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Contabilidade Vista & Revista

ISSN: 0103-734X
contabilidadevistaerevista@face.ufmg.br
Universidade Federal de Minas Gerais
Brasil

Coelho, Mary Cristine; da Cruz, Flávio; Platt Neto, Orion Augusto


A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio no Exercício do Controle Social
Contabilidade Vista & Revista, vol. 22, núm. 3, julio-septiembre, 2011, pp. 163-184
Universidade Federal de Minas Gerais
Minas Gerais, Brasil

Disponível em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=197021392007

Como citar este artigo


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A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio
no Exercício do Controle Social

Mary Cristine Coelho 1

Flávio da Cruz 2

Orion Augusto Platt Neto 3

• Artigo recebido em: 09/12/2009 •• Artigo aceito em: 06/04/2010 ••• Segunda versão aceita em: 28/11/2011

Resumo
O objetivo geral deste artigo consiste em estudar a informação como ferramenta de auxílio
no exercício do controle social. A administração pública é o ente destinado a promover o
bem comum, por meio da satisfação das necessidades básicas dos cidadãos, com o fim de
garantir condições dignas à população. Para isso, é necessária a aplicação de uma estrutura
de gestão pública patrimonial, operacional, financeira e contábil atuante e harmônica com
os princípios constitucionais. Em se tratando de administração de recursos advindos
eminentemente do povo, a compreensibilidade das prestações de contas torna-se impres-
cindível ao salutar controle externo dos atos administrativos. Assim, a problemática da
informação na gestão pública torna-se relevante quando associada, sobretudo, ao exercício
do controle social. Desenvolveu-se esta pesquisa segundo uma abordagem qualitativa. Foi
realizada uma revisão de literatura visando formar a base conceitual e legal para a
abordagem do problema. O estudo revelou a Contabilidade Pública como ciência que tem
como missão o incentivo a conhecimentos que admitam o controle efetivo da gestão
governamental. Apresentou-se também os alicerces da Lei de Responsabilidade Fiscal,
destacando-se o princípio da transparência, como mecanismo de cunho democrático à
viabilização da participação da sociedade civil. Por fim, ressaltou-se que a informação
contábil constitui um meio de assegurar a participação popular, de modo a se alcançar uma
política de gestão fiscal responsável, apoiada no exercício da cidadania pelo controle social.

Palavras-chave: Controle Social; Finanças Públicas; Informação Contábil; Participação


Popular; Transparência.
1
Bacharel em Ciências Contábeis, Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), SC (1996). Bacharel em
Direito, Universidade do Vale do Itajaí, Campus Biguaçu, SC (1998). Pós-Graduada em Controle da Gestão
Pública, UFSC, 2009. Contadora da Pref. Municipal de Florianópolis, SC. Endereço: Rua Osvaldo Cruz, 88,
Balneário, Florianópolis, SC, CEP: 88075-270. Telefone: (48) 3248-4220. E-mail: marycc@terra.com.br.
2
Mestre em Administração, UFSC, SC (1986). Bacharel em Ciências Contábeis, UFSC, SC (1974). Prof. Titular
no Dep. de Ciências Contábeis, UFSC, SC. End.: UFSC, Campus Univ. Trindade, Centro Sócio Econ.o, Bl.
C, Sl.009, Florianópolis, SC, Caixa Postal 476, CEP: 88040-900. Tel.: (48) 3234-3407. E-mail: flacruz9@ativanet.com.br.
4
Doutor em Inteligência Organizacional, Engenharia de Produção (EPS), UFSC, SC (2005). Mestre em Gestão de
Negócios, EPS, UFSC, SC (2002). Bacharel em Ciências Contábeis, UFSC, SC (1999). Professor Adjunto no Dep.
de Ciências Contábeis, UFSC, SC. End.: UFSC, Campus Univ. Trindade, Centro Sócio Econômico, Bloco C, Sala
009, Florianópolis, SC, Caixa Postal 476, CEP: 88040-900. Tel.: (48) 3234-3407. E-mail: orionplatt@cse.ufsc.br.
Nota: este artigo foi aceitopelo Editor Científico Poueri do Carmo Mário e passou por uma avaliação double
blind review.

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Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 22, n. 3, p. 163-184, jul./set. 2011.
COELHO, Mary Cristine; CRUZ, Flávio da; PLATT NETO, Orion Augusto

The Accounting Information as a tool


to aid the Social Control

Abstract
The general objective of this article consists in studying the information as an auxiliary tool
in employing the social control. Public administration is the designated item to promote the
common welfare, through the fulfillment of the basics needs of the citizens, in order to
ensure decent conditions to the population. Therefore, this requires the application of
patrimonial, operational and financial public management structure, acting harmoniously
with the constitutional principles. Referring to the administration of the public resources,
understanding the benefits of accounts is vital to a valuable external control of the
administrative acts. Though, the problematic of information in public management is
relevant when associated with the exercise of the social control. This research was
developed following a qualitative approach. A review of literature was conducted, aiming
to form basis to the legal and conceptual approach of the problem. This study showed the
public accountancy as a science that is responsible for encouraging knowledge that
recognizes the effective control of the governmental management. It also presented the
foundations of the law of fiscal responsibility, highlighting the principle of transparency, as
a democratic mechanism to enable the civil society engagement. Finally, emphasizing that
accounting information constitutes a way to ensure popular participation in order to achieve
a financial management policy, supported by the responsible citizenship achievement
through the social control.

