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1. Introdução
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Doutor em Educação, pela Universidade de São Paulo (USP), diretor-fundador do Instituto Paulo
Freire, Secretário Geral do Fórum Mundial dos Institutos Paulo Freire e Diretor do Programa de Pós-
Graduação em Educação, da Universidade Nove de Julho, em São Paulo. E-mail: jer@terra.com.br.
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Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Juiz de Fora e doutoranda em Educação na
Universidade Nove de Julho (Uninove). E-mail: natatcha.priscilla@gmail.com.
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Mas, o que se quer, neste artigo, é demonstrar como Fanon foi importante
inspirador do que se transformaria em um dos eixos axiais da ação e do pensamento
freiriano: a defesa incondicional dos direitos e dos interesses do oprimido, dos
“esfarrapados da terra”, como escreveria na epígrafe da Pedagogia do oprimido, ou
dos Condenados da terra, como os chamaria Frantz Fanon no título de sua obra
máxima.
1. Traços Biográficos
a busca da própria identidade negra, em 1943, Fanon deixou a Martinica para lutar, ao
lado dos franceses contra os alemães. Esse movimento, demonstra a hesitação do
jovem martinicano entre combater os colonizadores e lutar pela libertação dos
colonizadores.
Diferentemente dele, outro líder do movimento anticolonialista africano,
Amílcar Cabral, não teve dúvidas sobre ser a luta anticolonial mais importante do que
a luta pelas liberdades na metrópole (v. ROMÃO, 2012, p. 26 e segs.).
A partir da ocupação nazista da França, pelo armistício de 22 de junho de
1940, nasceu a Résistance (Resistência). Essa iniciativa foi progressivamente se
estruturando em uma rede de movimentos nacionalistas franceses clandestinos,
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de sua tese Peau noire, masques blancs (Pele negra, máscaras brancas), rejeitada
pela banca examinadora, por atribuir a origem de várias patologias mentais ao
colonialismo. Tese rejeitada, teve de substituí-la por outro trabalho: Troubles mentaux
et syndromes psychiatriques dans l’hérédep-dégénération-spino-cérébelleuse - Un cas
de maladie de Friereich avec délire de possession (Transtornos mentais e síndromes
psiquiátricas em degeneração espinocerebelar hereditária – Um caso de doença de
Friereich com delírio de posse). É bom lembrar que, mais tarde, em 1952, Fanon
publicou Peau noire et masques blancs, que se tornou uma das mais importantes
obras referenciais da luta contra o racismo no século XX.
Em 1953, casou-se com Marie-Josèphe Dublé, chamada simplesmente de
“Josie”, mulher branca, nascida na França, para quem Fanon ditou, para que ela o
datilografasse, o livro que acabara de publicar.
Nomeado para o hospital militar de Blida, na Argélia, ainda em 1953, aí
permaneceu por cerca de dois anos. Com o início da Guerra da Argélia, em 1955,
engajou-se na luta da Frente de Libertação Nacional (FLN) e passou a lutar pela
independência daquela nação africana, por meio do movimento “Amizades
Argelinas”, que buscava apoiar as famílias dos prisioneiros políticos com problemas
psíquicos.
Com apoio da FLN, instalou-se na capital da Tunísia, mas continuou
participando ativamente da luta anticolonialista. Nomeado “embaixador itinerante da
África Negra” pelo governo provisório da Argélia, Fanon viajou por toda a África
Sahariana e, por essa época, em Ghana, foi-lhe diagnosticada a leucemia.
Lutando contra a doença, tratou-se nos dois lados da bipolaridade política do
mundo do pós-guerra: na “Cortina de Ferro” e na “Cortina de Dólar”. Buscou,
inicialmente, ajuda médica em Moscou, mas foi aconselhado a ir para os Estados
Unidos, onde haveria mais recursos. Segundo entrevista concedida pela viúva de
Fanon, ele foi para o hospital de Maryland a contragosto.
Com a vitória das forças argelinas e o cessar fogo de março de 1962, depois de
longas negociações, a França acabou por reconhecer a independência da Argélia, em 3
de julho do mesmo ano. Infelizmente, Frantz Omar Fanon não assistiu à vitória que
ajudara a conquistar, pois falecera em 6 de dezembro de 1961, em Bethesda,
Maryland, EUA. Porém, ainda conseguiu ver editada a obra-prima que escrevera
rapidamente antes que a doença o consumisse, Les damnés de la terre (Os
condenados da terra), publicada no mesmo ano de sua morte, aos 36 anos de idade.
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2. A Obra
eles “Marx, Lukács, Fromm, Gramsci, Fanon, Memmi, Sartre, Kosik, Agnes Heller,
M. Ponty, Simone Weill, Arendt, Marcuse...”
Na segunda citação, conta a anedótica experiência que viveu com camponeses
chilenos, na qual debateu com eles porque ele era doutor e os camponeses, não.
Completa o ocorrido, citando Fanon:
Esta passagem é uma das mais importantes da obra de Freire sobre o processo
de desalienação, que ele credita a Fanon. Na citação imediatamente subsequente,
acrescenta que, sobre o mesmo tema, deve-se consultar ainda Memmi e Sartre, dentre
outros, para se verificar o fenómeno da “‘aderência’ deste àquele, a dificuldade que
tem o(a) oprimido(a) de localizar o(a) opressor(a) fora de si, oprimido(a)” (p. 54). Dez
páginas adiante, da mesma obra, de novo destacando Fanon e Memmi que antes dele
teriam tratado do mesmo assunto, afirma a “aderência” do oprimido e da oprimida ao
opressor transforma-se, em geral, em medo concreto, inibindo a luta pela libertação
das garras da opressão.
Nas citações subsequentes da mesma obra e página, Freire lembra-se
novamente dos dois autores mencionados na citação anterior, quando analisa os
efeitos da leitura dos originais da Pedagogia do oprimido para um grupo de sul-
africanos, chegando à conclusão de que, em seu processo de desalienação, muitas
intuições se organizavam e se consolidavam, da mesma maneira que ocorrera com ele,
quando lera Fanon e Memmi. Contudo, adverte que a assunção de “uma nova
inteligência do mundo” não significa “porém que, por estar sendo percebido de forma
diferente, já tivesse sido o mundo transformado”, mas “que, por causa da nova
inteligência do mundo seria possível criar-se a disposição para mudá-lo” p. 72).
Em Pedagogia do oprimido (1987), volta a discutir a questão da “aderência do
oprimido ao opressor (p. 94), mencionando Fanon como fonte para essa discussão.
Finalmente, em Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar (1997),
fala das administrações dos sistemas educacionais autoritários nas professoras o
“medo à liberdade”, acrescentando:
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Referências Bibliográficas
FREIRE, Paulo. Ação cultural para a liberdade. 5. ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1981.
______. Pedagogia do oprimido. 17. ed., 22. reimp., Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.
______. Professora sim, tia não: cartas a quem ousa ensinar. São Paulo: Olho
d’Água, 1997.