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Dedicatória

Para Griffin, meu rapaz escocês, e


para o povo de High River, Alberta, onde
parte deste livro foi escrito antes do
dilúvio.
Mantenham-se fortes!
Sinopse
Uma maldição antiga, um casal de fantasmas
intrometidos, uma mulher em fuga, e um fatídico
mal-entendido podem criar a chance perfeita para um
verdadeiro amor.
Lady Caroline Forrester do esquema de seu
irmão de casá-la com o mais alto solicitante. Uma
fuga à Escócia oferece uma chance de emprego como
governanta e a liberdade de um casamento infeliz —
era a solução perfeita. Mas Caroline não estava
preparada para os sentimentos que seu novo
empregador despertaria nela.
Alec McNabb, o relutante conde de Glenlorne,
nunca esperava retornar à Escócia. Mas, agora aquele
ele está lá, ele percebe que tem obrigações das quais
ele não pode escapar. Alec precisa fazer um bom
casamento e rápido.
Quando um caso de erro de identidade -
juntamente com a sensual e mágica atmosfera do
castelo de Glenlorne - resulta em um apaixonado
encontro, Caroline e Alec devem decidir se a atração
deles é o suficiente para superar os problemas de seus
passados, ou se a chance de um verdadeiro amor
acabou antes de começar...

Prólogo

— Angus MacNabb!
Não havia paz em sua própria sepultura?
Ele havia sido atormentado o suficiente na vida. Ele fechou os
olhos com força e tentou ignorar a voz suave que o chamava, atraindo-o,
puxando-o de volta ao mundo, mesmo sabendo que ela era a única pessoa
que conseguiria.
— MacNabb, eu sei que você pode me ouvir. Pare de ser teimoso
e saia. Nós não estaríamos aqui se não fosse por sua tolice, e você vai me
ajudar a consertar isso.
— Teimosa! — Retrucou Angus, incapaz de resistir ao aguilhão.
— Isso não é o caso do sujo falando para o mal lavado? — Ele parou e
olhou. Georgiana estava reluzente no ar diante dele.
Ele piscou, imaginando se estava vendo um fantasma, então
lembrou, que ele estava.
Mesmo morta, Georgiana possuía o poder de roubar-lhe o fôlego
— se ele tivesse algum fôlego para roubar. Ela inclinou a cabeça e sorriu
para ele, do jeito que ele se lembrava. Fazia quase sessenta anos desde que
ele vira aquele sorriso, mas ele nunca se esquecera. Percorria através dele
agora como a própria vida, enchendo-o de paixão e dor.
Georgiana Forrester, a falecida condessa de Somerson, ergueu as
sobrancelhas como se esperasse que ele terminasse seu comentário, mas ele
não o fez. Como ele podia falar enquanto os olhos dela percorriam o plaid
escocês com o qual ele havia sido enterrado? Ele parecia melhor quando
estava vivo, então endireitou orgulhosamente seus ombros, e a boina do
Laird em sua cabeça.
— É um belo vestido esse que você está usando. Você ainda
parece uma menina. — Minha menina.
Georgiana olhou para o cetim prateado com uma careta de
desgosto.
— Eu detesto este vestido. Eu casei com Somerson com ele, e
eles o escolheram para o meu enterro. A única coisa boa que posso dizer é
que ainda se encaixa, perfeitamente, depois de todos esses anos. Eu não sei
como eles o encontraram. Eu pedi a minha donzela para queimá-lo.
MacNabb franziu a testa e uma das penas de águia na boina caiu
sobre seu olho. As três penas o proclamavam Laird de seu clã, chefe de
todas as rochas, touceiras de capim e crianças famintas, até onde os olhos
conseguiam ver da decadente torre do velho Castelo Glenlorne, onde
estavam agora. Ali havia sido o seu lugar de encontro até... A raiva antiga e
familiar explodiu.
— Somerson! — Ele cuspiu o nome, preenchendo-o com sessenta
anos de ódio. — Só um idiota, tolo, enterraria sua esposa em seu vestido de
casamento.
O queixo de Georgiana se elevou.
— Você disse que havia gostado. Além disso, o dia do meu
casamento e o dia do meu enterro foram igualmente dolorosos. Eu acho que
foi uma escolha muito apropriada.
MacNabb suspirou e a brisa se moveu através das copas das
árvores para além das paredes, em ruínas, da torre.
— Sim, bom, é por isso que estamos aqui, para debater nossas
roupas de sepultura?
Ele olhou ao redor da torre, agora aberta para o céu, o telhado há
muito desaparecido. As madeiras podres das janelas emolduravam uma
vista do vale, do lago e do novo castelo de Glenlorne, no extremo oposto do
vale. A nova fortaleza, que já contava com mais de cento e cinquenta anos,
parecia tão decrépita quanto esta torre que era mais antiga, por quatro
séculos. Ele suspirou novamente.
Se ele se virasse e desviasse o olhar para o leste, seria capaz de
ver o chalé do tio de Georgiana, Lullach Grange, mas ele manteve as costas
viradas. Ele passou sessenta anos observando a casa vazia, com uma vela na
janela, o sinal de que ela devia encontrá-lo aqui, na torre, mas a luz se
apagou quando as famílias os separaram para sempre. A amargura familiar
foi realçada novamente, ainda, e ele se virou para encará-la.
— O que você quer de mim, mulher? — Ele perguntou
rispidamente.
Os olhos dela permaneciam calmos, sem medo.
— Você nos amaldiçoou, Angus.
— Eu possuía motivos suficientes!
Ela balançou a cabeça, seu sorriso melancólico.
— Nós estávamos apaixonados, e eles não nos deixariam casar,
mas sua maldição ecoou por duas gerações de nossas duas famílias. Deve
terminar. Quero que minha neta conheça o tipo de felicidade que
compartilhamos, Angus.
— Foi felicidade? Isso tornou o resto de nossas vidas,
insuportável. Bem, no meu caso foi assim. Não posso falar por você, é
claro. Não houve um dia em que ele não tivesse pensado nela. Seu nome
havia sido a última palavra em seus lábios.
Ela olhou para a mão onde a aliança de casamento estivera uma
vez. A herança de família, agora enfeitava a mão da atual condessa. Era
outro anel, o que Angus lhe dera para selar seu amor, um anel de promessa
com um pequeno rubi.
— Nenhum de nós teve alegria em nossos casamentos. — Ela
acenou com a mão para indicar a torre. — A última felicidade verdadeira
que senti foi aqui, naquela noite em que passei em seus braços.
Angus podia ver o lugar do qual ela falava, através de sua
imagem transparente, o local protegido onde eles estiveram juntos,
embrulhados em sua manta, alternadamente, fazendo amor e sussurrando
sobre o futuro, se comprometendo um com o outro. Suas mãos se fecharam
querendo tocá-la. Eles poderiam se tocar? Ele não sabia, mas alcançá-la e
fechar os braços no ar vazio novamente, seria demais para suportar.
— Você veio em um momento ruim, gràdhach, — disse ele,
deixando o termo em gaélico para — amada — escorregar de sua língua.
Ele poderia ter mordido a língua em duas, quando ela sorriu docemente para
ele. — Meu filho acabou de morrer e meu clã ficou sem líder. Minha nora
está tentando vender à...
— Não ficou sem liderança. Você tem um neto, não tem?
— Eu tenho. Mas Alec deixou Glenlorne anos atrás, jurando que
nunca mais voltaria. Talvez seja melhor que ele não volte.
— Você não acredita nisso.
— O que resta para ele voltar para casa? — Ele perguntou, sua
boca torcendo amargamente.
Ela flutuou para ficar ao lado dele.
— Há a terra, Angus. E existe amor. O amor pode reconstruir
qualquer coisa.
Ele olhou para ela, viu a tola esperança em seus olhos. Aquele
olhar, aquela esperança o fez se apaixonar por ela, o fez acreditar que
qualquer coisa seria possível. Ele fechou os olhos contra a sensação
invadindo seu peito.
— Você não pensa realmente que eu acredito em amor, não é?
Ela estendeu a mão, colocando-a em seu braço. Ele não conseguia
sentir aquilo, mas uma luz brilhava onde suas almas se tocaram.
— Você acreditou uma vez, a filha de um inglês e um escocês,
quem teria imaginado isso naqueles tempos terríveis? Era, quase,
impossível.
— Era impossível.
Ela riu, e o som ecoou pela torre, assustando um pássaro que
voava. Ele saiu à noite com um grito assustado. Georgiana ignorou.
— Só era impossível para eles, não para nós. Eu duvido que nós
estaríamos aqui agora, juntos neste lugar novamente, se nosso amor
também tivesse morrido.
Não, o amor dele por ela nunca havia morrido. Nem mesmo aqui,
do outro lado da morte. Ele a amava ainda, mas que sentido havia nisso?
Seria uma eternidade de dor em vez de uma vida simples?
— O que isso tem a ver com Alec? — Ele perguntou. Era sua
imaginação, ou ele conseguia sentir o perfume dela?
— O nome da minha neta é Caroline. — Sua voz era suave,
afetuosa e gentil.
— Caroline? Você quer juntá-la com meu neto? Como você pode
ter certeza de que eles se adequariam? O atual conde de Somerson não
objetaria a um casamento com um Laird escocês sem dinheiro, nem... nada?
— Deixe ele para mim. Precisamos apenas deixar minha Caroline
e seu Alec juntos, lembrá-los, talvez, de... — Ela lançou um olhar
significativo para o local do encontro.
— Ela possui algum dinheiro? — Perguntou implacavelmente,
tentando ignorar a lembrança terna. — Ele precisa se casar com uma moça
com uma maldita fortuna, se ele quiser salvar este lugar!
Ela dispensou sua preocupação com um aceno de mão.
— Ela tem um dote respeitável, é claro, mas isso dificilmente
importa. Eles encontrarão um caminho, mas não por amor ao dinheiro,
Angus, amor. — O som da palavra girou no ar ao redor dele. Aquilo
suavizou seu coração.
— Eu não sou contra tentar, gràdhach, mas não podemos forçá-
los a se apaixonar, ou mesmo, ter certeza que vai durar.
Ela sorriu docemente e suspirou, e as urzes brancas crescendo sob
as paredes estremeceram.
— É quase verão, Angus. Lembre-se de como era fácil se
apaixonar no verão? Tudo o que precisamos fazer é trazê-los aqui. O resto
se resolverá por si só.
Angus franziu a testa, ainda duvidando de que alguma coisa
relacionada com amor ou casamento pudesse ser assim, tão simples.
Além do santuário da torre, nuvens beligerantes cobriam a lua e o
trovão murmurava um aviso sombrio.
Uma tempestade estava prestes a descer no pacífico vale de
Glenlorne.

Capítulo 1

— Eu terei sua decisão agora, por favor.


Lady Caroline Forrester olhou para o carpete do escritório de seu
meio-irmão. Era como tudo em sua mansão em Londres: caro, elegante e
escolhido apenas para proclamar sua posição como o conde de Somerson.
Ela fixou os olhos nos redemoinhos azuis e arabescos desenhados no tapete
e se perguntou de que terra distante ele provinha, e se ela poderia ir lá,
sozinha, em vez de fazer a escolha que Somerson exigia.
— Escolha agora, — ele disse, impaciente. — Você tem duas
opções para escolher. Visconde Speed tem duas mil libras por ano e herdará
o condado de seu pai.
— Na Irlanda, — Caroline sussurrou, baixinho. Speed também
apresentava a pele oleosa, perpetuamente úmida e um pouco de espinhas, e
só se interessava por ela porque seu dote o enriqueceria. Pelo menos por um
curto período, até que ele gastasse seu dinheiro enquanto gastava sua
própria fortuna em amantes, bebedeiras e cavalos.
— E o senhor Mandeville possui uma boa propriedade na
fronteira com o País de Gales. A mãe dele mora lá, então ela seria uma
companhia para você.
Mandeville não passava tempos em sua propriedade rural por esse
exato motivo. Caroline estivera em Londres fazia apenas um mês, mas
ouvira a fofoca. Lady Mandeville trocava de companheiros nobres, como
Charlotte, a condessa de Somerson, devorava bolos de creme no chá. Lady
Mandeville era famosa por seu mau humor, sua língua afiada e seus
cachorros. Ela criava dúzias, talvez até centenas, de criaturinhas mal-
humoradas, desajeitadas e desagradáveis, que se comportavam como seus
amantes, se as histórias sussurradas fossem consideradas. A mulher infeliz o
suficiente para se tornar a esposa de Lorde Mandeville, serviria como a
companheira da velha até que um deles morresse, sem possibilidade de
deixar o posto para um trabalho mais agradável.
— Então, qual cavalheiro você escolherá? — Perguntou
Somerson, andando de um lado para o outro, com a postura rígida, as mãos
cruzadas atrás das costas, o rosto sóbrio. Caroline riu quando ele disse a ela,
pela primeira vez, que os dois homens haviam se oferecido para pedir a
mão dela. Mas não era uma piada. Seu meio-irmão realmente esperava que
ela escolhesse um dos odiosos pretendentes que ele selecionou para ela para
o resto de sua vida. Ele olhou para ela empinando o nariz adunco, uma
característica herdada de seu pai, junto com seus olhos pálidos e
esbugalhados. Caroline se parecia com a mãe, a segunda esposa do falecido
conde, e era provavelmente por isso que Somerson não suportava a visão
dela. Quando jovem, ele teria protestado contra a nova noiva de seu pai,
porque ela era muito jovem, bonita demais, e a filha de um mero baronete,
sem fortuna ou grandes conexões. Ele se opusera até ao cabelo ruivo da
nova condessa. Caroline levantou a mão para colocar um cacho castanho
avermelhado atrás da orelha. Speed tinha cabelo ruivo, laranja na verdade, e
cílios rosados e finos.
Caroline pensou em sua sobrinha, Lottie, que estava no andar de
cima com o vestido de noiva sendo ajustado, discutindo com sua mãe sobre
que tom de fita seria mais adequado às flores do buquê. Ela estava se
casando com William Rutherford, o visconde Mears, o William de Caroline,
o homem que ela conhecera a vida toda, o filho mais velho e herdeiro do
conde de Halliwell, um vizinho e amigo querido de seus pais. Sempre foi
esperado que ela se casasse com um dos filhos de Halliwell, mas Sinjon, o
filho mais novo do conde, havia saído de casa para se juntar ao exército e ir
à guerra, em vez de propor a Caroline. E agora William, que até Caroline
achava que faria uma oferta por sua mão, escolheu Lottie. Caroline fechou
os olhos. Estava começando a parecer uma maldição. Não que isso
importasse agora. William fizera sua escolha. Ainda assim, um casamento
deveria ser uma coisa feliz, a noiva tão alegre quanto Lottie, um futuro
aguardado com as possibilidades de amor e felicidade.
Caroline nem gostava de seus pretendentes — bom, eles não eram
realmente seus pretendentes — eles estavam cortejando seu dote e uma
conexão com Somerson. Eles precisavam do dinheiro dela, mas não
precisavam dela.
— É realmente uma escolha tão difícil? Você tem vinte e dois
anos de idade. É tempo da essência. — Somerson disse friamente. —
Certamente um cavalheiro se destaca em sua estima. Você acha Speed um
bom homem, ou talvez a conversa de Mandeville seja mais agradável?
Não e não!
Ela olhou para seu meio-irmão, vinte e quatro anos mais velho, e
um dos mais poderosos condes do reino, pronta para defender seu caso, mas
viu imediatamente que isso era inútil. Casou-se com a filha de um conde
igualmente poderoso, teve nove filhos e parecia feliz o suficiente com sua
esposa, embora Charlotte fosse feia, fofoqueira e glutona. Ela pesava
muitos quilos e nunca ficava sem um prato de doces perto da mão.
Speed era a versão masculina de Charlotte. Somerson era como
Mandeville, obcecado com sua própria importância.
Não, não faria sentido discutir ou recusar. Somerson decidiria,
mesmo que ela não o fizesse, não conseguiria. O estômago de Caroline
revirou e ela fechou a boca. O rosto de seu meio-irmão estava tenso e sem a
menor simpatia. Ela era simplesmente uma questão que ele queria resolver
o mais rápido e silenciosamente possível. Caroline era um fardo indesejado
agora que sua mãe estava morta. Ela sabia que ele escolheria por ela, se ela
se recusasse a fazê-lo, e era impossível dizer qual cavalheiro seria pior. Ela
se mexeu, o que o fez parar de andar para encará-la como uma ave de
rapina.
— Caroline? — Ele perguntou.
As vinhas enroladas no tapete ameaçavam se levantar e sufocá-la,
embora sua própria desgraça já estivesse fazendo bem o trabalho.
Ela forçou um sorriso.
— Eu prometi a Lottie que a ajudaria a escolher um vestido para
sua viagem de casamento. Realmente tivemos tantas coisas para fazer para
as núpcias. Com isso eu não tive um momento para pensar sobre o meu
próprio futuro, — ela disse o mais calma possível, torcendo o anel de rubi,
legado de sua mãe, em seu dedo.
— Já faz dois dias, — advertiu Somerson. — Quanto tempo
levará para fazer uma escolha tão simples?
Caroline fechou os olhos. Não era simples. Ela tinha sido uma
criança sentimental e crescera para ser uma jovem mulher com ideias
apaixonadas sobre como o romance e o casamento deveriam ser. Ela sempre
achou que saberia, no momento que pusesse os olhos no homem com quem
gostaria de se casar. Ela sentiria uma onda de amor que a aqueceria dos
dedos dos pés até a cabeça, e os anjos cantariam. Ela sentiu apenas horror
quando olhou para Mandeville e Speed. Sua pele se arrepiou e gritos
grunhiram um aviso.
Fuja.
A ideia sussurrou em seu ouvido.
Ela engoliu em seco e encontrou os olhos de Somerson,
preparando coragem para recusar, mas o gelo em sua expressão a paralisou.
Ela havia sido criada para ser obediente, mesmo quando o jugo a irritava.
— Amanhã vou lhe dizer minha decisão.
Os olhos dele se estreitaram como se ele suspeitasse de um
truque. Ela aumentou o sorriso até doer.
— No café da manhã, está claro? — Ele disse finalmente.
— Perfeitamente, — ela murmurou. — Posso ir?
Mas ele já havia se afastado, como se tivesse coisas mais
importantes para pensar e ela tivesse ocupado muito do seu tempo. Ela
observou as costas dele e saiu do escritório.
No andar de cima, Charlotte gritava com a modista, batendo na
pobre mulher porque ela não estava ajustando adequadamente a cintura de
Lottie. Caroline sentiu pena da modista — já passava da meia-noite e era a
terceira vez que Charlotte mudava de ideia sobre o vestido de casamento de
sua filha. Caroline não tinha a menor dúvida de que Charlotte deixaria a
meia-irmã de seu marido se casar usando um saco de aniagem, se resolvesse
o problema mais rapidamente e tirasse Caroline de vista e da sua mente,
para sempre.
Uma porta distante bateu e uma serviçal desceu correndo os
degraus, quase colidindo com Caroline.
A pobre garota estava corada, e ela quase tropeçou tentando fazer
uma reverência e correndo ao mesmo tempo.
— Oh! Desculpe-me, minha senhora, mas mais tortas de caramelo
são necessárias no andar de cima e rápido. — Ela correu pelo corredor que
conduzia à cozinha como um coelho assustado.
Caroline colocou a mão no corrimão. Ela levantou o pé, colocou-
o no primeiro degrau e parou.
Houve outra alta objeção no andar de cima, e Lottie explodiu em
lágrimas barulhentas.
Caroline recuou. Ela deveria subir para ajudar a acalmar sua
sobrinha, ou ir à cama e pensar sobre sua escolha, mas não havia sentido
nisso. Ela nunca poderia escolher Speed ou Mandeville.
Fuja.
Ela se virou, perguntando-se se alguém havia falado, mas não
havia ninguém lá, apenas a capa e o chapéu da modista, pendurados em um
cabideiro ao lado da porta da frente.
Fuja.
Caroline pegou o manto, colocou-o sobre os ombros e colocou o
chapéu. O trinco da porta de latão estava frio sob a palma de sua mão. Seu
coração batia forte. Outro grito de raiva ecoou pelas escadas, e ela abriu a
porta e saiu, fechando-a atrás dela, cortando o terrível som. Por um
momento, ela ficou no degrau da frente, olhando para cima e para baixo na
rua escura, imaginando qual caminho seguir. Era outra escolha — e ela não
podia esperar até a manhã para fazer. Respirando fundo, ela puxou o capuz
para perto do rosto e virou à direita.
Ela se afastou das luzes de Somerson House, movendo-se pelas
sombras. Se alguém se incomodasse em procurá-la hoje à noite, eles a
descobririam. Senão, até Somerson entenderia sua escolha quando ele se
sentasse para o café da manhã.

Capítulo 2

Alec MacNabb levantou a gola do casaco para esconder o rosto


enquanto abria a porta do quarto da condessa Bray. Ele deslizou para dentro
do quarto escuro e fechou a porta, parando por um momento com a mão no
trinco para deixar seus olhos se ajustarem à escuridão, e para ver se a
senhora se sentaria em sua cama e gritaria. Prendeu a respiração e escutou o
tique-taque de um relógio, tão alto quanto um martelo.
A forma arredondada sob o edredom não se movia, exceto para
emitir um ronco suave. Ele exalou e sorriu. A condessa estava claramente
exausta, tendo dançado metade da noite no baile de lady Elsley. Ele
examinou a sala procurando um lugar para começar.
A delicadeza dos móveis brancos o tornava ciente do fato de que
ele era muito alto, muito escuro, muito masculino para tal espaço. Se ela
abrisse os olhos, provavelmente pensaria que os escoceses estavam
invadindo, saqueando, estuprando e matando mulheres em suas camas. Ele
olhou a cama ironicamente. A condessa Bray seria a última dama, na terra,
que ele desejaria violentar. Roubar, no entanto, era outro assunto.
Ele foi até a penteadeira. As joias que ela usara para o baile
haviam sido, descuidadamente, deixadas a brilhar entre seus frascos de
perfume e pentes, mas ele as ignorou e abriu a gaveta, passando pelos
lenços de renda, procurando o painel oculto. Que dama com segredos como
a condessa de Bray não teria tal esconderijo? Ela era presunçosa o bastante
para não suspeitar que alguém viesse roubar esses segredos e que o ladrão
soubesse exatamente onde encontrá-los. Todas as mulheres possuíam os
mesmos esconderijos para seus recibos, seus diários, as bugigangas que os
amantes lhes davam, e toda mulher achava que ninguém os encontraria. A
madeira se moveu sob seus dedos e deu um leve, mas satisfatório, clique. A
senhora na cama suspirou, virou-se e ele congelou onde estava, esperando
até que sua respiração ficasse profunda e uniforme, novamente.
Com cuidado, retirou o painel e colocou-o em cima da
penteadeira. Um colar brilhava maliciosamente e teria escorregado e caído
no chão se ele não o tivesse capturado. As gemas aquecidas em sua mão
como um amante, brilhavam para ele. Ele reconheceu a pedra — o famoso
rubi Bray. A joia impecável brilhou como uma gota de sangue nobre, as
pérolas brilharam e os diamantes piscaram para ele, coquetes. Por um
momento, ficou tentado. O colar traria fortuna suficiente para comprar
livros e novos vestidos para suas irmãs, e manter suas despensas cheias por
semanas. Ele provavelmente poderia reconstruir o castelo da família em
ruínas e reabastecê-lo também. Ele franziu a testa e colocou o colar de lado,
como se estivesse queimando. Por sua própria escolha, Glenlorne não era
sua preocupação, e ele possuía um trabalho a fazer. Chegou novamente ao
esconderijo da penteadeira e fechou a mão sobre o que ele procurava, um
maço de cartas, amarrado com fita. Ele pegou as cartas com um sorriso. Ele
era bom nisso, e isso estava se tornando quase fácil.
Seu cotovelo bateu contra um frasco de perfume, e ele assistiu
com horror quando o frasco oscilou na borda da penteadeira por uma fração
de segundo, antes de cair no chão e quebrar. O aroma de rosas encheu o ar
quando a condessa se mexeu e se sentou na cama. Alec congelou nas
sombras com as cartas em suas mãos, silenciosamente amaldiçoando sua
falta de jeito e os poucos esconderijos do quarto, para um escocês de um
metro e oitenta.
No começo, ela não olhou para ver o que a havia perturbado.
Pegou um frasco na mesa de cabeceira e abriu-o com dedos sonolentos,
adicionou algumas gotas a um copo de água e bebeu profundamente,
afundando-se no travesseiro.
O cheiro amargo encheu o ar. Láudano, Alec soltou um suspiro
silencioso e passou a mão trêmula pelo cabelo. Tudo o que ele precisava
fazer era esperar que a droga funcionasse e fugir quando a condessa
adormecesse novamente, mas ela se virou para se deitar de costas, e ele
estava diretamente em sua linha de visão.
Seu primeiro som foi apenas um grunhido de surpresa, mas Alec
sabia que ela gritaria em seguida, agora que ela o vira. Sua única escolha
era dar o fora o mais rápido possível. Ele correu para a porta.
Ele teria conseguido se não fosse pelo vidro quebrado e pelo
perfume derramado. Aquilo tornou o piso escorregadio e ele escorregou,
aterrissou com força com as mãos e joelhos e largou as cartas. A fita se
soltou e elas caíram no chão igual folhas ao redor dele.
Enquanto os gritos da condessa tomavam força, ele correu para os
envelopes, no escuro, xingando em gaélico enquanto o perfume encharcava
os joelhos de suas calças, ferindo os lugares onde os cacos de vidro
mordiam sua carne como cães de guarda afiados.
No momento em que ele recuperou os pés, a condessa estava
sentada, olhando para ele, a boca larga na escuridão, os lençóis agarrados ao
peito, os gritos ensurdecedores. Ele não fazia ideia de que uma Lady
pudesse gritar tão incessantemente, sem sequer parar para respirar. Ele abriu
a porta, e seu alarme o seguiu pelo corredor quando ele foi até a janela no
final, seu ponto de entrada e sua rota de fuga. Ouviu passos atrás dele,
batendo ao longo do corredor, e esperou que parassem para checar a
condessa primeiro e lhe darem preciosos segundos. A janela estava bem à
frente e ele curvou os ombros, preparou-se e pulou. Ele caiu pela abertura,
batendo o ombro no batente, sentindo o ar da noite. Ignorou a dor e rolou
pelo telhado da varanda e caiu pesadamente no chão. Havia cacos de vidro
nos joelhos, e nas mãos também, e ele resmungou quando cacos renovaram
o ataque deles.
Ele ainda conseguia ouvir os gritos enquanto fugia. Certamente
toda a família e metade dos vizinhos estavam acordados agora.
Ele ouviu o grito da janela, uma voz masculina, de barítono para a
de soprano da senhora, em uma ópera cômica muito ruim.
— Pare, ladrão! — Mas Alec estava correndo sobre as pedras
lisas, rezando para que ele não escorregasse, rezando para que a condessa
Bray não tivesse conseguido dar uma boa olhada nele. Ele não parou até
estar bem longe e com a certeza de que não estava sendo seguido. Entrou no
beco mais escuro que encontrou e se encolheu contra a parede, com o
coração batendo contra as costelas, os pulmões ardendo e, ele rezou para
que quem quer que estivesse à espreita no beco não fosse pior do que os que
o perseguiam.
Nada. Os únicos espreitando eram do tipo de quatro patas, gatos,
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os esperançosos moggies à procura de comida.
Ele saiu à luz da rua, olhou para o sangue em seus dedos, viu o
brilho do vidro. Usou os dentes para tirar os cacos dos cortes e os cuspiu.
Ele deu um tapinha no bolso, certificando-se de que as cartas ainda estavam
seguras contra seu coração acelerado, tirou um frasco de uísque do casaco e
bebeu. Havia mais sangue nos joelhos, mas isso precisaria esperar até que
ele estivesse em casa.
Ele estava de volta ao seu quarto em meia hora, depois de uma
dúzia de ruas e toda uma classe social longe da elegante casa da cidade em
Mayfair, de Lorde Bray. Serviu-se de um copo de uísque e esvaziou os
bolsos, largando as cartas amassadas e ensanguentadas sobre a mesa,
acalmando as batidas do seu coração. Ele deixou cair suas calças e fez uma
careta quando tirou os cacos de seus joelhos.
Ele amaldiçoou em voz alta. Ele não costumava ser desajeitado.
Na verdade, era o melhor — espião — que a Coroa possuía, a quem eles
chamavam para as missões mais importantes e sensíveis. Mas ele sabia que
sempre havia uma chance de ser pego. Custava apenas um pequeno erro.
Como derrubar um frasco de perfume. Ele fechou os olhos enquanto jogava
o último pedaço de vidro com aroma de rosas no penico. Ele cruzou o
quarto e jogou água fria sobre o rosto, e encarou seus próprios olhos vazios
no pequeno espelho oval. Ele parecia o que ele era, uma criatura dura e
desesperada da noite, de cabelos escuros, olhos cinzentos, musculoso, um
ladrão, um homem sem lar, sem família, sem honra. Ele se virou e olhou às
cartas na mesa. Não havia necessidade de se preocupar. Mesmo que a
missão não tivesse saído exatamente de acordo com o planejado, ele não
havia falhado. Ele estava com as cartas pelas quais ele fora enviado. Passou
perto, mas ele não havia sido pego.
Olhou de relance às cartas, oito envelopes que eram importantes o
suficiente para a Coroa pedir a um homem que arriscasse a vida e as pernas
para recuperá-las. Ele se perguntou o que havia nelas que poderia ser tão
prejudicial, mas não era seu trabalho fazer perguntas. Ele era esperado para
roubá-las, não as ler. Amanhã ele as entregaria, e o problema que as cartas
representavam, qualquer que fosse, seria resolvido. Ele olhou para o
relógio. Ainda faltavam várias horas até o amanhecer. Ele não queria
dormir. Ele nunca dormiu depois de uma de suas excursões. Ele se sentou e
tomou uísque e desejou que estivesse no Ceilão, onde sua família acreditava
que ele estava. Ele deixou Glenlorne oito anos atrás, se gabando de como
pretendia fazer uma fortuna com plantação nas terras do sul. Ele nunca
havia chegado mais longe do que Londres, e ele não era um plantador. Ele
era um ladrão.
Voltou-se para as cartas e as empilhou o mais cuidadosamente
possível, dadas as suas condições esfarrapadas, ou, a falta completa de
condições. Elas até tinham sangue nas bordas. Observou o selo real nos
envelopes, as bordas douradas do caro papel de carta. Cartas importantes,
de fato. Disseram-lhe que havia oito cartas ao todo, uma coleção de
pensamentos românticos, indiscretos, descuidadamente colocados no papel,
provas irrefutáveis de um caso real, de muito tempo atrás. O conteúdo das
cartas se tornou uma ameaça para alguém importante, uma fonte potencial
de constrangimento ou escândalo à Coroa, talvez, até mesmo uma
chantagem — e foi por isso que ele foi enviado para buscá-las de volta,
antes de qualquer dano que não pudesse ser desfeito. Ele contou as cartas
enquanto as empilhava. Sua garganta se fechou e ele contou novamente.
E mais uma vez: Sete
Ele procurou seus bolsos, olhou no chão. Não estava lá.
Ele sentou-se pesadamente na cadeira e passou a mão no rosto.
Ela caiu, ele a perdeu na rua, ou a deixou para trás, no quarto de Lady Bray.
Isso, claro, significava um desastre. Seu estômago se transformou
em água, e ele xingou amaldiçoando seu descuido.
Puxou o casaco e saiu na noite escura mais uma vez.
Ele precisava encontrar a carta que faltava.