Keywords: Social Control. Public Finances. Accounting Information. Popular Participation.


Transparency.

1. Introdução
Na administração pública brasileira, a Constituição Federal (CF)
garante o exercício da fiscalização contábil, financeira, orçamentária,
operacional e patrimonial, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade,
aplicação das subvenções e renúncias de receitas, pelo Poder Legislativo,
mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Além da obrigatoriedade imposta pelo constituinte, tornam-se nece-
ssários o planejamento, o controle, a transparência e a responsabilização
pelos atos administrativos praticados pelo ente público, sobretudo quando

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se contrapõem a interesses públicos, como o respeito aos direitos funda-


mentais do homem.
Nesse sentido, instrumentos operacionais que permitam a otimização
da responsabilidade na gestão fiscal fazem-se cada vez mais importantes
aos gestores públicos, preocupados com a efetividade da aplicação do
dinheiro público, na busca ao atendimento dos anseios sociais.
Diante disso, o controle torna-se ferramenta importante, em especial,
quando associado ao princípio da transparência das contas dos entes
públicos e seus órgãos da administração direta e indireta. Permite a melhor
fiscalização pelos órgãos de controle externo, seja ele exercido pelo Poder
Legislativo ou diretamente pela população, constituindo-se o controle
social, a origem de legitimação das políticas públicas e do próprio direito.
Dessa forma, mais do que assegurar o cumprimento de preceitos legais,
a função transparência na administração pública constitui instrumento a ser
considerado no desenvolvimento de uma política de gestão responsável que
apoia o exercício da cidadania através do controle social.
Assim, a problemática da informação na gestão pública passa a ser
relevante quando associada, sobretudo, à aplicabilidade do controle externo
estatal, com enfoque no exercício social. Os reflexos desses elementos na
esfera pública justificam o desenvolvimento de um estudo sobre esse tema,
que tem como objetivo principal estudar a informação como ferramenta de
auxílio no exercício do controle social.

2. Procedimentos Metodológicos
No âmbito da Contabilidade é usual classificar as pesquisas em três
tipos distintos: quanto aos seus objetivos, quanto aos procedimentos
utilizados e quanto à abordagem do problema (MACHADO; BIANCHI;
GIBBON, 2007). Assim, do ponto de vista dos procedimentos utilizados, a
pesquisa a ser apresentada é de cunho bibliográfico, pois foi organizada
com base em material já elaborado, como livros, artigos científicos e publi-
cações periódicas. Quanto à forma de abordagem do problema, a pesquisa
é qualitativa. Quanto aos objetivos propostos, trata-se de uma pesquisa
exploratória, pois, segundo Alves (1991 apud BÚRIGO; ZANELLI, 1997,

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p. 20-21), visa “proporcionar, através da imersão do pesquisador no


contexto, uma visão geral e não enviesada do problema considerado, e
contribuir para a focalização das questões e a identificação de informantes
e outras fontes de dados”.
Com o intuito de se alcançar o objetivo principal desta pesquisa, que
é o estudo da informação como ferramenta de auxílio no exercício do
controle social, este trabalho será organizado em quatro seções, baseadas
nos objetivos específicos que se pretende alcançar, sendo realizada uma
fundamentação teórica para a constituição da abordagem do problema.
Nas seções são abordadas as seguintes questões: Contabilidade Pública,
as bases da Lei de Responsabilidade Fiscal, o princípio da transparência
administrativa e a informação contábil como meio de assegurar a partici-
pação popular.
No que tange às limitações, Marconi e Lakatos (1990, p. 270) referem
que
a pesquisa pode ser limitada em relação: ao assunto,
selecionando um tópico, a fim de impedir que se
torne ou muito extenso ou muito complexo; à
extensão, porque nem sempre se pode abranger todo
o âmbito onde o fato se desenrola; a uma série de
fatores, meios humanos, econômicos e de exigüidade
de prazo, que podem restringir o seu campo de ação.
Nesse sentido, o presente estudo possui restrições impostas em
relação ao tema. Isso porque a pesquisa será direcionada a abranger,
exclusivamente, os objetivos propostos. Outra limitação decorre do fato de
ser, este estudo, de cunho essencialmente teórico. Consequentemente, isto
implicará na ausência de uma pesquisa de campo.

