Você está na página 1de 60

FUNDAMENTOS

DA PRÁTICA ORACULAR COM O TARÔ

KELMA MAZZIERO

Revisão Heitor Pinheiro


Conteúdo
1 INTRODUÇÃO

2 PROFISSIONAIS E PRATICANTES

3 CLIENTES e CONSULENTES

4 A LEITURA NA PRÁTICA

5 O LUGAR DO ORÁCULO

6 ÉTICA E RESPONSABILIDADE

7 FUNDAMENTOS

-2-
Introdução
A leitura oracular com o tarô demanda, antes de qualquer coisa, uma relação entre
profissional e consulente. Isso não significa que há a necessidade de se ter uma amizade ou
vínculo emocional entre os dois, mas que, a partir do momento em que o oráculo se torna
um mediador entre quem o interpreta e quem busca orientações, se estabelece uma relação
de confiança. Para além disso, o tarô propicia a oportunidade de ambas as partes dessa
relação relembrarem a si mesmas o quão comprometidas, responsáveis e humanas elas são.

Meu objetivo com esse pequeno livro é abordar E não à toa vou disponibilizá-lo de modo
um tema ainda pouco debatido na área oracular: a acessível, pois da mesma maneira que o acesso à
prática e a leitura propriamente ditas. Com isso, não internet, às redes sociais ou mensageiros é fácil
pretendo criar uma cartilha, tampouco um livro de para a maioria das pessoas, assim também deve
regras ou normas, pois tenho plena consciência de ser o acesso às informações sobre o que se
que um dos aspectos mais encantadores da prática pratica, divulga, e até o que se promete nesse
oracular é a diversidade de propostas às quais ela ambiente virtual. Não vou me referir apenas à
pode se adaptar. Porém, considerados esses nossa existência online, mas darei atenção
elementos, se faz necessário um comprometimento especial ao assunto porque é o que nos trouxe a
mínimo com o tema e a consciência da uma realidade mais conectada, mais informada e
representação oracular no século XXI. simultaneamente mais exposta e sensível.

Quando habitávamos um mundo offline, tínhamos Por último, vale lembrar que meu foco nessa
outras preocupações e também outra relação com a proposta é o tarô. O tarô que estudo, ensino e
leitura oracular. Atualmente, com praticamente utilizo para aconselhamento desde sempre. Longe
todas as pessoas online, é fundamental rever essa de querer ditar regras, é a partir do meu olhar
questão, bem como as relações que se dão a partir profissional que escrevo essas linhas, na
do oráculo e tudo o que isso significa. Não à toa esperança de contribuir para a profissão que tanta
escolhi esse título: Fundamentos da Prática Oracular coisa me trouxe e que gosto por demais.
com o Tarô.

Sobre mim e meu compromisso no tarô


Sou Kelma Mazziero, taróloga e pesquisadora da área comportamental.
Ambas as atuações, ao contrário de gerarem cisão, se complementam muito
na minha prática. Desde o começo dos anos 2000, trilho um caminho que
visa a desmistificação e a atualização do tarô no Brasil, e acredito que através
da responsabilidade, do comprometimento e da conscientização se constrói
uma prática significativa. Saiba mais sobre mim em meu site e redes sociais.

-3-
2. Profissionais e praticantes
Nossos desafios e responsabilidades
Como você atende?

Há uma preocupação constante na realidade de quem pratica ou de quem atende


profissionalmente com o tarô: jogar bem. Se a gente pensar com atenção sobre essa
questão, podemos notar que se abrem duas reflexões a esse respeito. A primeira seria
sobre o que significa, efetivamente, "jogar bem". Para alguns, jogar bem é "acertar tudo",
seja previsão ou interpretação da situação propriamente dita. Para outros, jogar bem é ter
resposta para tudo e, de preferência, não tropeçar na hora de traduzir um jogo. A cada
nova enquete que faço em meu Instagram, percebo um conceito diferente sobre o que
seria jogar bem.

Na realidade, essa situação só comprova que não há um consenso quanto ao que


seria uma consulta ideal. Mas, cuidado. Isso não quer dizer que todos jogam bem,
tampouco que ninguém joga. Na verdade, essa reflexão só nos mostra que há muitas
nuances na prática oracular e que dificilmente uma cartilha ou um manual de regras
cobriria todas as possibilidades, determinando o que é certo ou errado, o que se deve ou
não fazer durante a consulta. Quando, mais à frente, essa discussão se somar ao tema
ética, então, teremos mais elementos para agregar nesse debate – ou mais dor de cabeça
para delimitar o que fazemos e como o fazemos. 

A segunda reflexão vai um pouco além da performance que, em tempos de mídias


sociais, acaba ganhando muito mais importância do que deveria. Isso porque talvez a
coisa mais importante da prática oracular não seja o ranking de acertos e erros do
oraculista[1], mas como esse mesmo oraculista atende e se relaciona com as pessoas
que o procuram. Em outras palavras, a questão não é apenas quando se deve começar a
atender ou se já atende pessoas suficientes, mas como conduzir seu atendimento e,
especialmente, como construir a relação com a pessoa que está do outro lado.

[1] Muito difundido entre os interessados no tema, esse termo vem sendo utilizado nos últimos anos, no meio
oracular, para designar aqueles que têm o domínio de uma prática divinatória. Trata-se uma palavra relativamente
recente em língua portuguesa brasileira, ainda não dicionarizada, mas que já compõe o vocabulário técnico da
área. Neste livro, oraculista normalmente será usado no contexto da cartomancia, mas pode ser utilizado também
para qualificar praticantes de outras artes divinatórias. (N.R.)

-4-
Como mencionei na introdução desse livro, o tarô é uma ponte, um mediador entre
oraculista e consulente. Portanto, sem uma relação, dificilmente essa prática terá
consistência. É nesse momento que adentramos um território delicado, que é a demanda
cada vez mais alta por consultas online, realizadas à distância, e que muitas vezes
inviabiliza um vínculo mínimo entre nós e a aqueles que atendemos. Mas antes que você
ache que vou condenar o trabalho à distância, quero reiterar minha adesão total a esse
esquema de trabalho, vide o fato de eu estar na modalidade online, quase que
exclusivamente, desde 2006.

Sendo assim, não é uma questão de ser a favor ou contra o trabalho virtual. Polarizar
na hora de refletir sobre nosso trabalho é apenas uma forma de dispersar nossa atenção
dos pontos relevantes. Refletir é justamente não se desesperar na busca por uma
resposta, especialmente quando queremos evitar uma resposta taxativa ou unilateral. O
fato é que, antes da pandemia, havia uma resistência muito maior, por parte de
profissionais e oraculistas, em trabalhar online. Contudo, a pandemia da covid-19 obrigou
muita gente a reformular seu modo de trabalho e se ajustar para seguir realizando sua
atividade de alguma maneira. Isso aumentou o número de profissionais disponíveis,
expandiu propostas, ampliou a qualidade e a quantidade de conteúdo à disposição. Ao
mesmo tempo em que a interação nas redes aumentou, a exposição igualmente cresceu,
e, com isso, a sensibilidade se tornou ainda maior. Não à toa, muitas vezes nos pegamos
receosos de escrever, divulgar e publicar sobre o nosso estilo de trabalho, ou mesmo de
emitir opinião sobre determinados assuntos.

       Não estou aqui para discutir os efeitos da superexposição nas redes nem para definir
a melhor maneira de nos comunicarmos. Contudo, não há como ignorar o peso dessa
realidade sobre o saldo de quem nos tornamos profissionalmente nos últimos anos. E na
hora de pensar sobre o nosso papel, devemos também refletir sobre esses aspectos que,
mesmo sem a gente perceber, acabam moldando o que oferecemos e como nos
posicionamos. Chegamos, assim, à questão que coloquei como fundamental
anteriormente: na realidade em que vivemos atualmente, o como pode ter mais
importância do que o "quando" ou "quantos".

-5-
Veja bem, saber jogar e ter segurança na prática oracular deve ser algo inegociável,
pois a reflexão sobre o como se atende só acontecerá depois que houver condições para
isso. O argumento aqui se refere muito mais a não estagnarmos em conceitos sobre a
performance e esquecermos do aspecto humano que existe por trás da nossa prática de
leitura. Às vezes, a preocupação  em brilhar na consulta ocupa tanto espaço que deixa o
consulente em último plano, bem como a relação que se dá entre as duas pessoas que
compõem o atendimento, que deveria ser devidamente trabalhada para ganhar o mínimo
de significado.

      Vale muito a pena nós colocarmos esses aspectos em perspectiva para repensar o
quanto estamos nos concentrando unicamente em nossa capacidade e esquecendo de
outras coisas igualmente importantes, como a relação que devemos estabelecer com
consulentes e a dinâmica do atendimento propriamente dito.

    Atualmente, contamos com uma variedade de recursos que nos auxiliam nas
consultas, tais como as próprias redes sociais, plataformas que permitem a gravação das
leituras em áudio ou em vídeo e interações em tempo real. Como exemplo, podemos
citar o Zoom, Skype, Meet etc., sem contar os mensageiros, como o WhatsApp e o
Telegram, que também abrem um leque de opções, desde um atendimento por texto até
atendimentos por chamada de voz, de vídeo ou por envio de áudios. É mais válido nos
atermos, portanto, ao como iremos atender e como estabeleceremos uma interação
mínima com os consulentes ao invés de seguirmos invalidando essas alternativas que
não vão deixar de existir e que, justamente por isso, devem ser utilizadas
responsavelmente.

      Tenho o hábito de formular perguntas e abri-las para interação nas redes sociais,
principalmente no Instagram, onde questiono sobre alguns temas relacionados ao tarô e
debato com alunos, clientes e colegas sobre a prática oracular. Recentemente, ao abordar
um tema sugerido por um colega, obtive um retorno curioso. Ao questionar ao público se
se sentiam pressionados a entregar conteúdo nas redes, mais de 70% das pessoas
responderam que sim. Essa resposta foi seguida por outras ainda mais interessantes: 65%
das pessoas afirmou já ter ficado exausta de postar nas redes, 54% afirmou sentir que em
redes sociais a concorrência parecia desleal, 92% afirmou já ter se sentido culpada por
não saber vender seu trabalho e, por fim, 72% das pessoas afirmou acreditar que teriam
maior retorno profissional caso soubessem se vender melhor em ambiente virtual.

-6-
Diante desses resultados, não devemos assumir a postura de que então a solução é
se afastar, mudar de profissão ou sair das redes. Sabe porque essa atitude apressada não
funciona a médio e longo prazo? Porque estamos todos nas redes. Vide o resultado de
uma das questões que elaborei, em que perguntava se essas mesmas pessoas buscavam
acessar conteúdos em redes sociais e 73% respondeu que sim. E aqui, vale um adendo:
nessa mesma questão, outros 23% responderam que só buscavam conteúdo nas redes
se acreditasse ser necessário. Ou seja, temos nesse número mais pessoas que
consideram as redes um espaço para informação, ainda que seja somente quando
necessário.

Usando essa breve amostragem como exemplo de como estamos nos relacionando e
como nos identificamos profissionalmente nas redes, fica o dilema: o que fazer ante um
cenário em que muitos estão exaustos e outros tantos se sentem insuficientes? Minha
sugestão fica sempre a cargo da reflexão. Desse modo, aconselho que antes de entrar
nesse vórtice, pergunte a si mesmo o que quer das redes. Procure ser o mais sincero
possível para, então, seguir em direção a uma nova questão: você quer ser um oraculista
ou um influencer? Não há problema em querer ser as duas coisas. Mas você só
entenderá o que faz sentido (e o que não faz) depois que souber qual o seu objetivo e, a
partir disso, o que é possível ou não ser feito para o seu público.

-7-
   Para se profissionalizar, é necessário
estudo teórico e prático. Não se
aprende tarô em universidades, e a
formação se dá gradativamente,
através de cursos livres.

Some text

A profissionalização
Há décadas, vemos estudiosos e entusiastas
defendendo a criação de um sistema
educacional que contemple um ensino formal
do tarô e garanta diplomas ou certificações
com o mesmo peso de um reconhecimento
universitário. Do outro lado, vemos pessoas
radicalmente contra essa proposta. É a eterna
briga entre manter um tarô informal versus
um tarô erudito. Numa ponta, temos quem
afirme a importância de o tarô ser aceito como
estudo formal, de outro, pessoas receosas de
que o tarô passe por um processo de
cientifização. Vale dizer que tarô não é ciência,
Isso não precisa ser um problema desde que portanto, não há o perigo de ser cientifizado.
estejamos comprometidos com esse saber. É Contudo, apesar de não ser ciência, o tarô é,
preciso tempo, persistência e amadurecimento sim, passível de estudo científico. Vide tantos
na prática. Estar pronto para atender envolve um oraculistas que transitam em ambiente
processo gradativo e consciente. Não existe uma acadêmico, pesquisando e produzindo artigos
pessoa ou avaliação que garanta que um tarólogo científicos ou publicações, além de
tenha condição de atender profissionalmente, dissertações de mestrado e teses de doutorado
mas é possível estudar e praticar, sabendo que a em que o tarô é tema. A questão não é qual
arte oracular é uma escolha profissional, e não escolha de estudo é melhor, mas o seu grau de
uma alternativa para quem não tem outra opção. comprometimento.
-8-
O que complementa a profissionalização oracular
1. Conhecer os limites e as possibilidades da prática oracular contemporânea

Assim como tudo o que foi dito até aqui, o entendimento sobre o que uma consulta
propicia ao consulente e o reconhecimento das limitações da leitura devem estar claros
para ambas as partes dessa relação. Um oraculista pode fazer muito por um consulente,
mas nem por isso terá condições de fazer tudo – daí a importância de falar sobre os
limites. Não apenas os limites que existem, efetivamente, mas os limites que nós
podemos estabelecer para oferecermos algo possível para quem nos procura. Nesse
sentido, as redes sociais potencializaram as inseguranças, pois tanto se promete que
acabamos por pensar que o que fazemos não é tão bom ou não aparece tanto. Mas não
devemos seguir por esse caminho, já que a leitura oracular carrega muito de quem a
gente é. Desse modo, comparar-se com outras pessoas pode ser um tiro no pé. Por esse
motivo, proponho fazer uma distinção para clarear um pouco essa situação: se comparar
com colegas é bem diferente de ter referências profissionais. Reflita sobre isso e em
pouco tempo você verá que grande parte da preocupação estava direcionada para o
ponto errado. Conheça seus limites, definindo o que você não faz e o que não quer fazer,
e assim poderá informar as pessoas que te procurarem sem acanhamento. A
transparência é um fator primordial em nosso trabalho. Logo, os limites devem ser claros
para que todos, oraculista e consulente, estejam cientes do que é possível ou não ser
feito em determinada consulta. Da mesma maneira que sabemos que uma consulta não
faz milagres, devemos saber e informar o que não podemos ou não queremos oferecer a
partir da nossa prática.

Em nosso trabalho, é fundamental esclarecer e disponibilizar informações sobre o que


fazemos e o que não fazemos. Uma vez que o tarô é plural e permite utilizações diversas,
com abordagens também distintas, um consulente só saberá quem é o profissional mais
adequado para atendê-lo a partir do momento em que souber o que esse oraculista
aborda e o que não aborda. Em minha proposta de atendimento, por exemplo, esclareço
que minha abordagem é interpretativa, determino duração e valor da consulta, esclareço
o meu papel direcionado para aconselhamento e orientação. Além disso, defino os temas
possíveis no meu atendimento, já que nem todos os profissionais abordam tudo,
incluindo assuntos como gravidez, traições, mortes, simpatias ou feitiços, dentre outros, e
também aviso que não trabalho com vidência nem vínculos religiosos ou espiritualistas.
Esses são alguns dos limites e possibilidades relevantes para esclarecermos a quem nos
procura. Não há um número certo de um ou outro, nem temas obrigatórios. O que deve
existir é a transparência na explanação da atuação profissional para que isso contribua
nas informações de modo geral, além de permitir que os consulentes escolham qual
profissional os atenderá.

-9-
2. A atualização do nosso papel profissional mediante o público

Assim como a linguagem acompanha a vida em sociedade, a leitura oracular – que


tem uma forte afinidade com a linguagem em vários sentidos – também acompanha o
avanço social e comportamental. Em outras palavras, as leituras feitas há décadas, que se
concentravam em analisar casamento para as moças, trabalho para os moços, filhos para
os casados e vida longa às pessoas na maturidade, hoje se mostram adaptadas a uma
realidade diferente. Veja bem, os dilemas existenciais do ser humano seguem os mesmos.
Mas o cotidiano e a maneira de viver mudaram, fazendo com que hoje o foco da moça
que busca a leitura vá além do casamento, o interesse do moço não se resuma ao lugar
onde trabalha ou à profissão herdada de seu pai, bem como os casamentos podem ser
analisados independente do desejo de se ter ou não filhos, além da estimativa de vida
que se estendeu e que permite que não se espere um ultimato de morte natural aos 40
anos de idade. Com as mudanças na sociedade, mudam também as ferramentas que
refletem essa mesma sociedade. Em função disso, o nosso trabalho informativo ganha
mais atenção, pois o imaginário social ainda carrega uma impressão da prática oracular
que, atualmente, não procede e nem se encaixa no que efetivamente se faz. É nesse
mesmo imaginário que reside a ideia de que a pessoa que lida com oráculo falará de
forma metafórica ou apocalíptica, que verá o futuro em mínimos detalhes, que
certamente dará notícia ruim ou que, no pior cenário, é uma picareta mentirosa. Já
desenvolvi, inclusive, artigo científico abordando esse aspecto e refletindo o quanto
desse imaginário é parte da memória social e o quanto é parte dos próprios profissionais
(alguns, não todos) que insistem em publicar promessas e alimentar essa
espetacularização caricata do que de fato podemos oferecer. Não à toa, costumo frisar
sempre que possível a necessidade de nós, profissionais, informarmos e
conscientizarmos como for possível. Às vezes, o que é óbvio para nós é uma grande
novidade para alguém que nunca cogitou fazer uma consulta oracular. 
 