Capítulo 3
Caroline corria e bateu em uma parede que parecia ter aparecido
do nada, bem no meio da calçada escura. Ela bateu na superfície dura como
se não pesasse nada. Se não fosse pelas mãos que seguravam a frente da
capa, ela teria caído na rua suja.
Por um instante ela ficou presa na figura escura e aterrorizante
enquanto ele a arrastava à luz da lâmpada de rua mais próxima e pairava
sobre ela. O gosto amargo do medo lhe secou a garganta, e ela esfregou as
mãos enluvadas inutilmente com os dedos trêmulos. Ele conseguia vê-la,
mas com a luz atrás dele, ele era apenas uma sombra enorme e sinistra. Seu
coração começou a bater, e ela quase desejou estar na segurança de sua
casa.
Quase.
Ela tentou se afastar, correr, mas ele a segurou tão facilmente
como se ela fosse uma criança, sem força alguma. O medo real passou
através dela como fumaça, deixando-a ainda mais fraca. Será que Somerson
a viu sair de casa e o mandou atrás dela? Se era um lacaio, não era alguém
que ela conhecia, nem usava o uniforme de Somerson. Ele estava vestido de
preto da cabeça aos pés, como parte da noite. O terror transformou seus
joelhos em geleia, e ela caiu, mas ele a levantou e a colocou de pé, sem
soltá-la. Um punho segurou o manto dela sob o queixo.
— O que diabos você está fazendo andando pelas ruas no escuro?
— Ele perguntou. — Eu poderia ter cortado sua garganta, pensando que
você fosse um batedor de carteiras!
O riso histérico borbulhava em sua garganta. Ele pensava que ela
era alguém para ter medo?
— Eu não sou! — Ela protestou, recuando, saindo de seu aperto.
Ele a soltou e ela recuou para outra parede, uma parede verdadeira dessa
vez. Ela encolheu-se contra a parede, colocou as palmas das mãos sobre os
tijolos ásperos. — Eu não vi você. Eu devo ter tropeçado no meu manto. É
emprestado, você vê, e...
— Emprestado? — Ele rosnou. Ela detectou uma trepidação em
sua voz, um sotaque de algum tipo. Ela sentiu os olhos dele examinando-a,
avaliando-a, e ela sabia o que ele estava pensando. Uma dama sozinha, na
rua, e desconhecida em Mayfair, especialmente à noite, com roupas que não
eram dela. Suas bochechas aqueciam apesar do frio úmido no ar.
Ela se empurrou mais para trás na parede, temendo que o
cavalheiro estivesse prestes a enganchar os dedos em seu manto emprestado
mais uma vez e o tolo a levasse de volta para Somerson House.
Se, claro, ele fosse um cavalheiro. Seu coração pulou em sua
garganta e ali permaneceu, tornando impossível falar alguma coisa. Ela não
conseguia gritar, ou implorar, ou raciocinar com seu captor.
— Onde você está indo a esta hora da noite? — Ele perguntou.
A boca de Caroline trabalhou silenciosamente enquanto sua
mente procurava uma resposta para isso. Para onde ela estava indo? Ela
nem havia pensado nisso quando saiu correndo de Somerson House.
— Norte. — A palavra surgiu em sua cabeça e para fora de sua
boca antes que ela soubesse que ia dizer. — Eu estou indo para o norte, —
ela disse novamente, testando, gostando. A propriedade de Somerson em
Northumbria, onde crescera, ficava ao norte. Mas seria o primeiro lugar que
ele procuraria por ela.
— Escócia? Gretna Green, talvez? — A sombra exigia.
— Escócia? — Ela resmungou como se fosse uma idiota que
nunca ouvira falar do lugar.
— Casar em segredo? Você está fugindo, não é?
— Casar? — Ela engasgou. Se ele soubesse que era bem o
contrário!
— Eu imploro que reconsidere seus planos. Você não deveria
vagar pelas ruas sozinha, e se o seu pretendente fosse melhor tipo de
homem, ele não a colocaria em tal perigo. Você faria melhor indo direto
para casa e esquecendo isto.
— Não! — Ela chorou. Ele inclinou a cabeça, e a luz da lâmpada
acariciou o lado direito de seu rosto, revelando uma mandíbula forte, uma
bochecha alta, uma sobrancelha larga e uma mecha de cabelos escuros. Um
olho brilhante olhou para ela, aguçado como o de um corvo. Ela engoliu em
seco. — Não, eu não posso ir para casa. Vou encontrá-lo no Ram's Head
Inn. Não é de onde as diligências partem?
A sobrancelha escura que ela podia ver alcançou o couro
cabeludo dele.
— Você vai pegar um transporte público? Na estação? O tolo
poderia ter, pelo menos, acordado em pagar por um lugar no Royal Mail. —
Ele ficou tenso. A mão dele agarrou seu cotovelo tão de repente que ela se
encolheu. — Oh! Moça, ele não é digno de você! Eu tenho três irmãs e se
algum homem ousas...
Ela puxou o braço do seu aperto. Ela não podia voltar atrás agora.
Se ele soubesse o que ela estava enfrentando, se ele pudesse imaginar por
um instante o que as próprias irmãs dele fariam se confrontadas com aquilo.
Tal escolha como a dela, ele a deixaria seguir seu caminho, mas quase não
havia tempo para explicar.
— Por favor, diga-me o caminho! — Ela olhou para baixo, na rua,
esperando ver um bando de lacaios de Somerson vindo atrás dela,
carregando tochas e garfos, trazendo o cãozinho terrível de Charlotte em
uma corda para farejar o rastro dela.
Ele mudou os pés na calçada, e o som a fez pular. Ela engoliu em
seco, cerrou os punhos dentro de sua capa, e agarrou a si mesma.
— Você tem certeza de que não vai mudar de ideia e me deixar
levá-la para casa? Você não tem nenhuma bagagem, — ele ponderou. — Ou
luvas.
— Tudo foi enviado à frente, — disse ela sem fôlego. Ela teria
que passar ao lado dele para fugir, mas no escuro, ele parecia tão largo
quanto era alto. Ele poderia pará-la facilmente. Ele provavelmente poderia
quebrá-la ao meio se quisesse. Ela começou a seguir a parede, preparando-
se para levantar suas saias e correr, ela deveria ser deixada para trás, e
estava começando a parecer como se ele estivesse junto com todos de
Somerson House.
— Você tem algum dinheiro?
Isso a impediu. Ela sentiu o sangue drenar de seus membros. Ela
não poderia entrar em uma carruagem ou até mesmo alojar-se, sem
dinheiro. Ela sentiu o sangue quente inundar seu rosto. Ela deve ter
brilhado, tão iluminada quanto a lâmpada da rua, pois ele suspirou.
— Não importa, eu posso ver que você não tem.
Ele pegou a mão dela e virou-a na sua, o couro de sua luva contra
sua pele, e deixou cair uma bolsa em sua palma e cruzou os dedos sobre ela.
— Desde que você está determinada a seguir este curso tolo e
perigoso de ação, permita-me garantir que você atinja o seu objetivo da
maneira mais segura possível. Pegue a carruagem da correspondência, não
outra. É mais rápido e menos propenso a ser incomodado por salteadores da
estrada, embora você não tenha nada para roubar. Só embarque se houver
outra mulher na viagem, está claro?
Suas bochechas ardiam ainda mais. O que ele devia pensar dela,
uma garota tola fugindo de casa para um futuro incerto? Ela devia parecer
muito mais jovem do que seus vinte e dois anos, e tão sombria quanto uma
maçã sem polimento. Ela engoliu em seco, levantou o queixo e assentiu,
tentando parecer uma mulher do mundo. Ele estava esmagando o anel da
mãe dela, contra seu dedo com o aperto dele. Isso a fez lembrar que possuía
um item de valor consigo. Não suportava pensar nele nas mãos de um
ladrão comum ou de um ladrão de estrada. Este homem mostrava sua
bondade e uma dama pagava suas dívidas.
Ela puxou a mão da dele e tirou o anel. Ele brilhava como uma
gota de sangue na luz amarela da lamparina.
— Permita-me recompensá-lo, senhor. Garanto-lhe que não tenho
o hábito de receber dinheiro de cavalheiros que não conheço. — Ele não o
tocou, e ela empurrou para ele. — Tome isso. Melhor você do que um
ladrão de estrada.
Ele pegou-o da mão dela, segurou-o com cuidado entre o polegar
e o indicador e o estudou. Ele estava se perguntando se a pedra era
verdadeira? Ela não esperou que ele decidisse, começou a andar, movendo-
se tão rapidamente quanto conseguia, sem correr. Ela ergueu a cabeça com
confiança, orgulhosa, mas seus ouvidos prestaram atenção no som de passos
atrás dela, mas só havia silêncio.
Caroline olhou para trás, mas a rua atrás dela estava vazia. Ela
engoliu em seco e sentiu um arrepio de medo percorrer sua espinha. Ela
estava verdadeiramente sozinha, então. Ela desacelerou por um instante,
imaginando se era tarde demais para se virar, voltar e... Começou a chover,
as pesadas gotas batendo contra o capuz da capa.
Escócia. Somerson procuraria por ela lá? Ele procuraria por ela
ou ela desapareceria como uma carga indesejada removida de seus ombros?
Caroline engoliu em seco. Seja qual for o seu futuro, não incluía o
Visconde Speed ou o Lorde Mandeville.
Ela sentiu o peso reconfortante da bolsa de seu benfeitor em seu
bolso, e apertou a capa ao redor de seus ombros contra a chuva, e retomou a
longa caminhada para pegar a carruagem do correio.
Alec sentiu uma onda de aborrecimento. Ele possuía coisas para
fazer, coisas mais importantes do que proteger a missão de uma idiota. Ele
deveria estar procurando nas ruas pela maldita carta, como vinha fazendo
quando ela quase o derrubou.
Ele a seguiu, permanecendo nas sombras, porque ela era linda e
sozinha e precisava da proteção de alguém. Seu rosto, que ele avistara sob a
sombra de seu capuz, ficara branco à luz da lâmpada, o medo tão palpável
quanto sua determinação de ver sua missão terminar.
Ela o lembrava de suas meias-irmãs, especialmente porque ela
era, mais ou menos, da mesma idade que Megan, a mais velha. Esperava
fervorosamente que nenhuma de suas irmãs fizesse algo tão estúpido quanto
essa mulher estava prestes a fazer. Com toda a probabilidade, ela acabaria
solteira, arruinada por seu amante inútil, e forçada a voltar para sua família
assim que percebesse que fora enganada. Ela passaria o resto de sua vida
escondida, um embaraço para seus parentes. Essa aventura seria suficiente
para sustentá-la pelos anos de arrependimento? Sua família provavelmente
não faria nada para encontrar o bastardo, já que isso só aumentaria o
escândalo. Alec cerrou os punhos. Ele caçaria qualquer homem que ousasse
prejudicar alguém que ele amasse.
Mas ele não amava essa mulher. Ele nem sequer a conhecia, mal
conseguira dar uma boa olhada nela no escuro. Então, por que ele a estava
seguindo? Curiosidade, talvez, ou culpa, porque ele nunca estaria lá para
proteger suas irmãs se elas precisassem dele, talvez nunca mais as visse
novamente. Ele se perguntou quem seria essa mulher, se ela tinha um irmão
que falhou quando ela precisou dele. Talvez ela fosse uma criada, ele
decidiu. O anel de rubi que ela lhe dera era valioso. Uma serviçal poderia
ter a chance de roubar tal joia antes de fugir de seu empregador. Sentiu uma
pontada momentânea de culpa por seu próprio, quase, roubo do colar de
Lady Bray. Ele fez uma careta, se perguntando se ele estava apoiando um
roubo. Mas por que ela lhe daria o prêmio roubado? O anel valia mais do
que ele lhe dera em moeda.
Ele estudou a figura esbelta à frente dele, caminhando com
determinação para a pousada, em seu caminho. Ela era corajosa, ela
demonstrara isso. A maioria das senhoras que ele conhecia se derreteria
como açúcar à simples menção da chuva, e nenhuma das damas que ele
conhecia seria encontrada andando pelas ruas de Londres, à noite, com ou
sem chuva. No entanto, ele decidiu que ela não era serva. Seu porte a
declarava nada menos que uma dama nascida e criada, e seu nervosismo
dizia que, apesar de sua bravura agora, ela não era acostumada a ficar
sozinha. Ele abraçou as sombras e a observou, e ficou atento a sinais de
problemas.
Ela chegou à estalagem em segurança, e Alec saiu da chuva para
os estábulos para esperar. Ele assistiu a carruagem parar, viu ela entrar.
Havia duas outras mulheres e alguns homens na jornada, todos eles de
aparência respeitável. Ela estaria segura o suficiente naquele momento.
A carruagem se afastou quando o amanhecer iluminou o céu,
tornando as ruas molhadas de Londres cor-de-rosa por alguns breves
momentos. A cor da esperança e do amor.
Ele se afastou, banindo o pensamento ridiculamente sentimental.
Em vez disso, desejou que tudo desse certo para a jovem garota, quem quer
que ela fosse.
Ele possuía seus próprios problemas para enfrentar. Ele refez seus
passos até ficar em frente da grande fachada, da elegante casa da cidade, de
Bray.
Mas a carta estava longe de ser encontrada.
Capítulo 4

Thomas Ellison, conde de Bray, esbravejou ao longo do corredor


que levava aos aposentos de sua esposa. A serva correu atrás dele, correndo
para acompanhá-lo, sem dúvida apavorada com a série de maldições que ele
deixara escapar quando ela chegou ao seu escritório para convocá-lo.
Ele estava lendo uma carta bastante interessante quando ela bateu.
Houve uma invasão incomum a noite passada. Um frasco de perfume fora
quebrado, mas o magnífico colar de Bray havia ficado intocado, em sua
penteadeira, de acordo com o lacaio, que relatou o incidente para Bray,
quando ele se levantou esta manhã, já que ninguém se atreveria a despertar
o conde, a menos que a casa estivesse prestes a queimar ao redor da cama
enquanto ele dormia, uma prancha fina de madeira foi encontrada na
câmara da condessa, com a largura exata da gaveta da mesinha, junto com
uma única carta contendo o selo do Príncipe de Gales. Ellison não levou
muito tempo para descobrir o que havia acontecido. Ele possuía várias
gavetas com painéis secretos, embora nenhuma tivesse sido tocada. O que
quer que o ladrão quisesse, estava em posse de sua mulher. O lacaio lhe
entregou a carta em uma bandeja de prata, junto com um pedaço
esfarrapado de fita azul. Leu a carta endereçada para sua esposa, e escrita
no tipo de linguagem íntima que não deixava dúvidas de um caso, Bray
percebeu que devia haver outras cartas, amarradas com a fita, talvez de
amantes diferentes.
Leu a carta de novo e mais uma vez observou as palavras
afetuosas escritas pela letra familiar do príncipe. Quantas vezes ele havia
recebido notas de Prinny, escritas na mesma papelaria, gravadas a ouro,
convidando-o para um encontro ou um jantar, ou uma noite de jogos?
A primeira impressão de Bray foi de admiração. Elizabeth atraiu o
príncipe de Gales? Depois da segunda leitura, percebeu que ele havia sido
traído. Depois de reler a carta dezenas de vezes, ficou furioso com a traição
de sua esposa e com a pessoa real que professava ser seu amigo. Ele não era
o único Lorde que o príncipe havia colocado nessa posição. Outros homens
poderosos foram feitos de tolos pelo príncipe, da mesma maneira. Aqueles
homens nunca mais conseguiram manter a cabeça erguida após descobrir a
traição. Eles não foram capazes de exigir satisfação do príncipe por seus
pecados. Eles simplesmente precisavam viver com aquilo. Bray não era
esse tipo de homem. Ele teria sua vingança, de alguma forma. Ele estava
planejando quando a criada de Elizabeth chegou.
A moça abriu nervosamente a porta do escritório e mergulhou
para uma reverência profunda, ficando ali, sem ousar se levantar.
— Sua senhoria tomou muito láudano, meu senhor. Posso mandar
chamar o médico? — Ela perguntou.
Ele olhou à carta em seu poder.
— Não
Ela olhou para cima, com seus olhos azuis apavorados.
— Mas... — O argumento dela morreu em seus lábios quando ele
ficou de pé abruptamente, deixando a cadeira de sua mesa cair no chão atrás
dele. Como se atrevia a discutir com ele? Não era a primeira vez que
Elizabeth se drogava, insensível ao láudano. Ela havia usado a droga com
tanta frequência que Bray proibiu os criados de chamar o médico quando a
condessa tinha um de seus — ataques — como eles chamavam. O médico
viera todas as semanas nos últimos seis meses e, a cada vez, trazia consigo
mais láudano. A opinião de Bray era que o remédio que estava causando o
problema de sua esposa. Quando o charlatão diagnosticou a condessa com
uma condição que ele chamou de — dispepsia frenética — Bray jogou o
homem para fora da casa com as próprias mãos.
Ele empurrou a serva encolhida e caminhou pelo corredor, e agora
a serva estava correndo atrás dele para acompanhá-lo. Ela temia que ele
pudesse machucar sua patroa? Ela deveria temer.
Ele não se incomodou em bater quando chegou ao quarto de sua
esposa. Ele simplesmente abriu a porta. Ela bateu atrás dele, bem no rosto
da empregada, provavelmente esfolando a pele do nariz, se fosse alguma
indicação. Bom. Se ele descobrisse que a garota estava fofocando sobre o
vício de sua esposa, ele faria algo pior. Ele não suportava fofocas. E agora
havia a carta ou cartas, talvez. Quantas pessoas sabiam a verdade?
Ele parou ao lado da cama, sua boca torcendo com desgosto ante
a visão de sua condessa.
— Elizabeth.
Ela mal parecia ciente de sua presença, uma mexida de sua
cabeça foi a única indicação de que ela o ouviu.
— Elizabeth! — Berrou, e as pálpebras dela se abriram para
revelar olhos brilhantes e sem foco. As pupilas negras subiram, expondo os
brancos quando a cabeça caiu de volta no travesseiro.
Ele bateu nela. Ela gritou e levantou os braços ao alto para se
proteger de mais um golpe, mas ele pegou a garrafa de láudano e jogou de
vez contra a parede, onde ela se quebrou, a coloração do líquido marrom
manchando o papel de parede de seda, com fitas de cobre largas.
— Por favor, Ellison, meus nervos, — ela choramingou.
— Não há nada de errado com seus nervos! — Ele rosnou. —
Sente-se e explique-se imediatamente, ou vou derramar água fria em você.
Sua donzela quer que eu chame um padre porque não vou permitir que o
médico venha.
— Minhas cartas, ele as encontrou? Oh, onde elas poderiam ter
ido? — Ela jogou o pulso sobre os olhos, a boca torcendo em paroxismos
feios de angústia.
Ele não sentiu pena.
— É isso que você quer dizer? — Ele exigiu, segurando a carta
amassada. O rosto dela corou e ele pode ver que ela sabia exatamente o que
era.
— Foi há muito tempo, — ela implorou, seus dedos arranhando
inutilmente sobre a colcha de cetim rosa. — Eu só queria que Sophie
tivesse o melhor.
— O que você fez?
Ela soluçou, virando o rosto para longe dele.
— Eu fui seduzida. Eu não tive escolha!
Ele sentiu a repugnância subir em sua garganta.
— Você é minha esposa, Elizabeth, minha condessa. Casei com
você para obter um herdeiro, um herdeiro legítimo. Você se atreveu a me
trair com o Príncipe de Gales, o Gordo George, um homem que eu
considerava meu amigo? Vocês dois riram enquanto você me traia, quando
você mentiu na minha cara? Um pensamento horrível o atingiu. — Sophie é
mesmo minha filha?
Ela não respondeu à pergunta dele, mas ele soube pelo jeito que
seus olhos se arregalaram e que seu rosto ficou vermelho.
— Não, — ele conseguiu dizer, sua garganta se fechando.
Ela pegou a mão dele.
— Eu fiz isso por você, para você ganhar o favor dele! — Ele se
afastou antes que ela pudesse tocá-lo. Ela afundou de volta na cama e
fechou os olhos, a mão caindo flácida ao seu lado. — Você não me amava,
Ellison, mas ele me fez sentir desejada. Ele me escreveu cartas de amor e
poemas. Ele me cortejou. Você nunca me cortejou.
— Cortejou você? — Ele olhou para ela desconcertado. Ele era
filho de um conde, possuía uma enorme fortuna. Ela se casou com esses
fatos tanto quanto a mulher antes dela. A terra e o dinheiro lhe trouxeram o
conforto que ela nunca tivera.
— Eu só queria ser amada, mas ele estava tão frio quanto você,
uma vez que eu... — Ela teve a honra de corar. — Uma vez que eu me
submeti aos desejos dele. Foi só uma vez, somente uma vez, eu juro. Eu
mantinha suas cartas, as lia repetidamente, sabia que algum dia...
Ele sentiu a cabeça começar a zumbir.
— Cartas? Há mais de uma? Quantas?
— Eu não me lembro! — Ela choramingou.
— Você lembra, — ele insistiu. — Quantas cartas?
— Oito! — Ela soluçou.
— Todas como essa? — Perguntou, horrorizado, imaginando os
detalhes íntimos de seu caso se espalhando como uma peste, sendo lidos em
voz alta nos salões de toda Londres, discutidos por cavalheiros nos clubes e
nos infernos de jogos.
Ela se forçou a levantar.
— Eu fiz isso por você, Ellison. Ele não iria reconhecê-la, ele não
respondia minhas cartas depois que ela nasceu. Mas eu possuía essas — ela
tentou pegar a página na mão dele, mas ele segurou longe dela. — Eu
queria fazê-lo pagar, queria forçá-lo a reconhecê-la, a casá-la com alguém
da realeza. Certamente você pode ver quão vantajoso um casamento real
seria para nós?
Ele olhou para ela.
— Você tentou chantagear o príncipe de Gales?
Ela passou a mão pelos seus cabelos emaranhados.
— Eu dei a ele o que ele queria. Agora ele deve pagar.
— Você é uma tola, — ele sussurrou. — Ele era meu amigo.
Como ele deve ter rido todos esses anos, sabendo que seu cuco esteve no
meu ninho. Ele dançou com Sophie no baile dela. Oh! Que honra, que
piada! — Ácido amargo encheu sua boca. Ele se virou para cuspir no
penico. Quando se voltou, Elizabeth estava observando-o. Ela teve a
ousadia de parecer orgulhosa, mesmo em seu estado drogado.
— Você não achou que eu fosse bonita, mas ele achou. Ele me
escreveu poemas. Ele jurou que não poderia viver sem mim, prejudicaria a
si mesmo se eu não me submetesse a ele
— Ele escreveu isso? — Perguntou Bray. — Em cartas? — Oh! A
estupidez! Ele esfregou os olhos com o polegar e os dedos indicadores. —
Sophie sabe disso?
— Claro que não. Eu queria esperar até que Prinny arranjasse um
casamento adequadamente importante para ela, antes que eu lhe dissesse...
Ele riu amargamente.
— Eu gastei a maior fortuna, insisti nos melhores professores, nos
melhores modistas, na companhia mais estimada. Eu não fazia ideia de que
estava criando uma princesa.
Ela levantou o queixo.
— E agora você faz. Talvez você possa convencer Sua Alteza a
enxergar que Sophie deve se casar como convém a sua posição na vida, —
disse ela.
— A posição dela na vida é ser o produto bastardo de uma
“queda” no feno, entre duas das pessoas mais estúpidas da Inglaterra!
O rosto dela murchou, o queixo caiu no peito dela. Ele não tinha
mais nada a dizer. Sua raiva havia sido desperdiçada e o orgulho havia
abandonado seu mundo, no espaço de uma manhã. Ele se afastou da cama,
incapaz de olhar para ela.
— Sua serva vai arrumar suas coisas. Você está indo embora
imediatamente.
— Para onde eu vou? — Ela choramingou.
— Carswell Park, por enquanto. Eu decidirei para onde você irá
mais tarde.
— Ellison, por favor! — Ela implorou, tentando se levantar da
cama. Ela era uma ruína, uma paródia de uma dama que se prostituiu. Ele
deixou seu olhar se movimentar sobre ela, observando seus olhos,
vermelhos e turvos pelas drogas e lágrimas, a camisola de renda cara,
amarrotada e manchada, e o cabelo emaranhado caindo ao seu redor como
uma louca no manicômio.
Talvez ele a mandasse para o hospício como parte de sua
vingança.
Ele atravessou a porta e a abriu. Sua serva saltou do buraco da
fechadura, quase derrubando o lacaio agachado atrás dela. Os dois servos o
observavam com expressões arregaladas de inocência fingida, mas ele sabia
que eles tinham ouvido tudo.
— Arrume as coisas dela, — disse ele à serva — Ela deverá estar
pronta para partir para Carswell Park dentro de uma hora. Você vai
acompanhá-la, e você também. Incluiu o lacaio. Ele os deixaria ir com o seu
segredo pela fronteira galesa, por um tempo. Não haveria ninguém para
fofocar com a margem selvagem da civilização. — Vocês não devem falar
com ninguém antes de saírem, está claro? Eu vou saber se vocês disserem
uma palavra do que aconteceu aqui, — disse ele ameaçadoramente.
Os dois assentiram, com medo nos olhos agora, sem palavras
obedientes, adequadamente aterrorizados.
Ele andou pelo corredor, passando pelos aposentos de Sophie. Ele
podia ouvir o ruído dissonante de um piano sendo mal tocado. Ela estava
tendo sua lição. Ele parou do lado de fora da porta. Ele geralmente gostava
de entrar e ouvir, interpretar o pai indulgente. Seu punho cerrou. Não hoje.
Ele não estava certo se poderia olhar para ela novamente. Por um momento,
considerou mandá-la embora com a mãe, mas perguntas seriam feitas.
Sophie foi a estreante mais popular da temporada. As pessoas iriam querer
saber porque ela saiu da cidade tão de repente. E se o príncipe lhe
perguntasse sobre ela? Ele teria a ousadia? E as histórias que o Ton
inventaria sobre elas seriam tão ruins quanto a verdade.
Ele se encolheu quando ela tocou outra nota errada. Ela ainda era
sua filha aos olhos da lei, a sua disposição como ele desejava. Elizabeth
esperava que o príncipe casasse a garota com a realeza, não é? Ele faria o
oposto. Ele casaria a garota, rapidamente, e em silêncio, com o senhor de
menor classe que ele pudesse encontrar, qualquer um que a levasse,
contanto que a levasse para longe, muito longe.

Capítulo 5

O mordomo que abriu a porta da Westlake House estava vestido e


bem acordado, como se fosse meio-dia, em vez de antes do amanhecer. Se
ele ficou surpreso ao ver Alec na soleira da porta, não deu a menor
indicação. Simplesmente recuou e deixou que ele entrasse no salão
cavernoso, presumindo que Alec havia sido convocado e viera,
imediatamente, apesar da hora.
— Bom dia, Northcott, — disse Alec, atravessando o limiar até a
casa do Conde de Westlake e entregando a Northcott seu chapéu ao fazê-lo.
— Bom dia, senhor. Eu vou ver se o senhorio se encontra, se fizer
a gentileza de esperar.
Alec esperou, embora soubesse que o conde de Westlake não
estaria apenas esperando, provavelmente, ele estivesse trabalhando por
horas, investigando os segredos e pecados da sociedade, passando através
das vidas de seus pares com um pente fino, examinando a correspondência
privada, examinando e analisando testamentos, menus de jantar, listas de
lavanderia e documentos de venda com significados ocultos. Alec se
perguntou se o espião da coroa alguma vez dormia, e passou a mão sobre o
próprio rosto, percebendo que não estivera na cama desde ontem.
Ele entregou as cartas ontem, admitiu que estava faltando uma, e
em poucas horas, ele recebeu a convocação para aparecer logo pela manhã.
Seu estômago estava se agitando desde então. Erros custavam caros neste
negócio. Alec presumiu que haveria uma reprimenda e um aviso para ser
mais cuidadoso. Na pior das hipóteses, ele seria mandado de volta para
procurar na câmara da Condessa de Bray. Ele puxou o lóbulo de sua orelha.
Seus ouvidos ainda estavam ressoando por causa dos gritos daquela mulher.
— O lorde vai vê-lo no estúdio, senhor, — disse Northcott,
interrompendo os pensamentos de Alec. Ele o conduziu no caminho pelo
corredor.
Adam De Courcey, conde de Westlake, levantou-se de sua mesa
quando seu convidado entrou.
— Ah, MacNabb. Que intuição a sua, eu estava escrevendo outra
nota para você.
Alec franziu a testa.
— Outra? Quando eu falhei em atender seu chamado pela
primeira vez?
A sobrancelha do conde se contraiu.
— Este é outro assunto e, portanto, outra nota. Café, por favor,
Northcott, — disse Westlake, dispensando seu servo. Ele indicou que Alec
se sentasse do outro lado da mesa e pegou uma carta aberta, da superfície
polida de mogno. — Você herdou o título de seu pai recentemente, você é o
conde de Glenlorne, — disse Westlake, fazendo com que o fato de não ter
ouvido de Alec primeiro fosse uma acusação não dita.
Alec não sabia. A surpresa o pegou no intestino, mas ele
escondeu, e continuou a observar Westlake da mesma maneira.
Como eu poderia saber? Ele teve tão pouco contato com sua
família quanto foi possível. Sua família pensava que ele havia deixado a
Inglaterra há alguns anos e que estava no Ceilão. O sabor amargo do choque
preencheu a boca de Alec. Então seu pai morrera jovem, assim como Alec
temera, depois de uma vida inútil na bebida. Ele não havia deixado a
Escócia com boas relações com o pai ou com a madrasta, o que tinha mais a
ver com o motivo pelo qual ele partiu. Alec se opôs quando seu pai quis
vender as terras para fazer mudanças nos métodos antigos, que existiam
durante séculos, e havia escrito cartas e decretos enquanto estava bêbado
que haviam destruído antigas alianças. Alec suspeitava que as ideias não
fossem do próprio MacNabb. Ele não podia provar isso, é claro. Foi melhor
sair do que assistir o clã ser destruído ainda mais. Ele apertou as mãos nos
braços da cadeira. O irritava que Westlake, de alguma forma, soubesse disso
antes dele.
Claro que dificilmente importava. Sem dúvida, não havia nada a
herdar a não ser um título sem valor, um castelo em ruínas e uma montanha
de dívidas. A cada geração, havia um pouco menos de herança. Era como se
o clã fosse amaldiçoado com má sorte. Seu bisavô, sabendo que a guerra
estava chegando, fizera suas apostas sobre o resultado da rebelião jacobita,
dividindo seus oito filhos, colocando metade no lado monárquico e metade
2
no acampamento de Bonnie Prince Charlie . A batalha e as consequências
terríveis levaram a sorte do clã, junto com o Laird e sete de seus lindos
filhos — todos, exceto o mais novo. O rapaz estava longe de casa, não
tomara nenhum partido e os ingleses permitiram que ele mantivesse o
pouco que restava de Glenlorne. Ao longo da vida do avô de Alec e da vida
de seu pai, as coisas só pioraram para os onze orgulhosos e prósperos clãs.
Logo, Glenlorne desapareceria completamente, e tudo o que permaneceria
seria a lendária e decaída glória MacNabb, contada ao redor de fogueiras
em cabanas caindo aos pedaços por homens maltrapilhos. O tipo de
histórias que o avô de Alec costumava contar quando ele era um menino.
Ele não pôde ajudar. Ele não era um líder. Ele havia saído há oito anos,
cheio de planos brilhantes, e falhara. Ele era o conde de Glenlorne? Sim, o
clã era realmente amaldiçoado.
— Sim, — ele disse em resposta ao pronunciamento do conde
sobre sua nova circunstância, como se estivessem discutindo o tempo, como
se ele soubesse, mas simplesmente não se importasse. Ele não intencionava
voltar à Escócia para o enterro, ou para reconhecer o título. Ele se
perguntou como suas meias-irmãs estavam se saindo, e o povo do clã, e
sentiu um arrepio de culpa. Ele afastou o pensamento. O que ele poderia ter
feito se tivesse ficado? Ele só causaria mais dor. Ele encontrou a pergunta
no olhar afiado de Westlake com desdém, dizendo ao conde,
silenciosamente, para cuidar de seus próprios negócios. Westlake sorriu.
Alec supôs que não deveria se surpreender que Westlake soubesse
disso antes. Havia muito pouco que Westlake não sabia.
— Na verdade, não é tão recente assim. Foi quase um ano atrás,
— disse o mestre dos espiões.
Um ano? Como sua madrasta e suas irmãs conseguiram viver
desde então? Alec rangeu os dentes e permaneceu teimosamente silencioso,
ignorando o estímulo das sobrancelhas levantadas do conde para que se
explicasse.
— É por isso que você queria me ver? Não há nada que você
precise que seja roubado, ninguém que você queira seguir? — Ele rosnou.
Westlake sorriu friamente.
— Eu tenho aqui uma carta da Condessa Devina...
— De quem? — Perguntou Alec.
As sobrancelhas articuladas de Westlake se contorceram de
surpresa e aborrecimento.
— Sua madrasta, eu acredito?
— Devorguilla? — Alec desabafou.
— Parece que ela está se denominando Condessa Devina agora.
Sinos de aviso soaram na cabeça de Alec mais do que a alteração
de seu nome. Devorguilla sempre teve uma queda por coisas inglesas. Ela
nunca ousaria mudar seu nome enquanto seu pai estivesse vivo. Isso
significava que ela estava tramando algo.
— Agora, por que diabos ela escreveria para você? — Perguntou
Alec.
Certamente Devorguilla-Devina não fazia ideia de que Alec
estava em Londres. Sua família acreditava que ele estava no Ceilão, não é?
Ele se remexeu em sua cadeira, uma onda familiar de culpa e fracasso
surgindo na boca do estômago.
— Ela não me escreveu — disse Westlake. — Ela escreveu para o
seu homem de negócios aqui na cidade, Richard Waters. Eu tenho alguém
em seu escritório que me mantém informado sobre desenvolvimentos
interessantes.
Alec franziu a testa. Ela queria dinheiro, provavelmente precisava
dele desesperadamente. Não que ele tivesse algum sobrando. Ele pensou
novamente no colar da condessa Bray e se perguntou o quanto...
— Ela quer você morto, — disse Westlake sem emoção, como se
Devorguilla houvesse mandado pedir recursos a Waters para comprar um
metro de cambraia, ou um pedaço de fita.
Alec sentiu o queixo cair.
— Morto?
— Uma vez que você esteve ausente durante muitos anos. Quase
os sete anos necessários, e não reconheceu sua herança do título, ela está
perguntando se Waters pode aconselhá-la sobre as regras de direito que
permitirão a ela ter você declarado legalmente morto, então ela poderá
reivindicar sua propriedade.
— Reivindicar minha propriedade? — Alec deixou escapar. —
Não há nada para reclamar!
— Ainda assim, ela deseja usar quaisquer fundos disponíveis para
fornecer dotes adequados para suas três filhas, Megan, Alanna e Sorcha.
Dotes. É claro que as meninas precisariam de dotes para se
casarem bem. Ele não havia considerado que agora era sua
responsabilidade.
— Ela pode fazer isso? — Perguntou Alec.
As sobrancelhas do conde se contorceram novamente, indicando
diversão, se Westlake fosse capaz de tal emoção.
— Você parece muito vivo para mim, conde Glenlorne, — ele
respondeu, usando o novo título de Alec. — Eu espero que você queira ir
para o norte e lidar com isso pessoalmente.
Alec olhou para ele.
— Não
As sobrancelhas de Westlake subiram até o couro cabeludo.
— Não?
Alec se levantou e caminhou pelo comprimento do tapete.
— Eu direi a Waters para enviar uma carta. — Era a coisa correta
a se fazer? Ele poderia ser um conde por herança, mas ele não fazia ideia de
como ser um conde. O que deveria dizer a Devorguilla, que comandos
deveria dar, além de confirmar o fato de que ainda estava vivo?
Westlake não falou por um longo momento. Ele parecia fazer
considerações sobre alguma coisa.
— Na verdade, Glenlorne...
— MacNabb vai se sair bem, obrigado, — rosnou Alec.
— Eu preciso de você na Escócia, ou, pelo menos, fora de
Londres. A carta desaparecida apareceu. O senhor Bray a tem, e eu tenho
certeza que ele conhece toda a verdade. Ele mandou a condessa Bray para o
campo na tarde de ontem e recusou um convite do príncipe regente.
— O que isso significa? — Perguntou Alec. Ele não fazia ideia do
que as cartas continham.
— Isso significa que eu não posso mais usar seus serviços.
Alec segurou a parte de trás da cadeira até o couro chiar.
— Por causa de um único erro em sete anos?
Westlake permaneceu calmo, ele nunca foi nada além de calmo.
— Não, não totalmente, embora se eu me lembre bem, avisei que
erros não poderiam acontecer. Não, você tem um título agora. Você se
tornou visível, um cavalheiro. Alguém pode reconhecê-lo se você começar
a frequentar o tipo de eventos da sociedade que seu novo status permite.
— Agora, por que eu faria isso? — Alec exigiu.
Westlake abriu uma gaveta, pegou um livro e o segurou.
Alec leu o título.
— Waverley? O romance de Walter Scott?
Westlake folheava as páginas.
— Sim. Toda a Ton já o leu, minha esposa incluída, e também o
príncipe regente, principalmente porque é fascinado por ele. Ele convidou
Scott para vir a Londres, e seu interesse, agora, está tornando todas as
coisas escocesas bastante na moda. Ele tem ascendência escocesa, é claro, e
ele eventualmente, será o rei da Escócia.
Alec riu.
— Duvido que ele me convide para o chá para conversar sobre
minha terra natal, meu senhor.
— Não, mas como um conde escocês, você será muito solicitado
pelo resto da sociedade, com as pessoas da moda que desejam imitar o
interesse de Vossa Alteza. Ora, minha própria esposa sugeriu que fôssemos
passar o verão na Escócia, o tema escocês está em alta. Eu vetei a ideia, é
claro, mas você consegue ver porque você deve ir.
Alec cruzou os braços sobre o peito.
— E se eu recusar?
— Eu confio em você para se lembrar de que um conde inglês
ainda está acima de um escocês? — Perguntou Westlake calmamente. —
Você sabia que Bray ofereceu uma recompensa em relação ao roubo de sua
casa na outra noite? Parece que um valioso colar foi roubado, sua mulher
ficou tão aterrorizada que precisou se retirar para o campo. Seu lacaio viu
um homem alto com cabelos escuros, — ele meditou.
— Eu não peguei o colar, — disse Alec.
— Claro que não, mas seria muito inconveniente se você fosse
identificado — talvez até enforcado — por um crime que não cometeu.
Você aterrorizou Vossa Senhoria, nada mais, mas ela poderia ser capaz de
identificar você.
Os lábios de Alec se contorceram amargamente e ele deu uma
olhada ao redor da luxuosa sala. Não havia nada em Glenlorne para
comparar com isso. Nem mesmo o café que Northcott havia entregue
silenciosamente em algum momento durante a conversa. Westlake foi até a
bandeja e encheu a xícara. A rica fragrância lembrou a Alec que ele não
estava no Ceilão, vivendo a vida de um rico fazendeiro. Ele era um ladrão,
sem dinheiro, e sua vida, seus segredos — todos eles — pertenciam a
Westlake. Deixou seu café intacto e fez uma reverência exagerada para
Westlake.
Ele pegou a carta de Devorguilla da mesa de Westlake e enfiou-a
no casaco por precaução.
— Se você não se importar meu senhor conde, eu cuidarei de
meus próprios assuntos de agora em diante, — ele disse, e caminhou em
direção à porta.