3. Fundamentação Teórica

3.1 A Contabilidade Pública


A ciência da Contabilidade surgiu da necessidade de o ser humano
controlar o seu patrimônio, que é definido por Franco (1997, p. 36) como

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“(...) a riqueza, individual ou coletiva, imprescindível à satisfação das


necessidades humanas e à vida em sociedade”. Tem como objeto de estudo
analisar, interpretar, compreender, comparar e controlar o patrimônio, ou
seja, tem como princípio entender a dinâmica patrimonial organizacional
no contexto social na qual está inserida.
A Contabilidade Pública, por sua vez, estuda, orienta, controla e exibe
a organização e execução do patrimônio público e suas variações. O art. 83
da Lei n.o 4.320, de 17 de março de 1964, que instituiu normas gerais de
direito financeiro para elaboração e controle dos orçamentos e balanços da
União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, dispõe que “a
contabilidade evidenciará perante a Fazenda Pública a situação de todos
quantos, de qualquer modo, arrecadem receitas, efetuem despesas,
administrem ou guardem bens a ela pertencentes ou confiados”.
Silva (2008, p. 15) afirma que a Contabilidade Pública
(...) não pode ficar adstrita ao objetivo de prestação
de contas, pois deve estudar formas que permitam o
controle efetivo da gestão do governo e, ainda, pesquisar
alternativas que auxiliem o processo decisório,
buscando sempre a transparência (...) para que todos
os cidadãos possam compreender a ação dos
governantes (...).
Para Lima e Castro (2007, p. 1-2),
a Contabilidade Pública é o conhecimento especializado
da Ciência Contábil que aplica no processo gerador
de informações os conceitos, princípios e normas
contábeis na gestão patrimonial de uma entidade
governamental, de sorte a oferecer à sociedade
informações amplas e acessíveis sobre a gestão da
coisa pública.
Assim, a Contabilidade Pública não deve, apenas, servir de suporte
para a prestação de contas do administrador dentro dos preceitos
constitucionais e legais. Deve ir além disso. Acredita-se que deva incumbir-
se de incentivar conhecimentos que admitam o controle efetivo da gestão
governamental, apoiada em um processo de decisões administrativas que
busque a garantia do princípio constitucional da transparência, por meio da

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disponibilização ampla e acessível de informações inteligíveis à população,


como meio de defesa dos princípios constitucionais fundamentais.

3.2 As Bases da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF)


A Lei Complementar n.o 101, de 4 de março de 2000 (LRF), que
objetivou estabelecer normas de finanças públicas voltadas para a
responsabilidade na gestão fiscal, é a regulamentação do art. 163, da CF, ao
tratar das finanças públicas e “(...) estabelecer um ‘regime de gestão fiscal
responsável’” (VERÍSSIMO, 2005, p. 1).
Para Gattringer (2005, p. 48), a LRF “(...) traduziu-se num código de
conduta gerencial para todos os administradores públicos do país, assim
como estabeleceu limites para a dívida pública e gastos com despesas de
pessoal por nível de governo e Poder”.
Para atingir o seu propósito, a LRF tem o seu alicerce em quatro
pilares: planejamento, controle, transparência e responsabilização ou
sanções. O planejamento, para Veríssimo (2005, p. 2),
(...) dará suporte técnico à gestão fiscal, através de
mecanismos operacionais, como o Plano Plurianual –
PPA (...), a Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO e
a Lei Orçamentária – LOA. Por meio desses instru-
mentos, haverá condições objetivas de programar a
execução orçamentária e atuar no sentido do alcance
de objetivos e metas prioritárias.
Fernandes (apud CASTRO, 2000, p. 22) afirma que os sistemas de
controle têm a tarefa de “(...) tornar efetivo e factível o comando legal,
fiscalizando a direção da atividade administrativa para que ocorra em
conformidade com as novas normas”.
A responsabilização impõe ao gestor público o cumprimento da lei,
sob pena de responder por seus atos e sofrer as sanções previstas em lei,
conforme disposto no art. 73, da LRF.
Por fim, por meio da transparência, colocar-se-á “(...) à disposição da
sociedade diversos mecanismos de cunho democrático, entre os quais
merecem relevo: a participação em audiências públicas e a ampla divul-

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gação das informações gerenciais (...)” (KRAEMER, 2002, p. 4 apud


LOPES; SLOMSKI, 2004, p. 4).

3.3 O Princípio da Transparência Administrativa


A CF de 1988 estabeleceu “(...) princípios e regras tendentes a assegurar
os direitos fundamentais dos cidadãos e os deveres de transparência do
Estado, que, em última instância, decorrem da própria noção do que seja
‘Estado Democrático de Direito’”, conforme destaca Veríssimo (2005, p. 3).
Nesse sentido, o princípio republicano e o princípio do Estado Demo-
crático de Direito, princípios constitucionais fundamentais dispostos no art.
1º da CF, impõem que se entenda a administração pública como instituição
que tem por fim o interesse público como aspiração de todos e para todos,
de forma legítima, sem privilégios ou distinções; reclamam a prestação de
contas dos gestores públicos, a transparência administrativa, a otimização
dos instrumentos de controle sobre a administração pública e poder público
e a escolha de fins públicos verdadeiros e legitimados pelo interesse comum
do povo; implicam, especialmente, o respeito ao conjunto dos direitos
fundamentais pertinentes ao homem, que devem constituir padrões de
conduta para os gestores e para as instituições administrativo-públicas
(ESPÍNDOLA, 2004).
Contudo, mesmo com a exigência constitucional de que os direitos
fundamentais do homem devem integrar o modelo de comportamento dos
gestores públicos, uma grande parcela da população ainda encontra-se
marginalizada por, sobretudo, não conseguir ascender aos direitos sociais
que asseguram o atendimento das suas necessidades vitais básicas e de sua
família, como: moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário,
higiene, transporte e previdência social.
A realização da democracia, na qual os indivíduos gozam das condições
mínimas de existência, tem como base a participação política, aberta aos
cidadãos que tenham acesso à informação, para que apresentem as suas
ideias, influenciem na manifestação de políticas públicas, participem da
tomada de decisão e estejam habilitados a utilizar instrumentos de controle
de legalidade, legitimidade e licitude, determinados pela ordem jurídica
vigente (ESPÍNDOLA, 2004).

