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Muitas vezes discussões sobre raça, cor e etnia entram em nossa sala
de aula apenas quando episódios de racismo são amplamente explorados pela
mídia. O debate acaba ocorrendo até mesmo sem a influência do professor,
pois tais fatos causam comoção, atingindo também nossos alunos, os
quais passam a manifestar suas opiniões dentro do contexto escolar. Não há
nada de errado nisso, pois o racismo infelizmente existe sim, e ignorá-lo
quando o assunto surge em nossa sala de aula, seja em uma situação ou em
uma menção, não é a melhor estratégia.
O que verdadeiramente apontamos como equivoco pedagógico ocorre
quando a abordagem do tema “racismo” é deflagrada pelo próprio docente.
Iniciar um projeto para introduzir questões étnico-raciais, por exemplo, a partir
de situações de cunho racistas, mesmo que as intenções iniciais fossem
outras, acaba reforçando um estereótipo e dando evidência ao negro apenas
em situações desfavoráveis a ele.
Ao nos dispormos criar uma nova ambiência racial na escola,
precisamos oferecer aos alunos, elementos que os levem a criar vínculos
identitários positivos com as diferentes raças. Tais vínculos, além de contribuir
para sua constituição, podem aumentar sensivelmente a autoestima do sujeito.
No entanto, cabe salientar que a maioria dos espaços sociais, dentre
eles a escola, estão impregnados por referências positivas de uma única raça
(branca), fato que empodera os indivíduos que tem esse pertencimento racial e
fragiliza as relações dentre os demais. Afinal, com todas as características e
menções favoráveis sempre ligadas a um determinado conjunto de pessoas,
torna-se fácil identificar-se e até mesmo querer pertencer ao grupo dominante.
Um exemplo clássico dessa ambiência racial dominante pode ser
percebido ao avaliarmos os resultados do famoso teste das bonecas.
Idealizado pelo psicólogo americano Kenneth Clark nos anos 40 e registrado
pelo cineasta Kiri Davis nos anos 2000, o experimento consiste em questionar
crianças negras sobre qual das bonecas detém qualidades e qual das bonecas
apresentam defeitos.
https://www.youtube.com/watch?v=XyilexcWbSE
Para ilustrar nossa visão de que somente com uma nova ambiência
racial poderemos modificar o contexto racista que encontramos em muitas de
nossas salas de aula, trazemos o relato real de uma professora que aplicou o
teste:
No final do ano de 2013 realizei a testagem “Clarks dolls test” com meus
alunos do 1° ano do 1° ciclo. A ideia de realizar a testagem surgiu por dois
motivos, primeiro a observação de que a imagem de negro que os alunos
apresentavam nas nossas conversas era negativa, na maioria das vezes, seja
por realizarem associações pejorativas de determinadas ações às pessoas
negras (é o que rouba, o que mata, o dono da boca), ou por julgarem as
pessoas negras incapazes de ocuparem certos lugares (como professora,
princesa e herói por exemplo).
O outro motivo que me levou a realizar a testagem foi o questionamento
de algumas colegas de escola quando foi apresentado um vídeo com o “Clarks
dolls test” quanto à validade do teste, já que no estudo para o qual ele foi
idealizado, foram entrevistadas apenas crianças negras. Minhas colegas
duvidavam da idoneidade do teste por esse motivo, sem entender que o que o
pesquisador buscava era identificar os efeitos do racismo na autoestima da
criança negra. Diante disso busquei os textos que originaram a pesquisa,
traduzi e elaborei protocolos em português e realizei a testagem com uma
pequena amostra de alunos.
Kenneth Clark foi um psicólogo negro norte americano que pesquisou os
efeitos da segregação racial (vivida nos EUA) na autoestima de crianças
negras através de uma experimentação sobre estereótipos, que ficou
conhecida como “The Clarks Dolls Test” ou “The Clarks Dolls Experiement”. O
teste consistia em realizar uma série de perguntas para a criança tendo o
auxílio de duas bonecas, uma negra e uma branca, que a criança deveria
apontar. A ordem das perguntas no teste de Clark é importante para que as
respostas das crianças possam ser as mais sinceras possíveis, sem que o fato
de identificar-se com uma boneca ou outra possa exercer influência na sua
escolha. Sendo assim, preparei o protocolo abaixo para que as crianças
respondessem com o apoio de duas bonecas conforme o Clarks Dolls Test
original.
Para fazer minha reflexão neste relato, selecionei três sujeitos que
representam a maioria das respostas obtidas e uma exceção, que se faz muito
interessante de observar. Vejamos os protocolos de cada um (os dados de
identificação foram omitidos para preservar as crianças sendo identificadas
apenas um código, as idades e a auto-declaração de cada um).