Capítulo 6

A pesada carruagem sacudiu profundamente e voou como um


brinquedo de criança durante mais uma curva na estrada. Caroline
estremeceu e segurou a borda da janela, o veículo se endireitou.
— Isto foi ruim! — O cavalheiro de chapéu verde, um certo sr.
Brill de Hampshire, riu. Caroline se absteve de revirar os olhos. Ele fez o
mesmo pronunciamento sobre cada buraco entre Londres e... onde quer que
estivessem agora.
— Sim, de fato, Sr. Brill, — disse a mulher de azul, abanando o
rosto corado com a luva. — Toda essa chuva fez uma bagunça terrível nas
estradas. Não tenho esperança de chegar ao meu destino com meus ossos
intactos!
— E para onde você está indo, senhorita Hindon? — Perguntou o
segundo cavalheiro, um clérigo chamado Scroop. Ele havia enfiado o nariz
comprido em um livro de história latina quando a carruagem partiu de
Londres, e o deixou lá, durante a maior parte da viagem. Depois de horas
sem nada para fazer, Caroline lhe invejava por ter algo, qualquer coisa —
até mesmo a história latina — para ler. A Sra. Hindon se envaideceu com a
atenção dele.
— Eu estou indo para Berwick, senhor. Minha irmã mora lá e está
mal. Seu marido morreu há um mês e ela espera um aumento da família.
Espero ser um conforto para ela, no entanto, não sei se eu posso.
— Eu diria que uma boa quantia aliviaria sua dor, com outra boca
para alimentar vindo junto! Estes são tempos difíceis. — Sr. Brill falou.
— Pobre moça, — murmurou a moça ao lado de Caroline, que
timidamente se apresentou como a srta. Louisa Best. Caroline ainda não
vira o rosto da Srta. Best debaixo da aba larga de seu chapéu de palha, já
que ela mantinha os olhos baixos. Seu breve comentário marcou a primeira
vez que ela falava, desde que ela havia sussurrado seu nome para seus
companheiros de viagem, como introdução.
— Eu estou com destino para York, — declarou Brill, sem
oferecer mais detalhes. Observou a senhorita Best com um olhar curioso,
como um predador olhando algo brilhante. — E para onde você está
viajando, senhorita Best?
— Escócia, — ela respondeu. — Vou ser governanta de três
jovens senhoritas de qualidade, para lhes ensinar inglês.
A Sra. Hindon engasgou e o Sr. Scroop tossiu. Brill riu.
— Ensinar maneiras inglesas? Você vai ser duramente
pressionada para fazer isso, eu diria.
— Bárbaros! — Disse a sra. Hindon, apertando a mão contra o
enorme busto do vestido azul com horror. Caroline engoliu o caroço que
subiu em sua garganta. O cavalheiro que a ajudara não era escocês?
— A Escócia não é lugar para uma inglesa decente, —
pronunciou Scroop, como se Deus tivesse decretado um mandamento.
— Por quê? O que você ouviu? — A Srta. Best guinchou a
pergunta que pairava sobre os próprios lábios de Caroline.
A sra. Hindon deu um gemido assustado e arregalou os olhos
quando olhou para os homens para que explicassem.
O Sr. Brill se inclinou à frente.
— Eles não usam roupas, para começar. Bem, não roupas como
você e eu as conhecemos. — Ele olhou à Sra. Hindon ofegante. — Eu sei
que é um tópico indelicado, mas é a verdade. Eles se vestem em farrapos e
comem carne crua, ou comem aveia, como cavalos.
Caroline franziu a testa. Sua avó contara histórias da Escócia.
Embora tivesse morrido quando Caroline era muito nova, Caroline não se
lembrava de nenhuma menção a carne crua ou selvagens nus. Sua avó havia
falado de prados floridos de urzes, rios de fluxo rápido cheios de salmão,
e...
— Se não tivéssemos colocado abaixo a rebelião do inglês
Bonnie Prince Charlie anos atrás, e forçado um pouco de civilização sobre
os escoceses, eu diria que eles seriam completamente selvagens até agora,
— Disse o Sr. Scroop, fechando seu livro, e se concentrando em dar à
senhorita o benefício de sua opinião.
— Mas eu possuo uma carta de uma condessa, uma condessa real,
que mora nas Highlands. Ela escreve bem o suficiente. — A Srta. Best abriu
a bolsa e procurou uma carta dobrada, que ela segurava como um talismã.
Scroop fungou, recusando-se a tocá-la.
— Ela provavelmente possui um bom clérigo inglês para escrever
para ela. Os escoceses não sabem ler e escrever como nós. Eles nem falam
inglês fora de Edimburgo e, mesmo lá, eles maltratam e ofendem nossa
língua até que seja quase sem sentido!
Caroline recordou do suave perfume escocês de seu salvador. Ele
havia sido bem compreensível e certamente foi mais gentil do que qualquer
um desses homens. Ela notou a dura luz de malícia nos olhos de Scroop, e a
ignorância do Sr. Brill. A indignação aqueceu sua pele. Eles estavam
assustando a senhorita Best. Ela observou a jovem guardar a carta com os
dedos trêmulos.
Na verdade, eles estavam assustando a ela. Caroline mordeu o
lábio. Ela cometera um erro terrível? Ela deveria ter ficado em Londres.
Talvez, pudesse ter falado com Somerson e pudesse escolher um marido,
implorado se fosse preciso. Seu salvador escocês não havia contado nada
sobre os terrores da Escócia. Claro, ele esperava que ela tivesse uma
escolta, um noivo, que se casaria com ela, rapidamente, jurando sobre a
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bigorna , depois a levaria direto para casa e novamente à Inglaterra.
Ela mordeu o lábio e olhou pela janela para a paisagem que
passava. Ela tomou uma decisão impulsiva que poderia afetar o resto de sua
vida, algo que poderia se revelar um futuro muito mais trágico do que ela
enfrentaria sendo uma esposa para Speed ou para Mandeville. Ela confiara
em um estranho na rua e rejeitara o conselho de seu próprio meio-irmão,
um conde e um cavalheiro. Ela segurou a respiração, deveria voltar, ir para
casa, pedir desculpas e se casar como era esperado. Ela considerou sua
escolha e estremeceu novamente.
Ela fechou os olhos, imaginando como seria seu escocês, tentando
imaginar um rosto gentil a partir de uma bochecha sombria, um fragmento
de sobrancelha escura e um único olho brilhante. Ele foi gentil, e ela estava
convencida de que ele deveria ser assim e seria extremamente bonito
também. Ela imaginou um semblante sorridente com olhos azuis e cabelos
ruivos — ou talvez olhos castanhos e cabelos escuros?
Ao lado dela, a Srta. Best engoliu em seco, segurando as
lágrimas. Caroline colocou a mão no braço dela.
— Certamente não é tão ruim quanto eles dizem. A Rebelião de
1845 foi há muito tempo e Bonnie Prince Charlie se foi, — ela a acalmou.
— Minha avó costumava me contar histórias sobre a Escócia, e não havia
uma única menção...
Outro suspiro de horror encheu a carruagem.
— Você é uma escocesa? — Perguntou a sra. Hindon, como se
temesse que Caroline estivesse prestes a retirar uma espada de debaixo do
manto e assassinar todos os presentes, começando por ela.
— Não, eu sou inglesa! — Caroline disse rapidamente.
— E para onde você está viajando? — Perguntou Brill.
Caroline engoliu em seco.
— Para a Es... Escócia. — Desta vez, a palavra rolou
desajeitadamente de sua língua, e uma onda de dúvida varreu sua barriga.
As sobrancelhas do Sr. Scroop baixaram desconfiadas. A Sra.
Hindon ofegou. Mr. Brill riu friamente.
A Srta. Best se virou para olhar além de seu chapéu para Caroline.
— Você já esteve lá antes?
Caroline engoliu em seco.
— Não
— Então por que ir agora? — Perguntou a sra. Hindon.
Todos olharam para Caroline, fixaram os olhos nela como abutres
famintos de olho em sua presa, alguém fraco, vulnerável e longe de casa,
onde ela deveria ter tido o bom senso de ficar.
Mas o futuro dela, qualquer que fosse, estava à frente. Disso ela
estava certa. A onda de dúvida em sua barriga acalmou. Ela não podia
admitir isso para seus companheiros de viagem, nem sequer dizer a
verdade.
— Estou indo para... — Caroline atormentou seu cérebro para ter
uma história em que eles acreditassem. — Eu estou no meu caminho para...
— Outro choque duro cortou suas palavras.
— Isto foi ruim! — Disse Brill, mas os passageiros estavam
observando Caroline, esperando que ela falasse. Ela sentiu uma gota de suor
escorrer entre os ombros.
— Eu estou indo para um casamento! — Ela conseguiu. O seu
salvador não tinha assumido que ela estava fugindo??
— Um casamento! — A curiosidade substituiu a suspeita nos
olhos pálidos da Sra. Hindon. — Noiva ou noivo?
— Hum, noiva, — Caroline conseguiu. — Em Edimburgo. Minha
irmã está se casando com um soldado inglês que mora lá, veja você, um
capitão. — A história romântica surgiu, completamente, formada em sua
mente. — Ele é muito bonito, e minha irmã é tão feliz. — Todo mundo
estava olhando para ela com fascínio extasiado. Ela respirou fundo, pronta
para adicionar o próximo capítulo, mas a carruagem bateu em outro
obstáculo.
— Isto foi ruim! — Brill e Scroop disseram juntos, e a Sra.
Hindon deu uma risadinha.
— É melhor você escolher flores para o casamento deste lado da
fronteira. Nada cresce na Escócia. Os escoceses comem carne de carneiro e
o carneiro come todo o resto. É um lugar árido onde o sol nunca brilha, —
disse Brill.
— A maldição de Deus sobre uma terra pagã, — entoou o clérigo.
A senhorita Best choramingou novamente e apertou as mãos
enluvadas com força, como se estivesse rezando.
A carruagem derrapou como um navio em mares tempestuosos
quando os cavalos entraram em um espaço lamacento da estrada, em frente
a uma pousada. A Sra. Hindon gritou quando foi jogada contra a Srta. Best.
Scroop grunhiu quando o cotovelo do Sr. Brill derrubou sua história latina
no chão. Caroline se agarrou ao assento.
Os passageiros suspiraram quando a carruagem parou,
endireitando as capotas e os chapéus enquanto desciam do veículo,
piscando com o sol da tarde e esticando os músculos contraídos.
Senhorita Best pegou a saia e correu para a pousada, e Caroline
seguiu, com a Sra Hindon vindo atrás, caminhando através da lama como
uma galinha exigente, reclamando em voz alta sobre a ruína de suas botas.
O estômago de Caroline roncou. Ela não havia comido uma
refeição adequada desde o jantar da última noite em Somerson House. Quão
longe parecia agora, se colocar em um lugar tão estrangeiro quanto a
Escócia. Seu meio-irmão estava procurando por ela? Ela olhou ao redor da
estalagem de teto baixo, examinando os rostos dos habitantes, mas eles nem
olharam para trás, com pouco interesse em quem ela poderia ser.
— Quando a próxima carruagem de correspondência vai para o
sul? — A senhorita Best perguntou ao estalajadeiro. — Eu quero comprar
uma passagem! — Ela disse.
— Mas você acabou de sair da London Mail! — Ele disse
surpreso.
— Eu mudei de ideia! Eu quero voltar para Londres neste exato
minuto, — ela disse desesperadamente, uma ponta de pânico em sua voz.
Caroline pegou sua manga.
— Oh, senhorita Best, tenho certeza de que a Escócia não é tão
ruim quanto dizem!
A senhorita Best afastou as lágrimas e puxou o braço do aperto de
Caroline.
— Como você sabe? Você disse que nunca esteve lá!
— Mas...— Caroline começou.
— Você quer a passagem ou não? — O estalajadeiro disse.
— O que você sabe sobre a Escócia? — Perguntou a moça.
— Não é a Inglaterra, — ele disse enigmaticamente.
— Então eu vou pegar a passagem! — Miss Best abriu sua bolsa
para pegar seu dinheiro. A carta caiu e Caroline olhou para ela, o papel
branco contra as tábuas negras envelhecidas do chão. Moedas caíram no
balcão de madeira, e Miss Best pegou sua passagem e se virou.
— Espere, sua carta! — Disse Caroline, curvando-se para pegá-
la.
A garota se afastou, como se ela estivesse envenenada.
— Eu não quero isso! — Ela disse. — Queime-a!
Com isso, a srta. Louisa Best entrou correndo na sala de espera
das damas, sem olhar para trás.
Caroline sentiu a carta formigar em seus dedos sem luvas. Ela
olhou para o selo quebrado. Aquilo era um leão ou um urso? Ela não sabia
ler o nome ou o lema. Ela desdobrou-a.
Tenho o prazer de oferecer-lhe o posto de governanta, no valor de
sete libras por ano, além do seu quarto e pensão aqui no castelo de
Glenlorne. Você será responsável por ensinar inglês às minhas três filhas,
uma de dezoito anos, uma de dezessete e uma de doze anos, além de
aconselhá-las sobre as maneiras e o estilo inglês. Esperaremos você em
Glenlorne no primeiro dia do mês.

A carta era assinada pela condessa de Glenlorne.


— Glenlorne, — sussurrou Caroline.
Era um destino, um trabalho pago respeitável, com uma mãe e
três filhas. A condessa queria que alguém ensinasse inglês e boas maneiras.
Quem melhor que a filha de um conde inglês?
Ela abriu a bolsa do escocês e pegou uma moeda para pagar uma
torta e uma xícara de chá, sentindo a esperança subir em seu peito. Ela
agradeceu, silenciosamente, a seu benfeitor desconhecido mais uma vez, e o
rosto imaginado em sua mente, sorriu, os olhos cor de avelã de Caroline
cintilavam enquanto as mechas vermelhas douradas flutuavam com a brisa
fresca das Highlands.
Seu coração se animou um pouco. Era uma aventura, uma
oportunidade, uma verdadeira história para contar a seus filhos e netos, e
Caroline não seria tão tola quanto a senhorita Best, de voltar agora.
Em sua mente, seu herói escocês riu, um som quente, baixo e
sedutor. Seus olhos azuis brilhavam e uma mecha de cabelos loiros cobria
sua ampla testa enquanto ele estendia a mão para ela.

Capítulo 7

Alec olhou às profundezas do seu uísque, ignorando os habitantes


do modesto clube de cavalheiros. A carta de Devorguilla estava em seu
bolso e ele já a lera uma dúzia de vezes.
Ela precisava de dinheiro. A propriedade precisava de reparos, e
todos os fundos dela cuidariam de suas filhas pequenas. Seu marido, o
sétimo conde, havia deixado numerosas dívidas para serem saldadas, ela
dizia. Se ela pudesse encontrar uma maneira de declarar Alec morto e
vender Glenlorne, ela poderia fazer arranjos que resultariam em dotes para
suas meninas. Ela não queria nada para si mesma — ou assim ela disse. Ela
não disse uma palavra sobre o povo de Glenlorne, ou o fato de que a terra
sob o castelo em ruínas, representava quatrocentos anos da história de
MacNabb — a história das filhas dela, e a dele.
— Boa noite, Glenlorne, — um amigo patrono cumprimentou
Alec com seu novo título, quando ele passou, indo para as salas de jogos.
Alec cerrou os dentes, mas não reconheceu o homem. Poucas horas depois
de se encontrar com Westlake, uma dúzia de homens o saudou como
Glenlorne, em vez de MacNabb. Ele amaldiçoou, silenciosamente,
Westlake, e Devorguilla também. Quanto tempo levaria para as notícias se
espalharem que seu condado não possuía dinheiro, e sua família preferiria
que ele estivesse tão morto quanto seu pai? Não havia dúvida de que
Devorguilla queria vender o que sobrara. Alec se perguntou o quanto o
castelo e a terra poderiam valer. Chegara a uma conclusão nas primeiras
horas desde seu encontro com Westlake, quando voltasse à Escócia, — se
voltasse, — precisaria de dinheiro. Agora cabia a ele prover suas meias-
irmãs, no mínimo. Ele provavelmente seria forçado a fazer exatamente o
que Devorguilla pretendia fazer e teria que vender Glenlorne. Ou — ele
olhou para a porta da sala de jogos — ele poderia ir para casa com, pelo
menos, um pouco de moedas no bolso, talvez, se tivesse mais sorte do que
tivera recentemente. Se ele tivesse mais sorte do que isso, poderia até ter o
suficiente para convencê-los a pensar que realmente estivera no Ceilão. Ele
precisava ao menos tentar. Ele tomou o último gole de uísque e se levantou
do assento.
Uma hora depois, Alec olhou para as cartas inúteis em sua mão.
— Bem, meu senhor conde? — Jasper Kendrick perguntou.
Alec ignorou o uso de seu título. O resto de seu dinheiro já estava
na frente de Jasper, e o homem estava prestes a ganhar mais uma vez. Alec
sentiu um fino fio de suor escorrer pela espinha. Forçou-se a sorrir, como se
tivesse herdado um rico ducado, em vez de uma ruína escocesa, sem
dinheiro, largou as cartas e jogou os poucos guinéus restantes sobre a mesa.
— Estou deixando a cidade por algumas semanas, então vou lhe
poupar o trabalho de aguentar minha presença até eu voltar.
— Você está saindo no meio da temporada? — Os pálidos olhos
azuis de Jasper se arregalaram. — Agora? Você deve saber que um título
melhora um homem, e muito, aos olhos das noivas em potencial. Você é
obrigado a dar atenção a todas as festas em Londres, agora que você
herdou. As senhoras não ficarão felizes em ver um belo e solteiro homem,
se despedir durante a temporada de caça ao marido. — Ele pegou o dinheiro
sem me importar em contá-lo.
Alec se levantou.
— Apesar da atenção, não estou no mercado à caça de uma
esposa.
Jasper riu.
— Você diz isso agora, mas você considerou a Senhorita Anne
Devereaux? Ela tem mil libras por ano, mas é louca por um título. Condessa
iria servi-la bem.
— Então espero que ela encontre um bom e disposto conde para
lhe dar o que ela quer, — disse Alec. — Boa noite, Kendrick. Aproveite
minhas moedas. — Ele olhou o monte de moedas na frente de seu oponente
rico, com pesar e se virou, indo à porta.
Uma bengala deslizou em seu caminho.
— Boa noite, Glenlorne. Eu estava esperando que pudesse ter
uma palavra particular antes de você sair. — Alec olhou para a bengala,
pensou em agarrá-la e quebrá-la sobre o joelho. O portador nem se
incomodou em se levantar para detê-lo. Sentou-se em uma mesa perto da
porta, meio à sombra. Alec olhou para ele, uma repreensão obscena na
ponta da sua língua. Sua boca secou enquanto ele olhava para a face opaca
do Conde de Bray. O conde fixou-se em seus olhos, sua expressão fria e
ilegível.
Ele indicou que Alec se sentasse em frente a ele.
— Junte-se a mim.
Que escolha ele tinha? Alec se perguntou se o conde sabia que ele
invadira sua casa, aterrorizara sua esposa, roubara suas cartas particulares.
Sentou-se devagar, imaginando se estava prestes a sentir o aço frio de uma
faca debaixo da mesa penetrar em sua barriga.
Mas Bray meramente sinalizou para o garçom, um anel de sinete
cravejado de joias cintilando na espartana luz das velas.
— O uísque seria mais apropriado, eu suponho? — Perguntou a
Alec. Alec assentiu, seu queixo muito tenso para falar. Bray sorriu e Alec
reconheceu a crueldade disfarçada de camaradagem. Sua pele arrepiou
quando o olhar do conde deslizou sobre ele. Nem Westlake nem seu próprio
título o protegeriam se Bray soubesse da verdade. Alec procurou o rosto de
Bray, mas não havia acusação ali. Certamente, se Bray quisesse se vingar,
ele teria simplesmente esperado do lado de fora, alguns lacaios corpulentos
lutariam com Alec em uma carruagem escura, ou em um beco ainda mais
escuro. O homem diante dele era um companheiro do príncipe regente, um
dos mais poderosos pares do reino. Mas se ele não estava ali para isso,
então o que diabos ele queria?
Bray esperou até que o garçom pusesse as bebidas diante deles e
partisse. Ele levantou seu copo, seus olhos eram duros enquanto olhava para
Alec por cima da borda do copo.
— Kendrick está certo, você sabe. Você estará muito em demanda
no mercado matrimonial, agora que você tem um título.
Estava na ponta da língua de Alec insistir para o conde chamá-lo
de MacNabb, mas segurou sua língua, curioso agora, bem como cauteloso.
— Você não se saiu muito bem nas mesas hoje à noite, —
declarou Bray.
— O que é isso, meu senhor? — Perguntou Alec. Bray deixou seu
olhar cair no copo intocado de Alec.
— Diga-me, você faz uísque em suas propriedades na Escócia?
— Não. — Alec respondeu logo, embora seu pai tivesse bebido o
suficiente para encher o lago abaixo do castelo.
— Você cria ovelhas para tecer lã em Glenlorne?
Alec ficou em silêncio.
— Gado? Aveia?
— Por que você está perguntando? — Alec exigiu novamente.
— Porque estou curioso. Eu me perguntava que tipo de renda um
conde escocês poderia ter.
Estava claro o suficiente pelo sorriso no rosto de Bray que ele
sabia que Glenlorne não possuía dinheiro. Alec não estava com intenção de
brincar com um conde inglês entediado, nem de ouvir outro inglês
menosprezar a Escócia — e ele — para sua própria diversão.
Ele começou a levantar.
— Boa noite, senhor Bray.
Bray levantou uma mão imperiosa.
— Sente-se. Eu tenho uma proposta para você.
— Não. — Disse Alec.
— Você tem três irmãs jovens, não tem? E todas em idade de se
casar, ou quase, eu presumo. Como você as ajuda? — Bray interrompeu.
Isso parou Alec. O sorriso frio de Bray era do tipo que Alec
normalmente tomaria como aviso, mas, agora, ele estava curioso. Ele se
perguntou se Bray queria comprar Glenlorne. Isso de fato resolveria muitos
problemas.
— O que você quer, meu senhor?
— Como eu disse, tenho uma proposta para você. Uma proposta
de casamento, na verdade, — Bray respondeu.
Alec resistiu ao impulso de rir.
— Você dificilmente é meu tipo, meu senhor.
Bray enviou-lhe outro sorriso congelante.
— Realmente. Mas, eu quis dizer minha filha. Sophie fez sua
estreia nesta temporada. Ela tem estado em cada evento e festa importante.
Não nos círculos em que você comparece, é claro. Você provavelmente não
teve o prazer de conhecê-la.
Novos sinos de aviso soaram na cabeça de Alec.
— Sua filha, Lady Sophie Ellison?
— Sim. Eu quero que você se case com ela.
— Casar com Lady Sophie Ellison? — Alec repetiu
estupidamente, atordoado. Certamente havia um erro. Lady Sophie era a
bela da estação, destinada a ser a esposa de um rico duque, no mínimo.
Havia rumores de um casamento com a realeza estrangeira, não um conde
escocês sem dinheiro, mas Bray assentiu.
— Eu presumo que você a conhece então?
Todo mundo conhecia a filha do conde de Bray. Ela era
amplamente considerada a garota mais adorável de Londres. Alec nunca a
conheceu pessoalmente, ele engoliu em seco. Deve haver algo muito errado
com ela, de fato, se Bray queria que ele se casasse com a garota. A fortuna
de seu pai, suas conexões reais, iriam longe, transformando até mesmo uma
garota estúpida, em uma garota adorável e fascinante. Um pânico puro
correu por suas veias, anulando a esperança de que, de alguma forma, a
oferta de Bray significasse salvação, solvência e um final feliz.
— Receio não estar no mercado para uma esposa, — disse Alec
com cuidado.
— Você gostará de um dote de cinquenta mil libras.
Alec ficou olhando.
— Cinquenta — ele engoliu em seco.
— Sim. Pense nisso. Todo o uísque, aveia, gado e ovelhas que
você poderia querer. Você poderia reconstruir sua mansão
— Castelo, — murmurou Alec.
— Castelo. — Bray acenou com uma mão, desconsiderando o
comentário, como se importasse pouco onde sua filha seria alojada depois
de suas núpcias. — Você poderia transformá-lo no castelo mais magnífico
de toda a Escócia — um pequeno e romântico ninho de amor para você e
Sophie.
Alec olhou para o uísque. Romance? Ele nunca esteve
apaixonado, nunca considerou a possibilidade disso. O casamento era um
assunto diferente, raramente envolvendo amor. Não que ele tenha
considerado o casamento também. Sua mão apertou o copo. Cinquenta mil
libras. Ele poderia dar dotes para suas irmãs, vê-las se casarem bem, muito
bem, de fato. Ele poderia reconstruir as casas e fazendas de Glenlorne, vê-
las se levantar mais uma vez da pobreza, devolver-lhes o orgulho.
Ele fechou os olhos. Aqueles eram os sonhos de seu avô, não
dele. Ele duvidava que restasse alguma coisa em Glenlorne que valesse a
pena reconstruir. Seria uma tarefa tola, tão impossível quanto tentar trazer
os mortos de volta à vida. Certamente não era um lugar para levar uma
noiva, especialmente uma noiva como Lady Sophie Ellison.
— Você hesita, — disse Bray.
— Por quê? Por que eu? — Alec exigiu, subitamente irritado.
Toda a sua vida mudara no dia anterior.
Bray deu de ombros.
— Por que não? Você é um jovem bonito com um título e um
castelo, — ele disse. — Eu mencionei que Sophie levará as joias de sua
mãe? Tudo isso, mais diamantes, rubis e esmeraldas do que qualquer
mulher poderia usar durante toda a vida.
— Ela não teria motivos para usá-los em Glenlorne, — murmurou
Alec.
— Não importa. Sophie vai aprender a amar a Escócia. Tenho
certeza de que não haverá necessidade de que ela volte para Londres.
Sinais de aviso soaram novamente. Ficou claro que o conde de
Bray queria se livrar de sua filha. Ele estava vendendo a pobre garota para
um homem que ele esperava que a mantivesse nos confins do reino, para
nunca mais ser vista novamente. Obviamente, não importava se Sophie
estivesse feliz, ou se Alec pudesse fazê-la feliz. Sentiu pena da menina e
imaginou o que ela fizera para merecer tal destino. Ela sabia que isso estava
acontecendo? Um pensamento o atingiu como um raio.
As cartas.
Se isso tivesse algo a ver com a carta que ele deixou cair, a que
Westlake disse que Bray havia encontrado, então o destino de Sophie era
culpa dele. Ele sentiu seu estômago revirar, inquieto.
— Pense no dinheiro, Glenlorne, — insistiu Bray.
Alec engoliu em seco. Cinquenta mil libras significavam que
acabariam as mentiras, os roubos e a espionagem. Em vez disso, ele poderia
viver uma vida de honra, riqueza e privilégios. Era tentador. Ele se
levantou.
— Vou precisar considerar isso com mais cuidado. Eu estou indo
à Escócia amanhã. Eu vou manter o meu homem de negócios em contato
com você. — Waters, não era esse o nome na carta de Devorguilla?
A mão de Bray em seu braço o deteve.
— Decida agora, Glenlorne. Não há muitas exigências na
Escócia. Você poderia levá-la com você, e se casar com ela quando chegar à
Escócia.
Alec olhou para as veias azuis sob as juntas das mãos de Bray,
para os anéis que adornavam suas mãos. Nenhum pai inglês gostaria que
sua filha se casasse em frente a bigorna. Era impróprio e escandaloso,
mesmo que o noivo fosse um conde. Ele pensou fugazmente na moça ruiva
que ele ajudou em seu caminho indo para tal destino, sentiu-se culpado. Se
ele não tivesse deixado cair aquela carta, nunca a teria visto na rua, e Bray
provavelmente estaria em um clube de cavalheiros, muito mais elegante,
negociando um partido muito diferente para Sophie. De repente, ele se
sentiu responsável pela infelicidade de ambas as mulheres — e pela miséria
de suas meias-irmãs e de Devorguilla, também.
— Talvez um longo compromisso, para que possamos conhecer
um ao outro, — Alec disse. — Quando eu voltar, poderemos providenciar.
Um ano, digamos assim? — Ele se perguntou onde a moça que ele
encontrou na rua estava agora. Casada, ele esperava, delirantemente feliz
com seu marido carinhoso e fiel. Ela era uma mulher corajosa. O amor a
deixou disposta a fazer qualquer coisa por uma chance de felicidade. Ela
seria o tipo de esposa que ficaria ao lado de seu homem na hora da
necessidade, o amaria sempre — se as coisas acontecessem como ela
esperava, é claro. Que tipo de esposa seria a mimada e bonita Sophie?
Ela o tornaria rico.
— Um ano! — Zombou Bray. — Você sente que estou sendo
muito apressado, não é? Devemos aumentar para sessenta mil libras? Aqui
está o que estou disposto a fazer. Já que você deve partir imediatamente
para suas propriedades — e eu entendo, perfeitamente, que você deve
assumir suas obrigações, imediatamente — vou providenciar para que
Sophie viaje à Escócia. Você poderá mostrar para ela as glórias de
Glenlorne antes do casamento. Isso seria bom?
— Eu não estou...— começou Alec, mas Bray se levantou e
estendeu a mão.
— Ela estará lá dentro de uma quinzena. Isso lhe dará tempo para
dar a feliz notícia de suas iminentes núpcias para seus parentes ou a palavra
certa seria — clã?
— É uma palavra fora da lei, acredito, especialmente na
Inglaterra, — disse Alec. Os clãs, a língua gaélica, o tartan e até as gaitas de
fole haviam sido proibidas pela Coroa inglesa, durante anos, depois de
4
Culloden .
Bray deu uma risadinha.
— Vossa Alteza planeja mudar tudo isso. Amante da vestimenta
das Terras Altas, Sir Walter Scott prometeu encontrar um alfaiate que
pudesse fazer para ele, um traje adequado de roupas escocesas, e trazer um
gaiteiro para tocar para ele.
— Se ele conseguir encontrar um, — Alec murmurou.
Bray ignorou o gracejo.
— Eu posso ver que você é um patriota, um homem de honra.
Sophie se orgulhará de estabelecer novas tendências, começando novas
modas. O príncipe gosta de coisas escocesas, mas você vai levar uma
mulher, uma dama como Sophie, para colocá-lo em prática. Imagine isso se
você quiser. Todos os ingleses traçarão suas raízes escocesas, e a Escócia se
erguerá novamente com clãs, faixas e gaélico.
Alec engoliu um gemido. O interesse inglês pela Escócia nunca
havia sido um bom presságio. Ele olhou para a mão estendida de Bray. Seja
qual for a razão pela qual Sophie estava sendo forçada a casar, pelo menos
em parte era sua culpa. E suas irmãs precisavam do dinheiro. Não era por
isso que ele viera aqui, esta noite? Ele imaginou chegar a Glenlorne, tão
pobre e inútil quanto seu pai, outra boca sem valor para se alimentar,
mesmo que fosse conde. Jasper Kendrick estava certo. Casar por dinheiro
era o caminho mais rápido para a fortuna, talvez o único caminho. Ele
precisaria se casar com alguém, ele supôs. Bray lhe mostrara que não havia
escolha.
Relutantemente, ele apertou a mão de seu futuro sogro.

