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Discente: Marina Koschar Franco Lacerda

AV2: Seminário
Teoria das Relações Internacionais II
Decolonialidade e raça, uma perspectiva emancipatória do negro nas RI’s

● Os Condenados da Terra - Frantz Fanon cap 1, 2 e 3


● Pele Negra, Máscaras Brancas - Frantz Fanon cap 1, 2 e 6
● Crítica pós-colonial a partir das práticas políticas do feminismo
atirracista - Ochy Curiel

Entendimento do que é a Decolonialidade:

Descentramento epistêmico, político e cultural das formas de pensar e dos


modos de existir no mundo colonizado pelo eurocentrismo.

Quem foi Frantz Fanon?


Frantz Omar Fanon, (1925 - 1961) foi um psiquiatra e filósofo político
martinicano e de classe média. Estudou medicina na França, e se
especializou em psiquiatria. Um dos acontecimentos fundamentais para a
determinação de sua trajetória acadêmica, profissional e política, foi a
rejeição de sua tese de conclusão de curso, em que a banca exigia uma
postura “universal” na sua produção. Conceito esse, justamente criticado e
amplamente tratado na teoria crítica e na obra de Fanon, para compreender o
que é a universalização do homem, dos costumes, e da política.
Posteriormente, migrou para atuar em um hospital psiquiátrico na Argélia,
colônia francesa na época, em que lá pôde observar diretamente seu objeto
de estudo: o homem negro africano colonizado. Desenvolveu diversos
estudos científicos, filosóficos e políticos de como a colonização tinha efeitos
diretos no auto-entendimento social daquele povo, na estrutura de poder, e
seu apagamento histórico.
Quem é Ochy Curiel?
Rosa Ínes Curiel Pichardo é uma teórica feminista, artista e antropóloga
dominicana. Tem seu reconhecimento advindo de estabelecer o movimento
de mulheres afro-caribenhas. Estudou serviço social na PUC Madre y
Maestra na República Dominicana, e no final da década de 80 trabalhou no
Centro Dominicano de Estudos de Educação e fundou a ONG de mulheres
Ce- Mujer, atuando nessa perspectiva de raça e gênero ao longo de toda sua
trajetória até os dias atuais.

Recapitulação:
Fanon baseia toda sua teoria na divisão do mundo entre duas esferas: os
colonos e os colonizados. E que a partir disso a universalização dos
costumes através do eurocentrismo, contribuíram diretamente na
desumanização do colonizado no processo de colonização, ocasionando o
racismo e a violência, convertendo esses povos através de vários tipos de
dominação.
No livro Os Condenados da Terra, Fanon inicia o debate afirmando que o
processo de descolonização é sempre violento, pois trata da substituição de
uma espécie de homem por outra, um novo ser, uma nova humanidade.
Entende esse processo como violento desde do sentido literal da palavra, até
o compreendimento de que essa luta de antagonistas perpassa pela
recomposição social, e entendimento interno do colonizado, e que é assim
violento, pois o colono para sua emancipação social atravessa na
legitimidade do homem, e o entendimento de que homem é esse.
Perpassa pelo entendimento do que é subdesenvolvimento, apontando que é
fruto de um longo processo de extração de riquezas desses países
colonizados, e no terceiro capítulo enfatiza a importância da organização das
massas para dar início à descolonização. Para Fanon, a descolonização
implica na solidariedade entre povos.

Pele Negra, Máscaras Brancas


O livro tem como objetivo quebrar o complexo psicoexistencial do
branqueamento do negro.

capítulo I

Ao iniciar o debate, Fanon em seu primeiro capítulo discorre sobre a


linguagem, e de como ela é o primeiro contato direto do povo colonizado e o
colonizador. Aborda o sentimento e uma necessidade do negro em incorporar
a língua europeia, no caso a francesa, como forma de legitimidade,
atravessando um processo de rejeição da sua língua natal. Observa o contato
do negro com a cultura do “civilizado” ao ir à França, e essa tentativa de
incorporar a língua, os costumes, e conhecimentos para não ser
subalternizado.

❖ exemplifica o termo petit-nègre como resultado falho dessa tentativa de incorporação tendo
como consequência a subalternização.

“Há um fenômeno psicológico que consiste em acreditar numa abertura


do mundo na medida em que as fronteiras se rompem”

Entende-se assim, que essa tentativa de se legitimar enquanto um ser,


se dá por um complexo de inferioridade, gerando uma atitude constante
de se embranquecer. A partir disso, observa o efeito no psiquismo do
negro ao retornar da França, negando seus costumes, línguas e
cultura, se auto afirmando como um novo ser legitimo, dado como
embranquecido, se assemelhando ao homem branco.
❖ trecho do sexto capítulo: “ O negro visa o uniersal, mas nas telas é mantida intacta
sua essência negra - sempre servente, sempre obsequioso e sorridente…”
capítulo II

Já no segundo capítulo, Fanon trata do ponto que mais se correlaciona com o


segundo texto escolhido. Trata sobre o comportamento doentio em seu ponto
de vista, da submissão da mulher negra ao homem branco em troca de amor.

