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Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil

Diretoria Executiva - Quadriênio 2021-2025

Presidente: João Martins da Silva Junior


1º vice-presidente: José Mario Schreiner
2º vice-presidente: Gedeão Silveira Pereira
1º vice-presidente de Finanças: José Zeferino Pedrozo
2º vice-presidente de Finanças: Muni Lourenço Silva Júnior
1º vice-presidente de Secretaria: Mário Antônio Pereira Borba
2º vice-presidente de Secretaria: Júlio da Silva Rocha Junior

CONSELHO FISCAL
Efetivos
Normando Corral
Raimundo Coelho de Sousa
Silvio Silvestre de Carvalho

Suplentes
Paulo Carneiro
José Álvares Vieira
Ivan Apóstolo Sobral

EXPEDIENTE
Diretor Técnico da CNA: Bruno Barcelos Lucchi
Assessor Especial da Presidência da CNA: Daniel Klüppel Carrara
Presidente do Instituto CNA: Roberto Brant

C758o
Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil; Federações; Sindicatos.
O que esperamos dos próximos governantes: 2022. Brasília: CNA, 2022.
85 p. il.

ISBN: 978-65-00-51887-0

1. Segurança Alimentar. 2. Desenvolvimento econômico. 3.


Desenvolvimento Social. 4. Desenvolvimento Sustentável. I. CNA. II. Título.

CDU 631+502.131.1(81)
O QUE
ESPERAMOS
DOS PRÓXIMOS

GOVERNANTES
2 0 2 2
Prefácio
PREFÁCIO
João Martins da Silva Junior
Presidente da Confederação da
Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA)

Desde as eleições gerais de 2010, a CNA depende do progresso de todos. Do mesmo


produz documentos que expressam as modo, as questões da educação, da saúde,
ideias e os interesses da agricultura e da segurança e da igualdade precisam
da pecuária do Brasil e os apresenta aos integrar qualquer plano realista de
candidatos à Presidência da República, crescimento da economia.
na esperança de que tais opiniões sejam
discutidas abertamente nas campanhas Nosso país pode muito, mas para isso tem
e sejam incluídas nas políticas de governo que estabelecer, para si mesmo, metas de
do candidato vencedor. Até este ano, os crescimento e de progresso muito mais
problemas, as realidades e os projetos de ambiciosas, a política precisa ser menos
interesse de nosso setor haviam sido nosso conflituosa e mais construtiva e os Poderes da
foco principal. República devem atuar em estrita harmonia.

Neste ano de 2022, ampliamos o escopo do A competição política é da natureza das


nosso documento de modo a abranger, além democracias. Para que seja proveitosa para
dos temas específicos do agro, como fizemos todos, é preciso que ela seja baseada na
anteriormente, as questões econômicas, discussão das questões de fundo que afetam
sociais e políticas do país, a partir do a vida nacional e que seja um instrumento
entendimento de que todos os setores de para dar clareza e realismo à solução dos
produção estão inseparavelmente conectados problemas. Ao fazer este documento e
uns aos outros e de que todos dependem de ao apresentá-lo a todos os candidatos à
um ambiente político e institucional mais Presidência da República, bem como a todos
favorável à liberdade e ao desenvolvimento. que pleiteiam uma cadeira no Parlamento,
Os interesses e as visões da agricultura, a CNA deseja contribuir tanto para
da indústria e dos serviços precisam ser o processo democrático quanto para o
compartilhados e o progresso de cada um desenvolvimento do Brasil.

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Sumário
SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................................................................................................... 9

1. SEGURANÇA ALIMENTAR........................................................................................................................................11

1.1. INOVAÇÃO TECNOLÓGICA......................................................................................................................................................... 11

1.2. LOGÍSTICA E TRANSPORTE.....................................................................................................................................................20

1.3. MERCADO INTERNACIONAL..................................................................................................................................................26

1.4. ACESSO AOS ALIMENTOS........................................................................................................................................................30

2. DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO................................................................................................................... 33

2.1. REFORMA POLÍTICA..................................................................................................................................................................... 33

2.2. REFORMA ADMINISTRATIVA................................................................................................................................................. 35

2.3. REFORMA TRIBUTÁRIA.............................................................................................................................................................38

2.4. POLÍTICA AGRÍCOLA.................................................................................................................................................................. 44

2.5. DESENVOLVIMENTO REGIONAL....................................................................................................................................... 48

3. DESENVOLVIMENTO SOCIAL............................................................................................................................... 55

3.1. SAÚDE.................................................................................................................................................................................................... 55

3.2. EDUCAÇÃO........................................................................................................................................................................................ 57

3.3. EMPREGO...........................................................................................................................................................................................62

3.4. SEGURANÇA PÚBLICA..............................................................................................................................................................67

4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL.................................................................................................................71

4.1. SEGURANÇA AMBIENTAL.........................................................................................................................................................71

4.2. MERCADO DE CARBONO.......................................................................................................................................................76

4.3. ECONOMIA VERDE E AGROENERGIA............................................................................................................................78

4.4. COMPROMISSOS INTERNACIONAIS................................................................................................................................81

4.5. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA.............................................................................................................................................83

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Introdução
INTRODUÇÃO

O presente documento tem como objetivo web, envolvendo todos os tópicos que com-
apresentar aos candidatos à Presidência da põem o documento final. O resultado des-
República e aos futuros membros da Câmara sas jornadas – nas quais foram discutidas as
dos Deputados e do Senado Federal nossa reformas do Estado, as questões da educação
reflexão sobre os problemas da economia e do emprego, os problemas da saúde e da
e da sociedade brasileira, bem como nossa segurança pública, a segurança alimentar e
visão de como esses problemas devem ser os temas do meio ambiente –, combinado
enfrentados, quer pelo Poder Executivo, quer com a nossa experiência de muitas déca-
pelo Poder Legislativo. Procuramos não nos das na representação do agro, nos permitiu
ater a uma perspectiva puramente setorial, chegar a um documento que, em sua maior
embora os problemas do agro estejam parte, contém uma grande dose de propos-
adequadamente considerados, porque tudo tas consensuais.
o que limita o crescimento do país afeta
igualmente todos os setores econômicos. O momento das eleições é o tempo próprio
Além disso, não é possível separar os para aprofundarmos o conhecimento de
problemas propriamente econômicos nossa realidade e discutirmos o que fazer
das questões sociais e políticas que tão para que o nosso país reencontre o caminho
duramente marcam a vida de nosso país. para o crescimento acelerado da economia,
para o progresso social de toda a população
Para chegar a uma visão ao mesmo tempo e para a unidade da nação em relação às
bem fundamentada, realista e equilibrada, questões essenciais de nosso destino. Este
procuramos ouvir as experiências e opiniões documento é a nossa contribuição para que
de uma variedade de especialistas reconhe- essas justas aspirações se tornem realidade.
cidos e de políticos de grande experiência
em cinco encontros, com amplo acesso pela

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1
Segurança
Alimentar
1. SEGURANÇA ALIMENTAR

O combate à insegurança alimentar, equilibrar a oferta de produção nacional e


seja ela crônica ou temporária, é um auxiliar a manter a produção em momentos
compromisso de Estado, que precisa ser de menor crescimento interno da economia.
trabalhado em diferentes frentes, mas para
que seja duradouro e estruturado, esse Enfim, as propostas elencadas neste capítulo
enfrentamento precisa de, basicamente, se somam às outras na busca pela segurança
duas linhas de políticas públicas: ter oferta alimentar e por um Brasil melhor para todos
de alimento no país e garantir à população os brasileiros.
acesso aos alimentos na quantidade e na
qualidade adequadas. 1.1. INOVAÇÃO TECNOLÓGICA

Sob a linha da oferta de alimentos, a A disponibilidade de alimento é fator-chave


ação principal é aumentar a produção e para garantir a segurança alimentar. No Brasil,
produtividade da geração de alimentos a ciência e o uso intenso de tecnologia
no país, que pode ser feita via tecnologia, no campo permitiram o desenvolvimento
melhores insumos, controle da sanidade e estruturado da agropecuária no país. Dessa
outros. Já na linha de acesso aos alimentos, forma, para seguirmos garantindo maior
as propostas buscam elencar estratégias oferta de alimentos para os brasileiros e
e políticas públicas basilares de promoção boa parte do mundo, devemos ter como
da dignidade humana. Para isso, busca- foco políticas que mantenham os ganhos
se maior eficiência de uso dos recursos de produtividade, por meio de pesquisa,
públicos e acesso adequado à educação, tecnologia, insumos e sistemas produtivos
saúde, segurança e ao mercado de trabalho, cada vez mais eficientes. Neste tópico,
que por consequência serão promotores abordaremos quais iniciativas podem
da recuperação da renda, do acesso aos incrementar ainda mais a produção e a
alimentos e da ascensão social das famílias. produtividade da agropecuária brasileira.

No entanto, o acesso aos fatores de produção a. Aspectos tecnológicos


e a conexão entre as pontas produtora
e consumidora também demandam Participar da ordem mundial estabelecida,
reparos e ações de longo prazo para com envergadura para competir estando
que, de fato, a segurança alimentar seja nela inserido, depende, em grande medida,
promissora. Portanto, propostas relacionas da capacidade acadêmica, científica e
a infraestrutura e logística foram inseridas tecnológica que o Estado possui. Da mesma
neste capítulo, principalmente no que se forma, a falta de domínio no campo científico
refere à redução do Custo Brasil. Da mesma e tecnológico constitui uma barreira para
forma ocorre com o acesso ao mercado a participação proativa na ordem mundial
internacional, o qual é importante para estabelecida. A desatualização é um fator

11
determinante para ser afastado, empurrado Quanto ao caráter social e econômico
para a periferia do progresso. da sustentabilidade dos sistemas de
produção, o desenvolvimento de políticas
No Brasil, o desenvolvimento científico e públicas estruturadas em prol da pesquisa
tecnológico já se demonstrou primordial e do desenvolvimento científico é fator
para a tropicalização da agropecuária determinante. Isso ocorre, principalmente,
brasileira. Os ganhos tecnológicos foram pela sua capacidade de oferecer eficiência no
os impulsionadores do desenvolvimento uso dos fatores de produção como insumos,
sustentável e da ampliação da mão de obra e água. A eficiência pode ser
disponibilidade de alimento para o Brasil e incorporada aos insumos propriamente
para o mundo, contribuindo fortemente para ditos, bem como à sua operacionalização por
a segurança alimentar. A manutenção dos meio de tecnologias já existentes em outros
avanços e a equiparação do acesso, pelos seguimentos econômicos, tais como internet
diferentes tipos de produtores e sistemas de das coisas, big data, comunicação entre
produção, estão estritamente relacionadas à máquinas etc.
estruturação de um ambiente de negócios
inclusivo ao desenvolvimento e à difusão O caráter social, que já fica claro na
dessas tecnologias. ampliação da disponibilidade de alimentos,
pode ser promovido, ainda, pela geração
O espaço para o desenvolvimento de de empregos de melhor qualidade
tecnologias é vasto. O aumento da demanda operacional. Porém, vai além quando
global por alimentos, a velocidade de possibilita a utilização do ensino a distância
transformação digital no mundo e a aptidão e da assistência técnica moderna como
ambiental do agronegócio brasileiro, ferramenta de equiparação social para
atreladas à sua expertise na adequação acesso a essas e outras tecnologias
tecnológica, tornam esse setor um potencial de produção.
utilizador de novas tecnologias para o
suprimento global de alimentos, bem como Identificadas as áreas prioritárias do
um gerador de emprego e renda para conhecimento e definida a formação das
a população. equipes, consolidado está o objetivo político
do Estado. Os próximos passos consistem na
Entretanto, para que a inovação aconteça pavimentação do caminho normativo que
de forma regular, é importante construir fará o sistema de inovação funcionar bem em
um programa eficiente que permita direção aos objetivos políticos estabelecidos
às universidades, aos institutos e às e a alocação orçamentária necessária e
empresas de pesquisas acelerarem a regular para permitir que o trabalho ocorra
formação de equipes especializadas e com com a velocidade possível e necessária.
sólida capacidade para a pesquisa, com
conhecimento científico e tecnológico No processo de consolidação, algumas ações
consolidado para prospectar oportunidades em áreas promissoras do conhecimento para
reais para a inovação e com ampla aptidão a inovação aplicável à agricultura, e não só a
para a compreensão interdisciplinar. ela, devem ser priorizadas.

12 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS • Fortalecer a pesquisa e o
desenvolvimento de tecnologias de
• Construir um robusto sistema nacional edição de genes. O melhoramento
de ciência, tecnologia e inovação e uma genético de plantas e animais é
política nacional de desenvolvimento importante para a produção agropecuária
científico e tecnológico ousada, que melhorar a produtividade, a resistência
consiga garantir continuidade perante a doenças ou secas e até mesmo o
as mudanças de governos. Assim, a valor nutricional – ganhos relevantes
sociedade brasileira poderá debater que podem contribuir para a segurança
com propriedade qual será a alocação alimentar;
orçamentária necessária para fazer a
inovação tecnológica acontecer; • Incentivar a pesquisa, o ensino e o
desenvolvimento científico público e
• Reorganizar as políticas públicas de
privado pela automação com a utilização
desenvolvimento científico direcionadas
de internet das coisas, sensoriamento
à maior eficiência de uso dos insumos
remoto e monitoramento em tempo real
químicos, minerais e biológicos, bem
dos sistemas de produção;
como da água e da mão de obra nos
sistemas agropecuários de produção;
• Promover ferramentas e métodos de
análise e monitoramento multiescalares
• Reestruturar a grade curricular das
e multifontes dos riscos agrícolas e
escolas de ensino agrário com inclusão
explícita dos aspectos tecnológicos do ambientais associados à atividade
Agro 4.0; agropecuária; e

• Ampliar a capacidade de coleta, • Reestruturar e inserir os aspectos


análise, armazenagem, utilização e tecnológicos nos meios de acesso
compartilhamento do banco de dados ao público-alvo e de transferência
da produção agropecuária e permitir tecnológica da assistência técnica e da
produzir correções e sugestões de educação a distância, com a incorporação
modelos de produção cada vez mais clara dos conceitos e das ferramentas do
modulados; Agro 4.0 aplicáveis aos diferentes portes e
níveis tecnológicos dos produtores rurais.

b. Insumos de modo a estabelecer uma situação ótima


de cultivo e elevar o potencial produtivo.
O uso de insumos é intrínseco à produção de
alimentos e a sua garantia de produção em Dentre os insumos essenciais à produção
volume e qualidade são pilares fundamentais de vegetais listam-se os fertilizantes, os
da segurança alimentar. Tais recursos podem defensivos e as sementes. Por outro lado, na
ser fornecidos naturalmente ou ofertados produção animal, produtos vegetais como
conforme a demanda da cultura ou animal, milho e soja exercem esse papel de insumo,

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associados aos medicamentos e demais Quanto aos bioinsumos, eles constituem
insumos de suplementação mineral. uma alternativa crescente de controle
dentro do Manejo Integrado de Pragas e
O Brasil tem potencial para ser gerador de Doenças (MIPD) quando utilizados como
alimentos para a população nacional biodefensivos, biofertilizantes e fonte ou
e outros países, mas para tal, a demanda por veículo nutricional e de biodiversidade
fertilizantes, que é crescente, precisa para os solos cultivados. Aqui se propõe
ser atendida. que seja construído o arcabouço legal para
manutenção da garantia e ampliação da
Em 2021, foram entregues mais de 45 segurança jurídica para produção na fazenda,
milhões de toneladas de fertilizantes no para uso próprio desses insumos, amparados
mercado nacional, volume 13% superior na ciência, no desenvolvimento científico e
ao recebido em 2020 e 26,54% superior a no acompanhamento da assistência técnica.
2019. Vale ressaltar que mais de 85% desse
volume é importado. A disponibilidade de Da mesma forma, o papel que a
insumos no mercado global, atrelada ainda agropecuária brasileira exerce na segurança
à continuidade nas relações comerciais, não alimentar nacional e internacional, hoje,
pode ser desprezada como fator de risco foi construído com forte amparo da
para a produção brasileira de alimentos e utilização das biotecnologias, incluindo a
seu papel na segurança alimentar mundial. transgenia. No entanto, faz-se necessário
Para tal, as propostas a seguir surgem como regular de forma estreita o uso dessas
alternativas de diagnóstico e estímulo biotecnologias, garantindo acesso, eficiência
para o início do movimento de redução e durabilidade aos produtores que as
da dependência brasileira de fertilizantes adquirem, bem como segurança jurídica
importados. e autonomia aos produtores que investem
em processos de produção delas para uso
No que tange à legislação federal de próprio. A durabilidade da tecnologia deve
defensivos, a imposição de maior rigor ser fomentada pela indústria, por meio
científico, a inserção da etapa analítica de do refúgio, sem que esta seja imposta ao
risco na análise de perigo, a digitalização do produtor rural.
processo, a participação ativa dos órgãos de
controle responsáveis (Anvisa, Ibama e Mapa) Faz-se, portanto, necessário assegurar a
e o estabelecimento de prazos para registro disponibilidade de insumos no mercado
são pontos que devem ser modernizados. interno.
Isso se busca por meio do Projeto de Lei
(PL) 6299/02, hoje no Senado com número
1459/2022.

14 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS regulamentação do Decreto 10.833, de 07
de outubro de 2021;
• Incentivar a produção nacional de
fertilizantes minerais, por meio da • Aprovar e regulamentar o PL 658/2021,
realização de um mapeamento e que dispõe sobre a classificação, o
estudo de constituição de formações tratamento e a produção de bioinsumos
rochosas das regiões que apresentem por meio do manejo biológico on farm
potencial para tal, bem como aprovar o e ratifica o Programa Nacional de
PL 3507/2021, que institui o Programa Bioinsumos; e
de Desenvolvimento da Indústria de
Fertilizantes (PROFERT); • Regulamentar o desenvolvimento de bio-
tecnologias no que tange a produção, co-
• Aprovar o PL 1459/2022, que visa à mercialização e uso de materiais de propa-
modernização e transparência no gação, como sementes e mudas, de modo a
processo de registro de defensivos garantir a segurança jurídica e a durabilida-
agrícolas, atrelado ainda à de da eficiência para o produtor rural.

c. Sanidade Com a implementação dos mecanismos


de autocontrole, propostos no PL 1293/2021,
Modernização, priorização e garantia do espera-se que o novo modelo de defesa
aporte de recursos são meios buscados para agropecuária seja implementado e disponha
garantia da sanidade de cultivos e rebanhos de meios para gerir seus recursos humanos
no longo prazo. Com ampla fronteira e eleva- e materiais de forma continuada e otimizada
da movimentação de mercadoria na expor- de uso. Trata-se do mesmo papel que se
tação e importação, posição geográfica e de espera da digitalização, com acesso às
ambiente que favorece o desenvolvimento informações básicas via plataforma web – por
de pragas, doenças e plantas daninhas, o meio da qual se espera uma interlocução
Brasil demanda pessoal, recursos e inova- mais célere com o setor regulado –, e o
ções tecnológicas e normativas constantes oferecimento de maior transparência e
em prol da defesa sanitária animal e vegetal. agilidade aos processos.
A mitigação dos impactos econômicos aos
produtores e a garantia da qualidade, identi- Da mesma forma, a garantia da eficiência
dade e inocuidade dos alimentos fornecidos depende da definição de uma estrutura
à população são papéis relevantes do Estado. organizacional capaz de permitir que cada
instância atue e controle as etapas do
As ações efetivas de promoção à saúde, de processo da sua responsabilidade. Com
vigilância e defesa dos animais e vegetais melhor distribuição de mão de obra e sem
precisam de uma coordenação dinâmica, sombreamento de ações, haverá melhoria
eficiente e atuante do Poder Público com da situação sanitária e fitossanitária do país.
envolvimento das três instâncias federativas. Para isso, a operacionalização adequada do

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Sistema Unificado de Atenção à Sanidade orçamentária e previsibilidade de longo
Agropecuária (Suasa) faz-se necessária. prazo de forma a garantir a operacionalização
adequada da defesa agropecuária nacional.
De forma estruturante e transversal às
propostas a seguir, sugere-se a garantia

PROPOSTAS • Promover a integração eficaz entre os


entes federativos com a implementação
• Garantir a alocação orçamentária na Lei da Lei 9.712/98, que instituiu o Sistema
Orçamentária Anual (LOA), bem como Unificado de Atenção à Sanidade
priorizar as políticas públicas relacionadas Agropecuária (Suasa);
à defesa agropecuária na Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO); • Promover a estruturação normativa do
autocontrole na defesa agropecuária por
• Acelerar a estruturação normativa meio da aprovação do PL 1293/2021; e
e os incentivos orçamentários para
digitalização da defesa agropecuária • Estimular e fomentar a concessão do Selo
desde a emissão de certificados de Arte (produtos artesanais) nas diferentes
registros de insumos, produtos e esferas do governo.
estabelecimentos, até mesmo nas ações
de polícia, monitoramento e fiscalização;

d. Conectividade tes ações de amplo e restrito espectro, fazem-


-se necessárias para otimização dos recursos
O Brasil possui cobertura deficitária de e assertividade nas tomadas de decisão das
conectividade no meio rural, o que tem políticas públicas. A conectividade tem se
dificultado o avanço tecnológico para os tornado cada vez mais um instrumento de
diferentes níveis de produtores e sistemas promoção de equidade social e sua universali-
de produção. Segundo dados do último zação permite o exercício de diferentes papéis
Censo Agropecuário, de 2017, apenas do desenvolvimento social do Brasil rural.
28% das propriedades possuem acesso à
internet. Essa situação se agrava para as Distintos públicos apresentam demandas
Regiões Norte e Nordeste, onde 16% e 22%, por conectividade, diferentes de utilização
respectivamente, possuem acesso. de serviços proporcionados pela internet
(como aplicativos, softwares etc.), bem como
O diagnóstico e a identificação da natureza são diferentes os meios de proporcionar o
das deficiências de conectividade do público acesso à internet, conforme aponta estudo
demandante do Brasil, bem como as diferen- contratado pelo Ministério da Agricultura,

16 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


Pecuária e Abastecimento (Mapa) à Escola eficiência, bem como do nível de agregação
Superior Luiz de Queiroz da Universidade de de valor da produção. Entende-se que as
São Paulo (Esalq/USP). exigências de suporte governamental, bem
como as formas de utilização do suporte
Para agricultores familiares e de pequeno tecnológico, terão comportamento similar
porte, espera-se que a conectividade seja aos pequenos ou grandes, a depender da
fomentada via políticas públicas. Para isso, natureza dos sistemas de produção.
a inclusão digital deve ocorrer por acesso à
informação, incluindo educação e Assistência Vista como caminho inevitável da agricultura,
Técnica e Extensão Rural. No entanto, terá a conectividade ampla exerce primordial
papel determinante também no controle da papel de mudança de paradigma da
produção propriamente dita com aplicativos produção agrícola, uma vez que introduzirá,
para controle fitossanitário e monitoramento no limite do possível, o elemento
da produção, organização da comercialização previsibilidade na atividade. Diferentemente
por meio do acesso a mercados e alteração da indústria, a agropecuária sempre foi
da relação com consumidores e pequenos sujeita a intempéries climáticas e ao ataque
varejistas. Da mesma forma, espera-se o en- de pragas e doenças, estando em posição
curtamento das cadeias de valor e venda de desfavorável no que diz respeito à formação
produtos online. de preço e alocação de fatores de produção.

