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Domando o Highlander

TRADUÇÃO E REVISÃO:
Katia Van Hellsing

Série Maclerie nº 1 Terri Brisbin


Prólogo

Escócia, 1352

Soube que sua mulher tinha morrido no momento em que seu


corpo caiu sobre o segundo degrau com um golpe seco.
Connor MacLerie viu como a consciência e a aceitação do que
lhe estava ocorrendo foram substituídas pelo olhar gelado da
morte. Kenna não gritou ao cair, Connor só ouviu o som dos
ossos ao quebrar-se contra a grande escada de pedra.
Ela não emitiu som algum, mas ele sim… sua fúria estalou em
um rugido que atraiu à família e aos servos. Todos se reuniram
a seus pés, seguros de como tinha acontecido tudo porque sem
dúvida alguns tinham ouvido a discussão desde seu começo.
Connor fechou os olhos um momento, depois deu meia volta e
se afastou dali.
E no instante que morreu sua mulher, nasceu a Besta. Sua
reputação se estendeu ao longo das Highlands, as terras altas
da Escócia. Todo mundo sabia que as últimas palavras de sua
mulher tinham sido para lhe implorar perdão e que ele o tinha
negado, e sua decisão de não assistir ao enterro não tinha feito
mais que aumentar sua fama de cruel. As mães temiam por
suas filhas, os pais se perguntavam se os rumores eram
verdadeiros e as donzelas dos clãs vizinhos rezavam cada
noite para que nenhum lembro as deixasse a mercê de Connor.
Menos de um ano depois da morte de sua esposa, Connor se
converteu em chefe do clã dos MacLerie devido ao falecimento
de seu pai. Agora precisava de uma nova esposa.
Assim que a Besta se dispôs a percorrer as Highlands em busca
de uma companheira.
Capitulo Um

Três anos depois

—Então não há outro modo de fazê-lo?

Jocelyn fez um esforço para ocultar o tremor de sua voz. Cravou as unhas na mão para não
desmaiar ao ouvir a notícia.
—Não, moça. Perguntou por você especificamente. E é a única maneira de salvar a vida a
seu irmão.
Seu pai fugia de seu olhar. Estava tudo acabado. A Besta tinha feito públicos seus desejos e
como ninguém de seu clã podia negar-se a cumprir suas exigências, a sorte de Jocelyn
estava lançada teria que sacrificar-se para salvar a outro.
—Possivelmente logo te faça conceber um filho —sussurrou sua mãe do leito onde jazia
doente—. Se lhe der o filho que tanto deseja, será clemente com você.
Jocelyn sentiu que lhe gelava o sangue nas veias ao ouvir aquelas palavras que deixavam
perseverança de que estava a ponto de entregar-se de corpo e alma a um homem cuja
crueldade se feito famosa em todas as Terras Altas.
Por muito que tentasse manter a calma, o som dos soluços de sua mãe fez que lhe
parecesse impossível e temeu desmaiar de verdade, algo que tinha prometido não fazer
frente ao emissário de MacLerie. Assim, respirou fundo e se voltou para seu pai e seus
conselheiros.
—Não necessita meu consentimento, pai, assim faça o que tenha que fazer.
Despediu-se dele e do enviado de MacLerie com um leve movimento de cabeça, depois
ficou tão reta como pôde e saiu muito devagar do quarto. A necessidade de pôr-se a correr
se fez mais e mais imperiosa à medida que os soluços de sua mãe aumentavam de volume.
Então tratou de recordar que era a filha de MacCallum e que não ia se envergonhar. A seu
redor viu alguns servos trabalhando, limpando as mesas. Era consciente de que a notícia
de seu casamento não demoraria para propagar-se assim que a reunião tivesse terminado e
sabia que devia ser ela quem o comunicasse a Ewan.
Atravessou a cozinha pelo caminho mais curto e, depois de sair da torre da comemoração,
cruzou também o pátio de armas. Procurou entre os grupos de homens que ali haviam até
que deu com ele.
Ewan MacRae. Seu primeiro amor. O homem com quem tinha acreditado que se casaria.
Agora enfrentava à tarefa de lhe dizer que nunca poderiam ser marido e mulher. Ao vê-la,
Ewan sorriu e foi a seu encontro.
—Bom-dia, Jocelyn —lhe disse com aquela voz profunda que tão bem conhecia ela.
—Ewan, temos que falar —respondeu Jocelyn lhe fazendo um gesto para que a seguisse.
Ewan saltou a cerca e caminhou a seu lado em silêncio até que se encontraram longe da
zona de treinamento, momento no qual Jocelyn se voltou a olhá-lo, disposta a lhe dar a
notícia que ia mudar suas vidas para sempre. As lágrimas lhe ardiam nos olhos e
ameaçavam cair de um momento a outro, mas se esforçou por tomar o controle de suas
emoções.
—O que aconteceu, Jocelyn? Ficou lívida e está tremendo —a agarrou pelos ombros e a
aproximou para si.
Jocelyn sabia que aquele era um gesto inapropriado nas circunstâncias que as que se
encontrava agora, mesmo assim não se moveu mas sim desfrutou da calidez, do carinho e
daquela sensação de amparo que não voltaria a sentir nunca mais. Depois de um momento,
separou-se dele e o olhou com as bochechas molhadas pelo pranto que não tinha podido
conter por mais tempo.
—Meu pai me prometeu a outro homem, Ewan. Não poderemos ficar juntos como eu tinha
esperado. Vou casar me com… o Connor MacLerie.
—Com a Besta? —perguntou com surpresa e temor.
Ela só pôde assentir, pois o sentimento de apreensão era cada vez mais forte. A reputação
de MacLerie era conhecida em todas as Terras Altas e, embora desejasse que não fosse
mais que o produto das fofocas, dito desejo não aliviava seu temor.
—Seu pai aceitou? —a perplexidade se refletia em seu rosto.
Se ela mesma não tivesse estado presente no quarto só um momento antes, tampouco teria
podido acreditar. Entre Ewan e ela nunca tinha havido nenhum acordo formal sobre seu
futuro, mas sua relação tinha ido estreitando-se mais e mais no tempo que Ewan estava ali
e Jocelyn sabia que pensava pedir sua mão depois de visitar seus pais na primavera.
—Sim. Devo partir com os homens de MacLerie e o casamento se realizará assim que
chegue lá —estava pronunciando aquelas palavras, mas não pareciam reais.
—Se casará lá? Sem ter perto sequer a sua família? Esse homem é uma besta de verdade!
—De todos os títulos que possui, MacLerie não sente o menor apreço por esse em
particular.
Jocelyn se virou e se encontrou com o emissário de MacLerie. Em seguida viu como o rosto
de Ewan se convertia em pedra e depois se colocava diante dela, cruzando os braços sobre
o peito com gesto protetor.
—Quem é você? —perguntou com voz desafiante—. Que direito tem a falar em nome de
MacLerie?
—Sou Duncan MacLerie —disse levando-a mão ao punho da espada que descansava
pendurada em sua cintura—. Sou seu homem de confiança e venho por seus interesses
neste assunto.
—Este assunto? Refere-se ao compromisso com Jocelyn?
—Sim. Sou o encarregado de fazer valer seus desejos neste assunto —Duncan falava com
voz suave e tranqüila, mas Jocelyn sabia que não tomaria aquele desafio com tanta calma.
—Não é nenhum assunto —declarou Ewan—. Jocelyn é…
—Prometida de MacLerie e, portanto, nada que seja da sua conta de agora em diante.
Jocelyn ficou boquiaberta ao ouvir tão cortante anúncio.
—A menos que vocês dois tenham feito algum tipo de promessa perante testemunhas —
continuou dizendo o homem de MacLerie dirigindo-se a Ewan.
Ewan afastou o olhar dele e cuspiu ao chão. Respondeu sem olhar a Jocelyn.
—Não.
—Ou a menos que a dama esteja grávida —disse Duncan assinalando a Jocelyn.
Aquilo era um insulto a sua honra e a de Ewan, um insulto tão grave, que Jocelyn se
aproximou de MacLerie rodeando Ewan e lhe deu uma bofetada tão forte o quanto pôde.
—Como se atreve a me insultar desse modo? —perguntou-lhe com os braços rígidos.
—Não lhe levarei a meu senhor uma noiva que leve dentro a semente de outro homem.
—Claro, todos sabemos que seu senhor deseja plantar a semente pessoalmente.
Logo que as palavras escaparam de sua boca, Jocelyn desejou não as haver dito. O olhar de
Duncan se obscureceu de ira e se cravou sobre ela com uma força abrasadora ao mesmo
tempo que dava um passo para ela.
—Assim é, senhora —disse apertando os dentes—. Todos sabemos o que deseja —
continuou olhando a um e a outro—. Despeçam-se porque partiremos dentro de duas
horas, estejam preparados para isso ou não.
Jocelyn viu com surpresa como o homem de confiança de MacLerie se virava e se afastava
deles demonstrando sua ira em cada passo. Não era assim como teria desejado começar
sua vida como esposa de MacLerie; insultá-lo diante de seu criado não tinha sido um
movimento muito inteligente. E sem dúvida o próprio MacLerie seria informado a respeito
assim que chegassem a Lairig Dubh.
—Falarei com seu pai, Jocelyn. Temo por você se casar com esse homem —lhe disse Ewan
brandamente, enquanto viam Duncan afastar-se.
—Não, não pode fazer isso, Ewan —Jocelyn se voltou a olhá-lo pela última vez. Dada a
perigosa situação em que se encontrava seu irmão, sabia que só podia fazer uma coisa—.
Temoe que em tudo isto há muitas implicações que nenhum dos dois conhecemos.
—Então se supõe que devo ficar aqui de braços cruzados e te desejar boa sorte em seu
matrimônio com MacLerie?
O pranto lhe bloqueava a respiração enquanto assentia.
—Por favor —lhe suplicou.
Ewan tomou as mãos entre as suas e a atraiu para assim apesar do homem que os
observava de longe. Retirou-lhe o cabelo da cara e lhe acariciou a bochecha meigamente.
—Desejo-lhe uma vida longa e feliz, Jocelyn. E se tiver que ser com esse homem, que Deus
te acompanhe em todo momento. Rezarei para que não destrua a energia de seu coração e
de sua alma.
Ewan lhe deu um beijo na testa e se separou dela. Jocelyn pensou que havia dito aquilo
sobre a energia de seu coração com a intenção de animá-la, pois seu gênio era conhecido
por todos. Depois se afastou dali sem dizer nada mais. As lágrimas percorreram livremente
seu rosto enquanto via afastar-se ao homem com quem tinha acreditado que se casaria,
mas em seguida secou as bochechas e respirou fundo. Não podia permitir o luxo de chorar
pelo que poderia ter havido entre eles. Tinha muitas outras coisas que fazer se, como lhe
havia dito Duncan, iriam partir só duas horas depois. Centrando seus pensamentos em
preparar-se para a viagem em lugar de deixar-se levar pela tristeza que a destroçava por
dentro, Jocelyn voltou ao interior do castelo.
Embora sabia que devia desculpar-se com o Duncan por ter insultado a seu senhor, o
orgulho não permitiu que o fizesse ao passar junto a ele, mas sim lhe lançou um desafiante
olhar a que ele respondeu com um simples movimento de cabeça. Jocelyn não soube como
interpretá-lo, mas continuou caminhando, ansiosa por começar suas tarefas.

Duncan fez um esforço por não sorrir quando Jocelyn passou a seu lado. O certo era que
sentia certa simpatia pela moça; encontrou-se de repente com a notícia de que devia
abandonar seu lar para casar-se com um homem quando acreditava que se casaria com
outro. Embora isso fosse o que se esperava da filha de um latifundiário, Duncan não tinha
a menor duvida de que tudo aquilo poderia haver-se feito de um modo melhor.
Apoiou-se na cerca que delimitava o campo de treinamento e a viu entrar na torre da
comemoração. Aquela mulher tinha coragem… ainda lhe doía na cara a bofetada que lhe
tinha dado com toda sua vontade. À margem dessa bofetada, a moça tinha mantido a
compostura em todo momento, inclusive enquanto via chorar a sua mãe com desconsolo.
Aquele pranto da mãe tinha estado a ponto de fazer que Duncan anulasse todo tipo de
acordo. Connor o teria matado se tivesse feito algo semelhante, mas o terror que havia na
voz daquela mulher lhe tinha chegado à alma. Jocelyn bateu a porta com força ao entrar e
Duncan pôde por fim deixar que aparecesse a seus lábios o sorriso que tinha estado
contendo.
Seria perfeita. Connor lhe tinha dado ordens de que tivesse aspecto singelo mas que não
parecesse uma infeliz assustada e sem cérebro. Duncan meneou a cabeça ao recordar
aquelas instruções. O de que não fosse pálida parecera fácil, mas como saber se uma moça
era uma infeliz assustada se todas punham-se a tremer em apenas ouvir o nome de seu
senhor?
Connor MacLerie, a Besta.
Duncan deu um chute no chão com raiva. Embora sabia que muitos não falavam
livremente em sua presença, não podia acreditar até que ponto se estendeu a má reputação
de Connor, tanto entre seus aliados como entre seus inimigos. Ele teria podido lutar contra
esses rumores… se soubesse a verdade sobre a morte de Kenna, mas não tinha estado no
castelo aquela fatídica noite.
Ele só sabia o que contavam as milhares de histórias que tinham surgido depois, já que seu
senhor, e amigo, não havia tornado a mencionar o nome da Kenna depois de sua morte.
Aqueles pensamentos foram interrompidos pela chegada do homem ao que tinha acudido
Jocelyn a receber a notícia de seu compromisso. Ewan MacRae, filho de Dougal. Conforme
lhe havia dito MacCallum, não tinha concordado nada em relação a casar Jocelyn com
aquele jovem, mas o afeto que sentiam um pelo outro e a crença de que compartilhariam o
futuro tinham sido evidentes para Duncan em apenas vê-los. Duncan se separou da cerca e
o olhou.
—Vai contar a seu senhor o que viu?
—Refere-se a que sua prometida correu a seu encontro assim que teve a menor
oportunidade? —Duncan voltou a baixar a mão até deixá-la sobre o punho da espada.
Ewan afastou o olhar dele e a dirigiu ao horizonte antes de responder.
—Jocelyn é uma mulher leal, por isso quis que eu o ouvisse de sua boca e não da de outro.
—A lealdade é uma qualidade admirável —disse Duncan sem responder à pergunta de
Ewan.
—Sim, é —assentiu o mais jovem dos dois homens—. Eu não gostaria que Jocelyn sofresse
nenhum tipo de castigo ou reprimenda por sua lealdade.
—E acredita que MacLerie faria algo assim? —Duncan deu um passo para ele.
—Ouvi os mesmos falatórios que sem dúvida você ouviu também. Se não posso estar com
Jocelyn, quero ao menos me assegurar de que estará bem.
Duncan assentiu e voltou para trás.
—Meu senhor só quererá saber se estiver tudo arrumado. Não lhe interessará com quem
tenha falado sua prometida antes de partir.
Ewan aceitou aquelas palavras com um suave movimento de cabeça, sem dizer nada. Não
podia fazer nada para evitar o que estava acontecendo, mas Duncan respeitava seus
esforços por proteger Jocelyn. Outra vida que mudava inexoravelmente pelos atos de seu
senhor e que contribuiriam a que fora conhecido como a Besta. deu-se meia volta e se
dirigiu aonde seus homens aguardavam à espera de receber ordens. Quantos mais ficariam
bloqueados pelo terror antes de que se conhecesse a verdade? Duncan moveu a cabeça com
impotência e chamou a seus homens para que se preparassem para partir.

Dois

O vento lhe despenteava o cabelo e lhe movia as roupas enquanto esperava na torre mais
alta do castelo de Broch Dubh. Protegendo-os olhos com as mãos, olhou ao longe uma vez
mais, mas não encontrou o que procurava. Chegavam tarde. A mensagem de Duncan dizia
que chegariam por volta do meio-dia e fazia já muito que o meio-dia tinha ficado para trás.
Alguns segundos mais tarde voltou a observar o horizonte com preocupação e certo temor.
Duncan cuidaria dela durante a viagem; seu primo levava anos sendo seu homem de
confiança e sempre cumpria suas obrigações com uma dedicação da que não podia
presumir nenhum outro integrante do clã MacLerie. Assim, tarde ou não, sua prometida
estaria a salvo com Duncan. Connor se sobressaltou ao ouvir alguém que limpava a
garganta a suas costas, era outro de seus homens.
—O que foi, Eachann?
—Deseja que envie mais homens em sua busca?
Connor seguiu pela vigésima vez o caminho que conduzia ao povoado de Lairig Dubh e
depois negou com a cabeça.
—Não. Duncan sabe o que tem que fazer e sei que não falhará.
Eachann assentiu e deu um passo atrás em silencio para não importunar a seu senhor com
mais pergunta. A seu lado, em completo silêncio, o capitão de sua guarda cruzou os braços
sobre o peito e esperou receber mais ordens. Connor se apoiou no grande muro de pedra e
seguiu com o olhar cravado no horizonte.
Amaldiçoou a si mesmo por sua insensatez. Sempre tratava de aproveitar as oportunidades
que lhe apresentavam, mas pedir em matrimônio à irmã do jovem MacCallum em troca de
lhe perdoar não era uma oportunidade. Era um desastre.
Depois de tanto tempo cultivando os terríveis rumores que o protegiam do matrimônio, a
morte de seu pai o obrigava agora a casar-se. Desgraçadamente as histórias que se
contavam sobre ele tinham conseguido que nenhum homem, aliado ou inimigo, atrevesse-
se a lhe oferecer sua filha como esposa. Apesar de sua riqueza pessoal e da de seu clã, de
seu título e da enorme expansão de terras que os MacLerie faziam suas nas Highlands,
parecia-lhe impossível encontrar uma mulher com a qual se casar.
Apoiou-se sobre o muro para ver seus guerreiros treinando no pátio. O que mais teria
desejado naquele momento teria sido poder continuar treinando com seus homens para
que estivessem preparados para entrar em combate a qualquer momento. O clã MacLerie
se orgulhava de ter mais de quinhentos guerreiros próprios que combinados com seus
aliados compunham um exército sem igual em todas as Terras Altas da Escócia. Mas uma
de suas obrigações como senhor era proporcionar um herdeiro que pudesse substitui-lo
quando ele morresse.
Bem era verdade que tinha vários primos e tios que poderiam dirigir o clã, mas a maioria
preferia que a sucessão correspondesse ao primogênito, de acordo com a tradição. Por isso
sentia tanta pressão por encontrar uma esposa adequada que pudesse lhe dar um herdeiro.
Um dos guardas o alertou naquele momento de que alguém se aproximava e Connor voltou
a olhar ao caminho que chegava até o castelo. Um pequeno grupo de cavaleiros acabava de
sair do bosque e se dirigia para a porta principal. Tentou reconhecer Duncan entre os
integrantes do grupo, mas ainda se encontravam muito longe, por isso desceu correndo da
torre. Saiu ao pátio justo no momento em que os guardas lhes permitiam a entrada ao
castelo.
Ao dar-se conta de que qualquer um poderia interpretar mal sua pressa, diminuiu o ritmo
e se aproximou com tranqüilidade para receber a seu amigo… e a sua prometida. Os
cavalariços se apressaram em ajudá-los a descer e encarregar-se dos cavalos. Congregou-se
uma multidão que esperava ver quanto antes à nova senhora; todos eles começaram a
murmurar e depois puseram-se a rir ao distinguir à única mulher entre o grupo de
cavaleiros.
Foi Duncan quem a ajudou a desmontar e Connor se deu conta de que estava ansioso por
vê-la melhor e comprovar se suas ordens tinham sido obedecidas. Tinha pedido uma
mulher normal, mas que não fosse nenhuma idiota e Duncan não devia assinar nenhum
tipo de documento em seu nome a menos que verificasse que a pessoa se ajustasse a tais
condições.
Parecia difícil ver seu aspecto, pois estava coberta de barro dos pés a cabeça. Nem sequer
podia distinguia a cor do cabelo. Por um momento, Connor sentiu vontade de rir também,
mas em seguida recordou que aquela era a mulher com a qual ia casar se. Depois se fixou
em Duncan que estava igualmente coberto de barro. Alguém tinha que lhe dar uma
explicação imediatamente.
—Duncan? —chamou-o entre os ruídos da multidão. Como era de esperar, todo mundo se
calou e esperou para ver sua reação da mulher que tinha diante.
—Sim, senhor —respondeu Duncan levando a dama para os degraus da entrada e sem
olhá-lo aos olhos.
—Tem o acordo de compromisso?
Duncan tirou um pergaminho do bolso de sua jaqueta de couro e o deu a seu senhor sem
mal tocá-lo para não sujá-lo. Connor acreditou ver um sorriso aparecendo aos lábios de seu
amigo. Connor leu o documento e, ao ver que ali figurava tudo o que ele tinha ordenado,
assentiu com satisfação.
—Bem-vinda… —olhou o pergaminho uma vez mais para ver o nome de suas prometida—.
Bem-vinda ao clã MacLerie, Jocelyn MacCallum. Pode ir limpar se, o padre nos espera na
capela.
Connor percebeu o olhar feroz de seu amigo e também a de sua prometida. Ela sabia que
estava tudo preparado para que se casassem imediatamente, seu irmão não ficaria em
liberdade até que não se pronunciaram os votos e a união não tivesse ficado consumada,
coisa que não pareciam muito atraente vendo-a jorrando de barro. O clã os rodeava,
observando cada movimento e escutando cada palavra.
—Preferiria ver meu irmão antes de nos casar, senhor —disse nela com voz firme e
indignada. Não queria entregar-se a ele em troca de nada.
—Seu irmão está bem. Agora, lave-se e depressa —uma vez tomada a decisão de casar-se e
tendo encontrado à mulher adequada, não queria esperar mais.
Mas ela deu um passo para diante, levando para ele o terrível aroma do barro que a cobria.
—Verei-o agora, senhor.
A multidão ficou boquiaberta perante tal insolência. Atreveu-se a rebater suas ordens
diante de todo mundo. Mas parecia haver-se dado conta de seu engano porque em seguida
piscou e olhou para aqueles que a rodeavam. Embora depois se voltou para ele e teve o
atrevimento de olhá-lo diretamente nos olhos.
—Parece que os MacCallum levam no sangue a falta de respeito. Põe em dúvida minhas
palavras?
—Sim, senhor. Quero ver meu irmão antes de pronunciar algum voto.
Connor respirou fundo, disposto a avançar contra ela por desafiá-lo daquele modo, mas
então viu o gesto de advertência com o que o olhava Duncan. Possivelmente pô-la em seu
lugar não fosse a melhor maneira de que sua futura esposa começasse sua vida no clã.
Connor sabia que, uma vez que fosse completamente dele, teria oportunidades de sobra
para corrigir suas maneiras. Assim, dirigiu-se a um de seus homens e lhe deu uma ordem
ao ouvido, depois esperou a que trouxessem o prisioneiro da masmorra com os braços
cruzados sobre o peito e um intenso olhar cravado nela.
Aproveitou a espera para examinar com mais calma a sua futura esposa, mas o barro só lhe
permitiu distinguir a cor de seus olhos. Eram verdes.
Como os de Kenna.
Lhe revolveu o estômago e sentiu uma náusea que teve que controlar antes de que lhe
chegasse à boca e lhe fizesse perder a refeição que tinha feito pela tarde. Fazia muito tempo
que não tinha pensado em Kenna e não entendia por que sua lembrança invadia sua mente
justo naquele momento. Provavelmente o iminente matrimônio tinha despertado algumas
lembranças que teriam estado melhor adormecidos para sempre.
Tratou de concentrar-se de novo na mulher que tinha diante de si e viu que o olhava com a
mesma intensidade que ele a ela. Teria notado seu mal-estar? A chegada do prisioneiro lhe
serviu de desculpa para afastar o olhar. Dois soldados flanqueavam Athdar MacCallum
agarrando-o cada um por um braço. O jovem, com a cara cheia de machucados, parecia
confuso.
Connor ouviu o grito afogado de Jocelyn e teve que agarrá-la para lhe impedir que não
corresse para seu irmão. Ela tratou de escapar de suas mãos, mas sua força não era
comparável a de seu futuro marido.
—Me deixe. Está ferido —disse tentando liberar-se.
—Disse que queria vê-lo e já o viu. Agora tem que cumprir sua parte do trato —sussurrou o
entre dentes para que só ela o ouvisse.
—Muito bem, senhor. Nos casemos já para que depois possa curar as feridas meu irmão.
Connor a puxou com força.
—Tenho entendido que lhe explicaram as condições do acordo, não é assim? —olhou a
Duncan em busca de confirmação e ao ver que seu homem assentia, continuou dizendo—:
Uma vez que nos tenhamos casado e consumado o matrimônio, seu irmão ficará em
liberdade.
Não teria podido assegurá-lo, mas a Connor pareceu que ela se ruborizou sob tanta sujeira.
Duncan tossiu ao ouvir suas palavras e o resto dos presentes o olharam boquiaberto.
—Então, senhor, procuremos o padre e terminemos com isto quanto antes.
—Antes deveria lavar-se e trocar-se…
—Posso pronunciar meus votos limpa ou suja, senhor, e preferiria fazê-lo o quanto antes
possível.
Aquela mulher era insuportável!
Frente a ele e a todo seu clã, era a evidente perdedora e entretanto ninguém o haveria dito
a julgar por sua atitude e suas exigências para ele. Mas Connor não era dos que se
intimidavam diante de um desafio, especialmente se o lançava uma mulher que devia
aprender a comportar-se.
—Duncan, faça vir ao padre.
—Mas, Connor… —Duncan se aproximou dele com ânimo de discutir suas ordens também.
—Já ouviu a dama. Deseja pronunciar seus votos o quanto antes e eu vou agradá-la. Traga
o padre, Duncan.
Duncan o conhecia o suficiente para reconhecer a fúria que havia em sua voz e que ele
mesmo podia ouvir. A dama em questão, entretanto, não o conhecia tanto, mas devia
haver-se dado conta de seu engano porque tratou de afastar-se dele. Connor o impediu
uma vez mais; não ia permitir lhe que escapasse do destino que ela mesma tinha aceito.
Voltou-se para seus homens e lhes ordenou que levassem a prisioneiro de volta à
masmorra. Quando sentiu que ela ia protestar, apertou-lhe o braço e disse:
—Não só sua vida, também sua comodidade depende de seu comportamento. Pense-lhe
bem antes de dizer algo.
Viu como ela abria a boca para falar e depois voltava a fechá-la. Então se fez um silêncio
cheio de tensão que se prolongou até a chegada dr Duncan acompanhado do padre.
—Senhor —disse o padre baixando a cabeça a modo de reverência—, isto é muito incomum.
—Sim, padre, eu sei.
—Não deveríamos deixar que a dama se prepare para a cerimônia? Poderíamos celebrá-la
pela manhã.
—Não. Minha prometida pediu, ou melhor, exigiu que se celebre agora. Assim lhe rogo que
tenha a amabilidade de proceder.
Connor sabia que o padre Micheil não entendia a situação, mas também sabia o que faria
tudo o que lhe pedisse. Assim, alguns minutos mais tarde, já estava casado de novo e, se ele
se sentia esmagado por tal feito, podia imaginar o que devia sentir a desposada. O tremor
de seu corpo e o modo em que lhe tilintavam os dentes davam mostra de estar honrada de
ser sua esposa.
—Ailsa —chamou Connor a uma das criadas— leve a dama a seus aposentos e ajude-a em
tudo o que necessite.
Jocelyn seguiu à criada sem dizer nada. Connor solicitou a presença de Duncan a seu lado
com apenas um olhar e esperou a que a multidão se dispersasse para lhe falar:
—Entre e me explique por que minha mulher e você estão cobertos do mesmo lodo.

Jocelyn mal sabia que força lhe permitiu manter-se em pé durante a cerimônia e seguir à
mulher pelas escadas do castelo. Cada degrau supunha toda uma provocação, pois até o
mais leve movimento lhe supunha uma grande dor. Sabia que se titubeasse só um segundo,
cairia de bruços ao chão, assim fixou o olhar na barra da saia da criada e rogou ao céu que
seus aposentos não estivessem longe.
Depois de presenciar a total indiferença de seu novo marido, não sabia o que a esperaria ao
final daquela escada. Alguns segundos depois, Ailsa abriu a porta de um quarto e esperou a
que ela entrasse primeiro. Jocelyn se deteve na soleira, paralisada ante a visão de todas
aquelas comodidades.
Era um quarto grande ao leste e com várias janelas com vidros. Uma lareira ocupava
grande parte de uma das paredes, frente ao que havia uma cama enorme que lhe pareceu
muito atraente. Jocelyn não se moveu para não sujar nada com suas roupas e olhou à
criada em busca de ajuda.
—Me deixe ajudá-la a desfazer-se de suas roupas, senhora —disse Ailsa se aproximando
dela e Jocelyn não teve nem forças nem desejo de resistir—. Pedi que tragam água quente
para que possa tomar um banho.
Jocelyn tentou conter as lágrimas que tinha sentido a ponto de lhe transbordar os olhos
cada cinco minutos desde que tinha descoberto que seu destino estava agora nas mãos de
MacLerie. Ficou imóvel enquanto Ailsa lhe tirava a camisa, a saia e as anáguas e deixava nu
seu corpo trêmulo. Minutos depois, Jocelyn pôde inundar-se em uma enorme banheira
cheia de água fumegante e aromatizada.
Recordava que Ailsa lhe tinha ensaboado o cabelo e o tinha limpado igual ao resto do
corpo, antes de envolvê-la em várias toalhas para depois sentá-la na cama frente a uma
bandeja de comida. E isso era a única coisa que pôde recordar quando os raios de sol
alagaram seu quarto na manhã seguinte e a tiraram de um profundo sono.
Uma terrível onda de pânico lhe alagou o corpo ao dar-se conta de que não tinha completo
a segunda parte do trato. Pois, a menos que o ato de consumar o matrimônio fora um fato
tremendamente sobrevalorizado e pudesse fazer-se em sonhos, duvidava muito que seu
marido tivesse feito uso de seus direitos aquela noite.
Levantou-se da cama ainda envolta nas toalhas e procurou no quarto algo que pudesse
vestir, pois não sabia onde estava a pequena trouxa de roupa que ela mesma tinha
preparado antes de partir. Não podia deixar de pensar que não havendo-se consumado os
votos, Connor ainda podia continuar castigando a seu irmão. Depois de procurar algo com
o que vestir-se durante vários minutos, teve que resignar-se a ficar ali esperando a que
acudisse algum servo, assim que se entreteve em escovar o cabelo com uma escova que
encontrou sobre a cômoda.
Algo devia ter alertado aos servos de que estava acordada porque pouco depois bateram na
porta e entrou uma moça, que acendeu o fogo em um abrir e fechar de olhos e lhe jogou
água quente na bacia que havia junto à cama. Depois se dispôs a partir, mas antes lhe disse
da porta:
—Senhora, o senhor pediu que se reúna com ele no salão para tomar o café da manhã.
—Temo-me que não posso fazê-lo… como se chama?
—Cora, senhora —disse a moça com uma reverência.
—Cora, lhe diga ao senhor que não posso fazer o que me pede…
Antes de que pudesse terminar de falar, a garota tinha desaparecido tão rápido como um
espectro e a deixou sozinha de novo. Jocelyn começou a lavar-se com a esperança de que
alguém fosse procurá-la e se desse conta de que necessitava de roupa. Inundou as mãos na
água quente e molhou o rosto. Justo nesse momento a sobressaltou um ruído que fez que
se voltasse de repente e perdesse o controle das toalhas que lhe cobriam o corpo. Agarrou-
as antes de que caíssem de tudo e levantou o olhar esperando encontrar-se com Cora.
Mas a quem viu foi seu marido. Connor MacLerie.
Ao ver a expressão de seu rosto soube por que o chamavam de Besta. As palavras que
queria lhe dizer lhe secaram na garganta quando viu que seu olhar se detinha em seus
seios. Teria desejado apagar aquela expressão lasciva com uma bofetada, mas sabia que
como esposa, devia submeter-se não só a seus olhares, mas também a suas carícias e à
completa posse de seu corpo. Não pôde controlar o calafrio de terror que percorreu sua
espinha dorsal. Finalmente fez frente a seu olhar com fúria.
—Vejo que toda uma noite de descanso não adoçou seu ânimo nem sua disposição. Vai
desobedecer até a menor de minhas petições? —perguntou-lhe cruzando os braços.
—Senhor, não lhe desobedeci —disse ela enquanto ele se aproximava. Sabia que não podia
afastar-se dele, não tinha aonde fugir.
—Pedi que descesse ao salão e não o fez. Isso não é desobediência?
Não era maneira de começar sua vida de casada. Um pequeno mal-entendido poderia
converter-se em algo muito mais importante se não o dirigisse bem. Olhou-o e se deu conta
de que o cansaço e o temor por seu irmão não lhe tinham permitido fixar-se em seu marido
no dia anterior. Tinha assistido à cerimônia como uma alma penada, mas agora, à luz do
dia, via que se casou com um homem incrivelmente atraente. Mais alto que seu pai, e
inclusive mais alto que Ewan, com o cabelo negro preso na nuca e o rosto perfeitamente
barbeado, traços marcados proclamavam sua masculinidade. Olhos da cor do bronze a
olhavam com a intensidade do fogo e o poder de sua autoridade como marido e como
senhor.
—Senhor, não tenho roupa —explicou por fim com uma reverência. Com a cabeça inclinada
não pôde ouvir sua reação, mas sentiu que sua voz se suavizava.
—Não tem roupa?
—Não, senhor. E não encontrei nada neste quarto com o que poder me cobrir para ir a sua
chamada. Não acredito que quisesse que aparecesse nua diante de todo seu clã.
Ouviu como se engasgava um momento antes de que se ouvisse uma gargalhada fora do
quarto. Jocelyn levantou o olhar justo ao ver como suas botas saíam pela porta. Alguns
segundos depois voltou a aparecer com sua trouxa de roupa. Jocelyn se inclinou a recolhê-
lo e ao ficar reta de novo, perdeu o equilíbrio e teria caído se ele não a agarrasse e a
apertasse contra seu peito.
—Vista-se e desça imediatamente —lhe ordenou ao ouvido.
—Sim, senhor —respondeu ela.
Soltou-a e esteve a ponto de sair, mas Jocelyn não podia deixar que partisse até saber como
se encontrava seu irmão.
—Senhor? —ele se deteve, mas não se girou a olhá-la—. Meu irmão sofreu algum tipo de
castigo porque eu não cumpri meu dever de consumar os votos?
Jocelyn ouviu outra risada no corredor, mas logo que pensou nela porque no momento em
que Connor se voltou a olhá-la só pôde olhá-lo também enquanto ele se aproximava até
ficar a só alguns centímetros, mas sem roçá-la sequer. Olhou para baixo com a ferocidade
de uma besta e lhe falou entre dentes.
—Seu irmão é o único responsável por seu comportamento e você do seu. Agora vista-se e
desça ao salão.
A fúria de sua voz a deixou gelada depois que ele saiu dali, batendo a porta. Quando deixou
de ouvir vozes no corredor soube que ele se foi e nesse momento pôs-se a tremer e caiu de
joelhos ao chão.
Não saberia dizer quanto tempo esteve ali ajoelhada, o som das vozes atraiu sua atenção e
a fez levantar-se com grande esforço. Não demorou para encontrar um vestido e algumas
meias na trouxa de roupa. Lutou com o tecido e os laços torpemente até conseguir vestir-se
por completo. Jogou-se um xale sobre os ombros e o atou com força com a esperança de
que isso aplacasse seus tremores.
Depois de respirar fundo várias vezes se sentiu mais ou menos preparada para responder à
chamada de Connor. Ao abrir a porta lhe surpreendeu encontrar Ailsa e Duncan
esperando-a. Duncan a recebeu com uma reverência que nada tinha que ver com a falta de
respeito que tinha mostrado por dela em todo momento durantea longa viagem da jornada
anterior.
—O senhor me pediu que a acompanhe ao salão.
—Muito bem —disse ela à espera de que lhe indicasse o caminho.
—Possivelmente iria mais cômoda com sapatos —disse assinalando seus pés nus—. Não
acredito que ao senhor gostasse que sua esposa aparecesse descalça.
—De acordo —disse ela voltando para se calçar.
Segundos depois estava vestida, mas duvidava enormemente que alguma vez fosse estar
preparada para enfrentar-se ao que a esperava no salão. Tinha despertado a fúria de
Connor ao lhe perguntar pelo estado no que se encontrava seu irmão; a honra obrigava a
manter são e salvo a um prisioneiro durante o cativeiro, mas Jocelyn sabia que muitos
eram maltratados. A idéia de que seu irmão menor sofresse desse modo voltou a lhe encher
os olhos de lágrimas. Sua vida dependia tão somente de que ela cumprisse sua parte do
trato.
Duncan lhe estendeu o braço para que ela apoiasse a mão nele e se deixasse guiar. Incapaz
de deixar de tremer, Jocelyn se concentrou em cada degrau que descia e que contava em
silêncio. Algo terrível lhe passou pela cabeça ao chegar ao último… seriam aqueles os
mesmos degraus nos que tinha encontrado a morte a primeira mulher de Connor?
Ao deter-se em seco, Jocelyn atraiu a atenção de Duncan, que deveria adivinhar o que se
estava perguntando porque disse:
—Não, não foi aqui.
—Eu… ouvi que… —não sabia muito bem o que dizer. Duncan já lhe tinha deixado muito
claro que não aprovava que ninguém chamasse de Besta a seu senhor e sem dúvida
tampouco veria com bons olhos que Jocelyn soubesse toda aquela sórdida história.
—Você não ocupa seus aposentos. Essas habitações não se utilizaram desde sua morte.
—Então é verdade? Morreu nas mãos de MacLerie?
Duncan a olhou com uma ira que lhe cortou a respiração. Jocelyn levantou a mão de seu
braço com medo a sua reação. Mas antes de que dissesse algo, ouviu-se uma terceira voz.
—Duncan, pedi que trouxesse para minha esposa ao salão, não que lhe fizesse um percurso
de visita pela casa.

Três

Connor ficou observando-os a só alguns metros com os braços cruzados sobre o peito.
Jocelyn estava certa de que continuava zangado com ela por ter ofendido sua honra, não
obstante, estendeu-lhe a mão, ela foi para ele em silêncio e a aceitou para que a levasse ao
salão. Já na porta, Jocelyn pôde observar o lugar e as pessoas que o ocupavam.
Era muito maior que o de seu pai e se encontrava em melhor estado. A má fortuna dos
MacCallum se viu refletida na rápida deterioração que tinha sofrido o castelo e na
completa falta de comodidades. Essa iminente pobreza era a que tinha feito que seu pai
fosse vulnerável a uma oferta como a de MacLerie.
Assim que entrou Jocelyn sentiu todas os olhares sobre eles, mas ninguém sorriu, nem
sequer a saudaram de um modo ou outro e ela tampouco reconheceu ninguém. Parecia
impossível interpretar a expressão daqueles rostos porque todos eles se voltavam assim
que ela se aproximava. Jamais se havia sentido tão mal recebida. Era o temor para o
senhor do castelo o que fazia que todas aquelas pessoas estivessem em silêncio? Acaso
sentiam o mesmo desprezo para ela que seu senhor? Jocelyn sentiu um calafrio, mas
continuou caminhando junto a seu marido até chegar à mesa. Connor não parecia ter
notado seu desconforto ou, se o tinha feito, certamente não tinha dado o menor sinal disso.
Não lhe prestava a menor atenção nem sequer enquanto a levava pela mão, estava ocupado
saudando todo mundo. Uma vez à mesa, Connor esperou a que ela tomasse assento junto a
uma enorme cadeira de madeira própria do senhor do castelo e chefe do clã. Todo mundo
voltou a ficar em completo silêncio.
—Apresento lady Jocelyn MacCallum, minha esposa —anunciou em voz alta.
Jocelyn esperou ouvir o resto da apresentação, mas não houve nada mais. Não sabia muito
bem o que tinha esperado ouvir, só sabia era que aquela breve apresentação lhe tinha
parecido decepcionante. Olhou às demais pessoas que se sentavam à mesa, mas nenhuma
delas lhe devolveu o olhar. Com um leve movimento de cabeça de Connor, os servos
começaram a colocar sobre a mesa bandejas repletas de pão e queijo e jarras de água e de
cerveja às que seguiram numerosa terrinas de aveia fumegante que encheram o ar de
aromas que despertaram o estômago de Jocelyn.
Seu marido partiu uma parte de pão e começou a comer, não parecia ter ouvido os rugidos
de suas tripas. Jocelyn esperou alguns segundos com as mãos no colo até que todo mundo
começou a comer e ela fez o mesmo. Ao meter a colher carregada de aveia seu estômago
começou a rugir ainda com mais força e Jocelyn levou a mão ao estômago para tratar de
sossegar o ruído.
—Não comeu suficiente ontem à noite? —perguntou-lhe Connor deixando de comer.
—Não, senhor.
—É que Ailsa não levou comida como eu lhe ordenei?
—Sim que o fez, senhor, mas temo que eu estava muito cansada e adormeci imediatamente
depois de me banhar.
Connor grunhiu algo para ouvir sua resposta, mas não disse nada mais. Jocelyn pensou de
repente em seu irmão e lhe tirou o apetite automaticamente. Deixou cair a colher sobre a
mesa sem poder apagar de sua mente a imagem do pobre Athdar ferido e morto de fome
em uma suja cela.
Seu mal-estar deveu parecer evidente porque atraiu a atenção de Connor.
—Está doente? De repente ficou muito pálida —se inclinou para ela e a observou.
Jocelyn não sabia o que responder. Já o tinha ofendido lhe perguntando por seu irmão essa
mesma manhã e sem dúvida entenderia qualquer outra pergunta a respeito como um novo
ataque. Dada a reputação que tinha de ofender-se facilmente e defender seu nome a todo
custo, Jocelyn não queria nem pensar o que poderia lhe acontecer se lhe perguntasse o que
tanto a atormentava.
Nunca saberia como adivinhou o que lhe ocorria, mas no momento seguinte, Connor ficou
em pé de repente atirando sua enorme cadeira e agarrou Jocelyn pelo pulso para obrigá-la
a levantar-se também. Sem lhe dar a menor explicação, a aarastou pelo salão e a levou pelo
corredor para o outro lado do castelo. Jocelyn deixou de lutar em seguida, pois não tinha
nada que fazer frente a sua força e sua determinação. Connor abriu uma porta oculta em
um muro com tal força, que golpeou contra a pedra; depois agarrou uma tocha e a
conduziu ao interior do túnel.
O ar ali se fazia mais denso e úmido à medida que entravam no passadiço. Jocelyn não via
nada do que havia por diante dele e não podia calcular quanto mais seguiriam caminhando
por ali. Connor diminuiu o passo momentaneamente antes de começar a descer alguns
degraus. Aonde a levava? Acaso o tinha ofendido tanto como para que fosse lhe custar a
vida? Jocelyn pusou sua mão para tentar fazer ir mais devagar.
—Não pode continuar desafiando todas e cada uma de minhas palavras, esposa. É como
um cão que se aferra a um osso e que não solta até que o obrigam a fazê-lo.
—Senhor, eu… —começou a dizer ela.
—Escute, esta é a última vez que sou tão benevolente com você.
Agarrou-a pelos ombros e a empurrou para diante até colocá-la olhando a uma pequena
cela. A masmorra. Seu irmão. Jocelyn ficou nas pontas dos pés para poder ver o interior da
cela, onde pôde ver seu irmão convexo em um pequeno catre. Disse seu nome, mas ele não
se moveu.
—Tem cinco minutos para ficar com ele, nenhum mais —então se dirigiu a um guarda no
que Jocelyn nem sequer tinha reparado até esse momento—: Duff, traga para a dama de
volta ao salão quando tiver acabado o tempo. E não deixe que entre à cela.
—Sim, senhor —disse o enorme guarda de cabelo e olhos negros.
Connor partiu sem lhe dizer nada mais, mas sim lhe lançou um último olhar que dava fé de
sua irritação. Jocelyn pronunciou o nome de seu irmão uma vez mais.

