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que é encontrada na propaganda feita na mídia, A freqüente busca pela felicidade

prometida pelos antidepressivos através do slogan "pílulas da felicidade" faz com que
. as pessoas, a cada dia mais, escamoteiem em seus discursos elementos que poderiam,
no mínimo, produzir questionamentos sobre seu estado psíquico. O ser humano
parece ficar reduzido à deficiência de neurotransmissores, que são repostos através
da ingestão de pílulas de "última geração". A revolução medicamentosa parece ter a
intenção de fabricar um novo homem proposto aos moldes do ideal social, embora
ainda não tenha sido fabricada uma medicação que cure uma "doença" psíquica. As
alterações do humor passam a ter, especificamente no arsenal psiquiátrico, uma
variação de nomes em seus manuais de classificação - cujo significante pivô é o
"transtorno depressivo" -, e a evitação de seu sofrimento torna-se banalizada.
Em "O mal estar na civilização'", Freud afirmou que a droga seria uma forma
tosca de narcotizar o sofrimento humano. A angústia e a tristeza, sofrimentos
inerentes aos seres falantes, são cada vez mais, na atualidade, medicados com
ansiolíticos na intenção de barrar o sofrimento. A ciência quer um escravo da
medicação e quem ganha com isso é a indústria farmacêutica, fazendo promessas
de cura da depressão rumo à produção da felicidade de forma artificial, eliminando
do sujeito a possibilidade de se engajar com seu desejo. Assim, ele segue iludido,
com a concepção de uma falsa felicidade, imposta pelo consumo indiscriminado
de drogas, que vem constituindo uma nova modalidade de gozo, uma espécie de
permissividade para um novo tipo de toxicomania.
As posições subjetivas, a particularidade de cada sujeito em relação ao desejo,
são desconsideradas numa clínica psiquiátrica que pretende a generalização e, por
conseqüência, a banalização do sofrimento humano. Assistimos aos consumidores
de drogas, à compulsão alimentar, às crises de pânico, às fobias, à enurese e até
mesmo à angústia neurótica serem tratados com antidepressivos. Uma das únicas
maneiras possíveis de fazer o sujeito interromper o uso medicamentos o é quando
os incômodos decorrentes dos efeitos colaterais demandam dele uma atitude que
leva a seu abandono. Em um atropelo coletivo, a ciência segue esquecendo que o
desconforto produzido internamente continuará a se estender em uma história.
Tratado como depressivo, o sujeito fica "viciado" na ingestão de pílulas como
objeto de satisfação. Embora a medicação não impeça que o tratamento analítico
prossiga, desde que não seja uma dose que cale o sujeito, a medicação vem se tornando
mais um sintoma da modernidade. Não tenho a intenção de descartar os benefícios

I FREUD, Sigmund. "O mal-estar na civilização" (1929). Em: Obras completas, vol. XXI. Rio de
Janeiro: Imago, 1977, p. 93.

206 Saber, verdade e g07

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