Já os grandes produtores têm a possibilidade Segundo o referido estudo, o atendimento


de conectividade por iniciativa própria, desde de 90% da demanda por sinal no meio
que condições adequadas sejam fornecidas rural resultaria em ganhos de 9,6% no Valor
às empresas de tecnologia para acesso a Bruto da Produção (VBP). Considerando-
esse público. Para isso, espera-se o uso em se a estimativa do VBP de R$ 1,37 trilhão, o
prol de tecnologias focadas no aumento aumento seria equivalente a R$ 132 bilhões.
da produtividade via previsibilidade da
produção (previsão de impactos climáticos Cabe destacar que incrementos em
e mitigação de riscos), a automação dos produtividade resultantes da expansão do
sistemas de produção propriamente ditos e, acesso à internet são perenes, representando
fora da porteira, espera-se o rastreamento poderoso instrumento de transformação
do produto até centros consumidores, bem da realidade econômica no meio rural
como o incentivo à certificação das boas brasileiro. Assim, a política de ampliação
práticas de produção. da conectividade, em coordenação com
as já consolidadas de Assistência Técnica e
Já para os médios produtores, o grau Extensão Rural, seguro rural e crédito rural,
de necessidade de fomento via políticas é comprovadamente uma via próspera para
públicas varia em função das características evolução da agropecuária brasileira.
geográficas, das cadeias produtivas e de sua

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PROPOSTAS refere à conectividade e inclusão digital
no meio rural (Decreto 11.004/2022);
• Identificar adequadamente as áreas
não cobertas por internet e priorizar a • Inserir a visão de longo prazo das
necessidade de atendimento; Políticas Públicas de Telecomunicação
no que se refere a previsão de fontes
• Ampliar a utilização da capacidade de financiamento e orçamento, metas,
ociosa das antenas e torres já existentes e prazos indicadores de desempenho e
instalar novas antenas de internet; competência dos atores envolvidos em
seu âmbito (Decreto 9.612/2018); e
• Estudar a viabilidade de ampliação da
constelação de satélites por meio de • Alinhar as estratégias de investimento
parcerias público-privadas; em telecomunicação da Financiadora
de Estudos e Projetos (FINEP) com
• Cumprir e priorizar os objetivos do as prioridades do meio rural de
Fundo de Universalização dos Serviços conectividade.
de Telecomunicações (FUST), no que se

e. Irrigação e recursos hídricos Diante da atual necessidade de buscar


soluções de mitigação dos efeitos da
O Brasil possui um volume de chuva anual escassez ou do excesso de oferta de
em torno de 1.500 mm e um período seco chuvas para o produtor rural e promover a
definido nas principais regiões agropecuárias segurança alimentar, a reservação da água
do país. Dessa forma, a possibilidade da chuva para irrigação minimiza os efeitos
de acumular água, regulando parte do da estiagem que acontecem, principalmente,
volume precipitado em reservatórios na região centro-sul do Brasil, regulando
estratégicos, e a utilização dessa água para seu fluxo nas Regiões Nordeste e Sudeste e
irrigar as culturas no período seco são um garantindo a segurança hídrica e alimentar
diferencial competitivo para o Brasil que do país.
está sendo desperdiçado. O país utiliza
apenas 2,7% das vazões dos rios para Da mesma forma, em todo fórum
irrigação (desconsiderando a vazão do Rio em que discute a competitividade da
Amazonas). agropecuária brasileira, o recurso natural
que aparece como um grande diferencial
Segundo a FAO, a produção irrigada deverá de competitividade é a água. O Brasil é rico
responder por aproximadamente 80% do nesse recurso. Logo, preservá-lo e conservá-
incremento da produção de alimentos lo em quantidade e qualidade é estratégico
necessária até 2050. Os reservatórios para a manutenção dessa competitividade.
contribuem com a segurança hídrica e
alimentar do Brasil e do mundo.

18 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


No contexto da crescente disputa pelo uso palmente por parte do Conselho Nacional
dos recursos hídricos, dos mecanismos de de Recursos Hídricos (CNRH), com o objetivo
cobrança pelo uso da água e pelo alto custo de tornar a técnica segura aos usuários e aos
energético, a demanda e o uso eficiente são consumidores, trazendo segurança ao uso
primordiais. Assim, surgem alternativas como da água residual não potável, principalmente
o reúso e a agricultura mais uma vez se colo- nas localidades com baixa precipitação e alto
ca como a principal atividade receptora, com índice de comprometimento na disponibili-
benefícios diretos, inclusive na prestação dade hídrica.
de serviços ambientais e, em particular, do
reúso indireto, com potencial para adequa- Diante da responsabilidade do país em
ção do corpo hídrico à melhoria de qualida- alcançar seu compromisso de garantir a
de da água. Para alcançar esse potencial, é segurança alimentar dos brasileiros e ser um
necessária a adoção de normas claras para dos principais fornecedores de alimentos ao
o aproveitamento agrícola no reúso, princi- mundo, são necessárias algumas ações.

PROPOSTAS • Criar incentivos que viabilizem a geração


distribuída, para que a taxação prevista
• Regulamentar a reservação de água para para começar em 2023 não desestimule
produção de alimentos como de utilidade o uso das fontes renováveis e o país não
pública, para fins de aplicação da Lei avance na sua matriz energética;
12.651/2012 por meio da aprovação do PL
2168/2021; • Regulamentar a criação do Conselho
Nacional de Irrigação; e
• Garantir a retomada do desconto da
energia para o setor rural e manter os • Normatizar o reúso da água para a
descontos para irrigação e aquicultura por agropecuária por meio de resolução do
meio da aprovação do PDL 7/2019 e do PL Conselho Nacional dos Recursos Hídricos
2045/2021; (CNRH) para usos diretos e indiretos,
promovendo a eficiência do uso do
• Apoiar os Polos de Agricultura Irrigada recurso hídrico e reduzindo a disputa
criados pelo MDR, garantindo corpo entre usuários de água.
técnico e recurso financeiro para que os
projetos e as ações possam caminhar;

19
1 .2. LOGÍSTICA E TRANSPORTE do plano de governo, sugere-se considerar
como propostas:
Estabelecer prioridades em infraestrutura
requer planejamento, implantação e a. Transportes terrestres e aquaviários
gerenciamento eficaz de planos, programas
e projetos de investimentos. O cerne é As estradas, na distribuição da matriz de
considerar o atendimento das necessidades transportes brasileira, representam mais
públicas e o bem-estar social. de 60% da movimentação de passageiros e
cargas. Entretanto, a extensão pavimentada
Costumeiramente, proposições voltadas não ultrapassa 12% e sua condição é
à garantia de infraestruturas essenciais agravada quando avaliados parâmetros
– como saneamento básico, energia como a qualidade do asfalto, da geometria
elétrica, transporte, mobilidade urbana e da via e da sinalização. Ademais, de todos
telecomunicação – são caracterizadas por os produtos que trafegam em linhas
incertezas, riscos e imprecisões ambientais, férreas, somente 17% são agropecuários.
financeiras, institucionais, sociais e políticas. O principal beneficiário desse modo de
transporte – caracterizado por menor custo
Cada real investido em logística é revertido e maior sustentabilidade – é o minério de
na redução do Custo Brasil e produz efeitos ferro, totalizando 76%. Quando se trata
multiplicadores positivos. Ademais, propor- dos rios brasileiros, convém relembrar que
ciona a integração entre as regiões brasileiras o potencial de navegação comercial é de
e o aumento da produtividade e competitivi- 43 mil quilômetros, mas a ausência de
dade. É criado ambiente com condições favo- manutenção permite – com restrições e
ráveis para o crescimento e o desenvolvimen- durante determinados períodos do ano –
to econômico do país, na medida em que são utilizar irrisórios 29% da extensão disponível.
gerados emprego e renda. Para a formulação

PROPOSTAS especialmente quanto à prestação


adequada do serviço e à modicidade
• Adotar programas de recuperação, tarifária;
melhoria e adequação nos corredores
de comércio e de exportação da • Implantar comissões/fóruns tripartites,
produção, incluindo rodovias, ferrovias com a participação dos usuários, dos
e rios navegáveis ou potencialmente transportadores e do governo, com
navegáveis; a finalidade de discutir ações para
aperfeiçoamento da infraestrutura de
• Formular, editar ou revisar marcos transporte do país;
regulatórios do setor de transportes,
indicando soluções aos entraves • Direcionar valores de outorga para a
de natureza legal ou operacional, complementação de investimentos
preservando os direitos dos usuários, privados e/ou para a implantação de

20 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


novos trechos de rodovias e ferrovias • Promover o compartilhamento da
(investimentos cruzados); infraestrutura ferroviária, em consonância
com o direito de passagem e tráfego
• Implantar e aperfeiçoar a legislação que mútuo, a Operadores Ferroviários
estabelece o conceito de transporte Independentes (OFIs), concessionárias e
multimodal previsto na Lei 9.611/1998 autorizatárias;
(integração entre os modos rodoviário,
ferroviário e hidroviário); • Recuperar e reativar trechos ferroviários
subutilizados (desativados ou ociosos);
• Manter princípios básicos de livre
mercado no novo marco regulatório do • Definir modelo de gestão, administração,
Transporte Rodoviário de Cargas (TRC), operação e segurança de hidrovias,
priorizando a livre negociação e vedando incluindo a criação de Empresa Brasileira
o tabelamento de fretes rodoviários; de Hidrovias (EBH), assistida por conselho
com participação de usuários;
• Adotar modelos de concessão em
rodovias que garantam menor valor de • Implementar serviços contínuos de
tarifa como critério de julgamento e com manutenção dos rios (dragagem,
previsão de investimentos em expansão derrocamento, balizamento, sinalização,
de capacidade, baseada no volume de atualização de cartas náuticas, construção
tráfego; de dispositivos de transposição de
desníveis), que resultem na ampliação dos
• Criar modelo de política nacional de canais de navegação; e
mobilidade rural e de apoio ao transporte
de passageiros e cargas, em estradas • Garantir o princípio do Uso Múltiplo
vicinais, assegurando condições das Águas (Lei 9.433/2007) para a
adequadas de tráfego (manutenção, navegação em rios, sem privilegiar setores
recuperação, revitalização e desobstrução específicos.
de pontos críticos);

b. Sistema portuário ção da infraestrutura de acesso aos portos e


de capacidade para escoamento. E, ainda, a
Os portos brasileiros – quer públicos, quer mitigação de gargalos logísticos que inviabi-
privados – respondem por mais de 90% dos lizem os custos de movimentação de pro-
produtos enviados ao comércio exterior. dutos, mantendo a competitividade com o
A cada novo recorde de safra e crescimento mercado internacional.
das exportações, faz-se necessária a adequa-

21
PROPOSTAS auxiliares, para aquisição de máquinas,
equipamentos e outros bens necessários
• Tornar ágeis os processos de licitação à reformulação e modernização dos
de arrendamentos de áreas públicas ou portos;
autorização de Terminais de Uso Privado
(TUPs), com a finalidade de aumentar • Aprimorar o processo de desestatização
a capacidade de movimentação de dos portos organizados, sob os pilares
produção agropecuária; da ampla liberdade econômica, da
concorrência, da eficiência e da
• Permitir modernização e expansão de competitividade, promovendo atracação
estruturas (ampliar e modernizar cais e de investimentos privados e repelindo a
aprofundar acessos aquaviários), bem concentração horizontal do mercado ou
como incrementar a movimentação de abuso de poder econômico; e
cargas e a concorrência entre os agentes
atuantes no sistema portuário; • Regular o serviço de praticagem,
promovendo eficiência e competitividade
• Estabelecer política tributária permanente na prestação do serviço, de maneira
de desoneração dos investimentos a evitar abusos do poder econômico,
em terminais portuários e serviços decorrentes da concentração de mercado.

c. Armazéns, portos secos ou Centros predominantemente em regiões de novas


Logísticos e Industriais Aduaneiros (CLIAs) fronteiras agrícolas.

A implantação da estrutura essencial para No Brasil, somente 14,8% das unidades estão
atender à etapa de armazenamento de situadas em fazendas. No Canadá, a capaci-
produtos agropecuários, que antecede a dade de armazenagem instalada nas fazen-
distribuição aos centros consumidores, não das representa 85%; nos Estados Unidos, 65%;
tem acompanhado safras recordes. O que na Europa, 50%; na Argentina, 40%; e na Aus-
se observa na prática é uma estrutura arma- trália, 35%. O incremento contínuo da produ-
zenadora inadequada e uma distribuição ção de grãos no Brasil constitui indicativo da
desarrazoada da capacidade estática no país. necessidade de políticas públicas capazes de
O déficit em armazenagem de grãos é de incentivar a modernização do setor armaze-
76,4 milhões de toneladas (CONAB, 2021), nador, com níveis de tecnologia compatíveis
aos alcançados na produção dos grãos.

22 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS armazenagem (oferta de cursos
profissionalizantes, com foco na operação
• Diagnosticar a situação atual e os pontos de máquinas e equipamentos, tratamento
críticos para adequação e implantação fitossanitário e automação de processos);
de armazéns, nos seus aspectos de
capacidade, distribuição espacial • Adequar o Programa para Construção
estratégica e atendimento aos requisitos e Ampliação de Armazéns (PCA), de
legais de qualidade e segurança da maneira a ofertar recursos com taxas
atividade; de juros atrativas e, consequentemente,
expandir, modernizar e reestruturar o
• Atualizar o Cadastro Nacional de parque de armazenagem no país; e
Unidades Armazenadoras (CNUA),
mantido pela Companhia Nacional • Promover ajustes tributários estaduais,
de Abastecimento (Conab), primando em legislação fiscal específica, com a
pela manutenção do banco de dados finalidade de viabilizar a implantação
e o cadastramento de informações de condomínios de armazéns rurais,
periódicas, com a finalidade de auxiliar no ampliando a oferta dessa estrutura
diagnóstico e no perfil do setor; em nível de fazenda, possibilitando a
comercialização estratégica da produção
• Qualificar mão de obra para a gestão e resultando na redução de custos de
e operacionalização do serviço de armazenagem e logísticos.

Quanto aos portos secos e/ou Centros Logís- na e Minas Gerais concentram 70% dessas
ticos e Industriais Aduaneiros (CLIAs), vale estruturas, sendo somente nove instalações
lembrar que estes representam importantes no Norte e no Nordeste (9%). As regiões de
instrumentos de desburocratização para novas fronteiras agrícolas são carentes desse
movimentação e armazenagem de cargas, tipo de estrutura, o que demanda ações para
especialmente no interior. O Brasil possui simplificar o regime de delegação dos por-
35 portos secos e 34 CLIAs. Os estados de tos secos e dos CLIAs, adotando processo de
São Paulo, Rio Grande do Sul, Santa Catari- autorização ou licença (sem licitação).

23
PROPOSTAS • Possibilitar incremento da oferta de
serviços de alfandegamento, resolvendo
• Descentralizar e interiorizar as operações o atual gargalo de infraestrutura nos
de desembaraço aduaneiro; portos; e

• Reduzir custos operacionais e promover • Aliviar as operações dos portos marítimos,


maior concorrência no desembaraço favorecendo a recepção e o carregamento
aduaneiro; dos navios.

d. Intervenções prioritárias produtos agropecuários aos centros de distri-


buição ou terminais portuários são elencadas
As prioridades em logística e infraestrutura no quadro a seguir:
necessárias para garantir o escoamento dos

MODO DE
INTERVENÇÕES JUSTIFICATIVA
TRANSPORTE

BR-020: elaboração do projeto, 1,5 a 3 milhões de toneladas/ano


pavimentação e adequação do trecho de
RODO
Santa Rita de Cássia (BA) a Campo Alegre Abastecimento da Região Nordeste com
de Lourdes (PI) (310 km) milho (avicultura, faixa litorânea)

4 a 7 milhões de toneladas/ano
BR-020: pavimentação e adequação do
RODO trecho entre Barreiras (BA) e Picos (PI),
entroncamento com a BR-230 (741 km) Abastecimento da Região Nordeste com
milho (avicultura, faixa litorânea)

3 a 5 milhões de toneladas/ano
BR-080: pavimentação do trecho de
RODO Ribeirão Cascalheira (MT) a Luiz Alves, em
São Miguel do Araguaia (GO) (201 km) Ligação dos polos produtivos à Ferrovia
Norte-Sul (FNS) aos portos do Arco Norte

BR-155: adequação da capacidade da


RODO rodovia (350 km), no trecho de Redenção
(PA) a Marabá (PA) 7 a 15 milhões de toneladas/ano

BR-158: implantação e pavimentação Ligação dos polos produtivos aos outros


do contorno de Terra Indígena modos de transporte e aos portos do Arco
Maraiwatsede (MT) (195 km) e adequação Norte. Obs.: restrita à conclusão do Pedral
RODO
da capacidade da rodovia, entre o trecho do Lourenço (PA)
divisa do MT/PA a Redenção (PA), com a
construção de pontes

24 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


MODO DE
INTERVENÇÕES JUSTIFICATIVA
TRANSPORTE

1 a 5 milhões de toneladas/ano
BR-163: conclusão da pavimentação do
RODO trecho Miritituba (PA) a Santarém (PA) e Ligação dos polos produtivos aos outros
construção de pontes (33 km) modos de transporte e aos portos do Arco
Norte, com auxílio da implantação da
Ferrovia Ferrogrão (EF-170)

2 a 4 milhões de toneladas/ano
BR-230/412/232: adequação da
capacidade da rodovia, no trecho de
RODO Suprimento de grãos (criatórios no litoral),
Picos (PI) a João Pessoa (PB), via BR-232,
em Pernambuco (PE) (852 km) frutas, fertilizantes, combustíveis
e alimentos

5 milhões de toneladas/ano
BR-242: pavimentação do trecho
RODO Santiago do Norte (MT) a Querência (MT)
(288 km) Conexão das áreas de produção às BR-158
e BR-163

5 a 10 milhões de toneladas/ano
BR-242: adequação, manutenção,
ampliação do pavimento e instalação de Escoamento de grãos para o Porto de
RODO
terceiras faixas no trecho de Luís Eduardo Cotegipe (exportação) e frete retorno de
Magalhães (BA) a Aratu/Cotegipe (BA) fertilizantes, para suprir as demandas
internas da Bahia

5 a 7 milhões t/ano
BR-282/470 ou BR-280/153: adequação
da capacidade da rodovia no trecho
RODO Abastecimento de insumos destinados a
São Miguel do Oeste (SC), fronteira da
Argentina ao Porto de Navegantes (SC) criatórios e transporte e exportação
de carnes

14 a 20 milhões t/ano
BR-392/471: adequação da capacidade
RODO da rodovia do trecho de Santa Maria (RS) Tradicional ligação das áreas de produção
a Rio Grande (RS) de grãos ao sistema portuário de Rio
Grande (RS)

20 a 50 milhões t/ano
Ferrogrão: licitação e implantação do
FERRO
trecho de Sinop (MT) a Miritituba (PA) Ligação do norte do Mato Grosso ao porto
de Miritituba/Itaituba (PA)

Ferrovia de Integração Centro-Oeste 20 a 27 milhões t/ano de grãos


(FICO): licitação do trecho de Campinorte
FERRO
(GO) a Lucas do Rio Verde (MT) e Sapezal
(MT) a Porto Velho (RO) Ligação com a Ferrovia Norte-Sul (FNS)

25
MODO DE
INTERVENÇÕES JUSTIFICATIVA
TRANSPORTE

Ferrovia de Integração Oeste-Leste 20 a 27 milhões t/ano de grãos


(FIOL): licitação do trecho Ilhéus (BA) a
FERRO
Figueirópolis (TO) e trecho de Brumado
(BA) a Porto de Aratu/Cotegipe (BA) Ligação com a Ferrovia Norte-Sul (FNS)

20 milhões t/ano

HIDRO Rio Madeira: dragagem e sinalização Obras de sinalização, derrocamento,


balizamento e dragagem (tráfego
permanente)

Rio Tapajós: dragagem, sinalização e


Garantia da movimentação de cargas
HIDRO balizamento do trecho de Miritituba (PA)
agropecuárias nos rios
a Santarém (PA)

20 a 50 milhões de t/ano
Rio Tocantins: derrocamento do Pedral
HIDRO
do Lourenço (TO)
Carga para 2025

Tietê-Paraná: dragagem e derrocamento Garantia da movimentação de cargas


HIDRO
do Pedral de Nova Avanhandava (SP) agropecuárias nos rios

1.3. MERCADO INTERNACIONAL Com isso, houve um aumento na inseguran-


ça alimentar ao redor do mundo. De acordo
a. Acesso a mercados e acordos com a FAO, um décimo da população global
comerciais – até 811 milhões de pessoas – estava subali-
mentada em 2021. Nesse contexto desafia-
Mesmo em um cenário de alta volatilidade e dor, o agro brasileiro tem papel fundamen-
insegurança global causado pela pandemia tal para garantir a segurança alimentar da
de covid-19 e conflitos armados no mundo, população brasileira e uma vocação exporta-
o agro brasileiro foi resiliente e superou US$ dora que apoia a garantia da paz e da segu-
120 bilhões de exportações em produtos agrí- rança alimentar em todo o mundo.
colas em 2021 – um crescimento de 24,51%
frente a 2019, último ano antes dos impactos Contudo, o que foi visto nos últimos anos foi
da covid-19 atingirem o mundo. uma tendência de aumento do protecionis-
mo em diversos países. Esse quadro reforça a
O cenário desafiador foi completado por importância de uma forte atuação do gover-
um incremento nas dificuldades logísticas no para a abertura de novos mercados e me-
com o aumento dos fretes, o fechamento de lhores condições de acesso para os produtos
importantes portos globais e a redução da agrícolas brasileiros.
disponibilidade de contêineres e de espaço
nos navios. Soma-se a isso uma rede de acordos comer-
ciais ainda limitada e com pouca sinergia

26 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


com os principais mercados importadores A desvantagem fica clara ao vermos que, em
de produtos agropecuários, ao contrário de 2021, apenas 10% das exportações agrícolas do
importantes players do mercado interna- Brasil foram destinadas a países com os quais
cional, como a Austrália, os Estados Unidos, possuímos acordos comerciais. Em compa-
o México e a União Europeia. Estes contam ração, 72,6% das exportações agrícolas da
com uma ampla rede de preferências em Austrália e 93,95% das exportações agrícolas
mercados com os quais o Brasil comercializa, do México foram destinadas a países com os
o que coloca os produtos brasileiros em uma quais estes mantêm acordos preferenciais.
situação de desvantagem. Nesse sentido, é fundamental avançar com a
agenda de acordos comerciais e com a aber-
tura de mercados.

PROPOSTAS • Revisar e ampliar acordos comerciais com


África do Sul e México;
• Concluir as negociações de Acordos
de Livre Comércio em andamento com • Definir uma estratégia de política
Canadá e Coreia do Sul; comercial brasileira ampla e de longo
prazo;
• Abrir novas frentes de negociação com
mercados como Reino Unido, Japão e • Buscar por novos acordos para evitar
países da América Central; Dupla Tributação (ADTs) e de Facilitação
de Investimentos; e
• Ampliar e celebrar novos acordos
internacionais para facilitação do • Modernizar o processo de exportação
comércio, a exemplo do que temos com de produtos agrícolas por meio da
Chile e EUA, para aceitação simplificada simplificação dos procedimentos,
de documentos e procedimentos, com foco na digitalização e adoção
inclusive certificações sanitárias, de documentos eletrônicos
fitossanitárias e de produtos orgânicos; internacionalmente aceitos.