Capítulo 8

O fantasma de Angus, transparente como uma cortina de gaze,


estava olhando pela janela da velha torre, observando o vale. Georgiana
podia ver a estrada através de suas costas largas, percorrendo pela torre, a
caminho do novo castelo. Bem, não era novidade. Era mais velho do que
qualquer um deles, e eles estavam mortos há quase vinte anos, mas era mais
novo do que este lugar onde os fantasmas habitavam.
— O que você está olhando? — Ela perguntou.
Ele lançou-lhe um olhar de aço, sob suas sobrancelhas brancas.
Ele se transformara de um rapaz atraente, para um homem forte e bonito.
Ela teria gostado de envelhecer com ele. Ela sentiu a mordida familiar de
arrependimento, e inclinou a cabeça para sorrir para ele, imaginando como
poderia ter sido.
— Um homem não pode admirar a vista? — Perguntou, irritado
com a interrupção dela, obviamente, cauteloso pelo sorriso melancólico
dela.
— Sim, suponho que sim, — ela disse suavemente, e se
aproximou, deixando-o sentir o peso de sua presença. Ele encolheu os
ombros, mas não se afastou.
— Algo está prestes a acontecer. Eu posso sentir isso em meus
ossos, como eu costumava ser capaz de sentir uma tempestade descendo das
colinas, — ele resmungou. — Talvez já esteja aqui. Devorguilla sempre foi
astuta e ardilosa, e Brodie MacNabb chegou, todo sorrisos e músculos,
mesmo que ele não tenha muita inteligência. Ela está tramando alguma
coisa, ou ele — algo que mudará Glenlorne para sempre.
Como se ele tivesse ossos. Ela reprimiu um sorriso.
— Será tão ruim quanto Culloden? Glenlorne sobreviveu a isso,
Angus. — Georgiana deixou seus olhos vaguearem sobre a largura dos
ombros, a força nas mãos fantasmagóricas que seguravam o parapeito da
janela. Ele se virou para olhar para ela, como uma águia feroz.
— Sim, Glenlorne sobreviveu, mas isso é diferente. Meu pai
dividiu seus filhos, colocou alguns de cada lado, metade jacobita, metade
monarquista, só para ter certeza de que os MacNabbs manteriam Glenlorne,
não importando quem vencesse.
— E de que lado você ficou?
A carranca dele se intensificou.
— Como eu poderia ter escolhido? Eu era escocês, mas... — Ele
desviou o olhar dos olhos vagando pelo vale, os ombros encolhidos contra a
lembrança.
— Mas você estava apaixonado por uma garota inglesa, filha de
um lorde inglês, — ela cutucou, terminando a frase.
— Eu não era um covarde. Eu teria lutado com meus irmãos, mas
eles não me deram a chance. — Ele estudou suas mãos. — Na noite em que
planejamos fugir, juntos, eles me pegaram empacotando minhas coisas. Eles
sabiam para onde eu estava indo. Eles me deixaram sem sentido, me
jogaram no cavalo e me arrastaram à costa. Eles me colocaram no primeiro
navio de saída que encontraram, não se importando para onde ele estava
indo, contanto que me levassem para longe de você.
— Então é por isso que você não apareceu, — ela disse
suavemente, sem culpa, embora se arrependesse profundamente. Foi um
complô familiar.
— Você realmente acreditava que eu a abandonei?
Ela suspirou e a brisa agitou as árvores raquíticas que haviam
começado a crescer dentro das paredes arruinadas da torre.
— Eles me disseram mais tarde que você havia feito exatamente
isso. Eles me disseram que você caiu em si e fugiu, em vez de enfrentar
uma vida comigo.
— Bastardos! — Ele gritou. Um bando de andorinhas fugiu
aterrorizado com sua malevolência, passando pela sombra de Angus e
saindo para o céu aberto. Ele se defendeu, embora elas não pudessem
machucá-lo. — Suponho que meus irmãos pagaram o preço por isso. Todos
foram mortos ou capturados.
— Se você tivesse ficado, você teria morrido com eles, em
Culloden Moor, e eu ainda teria perdido você, — disse Georgiana
suavemente. Ela se aproximou ainda mais. — Conte-me para onde o navio
levou você. Eu nem imagino.
Mas Angus estava olhando a estrada, pela janela, mais uma vez.
— Querido Deus! Eu estou vendo um fantasma!
Georgiana olhou para baixo. Uma carroça passava, mas o único
fantasma era o véu de poeira que corria atrás do veículo. A jovem sentada
ao lado do cocheiro olhava fixamente à torre, apertando os olhos ao sol,
com uma das mãos apertada nas rédeas. Um longo cacho vermelho flutuou
solto na brisa.
— É você, gràdhach! Que tipo de feitiçaria é esta?
Georgiana riu e ele se virou para ela surpreso. Ela o ignorou por
um momento, manteve os olhos fixos na garota na carroça, sentiu-se
orgulhosa e o alívio foi preenchendo seu peito vazio.
— É minha neta Caroline, finalmente ela está aqui, — disse ela.
Ela deu a Angus um sorriso deslumbrante enquanto a carroça contornava
uma curva da estrada e desaparecia sobre a borda do vale, rumo ao novo
castelo.
Angus olhou para ela, atordoado.
— Como você conseguiu... — ele começou, mas ela lhe deu um
sorriso coquete.
— Você acha que ela se parece comigo, não é?
Angus se sacudiu e assentiu, sentindo-se um tolo.
— Sim. O mesmo cabelo, a mesma pele branca. É a moça que
você pretende para Alec?
Ela sorriu.
— Sim. O que você acha?
Ele gemeu.
— Que o céu o ajude. Um olhar para aqueles olhos e ele será um
homem perdido. É um sentimento que me lembro muito bem!
— Se ele chegar até aqui, — disse Georgiana, com os dedos dos
pés curvados ao receber o elogio inconsciente de Angus.
— Sim, — ele murmurou, olhando a carroça. — E é melhor ele
chegar aqui rapidamente.

Capítulo 9

Caroline sentou-se na encosta da colina à sombra da velha Torre


de Glenlorne e observou as nuvens se apressarem no perfeito céu azul como
debutantes em uma pista de dança. A condessa ficara feliz em aceitar a
senhorita Forrester, no lugar da senhorita Best, uma vez que se assegurara
que Caroline possuía ainda mais habilidades e talentos para ensinar às
meninas, e era de bom caráter moral.
— Haverá chuva esta noite, — disse Sorcha de doze anos,
sombria, seguindo o olhar de Caroline.
— Então vai fazer as flores crescerem! — Disse Megan. Aos
dezoito anos, ela era bonita e sofisticada.
— Mais especialmente as lavandas, rosas silvestres, e visgos,
Megan, — disse Alanna, de dezessete anos, num tom provocador.
— E muita rainha do prado e damiana, — acrescentou Sorcha. —
Muira disse que você precisa encontrar a damiana. — Ela e Alanna se
cutucaram e sorriram como conspiradoras.
O queixo de Megan se elevou e Caroline viu um rubor beijar suas
bochechas.
— E para que servem essas flores? — Ela perguntou gentilmente.
— É Véspera do Solstício de Verão amanhã à noite, — disse
Sorcha.
— Vocês celebram a véspera de São João? O solstício de verão?
— Caroline perguntou surpresa, como Devina permitiria isso sem qualquer
desaprovação sobre o antigo costume.
Alanna deu uma risadinha.
— Suponho que vocês não sejam tão supersticiosos na Inglaterra.
Não devemos, eu sei, mas muitos Highlanders ainda honram os velhos
costumes. A véspera do Verão é realmente apenas uma desculpa para uma
festa. Haverá uma fogueira e danças. Nada para prejudicar nossas almas.
— Eu sei, — Caroline sorriu. — Nós fazíamos o mesmo na
Inglaterra, onde eu cresci. — Elas deveriam estar lendo um tratado sobre os
deveres domésticos de uma dama inglesa, mas o glorioso tempo e a emoção
da celebração tornavam difícil se concentrar, mesmo para Caroline. O vento
estava quente, as flores silvestres perfumadas e Glenlorne era, sem dúvida,
o lugar mais bonito que ela já vira. — Como se comemora aqui?
Alanna encolheu os ombros.
— Bolos e cerveja em uma fogueira, é só isso.
— Não, não é. Não se você acredita nos velhos hábitos — então,
existirá mágica, fadas e feitiços de amor para serem lançados — Sorcha
disse sorrindo para Caroline. — A Velha Muira prometeu fazer um amuleto
de amor para Megan este ano, para ver se ela vai encontrar um amor
verdadeiro no próximo ano.
Caroline observou um rubor nas bochechas de Megan.
— Oh, ela já encontrou seu verdadeiro amor! — Disse Alanna. —
Ela gosta de Brodie. Ele é nosso primo e será o próximo Laird, se Alec não
voltar para casa. Mamãe insiste que devemos nos casar com lordes ingleses,
mas ela vai abrir uma exceção se Megan se casar com Brodie. Ela será uma
condessa, não será, senhorita?
— Hush! — Megan se levantou e bateu o pé para parar a
provocação.
— Och, ela precisará mais do que charme se quiser ganhar
Brodie, — continuou Alanna, apesar do olhar de sua irmã. — Toda moça
em até cem quilômetros ama Brodie. Ele é bom de briga, mesmo que não
seja muito esperto, e vai ser o próximo Laird.
Megan corou até ficar quase escarlate.
— Mamãe diz que isso manterá Glenlorne na família, isto é tudo.
— Se ela tiver sorte, ela pode pular o fogo amanhã à noite com
Brodie, — brincou Sorcha. — Ele é o rei do solstício de verão e deverá
escolher uma rainha. Megan tem certeza de que ele vai escolhê-la. — Ela
puxou Alanna e elas deram as mãos e dançaram em círculo ao redor da
irmã.
— Talvez ele dance com você, dê flores para o seu cabelo, —
brincou Sorcha. — E a beijará nas sombras onde mamãe não possa ver.
O rosto de Megan ficou ainda mais vermelho, mas ela levantou o
queixo, fechou os lábios e olhou para a velha torre como se fosse a coisa
mais fascinante do mundo.
Caroline seguiu seu olhar. A frágil pedra amarela brilhava à luz do
sol. Os ramos de hera emaranhados agora pareciam ser tudo o que mantinha
em pé o antigo lugar. Caroline se perguntou quantos solstícios de verão ela
havia presenciado. O vento entoava pelas janelas vazias.
— Você acredita em fantasmas, senhorita? — Perguntou Megan,
ignorando a provocação de suas irmãs. — Alguns dizem que a torre é
assombrada.
— Só por texugos e gralhas! — Sorcha disse, mas a hera
emaranhada balançou ao vento e uma nuvem passou sobre o sol, fazendo a
sombra da torre se estender em direção a elas. O sorriso de Sorcha
desapareceu. Caroline estremeceu também. Era sua imaginação, ou havia
um rosto na janela do topo? A pele arrepiada subiu em seus braços, e ela
teve a estranha sensação de que alguém a estava observando, esperando por
ela. A nuvem passou e a sensação desapareceu.
— Claro que não, — disse ela. — Não acredito em fantasmas,
claro que não.
— Provavelmente não é um fantasma. Dizem que se você colher
sementes de samambaia na noite de verão, você ganhará o poder da
invisibilidade, — Alanna disse a ela. — Talvez haja alguém invisível nas
proximidades, um rapaz ou uma moça que tenha colhido a semente, e hoje
lamenta tê-lo feito, uma vez que eles podem andar invisíveis entre os vivos,
completamente despercebidos. — Ela suspirou com a noção romântica e a
antiga torre pareceu suspirar com ela. Caroline pensou em William, agora
casado com sua sobrinha Lottie, e lembrou-se de como esperara que ele a
notasse. Mas ele não a notara. Ela reconheceu a mesma expressão
melancólica e desolada no rosto de Megan.
— O que acontece com o amuleto de amor da velha Muira? —
Perguntou Caroline.
— Nada além de rosas e lavanda! — Megan disse rapidamente.
— E erva de São João, hera e visco, — acrescentou Sorcha. —
Temos uma lista de Muira com o que deve ser reunido.
— Também precisamos de urzes para dar sorte, protege o gado de
doenças, — disse Alanna. — Pelo menos, é o que dizem.
— Brodie também diz isso, — disse Megan. Ela sentou-se ao lado
de Caroline. — Como as inglesas conhecem quem será seu verdadeiro
amor, senhorita Forrester? — Perguntou ela.
Sorcha bufou. Sua irmã mais velha enviou-lhe um olhar mordaz.
— Damas inglesas não fazem feitiços, Sorcha Maire MacNabb.
Sorcha colocou as mãos nos quadris.
— Eu ainda não sou uma dama! E espero nunca crescer, se isso
significa ter que casar com alguém que não me ame. Todo mundo sabe que
ele anda também com as moças da vila, Annie, Kat e Nan. E está tudo bem
para você, e se a mamãe traçar nosso caminho, não importa quantos feitiços
a Muira lance, Alanna e eu seremos casadas com senhores ingleses e
deixaremos a Escócia para sempre.
As três garotas pareciam chocadas com a possibilidade, Caroline
percebeu isso. O vento gemeu através da torre em solidariedade com as
moças.
— Tenho certeza de que falta muito tempo ainda. Vocês ainda não
foram oficialmente apresentadas, nenhuma de vocês, e duvido que haja um
lorde inglês por milhas. — Ela esperava que não, de qualquer forma. Ela
estudou os dedos por um momento. — Na Inglaterra, as meninas olham
para o fogo, no solstício do verão e esperam ver o rosto de seu verdadeiro
amor. Talvez você veja uma imagem do seu duque no fogo esta noite, e
quem sabe um dia você o encontre, e você se apaixonará, mesmo que ele
seja inglês.
Sorcha enrugou o nariz sardento com ceticismo.
Megan suspirou com a noção romântica.
Alanna ficou de pé.
— Olhe! — Ela disse, apontando para o vale. As pessoas subiam
a colina, alegres, rindo e carregando cestos. — Todo mundo saiu para
colher flores para o solstício de verão. Olhe, lá está Brodie.
Megan se sentou, seus olhos verdes se arregalando ao ver seu
amor.
Sorcha apertou a mão de Caroline.
— Podemos ir com eles, senhorita?
Como Caroline poderia dizer não? Era verão, e o ar era como
vinho, e havia alegria para ser sentida.
— Sua mãe espera que vocês voltem para o chá, — disse
Caroline. Era para ser mais uma lição sobre o bom chá inglês, o bom
comportamento e as conversas durante o chá inglês, sob o olhar crítico da
condessa Devina.
— Mas para isso faltam horas ainda! — Alanna implorou,
parecendo esperançosa. O coração de Caroline bateu forte e assentiu.
— Sim, tudo bem. No entanto, fiquem juntas. — Enquanto elas
fizessem parte de um grupo tão grande, o que poderia acontecer?
Megan pegou a bainha de seu vestido de musselina e colocou-a na
faixa em sua cintura, fora do seu caminho, como uma das moças da aldeia,
expondo seus tornozelos. Ela tirou os sapatos e as meias e mexeu os dedos
dos pés descalços. Caroline mal teve tempo de ficar chocada ou protestar
antes que as outras garotas fizessem o mesmo. Megan parecia uma feliz
moça das Highlands, não uma jovem se preparando para as regras e
restrições do mercado matrimonial de Londres. Ela mordeu o lábio
enquanto olhava através da encosta para Brodie, que estava cercada por
adoráveis mulheres, depois, correu colina abaixo para encontrá-lo.
Caroline juntou as meias e os sapatos descartados em uma pilha
bem arrumada e as observou correrem pela encosta, meninas de novo, não
damas. Elas não pediram para ela ir junto. Ela era uma criada, e
provavelmente imaginaram que ela era velha demais, e inglesa demais, para
gostar de atividades como pegar flores e flertar. Uma risada feliz flutuou até
ela na brisa, Caroline fechou o livro no colo e se deitou na grama fresca.
Ela olhou para a torre novamente, amarela como queijo seco
contra o céu azul. A vista lá de cima deveria ter sido espetacular, uma vez.
Na verdade, provavelmente ainda era.
Um trinado de risadas atravessou a encosta e Caroline se apoiou
no cotovelo para observar as meninas descendo a encosta, esquecendo-a
completamente. Ela reprimiu sua decepção. Ela era uma mulher crescida, e
uma governanta, não uma garota procurando flores para um amuleto de
amor. Ela duvidava que agora pudesse encontrar o amor verdadeiro. A torre
gemeu ao vento.
Caroline olhou para as janelas vazias. Certamente era apenas sua
imaginação. Nenhum fantasma assombraria um lugar tão decadente.
— Olá? — Ela chamou, só para ter certeza, mas a única resposta
foi a risada do vento.
Ela levantou-se e protegeu os olhos com a mão, examinando a
torre. Houve um som fraco no interior — um grito suave, talvez. Ou um
gemido. Ela circulou as pedras antigas e encontrou a porta aberta. Ela
hesitou, olhando para a abertura sombria, para a boca negra contra o dia de
verão. O choro veio de novo, desta vez mais alto. Um animal talvez — ou
uma criança — havia dezenas de pequenos na aldeia. E se alguém estivesse
perdido, sozinho e assustado, ou mesmo machucado? Ela empurrou a porta
mais larga.
— Olá? — As antigas dobradiças rangeram um aviso, mesmo
quando o grito voltou. Caroline enfiou as saias do jeito que as garotas
tinham feito e respirou fundo
— Estou chegando, — ela avisou, e ouviu sua própria voz ecoar
de volta.

Capítulo 10

O castelo de Glenlorne parecia o mesmo de quando ele saíra de


casa oito anos antes, como se o tempo de fato parasse nas Highlanders. O
novo castelo esperava por ele no topo de um longo vale que dava para o
lago, rodeado por colinas e pelo céu, e quando a carruagem que ele havia
contratado na estalagem levou-o até mais perto, Alec sentiu uma onda de
orgulho, de vontade de que as coisas voltassem a ser, realmente, do jeito
que eram uma vez. Recordou-se, de pé, na encosta escarpada acima do lago
com seu avô, respirando o cheiro de urze e turfas acesas, e ouvindo os
contos de como tudo havia sido, antes de Culloden e os ingleses, antes de
que o Clã MacNabb perdesse o que havia de bom, o orgulho e a esperança
do clã desaparecendo com os sete irmãos, todos mortos em Culloden, ou
através das represálias brutais seguidas do príncipe Charlie até a batalha
final, onde Angus MacNabb foi o único que restou. Ele havia estado no
mar, e quando retornou encontrou um punhado de esfarrapados, MacNabbs
quebrados que esperavam que ele fosse seu senhor, para corrigir tudo, para
voltar o relógio e dar-lhes de volta o que haviam perdido, como se um
homem pudesse realizar tal façanha. Alec se lembrou da dor nos olhos de
Angus quando ele falou daqueles dias. Ele fez Alec prometer que, algum
dia, quando fosse o conde, Glenlorne se levantaria novamente, voltaria a ser
um lar cheio de orgulho e prosperidade. Alec cerrou os punhos e olhou para
o castelo. Se seu avô pudesse vê-lo agora, o velho certamente ficaria
decepcionado. Alec sentiu a dor da culpa através da lembrança daquela
promessa. Ele não era um líder ou um milagreiro. Ele era um ladrão e até
nisso ele falhou. Ele não os quis. Não ficaria surpreso se os membros do clã
o colocassem para fora de Glenlorne, para sempre.
Ele olhou para o pequeno cemitério na beira da aldeia, os
marcadores subindo pela grama como dentes podres. Seu avô foi enterrado
lá e agora seu pai, também. Ele ficaria deitado ali, quando chegasse sua
vez? Uma nuvem passou, deixando o cemitério na sombra, enquanto
deixava o sol brilhar nas pedras amarelas e cinzentas do castelo,
iluminando-o com luz, fazendo parecer que brilhava.
A carruagem parou na porta.
— Aí está você, Laird, — disse o carreteiro, pulando para pegar
as caixas de Alec da parte de trás. — E eu posso dizer que é ótimo ter você
em casa novamente. — Ele sorriu como se Alec fosse de fato o salvador.
Alec assentiu e lhe deu uma moeda. Ele vendeu seus parcos mobiliários e
seus livros e pedira um pouco emprestado para Westlake, assim conseguiu
dinheiro suficiente para fazer esta viagem, para comprar algumas
bugigangas para suas irmãs, para que elas não soubessem o que ele
realmente era quando chegasse em casa.
Casa. Ele estava em casa? Pelo menos por enquanto. Ele não
ficaria. Ele não poderia. Renovaria sua promessa de venda, tentaria achar
no local um bom comprador. Ele correu as pontas dos dedos sobre a
escultura da porta da frente, o rosto de um lobo. Parte da mandíbula estava
faltando, arrancada durante as represálias depois de Culloden, e a criatura
orgulhosa parecia mais um cão mestiço.
— Apenas um dos pecados pelos quais os ingleses devem
responder, — seu avô resmungava, toda vez que passava pela escultura.
Alec olhou nos olhos da fera destruída. O castelo exigiria uma boa
quantidade de reparos antes que ele pudesse vendê-lo.
— Alec, meu rapaz!
Ele se virou para encontrar a velha Muira dando a volta ao lado
do prédio, carregando cestos cheios de ervas e flores.
A criada já era velha quando ele era rapaz, e agora estava ainda
mais velha, mas inalterada, intocada pelo tempo como o resto de Glenlorne.
Ele sorriu enquanto ela se apressava para ele, seus olhos brilhando, ainda
azuis como o céu.
— É você, não é? — Ela moveu as cestas no quadril e estendeu a
mão para tocar sua bochecha, como se quisesse ter certeza de que ele não
era um fantasma.
— Sim, sou eu, Muira, — disse ele, voltando-se para o gaélico.
Ela recuou e gargalhou.
— Eu sabia que você voltaria! Ela tem dito que você deve estar
morto, mas eu sei que se você estivesse, eu sentiria isso em meus ossos. O
castelo sentiria isso. Ele está esperando por você, todos esses anos, e aqui
está você.
Alec observou seus olhos se encherem de lágrimas sentimentais.
Muira estava em Glenlorne desde que Alec se lembrava. Ela era a
cozinheira, governanta, curandeira e parteira de Glenlorne. Ela conhecia as
lendas do clã e as velhas histórias, assim como o avô dele. Ela também
serviu como cuidadora de Alec quando a mãe dele morreu, antes de seu pai
se casar com Devorguilla. Devorguilla cometeu o erro de tentar mandar
Muira embora, dizendo que Muira era uma bruxa. Foi seu conhecimento de
ervas e feitiços que a salvou. Ela salvou Devorguilla através de um parto
difícil no nascimento de Megan, salvou a vida dela e a da criança, e embora
as duas mulheres nunca falassem sobre isso, uma trégua desconfortável
existia entre elas, e Muira havia ficado. Muira se recusava a falar o nome de
Devorguilla ou a chamar de condessa, e Devorguilla se referia a Muira
como — a cozinheira.
Alec abriu os braços, mas Muira sacudiu a cabeça.
— Entre, rapaz. Estas são as ervas do Solstício de Verão e não me
atrevo a deixá-las tocar o chão.
Ele havia esquecido os encantos, feitiços e superstições.
— Deixe-me ajudá-la, — disse ele, e tentou pegar as cestas.
Muira se agarrou com um aperto que desmentia a fragilidade de seus ossos.
— Não seja idiota. Você é o Laird, você não pode fazer o trabalho
das mulheres.
Ela apontou à porta da frente.
— Você vai pela frente, como é apropriado. Vou levá-las pela
cozinha e ir ao vestíbulo para recebê-lo em casa.
Ela correu ao virar o canto, e Alec subiu os degraus e olhou para a
enorme porta de carvalho, marcada por batalhas e anos de uso. Ele tocou os
profundos arranhões deixados pelos fuzis ingleses e puxou a mão. Este não
era o momento para esses sentimentos. A porta precisava de uma camada de
tinta, talvez, para fazer com que parecesse menos uma fortaleza medieval e
mais como uma casa, de modo que os potenciais compradores não se
assustassem antes mesmo de entrarem.
Ele respirou fundo quando abriu a porta, imaginando o que
encontraria. Ele ficou no degrau largo que levava ao grande salão do
castelo. Estava aquecido lá dentro depois do calor do dia de junho. Ele se
lembrou do quadro da família. Era o salão de um Laird — um homem
poderoso, a favor do rei da Escócia, seu confidente e amigo. Ele olhou para
o estrado perto da parede, que seu avô disse que uma vez possuía uma
cadeira enorme para o uso do Laird. Alec nunca a viu. Ela havia sido
quebrada, usada pelos soldados ingleses para abastecer as duas enormes
lareiras, projetadas para aquecer o vasto espaço nas frígidas noites das
Highlanders. Agora, uma cadeira simples estava ali, em um espaço
reservado, esperando a glória dos MacNabbs retornar.
As paredes eram estéreis de decoração, exceto o símbolo do clã
entalhado em pedra, acima da cadeira do Laird. Seu avô contou também dos
dias em que o salão estava repleto de tapeçarias, armas e escudos, mas esses
haviam desaparecido e, com a passagem dos velhos, assim como Muira,
logo se perderiam na memória. Alec podia imaginar seu avô apontando o
local na parede onde cada arma estava pendurada... O machado de
Malcolm; uma faixa abençoada por St. Margaret, o punhal e a espada de
Alec MacNabb, o primeiro que recebera este nome, e o Laird que construiu
a torre para sua noiva, uma criatura delicada que não podia suportar os
ventos gelados que assobiavam através da velha torre no penhasco. Ele
atravessou até a janela, abriu as persianas e olhou através do vale, para a
velha torre. Ainda estava de pé, em sentinela.
— Aqui está. — Ele ouviu a voz de Muira e se virou. Ela
carregava um cálice transbordando em uma bandeja coberta com um
pedaço de xadrez. — É a taça do Laird, — disse Muira com orgulho. —
Feita a partir do chifre da grande cabra montanhesa que tentou matar o
primeiro Alec MacNabb, e enfeitada com prata presenteada pelos clãs mais
pobres e mais fracos, que vieram de joelhos para reverenciar o nosso nome
e juntar-se aos grandes MacNabbs.
Alec olhou para as profundezas do uísque que enchia o copo até a
borda. O uísque, pelo menos, parecia estar em oferta abundante em
Glenlorne.
— Beba! — Muira o encorajou. — Ele vem do barril que estava
escondido em uma caverna por seu tataravô, para uma ocasião como esta.
Alec se perguntou se era verdade.
— Existe um feitiço sobre isso? — Ele perguntou, levantando a
taça para seus lábios.
Muira esperou até ele beber antes de responder.
— Só um pouquinho, talvez, e apenas por sorte, um novo futuro
brilhante e herdeiros fortes e saudáveis, claro. Mas nós dificilmente
precisaremos de um feitiço agora que você está aqui. Você, finalmente, vai
acertar as coisas. O clã MacNabb precisa somente de um líder, novamente,
e tudo ficará bem.
Sessenta mil libras também ajudariam a consertar as coisas, ele
pensou. Estava na ponta da língua para contar a ela sobre Sophie, sua noiva
e a potencial mãe daqueles herdeiros fortes e saudáveis, mas ele
permaneceu em silêncio. E se ele não se casasse com Sophie, e se ele
vendesse Glenlorne? Seus filhos, se ele tivesse algum, nunca veriam
Glenlorne. Bebeu o uísque, saboreando o sabor rico e envelhecido. Muira
era outra alma que ele estava prestes a decepcionar. Ele sentiu como se seu
avô estivesse franzindo a testa para ele da cadeira do chefe. Ele olhou para
trás para se certificar de que a cadeira estava vazia.
— Onde estão as mulheres? — Perguntou Alec.
Muira sorriu.
— É verão! Elas estão nas colinas ou, claro, reunindo o que é
necessário para a celebração. — Ela franziu os lábios, e sua pele se dobrou
em linhas profundas e vincos. — Pelo menos, espero que estejam. Eu não
sou mais a cuidadora delas. Ela contratou uma nova governanta e...
— Você não tem que trabalhar na cozinha? — Alec se virou para
encontrar Devorguilla de pé, ao pé da escada. Ela não havia mudado. Ela
ainda era linda e vestia um elegante vestido inglês. Seus olhos escuros
viajaram sobre Alec, sobre a taça e sobre Muira, enquanto ela entrava no
recinto. A temperatura pareceu cair quando ela entrou. — Vá, — ela
ordenou para Muira, e ficou vermelha quando a velha olhou para Alec
pedindo confirmação. Ele balançou a cabeça e Muira saiu do recinto.
— Olá, Devorguilla, — disse Alec.
— Você não nos disse que viria, — ela disse, seus olhos não
oferecendo boas-vindas.
— Eu não sou um fantasma se é isso que você teme, — ele disse,
e ela inclinou a cabeça e sorriu.
— Não, eu posso ver que você está bem saudável e bem vivo,
embora eu esperasse que você seria tão bronzeado quanto um vendedor
ambulante, por todos esses anos no sol dos climas do Sul, e ainda assim
você parece tão branco quanto um inglês. Como foi sua viagem para casa?
Quanto tempo levou para navegar por todo esse caminho? — Ela
perguntou, seu tom zombeteiro. Algo nos olhos dela dizia que ela sabia que
ele estava em Londres o tempo todo.
Ele deu o sorriso mais encantador que ele conseguiu.
— E você parece bem. Nem um dia mais velha do que quando eu
estava aqui. Muira conhece suas poções. Ele subiu os degraus até a cadeira
do Laird e sentou-se com o copo de uísque ainda na mão.
Ela o observou em silêncio, seus olhos sombrios.
— Vou tomar isso como um elogio. Diga-me, você trouxe
presentes? Dinheiro, talvez? Nós precisamos de dinheiro, como você pode
ver. — Ela indicou o local com dedos magros.
A garganta de Alec se apertou.
— Eu tenho presentes para as meninas. Quanto ao dinheiro,
precisarei ver as contas.
Os olhos dela se afiaram.
— Não há muito para ver. Nós vivemos simplesmente, como
devemos.
— Ainda assim, — ele insistiu. Ele estava sem palavras, tão
inseguro como quando era um menino.
— Posso assegurar-lhe tudo está em ordem aqui.
— Eu estou em casa novamente, vivo e bem, e eu vou gerenciar
minhas propriedades eu mesmo. Obrigado por fazer isso nos últimos meses.
Os olhos dela brilharam.
— Meses? Eu tenho administrado as coisas há anos. Seu pai não
foi capaz.
— Não é bom falar mal dos mortos, Devorguilla, — ele
interrompeu.
— Devina, — ela disse.
— Sim, — disse Alec. — Ouvi dizer que você mudou seu nome.
Eu duvido que meu pai teria gostado disso.
Ela ignorou aquilo, seus olhos brilhando.
— Quando as garotas fizerem sua estreia em Londres, vou mudar
os nomes delas, também. Margaret, Alice e Claire. Você já as viu? Elas são
muito bonitas, mas isso não é suficiente. Eu pretendo ver elas encontrarem
maridos ingleses, homens com títulos, com fortunas e terras. Claro, uma
mudança de nome não é suficiente. Elas precisarão de dotes para superar a
mácula das Highlands.
— Ah, e você tem uma fortuna para essa eventualidade? —
Perguntou Alec.
— Você é o Laird agora. É você quem deve fornecer para elas.
Você quer vê-las casadas com mascates e vendedores ambulantes para viver
na miséria o resto de seus dias?
— Eu as quero felizes. Títulos e dinheiro não garantem isso, —
disse Alec. Claro que ele queria ver suas meias-irmãs, casarem bem, tanto
por amor quanto por fortuna. Ele pensou em Lady Sophie Ellison. Que
felicidade ele poderia oferecer a ela, aqui, quando ela estava acostumada
com o luxo das propriedades e da riqueza inglesa?
— Eu vejo que você é tão tolo quanto sempre foi. Você
costumava tagarelar sobre a glória do clã, como os MacNabbs eram
orgulhosos e bons. Mas amor? Você é um poeta agora? Eu ouvi dizer que
você fez o seu caminho no jogo de Londres. Eu pensei que oito anos disso o
curariam de sentimentos ridículos.
— Tudo é uma aposta, Devorguilla. Você apostou que eu estava
morto. Você perdeu.
— Devina! — Ela insistiu. — E eu nunca perco.
Ele se levantou da cadeira. O uísque zumbiu em suas veias. Ele
não queria ter essa conversa agora. Não, seria uma luta. Ele precisava de
tempo para pensar, decidir, e encontrar as palavras.
— Eu acho que vou encontrar as garotas e dizer olá.
— Elas estão dando um pequeno passeio no jardim com a
governanta, — disse ela. — Elas chegarão para o chá, em breve. Você pode
vê-las então. Elas não são mais crianças. Eles são jovens damas.
Todos esses anos, e ela ainda possuía o poder de fazê-lo se sentir
um garoto desajeitado e inepto, meio bárbaro, meio idiota.
— Por que esperar? É um dia lindo. Vou sair e conhecê-las, —
disse ele. Ele colocou o copo na mesa e saiu antes que os inevitáveis
insultos e palavras iradas começassem a voar. Sempre foi assim entre eles,
mas para sua surpresa, ela, simplesmente, ficou de pé e o observou ir
embora.
Sair do castelo e entrar no ar quente do verão era como sair de um
túmulo. Muira disse que as meninas haviam ido para as colinas. Ele
precisava de tempo para andar e pensar. O que ele diria a elas? Certamente
elas mudaram em oito anos. Ele seguiu a trilha feita entre as urzes, há
séculos, esculpidas pelo gado e pelas pessoas, o caminho que ele havia
tomado milhares de vezes quando menino, indo para o lago para pescar, ou
para o topo dos penhascos para procurar águias, ou caçar.
Ele tirou o casaco e pendurou-o no ombro e afrouxou o lenço. Ele
olhou em volta, viu o sol brilhar no lago e se lembrou dos prazeres de nadar
na água gelada, no auge do verão.
Sentiu uma pontada de arrependimento pela ideia de vender
Glenlorne, perdendo-o para sempre. Se ele vendesse a terra, nem precisaria
se casar com Sophie Ellison. Ele poderia dar seus dotes às irmãs e ir para o
Ceilão, finalmente. O condado de Glenlorne era uma responsabilidade que
ele não queria. Ele não era um lorde, nem um conde, nem um líder. E ele
nem queria ser.
Ele não encontrou ninguém no caminho, e antes que ele
percebesse, estava perto da velha torre, e mal podia dizer como foi parar ali,
já que estava imerso em pensamentos e não prestando atenção para onde
estava indo.
A torre havia perdido mais um pedaço de parede desde que ele
esteve ali. O bloco maciço estava na urze, na base da torre. O telhado
desaparecera quase inteiramente agora. Ele supunha que deveria ser
derrubado por segurança. Era como o próprio clã — outrora orgulhoso,
forte e alto, — e agora uma casca desmoronada.
Um movimento em uma das janelas chamou sua atenção. Uma
bandeira vermelha — não, uma longa mecha de cabelo vermelho —
flutuava na brisa. Ele viu o rosto dela, branco contra as sombras
acinzentadas. O vento cantarolou uma melodia sinistra. Um fantasma? Sua
garganta se apertou e ele olhou para ela, paralisado. Então ela estendeu a
mão para afastar o cabelo do rosto, os dedos esguios e sólidos, os olhos
fixos no horizonte. A raiva brilhou por causa da intromissão dela, tanto em
sua imaginação quanto em sua torre.
Como diabos ela entrou? A velha porta de carvalho era sólida e
permanentemente trancada — pelo menos desde a última vez que a vira —
para afastar qualquer pessoa suficientemente tola para tentar se aventurar lá
dentro.
Ela era uma tola garota local, sem dúvida, que estava aqui para a
festa do solstício de verão, ou ela escalou a torre podre como um desafio.
Havia sido seu lugar favorito, especialmente nesta época do ano. Ela não
entendia o perigo em que ela estava se metendo? O pânico tomou conta
dele. E se suas irmãs também estivessem na torre?
Ele gritou um comando em gaélico para que ela saísse, antes que
a torre decadente caísse sobre ela.
Ela se virou para olhá-lo, seus olhos encontraram os dele, seu
cabelo se enrolou em seu rosto e ele sentiu um choque passar por ele.
Ela era linda.

