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GUIA DE LEITURA

CRIME E CASTIGO
Índice
Do autor__________________________________ 3
Resumo da obra ____________________________ 8
Parte I _______________________________ 9
Parte II_______________________________ 14
Parte III ______________________________ 18
Parte IV ______________________________ 22
Parte V_______________________________ 26
Parte VI ______________________________ 28
Personagens ________________________________ 34
Chaves de interpretação_______________________ 36
Do autor
DOSTOIÉVSKI: O bárbaro barbado

Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski nasceu em 11 de novembro de


1821, no Hospital Santa Maria dos Pobres, na periferia de Moscou.
Seu pai, Mikhail Dostoiévski, era médico e descendente de nobres da
Lituânia, que perderam os títulos nobiliárquicos por problemas finan-
ceiros e passaram a ingressar na vida sacerdotal. A mãe do escritor,
Maria Fiodorovna, era filha de comerciantes moscovitas.

A família vivia em um apartamento nos fundos do hospital, mas, para


manter as aparências, contava com vários criados. Na década de 1820,
Mikhail recebeu um título de nobreza pelos serviços prestados como
médico. Em 1831, a família mudou-se para um propriedade na zona
rural de Moscou, onde Dostoiévski teve seus primeiros contatos com
a gente comum da Rússia.

Contrariando a aristocracia daquele tempo, Dostoiévski recebeu de


seus pais e professores uma educação religiosa e russa, em vez da for-
mação iluminista e afrancesada que estava em voga entre a elite. Em
1836, Maria Fiodorovna faleceu, deixando órfãos oito filhos. No mes-

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mo ano, Dostoiévski foi enviado junto de seu irmão mais velho à Aca-
demia de Engenharia Militar de São Petersburgo. Antes entusiasmado
com a vida militar, Fiódor decepcionou-se com os castigos físicos im-
postos aos alunos e com os maus hábitos dos professores.

Em junho de 1839, Mikhail Dostoiévski morre em circunstâncias


jamais esclarecidas. A conduta do patriarca era violenta com os ser-
vos, e há suspeitas de que estes o assassinaram, vingando anos de
opressão contínua.

Em 1843, Fiódor formou-se como tenente e passou a dedicar-se à


escrita, que conhecera justamente ao trabalhar em jornais estudantis.
Passa a viver uma vida de excessos, contrai dívidas e se envolve em pi-
râmides financeiras. Neste período traduz Eugènie Grandet, de Balzac,
La dernière Aldini, de George Sand, e Mary Stuart, de Friedrich Schil-
ler. Abandona, em 1844, a carreira militar e inicia a escrita de Gente
Pobre. Em janeiro de 1846, publica-o na revista Petersburg Almanac.
Sua estreia recebe elogio efusivos de Vissarion Belinsky, crítico célebre
à época, e Alexander Herzen, autor prestigiado e popularíssimo. Pu-
blica em seguida O duplo, na revista Otechestvennye Zapiski. Recebe
pagamentos antecipados do editor e, por isso, passa a publicar ficção
regularmente na revista.

Belinsky e Herzen o influenciam a se envolver com grupos revolucioná-


rios. Começa a participar de reuniões de um grupo radical que se inspira
no socialismo utópico de Charles Fourier. Em 1848, o czar Nicolau I
intensifica o monitoramento de grupos extremistas por temer que che-

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gasse à Rússia a atmosfera revolucionária que agitava a Europa ociden-
tal. Dostoiévski e mais dezenas de militantes são presos e condenados à
morte por fuzilamento. No momento da execução, os condenados são
informados de que a pena foi comutada em trabalhos forçados.

Cumpre a pena na prisão Osmk, na Sibéria. Devido ao indulto, o


escritor passou a nutrir gratidão e admiração pelo czar Nicolau I. Na
prisão, conheceu de fato a natureza humana: prostituição, roubos, as-
sassinatos, mentiras, hostilidades entre presos, camponeses e revolu-
cionários. Dali em diante deixou de lado as idealizações que tinha
sobre a Rússia, passando a olhar a todos, aristocratas e camponeses,
reacionários e progressistas, cristãos e ateus com a mesma compaixão
e boa vontade.

Em 1854, foi enviado como soldado ao batalhão de Semipalatinsk,


também na Sibéria ocidental. Lá conheceu o casal Aleksandr Ivanovit-
ch Isaev e Maria Dmitrievna Isaeva, de quem tornou-se amigo íntimo
e tutor dos filhos. Em 1855, Aleksandr, que era alcoólatra, faleceu;
em 1857, o escritor casou-se com a viúva. Dois anos depois, recebeu
permissão para retornar à Rússia europeia, instalando-se em Tver, ci-
dade no caminho entre Moscou e São Petersburgo. No ano seguinte,
publica os primeiros capítulos de Recordação da casa dos mortos, ro-
mance que retrata a vida dos presos na Sibéria. Em parceria com o
irmão Mikhail, funda a revista literária Vremya, onde viria a publicar
Humilhados e Ofendidos.

Em 1862, viaja pela primeira vez para a Europa ocidental, passando


por Alemanha, Bélgica, França e Inglaterra. Nesta viagem, conheceu os

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jogos de roleta, vício que o acompanharia pelo resto da vida. Notas de
inverno sobre impressões de verão (1863) e O Jogador (1867) trazem no
bojo experiências vividas pelo autor nesta primeira viagem. Em 1864,
funda a revista Epokha, nova parceria com Mikhail, que, por má admi-
nistração, fechou em menos de um ano. Neste mesmo ano, enquanto
redigia Cadernos do Subterrâneo, Maria Dmitrievna Isavea faleceu.

Crime e Castigo é redigido e publicado em 1866; O jogador é publicado


em 1867, mesmo ano em que Dostoiévski casa-se com Anna Grigo-
rievna Snitkina, sua datilógrafa. Pressionado por credores e problemas
familiares, o casal fugiu para a Europa. A viagem deveria durar alguns
meses, mas se estendeu por quatro anos, com passagens por Dresden,
Genebra, Milão e Florença. Durante a viagem, Dostoiévski entregou-
-se ao vício no jogo. Em Genebra, em 1868, nasceu Sônia, a primeira
filha do casal, que faleceu cerca de dois meses depois.

Em 1872, retornaram a São Petersburgo e Dostoiévski publicou Os


demônios. Em 1873, tornou-se editor da revista Grahzadanin, na qual
é publicada a coluna Diário de um escritor. Em 1875, nasce Alexei, o
segundo filho, e O adolescente é publicado. Alexei faleceu em 1878, em
decorrência de graves crises epiléticas. A perda faz crescer no escritor
o fervor religioso, levando-o a visitar mosteiros com maior frequência.
Neste mesmo período, Dostoiévski aceita o convite do czar Alexandre
II para ser tutor de seus filhos mais novos.