• Ratificar acordos de livre comércio com a


União Europeia e a EFTA;

27
b. Fortalecimento da imagem e defesa de No âmbito multilateral, é importante avançar
interesses em iniciativas que aumentem a competitivi-
dade brasileira e sejam indutoras das refor-
É imprescindível que o governo defenda e mas necessárias e da redução de custos e
promova a imagem do agro brasileiro como atração de investimentos, como a acessão do
fornecedor confiável de alimentos para o Brasil à OCDE. Também no âmbito multila-
mundo, produzindo de maneira sustentável teral, é importante a retomada dos trabalhos
e eficiente. do Órgão de Solução de Controvérsias (OSC)
da OMC e a utilização da OMC como fórum
Esse posicionamento é ainda mais relevante para discussões de temas multilaterais como
considerando que o mundo está cada vez subsídios agrícolas.
mais protecionista e que a produção agro-
pecuária brasileira vem sendo alvo de fortes Por fim, em um mundo volátil e protecio-
críticas no cenário internacional. nista, é necessário preservar os fluxos inter-
nacionais de alimentos e insumos agrícolas,
É necessário, ainda, que sejam combatidas as isentando esses produtos de possíveis san-
barreiras não-tarifárias impostas sem funda- ções internacionais que possam ser impos-
mento científico e que haja o aprofundamen- tas, contribuindo assim para a redução da
to das discussões sobre as regras ambientais segurança alimentar mundial.
em discussão ou impostas em mercados
como o Reino Unido e na União Europeia.

PROPOSTAS barreiras sanitárias, fitossanitárias,


técnicas e ambientais que impedem o
• Defender e promover a imagem do acesso de produtos agrícolas brasileiros;
agro brasileiro como seguro, confiável
e sustentável em fóruns bilaterais, • Defender, de maneira proativa, o agro
plurilaterais e multilaterais; brasileiro contra medidas injustificadas
que onerem o produtor rural, no cenário
• Criar campanha unificada entre os internacional;
diversos órgãos governamentais e o setor
privado para o fortalecimento da imagem • Utilizar a acessão do Brasil à OCDE como
do país; catalisador de reformas estruturais e
redutor de custos;
• Discutir, de forma multilateral, os
regulamentos sobre sustentabilidade • Utilizar a OMC como fórum de discussões
e comércio internacional para evitar a multilaterais e buscar a revitalização do
imposição de barreiras não-tarifárias; OSC; e

• Atuar proativamente em fóruns bilaterais • Defender a não inclusão de alimentos e


e multilaterais para superação de insumos agrícolas em possíveis sanções
internacionais.

28 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


c. Promoção comercial e foco no Brasil quando comparada a países como Austrália,
exportador de alimentos Estados Unidos e Canadá, e até mesmo com
os vizinhos Peru e Chile.
O Brasil precisa desenvolver uma estraté-
gia de diferenciação de produtos focada no Um outro fator que exige atenção do próxi-
marketing junto aos consumidores interna- mo governo é em relação à necessidade de
cionais e no posicionamento de novos se- ampliar a base de empresas exportadoras no
tores exportadores. É uma atuação mais do país. Atualmente são pouco mais de trinta
que necessária para ampliar a exportação de mil, sendo apenas sete mil do setor agrope-
produtos de maior valor agregado e diversifi- cuário. Esse número indica a oportunidade
car a pauta do comércio exterior do país. de fomentar exportações de cadeias especí-
ficas e de ampliar o número de empreendi-
Em 2021, dentre os 1.854 produtos exporta- mentos rurais envolvidos – direta e indireta-
dos pelo agronegócio brasileiro, apenas 10 mente – no esforço exportador.
responderam por 72% do valor total, o que
demonstra grande concentração da pauta de O produtor rural está fazendo seu dever de
exportações. casa, ampliando sua produtividade e adotan-
do práticas cada vez mais sustentáveis. Essa é
Além disso, o trabalho de promoção da ima- a imagem que precisamos mostrar ao mun-
gem do país como produtor e fornecedor de do: de um setor diverso, que contribui para o
alimentos diferenciados precisa ser fortaleci- desenvolvimento do país ao mesmo tempo
do, pois, apesar de ser um dos maiores pro- em que produz alimentos de alta qualidade,
dutores em muitas cadeias do agronegócio, a respeitando a biodiversidade local.
imagem do Brasil não tem o apelo comercial

29
PROPOSTAS • Investir em programas de comercialização
no exterior voltados para pequenos
• Fomentar as exportações de produtos e médios produtores, explorando
agropecuários de valor agregado, oportunidades em redes de e-commerce
explorando atributos relacionados a internacionais;
diferenciações regionais como indicações
geográficas; • Estabelecer parcerias e elaborar estudos
de benchmark com outros países
• Desenvolver projetos nacionais de que sejam importantes produtores e
fomento às exportações de alimentos que exportadores mundiais de alimentos
sejam adaptados às realidades locais do e que conseguiram consolidar a sua
agronegócio, com ações de qualificação e presença e imagem em mercados
de promoção comercial; externos, como Austrália, Canadá,
Chile e Nova Zelândia. O sucesso no
• Manter a competitividade da agricultura reconhecimento de seus produtos foi
brasileira nos mercados internacionais, possível graças a uma estrutura robusta
não tributando a exportação de alimentos de suporte à exportação; e
e produtos agropecuários;
• Manter a competitividade da agricultura
• Criar programa para a sensibilização, brasileira nos mercados internacionais,
capacitação e desenvolvimento de novas não tributando a exportação de alimentos
cadeias agropecuárias para o comércio e produtos agropecuários.
internacional, por meio de parcerias entre
entes públicos e privados;

1.4. ACESSO AOS ALIMENTOS para a população ou para o governo adqui-


rir alimento e evitar o risco de insegurança
Por mais que esforços e avanços tenham sido alimentar. Nesse contexto, implementar uma
verificados no Brasil em prol do desenvolvi- estratégia nacional eficiente e permanente
mento científico, do aumento da eficiência de garantia da segurança alimentar é uma
da agropecuária objetivando a oferta de forma de demonstração de que as pessoas
alimentos em quantidade e qualidade para estão em primeiro lugar.
a população, a segurança alimentar em seu
sentido intrínseco – de garantia de que todas Com isso, a recuperação e, em muitos casos,
as pessoas tenham acesso a alimentação a inserção do potencial de acesso a alimentos
para suprimento de suas necessidades diá- está associada, de forma basilar e estrutural:
rias – ainda esbarra em fortes dificuldades re- ao comprometimento da renda, que, por sua
lacionadas à capacidade de acesso e compra. vez, é consequência do crescimento econô-
mico irregular e de taxas tímidas por déca-
Em muitos lugares onde o fantasma da fome das, o que demanda reformas estruturantes
aparece, incluindo o Brasil, falta dinheiro a serem tratadas nos próximos capítulos; a

30 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


elevada taxa de desemprego, que ainda atin- alimentar mundial. Não é sem motivos que,
ge 9,8% da população; ao elevado nível de dos Objetivos de Desenvolvimento Susten-
desigualdade social; ao ainda baixo desenvol- tável das Nações Unidas, o primeiro seja a
vimento tecnológico, educacional e à elevada erradicação da pobreza em todas as formas
taxa de analfabetismo, que contribuem para e em todos os lugares. O segundo é erradi-
a baixa remuneração e qualidade dos empre- car a fome, alcançar a segurança alimentar,
gos; a histórica má administração dos recur- melhorar a nutrição e promover a agricultura
sos públicos e investimentos governamentais sustentável.
em serviços básicos e essenciais, como saú-
de, segurança, educação e transporte, que Portanto, além das ações a serem elencadas
concorrem com a alimentação nas despesas nos capítulos subsequentes, ações de cur-
das famílias; e a deficitários mecanismos de to, médio e longo prazo, com mecanismos
dispersão regional da oferta e do acesso da transitórios, precisam ser consideradas em
população a alimentos a preços competitivos. um plano de trabalho de Estado, com foco
na ascensão econômica e social, educacional
Desfazer, ou mesmo despender esforços para e tecnológica da população e, por consequ-
mitigar esses problemas estruturantes, repre- ência, no seu poder de compra e acesso a
sentaria não apenas grandes conquistas para alimentos em quantidade e qualidade míni-
a população brasileira, mas também uma mas para uma vida saudável.
importante contribuição para a segurança

PROPOSTAS o desenvolvimento socioeconômico


regional e promovam a oferta de
• Ampliar o rigor, a eficiência e a alimentos a preços competitivos à
fiscalização dos recursos aplicados aos população; e
programas sociais com foco nos mais
pobres, bem como transformá-los em • Estruturar, de forma complementar,
mecanismos transitórios de recuperação rigorosa e estratégica, o papel dos entes
de renda por meio da inserção das federativos (União, estados, Distrito
famílias no mercado de trabalho; Federal e municípios) na aplicação
dos recursos públicos direcionados
• Promover o desenvolvimento de aos serviços básicos e essenciais,
arranjos produtivos locais de alimentos, considerando a diversidade e as
que reforcem a empregabilidade e especificidades regionais.

31
2
Desenvolvimento
Econômico
2. DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

É consenso de grande parte dos brasileiros 2.1. REFORMA POLÍTICA


que o país precisa passar por uma série
de reformas para se desenvolver de forma Democracia é o regime político brasileiro
estruturada. Neste capítulo, apresentamos em que todos os cidadãos participam
a essência das principais reformas a serem igualmente, diretamente ou a partir de
realizadas pelo Brasil. representantes eleitos na proposta do
desenvolvimento e da criação de leis,
A primeira reforma a ser proposta é a política, exercendo, assim, o poder de governar por
alicerce para a reforma administrativa, a meio do voto – o sufrágio universal.
qual, neste capítulo, recebe recomendações
relacionadas à necessidade de melhoria da Desde a proclamação da República, o Brasil
produtividade e da qualidade dos serviços tem sido governado por três poderes: Legisla-
prestados, bem como a redução de custos da tivo, Judiciário e o Executivo, no qual o chefe
máquina pública à população brasileira. Em é o presidente da República, eleito pelo voto
seguida, sugere-se a reforma tributária, cujo popular a partir de 1989 em eleições diretas
objetivo principal é o de simplificar a vida do para um mandato de quatro anos. Em 1997
cidadão brasileiro sem promover aumento da foi aprovada a reeleição, concedendo ao
carga tributária. presidente no cargo o direito de concorrer a
mais quatro anos de mandato.
Tais proposições buscam ainda o
amadurecimento e o aprimoramento do Mas o que, de fato, o cidadão espera do
Estado visando ao cumprimento do preceito regime democrático? Os cidadãos esperam
constitucional de redução das desigualdades fazer valer os princípios, as atitudes e os
regionais. Para isso, recomenda-se, além do valores voltados ao coletivo, como respeito
uso de instrumentos financeiros e fiscais, o à vida, responsabilidade, honestidade,
investimento robusto em capital humano, solidariedade e justiça.
serviços públicos e infraestrutura, bem como
a promoção tanto da inovação regional E o sistema político brasileiro atende à demo-
quanto dos arranjos produtivos locais. cracia almejada pelo cidadão? A maioria da
população, acompanhada de várias correntes
As reformas e as propostas de política agrí- de especialistas, acredita que não, culpando
cola e de desenvolvimento regional objeti- o atual sistema pelos baixos índices de de-
vam, portanto, a construção de um cenário senvolvimento econômico e humano.
econômico e fiscal sólido, fundamental para
o desenvolvimento de um ambiente social à Por isso, a reforma política se torna a mais
altura do que o país merece. importante das reformas, imprescindível

33
para reorganizar estruturalmente o Estado, fundamento da vida democrática é posto
pois é a partir dela que se fazem possíveis, em questão. Na prática, com a fragmentação
efetivamente, uma reforma administrativa partidária, o povo elege o presidente, mas
e um novo pacto federativo que tragam a não dispõe de controle sobre a formação das
democratização do sistema político, buscan- maiorias parlamentares. Nas democracias
do, desse modo, uma melhor distribuição dos maduras e efetivas, a população escolhe o
recursos públicos e justiça social. governo e a maioria parlamentar, o que não
é possível no sistema proporcional em que o
Nessa reforma política, devem ser eleitor não sabe sequer em que está votando.
discutidos a possível mudança no sistema Esse sistema tende a manter os governos
eleitoral, a organização dos partidos e o com minoria parlamentar, obrigados a
financiamento eleitoral. custosas barganhas para governar e quase
sempre sem poder cumprir os programas
O sistema proporcional para as eleições de campanha que o povo escolheu. Nesse
legislativas, além de ser um sistema sentido, o Congresso fica com o poder de
complexo, o qual não é adotado em mudar por conta própria o pacto político
nenhum país relevante no mundo, distorce aprovado na eleição majoritária.
claramente o sentido da representação.
O segundo ponto que precisa ser reformado é
Praticamente todas as nações aderiram ao a fragmentação partidária. Os partidos bra-
sistema distrital para a escolha dos seus sileiros, na sua quase totalidade, não repre-
deputados, e o primeiro passo para se sentam nada e nem ninguém, não tendo
alcançar também um Parlamento em que projeto próprio de poder – existem por terem
as pessoas possam se reconhecer seria a à disposição recursos públicos para financiar
adoção desse mesmo sistema. suas campanhas e tempo nas redes de rádio
e televisão. A criação de partidos deve ser livre,
Em um distrito regionalmente limitado, mas os seus financiamentos não podem ser
em que o deputado é eleito por meio de públicos, porque a maioria deles não exerce
uma eleição majoritária, na qual concorrem qualquer papel de ordem pública e funcio-
poucos candidatos, a ligação entre eleitor e nam como entidades privadas. Se financiados
eleito é efetiva, o voto é mais consciente e com recursos públicos, deveriam ter tanto a
a responsabilização do eleito pelo eleitor se sua organização interna quanto o seu funcio-
torna possível. namento severamente regulados pelo Estado.

No nosso sistema atual, com eleição Por fim, defendemos a volta do livre
proporcional em que o eleitor pode votar funcionamento das campanhas eleitorais,
tanto no candidato quanto no partido ou com o fim do financiamento público ou a
coligação, os laços entre o deputado e seus sua limitação a um mínimo, mediante severa
eleitores desfazem-se na própria noite da regulação, e, criando critérios para evitar que
eleição, e a população encara o Parlamento o poder econômico seja o desiquilíbrio das
como uma entidade estranha e abstrata. eleições e da democracia.

Se a população não se sente representada, O regime legal das instituições políticas


tampouco responsável pelo Parlamento, o brasileiras não serve ao bom funcionamento

34 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


do Estado, não assegura a participação Como o Brasil é importante na economia
do povo na formação do poder e veda a mundial, faz-se necessária a modernização
renovação de quadros. de seu sistema político para crescer, evoluir,
além de transparência e motivação para os
Nessa perspectiva, é preciso que o futuro cidadãos brasileiros acreditarem ainda mais
governante enfrente e lidere um processo em seus representantes.
de reforma política profunda para abrir
possibilidades para as demais reformas, Isto posto, recomenda-se aos próximos
desacorrentando o Brasil do peso da governantes a realização de mudanças no
máquina pública e alcançando, efetivamente, sistema eleitoral, na organização dos partidos
a democracia na sua plenitude. e no financiamento eleitoral.

PROPOSTAS mento não deva continuar público, pois


funciona como instituição privada;
• Mudar o atual sistema proporcional
que elege os deputados para o • Retornar ao livre funcionamento das
sistema distrital ou misto, com distrito campanhas eleitorais, com o fim do
regionalmente limitado, em que o funcionamento público ou a sua limitação a
deputado é eleito por meio de uma um mínimo, mediante severa regulação; e
eleição majoritária;
• Avaliar a possibilidade de se extinguir
• Defender que continue livre a criação de a reeleição concomitantemente à
partido político, embora o seu financia- ampliação do mandato.

2.2. REFORMA ADMINISTRATIVA Ademais, o Brasil possui baixa mobilidade


social. Relatório divulgado em 2020, durante o
O Brasil é um país com enormes potenciali- Fórum Econômico Mundial, apontou que uma
dades, mas que ainda convive com profundos pessoa de baixa renda demoraria, em média,
obstáculos que travam o seu crescimento nove gerações para atingir a renda mediana
mais célere, robusto e sustentado, a exemplo do país. Nesse Índice Global de Mobilidade
do elevado gasto da máquina pública frente à Social, no qual 82 economias foram analisadas
má qualidade dos serviços oferecidos a popu- sob a perspectiva de qualidade e de acesso a
lação, em boa parte das repartições públicas. educação, saúde, distribuição justa de salários,
entre outros pilares, o Brasil ficou na 60ª posi-
O acesso a bons serviços públicos é condição ção no ranking de mobilidade.
indispensável ao crescimento e ao desenvolvi-
mento de um país. No Brasil, isso é ainda mais Diante desse cenário, é ainda mais premente
latente, considerando se tratar de um país a necessidade de uma administração pública
com grande desigualdade de renda, em que eficiente, capaz de entregar serviços públicos
a maioria da população somente tem acesso de qualidade. Mas, ao contrário, a máquina
aos serviços básicos, como educação e saúde, pública brasileira consome muitos recursos e
por meio do poder público. não devolve para a sociedade bons serviços,

35
reforçando o problema de desigualdade e a burocráticos de baixo custo-benefício para o
perpetuação da armadilha da pobreza entre cidadão, as quais perduram por décadas.
as gerações, com os filhos de famílias com
maior vulnerabilidade econômica permane- A motivação para a reforma administrativa
cendo em igual situação. deve ser, portanto, a melhoria dos serviços
públicos como instrumento fundamental de
Paralelamente a esse cenário, desde 2014, o combate às desigualdades socioeconômicas
setor público apresenta resultado primário ne- dados os seus potenciais efeitos distributivos
gativo – exceção apenas para 2021 – e uma sobre a população mais vulnerável.
dívida bruta expressiva em proporção ao Pro-
duto Interno Bruto (PIB). Ao mesmo tempo, o Ressalte-se que o aumento da produtividade
país registra elevada carga tributária, a qual, do setor público repercute sobre a produti-
segundo o Tesouro Nacional, alcançou, em vidade da economia tanto pelos seus efeitos
2021, 33,90% do PIB. Com isso, a capacidade diretos, de melhora na gestão dos recursos
de investimento público se tornou quase ine- públicos e na qualidade do serviço entregue ao
xistente, dado que cerca de 93% dos recursos cidadão quanto por seus efeitos secundários
federais são voltados a despesas obrigatórias, sobre a produtividade do setor privado, prin-
grande parte delas destinadas a pessoal. cipalmente pela redução da burocracia, pela
tempestividade na prestação dos servidos e
Estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de pela melhoria na formação do capital humano.
Planejamento Tributário (IBPT) busca mensu-
rar e qualificar a prestação de serviço público A reforma administrativa deve, portanto,
no país. O instituto criou o Índice de Retorno primar pela capacitação e valorização dos
de Bem-Estar à Sociedade (IRBES), consi- seus gestores e servidores, e pela criação de
derando os 30 países de mais elevada carga estímulos à maior eficácia e eficiência na
tributária no mundo, entre eles, o Brasil. Nesse aplicação dos recursos públicos e prestação
sentido, o IRBES leva em conta a arrecadação de serviços. Ainda que a maior disciplina de
tributária em proporção do PIB e o Índice de despesas com pessoal esteja no escopo das
Desenvolvimento Humano (IDH), que engloba discussões da Reforma, seu cerne não é e não
indicadores de renda, saúde e educação dos deve ser o ajuste das contas públicas, mas o
países selecionados. Segundo a última avalia- aumento da eficiência do Estado e a melhora
ção, realizada com base na carga tributária de no serviço público disponibilizado ao cidadão
2017 e IDH de 2018, o Brasil segue como o país por meio da (re)estruturação das formas de
com pior retorno dos valores arrecadados em gestão, da digitalização da administração pú-
prol do bem-estar da sociedade, por ter com- blica, da avaliação dos servidores, e do estabe-
parativamente uma elevada carga tributária e lecimento de um novo marco regulatório das
um baixo IDH. carreiras públicas.

As razões por trás desse resultado estão na Diante disso, é urgente a necessidade de en-
pesada, complexa e disfuncional administra- dereçamento da reforma administrativa, visto
ção pública brasileira, envolta em dinâmicas seu grande impacto sobre o bem-estar social
de má utilização de recursos e de entraves e sobre a produtividade do país.

36 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS pois uma boa reforma deve desenvolver
ferramentas destinadas a aprimorar
• Modernizar o Estado para que seja eficaz a qualidade dos gastos públicos,
a reforma do aparato estatal. Importante aperfeiçoando o direcionamento de
incentivar a construção de ferramentas recursos para projetos bem-estruturados
de base de tecnologia digital para e que, de fato, atendam ao interesse
facilitar e aproximar a administração dos público, bem como ampliar ao máximo
administrados, procurando reformular a transparência e a divulgação de
processos que, sem perder a qualidade informações, regras, planos, processos
e a segurança, possam contemplar a e ações. As informações precisam ser
autorização online para funcionamento acessíveis, além de adequadas e objetivas,
de estabelecimentos e registro de com linguagem que não represente uma
produtos ou de processos produtivos. barreira para os cidadãos. A transparência
O baixo e irregular crescimento leva a uma maior confiança nos líderes
econômico do país nas últimas décadas governamentais e, consequentemente, na
indica a necessidade de inovar e estimular administração pública;
a atividade produtiva, atualizando
processos e reduzindo burocracias que • Rever criticamente a estabilidade ampla
não mais se justificam na era digital; de servidores públicos. A estabilidade
é uma garantia importante e devida,
• Imprimir maior agilidade na gestão mas somente àqueles cargos que são,
pública. A Constituição Federal já nasceu efetivamente, estratégicos para o Estado
prolixa e com vocação ao crescimento e cujas funções incluem a tomada
do seu texto-base. Desconstitucionalizar de decisão ou a responsabilidade por
matérias relacionadas ao direito planejamento e execução de políticas.
administrativo contribuiria para uma A ampla estabilidade do servidor público
gestão mais ágil e racional da prestação é contraproducente e cria restrições
de serviços públicos e do quadro de para que se estabeleçam mecanismos
servidores. Manter detalhamento de de incentivo efetivos ao esforço e à
regra trabalhista no texto constitucional produtividade no cumprimento das
não é interessante para a administração funções, valorizando a meritocracia; e
do Estado, e o ideal seria disciplinar essa
normatização por lei específica, que • Discutir estratégias de aprovação da
pode ser revista de forma democrática de reforma administrativa por poderes.
maneira mais ágil. Assim, seria possível O governo federal e os governos
promover maior flexibilização na (re) subnacionais (estados e municípios) têm
alocação dos servidores, quando da autonomia para propor e implementar
extinção da função, bem como atender reformas administrativas de forma
melhor à demanda em novas áreas; isolada e independente. Diante disso, e
considerando-se o fato de que reformas
• Melhorar a gestão financeira e a estruturantes precisam ser pensadas do
transparência das informações públicas, ponto de vista de impacto e viabilidade

37
de aprovação, é necessário colocar em reforma do Poder Executivo federal terá o
debate propostas que contemplem uma potencial de criar um ambiente favorável
reforma ampla/integral, mas também, à implementação de reformas análogas,
alternativamente, outras que possam coordenadas e integradas àquelas dos
ser feitas de forma escalonada/fatiada, entes subnacionais, isto é, de estados e
iniciando-se pelo Poder Executivo municípios.
federal. É importante ressaltar que a

2.3. REFORMA TRIBUTÁRIA participação sobre o consumo em detrimento


da renda, o que ocorre devido à baixa renda
De acordo com o Tesouro Nacional, a carga média da população brasileira. Em outros
tributária do Brasil atingiu 33,9% do Produto países, essa proporção é maior na tributa-
Interno Bruto (PIB) em 2021, arrecadando o ção sobre a renda do que sobre o consumo.
montante de R$ 2,94 trilhões ao longo do últi- Destacamos que tributos incidentes sobre o
mo ano. Esse valor é recorde desde o início da consumo possuem perfil mais complexo de
série disponibilizada pelo órgão federal. administrar e arrecadar do que os compa-
rados aos tributos incidentes sobre a renda
Ao analisarmos a arrecadação brasileira por ou patrimônio por exemplo, o que acaba por
base de incidência, observamos uma elevada gerar maior insegurança jurídica.