Connor não compreendia o comportamento de sua esposa, mas tampouco o seu. Ao fazê-la
ir ao salão, não tinha tido a menor intenção de permitir que visse seu irmão e muito menos
que falasse com ele. O que pretendia era cumprir com sua palavra e com o acordo
matrimonial; seu irmão ficaria em liberdade logo que Connor se deitasse com ela. Mas seu
olhar enquanto o desafiava e sua honra de cavalheiro lhe tinham feito mudar de opinião.
Era consciente de que Jocelyn tinha sacrificado sua vida inteira por salvar a de seu irmão.
E sabia também que ele a aterrorizava. Mas tinha visto como era capaz de controlar esse
terror para pressioná-lo pelo bem do jovem Athdar. Certamente se haveria sentido mais
ofendida se soubesse dos verdadeiros motivos pelos que tinha tido que casar-se com a
Besta e a implicação de seu irmão no plano.
Acabava de voltar a sentar-se no salão quando sentiu as olhares horrorizados dos presentes
cravados nele. Acaso acreditavam que a tinha trancado? Deu um golpe na mesa com ambos
os punhos e, depois de ficar em pé, olhou-os a todos lentamente.
—Não pode culpá-los, Connor —lhe advertiu Duncan com um toque zombador que não
gostou de nada—. Você mesmo forjou sua reputação e a utilizou sempre que te conveio
fazer. Assim não pode culpá-los por pensar o pior de você.
—E você, Duncan? —perguntou a seu amigo sentando-se de novo—. Não o pensa também?
Você não acha que tenha trancado a minha mulher igual tranquei a seu irmão?
—Acredito que se continuar como começou, pode ser que deseje havê-lo feito.
Connor assentiu, completamente de acordo com o comentário de seu amigo. Aquela
mulher só levava um dia ali e já lhe tinha feito mudar de opinião várias vezes. Ao enviar
Duncan para falar com seu pai, tinha imaginado um matrimônio graças ao qual teria uma
mulher na cama pelas noites e completamente fora de sua vista durante o dia. Sabia sem
lugar a dúvidas que nunca poderia amar a outra mulher do modo que tinha amado Kenna,
por isso nos últimos tempos tinha acabado por aceitar a idéia de casar-se só com o fim de
dar um herdeiro ao clã. Se não deixava que lhe importasse muito, se a mantinha a
distância, poderia proteger seu coração de ter que voltar a sofrer a terrível agonia de perder
alguém tão querido.
Mas algo lhe dizia que aquela esposa que se procurou ia lhe dar mais problemas dos que
tinha previsto. Como se a tivesse feito aparecer com o pensamento, Jocelyn entrou no salão
junto a Duff e voltou para a mesa sem levantar o olhar do chão. O que fez a seguir deixou
ao Connor estupefato.
Deteve-se frente a ele, onde todos podiam vê-la, e se inclinou perante ele lhe fazendo uma
pronunciada reverência sem olhá-lo em nenhum momento. Sua voz se ouviu em todo o
salão, rompendo o silêncio com suas palavras.
—Suplico-lhe que me perdoe, senhor. Peço-lhe desculpas por ter questionado sua honra.
Connor sentiu um nó na garganta que não lhe deixava engolir a cerveja que acabava de
beber. Em sua voz não havia outra coisa que sincero arrependimento. Sabia que estava
fazendo aquilo para que todos o vissem, mas ao mesmo tempo tinha a certeza de que era
um gesto sincero. Engoliu com força antes de falar.
—Sente-se junto a mim e tome seu café da manhã.
Jocelyn ergueu as costas lentamente e foi sentar- se a seu lado. Connor lhe ofereceu uma
parte de pão que ela aceitou, seus dedos se roçaram por uns instantes. Ao ver que afastava
o prato de aveia e agarrava uma parte de queijo, Connor chamou um servo.
—Ian, traga para a senhora outro prato de aveia. O seu se esfriou.
—Não, Ian, não faz falta.
Voltava a lhe contrariar em público. Connor fechou os olhos alguns instantes e respirou
fundo antes de voltar a dar a ordem ao servo.
—Vai ser assim sempre? Eu dou uma ordem e você a desobedece sistematicamente?
Por uma parte desejava rir, ao menos não era a idiota de cérebro oco com a que tinha
acreditado que se veria obrigado a casar-se. Se tinha que casar-se, no fundo agradecia que
tivesse sido com uma mulher que não se encolhia como fazia a maioria. Mas como senhor e
chefe do clã, não podia permitir que questionasse suas ordens continuamente.
Jocelyn por fim o olhou e ao fazê-lo, Connor viu como sua expressão se tornava em um
gesto um pouco menos desobediente, mas apertava os lábios como se estivesse tratando de
conter-se de falar. Bem. Devia pensar antes de agir. Soube que o tinha compreendido
quando Jocelyn deu o prato de aveia a Ian para que o trocasse por outro.
Connor assentiu com satisfação. Possivelmente funcionasse. Depois daquilo, Connor
cercou conversa com o Duncan para discutir as tarefas programadas para a jornada, mas
aproveitou o momento para observar a sua esposa com mais calma.
Tinha um aspecto singelo: seu rosto, seus olhos e seu cabelo não eram nada excepcional,
mas tampouco careciam de atrativos. Depois da extraordinária beleza de Kenna, Connor
não tinha querido outra mulher bonita. Devia admitir que sim se movia com graça e sem
dúvida as formas de seu corpo eram seu melhor atributo; tinha-o descoberto ao ver seus
ombros nus e inclusive o começo de seus seios quando lhe tinha caído a toalha essa manhã;
naquele momento a reação de seu corpo lhe havia dito que consumar o matrimônio não
suporia dificuldade alguma. Removeu-se na cadeira ao recordar uma vez mais a imagem de
sua pele cremosa.
Como se houvesse sentido que a observava, Jocelyn levantou o olhar e se encontrou com os
olhos de seu marido. Possivelmente se tivesse precipitado ao valorizar seus atributos, pois
ao olhá-la fixamente viu um brilho em seus olhos que os fazia tremendamente atrativos.
Não, senhor, não seria nada difícil. A imagem de seu corpo nu invadiu sua mente e teve
que fazer um esforço para jogá-la de lado.
—Deveria ir ver as costureiras para que lhe fizessem algum vestido.
—Sei costurar, senhor, e tenho roupa… só que não aqui. Não tive tempo de fazer a bagagem
devidamente.
—Então terá que substituir essas roupas por outras novas, lady MacLerie não pode passear
pelo castelo ou pelo povoado como te encontrei esta manhã.
Jocelyn abriu a boca e se ruborizou. Parecia que havia um modo de fazê-la calar.
—Ailsa se encarregará de tudo, agora se me desculpa… —ficou em pé e fez um gesto a
Duncan para que o seguisse—… temos que nos ocupar de certas coisas.
Saíram do salão a toda pressa enquanto Connor urgia a seu corpo a acalmar-se. Estava
desejando que chegasse a noite porque então a faria dele e o matrimônio ficaria
consumado.
Aquela mesma noite.

Fazia já tempo que tinha escurecido, mas Connor não tinha voltado para castelo ainda.
Cada vez que Jocelyn perguntava a algum servo se costumava a retornar tão tarde, recebia
uma espécie de grunhido ou de murmúrio por resposta que não lhe esclarecia nada.
Quando por fim chegou à conclusão de que não estavam pelo trabalho de ajudá-la ou falar
sobre seu marido, procurou refúgio na solidão de seus aposentos.
Tinha sido um dia tremendamente frustante para ela. Tinha visitado as costureiras do
castelo e também ao sapateiro do povoado, tudo isso acompanhada pela presença vigilante
de Ailsa. De volta ao castelo com suas novas posses, Jocelyn tinha ficado surpresa de que
Connor não tivesse retornado ainda. Tinha chegado e passado o momento do jantar e sua
ausência tinha começado a incomodá-la de tal modo, que tinha pedido uma bandeja para
jantar a sós em seu quarto em lugar de fazê-lo perante o atento olhar de sua gente. Ali, em
seu quarto, era onde tinha passado as seguintes horas. Esperando.
Sobressaltando-se com cada ruído.
Impaciente por que chegasse a noite… e ele.
Sabia que o adiamento que lhe tinha concedido a noite anterior não voltaria a repetir-se,
por isso essa vez teria que cumprir sua parte do trato. Poderia fazê-lo? Jocelyn tinha
desfrutado com os beijos que tinha compartilhado com Ewan ocasionalmente, pois tinha
tido a convicção de que se casaria com ele. Sabia o que se esperava de uma esposa no leito
matrimonial, embora desconhecia os detalhes do ato em si. Não podia nem imaginar o fato
de entregar-se a um completo desconhecido. Pôs-se a tremer de medo, confusão e
curiosidade.
Cora, a jovem criada que tinha provocado o mal-entendido com Connor, tinha voltado para
seu quarto para lhe preparar a cama e avivar o fogo. Jocelyn se encontrava junto à janela,
com o olhar cravado no pátio, onde podia ver os guardas passeando de um lado a outro do
muro principal. Além disso, não havia nenhum outro movimento à vista.
O som da porta a fez girar-se rapidamente, mas em lugar de seu marido se encontrou com
Ailsa, que lhe levava roupa. A mais velhas das criadas disse algo a mais jovem, que saiu do
quarto imediatamente.
—Senhora — disse Ailsa assim que ficaram sozinhas—, trouxe-lhe uma camisola limpa e
uma bata. Depois de que se trocar, escovarei-lhe o cabelo se o desejar.
Jocelyn obedeceu quase sem pensar e minutos depois, encontrava-se envolta na pesada
bata e sentada frente ao fogo. As carícias da escova no cabelo a ajudaram a relaxar-se um
pouco enquanto esperava que chegasse o momento de enfrentar a seu destino.
Connor voltaria logo ? Possuiria-a então diretamente sem lhe dar lugar a opinar sequer?
Moveu-se na cadeira inquietamente, sem poder controlar as crescentes duvida que
invadiam sua mente.
—Há algo que deseje me perguntar, senhora?
Jocelyn se surpreendeu com o oferecimento.
—O que quer dizer, Ailsa? —perguntou olhando à criada.
—Estava pensando que possivelmente sua mãe não a preparou para a noite de núpcias.
—Não, Ailsa, não tenho nada que te perguntar.
—Como quizer. Disse-lhe sua mãe o que devia esperar?
—Na realidade disse que meu marido me diria tudo o que precisasse saber —sussurrou
Jocelyn, sem saber bem se era isso o que devia esperar realmente. Possivelmente se tivesse
sido Ewan… mas com Connor, teria desejado saber bem o que era o que ia acontecer
exatamente entre eles.
— Tem certeza? —insistiu a criada.
—Já ouviu a senhora, Ailsa. Seu marido responderá a suas perguntas.
Jocelyn se voltou para a porta, boquiaberta. A imagem de Connor enchendo a soleira com
sua altura, cortou-lhe a respiração. Fechou bem a bata e viu como Ailsa o saudava com um
leve movimento de cabeça e saía do quarto. Ele fechou a porta a suas costas. Jocelyn não
podia nem mover-se, lhe tinha feito um nó na garganta e lhe faltava o ar. Depois de dar só
dois passos para ela, Connor se deteve e Jocelyn teve que levantar o olhar para ele.
—Me diga, esposa, o que deseja saber?

Jocelyn teve que lutar contra o desejo de sair correndo dali ou ao menos esconder-se atrás
da enorme cama, mas o que fez foi respirar fundo e tentar procurar uma resposta a aquela
pergunta.
O que desejava saber? Tudo? Nada? Sabia no que consistia o ato; não era isso o que a tinha
preocupado do momento em que tinha recebido a notícia de seu matrimônio… Por fim
soube o que queria saber.
—Por que eu?
Não o olhou aos olhos ao falar, pois não sabia se queria ver o que se refletia neles para
ouvir a pergunta.
Sua atitude para ela até o momento tinha sido muito pouco amável, mas bem hostil, mas
Jocelyn continuava sem compreender o motivo daquele matrimônio.
—Necessitava de uma esposa e você estava disponível.
Não havia nem rastro de hostilidade em sua voz; nada que desse a entender que o que dizia
não era verdade.
Sua explicação não desafinava absolutamente com o mundo no que ambos viviam; o
matrimônio não tinha nada a ver com sentimentos de afeto entre os cônjuges, por isso o
afeto que ela sentia por outro carecia completamente de importância.
Jocelyn sentiu que se aproximava dela um pouco mais, embora só se ouvia o crepitar do
fogo na lareira. Elevou o olhar para ele.
—Não desejava se casar?
—Não tinha sentimento algum a respeito, mas sou o chefe do clã, necessito de herdeiros e,
por isso, necessito de uma esposa.
—E qualquer mulher teria valido? —fechou a boca em seguida, mas as palavras já tinham
escapado de seus lábios.
Connor piscou ao ouvir aquela pergunta carregada de sarcasmo. Aquele não era momento
de ofendê-lo. Mas então ele reagiu de um modo surpreendente. Sua risada encheu o quarto
e Jocelyn pensou que parecia mais acessível quando sorria.
—Não, sou mais exigente. Pedi uma mulher de aspecto singelo, mas que não tivesse a
cabeça oca.
Jocelyn o olhou com surpresa; surpreendia-lhe que tivesse estabelecido aqueles dois
requisitos e que os tivesse admitido ante ela. Então se deu conta do insulto que supunham
aquelas palavras para seu aspecto e teve que afastar o olhar para que ele não visse que a
tinha ferido.
—Não pretendia te insultar —disse aproximando-se dela e baixando a voz até que não fosse
mais que um sussurro—. Não queria uma esposa que se assustasse comigo. Queria uma
mulher com fibra.
—E sem atrativo —Jocelyn agarrou a escova da cômoda só para distrair da dor que sentia.
—Devo dizer que isso era mais um desafio para Duncan que um verdadeiro requisito —
Connor lhe pôs a mão sobre a sua e lhe tirou a escova. Ficou agachado a seu lado—.
Podemos falar de algo menos conflitivo?
Jocelyn sentiu um calafrio ao notar o roçar de sua pele. Seria agora? Tinha chegado o
momento?

Quatro

—Não sei o que fazer —sem poder acreditar que aqueles palavras tivessem saído realmente
de sua boca, Jocelyn se afastou dele.
Sua altura e sua força a alteravam em mais de um sentido e precisava pôr alguma distancia
para poder controlar seus temores. Surpreendeu-lhe que Connor a deixasse afaatar-se de
seu lado. A só uns passos dele, voltou-se a olhá-lo.
—Não esperava outra coisa de você —disse ele—. Alguém que jamais tenha ordenhado uma
vaca ou matado um porco não saberia como fazê-lo se alguém o pedisse.
Jocelyn ficou boquiaberta ao lhe ouvir comparar o que ia acontecer entre ambos como
ordenhar uma vaca ou matar um porco. Connor estirou uma mão para frear qualquer
resposta que ela fosse dar e em seguida se aproximou.
—Sei o que vai dizer. Será tudo assim entre nós? Eu digo algo e você protesta? —
perguntou-lhe com voz profunda e olhar intenso.
Jocelyn pensou o que acabava de ouvir antes de responder. O certo era que tinha sido
assim desde seu primeiro encontro, também depois no salão e inclusive agora. Fechou a
boca e se deu conta de que não tinha nada que responder. Tinha estado a ponto de
protestar como ele tinha adivinhado, mas a calidez do ambiente e o aroma de Connor a
tinham feito recordar uma vez mais o que a esperava. Um tremendo rubor lhe avermelhou
as bochechas.
—Entendo —disse ele indo para a mesa que havia junto à cama, de onde agarrou uma jarra
de vinho e serviu duas taças—. Suspeito que se trata de um inocente temor e não de uma
esposa que desafia a seu marido.
Estendeu-lhe uma taça, que Jocelyn aceitou. Possivelmente o vinho lhe temperasse um
pouco os nervos e fizesse que todo o resto fosse mais fácil. Tampouco tinha outra opção. A
vida de seu irmão, inclusive a vida de seu clã dependia de que ela cumprisse sua parte do
trato. Se Connor a devolvesse a casa havendo-a rechaçado…
Connor bebeu sua taça de um só gole e depois ficou olhando-a enquanto ela fazia o mesmo.
O vinho lhe chegou ao estômago rapidamente e sentiu como lhe esquentava o corpo.
Possivelmente se bebesse um pouco mais, deixaria de sentir tanto medo. Jocelyn estirou o
braço para lhe pedir que voltasse a lhe encher a taça. Connor o fez sem afastar os olhos
dela, o que provocou que o rubor voltasse para suas bochechas com major força.
O medo das inocentes, pensou Connor enquanto lhe servia o vinho. Pôs só uma pequena
quantidade, pois estava bem que a ajudasse a tranqüilizar-se, mas não queria que se
embebedasse.
Segundos depois deixou sua taça sobre a mesa e foi para ela.Quanto antes começasse,
antes terminaria. Jocelyn quase tinha deixado de respirar ao vê-lo ir para ela, assim
esperou uns segundos antes de aproximar-se um pouco mais. Então a agarrou pelo
cinturão da bata e puxou até desfazer o nó. O objeto se abriu deixando à vista uma fina
camisola e seu exuberante corpo.
Jocelyn ficou tensa assim que ele a tocou. Apesar de sua atitude, seu corpo era suave e
brando nos lugares que devia ser. Cheirava aos óleos aromáticos do banho. Parecia respirar
com normalidade, mas tinha o olhar perdido em um lugar do quarto.
—Ponha as mãos na minha cintura —lhe disse ele.
—O que? —perguntou, sobressaltada, mas olhando-o por fim.
—Disse que não sabia o que fazer, assim que lhe estou dizendo isso eu. Ponha as mãos na
minha cintura.
Podia sentir o calor de sua mão através da camisa, também sentiu seu tremor, mas tratou
de não pensar nisso. Seu corpo, tentado pelas curvas que acariciavam suas mãos,
preparou-se imediatamente para o que viria. Esperou alguns segundos, depois a puxou e a
apertou contra si.
Seus mamilos se endureceram, o que Connor não sabia era se seria por causa da excitação
ou do medo. De seus lábios escapou um tênue gemido que a deixou boquiaberta inclusive a
ele, mas Connor sabia que não podia tocá-la ali. Assim optou por lhe dar um beijo na
bochecha e depois foi baixando do queixo até o pescoço. Quando ela apertou as mãos ao
redor de sua cintura e lhe acelerou a respiração, Connor soube que podia continuar.
Levantou-lhe o cabelo dos ombros e começou a lhe beijar o pescoço e todas as regiões
sensíveis que tinha descoberto nela. Retirou um pouco mais a bata até que caiu ao chão. Já
fosse por instinto ou por proteger-se, Jocelyn tratou de cobrir os seios com as mãos.
Connor a acariciou com o olhar, de cima a baixo e de baixo para cima. Provavelmente não
suspeitava o que a luz das velas revelava de seu corpo; o triângulo escuro que havia entre
suas pernas parecia incitá-lo a tocá-lo, mas Connor preferiu esperar. Ficou detrás dela e
voltou a lhe beijar o pescoço, acariciando-a com a língua e mordendo-a brandamente.
Esperou algum tipo de resistência por sua parte e, ao não encontrá-lo, continuou
acariciando-a por debaixo da fina camisola, assim pôde tocar a pele suave de suas costas e
os seios. Jocelyn jogou a cabeça para trás e ele aproveitou o movimento para lhe chupar o
pescoço sem deixar de lhe acariciar os seios.
Tinham-na beijado antes e inclusive tinha deixado que Ewan lhe tocasse os seios uma vez,
mas nada do que tinha acontecido entre eles poderia lhe haver preparado para aquilo.
Apesar de que não se amavam e apenas se conheciam, aquele homem estava lhe fazendo
sentir coisas que jamais teria imaginado. O que sua boca provocava em seu caminhionão
fazia a não ser intensificar a dureza de seus seios e o úmido calor que notava entre as
pernas. Fazia que desejasse… algo mais. Jocelyn aguardou com a esperança de que lhe
ensinasse o que era isso mais que desejava sem ter que perguntar-lhe.
Sentiu uma de suas mãos na coxa, subindo mais e mais até chegar ao ventre. Ela mordeu o
lábio com impaciência. À medida que sua mão lhe aproximava do lugar onde mais a
necessitava, Jocelyn acreditou poder esquecer que aquele homem era um desconhecido
para ela. Que estava com ele por obrigação e que tinha tido que casar-se com ele e não com
o Ewan.
Ewan!
Deveria ter sido ele o que a acariciasse desse modo. Deveria ser a ele a quem Jocelyn se
entregasse, não a aquele desconhecido.
Todo seu corpo ficou tenso ao dar-se conta de que quando chegasse o amanhecer todos
seus sonhos se teriam esfumaçado, todas suas esperanças de casar-se com o homem
que amava e que tinha escolhido, todos seus desejos de viver com uma família que a
queria e a protegia, tudo isso teria acabado para sempre. Uma vez que aquele homem, seu
marido, possuísse seu corpo, não haveria esperança.
Sabia que ele se deu conta de que algo tinha mudado dentro dela porque a abraçou com
mais força e tinha deixado de beijá-la, embora continuava sentindo o calor de sua boca
contra a pele.
—Calma —lhe sussurrou ao ouvido—. Não vou machucá-la.
Deixou que lhe virasse e então se encontrou com seu intenso olhar. Seus olhos tinham um
brilho dourado e as sombras que projetava o fogo marcavam os duros ângulos de seu rosto.
Depois de haver sentido a força de seus braços, Jocelyn sabia que tudo naquele homem era
duro. Só sua voz parecia suave.
—Vamos, deixa que o faça da melhor maneira possível —lhe pediu com doçura, ao tempo
que a levava para a cama.
Uma vez junto à cama, levantou-a do chão sem nenhum esforço e a deixou sobre o colchão.
Sob seu atento olhar, Connor tirou seu kilt e a camisa, ambos os objetos caíram ao chão.
Jocelyn não pôde evitar fixar-se nas fortes coxas que tinham ficado à luz… ele se inclinou
sobre ela e voltou a acariciá-la. Jocelyn engoliu em seco com esforço e o olhou nos olhos
enquanto ele se deitava a seu lado sobre a cama.
Connor se estirou junto a sua esposa, que já não parecia muito desejosa de estar com ele.
Não havia dito nada, nem tinha protestado em nenhum momento, mas seu corpo lhe tinha
deixado bem claro que algo tinha esfriado. Agora Connor devia enfrentar à dura tarefa de
reavivar sua paixão para poder acabar com tudo aquilo e seguir adiante com suas vidas.
—Calma —lhe sussurrou enquanto penetrava a mão por debaixo da camisola e começava a
subir centímetro após centímetro.
Ao ver que não se abrandava sob suas mãos, Connor mudou de estratégia. Jocelyn parecia
ter desfrutado tanto como ele da atenção que lhe tinha prestado a seus seios, assim
começaria por aí.
Inclinou-se sobre ela para roçar um de seus peitos com a língua, acariciando-o através do
tecido. Depois agarrou o seio com a mão e brincou com o mamilo uma e outra vez até que
sentiu que a tensão de seu corpo começava a desaparecer.
—Só tem que pensar no prazer que está sentindo e me deixar que eu te guie —lhe
aconselhou enquanto apertava a força de seu membro contra o quadril dela.
A primeira reação de Jocelyn ao notá-lo foi olhá-lo com os olhos muito abertos, mas depois
os fechou e assentiu. Seu corpo começou a responder lentamente às carícias e muito em
breve Connor conseguiu que estivesse preparada para algo mais. Dessa vez, quando lhe
levantou a camisola e se deitou emcima dela lhe abrindo as pernas, ela pareceu desejar sua
aproximação. Connor lhe pôs as mãos sob os joelhos para lhe levantar as pernas e poder
entrar em seu corpo, que agora estava úmido e ardente.
No mesmo instante em que se inundou em lhe veio à cabeça uma idéia absurda… aquela
era a primeira vez que fazia o amor com uma mulher que tivesse alguma importância em
sua vida depois da morte de Kenna, fazia mais de três anos. De repente ouviu uma voz
dentro de sua mente que suplicava o perdão de Kenna pelo que estava fazendo; o coração e
a alma lhe diziam que ao possuir o corpo de sua nova esposa, estava sendo infiel aos votos
que tinha trocado com Kenna anos atrás.
Necessitava seu perdão por muitas coisas, mas agora era muito tarde.
Apertou os dentes enquanto enchia o corpo de Jocelyn com o seu e viu uma só lágrima que
percorria sua bochecha lentamente. Connor não se atrevia a deter-se, pois teria sido uma
humilhação não poder cumprir com sua obrigação de marido, assim continuou movendo-
se até sabendo de que ela não estava desfrutando até que, minutos depois, esvaziou-se
dentro dela.
Deitou-se sobre ela por alguns segundos para recuperar as forças e poder retirar-se.
Limpou-se com a túnica que não tinha chegado a tirar-se e se levantou da cama. Ela ficou
imóvel, com os lábios apertados e o rosto tão pálido como a camisola; não ficava nem
rastro do atrativo rubor que tinha colorido suas bochechas minutos antes. Sentia uma
inexplicável e poderosa necessidade de abraçá-la e aliviar a dor que ele mesmo lhe tinha
causado, assim que vestiu a roupa a toda pressa e se dirigiu para a porta.
antes de sair lhe disse umas palavras sem sequer voltar-se para olhá-la.
—Enviarei a Ailsa em seguida —disse com grande esforço.
—Não —gritou ela—. Não envie ninguém, por favor.
—Como deseja —respondeu ele aceitando sua resposta sem fazer mais perguntas. Depois
fechou a porta detrás de si e apoiou as costas no muro do corredor.
Sem saber o que esperava que acontecesse, Connor deu meia volta e se afastou dali. Mal
tinha chegado a seu quarto quando estalou a tormenta; aos trovões e relâmpagos seguiu
uma tromba de água que caiu sem clemência sobre Lairig Dubh.

A porta se fechou e Jocelyn afundou o rosto nos almofadões, sentia-se afligida e exausta
pelo que acabava de acontecer entre eles. A rapidez com a que Connor partiu não deixava
lugar a dúvidas de seu fracasso como esposa, não tinha sido necessário que lhe fizesse
nenhum tipo de recriminações para saber que não tinha ficado satisfeito.
Haveria dito o nome de Ewan em voz alta? Não acreditava havê-lo feito, mas o tinha
repetido uma e outra vez em seus pensamentos e em seu coração para não pensar no
homem que realmente estava fazendo-a sua. Quando lhe havia dito que pensasse no prazer
que sentia, a voz e o rosto de Connor se converteram na voz e o rosto de Ewan. Tinha
imaginado que eram os lábios de Ewan os que beijavam os seus e chupavam seus seios, que
eram suas mãos as que a acariciavam e lhe faziam sentir o que nunca havia sentido.
Só aquela terrível dor tinha quebrado a cena que tinha imaginado e a tristeza que tinha
visto nos olhos de seu marido ao possui-la tinha confirmado a verdade… agora pertencia a
Connor, mas ele não estava satisfeito.
Seguia sentindo dor entre as pernas e necessitava algo com o que limpar o sangue, assim
rasgou a barra da camisola e se secou com ela. Como já tinha ficado destroçada,a tirou,
inundau-o na tina de água e se lavou o melhor que pôde. Uma vez lavada, rasgou outro
pedaço e depois de voltar a molhá-lo colocou entre as pernas com uma ligeira pressão que
lhe serviu de enorme alívio. Repetiu a mesma operação até que desapareceu o ardor.
Por fim se envolveu na bata e se dirigiu à cama, mas nada mais ver o leito soube que não
poderia deitar-se ali. Era perfeitamente consciente de que devia confrontar o acontecido e
enfrentar-se a ele quanto antes, mas naquele momento o que desejava era evitar ambas as
coisas, assim, puxou a manta e depois retirou também os lençóis. Com tudo isso e duas
mantas mais se fez uma espécie de cama junto a lareira. Ali não teria frio. Já se enfrentaria
tudo pela manhã.
Pouco depois estalou a tormenta que a sua vez fez estalar dentro dela as emoções que tinha
tentado conter. O terror de ter sido entregue a aquele homem, a dor de ter tido que deixar
a sua família e a seu verdadeiro amor atrás e a desesperança ante o futuro que a aguardava,
tudo isso a alagou igual à chuva alagava os campos ao redor do castelo.
Feita um novelo entre os lençóis e esgotada pelo preço físico e emocional que tinha tido
que pagar pela liberdade de seu irmão, Jocelyn caiu em um profundo sono que a afastava
da realidade de sua vida. Em seus sonhos viu o homem que amava.
A escuridão e o calor do fogo lhe sentavam bem, pensou Jocelyn ao ouvir que alguém tinha
entrado em seus aposentos. Ficou imóvel, com os olhos completamente fechados. Depois
de várias tentativas, sabia que se levantasse, a cabeça começaria a lhe dar voltas e voltaria a
vomitar.
Não, preferia continuar ali, rodeada de escuridão e calor. Desgraçadamente, a voz que a
chamava era cada vez mais insistente.
—Senhora? Lady Jocelyn? Está bem?
Era a criada mais velha que tanto a tinha ajudado em outros momentos, mesmo assim, a
dor que sentia no ventre não a deixava responder.
—Senhora? Quer que avise ao senhor?
—Não! —gritou Jocelyn finalmente tirando o rosto dentre a roupa de cama.
Ailsa se tinha agachado a seu lado para poder lhe falar de perto, assim Jocelyn só teve que
negar com a cabeça para reafirmar sua resposta, e imediatamente depois aconteceu o que
ela tinha temido. Felizmente Ailsa foi o bastante perceptiva para adivinhar o que estava a
ponto de ocorrer e lhe deu uma terrina rapidamente.
Passaram vários minutos antes de que lhe assentasse o estômago e pudesse voltar a deitar-
se. Ailsa tratou de aliviá-la com palavras de consolo e um pano úmido que lhe aplicou na
testa.
—Deite-se, senhora. Em seguida lhe passará.
—É culpa do vinho —sussurrou ela a modo de explicação.
—Estava estragado? —a criada foi cheirar a jarra e imediatamente negou com a cabeça—.
me parece que está bem. Pode ser que o problema fosse a quantidade, não a qualidade.
Jocelyn não respondeu, não era necessário. Atrás da porta começavam para ouvir-se
ruídos que indicavam que o castelo estava despertando. Não poderia continuar ali,
escondendo-se de tudo e de todos aos que queria evitar durante o resto de sua vida.
—Senhora, pedi que lhe preparassem um banho. Se quiser, ajudarei-a a levantar-se.
—Prefiro ficar onde estou, Ailsa.
Justo nesse momento alguém bateu na porta e Jocelyn soube que não poderia fazer o que
preferia. A determinação de Ailsa era evidente e ela estava muito cansada para lhe
contrariar, assim aceitou a mão que lhe tendia e conseguiu ficar em pé. A cabeça se
queixava de cada movimento e o estômago ameaçava rebelar-se de novo. Fechou os olhos e
deixou que a criada a guiasse até uma cadeira.
Como se tivesse adivinhado o esforço que tinham suposto para ela aqueles poucos passos,
Ailsa a ajudou a sentar-se e depois a deixou ali tranqüila alguns instantes.
Foi então quando a criada descobriu os restos da camisola ensangüentada que Jocelyn
tinha deixado em um canto do quarto. Ailsa a olhou horrorizada.
—Senhora… —começou a dizer com preocupação—. Quer que chame o curandeiro?
Jocelyn não encontrava as palavras, só podia pensar em que precisava continuar
dormindo. Limitou-se a negar com a cabeça.
A criada olhou a seu redor; o dormitório parecia um campo de batalha. A cama desfeita, os
lençóis e mantas atiradas por toda parte, a jarra de vinho no chão e, sem dúvida também o
aspecto de Jocelyn era um elemento a mais do caos.
Ailsa começou a recolher e a limpar tudo sem a menor pressa por responder a quem tinha
batido na porta. Teve que fazê-lo depois de que chamaram de novo, mas deu algumas
instruções que Jocelyn não pôde ouvir e voltou a fechar para continuar com o que estava
fazendo.
Fez a cama com a rapidez que lhe davam os anos de experiência. Titubeou tão somente ao
ver o lençol manchado de sangue, mas em seguida o jogou de lado e pôs outro limpo.
—Senhora, fique descansando aí até que eu volte —lhe disse ao terminar.
—Estou bem, Ailsa. De verdade —assegurou ela com um tom de voz tão fraca que não
parecia nada convincente.
—Não entrará ninguém até que eu lhes dê permissão para fazê-lo, assim feche os olhos e
descanse. Trarei-lhe algo que lhe acalme o estômago e lhe dê forças para banhar-se.
Saiu dali sem dizer nada mais e Jocelyn ficou de novo a sós em um quarto on de não havia
mais nenhum rastro que indicasse o que ali tinha acontecido na noite anterior. Mas a dor
de seu coração não seria tão fácil de arrumar.

Cinco

Connor olhou pela pequena janela de seu quarto e tratou de ordenar seus pensamentos.
Não era habitual nele que bebesse a quantidade de vinho que tinha ingerido ao retornar a
seus aposentos a noite anterior. Depois da segunda jarra, tinha ordenado que liberassem o
jovem MacCallum. Depois da terceira, trancou-se em seu quarto para tentar apagar de sua
memória o que tinha feito, o motivo pelo qual tinha fugido do dormitório de sua esposa. A
quarta jarra por fim tinha feito efeito e tinha conseguido que dormisse na cadeira.
O atordoamento provocado pelo vinho lhe ajudava agora a não concentrar-se na notícia de
Duncan sobre certo gado roubado que deviam encontrar. Levava vários minutos sem lhe
fazer o menor caso quando se abriu a porta do quarto e entrou uma criada enlouquecida.
Embora apenas lhe chegava ao peito, Ailsa conseguiu lhe dar um pequeno golpe na cabeça.
—Ailsa! Que demônios te ocorre?
Quando viu que se dispunha a lhe bater uma vez mais sem o menor indício de
arrependimento, Connor a agarrou pelas mãos e a imobilizou. Duncan, por sua parte,
observava a cena com um sorrizinho malévolo.
—Como pôde? Criei-o perto de meu peito e sei que ninguém jamais o maltratou —
conseguiu soltar uma mão e voltar a lhe bater.
—Me diga agora mesmo a que vem este ataque de loucura. Por muito que me tenha
cuidado no passado, não vou permitir este comportamento.
A mulher deu um passo atrás e respirou fundo várias vezes. Estava tão raivosa com seu
senhor, que nem sequer se precaveu da presença de Duncan.
—Sei que não queria voltar a casar-se. Todos sabemos. Mas essa dama é agora sua esposa,
e chegou sendo donzela.
Connor sentia como aumentava a raiva dentro de seu corpo. Não tinha o menor desejo de
discutir o ocorrido entre sua mulher e ele com ninguém, nem sequer sua velha babá. Mas
antes de que pudesse pô-la em seu lugar, Ailsa voltou a falar com a mesma fúria.
—Acabo de deixar a sua mulher em seu quarto, onde a encontrei deitada no chão frente ao
fogo. Passou a noite no chão, soluçando e agasalhada com a roupa que pôde arrancar da
cama.
—O que? —grunhiu Connor—. Não pode ser. Estava na cama quando eu a deixei.
—Pois parece que bebeu o que restava no jarro de vinho e dormiu no chão. E isto —disse
lhe atirando um montão de roupa- isto é o que vestia quando você partiu.
O tecido era uma camisola de mulher feito farrapos e manchado de sangre seco. Connor
apertou os dentes. Era possível que fosse de Jocelyn? Não lhe tinha parecido que se
encontrasse mal. De fato, mostrou-se mais incomodada durante o ato que quando tinha
terminado e se levantou da cama. E se tinha negado a que enviasse Ailsa, o qual sem
dúvida significava que estava bem.
—Estava bem quando eu a deixei.
—Pois agora não está.
Naquele momento, Duncan fez um ruído que interrompeu a conversa. Ailsa viu então ao
homem de confiança do Connor e deu um passo atrás, afastando-se do confronto.
—Ailsa, se encarregue de seus afazeres e eu me encarregarei dos meus —ordenou Connor
com a intenção de pôr fim ao bate-papo.
—Sim, senhor. Como deseja —disse a criada com uma raiva que não pôde ocultar.
—Eu não lhe fiz mal, Ailsa.
A mulher murmurou algo que, a julgar pela cara de seu amigo que tentava não rir, Duncan
ouviu.
—Pode ser que alguém de sua idade não seja a mais apropriada para minha nova esposa.
Busque uma moça do povoado e ensine tudo o que deva saber para que se converta em sua
nova donzela.
Se Connor tinha acreditado que essa ameaça lhe baixaria a guarda, equivocou-se por
completo. A expressão do rosto de Ailsa não fez a não ser endurecer-se ao ouvir aquilo e a
fúria de seus olhos se acendeu ainda com mais força. A criada cruzou os braços sobre o
peito e olhou a seu senhor aos olhos com insolência. Tinha-a ameaçado muitas outras
vezes, mas nunca tinha conseguido livrar-se dela.
Possivelmente tivesse chegado o momento.
—Connor —interveio Duncan.
—Guarde o que pense, primo. Isto não tem nada a ver contigo.
—Então te desejo um bom dia —respondeu Duncan antes de dar meia volta e sair dali.
Junto com o Duncan tinha desaparecido a esperança de controlar a ira da Ailsa. Connor
não ia permitir que aquela conversa se convertesse em uma análise dos motivos pelos que
havia tornado a casar-se ou das intenções que tinha respeito a sua nova esposa. Assim,
levantou a mão e negou com a cabeça.
—Ailsa, vá ver o que necessita a senhora. Eu falarei com ela mais tarde.
—E o que lhe digo quando me perguntar por seu irmão?
Maldição! Como podia haver-se informado tão depressa?
—Não lhe diga nada. Eu falarei com ela.
Possivelmente fora algo que havia dito ou possivelmente o tom de sua voz, o caso foi que
Ailsa se deteve e o observou alguns instantes. Possivelmente se tivesse dado conta de que
tinha chegado ao limite do que Connor ia consentir lhe. Fosse o que fosse, Connor se sentiu
agradecido de que tivesse funcionado. A criada assentiu e se dirigiu para a porta.
Justo quando se dispunha a sair, as palavras escaparam de boca de Connor:
—Eu não lhe fiz nenhum mal, Ailsa.
—Como você diz, senhor —disse ela sem olhá-lo.
Deixando de lado à mulher pela que tinham estado discutindo, Connor decidiu que já
levava muitas horas trancado; precisava voltar para suas obrigações, assim saiu de seus
aposentos. Uma vez nos estábulos, reuniu um bom grupo de homens que deviam
acompanhá-lo às terras nas que se queixaram de que tinha havido invasões. Horas mais
tarde, a muitos quilômetros de distância, toda sua atenção se centrava em seu clã, suas
terras e na maneira de defender a ambos.

O respeito que Jocelyn sentia por Ailsa cresceu à medida que cada um dos remédios que
lhe oferecia sortia um efeito quase mágico… primeiro na cabeça, logo no estômago e depois
no resto do corpo. A beberagem de Ailsa lhe assentou o estômago e mitigou a dor de cabeça
e um longo banho quente minou as dores musculares e fez desaparecer o frio que parecia
haver lhe metido nos ossos durante a noite. Já vestida com roupa limpa e de casaco,
Jocelyn tinha a sensação de que todo o acontecido não tinha sido mais que um pesadelo.
Ela não era das que caía na autocompaixão e o mau humor, por isso confrontou o resto do
dia com a segurança de que o pior já tinha passado. Tinha sobrevivido à viagem até Lairig
Dubh, casou-se e deitou-se com a Besta. Não tinha sido uma experiência agradável,
embora em certos momentos sim tinha sentido prazer. Suas carícias lhe tinham feito sentir
coisas das que só tinha ouvido falar com outras mulheres, coisas que mal tinha começado a
descobrir com Ewan.
Se Connor cumprisse sua palavra, e não tinha a menor duvida de que o faria, seu irmão
ficaria livre para voltar para seu clã e lhes levar a ajuda e amparo prometido pelo clã
MacLerie. Jocelyn tinha intenção de perguntar por ditos planos logo que encontrasse ao
senhor. Os MacLerie tinham tratado Athdar de um modo desigual, por dizê-lo de algum
jeito, e Jocelyn só esperava que o temperamento de seu irmão não lhe causasse mais
problemas dos que já tinha. Aprenderia a controlar seu gênio à medida que fosse
convertendo-se em um homem, Jocelyn estava certa disso.
De acordo com o estabelecido no contrato de matrimônio, Athdar chegaria muito em breve
a casa com os recursos e os homens necessários para arrumar o castelo e o povo e
alimentar a todo o clã durante o inverno. Deixariam de ser o principal alvo dos clãs
vizinhos. Sim, seu matrimônio assegurava a sobrevivência de sua família. No momento,
enquanto continava chorando a perda de Ewan, Jocelyn se alegraria ao menos de que sua
família não iria morrer por falta de comida ou de um lugar no qual se proteger do frio.
O sol tinha conseguido aparecer entre as densas nuvens que tinham ficado no céu depois
da tormenta noturna. Jocelyn vestiu a capa sobre os ombros e desceu ao salão principal
com a intenção de ver seu irmão e ultimar os detalhes de sua liberdade. Depois,
possivelmente com sua companhia, exploraria a torre e o resto do castelo.
Chegou à pesada porta de madeira do salão depois da que se encontrava o passadiço que
conduzia às celas e tentou abrir. Parecia estar fechada com chave, entretanto não o tinha
estado a noite que Connor a tinha levado a ver seu irmão. Jocelyn tentou recordar o nome
do guardião… Duff.
—Duff? —gritou golpeando a porta—. Está aí?
Não houve resposta. Tentou abrir uma vez mais, mas foi em vão.
—Duff? Há alguém aí?
—Sabe Ailsa que saiu de seu quarto e está perambulando pelo castelo?
Jocelyn gritou ao sentir um sussurro no ouvido… Justo detrás dela. Era Duncan, o primo
do senhor, e parecia alegrar-se, assustando-a. Sentiu uma pontada ao recordar que seu
último susto tinha feito que ambos chegassem ao castelo cobertos de barro.
O ritmo da viagem de caminho ao castelo se converteu em uma verdadeira batalha em que
ela tratava de diminuir o passo para atrasar a chegada e ele acelerava para cumprir o
horário que lhe tinham designado. Em um momento dado, Duncan tinha esporeado a seu
cavalo estando ela emcima, Jocelyn se tinha atirado de propósito, agarrando Duncan para
que amortecesse a queda, sem imaginar que os dois cairiam no barro.
—Duncan —disse ela sem mover-se da porta.
—Senhora —respondeu ele com esse sorriso tão irritante que tinha. Esse sorriso com a que
parecia dar a entender que conhecia todas as respostas mas não queria as compartilhar
com ela. Por que o teria escolhido Connor para que fosse procurá-la em sua casa?—. Então,
sabe Ailsa que escapou qde seu quarto?
—Sou prisioneira? Como meu irmão —olhou à porta e depois outra vez a ele.
—Não, senhora. Você aqui é a esposa do senhor, não uma prisioneira. Ailsa disse que
estava… que não se encontrava muito bem esta manhã —corrigiu sem atrever-se a olhá-la,
coisa que ela agradeceu.
Jocelyn preferia não saber o que sabiam outros de seus assuntos pessoais; sobretudo se
tratasse de Duncan, um homem que utilizaria em seu contrário tudo o que soubesse.
—Já estou bem e agora quero ver meu irmão —disse voltando-se de novo para a porta para
chamar uma vez mais—. Mas parece que Duff não está em seu posto —Jocelyn duvidou se
lhe pedir algo que pudesse fazê-la estar em dívida com ele, mas finalmente o fez—. Pode
me levar ca meu irmão?
Seu rosto ficou pálido, tanto, que de repente parecia que fosse ele o que se encontrava mal,
então negou com a cabeça.
—Tem que falar com o senhor a respeito de seu irmão —deu um passo atrás e lhe deixou
caminho para que se afastasse da porta—. Vamos, acompanharei-a ao seu quarto.
—Não tenho a menor intenção de voltar para pá. Quero ver meu irmão e preparar sua
liberdade. Você conhece bem o acordo, negociou-o em representação de MacLerie. Se
disser que devo falar com o senhor antes de poder ver Athdar, chame-o.
—Chamar o lorde? —repetiu Duncan, estupefato—. Fala dele como se fosse um animal que
fará o que você ordene. Devem tê-la mimado muito se lhe permitiam tal comportamento.
Não me admira que seu clã esteja a beira da ruína se seu pai permitir a seus membros lhe
falar desse modo.
Aquelas palavras a deixaram gelada. Embora sabia que estava exagerando, sabia também
que aquele homem contava com a total confiança de Connor. Se o desejava, podia fazer que
a situação entre seu marido e ela fosse ainda mais complicada do que já era. Tinha
acreditado ver uma fibra de honra em seu comportamento, mas ao final, era o homem de
confiança da Besta.
—Entendeu-me mal, Duncan. Eu mesma irei em busca do lorde para lhe perguntar por
Athdar, se você fosse tão amável de me dizer onde se encontra. Não pretendia lhe faltar
com respeito.
Duncan ficou pensativo alguns segundos antes de assentir.
—Parece que ainda não se recuperou da viagem ou do acontecido nos últimos dias. Sua
preocupação por seu irmão é perfeitamente compreensível, inclusive admirável, mas
desnecessária. Se Connor houver dito que está bem, o está.
Só o céu sabia o esforço que teve que fazer naquele instante para controlar os desejos de
dar um murro em Duncan como Ewan lhe tinha ensinado a fazer. Mas então se deu conta
de algo… não tinha chegado a responder a sua pergunta.
Duncan sabia algo que não devia lhe revelar.
—Duncan, onde está meu irmão? —Jocelyn o olhou fixamente e viu como procurava as
palavras necessárias para lhe dar algum tipo de explicação ou desculpa.
—Olhe, senhora, aí vem Ailsa —Duncan deu meia volta e chamou à criada—. Ailsa, a
senhora está aqui. Chega no momento adequado, precisa ir descansar.
Assim se tinha assegurado de que todos os que passassem por ali ouvissem suas palavras e
Jocelyn sabia que não podia permitir que surgisse nenhum tipo de confronto. Sentiu um
profundo terror ante a possibilidade de que algo ruim tivesse acontecido a seu irmão. Ia
deixar que Duncan ganhasse aquele batalha, mas devia saber o que tinha sido de Athdar.
Assentiu com aparente obediência e ao mesmo tempo se inclinou a lhe dizer algo ao ouvido
que ninguém mais pudesse escutar.
—Ao menos me diga se estiver vivo —lhe sussurrou—. Só isso —lhe implorou apertando as
mãos com angústia.
Duncan fez um gesto que lhe encolheu o estômago.
—Está são e salvo, senhora —respondeu por fim—. O resto terá que falar com o lorde.
Ailsa chegou junto a eles e o olhou a um e a outro. A uma mulher tão ardilosa como ela não
poderia deixar de nota a tensão que havia no ambiente. Em lugar de levá-la para
descansar, Ailsa a agarrou pelo braço e a levou para a porta do salão.
—Vamos, senhora, acredito que um bom passeio será melhor que ficar trancada em seus
aposentos —a criada começou a andar, mas Jocelyn se deteve.
Ainda restava algo mais.
—Duncan, quando poderei falar com o lorde? Onde posso encontrá-lo?
—Foi a um povoado que se encontra nos limites de nossas terras. Voltará esta noite ou
amanhã pela manhã.
O que significava que teria que esperar várias horas ou inclusive um dia inteiro para saber
o que tinha acontecido com Athdar. Não podia fazer nada exceto tentar provocar Duncan,
o qual lhe serviria de diversão, mas não lhe proporcionaria nenhum resultado. Não
duvidava que lhe havia dito a verdade sobre o volta de Connor ou de seu irmão.
—Sendo assim, falarei com ele assim que voltar —assentiu Jocelyn, antes de continuar
caminhando junto à Ailsa.
Voltou-se a olhar ao Duncan quando estava a ponto de sair do salão. Em seu rosto havia
tanta frustração como a que sentia ela, mas por motivos opostos. E Connor MacLerie era o
causador da frustração de ambos.
Falar com o lorde?
Sim, claro que ia falar.