No seu último ano de vida, dedicou-se a escrever Os irmãos Karama-


zov, publicado na revista O mensageiro russo. Em junho, proferiu um

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discurso memorável durante a inauguração de um monumento em
homenagem a Aleksandr Púshkin, em Moscou, falando sobre a obra
do poeta e sobre o destino da Rússia entre as nações. No dia 6 de feve-
reiro de 1881, caiu de cama em razão de um enfisema pulmonar. Em 9
de fevereiro, faleceu. Sua procissão fúnebre foi seguida por uma grande
multidão, que lamentava a morte do bárbaro barbado que, ao lado de
Tolstói, já era considerado o maior escritor russo.

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Resumo
da obra
Parte I
I

Em um dia de calor em São Petersburgo, um jovem sai do seu quarto


de pensão e, enquanto desce as escadas, ouve a voz da proprietária do
imóvel, que mora no andar de baixo. O jovem lhe deve vários meses de
aluguel e por isso recua ao ouvi-la. Ao sair da pensão, o jovem volta seu
pensamento ao ato extremo que está prestes a cometer, mas que o lei-
tor ainda ignora. Ele se considera incapaz de consumar tal ação, pois,
se não tem forças sequer para encarar sua senhoria, como levará a cabo
um ato extremo? No último mês, o jovem finalmente decidira-se a agir,
embora tenha estado muito perturbado. Agora, ele chega ao prédio de
Aliona Ivánova, uma usurária. O jovem sobe as escadas observando
cuidadosamente o prédio. Ao apresentar-se à agiota, descobrimos que
ele é estudante e se chama Raskólnikov. O protagonista nota que os
móveis do apartamento são velhos, mas estão perfeitamente limpos
graças ao trabalho de Lisaveta, irmã mais nova da velha. Raskólnikov
oferece um relógio à usurária, que em troca lhe entrega uma quantia
ínfima. O jovem observa que a velha guarda seu dinheiro em um baú
e suas chaves no bolso direito. Antes de partir, Raskólnikov avisa que

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voltará em alguns dias com outro penhor e pergunta se Lisaveta cos-
tuma estar em casa naquele horário. Fora do prédio, Raskólnikov é
tomado por uma súbita sede de álcool, vai a uma taverna, senta-se em
um canto escuro, bebe cerveja e mais uma vez medita sobre a execução
do seu plano misterioso.

II

Na taverna, Raskólnikov conversa com um bêbado chamado Mar-


meládov. Este afirma ter orgulho de ser casado com Katerina Iváno-
va, mulher de origem nobre. Katerina, porém, casara-se com ele por
desespero, pois havia sido deserdada e experimentado um mau casa-
mento, que resultara em três filhos. Marmeládov havia alcançado um
posto no serviço público, mas fora demitido por causa do alcoolismo.
Para auxiliar o pai e a madrasta, Sônia, filha do bêbado, passou a se
prostituir. Enquanto conta a história, Marmeládov ora justifica seus
atos, ora se autocensura. Os dois saem da taverna e rumam para a casa
de Marmeládov. Lá encontram Katerina, que agarra o marido pelos
cabelos e lhe censura pela perda do emprego. Vizinhos observam e
zombam da briga familiar, e a proprietária ordena que Katerina saia da
propriedade imediatamente. Raskólnikov deixa um pouco de dinheiro
para a família e vai embora. O jovem logo arrepende-se da caridade
e enche-se de ódio por Marmeládov, sobretudo por forçar Sônia a se
prostituir.

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III

Na manhã seguinte, Raskólnikov é acordado por Nastássia, criada da


pensão, que lhe entrega uma carta de sua mãe Pulkhéria Aleksándrov-
na. Nastássia diz a Raskólnikov que a dona do imóvel deseja despejá-
-lo. Na carta, a mãe relata que Dúnia, irmã de Raskólnikov, estava tra-
balhando como empregada doméstica para ajudar a sustentar o irmão
estudante, mas teve de abandonar o emprego após ser assediada por
Svidrigáilov, o patrão.

Dúnia, então, aceitara o pedido de casamento de um rapaz chamado


Piotr Petróvich Lújin, que desejava aproveitar-se da situação financeira
da família. Pulkhéria salienta que ela e a filha a princípio não dese-
javam o casamento, mas decidiram aceitá-lo na esperança de que o
futuro marido viesse a ajudar Raskólnikov financeiramente. Mãe, filha
e noivo em breve estariam em São Petersburgo. Ao terminar de ler,
Raskólnikov está em prantos.

IV

Raskólnikov decide que não permitirá que o casamento se consume,


pois não deseja que Dúnia se sacrifique para ajudá-lo. Um velho perse-
guindo uma jovem alcoolizada interrompe seus pensamentos. Raskó-
lnikov intervém em favor da garota. Um policial surge, e Raskólnikov
lhe dá algum dinheiro para que leve a jovem alcoolizada para casa em
segurança. A garota caminha lado a lado com agressor e policial. Este,
pensa o irritado Raskólnikov, irá abandoná-la assim que o jovem estu-

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dante estiver fora de vista. Raskólnikov percebe estar caminhando em
direção à casa de Razumíkhin, seu melhor amigo da universidade, a
quem não encontra há quatro meses.

Raskólnikov decide não encontrar Razumíkhin antes de executar seu


plano misterioso. Bêbado, adormece em um gramado. No sonho, re-
lembra de um momento da infância em que testemunhou um grupo
de camponeses espancando até a morte uma égua velha e débil. Um
menino protesta contra a crueldade, abraça a égua e grita que parem
até ser carregado por seu pai. Raskólnikov acorda horrorizado com o
ato que está planejando e mais uma vez desiste de executá-lo. Cami-
nha, então, até o mercado público, onde encontra Lisaveta. A irmã da
velha usurária diz que não estará em casa em determinado horário do
dia seguinte. Raskólnikov percebe a oportunidade.

VI

O plano de Raskólnikov é explicitado: ele deseja matar Aliona Ivánov-


na. Raskólnikov desenvolvera um ódio tremendo pela usurária desde
a primeira vez que a viu. Tempos depois, ouviu, em um bar, um es-
tudante falando a um policial que o mundo seria um lugar melhor se
aquela velha usurária fosse morta e sua riqueza, distribuída entre os
pobres. Raskólnikov impressionou-se ao perceber suas próprias ideias
sendo ecoadas pela voz de outrem. Teve, então, certeza de que era justo
e necessário matar a usurária.

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De volta ao presente, Raskólnikov dorme um sono profundo até a
noite seguinte. Ao acordar, arranja um falso penhor para entregar a
Aliona, além de conceber maneira de carregar um machado em seu
sobretudo. Às sete e meia, toca a campainha de Aliona.