Capítulo 11

Estava bom dentro da torre e também, escuro. Uma família de


pombas arrulhou entre as últimas vigas apodrecidas, observando Caroline
com curiosidade quando ela entrou. Foi isso que ela ouviu? Ela protegeu os
olhos com a mão e olhou para elas. Quatro filhotes perto do ninho, o teto
estava aberto para o céu. Devia haver outras criaturas vivendo ali, também.
O lugar apresentava um forte cheiro de umidade e podridão, com muitos
cantos escuros. Uma enorme lareira ocupava a totalidade de uma parede, a
penumbra aquecida apenas por alguns fracos raios de luz do sol. Salvo pelo
esvoaçar das pombas e o sussurro alegre do vento, a torre ficou em silêncio.
Não havia crianças em perigo. As grossas paredes de pedra bloqueavam o
resto do mundo, e Caroline se sentia estranhamente segura ali. Este lugar já
foi um santuário, uma casa, e os ecos disso permaneciam depois de séculos
de desuso.
Ela deu um passo à frente e suas saias farfalharam sobre as folhas
secas e pedras caídas que cobriam o chão de laje. O musgo cobria tudo de
veludo verde. A luz escorria pelas janelas quebradas e pelo telhado que
faltava no recinto, no centro do andar. Ela cruzou e ficou ali, sentiu o lugar
antigo cantarolar em torno dela. Caroline girou em um círculo lento,
encantada.
Um conjunto de degraus de pedra desmoronando levava para
cima. No topo, a luz de uma janela estreita repousava nos degraus
musgosos como um caminho de esmeraldas. A vista deveria ser espetacular.
Ela começou a subir. O vazio caia abaixo dela enquanto ela subia
mais alto, e ela se agarrou à parede fria de pedra e se recusou a olhar para
baixo. Ela podia ouvir o barulho de pedrinhas quando elas caíam dos
degraus desmoronados para o chão distante, mas ela as ignorou, seu coração
ficando mais leve quanto mais alto ela ia, o ar mais doce. Ela finalmente
alcançou a janela e parou, ofegante, para olhar para fora.
A vista era de fato maravilhosa, varrendo a extensão do vale,
atravessando o lago brilhante até a porta do novo castelo. O vale era verde e
púrpura com urzes, pontilhada de flores silvestres amarelas e brancas sob
um céu azul brilhante. O vento estava perfumado com um aroma intangível
que ela quase podia saborear. Isso a deixou tonta. Ela se inclinou para o
vento, e sentiu uma mecha de cabelo se desprender do nó apertado que ela
havia prendido na parte de trás da cabeça, acariciando-a através de dedos
frios. Foi maravilhoso. Ela estendeu a mão e tirou os grampos, colocou-os
no bolso e deixou o cabelo se soltar. Como era fácil acreditar em magia,
amor verdadeiro e velhas lendas ali. Ela era uma princesa em um conto de
fadas, e tudo o que ela precisava era um belo príncipe.
Uma voz masculina irritada gritou alguma coisa em gaélico.
Caroline olhou para baixo e viu o homem olhando para ela. Ele
não vestia casaco, nem lenço, e suas mangas estavam enroladas, revelando
antebraços musculosos. Ele estava com os olhos sombreados contra o sol
com uma mão, e seu cabelo escuro soprava ao vento, revelando uma
sobrancelha larga. Ele gritou de novo, sua voz era profunda e cheia de uma
autoridade irada. Ela não o reconheceu como alguém que havia conhecido
em Glenlorne.
— Eu não falo gaélico, — ela gritou de volta, e acenou para ele,
não querendo que nada interrompesse aquele momento perfeito.
O queixo dele caiu.
— Bom Deus, você já está aqui? Suponho que a capela já esteja
marcada para o casamento também, — disse ele em inglês.
Casamento? Caroline piscou para ele. Isso era algum truque do
Solstício de Verão que fazia um estranho propor-lhe? Ela escondeu um
sorriso. Pelo menos ele era mais agradável de olhar do que Mandeville ou
Speed. Uma risadinha escapou.
— Desça. A torre não é segura, — disse ele, seu tom ainda severo,
mas persuasivo também. Com a mão estendida para ela, ela quase podia
acreditar que ele realmente veio para ela, um príncipe que iria levá-la
embora e se casar com ela.
Ela só precisava se aproximar, pegar a mão dele e deixar que ele a
carregasse.
— Eu aceito, — ela respirou, inclinando-se para fora da janela,
pegou a tontura do momento, bêbada no perfume das flores, a carícia de
seda do vento em seu rosto. Ele era bonito, ou pelo menos, ela achava que
ele fosse. Era difícil dizer de seu poleiro, tão alto, acima dele. Ela se
inclinou ainda mais para dar uma olhada melhor, Julieta para seu Romeu.
Ele não sorriu e estendeu seus braços. Seus olhos se arregalaram de horror.
— Não se incline mais para fora da janela. Eu vou subir e vou
buscá-la. Não se mova! — Então ele desapareceu, correndo ao redor da
torre, fora de sua visão.
Ela piscou para o local onde ele estivera, em pé, e sentiu um
momento de decepção. Talvez ela tenha imaginado ele, afinal de contas, um
rei das fadas que cruzou o véu entre os mundos enquanto era esperado o
solstício de verão. Que idiota! Ela devia encontrar as garotas, levá-las de
volta ao castelo para se vestirem para o chá. Se estivessem atrasadas, a
condessa Devina censuraria Caroline, depois suas filhas, e depois, Caroline
novamente.
Ela se virou para descer, observando seus pés nos degraus
estreitos. Se ele for real, deve ter ido procurar ajuda, pensando que ela era
estúpida, de pé, em uma torre podre, com o cabelo selvagem ao redor de
seus ombros.
De repente, ele estava lá, diante dela, de pé, na escada abaixo
dela. Ela deu um grito quando quase bateu nele, e recuou alguns passos. Ele
era de fato bonito — e alto, de ombros largos. Sua camisa branca brilhava à
luz fraca da torre. Ele olhou para ela por um momento, sua testa franzida.
— O que diabos você está fazendo?
Ela já ouvira aquela voz antes? Impossível, ele não era alguém
que ela conhecesse. Um homem como este seria difícil de esquecer. Ela
levantou o queixo.
— Eu estava acabando de descer, — ela disse em seu melhor tom
de dama.
Ele não se moveu, nem se afastou para deixá-la passar. Ele ficou
ali, olhando para ela, seus profundos olhos cinzentos concentrados em seu
rosto, em seu cabelo, varrendo seu corpo e parando. Ela percebeu que tinha
esquecido que sua saia ainda estava enfiada no cinto. Ela a afrouxou com
dedos nervosos e a deixou cair, cobrindo seus tornozelos. Ela endireitou a
coluna, substituindo a expressão de uma dama da mansão, por uma simples
governanta, embora pudesse sentir o sangue quente preenchendo suas
bochechas.
Ele sorriu para ela, a mudança de expressão súbita, transformando
seu rosto bonito em algo de fazer parar o coração. A respiração dela ficou
presa na garganta. Ele era o homem mais bonito que ela já havia visto. Era
o tipo de sorriso que roubava a respiração de uma mulher, o sorriso de um
amante. Ninguém nunca havia olhado para ela assim — nem Sinjon nem
William e, certamente, nem Speed ou Mandeville. Seu coração quase parou
de bater. Seu corpete estava muito apertado e estava difícil respirar.
— Você está procurando por alguém? — Ela perguntou, como se
ele, não ela, fosse o único a estar ali.
— Eu vim procurar por minhas irmãs. Eu não esperava ver você
aqui. Não tão cedo, pelo menos.
Agora, o que isso significava? Ela engoliu em seco, imaginando
se ele era perigoso. Ela recuou mais um passo.
— Eu sou a única aqui, estou com medo. Talvez você me dê
licença. Eu devo ir. — Ela esperou que ele se movesse, mas ele ficou
olhando para ela, do mesmo lugar.
— Se você, por favor, eu...
Alguém a empurrou. Ela sentiu as mãos fortes nas costas e, de
repente, ela voou pelo ar. Ela gritou e esperou que fosse pousar no chão de
laje bem abaixo.
Os braços dele pousaram ao redor dela, pegaram-na contra seu
peito. Ela sentiu o calor do corpo dele aquecido pelo sol, a dureza de seus
músculos, a batida de seu coração contra o dela. Ela encontrou a surpresa
em seus olhos, seu nariz estava a um centímetro do dele, por um instante,
antes de se virar e pressioná-la contra a parede, mantendo-a segura,
tentando conseguir seu próprio equilíbrio. Ele olhou para a borda, depois de
volta para ela. Ela podia ver seu rosto refletido em seus olhos, sentiu o leve
cheiro de uísque em sua respiração e o cheiro de urzes.
— Alguém me empurrou! — Ela engasgou, e ele olhou para ela
em dúvida, antes de recuar. Ele manteve uma mão sob o cotovelo dela. Ele
nem se incomodou em olhar para cima para ver se havia alguém atrás dela.
— Os caminhos são perigosos. A torre inteira é. Deveria ter sido
demolida cem anos atrás! — Ele começou a descer os degraus, ainda a
segurando, uma mão no cotovelo, uma ao redor de sua cintura, ajudando-a,
mantendo-a segura, como se fosse, de fato, uma princesa. Seu toque a
transformou em geleia, a parede de pedra a fez gelar de um lado, e o calor
do corpo dele a fez queimar do outro.
Caroline parou de andar e voltou a olhar os degraus, mas não
havia ninguém lá.
Ele seguiu o olhar dela.
— Você mesmo disse que estava sozinha, — ele disse
sensatamente.
Ela estava sozinha, não estava? Exceto pelo belo estranho
escocês. Mas ele estava abaixo dela. Ele não poderia tê-la empurrado. Ela
sentiu seu rosto arder novamente. Ele provavelmente pensou que ela havia
se atirado para ele, em resposta a sua proposta improvisada de casamento.
Ela provavelmente imaginou isso, também.
Ele a soltou assim que eles estavam em terra firme e recuou a
uma distância apropriada. Ele indicou, com um gesto amplo, que ela
deveria precedê-lo pela porta, de volta ao calor e à luz do mundo real. Ela
ficou mortificada enquanto ele puxava, com força, a pesada porta de
madeira para fechá-la.
— Como você conseguiu abrir isso? — Ele disse enquanto
pegava uma pesada barra de madeira, cravejada de ferro. — Esta porta está
trancada há anos.
Caroline franziu a testa. A porta estava fechada quando ela
chegou? Ela não se lembrava de abri-la. Ela o observou colocar a pesada
barra de carvalho no lugar, seus músculos se flexionando sob o linho de sua
camisa. Ela certamente teria se lembrado de mexer nisso.
Ela apertou as mãos em volta dos braços e sentiu um calafrio
enquanto se lembrava de Megan lhe perguntando se acreditava em
fantasmas. Claro que não acreditava. Mas enquanto olhava para as paredes
de pedra da janela vazia, sentia novamente como se alguém a estivesse
observando. Espinhos rastejaram sobre sua carne. Que lugar estranho era
aquele.
— Eu imagino que não preciso avisá-la para ficar fora da torre,
moça.
Moça? Caroline engoliu em seco. Ele pensava que ela era uma
garota local. Ela supunha que não se parecia em nada com a filha de um
conde inglês, ou mesmo com uma governanta. O vento levantava seu cabelo
e tentáculos vermelhos se estendiam para ele. Ela recuou e pegou-o em suas
mãos, arrumando-o, pegando os grampos no bolso.
Um chamado o fez virar. O estômago de Caroline caiu a seus pés.
Eram as garotas que voltavam para o outro lado da encosta, os braços e as
saias cheias de flores. A condessa não aprovaria. O cabelo de Megan estava
solto, enfeitado com flores silvestres e seus pés estavam descalços. Sorcha
estava pulando de mãos dadas, com outra garota da idade dela. Alanna
estava seguindo com uma braçada de flores, as bochechas coradas.
Certamente eram garotas alegres, despreocupadas e beijadas pelo sol.
Ela teria que apressá-las de volta ao castelo, fazer com que elas
lavassem o rosto, penteassem os cabelos. Ela as lembraria firmemente das
regras, diria que eram filhas de um conde e... Ela engoliu em seco. Mesmo
no silêncio de sua própria mente, ela soava igual a Somerson.
E aqui estava ela, desgrenhada, a saia manchada de poeira e
musgo, parecendo... bem, uma moça. Com um homem. O que a condessa
diria para ela? Ela a dispensaria imediatamente, é claro, e com razão, e
então para onde ela iria? De volta para Londres? Não.
Seu salvador se afastara dela e observava as garotas, a mão dele
protegendo os olhos, a brisa mexendo os pelos escuros no antebraço, onde a
camisa estava enrolada. Ele também estava desgrenhado, com uma mancha
verde de musgo no ombro. Ela viu um sorriso lento florescer sobre suas
feições, transformando-o novamente.
As meninas obviamente o conheciam. Ela podia ver isso na
maneira como soltavam as flores e corriam até ele, gritando como
selvagens, com o restante dos rapazes e moças as seguindo avidamente.
Nossa. Ela era uma governanta agora, não uma moça. Em um
momento, eles a localizariam também. Ela podia imaginar a fofoca, a
especulação, os comentários. A história certamente chegaria à condessa
Devina. Caroline se afundou mais na sombra da velha torre e depois fugiu
pelas costas dele. Ela desceu pelo caminho que levava através da floresta,
de volta a Glenlorne e à sanidade.
Ela precisava mudar seu próprio vestido e lavar o rosto, e
lembrar-se de quem ela era.

Capítulo 12

— Alec!
Ele se virou para assistir a meia-irmã mais velha subindo a
encosta da colina até ele. Pelo menos pensava que fossem suas irmãs. Eles
eram mulheres adultas, agora, não as meninas das quais ele se lembrava.
Aquela realmente era Megan, a moça alta com o cabelo escuro, e Alanna no
vestido azul? Garotos da aldeia se arrastavam atrás delas como um bando
de cachorros na caçada. Claro, era o Solstício de Verão, e havia sol, flores e
risos. Uma combinação perigosa, pensou de modo protetor, e percebeu que
soava tão velho quanto seu avô, tão rígido quanto Westlake. Elas se
transformaram em belezas. Que rapaz poderia resistir?
Ele abriu os braços a tempo de pegar a primeira garota quando ela
se lançou contra ele. Ele a envolveu em um abraço.
— Você cheira a urzes, Alanna! — Ele disse.
— Eu sou Sorcha, — disse ela, franzindo a testa apenas um
pouco, olhando para ele com os olhos cinzentos de seu avô.
— Ah, me perdoe. Da última vez que a vi, você era... — segurou
sua mão a cerca de um metro da grama. Ela estava com apenas cinco anos
quando ele saiu, com sardas e os dentes da frente faltando e cachos ruivos
indisciplinados. Ela sorria para ele com um conjunto de dentes agora, mas
ela ainda era sardenta, ele notou, feliz que ela não havia mudado. Em
poucos anos, a pequena Sorcha seria uma beleza. Seu coração se contraiu
enquanto pensava nos anos que ele perdera, e sentiria falta no futuro.
— Você parece o mesmo que eu me lembro! — Ela disse, seus
olhos brilhando. — Mamãe disse que você estava morto, mas Muira sabia
que você viria!
Outra garota chegou.
— Alanna? — Perguntou com cuidado. Ela cresceu e era muito
bonita, e seus olhos ainda eram tão azuis quanto o céu.
— Sim! — Ela sorriu timidamente.
— E Megan, — ele disse, sorrindo para a jovem que se afastou
um pouco. Ela fez uma reverência e estendeu a mão.
— Olá, Laird. Eu sou Megan MacNabb. — Ela gritou quando ele
a puxou para um abraço, balançando-a em um círculo antes de colocá-la em
pé novamente.
— Você não era tão pesada na última vez que fiz isso, — ele
provocou e a observou corar. — E está cheirando a água de lavanda? — Ele
perguntou.
Sorcha riu, passando a mão nele.
— É muito inglês. Mamãe faz Alanna usar perfume de rosas.
Alec bagunçou o cabelo dela.
— E você? Que perfume você usa?
Ela riu.
— Eu ainda sou muito jovem.
— Ela é apenas uma criança, Alec, — disse Megan.
— Tenho quase treze anos! — Protestou Sorcha. — Quando eu
tiver dezessete anos como Alanna, vou mandar à França os melhores lírios
ou violetas, ou mesmo gardênias!
Os rapazes e moças da aldeia deram um passo à frente, dando-lhe
as boas-vindas, com sorrisos tímidos.
— Este é Brodie MacNabb, — disse Megan quando o último
rapaz deu um passo à frente. As garotas ao redor dele suspiraram a menção
do nome dele.
— Eu sou o herdeiro, — disse ele. — O filho de Conor MacNabb.
Você se lembra de mim?
Alec conhecera o garoto no funeral de seu avô e lembrava dele
como taciturno e faminto. Passou o dia escondido debaixo da mesa,
comendo. O herdeiro. Seu herdeiro. Se ele não tivesse voltado para casa,
aquele garoto alto de olhos azuis sem expressão, seria o Laird agora.
— Você está em Glenlorne há muito tempo? — Ele perguntou. A
propriedade de Conor estava a milhares de distância.
— Devina me convocou quando o último Laird morreu, no caso
de você estar morto, também. Eu vejo que você não está.
Ele não parecia feliz com isso, Alec observou. Também notou a
maneira como Megan olhou para ele. Ele deu um passo à frente e colocou o
braço em torno de sua irmã.
— Tenho certeza de que há muitas novidades. Preciso me
atualizar, — disse ele, afastando-se de Brodie.
— Que horas são? — Perguntou Megan quando uma nuvem
passou pelo sol.
Alec pegou o relógio.
— Quase cinco. Por quê? O solstício de verão é hoje à noite?
— Claro que não, você esteve longe por muito tempo. É amanhã
à noite, — disse Alanna.
— Eu devo ser o senhor do solstício de verão, na fogueira, —
disse Brodie.
— Alec está em casa agora, e ele é o Laird. Ele vai fazer isso, não
vai, Alec? — Alanna insistiu.
— Estamos atrasados para o chá! — Disse Megan. — Mamãe vai
ficar lívida!
— Lívida? — Perguntou Alec.
— Bem irritada, — traduziu Sorcha. — Ela provavelmente está
sentada na sala de visitas com a senhorita Forrester, ambas vestidas para o
chá, imaginando onde estamos.
— E quem é a senhorita Forrester? — Alec perguntou.
— Nossa governanta, — disse Megan distraidamente, ainda
olhando para Brodie.
— Você trouxe presentes para nós? — Perguntou Alanna,
entrelaçando o braço com o dele, e sorrindo.
Ela costumava ter tranças que ele gostava de puxar. Seus cabelos
estavam soltos agora, agitados pela brisa. Ele enrolou uma mecha ao redor
de seu dedo e sentiu os cachos se agarrarem como videiras.
— Claro que sim.
— Livros? — Perguntou Alanna.
— Seda? Laços? — Megan implorou.
— Doces? — Perguntou Sorcha, e Alec riu.
— Esperem e descubram, — ele disse, e ofereceu à sua irmã mais
nova seu outro braço. Megan desceu a colina com Brodie e meia dúzia de
outras moças que estavam com os mesmos olhares enlouquecidos, em seus
rostos rosados.
Foi só quando chegou ao sopé da colina que se lembrou que
deixara a pobre Lady Sophie, sozinha, perto da torre. Quem mais poderia
ser além de Sophie? As inglesas não eram comuns nas Highlands.
Examinou a colina ao redor da torre e da janela, só para ter certeza de que
ela não havia subido de volta, mas não havia sinal dela.
Ela provavelmente fugiu, voltou à estalagem, ou onde quer que
estivesse com o pai, para esperar por uma chegada adequada, por uma
introdução formal. Ele se maravilhou, mais uma vez, de que Bray houvesse
chegado tão rapidamente. Sophie era uma beleza, e se lembrou do peso
suave e feminino dela em seus braços quando ele a pegou na torre. Ele não
queria soltá-la.
Talvez o casamento não fosse tão ruim assim.
Angus e Georgiana observaram Alec descer a encosta.
Angus limpou a garganta.
— Ele está em casa finalmente. Eu diria que começamos bem,
não é?
— Você assustou Caroline sem saber quando você a empurrou, —
Georgiana respondeu.
— Foi por uma boa causa. Você viu o olhar nos olhos de Alec
quando ele a pegou? — Angus riu. — Eu sei o que o rapaz estava sentindo,
a mesma coisa que senti no momento em que a vi.
— Eu me lembro, — disse Georgiana. — Como eu poderia
esquecer?

Capítulo 13

A condessa destinara Caroline a um quarto no último andar da


torre. O quarto era grande, com uma cama, uma grande mesa de madeira,
uma prateleira de livros e uma janela que oferecia uma vista deslumbrante
do vale. Não era o quarto de um empregado, mas também não era perto dos
apartamentos da família. Na segurança de seus aposentos, Caroline jogou
água fria sobre o rosto corado, mas o brilho do sol e o brilho de
mortificação por seu próprio comportamento não saíam. Ela prendeu o
cabelo com mais força e vestiu o vestido mais simples que pôde encontrar,
uma musselina cinza e macia com gola alta que comprara em Edimburgo
antes de chegar ali. Agora ela parecia uma governanta.
Muira seguiu-a.
— As garotas estão de volta. Encontraram o irmão delas na
encosta e todos o levaram para casa. A velha deu a Caroline um sorriso
quase desdentado. — É bom ter um Laird de volta a Glenlorne novamente.
Ele vai definir as coisas agora.
Laird? Caroline sentiu as bochechas arderem de novo. Não havia
dúvidas sobre quem ela conheceu na torre, então. Seu estômago se
encolheu. Ela agiu como um tola! Ela teria que enfrentá-lo no jantar, já que
a hora do chá já havia passado. Ou fazer fila para inspeção com o resto dos
criados, da mesma maneira como Charlotte fazia sua equipe ficar sempre
que ela chegava a uma ou outra das propriedades de Somerson.
Impropriedade, ou até mesmo uma mancha no uniforme da pessoa, podia
resultar em demissão imediata ou uma leve repreensão, dependendo do
humor de Charlotte.
— Ela insiste em um jantar formal no salão hoje à noite para dar
as boas-vindas ao Senhorio. — Muira colocou as mãos nos quadris. —
Vossa senhoria! Ele sempre será Alec para mim, e eu sei que ele preferiria
uma boa ceia quente com todas as pessoas, e um trago ou dois de bom
uísque para brindar seu regresso a casa. — Ela olhou ao redor da sala. —
Este era seu quarto de dormir quando ele era um rapaz, mas ele estará nos
aposentos do Laird agora. Na verdade, eu fui mandada para dizer que você
vai ter que jantar conosco na cozinha hoje à noite, senhorita. A refeição é
apenas para a família. Ela gostaria que você ajudasse as meninas a se vestir,
certifique-se de que elas se pareçam com damas de verdade.
— Claro. — Caroline quase suspirou de alívio. Ela não precisaria
enfrentar o novo conde de Glenlorne ainda. Ela deu a Muira um sorriso
ofuscante. — Eu quero dizer que eu gostaria muito de jantar na cozinha.
— Verdade? — Muira olhou para ela. — Você não está nem
curiosa para olhar para ele? Ele é um homem musculoso. Ele sempre foi, é
claro, mas está preenchido agora, todo em forma e bonito.
Caroline sentiu um rubor rastejar por suas bochechas. Sim, o
homem era muito bonito. E forte. Ela ainda podia sentir as mãos dele em
sua cintura, os olhos dele em seus tornozelos expostos.
— Você parece corada, moça. Você recebeu muito sol hoje? —
Muira perguntou.
Ela se afastou dos olhos curiosos de Muira.
— Acho melhor eu descer e ajudar as garotas a se vestirem.
Ela pegou as escadas curvas, assim como as da velha torre, ainda
mais largas aqui. Quanto tempo ela conseguiria evitar o novo Laird? Com
sorte, ele teria muitas coisas para fazer nos próximos dias, semanas ou
mesmo meses, e a esqueceria, completamente, se ela se mantivesse na sala
de aula. Somerson mal se lembrava de que ela existia — a menos que
houvesse um problema, como a necessidade de casá-la, para que ele
pudesse esquecê-la permanentemente. Ela duvidava que seu meio-irmão
teria se incomodado em perguntar sobre a governanta de suas filhas. Ela era
uma criada agora, mais invisível do que nunca.
Alec olhou ao redor da mesa para as moças graciosas que o
cercavam. Suas meias-irmãs não eram as meninas despreocupadas que
estiveram na encosta da colina. Sentaram-se à mesa de sua mãe — sua mesa
— com as costas retas, as mãos enluvadas apertadas no colo e sorrisos
fingidos colados em seus rostos. Ele quase podia acreditar que estava de
volta a Londres, no tipo de jantar que a condessa de Westlake poderia dar
em nome de seu marido para pessoas influentes.
O idioma usado durante a noite foi o inglês e as meninas vestiram
roupas inglesas. Apenas o brilho animado em seus olhos lhe deu esperança
de que elas, ainda, eram as garotas que ele se lembrava.
Muira substituiu o mordomo de Westlake, e dois membros do clã
ajudaram, rapazes com quem ele crescera, e que agora, eram seus criados.
Jock MacNabb piscou para ele enquanto colocava vinho no copo de Alec, e
Leith Rennie sorria do seu posto no aparador.
— De onde estas coisas vieram? — Perguntou Sorcha, segurando
uma taça de vinho de cristal.
— Heranças, — respondeu Muira enquanto servia a sopa, um rico
caldo de galinha. Ela se absteve de olhar para a condessa, mas Alec sabia
que seu próximo comentário era direcionado a Devorguilla como uma
flecha com a ponta envenenada. — Muitas coisas boas foram vendidas
quando o velho Laird Angus morreu, mas algumas das mais importantes
foram preservadas.
— Como os contos que o vovô costumava contar sobre os
tesouros da família escondidos depois de Culloden? — Perguntou Alanna.
Os lábios de Muira ficaram apertados.
— Melhor não falar desse dia.
Alec observou o queixo de Devorguilla se erguer.
— E suponho que essas coisas boas vão desaparecer, novamente,
após a refeição, junto com a prata e o vinho?
Muira sorriu maliciosamente.
— Oh, eles só serão colocados de volta em segurança, assim, a
prata não precisa ser polida o tempo todo. Elas vão ter mais uso agora que o
Laird está em casa.
— Era necessário vender algumas coisas para nos alimentar e nos
vestir, — disse Devorguilla, não fazendo contato visual com Alec.
— No luxo, — Muira murmurou no ouvido de Alec enquanto
servia sua sopa com um floreio.
— Você esperava que as meninas usassem trapos e andassem sem
sapatos? — Devorguilla respondeu. Alec percebeu que Muira falava gaélico
e Devorguilla respondia em inglês. — Elas são as filhas de um conde.
— E as irmãs de um conde também, — retrucou Muira. — Ele
vai mantê-las bem cuidadas. — Todos os olhos na sala se voltaram para ele
para se certificar disso. Alec tomou um gole de vinho e olhou à sopa.
— Oh, sem dúvida ele vai, assim como seu pai. — Devorguilla
disse acidamente. — As meninas são minha responsabilidade. Elas devem
estar aptas a se casar com condes e lordes, de acordo com sua posição na
vida.
— Que grandioso isso soa! — Alanna se aventurou bravamente,
entrando na crescente onda de ironia da família. Devorguilla silenciou sua
filha do meio, com as sobrancelhas erguidas, e Alec observou Alanna se
acalmar no silêncio feminino, novamente. A sopa de repente se tornou a
coisa mais fascinante da sala.
— Alec, aquilo que ouvimos sobre a Inglaterra, é verdade? —
Sorcha perguntou.
— O que vocês ouviram? — Ele perguntou a ela.
— Que os senhores ingleses têm rabo e os mantêm enfiados nos
calções, — interrompeu Muira.
Alanna escondeu uma risadinha atrás do guardanapo e ganhou um
olhar penetrante da mãe.
Alec sempre se perguntava se Westlake era o diabo, mas duvidava
que pudesse ser provado por um método tão fácil quanto expor sua cauda
bifurcada.
— Claro que não.
— Como eles se sentariam? — Perguntou Sorcha, imperturbável.
— Ouvi dizer que os cavalheiros ingleses não fazem nada além de
passar por cima dos campos, matando bebês e comendo grandes
quantidades de carne, de frango e de porco no café da manhã, no almoço e
no jantar. Bebem três litros de cerveja a cada refeição, limpam tudo com um
barril de conhaque e dormem até o meio-dia, — acrescentou Megan.
Alec não conseguiu deixar de rir.
— Não está longe da verdade, — ele disse suavemente.
— E as senhoras, — disse Alanna. — É verdade que elas não
podem fazer nada além de se sentarem em almofadas durante todo o dia,
para não sujarem os vestidos ou bagunçarem o cabelo, e passam o tempo
fazendo bordados?
— Exceto fofocar e beber chá, — acrescentou Sorcha. Ela imitou
uma senhora pegando sua xícara com o mindinho esticado. — Ouvi dizer
que a fofoca é a paixão das damas inglesas. Se elas não ouvirem nada digno
de nota, elas inventam as coisas para atingir uma a outra com mais
crueldade.
— Todos na Inglaterra têm três casas — uma casa de campo, uma
casa na cidade e uma cabana de caça — está correto? — Perguntou Megan.
— É por isso que Londres está tão lotada que não há espaço para
o verde crescer. Muitos edifícios e muitas pessoas, — acrescentou Sorcha.
— É verdade que não há flores em Londres, e as casas são tão altas que
você não consegue ver o céu? Eu ficaria triste se não conseguisse ver o céu.
Alec percebeu que suas irmãs e Muira estavam aguardando seus
pronunciamentos sobre as histórias que haviam ouvido.
— A senhorita Forrester diz que os ingleses são cavalheiros como
qualquer outro, — disse Megan, esperançosa, e também em inglês.
— Ela disse? — Perguntou Alec. — E o que ela disse sobre as
caudas dos cavalheiros?
— Ela diz que as únicas caudas estão em seus casacos de noite,
— disse Alanna.
Alec assentiu.
— Verdadeiro o suficiente.
— Ela diz que os homens e as senhoras dormem até o meio-dia se
tiverem saído de um baile ou de uma festa. Miss Forrester diz que dançam
até o amanhecer e bebem champanhe nas melhores festas. Ela está nos
ensinando danças inglesas, embora a valsa ainda seja considerada
escandalosa em alguns lugares, — disse Megan. — Ainda assim, se
quisermos tomar o nosso lugar na sociedade inglesa como mamãe deseja,
precisamos ir para Londres, logo que as circunstâncias permitirem. — Ela
olhou para Alec para ter a garantia de que este não seria um destino tão
terrível.
— O que há de errado com os rapazes escoceses? — Muira
resmungou. — Há muitos senhores com bons filhos aqui.
— Sem dinheiro, — suspirou Alanna, como se já estivesse
desiludida.
— E o amor? — Perguntou Alec, pegando a taça. Leith
imediatamente saltou à frente, para encher seu copo. — E se você se
apaixonar por um homem pobre?
Megan olhou para ele como se tivesse perdido o juízo.
— Eu nunca seria tão tola assim!
— A senhorita Forrester acredita no amor, — disse Sorcha. —
Pelo menos, eu acho que ela acredita. Ela gosta de poesia e histórias.
— Eu certamente espero que ela não esteja lhes ensinando
bobagens, — disse Devorguilla. — Ela está aqui para instruí-las sobre a
língua inglesa, os usos e costumes, e não para encher suas cabeças com
ideias tolas.
— Que coisa horrível de se dizer no meio do verão! — Disse
Muira, pairando atrás da cadeira de Alec. — É o momento em que uma
jovem deve pensar em amor, ler os presságios, procurar por um sinal do
homem com quem vai se casar!
As três meninas olhavam para ela com olhos brilhantes.
— Eu acredito que acabamos com a sopa. Você pode remover os
pratos, — disse Devorguilla.
— Eu quero me casar por amor, — suspirou Alanna, ignorando o
argumento da condessa.
— Então é melhor você se apaixonar por um rico lorde inglês,
pois é com quem você vai se casar, — disse Devorguilla, azeda.
Um antigo escudo que não estava lá naquela tarde escorregou da
parede e caiu no chão. As garotas pularam e Alec instintivamente fez o
gesto de pegar uma pistola que não levava mais consigo. Ali era Glenlorne,
não os becos escuros de Londres.
Jock pegou o escudo.
— Desculpe, Alec. Eu coloquei isso aqui esta tarde. É o escudo de
Malcolm, se você se lembra. Está escondido há anos. Muira insistiu que nós
o trouxéssemos para cá, agora que você está em casa. Eu pensei que havia
colocado direito.
— Ainda mais tesouros escondidos, — Devorguilla disse
bruscamente, seu olhar colidindo com o de Muira.
— Eu não consigo entender como isso caiu. Esse gancho tem
esperado que o escudo volte por volta de sessenta anos, — disse Muira. —
São os espíritos dos antigos que estão aqui para receber o Laird.
— Ou talvez o gancho tenha finalmente enferrujado, — disse
Devorguilla. — Como a fortuna dos MacNabbs.
Muira a ignorou.
— Há mais, Alec, todos as velhas espadas e machadinhas e
estandartes. Nós vamos colocá-los e fazer este lugar parecer uma casa
novamente.
— Que maravilhoso, — disse Sorcha, com os olhos brilhando. —
Elas ainda têm sangue nas lâminas?
Megan fungou.
— Eu ouvi dizer que na Inglaterra crianças não são permitidas no
jantar com pessoas adultas, pelo menos, até que tenham dezessete anos, —
ela disse em inglês, e Sorcha mostrou a língua para a sua irmã, que lhe
rendeu um olhar afiado de Devorguilla.
Jock apontou para o gancho, ainda firmemente preso na parede, e
engoliu em seco. Muira gargalhou.
— Estão vendo? Os espíritos retornam para o solstício de verão,
observam as coisas, expressam seu descontentamento quando as coisas não
estão certas. Talvez eu tenha confundido o lugar, e o escudo seja daquela
parede. Jock, tente lá.
— Você não vai. Estamos no meio do jantar, — falou
Devorguilla. — Eu não vou ter bobagens supersticiosas estragando a
comida.
— É solstício de verão, — rematou Muira. — Os espíritos
seguirão o seu caminho, quer você queria ou não.
Alanna respirou fundo.
— Mãe, podemos ir à fogueira amanhã à noite?
Os lábios de Devorguilla se apertaram com tanta força, que Alec
se perguntou se ela alguma vez os separaria novamente.
— Não. — Ela falou aquela única palavra.
— Mas a senhorita Forrester diz que na Inglaterra as moças
podem participar. De fato, condes e condessas fazem questão de se unir ao
seu povo nas celebrações, — disse Megan. — Nós certamente poderíamos
comparecer com Alec, não poderíamos? Quero dizer, seria bom que todos
vissem que ele está em casa e que tudo está bem, de novo...
De fato, era possível que o rosto de Devorguilla se contorcesse
ainda mais. Ela olhou para Alec como se o pedido de sua filha fosse culpa
dele, e ele houvesse dito o pronunciamento, não o fantasma da Senhorita
Forrester. Ele imaginou a governanta como uma solteirona com cara azeda,
cheia de conselhos sobre assuntos dos quais ela não sabia nada, e com o
desejo para o romance frustrado pela ausência de boa aparência e fortuna.
— Eu ficaria feliz em levar as meninas amanhã à noite, — disse
Alec a Devorguilla. — A menos que você tenha planejado um jogo ou uma
festa?
Sorcha deu uma risadinha.
— Não, mas haverá dança, é claro.
— Todas as moças vão querer dançar com você, Alec, — disse
Muira. — Você será o rei do solstício de verão, como é apropriado agora
que você está em casa.
— Espero que você tenha trazido sapatos de dança! — Megan
acrescentou.
— Para uma festa no prado? — Alec fingiu surpresa. — Não é
costume andar descalço?
Megan engasgou.
— Mas você é o conde de Glenlorne. Você não pode fazer isso!
— Os condes de Glenlorne uma vez se pintaram de azul, se bem
me lembro, — brincou Alec. — Muira, temos alguma tinta azul? — A velha
gargalhou com a brincadeira.
— Alec! — Gritou Megan. — Você não pode!
— Nunca tenha medo, moça. Vou ver se os rapazes podem tocar
uma valsa e vou dançar em volta da fogueira para ter boa sorte, é claro.
— Eu não dei a minha permissão, — disse Devorguilla, tomando
seu vinho. — É um costume bárbaro. Eu certamente terei uma palavra com
a senhorita Forrester por encorajar esse absurdo. Vamos ficar em casa
amanhã à noite e ler juntas — em inglês.
— Mas mamãe... — começou Alanna, com os olhos cheios de
lágrimas, mas Devorguilla acenou com a mão pedindo silêncio.
— Sem mais argumentos. — Seus olhos encontraram os de Alec,
negros e brilhantes, desafiando-o a contradizê-la. Ele manteve sua boca
fechada, e olhou ao redor da mesa. Ele não fazia parte dos velhos costumes,
nem desejava fazer parte dos novos que Devorguilla estava sugerindo. Sua
mão apertou a haste da taça de cristal. Ele não deveria ter voltado. Então
lembrou-se de Sophie, na torre, o cabelo vermelho solto, o rosto iluminado
pelo sol, o corpo quente, suave e feminino em seus braços e suspirou.
Talvez, houvesse uma maneira de fazer isso funcionar, com ela como
esposa. Não importava os velhos costumes, e, juntos, eles encontrariam
uma maneira de fazer seu próprio futuro. Ficou surpreso com o quanto ele
queria isso, de repente.
O responsável por isso, era Sophie, ou Solstício de Verão?
— Vamos ver, — Muira sussurrou por cima do ombro de Alec, e
acenou com a mão em um sinal mágico próprio.