Jocelyn não demorou para descobrir que Ailsa era na realidade uma tirana com aspecto de
anciã donzela. Durante o resto do dia e até bem entrada a noite, a pequena criada
acompanhou quase pela força a Jocelyn a percorrer até o último canto do castelo e seus
arredores, até que Jocelyn não pôde mais. Ao chegar a hora do jantar e ver que o lorde não
havia tornado, sentiu a tentação de se esconder em algum canto no qual Ailsa não pudesse
encontrá-la e ficar ali dormindo.
Mas o plano não teve êxito. Finalmente, Ailsa cedeu e deixou que partisse para o seu
quarto para jantar a sós, pois não havia ninguém no castelo que pudesse sentar-se a sua
mesa no salão. Assim uns minutos depois, Jocelyn se encontrava sozinha frente ao fogo
diante de uma bandeja de comida de delicioso aroma e de um livro que tinha descoberto
durante seu passeio pelo castelo.
Depois de engolir a comida a um ritmo incrivelmente rápido e sem dar-se conta de quão
faminta estava, Jocelyn estirou as costas sobre o respaldo da cômoda cadeira que lhe
tinham levado ao quarto esse mesmo dia e deu uma olhada à cama. Sabia que dormiria no
momento em que apoiasse a cabeça no almofadão, pois estava completamente esgotada.
Mas queria estar acordada quando chegasse Connor para assim poder lhe fazer todas as
perguntas que tinha para ele.
Pergunta sobre seu irmão, mas também sobre si mesma e sobre o lugar que ocupava em
Lairig Dubh e no clã MacLerie. Perguntas que tinham aumentado com o passar do dia, à
medida que se dava conta da pouca consideração que sentiam para ela todos os que
habitavam e trabalhavam no castelo.
Não necessitavam suas instruções para fazer a comida ou preparar-se para o inverno. Não
necessitavam sua ajuda para cuidar do castelo.
À margem das donzelas que ajudavam Ailsa, ela era a única mulher que vivia ali, assim que
aquela noite se encontrou em um lugar virtualmente vazio, sem saber nada de seu irmão
ou de seu marido e esgotada de tanto caminhar. A cama que tinha tratado de evitar parecia
chamá-la a gritos; tinha um aspecto tão atraente, que Jocelyn não demorou para levantar-
se e ficar de pé frente a ela.
—Coloquei algumas pedras quentes para que os lençóis não estivessem tão frios, senhora.
Me deixe ajudá-la —lhe disse Ailsa agarrando-a pelo braço para que pudesse subir à cama
com mais facilidade. Depois colocou as pedras envoltas em tecido para que lhe
esquentassem os pés.
O calor das mantas e a suavidade dos lençóis arruinaram seus planos de esperar acordada
a volta do senhor.
—Ailsa —sussurrou fazendo um esforço por não deixar-se levar pelo sono—. Diga ao senhor
que desejo falar com ele assim que retorne.
—Sim, senhora. O direi.
Houve algo no tom de sua voz que lhe chamou a atenção, mas não teve forças para dizer
nada mais. Fechou os olhos e, uma vez mais, voltou a sonhar com Ewan.
E em algum momento da noite, quando as chamas do fogo se extinguiram, foi a ela em
sonhos e lhe esquentou o corpo e a alma.

Seis

Fazia já momento que tinha passado da meia-noite quando Connor conduziu a seus
homens ao interior do castelo. Os guardas das almenas esperavam sua volta e tinham
aberto as portas para eles. Não tinha planejado voltar tão tarde, mas a luz da lua cheia
tinha iluminado o caminho e lhes tinha concedido mais tempo para procurar a quão
indesejáveis tinham atacado a membros de seu clã em um povoado a seis horas de viagem.
Os intrusos tinham pago por ter tido a arrogância de acreditar que podiam tomar o que
desejassem sem ter em conta que pertencia aos MacLerie. A retribuição que lhes tinha
exigido era bastante alta para que outros pensassem duas vezes antes de tentar algo
semelhante.
Depois de deixar os cavalos nos estábulos, Connor deu permissão a seus homens para que
descansassem e entrou na torre, onde sabia que Duncan estaria esperando-o. Só algumas
poucas tochas iluminavam o grande salão, por isso o lugar estava bem às escuras.
Entretanto se ouviam ruídos que nada tinham a ver com os roncos dos que ali dormiam.
Connor entrou no salão com a intenção de identificar os ruídos. As únicas mulheres que
dormiam ali, ou visitavam o chão da estadia, eram as prostitutas do povoado que às vezes
seus homens convidavam. Connor não tinha desejo algum de presenciar tal negócio… os
ruídos eram prova mais que refutável.
Optou por sentar-se à mesa que se encontrava no outro extremo do enorme salão, onde já
se encontrava Duncan e muito em breve apareceu um servo com uma boa terrina de aveia
quente, pão e uma jarra de vinho. Depois de ter sofrido tão recentemente os efeitos da
bebida, Connor preferiu rechaçar o vinho imediatamente e pedir cerveja.
—Desde quando entram prostitutas tão livremente no castelo? —o certo era que levava
algum tempo sem prestar muita atenção ao funcionamento de seu lar e a aqueles que
viviam nele, desde antes da morte de seu pai.
Não, para ser sincero, não tinha prestado o menor interesse a sortes coisas desde seu
matrimônio com Kenna. Mas certamente não recordava o momento que partiram as
mulheres e tinham começado as visitas das prostitutas.
—Há alguns meses —respondeu Duncan, dando permissão ao servo para que partisse—. Os
homens entenderam que seu silêncio significava que o passava.
O sarcasmo que impregnava suas palavras poderia ter sido entendido como um insulto se
Connor se deteve a pensá-lo. Assim era seu amigo, quando acreditava que não fazia caso a
seus conselhos, podia chegar a parecer bastante incomodado e inclusive irritante. A
maioria das vezes fazia o que lhe dizia para evitar a tensão que provocava o que não o
fizesse. Sabia que havia muitos no clã que acreditavam que deixava muitas decisões em
mãos de Duncan, mas confiava nele plenamente. Ao ouvir o que disse a seguir lhe tirou a
vontade de questionar seu bom julgamento.
—Acha que a sua mulher gostaria que prostitutas exercessem seu ofício sob seu mesmo
teto?
—Não tinha pensado nisso —admitiu encolhendo os ombros—. Não acredito que desça
durante a noite, assim não importa.
Além de sua função na hora de lhe dar um herdeiro, a verdade era que tentava não pensar
no que faria sua nova mulher. Tinha aproveitado a oportunidade que lhe tinha brindado a
ousadia de bêbado de seu irmão e tinha acabado como aliado de um clã sem o menor valor
mas com a esposa que necessitava.
O olhar de Duncan se tornou mais insolente, um aviso de que seu humor estava piorando e
isso não era algo que queria agüentar essa noite. Depois de um longo dia a cavalo e da
perseguição e a luta com a que tinha terminado, o que desejava era comer um pouco e
deitar-se.
—Então a senhora te deu mais problemas em minha ausência?
Porque, evidentemente, essa era a causa de seu mau humor. Duncan estava incomodado
porque lhe tivesse deixado ali; lutar contra intrusos sempre era preferível a ter que
agüentar as preocupações de uma dama.
—Veio em busca de seu irmão.
—Imaginava.
—Filho de cadela! Deixou-me aqui de propósito —exclamou Duncan acompanhando seu
protesto de um murro na mesa—. Sabia que o faria.
—É como um cão que tivesse encontrado um osso —balbuciou Connor antes de tomar uma
colherada de aveia—. E o que lhe disse?
A verdade era que Connor esperava que seu amigo lhe tivesse contado o que tinha feito.
Assim que aceitasse que tinha libertado a seu irmão e tinha completo com sua promessa de
enviar ajuda a seu clã, limitaria-se a desempenhar o papel que tinha pensado para ela; em
sua cama pelas noites e fora de sua vista durante o dia.
—Disse-lhe que falasse com o senhor.
Duncan levantou sua taça e tomou um bom gole. Não o estava contando tudo, Connor
notava.
—Que mais?
—Preocupava-lhe que Athdar pudesse sofrer algum tipo de castigo.
—Disse-lhe que o deixei livre ontem pela manhã depois de que ela falou com ele?
—Não —respondeu tajantemente—. Isso lhe deixei para você.
Connor arqueou uma sobrancelha para mostrar a seu primo que sabia que estava tentando
provocá-lo.
—E deixou de perguntar?
—Disse-lhe que estava bem —admitiu por fim.
—Sabia que não poderia resistir a lhe dar algum detalhe sobre seu irmão.
Duncan apanhou sua taça e ficou em pé, cheio de ira.
—Sabia muitas coisas mais Connor, mas jamais teria esperado que fosse tão cruel com ela
sem motivo algum —deixou a taça sobre a mesa com um golpe que retumbou em todo o
salão.
—Não acha que possa ter meus motivos para fazê-lo? —perguntou, apesar de que sabia que
não havia nenhum que estivesse disposto a admitir.
—Então me diga quais são seus planos para o clã.
—Meu plano é fazer do clã MacLerie o mais poderoso de todo o oeste da Escócia, embora
para isso tenha que jurar diante do rei como têm feito outros. Quero que minha gente
prospere e que o clã cresça. Esses são meus planos.
—Fala igual ao velho lorde. Continua vivendo sob sua sombra e seguirá assim até que… —
Duncan se inclinou para lhe sussurrar com voz firme—. Pensei que sua decisão de procurar
esposa significava que por fim estava preparado para deixar para atrás o passado… seu
passado.
—Está se excedendo, primo —espetou Connor ficando em pé.
—Alguém tem que lhe dizer isso.Depois da morte de Kenna se converteu em um estranho
empenhado em que todos lhe temessem, e a morte de seu pai te converteu em uma pessoa
ainda mais dura. Mas agora tem outra esposa…
—Cuidado com o que diz, Duncan —lhe advertiu, e sua ira era tão intensa, que teve que
apertar os punhos para não utilizá-los para lhe fazer calar—. O que o faz dizer essas coisas?
Acaso teme perder sua posição se tiver um filho?
Duncan cuspiu no chão e Connor pensou que possivelmente não tinha entendido a razão
da fúria de seu primo. Apesar do crescente costume de esquecer as velhas tradições
daquelas terras, os MacLerie continuavam respeitando os velhos usos da herança que
convertiam Duncan no homem mais próximo ao lorde. Ou ao menos os tinham respeitado
até esse momento.
—Embora foi uma honra que o conselho de anciões me escolhesse seu herdeiro, já disse
que só o serei até o momento que tenha um filho e possa lhe passar tal privilégio. Pode
estar seguro que não desejo a cadeira em que se senta. Vi o efeito que tem nos homens e só
desejo fazer o que melhor faço… lutar por meu clã e pela terra.
A lealdade de Duncan era indisputável apesar de que seu sarcasmo e suas contínuas
perguntas estivessem fora de tom. Connor se sentou de novo para terminar o pouco que
ficava na terrina e tomar um último gole de cerveja. Parecia que não ia conseguir falar com
o Duncan do acontecido durante a jornada, assim possivelmente fosse melhor retirar-se.
—Queria falar contigo assim que voltasse.
—Quem?
—Sua esposa… lady MacLerie.
—Agora já estará dormindo. Falarei com ela pela manhã.
Duncan negou com a cabeça e soprou.
—Como deseja, senhor.
Efetivamente, e o que desejava naquele momento era ir para a cama e não saber nada mais
de seu inconveniente primo ou de sua esposa. Despediu-se de Duncan com um simples
gesto, saiu do salão e se dirigiu às escadas que conduziam à torre oeste.
Ali dormia ela.
Apesar do que havia dito Duncan, algo o impulsionou a subir aquela escada e entrar em
seu quarto. Só alguns minutos separavam sua decisão de não saber nada dela no momento
em que pôs a mão na porta de seu dormitório.
E não sabia por que o estava fazendo.
Não queria enfrentar às perguntas que queria lhe fazer sobre Athdar, nem queria repetir o
desastroso ato da noite anterior. Verdadeiramente não queria outra esposa.
Parte dele sabia que se começasse a evitá-la, a evitar sua cama e o fato de ter que pô-la em
seu lugar cada vez que lhe exigisse algo, afastaria-se dela e não voltaria jamais. Esfregou os
olhos e afastou o cabelo da cara. Sem dúvida era o cansaço, algo que jamais lhe tinha
incomodado sendo mais jovem. Connor deu meia volta e estava a ponto de sair de novo
quando a porta se abriu.
—Senhor —sussurrou Ailsa saindo do dormitório.
—Disseram que a senhora desejava falar comigo —era a desculpa perfeita para explicar sua
presença ali.
—Sim. pediu que você viesse a vê-la assim que retornasse. Quer que espere?
Em outras palavras, ia voltar a lhe machucar? A acusação flutuava no ar um momento mais
antes de que Connor negasse com a cabeça. Sem saber por que tinha deixado sozinha
Jocelyn na noite anterior, não podia rebater a Ailsa nada que lhe dissesse. Não pensava
discutir os detalhes com ninguém exceto com a mulher em questão, assim tampouco
aceitaria nenhuma pergunta mais.
—Chamarei você se precisar,Ailsa.
Mas a velha criada não era das que cedia de qualquer jeito; antes de lhe partir lançou um
olhar de desprezo a que ele respondeu com um leve movimento de cabeça.
Agora estava sozinho frente à porta. Esperou até que já não podia ouvir os passos de Ailsa,
então levantou o passador e abriu. Se tivesse sorte, estaria dormindo e teriam que falar
pela manhã. Connor entrou no dormitório e depois de fechar a porta, foi para o leito.
Estava deitada no centro da cama, só seu rosto aparecia por cima dos lençóis e das mantas.
Embora as sombras que projetava o fogo faziam que parecesse que a expressão de seu
rosto mudava constantemente, na realidade estava tão profundamente adormecida que
não se movia absolutamente.
Connor apreciou um traço parecido com seu irmão na curva do queixo e na forma da boca,
mas a cor da pele, dos olhos e o cabelo eram completamente diferentes: ela tinha a pele
clara, o cabelo avermelhado e os olhos verdes, enquanto que ele era de pele azeitonada,
cabelo negro e olhos azuis. Com tais diferenças, certamente um se parecesse com a mãe e o
outro ao pai.
Uma vez no quarto, qual era o seguinte passo? Durante todo o dia, Connor havia tentando
afastá-la de seus pensamentos, mas cada vez que recordava o sabor de sua pele ou o tato de
seus seios nas mãos, aparecia em sua mente a imagem de seu rosto e o som da paixão em
seus lábios. E seu corpo respondia também. Depois de lutar contra isso toda a jornada, ao
voltar para castelo quase tinha chegado a convencer-se de que tinha conseguido controlá-
lo. Mas só levava alguns minutos em seu dormitório, sentindo seu aroma e vendo-a
dormir, e já havia voltado a perder a batalha.
Tinha que haver uma maneira de mantê-la afastada de seu mundo e, sobretudo, de seu
coração. Se queria proteger a seu clã e cumprir com suas responsabilidades, devia
encontrar o modo de não sentir nenhum tipo de apego por ela. Tinham passado mais de
três anos da morte da Kenna e o caos e o tortura que o invadiram durante esse tempo
serviam de prova irrefutável de que não podia permitir que algo assim voltasse a lhe
acontecer.
Não, o que precisava era uma mulher que compartilhasse sua cama pelas noites, mas que
não o incomodasse durante o dia para que ele pudesse seguir cumprindo seu dever como
chefe do clã. Não necessitava de amor; não só não o necessitava mas também além disso
sabia que suporia um tremendo perigo se ocorresse como seu primeiro matrimônio.
Alianças que se rompiam, acusações de assassinato e suspeitas de algo ainda pior. Não, o
clã MacLerie não sobreviveria se repetissem os acontecimentos de seu primeiro
matrimônio agora que seu pai já não estava ali e não havia nenhum outro herdeiro que
perpetuasse a linhagem.
Connor assentiu para confirmar a si mesmo que tinha decidido qual era o seguinte passo
que devia dar… devia deitar-se com Jocelyn. Embora na noite anterior tinha tido muitas
preocupações na mente, não tinha tido nenhuma dificuldade em consumar o ato. Devia
admitir que teria que fazê-lo tão freqüentemente como fosse possível e conseguir que
ambos o vissem como o que era, uma obrigação. Lhe ofereceria prazer, desse modo estava
seguro de que muito em breve deixaria de vê-lo como um suplício.
Assim, tirou a roupa e se meteu na cama junto a ela. Só usava uma fina camisola e seu
membro se endureceu ao sentir seu calor. Esperou alguns segundos para deixar que
Jocelyn se acostumasse a sua presença antes de lhe passar a mão pela cintura e começar a
lhe acariciar os seios.
O sonho parecia tão real. Jocelyn podia sentir a mão de Ewan sobre um seio, a dureza de
corpo e suas coxas apertando-a contra ele, esquentando-a justo no momento em que a
noite começava a esfriar-se. Se aconchegou contra ele e desfrutou de seu calor; sabia que
era um pecado desfrutar da idéia de que outro homem a acariciasse, mas só era um sonho e
não fazia mal a ninguém permitindo alguns momentos de debilidade.
Deslizou a mão pelo ventre e mais abaixo, onde encontrou a borda da camisola e pôde
levantá-la até encontrar esse ponto entre as coxas que tanto necessitava de suas carícias.
Separou-lhe as pernas brandamente.
—Se abra para mim, pequena —lhe disse com um sussurro suave e tentador—. Deixa que te
acaricie.
As carícias poderiam ter sido de Ewan, mas certamente a voz não era. Jocelyn abriu os
olhos e se encontrou com os de seu marido. Primeiro se sentiu surpreendida e depois
envergonhada de descobri-lo tocando-a em tão íntimo lugar. Automaticamente apertou as
pernas e tratou de afastar-se dele.
—Calma, Jocelyn. Não vou lhe machucar —lhe disse então.
Teria se dado conta de que lhe tinha prometido exatamente o mesmo a noite anterior?
Teria parado a pensar até que ponto não tinha cumprido tal promessa?
—É seu direito como marido —respondeu ela tentando relaxar.
Como marido e como senhor possuía seu corpo igual a tudo o que tinha levado consigo ao
matrimônio. Mas o certo era que lhe surpreendia que desejasse repetir com ela a dura
experiência da noite anterior.
Connor parecia surpreso com sua resposta mas, embora se afastou ligeiramente dela, não
retirou a mão do centro úmido de seu corpo. Jocelyn não pôde evitar emitir um suave
gemido de prazer que fez que levasse a mão ao lugar onde a tinha ele e tratasse de pará-lo…
ou possivelmente não.
—Pararei se desejas que o faça —prometeu ele.
—Ontem à noite não parecia gostar de nada disto. Não pensei que fosse voltar tão rápido.
Tinha sido sincera com ele. A expressão de tristeza que tinha visto em seu rosto e a pressa
com a que tinha saído de sua cama e de seu dormitório lhe faziam pensar que não estava
fazendo aquilo por desejo próprio. Evidentemente, a necessidade de engendrar um
herdeiro era mais forte que o rechaço que sentia por ela.
—Às vezes se encontra pouco prazer na primeira vez de uma virgem.
—Sim, já o tinha ouvido.
—E agora também sabe por experiência? —perguntou-lhe sem deter o baile de seus dedos
em nenhum momento.
—Sim, senhor —admitiu ela. Embora tinha havido alguns momentos melhores que outros e
agora que já tinha passado todo um dia, sabia que não tinha havido nada que lamentar
realmente, não alcançava a compreender por que aquele ato era tão apreciado e
sobrevalorado.
Mas… de repente sentiu uma onda de calor que a fez estremecer. Começaram a lhe tremer
as pernas e sentiu uma estranha tensão no ventre. Seus dedos já não só a acariciavam por
fora, cada dois ou três movimentos penetravam mais e mais dentro dela. Jocelyn seguia
tendo a mão em seu pulso, mas agora a movia junto a ele, seguindo o ritmo que ele
marcava.
Alguns segundos depois já não sabia se queria fazê-lo parar ou lhe urgir a que continuasse.
Dessa vez ele não usava camisa, por isso podia sentir o calor de seu corpo e a fina capa de
suor que cobria agora seu peito. E então, quando já acreditava ter tomado uma decisão,
Connor se deteve e a olhou nos olhos.
—Então, esposa, sim ou não? Deseja que te mostre a diferença entre uma primeira e uma
segunda vez, ou prefere que eu vá embora?
Connor tentou retirar a mão, mas foi ela a que a segurou ali até que pudesse decidir. Cada
vez lhe parecia mais difícil respirar e muito mais pensar com clareza ou pronunciar a
palavra que ele esperava. E que também ela desejava pronunciar. O fato de que se deteve a
lhe perguntar fazia com que Jocelyn se sentisse tentada a provocá-lo.
—Sim, marido —disse por fim em um sussurro, guiando seus dedos ao objetivo—. Me
mostre.
E o fez.
Algum tempo depois, depois de ter utilizado seus dedos e também sua boca para despertar
sua paixão, Connor se inundou dentro dela e lhe mostrou a diferença. Dessa vez não houve
dor, só desejo e a sensação de que outro a enchesse. Todo seu corpo se abrandou abaixo do
dele até acreditar que ia desfazer se por dentro.
Então, quando a tensão não podia ser maior em seu corpo, sentiu que ele começava a
estremecer-se e se esvaziava dentro dela. Os movimentos foram fazendo-se mais e mais
suaves até que ouviu seu suspiro e finalmente ficou imóvel entre suas pernas.
Seu marido se deitou a seu lado, fechou os olhos e respirou fundo várias vezes. Embora
parecia mais satisfeito com o que acabavam de fazer que da noite anterior, Jocelyn não
estava do todo certa de que fosse assim. Não lhe tinha doído, mas continuava sentindo essa
tensão no ventre e se perguntava se teria feito algo mal.
Depois de um momento, Connor se levantou na cama e se agasalhou com os lençóis. O frio
do quarto lhe arrepiou a pele de Jocelyn, mas quando tratou de agasalhar-se também, lhe
pôs a mão entre as pernas como se procurasse… algo.
—Desta vez não sangrou —anunciou agasalhando-a por fim—. Sente vontade de vomitar?
Jocelyn piscou várias vezes enquanto tentava compreender a mudança que se operou nele.
—Não, não tenho vontade de vomitar —respondeu enquanto ele se levantava e começava a
vestir-se—. Deveria ter?
—Ailsa me disse que ontem à noite não se encontrava bem e que tinha dormido no chão.
Quero me assegurar de que está bem antes de ir.
Assim que disse aquelas palavras apareceu em seu rosto uma ligeira expressão de
vergonha, possivelmente se tinha dado conta de como tinha divulgado o que acabava de
dizer. Então a olhou e Jocelyn soube que esperava uma resposta… para poder partir.
Possivelmente para ele a experiência não tivesse sido melhor que a do dia anterior além do
mais. Para ela tinha melhorado muito, embora seguia sem ser algo que pudesse desejar
tanto como o desejavam outras. Seu marido não perdia tempo nisso; terminava o ato e
partia para o seu quarto ou onde tivesse que ir.
—Estou bem —assegurou ela, lhe dando as palavras que parecia estar esperando.
Connor assentiu e se dirigiu à porta sem dizer nada mais. Estava a ponto de fechá-la
quando Jocelyn recordou algo:
—Senhor? Queria falar com você a respeito de meu irmão —lhe disse ao mesmo tempo que
se levantava da cama e se cobria com a bata—. Tentei vê-lo, mas não me deixaram.
—Não podemos falar disto amanhã? —a frustração se fazia evidente em sua voz e lhe
advertia que era melhor que fizesse o que lhe pedia.
—Não, senhor, não podemos. Onde está meu irmão? por que não me deixaram vê-lo hoje?
—deteve-se frente a ele e lhe fez a pergunta que tinha estado lhe dando voltas na cabeça
durante todo o dia—. Está morto?
—Não, não está morto. Acreditava que Duncan já lhe havia dito isso.
Fazia só alguns minutos que os olhos de Connor lhe tinham recordado às cores do outono
nos bosques que rodeavam o castelo de sua família, e entretanto agora tinham um brilho
de duro metal.
—Só me disse que estava vivo e que você me diria o resto —explicou Jocelyn—.
Normalmente prefiro enfrentar à verdade em lugar de histórias falsas, assim me diga onde
está Athdar.
Seu marido assentiu e cruzou os braços sobre o peito com um gesto menos intimidador que
de costume, mas mostrando uma impaciência que Jocelyn não queria ter em conta naquele
momento.
—Libertei seu irmão ontem depois que falou com ele. A esta hora estará de caminho de sua
casa… ou melhor da casa de sua família.
—Mandou-o embora sem me deixar que o visse antes?
—Já o viu e falou com ele, e pôde comprovar pessoalmente que estava bem. Assim que
soube que cumpriria com seus votos, deixei-o em liberdade.
Lhe encheram os olhos de lágrimas e lhe fez um nó na garganta.
—Teve como prisioneiro durante meses… Sabia que queria passar algum tempo com ele —
acrescentou com voz compungida.
—Isto não é um gesto de clemência, é uma aliança apoiada no intercâmbio de ajuda e…
—Gente —acrescentou ela.
—Sim, assim é. Você já estava aqui, assim não havia motivos para retê-lo.
—E isso era a única coisa que lhe importava —o acusou com dureza. Aquele homem não
sabia nada dela, não sabia quão importantes eram uns para os outros em sua família. Era
um homem frio e sem emoções que não fossem a raiva e o egoísmo.
—Para que não pense que não cumpri o acordo, direi que o acompanhavam cinqüenta
guerreiros MacLerie além de trinta carpinteiros, ferreiros e outros trabalhadores que
ajudarão a seu clã a reconstruir o povoado e o castelo. Também levavam provisões para as
próximas semanas e chegarão mais no mês que vem —se aproximou dela com olhar
ameaçador—. Tudo isto também me importa.
Jocelyn não ia deixar que a intimidasse, por isso lhe fez as perguntas cujas respostas
poderiam ajudá-la a imaginar seu futuro.
—Já me comprou. E agora o que?
—Continuarei visitando sua cama ou você a minha até que me dê ao menos um filho,
embora estaria muito melhor se fosse mais de um.
Connor fez uma pausa enquanto ela assimilava o golpe que supunha ser considerada só
uma égua parideira. Não tinha falado de formar uma família a que ela pudesse querer e
cuidar, ou de que fosse deixá-la implicar-se na vida de seus filhos.
—Depois poderá voltar para sua casa se assim o desejar.
Jocelyn apertou os dentes ao ouvir aquelas palavras. Nunca antes se havia sentido tão
pequena, tão intranscendente. Sim, tinha-lhe pedido sinceridade, mas aquela exposição tão
brutal da situação era mais do que teria esperado e do que acreditava merecer.
Embora sempre soube que seu matrimônio com Ewan tinha sido considerado pela aliança
que representava, o carinho que tinha havido entre eles prometia um papel para ela como
esposa e mãe de seus filhos. Aquela aliança com MacLerie não deixava lugar à esperança.
—Fez a mesma oferta a sua primeira mulher? —contra-atacou com força.
Em um décimo de segundo, Connor foi para ela, agarrou-lhe o rosto entre ambas as mãos
apertando seu corpo contra o dela e a olhou fixamente. Mas foi sua voz, que não era mais
que um sussurro, o que mais terror lhe provocou.
—Não fale de coisas das quais não sabe absolutamente nada —se inclinou um pouco mais
para ela, sua respiração lhe roçava a bochecha—. Não volte a mencioná-la nunca mais, nem
a mim nem a ninguém —acrescentou entre dentes e lhe apertando a cara para deixar
perseverança de sua ira.
Ao soltá-la, Jocelyn caiu ao chão sem forças para sustentar-se. As histórias sobre Kenna
MacLerie se propagaram por todo o país desde sua morte; a maioria delas falavam de um
terrível assassinato ocorrido naquele mesmo castelo. Segundo os rumores, uma violenta
discussão tinha acabado com um corpo quebrado ao final da escada. Uma discussão
relacionada com o desejo de ter um filho.
Jocelyn tinha provocado à Besta e não viveria para contá-lo. Sua família cairia em desgraça
por culpa de seu fracasso como esposa e o acordo entre os MacCallum e os MacLerie se
romperia para sempre. Baixou o olhar e tratou de tranqüilizá-lo sem palavras. Não se
atrevia a dizer nada, pois sabia que se falasse só conseguiria piorar a situação. O cabelo lhe
caiu sobre o rosto e lhe encheram os olhos de lágrimas.
Tinha suportado tudo aquilo para nada.
Connor não podia acreditar no atrevimento daquela mulher. Parecia que seus encontros
estavam condenados a acabar mal e aquele não ia ser uma exceção. Tinha tido a segurança
de que lhe pressionaria para que lhe desse informação, mas já era hora de que aceitasse
que Athdar se encontrava a caminho de casa e ela estava em seu lugar. Mas as mulheres
tinham um modo diferente de ver as coisas, uma perspectiva mais sensível que as levava a
converter em um drama algo que não o era. Parecia que Jocelyn encaixava também nesse
comportamento.
Deu um passo atrás e a observou acautelada no chão diante dele. Estava tremendo e
Connor não se explicava como era possível que a situação se descontrolasse tanto. Não era
isso o que ele desejava daquele matrimônio. O medo e o ódio era o que encontrava cada dia
em muitas outras pessoas dentro e fora de seu clã. Uma parte dele temia que Jocelyn
tivesse acreditado as histórias que se contavam sobre ele, mas havia outra parte a que não
lhe surpreendia. Mas o que sentia sobretudo era decepção, uma decepção reveladora.
Agachou-se junto a ela e a ajudou a levantar-se, segurando-a pelos ombros até que esteve
certeza de que poderia manter-se em pé sozinha. Jocelyn não tentou afastar-se, mas
continuava com a cabeça inclinada e ele não sabia se estava chorando.
—Não é isto o que quero que haja entre nós, esposa. Queria que houvesse sinceridade e isso
é o que te dei. Possivelmente foi mais do que estava preparada para escutar —fez uma
pausa e esperou a ver se ela o olhava, ao ver que não era assim, continuou falando—: Deve
ter em conta que os térmos de nosso acordo matrimonial são iguais aos de qualquer outro
casal de nossa posição. Aceite-os como o que são e poderemos nos dar bem.
Por fim levantou o olhar para ele, um rápido primeiro olhar a que logo seguiu outro mais
intensa. Como Connor tinha imaginado, as lágrimas tinham manchado suas bochechas,
mas já não chorava. Uma leve inclinação foi sua única resposta, mas ele a aceitou. Aquelas
confrontações tinham que acabar.
—Será melhor que descanse —lhe disse ele desejando partir dali—. A menos que necessite
que chame Ailsa.
Jocelyn não baixou os olhos, mas sim o olhou como teria olhado a um cão raivoso, com
medo a que voltasse a atacar. Apertava os lábios como se temesse abri-los. Seu olhar o
seguiu até a porta. Por fim negou com a cabeça.
Na mente de Connor foram muitas coisas que lhe dizer, mas todas lhe pareciam muito
debulhadas ou muito absurdas. Seria melhor guardar silêncio e não ficar como um idiota.
Entretanto seguia sentindo uma estranha necessidade de lhe oferecer algum tipo de
consolo, uma necessidade que não conseguia compreender e que lhe surpreendia.
Supunha-se que os meses que antecederam o casamento, deveriam ter servido para
prepará-lo para tudo aquilo, mas agora se dava conta de que se não tomasse cuidado,
voltaria a ser apanhado.
A primeira vez tinha estado a ponto de não sobreviver, por isso agora ia lutar contra isso
com todas as forças de seu ser. Dessa vez manteria a distância para proteger-se.
Alguns passos mais e se encontrou fora do quarto principal. Só quando começou a descer
as escadas se deu conta de que deixou as botas no dormitório de Jocelyn. Recuperaria-as
de um modo ou outro pela manhã; não podia pôr em perigo a escapada já conseguida.
Encontrou-se com Ailsa ao final da escada. Connor meneou a cabeça ao vê-la, pois não
queria escutar nenhum tipo de comentário sobre suas idas e vindas ao quarto de sua
esposa e isso seria precisamente o que faria a criada.
—Se suas velhas pernas podem subir as escadas e deseja fazê-lo, pode passar para ver a
senhora antes de se deitar. Encontrará em perfeitas condições, acredito.
—Essa era minha intenção —respondeu ela.
—Então até manhã —disse Connor resolvendo a conversa quanto antes.
Esperou a que ela tivesse começado a subir para decidir que não queria voltar para o seu
quarto ainda. Depois da discussão com Jocelyn, tinha muita energia para poder dormir. A
noite não era tão fria nem ele era tão velho para não poder caminhar descalço pelo
exterior, assim saiu do castelo e olhou ao céu.
A lua cheia iluminava tudo e se refletia no rio. Corria um vento fresco e úmido que
pressagiava uma mudança de temperaturas. Suas terras se estendiam perante ele além do
que podia ver. Os últimos chefes do clã tinham aumentado o território e ele seguiria
fazendo-o e consolidando seu poder até que seu filho ocupasse sua cadeira. Seu filho.
Teria que ser assim. Jocelyn teria que lhe dar um filho.
E uma vez que isso tivesse acontecido, por fim poderia desfrutar de tudo o que tinha
conseguido com seus esforços; algo que havia custado muitas vidas e muito dinheiro.
Muitos homens lhe tinham entregue suas vidas e não podia lhes falhar. Necessitava de um
filho.
Não tinha pretendido ser cruel com ela quando lhe havia dito que depois de lhe dar um
filho poderia voltar para sua casa. O que queria lhe dizer era que se ainda se sentisse infeliz
ali naquele momento, permitiria que partisse com sua família ou entrasse em um
convento; parecia-lhe um gesto muito mais amável que obrigá-la a ficar ali. Connor o
explicaria bem assim que se instalasse completamente em Lairig Dubh.
Sete

Ailsa despertou Jocelyn pouco depois do amanhecer. Depois de haver-se vestido, Jocelyn
decidiu tomar o café da manhã no salão com o resto de habitantes do castelo em lugar da
solidão de seu dormitório. Ao chegar ao grande salão encontrou a muitos soldados do clã
comendo já, em seguida viu também ao senhor e a seu primo sentados à mesa principal.
Entre mesas e cadeiras, Jocelyn esquivou dos servos que levavam bandejas aos comensais
e foi direta à mesa de seu marido, junto ao qual se sentou. Possivelmente aquele ruído que
ouviu entre colherada e colherada de aveia fosse uma saudação. Mal acabava de receber
sua terrina de aveia quando Connor ficou em pé.
—Voltarei esta noite —anunciou com um movimento de cabeça que devia ser uma
despedida.
Entre a surpresa e o estrondo ocasionado pelas dúzias de soldados que ficaram em pé ao
fazê-lo seu senhor, Jocelyn não conseguiu dizer nenhuma palavra, limitou-se a ver a
procissão de homens para a porta. Depois, o salão ficou vazio com exceção de uns poucos
servos. E de Ailsa, a quem convidou a sentar-se acreditando que ainda não teria tomado o
café da manhã.
—Obrigado, senhora, mas já tomei o café da manhã.
—Quando?
—Na casa de minha filha, senhora. No povoado.
—Tem uma filha? E como toma o café da manhã lá se vive aqui? —não lhe parecia lógico
que a pobre mulher tivesse que ir até o povoado para tomar o café da manhã antes de
começar sua jornada de trabalho.
—Eu não vivo no castelo, senhora. Faz tempo que não.
Certamente desde que tinha morrido a anterior lady MacLerie, pensou Jocelyn.
—Então vem até aqui todas as manhãs e volta de noite?
—Só trabalho aqui desde sua chegada, senhora. O senhor me pediu que a servisse até que
pudesse encontrar uma donzela adequada.
Tendo em conta tudo o que tinha feito por ela nos últimos dias, Jocelyn se alegrava de que
essa donzela não tivesse aparecido ainda, pois nenhuma moça jovem poderia havê-la
ajudado como o tinha feito Ailsa. Certamente a primeira esposa de MacLerie tivesse estado
acostumada a ter uma criada a seu lado em todo momento, mas a filha do pobre
MacCallum não estava.
Jocelyn tinha tido muitas responsabilidades na casa de seu pai, obrigações que não tinham
feito mais que aumentar quando a saúde de sua mãe tinha piorado. O empobrecimento do
clã tinha obrigado aos MacCallum a prescindir da maioria dos servos e Jocelyn e outras
mulheres faziam toda a roupa da família. Possivelmente por estar tão acostumada a
trabalhar dia e noite lhe parecia tão difícil estar ali sem nada que fazer em todo o dia.
—Não sabia, Ailsa. Sua filha tem filhos?
—Sim, senhora. Tem quatro e outro que nasceu faz só duas semanas.
Jocelyn ficou pensando naquelas palavras alguns segundos. Ailsa vivia com sua filha, que
por sua vez tinha cinco filhos para cuidar. Na opinião de Jocelyn, o lugar de Ailsa era junto
a sua filha, ajudando-a a cuidar dessas crianças até que pudesse fazê-lo sozinha, e
entretanto o senhor a tinha feito ir ao castelo para servir a sua nova esposa… que poderia
cuidar-se sozinha perfeitamente se o permitissem.
—Ailsa, deveria voltar para a sua filha. Estou certa de que ela precisa mais de você do que
eu.
—Não posso fazer isso, senhora. O ,lorde não iria gostar que a abandonasse desse modo.
Se havia algo do que estava certa, era de que aquela mulher não preocupava incomodar a
seu senhor; mas bem lhe preocupava que Connor se zangasse com sua esposa por lhe haver
levado a contráriá-lo uma vez mais.
—Hoje eu gostaria de ver o povoado, Ailsa —anunciou então Jocelyn—. Me levaria?
Todos os presentes sabiam que Jocelyn tinha explorado todos os cantos do castelo e seus
arredores nos últimos dias, por isso era lógico que quisesse também visitar o povoado. E
se, de passagem, fossem a casa da filha de Ailsa e passassem algum tempo com ela,
também estaria bem.
—Como você deseja, senhora —Ailsa parecia desconfiar daquela petição, mas não disse
nada.
—Então vamos. Podemos pedir um pouco de comida na cozinha e assim não teremos que
vir antes do meio-dia.
A mulher a olhou com incredulidade, mas a seguiu à cozinha obedientemente e não
protestou enquanto Jocelyn pedia a lista de comida que queria levar em sua excursão. O
cozinheiro a olhou com uma insolência que nem sequer tratou de dissimular, mas seguiu
todas suas instruções. Pouco depois, encontravam-se já no caminho que conduzia primeiro
ao rio e, depois de cruzar a ponte, ao povoado.
Jocelyn escutava as explicações da Ailsa com satisfação porque a velha criada não tinha
adivinhado ainda suas verdadeiras intenções. Durante o trajeto apresentou a muitos
habitantes da região; costureiras, curtidores, açougueiros… todos aqueles que Jocelyn
teria esperado que habitassem o castelo, viviam na realidade no povoado. Depois de passar
aqueles dias no castelo meio vazio, Jocelyn se surpreendeu encontrar tanta gente e
comprovar que além disso pareciam viver prosperamente.
Quando por fim chegaram a casa da filha de Ailsa, Jocelyn se alegrou ainda mais de ter tido
aquela idéia porque a pobre mulher parecia exausta, e não era de se admirar tendo que
cuidar e alimentar a tantas crianças sozinha.
—Esta é minha filha, Margaret —disse Ailsa assinalando a jovem que amamentava ao
menor de seus filhos.
Ailsa saudou o resto das crianças com beijos e carícias. Havia muito amor naquela casa,
tanto que fez que Jocelyn tivesse saudades da presença e das palavras carinhosas de sua
mãe. Era possível que tivesse passado já uma semana desde que tinha falado com sua mãe
pela última vez? A viagem a Lairig Dubh tinha durado quatro dias, mais os três que estava
no castelo… e em todo esse tempo nem sequer tinha podido mandar alguma mensagem
para seus pais com Athdar.
—… Peggy é a menor e Brodie é o maior.
Jocelyn se esforçou por abandonar aqueles tristes pensamentos e sorriu para Ailsa e para
sua filha.
—Sinto muito haver tirado a sua mãe quando mais a necessita, Margaret.
—Não, senhora —disse a jovem mãe, muito ruborizada—. Minha mãe não quis que
ninguém mais ocupasse seu posto no momento em que soube que o senhor ia casar se.
—Para mim é uma honra receber seus serviços —assegurou Jocelyn modestamente—. Mas
não estava preparada para tanta atenção. Eu cresci em um clã muito menor e estou
acostumada a cuidar de mim mesma.
Jocelyn se deu conta de que Ailsa continuava de pé junto à porta, como se tivessem
passado por ali só alguns minutos. Jocelyn sorriu as crianças e levantou o saco de comida
que tinha insistido em levar.
—Trouxe um pouco de comida para que possamos compartilhar o almoço.
Ailsa parecia perplexa, mas Jocelyn lhe pediu que se sentasse junto a sua filha.
—Eu posso dar de comer as crianças enquanto você ajuda a Margaret com a pequena.
Os meninos comeram com a alegria própria da infância enquanto Ailsa trocava ao bebê
recém-nascido e depois o embalou em seus braços lhe cantarolando uma canção sob o
atento olhar de Jocelyn. Margaret aceitou um pouco de pão com queijo, mas em seguida se
dispôs a levar às três pequenos aos colchões de palha para que descansassem um pouco.
—Brodie? Toma este balde e traga um pouco de água.
O menino obedeceu imediatamente, sem dúvida se sentia aliviado de não ter que continuar
com suas irmãs pequenas.
—Mas volte imediatamente, Brodie —lhe advertiu sua mãe com amor e firmeza ao mesmo
tempo.
Afligida pelo sentimento de nostalgia que aquela cena tinha despertado nela, Jocelyn se
levantou para abrir a porta ao menino e o viu partir com um balde que parecia muito
grande para ele.
—Ele poderá sozinho? —perguntou tratando de conter as lágrimas.
—Sim, senhora. Está desejando que o mande todos os dias porque assim tem a
oportunidade de brincar sozinho um momento, sem suas irmãs —Margaret tomou ao bebê
nos braços e lhe apoiou a cabeçinha no ombro—. Muito obrigado pela comida. E por trazer
minha mãe para que nos visitasse.
—Não a trouxe de visita, mas sim para que fique.
—Mas, senhora, não posso fazer isso —protestou Ailsa—. O senhor não gostará disso.
—Está muito ocupado para dar-se conta. Agora fique aqui e, se achar que deve fazê-lo,
venha me ver mais tarde, quando o marido de Margaret voltar.
A velha criada esteve a ponto de protestar de novo, mas depois olhou a seu redor e
assentiu. Ali a necessitavam mais que no castelo e Margaret parecia contente de contar
com a ajuda de sua mãe.
—Bom, eu vou indo —anunciou Jocelyn dirigindo-se à porta.
Jocelyn empreendeu caminho ao castelo segundos mais tarde. As nuvens e o sol
disputavam a hegemonia do céu, mas fazia uma tarde magnífica para passear.
Antes de chegar ao rio viu de longe o pequeno Brodie, que interrompeu seus jogos com
outros meninos para saudá-la de longe, Jocelyn o saudou também e continuou
caminhando com um sorriso nos lábios.
Um sorriso que desapareceu ao ver ao longe a torre do castelo. Todo o edifício parecia
desprender o poder escuro de seu senhor; nem sequer os raios do sol faziam desaparecer
seu aspecto sombrio. Uma guarida escura e imponente para uma besta igualmente escura e
imponente.
Como se ao pensar nele tivesse conjurado sua presença, MacLerie apareceu então a só
alguns metros dela. Cavaleiro e cavalo pareciam fundir-se em um; a mesma cor de cabelo
e, a julgar pelo modo de relinchar do animal, o mesmo temperamento.
—Se perdeu? —perguntou-lhe.
—Não, senhor —respondeu ela com tranqüilidade—. Venho do povoado e conheço o
caminho.
—Onde está Ailsa? Supõe-se que devia lhe acompanhar em todo momento.
—Ficou na casa de Margaret.
—É sua donzela —lhe recordou com evidente irritação—… e deve te servir.
—Serve me concedendo um pouco de privacidade.
—Privacidade? Para que?
—Tenho intenção de voltar para meus aposentos e descansar um momento —disse com um
suspiro. Sabia que Connor ia protestar acima de tudo o que ela dissesse—. Não necessito
que haja uma donzela do outro lado da porta enquanto eu descanso. Entretanto para
Margaret virá muito bem sua ajuda. Pareceu-me o melhor.
Connor não respondeu, mas ficou em silêncio alguns segundos, possivelmente
considerando suas palavras. O sol se escondeu atrás das nuvens uma vez mais e o vento era
agora mais frio. Jocelyn cobriu os ombros com o xale.
—Então me dê a mão e te levarei ao castelo —lhe disse por fim lhe estendendo a mão.
Jocelyn deixou que a ajudasse a subir ao cavalo. Seu marido lhe guiou a mão para que a
pusesse na cintura e quando ela esteve bem encaixada, pôs em marcha o cavalo.
Embora não de maneira intencionada, Jocelyn sentia o poder e a força de seu marido;
apesar das capas de roupa que os separavam, seu corpo desprendia calor e ela se permitiu
o luxo de apoiar-se nele. Também baixou a cabeça até deixá-la descansar sobre suas costas.
Era um homem forte, mas apesar da vantagem física que tinha sobre ela, não se tinha
servido dela em nenhum momento. MacLerie tinha força, mas sabia bem como controlá-la,
como qualquer homem inteligente.
Cheirava a uma mescla de couro e lã e seu próprio aroma masculino; uma mescla potente
que lhe fez recordar o que havia sentido tendo-o dentro de si, movendo-se e inundando-se
mais e mais em seu corpo.
Ao sair daquele devaneio Jocelyn descobriu que já tinham chegado e lhe ruborizaram as
bochechas só recordando o que tinha estado pensando. Depois de descer do cavalo com a
ajuda de um cavalariço, levantou o olhar para seu marido; os olhos lhe ardiam de um modo
que lhe delatou, tinha estado pensando o mesmo que ela.
—Não vou voltar para o jantar como tinha previsto, esposa.
—Eu direi ao cozinheiro —respondeu ela, agradecida de que sua voz não tivesse revelado
nenhuma de suas emoções.
—Me espere.
Jocelyn não acreditou em nenhum momento que se referisse ao jantar. Suas palavras eram
mais uma ordem que uma petição, mas uma vez mais sentiu que não pretendia impor-se a
ela de modo algum. Fixou-se em como lhe levantava a saia entre as pernas, algo que
confirmava seus planos para a noite.
—Sim, senhor.
Ele assentiu também e ato seguido, deu meia volta ao cavalo e se afastou dali. Jocelyn o
observou cavalgando e esperou que ninguém tivesse presenciado aquilo.
Passou o resto do dia descansando, lendo o livro que tinha descoberto e esperando a noite.
Ailsa voltou para castelo com a intenção de ajudá-la a deitar-se, mas Jocelyn conseguiu que
retornasse a sua família.
E na metade da noite, antes de que a lua se levantasse por cima do horizonte, seu marido
entrou sigilosamente em seu quarto e em sua cama. Aquele encontro foi mais insistente
que os dois primeiros e durou tão somente alguns minutos e, igual aos anteriores, Jocelyn
continuou sentindo a tensão que tinha começado cavalgando com ele caminho do castelo.
Uma tensão que tinha aumentado com as carícias, mas que não desapareceu com a
liberação de Connor. Depois de lhe perguntar que tal estava, seu marido se levantou da
cama, vestiu-se e voltou a sair.
Foi no dia seguinte, depois de toda uma noite sem conseguir pegar olho, quando Jocelyn se
deu conta de um pouco muito curioso… em nenhum momento durante seus encontros se
beijaram na boca. Pelo caminho para a casa da Margaret, deu-lhe a sensação de que todos
se beijavam; os maridos que se despediam de suas esposas, jovens que lhe roubavam um
beijo a uma donzela…
Entretanto seu marido não a beijava.

