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Frantz Fanon: Um revolucionário, particularmente negro.

Discente: Maria Eduarda Borges

Em uma breve apresentação, o livro trata da trajetória política de Frantz Fanon,


analisando desde a sua infância até a sua participação nos movimentos de libertação na
África. O autor Deivison Faustino procura mostrar a história de Fanon e a sua contribuição
para os debates sobre a resistência negra nos âmbitos políticos e intelectuais, debates
relacionados às lutas de libertação do continente africado e debates sobre subjetividade,
cultura e identificação do negro. O livro oferece uma síntese sobre a vida de Frantz Fanon,
que foi um médico psiquiatra, intelectual e revolucionário. Faustino traz vários debates
importantes no decorrer do livro, que nos ajuda a construir problemáticas acerca de temas
como racismo, violência, cultura, subjetividade, identidade, colonialismo e outros.
Faustino faz um livro bem elaborado com foco nos detalhes, narrativas e discussões
de teóricos para compreender quem foi Fanon e a sua importância na sociedade
contemporânea. O autor não segue à risca uma ordem cronológica sobre a vida e as obras de
Fanon, porém, nos primeiros capítulos do livro ele procura contextualizar a respeito de sua
infância, adolescência e juventude na Martinica, uma colônia francesa. No contexto
colonialista em que vivia, Faustino procura mostrar como Fanon, inserido neste cenário, luta
contra o racismo e os seus posicionamentos a respeito do movimento de negritude. O autor
oferece várias ferramentas e biografias para o entendimento dos contextos em que as obras de
Fanon foram escritas. Também, tem como objetivo despertar a curiosidade em pesquisar
sobre a vida e as obras de Fanon, e mostrar ao leitor a sua importância nos debates
contemporâneos sobre o racismo e a valorização de autores negros.
Para compreender as reflexões fanonianas é preciso entender a forma em que ele
expressa a sua originalidade em suas obras, de forma profunda e psicanalítica. Faustino cita
que no decorrer do livro ele irá trabalhar as obras de Fanon com a perspectiva do pensamento
da socionegia, que discute que os fatores de alienação do negro não é uma questão individual,
e sim algo econômico e social, também diz que os fatores sociais são elementos fundamentais
para entender e superar a influência colonial na sociedade. Essa superação só poderia ser
concebida a partir dos aspectos culturais, sociais e subjetivos da existência humana. As
escolhas políticas e teóricas nas obras de Fanon apontam um esforço em compreender a
complexidade da existência humana, considerando os fatores da subjetividade e o espaço
social do indivíduo.
Fanon demonstra em suas obras uma preocupação em cruzar saberes psicológicos,
psiquiátricos, psicanalíticos, filosóficos e sociológicos. O repertório de Fanon é composto por
vários conceitos, um deles é o conceito de colonialismo como uma questão social que
compreende dimensões políticas, econômicas, culturais e de dominação. Como psiquiatra, os
seus estudos estavam voltados também aos fenômenos psíquicos e suas dimensões. Faustino
inicia o livro levantando um debate sobre a visão que alguns teóricos possuem sobre a vida e
as obras de Fanon. O primeiro capítulo “Por que Fanon, por que agora?”, traz de volta uma
pergunta feita por esses teóricos que estudam sobre Fanon, e foi feita pela primeira vez por
Stuart Hall, a fim de debater sobre suas obras ao longo dos anos. A emergência e interesse em
estudar as obras de Fanon surge devido ao diferente contexto histórico, social e político, onde
os intelectuais buscavam entender de forma ampla e teórica o conjunto de suas obras.
Faustino também dedica alguns capítulos do livro para contar sobre a vida pessoal de
Fanon, conta que ele não tinha muitos amigos na Universidade por se tratarem de pessoas
majoritariamente brancas e que mantinha contato quando possível com os seus amigos e
família na Martinica. Também conta que em um período de relacionamentos casuais com
algumas garotas na universidade, acabou se envolvendo com uma estudante russa de origem
judia em 1947, tendo uma filha com ela. Fanon teve um contato bastante restrito com a filha,
que só foi apresentada à sua família 15 anos após a morte dele. Faustino também fala que
Fanon passou por um momento depressivo, uma vez que houve a gravidez não planejada, o
sentimento de ser deslocado na sociedade e dificuldade de se inserir no mundo branco da
universidade e também de se inserir no mundo negro.
No segundo capítulo “Os nossos pais, os gauleses”, Faustino aborda sobre a questão
da língua e a sua importância para Fanon. Nascido na Martinica, Fanon cresceu em meio às
perspectivas coloniais, que negavam a individualidade do ser e buscava a padronização, o
tornar branco. A Martinica por se tratar de uma parte ultramarina francesa, era composta por
negros descendentes do trabalho escravo e por uma pequena e rica aristocracia branca nativa,