Nesse ponto, as mídias e as redes sociais podem ser uma ótima via, pois o acesso à
informação ficou mais fácil e o trânsito de pessoas permite que nos esforcemos para
apresentar algo justo, coerente e responsável. Em contrapartida, nesse mesmo ambiente
virtual, é possível encontrar propostas fantasiosas e distorcidas – e aqui, não me refiro à
pluralidade, mas ao imediatismo perigoso da internet que promete formar pessoas em
um dia ou garantir felicidade imediata. Por isso, a informação segue sendo o único
caminho para termos um cenário mais próximo daquilo que é possível fazer com um
oráculo em pleno século XXI.  A internet ampliou e facilitou conexões, acelerou
processos, encurtou distâncias, mas nem por isso nosso trabalho deixou de demandar
preparo e responsabilidade. Os tempos mudaram, nós mudamos e a atualização para o
que fazemos é inadiável.

- 10 -
3. A subjetividade da relação entre oraculista e consulente

Cada consulta é única. Costumo dizer que, se a gente começa a se repetir, isso é sinal
de falta de repertório, e carece reciclar conhecimento para ampliar visão e arejar o saber.
Se cada consulta é única, a cada jogo a gente terá novos desafios pela frente, inclusive,
por esse motivo, não adianta muito decorar significado ou tentar definir um único
sentido à carta. O jogo é irrepetível porque as pessoas são irrepetíveis, logo, cada relação
será construída à sua maneira. Oferecemos as informações, definimos limites e
possibilidades, atualizamos, mas cada pessoa lidará à sua maneira com aquele jogo
singular. Isso definido, fica a dica: o público não deve conhecer nossas dificuldades
pessoais relacionadas à nossa função, ou seja, evite publicar em rede social reclamação
de cliente, fuja de analisar jogos de colegas que criem confronto de opiniões, não
exponha publicamente quem confiou em você, ainda que essa pessoa desafie sua
paciência ou sua ética. Uma coisa é a relação que temos com o consulente, outra coisa é
como lidamos com a forma de ser dessa pessoa e, principalmente, como lidamos com os
assuntos que ela nos traz em consulta. Não é porque existe gente que expõe seus
próprios jogos e consultas nas redes que devemos seguir esse modelo, pois sabemos
bem que um jogo é o retrato de alguém naquele determinado momento. Esse fato,
inclusive, é curioso porque da mesma forma que não vou postar nas redes uma foto da
minha limpeza e profilaxia bucal, não vou postar foto do jogo de um consulente, nem
desabafar a respeito dele para todos verem. A leitura é pessoal, íntima e intransferível. E
as questões que temos (ou que desenvolvemos) em relação aos consulentes devem ser
tratadas também de forma discreta.

Nosso ofício é cansativo, exigente e desafiador em todos os sentidos. Mas qual ofício
bem feito não o é? E digo isso, tanto na maneira como somos caricaturados quanto no
estudo oracular, que demanda investimento e tempo, bem como na própria consulta, que
exige da gente total concentração e comprometimento. E, por sermos seres humanos,
muitas vezes desempenhamos o nosso trabalho enquanto enfrentamos em nossas vidas
pessoais problemas sérios e complicados. O que eu sugiro? Que todo oraculista tenha
suporte terapêutico, independente de qual seja sua preferência. Pode ser psicólogo,
psicanalista, terapeuta holístico ou terapeuta alternativo. Para quem se orienta por um
viés espiritualista ou religioso, tenha alguém desse ambiente que lhe ampare e dê apoio.
Não importa a via que você escolher, não deixe de se cuidar, pois sem isso ficará
extremamente difícil dar conta de um trabalho tão cheio de minúcias e nuances como o
nosso. Juntando tudo o que envolve ser oraculista no Brasil com uma superexposição nas
redes sociais, ficamos constantemente fragilizados. Daí a necessidade de termos suporte
para conseguirmos sentir e compreender completamente o que é nosso e o que é do
outro. Só assim conseguimos nos profissionalizar, no sentido de assumirmos o lugar de
oraculistas diante do consulente.

- 11 -
Ainda sobre a interação
Recentemente, abordei nas redes um tema
sugerido por uma colega: a questão da saúde
mental no cenário da consulta, tanto para
quem busca o oráculo quanto para oraculistas.
Ao lado e abaixo deixo sugestões.

Equilibre Em alguns países da Europa, colegas já


1 sua vida pessoal e profissional. definem, em suas informações preliminares
Use as redes com consciência sobre a consulta, os elementos que ajudam a
restringir a prática oracular no caso de
Diferencie pessoas que estejam com indícios de forte
2 suas expectativas das
trauma, sob efeito de drogas ou fortes
medicações, ou ainda, que estejam em
expectativas dos consulentes
choque e enfrentando situações extremas.
Creio que seja um ponto importante a ser
Respeite
considerado, já que não somos habilitados a
3 os limites alheios e os seus tratar ou diagnosticar consulentes. Além
disso, parece prudente evitar potencializar
qualquer uma dessas situações a partir de
Humanize uma leitura oracular. Logo, fica cada vez mais
4 a prática e tenha cautela com a clara a importância de delinear os limites da
instrumentalização consulta, incluindo determinados casos de
consulentes que demandam o suporte de
outras áreas.

" Um detalhe importante: a ansiedade pode


fazer parte da consulta, porém, ansiedade
extrema antes, durante ou depois requer

"
A leitura oracular não é uma indicação
atenção. Os extremos, na prática oracular,
para todo e qualquer momento.
não funcionam e geram desgaste mútuo.

- 12 -
Entender a maneira como se pratica a leitura oracular é fundamental para observar os
aspectos de informalidade que eventualmente podem gerar experiências insatisfatórias e
disfuncionais. O conhecimento técnico, sem dúvida, carrega grande importância.
Contudo, sem estabelecer a forma como isso será colocado em prática, a técnica se
enfraquece. Considere nessa construção os jogos que você tem conhecimento suficiente
para utilizar, a duração da consulta, se haverá espaço de perguntas ou dúvidas, além de
definir sua forma de comunicar ao consulente o que interpreta, a conduta diante do
oráculo, dentre outras formas que podem vir a compor a leitura oracular na prática. Esse
modus operandi ninguém pode fazer por você, tampouco adiantaria copiar ou reproduzir
de outra pessoa, pois é justamente o que tornará o seu atendimento único e
personalizado. Essas definições independem da modalidade, online ou presencial, pois,
ainda que seja à distância, a relação entre profissional e consulente deve ser valorizada,
bem como, garantir que a consulta tenha estrutura para estabelecer uma interação
produtiva – da maneira que for possível – construindo em cada atendimento um
processo que tenha começo, meio e fim.

Ainda sobre a maneira como você definirá a sua consulta e sobre as diferentes
possibilidades de conduzi-la, cabe um breve comentário sobre a ritualística do tarólogo
no atendimento. Ao longo desses anos de experiência com a prática oracular, já tive
rituais explícitos para ler tarô. Atualmente, meu ritual é não ter ritual. Para mim, a
importância do trabalho interpretativo é tamanha, que a própria repetição do
procedimento de consulta tem o efeito de mantra. Conforme recebo meu cliente, explico
o funcionamento do atendimento, ouço suas questões e busco um caminho. Ali,
reproduzo, sem cansar, minha ritualística. Não há um modo certo ou errado, há o seu
modo de sacralizar o seu trabalho.

O preconceito com rituais é desnecessário, pois todos temos um, ainda que o ritual
seja não ter um ritual. Todo profissional tem uma forma de atuar em seu trabalho e,
normalmente, tem sua ritualística: os horários e os dias que prefere atender, onde se
sente melhor, as roupas que escolhe usar, os hábitos que repete e através dos quais se
sente melhor trabalhando. Ritual é a repetição significativa de gestos ou costumes. Todos
temos nossos rituais. Logo, é de sua responsabilidade a construção e a manutenção da
sua ritualística. Desmistificar o sentido disso é entender que ritual é justamente aquilo
que carrega um valor para nós e que deve ser respeitado, seja ele praticado
espiritualmente ou profissionalmente. Portanto, da mesma maneira que é você quem
toma a decisão de atuar profissionalmente com oráculo, a decisão de definir ou não um
ritual para a leitura também é sua.

- 13 -
4. As diferentes abordagens 

O termo abordagem pode ter mais de um significado. Abordagem pode ser a maneira
como o profissional aborda seu consulente, ou seja, a maneira como adentra os assuntos
e trata o cliente. Contudo, abordagem pode ser também o estilo de trabalho. Para falar
sobre as abordagens, vou utilizar o conceito de um autor que gosto bastante, Atul
Gawande. Esse autor não fala sobre tarô. Na verdade, ele é um médico que atualmente
reside nos Estados Unidos e que escreve sobre a importância da humanização na prática
da medicina. Mas o que um médico tem a ver com tarô? Gawande escreveu, em seu livro
Mortais: Nós, a medicina e o que realmente importa no final, publicado pela editora
Objetiva, que ele percebeu que os médicos têm três tipos de abordagem na prática: a
paternalista, a informativa e a interpretativa. Cada uma delas tem uma função e segue o
estilo de prática do profissional. Grosso modo, o profissional com abordagem paternalista
seria aquele que prefere comandar a relação com o paciente, determinar o que deve ser
feito e seguir o esquema que julga ser o mais correto. Já o profissional com abordagem
informativa tende a ser aquele que repassa as informações que sabe e todas as
informações ao seu alcance, e deixa que o paciente tome a decisão e faça a escolha a
partir do que foi informado. Por último, o profissional com abordagem interpretativa é
aquele que prefere conversar e que, além de dar respostas, também faz perguntas. 

Imagino que você já deva saber onde quero chegar partindo desses conceitos. Vi
nesses três tipos de abordagens escolhas muito semelhantes às que fazemos na prática
oracular, claro, dadas as devidas distinções. Se um profissional se orienta por um viés
espiritualista, religioso ou secular, se prefere atender online ou presencialmente, se segue
uma linha preditiva, terapêutica ou orientadora, isso fala mais sobre as escolhas pessoais
para atuar na profissão como oraculista. A abordagem, por outro lado, está mais
relacionada à conduta que o profissional – consciente do que faz e munido de suas
escolhas – irá adotar em seu dia a dia de atendimento. Numa associação livre, entre os
conceitos do autor e as condutas de nossa profissão, podemos pensar que o oraculista
paternalista é aquele que gosta de jogar e analisar seu jogo sem que o consulente
precise dar dado algum sobre o que deseja na leitura. Assim, o profissional utiliza sua
ferramenta para definir a leitura de modo a passar segurança para o consulente,
justamente por não precisar de qualquer interação para realizar a consulta. Já o oraculista
informativo tende a ser aquele que se ocupa especialmente das técnicas que aprendeu
ou desenvolveu para não apenas responder, mas levantar o máximo de informações que
puder, a fim de abrir campo para que o consulente tome suas decisões a partir do que foi
analisado. O interpretativo, por sua vez, é aquele que busca o diálogo para definir o jogo
e contextualizar a leitura dentro da realidade que lhe foi trazida pelo consulente, às vezes
assumindo o lugar de quem pergunta para instigar a interação e a reflexão. Não há
abordagem melhor ou pior, há a abordagem ideal para aquela pessoa que se identifica
com o que é proposto pelo oraculista.

- 14 -
Como saber qual
a minha abordagem?
Abordagem oracular é a maneira
como se conduz a leitura, ou seja,
como irei expressar e lidar com
aquilo que interpreto num jogo, e
também a forma como irei transmitir
para o consulente. Cada praticante
tem sua abordagem e suas
especificidades na prática oracular, e
normalmente encontram nas opções
mencionadas anteriormente uma
estrutura como ponto de partida.
Você não precisa se identificar com
apenas uma das abordagens
mencionadas nesse livro. Mas, antes
de considerar as possibilidades
sugeridas, pense em como gosta e
prefere conduzir uma consulta.
Assim, partindo da sua conduta,
encontrará semelhanças com as
abordagens de forma natural, sem
cair em uma crise de identidade
profissional. Se encaixar em qualquer
proposta demanda identificação e
não é obrigatório.

- 15 -
O que pode desprofissionalizar?

A cada dia que passa, novas modalidades surgem, comportamentos se modificam e


inovações se impõem em nosso cotidiano. Não tenho aqui a presunção de citar tudo o
que ajuda na profissionalização e, por conseguinte, tudo o que pode nos
desprofissionalizar. Até porque essa velocidade que nos permeia no contemporâneo
torna quase tudo ultrapassado sem dar nem tempo de se ter o devido aprofundamento.
Pensando nisso, quero citar algumas ações que, ainda que possam parecer uma boa
opção, se mal utilizadas (atenção para a frase que quero destacar: se mal utilizadas),
podem gerar o efeito oposto.

Dentre tantas possibilidades, algumas delas são: regras arbitrárias, cartilhas e manuais
apressados e com conteúdo volátil, padronização do discurso, reprodução sem critério
que esvazia o sentido de temas que deveriam ser tratados com cautela e, claro, o
marketing. Creio que você tenha entendido o contexto do que escrevo. Porém, para
assegurar, vou me ater ao último item, já que é ele que gera mais discussões polarizadas.
Que fique claro, o marketing veio para ficar, assim como a rede social. Não adianta muito
torná-lo um vilão, já que em algum momento todos lançaremos mão dele, de um jeito ou
de outro. A atenção que peço aqui, em relação ao marketing, é para a ação que torna
nossa ferramenta algo sem valor intrínseco, vendendo uma ideia vazia. Isso, para o tarô,
é a morte de tudo o que ele melhor representa. O marketing sem critério, exagerado e
desmedido apequena a criatividade, instrumentaliza a prática, criando uma aura
utilitarista, ou seja, uma ideia de que a ferramenta está aqui para te servir e realizar seus
desejos, seja você cliente ou aluno, já que é um produto e todo produto tem que ter uma
utilidade.

Regras são necessárias, mas quando arbitrárias, encarceram. Cartilhas e manuais


fazem parte do aprendizado, mas quando sem conteúdo, superficializam. A padronização
aniquila a pluralidade e a diversidade. Reproduzir sem critério inviabiliza a subjetividade.
A instrumentalização torna nossa profissão desnecessária. E assim como na vida, tudo
em excesso faz mal.

- 16 -
3. Clientes e consulentes
Interação, relação e comunicação
O que o cliente quer?

Considerando o século em que vivemos, onde a sociedade de mercado se estrutura


pautada em compra e venda, inclusive onde experiências e significados são
apresentados como bens e produtos, é de se esperar que a prática oracular adquira, em
certa medida, um formato que a aproxime de um produto e um serviço reduzidos a uma
interação de compra e venda, pautando o sucesso ou o fracasso a partir da satisfação do
cliente. Junte-se a isso a força e a velocidade das redes sociais, que nos apresentam
oportunidades – inclusive experiências oraculares “transformadoras” – gerando nos
próprios profissionais uma sensação de insuficiência e a vontade de oferecer o que os
clientes querem.

Logo, se observarmos sob uma ótica mercadológica e de consumo exclusivamente, a


expectativa do cliente é ser bem atendido. Mas, em se tratando de oráculo, precisamos ir
além disso, pois numa consulta o consulente quer encontrar sentido e atribuir
significado ao que vive. Desde muito tempo (e aqui me refiro a mais de 3 mil anos antes
de Cristo) o ser humano busca o oráculo para obter respostas aos seus dilemas
existenciais ou cotidianos. As questões cotidianas mudaram, pois assim como toda
língua sofre pressão de alguma ordem e se modifica conforme o tempo, o povo e a
cultura, a leitura oracular também absorverá essas mudanças que acontecem ao seu
redor. Contudo, no que se refere aos dilemas existenciais, esses mudaram pouco. E a
busca por respostas oraculares carrega escamoteada consigo essa necessidade de
entender, de compreender, de decifrar o que significa tudo aquilo que se vive ou
experimenta.

Nessa parte do livro, quero me concentrar nesse não dito. Naturalmente, abordarei
alguns pontos de ordem prática com fins de contextualização. Mas pretendo levantar
alguns elementos para reflexão e, vale dizer, não pretendo dar respostas fechadas,
porque gosto de instigar o pensamento e abrir espaço para que as pessoas que estudam
comigo ou leem o que escrevo possam construir seus próprios entendimentos. Já temos
muitas regras no mundo, normas que não se acabam. Fala-se tanto em liberdade de
expressão e, no entanto, estamos apenas trocando as cores de um discurso bastante
antigo.