Oito

—Brodie! —gritou-lhe com firmeza—. Não deveria contar essas histórias!


—Mas, senhor, se for verdade. Robbie me disse que sua irmã está grávida.
Jocelyn absorvia até o menor detalhe da informação que o moço lhe dava com entusiasmo,
o entusiasmo se soubesse conhecedor de algo que ninguém mais sabia. Agora Jocelyn
passava todas as manhãs na casa de Margaret ou visitando alguma outra mulher do
povoado e pelas tardes, quando o tempo o permitia, acompanhava para Brodie procurar
água. Aquelas atividades estavam lhe permitindo aprender muito sobre os integrantes do
clã de seu marido já que Brodie não perdia tempo em compartilhar com ela as últimas
fofocas do povado.
O mais difícil para ela era não voltar a rir nem ficar séria quando conhecia pessoalmente
aqueles dos que lhe tinha falado o menino. Cada dia a levava ao rio por um caminho
diferente pelo que tinha passado muita gente no transcurso da última semana. Tinha
conhecido sobre tudo às mulheres porque normalmente os homens estavam trabalhando
no castelo ou treinando no pátio de armas ou atendendo os campos de cultivo. As mulheres
também trabalhavam no campo, mas não as que tinham filhos pequenos ou deviam
atender a algum ancião ou doente.
À medida que se aproximasse a colheita, cada vez mais mulheres teriam que ir aos campos;
de fato já começava a perceber-se no ambiente que os dias eram cada vez mais curtos e se
aproximava a colheita. Os depósitos se encheriam até transbordar, os açougueiros
separariam quão animais terei que matar e conservar para o inverno. As plumas, a
manteiga e o grão se utilizariam ou armazenariam para satisfazer as necessidades do clã.
Inclusive os meninos como Brodie e seus amigos Robbie e Jamie teriam logo um trabalho
de que ocupar-se, possivelmente por isso aproveitavam agora para correr, nadar e saltar
como loucos enquanto pudessem.
—E não estão casados —acrescentou o menino sussurrando o mais suculento da notícia—.
Ele já está casado com Elspeth!
—Não deveria repetir essas coisas! Estou certa de que ao senhor não gostaria nada.
—O senhor não vem por aqui freqüentemente, senhora. Assim se falar baixo, não acredito
que me ouça.
Jocelyn se pôs a rir enquanto recordava quando Athdar e ela tinham feito esse mesmo tipo
de raciocínios sendo menores. Com a maravilhosa inocência das crianças, corriam,
brincavam e mexericavam igual a Brodie.
Agora, entretanto, vendo a notícia da perspectiva de adultério, lhe ocorriam outras facetas
da história. Quem cuidaria do bebê? O que aconteceria a moça grávida? Seu pai teria
intervindo e teria obrigado ao homem a confrontar sua responsabilidade como pai, já fosse
casando-se com a mulher ou ajudando-a com tudo o que necessitasse.
No tempo que levava em Lairig Dubh, não tinha visto Connor agir como chefe do clã salvo
para treinar a seus homens ou lutar contra aqueles que tinham atacado as aldeias do sul. O
conselho de anciões do clã se reunia freqüentemente e tinha desempenhado um papel
crucial na decisão de fazê-la vir. Dizia-se que tinham sido eles os que tinham pressionado o
MacLerie para que voltasse a casar-se; embora depois de ter vivido com ele aquelas
semanas, Jocelyn duvidava muito que alguém pudesse obrigar a aquele homem a fazer algo
que não desejasse fazer.
O certo era que desde que tinha descoberto o povoado e passava o dia com Margaret e
Ailsa, mal via seu marido exceto pelas noites. Mas isso já não importava muito, já que
Jocelyn mantinha os olhos fechados durante a maioria do ato.
Brodie continuou conversando ao chegar ao rio, onde estavam já seus amigos. Os três
meninos eram completamente diferentes, tanto em sua aparência como em seu caráter,
mas isso não lhes impedia de ser bons amigos e tratar de passar juntos todo o tempo que
pudessem. Ao Jocelyn adoravam vê-los brincar.
Pôs-se a rir ao vê-los salpicar-se água do rio com os baldes. Embora já tinha começado a
refrescar, aquele dia fazia sol e Jocelyn tirou o lenço com o que se havia coberto o cabelo.
As mulheres do povoado fazian isso quando queriam adaptar-se ao novo lugar, ela também
tinha adotado o costume. Os poucos véus que tinha se desprendiam quando caminhava ou
trabalhava. Aproximou-se do rio para molhar as mãos e a cara antes de voltar para casa de
Margaret, que já teria tido tempo de descansar um momento.
O som de cavalos a sobressaltou. Era um grupo de cavaleiros que acabava de sair do
bosque, deviam ser mais de trinta, a maioria deles maiores, de cabelos cinzas, mas havia
também alguns jovens guerreiros. Apenas a olharam ao passar perto dela, mas uns
minutos depois uma voz a sobressaltou de novo:
—Senhorita?
Um homem da idade de seu marido, mas muito mais alto que ele a observava com olhar
intenso. Levava a cabeça coberta, por isso não havia maneira de adivinhar de que cor tinha
o cabelo, mas seus olhos eram verdes. Cruzou os braços sobre o peito e foi para ela com
passos firmes que denotavam sua força física.
Ao vê-lo aproximar-se, Jocelyn sentiu um calafrio; o poder letal que desprendia sua
presença lhe cortou a respiração. No momento em que o medo começava a converter-se em
terror, o desconhecido sorriu e lhe estendeu a mão. Como teria feito qualquer um diante de
um depredador, Jocelyn deu um passo atrás.
—Tranqüila, senhorita, só quero conhecê-la - disse com uma voz profunda que lhe
provocou um calafrio. Nenhum homem deveria ser tão atraente e tão perigoso ao mesmo
tempo—. Deve ser nova aqui porque não a conheço.
Como em um baile, ele dava um passo para diante e ela um para trás. Desgraçadamente, o
rio impedia que Jocelyn seguisse retrocedendo. Sentiu vontade de pedir ajuda a gritos, mas
então ouviu uma voz conhecida:
—Sim que é nova no povo, Rurik. Está falando com a nova esposa de Connor —disse
Duncan da ponte.
Da altura de seu cavalo, parecia estar desfrutando com o desconforto de Jocelyn, pois não
deixava de sorrir.Entretanto, ao vê-lo, Jocelyn soube que estava a salvo. O tal Rurik a olhou
de cima a baixo e logo soltou uma gargalhada que deveu ouvir-se inclusive no castelo.
—Pelo grande Odín! —exclamou então—. É uma beleza!
Jocelyn sabia que seu aspecto nunca serviria de inspiração a nenhum poeta, mas não
gostava que a humilhassem por isso. Aquelas palavras a fizeram perder o equilíbrio e teria
caído no rio se ele não a tivesse agarrado antes. Assim que recuperou a força nas pernas
tentou soltar-se, mas ele a apertou um pouco mais, possivelmente para lhe demonstrar que
seria ele o que decidiria quando soltá-la. Foi então quando viu as antigas marcas que
adornavam seus braços.
—Deve estar pensando na primeira esposa do senhor. Ouvi dizer que era muito bonita —
espetou Jocelyn quando por fim conseguiu libertar-se. Então caiu em si de que Duncan não
estava longe dela e que mencionar a aquela mulher ia contra as ordens de seu marido.
Rurik voltou a rir.
—Eu conhecia Kenna e era muito bonita, mas não como você —voltou a agarrá-la,dessa vez
dos quadris, sem que ela pudesse fazer nada para evitá-lo—. Você tem uma beleza feminina
que promete encontrar o céu entre suas pernas e muitos bebês a seus peitos.
E antes de que pudesse pensar em algo que dizer, Rurik se afastou. Jocelyn olhou para
Duncan com fúria; o homem de confiança de seu marido desceu do cavalo e agora ia para
Rurik, a quem agarrou pelas costas e o atirou ao chão. Depois o agarrou pelo peitilho da
túnica, sussurrou-lhe algo e o soltou.
Duncan ficou diante dela a modo de escudo protetor até que Rurik ficou em pé, dedicou
um malévolo sorriso a Jocelyn e chamou a seu cavalo. Depois se afastou colina acima sem
olhar para trás. Jocelyn tinha ficado sem fala, mas esperava algum comentário sardônico
tão habitual em Duncan. Foi então quando se deu conta de que tinham espectadores do
povoado.
—Assustou-a? —perguntou-lhe Duncan observando-a—. Rurik está acostumado a ser
inofensivo.
—Quem é? E quem é essa gente? —disse ela assinalando ao caminho pelo que se afastou o
grupo de cavaleiros.
—Pertencem ao clã, devem aconselhar ao senhor —Duncan lhe estendeu uma mão para
afastá-la do rio—. Rurik é o guarda pessoal de um dos anciões do conselho.
—Seu nome não parece gaélico nem das terras baixas.
—Não, Rurik é de Orkney, ali ainda têm o poder dos vikings. Dizem que sua mãe era uma
escocesa que foi seqüestrada em um ataque e a que converteram em amante de um chefe
viking. Rurik apareceu um dia no castelo de Dougal e lhe pediu que lhe deixasse ser seu
servo.
—Dougal? Um dos anciões?
—Sim, o marido da tia de Connor.
Jocelyn sacudiu a cabeça, ainda não chegava a acreditar o que acabava de acontecer.
—Um viking… —murmurou.
O comportamento daquele homem lhe tinha parecido surpreendente. Inquietava-lhe que
tivesse visto nela uma beleza misteriosa que ninguém mais via.
—Devo encontrar Connor para lhe dizer que estão aqui os anciões —anunciou Duncan
voltando para seu cavalo—. E o mais importante, que Rurik os acompanha —antes de se
partir voltou a olhá-la uma vez mais—. Os anciões vão querer, senhora.
—Duvido muito, Duncan. Com certeza só querem assegurar-se de que o senhor encontrou
uma esposa como eles ordenaram.
Dessa vez Duncan não pôde ocultar a surpresa que lhe causaram aquelas palavras. Naquela
última semana, Jocelyn se tinha informado de muitas coisas graças a Brodie e aos
habitantes do povoado, que eram muito mais abertos na hora de falar do senhor e de sua
primeira esposa. Só Ailsa guardava silêncio e continuava sem falar, nem sequer se o pedia
sua filha.
—Acredito que sim vão querer conhecê-la, senhora. Sugiro-lhe que volte para castelo e se
prepare para o jantar enquanto eu procuro o seu marido.
Odiava lhe dar a razão, assim em lugar de dizê-lo, limitou-se a assentir. Duncan agarrou as
rédeas e se afastou dali sem perder mais tempo em explicações.
Bom, possivelmente aquela fosse a oportunidade que tinha esperado para ganhar um lugar
na comunidade. Ao olhar ao vestido e sabendo que teria as mãos e a cara quase tão sujas
como Brodie, deu-se conta de que devia voltar o quanto antes e preparar-se para conhecer
esse grupo de homens que tanta influência exerciam sobre seu marido.
Não pediria a ajuda de Ailsa, mas sim de Cora, a moça que lhe tinha servido nos primeiros
dias. Embora lhe tinha causado alguns problemas aoprincípio, o certo era que a jovem era
uma donzela eficiente, o que ocorria era que tinha medo do senhor e de seus homens, mas
parecia desejosa de aprender.
Ao chegar ao castelo comprovou que os anciões não tinham chegado ao interior, pois todos
os cavalariços estavam atendendo-os. Jocelyn continuou seu caminho para a torre até que
viu de longe Rurik… e atrás dele ia Connor, de espada em mão. Mas o que mais lhe chamou
a atenção foi a multidão que seguia a ambos, como se fossem a algum tipo de espetáculo.
Jocelyn se deixou levar pela maré de gente.
Rurik saltou uma cerca e Connor não duvidou em ir atrás dele e atacá-lo com ferocidade.
Jocelyn não tinha visto nunca um verdadeiro combate e se perguntou se aquele o seria.
Não, havia muitos homens observando a cena sem defender a seu senhor. Aquele não era
um combate real mas então, o que era?
Os golpes das espadas retumbavam no pátio provocando um ruído ensurdecedor. Parecia
impossível imaginar como podiam sequer levantar aquelas enormes espadas e além disso
as lançar para o outro com tal força. Passavam os minutos e os dois homens seguiam
lutando, o suor tinha molhado seus rostos, por isso ambos tiraram a túnica tão rápido
como puderam, sem afastar a atenção do oponente em nenhum momento. O sol fez então
que o suor brilhasse em seus peitos nus.
Embora Rurik superava Connor em altura por mais de um palmo, suas habilidades no
combate corriam muitos iguais. Na realidade ambos pareciam igualmente masculinos,
estavam em magnífica forma e eram igualmente atraentes para as mulheres que
observavam o combate. Todas elas protegeram os olhos do sol para não perder detalhe do
espetáculo e de vez em quando umedeciam os lábios com a língua enquanto os homens
atacavam e se defendiam um do outro com eficiência.
O resto do público parecia dividido entre um e outro lutador, mas todos eles animavam a
seu preferido com entusiasmo. Jocelyn teve que fechar os olhos quando Rurik golpeou
Connor de tal maneira que lhe fez machucou no peito, mas em lugar de parar como teria
feito qualquer homem sensato de não estar em uma batalha de verdade, aqueles dois
inconscientes seguiram como se nada tivesse acontecido.
Foi então quando se fixou nele. Em seu marido.
Aquele não era o homem sério e anti-social que a saudava cada manhã com o olhar
perdido, nem o marido pensativo que ia a cada noite a sua cama. Aquele era a Besta das
Terras Altas da Escócia, enfrentando-se cara a cara com seu igual sem o menor temor. Ria,
amaldiçoava e olhava com fúria a seu oponente. Nunca antes tinha visto tanta vitalidade
nele.
Connor respondeu a todos os ataques de Rurik até que conseguiu lhe encurralar contra a
parede dos estábulos lhe colocando a espada sobre a garganta. Jocelyn conteve a
respiração. O viking aceitaria a derrota ? Acabaria vencendo a seu senhor? Os gritos da
multidão aumentaram de intensidade até que Jocelyn sentiu vontade de tampar os
ouvidos.
Antes chegaram as palavras de Duncan, de pé junto a ela.
—Não me deu tempo de avisá-lo.
Jocelyn não se voltou para olhá-lo porque não queria perder o desenlace do combate.
—A quem? Ao senhor ou a Rurik?
—A seu marido —respondeu.
Então sim o olhou e compreendeu o que era tudo aquilo.
—Entendo —murmurou. Parecia que se tratava de um velho costume. A julgar pela reação
do povo, aquele encontro se repetiu muitas vezes—. Então isto acontece freqüentemente?
—Ultimamente não.
—Por que queria avisá-lo? É evidente que se diverte com o desafio.
A multidão estalou em aplausos e gritos quando os dois opositores soltaram as espadas e se
abraçaram como camaradas. O público começou a dissipar-se, mas muitos soldados foram
felicitar a seu senhor pela vitória conseguida. Rurik também tinha seguidores, mas a
maioria eram mulheres. Jocelyn meneou a cabeça com incredulidade.
—Rurik chega a perder a cabeça nestes combates —lhe explicou Duncan—. Ataca Connor
sem lhe importar o lugar ou o momento. Em outras ocasiões sofreram feridas e
ocasionaram diversos danos.
—Isto não é mais que uma diversão? —perguntou Jocelyn imaginando como podia acabar
o cenário da batalha quando esta se desenvolvia em um lugar fechado—. É que o senhor
não conhece outros entretenimentos mais pacíficos, como escutar as histórias dos bardos?
Certamente pareceria menos perigoso —acrescentou sem compreender bem o que acabava
de presenciar.
—É mais que uma diversão, esposa. Também serve de treinamento em caso de ter que
defender tudo aquilo que me importa, se houvesse necessidade de fazê-lo.
A voz procedia de atrás e sobressaltou Jocelyn. Naquele momento odiou Duncan por havê-
la distraído e ter permitido que Connor se aproximasse sem ser visto. Ao olhá-lo viu em seu
rosto os traços do guerreiro ao que acabava de ver em ação, mas a emoção desapareceu em
seguida. O que teria ela que lhe parecia tão desagradável?
—Maldito, Connor. Diga a verdade a sua esposa —espetou Rurik, junto a ele—. Está
desejando ter oportunidade de me vencer, embora ultimamente não tinha podido fazê-lo.
O sorriso que iluminava o rosto do viking não fazia supor que acabasse de perder uma
briga. De fato, qualquer que tivesse visto sua atitude, teria acreditado que tinha sido ele o
vencedor.
Quão único predisse o iminente ataque foi o modo em que Duncan fechou os olhos. Justo
nesse momento, Rurik agarrou Connor pelo pescoço e o atirou ao chão. Ambos se
derrubaram pela areia e lutaram até cair rendidos, esgotados pelo jogo.
Dessa vez, quando Jocelyn olhou a seu marido, pareceu-lhe muito mais jovem do que
parecia normalmente. Parecia que aquelas brigas além de entretê-lo faziam desaparecer
toda sua tensão. Possivelmente não fora má idéia ter perto Rurik para poder ver mais
freqüentemente essa parte de Connor que até o momento desconhecia.
Quando seus olhares se encontraram momentaneamente, Jocelyn sentiu seu poder, a força
que mantinha controlada a cada noite quando se metia em sua cama e entre suas pernas.
O que sentiria se ao tocá-lo, aquela pele masculina se estremecesse sob seus dedos? Como
seria deitar-se com ele com a mesma paixão e desfrute que tinha mostrado fazia uns
minutos diante de toda essa gente? A Jocelyn lhe fez a boca encher de água como se lhe
tivessem mostrado seu manjar preferido, mas a garganta ficou seca. De onde tinham saído
aquelas idéias?
De repente voltou para a realidade e sentiu o rubor nas bochechas que fez que temesse que
alguém, especialmente seu marido, pudesse adivinhar seus pensamentos. Os dois
combatentes ficaram em pé e limparam a roupa como puderam. Outros homens se
aproximaram nesse momento e Connor os saudou.
—Dougal, apresento Jocelyn —disse assinalando-a e recuperando a expressão séria e
totalmente carente de interesse que tinha sempre que a olhava—. Conhecerá o resto de
anciões durante o jantar.
O homem de cabelo cinza a olhou de cima a baixo, detendo-se especialmente em seus
quadris e seus seios, depois assentiu.
—Servirá —murmurou antes de encolher os ombros e dar meia volta.
Connor e todos outros se afastaram sem lhe dizer nenhuma palavra mais. Algumas
mulheres o seguiram falando e rindo, mas nenhum se voltou para comprovar se ela os
acompanhava. Só Duncan ficou ali, olhou-a com gesto inquisitivo e partiu também.
Jocelyn olhou a sua redor enquanto dentro dela voltava a despertar seu velho
temperamento. Como única filha de MacCallum esperava receber trato melhor, como
esposa de MacLerie, sabia que o merecia. Tinha chegado o momento de que assim fosse.
Para pôr em marcha um plano que pudesse ter êxito, precisava conhecer melhor o inimigo.
Que melhor momento para isso que o jantar com os anciões? Com tal propósito em mente,
Jocelyn entrou no castelo e subiu correndo a seus aposentos.
Alguém devia havê-la visto chegar porque Cora não demorou para ir ajudá-la a lavar-se e
trocar-se de roupa. Tinha sido o próprio Connor o que lhe tinha atribuído a Cora como
donzela sabendo que Ailsa continuava com sua filha.
Jocelyn escolheu o vestido verde que ela mesma fez durante as manhãs que tinha passado
costurando com o resto de mulheres do povoado. Depois de decidir deixar o cabelo
descoberto e prender com um laço de pele, fez uma pausa funda. Aquela era a primeira vez
que enfrentava às pessoas que mais importava a seu marido e, embora a ele não tinha
conseguido gostar dela, esperava que eles sim a aceitassem.
Quando chegou ao salão encontrou Connor rodeado de homens, discutindo
acaloradamente os recentes ataques contra povoados do clã. Ataques dos que ela não sabia
absolutamente nada, por isso não estava disposta a interromper ou intervir na conversa.
—Mandei mais homens, mas não penso entrar em batalha só por algumas cabeças de gado
—explicou seu marido—. Descobrirei o que pretendem realmente vendo como se
comportam e depois interviremos.
Sem ter mais informação a respeito, não podia formar uma opinião, mas a exposição dos
fatos e o plano que tinha apresentado Connor lhe valeram os louvores dos presentes.
Aquilo lhe recordou ao passado, quando seu pai se reunia com o conselho. Naqueles
tempos ele sozinho tinha protegido a sua gente sem a ajuda de outros clãs, porque então
tinha contado com guerreiros e fortuna suficientes para fazê-lo.
A lembrança daquela época fez que sentisse falta de sua terra e lhe enchesse o coração de
tristeza. O peso que sentiu na alma esteve a ponto de derrubar a e teve que dar uma mão à
parede para recuperar as forças.
—Eu diria que pensaram que MacLerie passa muito tempo na cama com sua nova esposa
para lhes exigir algo —gritou Rurik do outro lado do salão, atraindo sobre si todas os
olhares. O maldito viking elevou sua taça para ela—. Por lady Jocelyn.
Os recém chegados levantaram suas taças também, mas todos os que viviam no castelo
olharam a seu senhor sem saber o que fazer. Houve um momento de silêncio até que o
chefe do clã ficou em pé. De onde se encontrava, Jocelyn não podia lhe ver bem a cara, mas
a voz com a que pronunciou seu nome ao elevar a taça denotava sua irritação.
—Connor, deixa que acompanhe à dama até você —se ofereceu Rurik indo para ela,
enquanto seu marido tomava um gole de vinho.
Jocelyn tentou não retroceder, mas a aproximação daquele homem continuava deixando-a
nervosa. Suas maneiras não contribuíam para tranqüilizá-la, pois a olhava de um modo
que teria assustado até a mais valente. A pobre Cora a agarrou por braço com uma mão
trêmula.
—Vamos, senhora —lhe sussurrou provocativamente. Depois deu uma olhada a Cora, que
se escondia a suas costas—. Quem é esta? Uma mulher nova no castelo? —acrescentou
estendendo uma mão também a ela.
—Rurik! —o grito fez tremer as paredes do salão. O chefe do clã ficou em pé e foi para eles
com grandes passos—. Deixa em paz à donzela!
Rurik adotou uma atitude de inocência, mas a curva de seus lábios o delatou. Ao menos
retrocedeu em sua tentativa de agarrar a mão da moça, que parecia estar a ponto de
desmaiar.
—Cora, volte para os aposentos da senhora —lhe ordenou Connor, ao mesmo tempo que
agarrava Jocelyn pela mão, tirando-lhe de Rurik—. Não converta a essa moça em um de
seus objetivos, Rurik, ou não voltará a encontrar a hospitalidade que sempre recebe em
Lairig Dubh.
Pela ênfase que tinha dado à palavra, Jocelyn suspeitou que a hospitalidade que Rurik
encontrava ali não se referia a comida e bebida. Nem seria isso o que perderia se fazia
zangar a seu zangado anfitrião.
—Como manda, Connor. Os anciões aguardam.
O chefe do clã começou a caminhar, mas Jocelyn sabia que Rurik não se renderia tão
facilmente… e não demorou muito em comprovar que não se equivocou. Desgraçadamente,
ouviu até a última palavra do que disse a seguir.
—Não o culpo por não querer que outro homem a toque sequer. Deve ser um verdadeiro
prazer estar em seus braços… —acrescentou com um suspiro.
Jocelyn tropeçou ao ouvir aquilo e seu marido teve que agarrá-la para que não caísse ao
chão. Rurik fez caso omisso do olhar de advertência de Connor e continuou falando:
—Esses seios —sussurrou—. Essas coxas. Quantas vezes morreu para estar essas coxas,
Connor? Olhe como se movem seus quadris ao caminhar.
A partir daí Jocelyn não conseguiu continuar andando com normalidade. Uma gota de
suor se deslizou entre os seios que Rurik acabava de mencionar.
—E essa boca. Me diga se…
Não pôde terminar a frase porque Connor o impediu. Jocelyn se alegrou de não ser por
essa vez o objeto de sua ira. Soltou-lhe a mão e um segundo depois deu um murro no
viking que caiu. Depois voltou a tomá-la pela mão e a levou até a mesa como se não
acabasse de deixar inconsciente a um homem tão grande como um castelo.
Nenhum dos ali reunidos deveria acreditar que aquilo era algo incomum porque deixaram
Rurik inconsciente no chão e continuaram com suas conversas. Jocelyn foi a única que o
olhou.
—Senhor? —disse ela, mas Connor continuou falando com o homem que havia a seu lado
como se não a tivesse ouvido—. Senhor? —insistiu.
—Connor, acredito que sua mulher está falando —avisou Dougal—. Pensei que chamava a
seu pai, mas me parece que é a você.
—Não deveria ir alguém comprovar se ele está bem? —perguntou por fim.
Rurik não se movia e, apesar da vergonha que lhe tinha ocasionado, não lhe desejava mal
algum. Connor fez um gesto a um dos poucos soldados que havia junto ao lugar no que
tinha caído, o jovem o sacudiu várias vezes até que o fez voltar a si. Segundos depois, Rurik
ficou em pé e voltou para seu assento para continuar conversando como se nada tivesse
ocorrido.
A conversa se reatou em todos os cantos do salão e Jocelyn aproveitou para aprender
quanto pudesse sobre o clã de seu marido, e seu também. A princípio tentou não
interromper, mas o certo era que tinha alguns comentários a fazer em relação à colheita ou
a localização das tropas próximas às propriedades de sua família. Os anciões aceitaram
suas intervenções de bom grau, e inclusive a animaram a continuar participando com suas
perguntas. Finalmente o jantar passou de maneira rápida e agradável tendo convidados
com os quais conversar.
Apesar de que todos eles fossem homens.
E embora um deles parecesse encontrar atraente tudo o que ela fazia e dizia e entretanto ao
homem que se sentava a seu lado ocorria justamente o contrário.
Pouco depois de terminar de jantar, seu marido lhe perguntou se queria retirar-se e
Jocelyn entendeu que devia fazê-lo. A verdade era que estava esgotada depois do longo dia.
Uma vez na cama, Jocelyn descobriu com pesar que lhe tinha chegado a mesntruação. O
que devia fazer então? Sabia que Cora teria preferido morrer antes de ter que lhe dar a
notícia a seu senhor, assim possivelmente o melhor fosse esperar a que ele aparecesse para
dizer-lhe pessoalmente. Com a decisão tomada, Jocelyn pediu a Cora que lhe levasse tudo
o que necessitava e depois lhe deu permissão para partir.
Levantou-se da cama, jogou-se uma manta sobre os ombros e se sentou em uma cadeira
junto à janela. Momentos depois, ou essa foi a sensação que teve, porque não saberia dizer
quando, adormeceu e quando abriu os olhos , viu o Connor diante dela.
—Por que não está na cama? —perguntou-lhe assinalando ao leito que tanto prometia e
tanto decepcionava ao Jocelyn cada noite.
—Não sei muito bem como dizer isto. Estou… —começou a dizer, mas não encontrava as
palavras para expressá-lo.
—Grávida? —perguntou ele com impaciência e um ligeiro sorriso que nunca antes tinha
visto Jocelyn em seu rosto.
Estava a ponto de defraudá-lo uma vez mais.
—Não, estou mesntruada.
Como imaginava, a espera desapareceu automaticamente e foi substituída pelo semblante
pensativo de sempre. Jocelyn esperou sem saber o que ia ocorrer. Connor tinha vrado as
costas, mas voltou a olhá-la depois de alguns segundos.
—Quanto dura?
Aquilo não era algo do que estava acostumada a falar abertamente e muito menos com um
homem.
—Cinco dias —respondeu pensando no que lhe tinha durado durante o último ano.
Seu marido assentiu e voltou a dar-se meia volta. Já junto à porta, olhou-a como se
quizesse lhe dizer algo, mas suas ações expressaram o que não sabia dizer com palavras;
abandonou o quarto tão rapidamente como tinha aparecido nele.
Era inútil esperar que pudesse ocupar algum lugar em sua vida, que esperasse que a reação
dos anciões para ela fora a ter alguma influência no que ele sentia.
Depois de comprovar que não se ouvia nada ao outro lado da porta, Jocelyn se levantou da
cadeira e voltou para a cama.Jamais poderia ter um matrimônio de verdade. Se não podia
satisfazer sua única necessidade de lhe dar um filho, que utilidade teria ela para Connor
ou para seu clã?

Nove

A essas horas Jocelyn já deveria ter estado a caminho do povoado, mas Connor ainda não a
tinha visto passar pelo pátio como todas as manhãs. A outra exceção tinha sido no dia
anterior, que só tinha saído de seus aposentos para o jantar, e suspeitava que o tinha feito a
pedido de Dougal. Voltou a olhar a porta da torre da cerca do pátio. Já tinha passado mais
da metade da manhã e ela continuava lá dentro.
Connor estava fazendo algumas correções a poucos soldados que treinavam no pálio
quando Murdoch foi buscá-lo para lhe fazer uma consulta em relação à quantidade de
provisões que tinha ordenado enviar aos MacCallum; foi a solucionar as dúvidas e em
seguida voltou para seu lugar junto à cerca. Se a alguém pareceu estranho, ninguém se
atreveu a dizê-lo.
Desde a chegada de Dougal e dos outros, não tinha estado de muito bom humor. Embora a
chegada de Rurik tivesse suposto uma diversão, do combate inicial e seus lascivos
comentários sobre Jocelyn, o viking não se deixou ver muito à margem das comidas.
Connor não se preocupava pois sabia que Rurik não tinha jamais o menor problema para
encontrar um lugar no que descansar a cabeça e, o que era mais importante para ele. Um
ruído atraiu sua atenção nesse momento, voltou-se a olhar, mas uma vez mais, não era ela.
Maldição! Seus planos não estavam saindo como ele tinha esperado.
Estar ali de pé, pendente de cada som, esperando vê-la passar sem que ela suspeitasse
sequer que a aguardava ou que sabia o que fazia cada dia… tudo isso era prova irrefutável
de sua derrota. Mas Connor não estava disposto a capitular ainda, não podia deixar-se
controlar pelas emoções que tomaram conta dele em seu primeiro matrimônio.
O problema era que a estratégia que tinha adotado não estava funcionando.
Dougal o tinha notado e também Rurik, que tinha comentado várias vezes que ele era o
único que não falava com sua esposa quando estava presente. Isso tinha sido depois de que
o viking, maldito viking, tinha insistido em que Jocelyn estivesse presente quando se
discutissem os assuntos do clã. Os anciões não tinham posto objeção alguma, por isso
tampouco Connor pôde fazê-lo. Possivelmente essa fora a maneira de averiguar mais
coisas dela e de suas habilidades…
—Não vai assustar me com esse olhar.
Connor se voltou e se encontrou cara a cara com Rurik.
—Me deixe em paz —lhe disse imediatamente.
—Se não tem o suficiente, vá procurá-la e a leve para à cama —lhe aconselhou—. Porque
esse é o problema, não?
—O sexo não é a causa de todos os problemas nesta vida.
—Certo, mas sim que é a solução de quase todos. Se não querer que seja lá, alguma das
prostitutas se encarregará de suas necessidades.
Connor grunhiu antes de responder.
—Não pensa em outra coisa que na seguinte mulher com quem vai se deitar, que será a
primeira que abra as pernas…seja lhe pagando ou não. Não lhe importa nada mais?
Rurik se pôs a rir.
—Interessa-me a batalha, mas se não poder lutar, o outro é igualmente bom. Como não
podemos planejar quando vamos morrer, quero desfrutar de ambas as coisas tanto como
possa antes de que me chegue o momento.
—Então vá e se ocupe de Dougal. Eu não tenho o menor interesse em sua companhia.
—Você se ocupe de seu clã —replicou Rurik- Isso inclui a sua esposa.
Connor se aproximava do limite de seu autocontrole e teve a tentação de ensinar a Rurik os
perigos de intrometer-se em sua vida pessoal no momento em que o viking assinalou à
porta da torre.
A mulher da qual estavam falando saiu da sombra da torre e tomou o caminho para o
portão. Ia cabisbaixa, com o olhar cravado no chão.
—O que lhe acontece?
—Eu não vejo que lhe acontece nada —possivelmente seu passo fosse um pouco mais lento
do habitual, sem o rebolado que tinha mencionado Rurik.
—Não está tão radiante como quando a conheci faz alguns dias. Olhe para ela, mal levanta
a vista do chão. Está doente?
Connor sabia o que lhe ocorria, mas não era algo que queria falar com ela, nem com
ninguém. Embora observando-a atentamente enquanto cruzava o pátio, deu-se conta de
que possivelmente Rurik tivesse razão. Parecia diferente. Tinha os ombros caídos e o rosto
pálido. Com a cabeça coberta com um lenço e o vestido velho que tinha escolhido vestir,
parecia mais uma criada do que a esposa do chefe do clã.
Por que não se vestia melhor? Tinha-lhe proporcionado uma ampla variedade de vestidos,
mas ela insistia em continuar usando os que lhe tinha enviado sua família, que eram pouco
mais que farrapos.
Não parecia havê-los visto sequer, por isso Connor pensou deixá-la partir sem lhe dizer
nada. Mas Rurik tinha outros planos.
—Bom-dia, Jocelyn —exclamou Rurik saudando-a com a mão—. Está bem, moça?
Jocelyn se deteve ao ouvir a saudação, levantou o olhar e os saudou com um movimento de
cabeça. Depois ficou ali, esperando.
—Lhe diga algo, Conn —sussurrou Rurik para que só ele pudesse ouvi-lo—. Saúde sua
esposa —acrescentou lhe dando uma cotovelada.
Connor respondeu falando entre dentes:
—Não tenho nada a lhe dizer —se limitou a saudá-la do mesmo modo que o tinha feito ela,
que continuou seu caminho para a porta.
Rurik meneou a cabeça e soprou com frustração. Assim que ela saiu do pátio, o viking
agarrou Connor pelo peitilho e o atirou contra a cerca.
—Esse é o outro problema, sempre há algo que dizer a uma mulher, especialmente se for
sua esposa —Rurik acompanhou cada frase sacudindo-o pelos ombros—. Está muito
bonita, esposa —o sacudiu—. Hoje não me importa comer —outro sacudo—. Abre as pernas
e deixa que lhe…
Connor lhe soltou as mãos de seus ombros e o empurrou, mas Rurik não demorou para
impor-se a ele com sua altura e sua força. Agarrou-o e lhe levantou os pés do chão. Para
dar maior ênfase a sua explicação, apertou-o até fazer que lhe custasse respirar.
—Sempre há algo que lhe dizer a uma mulher —repetiu ao ouvido, tinham já uma pequena
multidão observando-os.
—Me solte, Rurik. Agora mesmo —Connor tentou escapar de suas mãos, mas nem sequer
pôde soltar uma.
—Se você sofrer, seu clã sofre. Tem que se esquecer do passado.
—Não se meta nisto —respondeu Connor, apesar de que lhe parecia difícil falar.
—Essa mulher poderia ser a esposa que necessita —lhe disse apertando-o um pouco mais—
Poderia ser a mulher que necessita o clã. E você tem que voltar a ser o chefe que foi, que é
para o que lhe educaram.
Dizendo isso, Rurik o deixou cair e começou a afastar-se, mas ainda restava uma ameaça a
mais a fazer:
—Prometi servir a você e a seu clã porque é digno de confiança. Não me faça mudar de
opinião, você não gostaria de me ter como inimigo.
Connor esfregou o pescoço e a garganta. Teve que apoiar-se na cerca e esperar para
recuperar as forças, uma vez o conseguiu, amaldiçoou tudo que pôde contra Rurik.
Naquele momento teria desejado matar a esse filho de cadela por lhe dizer essas coisas e
por meter-se em sua vida. Era o chefe do clã e ninguém podia tomar decisões por ele, e
muito menos em questões tão pessoais com a sua esposa. Não importava o que dissesse
Rurik. Nem o que opinasse o conselho de anciões. Ele era o chefe.
Estava tão farto de todo aquilo, que decidiu sair para ver como iam os preparativos para a
colheita. Isso lhe levaria várias horas e, com sorte, perderia o jantar.
—Voltem ao seu trabalho —gritou a todos aqueles que se congregaram para presenciar a
cena.
Sem deixar de soprar de raiva, foi ao estábulo, selou o seu cavalo e se afastou dali. Os
guardas que o seguiram, sem dúvida por ordem de Duncan, foram o bastante inteligentes
para manter-se a uma distância prudencial dele.
Passou o resto do dia comprovando que tudo estava em ordem, visitou o novo moinho de
água que se construiu no rio e finalmente voltou para castelo já entrada da noite,
iluminado pela tênue luz da meia lua. Assim que cruzou o portão do pátio, notou Dougal
saudando-o das almenas. Connor o saudou também.
Aquelas horas de solidão depois da reprimenda de Rurik lhe tinham servido para meditar
sobre como tinha confrontado suas responsabilidades como chefe do clã. Rurik o tinha
obrigado a admitir, ao menos perante si mesmo, sua debilidade como chefe e era algo
muito desagradável. Durante os últimos dois anos, tinha deixado que as coisas se
descontrolassem em Lairig Dubh até o ponto de converter-se em um lugar que nada tinha
que ver com o lar no que ele tinha crescido.
A verdade era que da morte de Kenna não tinha querido nem ver aquele lugar e só havia
voltado depois do falecimento de seu pai. Não lhe tinha preocupado que se converteu no
lar de poucos soldados lutavam com ele e ninguém mais. De fato, tinha-lhe vindo bem que
se convertesse em um lugar masculino totalmente carente do toque doce das mulheres.
Sempre e quando os lençóis de seu leito estivessem limpos e houvesse algo para comer, ele
estava satisfeito.
Enquanto subia às almenas, Connor só podia pensar em que não queria ter a conversa que
sem dúvida estava a ponto de ter, mas sabia que não podia fugir.
—Então não está grávida —lhe disse seu tio assim que se aproximou.
—Não —respondeu Connor, depois respirou fundo—. Como sabe?
—A sua tia ficava com a mesma cara de tristeza quando lhe vinha a menstruação. Então o
melhor era sair para caçar —acrescentou com uma gargalhada que também fez Connor rir.
Dougal começou a caminhar pelo perímetro do castelo afastando-se dos guardas. Connor o
seguiu.
—Parece uma boa mulher, Connor.
—Sim.
—Isso é tudo o que pode dizer dela? As pessoas dizem que não quer nada com ela.
Dougal estava entrando em terreno perigoso e Connor não ia permitir lhe que indagasse
em sua alma sem opor resistência. Embora era o mesmo no que tinha estado pensando
enquanto cavalgava, continuava sem querer discuti-lo com ninguém. O nó que tinha no
estômago lhe dizia que ainda não tinha chegado o momento.
—Pode dizer também que todos se meteram em minha vida e agora tenho a esposa com a
que me ordenaram que me casasse. Que não lhe passe pela cabeça me dizer como tenho
que tratá-la ou que devo fazer com minha vida.
—No que nos colocamos foi nos problemas do clã e continuaremos fazendo-o enquanto
acharmos que é necessário —depois de dizer aquelas duras palavras, Dougal suspirou e
meneou a cabeça—. Connor, sabe que ter um filho pode levar um tempo.
—Acredito que isso já aprendi da primeira vez, igual aprendi que não há nada que garanta
que vá passar —acrescentou com amargura. Foi então quando olhou a seu redor e se deu
conta de onde estavam. Teria sido o destino o que os tinha levado precisamente a aquela
torre?—. Nada garante tampouco que esta esposa não vá terminar como a primeira…
morta em minhas mãos.
—Admite então que leva seu sangue nas mãos? —perguntou-lhe com espanto—. Não pensei
que fosse possível apesar de todos os rumores.
—Já conhece a história. Não me deu nenhum filho, não trouxe para o mundo nenhum
menino vivo… discutimos, atirei-a pelas escadas e morreu.
Não tinha sido tão difícil dizê-lo como tinha acreditado. Possivelmente os meses e meses
que levava pensando como expressá-lo com palavras tinham aplainado o caminho.
—Escuto suas palavras, Connor, mas não posso acreditar. Você não é uma pessoa cruel.
Amava a Ke…
—Morreu em minhas mãos —disse interrompendo-o.
Dougal o olhou por alguns segundos, como se tratasse de encontrar a verdade em seu
rosto. Connor endureceu sua expressão, pois não queria lhe revelar nada.
—Não posso acreditar algo assim de você. Sei que o conselho não se equivocou ao te
escolher como chefe do clã. E eu não me equivoquei ao aconselhar que o fizéssemos.
—E se lhes tivessem equivocado?
—Me diga que não desejava se converter em chefe. Me diga que não é digno disso. Me diga
que agora mesmo poderia abandonar todas suas responsabilidades e renunciar a seu
poder… e a ela —disse desafiando-o—. Diga, Connor.
—Não posso fazê-lo. Admito que desejo tudo isso. Nasci para isso e desejo tudo o que meu
pai desejava… quero ser o chefe deste clã o resto de minha vida. E não há ninguém neste
clã, nem em todas as Terras Altas da Escócia que me possa arrebatar isso.
—É verdade que… é o mais temido —asseguro Dougal lhe pondo a mão no ombro—. Mas
isto tem que mudar, Conn. O rei voltará para o trono assim que se pague por seu resgate.
Os regentes estão impacientes por consolidar seu poder sobre os clãs e não concederão
privilégio algum a um homem que vive como um soldado itinerante e do que todo mundo
acredita que matou a sua esposa. Não deixarão que sirva ao novo rei se não estarem
seguros de que podem confiar em você.
—Os MacLerie apoiaram ao rei David II e a seu pai, Robert Bruce, antes que a ele. Deve-
nos…
—Não acredito que seja boa idéia dizer a um rei que não deve nada a ninguém,
especialmente a um que nem sequer controla o que ocorre em seu próprio país. Muitos
acabaram com a cabeça separada do corpo por fazer algo parecido.
Connor não desejava admiti-lo, mas era verdade. A vida nas Highlands estava mudando;
com a Escócia unida sob o mesmo rei, embora este estivesse prisioneiro na Inglaterra, os
clãs pareciam estar aceitando os costumes da côrte.
O domínio do clã MacLerie sobre aquelas terras se remontava muitas gerações,
possivelmente tivesse começado inclusive antes de que a família Bruce entrasse na
Inglaterra durante o reinado de Guillermo o Conquistador. Entretanto agora o rei concedia
«privilégios» como se aquela terra que eles habitavam pertencesse a ele. Se queriam
conservar o poder no oeste, os MacLerie deviam formar parte dos novos costumes.
—O fato de que compreenda a necessidade de me submeter ao rei não significa que tenha
que gostar dele.
—Tampouco eu gosto, mas é o melhor para o clã.
Connor assentiu, mas sem olhá-lo aos olhos. Aquela discussão não era nova para nenhum
dos dois, pois já se repetiu no tempo de seu pai. O que sim era novo era a presença da
mulher que ocupava as habitações da torre norte. Sem dar-se conta, olhou para lá e se
perguntou se estaria dormindo.
—Acreditei que se aceitasse se casar significava que por fim estava preparado para isto.
Também nisso me equivoquei? —Dougal sabia bem como encontrar seus pontos débeis e
atacá-lo com a precisão de um professor arqueiro.
Connor sentiu a tentação de levar a mão ao peito para ver se sangrava, mas o que fez foi
mover os ombros para tentar relaxar a tensão que ali sentia. Possivelmente foi essa a
mensagem que tinha dado ao aceitar o conselho dos anciões e possivelmente o tivesse feito
por essa razão, mas… realmente estava preparado?
—Não, não se equivocou. O que ocorre é que… —não encontrava o modo de explicar aquela
dor que tinha agasalhado tão profundamente, que não acreditava que pudesse desaparecer
jamais. Sua reputação tinha conseguido afastá-lo de tudo e de todos e lhe tinha permitido
afundar-se na raiva e na dor, mas agora devia mudar. E sem parecer débil.
—Deve ter tido um dia muito duro —disse Dougal adivinhando seu sofrimento—. Ouvi que
Rurik te deu uma boa sova esta manhã.
Connor se pôs a rir. Suas brigas com Rurik eram para muitos fonte de interesse. Connor o
fazia para demonstrar -se podia enfrentar e vencer a um adversário mais forte; Rurik,
entretanto, o fazia por diversão.
—Cuidado, Dougal. Ultimamente me ofende muito freqüentemente e, se continuar assim,
poderia acabar te jogando daqui.
—Ah! Tente se quiser, mas te asseguro que ainda na minha idade, poderia te dar uma boa
surra —disse seu tio continuando com a brincadeira, mas lhe jogando o braço pelo ombro
em um gesto de grande carinho—. Vou para à cama. Mas pense no que lhe disse.
—Sempre tenho em conta seus conselhos, tio. Igual a tenho em conta os do resto dos
anciões.
Uma vez sozinho, Connor continuou caminhando pelas almenas, pensando em que na
realidade o que tinha feito Dougal com suas palavras tinha sido expressar o que ele mesmo
pensava, o que levava muitos meses lhe enchendo a cabeça. Mas o mais importante era que
seu tio tinha confirmado a fé que tinha nele, pois não acreditava que fosse responsável pela
morte de Kenna.
Quem dera não o tivesse sido.
O som de seus passos retumbou nos corredores vazios da torre e alguns segundos depois
na escada. Ao chegar frente à porta dos aposentos de Jocelyn considerou a idéia de entrar
para vê-la. Sabia que continuava sangrando, mas se perguntava se estaria mal por isso.
Em seguida negou com a cabeça. Ainda não estava preparado para mudar de estratégia,
assim continuou até seu dormitório para tentar dormir. Tinha muito no que pensar; no
futuro do clã… e também no seu.

Dez

Como poderia voltar a olhar Rurik à cara?


