências e raízes em cálculos ordinários, aqui as somas e as di-

ferenças significam que f e d são mutuamente inversas). Daí temos

f pdy = ~ xx. como queríamos demonstrar. Agora prefiro usar dx

e símbolos parecidos ao invés de letras especiais, uma vez que este dx


é uma certa modificação do x. Em virtude disso acontece que -caso
houver necessidade - somente a letra x com as suas potências e as
diferenciais entrarão no cálculo. As relações transcendentes são ex-
pressas entre x e alguma omra quantidade. Curvas transcendentes
poderão ser expressas também por uma equação. Por exemplo, se

66 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


a é um arco, e o seno invertido é x, então a = Jdx: ~ - Se

a ordenada de uma ciclóide é y, então y = J2x - xx + Jdx: J2x - xx


- uma equação que exprime perfeitamente a relação entre a orde-
nada y e a abcissa x. A partir dela é possível demonstrar todas as
propriedades da ciclóide. O cálculo analítico é assim estendido às
curvas que até agora têm sido excluídas pela razão duvidosa de que
elas não seriam convenientes. 21

Notas
1. A relação pdy = xdx segue diretamente da consideração
do triângulo característico (veja a figura). O resultado aqui
deduzido era bem conhecido, já que apareceu na obra de
Barrow; Leibniz só usa-o como exemplo para seu cálculo.
2. Parece que Leibniz refere-se aqui ao uso de letras espe-
cíficas (como "o" e "a") para indicar as diferenciais. Seus
dx e dy têm a vantagem de indicar a relação com x e y res-
pectivamente. Além disso, se as equações para as curvas en-
volverem expressões diferenciais ou integrais, essas equações
ainda envolverão somente x e y como variáveis. Em se-
guida Leibniz dá um exemplo de tais equações.
3. Curvas transcendentes são curvas não-algébricas.

Q.A. 25

Verifique que y = j2x - xx + f dx


j2x - XX
é de fato a
equação da ciclóide.

R.A. 25
Para as coordenadas da ciclóide temos
X
y=u+s
onde u é a ordenada do círculo, s o comprimento de arco
correspondente. Assim
U = j2x - XX

s é o comprimento de areo do círculo, de sorte que

Agora du/dx = (1 - x)/ j2x - xx. Inserimos isso na fórmu-


la anterior e obtemos
ds
dx j2x - xx

21 lbid., p. 282.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 67


tal que

s= I J2xd~ xx
é a equação da ciclóide.
A influência imediata dos dois artigos de Leibniz foi insig-
nificante devido à dificuldade de compreensão enfrentada
pelos leitores da época.

Q.A. 26
Justifique por que os artigos de Leibniz foram dificeis de se
compreender.

R.A. 26
1. A matéria era nova.
2. Existiam erros tipográficos, particularmente na de(inição
da diferencial.
3. O estilo de Leibniz era muitas vezes deliberadamente com-
pacto e quase obscuro (por exemplo a referência às diferen-
ciais infinitesimais).
4. A definição da diferencial foi inconsistente com o seu
nome (segundo a definição no primeiro artigo, a diferencial
não é uma diferença). Também a definição não estava de
acordo com o uso das diferenciais no cálculo integral.

'\
Apesar dessas dificuldades, alguns matemáticos estudaram
e compreenderam os primeiros artigos de Leibniz. Foram
os irmãos Jakob e Johann Bernoulli que dominaram o cál-
culo entre 1687 e 1690. Essa parte da história do cálculo
será tratada na unidade 4.

3.16. CONCLUSÃO

Newton e Leibniz ocupam uma posição central na história


do cálculo e na história da matemática em geral. No final
desta unidade convém estimarmos a importância das suas
contribuições ao desenvolvimento do cálculo. Podemos vi-
sualizar isso melhor comparando as contribuições anterio-
res com o cálculo moderno. Listaremos também as diferen-
ças principais entre os métodos de Newton e de Leibniz.
Considera-se Leibniz e Newton os inventores do cálculo.
Isso significa que fizeram algo essencialmente diferente e mais
do que os seus predecessores. Vimos na unidade 2 que Ca-
valieri, Wallis, Barrow, Fermat e Pascal contribuíram com