Capítulo 14

Muira esperou até todos na casa adormecerem, antes de entrar no


quarto e fechar a porta atrás dela. Ela o trancou, depois trancou as persianas
da janela também, certificando-se de que estivesse sozinha. Ela acendeu
uma vela e colocou-a na superfície da mesa que ficava no meio da sala. Os
maços e feixes de ervas lançavam sombras nas paredes e no chão,
acrescentando um cheiro forte de ervas recém-colhidas ao cheiro de poeira.
Os fantasmas observaram a velha criada respirar profundamente,
por um momento, antes de começar a reunir latas e potes, tigelas e colheres
de medida, colocando tudo na mesa.
— Isso não faz parte do seu plano, não é? — Angus perguntou
para Georgiana enquanto Muira passava direto por ela para chegar à tigela.
— Você não acredita em magia? — Perguntou Georgiana.
— Claro que não. Sou um homem da razão — respondeu Angus,
depois se lembrou que ele era um fantasma, o que não era nada racional.
Ele cruzou os braços com teimosia e se inclinou contra a porta, fora do
caminho. Ele observou Muira escolher um maço de flores. — O que ela tem
ali?
— Pervinca. Se ela escolher sete flores ou mais, então ela fará um
amuleto de amor.
— Eu contei nove. Isso é bom? — Angus perguntou.
— Depende, — disse Georgiana. — Ela conhece alguma mágica
de verdade?
Angus esfregou a barba.
— Provavelmente. A velha Muira já ajudou a trazer à luz muitos
bebês, curou os doentes e cuida dos que estão morrendo há anos. Aprendeu
com a mãe dela. Ninguém se mete com ela, por medo de um feitiço. Você
pode ver como até Devorguilla é cuidadosa em torno de Muira.
Georgiana sorriu.
— Então é boa mesmo.
— Para que serve esse amuleto de amor? — Perguntou Angus. —
Eu não consigo ver como nove flores roxas podem fazer alguém se
apaixonar, especialmente um homem de bom senso.
Georgiana sorriu.
— Muira acha que está fazendo um feitiço de amor para as
meninas, então elas sonharão com seus verdadeiros amores. Ela também
acha que está frustrando os planos de Devorguilla de casá-las com lordes
ingleses, fazendo-as se apaixonarem por rapazes locais.
— Elas não são um pouquinho jovens para tais coisas? Elas
deveriam brincar com bonecas, ou tecer lã, ou cuidar das ovelhas.
— São mulheres jovens, Angus. Eu estava com a idade de Megan
quando eu me casei com Somerson. Você quer suas netas casadas com
ingleses? — Perguntou Georgiana.
A boca de Angus se torceu amargamente.
— Não, eu não quero.
Georgiana sorriu.
— Nem Muira, eu acho, mas seus planos por enquanto, precisam
dar errado. Há aqueles que precisam de ajuda imediata neste verão.
— Quem? — Angus a olhou igual a uma coruja, lendo algo sendo
arquitetado nos olhos de seu verdadeiro amor.
Ela sorriu como se fosse um segredo.
— Alec e Caroline, claro.
Ele empurrou a boina de volta na testa e se aproximou da mesa.
— Alec é um rapaz sensato. Ele não será enganado por esse
absurdo! É preciso mais que algumas violetas roxas para fazer um homem...
— Pervinca, — corrigiu Georgiana.
— É preciso mais do que algumas “pervincas” para fazer
aparecer o desejo de um homem, era o que eu estava prestes a dizer. É por
isso que eu a empurrei para os braços dele na torre. Você viu o jeito que ele
olhou para ela?
Georgiana descartou a ideia com um aceno de mão.
— Ele deve reconhecê-la como seu verdadeiro amor.
— E as flores roxas devem trazer tudo isso, como se ele não
tivesse vontade, não tivesse espírito próprio? Talvez haja outro homem para
sua Caroline, outra mulher para Alec.
— Não seja ridículo! Claro que eles estão destinados a ficar
juntos. É assim que a maldição vai acabar, — disse Georgiana. — Eu pensei
que estava claro.
— Claro como lama, — murmurou Angus. — O que a Muira tem
agora?
Georgiana se inclinou sobre a mesa.
— Anis estrelado, para atrair o amor, e chicória, para transcender
o obstáculo. Para as meninas, a chicória vai ajudar a mãe delas a
compreender as suas escolhas, mas para Caroline, acho que seria melhor ter
uma dose extra. — Ela cutucou o cotovelo de Muira, e o pote em suas mãos
virou, caindo metade do conteúdo na taça. Muira simplesmente encolheu os
ombros e se virou para a próxima erva, arrancando flores brancas rendadas
de um caule espesso, enchendo a sala com um aroma enjoativo e doce.
— Flor de sabugueiro, para realizar desejos, — sussurrou Muira,
fazendo um sinal em cima da tigela, e Georgiana sorriu.
— Rosas agora, — ela sussurrou no ouvido da serva, e Muira
arrancou as pétalas de uma rosa selvagem e as espalhou sobre o resto dos
ingredientes.
A velha mão de Muira pairava sobre os potes na mesa.
— Alecrim, a erva de Vênus, eu acho. — Ela abriu a tampa e
cheirou profundamente. — Bom e forte, — ela gargalhou.
Angus franziu o nariz.
— Ele não precisa beber isso, não é? Parece ruim. É mais
provável que o mate antes de fazê-lo se apaixonar.
Georgiana inclinou a cabeça com carinho.
— As garotas vão embrulhar uma porção com uma mecha de
cabelo, em um lenço e fazer um pedido. O restante vai ser colocado na
cerveja a ser servida na fogueira. Alec vai beber, mas ele nem vai notar.
Angus suspirou e as rosas silvestres estremeceram no vaso.
— Um homem nunca percebe nada, até que seja tarde demais.
Alguma erva para precaução, bom senso ou aviso?
Georgiana riu.
— Nós nunca fomos cautelosos ou sensíveis, Angus. Você se
lembra?
— Foi um feitiço? — Perguntou Angus. Se fosse, ainda estava
sobre ele. Georgiana brilhou à luz da vela e ele sentiu o desejo passar
através dele. Ele torceu suas mãos por causa a incapacidade de tocá-la,
sentir o toque familiar dela.
— Claro que não. Nós nunca dançamos ao redor da fogueira no
solstício de verão, ou bebemos vinho juntos.
— Erva ulmária — Muira murmurou, e eles se viraram para
observá-la.
— Você é pura magia. Ulmária é para lançar feitiços de amor, —
acrescentou Georgiana. Ela apontou o dedo branco para um par de frascos à
esquerda de Muira.
Muira se virou para olhar.
— Coentro e damiana, — ela murmurou. — Bem, por que não?
— Para o que é isso? — Perguntou Angus.
— Desejo, — Georgina suspirou.
— Para luxúria, — Muira murmurou, como se tivesse ouvido a
pergunta também. — A luxúria nunca machucou ninguém. O que é o amor
sem a luxúria?
— Mais disso, então, — disse Angus, e deu uma batida na mão de
Muira dessa vez. O pote virou na tigela, e as folhas mergulharam na poção.
— Não importa, — disse Muira, pegando o pote e deixando as
ervas.
— Isso não prejudicará as moças, não é? — Perguntou Angus.
— Não se elas não beberem a cerveja, — disse Georgiana.
Muira arrancou uma folha de uma planta verde que crescia em um
vaso.
— Isto cheira como a cozinha, — disse Angus.
— É manjericão, — disse Georgiana. — Para a fidelidade.
— Dele ou dela? — Perguntou Angus.
— Para sempre, devoção eterna — Georgina suspirou.
— Devoção eterna, — murmurou Angus amargamente, olhando à
mão invisível.
Eles observaram Muira misturar as ervas. Ela pegou pequenas
pitadas e fez três minúsculos saquinhos de musselina, murmurando um
feitiço enquanto os amarrava com um fio vermelho. Ela acrescentou o resto
das ervas em um jarro de cerveja, e olhou as profundezas do líquido
dourado que ela misturou, murmurando um encantamento, observando as
ervas sendo absorvidas, e afundarem. Ela colocou o jarro na prateleira e se
virou para buscar outra tigela.
— Agora o que ela vai fazer? — Perguntou Angus. Ele assistiu
Muira derramar um pote de papoula.
— É um feitiço para dormir, — disse Georgiana.
— Och, eu me lembro das noites em que eu não conseguia dormir
pensando... — Ele fechou a boca antes de admitir que uma vez que ele
perdeu Georgiana, o sono se tornou seu inimigo, porque seus sonhos
estavam cheios dela. Ele não conseguia dormir. Ele percorria o castelo à
noite, tomava longos banhos frios no lago, e ainda assim, ele não conseguia
esquecer.
Georgiana obviamente entendia bem o suficiente. Ela sorriu
suavemente para ele, com a cabeça inclinada, e ele poderia ter corado se
tivesse sido capaz. De repente, desejou ao neto toda a magia, a paixão, a
vida que ele mesmo perdeu. Ele esfregou a mão em seu peito sentindo dor.
— Eu acho que a poção de dormir é para Devorguilla, — disse
Georgiana. — Então as garotas poderão sair amanhã à noite. Agora está
tudo pronto, eu acho.
— Vai funcionar? — Perguntou Angus. — Isso fará com que
Caroline e Alec fiquem juntos?
Georgiana suspirou e as venezianas tremeram, fazendo Muira
olhar para cima, semicerrando os olhos para as sombras.
— Espero que sim, mas Muira não faz ideia de que a poção é para
eles. Ela fez isso para as meninas, para chamar o amor, e para os rapazes e
moças que vão dançar em volta do fogo amanhã à noite.
Angus sacudiu a cabeça.
— Eles estarão todos perdidos, coitados. Aqueles garotos
talentosos que tem sua liberdade e toda a sua vida pela frente. Eles vão
acordar nos braços de uma mulher depois que a fogueira apagar e se
perguntar o que diabos aconteceu com o juízo deles. O céu deveria ajudar
um homem quando as mulheres começam a se intrometer em sua vida.
— Os feitiços de amor não funcionam naqueles que não possuem
o desejo ou a necessidade. O verdadeiro amor tem sua própria magia e não
pode ser criado ou destruído onde não existe. Você não pode culpar o amor
por causa das ervas ou pela estação, Angus.
— Oh! Não posso? — Ele resmungou.
A risada de Georgiana fez a vela tremer descontroladamente por
um momento até que Muira a apagou e saiu do quarto, deixando-o na
escuridão.

Capítulo 15

Caroline olhou pela janela, através das colinas iluminadas pela


lua, até a torre. O sono a deixara, e ela enrolou um grosso xale de lã em
volta da camisola e abriu as persianas. A luz pálida da lua quase cheia,
preencheu a sala. Ela olhou através da torre, para a silhueta no penhasco
além do lago.
Ela podia ver seu rosto, de pé abaixo dela, olhando para ela na
torre, chamando-a, sua mão estendida. Tudo o que ela precisava fazer era
estender a mão e pegá-lo. Ela sentiu suas bochechas esquentarem, apesar do
vento frio da noite. Ela puxou o xale mais apertado.
Que tola, ter pensado que ele, o conde de Glenlorne, Laird
MacNabb, havia proposto a ela. Ela sorriu e pegou um pente e o deslizou
através do comprimento de seu cabelo. Ainda assim, ela teve um lindo
devaneio, um momento de magia.
O pente alcançou um obstáculo e ela estremeceu. Ela não
imaginou que Sinjon Rutherford, então seu irmão William, se casaria com
ela? Quantas vezes ela se sentou na sala, esperando que um deles a
chamasse, e se ajoelhasse e professasse que morreria em agonia se ela não
concordasse em se casar com ele imediatamente – ou, pelo menos, assim
que uma licença e um vestido de casamento adequado pudessem ser
obtidos. Ela esperou em vão. Sinjon fugiu para a guerra em vez de se casar
com ela. Ele acabou se casando com Evelyn Renshaw, e eles teriam uma
filhinha. William provavelmente estava em lua de mel com Lottie, agora.
Ele olhava para Lottie como o lorde a olhara na torre quando a pegou contra
o peito?
Um arrepio percorreu seus membros.
Ridículo. Esta não era a hora de se imaginar apaixonada,
novamente, apenas para ficar desapontada, novamente.
Ela colocou o pente de lado e prendeu o cabelo em uma trança
apertada. Ela nunca se casaria, nunca seria olhada daquele jeito, e não teria
uma festa de casamento, não esperaria bebês ou faria uma viagem de lua de
mel. Ela sentiu um arrepio de autopiedade.
Ela se levantou e foi até a cama, jogando para trás a colcha de lã
escura, revelando os lençóis brancos e frescos por baixo. Se ela havia sido
sonhadora e romântica antes, era hora de ser sensata agora.
Ela fez sua escolha quando saiu de Londres, desistiu da proteção
de seu meio-irmão. Ela ainda preferiria dormir sozinha pelo resto de sua
vida do que se casar com Speed ou Mandeville. Eles provavelmente já a
haviam esquecido de qualquer maneira, e teriam ido procurar outras moças
ricas para se casarem. Somerson estava procurando por ela, ou ele estava
simplesmente feliz por ela ter ido embora?
Ela acendeu uma vela, subiu na cama e pegou um livro de poesia
para planejar a aula do outro dia. Ela era uma governanta com um trabalho
a fazer. Ainda assim, as palavras desapareceram na página, e em seu lugar
se encontrava o rosto de um escocês musculoso, com o cabelo escuro
soprando ao vento, olhando para ela, oferecendo-lhe a mão. Ela se
perguntou o que o homem que a resgatou na rua, em Londres, diria sobre
isso. Ele iria rir, diria, novamente, o quanto ela era tola, diria para ela ir para
casa e viver uma vida segura e sensata.
Seria uma vida de segurança monótona, melhor do que aquele
momento, aquela sensação inebriante de olhar para baixo de uma torre alta
e ver o desejo nos olhos de um homem?
Ela fechou o livro, colocou-o de lado e apagou a vela, jurando
que não sonharia com Alec MacNabb.
Alec perambulava pela enorme construção de pedra que era o
dormitório do Laird. Muira havia insistido que ele deveria ocupar esses
aposentos agora, embora ele preferisse seu antigo quarto, na torre.
Aparentemente, a governanta inglesa das meninas estava alojada lá.
Imaginou-a lá em cima agora, vestindo uma camisola de flanela, com os
joelhos ossudos no chão, orando em inglês, para um Deus inglês tornar o
mundo — ou pelo menos a Escócia, — na imagem inglesa da perfeição.
Ele não se sentia confortável naquela sala. Talvez houvesse
muitos fantasmas esperando muito dele. Ele conseguia imaginá-los
pairando nas sombras, os olhos brilhando de esperança, prontos para
colocar o pesado manto da responsabilidade sobre os ombros dele. Ele
olhou em volta para os pesados móveis esculpidos, para a cama magnífica
que ocupava a maior parte de uma das paredes, sob um grande dossel que
alcançava o teto. Gerações de chefes MacNabb nasceram naquela cama,
criaram seus herdeiros por sua vez, e morreram nela. Esperava-se que ele
fizesse seu próprio herdeiro aqui e passasse o título também.
Ele imaginou Sophie ali, com o cabelo vermelho espalhado no
travesseiro, os olhos arregalados, os lábios entreabertos, do jeito que eles
estavam quando ela caiu nos braços dele, na torre. Ele a imaginou em seus
braços aqui, nesta cama, nua, e sentiu um forte puxão de luxúria. Ela era
primorosamente bonita, embora tivesse escalado a antiga torre sozinha. Ele
se afastou da cama, atravessou o marco da porta e tentou pensar no que
poderia ter acontecido se ele não estivesse lá para pegá-la.
Mas ele a pegou, e quando ele a olhou nos olhos, soube que ela
também sentira o mesmo desejo nascendo, aquele choque de fascinação.
Talvez se casar com uma estranha não fosse tão ruim assim.
Poderia até ser uma chance de felicidade. Ela parecia muito feliz quando ele
se aproximou dela, examinando Glenlorne de seu perigoso poleiro. A
alegria no rosto de Sophie o lembrou de como Glenlorne era linda, como
ele a amava quando menino.
Com o dote dela ele não precisaria vender a terra. Ele poderia
reconstruí-lo, fazer melhorias, consertar os chalés em ruínas na aldeia e
construir novos. Ele poderia restaurar o Clã MacNabb a tudo que seu avô
lhe dissera que havia sido uma vez, orgulhoso, belo e próspero. Imaginou
uma vida diferente, em que ele era um Laird escocês, com uma linda
esposa, filhos robustos e um futuro feliz. Seus sonhos de uma plantação em
terras depois dos mares do Sul, de repente, pareciam menos importantes.
Examinou as colinas escuras, tocadas pela qualidade mágica do
luar prateado e sorriu.
Com o enorme dote de Sophie, ele poderia até mesmo recuperar a
antiga Torre de Glenlorne. Ele daria a ela como presente de casamento, e
desfrutaria de uma vida inteira observando-a olhar sobre suas terras.

Capítulo 16

Caroline estava lendo em voz alta os poemas que ela não


conseguira entender na noite anterior. O sol passava pelas janelas da sala de
aula e iluminava os rostos brilhantes das meninas. Elas não estavam na
encosta hoje, mas, sensatamente, dentro de casa, com o cabelo preso,
sapatos, meias, e saias que cobriam os tornozelos de todas. Não haveria
mais o destino tentador nas encostas, durante o verão, decretara a condessa.
Não importava onde seus corpos estivessem — suas mentes
estavam muito além das paredes daquela sala. Caroline duvidou que
tivessem ouvido uma única palavra que disse durante toda a manhã. Não
que ela as culpasse — todo o castelo estava cheio de emoção por causa das
festividades da noite. Os habitantes mais antigos da aldeia de Glenlorne
haviam sido consultados quanto aos presságios para o ano seguinte, e seus
pronunciamentos eram os que qualquer um poderia falar. Os sinais eram
bons, especialmente porque Glenlorne possuía um Laird novamente. As
mulheres cozinhavam desde o amanhecer, e os homens foram enviados para
recolher lenha para acender a fogueira, assim que o sol se elevou o
suficiente.
Caroline parou de ler e observou as meninas.
— Com quem você sonhou? — Sorcha perguntou para Megan.
Megan suspirou.
— Com um homem de cabelos loiros e olhos escuros. Ninguém
que eu conheça.
— Não foi com Brodie, então, — disse Alanna.
Megan levantou o queixo.
— Pode ter sido um presságio de outro tipo, apenas um estranho.
Talvez eu me encontre com um amigo.
— Os amuletos de amor de Muira não funcionam. Eu não sonhei
com ninguém, — admitiu Alanna.
— É a estação, não os encantos de amor, que contam. Qualquer
garota que esteja pronta para o amor verá seu amor verdadeiro em seus
sonhos no meio do verão! — Megan insistiu. Ela se virou para Caroline. —
Com quem você sonhou ontem à noite, senhorita Forrester?
Caroline sentiu o calor da pele. Ela sonhara com um certo Laird
escocês, embora ele não fosse seu verdadeiro amor. Ela uma vez sonhara
com William, mas também não havia nada disso, mesmo para a magia das
Highlands. Ainda assim, por via das dúvidas, ela cruzou os dedos e sentiu-
se afortunada por não ter sonhado com o visconde Speed.
— Eu sonhei com poesia, claro, recitada em inglês perfeito.
Todas as três meninas pareciam horrorizadas.
— Verdade? — Perguntou Sorcha. — Você vai se divertir muito
na fogueira hoje à noite. Com quem você vai dançar?
— Sua mãe não disse que você não deveria comparecer à
fogueira? — Perguntou Caroline.
Megan sorriu.
— Muira prometeu conversar com ela para que pudéssemos ir.
Qual o problema se Alec estiver conosco? Ninguém ousaria insultar as
irmãs do Laird.
Ah, mas o que as irmãs do Laird estavam aprontando? Caroline
notou três pares de olhos brilhando de antecipação e travessura.
— Brodie vai estar lá também. — Megan suspirou. — Ele nos
protegerá.
— Se ele não estiver ocupado olhando para Annie, Maire ou May,
— brincou Sorcha.
Megan ignorou-a.
— O que você vai vestir hoje à noite? — Alanna e Caroline
perceberam que a poesia havia sido esquecida.
— Oh! Senhorita, Alec nos trouxe os presentes mais
maravilhosos! — Disse Alanna, incluindo-a na empolgação. — Eu tenho
um novo xale feito de seda indiana, no design mais extraordinário.
— Eu tenho uma dúzia de fitas de cabelo para escolher. Eu não
sei se devo usar a azul para combinar com os meus olhos, ou a vermelha, —
disse Sorcha. — Você vai me ajudar a escolher, senhorita?
— Eu tenho uma nova faixa de seda verde, para usar com o meu
vestido de musselina, — disse Alanna. — Apesar de todos os presentes, eu
amei os livros que ele trouxe, o melhor é o romance de Walter Scott,
Waverley, e sua Dama do Lago. Amanhã vou ficar em casa o dia todo e ler!
— E se alguém a beijar? — Sorcha brincou. — Uma moça em
uma nova faixa verde é difícil de resistir!
Alanna corou.
— O que mais o Laird trouxe? — Caroline perguntou, mudando
de assunto.
— Uma dúzia de vestidos de tecidos bonitos e livros nos padrões
de Londres! — Megan se entusiasmou. — Mamãe os tem, ela queria ser a
primeira a olhar para eles.
— Há doces de açúcar e especiarias também. E novos gorros para
todas nós, — disse Sorcha. — Até para mim.
— E havia revistas e luvas mais macias, também, — disse
Alanna. — Embora não precisemos de luvas hoje à noite. Na verdade, não
tenho certeza de quando precisaremos de tal elegância.
— Vamos comparecer a festas elegantes ou Alec vai nos levar a
Edimburgo! — Disse Megan.
— Ou quando formos a Londres para fazer nossa estreia, — disse
Alanna, tristemente. — Assim que ele encontrar alguém para nos patrocinar.
Caroline viu a mistura de alegria e desânimo nos olhos das
garotas com a perspectiva.
— A temporada de Londres não começa até a primavera. Vocês
tem tempo de sobra para ter os mais elegantes vestidos prontos, e aprender
as mais novas danças de Londres, fazer listas dos pretendentes mais
cobiçados, e aperfeiçoar as formas de ganhá-los, mas a fogueira é hoje à
noite. Vocês não deveriam se preocupar com isto primeiro? — Perguntou
ela. — Agora me traga suas fitas de cabelo, Sorcha, e nós escolheremos a
perfeita.
As meninas correram para obedecer e Caroline sorriu. Se Muira
conseguisse a aprovação da condessa, e o Laird estivesse presente para
acompanhar as irmãs, o que poderia dar errado? Na opinião de Caroline,
uma noite de festejos inocentes de verão, seria o contraponto perfeito para
os abafados bailes londrinos que as garotas logo precisariam suportar.