A pequena parecia sentir seu nervosismo, pois não parava de choramingar. Jocelyn tratou
de acalmá-la embalando-a em seus braços e lhe dando tapinhas nas costas como lhe tinha
visto Ailsa fazer. A pequena Peggy se tranqüilizou e aconchegou a carinha no pescoço de
Jocelyn, o que lhe provocou um estranho calafrio.
A música de gaitas de fole se fundia com as palmas dos que se reuniram para celebrar o
casamento da irmã de Robbie. Jocelyn se afastou em busca de um lugar mais tranqüilo
para não despertar à pequena.
Alguns casais, incluindo Rurik e a viúva Nara, dançavam ao som da música. Outros
comiam em torno das mesas colocadas perto da casa de Margaret e outros conversavam
animadamente enquanto as crianças brincavam. Apesar de ter sido um casamento um
tanto repentino e de estar celebrando-se no momento de mais trabalho do ano,
virtualmente todos os habitantes do povoado e inclusive alguns membros do conselho de
anciões se uniram à celebração.
Rurik lhe piscou um olho quando seus olhares se cruzaram de longe e Jocelyn se afastou
um pouco mais para evitar que pudesse ver o rubor de suas bochechas. Sabia que aquela
piscada era sua maneira de lhe dizer que a tinha visto antes no bosque.
Aquele homem era… um sem vergonha. Por muito que o tentasse, Jocelyn não podia
apagar de sua mente a imagem do casal entre as árvores. Tinham passado já horas, mas
ainda continuava ouvindo os ruídos que tinham atraído seu olhar para um grupo de
árvores a alguns metros do caminho que conduzia ao moinho da casa de Margaret, por
onde tinha estado passeando à menina que agora tinha nos braços. A princípio só tinha
visto as costas de um homem corpulento e nu que brilhava suarenta sob o sol. Mas então se
separou do chão com a força dos braços e Jocelyn tinha visto que havia uma mulher
embaixo ele. A cabeça coberta e as inconfundíveis marcas dos braços tinham revelado a
identidade daquele homem que devorava a beijos à mulher.
Ambos riam com paixão e trocavam palavras que Jocelyn não podia ouvir na distância,
mas que imaginou que seria algum tipo de desafio. Ele parecia provocá-la com seus
movimentos e ela resistia. Era um jogo do qual ambos pareciam desfrutar.
Como seu marido jamais a beijava na boca, Jocelyn só podia imaginar o que aquela mulher
sentia quando Rurik acariciava seus lábios com a língua e depois a metia em sua boca e a
movia igual a Connor movia… isso durante o ato.
Jocelyn se fixou também no modo em que a mulher movia as mãos e os pés com cada
beijo; seus dedos pareciam querer agarrar a terra que tinha debaixo. Um gemido da
mulher lhe deu a entender Jocelyn que Rurik tinha ganho o desafio. Nesse momento a
mulher lhe agarrou o rosto com ambas as mãos e o atraiu para si para beijá-lo
apaixonadamente, então lhe levantou as saias até a cintura e se inundou dentro dela. A
mulher o agarrou pelas nádegas e gritou de prazer.
Foi então quando Jocelyn se deu conta, com a respiração acelerada, de que tinha o olhar
fixo em uma cena que deveria ter sido particular. Quando se dispunha a dar a volta, o casal
rodou pelo chão e Nara, a que então tinha podido reconhecer, colocou-se sobre Rurik.
Jocelyn sentiu que estava molhada entre as pernas e que seus próprios mamilos se
endureceram presenciando aquele apaixonado encontro; parecia como se seu corpo tivesse
reconhecido o que Rurik e Nara estavam sentindo. O desejo a invadiu enquanto imaginava
que eram seu marido e ela os que estavam nus, suando e beijando-se por toda parte.
Sabia que devia partir, mas não queria mover-se por medo de ser vista.
A menina tinha começado a mover-se e Jocelyn tinha tido que afastar-se dali antes de que
o casal ouvisse algo. Escapuliu-se entre as árvores com o maior sigilo possível, mas a
piscada que acabava de lhe fazer agora Rurik era a prova inequívoca de que tinha
fracassado em sua tentativa de não ser descoberta. O viking sabia que tinha estado ali e o
que tinha visto. Maldito homem!
Viu-o caminhar de mãos dadas com Nara para as mesas da comida e lhe surpreendeu seu
comportamento porque tinha ouvido muitas histórias sobre ele e sobre suas proezas com
as mulheres do povoado. Entretanto agora não se separava de Nara, passou a noite inteira
dançando e conversando com ela como se não lhe interessasse a beleza das demais
mulheres. Quando outra jovem o convidou a dançar, Rurik olhou para Nara com um doce
sorriso e se uniu ao baile, mas voltou para seu lado minutos depois. Era estranho. Jocelyn
acreditava que se entregava a qualquer mulher disponível, mas não era isso o que dizia seu
comportamento.
—Obrigado, senhora —lhe disse então Margaret lhe tirando à pequena dos braços—. Eu
cuido dela agora.
—Tem certeza? —perguntou Jocelyn sabendo que sem ter uma tarefa que fazer ali, teria
que voltar para seus aposentos do castelo, para seu quarto vazio.
—Sim —assegurou Margaret—. É hora de levá-la para à cama.
Depois de despedir-se de Margaret, Jocelyn foi à mesa se servir uma taça de cerveja com a
que esperava aplacar a inquietação que por algum motivo sentia. A bebeu rapidamente e
voltou a enchê-la antes de ir sentar se entre as mulheres casadas. Mal acabava de sentar-se
quando Brodie e seus amigos foram contar lhe seus planos para o dia seguinte como se
fosse uma a mais do grupo.
Foi então, enquanto escutava aos meninos, quando viu seu marido olhando-a de longe com
o mesmo olhar duro que sempre lhe dedicava. A música se deteve e todo mundo ficou em
pé em honra a sua presença. Enquanto os homens se aproximavam para saudá-lo, algumas
mulheres o olhavam com medo e outras a olhavam com lástima.
Angus, o noivo, foi um dos primeiros em aproximar-se dele. Jocelyn não sabia os motivos
pelos que tinha aceitado casar-se, mas o certo era que não parecia estar sendo um sacrifício
para ele. Depois de algumas palavras que ninguém ouviu, Angus chamou a sua nova esposa
para que se aproximasse. Connor esperou a chegada de Siusan com os braços cruzados
sobre o peito, o que certamente não serviu para aumentar o pouco entusiasmo que parecia
sentir a noiva por aquela apresentação.
Connor falou com os noivos alguns segundos e, embora ninguém haveria descrito a
expressão de seu rosto como amável ou carinhosa, o temor abandonou o rosto de Siusan
enquanto escutava as palavras do chefe do clã. Jocelyn considerou a idéia de aproximar-se,
mas em seguida decidiu que não era boa idéia. Levava três dias sem falar com seu marido e
apenas o tinha visto exceto ao cruzar com ele no pátio. Mas segundos mais tarde foi ele
quem se aproximou dela, fazendo que Brodie e seus amigos saíssem correndo
imediatamente.
—Esposa —a saudou inclinando a cabeça.
—Senhor —respondeu ela secando o suor das mãos no vestido. Estava tão perto que nem
sequer podia ver o resto dos convidados, que certamente os observavam. Connor
continuava deixando-a nervosa, embora já não sentia o menor temor a que pudesse lhe
fazer algum dano físico.
—Não estava em seus aposentos.
—Não, senhor. Convidaram-me para o casamento de Siusan e não vi motivo para me
negar.
Seu olhar se obscureceu, mas não com o brilho assustador que tinha visto outras vezes
nele. Não, havia algo mais em seus olhos, algo que Jocelyn não sabia identificar.
—Fui a seu quarto lhe buscar.
Claro, o período tinha passado e já era hora de voltar a deitar-se com ela para cumprir com
sua obrigação de lhe dar um herdeiro ao clã.
—Nunca vem antes da meia-noite —Jocelyn deixou na mesa a taça que, sem dar-se conta,
tinha estado agarrando com força—. Não sabia que teria que ficar sentada esperando sua
chegada. Acaso pensava que tinha fugido?
Connor olhou a seu redor sabendo que todos os que os rodeavam escutavam ou tentavam
escutar o que falavam. Não sabia bem que reação tinha esperado de sua esposa, mas
certamente não era aquela. Jocelyn apertava os lábios e tinha as costas muito reta, como se
estivesse preparando-se para a batalha.
—Agora esta é sua casa e não tem por que ir a nenhum outro lugar —disse em um
sussurro—. Mas eu não gostaria de discutir isto aqui.
Deveria ter sido ele o zangado; tinha voltado para castelo para o jantar e o tinha
encontrado virtualmente deserto à exceção de alguns poucos servos. Duncan, os anciões e
inclusive Rurik tinham ido ao casamento. Ao subir, também tinha encontrado vazio o
quarto de sua esposa, que tinha acreditado que o esperava. Cedo ou não, Jocelyn deveria
ter estado ali.
A idéia de que pudesse havê-lo abandonado lhe tinha rondado a cabeça durante um
momento que tinha bastado para preocupá-lo. Apesar disso, não tinha demorado para cair
em si de que teria ido também ao casamento, pois ultimamente tinha passado muito tempo
no povoado e todo mundo esperaria sua presença na festa. Ele entretanto não tinha
considerado a idéia de assistir apesar de que tinha ajudado a encontrar um noivo adequado
para a moça. Com isso tinha acreditado cumprir com suas obrigações como chefe do clã.
Connor estirou os ombros e limpou a garganta, o que fez com que muitas mulheres se
afastassem dele assustadas. O que tinha feito ele para merecer tanto temor à margem de
cumprir com seu dever?
E à margem de matar a sua primeira esposa por não fazer o que ele desejava.
Todos os que tinham estado aquela noite no castelo, especialmente as mulheres, muitas
das quais estavam agora na festa, consideravam considerando-o um perigo. Olhavam a sua
esposa com lástima, como se acreditassem que ele fosse levantar o punho e golpeá-la até
matá-la a qualquer momento. De nada servia que passasse dias, semanas e meses
trabalhando para que todos eles tivessem cobertas qualquer necessidade e estivessem
protegidos de qualquer ataque. Todos lhe temiam. Connor sabia que ele mesmo o tinha
procurado, mas mesmo assim lhe doía.
Dando as costas a todos os presentes, Connor se voltou a olhar a sua esposa e lhe estendeu
a mão. Apesar de seu comportamento para ele e de não ter estado esperando-o em seu
dormitório, ela a deu imediatamente. Levou-a pela mão até o novo casal.
—Angus, Siusan, minha esposa e eu queremos lhes desejar felicidades —e dizendo isso,
voltou a agarrar Jocelyn pela mão e a levou para o cavalo. Ao chegar lá, viu que só estava o
seu cavalo—. Por que sempre vem andando podendo vir a cavalo?
Connor subiu ao cavalo e depois estendeu uma mão a ela para ajudá-la a subir também.
Embora Jocelyn o olhava, tinha a atenção em outro lado. Então ele também ouviu as vozes
que chegavam de entre as árvores.
—Angus não vai ser o único que acabe a noite na cama de sua esposa —disse um homem.
—Mas Angus ficará ali mais tempo… —disse outro antes de que todos pusessem-se a rir—.
Este termina mais rápido com sua esposa que com uma prostituta.
Se não tivesse sido pelo gesto horrorizado de Jocelyn, ele mesmo teria ido lhes dar uma
lição aos que acabavam de insultá-lo.
—Vamos, esposa, começa a fazer frio e não usa um casaco quente —a puxou e a sentou
entre suas pernas em lugar de deixar que se sentasse atrás, e a envolveu com sua capa—.
Diga, por que jamais vem ao povoado a cavalo? —perguntou-lhe minutos depois, quando
se encontravam já no caminho.
—Estou acostumada a caminhar. Meu pai não tinha cavalos suficientes para que eu
utilizasse um; só os soldados tinham cavalos.
—Agora tem cavalos mais que de sobra. Não fica bem que minha esposa vá por estes
caminhos como se fosse uma criada —sentiu como ficava tensa entre seus braços e se deu
conta de que ele também a tinha insultado agora—. O que quero dizer é que ordenarei que
lhe preparem um cavalo para que o utilize sempre que quizer.
Jocelyn não respondeu, só assentiu. Continuaram em silêncio até que ele voltou a falar.
—Sua donzela deveria te acompanhar ao povoado —assim era como devia caminhar a
esposa de um senhor poderoso como ele, sempre acompanhada.
Dessa vez Jocelyn soprou com frustração antes de responder com o tom que teria utilizado
para falar com um menino:
—Liberei Cora de suas obrigações quando já não necessitava de seus serviços. Sempre está
pendente do que necessito, mas hoje deixei que desfrutasse da festa.
Encontravam-se já frente à porta do castelo, mas Connor não queria separar-se dela depois
de senti-la durante todo o caminho grudada em seu corpo. Foi ela quem tirou a capa,
preparando-se para descer.
Connor não se preocupou que seu corpo reagisse com desejo a sua aproximação; depois de
três anos sem deitar-se regularmente com nenhuma mulher, era lógico que agora se
acostumou rapidamente a fazê-lo. Aqueles cinco dias afastado da cama de Jocelyn lhe
tinham feito ver que precisava ter relações com sua esposa.
—Levarei o cavalo ao estábulo —lhe disse depois de ajudá-la a descer—. Me espere em seus
aposentos.
Jocelyn o olhou e se virou para a entrada. Connor a viu esperar a que o guarda lhe abrisse a
porta e depois desaparecer atrás dela. Que demônios lhe ocorria aquela noite? Pensou
Connor a caminho do estábulo. Não entendia por que se sentia tão estranho estando com
ela. Possivelmente quando por fim tivesse completo com a obrigação de gerar um filho
para assegurar o futuro de seu clã e para que levasse o título que logo lhe daria o rei,
poderia voltar a sentir-se tranqüilo e tratar de encontrar um modo mais fácil de relacionar-
se com sua esposa. Uma vez que assegurasse sua posição como chefe do clã, poderia
abrandar sua atitude e deixar que ela se aproximasse um pouco mais.
Possivelmente por obra do destino ou da casualidade, naquele momento se ouviu um ruído
em uma das torres do castelo, a que se encontrava entre aquela em que dormia Jocelyn e a
que albergava suas dependências… a torre em que Kenna tinha encontrado a morte.
Connor meneou a cabeça e aceitou que jamais poderia abrandar-se porque isso seria sua
perdição. E não podia permitir que isso acontecesse de novo.
Sim, tinha intenção entretanto de realizar algumas mudanças. A ameaça de Dougal de
enviar a sua tia se não voltasse a transformar o castelo em um lar digno do próximo conde
de Douran lhe havia dado que pensar. Tinha que fazer algo para assegurar-se de que a
visita de sua tia Jean não fosse necessária.
—Connor —Duncan se aproximou dele—. Onde está Jocelyn?
—Lá dentro —respondeu ele assinalando à torre —. Por que?
Duncan franziu o cenho.
—Porque também Leana está lá dentro, com Eachann.
Uma das prostitutas do povoado estava realizando seu ofício exatamente no mesmo lugar
ao que tinha enviado a sua esposa. Quando tivesse tempo, apagaria a expressão petulante
do rosto de Duncan com que o olhava nesse momento; sim, já lhe tinha avisado de que a
presença das prostitutas no castelo lhe traria problemas. Mas agora o importante era
afastar a sua esposa ou ao menos adverti-la da situação.
Connor abriu a porta e pôs-se a correr pelo corredor que conduzia ao grande salão. Ali,
deitados no chão, visivelmente exaustos, encontrou Leana e Eachann. Não havia mais
ruídos no salão exceto os roncos dos que ali dormiam.
Assim, dirigiu-se para a escada e subiu aos aposentos de Jocelyn, cuja porta encontrou
fechada. Respirou fundo, bateu na porta e a abriu sem saber o que lhe esperava dentro.

Onze

Encontrou-a de pé frente à janela, de camisola. Os portinhas estavam completamente


abertas e a brisa entrava do exterior. Se tinha notado sua presença, certamente não deu o
menor sinal disso; continuava ali em silêncio, deixando que o vento a acariciasse e lhe
despenteasse o cabelo solto que lhe caía pelos ombros livremente. Connor fechou a porta e
esperou a que ela dissesse algo, algo que lhe desse uma idéia de como estava.
Teria visto Eachann no salão? Estaria escandalizada por isso?
Aproximou-se dela e falou brandamente:
—Não tem frio?
Ela negou com a cabeça com os olhos fechados.
—O vento me relaxa.
—Tenho medo de que o frio te faça adoecer. Se afaste da janela —lhe pediu.
Mas ela continuava sem lhe prestar atenção, por isso Connor se aproximou um pouco mais
e a rodeou para fechar os painéis de vidro. Aqueles aposentos tinham sido os de sua mãe e
os incríveis painéis tinham sido um presente de casamento de seu pai.
Connor se afastou e ela o seguiu para a cama. A surpresa de encontrá-la tão perto fez que
Connor tropeçasse e caísse sentado sobre a cama. Ia falar, ela estirou o braço e lhe pôs um
dedo sobre os lábios para que não o fizesse. Então se inclinou e estreitou sua boca contra a
dele.
Embora sua falta de experiência na matéria era evidente, o inocente roçar de seus lábios
provocou que Connor sentisse uma onda de calor. Ficou sentado, imóvel, consciente de que
aquele tipo de intimidade era precisamente o que devia evitar. Ao ver que não respondia
como ela devia esperar, beijou-o com mais ímpeto e lhe fez uma carícia que possivelmente
ele imaginou, mas em que lhe pareceu sentir sua língua. Seu cabelo caiu sobre ambos como
uma cortina.
Connor sentiu como seu corpo se endurecia pela excitação e o encheu o desejo de possui-la
naquele mesmo instante, mas sabia que se perdesse o controle, já não poderia recuperá-lo.
Levantou a mão para afastar seu cabelo da cara, mas sua suavidade o deixou hipnotizado.
Então o beijo se tornou mais apaixonado e Connor soube que a batalha estava perdida.
Puxou-a para si, deixando que o desejo controlasse seus movimentos, e se apoderou de sua
boca ansiosamente. Não parecia que aquilo a assustasse, mas bem ao contrário, porque
Connor sentiu que ela se abrandava sob suas mãos por inteiro.
Alguns segundos depois, foi baixando as mãos por seu voluptuoso corpo até chegar a barra
da camisola, a levantou brandamente primeiro até os quadris, logo até a cintura, até os
seios e por fim a tirou e pôde vê-la completamente nua frente a seus olhos. Viu-a
estremecer e soube que não era de frio mas sim de calor, um calor ardente que fez que os
mamilos lhe endurecessem. Connor não pôde resistir à tentação de meter um na boca e
logo o outro.
Depois voltou a beijá-la nos lábios… e não pôde acreditar que fosse a primeira vez que se
beijavam. Seus lábios eram suaves, sua boca ardente e suas línguas pareciam entender-se
mediante um baile provocador e incrivelmente prazeiroso para ambos. Só uma breve pausa
para que Connor se livrasse também da roupa. Uma vez nu, abriu as pernas e a puxou até
deitá-la emcima de seu corpo rodeando-a com seus braços.
Quando seus corpos se encontraram pele contra pele, ela se afatou só alguns segundos e o
olhou com olhos alagados de paixão, mas também de confusão. Connor temia por um
momento que ela se desse conta de que o que estavam fazendo era uma loucura, assim
girou sobre a cama até ficar ambos de lado, frente a frente. Agora podia tocar a umidade
entre suas pernas que demonstrava que seu corpo estava preparado para ele. A respiração
entrecortada e os suaves gemidos que saíram de sua boca quando ele a tocou ali
transmitiam a mesma mensagem.
Connor continuou beijando-a pois parecia gostar bastante. Quando começou a ofegar pelo
efeito das carícias e os beijos, Connor se colocou sobre ela sabendo que estava a ponto de
chegar ao mais alto. Foi então quando ela mesma o agarrou pelos quadris e o inundou em
seu corpo, deixando que a enchesse. Ao olhá-la nos olhos viu claramente que não sabia o
que estava a ponto de lhe acontecer.
—Calma —lhe sussurrou—. Deixa que ocorra.
Começou a mover-se dentro dela enquanto notava como seu corpo se enrijecia e se fechava
a seu redor. Também ele estava no limite, mas dessa vez ia esperá-la. Penetrou a mão entre
seus corpos e procurou essa parte dela que a levaria a máxima libertação.
Apenas o tinha roçado quando começou a sentir seus estremecimentos. Seu corpo se
arqueou abaixo do dele e o modo em que seu núcleo se fechou o arrastou também para o
limite do prazer. Ouviu-a gritar no momento que começaram os espasmos e ele se
esvaziava dentro de seu corpo.
Connor caiu rendido sobre ela, mas em seguida a aliviou de seu peso para que ela também
pudesse recuperar o fôlego. Ao deitar-se a seu lado pôs a mão no ventre e sentiu que ainda
continuava tensa, precisava de algo mais, assim colocou a palma da mão sobre o monte de
Vênus e pressionou com os dedos até que voltou a arquear as costas e a estremecer uma e
duas vezes mais. Agora sim completamente esgotada, deitou-se de lado junto a ele.
Jocelyn não podia abrir os olhos, ainda não podia acreditar o que acabava de acontecer.
Seus músculos não pareciam obedecer à mente. Nada poderia havê-la preparado para as
entristecedoras sensações que acabava de experimentar. Os beijos, o toque de seus lábios e
as carícias de sua língua não se parecia com nada que houvesse sentido ou que tivesse
imaginado que poderia sentir algum dia. Nem sequer podia explicar a explosão de prazer
que a tinha invadido.
Por fim compreendia do que falavam as mulheres do povoado com tanto entusiasmo.
Tão pouco importante era para seu marido, que em todos seus encontros anteriores só se
preocupou por sentir ele? Sentia tão pouco apreço por ela, pela mulher com a quem o
tinham obrigado a casar-se, que não tinha querido compartilhar aquela maravilha até
agora. Até que ela o tinha empurrado a fazê-lo.
Jocelyn se levantou e vestiu a camisola que tinha ficado no chão, depois olhou a seu
marido. Nem sequer se tinha dado conta de que estava chorando até que lhe perguntou.
—Lhe machuquei, esposa? —perguntou-lhe ele.
—Preferiria que não me perguntasse isso —respondeu secando a prova de que efetivamente
tinha o poder de lhe machucar—. Se im porta de verdade ?
Fez um breve silêncio antes de que chegasse sua resposta.
—Sim, me importa. Não pretendo te machucar de modo algum.
—Pois sim que me machucou —disse isso ela—. Profundamente, embora me custe admitir.
Jocelyn o olhou por fim fixamente e viu como seu rosto se enrijecia. Como se atrevia a
tratá-la como se não tivesse a menor importância? Como tinha podido permitir que sua
indiferença a privasse de algo tão… tão… incrível? Como marido, era sua obrigação
compartilhar com ela os prazeres da paixão e sabendo que era virgem, deveria haver-se
levado ainda mais a sério tal obrigação.
E entretanto só se incomodou em procurar seu próprio prazer e em fazer só o estritamente
necessário para gerar o filho que tanto necessitava. Seus próprios homens haviam dito que
passava mais tempo na cama com as prostitutas do povoado do que com ela. Também
tinha ouvido que tinha passado a noite inteira com Leana e com outras mulheres do
povoado quando tinha desejado manter relações. Mas com ela se limitava a penetrar em
sua cama no meio da noite, esvaziar-se dentro de seu corpo e partir como um fantasma,
como o marido fantasma que era.
—Mas me diga, de que modo te feri? Foram suas ações as que me convidaram a fazê-lo —
disse assinalando a cama—. Me equivoquei ao acreditar que procurava algo mais do que
temos feito outras vezes? —levantou-se na cama e procurou suas roupas com o olhar—. Me
explique, a que se deve seu mal-estar? —passou-se a mão pelo cabelo como fazia sempre
que estava confuso, depois voltou a olhá-la—. Possivelmente viu Eachann com a prostituta
e desejou experimentar o mesmo ardor?
Jocelyn se ruborizou ao recordar a imagem do soldado nu convexo emcima da prostituta.
Recordou seus gemidos de prazer. Pela segunda vez em um mesmo dia, tinha sido
testemunha da paixão e se viu obrigada a admitir seu fracasso como mulher e como esposa.
Ela jamais havia sentido algo assim; nunca lhe tinha devotado essa classe de prazer.
—Sim, os vi —ia ser sincera embora ele não o fosse com ela, nem na cama nem fora dela—.
E me perguntei por que meu marido me ocultava algo assim.
—É isso o que acha? —foi até ela e, agarrando-a pelos ombros, atraiu-a para si até que
Jocelyn pôde sentir sua respiração—. Quer que te trate como a uma prostituta?
Jocelyn levantou a mão para pagar aquele insulto com uma bofetada, mas ele foi mais
rápido ao impedir-lhe. Então o olhou nos olhos e soube que desejava mais, aquela noite
queria tudo. Seu corpo desejava voltar a sentir o que agora sabia que era possível, mas sua
alma desejava algo mais. Queria a paixão e a atenção que ele tinha escolhido não lhe dar.
—Quero que me trate como a uma esposa.
—É minha esposa.
Para Jocelyn pareceu uma resposta muito pobre até que se fixou em que lhe tremiam as
mãos. Respirou fundo e continuou desafiando-o:
—Por que então jamais quis me mostrar o prazer que podia chegar a sentir?
Connor começou a falar várias vezes sem conseguir de tudo.
—Mas… —disse tentando-o de novo—. Você não gosta de —acrescentou com o cenho
franzido—. Por isso pretendo terminar o quanto antes, para te liberar disso o mais rápido
possível —voltou a passar as mãos pelo cabelo e quando voltou a olhá-la, a confusão se
refletia em seu rosto.
—Queria que acabasse porque até agora não sabia o que era possível entre um homem e
uma mulher —explicou ela com total honestidade—. Ouvi falar disso. Vi…
—O que viu ? O que lhe contaram?
—É difícil não dar-se conta quando vê um homem e a uma mulher beijando-se,
acariciando-se, amando-se —disse encolhendo os braços—. No povoado se fala muito disso
e vi Rurik e a…
—Rurik? O que lhe viu fazer?
—Foi um acidente —explicou como se tivesse sido muito menos do que na realidade tinha
sido—. No bosque perto do povo. Vi ele com uma viúva, estavam… fazendo...
Seu corpo ainda o recordava com total nitidez.
—E ele sabia que estava ali? Maldito viking! Claro que sabia —adivinhou sem esperar para
ouvir sua resposta. Depois voltou a olhá-la—. E as mulheres do povoado falam dessas
coisas diante de você? Não deveriam fazê-lo, você é a esposa do chefe.
Era evidente que tratava de desviar sua atenção de um tema do que não desejava falar. O
modo em que se comportou aquela noite não tinha sido mais que uma momentânea perda
de controle que certamente não ia permitir que se repetisse.
—Boa-noite, senhor —disse ela indo para a porta sem olhá-lo sequer. Já se tinha
humilhado suficiente sendo tão direta com ele, não ia além a lhe suplicar algo que ele não
desejava lhe dar.
—Esposa, não sabe o que me pede… —murmurou com um toque de desespero—. Não é que
não queira… —se deteve e apertou os dentes, como se não quizesse lhe dar aquela
explicação.
—Não sei se não quer ou não pode, mas o resultado é o mesmo —por fim o olhou e ao fazê-
lo viu tanto dor em seus olhos, que a ponto esteve de voltar atrás—. Deixou muito claro
diante de todos que tem uma esposa que não deseja. Se tiver cometido a tolice de acreditar
que as coisas poderiam ser de outro modo entre nós, foi por ignorância e por inocência.
Agora já sei —lhe abriu a porta com o esperança de que saísse.
Ele foi para a saída, mas antes se voltou para olhá-la.
—Jocelyn —começou a dizer, surpreendendo-os a ambos ao chamá-la por seu nome.
Jocelyn se deu conta de que só uma vez a tinha chamado por seu nome, ao apresentá-la ao
clã no dia do casamentos. Muitos outros a chamavam assim, mas ele não. Outro sinal de
seu desprezo.
—Boa-noite, senhor.
Tampouco ela o chamava por seu nome, mas isso era por falta de confiança. Mal esperou a
que cruzasse a soleira para fechar a porta com força.
Uma vez sozinha, Jocelyn se sentiu melhor. Tinha desafiado a seu marido, tinha-lhe
demonstrado que não podia continuar tratando-a assim. E tinha descoberto quão incrível
podia ser o prazer.
Jocelyn apagou o resto das velas que iluminavam o quarto e se meteu na cama. Invadida
pelas lembranças do dia que acabava e pelas novas emoções, fechou os olhos e tratou de
dormir.

Enquanto descia as escadas da torre, Connor se deu conta de que, nas poucas semanas que
tinha casado, tinha quebrado todas as regras que ele mesmo se impôs. Tinha permitido que
se desse uma intimidade que tinha prometido evitar e tinha chegado inclusive a tentar
explicar seu comportamento diante dela. Mas o mais grave era que tinha desejado que ela
o entendesse.
Por fim chegou a seu dormitório e abriu a janela com a esperança de que a brisa o
acalmasse como tinha acalmado a sua esposa. Jocelyn.
Seu nome era Jocelyn.
O nome tinha escapado de sua boca de maneira inconsciente, mas lhe tinha feito bem
pronunciá-lo. Havia-o sentido doce entre seus lábios, como o tinha sido ela entre seus
braços. E forte, como lhe tinha demonstrado ser fazia alguns momentos quando tinha
expressado seu aborrecimento. Um aborrecimento lógico, pois tinha razão em acreditar
que lhe estava dando menos do que merecia como esposa. Mas Connor fazia o que fazia
para proteger-se, nada mais.
Mas o certo era que agora que tinha descoberto o que podia sentir com ela, desejava senti-
lo mais vezes. Não a emoção, a não ser a paixão. Qualquer homem teria desfrutado
sentindo-a desfazer-se em seus braços. Mesmo assim, devia manter o controle.
E devia também realizar outras mudanças tanto no castelo como no povoado. O medo
podia ser útil para defender do inimigo, mas não era assim como queria controlar a seu clã.
Com a decisão de levar a cabo ditas mudanças, Connor se serviu de uma taça de cerveja e
tratou de engolir a dor que lhe provocava saber que isso significava romper com o passado
de maneira irrevogável. E teria que fazê-lo sem ter a seu lado à pessoa com a que tinha
planejado e sonhado tudo aquilo.
Kenna.
Sabia que também devia romper com ela para sempre se queria conseguir seus novos
objetivos. Ninguém se atreveria a nomeá-la diante dele, o qual facilitaria as coisas. A
promessa que lhe tinha feito justo antes de morrer de não revelar a verdade seguiria sendo
tão firme como aquela fatídica noite.
Era provável que Jocelyn lhe desse herdeiros e ocupasse um lugar importante em sua vida,
mas jamais teria seu amor. A morte de Kenna entre seus braços tinha destruído sua
capacidade de voltar a confiar em alguém desse modo. Não, seu coração seria sempre um
terreno proibido para sua nova esposa, por muito que mudassem suas vidas e o clã.
Largou a taça de cerveja antes de meter-se na cama. Tinha muito que fazer e precisava
descansar. Mas, apesar de suas intenções, passou a noite dando voltas sobre o colchão.
Cada vez que fechava os olhos, aparecia ela. Via-a, sentia-a junto a ele, ouvia seus gritos de
prazer ao liberar toda sua paixão. Sua presença naqueles sonhos o deixou atônito pois
esperava Kenna como o resto das noites.
Mas essa noite era Jocelyn.
E isso significava que, embora não deveria ter sido assim, já era parte de sua vida.

Doze

—Bom-dia, Jocelyn.
Sobressaltou-se ao vê-lo, pois não esperava encontrar Rurik atrás da porta do grande salão.
A pobre Cora pôs-se a tremer em apenas ouvir sua voz e Jocelyn a colocou a suas costas
para que não temesse. Aquela manhã, o viking tinha um enorme arranhão na bochecha.
Teria tido outro combate com o senhor?
—Bom-dia, Rurik.
—Poderia falar com você um momento? —perguntou-lhe sem afastar-se de seu caminho—.
A sós, se for possível.
Foi então quando viu uma estranha expressão de inocência em seu rosto que despertou sua
curiosidade.
—Do que se trata? —disse-lhe depois de deixar Cora partir, coisa que a moça sem dúvida
agradeceu.
Ao olhá-lo, Jocelyn não pôde evitar recordar o aspecto daquele corpo nu, em seguida
voltou a centrar-se em seus olhos, mas não o bastante rápido para evitar que lhe
ruborizassem as bochechas.
—Nara está zangada comigo —disse ele por fim com voz baixa e inclinando-se por volta
dela para que ninguém mais pudesse ouvir suas palavras—. Soube de que ontem esteve no
bosque e viu…
Fez uma pausa e sorriu.
—Bom, acredito que já sabe o que viu lá.
Jocelyn abanou a cara com a mão.
—E Nara está zangada? —pensou qual podia ser o propósito daquela conversa além de
envergonhá-la.
—Sim. Diz que não poderá voltar a te olhar à cara até que me tenha desculpado com você.
Diz que deveria ter impedido que nos visse.
Jocelyn não podia acreditar o que tinha diante de si. Aquele duro guerreiro que não temia
nada nem a ninguém, temia a ira de uma mulher!
—E isso é importante para você? —perguntou-lhe.
—Sim, Jocelyn. Nara é importante para mim, embora preferiria que não o dissesse a muita
gente —dessa vez foi ele quem se ruborizou.
—Quando se deu conta de que estava ali?
—Justo antes de que partisse.
—Não pretendia me intrometer em sua intimidade, Rurik. Estava dando um passeio com a
menina e de repente os vi.
—Então aceita minhas desculpas? Posso dizer a Nara que as aceitou?
—Sim, diga que aceito suas desculpas e que tudo ficará esquecido.
—Muito bem —disse com um sorriso, mas antes de afastar-se, Rurik se voltou a olhá-la e
deixou claro que continuava gostando de paquerar com as mulheres—. Espero que não
tenha esquecido tudo o que viu —acrescentou com uma piscada sedutora que teria
derretido a qualquer mulher.
Jocelyn se pôs a rir com vergonha e certo alívio. Mas não queria que saísse ileso, assim que
se aproximou dele e lhe sussurrou ao ouvido:
—O que quer dizer a marca que tem no…? —lhe assinalou ao traseiro, onde recordava ter
visto uma estranha tatuagem.
Rurik levou a mão às nádegas com surpresa, mas logo soltou uma gargalhada tão sonora
que atraiu a atenção de todos os presentes no salão, incluindo a seu marido. Depois lhe pôs
a mão nas costas e lhe deu uma forte palmada que a fez cambalear-se.
—Não está nada mal, Jocelyn. Nada mal.
Aquelas palavras lhe alegraram a alma porque era uma maneira de expressar que a
aceitavam na comunidade. Não só ele, também as mulheres do povoadp, pois Rurik jamais
teria ido falar com ela se Nara não o tivesse pedido, o qual significava que a viúva tinha
uma grande consideração por ela. Ao menos havia alguém que a tinha em conta e a
aceitava.
Foi para a mesa principal do salão com uma confiança em si mesma que não tinha sentido
desde muito tempo. Estava a ponto de sentar-se quando seu marido ficou em pé. Ia
perguntar lhe pela conversa com o Rurik? Repreenderia-a pelo aborrecimento da noite
anterior? Possivelmente simplesmente fosse partir como fazia sempre. Por uma parte,
Jocelyn desejava que fosse isso porque não queria que seu desprezo voltasse a lhe
arrebatar a confiança que sentia. Mas então ele atraiu a atenção de todos os que ocupavam
a mesa principal e os fez levantar-se.
Voltava a ficar sozinha. Nada novo.
Em lugar de partir, Connor esperou a que ela se sentasse e deu ordens para que outros se
sentassem também. Jocelyn olhou para os outros sem compreender, todos eles a saudaram
com um gesto. Mas seu marido fez algo mais que saudá-la, falou-lhe diretamente sem
titubear.
—Bom-dia, esposa.
—Bom-dia —disse ela quase gaguejando.
Em seu rosto não havia seriedade, nem frieza, nem o olhar de desprezo que sempre lhe
dedicava, nada.
Depois continuou com a conversa com outro dos presentes, mas em todo momento parecia
estar pendente do que ela pudesse necessitar; chamou um servo para que lhe servisse a
aveia e mais tarde lhe perguntou se queria mais…
Aquilo era muito estranho.
Discutia com seus homens o melhor modo de alojar a todos aqueles que até então tinham
dormido no castelo. Connor escutou com atenção todas as opiniões e sugestões que lhe
faziam. Dougal estava ali também, mas mal falou, só observava sem perder detalhe.
Finalmente o chefe do clã se despediu de todos os com um gesto e se voltou para ela.
—O que queria Rurik? —perguntou-lhe—. Estava lhe incomodando?
—Não, pediu-me desculpas por… —vacilou pois não sabia como explicar-se—. Por não me
haver avisado ontem no bosque.
—E as aceitou? —aquela estranha calma em sua voz começava a pô-la nervosa.
—Sim. Nara lhe tinha pedido que falasse comigo e ela parece ser importante para ele,
assim não vi razão para me negar.
—Falei com Murdoch, o de ontem à noite não voltará a se repetir.
Jocelyn o olhou sem compreender. A noite anterior tinham ocorrido tantas coisas que não
sabia a qual delas se referia. Estaria falando de seu comportamento no quarto? Mas, por
que implicar a seu ajudante em um assunto tão pessoal?
—O de… ontem à noite? —perguntou.
—Leana e as demais não voltarão a trabalhar dentro do castelo nem em seus arredores.
—Ah —voltaram a ruborizar-se as bochechas—. Obrigado… não queria voltar a vê-lo… aqui.
Se aquele ia ser seu lar, e não tinha intenção de partir, alegrava-se de que seu marido
tivesse dado tal passo.
Connor ficou em pé, mas antes de partir começou a falar:
—Preferiria conversar esta noite, em particular, mas suponho que não serei bem recebido
em seus aposentos.
Jocelyn o olhou, estupefata, sem saber o que responder. Balbuciou alguns sons, mas
nenhum com significado, assim continuou falando ele:
—Depois do modo em que me mandou embora ontem à noite, não quero me apresentar
sem avisar.
—Está em seu direito de fazê-lo —foi o que lhe ocorreu dizer.
—Sei, Jocelyn. Mas não se trata disso, mas sim de que serei bem recebido —baixou a voz
para que ninguém pudesse ouvi-lo.
Havia voltado a chamá-la por seu nome. Parecia-lhe tão estranho ouvi-lo dizer, que o olhou
à boca. Isso lhe fez recordar o que podia fazer com essa boca e de repente sentiu um
tremendo calor.
O que devia lhe dizer? Não o tinha rechaçado quando tinha temido por sua vida estando a
seu lado, como poderia fazê-lo agora, que já tinha decidido que não ia partir? Como
poderia rechaçá-lo agora que sabia o prazer que podia chegar a lhe dar? Continuava
zangada com ele por havê-la tratado com tanto desprezo, mas já tinha decidido que ia fazer
seu lugar ali com ou sem sua ajuda.
—Sim, será bem recebido —o aceitaria em sua cama até sabendo que nunca haveria nada
mais.
Ao olhá-lo para ver sua reação, Jocelyn descobriu em seu rosto o primeiro sorriso de
verdade que tinha visto nele.
—Muito bem, Jocelyn —repetiu seu nome como se estivesse tratando de decidir se gostava
de utilizá-lo—. Ali estarei.
Então partiu e Jocelyn voltou para seus aposentos, mas durante o resto do dia, sentiu uma
estranha impaciência para que chegasse a noite. Possivelmente tivesse interpretado mal as
palavras de seu marido. Descobriria-o de noite.
E o descobriu.
Aquela noite e as seguintes.
Connor levou a sério seu papel de tutor nas artes amorosas e cada noite ela descobriu algo
novo.
A primeira lhe ensinou que se podia agüentar muito essa tensão interior e que, ao fazê-lo, a
liberação e portanto o prazer eram maiores.
A segunda noite a instruiu na arte das carícias e nos efeitos que podiam ter em ambos.
A terceira noite lhe demonstrou a importância de saber montar e como controlar o ritmo
dos movimentos e o prazer podia ser ainda maior.
A quarta noite a ensinou a utilizar a boca para algo que não fosse falar ou comer. Depois
daquilo, Jocelyn não voltaria a ver o suco das frutas com os mesmos olhos.
Mas foi a quinta noite quando aprendeu a lição que jamais esqueceria.
Apesar de seu comportamento com ela no dormitório, do prazer e das risadas que
compartilhavam cada noite, a chegada do dia sempre voltava a lhe mostrar a dura
realidade de seu matrimônio. Qualquer indício de intimidade desaparecia com a saída do
sol. Jocelyn não compreendia aquela necessidade de Connor de trancar-se em si mesmo e
não deixá-la aproximar-se salvo para compartilhar esse prazer que agora era como uma
droga para ela. Sempre com a esperança de que as coisas mudassem, Jocelyn não viu os
sinais que demonstravam do que compartilhavam era a paixão.
Até o quinto dia, quando chegou um mensageiro dos MacCallum com a notícia da morte de
sua mãe.

—Queria me ver, Duncan? —perguntou Jocelyn ao entrar no grande salão.


Um servo tinha ido ao povoadoo em sua busca para lhe dizer que Duncan queria vê-la.
Assim que entrou, reconheceu ao homem que estava junto a Duncan, era um criado de seu
pai chamado William. Ambos a olhavam com gesto sombrio.
—Jocelyn, Connor não está aqui, mas enviei a alguém em sua busca.
—O que aconteceu, Duncan? William, que notícias traz de minha casa… de meus pais? —
corrigiu em seguida.
—Senhora, devo esperar à chegada de MacLerie —afirmou o criado com insisitência.
Jocelyn o aceitou com resignação. Passaram muitos minutos sem que ninguém dissesse
nada, os três esperavam sentados, com o olhar perdido no chão e com evidente
impaciência no caso de Jocelyn.
Alguns ruídos anunciaram então a chegada de cavalos. Por fim saberia da notícia… A porta
se abriu, mas foi Rurik quem apareceu.
—O senhor vai atrasar se, Duncan —anunciou o viking—. Mas diz que deve se encarregar
de qualquer assunto que necessitem os MacCallum.
—O que o retém? —perguntou Jocelyn.
—Um de seus homens está ferido. Foi durante um treinamento.
—Bom, William, já ouviu, Duncan atenderá o assunto em nome de MacLerie. Já pode falar
—ordenou Jocelyn.
—Os MacCallum enviam saudações para MacLerie e lady Jocelyn —começou a dizer
dirigindo-se a ela—. E lamentam comunicar que Lilidth MacGregor morreu a semana
passada.
Jocelyn moveu a cabeça, segura de que tinha ouvido mau.
—O que disse, William? —não podia ser, tinha que ser um engano.
—A… senhora faleceu faz alguns dias —repetiu o criado olhando para Duncan dessa vez.
—Sinto muito, Jocelyn —sussurrou Duncan fazendo William sair.
—Espere —disse ela, antes de que pudesse partir—. Está morta?
Não o compreendia. Era verdade que tinha estado doente, mas não tinha acreditado que
fosse nada sério.
—Quem é Lilidth MacGregor? —perguntou Rurik.
—Lady MacCallum —respondeu Duncan secamente.
Jocelyn olhou para Duncan e logo para Rurik. Não podia ser verdade, o mensageiro devia
haver-se equivocado, possivelmente tinha piorado, mas não podia ter morrido.
—Jocelyn, sinto muito que sua mãe tenha morrido —começou a dizer Rurik com uma voz
profunda que fez que os olhos de Jocelyn se enchessem de lágrimas. Tanta ternura de um
homem tão duro… que além disso era um desconhecido para ela.
—Vi como a enterravam antes de partir para lhe trazer a notícia, senhora.
Tudo começou a dar voltas a seu redor.
—E meu pai? E Athdar?
—Estão todos bem se é que se pode esperar nesta situação.
A lástima invadiu os rostos de todos os presentes. Duncan e Rurik trocaram um olhar de
pesar.
Sua mãe estava morta.
Sentia que os muros do salão se curvavam para ela e o chão também parecia estar cada vez
mais perto. Na distância ouviu o grito de advertência de uma mulher, um grito que se
prolongou interminavelmente enquanto a escuridão invadia tudo.