- 17 -
Como já mencionei antes, atualmente as redes sociais fazem parte da nossa
realidade. Escrevo esse livro considerando essa "nova" realidade algo inevitável. E,
ainda que eu mesma use as redes e goste de estar nelas, não posso ignorar aspectos
complexos que elas representam, os quais só teremos ideia num futuro não tão
próximo. Conte, portanto, com o fato de que, ao falar sobre clientes, eu incluo nesse
cenário a vida virtual, que hoje está colada à nossa realidade presencial. Na pergunta
acima, sobre o que deseja esse cliente, me refiro a clientes tanto de atendimentos
presenciais quanto de atendimentos virtuais. Porque o que move essa pessoa é uma
mesma necessidade: compreender a realidade na qual está inserido. O que muda é
apenas o formato através do qual a pessoa obterá essas respostas.

Junto dessa busca por entendimento, quase sempre haverá outro elemento
importante implícito: o medo. Medo de ouvir uma resposta ruim, de receber uma
notícia catastrófica, de ser frustrado em suas expectativas. Um medo que antecede
outro medo: o de estar refém do oráculo e, portanto, vulnerável mediante quem o
atende e que vê sua fragilidade real, não a pessoa perfeita que compartilha fotos
sensacionais, mas alguém comum, como qualquer outro ser humano, que tem
problemas e falhas. Ou seja, o medo de ser visto e reconhecido em sua falibilidade.
Partindo dessa percepção, então, podemos dizer que o oráculo nos relembra que
somos mortais.

Muitas vezes, alunos me procuram para discutir situações rotineiras, tais como
clientes que se frustram com a consulta, consulentes que incomodam e se tornam
dependentes de respostas oraculares, pessoas que destratam e criam conflito durante
a leitura, dentre tantas outras manifestações como essas. Para você que me lê e tem
pouca experiência na área, acredite, são inúmeras as situações humilhantes que
enfrentamos na prática do nosso ofício. Mas não estou aqui para falar sobre isso, e
sim sobre o que isso representa, uma vez que somos intérpretes e sabemos que a
representação é o que efetivamente importa.

Desse modo, quando me procuram para discutir essas situações vexatórias e


desgastantes, costumo responder quase sempre do mesmo jeito e digo que todos
esses comportamentos indicam, na realidade, a recusa em lidar com as coisas como
são. Abrir mão da ilusão, da fantasia de que alguém vai me amar para sempre, de
fingir que a pessoa que amo é imortal, de viver como se não houvesse amanhã
ancorado na justificativa de que posso ser cruel porque mereço me vingar, isso e
tantas convicções que o ser humano constrói para sobreviver à dureza da vida
concreta, isso tudo requer da gente muita coragem. É a coragem de ser humilde, de
se perceber falível e imperfeito diante do oráculo, de saber que muito do que acho
que controlo, na verdade, não consigo ter o menor controle.

- 18 -
Assim, chegamos num lugar desafiador: o lugar onde a
liberdade se encontra – ou se choca – com o destino (ou
fortuna, ou acaso, ou contingência). Há uma confusão de fundo
que envolve a leitura oracular e que se apresenta como a
necessidade de ter um destino para culpar quando falta
coragem para decidir e, simultaneamente, a necessidade de ter
liberdade para controlar aquilo que não é passível de controle.
Como vemos, o subjetivo de uma leitura oracular não pode (e
nem deve) se resumir a um "sim" ou "não". E antes que se abra
aqui uma problematização desnecessária, já aviso que todos
esses pontos subjetivos não dão, em hipótese alguma, o direito
ao oraculista de agir sem tato e sem compaixão. Não devemos,
jamais, nos esquecer de que somos seres humanos assim
como o são aqueles que atendemos. Então, nesse sentido, os
clientes ou consulentes não devem ver nessa escrita um
julgamento. Ao contrário, poderão entender que, ao serem
atendidos, estão sendo respeitados e acolhidos dentro de sua
mais profunda humanidade. De nossa parte, só o fato de
lidarmos com isso já deveria ser o suficiente para nos
lembrarmos a todo momento o quanto somos passageiros.

- 19 -
Os depoimentos online expostos em sites e
redes sociais atrelam nossa capacidade à
avaliação dos outros. Porém, quando há
preparo suficiente para exercer o trabalho e
mesmo assim não há satisfação do cliente, não
será invalidando o que sei que encontrarei
mais reconhecimento. Às vezes, a relação
profissional-cliente só não funcionou, e isso
não quer dizer fracasso pessoal nem
profissional.

O que o cliente precisa?


Na maioria das vezes, nós temos à mão
técnicas suficientes para dar conta da
demanda de cada consulente. Isso vale,
obviamente, para quem estudou, praticou e
amadureceu o suficiente nesse caminho para
saber que nunca deixamos de aprender e
que, além disso, há o preparo necessário para
abrir a vida de outras pessoas e interpretar
um jogo responsavelmente. Veja bem, não é
se eu "acho" que estou pronta, mas sim estar
efetivamente pronta para isso.

A necessidade do cliente deve ser equilibrada Quando, apesar de termos preparo para
dentro de nosso entendimento. Como dito atender, somos convencidos pelo consulente
anteriormente, tendemos a buscar ampliação do de que não temos ferramentas o suficiente,
nosso trabalho e avanço profissional a partir do então chegamos ao ponto de repensar nosso
feedback do cliente ou da quantidade de clientes próprio psicológico. Porque, a rigor, se
que nos procuram. Isso faz com que coloquemos, conhecemos tiragens e métodos, se
em certa medida, a resposta para nossas aprendemos técnicas, e se informamos sobre
preocupações de ordem prática e material nossa linha de trabalho, temos condições de
exclusivamente nessas pessoas.  Assim, acabamos atender e fazer o possível pelo outro.
preterindo nossas percepções em detrimento da
demanda. Isso nem sempre funciona. - 20 -
Apesar da importância de sabermos o que um consulente
precisa na consulta para definirmos tiragem, técnica e a
comunicabilidade, todo o restante que envolve nosso trabalho
deve ser desenhado por nós. Além disso, parte do profissionalismo
acontece quando sabemos o que podemos oferecer, cientes do
que fazemos e do porquê o fazemos. Ao colocarmos todo o
processo de construção profissional no outro e pautar resultados
especificamente no julgamento alheio – isso inclui as regras de
marketing que muitas vezes atropelam nossa percepção – estamos
preterindo um papel significativo que desempenhamos em nosso
próprio trabalho. Devemos manter a coerência entre o que
pensamos e fazemos, não nos abstendo de determinar o que é
preciso para a consulta fluir. O cliente é parte essencial da
consulta, mas, quando a necessidade desse mesmo cliente gera em
nós a sensação de nunca sermos o suficiente, então será preciso
separar o que é anseio nosso e o que é anseio do outro, a fim de
não tingir nosso trabalho com cores irreais.

- 21 -
Para quem busca uma consulta, alguns apontamentos

É importante falar também daquilo que envolve o cliente propriamente dito, uma vez
que a consulta é relação e requer considerarmos esse binômio oraculista-consulente, de
preferência numa perspectiva equilibrada. Avaliar o papel do cliente, além de suas
expectativas, contribui para estabelecermos um entendimento mais amplo e acolhedor
do que envolve essa interação diante do oráculo.

Começo esse assunto lembrando que o consulente pode ser um leigo, mas também
pode ser um praticante ou até profissional do tarô. Porque, no final das contas, todos
temos problemas e questões a serem esclarecidas a respeito de nossos cotidianos. Logo,
não importa o quanto você conheça sobre tarô, todos somos, em algum momento,
consulentes.

É comum lidarmos com clientes que mentem, que manipulam informações ou que
tentam manipular o oraculista (ou até a resposta do próprio oráculo), dentre outros
comportamentos em qualquer momento da interação, seja no pré, durante ou no pós
consulta. Isso é prova de que aquela pessoa que está no papel de consulente é mau
caráter? Não. Devo lembrar aqui que já descrevi anteriormente alguns dos aspectos que
tornam um consulente mais frágil e que podem gerar comportamentos inesperados.
Porém, vale dizer, tem muita gente mau caráter no mundo, ou seja, isso não é prerrogativa
de quem procura o tarô. Fato é que esse tipo de situação desgasta o profissional, mas, por
outro lado, é fato também que em algum momento teremos que enfrentar esse tipo de
situação e, às vezes, ela se torna um osso do ofício. Logo, se você é consulente, procure
atendimento consciente de que agir de maneira agressiva, impaciente ou ansiosa não é o
melhor caminho para estabelecer uma relação diante do oráculo. Sim, nós profissionais
sabemos lidar com isso e sabemos que faz parte da nossa realidade, mas começar uma
leitura nesse caminho é uma péssima escolha. Ninguém tem culpa de seus infortúnios,
especialmente quem está lá para tentar te ajudar em relação a isso. 

- 22 -
Outras condutas podem atrapalhar uma consulta ou mesmo abrir caminho para erros de
interpretação, e aqui temos uma parte fundamental que envolve consulentes: a dedução, a
suposição e a indução. A dedução atrapalha uma consulta porque, basicamente, se refere à
conduta de buscar uma leitura sobre algo que não aconteceu ou ainda não existe. Então a
pessoa quer saber do oráculo o que pode acontecer se ela vier a fazer algo. A chance de o
oráculo responder de maneira evasiva é grande, além do que, o oraculista não tem como
manejar um assunto que não está efetivamente acontecendo. A suposição acontece quando o
consulente supõe algo que não foi dito ou analisado em jogo. Por exemplo, quando alguém quer
saber se há chances de encontrar um trabalho e, diante de uma resposta favorável, supõe que
terá dinheiro em breve. Aqui vale um adendo relevante: quando há dúvidas sobre o que
perguntar ou mesmo como perguntar, ou ainda, sobre a relação entre os assuntos questionados,
o consulente deve ter espaço de perguntar e esclarecer isso diretamente com o oraculista que
o atende, pois ninguém é obrigado a saber essas especificidades do nosso trabalho técnico. Por
último, a indução, que é a atitude de induzir respostas, acontece quando o consulente coloca na
pergunta a afirmação ou negação esperada. Por mais que se torça e queira, o oráculo não existe
para realizar vontades.

Há um quarto aspecto, que não mencionei, mas que também configura um comportamento
de obstáculo para a fluidez da consulta. Me refiro à imposição, que é a conduta arbitrária, por
parte do consulente, que age dessa forma porque acredita poder controlar as respostas ou, na
melhor das hipóteses, controlar o oraculista. Aqui vale dizer sem rodeios que de nada adianta
impor se aquilo que se determina não é passível de realização. Nem sempre querer é o
suficiente, ainda que os manuais de autorrealização jurem o contrário.

Seguindo adiante, não tem como não falar sobre os clientes ou consulentes em redes
sociais. Esse mesmo universo virtual, que nos permitiu conectar com alunos e clientes de
outros estados e países, que nos abriu espaço para informar mais e melhor, que deu lugar para
podermos expor nossos trabalhos e abrir leques de possibilidades profissionais, é também o
lugar onde as pessoas muitas vezes desabafam, expõem seus fracassos e deméritos, criam
intriga e delatam profissionais.

Algumas situações são constantes, tais como consulentes que usam um mesmo jogo para
que vários profissionais opinem a respeito. Os grupos de redes sociais e mensageiros (como
Telegram ou WhatsApp) dão espaço para que alguém publique um jogo e todos palpitem. Isso
não seria um problema se, muitas vezes, não fosse usado sem o consentimento do profissional
que fez o jogo em questão (não devemos ignorar também os grupos de profissionais que fazem
o mesmo com jogos de consulentes sem permissão).

Podemos ir além e citar as situações em que clientes fazem prints de conversas para expor
em suas redes sociais ou compartilham áudios trocados com oraculistas, também sem
autorização ou consenso. Ou seja, a mesma rede que dá o espaço permite que ele seja mau
utilizado ou distorcido. 

- 23 -
Nesse cenário, não podemos nos esquecer de que quem faz
as redes somos nós, logo, o problema não está
necessariamente nas plataformas, mas em como são usadas.
Fora toda a polêmica dos algoritmos, já foram publicados
estudos que demonstraram que as redes sociais dão mais
visibilidade para quem posta imagens pessoais (quanto menos
roupa, mais visibilidade). Sem falar de tantas outras
ferramentas que estimulam a competição, a disputa, a F.O.M.O
(Fear Of Missing Out) e o aumento da sensação de
insuficiência. Verdade seja dita, não tem mocinho nessa
história, mas nem por isso todos são bandidos. É muito mais
uma questão de aprendermos a lidar com as opções que temos
à mão e lembrarmos que tanto na vida real quanto na virtual,
consciência e responsabilidade devem ser fatores
indissociáveis no âmbito pessoal e profissional.

Numa enquete recente que publiquei em rede social,


perguntando se consulentes, leigos ou praticantes, já
enfrentaram problemas por causa da interação online, mais de
45% das pessoas responderam que sim. Isso nos ajuda a
pensar sobre maneiras que poderiam auxiliar a estabelecer um
vínculo mínimo com o consulente a fim de evitar a
mecanização de nosso serviço, que leva à despersonalização
do trabalho, e que, consequentemente, amplia a possibilidade
de ataques, cancelamentos, linchamentos virtuais, dentre
outras formas de agressão.

- 24 -
Conhece a ti mesmo
Essa frase célebre, gravada no pórtico de
entrada do templo de Apolo, que ficava na
cidade de Delfos, oferece várias
interpretações. Quando a cito, me remeto ao
fato de que tais palavras relembram ao ser
humano sua condição mortal e imperfeita.

Se informe
1 sobre quem irá te atender, qual o
Ainda se pensa pouco a respeito da prática
oracular. A literatura é escassa nesse aspecto
estilo do profissional e o que oferece
e, como tarô e outros oráculos ainda são
enxergados como superstição ou coisa de
Escolha consciente gente mística (ainda que o termo já tenha
2 de que será atendido por alguém sido bastante desgastado e descolado de seu
que fala sua língua sentido principal), acabamos por criar uma
aura excessivamente informal. Isso nos
Entenda o que busca prejudica e também a nossa prática, e atinge
3 para saber se o que deseja é inclusive os consulentes, que gostam de
procurar consulta, mas nem sempre sabem
possível de ser analisado em jogo
ao certo sobre o que abrange a leitura
oracular, sua origem, importância ou
Tire suas dúvidas representação.
4 e não tenha receio de esclarecer sua Sempre lembro aos meus consulentes que,
consulta antes de realizá-la no espaço da consulta, tudo o que é falado
ou analisado se trata de conteúdo pessoal,
" O conteúdo da consulta presencial e da
intransferível. Publicar jogos, expor detalhes,
compartilhar pormenores é escancarar sua
própria intimidade. Ao lado, deixo sugestões

"
consulta à distância não muda. O que a clientes e consulentes que se consultam ou
muda é como você prefere ser atendido. pretendem se consultar com o oráculo.

- 25 -
Já mencionei anteriormente alguns elementos que povoam o imaginário a respeito da
prática do tarô. Quero deixar claro que, quando escrevo sobre esses assuntos, não estou
necessariamente falando sobre uma ou outra pessoa, mas sobre grande parte das pessoas que
nos procuram para consultas e leituras. Quando nos colocamos nesse lugar, de esclarecer e
atualizar determinados aspectos do nosso trabalho, precisamos partir do ponto de vista de uma
maioria para podermos avançar no debate. Se nos fiarmos nas exceções, dificilmente
conseguiremos andar para a frente. Em função disso, acontece muito de me escreverem
dizendo que falei sobre determinada coisa, mas que não é assim para todo mundo. E, em
seguida, normalmente a pessoa usa a si mesma como exemplo. Não há problema algum nisso,
desde que lembremos, sempre que necessário, que realmente uma exceção não representa
uma enorme maioria. Fica mais fácil dar um exemplo cotidiano para ilustrar essa questão.
Quando algum palestrante fala sobre preconceito, está falando porque o preconceito é uma
realidade, ainda que uma ou outra pessoa afirme que não o tenha. Assim, vamos partir do
ponto em que, ainda numa maioria, o imaginário é povoado de distorções sobre a prática
oracular. Não é fácil mudar a mentalidade ou a cultura de alguém. Ainda mais complexo é
mudar a maneira como uma sociedade se comporta diante daquilo que lhe parece diferente.
Contando com essa realidade, deixarei aqui algumas reflexões para que consulentes possam se
aprofundar nesses pontos e ampliar ainda mais suas percepções nesse sentido. 

Qual profissional escolher?


Quem te atende deve estar alinhado com o que você precisa naquele
momento. Essa é uma escolha muito pessoal e, por isso, nem sempre o
oraculista que pareceu ótimo para uma amiga também será para você. Não é
fama, promessas ou número de clientes ou seguidores que tornam determinado
profissional a melhor escolha. Não hesite em esclarecer suas dúvidas para que
esse momento se estruture em confiança e tranquilidade.

Medo desmedido, preocupação e vulnerabilidade excessivas podem ser


improdutivos na consulta. Saiba escolher o profissional, e saiba também
escolher o momento para se consultar.

- 26 -
4. A leitura na prática
O que envolve uma consulta para ambas as partes
Qual é o lugar da leitura oracular?