Gráfico 1 – Estrutura da Carga Tributária Bruta no Brasil

1,23% 1,28%
1,13% 1,26% 1,34% 1,29% 1,30% 1,15% 1,13% 1,21% 1,19%
1,18%

14,84% 14,76% 14,68% 14,41% 13,87% 13,93% 13,58% 13,91% 14,29% 14,01% 13,48% 14,76%

1,26% 1,28% 1,30% 1,32% 1,34% 1,44% 1,48% 1,50% 1,54% 1,59% 1,63% 1,65%

8,41% 8,61% 8,74% 8,66% 8,66% 8,67% 8,71% 8,75% 8,52% 8,55% 8,43% 8,19%

6,65% 7,17% 6,75% 6,77% 6,61% 6,69% 7,23% 6,97% 7,01% 7,25% 7,05% 8,02%

2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

Demais impostos Impostos sobre bens e serviços

Impostos sobre a propriedade Contribuição social

Impostos sobre a renda, lucros e ganhos de capital

Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional (STN)

38 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


Em seu relatório anual que trata do conten- Diante dessa realidade, é imprescindível que
cioso tributário no Brasil, o Insper apresentou ocorra no Brasil uma verdadeira reforma tribu-
que, em 2020, as disputas envolvendo a co- tária que modifique os problemas em todas
brança de tributos ultrapassam R$ 5,4 trilhões, as bases do consumo, para que os setores
ou o equivalente a 75% do PIB. econômicos obtenham, de fato, melhorias no
seu ambiente de negócios, além de que pos-
Ainda segundo esse estudo, entre os tribu- síveis deslocamentos da carga tributária sobre
tos que apresentam os maiores problemas uma base tributária sejam compensados com
destacam-se: Imposto sobre Circulação de ganhos em outra base, ou que a inseguran-
Mercadorias e Serviços (ICMS); Imposto Sobre ça jurídica se resolva a ponto de valer a pena
Serviços (ISS); Imposto de Renda da Pessoa apoiar todas as mudanças, caso contrário,
Jurídica (IRPJ); Contribuição para o Financia- teremos apenas uma meia reforma.
mento da Seguridade Social (Cofins); e Con-
tribuição Previdenciária. Entre os principais, Faz-se importante destacar também que a
estão os tributos incidentes sobre o consumo reforma tributária seja precedida de uma refor-
ma administrativa ampla, a qual será objeto de
(ICMS, ISS, Cofins) e, na sequência, sobre a
destaque em outro capítulo deste documento.
tributação da renda da pessoa jurídica (IRPJ)
e, por fim, na incidência da tributação sobre a
Tal necessidade se justifica pelo fato de
folha de salários.
que é preciso redimensionar o tamanho do
estado brasileiro, conferindo maior eficiência
Ressaltamos que a atual estrutura tributária,
e reduzindo os custos aos contribuintes para,
seja da base do consumo, renda, patrimônio,
posteriormente, promover os ajustes no
seja previdenciária, afeta de maneiras diferen-
sistema tributário.
tes os setores econômicos. Os setores indus-
trial e do comércio possuem grandes pro-
a. Reforma tributária (consumo, renda e
blemas na tributação sobre o consumo e na
patrimônio)
renda, enquanto o setor de serviços dispõe de
desafios na incidência previdenciária e na ren-
As reformas tributárias se mostram necessá-
da. Por sua vez, o setor agropecuário enfrenta rias tanto para o desenvolvimento econômico
grandes desafios na tributação da renda e na quanto para a garantia de segurança jurídica
propriedade, cabendo assinalar que as dis- do nosso país. Cabe destacarmos que alguns
torções na base do consumo também geram pontos são fundamentais para que as refor-
cumulatividade tributária para o setor. mas sejam esse vetor de desenvolvimento e
segurança aos contribuintes.
Nas últimas décadas discutiram-se, no
Congresso Nacional, inúmeras reformas Entretanto, para que possamos atingir esses
tributárias, em sua grande maioria focadas objetivos como nação, é primordial que haja
na tributação sobre o consumo, o que gerou reformas, algumas estruturantes, outras mais
insatisfação de alguns setores econômicos, pontuais em todas as bases de tributação, seja
pois os problemas setoriais não seriam no consumo, seja na renda ou no patrimônio.
resolvidos por completo. Ademais, o
deslocamento da carga tributária entre eles Quando falamos sobre uma reforma tributária
prejudicaria a sua competitividade. sobre o consumo, a qual podemos entender

39
como a mais complexa, algumas premissas mos que essa alíquota reduzida permite que
básicas devem ser consideradas no sentido as famílias mais carentes consigam se alimen-
de terem o condão de fomentar a atividade tar sem comprometer parte importante de
econômica, não incorrendo em aumento de sua renda com o pagamento de tributos.
carga tributária a ponto de inviabilizar setores
econômicos. Em uma reforma tributária ampla sobre o
consumo é extremamente importante a
Temas como a manutenção da carga tribu- previsão do prazo de devolução dos créditos
tária setorial e global devem ser assegurados, do novo IVA, bem como os créditos tributários
além de eventuais deslocamentos entre os atuais serão devolvidos aos contribuintes.
setores serem compensados com ajustes nas É necessário que esse crédito seja devolvido
legislações de outras bases tributárias. de maneira rápida e ágil (em menos de 30
dias). Em caso de morosidade na devolução,
Em qualquer discussão de reforma sobre o essa situação exige esforço no fluxo de caixa
consumo, é preciso ter conhecimento de que das empresas e acaba se refletindo nos consu-
98,2% dos produtores rurais brasileiros es- midores por meio de aumento de preços.
tão estabelecidos como pessoas físicas, não
sendo, portanto, contribuintes de PIS, Cofins, Por fim, observa-se a possibilidade de aplica-
IPI, ISS e em grande parte do ICMS –e isso não ção de uma tributação seletiva sobre insumos
prejudica a apropriação de créditos presumi- agropecuários, o que irá onerar sobremaneira
dos por parte dos adquirentes da produção. os produtos agropecuários, uma vez que esse
tributo não permite a apropriação de crédito
Reformas da tributação sobre o consumo por parte dos adquirentes. Ou seja, a tribu-
normalmente apontam o Imposto sobre Valor tação seletiva deve ser aplicada apenas em
Agregado (IVA) como o modelo tributário a produtos de consumo final, que comprovada-
ser seguido. Cabe lembrar que esse tributo mente possuam externalidades negativas à
deva incidir sobre os produtos e não necessa- sociedade. Imposto seletivo deve ser aplicado
riamente no contribuinte. Nesse sentido, en- com cautela, sendo a exceção e não a regra.
tão, as propostas não devem incluir as pessoas
físicas como contribuintes diretos. Quanto à reforma tributária sobre a renda,
é preciso que as faixas da tabela progressiva
Em relação à incidência de um IVA sobre pro- sejam corrigidas anualmente pelo índice da in-
dutos agropecuários, quase todos os países flação. A última atualização ocorreu em abril de
do mundo recorrem a alíquotas diferenciadas 2015, e essa desatualização amplia a incidência
(reduzidas) sobre alimentos, e essa diferen- tributária sobre os mais pobres, prejudicando o
ciação serve para reduzir o custo de vida da caráter de progressividade do tributo.
população. Outro argumento em defesa dessa
diferenciação é o de que, justamente no mo- É preciso ainda que seja permitida a atualiza-
mento que o Brasil assina acordos comerciais ção dos valores de bens imóveis declarados
com outros blocos econômicos, a elevação no patrimônio dos contribuintes, para fins
dos preços de alimentos produzidos no país de tributação sobre os ganhos de capital. Ao
por conta de tributos fará com que muitos passo que os imóveis, em média, se valorizam
produtos de outros países cheguem até aqui em todo o Brasil, é imprescindível que haja o
com preços mais competitivos. Vale destacar- pagamento do tributo sobre esse ganho, en-

40 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


tretanto, é importante que os valores declara- to sobre a Propriedade de Veículos Automo-
dos também sejam atualizados pela inflação. tores (IPVA) em um conjunto considerável de
O status atual de não permitir a atualização veículos classificados como de luxo, ao mes-
constitui-se como apropriação indébita por mo tempo em que incide sobre motocicletas
parte do Estado brasileiro. e outros veículos utilizados no transporte diá-
rio de mercadorias e pessoas, demonstrando
Ainda a respeito da reforma tributária da claro caráter de injustiça fiscal nesse tributo.
renda, é fundamental que as alíquotas do É necessário que haja uma atualização desse
Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), tributo, considerando que veículos utilizados
juntamente com a Contribuição Social sobre para produção de bens ou serviços, transpor-
o Lucro Líquido (CSLL), sejam reduzidas em tes de mercadorias ou de transporte coletivo
patamares internacionais. de pessoas possuam regressividade a ponto
de não onerar os consumidores finais por
Não faz sentido econômico o país cobrar meio de tributação excessiva.
altos tributos das empresas, pois isso impacta
negativamente na ampliação ou na instala- Adicionalmente, nota-se a recorrente uti-
ção de novos negócios no Brasil. Desse modo, lização por parte de muitas prefeituras
as empresas, sobretudo as multinacionais, conveniadas para administrar e arrecadar
buscam se instalar em países vizinhos como o Imposto Territorial Rural (ITR) na superva-
forma de garantir uma menor tributação, lorização da base de cálculo, em flagrante
afastando, assim, investimentos e a criação de inconstitucional com o que determina a le-
empregos e renda no Brasil. gislação atual. Por isso, é importante tornar
mais clara e previsível a legislação que de-
A possível tributação sobre distribuição de termina os critérios para definição do Valor
dividendos deve ser dimensionada em con- da Terra Nua (VTN) para fins de incidência
junto com a alíquota do IRPJ, para que não do ITR, para assegurar segurança tanto aos
haja uma bitributação sobre o lucro auferido contribuintes quanto ao fisco.
pela empresa e também sobre o rendimento
distribuído ao sócio. É contraproducente uma Embora não seja um tributo sobre o patrimô-
reforma tributária que vise à progressividade nio, é preciso extinguir a incidência do Impos-
tributária sobre a renda e que não considere to sobre Operações Financeiras (IOF) sobre
essa questão como primordial. empréstimos e financiamentos tomados
dentro do país. Esse tipo de tributo acaba por
Quanto à reforma tributária sobre patrimônio, ampliar ainda mais a já elevada taxa de juros
destacamos a atual não incidência do Impos- cobrada da sociedade.

41
PROPOSTAS O objetivo é garantir segurança jurídica
aos contribuintes e ao fisco;
• Manter a carga tributária global, eventuais
deslocamentos de cargas entre os setores • Garantir devolução rápida e eficaz de
econômicos devem ser compensados créditos tributários acumulados, ainda
com a revisão de tributos incidentes sobre durante o período de transição entre os
outras bases; modelos atual e novo, que os créditos
atuais sejam compensados a fim de
• Criar alíquotas diferenciadas para assegurar de forma efetiva, o direito do
produtos básicos à população, a contribuinte;
exemplo de outros países que se
utilizam do modelo do IVA, a partir do • Cobrar um único Imposto Seletivo sobre
qual os produtos básicos (alimentos, produtos com externalidades negativas,
medicamentos e serviços básicos) não nunca em produtos que são insumos para
são tributados com a alíquota-padrão. a produção;
Faz-se necessário também que pessoas
físicas não sejam contribuintes diretas do • Redimensionar as alíquotas do IRPJ
tributo; e CSLL, a fim de assegurar incidência
equivalente aos demais países no mundo;
• Garantir que as faixas da tabela
progressiva do Imposto de Renda sejam • Reformar a incidência do IPVA, com visão
atualizadas anualmente pelo índice da de progressividade tributária, Veículos
inflação; utilizados para a produção de bens ou
serviços, transportes de mercadorias ou
• Garantir que os valores dos bens imóveis transporte coletivo de pessoas devem
declarados no Imposto de Renda possam possuir uma tributação favorecida
ser atualizados anualmente pelo índice da quando comparada à incidência sobre
inflação; veículos de luxo; e

• Promover uma reforma do ITR, no sentido • Extinguir a incidência do Imposto sobre


de impedir a atual discricionariedade Operações Financeiras (IOF) sobre
da mensuração do Valor de Terra Nua empréstimos e financiamentos tomados
Tributável (VTN) por parte de algumas dentro do país.
prefeituras.

b. Redução da burocracia confortável. Essa classificação comprova que


o ambiente econômico brasileiro imposto à
A pauta de redução de burocracia é uma de- iniciativa privada não é amigável.
manda antiga da sociedade brasileira.
O último estudo do Banco Mundial a mensu- É imprescindível que as bases de informações
rar a facilidade de fazer negócios nos países dos órgãos de administração tributária se
coloca o Brasil em uma posição muito des- comuniquem. Atualmente, com a emissão

42 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


da nota fiscal eletrônica associada ao Sistema rio, oferecendo, em um segundo momento,
Público de Escrituração Digital (SPED), insegurança jurídica à economia.
muitas obrigações acessórias relacionadas à
tributação sobre o consumo e sobre a renda Nessa parte, tratamos de propostas de
poderiam ser extintas ou reduzidas. melhoria no ambiente regulatório com
propostas em nível infralegal, ou seja,
Na base da tributação sobre o patrimônio, independentemente de Proposta de
obrigações ainda em vigor já não fazem sen- Emenda Constitucional (PEC), Projeto de Lei
tido, dado o aperfeiçoamento das declarações Complementar (PLP), ou Projeto de Lei (PL).
que os contribuintes são obrigados a fazer de Desse modo, o governo federal poderia, por
forma redundante. meio de decretos, instruções normativas e
resoluções, promover uma série de alterações
O excesso de obrigações legais e a dificuldade no regramento atual, no sentido de ampliar a
para o cumprimento de todas as exigências segurança jurídica e de reduzir a burocracia
aumentam os custos diretos para o empresá- aos contribuintes e cidadãos.

PROPOSTAS redundantes. O Sistema Público de


Escrituração Pública (SPED), por exemplo,
• Criar e manter regular conselho possui inúmeras informações relativas
deliberativo, composto por representantes à emissão de documentos fiscais, o
das entidades empresariais e de que torna desnecessário o reenvio de
trabalhadores, bem como representantes declarações, como na Declaração de
do governo federal e do Poder Legislativo, Débitos e Créditos Tributários Federais
para debater mudanças e propor ajustes (DCTF) e na Guia de Informações e
necessários em matérias tributárias e Apuração do ICMS (GIA). O eSocial, por
aduaneiras, a fim de priorizar a agenda sua vez, contém inúmeras informações
tributária brasileira; previdenciárias e fiscais, dispensando a
obrigatoriedade da entrega da Declaração
• Criar e manter regular conselho do Imposto sobre a Renda Retido na
consultivo, composto por representantes Fonte (DIRF);
das entidades empresariais, bem como
representantes do governo federal e do • Garantir que haja, sempre que possível,
Poder Legislativo, para debater plano um período de carência mínimo de 90
de redução gradual de incentivos e dias para vigência de atos da matéria
benefícios federais de natureza tributária, tributária; e
a fim de garantir o cumprimento disposto
na Emenda Constitucional nº 109 de 2021; • Promover alteração infralegal para
inclusão dos produtores rurais
• Promover uma revisão das obrigações estabelecidos como pessoas jurídicas no
acessórias tributárias federais, estaduais e rol de empresas habilitadas a promover a
municipais, suprimindo a obrigatoriedade unificação de cadastro dentro do mesmo
de transmissão de informações município.

43
2.4. POLÍTICA AGRÍCOLA de risco, reduzindo, assim, as variáveis de risco
que impactam a atividade.
A política agrícola engloba um conjunto de
políticas governamentais que impactam os Entre os esforços para possibilitar o
diversos segmentos do agronegócio. Neste acesso a novas fontes de financiamento e
documento, focamos nas políticas voltadas alternativas para a maior inclusão financeira
ao crédito e à gestão de risco relacionados ao dos produtores rurais, tivemos nos últimos
setor de produção primária. anos a instituição dos Fiagros (Fundos
de Investimento nas Cadeias Produtivas
Em estudo conduzido pela Confederação Agroindustriais). Essa modalidade possibilita
da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), foi o aumento da escala e da sustentabilidade do
analisado o funding do financiamento do agronegócio, além de exigir do setor melhores
setor agropecuário em 2021, o qual se encon- práticas voltadas à governança administrativa.
tra distribuído em: 36% de recursos de institui-
ções financeiras; 36% de recursos dos próprios Embora o setor venha incorporando novos
produtores; e 28% de traders, distribuidoras, mecanismos de governança, o mercado de
cooperativas e mercado financeiro. Há algum crédito rural ainda precisa de atualizações,
tempo, as instituições financeiras têm redu- com a finalidade de tornar o ambiente de
zido o percentual de participação no crédito negócios mais atrativo e moderno para
rural, em especial com os recursos oriundos os investidores. Para isso, são necessárias
do plano safra. adequações legais e normativas que tornem
todas as etapas de concessão de crédito
A expansão que a agropecuária brasileira al- menos burocráticas e mais ágeis. Para
cançou na última década não foi acompanha- isso, a participação de todos os envolvidos
da pela oferta do crédito rural oficial. Entre- no processo é de grande importância,
tanto, mesmo com a redução da participação possibilitando uma estrutura moderna e
do funding, esses recursos balizam as taxas eficiente na oferta dos serviços de crédito.
e os prazos do mercado, favorecendo, ainda,
pequenos e médios produtores com linhas Nesse sentido, as propostas apresentadas
específicas e fomentando sistemas produtivos visam diversificar o funding do crédito rural,
mais sustentáveis. dar maior eficiência aos recursos utilizados no
crédito rural oficial, bem como fortalecer os
Além da eficiente distribuição dos recursos mecanismos de gestão de riscos da atividade
públicos, é necessário criar um ambiente favo- agropecuária.
rável para o crescimento do funding privado,
de modo que essas fontes sejam disponibiliza- a. Ampliar e diversificar as fontes
das com custos e prazos adequados à neces- de financiamento para o agro
sidade do setor. E, a longo prazo, possibilitem
ainda a transferência dos recursos públicos A expansão da produção agropecuária, devido
para a gestão de riscos e linhas de investimen- às novas tecnologias, ao manejo adequado e
tos voltadas a pequenos produtores. Desse às cultivares melhoradas, não foi acompanha-
modo, a agropecuária teria o suporte neces- da pela oferta de recursos ao crédito rural com
sário para o fomento financeiro da atividade e origem de recursos oficiais, demandando,
o acesso facilitado a instrumentos de gestão assim, mais recursos próprios ou fomentando

44 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


as operações realizadas por meio de troca de demonstrando carência por instrumentos,
insumos e produtos agropecuários. Os ins- públicos e privados, que financiem a armaze-
trumentos de operacionalização da política nagem no Brasil.
agrícola brasileira precisam ser aperfeiçoados
à evolução técnica, gerencial e contratual por As Fintechs, as Startups, além do sistema
meio da qual a economia vem passando. Open Finance, são soluções financeiras ao
agronegócio que vêm ganhando espaço e
As finanças verdes e o mercado de carbono, devem ser impulsionadas nos próximos anos.
por exemplo, são tendências que precisam A contratação de crédito menos burocrática,
de uma efetiva incorporação a esse meio, a capilaridade via tecnologia e a disponibilida-
viabilizando, desse modo, que os produto- de de soluções financeiras e de instrumentos
res obtenham certificações, acessem esses de gerenciamento de riscos das atividades
recursos e possam agregar valor a seus pro- agropecuárias se fazem necessárias para que
dutos. A expansão da produção de grãos nas condições de financiamento e taxas de segu-
diversas regiões e a falta de investimentos em ro sejam diferenciadas e adequadas à realida-
infraestrutura fizeram com que o déficit de de de cada produtor.
armazenagem aumentasse nos últimos anos,

PROPOSTAS agronegócio, por meio das Fintechs, por


exemplo;
• Fomentar a criação de novos produtos
financeiros, como fundos e títulos de • Fortalecer o uso do Open Finance
investimentos voltados especificamente (Open Banking + Open Insurance) nas
ao setor rural. Esse fomento deve passar instituições financeiras e nas seguradoras,
por uma maior proximidade entre o desde que autorizados pelos clientes;
mercado financeiro, investidores em geral
e atores do setor agropecuário; • Adequar as linhas de financiamento
rural para construção de armazenagem
• Elaborar mecanismos para os produtores e inovações ambientais, sendo que essa
rurais ampliarem o acesso às inovações adequação deve ser realizada por meio
sustentáveis e finanças verdes, como de avaliações de prazos, condições de
promover o mercado voluntário de pagamento e itens financiáveis; e
pagamentos pela prestação de serviços
ambientais, por meio da CPR Verde; • Aproximar as instituições privadas de
crédito à agricultura familiar, hoje quase
• Incentivar novos modelos de negócios inteiramente fomentada apenas pelos
no Sistema Financeiro Nacional de modo recursos públicos do Plano Safra.
a operacionalizarem o financiamento ao

45
b. Melhorar o ambiente de negócios para para aprimorar o ambiente de negócios,
o crédito rural geram distorções na alocação de recursos da
política pública e tornam o processo moroso
O setor agropecuário carece de instrumen- e caro.
tos céleres, baratos e efetivos que facilitem o
acesso ao crédito rural. As garantias desempe- Quando se trata da ampliação da oferta de
nham papel crucial na concessão de crédito, financiamento, o setor agropecuário esbarra
visto que, devido à segurança fornecida, quan- na regulação prudencial brasileira. Essa
to mais sólidas menor será o custo do crédito. regulamentação não possui critérios para a
O fato é que algumas garantias não estão “carteira de crédito agro”, sendo aplicados
sendo utilizadas pelas instituições financeiras, Fatores de Ponderação de Risco (FPR) gerais e
e outras não viabilizam o oferecimento de ga- que não condizem com o seu real risco. Cabe
rantia proporcional ao financiamento tomado. destacar que a concessão de garantias reais,
combinada ao mercado de seguros rurais e
Os custos intrínsecos, como taxas, custos à possibilidade de se utilizar monitoramento
administrativos e tributários, custos de remoto das propriedades, demonstra que
registro da cédula e das garantias em cartório, o risco da carteira agro no Brasil é inferior
custo de seguros não vinculados à atividade àquela hoje vigente na regulação prudencial
agropecuária, entre outros, são excessivos e definida pelo Banco Central e aplicada às
desproporcionais. Além de não contribuem instituições financeiras.