Treze

Continuava chovendo.
Tinham passado seis dias desde a chegada do mensageiro com a notícia e ainda continuava
chovendo. Os primeiros dois dias, Connor tinha pensado que era algo bom, pois com tão
mal tempo Jocelyn não insistia em ir ao povoado e assim podia descansar. Mas depois de
quatro dias mais, durante os que se negou a sair de seus aposentos, soube que não era nada
bom.
Era como se o céu mesmo estivesse de luto. O ambiente cinza era o mesmo que se via nos
habitantes de Lairig Dubh. Todos eles continuaram trabalhando como podiam para
preparar-se para a colheita, mas a ira com que o olhavam não desaparecia de seus rostos.
Tinham ouvido a história de que a mãe de sua esposa tinha morrido, ela tinha desmaiado
no salão e ele tinha preferido ficar com seus homens em lugar de ficar a seu lado, e todos a
tinham acreditado. Quando o padre tinha celebrado a missa pela alma de lady MacCallum,
o chefe do clã não tinha aparecido. Igual no passado, sua gente tinha preferido pensar o
pior dele.
—A senhora não vai levantar- se, senhor.
Ailsa foi a primeira que rompeu sua solidão aquela manhã, depois de um amanhecer no
que o sol não parecia ter saído.
—Ainda é cedo, Ailsa. Deixemos que descanse —ouviu o que ela balbuciou entre dentes, o
qual sem dúvida tinha sido sua intenção.
—Já falou com ela, senhor? —perguntou-lhe em tom acusador.
—Não queria incomodá-la enquanto descansa.
Outro juramento o bastante alto como para que o ouvisse.
—Está sofrendo muito, senhor —lhe disse então a criada.
—Não há nada que eu possa fazer para evitar tal dor. Só o tempo poderá curá-la.
Dessa vez, Ailsa se limitou a olhá-lo com a cabeça muito alta e os braços cruzados sobre o
peito, sem dizer uma palavra enquanto a chuva caía sobre eles no alto das almenas.
Connor se tinha informado do estado de sua esposa. Rurik lhe havia dito que tinham feito
chamar a Ailsa para que a cuidasse. Assim não havia necessidade de que voltasse para seu
lado como se estivesse tão apaixonado que não pudesse estar sem ela. Não, só necessitava
tempo para superar o golpe e ele não desejava dar um passado do que logo não poderia
retrair-se. Se estivesse com ela, a consolaria e fazia tudo o que se esperava de um marido
carinhoso, eliminaria a distância que havia entre eles, uma distância que queria respeitar.
—Poderia fazer mais —disse Ailsa—. Se não pode dar o que ela necessita, possivelmente
outro possa.
Connor olhou à velha criada depois de minutos fugindo de seus olhos.
—O que quer dizer? Ela é minha esposa.
—Então trate-a como tal. E não só no dormitório. Se este for seu lar, faça que de verdade o
seja.
—Como sabe tanto alguém que jamais foi a esposa de nenhum homem? —soube que se
excedeu no momento em que aquelas palavras saíram de sua boca.
—Tem muita ira dentro de si, senhor, e até que não se liberte, não poderá curar-se nem
voltar a ser feliz.
—Ailsa, não… —levantou uma mão para detê-la, pois não tinha direito a lhe falar do
passado.
—Lady Jocelyn não tem a culpa do que ocorreu com Kenna; não deveria ser o objetivo de
sua ira.
—Foi muito longe, mulher —deu um passo para ela enquanto a chuva caía sobre eles.
—Fosse o que fosse o que ocorreu entre você e Kenna, ou o que não ocorreu, já não
importa, Connor. Esta mulher é como um presente, alguém que poderia ajudá-lo a
esquecer…
—Nunca esquecerei Kenna.
—Então possivelmente possa perdoá-la e perdoar-se a si mesmo. Libertar-se de toda essa
ira antes de que destrua a uma mulher inocente.
—Vá embora! —gritou-lhe. Como tinha o descaramento de lhe falar do passado? Ninguém
o tinha feito jamais. Ninguém.
—Como desejar, senhor.
Ailsa baixou a cabeça e se retirou, mas tinha conseguido o que pretendia. Connor sentia os
golpes como se os tivesse ocasionado um braço em lugar daquelas palavras. Esperou até
que tivesse desaparecido antes de levantar o rosto para o céu e deixar que a chuva lhe
molhasse a cara. Haveria um modo de desfazer-se da raiva que sentia? Poderia de verdade
afastar do passado e começar de novo?
Passaram vários minutos, então ouviu passos que se aproximavam, passos de homem.
—Connor, preciso falar com você —lhe disse Duncan a suas costas.
—Agora não —não estava de humor para falar, mas seus desejos não importavam.
—Ouvi que Jocelyn tampouco saiu de seu quarto esta manhã.
—Duncan, não tem por que preocupar-se por minha esposa.
—Tenho uma sugestão para fazer e eu gostaria que o pensasse.
—Parece-me que não vou gostar.
—Provavelmente não, mas pensa nisso pelo bem de todos.
Duncan sempre lhe propunha idéias bastante acertadas e, embora sabia que aquela em
particular não seria de seu agrado, devia escutá-lo, o devia.
—Jocelyn tem muito tempo livre, mas ninguém com quem compartilhá-lo à exceção da
gente do povoado.
—Eu tenho muitas obrigações, Duncan… —protestou assim que pôde.
—Não estava pensando em você. Precisa ter outras mulheres perto, tanto para que lhe
façam companhia como para que lhe sirvam de conselheiras.
Outras mulheres? Era certo que Jocelyn passava muito tempo no povoado e, embora não
era ruim de por si, não seria o mais adequado para a esposa de um conde. Se lhe
concediam o título nos próximos meses, receberia a visita de muitos emissários do rei.
—E tem a alguém em mente? —perguntou a sua primo.
—Acredito que sua tia seria uma boa ajuda para começar.
Connor soltou uma gargalhada. Sabia que a esposa de Dougal estava desejando ir ao
castelo e poder conhecer Jocelyn, mas tinha estado atrasando o momento de convidá-la,
ou de lhe dar permissão para que fosse.
—Jean seria o que faltava para que minha esposa tirasse de uma vez por todas o gênio que
tem.
—Pensei que poderia lhe pedir que trouxesse Rhona.
—Rhona? Não a vejo há…
—Três anos —completou Duncan—. Estava acostumado a dizer que era de grande ajuda
para Kenna.
Connor pensou em sua prima Rhona, tinha-os visitado depois da morte de seu marido e
tinha exercido uma magnífica influência sobre Kenna durante momentos muito difíceis.
Quando cada mês de espera resultava em uma nova decepção, Rhona sempre tinha tido
uma palavra amável e tinha servido de força tranqüilizadora e de apóio para sua esposa.
Partiu pouco depois da morte de Kenna e Connor não havia voltado a vê-la após.
—Era. Fazia muito tempo que não pensava nela. Continua solteira? —possivelmente a idéia
de Duncan não fosse tão má.
—Isso diz minha mãe. Rhona rechaçou a todos os possíveis maridos que tentaram lhe
buscar.
Rhona poderia ser uma boa ajuda para Jocelyn e sua presença não seria tão cansativo
como podia chegar a ser o de sua tia… como o era quase sempre. Mas, não seria também
um aviso constante do passado? Sim, mas com ela atendendo a sua esposa, Connor não
teria que preocupar-se mais e poderia as evitar a maioria do tempo. O importante era que
nunca falasse com Jocelyn sobre Kenna.
—Muito bem, lhe mande um convite com Dougal para que venha a Broch Dubh para
conhecer minha esposa —disse Connor com um sorriso.
—Não acha que deveria perguntar a Jocelyn antes as convidar formalmente?
—Jocelyn não se encontra em condições de decidir, Duncan, mas se alegrará quando
souber que o tenho feito por seu bem —acrescentou lhe dando uma palmada no ombro a
sua primo e começando andar para a escada para descer para tomar o café da manhã.
Demorariam uma semana em receber o convite e fazer a viagem até lá, enquanto, teria que
mandar que preparassem as habitações necessárias e necessitaria também mais servos.
Voltaram para salão e se sentaram para tomar o café da manhã. Então se lembrou de
Jocelyn.
Acostumou-se a tomar o café da manhã a seu lado e essas últimas manhãs a tinha sentido
falta. Desde que tinham começado a compartilhar e a desfrutar de juntos da paixão depois
da discussão que tinham tido, Connor gostava de vê-la chegar pelas manhãs e que se
ruborizasse ao vê-lo. Ambos sabiam que naquele momento pensava no acontecido no
dormitório na noite anterior. Sua esposa era ainda muito inocente em nesses assuntos e
Connor estava desfrutando enormemente com seu papel de marido e mentor.
Agora, vendo seu lugar vazio e com o salão em silêncio, sentia falta. Possivelmente por isso
decidiu visitá-la antes de partir essa manhã. Assim poderia lhe dar a notícia da chegada de
sua tia e sua prima.
Encontrou Cora com a orelha grudada à porta fechada de seus aposentos.
—Não deveria estar atendendo à senhora em lugar de escutar às escondidas? —perguntou-
lhe. A garota se sobressaltou ao ouvir sua voz—. Tranqüila, moça. Tem que superar esse
medo que tem a toda a hora. Já está acordada a senhora?
Cora teve que engolir em seco várias vezes antes de ser capaz de falar.
—Sim, senhor. Ailsa a obrigou a levantar-se.
—Que a obrigou? —Connor pôs a mão na porta para abrir, mas a moça o agarrou por braço.
—Ailsa disse que precisava estar a sós uns momentos com a senhora.
O rosto de preocupação da donzela e o fato de que se atreveu a detê-lo bastaram para que
Connor não insistisse. Parecia muito protetora com Jocelyn.
—Então suponho que esperarei.
Aproximou-se da janela da escada e a abriu. Continuava chovendo, mas viu algo diferente;
um grupo de mulheres, umas vinte, estavam cruzando o pátio do castelo para a torre.
Reconheceu Margaret, Siusan e a algumas outras. Tinha dado um passo para o primeiro
degrau da escada quando se abriu a porta do dormitório e Ailsa o chamou. Abaixo estavam
Duncan e Murdoch para encarregar-se de tudo, assim entrou. Ailsa lhe sussurrou que
voltaria mais tarde e partiu deixando-o ali.
Fazia muito calor e entretanto encontrou a sua esposa sentada junto ao fogo.
—Jocelyn? —disse-lhe com voz trêmula—. Como se encontra? —ao ver que não respondia,
aproximou-se mais a ela—. Está bem, esposa?
—Tenho frio. Parece que não consigo me aquecer —respondeu por fim com um sussurro
apenas audível.
Se lhe surpreendeu a debilidade de sua voz, mais o fez seu aspecto. Tinha a pele tão pálida
como um fantasma e o olhar perdido. Agachou-se a seu lado e lhe tocou a mão. Estava
gelada.
—Como pode ter tão frio? —disse enquanto lhe subia bem as mantas nas que estava
envolta. Jocelyn não respondeu, só recebeu seus cuidados sem mover-se.
Connor viu uma bandeja de comida junto à cama, estava intacta. Além disso do prato,
havia uma taça de vinho ainda quente.
—Quer um gole? Está quente, possivelmente te aqueça.
Pensou que ia rechaçá-lo, mas assentiu levemente e deixou que lhe pusesse a taça nos
lábios. Só deu um pequeno gole antes de retirar a cara.
—Não quero mais —olhou a seu redor como se acabasse de dar-se conta de que estavam
sozinhos—. E Ailsa?
—Desceu um momento, mas virá em seguida.
Jocelyn voltou a perder o olhar nas chamas. Connor não sabia o que dizer e isso o
incomodava. Qualquer frase de condolência conduziria a algo mais que não desejava, assim
teria que esperar até que retornasse Ailsa.
—Minha tia, a esposa de Dougal, virá em breve.
Não houve resposta.
—E minha prima, Rhona.
—Temo, senhor, que não serei muito boa anfitriã.
Naquele momento Connor se deu conta de que nunca o chamava por seu nome. Sempre se
referia a ele como «senhor» ou «marido», e entretanto a maior parte dos membros de seu
clã o chamavam Connor ou Conn. Estaria tentando manter-se afastada dele como ele fazia
com ela? A idéia lhe provocou um calafrio. Sem dúvida ela tinha desejado aquele
matrimônio ainda menos que ele.
Teria havido outro homem? Recordava ter ouvido falar com Duncan sobre a possível
existência de um compromisso anterior, mas isso tinha sido antes de ir negociar com seu
pai. Já nada disso importava, agora era sua esposa e de ninguém mais.
—Não vêm de visita, Jocelyn. São parte da família e ficarão algum tempo —procurou um
pouco de interesse em seu rosto para ouvir aquilo, mas não o encontrou.
—Como desejar.
A notícia não teve o resultado esperado. Jocelyn estava pior do que tinha acreditado e não
pôde evitar perguntar-se quanto tempo demoraria para recuperar-se da perda. Sua mãe
tinha morrido sendo ele muito menino e não tinha estado presente quando tinha morrido
seu pai, assim não tinha nenhum conselho que lhe oferecer. Entretanto, ao olhar à mulher
que tão somente alguns dias antes lhe tinha dado sorrisos e doçura, desejou poder lhe dizer
algo. Lutou contra o impulso de aproximar-se e abraçá-la. Deu um passo para ela, mas se
deteve o ouvir que se abria a porta.
—Senhora, vieram vê-la algumas mulheres do povoado —anunciou Ailsa ao entrar—.
Esperam lá embaixo.
—Ailsa, Jocelyn está… —o olhar da criada o interrompeu.
—Margaret trouxe a pequena e Siusan quer lhe perguntar algumas coisas sobre alguns
pontos que lhe ensinou —acrescentou indo para ela para ajudá-la a levantar-se.
Connor em seguida se deu conta de que Ailsa tinha tido algo que ver com a visita das
mulheres.
—Não estou preparada… —sua voz era tão fraca como seu aspecto e Connor soube que não
teria forças suficientes para descer sozinha.
—Eu te levarei —não lhe deu tempo para que protestasse antes de levantá-la em seus
braços—. Só ficará alguns minutos, depois eu mesmo voltarei a te trazer.
Sentia-a tão frágil em seus braços, como se fosse se quebrar a qualquer momento. Levou-a
até o salão e daí a uma sala contigüa que tinha pertencido a sua mãe e depois a sua esposa.
Ailsa colocou uns almofadões em uma cadeira junto à grande chaminé que dominava uma
das paredes. Uma vez Jocelyn esteve sentada, fizeram chamar as mulheres do povoado.
A primeira que entrou foi Margaret. Ao ver sua meio-irmã atravessar a sala, Connor
pensou uma vez mais que se parecia com seu pai; tinha herdado a cor dos olhos e da pele.
Ele, o caráter e o sobrenome.
—Margaret, tem bom aspecto —lhe disse sabendo que o resto de mulheres os observavam
com tensão.
—Você também, Connor. Sou bem-vinda aqui? —perguntou ela.
As mulheres sabiam que Margaret não havia voltado a pôr um pé no castelo desde menina.
Sua mãe lhe tinha proibido a entrada quando se conheceu a relação de Ailsa com seu pai.
Ailsa tinha contínuado vivendo no povoado e recebendo as assíduas visitas de seu pai.
—Claro que é, não é assim, marido? —interveio a voz débil de Jocelyn.
Pelo modo em que Ailsa o olhou, Connor soube que sua esposa não sabia de quem
Margaret era filha.
—Todos os MacLerie são bem-vindos aqui, senhora —disse ele olhando a Jocelyn—.
Embora antes não fossem.
Margaret se aproximou de sua mulher e lhe disse algo que a fez sorrir; foi um tênue
sorriso, mas certamente era primeira da notícia da morte de sua mãe. As outras mulheres
se aproximaram também e lhe falaram em voz muito baixa.
Connor se deu conta de que era o momento de deixá-las sozinhas.
—Ailsa, me avise quando a senhora queira voltar para o seu quarto.
Mal tinha atravessado a soleira da porta quando ouviu a voz de Ailsa:
—Senhora, nos fale de sua mãe.
Acaso estava louca? Como lhe ocorria lhe pedir algo que lhe provocaria tanto dor? Jocelyn
estava muito fraca para enfrentar isso, Connor se deu meia volta para voltar a entrar, mas
então ouviu a resposta de sua esposa:
—A minha mãe adorava dançar… adorava a música e quando a ouvia não podia resistir —o
pranto lhe impediu de continuar falando.
Ninguém falou enquanto ela chorava, mas Connor mal podia agüentar a vontade de ir a seu
lado.
—Qual era sua canção preferida? —perguntou então Margaret, ao mesmo tempo que a
agarrava pela mão.
Jocelyn secou as lágrimas e assentiu. Então começou a cantarolar uma melodia e alguns
segundos depois sussurrou a letra também. As outras mulheres não demoraram para unir-
se ao reconhecer a canção. Logo todas estavam cantando em uníssono.
Connor observou a cena com o coração encolhido de tristeza por Jocelyn. Seu pranto o
comovia mais do que queria admitir. O que tinha achava uma crueldade tinha sido na
realidade a melhor maneira de ajudá-la a confrontar sua dor.
Pensava partir, mas depois da canção seguiram as perguntas e de repente se deu conta de
que não podia deixar de escutar a sua esposa falando de sua mãe, de sua família, de sua
infância e de muito mais. Nesses minutos descobriu mais coisas dela que em todo o tempo
que tinham casados.
Alegrou-se de que sua meio-irmã e Ailsa estivessem ali para ajudá-la e lhe dar o apoio que
tanto necessitava.
Os seguintes dias passaram devagar, mas Jocelyn não continuou trancada em seus
aposentos. Ailsa dizia que comia mais, mas ele continuava vendo-a muito fraca. As
mulheres foram vê-la todas as manhãs, almoçavam com ela e depois partiam a fazer suas
tarefas.
Uma noite Jocelyn lhe pediu que fosse visitá-la e Connor obedeceu. Ela o abraçou com
desespero e ele ficou em sua cama mais do que o usual, a ela não pareceu se importar.
Dessa vez Connor esperou que dormisse para sair de seu dormitório.
Parecia tomar forças de cada tarefa que fazia, por isso Connor pediu a Murdoch que a
implicasse nos preparativos para a chegada de sua tia. Fez só para ajudá-la a retomar suas
atividades, não porque lhe alegrasse o coração cada vez que a via sorrir. Não o fez porque
quisesse que ela ocupasse um lugar importante em sua vida.
E certamente, não o fez porque lhe importasse.

Quatorze

—O que quer desta vez, Murdoch? —perguntou Jocelyn abrindo a porta.


Efetivamente, era o chefe do serviço o que se encontrava ao outro lado.
—Senhora, queria lhe perguntar sua opinião sobre os quartos para a tia e a prima do
senhor.
—Estou certa de que está tudo em ordem.
—Não quereria vir às ver?
—O senhor não quer que me intrometa em seu trabalho.
Já o havia dito. Essa era a verdade. Embora seu marido tinha estado muito mais amável
nos últimos dias, não tinha mudado de opinião sobre o lugar que ocupava ela no castelo.
Murdoch era o responsável pelo funcionamento da residência e ela devia manter-se à
margem.
—Mas se eu lhe peço opinião, não será nenhuma intromissão, não lhe parece, senhora?
—Está bem —respondeu Jocelyn com resignação, apesar de que não queria fazer nada que
perturbasse a paz que reinava entre seu marido e ela ultimamente e que tanto tinha
chegado a desfrutar.
Já no andar de baixo, Murdoch lhe mostrou o dormitório que, conforme disse, tinham
preparado para Jean e Dougal.
—Dougal e Jean compartilham o quarto? —perguntou ela com surpresa.
—Sempre o fazem —respondeu o servo dirigindo-se ao quarto que ocuparia Rhona e que se
encontrava na mesma torre que os aposentos de seu marido.
Jocelyn nunca tinha visitado o quarto do chefe do clã e se perguntava se seria como o seu
ou maior. Como seria sua cama?
—Olhe por onde anda, Jocelyn, ou acabará caindo —lhe disse Rurik agarrando-a pelo
braço e impedindo que fizesse isso precisamente.
—Obrigado, Rurik —respondeu ela com um sorriso a suas bruscas maneiras de sempre.
—O que faz aqui? Se procura Connor, está nos estábulos.
—Estamos comprovando que tudo esteja em ordem nos quartos que utilizarão Jean e
Rhona em sua visita… enquanto estejam aqui —disse recordando as palavras de seu
marido, embora continuava pensando que era estranho que fossem ficar ali depois de
quase três anos sem visitar o castelo.
—Esta quarto é um pouco pequeno para Dougal e Jean —comentou Rurik vendo a
habitação que tinha a porta aberta.
—Não, esta é a de Rhona. A de Dougal e Jean é a debaixo da minha, espero que seja o
bastante grande.
Embora seus pais também tinham compartilhado aposentos e também o faziam Dougal e
Jean, seu marido e ela entretanto não.
Jocelyn se fixou então no olhar que trocavam ambos os homens.
—Tem algo de errado nesse quarto? —perguntou.
—É a mesma que ocupou da última vez —explicou Murdoch.
—Da última vez? Quando foi isso?
—Antes —responderam ao uníssono, com certa culpa.
Ah, antes de que a primeira esposa do senhor morresse.
—E haverá algum problema em que volte a ocupá-la desta vez?
Murdoch lhe tinha assegurado que o acidente tinha tido lugar na torre central, ali todas os
quartos se utilizavam agora como depósito.
—Não acredito, senhora —respondeu o servo gaguejando.
—Queria me perguntar algo mais, ou posso voltar para meus aposentos?
—Faz um dia lindo, Jocelyn. Gostaria de dar um passeio? —perguntou-lhe Rurik—. Poderia
te contar um par de coisas de Jean, se quiser.
Jocelyn tinha notado uma espécie de conspiração destinada a mantê-la afastada de seu
dormitório. Tinha começado no dia anterior e havia muitos que pareciam formar parte
dela. Rurik também. Possivelmente seu marido estivesse por trás de tudo aquilo.
—Estou cansada, Rurik, embora te agradeço o convite. Mas eu gostaria de descansar.
—Já poderá descansar quando estiver morta, Jocelyn —balbuciou Rurik com a suavidade
que lhe caracterizava—. O inverno está a ponto de chegar e este tempo não durará —
acrescentou com evidente satisfação. Depois olhou para Murdoch e assentiu. Grande
equipe formavam.
—Quando estiver morta? —repetiu Jocelyn fingindo estar ofendida.
—Por Odín… queria dizer… —ficou pálido de repente—. Não pretendia te fazer pensar em
sua mãe. Connor me matará se souber que te incomodei — passou a mão pela cabeça e
depois pelo pescoço.
—Rurik! —repreendeu-o Murdoch. Então, efetivamente, seu marido estava por trás de
tudo aquilo.
—Acompanharei a seu quarto, se está cansada.
Foi o chefe do clã e não Rurik que fez o oferecimento e o fez com um sorriso nos lábios.
Rurik e Murdoch se retiraram rapidamente.
—Disse alguma coisa? —perguntou ela—. Ou está acontecendo algo estranho?
—Ailsa me disse que come e dorme melhor desde que começou a ajudar Murdoch com os
preparativos. Pensei que seria boa idéia te animar a fazer coisas necessárias no castelo.
Era um gesto muito amável… e inesperado, especialmente procedendo dele.
—Por que? —perguntou ela.
—Porque é o que se deve fazer; ajudar a alguém quando o necessita.
—Obrigado por sua consideração —esperava outro tipo de resposta, mas já deveria saber
que seu marido a via como a qualquer outro membro do clã.
—Tenho que passar por meu quarto um momento, espere-me aqui para que depois
acompanhe ào seu?
—Não é necessário que me acompanhe, estou perfeitamente bem para ir sozinha. Poderia
subir com você?
A petição o surpreendeu, mas não demorou para assentir. Estendeu-lhe a mão e começou a
caminhar adaptando o passo a ela, que ainda estava um pouco fraca.
A primeira coisa que viu ao abrir a porta foi a Chaminé e, frente a ela, a cama.
A cama dele.
Era como ele, alta, forte e sem nenhum tipo de adorno. Não era de se admirar que
abandonasse o seu para voltar para aquela sempre que a visitava. Jocelyn não se deu conta
de que havia dito aquelas palavras em voz alta até que ele a olhou e pôs-se a rir.
—É mais cômoda que o seu, sim. Prove-o se quiser, Jocelyn.
Sem esperar uma resposta, levantou-a nos braços e a sentou no centro do enorme leito.
Depois foi para a cômoda e procurou algo nas gavetas. Possivelmente pudesse lhe
perguntar algo que levava lhe rondando a cabeça há vários dias.
—Por que não me contou sobre Margaret?
Demorou alguns segundos em virar-se para olhá-la e responder.
—Não é que lhe ocultasse isso, simplesmente não pensei nisso. Não é nenhum segredo que
Margaret e eu tenhamos o mesmo pai, nem no povoado nem para o clã.
—Ninguém me havia isso dito.
—Jocelyn, asseguro que ninguém te ocultava nada. O que vai perguntar agora? Se minha
mãe sabia? Sim. Se meu pai assumiu sua responsabilidade? Sim, deu a Ailsa e a sua filha
todo o necessário e se encarregou de procurar um marido apropriado para Margaret
quando chegou o momento.
—Diz como se minha curiosidade não fosse normal, senhor —protestou ela.
—Connor. Meu nome é Connor e eu gostaria que me chamasse assim —lhe disse com
repentina irritação—. Poderá dizê-lo? —perguntou-lhe com o olhar cravado em seus olhos.
Jocelyn começava a sentir-se incômoda, assim foi até a beira da cama para se retirar.
—Não pretendia te faltar ao respeito —assegurou ela baixando a vista ao chão.
—Use meu nome e responderei a tudo o que queira me perguntar.
Por que era tão importante para ele? Desde que se tinha dado conta de que nunca a tinha
ouvido pronunciar seu nome, não tinha podido deixar de pensar nisso. Queria ouvi-lo sair
de seus lábios. Queria ouvir-lhe quando gemesse de prazer entre seus braços. Sabia que
começava a ser uma obsessão. Perguntaria-lhe algo que ele não queria responder,
deixando-o envergonhado se negasse a fazê-lo?
—Connor —disse por fim em um sussurro.
Seu corpo reagiu imediatamente ao ouvi-lo. Sua voz soava tão sensual… tão sexual. Connor
tentou não deixar-se levar por tão primária reação, mas seu corpo era mais forte.
—Sim? —aproximou-se dela e lhe abriu as pernas para colocar-se de pé entre elas. Ela não
o impediu—. Agora pode perguntar.
—Ailsa foi sua babá?
Muito fácil de responder.
—Sim. Tinha dado a luz um bebê que morreu pouco antes de que eu nascesse, por isso a
trouxeram como babá —podia ver em seus olhos como seu cérebro procurava a maneira de
formular as seguintes pergunta.
—Connor? —continuava havendo certa insegurança em sua voz ao dizê-lo.
—Me diga, Jocelyn —lhe passou as mãos pela parte interna das coxas, por cima do vestido,
detendo-se no lugar onde se uniam, mas sem tocá-la intimamente. Ainda não.
—O bebê que morreu, também era de seu pai? —a respiração entrecortada demonstrava
sua reação às carícias.
—Sim —ia fazer que se esforçasse um pouco mais por conseguir a informação que
procurava.
—Não é justo, senhor —protestou enquanto lhe levantava lentamente o vestido até poder
tocar a pele de suas pernas. Tinha adivinhado que estava desfrutando do jogo—. Connor,
como se converteu Ailsa na amante de seu pai?
—Como de costume. Uma mulher bela atrai a atenção do lorde —sussurrou enquanto
penetrava a mão no lugar que esperava estivesse úmido. Estava—. Uma carícia… depois um
beijo —lhe roçou o pescoço com a boca enquanto sua mão se deleitava do úmido calor de
seu sexo.
Depois de um instante já não agüentou mais e a levantou para colocá-la no centro da cama
e deitar-se sobre ela.
—Um encontro furtivo… —continuou sussurrando enquanto ele também levantava a
túnica.
Quando ela puxou seu corpo obrigando-o a inundar-se onde tanto desejava, Connor
perdeu o controle. Beijou-a na boca apaixonadamente, acariciou seus lábios com a língua
enquanto entrava em sua umidade. Jocelyn o apertava com força e se movia seguindo seu
ritmo, ansiosa por encontrar o prazer junto a ele.
—Connor —sussurrou ela lhe dando de presente o som de seu nome.
Penetrou as mãos sob suas nádegas e lhe levantou os quadris para poder entrar no mais
fundo de seu corpo e desfazer-se dentro dela. Ela se derreteu entre seus braços com um
gemido interminável. Ele não a soltou nem mesmo depois de que seu corpo se relaxou.
—Assim que este era seu plano desde o começo —lhe perguntou ela quando, minutos mais
tarde, ele se deitou a seu lado.
—Meu plano?
—Arrastar a sua mulher a sua cama e seduzi-la a plena luz do dia…Todo mundo sabe? —o
tom brincalhão de sua voz nada tinha que ver com a voz débil dos últimos dias.
—Acredito que um par de cavalariços não ouviram minhas instruções —respondeu ele lhe
seguindo o jogo, ao mesmo tempo que lhe retirava o cabelo da cara.
—Connor! Está brincando, não é?
—Sim. Meu único plano era te fazer sair de seu quarto. Já lhe disse, pedi a Murdoch que te
pedisse ajuda com os preparativos.
—Então na realidade não precisava de minha ajuda?
—Claro que sim. Não pense que era um gesto vazio.
—E isto?
—Só me aproveitei que a surpresa de te encontrar perto de meu dormitório… e de voltar a
ver que lhe brilhavam os olhos —confessou—. Estava preocupado por você —não lhe fez
mal dizer aquelas palavras; uma admissão semelhante deveria ter feito que lhe partisse o
coração em dois, mas não foi assim. Na realidade lhe fez sentir… bem.
Jocelyn não disse nada. Não podia. Ouvir aquelas palavras de sua boca era toda uma
mudança. Mas depois da dor da morte de sua mãe, não queria lhe dar mais importância da
que possivelmente tinha. No momento, gostaria de ficar em sua cama, em seus braços.
Tinha compartilhado com ela algo sobre sua família e, portanto, sobre si mesmo; tinha-o
feito através de um jogo, mas o tinha feito.
O cansaço lhe fechou os olhos momentos depois. Estava satisfeita e cômoda a seu lado…
Até que um grito fez que retumbassem as paredes do quarto.
—Conn! —gritou Rurik da escada. Connor se sobressaltou, mas não se levantou, mas sim se
apertou mais contra ela, pressionando o sexo contra suas nádegas e lhe agarrando um seio
ao mesmo tempo.
—Se não responder, acabará partindo —sussurrou.
A excitação substituiu ao sono, pois seu corpo reagia imediatamente às carícias de seu
marido.
—Tem certeza? Eu não gostaria de começar algo que não possamos terminar.
Connor se levantou e foi escutar à porta.
—Já foi.
Voltou para a cama, mas não se deitou mas ficou de pé. Agarrou-a pelos tornozelos e puxou
até a beira.
—É hora de acabar o que começamos, Jocelyn —e dizendo isso se agachou até colocar sua
boca…lá.
Jocelyn só demorou alguns segundos para deixar-se levar pela paixão. Agarrou-lhe a
cabeça para que não se movesse de onde estava. Para que não deixasse de fazer o que fazia.
Quando já sentia o grito de prazer nascendo de suas vísceras, Connor se moveu entre suas
pernas, inundou-se dentro de seu corpo e lhe apanhou a boca com a sua. Jocelyn pôde
sentir o sabor de sua própria essência nos lábios e sua plenitude no mais profundo do
corpo. Os músculos começaram a contrair-se, o calor a banhava por dentro. Ele jogou a
cabeça para trás e gritou:
—Rurik!
—O que? —Jocelyn o olhou, surpreendida de ouvir um nome que não era o seu
precisamente, mas ao olhá-lo viu a porta aberta.
E Rurik olhando-os boquiaberto.
O viking exclamou algo incompreensível para ela antes de voltar a fechar a porta. Connor
se levantou correndo, jogou-se a túnica por cima e foi correndo para a porta.
—Desta vez eu o mato —se deteve a meio caminho e a olhou—. Sinto muito, Jocelyn. De
verdade pensei que tivesse ido embora.
A única coisa que pôde fazer naquele momento foi rir. Não poderia voltar a olhá-lo à cara.
Deus sabia o que teria visto Rurik. Teria visto Connor beijando-a no mais íntimo de seu
corpo? A teria ouvido gemer como sem dúvida tinha gemido ao alcançar o máximo prazer?
Jocelyn tampou a cara com as mãos ao pensar na cena que tinha presenciado o viking.
Sentiu a mão de seu marido no ombro.
—Sinto muito, Jocelyn —disse lhe limpando as lágrimas que lhe caíam pela cara.
—Vai ter que matá-lo.
Connor demorou segundos em dar-se conta de que as lágrimas eram de risada, mas
quando o fez, pôs-se a rir com ela. Seu rosto resplandeceu de tal modo com a risada, que de
repente lhe pareceu uma pessoa diferente. Seus olhos escuros adquiriram um quente
brilho dourado e seus traços se adoçaram.
Jocelyn desejou que sempre fosse assim.
Instantes depois, Connor se sentou sobre a cama e a olhou com mais calma.
—Antes disse que estava cansada, fique aqui. Ninguém te incomodará.
—Deveria ir. Murdoch queria que o ajudasse com alguns tecidos.
—Jocelyn, tome todo o tempo necessário para superar a dor. Murdoch terá que esperar —
acrescentou enquanto se dirigia à mesa e agarrava um livro e outros papéis que tinha
tirado das gavetas—. Tenho que levar isto a Hamish e matar Rurik, mas te verei no jantar.
antes de partir, beijou-a brandamente nos lábios.

Jocelyn despertou algum tempo depois e foi em busca de Murdoch. Encontrou-o no quarto
que ao dia seguinte ocuparia Rhona. As palavras de Connor ressonaram em sua mente:
«Uma mulher bela atrai a atenção do lorde». Olhou aos poucos degraus que separavam
aquele quarto do quarto de seu marido e pensou nisso.
—Murdoch —disse atraindo a atenção do servo enquanto dava os últimos retoques—. A
prima do senhor é uma mulher bela?
—Sim, senhora. Rhona é bonita e tem um caráter muito doce e…
Jocelyn levantou a mão para pôr fim aos louvores. A seguir fez algo que não saberia
explicar ou, melhor, algo cujos motivos preferia não pensar.
—Prepare outro quarto para a prima do senhor, Murdoch. Esta não me parece o mais
adequada.
Não deu ocasião a perguntas ou protestos de nenhum tipo, deu a ordem e partiu.
No dia seguinte, quando chegaram a tia e a prima de Connor, soube que tinha tomado a
decisão correta. Viu descer do cavalo aquela mulher incrivelmente bela que, passando por
diante dela, foi direta a seu marido e o saudou com um abraço.
Rhona devia ser quatro ou cinco anos mais velha que Jocelyn, mas tinha o corpo de uma
mulher mais jovem. O cabelo loiro lhe caía sobre as costas amarrado com um tecido da
mesma cor que o vestido, um vestido precioso e de um estilo completamente novo para ela.
Se por acaso isso não tivesse bastado para deixá-la envergonhada, Rhona tinha uma voz
profunda e sedutora.
—Jocelyn?
Tratou de reagir com naturalidade. Secou-se a palma das mãos no insípido vestido que
levava e foi para seu marido.
—Apresento a minha prima, Rhona. É minha família por parte de minha mãe. Rhona,
apresento a minha esposa, Jocelyn.
—Jocelyn? Que nome tão bonito! Obrigado por me convidar —e então se aproximou dela e
a abraçou—. Pôde fazer algo com o castelo com todos estes brutos? Suponho que não, mas
a tia Jean e eu lhe ajudaremos a convertê-lo em um lar de verdade —prometeu, enquanto
puxava a senhora que a acompanhava, a esposa de Dougal.
Jocelyn imaginou que se equivocou ao julgá-la por sua aparência. Rhona a agarrou pelo
braço e a levou para o interior do castelo sem deixar de falar e fazer perguntas que ela
mesma respondia. Jocelyn deu uma olhada a seu marido, que a olhava com gesto
envergonhado, como se a tivesse jogado aos lobos.
A suas costas ouviu um comentário de boca do Dougal que provocou as risadas de todos os
homens, algo de sair para caçar.
Só uma hora depois, de ter presenciado uma acalorada discussão entre Rhona e Murdoch
e ter ouvido as incessantes instruções de ambas as mulheres sobre como teria que arrumar
e reorganizár tudo, Jocelyn se sentiu um completo fracasso. Se aquele era o tipo de
mulheres às que Connor estava acostumado, ela nunca deixaria de decepcioná-lo. Jocelyn
não tinha nenhuma experiência em dirigir uma casa tão grande como aquela e agora que
via aquelas duas damas tomarem o controle de tudo, soube que nunca chegaria a tê-la.

Quinze

Como provavelmente acontecia com a maioria dos homens, Connor estava acostumado a
lhe parecer mais fácil manter-se à margem que enfrentar sua tia e a sua prima quando
ambas as mulheres uniam suas forças. Durante os dias seguintes a sua chegada teve que
recordar uma e outra vez que tinha sido boa idéia convidá-las. Mas, embora às vezes sentia
vontade de matar Duncan por havê-lo sugerido, o certo era que as mudanças que tinham
levado a castelo tinham sido positivas.
Ao menos até o momento.
Seu plano secreto era deixar que deixassem tudo em ordem ali, convertendo o castelo em
uma residência bem provida e cômoda, e depois partiriam com Dougal quando seu tio
recebesse a ordem de transladar-se ao povoado do sul.
Não tinha falado com Jocelyn desde a chegada de ambas as mulheres, mas tinha ouvido
que tinha ganho uma outra batalha pessoal. Certamente não passaria muito antes de que
expressasse seu disconformidade com tudo aquilo. Connor a visitava cada noite, mas
sempre a encontrava tão profundamente adormecida, que não despertava e a deixava
descansar com a esperança de que isso apagasse o último rastro de olheiras que ainda lhe
via no rosto.
Todos os dias era ela quem se levantava antes da mesa do café da manhã para ir ao
povoado. Rhona já tinha dado sua opinião sobre essas visitas; pareciam-lhe impróprias da
esposa do chefe do clã, mas Jocelyn tinha argumentado que precisamente como esposa do
chefe, o bem-estar dos habitantes do povoado era uma de suas principais preocupações.
Connor sorriu a caminho dos estábulos. Sabia que sua mulher tinha muita força interior,
só precisava sentir-se segura para usá-la.
Quando tinha decidido casar-se, tinha pensado primeiro em procurar uma mulher
pertencente a um clã forte com o que lhe seria útil aliar-se. Logo tinha descoberto que sua
má reputação não o convertia precisamente em um marido muito solicitado e tinha
começado a investigar os clãs mais modestos. Tinha sido então quando Athdar tinha
parado em Lairig Dubh a caminho a casa, bêbado e cheio da arrogância própria da
juventude. Para Connor não tinha sido difícil provocar o insulto que tinha iniciado a briga
depois da qual tinha acabado como prisioneiro dos MacLerie e tendo que negociar com ele
sua libertação.
Assim, Connor tinha encontrado a esposa que necessitava; uma mulher inteligente que
pudesse ser a acompanhante de um chefe poderoso como ele, mas o bastante diferente de
Kenna como para que não a recordasse constantemente. É obvio que havia muitas coisas
que ainda devia aprender, mas tinha a segurança de que o faria.
Como se a tivesse chamado com o pensamento, Jocelyn apareceu naquele momento na
porta do pátio, procedente do povoado. Demorou vários segundos em chegar a seu lado
porque vários homens foram a seu encontro a lhe fazer diferentes perguntas que ela
respondeu imediatamente. Durante esses segundos, Connor observou seu modo de mover-
se e de falar, e se fixou em que a tristeza ainda não tinha desaparecido por completo de seu
rosto.
Foi então quando se deu conta de que o papel que Jocelyn ocupava em sua vida tinha
mudado muito na última semana. As palavras de Ailsa sobre sua ira lhe tinham feito parar-
para pensar em seu comportamento com Jocelyn. Fosse como fosse, agora estavam unidos
em matrimônio e era absurdo privá-la do papel que devia desempenhar em sua vida… um
papel que ele necessitava também.
Sem sequer ser consciente disso, Connor tinha aceito a mudança e com isso tinha feito que
os habitantes de Lairig Dubh e ela mesma começassem a vê-la como a senhora do clã.
Mas apesar de dita mudança, continuava tendo a segurança de que aquilo era o máximo ao
que podia chegar. Poderia ter a esposa que necessitava e a que começava a desejar, mas
sem arriscar-se a nada mais.
—Senhor —disse a modo de saudação.
—Senhora —respondeu ele sem ocultar sua irritação. E funcionou.
—Connor —disse ela dessa vez.
—Jocelyn —respondeu ele com um sorriso—. Já de volta ?
—Temo que devo fazê-lo —respondeu com resignação.
Connor não pôde evitar de rir diante de sua reação à idéia de encontrar-se com Jean e
Rhona.
—Não poderia tentar descansar?
—Rhona e Cora estão em meus aposentos terminando um vestido que se empenharam em
fazer e Murdoch enviou alguém a seu quarto para que lhe façam uma estante. Assim temo
que não há lugar para «descansos».
Pela ênfase que lhe deu à palavra, Connor soube que ela acreditava que tratava de levar-lhe
à cama; mas, embora a idéia nunca estava muito longe de seus pensamentos, na realidade
o que queria era falar com ela.
—Venha, mostrarei um lugar onde se esconder quando precisar.
Estendeu-lhe uma mão que ela aceitou. Rodearam juntos o castelo até a escada que
conduzia às almenas, uma vez ali deram a volta à esquina e entraram nas sombras que
projetavam as torres. Aquele era seu canto preferido.
—Aqui ninguém pode vê-la nem desde as torres nem das almenas.
—Isso não soa muito seguro em caso de ataque —disse ela olhando a seu redor.
—Mas os guardas passam por aqui a cada quinze minutos, a menos que o senhor ordene o
contrário. Dizem que quem construiu o castelo o desenhou assim para ter um lugar onde
reunir-se com a esposa do lorde na época, pois eram amantes.
—Uma história muito romântica, mas desonrosa.
Teria se dado conta de que conforme falava se aproximava dele?
—Para muitas mulheres parece emocionante. A você não?
Jocelyn se inclinou sobre ele para proteger do frio e Connor a rodeou com seus braços.
—Bom, se era para dois amantes...
—E se for para o senhor do castelo e sua esposa?
—Sabia que essa era sua intenção desde o começo.
Connor se pôs a rir.
—Não, embora certas partes de mim sempre estão dispostas —lhe disse apertando a pélvis
contra ela para que comprovasse que não mentia—; na realidade queria te mostrar meu
refúgio se por acaso alguma vez precisasse descansar de alguém que te estivesse cansando.
—E quem poderia ser esse alguém, marido?
—Acredito que ambos sabemos a resposta —lhe deu um beijo na cabeça enquanto ela a
apoiava em seu peito. O fazia bem estar assim, abraçá-la. Por que teria pensado que era
algo tão horrível?
—A verdade é que sua tia parece estar tentando pôr a prova minha paciência —admitiu por
fim—. Rhona tenta ajudar, mas tudo terá que fazê-lo a sua maneira.
—E isso por que só estão aqui dois dias, imagine como estará quando chegar o inverno.
—Pensei que Dougal partiria antes disso —deduziu adivinhando seus planos.
—Tentarei que assim seja —fez uma pausa antes de confessar o verdadeiro motivo pelo que
estavam ali—. Jocelyn, não fui sincero sobre os motivos pelos que te trouxe aqui.
—Então procurava um encontro de amantes?
—Não, refiro a Lairig Dubh.
—Como? Não queria que fosse sua esposa? —perguntou com evidente inquietação.
—Sim, mas não tinha intenção de compartilhar com você tudo o que suportava o fato de
que fosse. Queria te manter à margem de tudo enquanto eu seguia com minhas obrigações
como chefe do clã —Jocelyn ficou imóvel em seus braços e Connor temeu estar lhe
transmitindo uma mensagem errônea—. Mas agora me dei conta de que o clã merece algo
mais e você também.
—Me alegro… —disse sem nenhuma convicção.
—De verdade? Não o parece. Acredito que você gostaria de poder dizer a Murdoch o que
tem que fazer e dar ordens como faz Jean.
—Devo admitir que às vezes sim sinto vontade de fazê-lo, Connor —disse, separando-se
dele para olhá-lo de frente—. Mas temo não ter a experiência nem a preparação necessária
para fazê-lo bem.
—Confesso que te escolhi apesar disso.
—Apesar de meus defeitos? —a expressão de seu rosto deixava claro que lhe preocupava
não ser merecedora da posição que ocupava e não saber levá-la a cabo.
—Disseram-me que levava meses te ocupando das tarefas de sua mãe desde que ela estava
doente e que você sozinha se encarregava de que todo mundo no castelo tivesse comida,
roupa e um lugar onde dormir, para o qual às vezes tinha que fazer você mesma a roupa e
dar sua comida aos que a necessitavam mais. Equivoco-me?
Jocelyn se ruborizou, mas não por falsa modéstia, mas sim porque lhe envergonhava que
seu marido soubesse de sua pobreza. Lhe encolhia o estômago só de pensar que seu pai
tivesse chegado a ser incapaz de proteger a sua família e a seu clã.
—Não, senhor.
Connor lhe levantou o rosto brandamente e, ao olhá-lo, Jocelyn viu aquele sorriso que
ultimamente tinha visto mais freqüentemente.
—Ao aceitar a oferta de matrimônio da Besta das Highlands, salvou a seu clã. E sobreviveu
mais do que muitos teriam pensado.
—É verdade —respondeu ela. Por que brincava com algo assim? De verdade queria fazê-la
sentir forte depois de lhe haver demonstrado tantas vezes que não lhe importava o
mínimo? Atreveria-se a aceitar a oferta de converter-se na esposa que necessitava e que
possivelmente inclusive desejava?
Jocelyn se deu conta de que as coisas já tinham mudado entre eles. Tinha-a levado pela
mão até ali e lhe tinha explicado seu modo de proceder, algo que não nunca tinha feito
antes.
—Então —lhe disse ele—, está disposta a ocupar o lugar que pertence a meu lado? A
agüentar o que for necessário de minha tia e minha prima para aprender suas funções
como senhora da casa?
Seu marido estava lhe oferecendo muito com aquelas palavras… seu apoio, o lugar que lhe
correspondia e a oportunidade de aprender e fazer muitas coisas que jamais teria vivido
em seu pequeno clã. Estava preparada para isso?
—Pode ser que você não goste do que descubra em mim, marido.
—Ah, senhora. Ouvi dizer que a filha dos MacCallum leva um demônio dentro de si quando
se zanga. Pergunto-me se será verdade.
Jocelyn se pôs a rir. Sim, era geniosa, mas ultimamente tinha estado muito assustada ou
muito triste para ser.
—Confesso que grito de vez em quando.
—De verdade? Então possivelmente ouçamos logo seus gritos entre os muros de Lairig
Dubh.
—Possivelmente.
A conversa chegou a seu fim quando ambos foram chamados por diferentes pessoas; ela do
interior do castelo e ele do pátio de armas.
Quando chegou o momento de separar-se no pátio, Jocelyn se dispôs a afastar-se com um
sorriso porque agora as coisas eram diferentes. Agora tinha um verdadeiro lugar ali, um
lugar que ele mesmo lhe tinha convidado a ocupar. De repente lhe pareceu que o sol
brilhava com mais força.
—Jocelyn! —gritou Rhona da porta da torre -. Te procurei por toda parte. Achei que
voltaria logo do povoado. O que ainda não compreendo é por que tem que passar tanto
tempo lá.
—Se prepare, esposa —lhe sussurrou Connor—. Enfrenta a um duro adversário.
—Estou enfrentando a um muito mais duro desde que cheguei aqui.
Jocelyn esperou sem saber como se tomaria aquela resposta. Sua gargalhada ressonou em
todo o pátio e atraiu a atenção de todos os que ali haviam.
—Jocelyn, o vestido está preparado para que lhe prove —insistiu isso Rhona indo para
eles—. Temos muito pouco tempo, assim por favor se apresse.
—Muito pouco tempo para que? —perguntou Connor.
—Esta noite vamos celebrar um verdadeiro jantar no grande salão, um jantar à altura..-
Rhona titubeou antes de continuar—. À altura de um clã como o nosso. Um jantar para a
que a esposa do… chefe do clã necessita um vestido apropriado.
—Vá então, esposa. Verei as duas no jantar —esperou a que Rhona se virasse para piscar o
o olho para Jocelyn.
—Jocelyn, vá se adiantando, eu tenho que falar com o senhor um momento. Cora está em
meu quarto com o vestido.
Jocelyn agradeceu o momento de solidão e subiu tranqüilamente para os aposentos de
Rhona. Enquanto provava o vestido, Jocelyn se fixou nos frascos de vidro e nas bolsinhas
que Rhona tinha sobre a cômoda de seu dormitório.
—O que é isso, Cora?
—Não estou certa, senhora. Dizem que a prima do senhor prepara infusões e todo tipo de
beberagens com diferentes ervas.
—Assim é, moça —confirmou a aludida da porta.
A prima de Connor foi direta a comprovar que tudo estava em ordem no vestido. Puxou oo
tecido das costas para ajustar-lhe ao peito. Jocelyn tomou ar ao sentir certa dor.
—Perdão, Jocelyn, está muito apertado?
Jocelyn levantou a mão para ajustá-lo pessoalmente, voltou a sentir a mesma dor.
—Terminou a mestruação? —perguntou-lhe Rhona enquanto movia os alfinetes para
deixar-lhe mais largo.
—Sim. Na realidade deveria ter começado já, mas Ailsa diz que é normal que se atrase com
tudo o que aconteceu estas últimas semanas.
—Isso diz? —perguntou com ironia—. Bom, seguro que ela sabe disso.
Como boa mulher de classe alta, Rhona sentia um certo desprezo pelos camponeses, os
servos e as mulheres que se deitavam com seus senhores. Não parecia para para pensar
que normalmente algumas mulheres não tinham outra opção que converter-se nas
amantes de seus chefes.
—Cora, eu terminarei com isto. Prepare o banho à senhora e lhe ponha estas ervas na água
—ordenou lhe dando uma bolsinha de linho.
A moça obedeceu imediatamente e Rhona ajudou Jocelyn a tirar o vestido. Como costurava
melhor e mais rápido que ela, Jocelyn pegou uma agulha e colocou mãos à obra,enquanto
Rhona ia à cômoda e agarrava duas pequenas terrinas. Em uma delas jogou umas folhas e
na outra, outras ervas que tirou de uma bolsinha. Jocelyn observou fascinada como vertia
água fervendo do fogo em ambas as terrinas. Depois abriu outro frasco e pôs algo que
parecia mel.
—Meu marido, que em paz descanse, era muito maior que eu e sofria diferentes doenças.
Tinha uma curandeira cujas beberagens conseguiam aliviá-lo enormemente. Eu aprendi
muito dela —explicou enquanto trabalhava- Estas terrinas são minhas infusões preferidas.
São de grande ajuda quando fico mesntruada.
Jocelyn aceitou a primeira terrina e bebeu. O sabor era delicado e agradável, por isso
continuou bebendo enquanto Rhona bebia do outro. Assim continuaram costurando e
quando as terrinas estiveram vazias, o vestido estava acabado.
Depois foi tomar oprometido banho, mas antes de meter-se na água se deu conta de que
lhe rugia o estômago de fome e decidiu comer-se algumas frutas que lhe tinha trazido
Brodie essa mesma manhã. A água quente e a doçura das pêras eram um luxo que nunca
antes tinha desfrutado.