68 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


a matemática infinitesimal e que as suas pesquisas perten-
cem à história do cálculo. Por que então se diz normalmente
que Newton e Leibniz são os verdadeiros "inventores" do
cálculo? A defesa baseia-se em três considerações:
(a) Os vários métodos infinitesimais dos predecessores de
Newton e Leibniz eram muito restritos (eles muitas vezes
foram aplicáveis somente para classes especiais de curvas)
e não foram reconhecidos como inter-relacionados. Leibniz
e Newton criaram um sistema coerente de métodos a fim
de resolver problemas sobre curvas (quadraturas, tangentes,
etc.). Seus métodos não dependeram da natureza especial
das curvas tratadas. Portanto o alcance desses métodos foi
mais amplo do que o dos métodos anteriores. Através de
Newton e Leibniz os métodos infinitesimais chegaram a for-
mar uma teoria coerente e poderosa. Em resumo, foi a obra
deles que permitiu falar em cálculo pela primeira vez.
(b) A coerência dos sistemas de Leibniz e Newton foi atin-
gida devido ao reconhecimento do teorema fundamental do
cálculo: a relação inversa entre a diferenciação e a integra-
ção. Através dele reconheceu-se o relacionamento recíproco
entre os problemas de quadraturas e tangentes, que foram
considerados anteriormente como problemas separados.
(c) Newton e Leibniz inventaram um sistema de notação e
de símbolos pelo qual podiam aplicar analiticamente seus
novos métodos, quer dizer, pelo uso de fórmulas ao invés
de figuras e a sua descrição verbal por argumentos geomé-
tricos. Seus métodos foram explicitados na forma de um al-
goritmo claro e simples, um aparato de regras de cálculo
para as fórmulas.

Q.A. 27
Dê exemplos de predecessores de Leibniz e Newton que:
(i) desenvolveram métodos de tangentes e de quadraturas
para uma classe restrita de curvas;
(ii) sabiam sobre a relação inversa entre a quadratura e as
tangentes;
(iii) desenvolveram um sistema de notação.
Considere em cada um dos casos se a pessoa em questão
pode ser considerada como o inventor do cálculo.

R.A. 27

(1) Fermat tinha um método geral e sistemático para a qua-


dratura das parábolas e das hipérboles de graus superiores.
Tinha também o início de um método sistemático para tan-
gentes. Porém o alcance desses métodos ficou restrito, pois
faltou uma notação conveniente.
(II) Torricelli, Gregory e Barrow tinham conhecimento so-
bre o relacionamento inverso entre a quadratura e as tangen-

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 69


tes. Gregory e Barrow publicaram o teorema fundamental,
mas eles se mantiveram no tratamento completamente geo-
métrico da quadratura e dos problemas de tangentes e não
desenvolveram uma notação específica.
(III) Cavalieri introduziu uma notação específica para as
quadraturas. Mas esse método foi restrito demais. Ele não
tinha um método para tangentes e conseqüentemente não foi
capaz de reconhecer o teorema fundamental.

As três prioridades (a), (b) e (c) dos novos métodos infi-


nitesimais formam a justificativa usual de que Newton e
Leibniz inventaram o cálculo. Mas é importante reconhecer
que Newton e Leibniz não inventaram o cálculo moderno
e não inventaram o mesmo cálculo. Existem diferenças fun-
damentais entre a versão do cálculo de Newton e a de Leibniz.
Existem também diferenças fundamentais entre essas duas
espécies de cálculo e a teoria moderna. Listaremos e discuti-
remos agora essas diferenças.

Diferenças entre o cálculo


de Newton e o de Leibniz
Como vimos, o cálculo foi desenvolvido através do estudo
de curvas. Na primeira metade do século XVII, Descartes
introduziu métodos algébricos à geometria mostrando que
as curvas podem ser representadas por equações. Tornou-se
possível usar tais equações para exprimir as relações entre
a abcissa (x) e a ordenada (y). A abcissa, a ordenada e outras
quantidades, tais como a subtangente, a normal, a área,
etc., são chamadas de quantidades variáveis vinculadas à
curva. As diferenças entre a versão do cálculo de Newton
e a de Leibniz devem-se consideravelmente à diferença na
concepção das quantidades variáveis. Essas diferenças são:

I A concepção das quantidades variáveis


Newton considerou as variáveis dependentes do tempo. Ele
aplicou conceitos de movimento; as variáveis foram consi-
deradas como quantidades fluentes. Esses são conceitos me-
cânicos, ou melhor, conceitos cinemáticos. Formulados numa
terminologia moderna poderíamos dizer que Newton con7
siderava todas as variáveis como função do tempo.
Leibniz considerava as variáveis como percorrendo seqüên-
cias de valores infinitamente próximos. No seu cálculo há
pouco uso de conceitos de movimento.