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Dessa forma, como expõe Veríssimo (2005, p. 3), o princípio da


transparência “(...), inicialmente, concretizado na Carta Maior, (...) asse-
gura, por exemplo, a todos o direito de [receber] dos órgãos públicos
informações (dados) de interesse particular ou de interesse coletivo ou geral”.
Assim, uma das formas de se atingir o bem comum, que é a razão de
existência do Estado, conforme afirma Slomski (2007), é dar suficiente
publicidade aos seus atos, com a devida prestação de contas à população.
Porém, não basta ser assegurada a publicidade. Deve-se, também, garantir
a transparência, de forma clara e compreensível a qualquer cidadão, indis-
tintamente, e possibilitando-lhe efetiva participação nas questões de ordem
pública de seu Município, Estado ou País (PLATT NETO et al., 2007).
A garantia da participação popular, cujo pilar de sustentação
encontra-se consagrado na CF, tem como objetivo o interesse comum. É o
direito de participação política da sociedade de decidir conjuntamente e
compartilhar a gestão pública, opinando sobre as prioridades e fiscalizando
a aplicação dos recursos públicos. Todavia, para que ela ocorra, é necessária
a conscientização da população no que se refere ao exercício da cidadania,
além do engajamento dos gestores públicos na transparência administrativa.
Na LRF, como afirma Veríssimo (2005, p. 4), a transparência “(...)
está assegurada pelo incentivo à participação popular e pela realização de
audiências públicas no processo de elaboração como no curso da execução
dos planos, da lei de diretrizes orçamentárias e dos orçamentos”.
Contudo, para que se alcance eficácia da participação popular nas
questões atinentes ao exercício da atividade pública, faz-se necessária a
preocupação com a compreensibilidade das informações, buscando-se
linguagem adequada, simples e acessível, também ao cidadão comum
(PLATT NETO et al., 2007).
Uma iniciativa que merece destaque no processo de tornar pública a
administração estatal e construir um instrumento de promoção da
transparência e incentivo a participação e controle social é o Portal da
Transparência (<www.portaldatransparencia.gov.br>), criado em 2004, pela
Controladoria Geral da União (CGU). Em linguagem simples, o Portal da
Transparência traz dados e informações exatas, tempestivas e completas
sobre a aplicação dos recursos públicos federais, além de um canal de

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comunicação, do tipo “Fale Conosco”, no qual os usuários podem sanar


suas dúvidas e obter orientações sobre a acessibilidade do portal e do
conteúdo disponível.
Outro elemento importante para a transparência das contas públicas é
a confiabilidade das informações fornecidas aos usuários. Em não havendo
a garantia de veracidade do conteúdo que é divulgado, perderia a razão toda
a preocupação pela eficácia das informações, prejudicando a participação e
controle popular nas ações governamentais, especialmente, naquelas
referentes às contas públicas (PLATT NETO et al., 2007).
Diante disso, Janny Teixeira e Santanna (1994 apud SLOMSKI,
2003, p. 437-438), afirmam que:
A Administração Pública e suas entidades, em certo
sentido, “pertencem” aos cidadãos. No entanto, não
há, entre nós, em geral, canais adequados para que os
cidadãos façam ouvir suas reivindicações, nem há
meios efetivos de informação sobre o que se passa
dentro da administração pública. Daí agravar-se a larga
margem de insatisfação popular para com os serviços
prestados pelo Estado e a desconfiança do público
em geral sobre a forma como são geridos os recursos,
pagos direta ou indiretamente pela população.
O princípio da transparência das informações contábeis impõe ampla
divulgação, mesmo em meios eletrônicos de acesso público, como a
Internet. Trata-se de mais um meio de divulgação de informação das contas
públicas aos diversos usuários, sendo este mais um importante elemento
para aumentar a publicidade das ações governamentais e uma ferramenta
democrática de capacitação política da sociedade (PLATT NETO et al.,
2007).
A efetividade nas comunicações públicas deve obedecer ao binômio
publicidade-transparência. A publicidade denota divulgação, disseminação
de alguma informação; a transparência imprime clareza e veracidade do
documento publicado. Esse é o escopo da LRF no que concerne à questão
da transparência das contas públicas, buscando mecanismos para inserir os
cidadãos no contexto dos atos da administração pública, exercendo, assim,
um controle externo das atividades.