❖ Debate em cima do livro de uma mulher negra chamado “Je suis Martiniquaise”, em que ao
longo de toda sua trama de vida pessoal, se submete a diversas violências raciais vindas de
um homem branco.

Fanon, precisamente compreende que esse fenômeno advém de uma


percepção de almejar o embranquecimento da raça (tal qual A Redenção de
Cam), impossibilitando a relação afetiva entre pessoas negras, porque a
mesma não poderia proporcionar a ascensão social do homem legitimo
(branco). Todo esse processo, se dá pela alienação psíquica do negro, já que
dentro do complexo de inferioridade já citado, o relacionamento inter-racial
seria a porta de entrada para o mundo civilizado.

Trata também da mulher negra e mulata, em que a primeira não tem outro e
sequer anseio do que se embranquecer, e a segunda de não regredir para
suas raízes escuras. Aponta a interacialidade como projeto, e doutrina
absorvida pelos negros, fruto do processo de colonização. Tudo isso, gira em
torno do entendimento europeu, e universalista de que o único corpo capaz
de ser amado, é o branco, dando à pessoa negra, através desse
relacionamento mestiço, talvez a única possibilidade de ser digno desse
sentimento.

capítulo VI

Através das escolas psicanalíticas de Freud e Adler, que estudaram as


reações neuróticas em determinados ambientes, Fanon as emprega numa
tentativa de explicar a visão de mundo do homem de cor.
A psicanálise busca compreender determinados comportamentos que se
baseiam na estrutura familiar dos indivíduos, fazendo uma analogia entre a
neurose observada na vida adulta com elementos infantis, repetições e
cópias de conflitos surgidos nessa esfera.
Para Fanon, na Europa, a estrutura familiar e a estrutura nacional mantêm
estreitos laços, sendo a família um elemento da nação.

❖ autoridade militar - autoridade paterna

“Uma criança normal, que tenha crescido em uma família normal, será uma
pessoa normal.” Porém, Fanon explica que em famílias de cor, mesmo uma
criança normal, crescendo em uma família normal, será anormal a partir do
momento que se tem contato com o mundo branco. Aquela criança será
inferiorizada através de uma ótica da normalidade do homem branco.

Para se aprofundar na compreensão dessa lógica, Fanon retoma


determinadas análises de Freud e Breur ao tratar dos sintomas neuróticos na
vida adulta de um indivíduo: afirmam que para o entendimento dos sintomas,
é necessário que gradativamente o sujeito vá acessando cenas traumáticas
de forma cronológica e precisamente inversa. Dado esse entendimento,
chama-se essas vivências de Erlebnis, sendo algumas delas determinantes
na origem das neuroses. Então, Freud acrescenta, que tais Erlebnis são
reprimidas pelo inconsciente.
A partir disso, Fanon relaciona essa análise para entender o negro. Retoma
o conceito de inconsciente coletivo de Jung, que se define como um conjunto
de sentimentos, pensamentos e lembranças compartilhadas em uma
sociedade. Exemplifica como o caso hipotético no negro ao ir à Paris para se
graduar em Sorbonne, e que antes mesmo de haver qualquer aparecimento
de conflitos (raciais), o mesmo já assume de antemão uma postura defensiva.
Tal comportamento, origina-se do inconsciente coletivo de acordo com René
Ménil da “instauração na consciência do escravo, em lugar do espírito
africano, reprimido, de uma instância representativa do senhor, instância
instituída no âmago da coletividade e que deve vigiar como uma guarnição na
cidade conquistada”. Fanon, aponta como a cultura absorvida pela população
colonizada, contribui desde a infância esse sentimento produzido no
inconsciente de inferioridade. Através de histórias infantis, em que o negro
sempre é representado negativamente como “o Lobo, o Diabo, o Selvagem”,
e até nos ensinamentos escolares em que crianças se referem aos
colonizadores como “nossos pais”, que perversamente se identificam com o
explorador e “civilizador” branco. Há uma adoção subjetiva da atitude do
branco.
❖ destaca a falsa percepção dos antilhanos de não se reconhecerem como negros, e que são
ensinados culturalmente que o negro selvagem é o senegalês. Porém sua ida ao mundo
branco europeu, escancara sua verdadeira pele.

Fanon enfatiza que tem por objetivo, promover uma nova forma de estudo
rigoroso, a partir de duas óticas: a interpretação psicanalítica da experiência
do negro e a interpretação psicanalítica do mito negro. Entende que o negro é
tratado pelo branco como um objeto fobígeno e ansiógeno, e tais neurores
(fobia e ansiedade) foram desenvolvidas pela lógica racista, e que as
mesmas perduram no inconsciente coletivo do branco. Esse inconsciente é
uma imposição cultural irrefletida, é adquirido, formou-se no profundo
inconsciente do europeu um recôncavo excessivamente negro, onde se
repousa as mais negativas assimilações sociais ao outro. Se compreende
assim, a partir disso como resultado a auto negação, ao perceber que o negro
é ruim, o negro parte a odiar a si mesmo de maneira autodestrutiva.