que possuía grande parte dos meios de produção da ilha. Fanon fazia parte da classe média
negra, composta por funcionários públicos e pequenos proprietários de terra. Por se tratar de
um território considerado francês, o domínio da língua francesa era considerado algo
essencial para ser considerado um cidadão legítimo.
O colonialismo ensinava a sociedade que o padrão era ser e se sentir francês,
combinando nas exclusões raciais e de classe para aqueles que não dominavam a língua
francesa. Fanon descreve em sua obra “Pele negra, máscaras brancas” a forma em que o
jovem negro era ensinado nas escolas a identificar-se com o explorador, tratando os que não
falavam a língua francesa e falavam a língua crioulo como selvagens. A exaltação dos valores
europeus era o padrão social, pois pensava-se que o nativo não poderia governar a si próprio
e precisava de uma língua civilizada, que estava diretamente relacionada à uma estrutura de
classes. O padrão branco entrava no imaginário dos negros, fazendo com que aqueles que
eram mestiços pensassem que eram superiores e mais evoluídos comparados ao negro, por
estar mais próximo ao branco.
O uso da língua francesa esteriotipava e subestimava os povos da Martinica, que eram
desencorajados desde cedo a falar o crioulo em detrimento da língua francesa, fazendo com
que a língua originária desaparecesse gradualmente com o passar do tempo. Fanon escreveu
em suas obras que falar a língua nativa era uma forma de expressão da cultura dos povos
colonizados contra os colonizadores. Apesar de todo o esforço de Fanon, parecia ser em vão,
uma vez que até mesmo os negros mais privilegiados nunca seriam visto da mesma forma
que os brancos, seriam sempre subalterno.
No capítulo “A ruptura narcísica de um filho bastardo” Faustino conta de maneira
mais detalhada a vida de Fanon, partindo de sua infância até o momento em que ele decide
estudar as dimensões raciais e de exploração colonial. Fanon cresceu com oito irmãos, filho
de pais de classe média, criado pela mãe e com pai ausente. Seu irmão Joby relata que Fanon
sempre foi uma criança muito séria, que mesmo muito novo ele tinha uma certa maturidade
para lidar com situações diversas. Faustino também passa brevemente sobre a relação de
Fanon com o seu pai, as suas perspectivas sobre a masculinidade e paternidade, e também
sobre a homossexualidade. Outro fator abordado no texto foi a presença de marinheiros
brancos na Martinica após a rendição da França ao poder alemão, na segunda guerra mundial.
Faustino conta que esse fator foi crucial na colaboração das explorações raciais e de classe,
gerando uma segregação ainda maior, pois os marinheiros repudiavam tudo aquilo que era
negro. Fanon sabia que por mais que ele desejasse fortemente o contrário, na face dos
brancos ele seria apenas um negro, jamais um francês legítimo como os marinheiros.
Faustino escreve sobre Fanon ter se alistado junto aos seus amigos de infância ao
Exército Francês de Libertação, uma parte antinazista do exército francês. Após um período
de preparo militar da Dominica ele vai para o front na Europa, junto aos franceses brancos.
Após passar quase dois anos na guerra, Fanon retorna à Martinica em 1945 após ter sido
ferido em combate, sendo promovido a Cabo e sendo condecorado. Após o seu retorno,
Fanon se junta a Aimé Césaire e na sua campanha política como prefeito de Fort-de-France
pelo Partido Comunista. Porém, por mais que houvesse relações entre os pensamentos de
Fanon e Césaire, os dois se diferenciam fortemente nas perspectivas sobre o movimento da
negritude. Fanon acreditava que: “A negritude tem o mérito de ser a antítese afetiva do
racismo branco, mas por vezes esbarra na visão racializada que o branco criou.” O autor
também destaca as falas que Fanon fazia em congressos contra o racismo e que abordavam
temas sobre cultura. Faustino diz que Fanon era amplamente conhecido pelas suas críticas ao
movimento da negritude, ele também considerava o racismo como elemento cultural.
Para mim, a partir dos capítulos em que li, Faustino faz um trabalho sucinto e bem
elaborado sobre a vida de Fanon, um livro de leitura fácil e rápida. Entendi como assuntos
principais a narrativa sobre a vida e a trajetória de Fanon, sua infância, sua convivência com a
sua família, os lugares em que ele estudou, sua relação com as pessoas, sua vida pessoal e
suas ideias. Também, de forma teórica a forma em que as obras de Fanon foram e continuam
sendo importantes no mundo contemporâneo, uma vez que, expressa como a cultura europeia
é ideologicamente apresentada como algo universal e modelo para todos. Frantz Fanon nos
mostra que o povo negro não pode ser obrigado a abrir mão de sua cultura, subjetividade e
individualidade para se aproximar do mundo do colonizador, trata-se de mostrar que há
possibilidade de encontrar outras maneiras de ser humano que não seja sendo branco.

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