VII

Raskólnikov entrega à Aliona uma cigarreira enrolada por um nó com-


plicado. Enquanto a usurária tenta desfazê-lo, o jovem golpeia-lhe a
cabeça várias vezes. Raskólnikov não encontra nada de valor. Lisaveta
entra no apartamento e fica paralisada ao ver a irmã morta ao lado do
assassino. Raskólnikov a mata com um golpe certeiro, e então percebe
que a porta permaneceu aberta o tempo todo. Desesperado, lava as
mãos e tranca a porta. Dois homens estranhos aproximam-se, deter-
minados a averiguar o que acontece. Raskólnikov escapa e se esconde
em um apartamento vizinho, onde dois pintores trabalhavam. Lá per-
manece até perceber o momento oportuno para a fuga. Raskólnikov
volta para casa fazendo um caminho incomum, na intenção de despis-
tar alguém que o estivesse seguindo. Antes de entrar no quarto, coloca
o machado de volta no local de onde o havia retirado.

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Parte II
I

Após uma noite de sono febril e agitado, Raskólnikov procura vestígios


de sangue em suas roupas. Descobre no bolso os itens penhorados que
havia roubado. Por volta do meio-dia, Nastássia e o porteiro entregam-
-lhe uma intimação para comparecer à delegacia. Mesmo preocupado,
Raskólnikov obedece. Na delegacia, descobre que fora denunciado por
dever o aluguel. Lá ouve um detetive falar sobre o assassinato de Aliona
e Lisaveta, e desmaia imediatamente. Quando acorda, o detetive Iliá
Petróvich pergunta-lhe o que estava fazendo no dia anterior. Raskólni-
kov sai da delegacia temendo ter se tornado suspeito do crime.

II

Raskólnikov enterra os objetos roubados sob uma pedra em um terre-


no baldio e vai visitar Razumíkhin. O amigo preocupa-se com a saú-
de de Raskólnikov e lhe oferece trabalho como tradutor. Raskólnikov
recusa e parte irritado com o amigo. Após caminhar sem rumo pelas
ruas, chega em casa às oito da noite. Cai em sono profundo, durante
o qual sonha que o detetive da polícia está batendo na dona de seu

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apartamento. Ao acordar, pergunta a Nastássia se isso de fato ocorreu
ou se não passou de um sonho. Nastássia afirma ter se tratado de um
sonho ruim.

III

O assassino começa a ter alucinações. Numa manhã, acorda cercado


por Nastássia, a dona de seu quarto, Razumíkhin e um estranho. O
estranho lhe entrega trinta e cinco rublos enviados por Pulkhéria Alek-
sándrovna. Raskólnikov descobre que está delirando há quatro dias e
que estava sob os cuidados daqueles que lhe cercavam quando acor-
dou. O médico Zossímov e o detetive Zamiótov lhe visitaram durante
esse período. Razumíkhin manteve os credores de Raskólnikov – em
particular a dona do imóvel – sob controle. Zossímov entra.

IV

Zossímov, Razumíkhin e Nastássia discutem o assassinato de Aliona


e Lisaveta. Razumíkhin está defendendo um dos pintores que traba-
lhava no apartamento ao lado da moradia da usurária. A investigação
descobriu que ele estava com um brinco que havia sido penhorado
por Aliona. Razumíkhin argumenta que o verdadeiro assassino pode
ter deixados os brincos caírem enquanto fugia do edifício e o pintor os
teria encontrado em seguida.

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V

Quando Razumíkhin encerra sua fala, surge um homem estranho à


porta. É Lújin, noivo de Dúnia. Ele se empenha em demonstrar inte-
resse por ideias progressistas e revolucionárias, na intenção de impres-
sionar os dois jovens. Estes, porém, o recebem com frieza. Quando
Lújin sai, Zossímov e Razumíkhin voltam a falar dos assassinatos. Este
argumenta que o crime foi cometido por um amador, já que 1.500
rublos foram deixados para trás e apenas quinquilharias foram rou-
badas. Lújin retorna, novamente tentando exibir inteligência. Razu-
míkhin critica suas ideias políticas e a conversa se acalora. Raskólnikov
intervém, acusando Lújin de aproveitar-se da condição empobrecida
de Dúnia. Lújin ofende-se e vai embora furioso. Raskólnikov expulsa
Razumíkhin, Zossímov e Nastássia do quarto. Na saída, Zossímov co-
menta com Razumíkhin que a simples menção aos assassinatos irrita
profundamente Raskólnikov.

VI

Tomado por uma súbita lucidez, Raskólnikov sai pela rua. Adentra um
café, onde conhece o inspetor de política Zamiótov. Raskólnikov puxa
conversa e passa a implicar com o inspetor, afirmando saber muito so-
bre assassinatos e crimes de maneira geral. Claramente perturbado, o
assassino quase confessa o crime e desperta suspeitas em Zamiótov. Por
fim, Raskólnikov disfarça, convencendo o inspetor de que é apenas
um sujeito um tanto excêntrico. Sai às pressas do café, e tromba com
Razumíkhin na escada. Este repreende o amigo por sair sozinho, mas

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o convida para a primeira festa em sua nova casa; Raskólnikov recusa.
Atravessando uma ponte, fica enjoado ao testemunhar uma tentativa
de suicídio. Vagando febrilmente, logo se vê em frente à casa de Aliona
Ivánovna. Vai até o apartamento, onde estão trabalhando dois operá-
rios. Pergunta-lhe, então, por que removeram o sangue do chão e das
paredes. Os pedreiros nada respondem, e o porteiro o expulsa. Na rua,
Raskólnikov vê uma multidão reunida.

VII

Marmeládov foi atropelado por uma carruagem e ficou gravemente


ferido. Raskólnikov leva-o para casa. Um médico diz que não há re-
médio para os ferimentos. Marmeládov chama um padre, que exorta
Katerina a reconciliar-se com o marido. Ela não aceita os conselhos,
e segue amparando o marido enquanto o amaldiçoa como bêbado e
inútil. Marmeládov morre nos braços de Sônia. Raskólnikov deixa 20
rublos para a família e promete sustentá-los no futuro. Pólenka, uma
das filhas de Katerina, corre atrás dele e lhe pergunta seu nome, agin-
do em nome de toda a família. A criança abraça Raskólnikov. Ele não
responde à pergunta, mas pede que a família ore por ele.

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Parte III
I

Pulkhéria e Dúnia preocupam-se com Raskólnikov, mas ele se irrita e


as manda embora, não sem antes ordenar a Dúnia que rompesse o noi-
vado com Lújin. Razumíkhin conversa com as duas mulheres nas esca-
das do prédio de Raskólnikov, prometendo trazer o médico Zossímov
para passar a noite junto ao rapaz. Pulkhéria e Dúnia simpatizam com
Razumíkhin, que lhes jura lealdade, declara amor a Dúnia e critica Lú-
jin. Após passarem alguns momentos com Raskólnikov, Razumíkhin e
Zossímov visitam mãe e filha. O médico acalma as mulheres, afirman-
do que Raskólnikov decerto está sofrendo algum tipo de obsessão, mas
logo ficará bem. Do lado de fora, Razumíkhin fica com ciúme quando
vê Zossímov cumprimentar Dúnia e planeja aproximá-lo da senhoria
de Raskólnikov.