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Ainda, como concluído por Veríssimo (2005, p. 6-7):


(...) a transparência buscada pela LRF tem por objetivo
permitir à sociedade conhecer e compreender as contas
públicas. Logo, não basta a simples divulgação de
dados. Essa transparência buscada pela lei não deve
ser confundida com mera divulgação de informações.
É preciso que essas informações sejam compreen-
didas pela sociedade e, portanto, devem ser dadas em
linguagem clara, objetiva, sem maiores dificuldades.
No Brasil, país com grande extensão territorial e diversidade cultural
expressiva, as variantes da língua portuguesa são características a serem
consideradas, até no acesso à informação sobre os gastos públicos pelos
portais de governo. Embora louvável a iniciativa da CGU, pelo Portal da
Transparência, há, ainda, a necessidade de disseminação da informação
considerando as linguagens típicas regionais, facilitando a sua compreensão
e contrapondo-se à ideia de uma informação uniforme por todos os “brasis”.
Nesse sentido, Dias Filho (2000, p. 38) destaca que “(...) a
compreensibilidade das informações geradas pela Contabilidade é um dos
requisitos necessários para que ela cumpra bem a sua missão”. Assim, uma
linguagem inteligível é fator primordial para que o usuário da informação
contábil compreenda o seu conteúdo.

3.4 A Informação Contábil como Meio de Assegurar a Participação


Popular
A comunicação sempre foi utilizada pelo homem, enquanto ser social,
como forma de criar relações e desenvolver-se ao longo da história (DIAS et
al., 2004). Contudo, mais do que discutir a importância da comunicação, é
primordial que se avalie a qualidade da informação estabelecida entre o emissor
e o receptor.
Se a função da Contabilidade é, conforme salientam Dias Filho e
Nakagawa (2001, p. 47), “(...) facilitar a tomada de decisões, o mínimo que se
pode esperar das demonstrações contábeis são informações claras e
compreensíveis, a fim de que o usuário possa identificar as alternativas de ação
e selecionar a que mais se afine com seus objetivos.”

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Assim, por ser a evidenciação o meio pelo qual a Contabilidade alcança


o seu objetivo maior, que é, conforme explica Dias Filho (2000, p. 40), “(...)
comunicar aos seus usuários informações relevantes para orientar decisões.
(...) a evidenciação precisa ser ‘justa, adequada e plena’, para permitir uma
compreensão satisfatória de todos os elementos contábeis que possam
influenciar as decisões.”
Contudo, diversos autores, quando abordam a questão da percepção da
informação contábil, esclarecem que o usuário também é responsável por
compreendê-las. Hendriksen e Van Breda (2007, p. 515) afirmam que “a
quantidade de informação a ser divulgada depende, em parte, da sofisticação
do leitor que a recebe”.
Corrobora com esse entendimento Dias Filho (2000, p. 39), ao
reconhecer que “(...) a inteligibilidade da informação depende também das
características do usuário, toda a abordagem ficará vinculada à premissa de
que ele possui alguma experiência suficiente para compreender o conteúdo de
demonstrativos contábeis”.
O Financial Accounting Standards Boards (FASB) (apud
HENDRIKSEN; VAN BREDA, 2007, p. 515) acredita que a informação,
conhecida por meio dos relatórios financeiros, deve ser “compreensível para
os que possuem um conhecimento razoável de negócios e atividades
econômicas e estão dispostos a estudar a informação com diligência razoável”.
Nesse mesmo sentido, Platt Neto et al. (2007, p. 82) sustentam, com
base nas fontes pesquisadas, que “(...) o usuário também é responsável pela
compreensão da informação, devendo, caso precise, estar disposto a estudar o
tema. Todavia, o responsável primário da compreensibilidade das informações
é a entidade que as divulgam”.
Dessa forma, como bem salientam Platt Neto et al. (2007), cabe às
entidades promover, da melhor forma possível, a compreensibilidade das
informações. Porém, cumpre salientar que, no que concerne à administração
pública, compete a ela impulsionar a maior abrangência possível das
informações, sejam elas contábeis ou não, como forma de alcance da
transparência e, com isso, possibilitando e realizando o controle social.
Para tanto, deve a administração pública construir um Estado no qual os
cidadãos possam participar de forma efetiva na discussão da melhor aplicação

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do dinheiro público para o cumprimento da função básica estatal de responder


pelas necessidades dos cidadãos.
Nesse sentido, o Comitê Interino da Assembleia de Governadores do
Fundo Monetário Internacional, em 1998, criou o Código de Boas Práticas
para a Transparência Fiscal, que, conforme destaca Porto, Castro e Perottoni
(2006, p. 3), “(...) representou o consenso acerca de pontos considerados
essenciais para a boa administração dos recursos públicos”.
Os denominados objetivos-chave desse Código são divididos em quatro
objetivos principais:
(...) i) definição clara de funções e responsabilidades:
distinção entre o setor público e o privado, limitação bem
definida entre uma esfera e outra, distribuição das respon-
sabilidades entre os setores que compõem o governo,
além de um suporte legal e administrativo para controlar
e governar a máquina pública; ii) acesso público à
informação: colocar à disposição da sociedade todas as
informações possíveis acerca da atividade estatal, que, além
de ser periódica, deverá também ser de fácil compreensão;
iii) preparação de orçamento aberto, execução e
relatório: delineia como devem ser preparados e
executados os orçamentos, bem como estabelece o
modo de apresentação à sociedade; iv) garantia de
integridade: além de estar a informação sujeita à
análise pública, deverá também ser analisada por uma
auditoria independente, de forma a garantir a segurança
e a integridade das atitudes tomadas pelos mandatários
(PORTO; CASTRO; PEROTTONI, 2006, p. 6).
Assim, a transparência como princípio inerente à administração pública,
considerando-se, sobretudo, o acesso público à informação, não se encontra
respaldado apenas pelo sistema público financeiro brasileiro, mas também
pelo apoio do Fundo Monetário Internacional, que, mesmo se tratando de um
órgão internacional, apresenta preocupação com uma gestão fiscal
responsável, comprometida com os resultados e com a própria sociedade.
Sobre o nível de divulgação, Hendriksen e Van Breda (2007, p. 515) men-
cionam que “três conceitos de divulgação são geralmente propostos: divulgação
adequada, justa e completa”. De acordo com os autores (2007, p. 515):