Vamos começar esclarecendo que tarô não foi inventado para ser um oráculo. Mas, de modo
algum, isso retira o seu significado e sua representação na prática oracular. Se a gente olhar
com atenção, muitas ferramentas oraculares não foram criadas para isso, mas adaptadas. Os
ossos de animais não existem para essa finalidade, tampouco a terra utilizada na geomancia, e
assim por diante. O fato de algo ter sido criado para ser um oráculo, não necessariamente o
torna mais poderoso. O que está por trás da prática oracular é o sistema que o torna uma
ferramenta passível de interpretação. Desse modo, a ferramenta em si (tarô, terra, ossos, runas
etc.) associada a um método, além de técnicas e aplicações, são os responsáveis por um
resultado intrigante, revelador e significativo para quem experimenta.

A prática oracular tem o seu lugar, não precisa substituir outras práticas, muito menos
ocupar o lugar de outras áreas. O que acontece muitas vezes é que há uma forte impressão de
que a prática oracular não tem "um lugar" para estar e, assim, acaba se mantendo numa posição
marginalizada (no sentido de estar à margem). Vale desmistificar essa questão, até porque não é
tão difícil quanto parece. A prática oracular é algo que se dá desde muito tempo. E quando digo
muito tempo, quero dizer que algumas práticas oraculares datam de mais de 2.000 anos a.C.,
como o caso da leitura de estátuas egípcias (Egyptian Statues) ou a leitura conhecida como
Haruspício (em inglês Haruspicy, que era o especialista em interpretar as entranhas de animais
sacrificados).

As práticas oraculares nem sempre vinham atreladas à religião. Muitas vezes, eram
procuradas de uma forma bem semelhante à que acontece hoje: para obter respostas sobre
dilemas da vida ou do cotidiano. Naturalmente, respeitando a diferença da mentalidade de
época, uma vez que na antiguidade se buscava um oráculo para saber sobre viagens (que eram
eventos complicados em função das distâncias, perigos ao longo do caminho etc.), ou para
obter algum direcionamento para lidar com problemas práticos (as colheitas, doenças na
família ou até a quais deuses ou entidades oferecer sacrifício), por exemplo. No contemporâneo,
os temas podem até mudar, mas tendem a girar em torno das mesmas necessidades ou
inquietações, como o caso de viagens (que atualmente se resume à preocupação com vistos,
planejamento financeiro etc.), o trabalho (que nem sempre é sobre colheita, mas sobre o que
esperar e como lidar com a realidade do ofício), e questões de saúde e espirituais, que ainda se
mantém.

- 27 -
Perceba que alguns aspectos cotidianos mudaram, mas o cerne das questões, não. E, como
dito anteriormente, o oráculo não vinha necessariamente atrelado à religião, mas nele podia se
analisar a própria religião ou espiritualidade. Nada disso – repito, nada disso – desmerece o
oráculo ou a religião, ou mesmo a espiritualidade. É importante pensarmos sem
obrigatoriamente termos que atribuir um juízo de valor para tudo e todos que nos rodeiam.
Ainda que essa seja uma tendência do indivíduo (rotular, estereotipar, polarizar), temos
condição de absorver diferentes informações e refletir sem dependermos do juízo positivo ou
negativo a respeito de algumas coisas. No que se refere à ética e à responsabilidade, que
veremos mais adiante, nesses casos, o juízo de valor será de grande valia. Já no caso de
classificar a prática oracular em função do que ela carrega ou não consigo, o juízo de valor
pode estreitar a nossa visão e fazer com que mantenhamos a constante sensação de que tudo
o que não contempla nossas opiniões é de natureza negativa. Desse modo, se aprende pouco,
não se avança e se alimenta ressentimento desnecessariamente.

A prática oracular, portanto, já existia antes de algumas práticas espirituais e religiosas. E


sempre ocupou esse lugar, de uma prática que permite ao ser humano obter respostas,
orientações, conselhos e, por que não dizer, entender melhor o que acontece em sua vida. Não
há como negar o vínculo inerente da função oracular à divinação que, não apenas direciona,
mas aponta tendências e dá condições (em alguns casos) de se modificar aspectos
problemáticos do cotidiano, ou até de esclarecer escolhas para que seja possível um
posicionamento em determinadas circunstâncias da realidade pessoal. 

Já debati com alunos que se sentiam incomodados com esse lugar ocupado pelo oráculo no
imaginário social. Esse incômodo é justificado pois, na vida concreta, nos deparamos muitas
vezes com pessoas que nos questionam a respeito de nosso trabalho. Isso se dá muito em
função do que já falei no capítulo anterior, especialmente quando o imaginário imprimiu a
imagem de que absolutamente tudo o que se relaciona à prática oracular é coisa de picareta,
de quem tem pacto com o diabo ou com macumba. Na vida real, nem sempre é confortável
preencher dados numa loja ou numa ficha médica e, ao informar a profissão (tarólogo), ser
olhado e questionado como se fosse um extraterrestre. Isso quando o olhar e a reação não
vêm acompanhados de perguntas ou comentários, como "Não vou conversar muito com você
porque já deve saber o que estou pensando", "Nossa, isso é profissão?", "Sério, esse é seu
trabalho, você adivinha futuro e ganha dinheiro com isso?". Se você é uma dessas poucas
pessoas que nunca enfrentou essa situação, parabéns. Mas, se você se encontra no time de
quem já enfrentou esse tipo de incidente, saiba que o incômodo é justificado, sim. Não somos
obrigados a ignorar todas as falas preconceituosas em relação à nossa profissão, inclusive
porque trabalho é um tema da vida que muitas vezes carrega características nossas, é parte de
quem nos tornamos. Logo, se alguém faz piada com minha escolha profissional, nem sempre
terei o bom humor necessário.

- 28 -
Toda profissão carrega seus rótulos, com a nossa não seria diferente. Porém, quando
menciono todos esses elementos, é porque em nosso caso esses rótulos e distorções
imaginárias são vexatórios e, pior, são equivocados. Esses são motivos suficientes para que eu
decidisse abordar o assunto nesse livro e reforçar o lugar que a prática oracular ocupa na
sociedade, na cultura e no cotidiano do ser humano há muito mais tempo do que se imagina.
Além disso, o fato de o oráculo ter sua validade e sua funcionalidade, independentemente de
qualquer outro trabalho ou ambiente (espiritual, religioso), o torna por si só uma ocupação
autossuficiente. Não há problema algum em agregar a prática oracular a outro trabalho ou a
outras práticas, tampouco à religião ou espiritualidade. Mas é fundamental sabermos que o
oráculo não carece de nada além dele mesmo para cumprir uma função significativa. Para quem
não sabe, a profissão oraculista é reconhecida pelo Ministério do Trabalho e configura na CBO
(Classificação Brasileira de Ocupação). Contudo, não é de se estranhar que ainda tenhamos
relutância em relação à profissão, visto que até 1997 a prática da cartomancia era considerada
crime simples (contravenção penal) pelo Código Penal Brasileiro. É compreensível que ainda
tenha névoa ao redor do nosso ofício, não se muda um cenário como esse em pouco tempo.
Em contrapartida, a internet ajuda muito no que se refere à divulgação de informação. As redes
sociais também podem assumir esse papel se quisermos produzir conteúdo que promovam a
difusão de temas como esses, abrindo espaço para que esclareçamos nossa função e trabalho.

Não falta condições e caminhos para que possamos atualizar nossa realidade. Isso vale para
profissionais, interessados no assunto, alunos, clientes e leigos. Às vezes, mudar a mentalidade
pode ser muito mais demorado que uma informação, e é por isso que o debate e a reflexão
precisam de espaço em nosso cotidiano. Temos muito a fazer, nosso foco principal deve ser
esse esclarecimento, para que pratiquemos a cartomancia com menos relutância e imbróglios a
respeito do nosso ofício. Assim, desmistificar se torna parte do trabalho informativo. E quando
menciono o termo desmistificação, quero dizer isso, esclarecimento, conscientização,
especialmente, atualização. Desmistificar não é desmagificar, e essa reflexão pede atenção para
que não entremos em querelas entre os próprios colegas desnecessariamente. Temos tantos
aspectos a esclarecer para o público que os embates internos, entre os próprios profissionais,
perdem o sentido, sobretudo quando, muitas vezes, as polêmicas são geradas por uma questão
de imposições de opinião. Costumo chamar essa situação de "rinha", no sentido desconfortável
do termo, que alude à briga de galo, ou seja, criaturas de uma mesma espécie que se ferem para
que o público assista, faça suas apostas e veja quem se machuca mais. O mercado, em si, já é
estreito, a profissão e a prática já envolvem bastante desgaste e demandam esclarecimento
constante, as redes exigem conteúdo e posicionamento, fora os alunos e clientes que precisam
(e merecem) nossa atenção. Qual o sentido da rinha, portanto? O sentido acaba sendo uma
dispersão a qual ainda não podemos nos dar ao luxo de bancar. Trabalhemos, portanto, para
esclarecer e refletir.

- 29 -
Na prática, como lidar?
Cada leitura tem seu ritmo e sua
característica. Podemos e devemos ter um
sistema funcional, com elementos definidos,
tais como formato de consulta, tempo de
duração, valor e demais informações. Porém, o
andamento é estabelecido no encontro.

Aprenda a se comunicar
A fala e a escuta
1 para que a consulta seja um espaço de
A leitura oracular se distingue em vários
esclarecimento e acolhimento.
aspectos de uma sessão de terapia
(psicoterapia, psicanalise, psiquiatria etc.),
Trabalhe na construção das perguntas
tanto no que se refere à duração quanto ao
2 feitas durante a leitura, já que as respostas
motivo de sua realização etc. O aspecto que
dependem muito da elaboração das
mais diferencia uma prática da outra, além
questões que são analisadas em jogo.
dos citados anteriormente, é a dinâmica: a fala
e a escuta. Por quê? Numa sessão de terapia
Não julgue o jogo alheio
ou de análise, quem fala é o cliente (paciente).
3 não classifique jogo "bom" ou "ruim".
Logo, o profissional está ali pronto e
A vida é mais complexa que isso.
especializado na escuta. Essa escuta é um
componente constitutivo do processo. Na
Seja profissional leitura oracular, temos outra dinâmica. A rigor,
4 você não trabalha para agradar, mas para
interpretar bem o jogo.
o cliente (consulente) é quem está na consulta
para ouvir. Isso muda tudo.
Devemos distinguir, sempre que possível, a
prática oracular das práticas psi's, pois, a
" menos que o profissional tenha formação psi
e consiga associar ambas as atividades, nos
O tarô é uma bússola. Não devemos outros casos, essas práticas devem se manter
nos comunicar como quem decreta ou

"
separadas por ocuparem lugares distintos,
sentencia, mas sim como quem orienta. tanto em dinâmica, quanto em finalidade.

- 30 -
Algumas situações são recorrentes na prática da leitura e, nesse sentido, obtenho um bom
retorno das pessoas que me acompanham em minhas redes sociais, em especial o Instagram,
onde compartilho enquetes, interajo e debato tudo o que se relaciona com o tema tarô. Essa
interação online permite que eu traga informações e alguns resultados relevantes para
apresentar nesse livro. Não à toa, costumo dizer que às vezes quem me acompanha contribui
mais com minha escrita do que as referências bibliográficas. Isso não é demérito, ao contrário,
é ter elementos atuais à mão para mencionar o que realmente importa para quem pratica a
leitura oracular com o tarô.

Recentemente, perguntei sobre a questão da frustração na consulta. Através da enquete,


obtive respostas interessantes sobre o assunto. Ao questionar os profissionais se acreditavam
que já haviam frustrado alguém numa leitura, 88% respondeu que sim; e depois, quando
perguntei se essas mesmas pessoas já haviam se frustrado com a leitura oracular, 74%
responderam também que sim. Desse modo, é possível entendermos que a frustração, em certa
medida, faz parte do nosso trabalho. Não quero dizer com isso que a frustração na consulta
será certa e garantida, mas sim que, a partir do momento em que existe uma expectativa (e
expectativas em relação à consulta existem, não há como evitar), o risco de se frustrar sempre
estará por perto. Talvez, refletir sobre isso seja mais útil do que lutar insanamente para tentar
evitar frustrações, pois elas fazem parte da nossa realidade e, num mundo onde se cultiva uma
perspectiva narcísica sobre tudo, sempre haverá chance de experimentar frustração em não
ouvir o que se deseja ou ter que enfrentar uma situação incômoda.

Outro aspecto recorrente nas interações e queixas dos colegas profissionais é sobre a lida
nas perguntas de "sim” e “não". É comum ver alunos estudando e mapeando as cartas para
decidir qual carta diz "sim", qual carta diz "não", qual carta diz "talvez". Isso não é errado, mas
pode ser um trabalho excruciante e – vou usar novamente o termo – frustrante. Como já citei,
cada jogo é um jogo, cada pessoa é única. Um dos autores que estudo e pesquiso há alguns
anos, sobre o qual escrevo e produzo artigos a respeito do vazio existencial e o sentido da Vida,
Viktor Frankl, afirma que cada ser humano é único e irrepetível, assim como o seu encontro
com o sentido também será. Partindo desse entendimento, categorizar cartas pode não ser útil
na prática. Para lidar com essa questão do "sim”, “não” e “talvez", devemos considerar cada caso,
cada jogo e o que se deseja saber (nas páginas anteriores expliquei que a pergunta bem feita é
metade de uma boa resposta).

O estilo de leitura do oraculista também é um fator a ser considerado, pois alguém com um
estilo de leitura terapêutica poderá não ter se especializado em respostas curtas e objetivas. Do
mesmo modo, o estilo de orientação e aconselhamento também não contempla "sim”, “não” e
“talvez". Nesse sentido, o estilo preditivo tende a se mostrar mais assertivo para essa demanda.
Veja bem, divinatório, todos somos, de um jeito ou de outro. Logo, a característica divinatória
normalmente é um elemento que faz parte do "combo" de todo oraculista, afinal, oráculo é
divinação. Mas, independentemente do caráter divinatório, o estilo – terapêutico, preditivo, de
aconselhamento etc. – faz diferença na hora de buscar uma leitura adequada.

- 31 -
Contamos com vários estilos de leitura. Os 3
principais, seguindo as divulgações e opções
disponíveis na maior parte de perfis, são: leitura
preditiva, leitura de aconselhamento e orientação
e leitura terapêutica. O estilo se refere à linha de
pensamento e ao posicionamento do profissional
em sua proposta e também durante a consulta.
Procure informar ou explicar aos
clientes/consulentes o seu estilo de trabalho para
esclarecer como sua leitura funciona.

Qual estilo é melhor?


Não caia nessa cilada. Às vezes, a batalha por
clientela e a problematização exacerbada
geram conflito entre profissionais e alunos,
fazendo com que deixemos o que importa de
lado e entremos num embate desnecessário.
Não existe estilo melhor, a rixa entre
profissionais de estilos diferentes é
desnecessária. É como um corredor de curta
distância que se queixa de um maratonista.
Ambos correm, mas cada um escolheu sua
modalidade no esporte, pois é onde se dá
melhor e se desenvolve bem.
Toda leitura oracular terá um pano de fundo
O oraculista é um especialista em sua prática. Isso divinatório. O estilo terapêutico tende a
também não é de hoje. Desde que se tem registro analisar a pessoa ou seu momento, variando
das práticas oraculares, podemos observar que o conforme a abordagem. O estilo preditivo
oraculista era sempre alguém especializado na inclina-se a analisar tendências e questões
pontuais ou objetivas, também variando na
análise de um determinado oráculo. Vide os
abordagem. E o estilo de aconselhamento e
intérpretes de vísceras, que estudavam anatomia
orientação oferece esclarecimento e diretrizes
minuciosamente, os astrólogos, que estudavam o
para a pessoa ou seu momento, considerando
céu e os planetas, e assim por diante. A ideia de um
a abordagem de cada um. Cada um atua em
oraculista sem conhecimento é equivocada e não
sua expertise.
representa nossa realidade profissional.
- 32 -
Os profissionais oraculistas – com especial atenção aos tarólogos – vêm demonstrando
flexibilidade em sua prática profissional. Dentro das interações que mantenho, tanto em
eventos presenciais quanto em ambiente virtual, nota-se um interesse cada vez maior em se
aprimorar e abrir espaço para a reflexão, permitindo que o trabalho seja cada vez mais
enriquecido a partir de bases consistentes. Em uma semana de interação online a respeito da
conduta dos profissionais, em relação à dinâmica da leitura, a maioria se mostrou bastante
flexível no que se refere à abertura que oferecem aos clientes. Isso favorece consultas
contextualizadas e interativas, colocando o oráculo como uma ponte que leva a pessoa em
direção ao esclarecimento a partir de uma relação de confiança que se estabelece entre
oraculista e consulente. Recentemente, em uma enquete feita via Instagram, ao questionar
sobre as perguntas numa consulta, 76% dos profissionais disseram que não determinam ao
consulente se este deve ou não fazer perguntas, preferindo avaliar isso a partir do jogo ou
tiragem escolhida para a leitura. Isso demonstra a condição e o preparo do oraculista, que
confia na escolha e na metodologia para estabelecer se é cabível ou não fazer perguntas no
início da consulta. Naturalmente, isso depende muito de cada profissional, mas esse indício de
confiança e flexibilidade mostra que essas pessoas administram o espaço da consulta de forma
consciente e responsável. Ainda sobre esse tema, mais de 52% dos oraculistas afirmaram não
ter preferência quanto a essas determinações de perguntas, o que indica que, para a maior
parte dos profissionais, não se trata apenas de afirmar o que eles acreditam ser o melhor, mas
de analisar cada caso para decidir se cabe se pautar pelas perguntas ou não. 