II

Na manhã seguinte, Razumíkhin arrepende-se de tudo quanto dissera


a Dúnia. Ao visitá-las novamente, é muito bem recebido pela moça
e sua mãe. O trio conversa sobre Raskólnikov. Dúnia e Pulkhéria

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mostram ao rapaz uma carta em que Lújin lhes ordena não visitarem
Raskólnikov novamente. Além disso, Lújin também revela na carta
que Raskólnikov havia doado grande parte do dinheiro à família de
Marmeládov. Razumíkhin aconselha Pulkhéria a seguir os conselhos
da filha no que diz respeito à relação entre Lújin e Raskólnikov. Dúnia
acredita que os dois ainda podem se reconciliar. Os três entram no
quarto de Raskólnikov.

III

Zossímov cumprimenta mãe, filha e amigo e informa que a saúde de


Raskólnikov está melhor. Este se esforça para aparentar gentileza e
pede desculpas pelas grosserias que cometera nos dias passados. A paz
acaba quando o jovem ordena que Dúnia não se case com Lújin. Dú-
nia retruca dizendo que “não é culpada pela morte de ninguém”. Ao
ouvir isso, Raskólnikov desmaia, mas logo se recupera. Dúnia mostra
ao irmão a carta de Lújin. A moça planeja um encontro entre irmão e
noivo. Raskólnikov aceita o convite.

IV

Sônia entra no quarto e convida Raskólnikov para o funeral de Mar-


meládov e para o jantar organizado por Katerina em homenagem ao
falecido. Dúnia e Pulkhéria saem educadamente. Raskólnikov diz a
Razumíkhin que penhorara um relógio valioso com Aliona Ivánovna
e gostaria de tê-lo de volta e pergunta ao amigo se valeria a pena fa-
lar sobre o assunto com Porfiri Petróvich, magistrado responsável pela

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investigação do assassinato e parente de Razumíkhin. Este responde
positivamente. Os três saem do quarto. Enquanto Sônia caminha de
volta para casa, um homem chamado Svidrigáilov a segue. Ao final,
descobrimos que os dois são vizinhos de porta. Enquanto isso, Razu-
míkhin e Raskólnikov vão à casa de Petróvich. Raskólnikov faz piadas
sobre a atração do amigo por sua irmã, tentando parecer à vontade.
No íntimo, ele se pergunta se Petróvich sabia da sua visita à usurária
na véspera do crime.

Raskólnikov tenta aparentar despreocupação na casa de Petróvich, mas


ri de maneira forçada e causa desconforto no ambiente. Ao perceber
a presença de Zamiótov, o rapaz fica ainda mais nervoso. Razumíkhin
revela a todos que seu amigo fica extremamente nervoso sempre que o
assassinato é mencionado e isso torna o ambiente ainda mais pesado.
Petróvich afirma que Raskólnikov era o único cliente da usurária que
ainda não havia buscado seus pertences. Raskólnikov crê estar entre os
suspeitos e então começa a contar sobre suas caminhadas e delírios na
véspera do crime. O clima torna-se menos tenso, e o suspeito passa a
crer que tem uma relação amistosa com o investigador. Todos passam a
discutir a razão do crime e Petróvich menciona um artigo que Raskól-
nikov havia escrito e, sem conhecimento do autor, fora publicado dois
meses antes. No artigo, Raskólnikov argumentava que certos homens
estavam acima da média humana e, portanto, tinham licença para ma-
tar. Petróvich incita o suspeito a elaborar melhor a tese. Antes de par-

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tir, Petróvich pergunta a Raskólnikov se ele havia visto algum pintor
trabalhando no prédio em sua última visita à casa de Aliona, dois dias
antes do crime. Raskólnikov percebe a armadilha, pois havia dois pin-
tores no dia do assassinato, não dois dias antes, e responde que não.

VI

Raskólnikov crê ser suspeito do crime. Razumíkhin discorda do ami-


go, pois Petróvich não discutiria tão abertamente com um suspeito.
Os dois tentam analisar Petróvich e se perguntam se a pergunta final
do investigador fora uma armadilha. Raskólnikov crê que sim e diz ao
amigo ter percebido e dado uma resposta conveniente. O porteiro do
prédio avisa que um homem havia acabado de perguntar por Raskól-
nikov. Este corre atrás do homem, que lhe olha friamente e lhe chama
de assassino sem dar maiores explicações. Raskólnikov retorna para o
seu quarto em estado febril. Pensa nas suspeitas de Petrovich e na acu-
sação do estranho, mas tenta se convencer de que a vida da usurária
não valia nada. Porém, reflete sobre as razões que o levaram a cometer
o crime e se ele realmente estaria entre os homens extraordinários que
havia descrito em seu artigo. Naquela noite, tem um pesadelo em que
tenta assassinar a usurária, mas ela, em vez de morrer, ri. Ao acordar,
dá com um estranho em seu quarto.

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Parte IV
I

Svidrigáilov veio pedir ajuda a Raskólnikov para conquistar Dúnia. O


homem explica que nutre sentimentos puros por ela e que, ao contrá-
rio dos boatos, nada tem a ver com a recente morte de Marfa Petrovna,
sua esposa. Conta a Raskólnikov, então, a história de seu casamento,
afirmando que Petrovna aproveitara-se da situação difícil em que ele
se encontrava para controlá-lo e dominá-lo. Afirma também ser cons-
tantemente visitado pelo fantasma da esposa morta, em revelação que
faz Raskólnikov duvidar da sanidade do visitante. Svidrigáilov diz ter
ouvido falar do noivado de Dúnia e Lújin, seu parente, e se oferece
para acabar com essa união inadequada. Embora não esteja apaixona-
do por Dúnia, Svidrigáilov afirma não poder suportar que ela se una a
um marido tão detestável. Para conquistá-la, planeja dar-lhe dois mil
rublos como pedido de desculpa. Raskólnikov afirma que sua irmã
recusará tal presente. Svidrigáilov termina por revelar que sua esposa
deixou três mil rublos para Dúnia em seu testamento. Ele sai, passan-
do por Razumíkhin ao sair.

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II

Razumíkhin diz a Raskólnikov que conversou com Petróvich e Za-


miótov e descobriu que ambos o consideram suspeito dos assassina-
tos. Os amigos encontram-se com Lújin, Dúnia e Pulkhéria. Lújin
havia exigido que seu cunhado e Razumíkhin não comparecessem, e a
chegada deles fere seu orgulho. Decide, então, perturbar as mulheres
falando da chegada de Svidrigáilov a São Petersburgo e dos crimes e
depravações a ele atribuídos. Dúnia julga que as histórias não passam
de maledicência. Raskólnikov conta a todos sobre seu encontro com
Svidrigáilov e sobre o dinheiro que Petrovna legara a Dúnia, mas não
informa quais são as intenções de Svidrigáilov em relação à moça. Esta,
por sua vez, pergunta a Lújin a razão do aborrecimento com a presença
de Raskólnikov. Exasperado, Lújin dispara ofensas contra todos. Dú-
nia expulsa Lújin, que agora odeia Raskólnikov, a quem atribui a culpa
pelo rompimento do noivado.