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Minas Gerais, Belo Horizonte, v. 22, n. 3, p. 163-184, jul./set. 2011.
A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio no Exercício do Controle Social

A mais comumente utilizada dessas expressões é a


divulgação adequada, mas isso pressupõe um volume
mínimo de divulgação compatível com objetivo negativo
de evitar que as demonstrações sejam enganadoras.
Divulgação justa e completa são conceitos mais
positivos. A divulgação justa subentende um objetivo
ético de tratamento eqüitativo de todos os leitores em
potencial. Divulgação completa pressupõe a divulgação
de toda informação relevante.
Platt Neto et al. (2007, p. 83) salientam que “no que tange à informação
completa, vale a ressalva de se evitar o excesso de informações prejudicial ao
entendimento. Nessa situação, informações sem importância podem ocultar as
que realmente importam aos usuários”.
Entendimento esse de Hendriksen e Van Breda (2007), que inferem que,
idealmente, a informação deve compreender os três conceitos de divulgação,
em um contexto apropriado. Hendriksen e Van Breda (2007, p. 515) dizem que
“(...) a informação que não é importante ou relevante é omitida para tornar as
apresentações significativas e compreensíveis”.
No que se refere às contas públicas, há muitas formas de divulgação e
inúmeras opções de meios de comunicação para assegurar a sua ampla
publicidade. Platt Neto et al. (2007) apresentam uma lista de meios para
geração de publicidade, na qual os meios foram classificados conforme a sua
natureza e semelhança, como demonstrado no Quadro 1, a seguir:
Quadro 1: Lista de meios para geração de publicidade
Classificação Listagem de meios
Meios impressos Jornais, revistas, outdoors, cartazes, murais, folhetos, cartilhas e
Diário Oficial.
Página do município, Links e banners em páginas de interesse social
Via Internet do município, e-mails para cidadãos que se cadastrarem e formação
de grupos de discussão.
Meios presenciais Reuniões comunitárias e audiências públicas.
Televisão e rádio Horário eleitoral, publicidade e pronunciamentos oficiais.
Meios inovadores Painéis eletrônicos na rua e em prédios públicos, cartilhas de
cidadania nas escolas (em todos os níveis de ensino).
Fonte: Platt Neto et al. (2007, p. 88).

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COELHO, Mary Cristine; CRUZ, Flávio da; PLATT NETO, Orion Augusto

Cumpre descrever a observação feita pelo Conselheiro do Tribunal de


Contas do Estado de Santa Catarina (TCE-SC), Salomão Ribas Júnior (apud
PLATT NETO et al., 2007, p. 88), “(...) a melhor maneira de tornar uma
informação secreta é publicá-la no Diário Oficial”. Ou seja, “(...) nem tudo que
é público é acessível à população” (Platt Neto et al., 2007, p. 88).
No que diz respeito às propriedades da informação útil aos usuários, o
Conselho de Padrões Contábeis (apud HENDRIKSEN; VAN BREDA, 2007,
p. 95) afirma que
(...) usuários sofisticados poderiam considerar alguma
informação irrelevante porque já a conhecem. (...)
poderiam considerar informações complexas mais
relevantes do que os novatos. Assim sendo, a natureza
do usuário é um fator determinante crucial para a
decisão a respeito da informação a ser divulgada. Como
a inteligibilidade ou a compreensão da informação
proposta depende da natureza do usuário, esta caracte-
rística é classificada como específica ao usuário.
Assim, o reconhecimento de qual a informação adequada para determi-
nado usuário é fator a ser considerado para a sua compreensão. Nesse sentido,
Iudícibus (1993, p. 24-25) afirma que o
(...) processo de comunicação implica o reconhe-
cimento dos tipos de informação necessária para cada
principal usuário da informação contábil e a avaliação
da habilidade dos usuários em interpretar a informação
adequadamente. (...) procura entender as necessidades
expressas de cada usuário e fornecer uma resposta
adequada, com a única ressalva de que envolve, por
parte do contador, um entendimento sobre as restrições
do usuário, para utilizar uma grande gama de infor-
mações, e sobre as restrições de mensuração da própria
Contabilidade. Realça, assim, a noção de relevância,
talvez uma das poucas formas de delimitar a quantidade
e a qualidade da informação prestada; caso contrário,
não saberíamos quais os limites a serem impostos à
comunicação e à informação. Envolve um processo de
participação entre usuário e Contabilidade e uma noção