Fazer perguntas, portanto, não é obrigatório para os consulentes. Em alguns casos, a pessoa
traz questões ou temas para a leitura, já em outros, preferem ouvir o que determinado jogo tem
a apresentar sobre sua vida. Esse cenário favorece o trabalho oracular e também flexibiliza a
procura pela leitura, uma vez que alguns clientes não se sentem à vontade para perguntar ou
ainda não têm em mente questões formuladas. Assim, é possível que alguém busque a leitura
oracular sem a pressão de criar perguntas e, caso elas surjam ao longo do processo de
interpretação, o consulente pode elaborar as questões que julgar necessárias. Para quem
atende esses clientes, também haverá mais flexibilidade, no sentido de poderem abrir o leque
de opções e definirem o melhor caminho a percorrer conforme a demanda de cada um. As
perguntas não são obrigatórias, mas, ainda que elas possam ajudar a balizar o trabalho do
oraculista, em determinados casos, é possível elaborá-las a quatro mãos, pois, como disse
acima, a resposta depende muito do que foi perguntado. Não existe pergunta certa ou errada, o
que existe é pergunta mal feita, ambivalente, confusa, truncada. Veja bem, isso não é
incompetência dos consulentes. Na realidade, quando se enfrenta alguma situação de vida
delicada ou quando se está tenso, ansioso diante do oráculo, nada mais normal que encontrar
dificuldade na formulação de perguntas. Não à toa, alguns profissionais contribuem na
elaboração e ajuste das questões.

- 33 -
Aproveitando o gancho desse assunto, sobre respostas que dependem de perguntas, quero
me concentrar agora numa questão desafiadora: como lidar com respostas ruins? Retomando
um pouco a discussão sobre juízo de valor na leitura, esse é um momento que requer cautela.
Por quê? Porque o que eu julgo ruim pode não ser ruim para o consulente (e vice-versa). Há
algum tempo, ofereci um curso sobre as cartas complexas, onde me concentrei nesse viés, pois
muitas vezes, as cartas que nós não gostamos falam mais sobre nós do que sobre o outro para
quem jogamos. Existe, sim, algumas cartas que são consenso, pois simbolizam questões, não
apenas pessoais, mas também coletivas. Por exemplo, a Torre é uma carta que gera abalo na
maioria das pessoas, pois representa uma situação de descontrole que choca diretamente com
a nossa cultura, do século XXI. Num mundo em que nos iludimos com o controle, uma carta
que representa a perda desse controle pode abalar, mesmo que não nos demos conta disso.
Outras cartas mexem mais com uns do que com outros, como é o caso da carta do Diabo.
Minha intenção aqui é dar exemplos, não pretendo me estender nisso, pois não é o foco desse
livro. O importante é deixar aqui a compreensão de que atribuir juízo de valor a uma carta
pode não ser profissionalmente produtivo. Então, vamos retomar a questão sobre respostas
ruins e rever essa ideia, a fim de sair do estereótipo de "bom” ou “ruim" e assim usar uma lente
mais realista.

Se alguém nos procura, grande parte das vezes será porque se encontra em um momento
delicado ou quer avaliar alguma situação que tem relevância. Logo, esperar que não saiam
cartas complexas (prefiro esse termo ao "negativo" ou "ruim") pode ser inútil. As cartas
complexas nada mais são que representações de desafios que fazem parte da vida, por isso,
tratá-las com naturalidade deveria ser parte da nossa prática diária. Além disso, aqui tem um
ponto subjetivo importante, pois parte do acolhimento na consulta é conduzir o processo sem
julgar, consciente de que somos todos seres humanos e de que dilemas fazem parte da vida, e,
portanto, nossa função é falar deles. Um oraculista que se assusta com carta, que faz cara feia
quando atende alguém que tem uma relação extra conjugal, torce o nariz para analisar relações
homoafetivas, dá opinião sobre as escolhas do consulente, certamente é um oraculista com
pouco comprometimento ético. Falaremos disso mais tarde. Por enquanto, basta reforçar que
respostas ruins não devem ser um problema para nós, que elas podem assim nos parecer e
não necessariamente para o consulente, e que o que analisamos faz parte da vida. Alguns
colegas responderam uma enquete sobre isso e citaram como sinônimo de resposta ruim
aquilo que não se quer ouvir ou saber, aquela resposta que é diferente da expectativa anterior
à consulta (e que faz parte dela), a notícia ruim propriamente dita (morte, traição, doença) ou
aquela resposta que gera mais confusão do que esclarecimento. Vou me concentrar aqui nas
duas últimas, pois as duas primeiras foram mencionadas acima. Para profissionais que dão
notícias ruins, como morte, sugiro que mencionem isso e deem a escolha, de ouvir ou não, para
o consulente (atenção aqui, nem todas as pessoas apresentam condições para isso). 

- 34 -
Anteriormente, abordei a relevância da questão ligada à saúde mental, bem como reações
mentais ou emocionais extremas que podem gerar problemas a partir da leitura. Sendo assim,
considere tudo isso antes de falar sobre temas que podem desencadear uma reação ou
situação que não será possível de manejar durante a consulta. Veja bem, não estou incitando
que o oraculista omita ou minta. Mas estou convocando o bom senso para que saibamos os
nossos limites e dos demais, de modo a tornar o espaço da leitura um espaço de construção e
não de destruição. Ainda que o profissional seja um "sincericida", é fundamental que avalie se a
profissão permite esse tipo de comportamento indiscriminadamente. Embora muita gente
enxergue nosso trabalho como superficial, a realidade é que tratamos de questões pessoais,
íntimas, delicadas e isso requer condição psicológica, tato e preparo suficiente.

Sobre as respostas que mais confundem do que esclarecem, também é preciso refletir. Às
vezes, um consulente quer ouvir algo que é impossível de se obter em jogo. Nesse caso, a
pessoa pode dizer que ficou confusa, uma vez que a resposta do oráculo não se encaixa no
padrão esperado, especialmente quando se busca unicamente um "sim”, “não” ou “talvez". Porém,
quando a resposta que confunde é aquela extremamente prolixa, que tergiversa, evasiva, aí é
preciso rever a conduta e a comunicação. Um profissional que não sabe se comunicar terá
problemas recorrentes em função disso. Não quer dizer que todo oraculista precise fazer curso
de retórica ou de teatro (aqui estou exemplificando alguns dos mais procurados nesse caso).
Quer dizer que, se há dificuldade de comunicação, essa dificuldade deve ser trabalhada de
alguma forma. Afinal, nosso trabalho mental é enorme, mas se não soubermos traduzir e
comunicar o que interpretamos, de nada adiantará ser o melhor intérprete de cartas do mundo.

Isso nos leva a mais uma questão importante: como falar com o consulente? E aqui me
refiro a falar mesmo, no sentido de comunicar o que o jogo mostra, que nem sempre é fácil de
ser dito. E a resposta é simples: como você gostaria de ouvir. Se você buscou um
esclarecimento, estará diante do oráculo para saber o que for possível, mas nem por isso de
qualquer jeito. Fale com tato, respeite o consulente, dê tempo para ele digerir o que for preciso.
Ainda que a pessoa peça para “você falar na lata” (sempre ouço isso), é preciso lembrar que
respeito e educação nunca são demasiados.

Compromisso humano
A automatização associada à velocidade que a internet nos traz, gera uma
tendência à impessoalidade. Nosso trabalho é o oposto disso. Nesse sentido,
talvez seja necessário encontrar formas de manter alguma pessoalidade e a
característica intimista da leitura oracular, mesmo estando em ambiente virtual.
Para isso, é preciso ir além do conceito dos "7 passos para o sucesso" e construir
espaços humanos evitando fórmulas prontas, que eventualmente descaracterizam
elementos importantes e constitutivos da consulta personalizada.

- 35 -
A automatização nos trouxe facilidades e dificuldades. Por um lado, facilitou o agendamento,
ampliou as alternativas de atendimento e otimizou o tempo. Por outro lado, aumentou a
distância, gerou impessoalidades em alguns casos e, creio, gerou um dos elementos mais
complicados, o fato de termos que trabalhar "no escuro". Você pode se questionar agora: “Mas a
gente já trabalha no escuro, uma vez que nunca sabemos o que sairá num jogo!”. Isso é uma
verdade. Porém, quando uso o termo "trabalhar no escuro", me refiro ao fato de, muitas vezes,
não termos a menor ideia de quem atendemos. Isso não só distancia e inviabiliza aquela
relação tão importante entre profissional e cliente que mencionei acima, como pode criar
problemas em função desse desconhecimento generalizado. Cabe aqui compartilhar uma
situação que observei e da qual, indiretamente, fiz parte.

Numa das aulas de supervisão que costumo oferecer aos alunos e praticantes, surgiu uma
leitura que havia sido feita poucos dias antes e que a oraculista me trouxe a fim de
debatermos. Era uma Mandala (tiragem ampla, com múltiplas técnicas e possibilidades de
interpretação) e, a partir desse jogo, a consulente gostaria de compreender melhor a fase vivida
e, se fosse possível, avaliar a possibilidade de mudar de residência ou de país. Durante a análise
da oraculista, constatei que as observações dela eram todas pertinentes. O jogo de fato
indicava que o caminho era o da parcimônia, da reflexão, e, consequentemente, mudanças ou
ações impensadas não eram o conselho do jogo. Nada impedia que a pessoa agisse a partir das
próprias escolhas, mas a indicação era a calma, a reflexão, o caminhar gradativo na direção
desejada. Não era aconselhável esquivar dos processos e tentar algo totalmente novo naquele
momento (veja bem: naquele momento). Diante disso, perguntei à oraculista o motivo de ela
trazer o jogo para a supervisão. Então, ela me disse que, após enviar a leitura para a consulente
(via áudio), recebeu uma resposta reativa bastante agressiva dessa pessoa, que afirmava que já
havia começado a mudança, que iria se mudar, não só de casa, mas também de país, e que o
jogo era uma falcatrua porque não havia mostrado isso.

Perceba que esse tipo de situação pode acontecer em qualquer circunstância, mas, quando o
contato com o cliente é menor, as chances aumentam. Na mesma medida em que a rapidez da
vida virtual permite atender alguém de outro estado, que nunca conheceríamos de outra forma,
essa mesma rapidez restringe a relação que é necessária, inclusive para lidar com casos de
pessoas que distorcem nossa proposta. Quando fazemos tudo à distância, não temos
elementos suficientes para saber quais são as condições de quem será atendido, se há
alinhamento entre ambos, se seremos expostos (e aqui cabem cancelamentos, linchamentos
etc.).

Anteriormente, falei da importância de lembrar que atendemos seres humanos e de que


nem sempre eles estão em condições para receber um oráculo. À distância, isso se agrava. Às
vezes não se trata de alguém mal intencionado, mas de alguém fragilizado, que realmente não
deveria ser atendido em consulta oracular por não ter condições de manejar as situações. E
outras vezes, são pessoas nessa mesma situação, porém, agressivas e desgastantes.

- 36 -
O oráculo na internet
Consultas com agendamento eletrônico,
leituras pelo Zoom, Skype, FaceTime; às vezes,
atendimentos feitos através de mensagens
no Facebook, Instagram, gravados em áudio
ou vídeo à distância e contratados
antecipadamente por e-mail; explicações e
informações passadas em mensageiros,
como Telegram ou Whatsapp. O que não
falta é opção para fazer leitura, mas pode
ficar faltando contato. Tente encontrar O atendimento presencial também contém
maneiras de estabelecer contato com seu facilidades e dificuldades. Presencialmente, temos
cliente. Interaja, crie uma relação, ainda que mais contato, um outro tipo de interação, com
mínima, para que a qualidade não se perca e maiores chances de criar uma relação. Em
a praticidade não devore seu trabalho. contrapartida, as situações de risco, inclusive que
Ainda há incertezas, por parte do público, envolvem agressão e descontrole, são mais
sobre o funcionamento efetivo e integral da passíveis de acontecer. Em função disso, não
leitura oracular feita à distância. Quem já fez adianta querer descobrir qual a melhor estrutura
consulta à distância sabe que o conteúdo de atendimento, mas sim qual a melhor forma de
não muda, o que muda é apenas o formato. atender dentro da estrutura possível e escolhida.
Porém, essa dúvida é normal e pode ser O importante é não trocar a qualidade pela
esclarecida com informação, que é parte do praticidade, muito menos achar que é na
nosso trabalho, aliás. impessoalidade que terá menos problemas.

" Trabalhe organizadamente

Não é porque a profissão é vista com informalidade que devemos


corroborar com isso. Faça sua agenda, estabeleça sua conduta, defina
seus limites e suas possibilidades, informe seu público. Estude, recicle,
se aprimore. A seriedade que você doa a esse trabalho vale muito.
"
- 37 -
5. O lugar do oráculo
História, cultura e desmistificação
Reservei um capítulo inteiro para falar sobre o "lugar do oráculo". Esse capítulo é dedicado a
todos os profissionais que já enfrentaram embates exaustivos sobre a eficácia e validade da
prática oracular. Também dedico a todos aqueles que alguma vez já foram menosprezados ou
diminuídos em suas capacidades, pessoais ou profissionais, em função de serem oraculistas,
gostarem de estudar e praticar, ou até aqueles que gostam de se consultar com oráculos. Longe
de fazer apologia ao ressentimento, mas, sim, de querer compartilhar uma satisfação: a de estar
viva para atestar que em ambientes maduros há espaço para reflexão e respeito pelo nosso
trabalho. Como diz um professor que respeito muito: "preconceito não combina com
conhecimento". A seguir, quero falar um pouco da prática oracular num viés inusitado,
abordado numa proposta atualizada e, por que não, libertadora.

Um dos argumentos mais usados entre os críticos de nossa prática é o de que não é
possível encarar como profissão algo que é totalmente randômico e aleatório. Para esclarecer
esse argumento, vou lançar mão de alguns conceitos que aprimorei num curso introdutório
sobre oráculo, chamado Omens, Oracles & Predictions, disponível no edX, um espaço virtual de
educação de alta qualidade, com cursos oferecidos por professores da Harvard University e
outras universidades estrangeiras. Esse curso abordava elementos introdutórios sobre os
temas propostos no título, apresentando dados investigados por vários professores da
Universidade e com o objetivo de esclarecer um ponto fundamental: o que a gente usa hoje em
dia, para prever, antever, prevenir, tem muita relação com práticas ancestrais. Desenvolvi, no
último ano, algumas apresentações sobre isso e demonstrei em eventos o quanto nos
relacionamos de maneira supersticiosa (e mal informada) com o conceito de previsão. Aquela
previsão que acontecia há centenas de séculos, na realidade, apresentava uma função que até
hoje se mantém. Mais que isso, essas práticas se tornaram parte do nosso cotidiano. Para dar
um exemplo, a relação do ser humano com os planetas e, especialmente, com os cometas
existe há muito tempo. Hoje é possível saber quando, como e qual cometa poderá ser visto. Na
antiguidade, não havia ferramentas para isso, mas já havia o interesse e a vontade de estudar
esses fenômenos de modo a interagir com eles e buscar neles um significado. Um cometa, que
era visto como presságio há centenas de anos, em 1687 começava a ser compreendido
cientificamente e, em 1758 culminou numa previsão bem sucedida sobre o retorno do Cometa
Halley. Nesse contexto, do século 18, por exemplo, a previsão já assumia ares científicos. E, ao
longo do tempo, foi se infiltrando cada vez mais em nossa realidade.

- 38 -
Estamos no século XXI, onde contamos com previsão do tempo, previsão sobre eclipses,
cometas ou planetas que eventualmente podem ser vistos a olho nu (com definição de data,
horário etc.), previsões sobre tratamentos e processos de recuperação de saúde, previsões em
praticamente todas as áreas. Segundo esse curso, coordenado pela professora Alyssa Goodman,
da área de Astronomia em Harvard, as previsões ganharam mais e mais força a partir do
desenvolvimento da tecnologia e da ciência, mas sempre existiram e sempre tiveram seu valor.
Desmistificado esse ponto, sobre o papel das previsões e o quanto fazem parte da nossa vida
cotidiana até hoje, vale dizer que, ainda que tenham funcionamentos e finalidades distintas,
carregam uma conexão entre si, gostem os céticos disso ou não. 

