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O conhecimento do espaço e do tempo, e a sobrevivência do Homem

O primeiro período da história da Astronomia tem o seu início há dezenas, ou mesmo centenas de milhares de anos. A
Astronomia, juntamente com a aritmética, é talvez a mais antiga de todas as áreas do conhecimento. De certa forma
ligada à Astronomia, encontramos também, em todas as épocas, e não importa em que região da Terra, nem qual o nível
de evolução das civilizações, a preocupação do Homem relativamente às suas origens e ao seu destino final. 

Pintura rupestre, “Cueva de Los Caballos”, Castellón-Espanha. Crédito: Centro Nacional de Información y Comunicación Educativa.

“De onde vimos?” e “Para onde vamos?”, são preocupações cosmológicas que sempre dominaram, e continuam a
dominar o pensamento humano. 

Desde a Pré-História que a observação do céu deve ter inquietado o espírito humano; por um lado, a revelação da
existência de leis naturais imutáveis, por outro, a tentação de colocar no céu seres sobrenaturais todo poderosos.
Percebemos, nessa época, a origem dos primeiros mitos e cultos astrais, que tiveram um papel importante nas diversas
religiões primitivas. Ao observar o mundo, o Homem acreditava poder explicá-lo como uma consequência da actividade
de espíritos motivados por emoções semelhantes às dos seres humanos. Vivia-se uma época em que o universo era
completamente antropomórfico - a Época da Magia. É a época dos espíritos bons, mas também dos demoníacos, aos
quais era atribuída a forma de animais e de plantas, e que tinham o poder de governar o mundo. Tudo o que era
observado podia ser explicado de forma simples pela vontade e pelas acções desses espíritos. 

Inicialmente, o Homem não tinha qualquer actividade, para além das que estavam relacionadas com a sua própria
sobrevivência. Muito antes de se colocar certas questões sobre os fenómenos observados, ou até de tentar encontrar
explicações para os justificar, o Homem primitivo pretenderia apenas sobreviver, no meio hostil que o rodeava. mas
desde muito cedo a sua atenção terá sido atraída para diversos fenómenos astronómicos, sendo que o mais marcante
terá sido, naturalmente, a sucessão dos dias e das noites. 
Calendário lunar primitivo. Crédito: Calvin J. Hamilton (Science Views)
Em épocas muito primitivas, na sua fase nómada, o Homem não havia ainda inventado a agricultura, e não tinha ainda
aprendido a domesticar animais. A sobrevivência era difícil, quase um acto heróico. Terá nascido assim, a necessidade de
contagem do tempo, isto é, a construção de calendários que permitissem prever com antecedência, a ocorrência de
determinados acontecimentos essenciais à sua sobrevivência, como por exemplo os fluxos migratórios de certos animais,
ou o amadurecimento de determinados frutos. Muito antes de inventar a escrita, o Homem aprendeu a conhecer as fases
da Lua, constatou a sucessão periódica das estações do ano, apercebeu-se do movimento diurno aparente das estrelas,
que noite após noite as trazia de volta, e, percebendo que mantinham as suas posições relativas, “inventou” as
constelações, verdadeiros referenciais que lhe permitiam orientar-se. 

A Astronomia nasce com a aprendizagem deste tipo de conhecimentos, simples mas essenciais. As actividades
necessárias à sobrevivência da espécie humana estão pois na origem das primeiras atitudes directamente ligadas à
Astronomia, a qual, por esse motivo, se encontra intimamente relacionada com a evolução do Homem desde os tempos
mais primitivos. 

Calendário lunar primitivo (pormenor). Crédito: Calvin J. Hamilton (Science Views)


Cerca de uma dezena de milhares de anos atrás, na tentativa de assegurar mais facilmente a sua sobrevivência, o
Homem opera uma transformação fundamental: abandona o modo de vida nómada, que adoptara durante centenas de
milhares de anos, e torna-se sedentário. Paralelamente, esta transformação tem também consequências importantes
para a evolução da Astronomia. Na verdade, a fixação numa determinada região torna mais fácil o registo de
observações sistemáticas, bem como a sua conservação para posterior consulta e análise, sendo este um factor essencial
para o desenvolvimento e sofisticação dos calendários mais primitivos. Esses registos são talvez as mais antigas formas
de escrita que possamos imaginar, e a forte ligação que todas as civilizações, que se desenvolveram a partir dessa
época, tinham com a astronomia resultava sobretudo dessa necessidade “vital” que consistia no melhoramento constante
dos calendários. 
Calendário Maia. A imagem representa uma pequena secção da "La Mojarra Stela 1". Crédito:Wikipedia.
Convém aqui referir o facto de que a partir de determinada época, para além de questões de sobrevivência, existiriam
em simultâneo motivações astrológicas e/ou religiosas para observar o céu. Astronomia, astrologia e religião, ter-se-ão
desenvolvido em conjunto a partir de então, e na maior parte das vezes estando a primeira ao “serviço” das outras
duas. 

Mais tarde a Época da Magia acabará por dar lugar à Época da Mitologia. Os espíritos, que eram omnipresentes e
omnipotentes, “transformaram-se” em deuses que personificavam abstracções do pensamento. O Homem adquire então
consciência da sua pequenez perante o mundo, mas, paradoxalmente, acredita que desempenha o principal papel no
palco universal. Vive-se uma época em que o universo é perfeitamente antropocêntrico, na qual as diversas mitologias
podem ser hoje interpretadas como modelos cosmológicos pré-científicos. Na verdade, a mitologia não é mais do que a
expressão figurativa de certas cosmologias, sobretudo as que se desenvolveram utilizando complexas redes de mitos,
que na época preenchiam o imaginário de todos. Estes modelos representam talvez as primeiras tentativas para explicar
o Universo através de uma utilização sistemática do raciocínio. Podemos citar, por exemplo, mitologias criadas por
civilizações importantes, como a civilização maia ou a egípcia, a judaica ou a grega, e mais a oriente, as que foram
construídas pela civilização babilónica, a indiana ou a chinesa. Na verdade, todas elas constituem os mais primitivos
modelos, conhecidos, que o Homem construiu para explicar o Universo. 

Bibliografia:

 A. Berry, A short history of astronomy


 A. Pannekoek, A history of astronomy
 H. Thurston, Early astronomy 

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