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Prenúncio das sombras

Nada some tão de repente, as sombras voltam-se para trás. É época festiva, laços afetivos desabrocham e
a primavera se esvai como o cheiro do etílico.
Nada me conforta, sem eu estar em sono turbulento. São apenas cartas, uma família e suas
intemperanças, gritos me invadem as portas, são gritos de lá de baixo, filhos maldizem os seus pais e seus pais a
maldizer um mundo inteiro. A menina chora, enquanto a estas horas as ruas estão desertas. Me bate um estalo,
um gatilho no peito, estão a chegar coisas piores do que estas? Há dores no peito, na garganta, meu suor
Aqui se vê e se vive a vida real, tudo de mais real está nas esquinas às onze horas da noite ou ao bater da
escorre, me vem à mente a sensação de perigo, instala a angústia, a sensação de um drama corriqueiro. Ela me benção da meia-noite. Pela manhã, ou seja, às oito da manhã, muitos carros passam por estreitas ruas.
diz que histórias de terror são clichês, são sempre as mesmas coisas: mortes, espíritos vingativos, vampiros. Um
— Por aqui, seu moço, foi colocado quebra-molas, dizem que é para não facilitar o acesso, você sabe
pouco do místico drama hollywodiano. Mas há coisas piores do que vejo por aqui?Acho que não! Vou lhe
como eles chegam aqui! Dizem e deram até carta de liberdade para fazer o que bem entenderem!
contar minha história. Inclina teu ouvido para mim, que lhe conto com todos os detalhes o que se passa por
— Eles invadiram a toda velocidade, vieram buscar quem?
aqui.

Conto 02 — E nesse estopo de tanto assombro, aqui vira máquina de fazer dinheiro!

— E o país que o diga? Tem um tal de “joinha” que ele já entra bancando o terror, pega dinheiro na mão
de gente, pedia coisa a meu pai que é respeitado. Ô homem digno e honesto, se há um homem que é
assim digno, é meu pai!
AUTORA: JEMIMA FERCONDINI
— Ele me ensinou tanta coisa bacana, que hoje o velho está agora a descansar, eu só tenho a agradecer
por tudo que ele me ensinou! O velho me faz uma falta, às vezes dá uma vontade de chorar, mas diz o Começo a esperar, suor escorrendo, coração acelerado, o entendimento se esvai. Copo oferecido na
povo mais velho que homem não chora, não é? Que homem chorando é “nigrinhagem”, dá vontade até
mesa, tudo aqui disperso para começar as tragédias humanas. Mais um gole, a cabeça não recorda o que se
de rir...
fala.
— E a aluna de minha tia vive no mundo da lua. Minha tia é uma aí que tem um pouco de condição e
acha que aqui só mora gente que não tem caráter, mas, no fundom ela sabe que isso não é verdade, meu — Se eu estiver mentindo, pode ficar com minha pulseira, meu batidão, prata pura, se acontecer algo a ti.
pai é homem honesto, digno, fundou isso aqui, junto com o pai de Dona Hervaldina e aí se vai lascou... — Os caras estão lá em cima te procurando, querem falar algo contigo...
FEMINICÊNCIA
— Nada demais! Só bebendo um vinho!
— Mas por quê? O que houve?
Era um presságio, a salvação em meio ao deserto. Deus mandou um empecilho ao que estavaa ocorrer.
— Não sei, só sei que estão para lhe pegar. Venha comigo, nada de mau pode lhe acontecer, serei teu protetor!
— Apenas, intuição!
O copo na mesa e a linha no cartão, era o absoluto sentido para tal maldade.
— Não sei, somente sei que o me trouxe aqui, evaporou, te levou ao teu verdadeiro abismo.
— Tamanha estupidez!
— Ah! O pior está por vir!
— O que estás a fazer por aqui?
Correntes, a porta, um barraco de madeira, um boné xadrez e ali começaria o que se destina a uma mulher que
Na verdade, preciso lhe dizer a verdade, sobre todo o encontro e desencontro daqueles dias. Era assombroso
nem se quer se ouviu.
tudo que havia lhe acontecido. E não é que dizem: que a noiteé uma criança...
Não leu teus pensamentos, não ouviu o teu texto dos capítulos de dias anteriores. A noite intensa, entre
Prefiro ressignificar e lhe dizer que a noite é uma velha sábia onde se encontra todos os demônios da
prazeres e desprazeres, um ato falho e tu, tu irias embora. Muitos odores fétidos, cheiro de suor escorrendo,
humanidade, ela é deveras, recôndita, inóspita e cruel. Sim, aquela velha com os dentes amarelados, podres e o
crianças maltrapilhas e cachimbos a mão. Apenas uma linha, um ponto, um cheiro, mudaria todo o teu
cheiro de hálito velho na garganta. Eu precisava deixar de falar algumas verdades ou até mesmo de demorar
aspecto, mas você não iria viver do passado. As lembranças dessa jovem moça não se apagam. A faca
para lhe dizer tudo que a acometeu. A vizinha falou que meu velho estava no carro, nunca mais iria vê-lo. Pedi
quase atravessou tua janela e os
para acompanhá-lo, mas já era tarde demais. Carrego no mais estreito da minha alma a saudade do velho.
porões da tua casa. Você pode subscrever as linhas do meu pensamento ou apenas render-se a alguma delas!
Tudo se desvairou, perdi no infinito o mais límpido da minha alma! — Não sabe sobre quem te fala?
Estou a querer partir, mas ainda há um sopro de memórias, de vitórias e ressignificação. Decidiria que — Eu encurralo mesmo! A gente não pode deixar esses “merdas” se espalharem!