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A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio no Exercício do Controle Social

sistêmica da Contabilidade dentro do processo ou


sistema de informação empresarial.
Especialistas em comunicação, de acordo com Dias Filho (2000, p. 41),
defendem que “(...) o contexto ambiental e algumas características pessoais
são variáveis que devem ser consideradas no processo de evidenciação”.
Isso, no setor governamental, torna-se ainda muito mais relevante se
considerarmos uma pesquisa junto a administradores de empresas situadas na
Região Metropolitana de São Paulo, desenvolvida por Silva (1995 apud DIAS
FILHO, 2000), cuja preocupação central foi observar se o código linguístico
utilizado pela Contabilidade estava sendo entendido pelos usuários das
informações contábeis. Segundo o autor (1995 apud DIAS FILHO, 2000, p.
43), considerou-se que os “(...) usuários possuíam conhecimentos razoáveis
para permitir-lhes uma boa compreensão do conteúdo dos demonstrativos
contábeis”, pois 90,8% da população pesquisada possuíam formação superior,
sendo 62,6% oriundos dos cursos de Economia, Administração e Ciências
Contábeis. Com a pesquisa, Silva (1995, apud DIAS FILHO, 2000, p.43)
concluiu que “(...) a Contabilidade emprega palavras que são desconhecidas
para os seus usuários, provocando uma subutilização dos demonstrativos
contábeis”. E, como sugestão dos pesquisados, “(...) a Contabilidade deveria
adotar uma linguagem mais simples”, conforme destacado por Silva (1995
apud DIAS FILHO, 2000, p. 43).
Assim, considerando-se que a administração pública deve promover
todos os meios para assegurar à participação popular, como forma de defesa
dos interesses dos cidadãos, a sugestão proposta por alguns estudiosos no
trabalho desenvolvido por Dias Filho (2000, p. 45) é de “[...] que a empresa
divulgue dois conjuntos de demonstrativos contábeis em cada período: um
obedeceria aos moldes convencionais e o outro adotaria uma linguagem mais
simplificada e compreensível.” Seria esta, uma solução de grande valia para a
transparência e, acima de tudo, compreensibilidade, das contas públicas.
Nesse sentido, Platt Neto et al. (2007, p. 76) mencionam que “a
participação popular, alicerce do controle social, depende fortemente da
transparência das ações governamentais e das contas públicas, pois sem
informação as decisões são prejudicadas”.
Cruz (2007, p. 160) sugere ainda que

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COELHO, Mary Cristine; CRUZ, Flávio da; PLATT NETO, Orion Augusto

(...) a administração pública deveria, por meio de seus


órgãos de controle externo, efetivar o princípio da
publicidade e estimular didaticamente a participação
dos cidadãos no julgamento das contas públicas.
Assim, o conhecimento prévio do conteúdo a julgar
traria expectativas e vigilância.
Assim, a sociedade civil agiria como copartícipe no processo de fiscali-
zação e controle do patrimônio público, aumentando o retorno, a credibilidade
e, sobretudo, o compromisso do ente estatal para com os anseios sociais.
Hoje, nas audiências públicas, não se observa a presença da sociedade
civil, demonstrando, efetivamente, a ausência de desejo de transparência das
contas públicas, o que pode ser ocasionado pela dificuldade de compreensão
da informação contábil disponibilizada (CRUZ, 2007).
Nesse sentido, Coelho e Cruz (2009) realizaram uma pesquisa na qual
foram analisadas a divulgação, a realização e a participação popular nas
audiências públicas estabelecidas nas LRF, em 22 municípios do Estado de
Santa Catarina. Com a aplicação de um questionário ao contador ou controlador
interno da Prefeitura ou Câmara Municipal, os autores observaram que a
participação popular nas audiências públicas é incipiente. Comparando-se a
participação média nas audiências públicas com a população de cada Município,
os autores verificaram que nem um por cento da população participa de
audiências públicas, cuja participação ficou entre 0,01% e 0,92% da população.
Na mesma pesquisa, Coelho e Cruz (2009) ressaltaram a importância do
preparo de material com linguagem acessível à população, sugerindo,
inclusive, a utilização de revistas em quadrinhos, músicas, apresentações
teatrais, palestras de orientação, atividades ou apresentações culturais relativos
ao tema ou demais temas de interesse, como forma de atrair a população.
Ainda, Cruz (2007) propõe o uso da Internet como alternativa rápida e
eficiente de comunicação, no exato momento em que se percebe a existência
de determinada irregularidade. Uma vez tomado conhecimento, o responsável
adotaria medidas corretivas para desfazer o erro, falhas e omissões, evitando a
continuidade dos desperdícios.
Há de se salientar Porto, Castro e Perottoni (2006, p. 15), ao
(...) admitir que o acesso à Internet no Brasil ainda é