Avançando um pouco nesse debate, chegamos então ao elemento supostamente


desmerecedor da nossa prática, o fato de ser aleatório. Aqui, quero deixar um olhar
particularmente pessoal sobre isso, que observa que ser aleatório não é o mesmo que ser
randômico. Observação que se estende para a distinção entre adivinhação e divinação. Isso
pode parecer uma problematização desnecessária, mas diferenciar os termos pode ser um
caminho para enriquecer a reflexão a esse respeito. No caso da divinação, podemos considerar
o sentido de divinar, de revelar, de descobrir. Essa palavra se relaciona com mais proximidade
da prática oracular que, em alguns países, é conhecida como arte divinatória. No português do
Brasil, adivinhar tem um sentido de suposição, não de revelação. Apesar de ambas as palavras
evocarem um entendimento semelhante, creio ser possível ampliar o debate através da
compreensão das sutis diferenças entre o adivinhar e o divinar, e o que cada um desses termos
representa quando os utilizamos no contexto da leitura oracular. Talvez, a utilização do termo
divinar, enquanto revelação e descoberta, represente com maior proximidade a leitura oracular,
e o termo adivinhar remeta à suposição, que se distancia da interpretação simbólica e
imagética que realizamos em nosso trabalho. Seguindo nessa mesma direção, quando usamos o
termo aleatório, dizemos no sentido de "qualquer coisa", como por exemplo, conheci uma
pessoa totalmente aleatória, acabei assistindo uma palestra aleatória, a pessoa agiu de forma
aleatória. Aqui, o aleatório ganha ares de algo genérico, insignificante. Por outro lado, quando
mencionamos o termo randômico, entendemos que é algo que não responde ao nosso
controle, mas que nem por isso carece de um sistema ou de um sentido.

Mas por que estou explicando isso tudo? Porque, seguindo a reflexão anterior, sobre os
termos divinatório e adivinhatório, a prática oracular com o tarô pode ser randômica, mas nem
por isso é aleatória, no sentido de ser solta ou indiferente. Ainda que ambos os termos sejam
semelhantes e signifiquem a mesma coisa, minha proposta é analisar essas palavras no intuito
de diferenciá-las e, assim, estimular um vocabulário pertinente à nossa área, estabelecendo
alguns parâmetros, além de uma comunicação mais acurada.

- 39 -
Da mesma forma que pode ser interessante propor uma distinção entre divinação e
adivinhação, a distinção entre aleatório e randômico pode ter certa relevância, enriquecendo o
vocabulário utilizado pelos praticantes e profissionais. A sofisticação do debate a partir de
termos mais específicos, abre espaço para novos olhares e entendimentos. Em língua
portuguesa, temos riqueza lexical que nos permite fazer propostas de diferenciação de termos
que tradicionalmente são sinônimos em outros idiomas que possuem possibilidades lexicais
mais reduzidas. A seguir, menciono algumas situações como essas.

Nesse mesmo curso que mencionei, a prática divinatória é dividida de forma bastante
didática, que vai nos ajudar a entender esse sistema com facilidade. Segundo a proposta do
curso, a prática oracular (divinatória) se dá de 4 formas: Aleatória (Random), Randomizada
(Randomized), Humana (Human) e Não-Aleatória (Non Random). Vamos às definições básicas a
respeito dessa divisão, a seguir.

A prática Aleatória seria, grosso modo, aquela que abrange as leituras feitas a partir de
processos aleatórios, que ocorrem naturalmente, sem previsibilidade sistemática e sem
intervenção de seres humanos, ou seja, práticas espontâneas (note que, pela definição, o tarô
não se enquadra nessa categoria). Um tipo de oráculo aleatório seria a leitura do voo dos
pássaros, em português também conhecida como ornitomancia (Roman Bird Augury). Nesse
caso, a leitura dependia da manifestação da natureza para que a divinação acontecesse.

A prática Randomizada ou Randômica seria, a rigor, o resultado de um processo realizado


pelo ser humano com o propósito específico de produzir um resultado aleatório. Perceba que
existe uma diferença entre essa prática e a prática anterior, ainda que não haja aqui a intenção
de atribuir juízo de valor, definindo qual é melhor ou pior, afinal, são apenas diferentes. Um dos
exemplos de prática Randomizada ou Randômica é o jogo de dados. Nessa prática,
normalmente, se joga objetos como dados, pedras, moedas etc. (Casting of Lots). A ação
humana de jogar os objetos está lá e inicia o processo. Mas, a maneira com que esses objetos
irão repousar, ou seja, a face do dado que estará voltada para cima ou a maneira com que o
osso ficará parado, essa definição é aleatória (fortuita) e não controlada. 

A prática Humana se dá com a ação direta do vidente (Diviner, que, em tradução livre,
optamos por "adivinho"), e o vaticínio vem diretamente dessa pessoa ou, no mínimo, de
divinação proveniente de uma fonte não discernível além de quem decifra a mensagem. Aqui,
temos um exemplo clássico, o Oráculo de Delfos, em que uma mulher, incorporando forças
sobrenaturais, responde, às vezes de forma ambígua, a uma pergunta (Utterings of "possessed"
persons – declarações de pessoas possuídas). Aqui, valem duas colocações importantes: essa
incorporação pode se dar de maneira induzida, através de alucinógenos, por exemplo, ou
através de estados alterados de consciência, como numa experiência mística; outra colocação
diz respeito ao termo "ambíguo", que foi traduzido diretamente do inglês, mas não quer dizer
duvidoso, e sim metafórico, amplo, demandando uma reflexão para ser compreendido.

- 40 -
Por último, temos a prática Não-Aleatória. Nesse caso, a leitura acontece a partir de qualquer
processo considerado repetitivo, previsível ou, de alguma forma, conhecido de maneira
consistente. Um exemplo é a análise, medição e estudo das posições dos planetas (Measuring
the Position of Planets). Apesar de os astrônomos antigos não saberem a causa do movimento
planetário, eles sabiam que as posições dos planetas seguiam caminhos com padrão repetitivo,
relacionados ao fundo estelar.

Antes de seguir adiante, é preciso deixar claro que esses estudiosos


afirmam que um sistema totalmente determinístico, por exemplo, não é um
sistema oracular ou divinatório, mas sim a lei da gravidade em que a física
reconhece um padrão preditivo e determinístico de ponta a ponta (ou seja,
quando sabemos do começo ao fim o que vai acontecer e isso não irá
mudar, apesar da vontade humana). Ainda que a astrologia tenha o que se
chama de entradas determinísticas, essa prática requer uma leitura não
determinística nem imutável. Os estudiosos ainda enfatizam que a maioria
dos sistemas oraculares não são determinísticos, ainda que a astrologia
tenha sido uma fonte essencial para a astronomia, e que o haruspício tenha
sido igualmente significativo para o estudo da anatomia, da autópsia, entre
outros.

Como se vê, o entendimento de aleatório e randômico podem fazer


diferença, ainda que nosso idioma tradicionalmente interprete de formas
semelhantes. Elucidar essas questões, longe de estereotipar, é aprimorar as
reflexões sobre a leitura e a prática oracular.

- 41 -
As 4 categorias de práticas oraculares
discutidas passam, necessariamente, por um
observador, daí a necessidade de esse
observador ser um especialista nessa leitura ou
prática em especial. A partir da observação (e
conhecimento), o especialista lançará mão de um
sistema preditivo no qual a ferramenta específica
terá condições de ser traduzida ou interpretada.

O tripé do sistema preditivo

1. Observar - a observação dos dados é o


primeiro passo para analisar uma previsão.
Considere como uma entrada (input) do
sistema de previsão, que é alimentada no
"algoritmo" da estrutura. Isso varia, desde a
forma como um pássaro voa até a
localização de um planeta. Teoricamente,
quanto mais observações feitas, mais forte
um sistema de previsão pode se tornar.
O que é um Sistema Preditivo? É um conjunto 2. Fazer a previsão - após observar e
de instruções (ou algoritmos) para fazer previsões processar os dados no sistema preditivo, o
através de um método. Quase nenhum sistema profissional fará a previsão. A clareza da
preditivo é simples, e, por isso, é necessário confiar previsão varia de sistema para sistema
nas habilidades do intérprete. Da mesma forma que (alguns são mais objetivos que outros). Os
uma fórmula física é um sistema utilizado como menos objetivos devem contar com a
caminho para se chegar a um resultado, capacidade de compreensão do cliente.
considerando as devidas distinções (já que não
3. Avaliar a precisão - "a previsão estava
somos deterministas como a física), na leitura
correta ou não?". Parece uma questão
oracular utilizamos de um sistema para interpretar e
simples, mas algumas leituras envolvem
chegar a uma resposta. Por isso, interpretar o oráculo
maior complexidade que isso. Um método
demanda, além de vontade e interesse, estudo e
dedicação. O especialista na leitura oracular precisa
mal trabalhado, pouco conhecimento ou um
conhecer o sistema para fazer uma análise, chegar a entendimento truncado podem interferir
uma interpretação e realizar a consulta. nessa avaliação de resultado.
- 42 -
Quando falamos de previsão e sistema preditivo, devemos considerar as nuances e fatores
que envolvem essa análise. Já vimos anteriormente que não se trata de casualidade, nem de
superstição (com todo o respeito aos supersticiosos. Atire a primeira pedra quem não tem
superstição alguma). O estudo acurado da prática oracular e do sistema preditivo demandam
tempo e são complexos, bem como o seu funcionamento e desenvolvimento na prática. A
equipe de Harvard colaborou muito com essas informações no curso anteriormente
mencionado, e me permitiu desenvolver, ao menos em parte, um conhecimento que comprova
que desmistificar não é tirar a magia, mas recolocar uma atividade em debate e reposicionar
nosso imaginário no que se refere às distorções sobre ela. São informações disponíveis para os
interessados com o intuito justamente de entender o passado de tudo o que fazemos hoje e
que, de um lado ganha prestígio (como a física, a astronomia etc.) e de outro recebe
desmerecimento (como o tarô, a astrologia etc.). Não há nada, de minha parte, contrário ou
relutante quanto à ciência. Sou adepta e respeito o pensamento científico. Mas, assim como as
ideias que compartilhei nesse livro, esses saberes não são excludentes, eles se complementam.
Inclusive, em alguns casos, eles dão origem uns aos outros. O processo de avanço não se dá
com cisão, mas com melhoria e desenvolvimento. Logo, as práticas oraculares, em certa medida,
são o berço de muitas investigações científicas e traduzem ações e comportamentos que
acompanham o ser humano desde muito tempo. A previsão, que hoje está infiltrada em tantas
áreas e em nosso cotidiano, é um desses aspectos.

Durante o surto de cólera no século XIX, a teoria do miasma parecia ter dados convincentes
que mostravam uma correlação entre a elevação e a incidência de cólera, e que,
posteriormente, foi esclarecida, já que foi descoberto que indivíduos em altitudes mais baixas
não adoeciam por causa do miasma, mas sim porque a água ali era, geralmente, mais
contaminada com matéria fecal do Tâmisa. Nesse caso, estavam confundindo correlação com
causalidade. Esse é um exemplo de um processo que não foi baseado em fatos precisos e, por
isso, o erro foi cometido (aqui, o próprio sistema de previsão falhou).

Esse exemplo, citado ao longo do curso, nos permite fazer uma associação com nossa
prática, pois muitas vezes encontro alunos e praticantes com um medo aterrador de errar na
hora da leitura. E claro, ninguém quer errar ou se equivocar no que se refere à vida de outras
pessoas. Contudo, o erro faz parte, seja da prática oracular ou mesmo da ciência, já que o
desenvolvimento científico está em constante mudança e reformulação. Portanto, querer
trabalhar com oráculo e não aprender a conviver com os erros, que fazem parte da prática, é
uma ilusão, podendo criar um comportamento bastante complicado e irracional. Não quero
aqui incentivar todos a cometerem erros, mas sim relembrar que o erro, o ajuste e os
equívocos também fazem parte de nosso trabalho. Nem sempre é um problema pessoal, de
interpretação. Há variáveis que podem contribuir com erros e, por isso, buscamos estudar para
nos aprimorarmos ao máximo nesse quesito.

- 43 -
6. Ética e Responsabilidade
A apreciação, a crítica e o comprometimento
Como ser ético num mundo antiético?

É comum se pensar que, em se tratando de um trabalho que envolve subjetividades,


que não oferece um ensino formal ou que não é reconhecido por órgãos ligados à
educação e cultura, principalmente a partir de uma ferramenta tão plural quanto o tarô, a
ética não seria necessária e a responsabilidade, portanto, seria relativa. Mas não é assim.
Usemos como exemplo a psicanálise, que também não forma alunos e praticantes através
de um ensino formal, mas tem todo um processo de desenvolvimento dos profissionais
estruturado em ética e responsabilidade. Leitura oracular não é a mesma coisa que
psicanálise, isso já foi falado acima. Mas o ponto aqui é demonstrar que a ética e a
responsabilidade devem ser fundantes, estruturais, não facultativas. E isso independe da
profissão, da maneira como se dá a formação e de como se decida exercer um ofício. E
como vimos, não é porque não temos universidades de tarô ou de prática oracular,
tampouco porque trabalhamos numa profissão mistificada, que aquilo que fazemos ou
oferecemos tem menos valor. Buscar motivos para agir eticamente já é indício de falta de
ética.

Como um dos meus intuitos aqui é refletir, não bater o martelo sobre assuntos que
ainda oferecem muito espaço de discussão, quero olhar através de mais de um ponto de
vista a fim de contribuir com o aprofundamento do debate. Vamos começar observando a
época em que vivemos. Uma época em que as polarizações e os extremismos dominam a
maioria dos espaços e relações. Não que antes na história nunca tenhamos tido
polarizações, extremismos, radicalismos. Porém, na atualidade, isso vem se intensificando.
Um dos aspectos muito discutidos nas pesquisas e estudos, inclusive os de ordem
comportamental, é que essa acentuação se deu em função da aceleração, da velocidade,
da pressa, intensificadas com o surgimento e com a difusão da internet. Tudo se apressou
nos últimos anos. Escrevemos menos, porque os posts não permitem escrever além de
um número específico de caracteres. Falamos menos, porque os vídeos em redes sociais
devem ser cada vez mais curtos. Divulgamos com mais sensacionalismo, porque os
stories do Instagram duram apenas 24 horas e o tempo para "convencer" as pessoas acaba
rápido.

- 44 -
Praticamente abolimos o uso de telefone (já virou infortúnio receber ligação), enviamos
áudios e recheamos mensagens com pequenos desenhos para garantir que sejamos
compreendidos em nossas intenções (e para enfeitar, porque o entretenimento é palavra
de ordem no contemporâneo). Sem contar as edições, que corroboram com a
sensibilização. Editamos mensagens para não sermos mal interpretados, reenviamos
áudios que parecem menos educados, construímos expressões palatáveis. Vamos ver o
outro lado?

Dentro desse mesmo ambiente, ganhamos mais força, porque atingir aqueles de quem
não gostamos ficou muito mais fácil. Xingar, cancelar, editar e mandar trechos ou prints de
conversas para atiçar intrigas virou o dia a dia de todos nós. Sejamos nós os atores ou os
alvos, sabemos que esse tipo de comportamento já é parte da realidade. Não adianta
muito relutar ou fantasiar um mundo "como antigamente", até porque antigamente não
tinha comentários infelizes no meu post. Mas também não era tão simples obter
informações sobre uma clínica ou serviço que preciso contratar. É por isso que a
polarização e a radicalização não apenas são parciais, como são desgastantes. Um mundo
onde todos concordam, onde haja lugar para todos e onde a ambivalência inexiste, não é
um mundo de seres humanos. Eis o primeiro elemento para refletirmos: tanto o bem
quanto o mal, no contemporâneo, são produtos. E assumir um comportamento do bem ou
do mal vai depender bastante do número de likes que poderei angariar. Ética, nesse
contexto, vira terra de ninguém, porque até ela pode ser usada como marketing pessoal
ou profissional.

Foi pensando nisso que resolvi escrever sobre ética, tentando definir esse conceito
como algo que deve pautar nossa prática, no sentido de conferir credibilidade, estrutura,
consistência e também dar significado ao que fazemos. Não é uma questão de ser
"bonzinho” ou “mauzinho", mas de fazer uma escolha quanto à conduta e comportamento
que norteará nossa prática profissional. Afinal, se a gente começar a relativizar demais, em
breve teremos justificativas suficientes para abolir qualquer razão sensata para uma
atividade profissional saudável e significativa. E não, ninguém precisa amar o que faz ou
fazer o que ama, mas é possível praticar o que se deseja de forma minimamente
consciente e responsável.

Entre a ética, enquanto um manual de normas a serem seguidas para assegurar um


trabalho digno, e a ética no sentido comportamental, há uma estrada longa, cheia de
paradas e atalhos. Portanto, vamos começar pela parte mais concreta desse tema que é o
fato de termos um código de ética disponível para nos pautar. Esse código não é
brasileiro. Trata-se do Código Ético del Tarot, ao qual é possível se afiliar estando em
qualquer país. Aqui, já fica uma dica importante: se afiliar ao Código Ético e não o ler nem
seguir seus preceitos, apenas pegar o selo para exibir em redes sociais e sites, já é
antiético.

- 45 -
Logo, se um profissional decidir se afiliar a um código de ética, o indicado é que ele o
respeite e o siga. No código citado, há três partes essenciais, além da apresentação,
informações e explicações sobre adesão, informações sobre como foi construído e
indicações para uso do selo, dentre outras. Nessas três partes principais, que se referem
à conduta do tarólogo, encontramos o Decálogo (10 preceitos fundamentais), além das
recomendações para o bom uso do tarô e as recomendações para o tarólogo.
Recomendo vivamente a leitura do conteúdo disponível no site da Escola Marilo Casals.