PROPOSTAS • Discutir alterações na legislação que


diminuam a disparidade de valores
• Ajustar a regulação prudencial para entre as unidades da federação e evitem
a carteira agro, adequando o seu a cobrança de emolumentos que não
provisionamento, considerando fatores de correspondam ao custo efetivo da
ponderação e mitigadores de risco, como atividade; e
seguros e garantias, de modo a aumentar
a base de crédito para o setor; • Aprimorar medidas que coibiam a venda
casada, penalizem as instituições cujas
• Definir em lei novos instrumentos de práticas forem consideradas abusivas
garantias para financiamentos rurais, por e tragam transparência em relação aos
exemplo, a criação da Alienação Fiduciária custos administrativos cobrados nos
Parcial e a regulamentação da Alienação financiamentos.
Fiduciária e Hipoteca guarda-chuva;

c. Gestão de riscos climáticas e das oscilações desfavoráveis de


preços, de modo a se manter na atividade
A adoção de instrumentos de gestão de rural. Para mitigar as perdas decorrentes de
riscos nas atividades agropecuárias auxilia riscos climáticos, os produtores contam com
o produtor a se proteger das adversidades o apoio do governo por meio do Programa de

46 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) e indenizações aos produtores rurais; até maio
do Programa de Garantia da Atividade Agro- de 2022, o valor pago chegou a R$ 6,7 bilhões,
pecuária (Proagro). Para mitigar os riscos com o que demonstra a importância dessa política
volatilidade nos preços, os produtores podem como mitigador de risco para o setor.
recorrer ao mercado de opções.
O Programa de Subvenção ao Prêmio de Se-
Entre 2018 e 2021, a área segurada pelo PSR guro Rural (PSR) é um dos pilares da política
aumentou 204%, demonstrando que a política agrícola brasileira, mas possui reduzida pre-
de subvenção ao seguro rural vem ganhando visão orçamentária, sendo, com frequência,
importância nas propriedades rurais. Em 2021, prejudicado pelos cortes orçamentários. Além
mais de 120 mil produtores foram beneficia- disso, o mercado de opções de venda e com-
dos pelo PSR, que atendeu uma área de 14 mi- pra não é subvencionado, e não há fundos
lhões de hectares. A cobertura por parte dos que equalizem, estabilizem e sejam acionados
seguros rurais foi extremamente importante, para recuperar as seguradoras das perdas
especialmente pelo fato das adversidades em caso de eventos climáticos severos. Tais
climáticas ocorridas no centro-sul do país. Ao pontos evidenciam a necessidade de serem
longo de 2021, foram pagos R$ 5,4 bilhões em reforçadas as fontes orçamentárias e criados
novos mecanismos de securitização.

PROPOSTAS • Regulamentar o Fundo Catástrofe e


revisar o Fundo de Estabilidade do Seguro
• Adotar gradativamente incentivos para os Rural (FESR); e
produtores que contratarem seguro rural
ou adotarem instrumentos para proteção • Aprimorar os produtos de seguro rural
de riscos de mercado, por meio de acesso como forma de ampliar a gama de
diferenciado e em condições especiais, atividades cobertas. Por exemplo, a
como, por exemplo, limite de crédito cultura da mandioca possui apenas
ampliado e taxas de juros reduzidas; a cobertura do Proagro. Diante dessa
limitação, o fomento à inovação, pesquisa
• Melhorar a previsibilidade orçamentária e tecnologia é fundamental para ampliar
do PSR, tornando a execução dos recursos a cobertura das cadeias agropecuárias,
destinados ao seguro rural obrigatórios na reduzindo, assim, o risco global das
lei orçamentária anual; seguradoras.

• Fortalecer o mercado de opção, criando


um programa de subvenção ao prêmio de
contratos de opção de venda da B3;

47
2.5. DESENVOLVIMENTO REGIONAL a desigualdade de renda e a emigração desor-
denada, fomentando encadeamentos produ-
O Brasil é um país de dimensões continentais tivos sustentáveis, elementos fundamentais
e que apresenta diferenças profundas entre as para viabilizar avanços mais significativos da
suas regiões geográficas e até mesmo dentro economia nacional.
de uma mesma região. Diante disso, o país
busca endereçar formalmente a questão das Entre os instrumentos de promoção ao de-
desigualdades intra e inter-regionais desde a senvolvimento regional, destaca-se o incen-
Constituição de 1937 (art. 32), passando pela tivo à atividade produtiva nas regiões mais
Constituição de 1946 (arts. 198 e 199) e a Cons- deprimidas. O Brasil é reconhecidamente
tituição de 1967 (art. 8º). um país que enfrenta inúmeros obstáculos,
que atrasam o seu crescimento, o chamado
Esses dispositivos constitucionais constituem “Custo Brasil”. No caso das regiões menos
o embrião normativo dos atuais Fundos Cons- desenvolvidas, além desses gargalos – que
titucionais do Norte (FNO), do Nordeste (FNE) incluem o alto custo do crédito, insegurança
e do Centro-Oeste (FCO), inseridos na Cons- jurídica e burocracia excessiva –, há outras
tituição Federal de 1988, e da Política Nacio- muitas limitações relacionadas ao colossal
nal de Desenvolvimento Regional I (Decreto déficit de infraestrutura e logística e serviços
6.047/2007) e Política Nacional de Desenvol- públicos de pior qualidade, sobretudo educa-
vimento Regional II (Decreto 9.810/2019), bem ção, saúde, saneamento básico e segurança
como do Plano Regional de Desenvolvimento pública, que impactam a qualidade de vida
da Amazônia (PRDA), Plano Regional do De- da população, com repercussões sobre a pro-
senvolvimento do Nordeste (PRDNE) e Plano dutividade do trabalho e a competividade do
Regional de Desenvolvimento do Centro-Oes- setor produtivo.
te (PRDCO) estabelecidos de acordo com a Lei
Complementar 124/2007, Lei Complementar Em razão disso, o Estado faz uso de instru-
125/2007 e Lei Complementar 129/2009, res- mentos financeiros e fiscais, no seu papel
pectivamente. de indutor do desenvolvimento regional, na
busca por atrair atividades produtivas, que
Todo esse arcabouço normativo demons- procuram aproveitar as vocações locais e/
tra o empenho público no cumprimento do ou incentivar a instalação e modernização
preceito constitucional de redução das desi- da atividade econômica, contribuindo para a
gualdades regionais. E não poderia ser dife- melhora na qualidade de vida e bem-estar da
rente, levando-se em conta ser um objetivo população. Adicionalmente, as políticas regio-
fundamental da República. Mas a busca pelo nais inibem a exploração de atividades que
desenvolvimento das regiões mais deprimidas impactam negativamente o meio ambiente,
do país não deve ser considerada uma política assim como também a decisão de emigração
com efeitos exclusivamente locais. A mitiga- inter-regional motivada pela falta de oportu-
ção de desigualdades socioeconômicas é um nidades locais – isso porque a desigualdade
dos principais pilares capazes de viabilizar o induz a uma movimentação populacional em
crescimento robusto e sustentado de todo o direção a espaços mais dinâmicos, agravando
Brasil. Isso ocorre porque, apesar do foco re- o fenômeno da megametropolização, com
gional, tais políticas trazem benefícios sistêmi- todas as suas consequências de favelização,
cos, na medida em que combatem a pobreza, pobreza e violência.

48 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


Não resta dúvida, portanto, de que esses inviabilizada. Ademais, ressalte-se
incentivos são imprescindíveis dado o papel novamente que o abandono a essas políticas
fundamental na mitigação dos desequilíbrios seria uma afronta à própria Constituição
regionais. Não obstante, eles não têm o poder Federal de 1988. Portanto, a manutenção
de mudar de forma definitiva as diferenças dessas políticas precisa ser considerada
socioeconômicas regionais do país, inclusive na perspectiva de seus objetivos, sendo
pela limitação de recursos disponibilizados mantidas até que o equilíbrio seja alcançado.
para esse fim. Os gargalos são estruturais e
profundos e somente serão resolvidos por Não menos importante é o papel na go-
meio de expressivo e contínuo investimento vernança desses incentivos. As políticas de
público em infraestrutura e logística, em desenvolvimento regional, assim como os
educação e capacitação da mão de obra e demais gastos públicos, devem ser revisitadas
outros serviços que afetam e, muitas vezes, a fim de se garantir a maior eficiência possível
determinam a atratividade e a manutenção nos seus resultados, além da reformulação e
da atividade, do investimento privado, bem do fortalecimento das instituições que se de-
como a geração de emprego e renda. dicam a esse fim, como é o caso das Superin-
tendências do Desenvolvimento da Amazônia
Assim, espera-se que, paralelamente às polí- (Sudam), do Nordeste (Sudene) e do Centro-
ticas de desenvolvimento regional, o Estado -Oeste (Sudeco).
cumpra o seu papel no direcionamento de
investimento público robusto em capital Assim, também é de suma importância o
humano, em serviços públicos e na infraestru- aperfeiçoamento da gestão das políticas
tura e logística capazes de criar um ambiente regionais. A busca por uma orientação
de negócios competitivo, além de um eficien- estratégica sistêmica, com mecanismos de
te escoamento da produção até o mercado articulação e coordenação estruturados,
consumidor. Com isso, os indicadores socioe- capazes de assegurar a sinergia e a
conômicos das regiões menos desenvolvidas, complementariedade de programas e projetos,
parâmetro para mensuração dos desequilí- e com o fortalecimento da governança são
brios regionais, irão convergir à média nacio- primordiais. Nesse sentido, é necessário um
nal, momento em que os incentivos fiscais e acompanhamento mais estrito – com ações
financeiros não serão mais necessários. de planejamento, monitoramento e avaliação
– das políticas regionais a fim de buscar maior
Na ausência desse investimento público efetividade desses benefícios enquanto se
massivo, e até que aconteça, faz-se ainda fizerem necessários.
necessária a manutenção dos incentivos
à atividade econômica em áreas menos Trata-se de um projeto inadiável e de impor-
desenvolvidas – isso porque a ausência tância ímpar. Quanto mais distante se coloca
de políticas públicas de redução dos a priorização das políticas de desenvolvimento
desequilíbrios regionais poderia significar regional e os investimentos públicos essen-
um agravamento/ aprofundamento ainda ciais à transformação estrutural das regiões
maior das disparidades, com o retrocesso mais deprimidas, mais penalizadas são as
de indicadores socioeconômicos. Sem eles, populações residentes e maior número de
a manutenção da atividade produtiva entraves o Brasil enfrenta a seu crescimento e
nessas regiões seria, em grande medida, desenvolvimento nacional.

49
PROPOSTAS 7.827/1989 a fim de estabelecer repasse
mínimo de 10% do Fundo Constitucional
• Facilitar o acesso ao crédito com recur- do Nordeste – FNE às cooperativas
sos dos Fundos Constitucionais visando de crédito à exemplo do Fundo
reduzir custos e trazer tempestividade aos Constitucional do Centro-Oeste – FCO
financiamentos. É necessário revisar as (definido pela Lei 13.682/2018) e do Fundo
condições de operação e de governança Constitucional do Norte – FNO (definido
dos Fundos Constitucionais de Financia- pela Lei 14.227/2021);
mento a fim de diminuir o excesso de
burocracia e os custos de transação dos • Revisar e alterar as regras de repasse dos
financiamentos por meio da simplificação recursos dos Fundos Constitucionais,
das exigibilidades, ampliação do prazo de conferindo maior transparência,
documentos comprobatórios e redução previsibilidade e agilidade ao processo
de tarifas bancárias; de transferência dos recursos, com
impactos sobre a redução do prazo para
• Promover o aumento dos repasses dos a concessão do crédito ao produtor: a
Fundos Constitucionais com o objetivo de avaliação e aprovação do limite de crédito,
ampliar a rede de instituições financeiras bem como o prazo para o efetivo repasse
que ofertam o recurso ao produtor. O dos recursos financeiros dos Fundos
aumento da capilaridade de agentes Constitucionais a outras instituições
financeiros que operacionalizam os financeiras, inclusive cooperativas de
recursos dos Fundos Constitucionais crédito, ficam a critério dos respectivos
tem o forte potencial de promover a bancos administradores. Dadas a
melhoria das condições de acesso a demanda e a capacidade de solvência
esse crédito, principalmente nas regiões de instituições financeiras interessadas
Norte e Nordeste, onde as distâncias e a em operacionalizar recursos dos Fundos,
dificuldade de locomoção são entraves é necessária uma revisão das regras de
determinantes. A ampliação do repasse avaliação do limite de crédito, bem como
a instituições financeiras autorizadas a a definição de um prazo de resposta
funcionar pelo Banco Central do Brasil para dar previsibilidade e celeridade ao
mitigaria esse gargalo, aproximando o repasse. Essas alterações irão viabilizar
crédito ao produtor rural; o atendimento mais tempestivo a
financiamentos destinados ao setor rural;
• Determinar repasse mínimo do Fundo
Constitucional do Nordeste a cooperativas • Promover a repactuação de dívidas com
de crédito ampliando o acesso a os Fundos Constitucionais oriundas
esses recursos a localidades onde as de operação de crédito com risco
cooperativas são os únicos agentes exclusivo da instituição financeira dando
financeiros instalados. Também com condições equivalentes às oferecidas
o intuito de aumentar a capilaridade pela Lei 14.166/2021 aos produtores
e facilitar o acesso ao crédito, faz-se não contemplados pela norma legal:
necessário alterar o artigo 9°, § 3°, da Lei em junho de 2021, foi publicada a Lei

50 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


14.166 autorizando a renegociação tor tenha tempo para reestruturar suas
extraordinária de dívidas rurais e não atividades e finanças, evitando, assim,
rurais com os Fundos Constitucionais. A a pressão por uma renegociação mais
autorização, no entanto, não permite a abrangente no futuro;
adesão de contratos que tenham origem
em operações de crédito de risco integral • Mapear e solucionar os gargalos que
do banco administrador ou em operações travam a utilização dos Fundos de De-
de repasse para outras instituições senvolvimento Regional, assegurando a
financeiras. Essa restrição impacta aplicação de seus recursos financeiros
particularmente as operações contratadas em projetos de investimentos: os Fundos
com o Fundo Constitucional do Centro- de Desenvolvimento da Amazônia (FDA),
Oeste (FCO), já que, a partir de 1º de julho do Nordeste (FDNE) e do Centro-Oeste
de 2001, o risco de crédito de operações (FDCO) têm por finalidade o financiamen-
com o FCO contratadas com o Banco do to de projetos de investimentos em infra-
Brasil passou a ser exclusivo do banco. estrutura e serviços públicos e em ativi-
Diante dessa exclusão, é necessário dades produtivas com grande capacidade
se buscar uma solução urgente, que germinativa de negócios, com destaque
oportunize condições semelhantes às para agricultura e agroindústria. Apesar
oferecidas pela Lei 14.166/2021 visando de serem considerados um dos principais
oferecer o tratamento isonômico a instrumentos de desenvolvimento regio-
todos os mutuários que contrataram nal, segundo a própria Política Nacional
financiamentos com recursos dos fundos; de Desenvolvimento Regional (PNDR), há
anos esses fundos não recebem novos
• Facilitar o processo de prorrogação de recursos orçamentários. Ademais, são
dívidas com os Fundos Constitucionais subutilizados, pois há baixo interesse na
por meio da inclusão no MCR de permis- sua operacionalização em razão da taxa
são para o alongamento das operações de administração, considerada baixa pelas
de crédito rural com recursos dos fundos: instituições financeiras em razão do risco
incluir a permissão para prorrogação de integral da operação de crédito. Nesse
financiamentos de dívidas rurais com sentido, é fundamental a reavaliação dos
recursos dos Fundos Constitucionais no seus critérios de operacionalização, in-
Manual de Crédito Rural (MCR). A autori- cluindo a revisão da taxa de administra-
zação da aplicação das regras do MCR aos ção e do compartilhamento de risco do
fundos facilitará a renegociação de dívi- crédito, além da permissão e incentivo ao
das do setor rural em caso de prejuízos repasse desses recursos à outras institui-
causados por eventos adversos, em que ções financeiras;
a repactuação precisa ser feita de forma
tempestiva, pois o produtor se encontra • Ampliar e modernizar os sistemas de in-
temporariamente com a sua capacidade fraestrutura e logística das regiões me-
de pagamento comprometida. A medida nos desenvolvidas mitigando os gargalos
não implica qualquer prejuízo ao patrimô- que reduzem a competitividade do setor
nio dos Fundos, permitindo que o produ- produtivo nessas regiões: a infraestrutura

51
e logística são bases fundamentais para a uma política que deve ser incentivada e
alavancagem do crescimento econômico. difundida, considerados os seus efeitos
Quando precárias, como no caso das re- transformadores sobre as realidades
giões menos desenvolvidas, traduzem-se locais; e
em custos e ineficiências que impactam
a competividade do setor produtivo e as • Fomentar a inovação nas regiões
decisões de investimento. Por essa razão, menos desenvolvidas, promovendo
encontra-se entre as principais priori- o desenvolvimento tecnológico e
dades para a redução das disparidades viabilizando a sua incorporação pelo
regionais. Assim, é preciso robustecer setor produtivo, com impactos sobre a
e revisar os instrumentos de incentivos produtividade da atividade econômica
financeiros disponíveis (Fundos de Desen- local: a inovação é considerada um
volvimento Regional – FDA, FDNE e FDCO dos temas fundamentais para o
e Fundo de Desenvolvimento da Infra- desenvolvimento econômico, estando
estrutura Regional Sustentável – FDIRS) diretamente relacionado ao aumento da
para essa finalidade, de modo a promover produtividade e da competitividade do
a integração territorial, proporcionando o setor produtivo. No setor rural, a utilização
escoamento da produção, a mobilidade de pacotes tecnológicos (conectividade,
da população e a atração de investimento rastreabilidade, biotecnologia, sistemas
privado; de gestão, entre outros) são inovações
disruptivas de processos, com impactos
• (Re)estruturar Arranjos Produtivos expressivos sobre a produtividade. O
Locais (APLs) capazes de alavancar o tema precisa, portanto, ser considerado
crescimento econômico regional por da perspectiva do desenvolvimento
meio da especialização produtiva, regional, na medida em que pode
considerando as vocações locais: os APLs acelerar o processo de crescimento e
são aglomerados de agentes econômicos, desenvolvimento das regiões menos
localizados em um mesmo território, desenvolvidas. Do ponto de vista regional,
operando em atividades correlacionadas o grande instrumento de apoio à inovação
e que apresentam vínculos expressivos de é a linha de financiamento dos Fundos
articulação, cooperação e aprendizagem. Constitucionais destinada à inovação em
Os arranjos visam identificar e explorar produtos, serviços, processos e métodos
potencialidades e vocações locais, organizacionais em empreendimentos
além de obter ganhos de escala por rurais e não rurais, mas que
meio da organização dos processos tradicionalmente têm um desembolso
produtivos e de comercialização. Esse relativamente baixo. Diante disso, faz-
modelo de fomento pode promover e se necessária uma revisão dos critérios
incentivar ainda mais cadeias produtivas de concessão, bem como o incentivo à
capazes de promover a inclusão social utilização dessa linha para a promoção
e o desenvolvimento sustentável das de sistemas produtivos mais eficientes e
regiões mais deprimidas. Dessa forma, é resilientes.

52 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


53
Desenvolvimento
3
Social

54 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


3. DESENVOLVIMENTO SOCIAL

A promoção do desenvolvimento social Além do papel que as propostas relacionadas


correlaciona-se, sobremaneira, com o à educação terão para a preparação para
desenvolvimento econômico e se apresenta o mercado de trabalho, o texto elenca, no
em elevado patamar de prioridade como âmbito do emprego, também iniciativas
agente de promoção da dignidade regulatórias que precisam ser consideradas,
humana. A complexidade que acompanha como a manutenção das medidas adotadas
a progressão de uma sociedade não está na reforma trabalhista e os aprimoramentos
relacionada apenas à estrutura material de normativos infralegais, que garantem
necessária ao seu funcionamento; ela em concomitância a segurança jurídica, o
abarca, principalmente, o aprendizado e desenvolvimento econômico e a promoção
a preparação das pessoas para a vida em do trabalho decente.
meio social, vinculando-se à construção e
à observância das regras que determinada Em conjunto com as ações de promoção da
sociedade estabelece como base para a qualidade de vida como saúde, educação e
convivência social. emprego, enumeram-se também no texto a
seguir iniciativas a serem levadas em conta
Para isso, neste capítulo, as propostas de pelo próximo governo no que se refere
ascensão do desenvolvimento social estão à segurança pública e à manutenção da
ancoradas à melhoria dos serviços e da re- ordem. Entre elas, encontram-se prioridades
gulação do Estado no que se refere a saúde, de níveis político, estratégico e operacional,
educação, emprego e segurança pública. com a formulação de políticas públicas que
envolvam os órgãos de segurança pública, o
Quanto à saúde, as propostas visam garantir sistema penitenciário, o Sistema Judiciário e
que as pessoas, independente de condição o Poder Legislativo.
social e renda, tenham acesso aos serviços
por meio da inovação e da ampliação da Em suma, as propostas apresentadas
eficiência de aplicação dos recursos públicos. exigem atuação política permanente, com
a participação da sociedade e dos poderes
No que tange à educação, as sugestões constituídos do Estado.
buscam atuar desde o saneamento do déficit
educacional crônico do país, bem como al- 3.1. SAÚDE
mejam inovar no aprimoramento da qualida-
de do ensino, em consonância com o desen- O Estado brasileiro, em todas as suas esferas,
volvimento tecnológico vivenciado no Brasil deve assegurar regras estáveis para o bom
e no mundo. Assim, lança-se mão de instru- funcionamento do setor de saúde, visto
mentos que objetivam sua popularização e este ser um serviço público básico e um
seu acesso por todas as pessoas, a despeito direito social estabelecido pela Constituição
de sexo, idade, raça e etnia. Federal. Os bons resultados nessa área são

55
fundamentais para garantir condições para a e privado certamente foram ganhos
sobrevivência e o desenvolvimento de todos significativos que tivemos nesse período.
os cidadãos. Temos certeza de que a sociedade brasileira,
assim como soube se unir para enfrentar
No Brasil, temos o Sistema Único de Saúde, a covid-19, saberá, democraticamente,
conhecido como SUS, que nasceu com a encontrar os caminhos, junto aos nossos
Nova República e que é uma construção governantes, para levar assistência à saúde
da sociedade. Atualmente, o SUS é de qualidade a todos os nossos cidadãos.
reconhecido como o maior sistema público
de saúde do mundo. Sua manutenção e Em 2020, a Lei 13.989/2020 autorizou o uso
seu aperfeiçoamento são uma exigência da telemedicina durante a crise ocasionada
da sociedade brasileira e um desafio para pelo novo coronavírus, contando com a
os governos. Com certeza temos muito a aprovação de boa parte dos brasileiros em
melhorar no sistema atual e a debater sobre função da ótima experiência que se teve com
o SUS que queremos para o futuro. tal modalidade.

Garantir que todos, independentemente de Atualmente tramita no Senado Federal o


sua condição social e renda, tenham acesso Projeto de Lei 1.998/2020, já aprovado pela
aos cuidados de saúde faz parte de um Câmara dos Deputados, que propõe alterar
desenvolvimento econômico orientado para a Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990, para
a melhoria da qualidade de vida das pessoas. autorizar e disciplinar a prática da telessaúde
Sabemos que a margem de manobra em todo o território nacional e, também,
orçamentária do governo é limitada, o que revogar a Lei 13.989, de 15 de abril de 2020.
torna fundamental a racionalização dos
custos do sistema de saúde e a promoção da O projeto de lei mencionado considera a
eficiência na prestação desse serviço público. telessaúde como a modalidade de prestação
de serviços de saúde a distância, por meio
Faz-se necessário investir na medicina da utilização de tecnologias da informação
preventiva e na utilização dos recursos da e comunicação, mediante a transmissão
tecnologia digital, o que pode contribuir, a segura de dados e informações de saúde.
longo prazo, para racionalizar os custos do
sistema de saúde. Também, com os avanços É importante que os próximos governantes
na tecnologia médica, podemos ganhar experimentem novas estruturas de prestação
eficiência e equilibrar custos para preparar o de serviços e de gestão da saúde pública,
sistema de saúde para uma população cuja com o objetivo de promover a introdução
expectativa de vida é crescente. de novas tecnologias e novas parcerias na
área da saúde entre indivíduos, organizações
Em quase dois anos de pandemia, pudemos e comunidades sob a liderança dos entes
evoluir em vários pontos em busca do melhor federados. Nesse contexto, por um melhor
atendimento ao cidadão. A telemedicina e sistema de saúde, listamos algumas
o maior estreitamento entre setor público propostas.