III

Após a saída de Lújin, Razumíkhin fica exultante. Raskólnikov con-


ta a todos que Svidrigáilov planeja oferecer dez mil rublos a Dúnia;
Razumíkhin diz que a protegerá de qualquer ameaça e sugere que mãe
e filha permaneçam em Petersburgo e trabalhem juntas no ramo edi-
torial. Raskólnikov aceita as sugestões, mas se levanta, diz que precisa
separar-se deles por longo período e sai porta afora. Razumíkhin segue
o amigo, mas Raskólnikov ordena-lhe que tome conta de Pulkhéria
e Dúnia. Os dois se encaram e Razumíkhin percebe num átimo que
Raskólnikov é o assassino.

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IV

Raskólnikov vai ao quarto de Sônia, que se surpreende com a visita.


Eles falam sobre Katerina Ivánovna, a quem Sônia defende e Raskól-
nikov ataca. Sônia demonstra grande compaixão para com a madrasta,
e teme que sua morte deixe seus irmãos desamparados. Apesar das
dificuldades, a prostituta tem fé que Deus tomará conta de toda a
família. Ela revela que era amiga de Lisaveta, a quem dera uma cruz e
uma edição do Evangelho. Raskólnikov a interrompe e lhe ordena que
leia em voz alta a história de Lázaro. Trêmula, Sônia o faz. Raskólnikov
conta-lhe que irá se separar da mãe e da irmã e a convida a acompa-
nhá-lo pelo mundo. O protagonista vê nela uma “alma gêmea”, pois
sua posição como prostituta transgride a lei moral e destruiu uma vida
– a da própria prostituta. Ele afirma que elasaberá em breve quem
matou Lisaveta. Svidrigáilov escuta toda a conversa, com o ouvido co-
lado à parede do quarto vizinho.

Na manhã seguinte, Raskólnikov vai à delegacia entregar a Petróvich


um requerimento por escrito de seus bens penhorados. Os dois enga-
tam conversa e Raskólnikov logo percebe ter caído em uma armadilha
do investigador. Petróvich tenta deixar o suspeito à vontade, tagarelan-
do sem parar e ocasionalmente lançando frases enigmáticas no ar. Ele
fala sobre a juventude e inteligência do provável assassino, e o compara
a Raskólnikov. Este permanece quieto por longo tempo, até explodir
e desafiar o investigador a acusá-lo abertamente. Petróvich tenta acal-

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má-lo, mas, ao mesmo tempo, insinua saber da visita de Raskólnikov
ao prédio da usurária no dia seguinte ao crime. Os dois são interrom-
pidos por um “incidente singular”.

VI

Nikolai, prisioneiro suspeito dos assassinatos, entra correndo no es-


critório e confessa o crime. Petróvich não crê que ele seja culpado,
mas leva a confissão a sério e dispensa Raskólnikov, deixando claro
que precisará vê-lo novamente em breve para fazer mais perguntas.
Em casa, Raskólnikov percebe que teria confessado o crime caso Ni-
kolai não tivesse interrompido a conversa. Nesse momento, o es-
tranho que o havia chamado de assassino no dia anterior aparece à
porta. O homem identifica-se como inquilino do prédio da casa de
penhores e afirma ter testemunhado a visita de Raskólnikov à cena
do crime. Também diz não saber mais nada além disso e que, após
ouvir a conversa entre o suspeito e Petróvich na delegacia, acredita na
inocência de Raskólnikov. Ao ouvir, o assassino fica aliviado e renova
suas esperanças de não ser pego.

25
Parte V
I

Lújin está em seu apartamento com Lebeziátnikov, jovem que é seu colega
de quarto. Ele percebe que seu noivado com Dúnia está definitivamente
rompido, e por culpa de Raskólnikov. Pensar em todo o dinheiro gasto para
a futura casa dos recém-casados faz Lújin tremer de ódio. Ele e Lebeziátnikov
foram convidados para o jantar que Katerina Ivánovna, moradora do mes-
mo prédio, está oferecendo em homenagem ao falecido Marmeládov. Lújin
convida Sônia para ir a seu quarto e lhe entrega uma nota de dez rublos.

II

O narrador reflete sobre as razões que levaram Katerina Ivánovna


a gastar mais da metade do dinheiro dado por Raskólnikov em um
banquete e conclui que decerto era por causa de seu orgulho. Apenas
Raskólnikov e os inquilinos mais pobres comparecem ao evento. Ka-
terina repetidamente afirma ser de uma família nobre e insulta muitas
vezes seus convidados. Ao mesmo tempo, fica mais e mais doente,
chegando a tossir sangue durante a refeição. Por fim, termina brigan-
do com a dona do imóvel, em conflito instigado pela vizinhança. No
meio da bagunça, Lújin aparece e Katerina corre até ele.

26
III

Katerina implora proteção a Lújin, que a afasta de si. Voltando-se a


Sônia, ele a acusa de roubar uma nota de cem rublos. Katerina revira
os bolsos de Sônia para provar a inocência da enteada e fica espantada
quando uma nota de cem rublos cai no chão. Lújin, de modo magnâ-
nimo, diz que não apresentará queixa. Lebeziátnikov, porém, aparece
e revela ter visto Lújin colocar a nota no bolso de Sônia. Raskólni-
kov intervém, argumentando que Lújin está tentando humilhar Sônia
após ter se relacionado com ela. Lújin tenta insultar Lebeziátnikov e
Raskólnikov, mas desiste e vai embora. A briga entre Katerina e a dona
do imóvel continua. Por fim, a filha de Marmeládov é despejada.

IV

Raskólnikov visita Sônia e confessa os assassinatos. Ela promete apoiá-lo


e jamais abandoná-lo. Ele diz que não matou por pobreza, mas, sim,
porque tinha a ambição de se tornar um outro Napoleão. Também lhe
confessa sentir-se superior à maioria das pessoas, de alguma forma ex-
traordinário e desobrigado do cumprimento dos códigos morais impos-
tos às pessoas comuns. Sônia diz que ele foi punido por se afastar de
Deus e que ele deve confessar seus pecados publicamente para alcançar
paz. Raskólnikov inicialmente resiste, mas logo aquiesce, pois Sônia pro-
mete visitá-lo na prisão. Sônia dá a ele uma cruz semelhante àquela que
ela usa no pescoço. Nesse momento, Lebeziátnikov bate à porta.