❖ explora os estereótipos desenvolvidos por meio da “negrofobigênese” e como a fobia do


negro é o medo do biológico.

O autor compreende que todas essas experiências dos negros, partem


justamente desse ponto comum, ser um homem de cor. Porém, relembra a
importância de em cada vivência tomar em consideração as nacionalidades
(senegaleses, antilhanos, etíopes…), as realidades históricas e sociais de
cada país, as condições que foram impostas pela exploração imperialista, e
que não existe uma unidade na raça negra. Existe ambiguidade na situação
internacional do negro.
Ao final do capítulo, Fanon exemplifica toda a análise psicanalítica com
a observação do médico-chefe do hospital psiquiátrico Saint- Ylie. A
paciente observada demonstrava tiques repetitivos e outros distúrbios
nervosos, e que ao longo do processo através de hipnose, nos seus
sonhos acordados se identifica o aparecimento de imagens de negros e
como isso desencadeava um bloqueio e medo na paciente. Após o
término das sessões, se concluiu que tais sintomas eram decorrentes
de memórias infantis, em que seu pai atuava na época como veterano
das tropas coloniais, e se havia no ambiente familiar o discurso de
negros selvagens. Tal exemplo, traz o resumo perfeito de todo o
entendimento do capítulo: aplicando toda a contribuição de Freud para
se tratar das neuroses adultas, que perpassam por aquelas Erlebnis, e
assim é possível enxergar, como o inconsciente coletivo influencia
diretamente nas vivências individuais, tanto do homem branco quanto o
negro.

Crítica pós-colonial a partir das práticas políticas do feminismo


antirracista

Ochy Curiel inicia seu debate afirmando que o surgimento das teorias
pós-coloniais advém precisamente de lutas concretas, ou seja, partem de
movimentos sociais para depois se converterem em teoria.

A autora cita a importância de Césaire e Fanon, para o compreendimento do


racismo e colonialismo como sustentadores do capitalismo moderno, e
também na análise binária do mundo entre colonos e colonizados. Porém,
critica a ausência da abordagem de sexo e sexualidade em suas produções,
e aponta como diversas feministas racializadas, afrodescendentes e
indígenas consideram a junção de diversos tipos de dominação:
racismo, sexismo, heteronormatividade, e classismo

Dado essas teóricas, Curiel as entende como subalternizadas, não apenas na


produção decolonial, mas também no próprio movimento feminista, que
abraça os paradigmas da modernidade universal do branco.

❖ cita o discurso de Sojourner Truth femnista negra em 1851 “E eu não sou mulher?”

Traz a importância e relevância do Black Feminism e ao Feminismo Chicano,


e a partir disso, a necessidade de tratar das identidades que carregam esses
movimentos. Ao citar Las Chicanas ( que é um feminismo que se propõe a
identidade híbrida e mestiça, cruzando fronteiras geopolíticas e conceituais),
fala sobre sua pioneira Gloria Anzaldúa que é identificada como mestiça, e
como essa classificação possui um significado distinto em cada lugar.

❖ Na América do Norte o termo mestiça é um reconhecimento da subalternidade e é a


reivindicação do termo “latina”, sendo assim um ato de resistência.
❖ Na América Latina o termo mestiça se refere à uma ideologia racista de construção de um
Estado com uma identidade dominante ( Democracia Racial, política de embranquecimento)

A partir da abordagem do processo de mestiçagem e mito da Democracia


Racial, Curiel afirma que não só ela, mas outras teóricas feministas
pós-coloniais entendem e evidenciam essa grande sequela do colonialismo,
que foi fruto do estupro de mulheres racializadas. Denuncia como os estudos
de mulheres no período colonial são atravessados por um olhar ocidental, em
que elas acabam sendo reduzidas aos papéis de reprodutoras de escravos,
amas de leite, objeto sexual dos senhores e como força de trabalho
escravista.

E para assim finalizar sua contribuição para o debate, a autora resgata o


termo “Amefricanidade” de Lélia Gonzalez, que é entendido como processo
histórico de resistência e de reinterpretação em modelos africanos para se
pensar mulheres negras diaspóricas.

❖ descarta o termo “latinidade” pois o enxerga como uma nova forma de eurocentrizar esses
povos colonizados na América Latina.

O problema do negro não se desfaz no problema do negro vivendo entre


brancos, mas sim no problema dos negros sendo explorados, escravizados,
desprezados por uma sociedade capitalista, colonialista, patriarcal,
acidentalmente branca.

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