II Os conceitos fundamentais
da fluxão e da diferencial
Intimamente ligada às diferenças na concepção das quanti-
dades variáveis está a diferença no conceito fundamental de

70 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


ambas as teorias. O conceito cinemático de Newton sugeriu
a velocidade ou a taxa de mudança da variável como con-
ceito fundamental: a fluxão.
A noção das variáveis de Leibniz enfatizava, novamente, a
diferencial como a diferença de dois valores sucessivos na se-
qüência. Como as variáveis adquirem novos valores conti-
nuamente, não por saltos, as diferenciais não podiam ser
finitas e tinham de ser infinitamente pequenas.
Observe que Newton e Leibniz usaram idéias que, apenas
indiretamente, foram ligadas aos problemas de quadraturas
e tangentes. Nem o movimento e a velocidade de Newton,
nem as quantidades infinitamente pequenas de Leibniz são
diretamente sugeridos pela configuração da curva, da tan-
gente e da área.

III A concepção da integral, o teorema


fundamental
Newton compreendeu a integração como a tarefa de achar
as quantidades fluentes para as fluxões dadas. No seu cál-
culo, o teorema fundamental - a relação inversa entre a di-
ferenciação e a integração - está, portanto, contido na de-
finição de integração.
De acordo com a sua concepção de que as variáveis per-
correm seqüências, Leibniz compreendeu a integração como
somatório. Portanto, no seu cálculo a relação inversa entre
diferenciação e integração não está contida na definição de
integração.
Para Leibniz o teorema fundamental segue do relacionamen-
to recíproco das seqüências de somas e das seqüências de
diferenças em geral.

IV Quantidades infinitamente pequenas


Leibniz trabalhou com quantidades infinitamente pequenas.
Newton hesitou sobre essas quantidades. Ele as usou, mas
afirmando que seu cálculo era independente delas e que
podia ser dada uma base rigorosa quanto ao conceito da
última razão. A fluxão de Newton não foi uma quantidade
infinitamente pequena, mas uma velocidade finita.

V Notação

Leibniz usou letras distintas ( d, J) como símbolos; Newton


trabalhou com pontos para as fluxões, mas fez pouco uso
de qualquer símbolo para a integração. O simbolismo de
Leibniz deu provas de ter mais sucesso a longo prazo. As
suas principais vantagens sobre o simbolismo de Newton
são:

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 71


1. O uso de !erras distintas como símbolos para a diferen-
ciação e integração elucida seus papéis como operadores.
Por exemplo, é muito mais fácil enunciar o teorema funda-
mental na notação de Leibniz ( fdx = x: d f ydx = ydx)
do que na notação de Newton.

2. É mais fácil incorporar d e f nas fórmulas complicadas.

3. A notação de Newton (tal como a sua concepção das


fluxões) exige que todas as variáveis sejam consideradas como
funções de uma variável - o tempo. Portanto, não pode ser
estendida a situações quando as variáveis dependem de mais
de uma variável independente. A notação de Leibniz pode
ser estendida para cobrir casos de mais de uma variável
independente.

VI Os papéis das figuras e das fórmulas


Provavelmente devido às deficiências da sua notação, o cál-
culo de Newton dependeu mais de figuras e de argumentos
verbais sobre essas figuras. O cálculo de Leibniz superou
isso traduzindo todos os seus argumentos na linguagem de
símbolos e de fórmulas. No desenvolvimento posterior o
cálculo newtoniano ficou mais perto da geometria, enquan-
to o cálculo leibniziano se desenvolveu cada vez mais em
direção à anális€, à manipulação com as fórmulas, inde-
pendentemente de figuras e 'de interpretação geométrica.
Essas são as diferenças principais entre o cákulo de Newton
e o de Leibniz. Veremos na unidade 4 de que maneira essas
diferenças determinaram o desenvolvimento posterior dos
dois estilos de cálculo no século XVIII.

A relação do cálculo de Newton


e de Leibniz com o cálculo moderno
Ambas as espécies de cálculo foram, de fato, sujeitas a mu-
danças fundamentais antes que tivessem uma semelhança
com o cálculo moderno. Esse processo de mudança será des-
crito na unidade 4. É importante, porém, listarmos aqui ex-
plicitamente os pontos principais das diferenças entre o cál-
culo moderno e o cálculo de Leibniz e Newton. Essas di fe-
renças atingem :

I. Funções versus variáveis


O cálculo de Newton e Leibniz utilizava variáveis, as quan-
tidades variáveis ligadas a curvas, tais como as ordenadas,
as abcissas, subtangentes e áreas. O cálculo moderno utiliza
funções, aplicações de um conjunto (de números reais) em
outro. O conceito da função surgiu somente no século XVIII.