dali em diante um sopro de uma fina linha não daria conta da minha vida. Pensei na liberdade, nos sentimentos
— Tudo se vê e nada se faz! Tudo fica por aqui, olho vê, boca pio!
do mundo, em laços de família e daquela mulher atrás do espelho que sempre esteve escondida com tanta
feminicência. — Aqui é comércio, aqui é mercado de fazer cadáver, aqui não tem troco!

Pequenos contos da cidade vermelha — O troco é somado ao sangue nos olhos das mães e de nossas famílias.

Hoje é dia de eles passarem por aqui e me levar o que há por dentro, ver meu irmão sangrar, até ele dar o
— Os bares estão cheios, é dia de alegria, de feriado e de cobrança. Hoje eles passam por aqui!

que querem. Aqui se faz e aqui se leva, o que é dito é lei! Cinquentametralhadoras e mais o quê? — Eu venho aqui daqui a pouco, vamos faça meu dinheiro, se não fizer meus dois mil, eu pego teus
— Te dei ontem o prazo, fez meu dinheiro?
filhos e você já sabe né?
— Mário, você viu o quê?
— Não pega, não! Vocês são covardes. Se é a mim que vocês querem, por que mexer nos meus filhos?
Deixa-os em paz! Pega minha B****** então! — Está vendo quando eu digo que tem que mandar fazer nosso dinheiro?
— Acho que irei ao culto hoje da pastora Hilda, hoje recebi um livramento, vou dobrar o joelho.
Amanhã é dia de trampo, senão você já sabe né? Vou dar uma pila lá na igreja para ver se Deus me
— Só assim eles entendem!
abençoa e abre meus caminhos! Despoesia de uma mãe – mulher
A vida é urgente para a mãe de seis filhosQuando tem que hostil, vivo na cidade das casas avermelhadas,
passar, lavar, cozinhar, tomar conta do seu próprio eu, Vivo dos ismos cotidianos, vivo ao redor dos vícios e dos prantos.

que já não está dando conta dos dias e dos filhos que se foram, daqueles que um dia Sou dona de casa sim, amaciada pelo sofrimento, pelo desalento do comer.

partam e daqueles que gritam pelo labutar do dia!Tenho sim, tenho três filhos autistas, O homem que tenho em casa, pai de todos meus filhos, não me traz a mulher escondidaatrás do espelho.

ávida vida se faz contente, Viva que sou, luto arduamente para ter um lugar ao sol,Tenho

Se faz urgente, ávida vida se faz no expoente do suor que translade o meu rosto!Vivo em ambiente dignamente tudo que tenho
Fruto das palmas das minhas mãos, insensatos favores. Tudo está acordado entre nós.