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A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio no Exercício do Controle Social

restrito, mas, ao mesmo tempo, cumpre destacar que


existe um processo rápido e irreversível de expansão da
rede mundial de computadores e que as administrações
brasileiras têm tomado medidas louváveis a fim de
facilitar o acesso da população à Internet.
Contudo, mesmo que esteja ocorrendo a expansão de acessos à Internet,
ainda é inexpressiva a parcela da população que é usuária dessa ferramenta de
comunicação e informação. Platt Neto (2002) afirma que “menos de 8% da
população brasileira é usuária da Internet (...) Desses usuários, grande parte
ainda desconhece os potenciais da rede mundial de computadores e as páginas
governamentais não estão em sua rotina na navegação, mesmo por questões
culturais”.
Porém, embora seja pequeno o percentual de usuários da Internet no
Brasil, ela foi o recurso utilizado, recentemente, pela Lei Complementar nº
131, de 27 de maio de 2009, ao alterar o art. 48 da LRF, obrigando a “liberação
ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real, de
informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em
meios eletrônicos de acesso público”.
Dessa forma, a Lei Complementar nº 131 contrapõe a visão contábil
conservadora de preocupação com o resultado financeiro da execução
orçamentária e exigências da prestação de contas no encerramento do
exercício ou do mandato, conforme menciona Reis e Machado Jr. (1996).
Passa-se a vislumbrar uma contabilidade governamental de cunho gerencial e
ponto de vista informativo, sendo a transparência o instrumento legitimador
das ações governamentais.
De acordo com Porto, Castro e Perottoni (2006, p. 5) trata-se de
aprimorar
(...) o conceito de democracia. (...) da cidadania em forma
de participação da sociedade nas decisões do processo
administrativo. Mais do que dar voz à população e
permitir a sua interveniência no processo decisório dos
atos da administração pública, a participação popular –
aqui avalizada por meio do princípio da transparência –
busca dar legitimidade às ações intentadas pelo Poder
Público.

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COELHO, Mary Cristine; CRUZ, Flávio da; PLATT NETO, Orion Augusto

(...) é mister que todos os partícipes deste processo


estejam informados o suficiente, a ponto de permitir a
contribuição e a apreciação de cada um, de modo que
suas opiniões influenciem verdadeiramente tal
procedimento de tomada de decisões.
Assim, o acesso à informação compreensível é ferramenta fundamental
ao auxílio da aplicabilidade do controle externo estatal, realizado pela
participação popular. Permite a inclusão do cidadão no processo de tomada de
decisões e controle da administração pública, viabilizada pelo princípio da
transparência, considerado um dos pilares do exercício da democracia moderna.
Democracia esta que busca o fortalecimento da cidadania, conduzindo a
sociedade civil a participar diretamente da gestão pública, seja na fiscalização,
na execução orçamentária ou no exercício do controle social.

4. Conclusões e Recomendações para Estudos Futuros


Na atualidade, diante dos altos graus de endividamento dos entes da
Federação, dos inúmeros casos de escândalos políticos divulgados pela
imprensa, da elevada carga tributária, sem a correspondente contrapartida
de satisfação das necessidades básicas, como saúde, segurança, educação,
saneamento, entre outros, e, especialmente, por um início de conscien-
tização política dos cidadãos, que sentem a necessidade de legitimar o seu
direito a uma “democracia participativa”, o controle dos gastos públicos
parece ser a maior preocupação.
Nesse sentido, a transparência, um dos pilares da democracia moderna,
é um dos meios proclamados pela população para viabilizar os valores de
cidadania. Porém, uma das condições fundamentais para que ocorra uma
efetiva transparência das contas governamentais e o consequente fortale-
cimento do controle social sobre a administração pública, é de que as
informações disponibilizadas ao cidadão sejam compreensíveis e relevantes.
Diante disso, a Contabilidade tem papel fundamental, visto que tem
como missão fornecer aos seus usuários informações relevantes para
orientar as suas decisões. Dessa forma, pode-se afirmar que, hodierna-
mente, a Contabilidade é uma ciência capaz de disponibilizar aos cidadãos
informações justas, adequadas e plenas, possibilitando, assim, uma

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A Informação Contábil como Ferramenta de Auxílio no Exercício do Controle Social

compreensão satisfatória dos atos e fatos públicos que permeiam as


decisões políticas e que interferem diretamente em toda a vida social.
Compreendendo a realidade que se quer transmitir, o usuário da
informação pública poderá se respaldar nos princípios balizadores da LRF
para participar diretamente do controle externo social, não permitindo que
a fiscalização dos gastos públicos seja feita, exclusivamente, por órgãos
fiscalizadores e de representatividade.
Cabe, também, à sociedade, não o dever, como considerados por
muitos, mas o direito de fiscalizar a real aplicação do “seu dinheiro”,
constituindo a informação um instrumento primordial para tanto.
Portanto, a informação é ferramenta de auxílio da aplicabilidade do
controle externo estatal, possibilitando, por intermédio de sua compreensi-
bilidade, a efetividade do controle social, atuando a sociedade como partícipe
no processo de uma gestão fiscal responsável.
Para estudos posteriores, recomenda-se a análise das características
qualitativas das informações das contas públicas, com aplicação de pesquisas
diretamente com os usuários das informações contábeis, contemplando uma
visão multidimensional de compreensibilidade.
Sugere-se, também, a realização de pesquisas que visem à identificação
das informações relativas à gestão pública que os cidadãos consideram que
melhor contribuam na evidenciação das contas públicas, com vistas a
construir um modelo complementar de prestação de contas capaz de atender
efetivamente as necessidades de informação dos cidadãos e, consequentemente,
melhorando a transparência das contas públicas, requisito essencial do
exercício do controle social.

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