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Bochincho Misto de diaba e de santa

E com ares de quem é dona


E um gosto de temporona
(Jayme Caetano Braunn)
Que traz água na garganta
E eu me grudei na percanta
A um bochincho, certa feita O mesmo que um carrapato!
Eu fui chegando de curioso E o gaiteiro era um mulato
Que o vício é que nem sarnoso Que até dormindo tocava
Nunca para, nem se ajeita E a gaita choramingava
Baile de gente direita Como namoro de gato
Eu vi de pronto que não era
Na noite de primavera
A gaita velha gemia
Gaguejava a voz dum tango
Às vezes quase parava
E eu sou louco por fa ndango
De repente se acordava
Que nem pinto por quirera!
E num vanerão se perdia!
E eu contra a pele macia
Atei meu baio longito Daquele corpo moreno
Num galho de guamirim Sentia o mundo pequeno
Desde guri eu fui assim Bombeando, cheio de enlevo
Não brinco nem facilito Dois olhos, flores de trevo
Em bruxas não acredito Com respingos de sereno
¡Pero que las hay, las hay!
Eu sou da costa do Uruguai
Mas o que é bom se termina
Meu velho pago querido
Cumpriu-se um velho ditado
E, por andar desprevenido
Eu, que dançava embalado
Há tanto guri sem pai
Nos braços doces da China
Escutei de relancina
No rancho de santa-fé Uma espécie de relincho
De pau-a-pique, barreado Era o dono do bochincho
Num trancão de convidado Meio oitavado num canto
Eu me entreverei no banzé Que me olhava com espanto
O chinaredo a bolapé Mais sério do que um capincho
No ambiente fumacento
Um candeeiro, bem no centro
Num lusco-fusco de aurora
Pra quem chegava de fora
Pouco enxergava ali dentro Foi ele que se veio
Pois, se era dele a pinguancha
Bufando e abrindo cancha
Dei de mão numa tiangaça
Como dono do rodeio
Que me cruzou no costado
Quis me partir pelo meio
E já sai entreverado
Co'um talonaço de adaga
Entre a poeira e a fumaça
Que se me pega, me estraga!
¡Óigale!, China lindaça!
Chegou a levantar um cisco!
Morena de toda a clina
Mas não é à toa, chomisco
Dessas da venta brasina
Que sou de São Luiz Gonzaga!
Com cheiro de lixiguana
Que quando ergue uma pestana
Até a noite se ilumina
Meio na curva do braço Num grito de toda goela
Eu consegui tirar o talho Num berreiro alucinante
Mas quase que me atrapalho O índio que não se garante
Porque havia pouco espaço Vendo sangue, se apavora
Mas senti o calor do aço E se manda campo fora
E o calor do aço arde! Levando tudo por diante!
Me levantei sem alarde
Por causa do desaforo Eu sou crente na divindade
E soltei meu marca-touro Morro quando o Deus quiser
Num medonho Mas, amigos, se eu disser
Buenas tardes Até periga verdade
Naquela barbaridade
Eu tenho visto cosa feia De chinaredo fugindo
Tenho visto judiaria De grito e bala zunindo
Mas hoje ainda me arrepia O gaiteiro alheio a tudo
Lembrando aquela peleia Tocava um xote esclinudo
Talvez quem ouça não creia Já quase meio dormindo!
Mas vi nascer, no pescoço
Do índio do berro grosso E a coisa ia indo assim
Como uma cinta vermelha Balanceei a situação
E desde o beiço até a orelha Já quase sem munição
Ficou relampeando o osso! E todos atirando em mim
Qual ia ser o meu fim?
O índio era um índio touro Eu me dei conta de repente
Mas até touro se ajoelha! Eu não vou ficar pra semente
Cortado do beiço à orelha Mas gosto de andar no mundo!
Amontoou-se como um couro Me esperavam na dos fundo
E, amigos, foi um estouro Eu saí na porta da frente
Daqueles que dava medo!
Espantou-se o chinaredo E, dali, eu ganhei o mato
E aquilo foi uma zoada! Abaixo de tiroteio
Parecia até uma eguada Ainda escutava o floreio
Disparando num varzedo Da cordeona do mulato
E, pra encurtar o relato
Não há quem pinte o retrato Eu me bandeei pra o outro lado
Dum bochincho quando estoura Cruzei o Uruguai a nado
Tinidos de adaga, espora Que o meu baio era um capincho
E gritos de desacato E a história deste bochincho
Berros de quarenta-e-quatro Faz parte do meu passado
De cada canto da sala
E a velha gaita baguala
Num vanerão pacholento
Fazendo acompanhamento
Do turumbamba de bala!

É China que se escabela


Redemoinhando na porta
E xiru-da-guampa-torta
Que vem, direito, à janela
E a China?

Essa pergunta me é feita


Em cada vez que eu declamo
É uma cosa que eu reclamo
E acho que é até uma desfeita
Acho que não é direita
E até entender nem consigo
Eu, no medonho perigo
Duma situação brasina
Todos perguntam da China
E ninguém se importa comigo!

E a China, eu nunca mais vi


No meu gauderiar andejo
Somente em sonhos a vejo
Num bárbaro frenesi
Talvez ande por aí
No rodeio das alçadas
Ou talvez, nas madrugadas
Seja uma estrela xirua

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