Lavada pelo suor, a testa e a rachadura do sol — Suzana? Suzana?


— Será que não me ouves, toma teu último desafio, entregue tua alma podre aos deuses do olimpo, se
E tudo que resta é continuar, e ver meus filhos crescendo, se tornando homens e mulheres que estão
à tentativa da vida, pois, assim como eu, é preciso despoetizar! não quiser ver o homem asqueroso e rabugento que negociou suas dívidas com os anjos decaídos.
— Lembra-se da porta em formato de caixão, entrei e prefiro ficar em silêncio. — Perderam sua posição, Suzana. Agora olha só o que nos resta esse mundo vil e cheio de incertezas.

— Vamos ficar em silêncio? — Mas de quem é a culpa?

— Psiu, alguém pode acordar? — É destes, Suzana! Ainda me perguntas! É deste velho vermífugo que jogou a humanidade ao vácuo.

— E se alguém acordar você se responsabiliza, tome suas contas, preste-me um dos meus últimos e — Este e esses são os culpados, tu não tens nada a ver com eles, estais conhecendo agora e olha
para ti! — Não, deixa eu ir embora como estou, vou seguir o que me resta neste caminho.
— Te falo memórias, o velho reescreveu as tuas memórias? — Suzana, algum dia tu também vais desaparecer!
— Não, ele partiu, negociou, e abriu metade da porta entre seu cérebro e esta a levou como previsto. — Como te reconhecerei ou falarei contigo?
— Não se sobra nada nesta casa? — Não tenho como te perdoar se me largares.

— Não só a estes todos na parede que também já se foram. — Seja forte, tu não dependes de mim para viver! Siga, prossiga sempre em frente, beba a tua última

— Retratos velhos, velharia, ácaros e muita poeira. fonte de recordação, não se engane este mundo não é para os loucos!

— Esta sujidade vai me marcar?


Quimera Humana ou Humana Quimera
— Toma-te um banho e vestes umas das roupas da velha morta, sua companheira.
tinha uma porta em formato de
Ruas encharcadas, ratos passeando, inundações e cobras soltas se proliferando pelacidade. Este é o caixão. Assim pensei: “o proprietário deve ser um suicida ambulante ou um velhoasqueroso poluído
centro do que eu vivo. pelo cigarro se preparando para a morte.”
Meu nome é Suzana Roberto Salgueiro, nascida em 08 de julho de 1980, presenteneste passado A família deve viver um caos, a casa parece ser grande, a decoração de dentro épassada de geração
nascido vivo meus 34 anos afligidos pela discórdia e redemoinhos ambulantes. Quer saber por que
a geração, há décadas. Mas vamos deixar isso para lá.
vim parar aqui?
Quero lhe contar tantas coisas, mas não quero lhe obrigar a ouvi-las!
Para não servir de capa de verão da próxima estação. A poucos instantes, antes de começar, passei por
Eu vejo as sombras do medo atrás de toda minha casa e de meu espírito que seapaga a cada
uma rua deserta, uma eterna ladeira de pedras, variadas casas, masuma delas me chamara atenção; ela
segundo.
Parece-me que sou um disco inconstante, um parafuso a menos na porta,a inconveniência Esse teste não foi autossuficiente?
bate a tua esteira, a minha trajetória encardida. Você deverá estar se perguntando o porquê.
Você acredita que estou a fim de te matar? Uma coisa inexata e mais que complexa eu não te contei: eu sou louca, louca, os médicos já me
Enfiei uma faca no espelho, mas a faca não se atreveu a sangrar nem uma gota desangue. adiantaram, altas doses de clonazepam, fluoxetina, barbitúricos de
A verdade é que aqueles filmes de terror são mentirosos, a faca não volta, nãoinvade o espelho só todos os tipos, as doses aumentam e a loucura não para, é transpassada na caneta. Sofrode transtorno
reflete o seu reflexo. maníaco- depressivo aliado a uma leve esquizofrenia e o que
Abri bem os meus olhos e nada, nada!Os filmes de chamam de fobia social.
terror são mentirosos! Eu tenho medo do mundo, mas não tenho medo dos papéis.Quero tanto
matar você! O que você me prometeu?O que você me
Meu corpo anda leve como uma pluma e minha cabeça explodindo como umchumbo, prometeu?
atravessando a minha entrada triunfal. Eu prometi dar os sentimentos mais pálidos e grotescos do mundo.
Eu te contei dos presentes que ganhei no último ano novo? Que tipo de quimera eu sou? Uma quimera-humana ou uma humana-quimera? Vacile, Suzana,
Aspirinas e muita enxaqueca, das desventuras que meu corpo causou!Chamaram-me daqui a pouco vão estar te levando e tramando as bombas contravocê!
de cínica, covarde, mas nunca de durona! Você já tomou seu remédio hoje? Você já tomou