Alguns preceitos desse código se referem a dúvidas que alunos e praticantes


apresentam com frequência. Criado em 2012, o documento segue atual e aborda
assuntos que vez ou outra os oraculistas se questionam. Não pretendo comentar aqui
todo o conteúdo, pois a ideia é partir dessa premissa básica – um código de ética – para
avançar no debate e falar mais sobre elementos que nos inquietam profissionalmente.
Porém, vou pinçar o subtítulo do Decálogo para desenvolver essa questão: "Nós
orientamos, os clientes decidem". Por essa abertura, é possível notar que o Código foi
escrito sob a égide do livre arbítrio, assunto frequentemente reduzido no que se refere
ao tarô. E quando uso o termo reduzido, é no sentido de reducionismo, mesmo, de ser
apequenado. Veja bem, anteriormente, compartilhei a proposta de professores da Harvard
University a respeito da importância do oráculo e, simultaneamente, o quanto o oráculo
não é determinista. E, ao iniciar a leitura do  Código, nos deparamos com um título que
alerta que, sem liberdade, não haverá orientação oracular.

Isso não quer dizer que a previsão seja uma bobagem (já falamos disso aqui) nem
que um ou outro estilo tem menor importância (também já falamos sobre isso). O
principal aqui é entender que não precisamos saber tudo, não precisamos ditar o futuro
de ninguém e que, especialmente, não faz sentido ler um oráculo ignorando o papel que
o consulente tem diante de sua própria vida. De um lado, sabemos que há um anseio
por determinismo quando se trata de definir o oráculo, por outro lado, também sabemos
que, com o avançar do tempo, o ser humano ganhou cada vez mais espaço na
construção da própria vida. Há poucas décadas atrás, uma mulher não poderia escolher
sua profissão, por exemplo. Há pouco tempo (nem chega a ser décadas), um casamento
desfeito era escândalo social. Há pouco tempo, também, não querer ter filhos era sinal
de algum transtorno ou infertilidade. Mas nós caminhamos, e caminhamos rapidamente
com a internet. Nessa trajetória, as escolhas ganharam espaço e foram adicionadas de
fermento. Ler tarô, atualmente, implica considerar o que o Código Ético del Tarot propõe:
nós orientamos, os clientes decidem. Isso não muda a efetividade ou o papel do tarô,
apenas atualiza a prática oracular com o tarô no contemporâneo.

- 46 -
O médico psiquiatra e psicanalista brasileiro, Jorge Forbes, afirma que vivemos num
tempo em que nos encontramos desbussolados, pois fazer escolhas certas num mundo
inundado de tecnologia, informação e incertezas é aterrador. Em nosso trabalho, lidamos,
portanto, com as subjetividades já mencionadas, com mudanças e ajustes de época; um
boom de informação e pressão em virtude da vida online e em redes sociais, uma
realidade convertida em likes e objetificação. Junto disso tudo, acrescentamos a livre
escolha, ou o chamado às escolhas, que muitas vezes oprime. Não à toa, comumente
clientes buscam uma resposta definitiva, ou pedem para que o tarô decida ou escolha o
que for melhor, que mostre o caminho. É mais um retrato da realidade em que vivemos
estampado em nossa prática e que se reflete em nossa ética, no sentido de que
precisamos ter consciência do que fazemos, para quê o fazemos e o que as pessoas
buscam em nossa prática profissional.

Mas nada disso é motivo para desespero. O próprio Jorge Forbes diz que "talvez a
gente esteja vivendo o período mais criativo da raça humana, mas para usufruir dele não
podemos ficar assustados, pois o medo é inimigo da criatividade". Mas o que o Jorge
Forbes tem a ver com o tarô? Nada e tudo. Nada, porque ele atua em outra área. Tudo
porque ele fala sobre temas que nós, oraculistas, percebemos na prática diária do nosso
trabalho. Falar de tarô – e de ética – implica em falar também de ser humano e de vida,
não só de cartas e casas de jogo. Refletir sobre isso e entender o que faz parte da nossa
realidade só ajuda a dar condições de manejo e coragem em nosso ofício cotidiano. A
ética passa pelo ponto em que, mesmo estando online, nas redes, e participando dessa
realidade que se impõe – e da qual, muitas vezes, gostamos –, não podemos abdicar de
estar conscientes do que essa realidade pode representar e significar.

Minha experiência na internet começou lá pelos idos dos anos 2000. Em 2006, decidi
que trabalharia fundamentalmente online, numa época em que pouco se cogitava isso.
Estamos em 2022 e, após dois anos de pandemia, vimos que é possível trabalhar, estudar
e produzir na internet. Aprendemos isso na base da lei da sobrevivência, pois não
sobrou outra alternativa. Foi a contingência (acaso, destino, fortuna) se apresentando para
que tomássemos decisões. Mesmo estando há dezesseis anos trabalhando na internet,
não abri mão de observar o que isso promoveu em nossas vidas. Ampliamos nosso
trabalho, atendemos pessoas que jamais aceitariam se consultar à distância, demos aula
para pessoas que afirmavam detestar "essas coisas de tecnologia". Veja bem, isso não é
provocação, mas o panorama do que mais li e ouvi nesses tempos. E mesmo assim, não
deixei de notar que foi um período em que o número de oraculistas aumentou
significativamente, o que chamei de Fenômeno dos Tarólogos de Pandemia.

- 47 -
O marketing se tornou mais agressivo, os ataques em redes sociais também. Com a
imposição de lockdown e restrições práticas, precisamos escolher como iríamos lidar
com isso tudo. Ética é também escolha. Você escolhe se adaptar ou resiste até o fim?
Você escolhe amadurecer na prática ou prefere fazer um curso intensivo para atender
logo em seguida? Você escolhe ser parte dessa profissão ou prefere se apartar dos temas
que envolvem esse trabalho? Poderíamos pensar em inúmeras perguntas como essas,
mas o que importa aqui é demonstrar que a parte que vai para além de um código, mas
que ainda assim envolve ética, tem a ver com as escolhas que fazemos a cada dia, a cada
semana, a cada passo que damos em nossa caminhada. E, assim como não é fácil para a
gente fazer essas escolhas, pois muitas delas nos retiram  likes, diminuem visualizações,
viram motivo de retaliação ao vivo, da mesma maneira não é fácil para o consulente, que
nos busca ansiando para que o destino (ou o tarô) resolva todas as questões e decisões
que ele precisa tomar. O pano de fundo desse cenário também é ético, e é mais profundo
do que apenas se comportar como uma pessoa boa ou uma pessoa má no mundo. O
bem (e fazer o bem) também virou moeda de troca na vida virtual, pois na vida
presencial, muitas vezes, vemos que aquilo que se prega online não é praticado. Para
nossa infelicidade, o mal tem funcionado da mesma maneira. Não escapamos de viver e
conviver com essa dualidade, mas podemos escolher como lidar com ela.

Há mais um ponto que fortalece o aspecto ético, e que também não é tão óbvio: a
capacidade crítica e, mais adiante, a capacidade de autocrítica. Recentemente, ouvindo
um programa no rádio, acompanhei uma entrevista muito interessante com um rabino e
escritor, Nilton Bonder. Nessa entrevista, ele falava sobre a capacidade apreciativa do ser
humano enquanto uma capacidade de apreciar o que acontece com ele e aquilo que o
afeta. Nesse contexto, Bonder queria dizer que apreciar é ampliar sua habilidade de
elaborar, de perceber, de observar e, em última análise, aprimorar sua capacidade crítica.
Estamos numa época em que a crítica vem imbuída de ressentimento, ou de escárnio, ou
de provocação. Pior que isso, estamos numa época em que muitas pessoas abdicam de
sua capacidade crítica a fim de não arrumar problema com ninguém. Tanto de um lado, o
que critica para destilar veneno, quanto de outro, o que se omite e se engasga naquilo
que percebe, temos pessoas num modo reativo, e não ativo. A crítica é ação, no sentido
de que ela nos coloca ativos diante de nossas próprias vidas. Criticar não é injuriar,
ofender, reclamar, arrumar defeito. Criticar é questionar. E isso só é possível quando não
abrimos mão de apreciar – seja num sentido ou no outro – as coisas e afetos que nos
acometem. No viés da ética, a crítica é importante porque nos coloca ativos naquilo que
fazemos de um jeito menos materialista e mais comprometido. Quando nos implicamos
com o que fazemos, estamos significando nossa prática. 

- 48 -
Durante muito tempo, eu fugia da crítica. Qualquer uma, de qualquer
tipo, especialmente as críticas mais cruéis. Como todas me assustavam, não
sabia distinguir as que poderiam contribuir e as que eram uma mera perda
de tempo. Após as primeiras experiências falando de tarô no ambiente
acadêmico, e com muito sofrimento para digerir tudo o que ouvi e li,
entendi que há diferentes tipos de críticas. E que aquelas que vêm
imbuídas de colaboração são os melhores incentivo na caminhada do
conhecimento. Em especial, certa vez, escrevi um artigo sobre tarô e,
quando recebi a revisão, entrei em choque. Eram tantos riscos vermelhos e
comentários que me senti uma completa incompetente. Aos poucos, fui
digerindo, lendo cada comentário e sugestão, revi, acatei, consertei.
Quando foi publicado e li, senti uma satisfação incrível. Sem a revisão,
aquele artigo não seria metade do que se tornou. Com essa e outras
experiencias, além de alguns trechos oportunamente escritos pela autora
estadunidense Brené Brown, aceitei a crítica como uma parte que, se bem
feita, constrói pontes e fortalece a ética do comprometimento com aquilo
que se faz. Algum tempo depois, aceitei publicar um artigo sobre tarô, após
revisão acurada, obviamente, em que falava sobre a espetacularização da
espiritualidade e da prática oracular no Brasil; uma comunicação
autocrítica, onde me predispus a olhar para esse trabalho oracular e
entender onde foi que nós erramos e onde contribuímos com o cenário
oracular que enfrentamos no país, ainda tão antiquado e cheio de tabus.
Ética, portanto, requer olhar crítico, e acolhe o ceticismo como uma forma
de manter olhos abertos em relação ao papel do outro e o nosso, também.

- 49 -
Responsabilidade ética
A ética está nas regras do manual ou do
código, está nas escolhas, na capacidade
apreciativa, no comportamento e na ação que
moldam nosso caráter profissional. A ética
está também na responsabilidade, que carrega
aspectos práticos de comprometimento.

Sigilo
1 A padronização ética
Assuntos de ordem pessoal e íntima
devem ser protegidos, não expostos. Como manter minha identidade
profissional, sem abrir mão do que acredito,
Discrição ao seguir certas regras na prática oracular?
2 Trate com  equilíbrio o que for caro A escolha por uma prática ética não deve
ao consulente e em relação a ele. ferir quem você é, tampouco te oprimir. A
responsabilidade não se confunde com a
identidade – ao contrário, ambas se
Pontualidade e respeito
3 Quando definida a consulta, a
complementam. Ainda que você tenha seu
estilo de trabalho e sua forma de conduzi-lo,
pontualidade é sinal de respeito. nada impede que a sua prioridade esteja
pautada em um fazer responsável.
Imparcialidade Saber jogar, saber ler ou se destacar na
4 Um consulente precisa de sua
arte divinatória não autoriza ninguém a
abrir mão de elementos fundamentais para
leitura, não de seu envolvimento.
uma prática responsável. A capacidade
" interpretativa requer uma estrutura anterior,
para que se tenha espaço de trabalho, pois o
Trabalhe de modo a integrar o conhecimento precisará de uma base que
acomode um desenvolvimento digno e

"
aprendizado teórico, prático e técnico ao
comprometimento ético e responsável. íntegro de sua profissão.

- 50 -
Não devemos deixar de lado a responsabilidade jurídica. Sair da informalidade, ou, ao
menos, profissionalizar a prática oracular, envolve também pensar a respeito disso. Como
já mencionei antes, nossa profissão é reconhecida, ainda que a certificação não formal
(em cursos livres) isente formação prévia ou escolaridade específica. De todo modo,
certificados podem servir como atestado de estudo e aprimoramento ou especialização
sobre o assunto. Na internet, você encontra a CBO (Classificação Brasileira de Ocupações)
e também informações sobre contribuição no INSS, caso seja de seu interesse.
Atualmente, tanto essas informações quanto grande parte dos encaminhamentos são
feitos de modo virtual. Essa é uma parte importante para entendermos que não estamos à
deriva, que somos reconhecidos pelo Ministério do Trabalho e que podemos homologar e
comprovar nosso trabalho se quisermos.

Outro aspecto da responsabilidade jurídica é estarmos atentos ao oferecermos


transparência em nossa prática e nas informações que fornecemos. Acredito que você já
tenha visto, em algum momento, notícias sobre cartomantes, videntes ou oraculistas
envolvidos em casos de extorsão, injúria, má fé. Para entender esses processos, inclusive
no aspecto legal, é importante que busquemos direcionamentos confiáveis a respeito dos
nossos limites e das maneiras que podemos agir, a fim de evitar esse tipo de situação.
Muitos colegas, eventualmente, oferecem bate papo e entrevistas online, em lives ou
vídeos do YouTube, com advogados ou consultores, a respeito desse aspecto jurídico.
Normalmente, esse tipo de material informativo tem baixa procura, pois a busca por
aprender a jogar é sempre maior do que a busca pela conscientização a respeito daquilo
que envolve o exercício da profissão. Mas, repito, são assuntos e esclarecimentos
necessários para nos ajudar a pautar a responsabilidade prática do que fazemos e
fortalecer elementos de ordem ética. Isso é parte fundamental do exercício da profissão.

Recentemente, uma colega oraculista, que reside na Europa atualmente, partilhou


comigo informações significativas sobre esse tema. Em alguns países da Europa, como a
Inglaterra e a França, por exemplo, certos oraculistas já divulgam em suas redes e
informativos algumas restrições de atendimento, no que se refere à saúde mental e à
forma como procedem em sua prática profissional. Além disso, esses profissionais
buscam deixar visível e acessível o que chamamos de "Aviso Legal" (disclaimer), que seria
uma nota a respeito da responsabilidade de cada um durante o atendimento e no que se
refere ao teor da consulta. Assim como observamos, na maioria dos sites, na parte inferior
da página, avisos que reiteram a proibição da reprodução de conteúdo sem autorização,
ou alertando para o plágio, é possível utilizar esse recurso para alertar ou fazer ressalvas
importantes. Isso já delimita aspectos relevantes, contribui para termos um comprovante
de aviso e esclarecimento prévios, bem como contempla a clareza de atuação. Alguns
profissionais, inclusive, são favoráveis a disponibilizar termo de compromisso ou de
responsabilidade, a fim de evitar publicação ou exposição posterior da consulta e
assegurar sigilo, discrição e as ocorrências que se deram ao longo da leitura.

- 51 -
Por último, mas não menos importante, gostaria de falar sobre ética e
responsabilidade para além do óbvio. Quando era menina, minha avó materna morava
numa cidade pequena, no interior de São Paulo, para onde muitos italianos imigraram. Ela
tinha uma vida muito simples, não havia sido alfabetizada na infância, mas vivia sua vida
com uma dignidade ímpar. Essa história é semelhante à de tantas outras, que marcaram
positivamente a vida de quem conviveu com esses exemplos naturais de ética e
integridade. Não é preciso ter dinheiro, trabalho, fama ou um amor bem sucedido para
justificar a conduta ética. Minha avó, de quem herdei o segundo nome, tinha uma
peculiaridade: era vidente e benzedeira. Até hoje, não havia publicado esse dado porque
confesso que as comparações me cansam um pouco, e nem de longe quero ofuscar tudo
o que ela foi e representou dizendo que "puxei os interesses dela". Até porque não sou
nada disso, e essa confusão entre o que são oraculista, vidente, bezedeira e feiticeira
também me cansa. Fato é que, para sobreviver, minha avó vendia os ovos que suas
galinhas botavam, o que sua horta produzia e, em dias determinados, atendia pessoas
com os mais variados problemas, benzendo e dando suporte. Ela era católica, uma
católica que acompanhava a missa do galo em latim, mas que não abria mão de fazer o
que sabia para quem necessitava. Pessoas em situação de privação iam nos dias
determinados para serem benzidos ou para ouvirem seus direcionamentos. Nunca
consegui ouvir o que ela falava durante esses benzimentos, que eu mesma recebi várias
vezes. Ela praticava leitura do carvão na água, que consiste em pegar um copo com água
e nele jogar 3 pedras incandescentes de carvão que, no caso dela, estavam sempre
disponíveis no fogão a lenha. Assim que o carvão caía na água, ela observava e dizia
alguma coisa. Só para mim, ela leu inúmeras vezes. Eu ficava encantada com aquela
ritualística, com a seriedade e a integridade com que ela fazia sua magia. Às vezes, depois
disso tudo, ela ainda passava uma linha de carretel na cintura, rezava (também nunca
consegui ouvir ou distinguir as palavras) e depois dispensava a pessoa. Às vezes ela
recebia por isso, às vezes não. Era ela quem determinava como todo o processo se daria:
disponibilidade de "agenda", tempo de duração, qual ferramenta usar, quanto (e como)
cobrar, além da conduta que, naturalmente, deixava claro para todos que, naquele
momento, ela precisaria daquele espaço e respeito.