56 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS • Manter as isenções sobre insumos e pro-
dutos médicos que contribuam para redu-
• Apoiar a utilização de prontuários eletrô- zir a inflação médica e o peso da saúde no
nicos integrados e ferramentas eletrôni- bolso da população, tal como praticado
cas em gestão de saúde e a criação de em diversos países; 
parâmetros que permitam a comunicação
entre sistemas informatizados (interope- • Impedir o agravamento da carga tributá-
rabilidade) do setor; ria e dos custos trabalhistas que podem
advir das reformas em pauta;
• Regulamentar a telemedicina, com o
objetivo de conferir segurança jurídica à • Manter as conquistas oriundas da reforma
atividade e de preservar os interesses do trabalhista que dinamizaram as relações
consumidor em relação à qualidade do de trabalho, permitindo uma aceleração
atendimento e ao direito de uso pleno das da oferta de empregos no setor; e
redes contratadas;
• Conferir segurança jurídica à atividade e
• Fomentar a inovação e a pesquisa à preservação dos interesses do consu-
em saúde; midor em relação à qualidade do atendi-
mento e ao direito de uso pleno das redes
• Garantir a regularidade da alocação orça- contratadas.
mentária para o funcionamento do siste-
ma público de saúde, buscando eficiência
e sustentabilidade no seu financiamento;

3.2. EDUCAÇÃO a. Educação rural

“Todas as pessoas, independentemente Nos últimos 40 anos, o Brasil saiu da


de sexo, idade, raça, etnia, e pessoas com condição de importador de alimentos para
deficiência, migrantes, povos indígenas, se tornar um grande provedor para o mundo.
crianças e jovens, especialmente aquelas Foram conquistados aumentos significativos
em situações vulneráveis, devem ter acesso na produção e na produtividade
a oportunidades de aprendizagem ao agropecuária. Esses resultados estão
longo da vida que as ajudem a adquirir o diretamente relacionados com investimentos
conhecimento e as habilidades necessárias em pesquisa, assistência técnica, extensão
para aproveitar oportunidades e participar rural, políticas públicas e empreendedorismo.
plenamente na sociedade.” (Agenda 2030 da
Organização das Nações Unidas)

57
Apesar dessa rápida evolução, ainda há gran- Buscar proficiência na alfabetização e em
de desigualdade no campo, tanto no âmbito habilidades básicas para os adultos deve ser
produtivo quanto na geração de renda e, um dos focos do governo para que a inclusão
consequentemente, na qualidade de vida das com igualdade e equidade no mundo do
famílias rurais. Muitos desses produtores não trabalho se torne realidade. Além disso, a
têm condições de adotar novas tecnologias e aprendizagem e a educação de adultos
muitas vezes sequer conseguem ter acesso à devem ser construídas por meio de uma
formação profissional. abordagem holística e intersetorial.

A assistência técnica e a extensão rural Como parte da Agenda 2030 para


têm grande importância no processo de o Desenvolvimento Sustentável, da
educação e desenvolvimento do produtor Organização das Nações Unidas (ONU),
rural e também no crescimento do setor os líderes mundiais prometeram fornecer
produtivo rural. Isto porque suas ações “oportunidades de aprendizagem ao longo
levam consigo as informações sobre novas da vida para todos”, melhorar a alfabetização
tecnologias, inovações, pesquisas, entre de adultos e promover outros conhecimentos
outros conhecimentos fundamentais ao e habilidades essenciais.
desenvolvimento das atividades produtivas.
Monitorar e avaliar a aprendizagem
Por ser o serviço de maior alcance no meio e a educação de adultos são ações
rural, a assistência técnica exerce papel fun- fundamentais, porque a educação e a
damental no desenvolvimento do homem aprendizagem frequentemente ocorrem em
no campo e se firma, cada vez mais, como o espaços não institucionalizado, não formais
principal meio de ligação entre as políticas ou informais, o que pode ser difícil de se
públicas e o setor produtivo rural. A assistên- avaliar com exatidão. Devemos continuar a
cia técnica procura adaptar-se ao novo mo- aumentar a visibilidade da aprendizagem
delo de desenvolvimento sustentável, o qual em todas as formas, bem como monitorar
exige profissionais diferenciados, com conhe- mais de perto a realidade da educação,
cimento a respeito de novas tecnologias, mas gerando dados mais precisos para informar
que também saibam trabalhar com questões os responsáveis pelas tomadas de decisão.
econômicas, gerenciais, sociais, institucionais
e ambientais. A aprendizagem e a educação de adultos
contribuirão para todos os objetivos de
Essa “não condição” é consequência de vários desenvolvimento sustentável apregoados
fatores, como o custo elevado para incorporar pela ONU, desde a luta contra a pobreza até
novas tecnologias, a baixa escolaridade e o combate à degradação ambiental.
a carência no acesso às políticas públicas
direcionadas a perfis específicos de
agricultores, entre outros.

58 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS • Promover assistência técnica e gerencial
como forma de auxiliar o aumento de ren-
• Ampliar o número de cursos técnicos e da e produtividade dos produtores rurais
superiores e de vagas para as áreas rurais; brasileiros, potencialmente dos pequenos
e médios produtores;
• Ampliar a oferta de escolas que tenham
educação integral no campo; • Incentivar a sucessão familiar por meio de
processos educativos e de implementa-
• Ofertar cursos aderentes às tecnologias 4.0; ção de políticas públicas; e

• Construir escolas e universidades que


possam contemplar as populações rurais,
considerando a diversidade dos territórios;

b. Educação profissional técnica de nível Um dos cinco itinerários previstos pela nova
médio e superior legislação é a formação técnica e profissional,
que traz a alternativa para o aluno se
A educação profissional e tecnológica se aprofundar nas competências atuais do
apresenta como possibilidade de futuro para mercado de trabalho do século 21.
os jovens brasileiros, especialmente com o
Novo Ensino Médio, implementado pela Lei Nesse contexto, o desafio diz respeito à
13.415/2017, que alterou a Lei de Diretrizes e variedade de oferta da formação técnica e
Bases da Educação Nacional (LDB). profissional para a realidade do estudante.
Além disso, as unidades federativas
O Novo Ensino Médio traz uma gigantesca implantam a nova regulamentação; contudo,
reestruturação do currículo e do ensino. enfrentam limitações de infraestrutura e de
Enquanto o modelo anterior estava em educadores qualificados para esse fim.
descompasso com a realidade dos jovens
em nosso país, percebido pelo desempenho Os dados publicados em 2020 pela Organi-
escolar estacionário, a reforma se adequa às zação para a Cooperação e Desenvolvimento
novas tendências educacionais, com maior Econômico (OCDE) reforçam que, no Brasil,
integração e flexibilidade curricular e com a os jovens entre 15 e 24 anos que cursam ou
oferta de itinerários formativos. concluíram o ensino médio representam o
menor percentual de alunos na modalidade
A organização da educação do Novo Ensino de formação técnica, 8%, se comparado com
Médio em áreas e itinerários formativos o número de estudantes da mesma faixa etá-
tem o objetivo de engajar o estudante na ria dos países europeus, que alcança patama-
definição do seu projeto de vida, passando res de 60 e 70%. Assim, torna-se necessária a
ele a ter possibilidade de escolha. Dessa oferta de formação técnica qualificada, que
forma, os jovens adquirem protagonismo na incentive o ingresso imediato dos jovens no
formação e na construção de suas carreiras. mercado de trabalho.

59
Além disso, a educação profissional metodologias educacionais que privilegiam a
técnica se apresenta como a primeira vivência prática das atividades produtivas.
etapa de construção de uma carreira
profissional que poderá ser desenvolvida de No que se refere à educação superior, o
maneira contínua. Isto porque ela pode se Censo Agropecuário de 2017 apresentou um
constituir em uma trajetória formativa de quadro preocupante em relação ao nível de
aprendizagem ao longo da vida. escolaridade de um contingente de quase
5,1 milhões de proprietários rurais. Apenas
Segundo a Fundação Getulio Vargas, a 6,2% dos produtores rurais responsáveis pelos
educação profissional e tecnológica é uma estabelecimentos agropecuários têm nível
alternativa para mudar o cenário atual superior. Além dos produtores, o mercado
dos jovens brasileiros. Tem a finalidade de de trabalho agropecuário ocupa mais de 15
preparar para o exercício de profissões, milhões de pessoas diretamente, ou seja,
contribuindo para o cidadão se inserir dentro da porteira, com diferentes oportu-
na sociedade e no mundo do trabalho e nidades entre pequenos, médios e grandes
podendo aproximar o Brasil da modernidade produtores. Todo esse público merece uma
econômica mundial. especial atenção no que se refere ao acesso e
à permanência no ensino superior.
Nesse sentido, destacamos o trabalho do
Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Se- É fundamental que os cursos e as
nar), que oferece formação profissional rural propostas pedagógicas dialoguem
técnica de nível médio a partir da identifica- com as especificidades e a dinâmica da
ção dos novos perfis profissionais e das novas agropecuária brasileira, conforme a própria
competências requisitadas pelo mercado. legislação educacional brasileira preconiza,
pois é essencial, para a concretização de
Os cursos técnicos do Senar são ofertados uma educação profissional, que ela seja
segundo itinerários formativos profissionais, “integrada às diferentes formas de educação,
de acordo com as cadeias produtivas do setor ao trabalho, à ciência e à tecnologia” (art.
agropecuário brasileiro, com certificação 39 da LDB), objetivando o “permanente
intermediária de qualificação e diploma desenvolvimento de aptidões para a vida
de habilitação técnica de nível médio para produtiva” e a capacidade de adaptar-se,
o eixo tecnológico de recursos naturais, o com flexibilidade, ativamente, “às novas
qual permite a continuidade de formação condições de ocupação e aperfeiçoamentos
profissional. posteriores” (art. 35 da LDB).

A formação técnica do Senar pode ser Ou seja, a formação de nível superior para
articulada ao quinto itinerário do ensino o público de produtores e trabalhadores
médio, na forma subsequente, com a rurais deve ser orientada para o
proposta de atuar em parceria com distintas desenvolvimento das cadeias produtivas
instituições de ensino médio regular agroindustriais, integrando-se às dinâmicas
localizadas nas cinco regiões brasileiras. sociais, políticas e mercadológicas do
Para tanto, oferece itinerários formativos agronegócio brasileiro. Nesse âmbito,
do setor rural na modalidade de ensino o avanço e o empenho das políticas
semipresencial, com a utilização de federais com foco no reconhecimento e

60 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


na ampliação dos cursos superiores de metas, através da consolidação e do
tecnologia merecem especial atenção. aumento dos programas de financiamento e
bolsas. Tal feito potencializará ainda mais os
Para a concepção de funcionamento cursos de graduação tecnológica oferecidos
e o avanço dos cursos superiores de por instituições de ensino mantidas pelo
tecnologias, será muito importante conhecer setor privado no Brasil.
as dinâmicas locais, em termos sociais,
ambientais e econômicos, pois somente O processo educacional a distância deve ser
a partir disso será possível construir um reconhecido como centrado no estudante,
conjunto de saberes plenamente alinhados pois ele precisa se reconhecer como prota-
com as necessidades do mercado de gonista de seu processo de ensino-aprendi­
trabalho dos futuros egressos, incluindo zagem. Com o auxílio das tecnologias da
aí as dimensões éticas e profissionais e informação e comunicação, docentes, tutores
desenvolvendo nos alunos as atitudes e os e estudantes mantêm-se sempre conectados
valores orientados para o sucesso. e em constante relacionamento, tendo como
foco, nesse contexto, o desenvolvimento e a
O Catálogo Nacional de Cursos Superiores na profissionalização do agronegócio brasileiro,
área de tecnologia, elaborado pelo Ministério sendo possível, assim, gerar novos conheci-
da Educação, precisa ser constantemente mentos, inovações e tecnologias.
revisitado e discutido com as entidades de
classe dos setores econômicos, associando Em um país essencialmente agrícola e com
a sua oferta a modelos inovadores em dimensões continentais, somente esse
termos de práticas pedagógicas e de modelo é capaz de democratizar o acesso
desenvolvimento de competências técnicas. ao ensino superior, sobretudo de pessoas
ligadas ao agronegócio que, em geral, estão
O Censo da Educação Superior de 2019 con- nas cidades do interior do país e, portanto,
firmou a trajetória de expansão de matrículas distantes de centros de ensino de referência.
em cursos tecnológicos nos últimos anos. Em
2001, foram registradas 69,8 mil matrículas, Diante da capilaridade do sistema CNA/
e, em 2014, o número subiu para 701 mil. Já Senar, será possível alcançar estudantes do
em 2019, foram mais de 820 mil novos ingres- setor rural brasileiro de forma mais atrativa,
santes, sendo que 67% dos ingressantes (550 dinâmica e interativa, de forma que esse
mil) nesse ano optaram pela modalidade de modelo de educação se alinhe com as
educação a distância (EaD). especificidades e as práticas de empresas e
organizações rurais.
A modalidade de EaD se consolidou ainda
mais nos últimos anos, com forte expansão Por fim, existem desafios estruturais que o
após o contexto da pandemia de covid-19. Foi Brasil ainda precisará superar para obter ain-
nesse arranjo que o país também reforçou da mais conquistas no campo da educação
de forma expressa, em suas políticas públicas profissional de nível superior, sobretudo na
e suas estratégias de instituições de ensino, modalidade EaD, quais sejam: melhoria da
o fundamental objetivo de aumentar qualidade do ensino básico, fundamental e
significativamente as taxas de escolaridade médio; ampliação e diversificação de incen-
no ensino superior para cumprir diferentes tivos para pequenas e novas instituições de

61
ensino; aperfeiçoamento dos instrumentos EaD; e, principalmente, revisão do conteúdo
de avaliação do Ministério da Educação relacionado à evolução do agro brasileiro
sobre os cursos ofertados na modalidade nas escolas.

PROPOSTAS municípios com o setor agro em estado


pujante e/ou em potencial;
• Implantar programa nacional de expan-
são da educação profissional que tenha • Institucionalizar em lei a Portaria 193, de
metas de empregabilidade, com gestão 16 de junho de 2020, do Mapa, que institui
interministerial e com representantes dos o Programa de Residência Profissional
Ministérios da Economia, da Agricultura, Agrícola, destinado a qualificar jovens
da Ciência e Tecnologia, da Saúde, do Tra- estudantes e recém-egressos dos cursos
balho e da Educação; de ciências agrárias e afins;

• Ampliar e fortalecer parceria do Estado • Atualizar e aperfeiçoar os instrumentos


com instituições de formação profissional do Ministério da Educação de avaliação de
a fim de ampliar a qualificação da cate- cursos superiores em tecnologia, oferta-
goria, bem como a fim de atender o 5º dos na modalidade EaD;
itinerário formativo do ensino médio no
setor rural, na forma subsequente e • Ampliar a conectividade nas áreas rurais; e
semipresencial;
• Revisar o conteúdo dos livros didáticos
• Criar programa interministerial com parti- das escolas no que se refere à história e
cipação de instituições de ensino públicas à evolução do agro brasileiro, bem como
e privadas e de empresas de telecomuni- outros temas que vão na contramão da
cações, visando à ampliação da oferta de ciência. O material pedagógico deve ser
cursos técnicos e superiores em polos de isento de visão ideológica e basear-se
excelência, dotados de adequada infra- em ciência e fontes oficiais que transmi-
estrutura e conectividade, localizados em tam credibilidade.

3.3. EMPREGO das estatísticas de desemprego aberto,


nosso mercado de trabalho apresenta
O Brasil convive há muito tempo com taxas outras características que configuram
de desemprego muito elevadas, quando sérios problemas sociais, como o grau
comparadas às taxas internacionais. Nos de informalidade entre a população
anos recentes, em 2012, a taxa era de 6,90%, empregada – que gira regularmente
tendo chegado a 14,9% em 2021, em meio em torno de 40%, ou seja, 36 milhões de
à restrição a determinadas atividades trabalhadores – e a forte concentração
econômicas pela pandemia. Atualmente, de empregos nos estratos de mais
a taxa de desemprego está em 9,8%. Além baixos salários.

62 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


A principal causa para o desemprego e de competitividade das nossas empresas e
a informalidade é o baixo crescimento mantermos as taxas de desocupação muito
da economia brasileira, que se estende elevadas. A recente reforma trabalhista,
desde a década de 1980 do século aprovada pelo Governo Temer, mostrou o
passado. Independentemente do grau de impacto positivo de uma racionalização
progresso tecnológico, em condições de legislativa. Nosso ponto de vista é de que
baixo crescimento, a economia não cria os essa reforma tem que ser mantida e ainda
empregos necessários para abrigar toda a aprofundada, pois muitos aspectos da nossa
população ativa e disposta a trabalhar. Desse regulação foram concebidos para um tempo
modo, a principal política de emprego é a que não existe mais.
política de crescimento. Por uma série de
razões – grande parte delas de natureza O terceiro ponto para uma política de
política –, o Brasil vem crescendo pouco emprego atual é a qualificação dos
e de forma irregular há mais de 40 anos. trabalhadores às exigências de determinadas
Embora, numa economia de livre mercado, competências que são impulsionadas
o principal ator do crescimento seja a pelas constantes mudanças tecnológicas.
iniciativa privada, não temos dúvidas de que A economia contemporânea é totalmente
a quebra da estagnação duradoura precisa orientada para economizar trabalho
da decisão e da liderança do Estado, seja por humano, criando muitos empregos de alta
meio da promoção de reformas econômicas qualificação e altos salários e deixando
estruturantes, seja pela realização de de fora a maioria da população. Isto é um
investimentos estratégicos que elevem a grave problema nos países desenvolvidos e
produtividade da economia. Nesse sentido, adquire traços muito mais dramáticos em
reafirmamos a convicção de que o próximo nações como o Brasil, impactando inclusive a
governo precisa se empenhar numa série produção rural.
de reformas legislativas para destravar o
funcionamento da economia e assumir um Nossa população apresenta graves déficits
objetivo claro pela busca do crescimento educacionais, em comparação com os países
elevado do país. mais desenvolvidos, conforme atestam os
inúmeros exames e relatórios internacionais
Outro fator determinante para a expansão que são divulgados regularmente.
da oferta de empregos é o ambiente Investimentos maciços em educação
institucional que regula o mundo do integral, com viés profissionalizante, são a
trabalho. As leis brasileiras do trabalho melhor maneira de promoção social das
foram estabelecidas num tempo em que populações pobres e um modo de inserir a
as condições da economia e da sociedade maioria de nossos jovens numa economia
eram muito diferentes das atuais. As moderna. À falta disso, criaremos dois Brasis
mudanças demográficas, culturais e cada vez mais diferentes e separados, o que é
tecnológicas que ocorreram em todo o uma ameaça à harmonia social.
mundo – e também no Brasil – exigem que
sejam realizadas modificações profundas O Estado brasileiro e suas instituições
na regulação do mercado de trabalho, sob políticas precisam se compenetrar
pena de comprometermos as condições dessas realidades.

63
PROPOSTAS • Manter a reforma trabalhista e constante
busca pela modernização das leis traba-
• Implementar política estruturada de lhistas; e
crescimento econômico, que passa pelas
reformas que o país precisa realizar (políti- • Desenvolver programas robustos de qua-
ca, administrativa e tributária), bem como lificação da mão de obra, adequando a
aplicação de investimentos em aumento formação e a capacitação às constantes
da produtividade da economia nacional; mudanças tecnológicas e exigências de
mercado.

a. Reforma trabalhista rural O referido Projeto de Lei 6442, de 8


de novembro de 2016, institui normas
A Lei da Reforma Trabalhista – Lei 13.467, de reguladoras do trabalho rural, revogando a
13 de julho de 2017 – modernizou as relações Lei 5.889, de 8 de junho de 1973, e a Portaria
de trabalho regidas pela Consolidação das 86/2005, do Ministério do Trabalho. São
Leis do Trabalho (CLT). buscadas, por conseguinte, a atualização e a
dinamização das relações de trabalho rural,
Foram perceptíveis os ganhos da sociedade visando à competitividade internacional do
com modalidades de trabalho dinâmicas e agronegócio, que, há muito, tem sido o pilar
modernas, como o teletrabalho e o contrato da economia brasileira.
de trabalho intermitente, além de restar au-
torizado o fracionamento das férias de acor-
do com as necessidades do mundo hodierno.
PROPOSTA
Outrossim, prestigiaram-se as negociações
coletivas, extinguiu-se o pagamento (dispen-
• Apoiar a aprovação da reforma traba-
dioso e descabido) das horas in itinere e se
lhista rural (PL 6442/2016).
desestimulou a litigância abusiva no âmbito
da Justiça do Trabalho, que tanto onerava o
setor econômico e o Estado.
b. Conceituação do trabalho em condições
No entanto, as modificações são apenas análogas às de escravo
reflexas no campo, haja vista que o trabalho
rural é regulamentado pela Lei 5.889, de 8 A Lei 10.803, de 11 de dezembro de 2003, que
de junho de 1973, com aplicação meramente tipificou a condição de trabalho análogo
subsidiária da CLT. Destarte, urge modernizar à de escravo no Código Penal, provocou
a relação de trabalho no campo. no âmbito do setor rural um clima de
instabilidade e incerteza, pois se criou um
Dessa forma, é preciso concretizar a reforma conceito impreciso. Não se pode identificar,
trabalhista rural, mediante o apoio à com clareza, uma situação de condição
aprovação do Projeto de Lei 6442/2016. análoga à de escravo, em razão da excessiva

64 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


subjetividade dos termos “jornada exaustiva” Constitucional 81, de 5 de junho de 2014.
e “trabalho degradante”. Todavia, o setor alimenta a esperança de
uma regulamentação mais justa e objetiva
Esse ambiente de insegurança foi intensifica- no Projeto de Lei do Senado 432/2013, que
do com a publicação da Instrução Normativa definirá a exploração de trabalho escravo
139/2018, da Secretaria de Inspeção do Traba- para fins de expropriação, prevista no art. 243
lho do Ministério do Trabalho, que normati- da Constituição Federal.
zou o procedimento fiscalizatório em relação
à matéria, utilizando os mesmos termos Outrossim, é preciso reformular o processo
(“jornada exaustiva” e “trabalho degradante”) de inclusão de empregadores na popular-
como critérios e ampliando ainda mais sua mente denominada “lista suja do trabalho
subjetividade, permitindo, ainda, a autuação escravo”, de forma a garantir a ampla defesa
pelo auditor fiscal do trabalho conforme sua e evitar que as peculiaridades do trabalho
convicção pessoal. no campo e/ou meras irregularidades traba-
lhistas sejam confundidas com a prática do
Uma norma justa é aquela que o cidadão trabalho escravo.
compreende na sua literalidade, para moldar
suas condutas de forma livre e consciente. A CNA e todas as entidades do setor
Isto não acontece com as normas atuais, que produtivo agropecuário condenam
confundem situações não ideais de trabalho quaisquer práticas de trabalho análogo ao
(como as situações perigosas, penosas ou de escravo e defendem uma legislação clara
mesmo insalubres) com a prática de trabalho e objetiva, que não confunda no mesmo
análogo ao de escravo. tipo penal condutas que são inteiramente
diferentes. O que se busca é um ambiente
Nos últimos anos, não se constatou de segurança jurídica, no qual não haja
nenhuma alteração relevante no conceito margem de dúvidas para a compreensão do
de trabalho análogo ao de escravo, embora tipo penal e do ilícito administrativo.
tenha ocorrido uma revisão do Código Penal,
bem como a promulgação da Emenda

PROPOSTAS • Regulamentar a Emenda Constitucional


81 (PLS 432/2013); e
• Revogar a Instrução Normativa MTb
139/2018; • Alterar o art. 149 do Código Penal, tipifi-
cando o crime de forma mais objetiva e
• Revogar a Portaria MTb 1.293/2017; excluindo-se os termos “jornada exausti-
va” e “condições degradantes”.
• Revogar a Portaria Interministerial MTPS/
MMIRDH 4/2016;

65
c. Indenização do trabalhador safrista
PROPOSTAS
A Lei 5.889, de 8 de junho de 1973, prevê
que, expirado o contrato de trabalho, o • Revogar o caput do art. 14, da Lei
empregador pagará ao safrista, a título 5.889/1973; e
de indenização por tempo de serviço,
um valor correspondente a 1/12 do salário • Revogar o Precedente Administrativo
mensal obreiro, por mês de serviço ou 65, do Ministério do Trabalho.
fração acima de 14 dias. Logo, tem-se um
caráter indenizatório pelo tempo de serviço
prestado ao empregador como forma de se
assegurar subsistência ao empregado rural d. Cotas de contratação de pessoas com
ao término do contrato. deficiência

O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço Todos os empregadores são obrigados


(FGTS), por sua vez, tornou-se direito a observar cotas de contratação de
dos empregados urbanos e rurais com pessoas com deficiência, conforme a Lei
a promulgação da Constituição Federal 8.213/1991. Entretanto, no meio rural, há
de 1988, de forma a minimizar os efeitos imensa dificuldade no cumprimento dessa
financeiros do desemprego. obrigação legal por diversos motivos:
ausência de interessados; carência de
Claramente, ambas as rubricas possuem o pessoas com qualificação básica; falta de
mesmo intuito (indenização por tempo de acessibilidade de vias e transporte público;
serviço), de modo que a criação do FGTS ou, ainda, por incompatibilidade com as
advém para substituir a indenização do atividades exercidas no meio rural.
safrista, não fazendo sentido a exigência de
pagamento de ambas as verbas, onerando Mesmo quando comprovadamente são
sobremaneira o empregador rural. adotadas todas as medidas que objetivam o
cumprimento da lei – e ainda assim restam
Entretanto, o Precedente Administrativo elas inexitosas –, os empregadores rurais
65, do Ministério do Trabalho, prevê o têm sofrido a aplicação de penalidades em
pagamento da indenização, além do FGTS, fiscalizações do Ministério do Trabalho e
assim como a jurisprudência majoritária do Previdência e, em algumas situações, do
Tribunal Superior do Trabalho. Ministério Público do Trabalho, o que vai
de encontro ao entendimento do próprio
Nesse contexto, para eliminar qualquer Judiciário laboral, que, nessas hipóteses, tem
interpretação que redunde no pagamento reconhecido e declarado a inaplicabilidade
em duplicidade, determinadas ações são de qualquer sanção.
necessárias.