Connor esperou onde lhe tinham indicado, aos pés da escada da torre de Jocelyn. Na
realidade era a torre sul, mas ultimamente pensava nela desse modo.
Rhona lhe tinha ordenado que esperasse ali Jocelyn e a acompanhasse até a mesa; bom,
também que estivesse limpo e bem vestido como o futuro conde de Douran que era.
Connor tinha conseguido convencê-la de que ainda não tinha chegado o momento de fazer
pública tal possibilidade, pois ninguém lhe tinha assegurado que fosse fazer-se realidade.
Rhona não tinha confessado como soube, mas preferiu guardar silêncio no momento.
Assim ali estava, com uma camisa branca imaculada, um tartán recém tecido e a insígnia
de seu pai lhe adornando o peito, esperando a que sua mulher descesse pelas escadas. Foi
Cora quem apareceu primeiro, por isso não conseguiu ver bem Jocelyn até que a donzela se
afastou.
Ao vê-la pensou que flutuava sobre os degraus. Levava o cabelo preso e adornado com um
novo penteado que lhe dava um aspecto diferente a seu rosto; os adornos dourados faziam
ressaltar um tom avermelhado em sua pele que Connor não tinha notado antes. Com o
cabelo preso, a curva de seu queixo parecia muito elegante. Mas o que mais lhe chamou a
atenção foram seus olhos, que pareciam maiores e mais verdes que nunca. Seus lábios
também pareciam mais carnudos e tinha as bochechas ruborizadas.
Era ela ou ele que tinha mudado? Era impossível que um vestido novo e um par de
adornos a tivessem mudado tanto. Sem dúvida o traje a favorecia, pois tampando até o
último centímetro de sua pele, ressaltava suas curvas femininas. Deteve-se no penúltimo
degrau de maneira que seus olhares ficaram ao mesmo nível. Connor engoliu em seco
várias vezes antes de poder falar.
—Jocelyn, está… —começou a dizer. Não tinha a beleza de Kenna, pois Jocelyn era mais
terrestre e sensual. Então viu a expressão de seu rosto e viu a Jocelyn de sempre—. Está
incômoda.

Dezesseis

Connor sabia que aquelas palavras não eram o que Jocelyn esperava e o comprovou ao ver
como ela afastava o olhar enquanto tentava sorrir.
—Estou —olhou o vestido que levava e levou a mão ao cabelo—. Me sinto como se fosse
outra pessoa.
Connor a agarrou pela mão e se aproximou para poder lhe falar com ouvido.
—Pode ser que esteja incômoda —disse deleitando-se em seu aroma—, mas está linda, lady
MacLerie.
—Obrigado —respondeu ela, enquanto começavam a andar para o grande salão.
Quando viu todos os que ali se reuniram, Jocelyn se deteve em seco.
—Vamos, continue andando e sorria —lhe disse puxando-a brandamente. Connor sabia
perfeitamente o motivo daquele jantar requinatdo, pois não podia haver-se celebrado sem
sua permissão por muito que tivessem insistido sua tia e sua prima—. Sei que nosso
matrimônio não começou bem, com seu irmão convertido em meu prisioneiro e você
dando uma surra a meu homem de confiança na viagem para aqui.
Jocelyn se pôs a rir com nervosismo e sem poder afastar o olhar das dúzias de pessoas
congregadas.
—Minha tia me repreendeu várias vezes já por não te haver dado o recebimento que
merecia como nova integrante do clã. Exigiu-me que emendasse o engano e celebrássemos
nossa união diante de todos.
Encontravam-se já a só alguns passos da mesa principal, ocupada pelos anciões, Duncan,
Jean e Rhona, mas Jocelyn parecia ir desmaiar a qualquer momento. O silêncio não fez
sem aumentar a tensão do ambiente, um silêncio provocado por sua aparição. Connor
imaginava o que todos estavam pensando: o patinho feio se transformou em um formoso
cisne.
—Pensei que depois da conversa de antes, este jantar serviria também para selar nosso
novo acordo —continuou falando, com a esperança de chegar à mesa antes de que ficasse
sem argumentos com os que distrai-la do nervosismo que percebia nela.
O que conseguiu fazê-la relaxar-se finalmente foram as palavras que lhe dedicou Rurik ao
passar junto a uma das mesas:
—Você sim sabe se arrumar, Jocelyn —sussurrou, o bastante alto para que ela pudesse
ouvi-lo.
Os outros ocupantes da mesa puseram-se a rir, mas a expressão do rosto de Jocelyn
demonstrava que apreciavam enormemente aquelas palavras.
Todo mundo ficou em pé quando por fim chegaram à mesa presidencial, mas Connor não
lhe soltou a mão, mas sim esperou as palavras de Duncan:
—Senhor, senhora —disse levantando sua taça para eles—. É tradição receber à noiva com
a história de nossa família. Entretanto, nosso bardo desapareceu e ninguém recorda a
história.
Ouviu-se uma gargalhada geral, pois todos sabiam que fazia já muitos anos que o clã
MacLerie não tinha bardo e além do mais todos conheciam a história.
—Assim parece que terei que ser eu o que deseje todo o melhor aos noivos em seu
«recente» matrimônio —gritou Duncan com alegria—. Pelos MacLerie!
—Pelos MacLerie! —repetiu o salão inteiro ao uníssono.
Duncan e todos outros se sentaram, mas Connor continuou em pé. Levava todo o dia
pensando o que dizer para dar a bem-vinda a Jocelyn e não tinha conseguido encontrar as
palavras necessárias. Assim se limitou a brindar por ela.
—Por lady Jocelyn!
Todos repetiram o brinde de novo enquanto Connor lhe oferecia sua taça. Jocelyn bebeu e
logo ele bebeu da mesma taça. Acabava de sentar-se quando se ouviu um terceiro brinde,
era uma voz inconfundível.
—De noite de núpcias! —gritou Rurik com uma gargalhada que secundaram todos os
presentes.
Jocelyn se ruborizou de um modo que lhe deu um aspecto ainda mais encantador.
—Devo te confessar algo —disse Connor só para ela—. O que me impulsionou a dar
permissão de que se celebrasse este jantar foi a promessa de desfrutar de uma segunda
noite de núpcias, porque acredito recordar que a primeira a passou dormindo.
—Então terá que se encarregar de que desta vez não ocorra o mesmo.
—A verdade é que ao vê-la descer a escada, a primeira coisa em que pensei foi em te tirar
todas essas capas de tecido que cobrem seu corpo para poder te sentir nua junto a mim.
—Connor! —protestou lhe pondo a mão na perna sob a mesa, sem suspeitar que tocá-lo
não era a melhor ideia—. Alguém poderia te ouvir.
Connor lhe agarrou a mão e a colocou onde pudesse sentir sua excitação.
—Você também poderá me tirar a roupa até chegar aqui.
Jocelyn não afastou a mão quando ele a soltava; de fato, moveu-a até agarrá-lo bem. Foi
então quando Connor se deu conta de que todos os comensais os olhavam em silêncio.
Estavam esperando a que ele desse o sinal para poder jantar. Connor fez um torpe gesto
aos servos para que começassem a encher os pratos.
Tudo estava magnificamente organizado e a comida era abundante e deliciosa. Connor se
voltou para agradecer a sua prima por tudo o que tinha feito, mas foi ela a que falou antes:
—Não pensei que fosse possível, primo, mas me parece que está apaixonando por ela —o
disse com aparente amabilidade para não atrair a atenção de ninguém, mas Connor sentiu
a hostilidade implícita em suas palavras—. Pôde esquecer Kenna?
—Não é assunto seu, Rhona, mas não deve confundir desejo com amor —replicou ele.
O sorriso desapareceu de seu rosto imediatamente e então Connor viu algo mais em sua
expressão… Dor? Lástima? Alívio? Não saberia dizer. Depois desapareceu.
—Perdão, Connor, não pretendia ofender nem a você nem a sua esposa.
Voltou-se para olhar Jocelyn, mas a encontrou falando com Dougal e Jean.
Inundou a colher no molho de pêra e automaticamente recordou a última vez que tinha
desfrutado daquele delicioso suco. Justo nesse momento Jocelyn lhe deu com o joelho e, ao
olhá-la, leu em sua boca a palavra «logo».
Estava pensando o mesmo que ele.
Connor se pôs a rir e ofereceu uma prece. Embora entre Jocelyn e ele nunca pudesse haver
o que tinha havido com Kenna, embora sua união tivesse começado tão mal, e embora só
pudesse lhe oferecer respeito e um nome, não seu coração, Connor deu as graças ao Todo-
poderoso por lhe haver dado uma mulher que desfrutasse tanto da paixão que ele podia lhe
dar.
Tinha sido um iditoa ao acreditar que poderia viver com ela e mantê-la à margem de sua
vida. Equivocou-se na maneira de tratá-la e se alegrava de haver-se dado conta de seu
engano. Agora que olhava ao salão, a seu clã, sabia que tinha tomado a decisão adequada
ao casar-se e começar a mudar… e também ao pedir a Jocelyn que ocupasse o lugar que lhe
correspondia.
Quantas coisas tinham mudado nas últimas semanas. Com a ajuda de sua tia e de sua
prima, Jocelyn aprenderia a levar a casa e quando por fim lhe concedessem o título, ela
estaria preparada para converter-se em condessa. E logo seriam abençoados com filhos,
não tinha a menor duvida disso.
—Connor? Eu gostaria de voltar para meus aposentos —lhe disse então Jocelyn lhe pondo a
mão no braço. Estava muito pálida e tinha a mão gelada e suarenta.
—Está bem? —fez-lhe um gesto a Cora para que fosse à mesa.
—Não sei o que me passa, mas algo não vai bem.
Rhona se aproximou também.
—Quer que vá com você, Jocelyn? Não tem bom aspecto.
Não esperou uma resposta, ficou em pé e a ajudou a levantar-se. Deu instruções a Cora e
depois conduziu Jocelyn para seus quarto.
Connor ficou ali pensando se devia fazer algo, mas Rhona a ajudaria melhor que ninguém
com seus dotes de herborista. Pouco depois, Cora levou alguns panos e pediu a um dos
ajudantes do cozinheiro que lhe levasse uma panela.
Tentou continuar comendo, mas não fazia mais que mover a comida no prato e tratar de
convencer-se de que tudo ia bem e quando viu voltar para Cora uns minutos mais tarde e
pedir a ajuda da Ailsa, decidiu que já estava bem.
Subiu correndo as escadas, mas ao tentar entrar no quarto de sua esposa se encontrou com
a porta fechada. Cora a abriu só o suficiente para que pudesse sentir o aroma que saía dali
e ouvir alguém vomitar. A porta voltou a fechar-se em seu nariz.
—Me diga como está —gritou e ao ver que ninguém respondia—. Diga o que…
Cora voltou a abrir a porta e assentiu.
Connor se deu meia volta, mas ainda podia ouvir os ruídos das arcadas, sentiu que lhe
revolvia o estômago e que se ficasse ali, ele seria o seguinte em adoecer, assim desceu ao
salão e esperou impacientemente junto a Duncan.
Ainda estava ali três horas mais tarde quando por fim desceram para lhe dizer como estava
Jocelyn.

A morte não poderia ser tão dolorosa como aquilo, pensou Jocelyn enquanto se esforçava
uma vez mais para abrir os olhos. Conseguiuo, mas sentiu tal enjôo que decidiu que era
preferível não despertar. Quando os sussurros que a rodeavam se fizeram cada vez mais
freqüentes, utilizou todas suas forças para mover a cabeça e abrir os olhos.
—Senhora —lhe disse Ailsa—, tente descansar um pouco mais —sentiu sua mão sobre a
testa e não pôde fazer outra coisa que seguir seu conselho.
Pouco depois voltou a tentar de novo e dessa vez não teve tonturas. Ailsa a ajudou a
levantar-se e lhe pôs uma taça nos lábios; não era água a não ser outra beberagem que lhe
acalmou o ardor que sentia na garganta e no estômago.
—Vou morrer? —perguntou quando por fim se sentiu com forças para fazê-lo.
—Não, senhora. Parece que comeu algo que lhe fez mal.
—Alguém mais ficou doente? —conseguiu levantar a cabeça o bastante para ver que Cora e
Rhona também estavam ali.
—Ninguém que saibamos —respondeu Cora.
—Jocelyn, comeu algo antes do jantar? —perguntou Rhona.
Recordava ter tomado o café da manhã uma terrina de aveia como todas as manhãs e
depois não tinha comido nada mais até…
—Comi algumas pêras que Brodie tinha me dado.
Cora olhou a seu redor e viu a cesta com as frutas que lhe tinham dado os meninos. Rhona
agarrou uma das pêras e a cheirou.
—Está estragada?
—Não parece, mas possivelmente sim o estivessem as outras.
—Ailsa, por favor, não diga nada a Brodie —suplicou Jocelyn ao ver o gesto de preocupação
da velha criada—. ficará muito triste se acreditar que seu presente me deixou doente.
—Agora descanse, Jocelyn —lhe recomendou Rhona—. Te trarei algo que te assente o
estômago.
E o necessitava, pensou Jocelyn levando-a mão ao ventre, mas então se deu conta de que a
dor procedia de outro lugar.
—Ai.
—Também te veio a menstruação, não é? —adivinhou Rhona com um triste sorriso—. Pode
ser que o tenha provocado o mal-estar do estômago.
Jocelyn não disse nada. As três mulheres compreendiam a decepção que provocaria em seu
marido a notícia. Embora sua relação era agora muito melhor, Jocelyn temeu que aquilo
fizesse que voltasse a mudar.
—Tudo vai ficar bem, senhora —assegurou a jovem Cora com doçura.
Jocelyn tentou sorrir, mas o golpe que supunha ter fracassado uma vez mais e não ter
podido lhe dar a seu marido o que mais desejava, o impediu, só pôde assentir levemente e
afastar o olhar para que não vissem seu desespero. Fechou os olhos com a esperança de
dormir e não sentir tanto dor ao despertar. Então recordou a noite de prazer que se
prometeram mutuamente seu marido e ela.
Não haveria segunda noite de núpcias.

Fazia já tempo que as mesas tinham ficado completamente vazias e todo mundo se deitou
quando Rhona voltou para salão. As taças de vinho se foram encadeando até que Duncan
tinha perdido a consciencia, Connor tinha continuado esperando. Ficou em pé ao ver
entrar sua prima.
—Está… —se deteve pois não sabia como fazer a pergunta. Apertou os punhos enquanto
aguardava a resposta. Nunca tinha visto ninguém ficar tão doente com tanta rapidez.
—Está descansando, Connor. Acredita que pode lhe haver caído mal algumas frutas que lhe
deram os meninos do povoado; possivelmente estivessem verdes ou tivessem vermes.
—Isso explicaria por que ninguém mais ficou doente.
—Sim —disse ela—. Cora está com ela e ficará lá até pela manhã.
—Rhona —lhe disse antes de que se fosse—. Obrigado por sua ajuda. Não só por isso mas
também por tudo o que tem feito até agora. Agradeço muito que viesse te avisando tão de
repente.
Rhona se aproximou dele, tanto que pôde sentir a essência com que aromatizava seus
banhos, e lhe pôs a mão no peito.
—Não invejo sua felicidade, Connor. Só quero que encontre a sorte que merece depois de
tanto sofrimento.
Incômodo com sua aproximação, Connor deu um passo para trás, mas ela o seguiu e
tomou a mão entre as suas.
—Kenna era sangue de meu sangue e sabe que a queria muito, mas ela não era para você.
Rezarei cada noite para que encontre o que realmente necessita.
—Obrigado, Rhona —respondeu ele retirando a mão.
Ela o olhou e sorriu.
—Vou me retirar já, quero ir ver Jocelyn assim que amanheça.
—Até manhã então.
Viu-a afastar-se para a escada da torre. Mal tinha começado a subir quando se voltou a lhe
dizer algo mais:
—Jocelyn queria que soubesse que está mestruada.
Connor afasttou o olhar ao ouvir aquilo e sentir como a decepção se alojava em seu peito.
Só pôde assentir. Rhona partiu sem dizer nada mais.
Outro mês desperdiçado.
Outro ciclo da lua sem que houvesse um filho a caminho.
Ailsa tinha tratado de acautelá-lo sobre aquilo. A velha criada lhe tinha explicado que a dor
pela morte de sua mãe poderia lhe haver afetado. Também lhe tinha mencionado outros
sintomas, mas ouvi-lo não tinha sido tão duro como sabê-lo agora com segurança.
Sentiu uma pontada de culpa no estômago.
Deveria haver-se preocupado pela mulher que sofria na cama e não por algo que só o Todo-
poderoso podia lhe conceder. Jocelyn tinha sofrido muito nas últimas semanas e agora
aquilo.
Só necessitava tempo para recuperar-se, estava certo de que depois todos seus esforços se
veriam recompensados. Alguns meses de cuidados e prática dariam seus frutos. Uma
esposa doente e delicada não podia ter filhos.
Tampouco poderia uma morta, que foi o que começou a temer nas seguintes semanas.
Dezessete

Jocelyn recuperou as forças rapidamente depois do incidente e muito em breve sentiu que
aumentava sua capacidade para encarregar-se de suas responsabilidades como esposa do
chefe do clã. Murdoch agora respondia perante ela e, embora consultasse Jean e Rhona,
era ela também a que controlava a todos aqueles que viviam ou trabalhavam no castelo.
Quando o mês de setembro chegava a seu fim, quase todos os campos tinham sido já
colhidos e todos continuavam preparando-se para o inverno a um ritmo mais rápido do
que o habitual, conforme lhe assegurou Murdoch.
Connor tinha decidido que Dougal e os outros voltariam para o seu lar no sul antes da
chegada do inverno. Jocelyn, por sua parte, não deixava de animar Jean e a Rhona para
que o acompanhassem e isso era algo que parecia irritar Rhona, mas dito mau gênio tinha
servido para que Jocelyn descobrisse duas coisas; uma sobre a prima de seu marido e outra
sobre si mesmo.
A primeira era que a Rhona não gostava de Rurik, de fato às vezes lhe parecia que o que
sentia por ele era verdadeiro ódio. A princípio tinha acreditado imaginá-lo, mas depois
tinha visto o modo em que ambos se olhavam e soube que não era imaginação dela. Em um
par de ocasiões tinha tentado descobrir o motivo de tal antipatia, mas Rhona tinha reagido
do modo mais evasivo, tentando distrair Jocelyn de sua busca da verdade.
Mas a partir de então se fixou em que Rhona era a única mulher, a única, do castelo e de
todo o povoado que não afetava a presença e as cuidados do viking. As mais jovens
virtualmente perdiam a fala cada vez que ele se aproximava e a razão se chegava a dirigir-
se a elas.
Apesar de sua aparente fidelidade para Nara, Rurik atraía às mulheres irremediavelmente.
Quanto mais o conhecia, mais convencida estava Jocelyn de que simplesmente se devia a
que gostava muito das mulheres e elas o notavam em seu modo de agir. Mais de uma vez
tinha ouvido queixar-se aoConnor dizendo que se não estava brigando ou… na cama com
uma mulher, Rurik não estava satisfeito, e o certo era que parecia verdade.
Jocelyn apreciava sinceramente ao viking por sua lealdade para Connor e pelo modo em
que a tratava ; era brusco, mas sempre estava pendente dela e preocupado por seu bem-
estar. Às vezes pensava que era sua atitude para Rurik o que fazia que Rhona o odiasse
tanto.
O que tinha descoberto sobre si mesmo tinha sido produto da casualidade e tinha ocorrido
enquanto escolhia com Rhona um tecido para um novo vestido.
—Jocelyn, deveria olhar estas. O azul te sentaria muito bem com sua cor de pele.
O tecido era muito pesado para ela, não para Rhona, por isso escolheu outro muito mais
singelo de cor marrom e explicou que iria muito bem com uma túnica de um marrom mais
claro. Rhona se pôs a rir.
—Tem que melhorar seu gosto, Jocelyn. Em tecidos, vinho e comida. A corte real, até sem a
presença do rei, é um lugar muito refinado.
Rhona lhe tinha contado milhares de anedotas sobre suas visitas a corte do rei David.
—Como não espero visitar tal lugar, nem viver lá como fez você, acredito que meus gostos
atuais serão suficientes.
—Como condessa de Douran, terá que ir a côrte freqüentemente. Assim será melhor que
aprenda o que se espera de você —terminou de dizer, enquanto dava um ponto mais forte
do normal.
Cora e o resto de servos se voltaram a olhá-la ao ouvir aquilo.
—Rhona! —exclamou Jean—. Não corresponde a você falar dessas coisas.
—Certamente que Jocelyn já sabe, não é assim, prima? —Rhona fez o nó ao fio e o cortou
com os dentes—. Por isso nos chamaram, para te preparar para seu papel de condessa.
Para que fosse a esposa que Connor necessita.
Condessa? Jocelyn não sabia nada daquilo, mas parecia que Jean e Rhona sim.
—Não sabia —admitiu—. Por que Connor não me contou isso ?
—Jocelyn —começou a dizer Jean—, fale com seu marido. Ele lhe explicará isso tudo.
—Vamos, Jocelyn, não o tenha em conta. Pode ser que desse a Kenna seu amor, mas a você
vai fazer condessa. Ao menos seu título durará mais do que durou seu amor por ela.
Jean pôs fim a aquela discussão sobre Connor e Kenna. Rhona arregalou os olhos como se
tivesse cometido um engano inocente, mas Jocelyn não acreditava que não tivesse
reparado no efeito que teriam suas palavras.
Parecia que todo mundo sabia o que tinha sentido por sua primeira esposa. Kenna tinha
sido um modelo de mulher bela e virtuosa, ainda mais bela que Rhona, que não duvidava
em compartilhar com ela todos os detalhes quando estavam sozinhas. Todos os membros
do clã lhe tinham professado um sincero amor, sobre tudo o chefe do mesmo. Kenna tinha
sido uma mulher perfeita.
E Connor a tinha amado loucamente apesar de sua única falha, não lhe haver dado um
filho. Mas, como às vezes acontecia, seu amor se converteu em ódio e a tinha atirado pelas
escadas. Rhona lhe tinha dado a entender uma vez que a incapacidade de Kenna para
conceber tinha sido um castigo do Todo-poderoso.
Jocelyn ouviu que Jean murmurava algo a Rhona, mas não conseguiu entender o que dizia.
Tremiam-lhe as mãos quando ficou em pé e deu a Cora o tecido que tinha estado
costurando. Tinha que falar com seu marido o quanto antes.
Não demorou para averiguar que se encontrava em seus aposentos, assim subiu as escadas
correndo. Encontrou-o sozinho em seu dormitório. Jocelyn ficou na porta esperando a que
se desse conta de que estava ali.
—Jocelyn, entre. Tenho que sair em seguida, mas… —deixou de falar com ver a expressão
de seu rosto. Tinha visto aborrecimento, frustração, prazer, desejo, afeto e tristeza naquele
rosto. Mas o de agora era algo diferente.
Era fúria.
Connor sabia que ele era o motivo de dita ira, mas não adivinhava o que tinha feito para
ocasioná-la.
—O que foi? —teria ido para ela, mas parecia capaz de lhe pegar.
—Outra vez? —disse por fim—. Outra vez volotu a me esconder algo?
Nunca a tinha ouvido falar nesse tom.
—O que acha que estive ocultando, Jocelyn?
—Vou ser condessa e pensou que não merecia saber? —gritou-lhe.
- Ia dizer isso quando fosse o momento.
—E quando ia ser isso, marido? Quando o rei chegasse da Inglaterra com a nomeação? —
continuou dizendo a gritos.
—Quando decidisse que devia saber.
Seu rosto adquiriu um tom vermelho aceso antes de jogar a cabeça para trás e gritar.
Quando voltou a olhá-lo tinha a respiração entrecortada.
—Sente-se melhor? —perguntou-lhe ele sorrindo.
—A que se refere? A ser a única que não sabe algo tão importante quanto vão nomear a
meu marido de conde?
—Não —disse indo para ela—.De zangar-se e deixar que saia sua ira. Poder gritar.
Jocelyn soprou com frustração.
—Seguiu meus conselhos, deixou que me apresentasse perante os anciões e que inclusive
falasse. Por que não me disse algo que todos já sabiam? Só para me fazer zangar?
—Tinha ouvido os rumores sobre a filha do chefe de um clã que nunca reprimia seu gênio
diante de ninguém, mas queria ver se ditos rumores eram verdadeiros —a viu gritar entre
dentes—. Jocelyn, não! Levo dias tratando de te fazer zangar, mas o do título não tem nada
que ver com isso.
O que agora refletia seu rosto era confusão e não ira.
—Então é verdade. Vão nomeá-lo conde?
—Sim, mas ainda sabe muito pouca gente e não queria anunciá-lo ainda.
—Por que não?
—Tudo o que rodeia ao rei pode mudar da manhã para a noite. Eu não gostaria que
soubesse e logo ter que dizer que não era certo. Não seria conveniente para manter minha
reputação de Besta das Highlands —lhe estendeu uma mão que ela tomou sem duvidá-lo—.
Além disso, não queria te carregar com mais coisas ainda. Pensei que poderia te sentir
afligida se pensasse que fosse ter que enfrentar a ser condessa e não só a esposa do chefe
de um clã.
—Estou afligida. É uma honra para você. Só me preocupa falhar com você.
«Minha única preocupação é falhar com você».
Jocelyn não podia saber que aquelas palavras eram virtualmente as mesmas que lhe havia
dito Kenna, mas a dor lhe cravou no coração como sempre que recordava alguma de suas
conversas. A única falha de Kenna tinha sido seu amor por ele porque a tinha levado a
morte. E agora, três anos depois de haver procurando a propósito uma mulher que não se
parecesse em nada a ela para não repetir os enganos do passado, voltava a ouvir as mesmas
palavras de boca de uma esposa preocupada com seus defeitos.
A única diferença era que ele não amava à esposa que agora tinha diante. Mantendo-se a
distância, a protegia. Se o amor não lhe nublava a cabeça, poderia guiá-la nos momentos
difíceis. Sentia carinho por ela, desejava-a enormemente e tinha começado a respeitar suas
opiniões e sua inteligência, mas devia manter-se afastado do amor para não repetir os
enganos do passado.
—Não vai falhar comigo, Jocelyn. Não deixarei que o faça. Mas não deve temer todas estas
provocações as que enfrenta, as que enfrentamos os dois. Estou certo de que uma mulher
que seguiu à besta até sua guarida, é muito mais valente do que ela acha.
Era verdade, apresentou-se em seus aposentos lhe gritando, lhe gritando! E o mais curioso
era que a ele parecia gostar de que o tivesse feito.
—Agora tenho que voltar para trabalho, quer saber algo mais?
Sem dúvida se referia só a aquele assunto.
—Quando será oficializado?
—Segundo as cartas que chegaram ultimamente, não acredito que seja antes da primavera.
—Que diferença haverá entre ser chefe do clã e ser conde?
—Estarei às ordens do rei, ou melhor, seu lugar-tenente e terei que ir a côrte quando me
ordenarem isso.
—E eu?
—Você me acompanhará quando for convidada e se não ficará ao cargo de tudo isto. Fiz vir
a minha tia e a Rhona para que lhe ajudassem a aprender suas responsabilidades. Deixe
que lhe guiem para que esteja preparada quando chegar o momento. Agora tenho que
voltar para povoado, mas te peço que não fale disto com ninguém, ao menos até que receba
a notícia de que é completamente certo.
—Não se preocupe, não falarei com ninguém —lhe prometeu esperando que Rhona só o
tivesse mencionado por acidente.
Então Connor se aproximou dela e a beijou na boca, o qual a surpreendeu.
—Sabia que quando se zanga te brilham muito os olhos? E esse modo de gritar… recorda a
quando alcança o prazer entre minhas mãos… —terminou de dizer lhe sussurrando ao
ouvido.
Jocelyn sentiu um calafrio.
—Não vai sair? —perguntou ela.
—Sim, vou, mas voltarei mais tarde e procurarei a minha companheira em minha guarida,
onde ninguém possa nos interromper —disse afastando-se por fim para a porta e rugindo
como se fosse a besta que dizia ser.
Jocelyn tampou os ouvidos com as mãos e pôs-se a rir, satisfeita de que acreditasse capaz
de exercer como condessa e comandar o castelo em sua ausência. Poderia fazê-lo
seriamente?
No primeiro momento o que tinha que fazer era voltar para baixo e escolher um tecido
digno do vestido de uma condessa. Acabava de pôr o pé no primeiro patamar da escada
quando sentiu um golpe no chão que a fez dar-se contra a parede. Ao jogar a mão para
evitar a queda, bateu o braço e logo a cara. O que sentiu, em seguida, era que tinha caído
alguns degraus mais abaixo.
Levou a mão à cara e a sentiu machucada. Doía-lhe o braço e mal podia mover-se. Ficou ali
sentada alhuns minutos antes de tentar ficar em pé. As lesões não pareciam graves apesar
da imensa dor. Apoiando-se no outro braço, conseguiu descer o resto da escada e chegar ao
salão. Ali se apoiou na parede para recuperar as forças.
—Senhora! —gritou Murdoch do outro lado do salão.
Jocelyn voltou a levar a mão à cabeça com uma imensa dor que o grito não tinha feito mais
que intensificar.
Os sussurros começaram quase imediatamente. Jocelyn escutou as acusações sem saber
bem se eram reais ou o efeito do golpe na cabeça.
—Ouviu-lhe gritar?
—Ela subiu para falar com ele por não lhe haver contado…
—Lhe olhe a cara! Meu Deus, bateu nela…
—Estava muito zangado…
Pensavam que Connor o tinha feito ? Como teria podido? Saiu antes… Jocelyn olhou às
caras que a rodeavam e viu a lástima em seus olhos.
—Senhora, quer que chame Ailsa? —perguntou-lhe Cora.
—Não, Cora. Escorreguei-me na escada e me viriam bem alguns panos úmidos —disse
minimizando o ocorrido—. Rhona está aqui? —perguntou com os olhos fechados, pois
parecia que assim se enjoava menos.
—Não, senhora —respondeu a jovem donzela—. Acaba de sair para dar um passeio. Quer
que enviemos a alguém em busca do senhor?
Fez um longo silêncio à espera de sua resposta.
—Não. Não há motivo para incomodá-lo. Murdoch, se me ajudar a subir a meus aposentos,
em seguida ficarei bem.
Uma hora depois, já com compressas frias no rosto e no braço, Jocelyn tentou
compreender como tinha caído. Estava acostumada a caminhar pelo campo, entre as
rochas e jamais lhe tinha passado algo semelhante. Esperava que fosse a última vez
porque, inexplicavelmente, os servos culpavam Connor por suas feridas.
As acusações não fizeram mais que aumentar nos seguintes dias porque sua estupidez
aumentou e fez que sofresse ao menos dois «acidentes» mais antes de que Connor
reparasse nisso. Ninguém compreendia como tinha acabado em seu prato uma parte de
carne em mal estado ou por que o cavalo que estava escovando se assustou de repente e
esteve a ponto de lhe passar por cima ao tentar sair do estábulo.
Connor começou a examinar os acidentes em busca de algum elo em comum entre todos
eles. Ao princípio acreditou as explicações que lhe dava e pensou que realmente era porque
estava nervosa diante da perspectiva de converter-se em condessa. Mas o dia que estando
nas almenas, onde tinham adquirido o costume de reunir-se, uma pedra se soltou e
Jocelyn esteve a ponto de cair ao vazio, Connor soube.
Alguém estava tentando matar Jocelyn.
Pior ainda, alguém tentava matá-la e assegurar-se de que o culpassem.
Que sua primeira esposa tivesse morrido ao cair pelas escadas podia atribuir-se a um
acidente. Ninguém se deteria investigá-lo, nem sequer os emissários do rei, posto que as
testemunhas tinham confirmado a história. Mas se sua segunda esposa morresse do
mesmo modo, começaria a parecer perigoso para ele.
Então a pergunta era… quem era o verdadeiro objetivo? Jocelyn ou ele?

—Não tem outra coisa a fazer que me acompanhar ao povoado?


—Está-me dizendo que não desfruta do prazer de minha companhia, esposa?
Jocelyn suspirou e pôs-se a rir com alegria.
—Quando você está perto não consigo fazer nada. As coisas se torcem e sempre acabamos…
—Nus? —acrescentou ele lhe tirando a cesta das mãos e lhe oferecendo seu braço—. E
gemendo?
—Está tentando me provocar, Connor. Hoje tenho que visitar duas casas e não poderei
fazê-lo com você —levantou o olhar para ele—. Não é eu não goste de acabar nua e
gemendo com você.
Queria ou não, Connor não ia separar- se de seu lado. O último acidente tinha ocorrido
fazia já cinco dias. Se ia ocorrer lhe algo logo, queria estar perto para poder protegê-la.
Também tinha falado como Duncan e Rurik e lhes tinha pedido que estivessem pendentes
de algo suspeito que vissem no castelo ou no povoado. Sem uma explicação coerente que
confirmasse sua teoria, sabia que parecia um apaixonado assustado, entretanto seus
homens o tinham escutado atentamente e tinham prometido fazer o que ele lhes pedia.
Tivesse sido mais fácil se tivesse podido implicar também às mulheres, possivelmente
Rhona. Mas acreditava que era melhor e menos arriscado para ela que ninguém soubesse
no momento de suas suspeitas.
Seus planos se viram truncados quando Duncan foi a seu encontro e anunciou que deviam
sair para caçar para reunir provisões para o inverno. Sentiu o desejo de não ir, mas Jocelyn
lhe prometeu que ficaria no povoado até que ele retornasse.
Estavam a ponto de retornar já quando ocorreu o desastre.
Connor se encontrava junto a seu cavalo esperando a que seus homens atassem as presas a
carroça quando viu sair um javali dentre as árvores próximas. O animal se deteve e
levantou o focinho para cheirar o ar. Connor não ia armado, por isso fez um gesto para que
ninguém se movesse, com a esperança de que o javali não se sentisse atacado. Rurik não
teve tempo de lhe lançar a lança antes de que o animal pusesse-se a correr e avançasse
contra Connor.
Sentiu as presas afundar-se em sua perna no momento em que viu voar a lança de Rurik.
Connor caiu ao chão e viu como o sangue que emanava da ferida fazia um atoleiro na terra
em poucos segundos.
Duncan chegou a seu lado enquanto Rurik se assegurava de que o javali estava morto.
Connor sabia que estava a ponto de perder o sentido, mas tinha que lhe contar a alguém
que Jocelyn estava em perigo.
—Duncan —disse agarrando a sua primo do braço—. Jocelyn corre perigo. Alguém…
alguém tenta… lhe machucar.
Duncan rasgou a túnica e lhe atou o tecido ao redor da ferida.
—Quem tenta machucá-la?
—Não sei, mas sei que está em perigo —lhe custava respirar—. Leva-a a meu quarto.
Ninguém mais.
—O que diz de Jocelyn? —perguntou Rurik.
O bosque parecia estar convertendo-se em um buraco escuro.
—Rurik, protege-a com sua vida —lhe disse ao viking—. Com sua vida.
Rurik lhe agarrou a mão e prometeu:
—Com minha vida, Connor.
Com a segurança de que Rurik morreria antes de permitir que algo acontecesse a Jocelyn,
Connor soltou o ar que tinha nos pulmões e deixou que todo ficasse às escuras.

Dezoito

O ruído de cavalos atravessando o povoado atraiu sua atenção, mas em seguida voltou a
concentrar-se no bebê que tinha em braços enquanto sua mãe preparava a comida. Rhona
dizia que eram atividades impróprias de uma dama, mas Jocelyn preferia se sentir útil a
passar o dia mexericando sobre a vida na côrte ou outras coisas igualmente frívolas. Estava
deixando ao pequeno em seu berço quando alguém arronbou a porta da granja e a jogou de
lado.
Estavam sendo atacando? Jocelyn se interpôs entre a porta e o berço e procurou uma arma
com a que defender-se. Mas foi Rurik o que entrou na modesta casa dizendo seu nome.
—Jocelyn, venha comigo —lhe pediu com uma voz suave que a inquietou mais que se lhe
tivesse gritado.
—O que foi, Rurik?
O viking não lhe deu explicação alguma, só a agarrou pelo pulso e a tirou dali. Uma vez
fora, viu-se rodeada de soldados. Algo ia mal. Antes de que pudesse lhe perguntar de novo,
Rurik montou a seu cavalo e a subiu também. Só bastou um movimento de cabeça para
que o resto de homens se agrupassem a seu redor e ficassem em marcha ao uníssono.
—Rurik, me diga o que foi.
—Fale baixo, Jocelyn. Connor sofreu um acidente de caça e o levam ao castelo, vão há
alguns metros na nossa frente.
—Um acidente? Está…? —não podia dizer a palavra que estava pensando.
—Não, não o estava quando me separei deles para ir em sua busca. Acredita que está em
perigo e me pediu que te proteja.
—O que aconteceu?
Mas não recebeu resposta porque já tinham chegado ao castelo. Diante do atento olhar de
todos os presentes, Rurik a desceu do cavalo, agarrou-a pela mão e a levou ao interior da
torre sem deter-se diante de nada e nem ninguém, Jocelyn nem sequer pôde parar para
falar com Rhona quando cruzaram com ela no grande salão. Rurik se desfez dela com
apenas um olhar e continuou caminhando para os aposentos de Connor.
Uma vez ali viu muita gente ao redor do leito, mas conseguiu aproximar-se. Connor estava
muito pálido e lhe custava respirar.
—Rurik, leve-a daqui- lhe ordenou Connor.
—Connor? —Jocelyn tentou subir à cama para aproximar-se dele, mas o braço de Rurik a
rodeou e a separou de seu lado sem que pudesse fazer nada para o impedir —. Me solte,
Rurik. Alguém tem que cuidar dele. Por favor, Rurik —lhe suplicou ao ver que não podia
lutar contra sua força.
—Ailsa está a caminho —anunciou Duncan. Inclinou-se sobre o Connor e escutou suas
instruções—. Rurik, não quer que haja ninguém aqui exceto ela e Jocelyn.
O viking assentiu e a olhou.
—Fique aqui, Jocelyn.
Nesse momento o guarda permitiu a entrada de Ailsa.
—O que aconteceu?
Duncan lhe fez um resumo de como tinha sido ferido e Ailsa levantou a improvisada
atadura para examinar a ferida.
—Terá que cauterizar —decidiu a velha criadaa—. Necessito que tragam Niall da ferraria e
que traga suas ferramentas.
—O senhor disse que não devia haver ninguém exceto você e Jocelyn —Duncan repetiu as
ordens recebidas.
—A senhora e eu não podemos curar este tipo de ferida sem ajuda. O senhor confia em
Niall. Terá que trazê-lo em seguida.
—Duncan, por favor, faça o que ela diz —lhe suplicou Jocelyn.
O tecido que tinham posto ao redor da ferida e os lençóis estavam já empapados em sangue
e a hemorragia não parecia deter-se. Não bastaria costurando-lhe só lhe queimando
poderiam selar as veias e lhe salvar a vida.
Duncan acabou por acessar a mandar alguém em busca de Niall e Jocelyn pôde ir junto a
seu marido. Quando Duncan sugeriu que possivelmente uma infusão de Rhona lhe servisse
de ajuda, Rurik atalhou a sugestão com um só olhar. Como bem tinha suspeitado Jocelyn,
a relação entre o Rurik e a prima de seu marido não era nada boa.
Por fim chegou Niall e puderam dispor-se a cauterizar a ferida com a ajuda de Rurik e
outro soldado igualmente forte que seguraram Connor. Enquanto esquentavam os ferros
ao fogo, Jocelyn olhou a seu marido e se perguntou por que se cevou com eles o destino.
Justo quando começava a apaixonar-se por ele,iriam arrebatá-lo. Sentiu um suor frio nas
costas ao dar-se conta do que acabava de admitir. Durante as últimas semanas nas que
tinha visto o melhor dele depois de ter visto o pior, tinha ido lhe entregando o coração.
Sabia que ele não a amava, mas sim percebia seu carinho. O carinho não era amor, mas
possivelmente pudesse chegar a ser algum dia.
Se tinham oportunidade de continuar juntos.
—Não irá desmaiar, não é? —perguntou-lhe Rurik—. Olhe, Ailsa, ficou pálida.
—Não se preocupe por mim, Ailsa. Faça o que tenha que fazer.
Quando tudo começou, Jocelyn se colocou junto ao rosto de seu marido e lhe sussurrou
palavras de apoio. Apesar de haver três pessoas segurando-o, Connor se retorceu e
inclusive chegou a soltar um braço no momento em que o fogo roçou a ferida e o ar se
encheu de aroma de carne queimada. Jocelyn começava a pensar que de verdade ia
desmaiar quando de repente tudo acabou. Connor tinha desacordado fazia alguns minutos,
mas ela continuava lhe sussurrando ao ouvido. Depois, incapaz de falar, ajoelhou-se a seu
lado e chorou com desconsolo. O quarto ficou em silêncio e quando levantou a vista se deu
conta de que estava a sós com ele.
Ailsa, Duncan e Rurik estavam na porta falando em voz baixa e olhando-a de vez em
quando. Minutos depois os homens partiram e Ailsa voltou com compressas, uma bacia
com água e vários frasquinhos.
—O que devemos fazer agora? —perguntou Jocelyn.
—Deixou que sangrar, mas o maior perigo agora é a febre. Poderia subir a qualquer
momento.
Se não o matava a hemorragia, mataria-o a febre.
—Deveria descansar um momento, senhora, porque vai precisar de você mais tarde.
—Não poderia descansar agora, Ailsa. Pedirei que me tragam a costura —ao outro lado da
porta encontrou Duncan e ao Rurik fazendo guarda. Não a deixaram sair, mas prometeram
lhe levar o que necessitasse. Jocelyn voltou junto à cama e se fixou nos frascos de vidro que
havia sobre a bandeja—. São da Rhona?
—Não, senhora, eu tenho meus próprios ungüentos.
—Espero que lhe ajudem.
Connor dormiu várias horas, mas não deixava de mover-se por causa da febre que
começou com o ocaso do sol e piorou durante a noite. Ao princípio tremia de frio e logo
começou a suar e tiveram que banhá-lo com panos úmidos.
Assim continuou todo o dia seguinte e também a noite. Ailsa e Jocelyn foram alternando-
se para cuidá-lo e descansar depois, mas era difícil descansar sabendo quão grave estava.
Duncan permitiu que Cora entrasse para limpar o quarto e às ajudar um pouco, mas então
ficou na porta e observou cada movimento da moça como se acreditasse culpada de alguma
terrível traição. O olhar desconfiado de Duncan pôs tão nervosa a pobre Cora, que lhe caiu
das mãos uma bandeja com uma terrina de sopa e saiu correndo do quarto.
Na metade da segunda noite e apesar de que a febre continuava sendo muito alta, Jocelyn
sentiu que estava mais tranqüilo. Estava sentada junto à cama enquanto Ailsa foi
descansar em outro quarto. Estavam sozinhos.
Então se deu conta de que tinha os olhos abertos.
—Connor? —perguntou-lhe com um sussurro—. Está acordado? —antes de que pudesse
levantar-se, ele assentiu.
—Kenna, meu amor. Me alegro de vê-la.
—Connor, não sou…
—Tive um pesadelo horrível. sonhei que estava morta. Tinha encontrado a morte ao cair
pela escada. Deus, Kenna, sonhei que… —as lágrimas começaram a transbordar os olhos
avermelhados pela febre e Jocelyn soube que estava delirando.
—Tranqüilo, Connor. Descanse —lhe sussurrou tomando a mão.
Mas não podia descansar. Continuou lhe falando como se fosse Kenna, recordando coisas
que tinham feito juntos. Suas palavras lhe disseram mais do que jamais teria se atrevido a
lhe perguntar sobre seu primeiro matrimônio e o profundo amor que tinha sentido por sua
mulher. Jocelyn não se deu conta de que ela também estava chorando até que lhe acariciou
o rosto.
—Não chore, meu amor. Não deixarei que te ocorra nada ruim.
Então fechou os olhos e voltou a ficar em silêncio. Jocelyn lhe pôs a mão na testa, seguia
ardendo. Como era possível que um homem que tinha amado a sua mulher tão loucamente
fosse acusado de havê-la assassinado? Sentou-se sem afastar o olhar dele. A seguinte voz
não despertou, mas bem a tirou do sono com um sobressalto.
—Kenna! —gritou tão forte, que Rurik entrou correndo.
Connor continuou gritando o nome de sua esposa morta como se pudesse vê-la.
—Quer que fique aqui? —ofereceu-se o viking.
—Chamarei se precisar —assegurou Jocelyn com um sorriso de agradecimento.
Durante as seguintes horas e escutando os gritos de desespero de seu marido, Jocelyn
descobriu toda a verdade que lhe tinha oculto ao mundo inteiro. Connor gritava o nome da
Kenna e depois lhe suplicava que o perdoasse uma e outra vez, mas era evidente que ele
não a tinha matado.
Ela tinha tirado a vida.
Destroçada por não poder lhe dar a seu marido o herdeiro que necessitava, o menino que
ambos desejavam, Kenna tinha se matado. Acreditando que essa era a única maneira de
liberá-lo para que procurasse outra esposa que pudesse lhe dar filhos, Kenna tinha
sacrificado a si mesma pelo homem a que amava, sem saber que com isso também estava
destruindo a ele.
Quando Connor a tinha encontrado no alto da escada e tinha adivinhado o que planejava
fazer, tinha tentado impedir-lhe. Tinha-lhe prometido encontrar outro modo de solucionar
as coisas, mas ela tinha dado um passo para diante e se lançou à morte. Jocelyn sabia que a
febre estava fazendo que visse a cena uma e outra vez. Quando por fim se acalmou, Jocelyn
olhou à porta com lágrimas nos olhos e descobriu que Duncan tinha estado ali todo o
tempo e tinha ouvido a confissão.
—Não deve saber jamais que sabemos, Duncan. Não pode saber que quebrou a promessa
que fez a ela.
—Jocelyn… —ele também estava chorando.
—Me prometa que não o dirá. Sofreu muito para protegê-la, tentando que sua alma
descansasse com a paz que não teve em vida —ao ver que Duncan não respondia, Jocelyn
foi a ele e o agarrou pela camisa—. Me prometa.
—Não o direi a ninguém —disse por fim.
Soltou-o e voltou junto ao leito de seu marido e lhe umedeceu a testa com um pano úmido
com a esperança de que isso o ajudasse a descansar. Pouco depois voltou a falar com
Kenna, mas dessa vez falava de seu coração. Quando por fim dormiu, Jocelyn soube que
não importava o que lhe desse, quão bem cumprisse com suas obrigações ou quantos filhos
tivesse com ele, jamais obteria dele o que agora sabia que desejava.
Seu coração. Seu amor.
Quando pela manhã seu marido se despediu da mulher que amava, Jocelyn soube que
nunca poderia amar a outra.