Aliás durona só se for de dinheiro, porque os pensamentos são frágeis e fáceis,para uma seu remedinho hoje?
Se há algo que me incomoda é o controle da minha loucura!Hipócrita! É
mulher, uma criança de 34 anos de idade.
você mesmo hipócrita!
piloto automático, os sentidos não existem! Você pode gritar, cuspir, me dar uma surra,não vou sentir
H-I-P-Ó-C-R-I-T-A!
nada, nada, absolutamente nada!
Eu parei para escutar Norma e a mulher para de frente pra mim: você quer maisfeijão? Nada me importa mais, só essas drogas que ando usando.
Se tem uma coisa que detesto é a interrupção dos meus sentidos, principalmentequando estou A mulher de preto e sapatos roxos passou por aqui há poucos instantes, eu andointrigada com essa
escutando Norma na voz da Ângela Gheoghiu. mulher.
Isso me irrita!
Eu tive vontade de quebrar a mesa de vidro em dois tempos! Ela anda que anda metendo as orelhas para ouvir as minhas coisas.
No outro dia, foi o lixo desamarrado, eu acho que ela quer me descobrir!
Não, eu não tomei meus remédios hoje, porque quando os tomo pareço estar no
Aliás, eu vou dar um conselho: se querem descobrir a vida de alguém, vasculhem olixo, lá você loucura e sua sede são os cérebros humanos.
encontrará todas as dúvidas, respostas e até insinuações. Às vezes me sinto uma placenta abandonada na estrada!
Recebi uma ligação hoje da tal amante do marido que ainda não tive, dizendo que elemorreu. Estou em posição de feto amargo e liquidado, solto pelo cordão umbilical.Disseram-me: tu
Ele morreu, peninha, ele morreu!Traiu-me por vives minha realidade?
quê? Quem é você: quimera-humana ou humana-quimera?
Jorram-se espadas para todos os lados, dizem que está vindo uma nova revolução:a revolução dos Quiseram acabar com Norma, quiseram tirar os meus sentidos, me espionaram ouvindo Norma, mas
loucos, estressados e degenerados. não dou meu braço a torcer, sou eu ou os ouvidos alheios. Meus ouvidos se interpelam ouvindo
Suas espadas são as altas e recomendadas doses pelos nossos hospitais. Essa é acontramão contra música alheia, para que me serve, se estou semNorma?
Conheço-te muito bem. Usarás a música contra mim, sabes bem a fraqueza dosloucos. Como já diria Pitty: “caem: um. Dois, três, quatro, a terra girando não se podeParar”!
Os loucos usam a música para agasalhar os ouvidos! Mandaram-me para ser espectadora do mundo, violaram-me, mandaram-me para ver as
Conheço um homem bastante jovial e interessante, ele tem a personalidade dos incrédulos, ele sofre de guerras, aprender a história de outros povos, mandaram-me ser espectadora depessoas se
um tal tumor, tumor este que nos faz descobrir sua pele escondida do cérebro. Se há uma coisa que ouço matando, mandaram meu irmão lutar na guerra.
é ele sempre maldizendo os outros, elesofre de tumores, tumores que afetam sua personalidade. O aprendizado é o eterno retorno!
Um dia ele viu uma jovem subir os degraus da vida e a maldisse o tempointeiro. Eu ouvi e vi a cidade poluída pelas chamas negras que se revelam a cada segundo.Quanto você
Ele sofre de tumor, ele sofre de doença, a verdade é que já predigo o diagnóstico:Ele tem quer para parar e analisar de onde vem o medo?
personalidade flácida, com um grande tumor: a inveja amiga dos idealistas. O medo bate na circulação, repousa nos nossos portões incertos, à medida que vocême chama eu
balanço a criança, antes analisada e circulada pelos centros. Disseram-me para eu parar de falar. Agora veja, os queixosos relutam pelo que éreal.
Dizem que foi parto natural; eu não acreditei porque dizem que dói demais! Comecei a enxergar Vê se me deixa e cala-te, mulher asquerosa e rabugenta, teu cinismo é minha praga!
tudo de repente às pessoas entravam umas nas outras queriaminvadir-me o corpo como parasitas Os hospitais já me disseram que querem medicar a minha loucura, eis que aínasce o que