27
Parte VI
I

Após a morte de Katerina Ivánovna e de confessar o crime para Sô-


nia, Raskólnikov passa vários dias vagando pelas ruas em estado quase
delirante. Certo dia, Razumíkhin vem visitá-lo, afirmando que quer
descobrir de uma vez por todas se Raskólnikov enlouqueceu ou não.
Ele diz a Raskólnikov que Pulkhéria Aleksándrovna está triste e aban-
donada. Sempre compassivo com o amigo, Razumíkhin agora perde
a paciência com Raskólnikov, pois percebe que ele está causando so-
frimento à família. Além disso, ele informa a Raskólnikov que Dúnia
recebera uma carta misteriosa e que Petróvich acredita que Nikolai, o
pintor, é o culpado. Quando Raskólnikov lhe conta sobre a visita que
Dúnia lhe havia feito no dia anterior, Razumíkhin suspeita de algum
tipo de complô entre os irmãos. Razumíkhin sai e Petróvich aparece.

II

Petróvich pede desculpas a Raskólnikov, admitindo que estava tentan-


do arrancar-lhe uma confissão. Segundo o investigador, suas suspeitas
vieram do artigo e do desmaio na delegacia. Mas o investigador admite

28
que ainda não acredita na confissão de Nikolai, pois o pintor ignora
a maior parte dos detalhes do crime. Afirma, ainda, que não prendera
Raskólnikov apenas por falta de provas e que, aos olhos do juiz, seria
melhor que o suspeito confessasse logo ser o autor do crime. Antes de
Raskólnikov sair do ambiente, o investigador lhe pede que, caso esteja
planejando cometer suicídio, ao menos divulgue uma nota revelando
a localização dos objetos e do dinheiro roubado.

III

Raskólnikov encontra Svidrigáilov na sala dos fundos de um café e


ameaça matá-lo caso utilize alguma suspeita sobre o crime para chan-
tagear Dúnia.

IV

Svidrigáilov, um tanto bêbado, fala a Raskólnikov sobre seu relacio-


namento com Petrovna e de sua atração por Dúnia. Para disfarçar seu
interesse por Dúnia, conta sobre seu noivado com uma garota de ape-
nas quinze anos. Raskólnikov fica enojado com a história, mas Svidri-
gáilov se diverte com a desaprovação. Na saída, Raskólnikov segue o
bêbado, temendo que ele faça algo contra sua irmã.

Svidrigáilov percebe que está sendo perseguido, embarca em uma car-


ruagem rumo a uma zona distante da cidade e se despede de Raskól-

29
nikov. Desce do veículo poucos metros adiante, porém, e sai à procura
de Dúnia, atraindo-a para seu quarto e falando-lhe do crime cometido
por seu irmão. Dúnia fica espantada e acaba desmaiando. Depois, pro-
põe-lhe casamento em troca de proteção a Raskólnikov. Dúnia tenta
fugir, mas a porta está trancada. Pega, então, uma arma, acusa-o de ter
envenenado a falecida esposa, e atira duas vezes, atingindo-o de ras-
pão. Svidrigáilov a abraça à força, mas desiste de estuprá-la ao perceber
que Dúnia jamais o amará.

VI

Svidrigáilov visita Sônia, oferece-lhe três mil rublos e diz que esse di-
nheiro deve ser utilizado para acompanhar Raskólnikov até a Sibéria.
Vai, então, à casa de sua noiva, informa à família dela que se ausentará
por um tempo e lhes entrega quinze mil rublos. Dirige-se a um hotel,
onde sonha com uma menina de cinco anos que choraminga de frio.
Ao mirar seu rosto, vê nele uma expressão sedutora. Ao acordar, sai
pelas ruas de Petersburgo carregando o revólver de Dúnia. Encontra
um soldado e lhe ordena dizer, caso alguém pergunte, que ele viajou
para a América. Atira, então, contra a própria cabeça.

VII

Pulkhéria Aleksándrovna diz a Raskólnikov que leu seu artigo e, em-


bora não o tenha compreendido completamente, ficou muito impres-
sionada. Raskólnikov diz a sua mãe que a amará para sempre, mas que
eles terão de se separar. De volta a seu apartamento, encontra Dúnia

30
e confessa a ela ter cogitado suicidar-se, mas que optou por confessar
o crime. Num momento de exaltação, Raskólnikov afirma que não
se entregaria caso tivesse lucrado com o assassinato. Ao contemplar a
expressão de sofrimento da irmã, percebe quanta dor causou à família.

VIII

O narrador nos conta que Sônia e Dúnia se tornaram amigas quando


esta descobriu que Raskólnikov era culpado pelos assassinatos. Raskól-
nikov chega ao apartamento de Sônia e lhe diz que veio pegar sua cruz.

Caminhando em direção à delegacia, o criminoso teme a humilha-


ção pública pela confissão. Em uma encruzilhada, beija o chão, mas a
ação chama a atenção de transeuntes e desiste de confessar-se ali. Ao
perceber que está sendo seguido por Sônia, tem o ânimo renovado.
Chegando à delegacia, recebe um pedido de desculpas de Petróvich
pelas suspeitas. O investigador menciona o suicídio de Svidrigáilov.
Atordoado pela notícia, Raskólnikov sai da delegacia sem confessar o
crime. Na saída, vê Sônia, que lhe esperava. Dá meia volta e confessa
os assassinatos a Porfiri.

EPÍLOGO

Raskólnikov está preso na Sibéria há nove meses. No julgamento, ele


confessou o crime, relatou seus motivos e revelou a localização dos
bens roubados. Afirmou não saber ao certo quanto dinheiro e quais
bens havia roubado. De início, a corte não acreditou, mas após al-

31
gum tempo psicólogos explicaram que essa ignorância era sintoma de
uma insanidade temporária. A punição foi relativamente branda, pois
o criminoso confessou os assassinatos espontaneamente e, nos teste-
munhos, amigos e parente deram parecer positivo sobre sua conduta.
Razumíkhin relembrou atos de caridade do amigo nos tempos da fa-
culdade, e a dona do apartamento mencionou um ato de heroísmo de
Raskólnikov durante um incêndio.

Cinco meses após a confissão, ele foi condenado a oito anos de traba-
lhos forçados na Sibéria. Sônia foi consigo. Razumíkhin permaneceu
em Petersburgo, cuidando de Dúnia e de Pulkhéria, que estava à beira
da morte. Dali dois meses, Razumíkhin e Dúnia se casaram. Tentavam
esconder de Pulkhéria o destino do filho. Ela, porém, descobriu por si,
acabou delirando e enfim morreu.

Na prisão, Raskólnikov tem o orgulho ferido, acreditando que não


cometeu um pecado, mas apenas um erro, e que sua confissão não foi
senão um gesto de fraqueza.

Durante um período, Raskólnikov esteve gravemente adoentado e foi


internado no hospital da prisão. Sônia esteve ao seu lado em todos os
momentos, auxiliando-o a superar o sofrimento e a manter-se ligado
à família. Enquanto está doente, sonha que um vírus se espalhou por
toda a Rússia, fazendo com que cada uma das vítimas se considerasse
a única possuidora da verdade.