Capítulo 17
Alec se vestiu quando o sol nasceu e pediu um cavalo. Ele passou
uma noite inquieta considerando a possibilidade de casamento com Lady
Sophie Ellison, incapaz de tirar a beleza de cabelos castanhos da cabeça.
Ele também considerou a possibilidade de não se casar com ela. Pesando os
prós e os contras, não seria difícil — uma esposa adorável com uma vasta
fortuna de um lado, a pobreza para ele, seus parentes e seu clã do outro.
Se Sophie esteve na torre, ela deveria ter ficado por perto,
provavelmente também pesando os prós e contras do acordo. Era quase de
madrugada quando lhe ocorreu que era muito provável que ela estivesse
sozinha no lugar — ela estava visitando Glenlorne, decidindo se queria se
casar com ele. Se ela fosse uma filha dócil, ela faria o que seu pai quisesse e
se casaria onde lhe mandassem. Se ela fosse mais obstinada — e de seu
breve encontro na torre, ele achava que ela era, pelo menos, um pouco
teimosa, — ela poderia muito bem rejeitar seu termo, na esperança de uma
oferta melhor, que certamente viria.
Se ele queria Sophie como sua esposa, ele precisaria agir agora.
Ele precisaria ir até a estalagem onde Lorde Bray estava se hospedando, e
cumprimentá-la, formalmente, escoltá-la para sua casa pessoalmente, e
encantá-la.
Ele olhou para o copo e praticou seu sorriso mais sedutor, aquele
que nunca deixou de fazer as mulheres de todas as idades, perderem o juízo
e pensarem somente nele.
A adorável Lady Sophie era tão boa nisso quanto ele.
Muito mais tarde, Alec ainda estava sozinho. Ele havia visitado as
três estalagens mais próximas do Castelo Glenlorne e cinco, das mais
distantes. Não havia nenhum sinal de um conde inglês ou de uma adorável
senhorita ruiva.
Os estalajadeiros ficaram encantados por ter a oportunidade de
recebê-lo em casa e oferecer um drinque, ou uma caneca de sua melhor
cerveja. Era impossível recusar uma única gota. Todo homem, mulher e
criança olhava para ele com muita esperança em seus olhos, muito orgulho.
Ninguém além de seu avô havia olhado para ele daquele jeito antes. Era
muito desagradável ser visto como o salvador do Clã MacNabb em todos os
lugares aonde ele ia. Isso também o deixou ainda mais determinado a
continuar, até encontrar Sophie, mas ao meio-dia ele estava tão bêbado que
mal conseguia evitar cair do cavalo, e isso, só depois de muita dificuldade
para conseguir montar, em primeiro lugar. No final, voltou para Glenlorne,
bêbado e frustrado, esperando que o cavalo pudesse ver a estrada mais
claramente do que ele.
No início da tarde, encontrou-se montado no cavalo e olhando
fixamente para a janela da torre, onde ele a vira ontem, e se perguntou
aonde diabos ela teria se metido. Ele sentia falta dela. Ele sussurrou o nome
dela e balançou na sela, e o cavalo achatou suas orelhas e bufou um insulto.
Alec lembrou a si mesmo que havia um número de propriedades e
castelos dentro de um dia de Glenlorne. Poderia ser que ela fosse a
convidada de outro Laird, talvez até de um solteirão. Suas mãos ficaram
tensas sobre as rédeas e o cavalo contorceu-se nervosamente, e deu um
passo para longe da velha torre, até uma porção de atraentes flores
silvestres.
Alec estava prestes a puxar de volta o cavalo castrado — que
parecia aqueles mantidos em estábulos para as meninas montarem, e que ele
jurou que seria substituído por um garanhão de raça, menos teimoso, se ele
pudesse encontrar e se casar com Lady Sophie — quando ele mudou de
ideia. Aquilo que via, era uma mecha de cabelo vermelho chamando-o da
janela da torre, ou apenas um brilho ao sol? Sophie brincaria com ele,
esperaria que ele voltasse ao lugar onde ele a conheceu, ontem? Sorriu, na
verdade se viu dando risadinhas, e o cavalo lhe lançou um olhar de puro
desdém equino. Ele ignorou a besta. Talvez ela gostasse de jogos entre
amantes e quisesse ser cortejada.
Bem, se ela quisesse, ele certamente assim o faria.
Maravilhosamente. Espirituosamente e desajeitadamente Ele sorriu
novamente, depois riu alto. Ele colocou seus calcanhares no cavalo
castrado, que insistiu em permanecer firme onde estava. Quando ele
finalmente forçou o cavalo a obedecer, o que ele tinha visto acabou se
revelando ser apenas uma videira, de folhas vermelhas, crescendo no vão da
janela, torcendo-se ao vento, arranhando as pedras, rindo dele.
A porta estava trancada, assim como ele a deixara ontem, e não
havia sinal de uma moça atraente e de longa cabeleira. Ele resmungou uma
maldição, e o cavalo olhou para ele, por cima do ombro, como se soubesse
daquilo, o tempo todo, e sentia por Alec, o mesmo que Alec sentia por ele.
— Bom dia para você, Laird, — disse uma voz, e ele se virou
para encontrar uma dúzia de homens, em pé, atrás dele. Ele nem havia
notado eles lá.
— Você veio nos ajudar a nos preparar para esta noite? —
Perguntou Leith Rennie.
Alec examinou-os de cima do cavalo. Havia uma dúzia de
homens ou apenas seis?
— Na verdade, estou procurando por uma moça.
Eles sorriram e relaxaram, acotovelando um ao outro, depois
riram alto. Leith pegou um odre com cerveja e passou para Alec.
— Não estamos todos? — Ele disse.
— Haverá muitas garotas bonitas na fogueira hoje à noite, —
acrescentou Jock MacNabb.
— Estamos apenas preparando as coisas para as festividades — a
roda, a lenha e tal. Nós somos do conselho e procuramos ajuda para fazer o
trabalho, — acrescentou Hamish MacNair. Todos eles assentiram.
Alec acenou de volta e olhou para a torre vazia, novamente.
Talvez, o cérebro dele tenha dito que ela ainda poderia aparecer, se ele
esperasse, ficasse perto da torre. Ele olhou para o conselho novamente.
— Você poderia ter mais ajuda?
— Er, o senhor parece bastante bom para recolher lenha, Laird.
Alec deslizou das costas do cavalo. Ele tirou o casaco e jogou
sobre a sela. Desatou seu lenço e enfiou debaixo do casaco, tirando o colete,
por precaução. O cavalo pegou o colete de brocado e começou a mastigá-lo.
— Pare, agora, Flor, — disse Jock, pegando as rédeas da criatura,
lutando para recuperar o colete das mandíbulas teimosas do cavalo.
— Flor? — Alec murmurou. — Eu estou tentando cortejar —
cavalgando — em um cavalo macho, chamado Flor? — Os outros homens
tiveram a graça de parecer envergonhados por ele.
— A pequena Sorcha o nomeou, — disse Leith. Jock soltou o
cavalo e ergueu o colete esfarrapado. Flor puxou a cabeça e caminhou até
um pedaço particularmente exuberante de flores silvestres e começou a
devorá-las.
— Não deveríamos amarrá-lo? — Perguntou Alec, enquanto o
cavalo se aproximava de outro trecho de flores, mais distante.
— Flor? — Hamish perguntou. — Não. Uma vez que ele tenha
comido, ele vai para casa por conta própria, se não houver problema, Laird.
— A menos que ele encontre a manada, — disse Leith. — Ele
está envolvido com uma égua em particular, e já que é o Solstício de Verão.
Jock revirou os olhos.
— Ele é castrado, seu idiota!
Leith parecia magoado.
— Eu não quis dizer nada com isso. O amor vem em muitas
formas. Estamos todos procurando por uma moça.
Jock tirou a boina e deu uma pancada no primo.
— Vamos lá, seu idiota, nós temos madeira para buscar, e é
melhor chegarmos a ela assim que terminarmos a cerveja. — Ele passou o
odre para Alec. — Depois do senhor, claro, Laird.
Alec tomou um longo gole e continuou descendo a encosta até a
floresta, depois parou. Os homens atrás dele também pararam, alguns
colidindo uns com os outros. Leith, que estava na frente da procissão,
deslizou todo o caminho até a colina gramada, com um grito. Todos se
levantaram e o observaram deslizar. Parecia que eles estavam tão bêbados
quanto Alec.
— Só quero dizer que conheço todos vocês desde que éramos
rapazes. Então, me chamem de Alec.

Capítulo 18
— Você tem certeza de que a condessa não se importará se as
meninas forem à fogueira? — Caroline perguntou para Muira enquanto o
sol se punha, de pé na cozinha, ajudando a embalar cestas de comida e
frascos de cerveja.
— Ela não disse uma palavra contra isso quando eu perguntei a
ela há meia hora, — disse Muira maliciosamente, com os olhos arregalados.
— Talvez eu devesse checar com ela, — disse Caroline, mas a
velha criada gargalhou. — Não há necessidade. — A Senhora se retirou
cedo à cama, e pediu para não ser perturbada. Ela tem uma dor de cabeça
por ter passado o dia todo olhando os vestidos que Alec trouxe de Londres.
Eu diria que ela não acordará até amanhã, de manhã, ou, possivelmente, no
início da tarde. Então não se preocupe com ela nem mais um minuto —
você deve querer se preparar, e não há muito tempo. As moças observam o
sol se pondo e, assim que ele cair atrás da velha Torre de Glenlorne, elas
estarão prontas.
Caroline olhou pela janela. O sol vermelho pairava logo acima do
teto irregular da velha torre. Ela olhou no espelho e arrumou o cabelo,
certificando-se de que o botão de cima do vestido estava bem preso sob o
queixo.
— Pronto, — disse ela, voltando-se para Muira.
A velha criada revirou os olhos.
— Pelo amor da deusa, moça, você não quer dizer...
A porta se abriu e as garotas entraram. Elas usavam vestidos de
linho simples, com faixas de tecido coloridas, em suas cinturas. Seus pés
estavam descalços e seus cabelos caiam longos e soltos pelas costas. Elas
pararam na porta e olharam para Caroline.
— Senhorita Forrester! — Megan guinchou, surpresa e chocada,
como se fosse Caroline quem estivesse com o cabelo solto e os pés nus para
o mundo ver.
— Você não pode sair desse jeito! — Disse Alanna.
— Temos que fazer algo e bem rápido! — Disse Sorcha. Caroline
mal teve tempo de olhar pela janela, para ver que o sol havia baixado ainda
mais, antes que as garotas caíssem sobre ela. Sorcha tirou os grampos do
cabelo e Alanna desabotoou o vestido, enquanto Megan ia buscar outro
vestido, para ele colocar uma roupa no estilo das Highlands.
— Espere! Eu vou fazer isso sozinha! — Caroline disse, enquanto
elas se aproximavam, prontas para despi-la. Ela se escondeu na despensa.
As garotas a examinaram quando ela saiu, circulando-a com os braços
cruzados sobre o peito. Muira se sentou em um banquinho junto à lareira,
sorrindo como um corvo louco.
— Bem? — Ela perguntou.
— Não está pronta, — disse Sorcha.
— As meias, — Alanna apontou.
Elas queriam que ela saísse descalça?
— Uma dama nunca — ela começou, mas as meninas deram um
passo em direção a ela. — Eu vou fazer isso, — disse ela, levantando a
mão.
— Não há damas esta noite, moça, — disse Muira. — Só rapazes
e moças e os prazeres da dança e do riso, e nenhum mal nunca veio disso.
— Ela se adiantou e enfiou uma pequena flor branca no cabelo de Caroline,
acima da orelha. — Agora parece pronta.
— Ela não tem uma faixa xadrez.
— Ela pode usar minha fita vermelha, — disse Sorcha, e logo,
estava devidamente amarrada na cintura de Caroline.
— Oh, senhorita, você parece linda, — disse Alanna.
— Ela realmente está. Agora é com vocês. O sol está se pondo, e
tenho mais o que fazer — disse Muira, enxotando-as para fora da cozinha.
Megan e Sorcha seguraram-lhe as mãos e Caroline viu-se
apanhada no espírito da excitação, correndo com as garotas pela relva
fresca, descalça, com a brisa suave da noite nos cabelos. Elas se juntaram
aos aldeões e aos criados do castelo, até que havia uma procissão longa e
alegre de garotas que se dirigiam para a antiga torre.
Sorcha parou, os olhos arregalados.
— Oh, olhe, Alec está usando seu plaid. Como ele é maravilhoso.
Maravilhoso mesmo. Caroline viu o lorde entre os outros homens
e parou, com a respiração presa na garganta. Os últimos raios do sol poente
estavam sobre ele, sua testa e sua camisa açafrão brilhavam, os laços
abertos no pescoço mostrando a pele bronzeada abaixo. Ele usava o plaid
como um guerreiro antigo, ousado e orgulhoso, sorrindo como um pirata.
Cumprimentou todos quando chegaram ao local, verdadeiramente o senhor
daquele lugar. Ele era o homem mais bonito que ela já tinha visto.
Respire, uma voz sussurrou em seu ouvido. Respire
O ar era inebriante, e ela sentiu pura alegria percorrer seu sangue.
Acima dela a lua flutuava em um céu azul profundo, e as estrelas
começaram a aparecer, uma a uma.
O fogo brilhou na encosta perto da torre quando uma roda foi
acesa, um símbolo da mudança da estação, a metade escura do ano
começando hoje à noite, e a metade clara cedendo. Com um grito, os
rapazes rolaram a roda pela encosta, correndo atrás dela, caindo na grama
orvalhada, rindo e aplaudindo. Caroline se viu torcendo também. Se a roda
chegasse ao fundo da colina sem cair, significava uma boa colheita e boa
sorte para Glenlorne.
Um grito surgiu quando a roda começou a trepidar e balançar
sobre o solo rochoso, atirando faíscas enquanto voava, vermelhas e
douradas contra o azul do crepúsculo, mas chegou ao fundo da colina antes
que caísse na grama do prado ainda em chamas.
Uma onda de aplausos começou e todos correram à frente para
adicionar combustível na roda, transformando-o em uma fogueira que
queimaria pelo resto da noite. Do outro lado da fogueira, Caroline assistiu
Alec MacNabb lançar uma tora sobre a pilha, e as chamas saltaram,
iluminando seus olhos, seu rosto, os músculos de seu pescoço, e o
comprimento de suas pernas fortes. Todos, por sua vez, acrescentaram
galhos e recuaram para admirar o fogo.
Alguém com um capuz — Muira talvez — aproximou-se para
colocar uma coroa de folhas de azevinho na cabeça de Alec, e a multidão
aplaudiu novamente. Ela lhe entregou uma taça esculpida em um chifre,
decorada com prata, e ele bebeu, a luz do fogo acariciando sua garganta
enquanto ele engolia. Levantou a taça e limpou a boca com as costas da
mão, rindo enquanto os membros do clã aplaudiam.
Então Muira colocou uma segunda coroa em suas mãos, essa
decorada com hera e flores silvestres.
— O rei foi coroado, — anunciou ela à multidão. — Agora ele
deve escolher a rainha do solstício de verão.
Um esperançoso sussurro feminino subiu. Caroline observou os
olhos brilhantes de Alec esquadrinhando a multidão, e as moças deram
risadinhas e sorriram para chamar sua atenção. Ela ficou onde estava nas
sombras, esperando que o olhar dele a tocasse e parasse, mas, temendo
também.
Seus olhos passaram por ela e seguiram em frente, ela sentiu uma
pontada de desapontamento. Então ele se virou e seus olhos se encontraram
com os dela. Ela sentiu um raio atingi-la, viu o reconhecimento em seus
olhos, a curva lenta de seu sorriso, a intenção em seu olhar, e por um
momento seu coração parou. Ela não conseguia desviar o olhar.
Sem tirar os olhos dos dela, ele ergueu a coroa de flores acima de
sua cabeça e algumas pétalas ficaram em seu cabelo escuro.
— Salte o fogo, — comandou Muira.
Em um movimento atlético, Alec saltou através das chamas,
passando através das faíscas e da fumaça para aterrissar ao lado de
Caroline. Ele fez uma reverência exagerada, seus olhos nos dela. Ele
segurou a coroa e colocou na cabeça dela. O perfume de rosas selvagens a
cercou. Muira entregou-lhe a taça e ele a colocou nos lábios de Caroline. O
calor do líquido adocicado fluiu para baixo em sua garganta e através de
seus membros, instantaneamente inebriante, roubando-lhe o fôlego,
levantando-a do chão para flutuar acima dela. Ou era o Laird, suas mãos nas
dela, segurando a taça, seus dedos quentes e firmes?
— Agora devemos pular novamente, — disse ele, e pegou a mão
dela. — Você está pronta?
Caroline olhou para a fogueira diante dela. Era tão alta quanto
seus quadris, as chamas lambendo, como lábios famintos. Ainda assim, ela
concordou, e ele colocou o braço em volta da cintura dela e, juntos,
correram para a frente e voaram sobre o fogo, banhado em fumaça e faíscas,
abençoando a terra por mais uma temporada. Ela sentiu que ficaria voando
para sempre quando finalmente aterrissou na grama fresca do outro lado da
fogueira, sem fôlego. Ele não a soltou, mas manteve o braço ao redor dela,
e ela se aproximou do seu lado, sentindo-se segura e aquecida.
Outros casais deram as mãos e pularam o fogo. Os rapazes
levaram o gado através da fumaça ondulante para abençoá-los. A música
começou a tocar, tambores, flautas e gaitas de fole, e a dança começou, a
cerveja fluiu. Rapazes e moças se emparelharam, entrando e saindo das
sombras, roubando beijos e muito mais. As crianças perseguiam umas às
outras com varas em chamas.
Alec MacNabb a tomou em seus braços e começou a dançar,
girando-a da luz do fogo para a sombra e de volta a luz, até que tudo o que
ela conseguia ver era o brilho de seus olhos, tudo o que conseguia sentir era
a batida dos tambores em suas veias, seu batimento cardíaco batendo ao
mesmo tempo que o dele.
Outros casais se juntaram à dança, movendo-se cada vez mais
rápido até se tornarem um borrão, e Caroline e Alec eram as únicas pessoas
no mundo. Ela jogou a cabeça para trás e riu quando ele a ergueu e girou-a
em um círculo, deixando ela tonta, em seguida, deixou seu corpo deslizar
pelo comprimento do dele, até que seus lábios estavam a centímetros de
distância. Ela estava sem fôlego, intoxicada por Alec tanto quanto pela
cerveja. Ele a beijou e ela provou a doçura da bebida novamente.
— Você tem gosto de mel e flores, minha senhora.
— Eu? Eu pensei que era você, meu senhor, — ela brincou,
batendo os cílios, flertando com ele, aproximando-se dele enquanto a dança
continuava, depois se afastando, até que ela estava enlouquecendo de desejo
por mais cerveja, e outro beijo. Ele segurou a mão dela, puxou-a para o lado
quando os passos da dança a levaram longe demais, riu para ela.
Os olhos dele brilhavam, iluminados pela luz do fogo. Ela viu
desejo e sentiu fluir através de seus membros também. Ele a puxou contra
seu corpo e beijou-a novamente, sua língua lambendo a comissura de seus
lábios, exigindo a entrada. Ela abriu, provou o mel em sua língua, o
amargor das ervas e da cerveja, e ele. Ela colocou os braços em volta do
pescoço dele e puxou-o mais perto, querendo não fazer nada, além de beijá-
lo. O calor de sua boca deu lugar ao frescor da noite, quando ele recuou. Ele
apertou sua mão na dele e sorriu para ela, seus dentes brancos à luz do fogo.
Alec não conseguia tirar os olhos da mulher em seus braços. Seu
cabelo vermelho queimava tão brilhantemente quanto as chamas. Seus
lábios estavam suaves por causa de seus beijos, seus olhos dourados. Ele
poderia realmente ter tanta sorte de ter essa mulher para sua noiva? Ele se
casaria com ela amanhã, neste exato momento, se pudesse. Os sons de
tambores o preencheram, ou talvez, fosse mais que isso.
Ela sorriu para ele, mordeu o lábio quando tropeçou contra ele na
dança, o comprimento de seu corpo contra o dele por um momento. Ela
ficava bem em seus braços, familiar, perfeita. Ele sentiu a mesma onda de
desejo na torre, quando ela caiu. Excitação intensa, forte e poderosa. Ela
levantou os braços acima da cabeça enquanto dançava, seu corpo ágil e
elegante. Seus olhos percorreram a silhueta iluminada de seu seio sob a
musselina de seu vestido. Seus pés brancos trilhando os passos enquanto ela
se afastava, depois voltava para ele, no ritmo da dança. Ele não conseguia
esperar para tê-la em seus braços novamente, para girá-la, para segurá-la
perto, para sentir o doce aroma de seu cabelo sob a coroa de flores. Ele
estava, de repente, feliz por ser o Laird de Glenlorne. Certamente não havia
nada que ele não pudesse fazer com esta mulher ao seu lado, sua rainha do
solstício de verão, sua condessa, sua esposa.
Ele a puxou para perto e a beijou novamente, e ela passou os
braços ao redor do pescoço dele e o beijou de volta, sua língua
emaranhando-se com a dele, suas mãos em seu cabelo.
— Venha comigo, — disse ele, agarrando a mão dela, puxando-a
até a torre.
Ele a soltou apenas o tempo suficiente para levantar a barra da
porta e soltá-la na grama. Ele a puxou para a escuridão aveludada, e o vento
fechou a porta atrás deles, deixando-os na escuridão profunda. O som da
folia estava distante agora, os tambores ainda batendo em seus ouvidos,
suas veias, enchendo-o de excitação e desejo. O teto estava aberto para as
estrelas, e a luz da lua formava uma piscina macia no centro da sala, e ele a
puxou para dentro, inclinou o rosto para baixo, olhou para ela.
Caroline olhou para a lua, sem fôlego, e entrou no círculo da luz.
Ele tomou-a nos braços, abraçou-a, olhou para o rosto dela, acariciou-lhe o
cabelo.
— Você é linda, — ele sussurrou.
Ela ficou na ponta dos pés e segurou o rosto dele com as mãos, os
dedos se movendo sobre a barba áspera, enquanto ela o beijava novamente.
Ele gemeu baixinho e a puxou para mais perto ainda, pressionando-a contra
o comprimento de seu corpo, peito a peito, barriga a barriga, coxa a coxa.
Ela correspondeu ao beijo, duelando com a língua dele como se tivesse feito
isso mil vezes. Ele poderia dizer que ela não tinha? Ela deveria parar, mas
ela não queria. Ela era a rainha do solstício de verão e ele era seu rei, pelo
menos, por esta noite.
Ela inclinou a cabeça para que ele pudesse beijar seu pescoço. Foi
tão bom. Como era possível viver tanto tempo e nunca saber que tal
sensação existia? Ela podia sentir sua excitação, sabia o que isso
significava. Ele a desejava. Ele gemeu quando ela se aproximou ainda mais,
mexeu os quadris, movendo-se contra ele. Ela emaranhou as mãos no tecido
áspero da camisa dele, puxando-o para ela, precisando mais do que beijos,
mas ela não conseguia imaginar nada mais delicioso do que o beijo dele.
Ela não conseguiria parar de beijá-lo, mesmo se quisesse. Ela estava
enfeitiçada.
Ele trilhou a boca por sua garganta enquanto abria os laços da
frente de seu vestido com sua língua e dentes. Ela deslizou as mãos dentro
de sua camisa, sentiu o calor de sua pele sob suas mãos. Ele empurrou o
vestido dela para baixo dos ombros, desnudando seus seios, e abocanhou o
mamilo em sua boca faminta. A sensação levou os últimos pensamentos
coerentes de sua mente. Ela queria isso, queria-o e ele a queria. Ela se
contorcia contra ele, implorando por mais. Ela empurrou a camisa dele e o
plaid que cobria seu peito, da mesma maneira que ele fez com o vestido
dela, mostrando os ombros e o peito ao luar. Músculos duros brilhavam na
luz suave, tornando-o dourado e glorioso, um mítico rei do solstício, de
fato. Devia ser magia. Ela passou as pontas dos dedos sobre ele, explorando
a seda de sua pele, a flexão fascinante de seus músculos. Seu corpo era
maravilhoso, a perfeição masculina. O cheiro de sua pele se derramou sobre
ela, intoxicando-a muito além de qualquer coisa que a cerveja tivesse feito.
Ela pressionou a boca contra o peito dele, beijou-o, provou-o e
gemeu. Ela sentiu seu coração batendo sob seus lábios, sentiu a respiração
cantando através de seu corpo no ritmo da batida dos tambores além das
paredes enquanto seus músculos se esticavam de prazer com o que ela
estava fazendo com ele. O poder cantou através de suas próprias veias. Ela
encontrou seu mamilo e mordeu suavemente, em seguida, chupou o seixo
duro, e ele ofegou para respirar, suas mãos emaranhando-se em seu cabelo.
— Espere, — ele murmurou.
Ele puxou a camisa sobre a cabeça, desafivelou o cinto e deixou
cair as dobras de seu tartan. Ela respirou com a visão de seu corpo nu. Ele
espalhou o xadrez sobre o chão, fazendo um cobertor improvisado para uma
cama acolchoada pelo suave musgo por baixo. Ele usou a camisa dele para
fazer um travesseiro, e se ajoelhou.
— Venha aqui, — disse ele, estendendo a mão para ela. Desta
vez, não foi difícil decidir o que ela queria. Ela colocou a mão na dele e se
ajoelhou diante dele. Ele puxou o vestido dela sobre a cabeça, jogou-o de
lado. Ela segurou a respiração quando ele ficou imóvel, olhando para ela ao
luar. O que ele estaria pensando? Nenhum homem jamais a tinha visto
assim antes.
Ela era linda?
— Oh, moça, — ele murmurou, e deslizou as costas da mão sobre
sua bochecha, seu ombro, seus seios. — Eu acho que devemos ir devagar,
— disse ele. — Ou parar. A escolha é sua. — Sua voz estava cheia de
desejo.
Ela colocou os braços ao redor dos ombros dele, emaranhou os
dedos em seus cabelos, e trouxe sua boca para a dela. Ele gemeu e a puxou
para baixo, na cama macia de sua manta. Ele gemeu e caiu em seu abraço,
cobrindo o corpo dela com o dele. Ela se deliciava com a sensação de
músculos duros e pernas peludas contra sua pele, o som dos carinhos
murmurados que ele sussurrava em seu ouvido, em gaélico. Ele sugava seu
seio enquanto explorava as curvas de seu corpo, encontrando lugares que
ela nem sabia que existiam antes dele tocá-la. Colocou fogo nela em todos
os lugares que seus dedos roçaram, até que ela se arqueou para cima,
inquieta, desesperada.
— Por favor, — ela disse suavemente.
— Espere, — ele sussurrou contra sua boca, e ela choramingou
quando ele voltou a sugar o mamilo, devagar, docemente.
Ela agarrou seus ombros, cravou suas unhas na carne dura,
implorando sem palavras por muito mais, mas ele continuava lentamente.
Ele soprou ar frio em sua carne aquecida, em seguida, levou o broto
sensível de volta à sua boca. Ela se contorceu quando a palma de sua mão
desceu sobre a barriga e os quadris, movendo-se com lentidão
enlouquecedora para acariciar os pelos entre suas coxas. Ela se contraiu
contra a palma de sua mão, querendo mais, querendo — bem, o que quer
que fosse, que fazia os poetas cantarem, e as damas desmaiarem. Estava
dentro do poder dele concedê-lo, mas ele se deteve. Ele trouxe a boca de
volta para a dela, e ela se abriu para ele, mordendo e sugando sua língua e
lábios, ouvindo sua respiração se transformar em grunhidos de desejo
reprimido. A ereção dele pressionou em seu quadril, e ela se abaixou para
tocá-lo. Ela fechou a mão em torno dele e ele ofegou, gritou em gaélico.
Sua mão ainda pairava sobre os lábios delicados de seu sexo, e então seus
dedos mergulharam entre eles, e encontraram o lugar onde ela mais
precisava dele. Ela gritou em inglês, e ele começou a circular o broto
selvagem e úmido com a ponta do dedo, levando-a além da loucura para um
lugar de prazer tão requintado, que ela temia que morresse. Sua mão
tremulou sobre a dele, meio com medo do que estava por vir, meio com
medo que ele parasse.
A sensação explodiu sobre ela, como uma fogueira rugindo para a
vida, atirando chamas e faíscas, consumindo tudo, sagrada. Ela se agarrou a
ele, viu as estrelas acima da torre, sentindo-as descer sobre ela, uma a uma,
para cantar através de seu sangue, levantando-a.
Ele a beijou, murmurou palavras afetuosas quando se mexeu, e
ela sentiu a ponta dele, onde, antes, seus dedos estavam. Ela respirou fundo
e arqueou para trás, os dentes cerrados enquanto ele se dirigia para dentro
dela, sufocando um grito com a dor aguda. Ela cravou as unhas no ombro
dele, então ele esperou que ela se ajustasse a ele, ao ser preenchida pela
primeira vez, beijando seu pescoço, acariciando seu rosto.
Lentamente, ele começou a se mover, preencheu-a, retirou-se, e
preencheu-a novamente. A dor diminuiu e o prazer voltou, e ela assistiu os
músculos de seu pescoço se apertarem, enganchou seus tornozelos em torno
dos quadris dele, dizendo-lhe o que queria. Ela estava sem fôlego com a
necessidade, e ele se moveu mais rápido por impulso, mais forte, e ela se
agarrou aos seus ombros, querendo que durasse para sempre. Ela gritou
quando a sensação se derramou sobre ela, de novo, levantando seus quadris
para atraí-lo mais profundo, e ele gritou, tenso contra ela, enterrado dentro
dela, e ela sentiu-o estremecer antes de desabar contra ela, seu coração
batendo forte contra o dela. Ela cruzou os braços em volta dele, puxou-o
para ela.
Então é assim que se sente ao ser amada por um homem. Ela não
sabia. Ela ficou maravilhada com a alegria que sentiu. Foi realmente magia.
Seu coração batia contra o dela, sua respiração desacelerou para combinar
com a dela, e ele beijou seu rosto, acariciou seus cabelos e murmurou para
ela em gaélico. Ele estava professando seu amor? Não importava. Ele se
afastou dela e ela sentiu o frio da noite soprar contra os lugares que ele
havia aquecido. Ele puxou-a para o seu lado e envolveu os dois, em sua
manta.
Caroline piscou para a lua e adormeceu no santuário quente dos
braços de seu amante.
Os pássaros celebravam sua própria e estridente celebração
quando os primeiros dedos da aurora atingiram o horizonte. Eles surgiram e
mergulharam acima da torre, loucos de alegria. Caroline se aconchegou
mais profundamente nas cobertas macias, sem vontade de acordar ainda.
Ela teve o sonho mais maravilhoso, tudo... A respiração suave ao lado dela a
fez abrir os olhos arregalados. Ela se virou para olhar o perfil adormecido
de Alec MacNabb, deitado ao lado dela, compartilhando o cobertor macio.
Não foi um sonho. O pânico tomou conta dela. Ela olhou debaixo
das cobertas e percebeu que estava de fato nua. Outra espiada lhe disse que
ele também estava despido. Ela largou as cobertas, sentindo o sangue
quente preenchendo não apenas suas bochechas, mas todo o seu corpo. Não
foi um sonho. Ela havia saltado o fogo ao seu lado, dançou com ele, beijou-
o e... Ela abafou um suspiro. Ela se perguntou onde estavam suas roupas e
viu o vestido de linho reclinado sobre um pedaço das pedras, cobrindo
metade do entalhe de um rosto sorridente. A coroa de flores murchas estava
inclinada sobre os olhos esculpidos, uma boca risonha, zombando dela. Ela
olhou para Alec novamente. Seu rosto era suave e infantil durante o sono.
Longos cílios estavam contra as bochechas trincadas; sua boca era macia e
doce.
Seu coração se agitou em seu peito. Ele era magnífico. Ela
recordou o prazer que ele lhe dera, os beijos, as carícias... Foi a noite mais
incrível e inesquecível de sua vida.
Também havia sido a coisa mais tola que já fizera. Ela era
governanta das irmãs de Alec, uma criada em sua casa. Suas bochechas
queimaram com o pensamento.
As garotas. Ela se sentou com um suspiro. Se ela havia acabado
ali na torre, em uma posição comprometedora, onde estavam elas? Ela
escorregou com cuidado de debaixo da manta morna e deslizou ao redor da
figura adormecida para pegar seu vestido. Estava frio quando ela o colocou
sobre a cabeça e amarrou com a fita de Sorcha. O vestido estava enrugado e
manchado de marcas verdes de musgo, e preto de fuligem, mas não podia
ser arrumado. Ela olhou para o céu cheio de promessas, e fez uma oração
agradecendo que ainda fosse cedo o suficiente para que ela pudesse voltar
para o castelo sem ser vista. Ela lançou um último olhar enquanto ele
dormia, tão bonito quanto um anjo, e correu para a escuridão que antecedia
a madrugada.
— Você acha que devemos acordá-lo, enviá-lo atrás dela? —
Angus perguntou enquanto Caroline corria pela encosta da colina, o cabelo
atrás dela em selvagens cachos emaranhados. Ele adorava enrolar os cachos
de Georgiana ao redor do dedo enquanto ela ficava em seus braços depois
que eles haviam feito amor.
Georgiana sacudiu a cabeça.
— Não, ela vai precisar de tempo para pensar, para perceber...
— O quê? — Perguntou Angus quando ela terminou. Ele sorriu.
— Deixe-me adivinhar. Ela precisará de tempo para perceber que foi a
melhor noite da vida dela.
Georgiana revirou os olhos.
— Ela vai precisar de tempo para perceber que o ama, apesar do
que aconteceu aqui esta noite.
— Apesar disso? — Gritou Angus. — Por causa disso, você quer
dizer.
Georgiana colocou as mãos nos quadris e olhou para ele.
— Ele foi um pouco áspero cortejando-a, e você acha que ela não
consegue viver sem ele, que nenhum outro homem — qualquer outro
homem — poderia fazer o que ele fez? Quão arrogante você é! Ela era
virgem e ele a seduziu em uma torre em ruínas, no chão duro.
Angus empurrou a boina na cabeça, olhando para o brilho
revelador dos olhos dela. Ela flutuou diante dele, mas seus olhos estavam
em Caroline. Ele sentiu uma onda quase esmagadora de tristeza.
— Eu pensei que isso era o que você pretendia que acontecesse
entre eles. Foi o mesmo para nós, não foi? Você era virgem na noite em que
nós... — Ele parou para limpar a garganta. — Você está dizendo que você
se arrepende do que fizemos?
Ela fixou os olhos nele.
— Claro que não. Eu lamento que tenha sido a primeira e única
vez, e que não conseguimos viver aquele momento novamente. Oh! Angus,
cometemos um erro? E se nós apenas causamos mais infelicidade e
sentenciamos eles a uma vida inteira de arrependimento e dor?
Ele chegou mais perto, levantou a mão para o rosto dela, não
sentiu nada além de frustração por não poder tocá-la, nem mesmo para
oferecer conforto.
— Existe uma batalha amanhã que eu não sei? Ele não tem
irmãos para arrastá-lo para longe da moça, e ela não tem o pai para arrastá-
la de volta para a Inglaterra. Eles estão aqui, juntos. Eles não vão a lugar
nenhum. Porque mais tarde, esta manhã, ele acordará e retornará ao castelo.
Ele vai procurá-la e cair em um joelho e...
Georgiana gritou quando Alec correu pela sombra do avô, com o
tartan torto enquanto tentava vestir a camisa e descer a colina, ao mesmo
tempo. Eles olharam para ele quando ele saltou as últimas brasas da
fogueira de verão, desviando o povo ainda adormecido, pacificamente, na
grama encharcada de orvalho, parando, voltando a olhar para os rostos
adormecidos.
— Agora você vê? — Angus disse presunçosamente, endireitando
sua manta. — Ele está procurando por ela.
— Sophie? — Eles se viraram ao som do sussurro de Alec. —
Você está aqui?
— Sophie? — Georgiana repetiu, seu sussurro horrorizado
farfalhando as árvores, assustando um pássaro que fugiu em pânico. — Ele
ainda acredita que Caroline é alguém chamada Sophie? Mesmo depois de...
Angus sentiu um nó de trepidação no estômago. Ele assistiu seu
neto procurar entre as moças adormecidas pela mulher com quem acabara
de passar a noite, uma mulher cujo nome ele nem sabia.
— Eles não poderiam se apresentar? — Perguntou Angus. — Só
uma poção, você disse. Isso é tudo que seria necessário e tudo se
desenrolaria como deveria, e a maldição terminaria.
— Deve ter sido muito forte, talvez muita erva ulmária. —
Georgiana se irritou.
— Foi somente a poção, você não vê? Ela não é a mulher certa,
ou ele não é o homem certo! — Angus disse com raiva. — Não funcionou.
Os olhos de Georgiana se arregalaram.
— Como você pode dizer isso? Você viu como eles estavam
dançando, a paixão em seus olhos.
— Foi a cerveja e a luz do fogo, nada mais, — resmungou Angus.
— Ele obviamente está apaixonado por outra pessoa, alguém chamado
Sophie.
Georgiana sacudiu a cabeça, torcendo as mãos.
— Não, não é possível! Se ele ama essa Sophie, então por que ele
está aqui, está brincando com Caroline?
Angus lançou-lhe um olhar arrogante.
— Ele é um homem, gràdhach, e ela é uma moça adorável.
— Oh! O que fizemos? — Gritou Georgiana. — Eu devo ir até
Caroline, embora o céu saiba que eu não posso fazer nada para ajudá-la
agora. Nada, nada mesmo.
Angus observou-a desaparecer contra o amanhecer e olhou para
Alec, que observava a torre como se ele fosse estúpido e enfeitiçado. Angus
recordou exatamente esse sentimento. Ele estava no mesmo lugar, em uma
manhã de verão, há muito tempo, incapaz de pensar em algo ou alguém
além de Georgiana, e a doçura da noite em seus braços. Mesmo quando
seus irmãos haviam subido a colina para levá-lo, ele ficou ali, parado,
incapaz de se mover cheio de amor e alegria. Quando chegaram até ele, ele
abriu a boca pronto para declarar seu amor por Georgiana, mas Niall recuou
o punho e lhe deu um soco no rosto. A próxima coisa que ele se lembrava
era acordar em um navio, doente como um cachorro. Ela certamente se
sentiria machucada e confusa, e por uma razão, completamente, diferente.
Angus observou quando Alec se virou para olhar a estrada. Havia
uma grande carruagem rodando ao longo da trilha esburacada, seguida por
várias carroças, todas muito carregadas. Ele fez uma careta para o grande
emblema de ouro na lateral da carruagem, para os seis cavalos brancos
combinados que puxavam o veículo em direção a Glenlorne. Angus se
aproximou do lado do neto.
— Agora quem está vindo? — Perguntou, embora soubesse que
Alec não podia ouvi-lo.
— Sophie, — Alec murmurou, e saiu correndo pela encosta.