72 - CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


2. Diferenciação

No cálculo moderno a operação de diferenciação associa


uma função a sua derivada. Para Leibniz, a diferenciação
associava uma diferencial infinitamente pequena a uma
variável. Para Newton, tomar lluxões significava associar
uma velocidade finita a uma variável. Portanto, a concep-
ção da operação fundamental nos cálculos de Newton e de
Leibniz era totalmente diferente do conceito da diferencia-
ção que está em uso no cálculo moderno.

3. As fundamentações do cálculo
Tanto no cálculo de Newton quanto no cálculo de Leibniz
existiam problemas graves sobre a consistência lógica dos
conceitos fundamentais - a lluxão (definida por razões úl-
timas) e a diferencial (como diferença infinitamente pequena).
No cálculo moderno essas dificuldades quanto aos funda-
mentos são esclarecidas pelo uso de um conceito bem de-
finido de limite. Por isso não encontramos no cálculo moder-
no as quantidades infinitamente pequenas.
Como qualquer progresso matemático de importância, a obra
de Newton e de Leibniz incentivou intensos desenvolvimen-
tos posteriores. O cálculo foi estendido, foi amplamente
aplicado e depois de longas discussões os seus fundamen-
tos foram finalmente concretizados. Esses desenvolvimentos
posteriores serão o conteúdo das unidades 4 e 5.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BüYER, C. B. História da matemática. São Paulo, Ed. Edgard


Blücher, 1974.
CHILD, J. M. The early mathematical manuscripts of Leibniz.
Londres, 1920.
LEIBNIZ, G. W. "Nova methodus pro maximus et minimis ... ".
ln: Acta eruditorum. out. 1684.
LEIBNIZ, G. W. "De geometria recondita ... ". ln: Acta eru-
ditorum. jun. 1686.
NEWTON, ISAAC. Philosophiae natura/is principia mathematica
(Os princípios matemáticos da filosofia natural). Lon-
dres, 1687.
TURNBULL, H. W. (ed.) The correspondence of Isaac Newton.
Cambridge, Cambridge University Press, 1959.
STRUIK, D. J. A source book in mathematics. Harvard, Harvard
U niversity Press, 1969.
WHITESIDE, D. T. (ed.) The mathematical papers of Isaac
Newton. Cambridge, Cambridge University Press, 1967.
WHITSIDE, D. T. (ed.) The mathematical works of Isaac
Newton. New York, Johnson Reprint, 1964.

ORIGENS E DESENVOLVIMENTO DO CÁLCULO - 73


Agradecimentos

Sinceros agradecimentos às seguintes fontes pelo ma-


terial utilizado nesta unidade:

Texto
Harvard University Press, para excertos do D.J. Struick
(ed. ), A source book in mathematics 1200-1800 ©
copyright 1969 by the President and Fellows of Harvard
College; Toe Johnson Reprint Corp., New York, Cam-
bridge University Press e o editor para D.T. Whiteside
(ed.), The mathematical works of Isaac Newton, Cam-
bridge University Press, 1964; The Royal Society para
excertos de H.W. Turner (ed.) The correspondence of
Isaac Newton., v. II, Cambridge University Press, 1959;
Cambridge University Press e ao editor para tabelas
e excertos do The mathematical papers of Isaac Newton,
Cambridge University Press, 1967.

Ilustrações
University of Keele; Mansell Collection; Ronan Picture
Library; Royal Astronomical Society; Trinity College,
Cambridge.

CURSO DE HISTÓRIA DA MATEMÁTICA


Origens e Desenvolviménto do Cálculo
Unidade 1 A Matemática Grega
MARGARET E. BARON

Unidade 2 Indivisíveis e Infinitésimos


MARGARET E. BARON

Unidade 3 Newton e Leibniz


H. J. M. Bos e MARGARET E. BARON

Unidade 4 O Cálculo no Século xvm: Fundamentos


H. J. M. Bos
Unidade 5 O Cálculo no Século xvm: Técnicas e Aplicações
H. J. M. Bos

Fotolitos e Impressão

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HAMBURG
Aven<la Bogaert, 64
Vila das Mercês São Paulo
~r,,•;,t~-0233

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