fecais, mas não fiquei em estado de alerta. chamo de meu espaço, só meu, eu tenho um espaço só meu.
Imagina se seria isso um delírio uma emoção contraditória, ou um alívio de fazer nãofazer parte Eu sou sociável com os iguais a mim, o resto do mundinho que se exploda!
desses centros. Que mundinho que eu vivo, eu tenho abstração social, me chamaram de cínica, louca epobre de
Chamaram meu nome e não acreditei, parece muito intenso, tive um colapso dememória mais que espirito. Só eles que tem espírito, eu não vivo, eu não existo.
terrível, um colapso de memória. Fala-me, Suzana, sobre a tua memória.
Minha memória está em escassez, tiraram ela daqui. A poucos instantes me deram adroga da verdade, como eles chegam aqui. Deram até carta de liberdade para fazer o quebem entenderem!
assim eu existo! — Eles invadem a toda velocidade. Vieram buscar quem?
JEMIMA FERCONDINI — E nesse estopo de tanto assombro, aqui vira máquina de fazer dinheiro!
Às 11 da noite — CONTO — E o país que o diga. Tem um tal de “joinha” que ele já entra bancando o terror, pega dinheiro na mão
da gente, pedia coisa ao meu pai, que é respeitado. Ô homem digno e honesto, se tem um homem que é
Aqui se vê e se vive a vida real, tudo de mais real está nas esquinas às onze horas da noite ou ao bater da assim digno, é meu pai!
benção da meia-noite! Pela manhã, ou seja, às oito da manhã, muitos carros passam por estreitas ruas. — Ele me ensinou tanta coisa bacana, que hoje o velho está agora a descansar. Eu só lhe tenho a
— Por aqui, seu moço, foi colocado quebra-molas, dizem que é para não facilitar o acesso, você sabe agradecer por tudo que me ensinou! O velho me faz uma falta, às vezes dá uma vontade de chorar, mas
Poesia II
Sinta o que eu estou sentidoImporte-se aqui, mude-se
diz o povo mais velho que homem não chora, não é? Que homem chorando é “nigrinhagem”, dá vontade
até de rir... A poesia me chama, reclamaSinta as luzes se
— E a aluna de minha tia vive no mundo da lua. Minha tia é uma aí que tem um pouco de condição e
acha que aqui só mora gente que não tem caráter, mas no fundo ela sabe que isso não é verdade. Meu pai apagarem E a poesia estará no palco Você é a plateia
é homem honesto, digno, fundou isso aqui, junto com opai de Dona Hervaldina e aí se vai, lascou...
Na imensa escuridão Deixe-a cultuar sua alma,Sinta
AUTORA: JEMIMA FERCONDINI
as batidas
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De palmas, no seu coraçãoA poesia vem a mim
Eu sinto, você sente?Choro, chora
Poesia, poesiaEntre.
Alimente-se do seu meu oxigênioDo meu sabor, do meu
Deixe-me inundar
frescor
Em teus caprichos e em teus medosDeixe-me ser a sua irmã
Da minha imprecisão Da minha impulsividade
guia Deixe-me sentir os seus anseios Sente-se, coma ao meu
Das águas da minha almaDa minha paixão.
lado Alimente-se de mim
Deixe-me entrar em tiSinta...
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A poesia comeu o teu prato preferido.Ela tirou e retirou minhas
Trepei com minhas palavrasNaquele colchão
palavras Venha, poesia
Venha, exponha-se, tire sua roupa Sua rima infantil, sua Minha noite se torna claraÀ medida que o dia passa
metrificação Deixe-se ficar límpida e desvirginadaCom a pura E minhas angústias não chegam nem por lá Mal posso lembrar das
palavra caricaturas nos desertosDas noites indistintas
De afeto te chamo, na sua respostaAinda chamo por seu Dos meus caminhos incertosQue mal reescrevi
desejo. Mal posso lembrar
Dos meus destemidos sonhos Que me trazem lágrimas
Poesia III alegres,Eternas lembranças
Mal posso me lembrar dos meus destemidos sonhosEles saíram do lar Desespero em breve, e apenas barganho.
Mal posso lembrar!
Mal posso lembrar da tarde que cai na estradaDa qual não me levantei