A conduta ética é anterior a normas. Ela nasce do compromisso com a integridade e


da tranquilidade de se estar agindo como se deve. Não é uma questão de certo ou errado,
mas de estar inteiro no que se propõe a realizar. A Dona Amabile, nome da minha avó,
nascida na década de 30 do século XX, era uma mulher que sustentava a casa, trabalhava,
recebia a família aos domingos e praticava sua divinação altiva dentro de todo aquele
sincretismo inquestionável. A ética que se faz por obrigação deixa de ser ética, vira
reprodução vazia de sentido. Ser ético é uma das poucas condutas que só encontram
significado se forem praticadas conscientemente e voluntariamente. Só para fechar essa
história como ela merece, além de tudo isso, a Dona Amabile se alfabetizou e se formou
no Mobral, lá pelos seus mais de 70 anos. E como eu amava abrir aquela gavetinha da
mesa da cozinha para olhar seus cadernos de estudo!

- 52 -
A consulta oracular se dá através de uma ferramenta – o oráculo – e funciona a partir
de um sistema. Não podemos esquecer que, ainda que o oráculo seja o instrumento
através do qual se torna possível obter respostas, desempenhando a função de ponte, é
fundamental que, em cada lado dessa ponte, tenha alguém, no caso, consulente e
oraculista. Logo, a consulta se efetiva a partir da relação entre duas pessoas, intermediada
pelo oráculo. Em tempos de internet, de redes sociais, mensageiros e aplicativos, vemos
cada vez mais uma automatização que, em determinados casos, pode minimizar esses
papéis e superficializar essa relação. Veja bem, mais uma vez quero deixar claro que não
estou fazendo uma apologia contra o trabalho virtual (eu mesma faço), mas chamando a
atenção para evitarmos os extremos que poderiam nos levar a uma desumanização da
prática oracular. Já vimos que o ponto não é a tiragem ou a forma como o oráculo
funciona (randomizada, aleatória, humana, não-aleatória), a questão é para quem se faz e
quem o faz. Provavelmente, você já testou formas impessoais de consulta oracular, tais
como clicar numa imagem e ver o que a interpretação automática revela. Ou mesmo
fechar os olhos, abrir um livro e colocar um dedo em determinado lugar para ver o que
está escrito e encontrar semelhanças. Não quero aqui entrar no debate sobre validação
subjetiva, quero considerar que, de fato, essas experiências carregam consigo um
significado. Ainda assim, não é a mesma experiência da leitura oracular realizada numa
dinâmica personalizada. Não se trata de ser melhor ou pior, mas diferente. Ambas podem
coexistir, mas, honestamente, não acredito que seja produtivo uma prática extinguir outra.

Humanize seu atendimento


Há lugar para a prática oracular automatizada, mas deve haver lugar para a
prática personalizada, que seria aquela feita artesanalmente, em que uma pessoa
analisa o jogo para outra pessoa (ou até analisa o jogo para si mesma). E, tendo a
oportunidade de fazer uma leitura personalizada, lembre-se de que o que
distingue sua leitura de uma prática impessoal é justamente o fato de ter a
chance de interagir, se relacionar, construir uma dinâmica que pode render um
diálogo com percepções incríveis. Nessa experiência humana, a revelação é ser
atravessado pela representação simbólica, se deixando ressignificar através das
imagens. Não esqueça: quem busca o oráculo é tão humano quanto você, e é
essa humanidade que pode tornar uma experiência única para ambas as
pessoas ali comprometidas.

- 53 -
7. Fundamentos
Estude - Aperfeiçoe - Revele
Há poucos anos, escrevi um ebook gratuito com basicamente duas intenções: a
primeira era atualizar as informações introdutórias sobre o papel do tarô, a segunda era
furar a "bolha da moda" dos ebooks, que eram oferecidos como "isca", termo que elevou
o sentido do conhecimento a um novo patamar, o de atrair desavisados. Como já repeti
algumas vezes ao longo desse livro, não quero antagonizar com o marketing, até porque,
na vida real, todos nos utilizamos dele. Meu ponto aqui é refletir sobre a possibilidade
de, em alguns casos, esse tipo de estratégia destituir determinados serviços de
identidade, transformando tudo em produto com o intuito único de gerar lucro. Todos
gostamos de dinheiro, mas nem todos ficarão satisfeitos com um trabalho
despersonalizado. Ademais, a associação entre a prática oracular e uma máquina
registradora pode remeter a uma ideia da nossa profissão que não contempla a intenção
de todos os profissionais. Portanto, quando lancei o ebook gratuito, o fiz sem a intenção
de torná-lo uma isca. Meu intuito era apenas informar gratuitamente as pessoas que
tivessem interesse pelo tema. E assim o fiz, deixando o livro disponível para download
gratuito no meu site até o momento atual. Nesse primeiro ebook, propus uma tríade logo
no início, como um mapa, e que dizia: “Desmistifique – Contextualize – Compreenda”. Ali,
eu estabeleci um tripé que estruturou todo o conteúdo do ebook, apresentando, de forma
clara, informações que, de fato, deveriam ser acessíveis a todos. Esse tripé serviu para
sustentar o conteúdo, a iniciativa e a finalidade do livro.

Neste ebook, que você lê agora, a intenção é outra. Não à toa, o material não é
gratuito, e não usarei isca alguma para vendê-lo, pois ele servirá exclusivamente às
pessoas que querem fundamentar ainda mais sua prática. Como a proposta é diferente,
deixei o tripé por último, como um prelúdio para o fechamento desse conteúdo e com a
esperança de que seja só o princípio de uma jornada cada vez mais consciente em sua
prática oracular. Vale para qualquer momento e qualquer estágio de sua prática: estude.
Estude, sempre, porque é estudando que desenvolvemos humildade e percebemos que
saber tudo é sinal de saber pouco. Ocupar a posição de aluno é um exercício pessoal,
que humaniza nosso saber, que nos ensina humildade, além de arejar aquilo que já se
sabe. Ouvir e ler a mesma coisa de formas distintas, desenvolver pensamento crítico,
refletir ou relembrar, tudo isso só nos torna mais humanos, em vários sentidos.

- 54 -
Aperfeiçoe. Mas não no sentido de virar aquela pessoa que nunca está satisfeita ou
que nunca se sente suficiente. Quando menciono o aperfeiçoamento, é porque ele nos
torna quem somos profissionalmente. Um oraculista é um especialista. Um especialista
em interpretar cartas, imagens e símbolos a partir da observação de um sistema,
traduzindo aquilo que interpreta para alguém que está buscando respostas para suas
questões de vida. Aperfeiçoar envolve praticar, desenvolver habilidades, encontrar seu
estilo e se apropriar de sua abordagem. Significa construir sua identidade profissional,
que torna você alguém capaz de fazer um trabalho de modo que ninguém mais fará da
mesma maneira. E quando digo isso, não pretendo criar rótulos que enquadram quem é
melhor ou pior, tampouco quero instigar competição, pois isso já temos em nosso
ambiente e só atrapalha nossa convivência. Também não é minha intenção criar
comparações, pois isso também temos aos montes nas redes, inclusive pessoas que
promovem seus trabalhos através da crítica de outros profissionais. Aperfeiçoar é um
processo constante, é construção de teoria e prática, é personalização e integração de
tudo o que foi vivido e que ainda será experimentado ao longo da trajetória profissional.

Só então será possível revelar. Revelar o que um jogo apresenta e se revelar no


mundo, enquanto alguém que tornou o oráculo sua profissão de forma consciente, e não
alguém que buscou no oráculo um refúgio por falta de opção. Ainda que não deixe de
ser válido complementar sua renda com a prática oracular, por tudo o que já foi
mencionado anteriormente, fica claro que essa profissão envolve uma opção
absolutamente consciente, de comprometimento e responsabilidade, com significado
único para cada pessoa que se decida por essa via. A revelação permite que a gente
entenda que leitura oracular não é sobre descobrir, escarafunchar, é sobre ter maturidade
para estar aberto àquilo que o oráculo – e, consequentemente, a vida – tem a nos
mostrar. Falando tarologuês, a leitura oracular está muito mais próxima do Julgamento do
que do Mago. Sem a mente aberta, fica difícil que algo se revele para nós.

Quando decidi escrever esse livro, foi num click. Nas interações e discussões das
redes sociais, pude ver ali que havia um assunto sobre o qual eu realmente gostaria de
falar. Me conectei tanto com o tema que me preparei para escrever sobre ele, e quando
sentei para fazer isso, não parei mais. E nessa cadência de escrita, também não quis fazer
nada no estilo "7 passos para uma prática oracular melhor". Se você viu o título do meu
primeiro ebook, vai entender. Foi literalmente uma ironia sobre propostas que se
dispõem a uniformizar a vida e reduzi-la a um número xis de passos que, claro, não tem
como funcionar para todos. Não à toa, aqui, deixei mais reflexões e menos regras.

- 55 -
Contudo, ao longo do livro, você deve ter
percebido que mencionei algumas vezes o termo
"fundamental". Considere, em cada uma dessas
citações, uma sugestão de fundamento. Agora, vale
um comentário particular: ao ler os fundamentos e
as reflexões, você mesmo pode se dar conta, nas
entrelinhas, de algum fundamento que eu mesma
não tenha mencionado aqui. Caso isso aconteça,
então, seremos presenteados duplamente e
estaremos construindo juntos.

Ter preparo para atender é fundamental. Mas


isso não o isenta de se sentir inseguro em relação
ao seu trabalho, pois é algo que será aprimorado na
medida em que você o colocar em prática. Saber a
hora certa de começar, de reciclar, de mudar é
subjetivo, por isso não há um manual definitivo
sobre o momento certo de se começar a atender.
Essa decisão é única e intransferível, o que não
quer dizer que não se possa ter suporte para isso.

- 56 -
Fechamento
Assim como a carta do Mundo, todo fim é prenúncio de um novo começo

Quase sempre finalizo um projeto com a mesma sensação de quando vou viajar, de
que estou esquecendo alguma coisa. Quando escrevo, sinto que ainda teria muito mais a
dizer ou que deixei algo de lado. Porém, assim como numa viagem, depois que a gente dá
a partida, não tem como voltar atrás. Então, resta seguir adiante sabendo que tudo o que
foi lembrado e guardado irá junto com a gente. Ainda que seja o fechamento do
conteúdo desse ebook, está longe o encerramento do tema. Ainda há muito a ser dito, e,
como quase tudo em nossos dias, certamente em breve teremos mais outros debates a
travar sobre esse assunto. Uma das coisas mais desafiadoras é justamente escrever e
marcar aquela escrita no tempo. Com o passar dos anos, muita coisa muda e até a nossa
perspectiva é revista, dando a sensação de que um conteúdo ficou datado e precisa ser
revisitado. Em contrapartida, é muito bacana poder ler o que se pensava e articulava em
determinada época. Na lista de prós e contras, marcar a escrita em determinada época
acaba sendo mais interessante que não registrar o que se pensa por medo do que está
por vir. Nós, enquanto oraculista que somos, sabemos que grande parte do futuro não
existe, porque, em grande medida, o futuro se constrói. E, em relação às coisas sobre as
quais não se pode fazer nada, essas não precisam ser vistas, entendidas ou aceitas.
Aquilo que não tem como ser mudado, deve ser enfrentado.

A carta do Mundo pode ser uma boa inspiração para essa despedida, porque ela nos
desafia a fecharmos ciclos e enxergarmos, no que foi vivido, uma experiência de
integração. Concordando ou não, gostando ou não, uma hora nós precisamos integrar
tudo o que vivemos para poder fechar a conta e seguir em frente. Essa carta, inclusive,
diz que não é porque é o fim, que precisa ser ruim ou esmorecer. É possível integrar tudo
o que foi vivido para seguir em frente mais leve, mais consciente e pleno, buscando
novos começos. E que esses novos começos sejam ainda mais gratificantes. De
preferência, que seus novos começos sejam verdadeiros. Não sou daquelas pessoas que
acham que evolução indica sempre uma melhora, afinal, doença também evolui (e nem
sempre para melhor). Portanto, que possamos avançar, porque é assim que o mundo – e
o Mundo – caminha. Na prática oracular brasileira contemporânea, precisamos de
atualização, de desmistificação e de conscientização constantes. Não para mudarmos o
cenário profissional e sermos todos felizes para sempre (bem que seria bom, mas a vida
real é mais complexa que isso). Justamente porque há avanço, sempre haverá terreno a
ser desbravado. Por isso, convoco você a seguir me acompanhando nessa caminhada que
nos desafia sempre, mas que, igualmente, nos permite revelar, da vida, o seu melhor.

- 57 -
Agradecimentos
Meu principal agradecimento é para as pessoas que me acompanham em minhas redes
sociais. Não me sinto confortável chamando essas pessoas de seguidores, porque me
sinto, na realidade, acompanhada por elas. Cada enquete, cada interação, cada debate é
um clarão que se abre e permite avançar. Agradeço de coração a todas essas pessoas.

Agradeço à minha família, que sempre me Agradeço aos colegas que, na sugestão de
apóia, ainda que esse apoio envolva tempos temas, acabaram me trazendo a necessidade de
afastados, momentos de cansaço e  - muitas escrever e registrar o que desenvolvi nessas
vezes -  desatenção de minha parte. Para que eu páginas.
conseguisse escrever esse ebook,  resolvi me Às autoras e autores que, direta ou
afastar por alguns dias, a fim de ter todo o meu indiretamente, participaram dessa proposta. É
tempo disponível para pensar nisso. Sou impressionante o quanto essas pessoas -
alguém bem resistente em priorizar minhas citadas nas referências -  permeiam o que faço
necessidades, especialmente quando isso e me ajudam a lapidar reflexões.
envolve remanejar meus filhos, que são as Ao Heitor Pinheiro (@heitorpinheiro_) pela
criaturas que mais amo nessa vida. revisão incrível.
Mesmo resistente, entendi que precisaria de Nesse livro, evitei a variação de pronomes,
tempo e espaço para estruturar esse livro, para por uma questão de fluidez de escrita e leitura.
deixar que ele fluísse numa escrita livre. Para Mas, não posso deixar de agradecer às minhas
isso, precisaria estar sozinha no início do colegas, clientes e alunas. Mulheres incríveis
processo (coisa que não fazia há mais de 20 que me dão espaço e que confiam em meu
anos). Mais uma vez, essas criaturas foram trabalho: vocês são inspiração e resistência.
incríveis e, em momento algum, me
questionaram. É nessa confiança que produzo.  Seguimos juntos.

Clientes, vocês são causa e consequência


   Não há gratidão suficiente a vocês, clientes, que são pessoas que permitem
que eu aprenda diariamente, através de suas histórias, dúvidas e
disponibilidade em compartilhar comigo parte de seus dilemas e dores.
Vocês são a causa principal dessa proposta que fundamenta nossa prática e
são, também, consequência de todo esse processo. É um prazer e um
privilégio andar lado a lado com quem se permite conhecer melhor.

- 58 -
Referências
◦ Bonder, Nilton (2022): Como Encontrar a Nossa Essência. Disponível
em: https://cultura.uol.com.br/radio/programas/melhor-da-
vida/2022/04/16/101_como-encontrar-a-nossa-essencia.html. Acesso em jul. 2022.

◦ Brown, Brené (2012): A Coragem de Ser Imperfeito. Editora Sextante

◦ Código Ético del Tarot (2007) disponível em: http://eticaytarot.com/. Acesso em: jul.
2022.

◦ Forbes, Jorge (2010): Psicanálise do Homem Desbussolado. Disponível em:


http://jorgeforbes.com.br/psicanalise-do-homem-desbussolado-artigo-psique/.
Acesso em: jul. 2022.

◦ Frankl, Viktor (2020): Sede de Sentido. Editora Quadrante

◦ Gawande, Atul (2014): Mortais: Nós, a Medicina e o que Realmente Importa no Final.
Editora Objetiva

◦ Naiff, Nei (2017): Curso Completo de Tarô. Editora Alfabeto

◦ PredictionX: Omens, Oracles & Prophecies. Disponível em


https://www.edx.org/course/omens-oracles-prophecies. Acesso em: jul. 2022.

◦ Rees, Amanda: The History of Predicting the Future (traduzido como A História de
Prever o Futuro). Disponível em Wired: https://www.wired.com/story/history-
predicting-future/?
utm_source=NexoNL&utm_medium=Email&utm_campaign=OQEL Tradução para
português disponível em: https://kelmamazziero.com/atualizacao-de-textos. Acesso
em: jul. 2022.

◦ Riley, Jana (1995): Tarot, Dictionary and Compendium. Editado por Samuel Weiser,
INC.

◦ Windson, Jader (2021): A Cartomancia no Âmbito Jurídico. Disponível em:


https://jaderwindson.jusbrasil.com.br/artigos/1203002985/a-cartomancia-no-
ambito-juridico. Acesso em: jul. 2022.

- 59 -
FUNDAMENTOS
DA PRÁTICA ORACULAR COM O TARÔ

KELMA MAZZIERO
Julho/2022
São Paulo

Todos os direitos reservados


Copyright ₢ 2022 por Kelma Mazziero

Imagens cedidas por Visme 2022

Você também pode gostar