Connor levou a mão à cara sem saber por que lhe doía tanto o corpo e encontrou barba
onde não havido antes. Levantou a cabeça, estava em seu dormitório, mas parecia a cena
de uma batalha. Havia sangre seco no chão e ataduras por toda parte.
Tinha a boca seca, por isso tentou agarrar a taça que via na mesinha, mas o braço não lhe
respondia. Nãorestava outra opção que esperar a que alguém entrasse. Minutos mais tarde,
ou possivelmente muito mais, viu entrar no Rurik a avivar o fogo.
—Poderia me pôr essa taça nos lábios? —perguntou-lhe com uma voz que não reconhecia.
—Pelo Tor! Está acordado! —gritou Rurik, e automaticamente levou a mão à boca e olhou
à cadeira que havia junto à cama.
Jocelyn dormia nela e devia estar muito cansada porque não se alterou com o grito.
—Pensei que não sairia desta, Conn.
—O que aconteceu? —perguntou-lhe quando por fim pôde beber.
—Não recorda o javali?
Connor bebeu outro gole enquanto pensava nisso.
—Sim, saiu dentre as árvores —baixou o olhar para a perna e recordou a ferida e a dor.
—Connor —sua voz suave estava cheia de preocupação e carinho.
—Jocelyn —só podia dizer seu nome enquanto via em seu rosto a evidência do tempo que
levava sem descansar realmente.
—Está realmente acordado desta vez? —ficou de pé junto a ele.
—Tinha despertado antes? —perguntou tentando recordar—. Quanto tempo dormi?
Rurik e Jocelyn se olharam para calculá-lo.
—Três dias com suas noites —disse Rurik.
—E você esteve aqui todo o tempo? —perguntou-lhe quando por fim conseguiu estirar o
braço e pegar sua mão. A expressão de seu rosto parecia indecifrável.
—Sim, Connor.
—A princípio seguíamos suas ordens de mantê-la aqui, mas logo não houve maneira de
tirá-la do quarto.
—Minhas ordens? —tentou recordar o que havia dito, mas estava tudo muito impreciso.
—Disse que Jocelyn devia ficar aqui com você. Disse que…
Não chegou a terminar porque a chegada de Duncan o impediu. Contra o que Connor teria
desejado, Jocelyn lhe soltou a mão e se afastou para deixar espaço para Duncan. Pelo
modo em que olhava seu primo, Connor soube que deviam falar em particular. Voltou a
olhar para Jocelyn.
—Obrigado por seus cuidados, esposa —ela se limitou a assentir. Tinha aspecto de estar a
ponto de cair derrotada de cansaço—. Precisa descansar.
—Você também.
Naquele momento chegou Ailsa e o examinou atentamente antes de sorrir.
—Parece que está tudo bem.
Todos os pressente respiraram aliviados pela primeira vez desde muitos dias.
—Jocelyn, tem que descansar —insistiu Connor.
—Se de verdade estiver bem, irei —disse dando-se meia volta para a porta, mas apenas se
moveu quando perdeu as forças. Rurik a agarrou a tempo.
—Levarei-a a seu quarto e farei guarda na porta.
Connor tinha uma idéia melhor.
—Esta cama é o bastante grande para que ambos descansemos bem. Deita-a aqui.
Alguns minutos depois Jocelyn dormia profundamente a seu lado. Ailsa ficou satisfeita de
que ambos pudessem descansar e Duncan prometeu voltar depois para falar com ele. Rurik
saiu do quarto e se sentou na porta. O sono ameaçava apoderando-se dele, o viking se
deixou levar sabendo que Jocelyn estava a salvo junto a seu marido.

Dezenove

A recuperação de Connor foi muito lenta. Os músculos da perna não se curaram tão rápido
como esperava, a menos que desejasse que Rurik o levasse nos ombros, estava prisioneiro
no quarto.
Jocelyn voltou para o seu nessa mesma noite. Esse dia tinham despertado com as mãos
entrelaçadas, mas ela não tinha demorado para levantar-se e não havia retornado. Quando
tinha tentado lhe dar um beijo um pouco menos casto que os que agora lhe dedicava ela,
Jocelyn tinha murmurado algo sobre não lhe fazer machucar a perna e tinha escapado.
Quando Duncan lhe contou que a febre lhe tinha feito gritar o nome de Kenna uma e outra
vez, Connor se perguntou se não teria assustado Jocelyn. Se havia dito algo mais em
sonhos, ninguém quis contar-lhe. Rurik lhe explicou que alguns acreditavam que a febre
era um castigo de Deus por seus pecados; com muito tato, o viking não especificou quais
pecados. Mas também lhe disse que havia outros que pensavam que ao sobreviver tinha
sido absolvido de ditos pecados. Depois encolheu os ombros e foi em busca de alguém com
quem brigar até que ele estivesse recuperado.
Sem nenhuma prova que demonstrasse suas suspeitas à margem do que lhe dizia o
instinto, Connor não decidiu contar a Duncan nada sobre o perigo no que acreditava estar
Jocelyn. Só lhe pediu que lhe atribuísse um soldado discreto que cuidasse dela em todo
momento até que pudesse fazê-lo ele.
Por muitas voltas que dava a todos aqueles acidentes não conseguia encontrar nenhuma
conexão entre eles, e entretanto sabia que havia. Além disso havia algo que não conseguia
recordar, mas que estava aí em algum canto de sua memória. Até que pudesse lembrar,
esperaria vigilante.
Dougal anunciou que ficaria em Lairig Dubh até que Connor se recuperasse, o que
significava que também ficariam Jean e Rhona. Jocelyn não disse que desejasse que
partissem, assim Connor se alegrou de que lhe fizessem companhia. Além disso pareciam
exercer certa influência positiva nela porque tinha começado a vestir com outras cores que
não fossem o marrom e o verde.
Connor tinha sobrevivido e Jocelyn não havia voltado a sofrer nenhum ataque e entretanto
algo tinha mudado entre eles. O estranho era que Connor sabia que não tinha sido por sua
parte. Graças aos estranhos sonhos que tinha tido durante a febre, sentia-se por fim
preparado para deixar para trás o passado.
Nunca esqueceria Kenna nem deixaria de amá-la, mas as conversas que tinha mantido com
ela em sonhos lhe tinham permitido despedir-se dela de algum modo. O que seguiria como
antes seria a história de que ele a tinha matado, mas ninguém se atreveria a lhe fazer
nenhuma pergunta a respeito.
Sua alma poderia descansar em paz.
Connor descobriu também que tendo fechado as feridas do passado, tinha ficado um
espaço em seu coração para voltar a amar. Desgraçadamente, a mulher que amava não
parecia interessada. Cada vez que tentava lhe falar do que sentia, ela mudava de tema e não
demorava para partir. Não rechaçou seus esforços de retomar suas relações uma vez que
pôde chegar as escadas. Depois de seu primeiro jantar no grande salão, tinham descoberto
juntos que a paixão que sentiam o um pelo outro não se viu afetada pela ferida.
Mas continuava havendo algum problema e Connor ia solucioná-lo, mas antes devia
averiguar do que se tratava. Não podia permitir que sua esposa fosse menos feliz do que o a
ele era agora que por fim tinha descoberto que a amava.

—Conn —o chamou Rurik.


Com uma só palavra, Connor soube que a surpresa que tinha planejado para Jocelyn estava
preparada.
—Jocelyn, poderia vir ao salão?
—Espera alguém, Connor? —perguntou, surpresa—. Deveria trocar de roupa?
Connor sorriu diante de tão delicioso toque de paquera.
—Não, só me acompanhe.
Olhou-o com certa desconfiança, mas aceitou fazer o que lhe pedia. Ao chegar ao grande
salão e ver que efetivamente havia gente, Jocelyn deu ordens de preparar comida e bebida
para os convidados. Estava tão ocupada em seu papel de anfitriã, que nem se deu conta de
quem eram. Quando por fim os olhou, ficou boquiaberta.
—Papai! Athdar! —exclamou como se estivesse vendo fantasmas. Depois se voltou a olhá-lo
com lágrimas nos olhos e tanta alegria no rosto, que Connor esteve a ponto de de chorar
também.
Depois de fundir-se em um abraço com seu irmão e seu pai, que certamente acreditava que
não voltaria a ver sua filha com vida depois de havê-la a entregue à Besta, Jocelyn foi
apresentá-lo ao marido.
—Connor, conhece meu pai?
Connor se aproximou do homem e lhe estendeu a mão.
—Não. Realizamos as negociações através de um intermediário. Bem-vindo a Broch Dubh.
Antes de que pudesse impedi-lo, Tavish MacCallum se ajoelhou diante dele e o mesmo
fizeram seus homens.
—Não faça isso —lhe pediu Connor ajudando-o a levantar-se—. Agora somos uma família.
Vamos celebrar a visita com uma cerveja.
Se Jocelyn continuasse olhando-o como o estava olhando em cada momento, Connor
acabaria por acreditar que aquela expressão bastaria para continuar vivendo o resto de sua
vida. Mas não queria sua gratidão, a não ser seu amor.
—Você sabia? Sabia que viriam e não me disse isso? —perguntou-lhe emocionada
enquanto se dirigiam à mesa.
—Não haveria a surpresa se houvesse dito isso —Connor deu uma olhada aos MacCallum e
se aproximou de lhe dizer algo ao ouvido a sua esposa—. Acredito que estão surpresos de
vê-la com vida.
—Connor!
—É verdade. Com certeza esperavam que já tivesse morrido e agora acreditarão que vou
matá-la aqui mesmo —acrescentou rindo.
—Você procurou por isso, marido —replicou Jocelyn—. Você criou esse medo nas pessoas.
Mas meu pai devia acreditar que era um homem honrado, se não, não teria permitido que
me casasse com você —acrescentou agarrando-o pelo braço.
—Permitido? Eu acredito que o fato de salvar a vida de seu irmão e todo o clã deveria
influenciar em algo —não continuou falando porque os MacCallum se aproximavam—. Não
obstante, deveria advertir a seu irmão de que não volte a provocar Rurik outra vez.
—A Rurik? Brigou com Rurik?
—Como acha que se machucou tanto? —olhou-a à cara e viu nela a resposta—. Acreditava
que eu o tinha feito?
Jocelyn não respondeu, mas o rubor de seu rosto confirmou a resposta. Já não lhe
surpreendia que todo mundo pensasse o pior dele, afinal, nunca tinha feito nada para
desmentir as barbaridades que se diziam dele.
—Athdar menosprezou meu nome e, se por acaso fosse pouco, insultou a dignidade do
Rurik e já sabe o valor que lhe dá a sua dignidade.
—E com razão —sussurrou Jocelyn ao recordar a cena no bosque.
Seu marido arregalou e pôs a rir.
Durante a seguinte hora, Jocelyn escutou a ambas as partes falarem das melhorias
experimentadas pelo clã MacCallum e dos planos de futuro. Em todo momento, Connor
tratou a seu pai com muito respeito e inclusive afeiçoado apesar de que sem dúvida
pensava que tinha fracassado ao perder o controle de sua família e de seu clã. De vez em
quando Jocelyn olhava aos prsentes, aquelas caras que fazia tanto tempo que não via, e se
sentia agradecida a Connor por ter feito possível o reencontro.
Não demorou para descobrir que todos no castelo estavam sabendo da visita surpresa e
inclusive tinham preparado quartos para seu pai e seu irmão. Se era assim como ia tratá-la
sempre, possivelmente pudesse ser feliz a seu lado embora Connor não pudesse nunca lhe
dar o amor que ela sentia por ele.

—Aqui tem a infusão que tanto você gosta, Jocelyn —disse Rhona lhe oferecendo uma
terrina—. Pode ser que te ajude a acalmar os nervos.
Jocelyn olhou o líquido e depois à janela. Parecia-lhe muito difícil estar ali dentro
costurando enquanto que seu pai e seu irmão estavam no pátio treinando com Connor.
Embora efetivamente gostava da infusão de Rhona, dessa vez a rechaçou.
—Agradeço-lhe, Rhona, mas acredito que o que preciso é sair para dar um passeio —Cora
ficou em pé ao mesmo tempo que ela para acompanhá-la, mas Jocelyn preferia ir sozinha—
Cora, não precisarei de você até que venha a me trocar para o jantar, assim pode ficar aqui
e fazer o que quiser.
—Importa-se que te acompanhe em seu passeio, Jocelyn? —perguntou-lhe Rhona.
Teria desejado lhe dizer que preferia ir sozinha, mas quando quis dar-se conta estava
assentindo e aceitando sua companhia. Dirigiu o passeio para onde tinha pensado desde o
começo, às almenas, de ali poderia ver treinar a seu irmão e a seu pai. Rhona não demorou
para lhe perguntar por sua família, por seu irmão.
—Tenho entendido que está solteiro —comentou com naturalidade—. Possivelmente
Connor possa lhe buscar uma mulher adequada como fez com o irmão de Kenna.
Jocelyn esperou a ver se fazia algum comentário mais sobre a primeira esposa de Connor.
Rhona era virtualmente sua única fonte de informação sobre o primeiro matrimônio de seu
marido e, embora estava acostumado a limitar-se a comentários superficiais, Jocelyn
gostaria de saber mais coisas sobre ele. O que sentiu naquele momento, entretanto, foi
uma dor aguda provocada pelo nome da mulher a que amava o homem que ela amava.
Uma dor que a fez contra-atacar:
—E você, Rhona? Por que não pede a Connor que lhe arranje um marido?
Rhona não pôde dissimular que a tinha pêgo despreparada e começou a responder
gaguejando. Depois limpou a garganta e tentou de novo.
—Estou certa de que quando chegar o momento adequado, o fará. Mas no momento não
tenho nenhuma pressa.
O vento se levantou com força nas almenas até o ponto de que parecer difícil falar.
—Vou voltar para dentro, Jocelyn. Vem ou quer continuar passeando?
Por uma parte desejava continuar com a conversa, pois intuía que havia algo mais na
opinião de Rhona sobre o matrimônio, algo que teria gostado de descobrir. Não obstante,
decidiu ficar e desfrutar das vistas.
—Vou ficar um pouco mais, Rhona. Possivelmente logo possamos continuar falando dos
dotes de casamenteiro de Connor.
Se sua condição de nobre o tivesse permitido, Rhona teria corrido escada abaixo naquele
mesmo instante. Mas não o fez, olhou-a com verdadeiro terror e depois se deu meia volta e
partiu caminhando, embora muito rápido.
Assim que Rhona se afastou, o vento se acalmou como por magia e Jocelyn apareceu pela
almena para ver quem havia no pátio. Seu pai e seu irmão continuavam treinando, mas
alguns de seus homens se dirigiam já ao castelo.
Foi o mais alto desses homens o que atraiu sua atenção, inclusive de longe.
Era Ewan MacRae.
Ewan estava ali.
Como se a tivesse ouvido pensar nele, Ewan levantou o olhar e a viu no alto da almena.
Então a saudou com a mão e ao Jocelyn lhe encolheu o coração. Separou-se do grupo e foi
direto à escada, para ela.
Jocelyn se deu meia volta e apoiou as costas no muro. Ardiam-lhe as bochechas e lhe
suavam as mãos. Não havia tornado a vê-lo desde o dia que partiu para converter-se em
esposa de Connor. O que ia dizer lhe? O que lhe diria ele? Seus olhares se encontraram
assim que ele apareceu na almena. Jocelyn secou as mãos no vestido e esperou a que se
aproximasse.
De repente lhe pareceu incrivelmente jovem. Depois de haver-se acostumado a Connor,
Ewan lhe parecia agora um menino. Deteve-se um passo dela e a olhou, depois se
aproximou um pouco mais e a estreitou em seus braços.
—Jocelyn —sussurrou ao abraçá-la—. Está bem?
Recordou seu aroma e a sensação de estar em seus braços.
—Ewan. Senti a sua falta —deixou que a força de sua presença a tranqüilizasse.
—Sinto muito a morte de sua mãe. E sinto que não pudesse estar lá.
Ao dar-se conta de que continuava em seus braços, Jocelyn se afastou, mas lhe reteve a
mão entre as suas enquanto falavam de sua mãe. Gostava de poder falar dela com alguém
que a tivesse conhecido.
—É feliz aqui, Jocelyn? Estive muito preocupado por você desde que partiu.
Jocelyn suspirou.
—Sou feliz, Ewan. Ele… não é a Besta que todo mundo acha.
As palavras acabavam de sair de sua boca quando ouviu passos a suas costas e se voltou
para encontrar ali à criatura cuja existência acabava de negar. Levava semanas sem ver a
fúria refletida em seu rosto e quase tinha chegado a esquecer o aspecto que tinha quando
lhe fervia o sangue.
Tinha ido em sua busca para lhe perguntar se queria que convidassem a seu irmão a ficar
mais tempo. Ao não encontrá-la no quarto de costura com Rhona, nem em seus aposentos,
nem na cozinha com Murdoch, tinha imaginado que tinha saído. Por fim Cora lhe tinha
confirmado que se foi dar um passeio. Com essa informação tinha sido fácil encontrá-la em
seu canto secreto.
Tinha-a visto de baixo… com um homem. Tinha visto também como esse homem a
estreitava em seus braços. Connor não recordava ter decidido que ia subir, mas seus passos
se encaminharam às almenas de maneira inconsciente. Quando por fim tinha chegado, o
homem continuava tendo sua mão entre as dele.
Até que Jocelyn o viu.
Retirou a mão e limpou as duas no vestido como fazia sempre que estava nervosa. O
homem que havia junto a ela empalideceu ao vê-lo. Melhor. Devia ter medo a aproximar-se
de sua mulher.
—Connor —disse ela colocando-se entre o homem e ele. Acaso pretendia proteger a aquele
intruso de seu próprio marido?—. Este é Ewan MacRae, de Kintale —Connor assentiu, mas
não lhe estendeu a mão. O homem, mas bem moço, olhou-o nos olhos e assentiu também.
Incrivelmente, tentou colocar-se entre Jocelyn e ele como se quizesse protegê-la—. Ewan
se criou conosco, na casa de meu pai.
Claro. Connor olhou a ambos compreendendo-o tudo. Era uma tradição entre os clãs que o
menino que se criava com outra família acabasse casando-se com a filha de dita família e
assim ambos os clãs ficavam unidos. Teria sido esse seu plano?
—É o filho mais velho? —perguntou-lhe Connor.
—Não, senhor, tenho um irmão maior que eu.
Connor sorriu. A filha de um clã tão pobre como MacCallum não era o bastante boa para o
filho maior e herdeiro. Sem dúvida entre os pais de ambos haveria algum tipo de vínculo
de amizade ou de dívida que os tinha unido. Provavelmente tinham estado apaixonados.
Mas agora devia lhe mostrar o que significava ser a esposa da Besta.
—Eu gostaria de falar com você, esposa —anunciou agarrando-a pela mão.
O jovem MacRae ficou de lado e depois se despediu dela.
—Verei-a no jantar, Jocelyn.
—Lady MacLerie —lhe corrigiu Connor cravando nele o pior de seus olhares.
—Lady MacLerie —repetiu ele.
Connor não afastou o olhar de sua esposa enquanto ela via o moço se afastar. Depois
olhou a ele.
—Queria falar comigo?
—Em particular —lhe disse a puxanso pela escada.
Jocelyn não disse nada, só o seguiu, mas quando o ritmo se fez muito lento, Connor a
levantou nos braços e a levou assim até seu dormitório sem lhe importar quem pudesse vê-
los. Só queria fazê-la sua, assegurar-se de que soubesse que era dele.
—Não deveria ter feito isso, Connor —lhe disse uma vez se encontraram dentro do
dormitório e com a porta fechada.
—Não gostei de vê-la nos braços de outro homem —admitiu—. Não deveria me haver
provocado desse modo —disse tirando o cinturão que lhe segurava o tartán.
—Referia-me a me trazer nos braços. Poderia haver aberto a ferida —ela também tirou o
vestido e ficou olhando-o só com a camisola lhe cobrindo o corpo—. Não desejaria voltar a
passar o que passei aqueles dias junto a sua cama.
Connor sorriu ao ver que estava preocupada com ele, mas ainda mais ao ver como se o
evidenciavam os mamilos através da camisola.
—Por que tira o vestido?
—Porque me custou muito costurá-lo e não quero que rasgue
—Então te arrancarei a camisola.
—Por que tem que me arrancar algo? Tem-me aqui e há tempo.
—Não se trata disso, Jocelyn. Trata-se de que te encontrei nos braços de outro homem —
confessou aproximando-se dela—. Não diz nada? Encontrei-a em seus braços, Jocelyn!
Jocelyn lhe acariciou a bochecha brandamente como se fosse um gatinho ferido e não um
marido furioso.
—Ele não é o que construiu meu castelo, Connor.
Aquelas palavras o desarmaram pois demonstravam que entendia seu temor.
—Mataria-o se pensasse que o é —puxou-a e a beijou na boca.
—Não tem por que estar ciumento.
—Não se trata disso —disse lhe mordiscando os lábios—. É muito mais que isso… É desejo
—o beijo se fez mais e mais intenso enquanto suas mãos penetravam por debaixo da
camisola, já rasgada—. É posse. Porque… você é minha —sussurrou enquanto a levava a
parede e a possuía ali mesmo.
Dessa vez alcançaram o clímax juntos, um com o nome do outro nos lábios. Jocelyn
reconheceu que era dele e só dele. Connor a tinha deixado marcada com seu amor e, se o
desejasse, ela poderia fazer o mesmo porque ele era seu também.
Vinte

—Não posso acreditar que o tenha feito —protestou Jocelyn olhando a marca que o besta
de seu marido lhe tinha feito no seio—. Não posso acreditar que o tenha feito onde todo
mundo pode vê-lo.
—Onde ele possa vê-lo —matizou ele com um travesso sorriso nos lábios enquanto
levantava sua taça para as demais mesas, mas Jocelyn sabia que era a Ewan a quem olhava.
—É insofrível.
—Encontrou já a outra marca que te deixei, só para seus olhos?
Jocelyn engasgou ao ouvir aquilo. Tinham-no feito tantas vezes aquela tarde, que a marca
poderia estar em qualquer parte… em qualquer.
—Não tem por que preocupar-se, Connor. Só acreditei que amava Ewan, mas agora sei que
amo você.
Connor se voltou a olhá-la ao ouvir suas palavras e então ela se deu conta do que acabava
de confessar. Não tinha planejado fazê-lo, pois sabia que a colocava em uma posição muito
vulnerável tendo em conta que ele nunca poderia amá-la.
Connor tomou a mão e a levou a boca para beijar-lhe
—Muito obrigado por essas palavras, Jocelyn.
E então tudo desapareceu a seu redor e foi como se estivessem sozinhos na enorme sala.
Seus olhares se juntaram e Jocelyn viu em seus olhos o brilho de uma intensa emoção que
a fez derreter. Não era só paixão, era algo mais profundo, algo que lhe acelerou o coração.
Não demoraram para ter que voltar para a realidade, obrigados pelas palavras do
Murdoch, que anunciaram algo que Jocelyn não compreendeu. Quando quis dar-se conta,
o centro do salão se encheu de músicos e os convidados se puseram em pé para dançar.
—E isto? —perguntou-lhe Jocelyn, surpreendida.
—Uma vez alguém me perguntou se sabia me divertir que não fosse lutando e queria
demonstrar que sim sei —respondeu Connor com um enorme sorriso nos lábios—. Além
disso pensei que ficaria bem um pouco de música para celebrar a visita de seu pai.
Os músicos começaram a tocar e o coração de Jocelyn dançou ao ritmo de música. Connor
fazia tudo aquilo por ela e o tinha feito recordando umas palavras que havia dito possuída
pela raiva dos primeiros dias ali. Como tinha podido recordá-lo? Sabia que não se
equivocou ao apaixonar-se por ele e a seguinte canção acabou de demonstrar-lhe.
Siusan se colocou entre os músicos e depois das primeiras notas começou a cantar. Jocelyn
não podia acreditar o que estava ouvindo.
Era a canção preferida de sua mãe.
Sentiu a mão do Connor sobre a sua e pôs-se a chorar.
—Como sabia?
—Ouvi você falar com as mulheres do povoado.
E o tinha recordado após.
—Quer dançar comigo?
Olhou à improvisada pista, ali estava seu irmão dançando com uma moça do povoado e seu
pai dando palmadas.
—Sim.
Tinha que saber o que sentia por ela. Connor acreditava que suas ações delatavam o amor
que sentia.
Dançaram sem parar de rir e de olhar um para o outro.
Aquela noite, quando se uniram, não se tratava de posse mas sim de oferecimento, não se
tratava de paixão, mas sim de amor. Depois, Connor não partiu e em sua cama, junto a ela,
sentiu-se mais em paz do que se sentiu em anos.

Os gritos que despertaram não eram precisamente o que Connor tinha planejado para sua
primeira manhã juntos. Cora tinha entrado esperando encontrar só a sua senhora e se
assustou ao ver o chefe completamente nu. A reação de Jocelyn foi igualmente
surpreendente porque levantou da cama e começou a vomitar.
A segunda manhã não houve gritos nem interrupções porque tinham dormido no
dormitório de Connor, onde ninguém se atreveria a entrar sem sua permissão… O que foi
igual à primeira foram os vômitos de Jocelyn. A terceira manhã os encontrou de novo nos
aposentos do Jocelyn.
Quando a quarta manhã se repetiu o mal-estar do Jocelyn, Connor soube que nenhum
medicamento para o estômago lhe faria nada. Ela parecia não saber ou não querer
confrontar a verdade.
Jocelyn estava grávida.
Duas semanas depois chegou o momento de despedir dos MacCallum e Connor não pôde
suportar a tristeza que via em sua esposa. Foi essa tristeza a que o impulsionou a lhe dar
permissão para que falasse com o jovem MacRae, embora lhe pediu que fosse onde ele
pudesse vê-los; não porque não confiasse nela, a não ser para poder cuidar dela na delicada
situação em que se encontrava e da que ainda não tinham falado.
A decisão de permitir foi mais fácil que o fato de presenciá-lo. Connor preferiu lhes dar as
costas enquanto falavam. Possivelmente consciente de seu sofrimento, o pai de Jocelyn lhe
deu um tapinha no ombro e sorriu.
—Parece contente, lady MacLerie —disse Ewan depois de olhar para onde se encontrava
Connor.
—Pode me chamar Jocelyn, Ewan. Connor só pretendia aborrecê-lo quando te disse que
não me chamasse por meu nome.
Depois de ter insistido em que queria falar com o homem a quem acreditava ter amado,
Jocelyn se tinha dado conta de que já não sabia muito bem o que lhe dizer.
—Não tem medo dele? —perguntou ele.
—Faz muito tempo que não. Confesso que a princípio foi difícil, mas descobri muitas coisas
maravilhosas nele.
—E sobre nós?
—Já não há um «nós», Ewan. Sei que teríamos sido muito felizes se nos tivéssemos casado,
mas agora sou esposa dele e estou feliz assim.
Não saberia dizer que reação esperava dele, mas gostou da que recebeu. Ewan tomou a
mão e a levou aos lábios. Depois sorriu e inclinou a cabeça diante dela.
—Desejo-lhe que seja muito feliz, Jocelyn. Não, na realidade acredito que já é muito feliz.
—Espero que você também encontre a felicidade, Ewan —respondeu ela antes de seguir o
impulso de aproximar-se e lhe dar um beijo na bochecha.
Pelo modo em que se retirou Ewan, Jocelyn soube que se aproximava seu marido, assim
respirou fundo e se voltou para ele. Dessa vez não se encontrou com a besta, a não ser com
o homem, um homem que parecia muito satisfeito de si mesmo. Possivelmente porque
tinha ganho uma batalha e sabia.
Ela também sabia.

Dias depois, ao passar pela porta entreaberta do quarto de Rhona, Connor ouviu algumas
vozes que atraíram sua atenção.
—Cala, isto solucionará tudo —dizia Rhona com voz suave—. Toma um gole hoje, duas
pela manhã e três no dia seguinte, assim até que te venha a mesntruação. Pode ser que
sinta o estômago um pouco revolto, mas não deixe de tomá-lo até que comece a sangrar.
Connor continuou escutando até que segundos depois, saiu uma criada a que deteve no
corredor.
—O que fazia no quarto da senhora? —perguntou-lhe—. O que é isso que leva na mão?
A moça ficou pálida e começou a tremer.
—A senhora diz que não posso voltar com ela se estiver grávida. Meus pais necessitam do
dinheiro, senhor, assim me deu isto para resolver tudo - mostrou o frasco com uma mão
trêmula.
Connor o examinou e depois o guardou.
—E o pai?
—Quer que fique, senhor, mas a senhora diz que devo ir com ela. Vim com ela e devo ir
com ela, diz isso.
Connor considerou a situação por alg uns segundos.
—Quero que vá ao povoado agora mesmo. Pergunta pela casa de Margaret e lhe diga de
minha parte que precisa ficar lá alguns dias.
—Mas, senhor, a senhora diz que…
—Aqui o senhor sou eu e é para mim a quem deve escutar —a interrompeu Connor com
firmeza.
A moça saiu correndo sem dizer nada mais. Margaret a alojaria até que ele pudesse falar
com Rhona. Curar com ervas era uma coisa, mas aquela poção era uma coisa muito
diferente que ele não deixaria passar. Estava a ponto de bater na porta do quarto quando
recordou as instruções:
«Tome um gole hoje, duas pela manhã e três ao dia seguinte, assim até que te venhaa
mestruação. Pode ser que sinta o estômago um pouco revolto, mas não deixe de tomá-lo
até que comece a sangrar».
Se uma mulher tomava muitas dose dessa beberagem, poderia ficar muito doente. Havia
algo que lhe parecia muito familiar em tudo aquilo. Muito familiar.
Kenna tinha passado meses tentando ficar grávida e cada mês tinha chegado uma nova
decepção. Durante aquele tempo, sempre que pensava que poderiam ter concebido, Kenna
adoecia do estômago e sofria muitos dores até que começava a sangrar. Tinha acontecido
ao menos quatro vezes. A última tinha perdido ao bebê no quinto mês.
Sem deter um segundo, foi falar com Duncan, pois seu primo tinha estado ali durante
aquele tempo. Juntos foram unindo as peças como se de um quebra-cabeças se tratasse.
Tudo apontava ao mesmo lugar, ou melhor, à mesma pessoa… Rhona.
Então recordou também que em outro tempo seu pai tinha falado com o de Rhona da
possibilidade de casá-la com Connor, o pai dela tinha posto fim às conversas ao receber
uma oferta melhor.
Duncan e Dougal compartilharam com ele os rumores que circulavam sobre a prematura
morte do marido ea Rhona, uma morte que certamente ela não tinha chorado e depois da
qual se ofereceu imediatamente para viajar a Lairig Dubh. Isso tinha sido inclusive antes
de que Connor se casasse com Kenna. Depois sempre tinha estado ali, sempre com uma
palavra amável e com um remédio para tudo.
Connor sabia que tinha que afastá-la de Jocelyn e enfrentá-la. Odiava suspeitar de sua
prima, mas de repente se deu conta de que a ajuda que sempre lhe tinha prestado tinha
sido em momentos de dificuldade que ela mesma parecia ter causado.
Enviou Rurik ao povoado em busca de Jocelyn antes de ir falar com sua prima. Quando o
viking voltou com a notícia de que sua esposa não estava no povoado, Connor sentiu que o
sangue lhe gelava nas veias.

—Bebe um pouco mais, Jocelyn. Isso te acalmará as nauseia e te ajudará a descansar.


A infusão de Rhona a tinha ajudado em outras ocasiões, por isso tinha decidido lhe pedir
conselho ao ver que o mal-estar que sentia todas a manhãs não passava. Tinha chegado até
ao povoado essa manhã, mas se encontrava tão mal que tinha decidido voltar. Sentiu um
agradável calor no estômago ao engolir o líquido.
De repente se deu conta de que lhe estavam fechando os olhos e não podia centrar-se na
conversação por muito que o tentasse. Quando conseguiu abri-los viu a Rhona diante dela
movendo as mãos. Voltou a fechá-los e se deixou levar pelo calor.
Quando os abriu de novo estava caminhando junto à Rhona para a escada da torre central.
Jocelyn não pensava subir ali; Connor tinha ordenado que ninguém subisse aquela escada.
—Rhona, Connor não quer que…
—Foi ele o que me pediu que lhe trouxesse aqui, Jocelyn. Não se preocupe.
Tentou negar-se ou ao menos acreditou fazê-lo, mas algo lhe impedia de lutar contra os
desejos de Rhona. Subiram o primeiro lance de degraus e logo o segundo. Pensou em
protestar, mas não podia pensar com clareza. Rhona lhe falava com uma voz tão doce, que
só podia deixar-se levar… até que de repente se encontrou no dormitório da Kenna.
—Sabia que deveria haver-se casado comigo? —perguntou-lhe Rhona então.
—Connor? — mal podia seguir suas palavras.
—Sim. Seu pai e o meu concordaram em nos casar quando éramos crianças —não deixava
de movê-la e a Jocelyn enjoava o simples feito de tentar segui-la com a vista—. Então meu
pai sofreu um reverso e decidiu me vender a um rico velho libidinoso que devia pensar que
uma jovem virgem curaria todos os seus males.
Rhona… casar-se com Connor? Não tinha sentido.
—Sou apaixonada por Connor desde que éramos crianças, Jocelyn. Já esperei muito.
Colocou-lhe uma taça nos lábios e tratou de fazê-la beber, ao ver que não abria a boca,
tampou-lhe o nariz e Jocelyn não pôde fazer nada. Sabia que não devia engolir, mas o
líquido não deixava de entrar em sua boca.
—Quando soube de seu compromisso com Kenna, soube que tinha que parar aquele
matrimônio. Mas meu marido demorou muito em morrer e quando por fim cheguei aqui, o
casamento jpá tinha sido realizado.
A habitação começou a dar voltas a seu redor. Sabia que estava em perigo, mas o corpo não
lhe respondia.
—O pior foi ver que a amava. Tratei de lhe advertir que não era a mulher adequada para
ele, mas não me escutou.
Aquilo não estava bem. Sabia que tinha que escapar. Sua vida e a do bebê que tinha dentro
estavam em perigo.
—Não resista, Jocelyn. Não te farei mal se deixar que a beberagem faça efeito.
—Rhona, não —foi tudo o que conseguiu dizer.
—Pode ser que voltei a chegar tarde também com você. Vi como se apaixonava por Kenna e
agora vejo os mesmos sintomas —continuou falando enquanto lhe sujeitava a cabeça—.
Não é que eu não goste, não… Se eu não gostassei, morreria de um modo doloroso e
sangrento como meu marido.
—Ele não me ama, Rhona —tentou explicar-lhe mas não conseguia falar.
—Desta vez estarei aqui quando chorar sua morte. Desta vez se refugiará em mim e por fim
nos casaremos como deveríamos ter feito faz muito tempo.
Outra vez estavam caminhando, tinham saído da habitação e se dirigiam à escada. Rhona
se deteve e Jocelyn pôde ver a escada diante de seus olhos.
—Desta vez não se sentirá culpado. Ficará claro que sua morte foi um suicídio.
—Ele não me ama, Rhona.
—Não importa. Esperei muito com Kenna e Connor fez que parecesse que ele a tinha
matado. Desta vez não quero esperar.
—Rhona, não faça isso.
A voz de Connor encheu a torre inteira e Jocelyn sorriu ao ouvi-la. Tentou vê-lo, mas
estava tudo muito escuro.
—Connor, tirei Jocelyn da habitação de Kenna. Empenhou-se em desobedecer suas
ordens.
—Fique aí, Rhona —lhe pediu ele debaixo—. Eu subirei.
Ao ver que começava a subir, Rhona gritou que não continuasse. A imagem de Jocelyn
cambaleando-se ali acima lhe parou o coração. Duncan estava só uns degraus mais abaixo
e Rurik, escondido no primeiro patamar. Connor subiu um degrau mais e logo outro.
Enquanto, Rhona aproximava mais e mais Jocelyn da beira da escada.
—Solte-a, Rhona. Solte-a e me encarregarei de que vá embora daqui sem sofrer nenhum
castigo —naquele momento haveria dito qualquer coisa para salvá-la.
—Depois de que caia, será livre para voltar a se casar. Todo mundo saberá que Jocelyn se
suicidou e poderemos nos casar em seguida.
Estava louca. Completamente louca. Um passo em falso e Jocelyn morreria… se não a tinha
envenenado já.
—Sei que está se apaixonando por ela, Connor, mas desta vez não te culpará de sua morte.
Ela mesma a terá escolhido.
—O que deu a ela, Rhona? É o mesmo que deu a Kenna para que perdesse os bebês? —de
repente tudo estava muito claro.
—Sabia?
Aquele sorriso frio lhe gelou o sangue nas veias. Ouviu Duncan amaldiçoar as suas costas.
Aquela mulher tinha causado a morte de pelo menos quatro bebês.
—Não, desta vez só lhe dei uma poção para que durma. Disse que se fizer o que lhe digo,
não haverá dor.
—Dor?
—Quando cair. Eu gosto dela, Connor, de verdade. E não quero que sofra. Estou esperando
a que a poção faça efeito para que não sofra.
—Rhona, por favor, não a empurre —subiu dois degraus mais—. Se afaste da escada.
—Não será necessário, ela mesma dará o último passo. Kenna também o teria feito se você
não tivesse intervindo. Quanto tempo perdemos, Connor.
Deus. Não só tinha provocado os abortos, também tinha drogado Kenna e a tinha
empurrado para a morte. E ele não se deu conta de nada. Tinha estado tão imerso em sua
dor, que nunca tinha suspeitado de Rhona.
—Se lhe acontecer algo, prometo que não sairá daqui com vida —assegurou Connor com
todo o ódio que sentia—. Me deixe segurá-la e prepararemos tudo para que possa partir.
Subiu um degrau mais no momento em que Rhona se colocou atrás de Jocelyn, utilizando
a de escudo e, ao mesmo tempo, colocando-a na melhor posição para empurrá-la. Se o
fizesse, Connor não poderia chegar a tempo. Quanto mais se aproximava, mais conta se
dava de que Jocelyn mal podia manter-se em pé. Rhona não poderia agüentar muito
tempo. Connor lhe estendeu uma mão.
—Venha, querida. Deixa-a aí e poderemos ficar juntos —lhe disse mudando de estratégia.
—Já disse que não me ama —murmurou Jocelyn.
Connor viu com horror como lhe fraquejavam as pernas e começava a cair. Antes de que
pudesse mover-se, a flecha de Rurik se cravou no pescoço da Rhona, que morreu
imediatamente. Connor se lançou para Jocelyn e conseguiu agarrá-la no último momento.
Duncan correu a seu lado e a ajudou a segurá-la.
Estava completamente inconsciente.
Levou-a a seu dormitório e a deitou na cama. Se Rhona havia dito a verdade, Jocelyn
estava simplesmente dormindo. Mas, podia confiar na palavra de uma louca que tinha
matado a sua primeira esposa?

Vinte e um

—Encontra-se melhor?
Connor abriu os olhos ao ouvir sua voz. Estava acordada. Mas a careta de sua boca lhe
indicou que em seguida não se encontraria nada bem. Agarrando o balde, segurou-lhe a
cabeça enquanto vomitava e depois a ajudou a voltar a deitar-se.
—Encontra-se melhor?
—Sim, agora sim —sussurrou Jocelyn.
Connor levou o balde à porta, mas ao ouviu vozes se viu obrigado a abri-la.
—Está acordada —anunciou Connor.
—Bom-dia, Jocelyn —lhe disse Rurik da porta—. Tem bom aspecto para ter estado a ponto
de morrer.
Também estavam ali Margaret, Hamish, Duncan, Ailsa e Cora.
—Já a viram, agora vão embora —lhes ordenou Connor.
Uma vez sozinhos de novo, foi sentar se a seu lado na cama e tomou sua mão. Sabia que
tinha muitas perguntas a lhe fazer.
—Por que me perguntou se me encontrava melhor? —foi ele que perguntou primeiro.
—Agora que já sabe que Kenna não se suicidou, deve se sentir aliviado. Bom,
possivelmente aliviado não, mas…
Não sabia se devia continuar negando-o tudo ou lhe contar a verdade sobre a morte de
Kenna.
—O que lhe contou Rhona?
—Que a tinha drogado e a tinha convencido de que sua morte te libertaria. Kenna morreu
acreditando que estava lhe ajudando —Jocelyn fez uma pausa sem saber o que devia lhe
contar ou não—. Sei que acreditava que havia se suicidado porque você mesmo me disse
isso enquanto delirava pela febre. Agora já sabe que foi Rhona.
—Matou-a para poder casar-se comigo —sussurrou ele—. Assim continuo sendo o
responsável por sua morte.
—Não! —gritou ela—. Essa mulher enganou a todos. Você não podia saber que era o
causador de todos os seus problemas com a Kenna —lhe apertou a mão com força e o olhou
fixamente à cara—. Mas desta vez soube.
—Mas demorei muito em juntar para descobrir e estive a ponto de te perder.
Ficaram em silêncio por alguns segundos.
—O bebê está bem —disse ela, admitindo pela primeira vez que estava grávida.
—Então já decidiu dizer?
—Ao princípio não tinha certeza e logo temia que fosse muito cedo.
—Pode ser que isso te salvou. Se Rhona soubese, teria tentado te matar antes. Já te
provocou a enfermidade do primeiro mês.
Jocelyn sentiu que os olhos lhe enchiam de lágrimas ao recordar aquilo.
—Esqueçamos disso—disse ele lhe servindo uma taça de vinho quente—. Que mais te disse
em sonhos?
—Connor, já sei o lugar que ocupo aqui e em sua vida —lhe disse lhe dando um tapinha na
mão.
—Que lugar? —Connor não compreendia nada.
—Falou-me do amor que sentia por Kenna e disse que nunca poderia voltar a amar assim.
—Disse isso?
—Sim e o compreendo.
—Parece-me que não — cruzou de braços e a olhou com dureza—. Pensei que sim o
entendia, mas agora vejo que não.
—O que quer dizer?
—Quando convidei a sua família, quando preparei o jantar e não matei a seu primeiro
amor… pensei que minhas ações falavam por mim.
—Quer dizer que me ama? —perguntou com evidente insegurança. Uma vez mais, não se
sentia suficiente para ele.
—Durante a febre acreditei estar falando com Kenna, me despedindo dela. Despertei
sabendo que te amava, mas ao ver que você não estava interessada, optei por não lhe dizer
isso .
—Mas eu sim lhe disse isso.
—Sim e pensei que, em lugar de lhe dizer isso eu lhe tinha demonstrado isso com minhas
ações.
Jocelyn pensou em tudo o que tinha feito e se deu conta de que a mensagem estava muito
clara fazia tempo.
—Assim não matou Ewan por mim?
Connor se pôs a rir e aquela risada lhe alegrou a alma. Estreitou-a em seus braços e a
beijou até deixá-la sem fôlego.
—De agora em diante será conhecida como a mulher que domou à Besta das Highlands.
—Vamos necessitar de um trovador que conte a história.
—Se encarregue de encontrá-lo, lady MacLerie.
—Farei isso, senhor.
Mas uma coisa levou a outra e passou algum tempo até que os dois retomaram suas
obrigações em Lairig Dubh.

Epílogo

Nas longas noites de inverno se conta a história da Besta que vagava pelas Terras Altas da
Escócia. Era tão fera a criatura, que até os homens mais valentes a temiam.
Seu nome se utilizava como maldição quando um perigo espreitava. E as mulheres
rezavam para não encontrar-se nunca com ele.
E como em muitas histórias que se contam nas longas noites de inverno, esperava-se que o
amor o conquistasse tudo e a bela domasse à besta.
Entretanto aquela besta foi capturada por uma mulher a que ninguém considerava bela e
que o amansou ao dar a luz ao filho que tanto tinham desejado.
Ao final da história sim foi o amor o que o conquistou tudo e amansou à besta.

FIM
***
HYPERLINK \l "INDIQUE"
RESENHA BIBLIOGRÁFICA
Terri Brisbin
Terri Brisbin começou a ler novelas românticas em 1991, com os livros da Julie Garwood.
Pouco tempo depois se deu conta que ela mesma poderia escrever histórias de amor e ficou
mãos à obra. Foi em 1998 quando fez sua estréia com a publicação de sua novela Ao Love
Through Teme. E após tem escrito 16 romances históricos e paranormais para a editorial
Harlequin, sendo duas vezes finalista ao prêmio Rita.
Quando não está escrevendo passa seu tempo como mamãe de três meninos e uma nora e
como higienista dental no sul de Nova Pulôver. Atualmente também forma parte da Junta
diretiva de Escritores Românticos da América.Dedica seu tempo livre a trabalhar como
voluntário dando classes de leitura para adultos.

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