66 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS se houver a inexistência de beneficiários
reabilitados e pessoas com deficiência in-
• Considerar, para a reserva de vagas a teressados no preenchimento das vagas;
pessoas com deficiência (ou beneficiários
reabilitados), somente a quantidade de • Fornecer esteio para a criação de uma po-
empregados ativos contratados por prazo lítica pública de adaptação e qualificação
indeterminado e em atividades que não laboral das pessoas com deficiência; e
sejam perigosas ou insalubres;
• Adequar os preceitos que definem as
• Dispensar o empregador do cumprimento formas de deficiência, ensejando mais
da obrigação, não incorrendo em qual- segurança às contratações.
quer sanção administrativa ou judicial,

e. Criação do Conselho Administrativo de Perfazem-se, pois, algumas prioridades para


Recursos Trabalhistas (CART) o próximo governo.

A teor do contido na CLT, a apresentação de PROPOSTAS


defesa em sede de autuações trabalhistas
é feita à Superintendência Regional do • Criar o Conselho Administrativo de
Trabalho, cuja decisão é passível de recurso Recursos Trabalhistas (CART), tripartite,
à Secretaria de Inspeção do Trabalho. no âmbito do Ministério do Trabalho e
Previdência.
Nessa sistemática, as impugnações
administrativas são analisadas, não raras
vezes, pelo mesmo auditor fiscal que
realizou a autuação, o que prejudica o 3.4. SEGURANÇA PÚBLICA
grau de imparcialidade na revisão e no
julgamento, ensejando, costumeiramente, O conceito de segurança pública é amplo,
o litígio judicial, o que fomenta o conflito e abarca a proteção da inviolabilidade
onera, inclusive, o Estado. do ordenamento jurídico objetivo, bem
como a proteção da existência do Estado
A criação de uma instância administrativa e das instituições, suas instalações e seu
específica, de natureza tripartite, permitirá funcionamento. A vida, a saúde e a liberdade
a efetiva revisão e análise dos recursos dos cidadãos são exemplos de bens jurídicos
em face de decisões que imponham protegidos. Nessa perspectiva, garantir
penalidades por infrações à legislação a segurança e a ordem pública é função
trabalhista, o que reduzirá o número de primordial do Estado, que em geral atual de
demandas judiciais e contribuirá não apenas maneira preventiva e repressiva.
para a uniformização de interpretação sobre
um mesmo tema, como também para a O Brasil é penalizado socioeconomicamente
segurança jurídica, com redução dos gastos pela insegurança pública, que atinge todos
públicos e dos custos aos empregadores. os segmentos da sociedade. Inúmeros são

67
os lançamentos de programas e planos O enfrentamento dessa crise é complexo e
de segurança que, todavia, com o tempo, requer planos nos níveis político, estratégico
acabam sendo abandonados ou apresen- e operacional, com formulação de políticas
tam poucos resultados práticos, apesar dos públicas que envolvam os órgãos de
investimentos canalizados. A maior parte segurança pública, o sistema penitenciário, o
desses programas tem foco nas grandes Sistema Judiciário e o Poder Legislativo.
áreas urbanas, sendo poucas as iniciativas
endereçadas ao campo, o que afeta direta- É importante, inicialmente, criar um ambien-
mente a população rural. te político e psicossocial favorável às diversas
ações planejadas, que devem se somar para
A condição econômica dos estados não o enfrentamento da crise de segurança, ten-
cria expectativas de aumento de efetivos do também como foco a área rural.
das polícias. A situação de insegurança nos
centros urbanos absorve grande parte do Violência, insegurança e distúrbios provocam
quadro policial, e estudos mostram que efeitos devastadores em uma região ou país.
menos de 10% dos efetivos são destinados Afugentam investimentos, amofinam o cres-
para o policiamento da área rural. Com cimento econômico, criam atritos persisten-
base nesses indicativos, ganha importância tes nas comunidades e aumentam o custo
o aumento da eficiência e eficácia do para o orçamento público, dada a necessida-
policiamento na área rural. de de investigação, processamento e julga-
mento dos crimes, além de sobrecarregarem
A falta de uma rede de comunicações o serviço público de saúde com os resultados
está entre as principais dificuldades da violência contra as pessoas.
do policiamento no setor rural. A sua
implantação e a sua manutenção são pontos Um país que pretende buscar o caminho do
que merecem atenção e investimento, desenvolvimento e nele continuar trilhando
sobretudo considerando as grandes precisa de um ambiente social pacífico
distâncias envolvidas e o pequeno número e de instituições públicas eficientes que
de habitantes. garantam, entre outros itens, a segurança
pública para sua população.
Por outro lado, o caráter difuso das
ameaças e a diversidade do ambiente Diante desse quadro, é importante orientar
operacional dificultam significativamente as ações e os investimentos listados a seguir.
o enfrentamento da falta de segurança
pública tanto nas cidades como no campo.

68 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS tário e no cadastramento de propriedades e
respectivos trabalhadores rurais;
• Criar delegacias especializadas em crimes
rurais, a exemplo das já existentes; • Constituir grupos de trabalho específicos
para o estudo, a análise e a apresentação
• Criar patrulhas rurais, onde de soluções aos problemas relacionados
não houver; à criminalidade no campo, com base em
práticas bem-sucedidas no âmbito das
• Institur parcerias público-privadas volta- secretarias e demais órgãos de segurança
das ao fornecimento, às áreas rurais, de pública;
um sistema de telefonia móvel;
• Implementar em todos os estados e no
• Universalizar as telecomunicações e da Distrito Federal, a possibilidade de as pró-
conectividade no campo; prias polícias militares expedirem o termo
circunstanciado durante o atendimento
• Elaborar de projeto de mapeamento de às ocorrências; e
vias com capacidade de roteamento, uma
vez que a falta de sinalização, pavimenta- • Revisar o Sistema Nacional de Informa-
ção e iluminação das vias rurais dificulta ções de Segurança Pública (SINESP), de
o rápido atendimento de ocorrências na forma a possibilitar a apuração do índice
área rural; de reincidência criminal por regiões, esta-
dos e localidades, sendo tal ponto um re-
• Elaborar e organizar de programas e treina- quisito de fundamental importância para
mentos baseados no policiamento comuni- a formulação de políticas de segurança.

69
Desenvolvimento
4
Sustentável

70 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


4. DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL

O modelo da sustentabilidade, para zação estruturada para o cumprimento dos


qualquer segmento econômico, envolve compromissos ambientais internacionais; e a
a conjugação de desenvolvimento regularização fundiária.
econômico, responsabilidade social e gestão
ambiental. A partir dessas três grandes Sob a ótica da segurança jurídica da
linhas, vislumbramos grandes desafios sustentabilidade, sugere-se um conjunto
a serem considerados, para os próximos de propostas legais, ambientais e sociais
anos, no alcance da agregação do valor que têm como objetivo legalizar e titular as
“sustentabilidade” à agropecuária brasileira. pessoas ocupantes de terras pertencentes à
União ou os projetos de assentamentos da
Ampliar as ações da agropecuária na agenda reforma agrária.
de desenvolvimento sustentável; produzir
alimentos saudáveis e seguros para garantir Para isso, as ações contidas neste capítulo
segurança alimentar e desenvolvimento buscam reafirmar que a segurança
sustentável; definir os modelos de agricultura ambiental é necessária não somente para
mais adequados para ajudar o Brasil na manter a produção agropecuária brasileira
transição para uma “economia verde” dentro no caminho de sustentabilidade, mas
dos preceitos da sustentabilidade; expandir também para aliá-la à necessidade de se
a produção e assegurar a conservação da garantir a segurança alimentar do Brasil e do
biodiversidade e das florestas; promover mundo, cumprindo os acordos internacionais
a agricultura como vetor de empregos assumidos pelo Brasil e atraindo os
e desenvolvimento do país, reduzindo a investimentos para o crescimento do setor.
pobreza: tudo isso compõe esses desafios.

O cumprimento da legislação nacional,


particularmente da legislação que 4.1. SEGURANÇA AMBIENTAL
tem o meio ambiente como objeto, é
requisito ao enquadramento de qualquer a. Código Florestal
empreendimento à ótica da sustentabilidade,
considerando que existe uma diversidade de O Brasil possui uma das mais completas e
modelos de produção agropecuária no Brasil. complexas legislações ambientais do mundo.
A Lei de Proteção da Vegetação Nativa, Lei
Para isso, quatro grandes temas deverão ser 12.651/2012, conhecida como Código Florestal
pauta do governo para o fomento do desen- brasileiro, é uma delas; em maio de 2022,
volvimento da agropecuária competitiva e ela completou 10 anos desde sua última
sustentável. Entre eles estão: a estruturação modificação. Em resumo, essa lei estabelece
do mercado de carbono; a promoção da as regras para a proteção da vegetação nas
economia verde e da agroenergia; a organi- Áreas de Preservação Permanente (APP),

71
nas áreas de Reserva Legal (RL) e áreas de Ciente disso, o governo federal empenhou
Uso Restrito (AUR), define os instrumentos esforços, nos últimos dois anos, para
necessários para a identificação e ajudar as unidades federativas – que são as
recuperação dos passivos ambientais e abre principais responsáveis pela regularização
o caminho para a produção agropecuária ambiental das propriedades rurais no
sustentável nas áreas passíveis de uso âmbito do Código Florestal – a vencerem
econômico. Além disso, é o pilar do os desafios do processo de regularização
cumprimento dos acordos internacionais ambiental por meio da disponibilização de
assumidos pelo Brasil. ferramentas automatizadas, como o caso da
AnalisaCAR e do Módulo de Regularização
A aplicação do Código Florestal representa Ambiental (MRA), lançado no fim de 2021.
uma importante estratégia para que Além disso, o governo federal lançou, em
o Brasil continue seu caminho de março de 2022, o RegularizAgro – Plano
crescimento agropecuário aliado à proteção Nacional para a Regularização Ambiental dos
e à conservação ambiental. Contudo, a Imóveis Rurais –, que visa institucionalizar e
implementação da lei ainda enfrenta vários aperfeiçoar os mecanismos de articulação
desafios, o que já era esperado, dada a e coordenação entre a União e os estados
magnitude do número de propriedades e, assim, permitir o avanço da agenda da
privadas no Brasil, pois estamos tratando de regularização ambiental. Com isso, de
um país com dimensões continentais. Dez acordo com o referido plano, o Brasil pode
anos se passaram e muito ainda precisa ser usufruir dos benefícios resultantes da efetiva
feito para que esses desafios sejam superados. implantação da Lei 12.651, de 25 de maio de
2012, seja pela certificação da regularidade
De acordo com dados do Serviço Florestal ambiental das propriedades rurais – com o
Brasileiro (SFB), até abril de 2022 haviam reconhecimento de seus ativos ambientais e
sido declarados aproximadamente 6,5 o fortalecimento da segurança jurídica –, seja
milhões de cadastros, representando uma pela recuperação da vegetação nativa, em
adesão maciça do produtor rural. Esses uma escala sem precedentes no país.
números precisam ser refinados, pois a
natureza declaratória do Cadastro Ambiental No entanto, a implementação do Código
Rural (CAR) não evitou problemas de Florestal exige atenção, pois, no ano de 2012,
sobreposições entre áreas privadas, unidades houve a judicialização da norma através
de conservação, terras indígenas, glebas de ações diretas de inconstitucionalidade,
públicas não destinadas e assentamentos cujo resultado, após oito anos, foi pelo
da reforma agrária, em função de muitos reconhecimento de sua constitucionalidade
cadastros terem sido feitos sem o devido por parte do Supremo Tribunal Federal.
rigor. Portanto, esses cadastros precisam ser Entretanto, em 2020, através de diversas
analisados e, encontradas as divergências, ações judiciais, a aplicação do Código
retificados. Dados de abril de 2022 do Florestal ao bioma Mata Atlântica, que
SFB apontavam que, dos aproximados 6,5 atinge 16 estados da federação, foi
milhões de CARs, pouco menos de 1,5 milhão judicializada, sendo paralisadas as análises
havia passado por algum tipo de análise e do CAR e a implementação do Programa de
apenas 28.631 cadastros haviam tido a análise Regularização Ambiental (PRA), não havendo
de regularidade ambiental concluída. previsão para o deslinde da questão. Tal

72 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


situação deixa os produtores, que confiaram há consolidação de uso de área – um dos
no governo e no Congresso Nacional, sem principais institutos do Código Florestal.
perspectivas no que se refere à regularização Se possível, subir para a linha de cima. torna-
ambiental de seus imóveis rurais. se a Lei 12.651 letra morta nesses 16 estados
da federação, o que ocasionará imensuráveis
Visando solucionar o problema, o governo prejuízos de ordem econômica e social ao
federal ajuizou, em 2020, a Ação Direta de país e aos produtores rurais.
Inconstitucionalidade 6446 para reverter essa
situação que impede a análise do CAR em Nesse sentido, esforços devem ser
2,2 milhões de imóveis rurais, o que equivale empenhados para tanto, necessitando de
a um terço do total de áreas cadastradas e uma grande interação com as unidades
localizadas no bioma Mata Atlântica. Caso federativas para que a aplicação do Código
seja desfavorável o julgamento dessa ação, Florestal brasileiro se concretize e permita
que visa reverter o entendimento de que não ao país avançar na agenda de regularização
ambiental, sendo prioritário o que segue.

PROPOSTAS • Julgar procedente a Ação Direta de In-


constitucionalidade 6446, que reconhece
• Promover iniciativas que acelerem a análi- a aplicação do Código Florestal em áreas
se do CAR, como a dinamização da análise de Mata Atlântica;
e retificação dos cadastros;
• Intensificar a atuação da assistência téc-
• Qualificar os dados do desmatamento no nica para apoiar o produtor na retificação
Brasil, que são necessários para as políti- dos cadastros e na resolução dos passivos
cas públicas de combate ao desmatamen- ambientais;
to ilegal, distinguindo o desmatamento
legal e o ilegal e quantificando a recupe- • Promover o RegularizAgro, elaborando e
ração da vegetação nativa; colocando em prática um plano de ação
para alinhar as diversas estruturas pú-
• Promover o Programa de Regularização blicas responsáveis pela implantação da
Ambiental nos estados, criando condições regularização ambiental e também para
para o cumprimento da lei e para a regu- compactuar objetivos e metas de médio e
laridade ambiental da propriedade rural; longo prazo; e

• Definir o conceito de identidade ecoló- • Prorrogar o prazo para adesão ao Progra-


gica junto ao Supremo Tribunal Federal, ma de Regularização Ambiental, dado o
com fins de uso das Cotas de Reserva atraso nas análises do CAR.
Ambiental (CRA) para compensação de
passivos ambientais e como alternativa de
renda ao proprietário rural;

73
b. Licenciamento ambiental ser aprovado, visando evitar retrocessos
e estabelecendo segurança jurídica e
No Brasil, não existe uma lei geral que trate ambiental para o país e para nossa economia.
sobre o licenciamento ambiental. Todo o
arcabouço foi moldado com resoluções Após 17 anos tramitando no âmbito
do Conselho Nacional de Meio Ambiente legislativo, o PL 2159/2021 encontra-se
(CONAMA) e legislações estaduais, o que faz paralisado no Senado Federal desde o ano de
com que o processo de licenciamento não 2021, trazendo perda de competitividade ao
possua unidade nacional e seja diferente país e demora à aprovação dos pedidos de
em cada estado. É preciso desburocratizar, licenciamento ambiental, sendo este regido
modernizar e dar transparência e atualmente por normas obsoletas, da década
responsabilidade para o licenciamento dos anos 1990.
ambiental, fornecendo segurança ao
investidor. Isto só será possível com um novo Dessa forma, a CNA apoia a criação do marco
marco legal. Por essas razões, tendo sido legal para o licenciamento ambiental com as
amplamente discutida a matéria durante salvaguardas necessárias à viabilidade de sua
vários anos entre os setores, o projeto de aplicação ao sistema produtivo do agro brasi-
lei, aprovado na Câmara dos Deputados leiro, ressalvados os pontos que se seguem.
e que tramita no Senado Federal, precisa

PROPOSTAS e Compromisso (LAC) para as atividades


agropecuárias não enquadráveis na isen-
• Isentar as atividades de agricultura, ção pela própria lei ou declaradas pelo
silvicultura e pecuária extensiva e semi- Estado com algum potencial poluidor; e
-intensiva do licenciamento ambiental,
visto o setor agropecuário exercer ati- • Aprovar e sancionar o PL 2159/2021, com o
vidades de impacto insignificante, com conteúdo aprovado na Câmara dos Depu-
condicionantes já previstas no texto do tados, de modo a garantir maior agilida-
PL. Cabe reafirmar que estas atividades de e segurança jurídica aos investidores,
estão submetidas ao Cadastro Ambiental transformando o procedimento do licen-
Rural (CAR), o qual tem como finalidade o ciamento ambiental num instrumento de
monitoramento das questões inerentes à defesa da sociedade e de salvaguarda dos
vegetação nativa; interesses do meio ambiente, dos empre-
endedores e da sociedade brasileira.
• Buscar a utilização de licenciamento sim-
plificado através da Licença por Adesão

74 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


c. Pagamento por Serviços Ambientais manutenção da biodiversidade, proteção
dos recursos hídricos e manutenção das
O Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) belezas cênicas são funções já desenvolvidas
tem como premissa ser uma transação pela propriedade rural. As propriedades
voluntária na qual um serviço ambiental bem rurais têm, por força de lei, a obrigação de
definido – ou uma forma de uso da terra que manter suas áreas protegidas a título de
possa segurar esse serviço – é comprado Áreas de Preservação Permanente (APP)
por pelo menos um comprador de pelo e Reserva Legal (RL), imobilizando seu uso
menos um provedor, sob a condição de que em até 80%. Responsáveis pela preservação
o provedor garanta a provisão desse serviço. dos recursos hídricos, da paisagem, da
Com imenso potencial de aplicação no Brasil, estabilidade geológica e da biodiversidade,
a Lei 14.119, de 13 de janeiro de 2021, instituiu facilitando o fluxo gênico de fauna e flora,
esse instrumento da política ambiental do protegendo o solo e assegurando o bem-
país. No entanto, ainda não há clareza nas estar das populações humanas, essas áreas
garantias necessárias à transação devido à de conservação não são elegíveis como
ausência de um arcabouço legal para sua prestadoras de serviços ambientais por
inserção no orçamento federal; tampouco não terem o requisito “adicionalidade”.
foram definidos os critérios de captação de Nessa perspectiva, APP e RL são exigidos
recursos, de monitoramento dos benefícios apenas no Brasil e não contribuem para a
ecossistêmicos, de valoração dos serviços sustentabilidade econômica da propriedade.
prestados, de elegibilidade dos processos
ecossistêmicos e das áreas prioritárias no Assim, a Política Nacional de Pagamento
recebimento dos recursos financeiros, além por Serviços Ambientais (PNPSA) tem por
de outras questões. objetivo desmistificar, regulamentar e avaliar
economicamente o PSA, buscando oferecer
Se quisermos avançar além dos efeitos essa modalidade de remuneração ao
das medidas baseadas na política de produtor rural que se enquadre nela.
comando e controle, é consenso que
outros instrumentos de política ambiental Nesse sentido, sugerimos aos novos
sejam incorporados ao ativo produtivo da governantes ações para que a PNPSA
propriedade rural para a não opção pelo realmente produza os efeitos pretendidos
uso alternativo do solo. Serviços ambientais quando da sua discussão e aprovação no
como captura e retenção de carbono, campo legislativo federal.