Certo dia, senta-se ao lado de Sônia e os dois ficam de mãos dadas. Ge-
ralmente, ele sentia repulsa, mas desta vez encheu-se de amor, chegan-

32
do a chorar e a abraçá-la. À noite, pensa em Sônia, enche-se de amor,
lê trechos de uma cópia do Evangelho que ela lhe dera e sente-se como
se ele e a mulher que ama fossem um só. O narrador encerra o roman-
ce afirmando que a renovação desse homem é matéria para outro livro.

33
Personagens
RODION ROMÁNOVITCH RASKÓLNIKOV – Jovem de vinte e quatro

que teve que desistir dos estudos por falta de dinheiro. Nascido e cria-
do no interior, ele vive sozinho em São Petersburgo, onde é tido por
todos – não sem razão – como orgulhoso, taciturno e insensível. Por
seu orgulho, considera-se superior a todos e, por consequência, acima
das leis dos homens e da moral.

SÔNIA MARMELÁDOVA – Filha de Marmeládov, um bêbado invete-


rado, e enteada de Katerina Ivánovna, mulher doente e histérica. Sônia
se prostitui para sustentar a família, mas, apesar da desonra, sua alma
permanece pura. Quando ingressa na vida de Raskólnikov, exorta-o a
confessar o crime às autoridades. Quando Raskólnikov é enfim con-
denado, acompanha-o até a prisão da Sibéria e torna-se querida por
todos os presos, que a consideram uma mulher santa.

PORFÍRI PETRÓVICH – Juiz de instrução encarregado da investiga-


ção do assassinato de Aliona Ivánovna e Lisaveta. Logo suspeita de
Raskólinkov e tenta convencê-lo a confessar o crime, atormentando o
suspeito com insinuações incessantes.

34
RAZUMÍKHIN – Simpático, simples, gentil e querido por todos, Razu-

míkhin é o único amigo de Raskólnikov. É afetuoso e prestativo com


Pulkhéria, mãe, e Dúnia, irmã de Raskólnikov.

DÚNIA – Irmã inteiramente dedicada a Raskólnikov. Não hesita em


aceitar a proposta de casamento de Lújin, homem desprezível, apenas
para obter benefícios financeiros para o irmão. Forte e bonita, traba-
lhou anteriormente como governanta para pagar as dívidas da mãe e
do irmão.

SVIDRIGÁILOV – Ex-patrão de Dúnia. Sensual e violento, é apaixo-


nado por Dúnia desde quando ela trabalhou como governanta em
sua casa. Quando sua esposa morreu, mudou-se para São Petersburgo
para tentar conquistar a moça. Tornou-se vizinho de porta de Sônia.
Após ouvir a confissão de Raskólnikov a Sônia, concebe um plano para
chantagear Dúnia.

35
Chaves de interpretação
O ALCOOLISMO

Na Rússia, o alcoolismo é um grande problema social. O clima frio leva


os habitantes do país a ingerirem grandes quantidades de álcool para
esquentarem o corpo durante o rigoroso inverno. Do hábito tradicional
surge o vício, que leva muitos cidadãos ao consumo excessivo da bebida.

Na literatura russa, o álcool é topos. Eugène Oneguin, obra-prima de


Aleksandr Púshkin, retrata o champagne e o vinho, bebidas que se
tornaram populares entre a aristocracia russa após as invasões napo-
leônicas. Em Guerra e Paz, são várias as festas regadas à bebida e inter-
rompidas por brindes seguidos de discursos.

Vinhos, cerveja, champagne e licores têm seu espaço, mas a bebida


que caracteriza o país, e que se tornou marco na literatura russa, é a
vodca. Na obra de Dostoiévski, ela surge com maior relevo em “Crime
e Castigo”, na figura de Marmeládov. A ideia inicial do escritor era
redigir um romance intitulado “Os bêbados”, centrado na história de
Marmeládov, Katerina Ivánovna e Sônia, investigando as causas e con-
sequências do alcoolismo para o indivíduo e para a sociedade russa.

36
O interesse pelo tema não era fruto do acaso ou da mera observação so-
cial. O próprio autor, embora não fosse propriamente alcoólatra, tinha
certa tendência ao problema, que se acentuava durante as viagens e joga-
tinas pela Europa. Seu pai, Mikhail, era um senhor beberrão e, segundo
dizem muitos biógrafos, agressivo com os filhos e empregados. Desde a
infância, portanto, o autor teve relação íntima com o problema russo.

Durante a prisão na Sibéria, no período em que serviu como soldado


no batalhão de Semipalatinsk, tornou-se amigo do casal Aleksandr Iva-
novitch Isaev e Maria Dmitrievna Isaev. Íntimo da família, tornou-se
tutor de seus filhos. Na convivência naquele lar, percebeu que Alek-
sandr era alcoólatra e, em razão do vício, não exercia com correção
suas funções de marido e pai. Conforme o amigo foi avançando na
decrepitude, o escritor foi se aproximando de Maria. Quando esta tor-
nou-se viúva, contraiu segundas núpcias com Dostoiévski. O período
de íntimo contato com um amigo alcoólatra certamente despertou o
interesse do escritor por este tema, que, junto da mentalidade crimi-
nosa, toma conta de Crime e Castigo.

O CRIME E O CASTIGO

O tema do romance pode ser resumido nas dramáticas palavras que


lhe dão título: a primeira parte do livro fala da preparação e execução
do crime, e as cinco partes seguintes relatam a tortura psicológica que
aflige Raskólinkov após o assassinato.

Para a crítica, é difícil afirmar com certeza as razões que levaram o


autor a dedicar um romance inteiro à relação entre uma ação má e

37
a punição que lhe é devida. Uns dizem que o romance foi motivado
pela convivência que o autor teve com seu pai, homem irascível que,
segundo alguns biógrafos, foi morto pelos servos que maltratara por
anos a fio. Outros afirmam que a experiência na prisão foi decisiva:
detido por envolvimento com grupos revolucionários, Dostoiévski foi
condenado à morte, mas teve a pena comutada em prisão. Meditar so-
bre a ação do czar, que lhe condenara à morte e depois lhe preservara a
vida, foi, decerto, uma experiência profundíssima sobre moralidade e
justiça. Além disso, o convívio com toda sorte de criminosos teria feito
o autor investigar a natureza da mente criminosa e meditar sobre qual
seria a maneira certa de aplicar-lhe a devida punição.

Durante o enredo, o autor frisa a diferença entre o “pré” e o “pós”


assassinato. O crime é realizado por Raskólnikov de modo rápido e
até casual, ocupando uma única parte do romance. A punição, por
sua vez, é total: a relação de Raskólinkov com amigos e familiares se
deteriora, a saúde do criminoso torna-se frágil e as autoridades rapida-
mente o tomam como suspeito do crime.