Carreguei no colo as ovelhinhas que a vida machucou


Poesia III
Porque o homem
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É um ser tão inanimado?Ele é feroz
Mal posso lembrarda distância
As palavras correm a mil
da infância
Ele é ser eterno da abundânciaDe gerações que se abraçam
da busca eternada lembrança da vida
Sem nenhuma emoção
O temor de perder até um obstáculo Homens colocam-se como
o pensamento de ligar Olhar repentinamente
pedestais.
Colher os frutos de meias palavras
Correr atrás do ventre, dormir sem tomar venenosE depois amar
PÁGINAS 5 E 6
Acordar de madrugadaOlhar meu relógio,
VII
Guardar a amargura
Viver verdades ‘incontentes’Usar mentes imprecisas
E depois levantar Olhar a pessoa sentadaFolhear
Subir numa árvore giganteE gritar agradecendo a vida
o seu rosto
Usar palavras modestas Usar verdades primitivas Usar
E depois fechar-seCoroar a liberdade E arriscar-me por um instanteMarcar com a esperança
Saborear as melhores camasE comer à vontade Sem ideias relutantesFolhear um jornal
Desejar quem está ao seu ladoOlhar a sinaleira Colher o que há de melhor
E esperar o sinal fechar Correr atrás da conquista E ver a vida por um instante.
Pedir a uma estátua
E depois ajoelhar-se Guardar o sentimento vil PÁGINA 7
E depois arrepender-se do pecadoDesdobrar-me em mil
palavras VIII
A tua corrente sanguínea
O quanto esta noite Queria estar junto de ti Abraçar
Declama com o grito de quem quer abafarO prazer do sentimento de
o seu corpo Beijar teus lábios Arranhar a tua pele
uma amiga Subi o monte com as mãos
maciaPassar o teu perfume
Chamei por Vênus e ela suspirou
E suspirar no calor ofegante do teu quartoA mais linda poesia para ti
A Vênus declamou a poesia, o prazer, a ousadiaA tua luz, a tua lua, a tua
Lembra-me da música que ouvi pela primeira vezDeclamei-a em teu ouvido
carne nua e crua
E no teu corpo me prostei
Enxuguei o teu suor com meu corpoE senti na tua pele
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Os ângulos perfeitos
Atena jamais me ouviu
O retrato das tuas coxasDe tua boca
Mas Vênus respirou e penetrei-teDentre frias adagas
Dos teus olhos
incessantes Deixe-a esculpida no quadro Olhe vênus para ti
Meus caros não podem sentir tamanha seduçãoSeu olhar
Olhe a linda manhã
A sorte perfeita pela qual a tomei Dente os teus quartos na
Na qual buscamos dentre as camasMolhar os lençóis
meia noiteEssa Deusa esplêndida, beijou-me E eu provei
E desenhar em absoluto Um mundo em construto
Vênus
De um todo nu
Como se prova os céus.
A história do xerife descobertos, o dito xerife, não prometeunada só disse que daria condições desse povo sem recursos se
defender.