75
a demanda por redução de emissões
PROPOSTAS associada a uma oferta de créditos de
carbono com integridade ambiental. Do lado
• Regulamentar a Lei 14.119, de 13 de janeiro da demanda, os compromissos assumidos
de 2021; nos acordos internacionais e acordos
multilaterais – como a adoção de ações que
• Identificar e viabilizar fontes de recursos permitam limitar o aumento de temperatura,
para propiciar o PSA; e buscando a neutralidade de emissões e de
carbono, associadas ao comprometimento
• Elaborar metodologia para avaliar a eficá- com o aumento permanente da ambição
cia e/ou a eficiência do PSA. das ações dos países em suas Contribuições
Nacionalmente Determinadas (NDCs,
na sigla em inglês), aos compromissos
corporativos, às compensações de emissão
4.2. MERCADO DE CARBONO voluntárias e aos critérios verdes atrelados a
carbono nos protocolos Ambiental, Social e
Definir as regras-base de funcionamento do Governança (ASG) – devem ser definidos para
mercado de carbono brasileiro é essencial que se exerça todo o potencial de mitigação
para que o potencial do setor agropecuário das emissões do setor agropecuário.
brasileiro seja exercido, contribuindo efetiva-
mente com o alcance dos esforços conjuntos Com as regras internacionais definidas pelo
para o enfrentamento das alterações climá- livro de regras do Acordo de Paris, as bases
ticas, sem perder de vista a responsabilidade para o funcionamento dos mecanismos
de garantir a segurança alimentar. A aposta de mercado de carbono, bem como para o
do Brasil em desenvolver a agropecuária mecanismo de não mercado, exigem que
comercial mais sustentável do mundo an- as partes do acordo definam suas regras
tecipou a inovação do setor, resultando em e metodologias domésticas. Com o início
maior produtividade, produção e adaptação da contabilização das NDCs das partes, a
dos sistemas produtivos às alterações do cli- operacionalização do comércio de créditos
ma, estando estes associados a um balanço de carbono para ao alcance das metas de
mais positivo de emissões. O futuro da agro- cada país e entre os países – mecanismo
pecuária brasileira começou a ser traçado há denominado offset, surge como uma
pelo menos 10 anos, quando da ampla ade- importante alternativa para reduzir emissões
são do setor ao Código Florestal e ao Plano de Gases de Efeito Estufa (GEEs), alcançando
de Agricultura de Baixa Emissão de Carbono a demanda das partes do Acordo de Paris.
(Plano ABC).
O setor agropecuário encontra-se pronto
O Brasil tem oportunidades de geração de para contribuir no alcance dos compromissos
créditos em todos os esquemas previstos, do Brasil, mas precisa ter condições de
os quais podem ser transacionados com exercer seu grande potencial de emissão de
outros países, entre setores produtivos e créditos de carbono. Para isso, o mercado
nos mercados voluntários. Para alcançar deve viabilizar projetos que gerem créditos
o potencial de prover créditos de carbono de carbono adequados para o atendimento
nesse futuro mercado, é necessário promover dos compromissos estipulados pela

76 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


contribuição proposta pelo Brasil no Acordo atenção, ainda, as ferramentas correlatas
de Paris (as NDCs) e propiciar projetos que, que prometem melhorar o desempenho
ao mesmo tempo, sejam práticos e viáveis do mercado de carbono, como os conceitos
para negociar com outros países e setores de adicionalidade e contagem dupla,
interessados. os resultados de mitigação transferidos
internacionalmente e a inclusão de projetos
Graças à sua cobertura florestal, o Brasil tem privados nas transações de créditos de
um potencial de produção de créditos de redução de emissões.
carbono singular, dispondo de mecanismos
eficientes para certificá-los e remunerar Diante da responsabilidade do país para o
as ações do país. Eles são a melhor forma alcance de seus compromissos se utilizando
de priorizar, a médio prazo, as soluções do instrumento do mercado de carbono
baseadas na natureza (nature-based são necessárias algumas ações por parte do
solutions), como a restauração das florestas governo brasileiro:
e o desmatamento ilegal zero. Merecem

PROPOSTAS • Buscar soluções domésticas (por meio do


Mapa e da Embrapa) para definir metodo-
• Combater o desmatamento ilegal, que logias e pleitear reconhecimento, visando
prejudica a imagem do país e a integrida- ao cumprimento das metas nacionais, dos
de do crédito de carbono ofertado pelo offsets e do mercado voluntário;
Brasil;
• Promover a integridade do crédito de car-
• Implementar a Política Nacional de Car- bono nacional para garantir o acesso ao
bono na Agropecuária, com o intuito de mercado regulado e voluntário;
qualificar o crédito de carbono oriundo
das atividades agropecuárias; • Tornar as tecnologias do Plano ABC+ viá-
veis ao mercado de carbono;
• Promover a transparência necessária à
integridade do crédito de carbono na • Tornar o Código Florestal brasileiro como
captura das reduções de emissão e/ou no adicionalidade, apesar da obrigatorieda-
sequestro de GEEs; de da lei, passível de emitir créditos de
carbono certificado negociável no futuro
• Propor e aprovar metodologias de redu- mercado de carbono; e
ção de emissões que sejam acessíveis e
reconhecidas em âmbito mundial; • Construir normas técnicas para a produ-
ção, contabilização e remuneração de
• Optar pelo mecanismo de mercado regu- carbono verde em atividades agrícolas,
lado, evitando a taxação da emissão de pecuárias e de processamento de produ-
carbono; tos agropecuários.

77
4.3. ECONOMIA VERDE E AGROENERGIA do Plano ABC+, os quais incluem em suas
bases conceituais o uso eficiente de áreas
a. Agricultura de baixa emissão com aptidão para produção agropecuária –
de carbono com o aumento da capacidade adaptativa
dos sistemas de produção e suas
O futuro da agropecuária brasileira começou contribuições para mitigação de GEEs – e a
a ser traçado há décadas e hoje é uma abordagem integrada da paisagem, o que
referência mundial graças à mais completa e reforça o exercício de uma economia verde
complexa legislação ambiental do mundo e em todos os seus aspectos.
ao incentivo à adoção da agricultura de baixa
emissão de carbono. Para o país continuar com essa evolução
e honrar seus compromissos, o mercado
Com o término do período determinado de créditos carbono e a agroenergia – por
para a vigência do Plano ABC e dadas as meio do seu papel no uso eficaz e eficiente
obrigações decorrentes dos compromissos dos recursos naturais e na redução de
do Brasil com o novo acordo climático, emissões de GEEs e outros poluentes
estabelecidos por meio das Contribuições atmosféricos – são ferramentas essenciais.
Nacionalmente Determinadas, o Além de representarem uma forma de
Brasil reafirma o seu protagonismo agregar valor e reforçar a sustentabilidade
no desenvolvimento sustentável, do agro brasileiro internacionalmente, são
particularmente na atividade agropecuária, mecanismos estruturantes para que o Brasil
apresentando novo período de promoção cumpra metas relevantes, como as de zerar
de adaptação às mudanças do clima e ao o desmatamento ilegal até 2028, neutralizar
controle de emissões de GEEs. as emissões de GEEs até 2050, além da de
promover uma agricultura de baixa emissão
As metas e ações estabelecidas no de carbono.
plano operacional do ABC+ devem ser
colocadas em prática e alcançadas até Diante da responsabilidade do país para o
2030, contemplando todos os Sistemas, alcance de seus compromissos se utilizando
Práticas, Produtos e Processos de Produção das tecnologias e dos sistemas previstos no
Sustentáveis (SPSABC) previstos no portfólio Plano ABC+, levantamos algumas sugestões.

78 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS • Fomentar a tomada de recursos via Pro-
grama ABC e de outras linhas de crédito
• Promover a descarbonização da agricul- para estimular a adoção e a manutenção
tura brasileira com o uso das tecnologias dos SPSABC;
sustentáveis de baixa emissão de carbono
previstas no portfólio do Plano ABC+; • Estimular a criação de novos mecanismos
de financiamento via economia verde;
• Fortalecer os programas e os projetos de
estímulo à adoção e à manutenção dos • Desenvolver e aprimorar os métodos de
SPSABC; avaliação da efetividade da resiliência, da
capacidade adaptativa, da produtividade
• Fortalecer a assistência técnica e exten- e do controle das emissões de GEEs dos
são rural para apoiar a adoção e a manu- SPSABC; e
tenção dos SPSABC no território nacional;
• Criar mecanismo para reconhecimento e
valorização de produtores, organizações,
produtos e propriedades que utilizam os
SPSABC.

b. Agroenergia vegetal, hidráulica, derivados de cana, entre


outras) correspondem a 47% da matriz ener-
A agroenergia possui papel fundamental gética nacional, muito acima da média mun-
na busca por melhorias das condições do dial (14%). Quando se trata da matriz elétrica,
meio ambiente e do uso e da eficiência as fontes renováveis (hidráulica, biomassa,
dos recursos naturais, na contribuição eólica, solar) correspondem a 83%, segundo a
para a diversificação das fontes renováveis Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
de combustíveis e de eletricidade, na
interiorização da distribuição e transmissão No entanto, a agroenergia necessita de mais
de energia, bem como no empenho incentivos e políticas públicas que viabilizem
ininterrupto pela redução de emissões de sua operacionalização em todas as suas
GEEs e outros poluentes atmosféricos. esferas, mas, principalmente, em quatro
grandes grupos, a saber: 1. etanol proveniente
Atualmente, o Brasil é conhecido mundial- de culturas agrícolas como cana-de-açúcar,
mente no campo da energia limpa e renová- milho e resíduos florestais; 2. biodiesel
vel. O agronegócio possui grande potencial proveniente de fontes lipídicas, sejam elas
social para ampliação do uso dessas fontes e vegetais ou animais; 3. bioeletricidade gerada
para a mitigação dos efeitos das crises hídri- por meio do uso de biomassas vegetais
cas vivenciadas corriqueiramente, as quais e animais; e 4. promoção da geração de
geram impactos econômicos em toda a po- energia via fontes solar, hídrica e eólica para
pulação, como os vivenciados recentemente. contratação nos ambientes de contratação
Hoje, as fontes renováveis (lenha e carvão livre e regulada.

79
Para ampliar esses índices, a EPE estima fontes fotovoltaicas e eólicas e a biomassa
que são necessários investimentos da são exemplos primordiais de alto potencial
ordem de mais de R$3,2 trilhões na próxima energético e podem trazer segurança em
década, pautando-se principalmente em relação ao abastecimento de energia do
uma expectativa de que o consumo total país, de forma a suprir as demandas a médio
de eletricidade cresça acima do ritmo da e longo prazos. Isto fica mais notável pelo
expansão econômica. seu caráter modular e seu potencial de
interiorização no país, reduzindo os custos
Quanto aos biocombustíveis, o Brasil com transmissão, distribuição e manutenção
desponta em relação a outros países com de infraestrutura, principalmente por
políticas públicas voltadas à tratativa para meio da mini e microgeração de energia.
alavancagem de produção e uso desses, A permissão e os incentivos para que os
como o RenovaBio, que é uma política de consumidores, sejam eles de áreas rurais ou
Estado que reconhece o papel de todos urbanas, produzam a própria energia a partir
os biocombustíveis na matriz energética de fontes renováveis, como a solar – mais
brasileira, conforme critérios voltados à usual nesse mecanismo –, vão ao encontro
segurança energética, à previsibilidade do do propósito central apresentado, sendo
mercado e à mitigação de emissões de GEEs, necessária a viabilização da implementação
de forma a viabilizar a oferta de energia de de projetos por meio de benefícios fiscais e
maneira segura, competitiva e, como não aportes de crédito aos usuários.
poderia deixar de ser, sustentável.
Para democratizar o acesso, é imprescindível
Outra medida prática é a sustentação ampliar a participação da energia renovável
normativa da obrigatoriedade de mistura de na matriz nacional e definir políticas
biocombustíveis aos combustíveis fósseis, inclusivas de financiamento para o acesso
como do biodiesel ao diesel e do etanol a tecnologias de geração de energia
à gasolina, ampliando paulatinamente o renovável. Por fim, é importante reiterar que
percentual da mescla como medida de a agroenergia está, de diversas formas e
redução da dependência das fontes não em múltiplos grupos econômicos, direta ou
renováveis e, assim, colaborando para indiretamente relacionada a todos os outros
a ampliação da geração de emprego e setores, e seus proveitos podem e deverão ser
a conservação de divisas econômicas estendidos a todos eles.
no país. A manutenção dos parâmetros
e a previsibilidade de aumento são Visando traçar rotas para a expansão da
condições necessárias para a garantia dos infraestrutura para agroenergia, algumas
investimentos, principalmente da iniciativa ações se fazem necessárias.
privada, na produção desses biocombustíveis.

Quanto à eletricidade, é imprescindível


que haja diversificação de matriz a partir
de investimentos em fontes renováveis. As

80 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


PROPOSTAS no Brasil e promover políticas públicas e
incentivos para o aumento da produção
• Incentivar a Política Nacional de Biocom- de etanol de milho destinada aos biocom-
bustíveis (RenovaBio), atendendo aos bustíveis;
seus objetivos, de modo a estimular a am-
pliação da produção de biocombustíveis; • Promover o uso do biometano como fonte
para geração própria de energia elétrica
• Atender em plenitude ao cronograma ofi- dentro da propriedade rural, como com-
cial do teor de biodiesel no diesel fóssil do bustível no maquinário agrícola e em
Conselho Nacional de Política Energética substituição ao diesel no transporte pesa-
(CNPE), conforme metas estabelecidas do de carga;
na Resolução CNPE 16, de 29 de outubro
de 2018, incluindo a implementação do • Aprimorar o processo de licenciamento
B20 obrigatório em todos os ônibus das ambiental para ampliação dos investi-
regiões metropolitanas do país e do B30 mentos para construções de novas plan-
obrigatório no diesel ferroviário; tas de biogás no Brasil, com o objetivo de
aumentar a produção de biofertilizantes e
• Oferecer segurança jurídica, financiamen- obter maior aproveitamento do biometa-
to e estruturação de políticas de expansão no; e
das fontes renováveis para a geração pró-
pria em mini e microempreendimentos; • Reconhecer os atributos sistêmicos e
ambientais das fontes renováveis, além de
• Fortalecer o papel do etanol de milho na sua contribuição para a redução da emis-
matriz de transportes descarbonizantes são dos GEEs.

4.4. COMPROMISSOS INTERNACIONAIS As obrigações contraídas perante os acordos


internacionais geram compromissos
O Brasil é classificado como um dos países que, apesar de não se apresentarem
mais megadiversos do mundo. Associado à necessariamente como mandatórios,
sua dimensão territorial e à sua importância vinculam ações domésticas que podem ser
no escopo global das questões ambientais, é consideradas dentro de um processo de
objeto frequente de acordos internacionais comercialização internacional, resultando
multilaterais, dos quais tradicionalmente em barreiras não tarifárias aos produtos
é aderente. Esses acordos exigem do país do agro brasileiro. Além disso, impactam
medidas que impactam diretamente a a imagem do produto nacional frente aos
capacidade do uso dos recursos naturais, mercados consumidores, que se mostram
como o uso sustentável da biodiversidade, progressivamente mais exigentes em
o uso dos solos e das florestas, a emissão critérios de sustentabilidade. Diante desse
de GEEs, o acesso aos recursos genéticos, a cenário, cabe atenção à evolução do
restrição de uso em áreas protegidas, entre regime internacional de proteção do meio
outros compromissos firmados acerca do ambiente, exigindo de nossos governantes
meio ambiente e do clima. consideração especial aos compromissos

81
internacionais assumidos pelo Brasil, Brasil é parte é essencial para a garantia da
notadamente àqueles referentes às credibilidade frente aos parceiros comerciais,
mudanças climáticas e a biodiversidade. proporciona a abertura de novos mercados,
a redução das barreiras não tarifárias e a
A responsabilidade de garantir a segurança redução dos impactos das políticas regionais
alimentar mundial, associada ao eficiente de taxação de carbono de fronteira, além
uso dos recursos naturais, permitiu ao da ampliação dos acordos comerciais
país saltos de produtividade e produção, multilaterais.
promovendo a verticalização da produção
e agregando sustentabilidade ao valor Visando alcançar a credibilidade necessária
do produto brasileiro. A observância dos ao cumprimento dos acordos internacionais,
compromissos internacionais dos quais o sugerem-se determinados esforços.

PROPOSTAS • Buscar a neutralidade de emissões de


GEEs até 2050, propondo estratégia nacio-
• Promover esforços para cumprir os com- nal para a neutralidade climática;
promissos propostos frente ao Acordo
de Paris: • Implementar o mercado de carbono;

• Buscar a redução das emissões de GEEs • Buscar recursos para a mitigação e adap-
em 37% até 2025 e 50% até 2030, referente tação às alterações climáticas junto às
às emissões em 2005; negociações sobre o financiamento cli-
mático;
• Implementar o Código Florestal e seus
instrumentos; • Promover a ampliação da participação
das energias renováveis na composição
• Implantar a Política Nacional de Carbono da matriz energética de 45% a 50%;
na Agropecuária para a efetiva contribui-
ção do setor aos compromissos do acordo; • Aprimorar o inventário de emissões do
Brasil para uma efetiva transparência
• Zerar o desmatamento ilegal até 2028, no processo de redução de emissões de
cumprindo as metas intermediárias de GEEs; e
redução;
• Implementar a estratégia do Trabalho
• Aprimorar o Plano de Agricultura de Bai- Conjunto de Koronivia na Agricultura
xa Emissão de Carbono (Plano ABC); como forma de integrar a agropecuária
nas discussões do acordo climático.
• Restaurar e reflorestar 18 milhões de hec-
tares de floresta para usos múltiplos;

82 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


• Propor e cumprir a contribuição do Brasil esforços do país no cumprimento do Códi-
frente ao compromisso global do metano, go Florestal na preservação e recuperação
firmado durante a COP26, otimizando a de florestas; e
exploração agropecuária – e, particular-
mente, a pecuária –, melhorando a efici- • Detalhar os planos para cumprimentos
ência da produção e reduzindo a emissão das metas de biodiversidade, da Conven-
do gás metano; ção da Diversidade Biológica, adequando
as 21 metas propostas no novo compro-
• Propor o plano nacional e cumprir os misso e criando impactos no setor agro-
compromissos assumidos frente à De- pecuário até 2040.
claração dos Líderes de Glasgow sobre
Florestas e Uso da Terra, reconhecendo os

4.5. REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA ela permite que os órgãos federais


monitorem e fiscalizem o uso do solo, a
A segurança jurídica é um dos pilares do dimensão do imóvel e quais atividades são
Estado Democrático de Direito. Ela é de im- desenvolvidas pelo ocupante, possibilitando
portância fundamental para o fortalecimento a responsabilização daqueles que cometem
da agropecuária brasileira, o que significa a delitos, como o desmate ilegal, a grilagem
manutenção da previsibilidade da atuação de terras, as atividades não licenciadas,
do Estado, de modo a promover um sistema entre outros. Além disso, a regularização
jurídico mais eficiente e seguro. O desenvol- fundiária auxilia no ordenamento territorial
vimento econômico e o nível dos investimen- ao proporcionar maior controle do Estado
tos produtivos guardam estreita relação com sobre o território, garantindo o direito de
o grau de segurança jurídica que um país propriedade e a pacificação no campo.
oferta. Assim, o princípio da segurança jurí-
dica deve ser inserido, de modo transversal, É importante destacar que a regularização
em todas as cadeias produtivas do agro, em fundiária é o principal pilar para o produtor
especial no que tange à redução de incerte- preservar a vegetação nativa, produzir com
zas e de conflitos das questões fundiárias. sustentabilidade, desenvolver suas atividades
dentro da formalidade e com segurança
A regularização fundiária consiste num jurídica, além de avocar o princípio da
conjunto de medidas jurídicas, ambientais dignidade da pessoa humana. Ademais,
e sociais que têm como objetivo legalizar significa fornecer aos produtores os seus
e titular as pessoas ocupantes de terras direitos até como forma de responsabilizá-los
pertencentes à União ou os projetos de por suas obrigações junto ao Estado.
assentamentos da reforma agrária. Ao
realizá-la, o proprietário poderá exercer Assim, sugerimos as seguintes ações
plenamente a função social da propriedade governamentais referentes ao ordenamento
rural e garantirá o direito ao meio ambiente fundiário:
ecologicamente equilibrado. Ademais,

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a. Demarcação de terras indígenas

PROPOSTAS • Aperfeiçoar os processos de demarcação,


garantindo a adoção de procedimentos
• Fixar em lei as 19 salvaguardas institucio- técnicos nos estudos para identificação e
nais e a teoria do marco temporal, ga- delimitação das terras indígenas;
rantindo a necessária segurança jurídica
como orientação interpretativa para a • Atuar no sentido de reverter decisões
análise dos novos casos de demarcação liminares que suspenderam ordens judi-
de terras indígenas; ciais de reintegração de posse e adotar
medidas que coíbam as invasões de terras
• Acelerar o pagamento das indenizações por índios antes da efetiva regularização;
aos produtores rurais pelas benfeitorias
nos casos de demarcações de terras tra- • Promover a inserção de indígenas no
dicionalmente ocupadas por indígenas, processo produtivo, de modo a superar
conforme previsto na Constituição Federal; os principais entraves na produção e na
comercialização de produtos agrícolas de
• Publicar lei que garanta indenização ao comunidades indígenas; e
produtor rural que porventura teve sua
propriedade demarcada até outubro de • Possibilitar que as comunidades indíge-
1988 como terra tradicional indígena, con- nas desenvolvam em suas terras ativida-
siderando o valor da terra nua local para des econômicas, mesmo que em coopera-
pagamento; ção com terceiros não indígenas.

b. Combate às invasões de terras

PROPOSTAS principais regiões do país e aprimorar os


instrumentos de prevenção desses confli-
• Apoiar a aprovação dos Projetos de Lei tos; e
8262/2017 e 2250/2021, que tratam do
combate às invasões às propriedades ru- • Fortalecer os instrumentos e mecanismos
rais e das reintegrações de posse, coibin- jurídicos e normativos de retomada da
do a prática do crime de esbulho posses- propriedade em caso de invasão (rein-
sório e estabelecendo uma pena maior tegração de posse), sendo esse o único
para esse crime, bem como garantir à caminho capaz de assegurar a segurança
autoridade policial o direito de promover jurídica, a paz e a proteção do produtor
o desforço imediato; rural brasileiro, garantindo o Estado De-
mocrático de Direito.
• Criar observatório dos conflitos fundiá-
rios a fim de se monitorar as invasões nas

84 O QUE ESPERAMOS DOS PRÓXIMOS GOVERNANTES


c. Regularização fundiária e governança
de terras

PROPOSTAS • Fortalecer a estruturação do Cadastro Na-


cional de Imóveis Rurais (CNIR), cadastro
• Emitir títulos de domínio para o produtor integrado e multifuncional de terras de
que ocupa as terras de forma mansa, pací- terras públicas e privadas;
fica e de boa-fé;
• Aprimorar o processo de administração
• Atuar no aperfeiçoamento das regras para de terras, em especial o fortalecimento
regularização fundiária de ocupações em e o aprimoramento das ferramentas
glebas públicas federais pertencentes necessárias para tanto (estabilidade de
à União e ao Instituto Nacional de sistemas);
Colonização e Reforma Agrária (Incra)
através da aprovação do PL 510/2021, • Fortalecer a iniciativa do cadastro bási-
que define o novo marco regulatório da co rural com a integração do banco de
regularização fundiária; dados espaciais, com informações fiscais,
cadastrais, registrais, econômicas e geo-
• Consolidar e ampliar a digitalização dos espaciais de imóveis rurais e urbanos; tal
processos e a interoperabilidade do sis- integração permitirá uma visão global do
tema, por meio da Plataforma de Gover- território rural brasileiro; e
nança Territorial do Incra, com o objetivo
de dar celeridade à emissão de títulos em • Suspender as emissões do Termo de
glebas públicas federais e em assenta- Autorização de Uso Sustentável (TAUS),
mentos da reforma agrária; título precário emitido pela Secretaria
de Patrimônio da União (SPU) que não
• Apoiar projetos que descentralizam garante a segurança jurídica e o direto
e dão celeridade à regularização fundiária de propriedade nem para os povos
nos municípios, como o programa tradicionais nem para os produtores rurais
Titula Brasil; com áreas demarcadas.

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