Atormentado pelo peso da culpa dos assassinatos, Raskólnikov ora or-


gulha-se dos crimes, ora é engolido pelo remorso. Dostoiévski, cristão
à sua maneira, encontra uma única saída para o personagem: expiar
a culpa através da religião. No contato com Sônia, o protagonista co-
nhece as Escrituras e, aos poucos, percebe a infâmia dos seus crimes e
a importância de entregar-se ao justo castigo dos homens.

38
NAPOLEÃO

Na França, Stendhal retratou o imperador Napoleão Bonaparte em dois


romances. Em A cartuxa de Parma, retrata Fabrício, jovem que sonha em
conhecer Napoleão e participa da batalha de Waterloo. Em O vermelho
e o negro, somos apresentados a Julien Sorel, cujas ambições se dividem
entre a glória militar à Napoleão e a ascensão na hierarquia eclesiástica.

Guerra e Paz, obra magna de Tolstói, retrata a sociedade russa desde a Guer-
ra da Terceira Coalizão até a Campanha da Rússia, chegando a ter Napo-
leão Bonaparte como personagem. Além dos clássicos citados, há milhares
de obras ficcionais do século XIX que contam, se não com Napoleão como
personagem, ao menos com sua trajetória militar como pano de fundo
para o enredo ou como matéria para conversações entre os personagens.

Em Crime e Castigo, o protagonista é profundamente tocado pela fi-


gura do imperador francês. Segundo a teoria que o levou a cometer
os assassinatos, homens como César e Napoleão eram excepcionais e,
portanto, estavam desobrigados do cumprimento das leis morais co-
muns. Mas por que, afinal, Napoleão é tido como tão extraordinário?

Em 1799, contando 30 anos, a vida pública de Napoleão tomou maior


relevo. O jovem corso, filho de nobres empobrecidos, subiu nos postos
militares graças a seus méritos, tomou as rédeas de uma França há uma
década agitada pela Revolução e alterou radicalmente a geopolítica, a
cultura jurídica e concepção de nacionalidade em toda a Europa.

Subjugando reinos italianos, alemães, austríacos, poloneses e espanhóis,


Napoleão impunha monarcas e constituições em cada território con-

39
quistado. Alargando ainda mais a extensão do seu império, o jovem mi-
litar anexou o Egito aos seus domínios. Embora tenha fracassado ao ten-
tar invadir o Reino Unido e a Rússia, o imperador dos franceses marcou
a história de todos os países europeus e, assim como César, tornou-se
imortal na história graças a suas façanhas militares e políticas.

O apogeu da sua glória foi marcado por um gesto cheio de sentido.


Em 1804, na catedral de Notre-Dame, milhares de nobres e milita-
res franceses assistiram à cerimônia de coroação de Napoleão como
Imperador dos franceses. A Igreja Católica, perseguida no início da
Revolução Francesa, voltava a se aproximar daquele país, e a cerimônia
foi presidida pelo próprio Papa Pio VII. Na hora decisiva, Napoleão
decidiu alterar o rito. Primeiramente, coroou sua esposa, a Imperatriz
Josefina. Em seguida, tomou em suas mãos a coroa e a colocou em
sua própria cabeça, para espanto da multidão. O gesto, aparentemente
simples, representou uma radical alteração na relação entre Igreja e
Estado: dali em diante, este não estava mais submetido àquela.

Guerreando desde a Península Ibérica até as estepes russas, o impe-


rador dos franceses marcou a história de todos os países europeus e,
assim como César, tornou-se imortal na história graças a suas faça-
nhas militares e políticas. Esta figura, que deu forma final às aspirações
dos revolucionários de 1789, marcou também as literaturas nacionais.
Para nós, separados da Era Napoleônica por dois séculos, seu nome
já não passa de um capítulo nos livros de História. Para a juventude
e intelectualidade do século XIX, seu nome evocava lembranças de
acontecimentos decisivos do passado recente. O fascínio e obsessão

40
de Raskólnikov pelo Imperador não é, portanto, nada inverossímil, e
retrata fielmente o espírito daquela época.

UM ROMANCE POLIFÔNICO

O crítico literário Mikhail Bakhtin publicou, em 1929, a obra Problemas


da poética de Dostoiévski, em que apresenta e defende a tese de que o autor
de Crime e Castigo é o inventor do romance polifônico. Segundo o crítico,
o gênero é inédito e sem precedentes na história da literatura europeia.

A dita polifonia, que o autor contrapõe à monofonia dos romance de até


então, consiste na pluralidade de vozes e consciências independentes e
distintas presente nos romances de Dostoiévski. Segundo o crítico, no
romance polifônico, as vozes dos personagens não se confundem com
a do autor, mas estão ao lado desta. O autor não se sobrepõe aos perso-
nagens, manipulando-os segundo sua visão de mundo, mas busca criar
um ambiente em que as visões de mundo particularíssimas de cada um
possam ser expressas de modo claro.

No universo dostoievskiano há universitários, revolucionários, alcoóla-


tras, prostitutas, usurários, funcionários públicos, socialistas, religiosos e
inescrupulosos, cada um carregando consigo diferentes percepções sobre
a religião, a moralidade e a Rússia. Dostoiévski tinha suas próprias ideias
sobre as questões polêmicas do seu tempo, mas, através da sua chamada
polifonia, encontrou maneira de expressar as impressões dos diferentes
grupos e camadas sociais que formavam a Rússia do século XIX.

Para dar forma e personalidade únicas a cada personagem, Dostoiévski


insere nos diálogos hesitações, pausas, acelerações, lapsos, incongruên-

41
cias, jargões revolucionários, referências à cultura popular e menções a
determinados autores, conforme a classe social e o pensamento políti-
co e religioso de cada personagem.

Melhor exemplo da polifonia são as interações entre Sônia e Raskó-


lnikov. O protagonista outrora fora um rapaz interiorano, mas, após
viver e estudar em Petersburgo, tornou-se ambicioso, inescrupuloso e
orgulhoso, movido por ideias revolucionárias extravagantes. O crimi-
noso, que se julgava homem da categoria de Napoleão e César, temia
ser enfrentado pela senhoria, era sustentado pelas pobres mãe e irmã e
só utilizou da força para agredir duas mulheres indefesas.

Sônia, por sua vez, era simples e abnegada. Para ajudar a sustentar a
madrasta histérica e o pai alcoólatra, aceitou prostituir-se, ainda que
contra suas crenças religiosas. Mesmo vivendo as humilhações da pro-
fissão, mantinha-se pura e lutando por uma consciência reta, sem mal-
dizer o destino nem culpar os homens pelo seu infortúnio.

Os diálogos entre os dois personagens demonstram toda a força da po-


lifonia de Dostoiévski. Os dois personagens são radicalmente opostos
e ambos têm suas virtudes e fraquezas expostas de modo igualmente
sincero, sem que a voz do autor se sobreponha à experiência daqueles
jovens que protagonizam a história.

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