Sim! Era uma vez, um país que passava pelos melhores dias do seu povo mais humilde, chegaram uns filhos da E aí que começou um pouco de tudo: mas tudo o que o povo menos queria passar fome,o povo queria voltar

puta e lenharam com tudo, o povo parou de comer, os mercados não tinham mais nada, esse memo povo d aos tempos de bonança, mas como voltar?
tempos atrás, queria uma mudança, queriam eachavam que estariam sendo roubados, que tudo estava saqueado. O xerife se achava muito esperto e dono de tudo e achava que ele dominava um poucode cada conhecimento
Veio um pilantrão tirado a xerife de terras áridas e achou que poderia mudar aquela situação, o povo já sabia humanitário, até que veio um dia e ele se sentiu ameaçado, porque o povo estava revoltado e por incrível que
que talvez ele não pudesse mudar nada, porque aquele povo era “saqueado” desde o tempo em que foram pareça, o povo atacou de tudo um pouco pedindo pela volta dos bons tempos.
Esse xerife não aguentou e deixou a cidade...E os bons tempos Meus dentes ficaram cerrados, lágrima escorre, suor escorre, homens bebendo, fumando, mulheres olhando
entre si, qual é o próximo ser a divagar e ser levado a essanoite, tragado pela má sorte da vida e do tempo?
voltaram...
Não sei, parei para pensar em milhares de coisas, espíritos a solta, é a hora deles estarem na rua, não sei pará-
los. Já deu 1 hora da manhã e ainda estou aqui, vendo a vastidão da imensidão humana. Os seres se
A noite não tem nome
comportando dentre suas próprias vontades,não é que seja do espírito, mas é da própria má qualidade do ser
humano, a forma comoesse tal se comporta na sociedade e principalmente nas horas propícias, onde não há
mais ninguém a espreita-los, somente a eles próprios e a se vê a confusão daqui que a madrugada vire a
Não sei como começar essa história muito louca e parece uma desrealização, vejamos: alvorada, tudo pode acontecer!
Eu estive entre as noites e madrugadas nas ruas a partir das meias noites em diante e oque acontece nesses Arte
horários?
cenário, do ator, da dor humana, do gozo é a forma de trazer oque há de mais humano...

Versos e mais versos, o misto de tensões, mas de que serve a escrita, a poesia, a arte, vale-me muito, uma O que se aprende com a vida?
única coisa que ninguém possa contar.

A vastidão, o infinito, o deserto, o universo, as noites estreladas, a criação divina, a criação humana, o mito
Absolutamente tudo e absolutamente nada!
e a caverna, a insurreição, a irrealidade, a vontade, o gozo, odesejo, o gosto do teu beijo, o absinto, a
loucura, a ternura, a sensação, o tato, a inocência, o ato. Ainda me vem minha frustação existencial, de onde vim, qual o sentido disso tudo, porque de tanto sofrimento
e tudo foge, foge, fode com minha psique, com meu eu-eu, meu eu subjetivo, meu positivo, meu eu sombrio,
Tudo está dado, os teatros estão lotados, as peças serão representadas e tudo que há é mais que a preparação do
meu eu individualista, meu eu, porra!Meu eu!
Aí não me perguntes o porque de tantos eus, tudo é confuso, até mesmo a pessoa maisobjetiva e dona de si, entrei nos quadros nos quadros do absurdo, da inanição, da minha fragilidade, já lhe disse, eu não sou forte, já
ninguém está repleto de sabedoria que não possa aprender mais um pouco, mesmo que vivesse duzentos que você me perguntou...
anos, não conseguiria alcançar tudo que eu quero, tudo que almejo e todos os mil livros antes de morrer!
Sim há coisas que não temos como nos livrar e principalmente de amor adoecido, doído,sofrido e das cantigas

O romantismo me fodeu de escárnio

Vida

O romantismo me pegou de um jeito avassalador que não consigo me estabilizar, ele meremexeu, comeu
minhas artérias, vísceras, carne, fígado, rins e fodeu meu coração de um jeito que nunca mais me procurei, Não tenho pressa a vida arde,a vida me invade,
a vida me pede transcendência,A vida me pede

cautela,

A vida me pede maledicência, A vida me pede

malemolência, A vida me pede ternura,

A vida me pede amor, A vida me pede fervor,

A vida é uma pedinte!


Proof

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