Capítulo 19

Caroline atravessou a porta da cozinha e subiu os degraus de dois


em dois, indo em direção ao quarto de dormir das meninas em primeiro
lugar, temendo o que poderia encontrar — ou não encontrar — lá. Ela quase
caiu no chão, aliviada, quando viu três cabeças, em três travesseiros, todas
dormindo, sem nada mais perigoso do que algumas flores silvestres
murchas espalhadas pelo chão. Ela arrumou o cobertor em volta do queixo
de Sorcha e foi para seu próprio quarto.
Ela fechou a porta e se inclinou por um momento. Ninguém a
tinha visto. O alívio a inundou, e ela lavou o rosto em água fria, embora ela
não fizesse nada para esfriar o calorão de suas bochechas. Ela olhou para o
espelho, observando seu rosto nos primeiros raios do sol. Ela parecia
diferente?
Claro que ela parecia. Seu cabelo era um emaranhado selvagem, e
seus lábios estavam rosados e inchados por causa dos beijos dele. O simples
pensamento da boca dele, na dela, fez seus joelhos enfraquecerem com
desejo por mais. Ela viu sangue quente encher seu rosto do queixo até a
linha do cabelo, e seus olhos — oh, como ela esconderia o brilho em seus
olhos? Eles brilhavam, brilhavam muito, e havia um toque suave e confuso
que não estava lá antes. Seria amor, ou apenas a satisfação de uma mulher
que havia sido apreciada por um amante habilidoso? Ela sabia pouco sobre
essas coisas — bem, antes da noite passada. Ela ouvira criados fofocando
em voz baixa, é claro, com os próprios olhos brilhantes, as bochechas
coradas, como as dela agora. Ela segurou a borda da mesa, os joelhos
subitamente vacilantes, o corpo dolorido e saciado. Ela não queria nada
além de afundar no conforto de sua cama, dormir e sonhar com Alec
MacNabb e o que aconteceu entre eles na torre.
Mas o sol estava nascendo e ela possuía deveres a cumprir. Ela
lavou o rosto mais uma vez, tentando apagar a evidência. Ela escolheu o
vestido mais recatado que ela conseguiu encontrar, azul escuro e de gola
alta. Ela torceu o cabelo em um nó que puxava a pele até formar um caracol
e prendeu-o com vários grampos
Ainda assim, quando ela olhou para o espelho, suas bochechas
estavam vermelhas, sua boca ainda estava exuberante. Sim, agora ela
entendia o que os servos estavam fofocando. Ela se afastou do espelho. Ela
simplesmente agiria como se nada tivesse acontecido. Ela manteria os olhos
baixos e os lábios bem abertos. Certamente ninguém ousaria fazer
perguntas, perguntar para onde ela havia desaparecido ontem à noite. Se
eles fizessem, ela simplesmente diria a eles...
Ela alcançou a porta com o queixo erguido e parou, a mão no
trinco. Diria o quê? Não havia nada para explicar. E o que ela diria para
Alec MacNabb quando — se — ela o visse? Oh! Deus!
Ela deu um passo para trás e olhou para o trinco. Ela diria que foi
um erro — não, não foi um erro — um impulso. Não que ela fosse do tipo
impulsivo. Certamente dizer que foi o espírito da noite poderia soar melhor
— a dança, a fumaça do fogo. Tudo isso a deixou — bem... tonta — sim,
esta poderia ser uma palavra que ela poderia usar. Ela deixaria claro que
não era o hábito dela fazer essas coisas, e seu comportamento de ontem à
noite não se repetiria. Nunca. Ela colocou a mão no trinco novamente.
— Ora, isso deve explicar as coisas.
Ela recuou novamente. Ah, mas se ele sorrisse para ela e a olhasse
do jeito que ele olhou para ela, do outro lado da fogueira, ou a beijasse, ela
estaria perdida, de novo. Ela levantou os dedos trêmulos até sua bochecha
quente. Talvez fosse melhor encontrar uma maneira de evitá-lo,
completamente — pelo menos até ele se esquecer. Quanto tempo levaria um
homem para esquecer uma conquista casual, em uma torre escura? Era
certamente algo que ela nunca esqueceria, mesmo que ela vivesse até ser
tão velha quanto a própria torre. Ela respirou fundo e abriu a porta.
Ela saiu da torre e quase colidiu com uma criada que vinha ao
longo do salão principal com chá e torradas para Devina. A garota
simplesmente balançou a cabeça para trás e seguiu seu caminho sem dizer
uma palavra sobre as bochechas coradas ou os olhos brilhantes. Caroline
soltou o ar que estava segurando. Ela havia passado o primeiro obstáculo.
Ela se dirigiu para as escadas com um sorriso.

Capítulo 20

Alec mal conseguiu voltar ao castelo a tempo de trocar de roupa,


pentear o cabelo e limpar de sua pele o cheiro de sua amante. Ela
obviamente fugira quando ele adormeceu e voltou para onde quer que fosse,
e, onde seu pai estava hospedado, e agora, estava prestes a chegar,
formalmente, em Glenlorne.
Enquanto ele amarrava o lenço, renunciando ao traje das
Highlands à elegância inglesa. Certamente, o fato de que acabou de
amanhecer e ela estava chegando com carroças cheias de baús e caixas,
significava que ela gostara da última noite tanto quanto ele, e estava ansiosa
para se casar com ele e repetir o prazer, desta vez em uma cama como sua
esposa
Ele olhou para a grande cama MacNabb e a imaginou lá. Linda,
magnífica e apetitosa Sophie. Ele esperava que não tivesse sido muito
bruto, muito esmagador para ela. Se seus gemidos de desejo e suspiros de
prazer revelassem alguma coisa, ela estava bem satisfeita. Como ele estava.
Ele não havia dormido tão profundamente, ou tão bem, em muito tempo,
como quando ele a tivera em seus braços, satisfeito e feliz, sua mente em
paz. Ele ficou desapontado quando acordou sozinho. Ela possuía o maldito
hábito de desaparecer. Ele se perguntou se ela era real, mas o gosto dela em
seus lábios, a visão da sua coroa de verão, era prova suficiente.
Não importava. Ela estava aqui agora. Ele endireitou o lenço,
passou a mão pelo cabelo, e saiu do quarto.
Ele parou no topo da escada. Como ele deveria cumprimentá-la?
Ele dificilmente poderia envolvê-la em seus braços na frente do pai dela e
beijá-la do jeito que ele fizera na noite passada. Ele não poderia fazer o que
ele realmente queria e levá-la para o seu quarto pelo resto do dia, embora
ele ficasse excitado só de pensar nisso.
Ele endireitou as costas e desceu as escadas lentamente, com a
devida dignidade de um conde. Ele agiria do jeito que ela quisesse. Ele
fingiria que eles eram totalmente estranhos, se ela quisesse, se inclinaria
sobre sua mão e a chamaria de senhora, até mesmo esperaria pacientemente
enquanto as apresentações apropriadas fossem feitas. Ele ofereceria seu
braço e perguntaria educadamente como fora a viagem desde Londres e se
ela se cansara. Ele sorriu. Ela, de fato, deveria estar cansada esta manhã.
— Alec, uma grande carruagem acabou de chegar. Quem está
aqui? — Perguntou Sorcha, correndo pelo corredor.
Megan seguiu a irmã dela.
— Há um brasão ao lado da carruagem!
— É a coisa mais linda que eu já vi, seis cavalos, todos
perfeitamente combinados. É o príncipe regente, talvez? — Alanna fez uma
breve pausa quando chegou perto de Alec, com os olhos brilhando. — Isso
é parte dos nossos presentes?
Alec sentiu o orgulho inchar seu peito.
— Sim. Na verdade, é o melhor presente de todos, — disse ele.
Ela já estava descendo da carruagem quando ele chegou aos
degraus da frente, com a cabeça baixa, a mão na manga de um lacaio
usando uma libré. Ele não conseguia ver o rosto dela embaixo do chapéu.
Era mais um enfeite do que um chapéu, coberto com uma penca de penas
fofas, azuis, rosas e verdes, com um pássaro amarelo empoleirado em um
dos lados. O vestido dela era rosa, com uma elegante jaqueta verde. Ele
deixou seus olhos se demorarem sobre a figura dela. Estranho. Ele achava
que ela era mais magra, não tão curvilínea quanto parecia agora. Ele tentou
imaginar os seios dela, do jeito que ele os viu ao luar, perfeitos, brancos,
redondos e doces, preenchendo suas mãos. Ele sentiu suas mãos se
apertando, tentando comparar a memória com o que ele via agora. Talvez
fosse o vestido, ou as incontáveis peças femininas por baixo, mas ela
parecia muito mais dotada esta manhã. Ele abaixou a mão para o lado do
quadril.
Ele viu a boca dela se mover sob a aba do chapéu, enquanto
falava com o lacaio, com o chapéu ainda escondendo o resto do rosto.
Ele sentiu seu estômago tenso quando um cavalheiro saiu da
carruagem e entrou na frente de Sophie, bloqueando a visão de Alec sobre
ela. O homem olhou por cima do ombro e acenou para ele.
— Bom dia, senhor. Eu sou o reverendo Reginald Parfitt, — disse
o homem, subindo as escadas. — Eu tive o prazer de escoltar Lady Sophie e
sua empregada desde Londres, a pedido de seu pai. — Ele pegou a mão de
Alec que a sacudiu, tentando ver atrás dele.
Sophie se virou para observar a empregada descer da carruagem,
carregando uma caixa de chapéu. Alec sabia que o reverendo Parfitt estava
falando com ele, e as garotas estavam se aproximando dele, mas ele
manteve os olhos em Sophie, desesperado, agora, para vê-la. Ele queria
descer correndo os degraus, arrancar o maldito e ridículo chapéu da cabeça
dela, arqueá-la sobre o braço dele e beijá-la sem sentido; e ele não dava a
mínima para quem estivesse observando-o fazer isso. Ele se moveu à frente.
E foi quando Lady Sophie Ellison olhou para ele.
Os joelhos de Alec se tornaram geleia, ele parou onde estava e a
olhou. Ele encontrou um par de olhos azuis claros, sob uma onda de cabelos
claros. Não eram avelãs a noite passada? E o cabelo dela era vermelho. Ele
não poderia ter imaginado isso, poderia?
Não era ela. Essa mulher era uma completa estranha.
Alec sentiu o sorriso derreter do seu rosto como cera. Seu corpo
ficou adormecido, seus dedos esticados para trás.
Não era ela.
— Posso apresentar Lady Sophie Ellison? — Parfitt disse, e Alec
afastou os olhos do rosto dela e olhou para ele. Um longo momento de
silêncio se seguiu, até que a testa do homem da igreja se enrugou. — Meu
senhor conde? — Ele murmurou.
Alec piscou. Era possível que ele estivesse vendo coisas? Talvez
ela estivesse disfarçada, ou parecesse diferente sem um enfeite de cabeça
com pássaro. Ele olhou para ela novamente.
Não era ela.
Os grandes olhos azuis dela observavam, como beija-flores
nervosos, disparando sobre o castelo, por suas irmãs e por ele próprio. Não
havia sinal de reconhecimento. Seu olhar se moveu novamente, parou em
alguma coisa atrás dele. E o sorriso dela floresceu.
— Oh! — Ela choramingou. — Olhe, é Lady Caroline! — Ela
passou por ele, subindo correndo os degraus, e Alec se virou.
Ele teve um vislumbre de um cabelo vermelho, de uma pele
branca e de olhos arregalados, por um instante, antes deles serem engolidos
pelo abraço de Sophie, e o rosto de sua amante ficar escondido por trás das
plumas do enfeite de Lady Sophie.
Capítulo 21

— Você deve se surpreender ao me ver, e não ao Lorde Bray, —


disse Parfitt. — Sua senhoria tinha questões urgentes de negócios para
tratar. Em vez disso, mandou-me. O clérigo deu um tapinha no bolso. —
Não tenha medo. Eu estou equipado com uma licença de casamento. Lorde
Somerson está visitando Glenlorne no momento?
Alec forçou os olhos para longe das duas mulheres no topo da
escada e se virou para olhar para Parfitt.
— Somerson? Por que ele estaria aqui?
Parfitt olhou-o como se ele fosse um idiota, por um instante, antes
de sorrir incerto.
— Por quê? Porque a irmã dele está aqui, claro! Até muito
recentemente, Lady Caroline estava no mercado de casamentos em
Londres. Houve alguma especulação sobre o motivo pelo qual ela deixou a
cidade inesperadamente. — Ele estava, obviamente, esperando por uma
explicação, mas Alec não possuía nenhuma.
Lady Caroline. Esse era o nome dela. Alec se virou para olhar
para ela, para confirmar que era ela quem ele havia... Seu estômago se
transformou em líquido. Bom Deus, ele seduziu a irmã do conde Somerson.
Ela estava de frente para Sophie, de costas para ele. Ele olhou à
curva familiar de suas costas. Ele conhecia, com certeza, cada vértebra de
sua espinha intimamente, ele sabia exatamente o que ela sentira ao colocar a
mão em sua cintura, e acariciar a curva de seu peito. Seu cabelo estava
penteado amarrado esta manhã, preso em uma gaiola de grampos de aspecto
letal, mas era o mesmo cabelo que caíra em cascata em seu rosto enquanto
ele fazia amor com ela, ao luar. Se ele fosse arrancar os grampos e libertá-
los, sentiria o cheiro de flores silvestres e mel, e enrolaria eles em seus
dedos.
— Lottie recusou-se a casar se você não estivesse ao lado dela!
— Sophie estava dizendo em voz alta, apertando as mãos de Caroline — as
mesmas que o acariciaram, apenas algumas horas antes. — Ela tem estado
enlouquecida, e afinal aqui está você, bem saudável, na Escócia! Devo dizer
que o ar aqui parece te fazer muito bem. Você parece radiante!
Ele assistiu Caroline morder o lábio. Esperou que seus olhos
caíssem sobre ele, a verdadeira razão pela qual ela estava radiante, mas ela
se recusou a olhar para ele. Ela sabia quem era ele, ele sabia disso, porque
suas bochechas ficaram vermelhas como ameixas de verão.
— Por que você está aqui, Sophie? — Ela perguntou sem fôlego,
e ele ouviu o som suave, da mesma voz, implorando por mais, soltando
suaves gritos de paixão.
Sophie se virou para olhá-lo, batendo os cílios, oferecendo um
sorriso tímido.
— Porque, eu vou me casar com o conde de Glenlorne.
As ameixas nas bochechas de Caroline desapareceram, como se
uma súbita geada houvesse invadido o paraíso. As irmãs dele, em pé,
quietas até agora, exclamaram e foram abraçá-lo, puxar seus braços, beijar
suas bochechas. Ele não sentia nada. Ele não conseguia tirar os olhos de
Caroline.
— Oh! Senhorita Forrester, não é maravilhoso? — Perguntou
Alanna.
— Senhorita Forrester, — ele murmurou.
Ele nunca, sequer considerou que o nome poderia estar
relacionado com Somerson. O nome da família do conde era Forrester e,
embora ele nunca tivesse conhecido o homem, ele o vira várias vezes. Sua
esposa era famosa por sua língua incauta e por uma observação indiscreta
que fez certa vez, sobre Vossa Alteza, em um baile.
Alec sentiu um súbito rubor de raiva. Havia sido simples, em
Londres, investigar as fraquezas particulares e os erros dos outros — ele
precisou vir até a Escócia para encontrar um escândalo próprio. Ele olhou
ansiosamente por cima do ombro para as colinas, evitando até mesmo um
olhar à torre. Ele se perguntava o que aconteceria se ele, simplesmente,
começasse a andar, e escapasse. Ele olhou para Caroline, novamente, e
apesar de tudo o que havia acontecido nos últimos quinze minutos, sentiu
outra fisgada de desejo. Ele gemeu em voz alta.
— Está bem, meu senhor? — Perguntou Parfitt.
— Foi a véspera do solstício de verão ontem à noite. É apenas a
sequela das celebrações, — Alec disse, e o padre Sr. Parfitt franziu os
lábios, sem dúvida, considerando o potencial de pecado e blasfêmia, tal
celebração proporcionava uma boa indisciplina. Alec deu-lhe um sorriso
suave. Se ele soubesse.
Ele subiu os degraus, forçando-se a ignorar Caroline. Ele se
curvou para Sophie e beijou sua mão.
— Bem-vinda a Glenlorne, minha senhora. Por favor, venha para
dentro, — disse ele, surpreso com a grosseria de seu tom. Ele pegou o braço
de Sophie e a levou para dentro, passando por Caroline Forrester sem um
único olhar. A fraca fragrância do perfume dela, era quase sua ruína. Ela
cheirava como ele se lembrava, como as flores de verão e algo indefinível
que fez o desejo correr em suas veias, novamente.
— Alec, por que você não nos disse? — Megan exigiu, pegando
seu outro braço. — Eu sou Megan, — ela disse em um inglês primoroso. —
A irmã de Alec. Bem, meia-irmã. E estas são Alanna e Sorcha. — As irmãs
mais novas fizeram reverências perfeitas.
— Seu chapéu é divino, minha senhora! — Sorcha soltou, e
Sophie sorriu docemente e começou a tagarelar sobre chapéus e penas e as
últimas modas londrinas. Alec podia sentir a presença de Caroline Forrester
atrás dele. Ela ficou nua em seus braços, fez amor com ele, adormeceu com
ele.
— Vá buscar Devorguilla, — ele sussurrou para Megan, e ela
balançou a cabeça.
— Ela quer ser Devina, Alec, — a irmã dele disse sobriamente.
— Nome especialmente inglês. Ela provavelmente nem está acordada a esta
hora, é muito cedo. Vou mandar Alanna para dizer a ela que temos
convidados.
— E como devemos chamar Muira? — Ele perguntou.
— Apenas Muira, — respondeu Megan. — Eu suponho que nós
vamos querer, — ela olhou em volta, — chá, ou uísque, talvez? Você parece
um pouco pálido esta manhã, Alec.
— Chá, — disse Alec com firmeza. — E é melhor você prepará-
lo para Sophie e o Sr. Parfitt.
— Eu vou fazer isso, — disse Caroline, sua voz rouca vibrando
por causa de seu nervosismo, fortemente tensa. Ela saiu correndo e ele a
observou, resistindo à vontade de segui-la e exigir uma explicação. Havia
uma explicação além do fato de que era o Solstício de Verão e ele havia
sido um tolo? Ele estava tão certo, e fora tão estúpido, que ele não pediu o
nome dela. Ele apenas presumiu que ela era Sophie. E agora? Uma gota de
suor rolou de suas costas.
— Que quarto charmoso! — Sophie disse ao entrar no corredor.
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— Com alguns metros a mais de chintz e talvez, cortinas amarelas, e um
pouco de gesso e pintura, bem... talvez um monte de gesso e pintura e
alguns móveis novos no estilo de Carlton House, poderia ser um espaço
bastante agradável, de fato.
Alec segurou a língua, mas ele e todos os outros olharam em
volta, e ele viu as falhas da casa de sua família, pela primeira vez. As
paredes de pedra estavam cobertas de tapeçarias gastas e mais das armas
enferrujadas que haviam sido mantidas escondidas, por quase setenta anos,
o que Muira agora julgava adequado exibir. A mobília era espartana e
desbotada. Sophie tirou o chapéu e colocou-o numa mesa, e o pássaro
amarelo fitou as paredes frias de pedra de bico aberto, horrorizado.
Sophie franzia o nariz delicado por causa de um travesseiro que
Megan havia bordado quando ela estava com apenas nove anos e as
bochechas da irmã arderam. Sophie Ellison era ainda mais estranha do que
ele temia. Ele sentiu uma atração instantânea quando viu Caroline na torre.
Ele olhou para Sophie, novamente, e não sentiu nada. No entanto, ela traria
sessenta mil libras para Glenlorne.
Mesmo assim, a união parecia, mais uma vez, uma perspectiva
triste, mesmo que ele estivesse disposto, até mesmo ansioso, para se casar
com ela quando achava que ela era Caroline, ou Caroline era Sophie. Ele
esfregou a testa, confuso. Ele ainda se casaria com ela? Ele devia. Havia
alguma escolha? E Glenlorne seria pintado e reformado e suas irmãs, e
todos, aprenderiam a falar inglês, perfeitamente. Haveria carruagens
elegantes e cavalos para elas montarem, um cãozinho para Megan, um
esquilo para Sorcha, e uma pomba, talvez, para Alanna.
— Talvez pudéssemos ter uma palavra sobre os arranjos, meu
senhor? — Sugeriu Parfitt. — Lorde Bray estava muito ansioso para ver
tudo resolvido.
— Poderia esperar até depois do café da manhã? — Sophie
insistiu. — Estou morrendo de fome. Existe alguma comida inglesa no
lugar? Não importa, eu insisti que trouxéssemos provisões adequadas para o
caso de não ter. E, também, um cozinheiro.
— Temos uma cozinheira, — disse Alanna com cuidado, seu
sorriso desaparecendo.
Sophie riu, o som como água doce fluindo em uma taça de cristal,
em um dia quente.
— Não um inglês, eu garanto.
— Garanto? — Repetiu Alanna, passando a língua pela palavra
inglesa desconhecida.
Sophie balbuciava como uma corrente em uma maré cheia,
levando a conversa inteira sozinha, comparando as virtudes do papel de
parede francês com o gesso inglês, usando muitas palavras que as meninas
não reconheceram, e sem qualquer indicação de se importar com os olhares
de perplexidade que eram trocados entre elas. Suas irmãs lançaram alguns
olhares questionadores para Alec também, como se perguntando como e
onde ele encontrara Lady Sophie Ellison, e se era tarde demais para mandá-
la de volta. Era. Alec olhou à porta, esperando que Lady Caroline entrasse
por ela. Se ela fizesse isso, ele se levantaria de seu assento e atravessaria a
sala. Então ele a pegaria em seus braços e a estrangularia.
Devorguilla-Devina desceu vestida como uma dama inglesa em
um elegante vestido de manhã. Sua roupa, seu cabelo, até seus sapatos
teriam se encaixado bem na cara decoração inglesa que Sophie estava
sugerindo.
A condessa cumprimentou seus convidados inesperados como se
ela hospedasse nobres ingleses em sua casa, o tempo todo. Ela acenou com
uma mão graciosa para indicar que Muira poderia servir o chá. Muira
revirou os olhos.
— Mamãe, esta é Lady Sophie. Alec vai se casar com ela, —
disse Megan.
Muira teria deixado a delicada xícara de chá cair de sua mão se
Alec não esticasse o braço e a pegasse.
— Verdade? — Ela sussurrou em gaélico, olhando para ele. —
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Uma condessa sassenach ? — Ela fez um sinal sutil de proteção contra o
mal.
Os olhos de Devina se arregalaram, e ela olhou com mais cuidado
para Sophie, deslizando os olhos sobre o vestido e as joias da dama,
avaliando seu valor. Sophie se mexeu sob seu olhar quente.
— Caroline vai se juntar a nós para o chá? — Perguntou Sophie.
— Caroline? — Devina falou, tentando se recuperar de sua
surpresa. — Quem é Caroline?
— Ora, Lady Caroline Forrester. Foi um prazer encontrá-la aqui.
Eu sou uma querida amiga da sobrinha dela, Lottie. Nós temos muito o que
conversar!
A testa de Devina franziu.
— Sua senhorita Forrester, eu acredito, — disse Alec.
Os olhos de Devina saltaram de novo.
— Minha senhorita Forrester? A governanta das meninas?
— Sim, ela é a irmã do conde Somerson. — Alec alfinetou-a com
um olhar e observou a garganta de Devina engolir.
— Bem, sua meia-irmã, na verdade, — disse Sophie. — O pai
dele se casou com uma segunda esposa, com menos da metade de sua idade
e Caroline nasceu. Foi um terrível escândalo cerca de vinte anos atrás.
Lottie me contou sobre isso.
— Somerson? Aquele com todo aquele dinheiro? — Devina
guinchou.
Sophie inclinou a cabeça, os olhos arregalados.
— Sim, é ele, embora meu pai seja ainda mais rico.
Devina fez outro som de surpresa estrangulada.
Megan olhou para a mãe preocupada.
— Você quer um pouco de chá, mamãe? — Mas Devina estava
olhando para Alec.
— Você vai se casar? — Ela apontou discretamente para Sophie.
— Sim, de fato. Estou aqui para realizar a cerimônia, — disse
Parfitt com firmeza.
— Se Lorde Glenlorne propuser, formalmente, é claro, — disse
Sophie, e deu um sorriso tímido.
Alec observava Devorguilla-Devina, avaliando o valor de Sophie
novamente, olhando o pingente de diamante do colar, o chapéu elegante, o
corte de suas roupas, as requintadas pérolas, as esmeraldas dos brincos. Seu
sorriso se esticou até quase chegar aos ouvidos de ambos os lados.
— Diga-me, Lady Sophie, você tem algum irmão solteiro por
acaso?
Sophie deu uma risadinha.
— Oh! Não. Eu sou filha única. O título de meu pai será herdado
por um primo.
Devina bateu os cílios.
— Um primo solteiro?
Sophie riu em voz alta e colocou a mão sobre a boca.
— O querido velho primo Kenneth está perto dos cinquenta anos
e em sua terceira esposa. Sua única filha tem apenas três anos de idade.
Você está querendo se casar, condessa?
Devina considerou.
— Eu quis dizer minhas filhas, mas talvez...
— Bem, quando Glenlorne e eu nos casarmos — se nos casarmos
— eu pessoalmente verei para que suas amáveis meninas tenham a melhor
apresentação na sociedade, e garantirei, que elas circulem nos mais altos
círculos sociais.
Os olhos de Devina brilharam.
Alec sentiu todos os olhos no quarto pousando nele. Elas
esperavam que ele caísse de joelhos agora, ali, no meio do corredor? Ele
não poderia. Ele manteve sua expressão, sem graça.
— Tenho certeza de que Lady Sophie adoraria a chance de ver o
quarto dela depois que o café da manhã acabar, e talvez um passeio pelo
castelo depois. Megan, você faria as honras? — Ele se levantou do banco e
fez uma reverência à estranha com a qual ele deveria se casar. — Se você
me der licença, tenho coisas para ver que não podem esperar. — Ele deixou
Sophie e o reverendo Parfitt nas mãos capazes e ambiciosas de Devorguilla.
— Então esta é Sophie, — disse Angus, afastando-se para deixar
seu neto passar. Ele não se preocupava, é claro, mas estava cansado de ver
pessoas caminhando diretamente através dele. — Ela é uma moça bonita.
Você ouviu a parte sobre o pai dela ser rico?
Georgiana fungou.
— Ela não é tão bonita quanto Caroline. Ela é apenas bonita
porque suas roupas e joias são caras. Seus olhos se projetam e seus dentes
são grandes demais.
— Ainda assim, o que mais um homem precisa? — Angus
argumentou, seus olhos em Sophie, enquanto ela bebia seu chá,
delicadamente. — Ela obviamente tem dinheiro, você viu a carruagem e os
animais puxando-a?
— Você viu aquele chapéu? — Georgiana retrucou.
Angus olhou para ele e estremeceu, tocou a mão no próprio boné
de penas.
— Ach, o que isso importa? Ela é rica. Alec pode construir novas
casas, talvez, uma escola.
Georgiana colocou as mãos nos quadris.
— Não te incomoda que ela queira transformar Glenlorne em um
castelo adequadamente inglês, na mesma imagem que a casa do pai dela, ou
de Somerson?
Isso chamou a atenção de Angus.
— O quê? Ela não faria isso!
— O que você acha que é chintz, meu amor? — Perguntou
Georgiana.
Ele não fazia ideia, mas estava relutante em admitir sua
ignorância.
— Alec não permitiria chintz.
— Com Devorguilla do lado dela? — Georgiana sorriu. — Olhe
para ela. Se Lady Sophie Ellison quisesse derrubar o castelo inteiro e
reconstruí-lo como uma mansão palaciana, Alec e um exército de membros
do clã seriam impotentes para impedir que isso acontecesse.
— Você é maluca, mulher!
— Tem certeza que eu sou? Olhe! — Ela apontou para
Devorguilla, que agora estava em profunda conversa com o reverendo
Parfitt.
— Do que eles estão falando? — Perguntou Angus. Ele não
gostou do brilho nos olhos de Devorguilla. Ela era uma mulher ardilosa e
ele reconhecia os problemas quando os via.
— Sessenta mil! — O grito de Devorguilla tocou nas vigas.
— O dote, Angus. Eles estão falando sobre o dote.

Capítulo 22

Caroline andava de um lado para o outro no quarto dela. Suas


mãos tremiam. Ela fez uma pausa e emitiu um som de raiva.
— Sua noiva! — Alec MacNabb sabia que ele estava prometido
— e para Lady Sophie Ellison entre todas as mulheres da Terra, e ele se
atreveu a brincar com outra mulher? Não apenas outra mulher, com ela!
Ela havia sido tola, mas o que ela esperava, que ele se casaria
com ela depois de uma queda apressada no escuro? Não, ela nunca esperara
isso, nem por um momento. Seu rosto se aqueceu com a mentira. Ela
passou a vida sonhando com o amor verdadeiro. Ela estava completamente
convencida agora, se ela não tivesse prova suficiente antes, que não existia
tal coisa — e, que ela ainda era uma tola.
E agora? Sophie Ellison era uma das amigas mais íntimas de
Lottie, e ela era uma fofoqueira terrível. Certamente a primeira coisa que
Sophie faria depois que reorganizasse os móveis de seu quarto, mudasse seu
vestido, e seu cabelo fosse refeito por uma das três criadas que ela trouxe
com ela, seria sentar e escrever para Lottie. Lottie escreveria à mãe, que
acordaria gritando, depois de desmaiar de horror, diante da notícia de que
Caroline era governanta na Escócia e, depois informaria Somerson.
E então? Seu irmão viria e a arrastaria até a bigorna mais
próxima, por que os conventos eram escassos, e ela estremeceu ao pensar
em quem poderia estar lá, esperando para pegar a mão dela em casamento
naquele momento. Ela colocou os braços ao redor de seu corpo para
acalmar o tremor de desgosto. Ela faria melhor se saísse agora, subisse a
torre decaída e pulasse do topo. Ela gemeu, suas bochechas estavam
flamejantes.
Maldito Alec MacNabb! Ele estava na porta de seu castelo, esta
manhã, calmamente esperando para cumprimentar sua noiva, sua expressão
fechada, indecifrável, como se ele não tivesse nada a ver com o que
acontecera!
Ele se curvou para Sophie, pegou-a pelo braço e a levou para
dentro de casa, como um noivo.
E ainda assim, horas antes, ele a levara para sua torre como um
pirata, e — não, ela não podia acusá-lo de nada, além de aceitar o que fora
oferecido gratuitamente. Oh! Como ela seria capaz de enfrentá-lo,
novamente? Ou Sophie, ou qualquer outra pessoa que ela conhecesse? Ele
devia pensar que ela era uma tola, devia estar horrorizado ao pensar que tal
criatura devassa fosse governanta de suas inocentes e jovens irmãs!
Ela foi até a janela e olhou à estrada poeirenta que passava pela
torre antiga. Ela seria demitida, é claro. Ela não podia esperar uma
referência da condessa. O que ela faria, então? Ela poderia ir para
Edimburgo ou Glasgow, talvez. Ou ela poderia ir para casa, ter o perdão de
seu irmão, ela deveria ter feito isso, em primeiro lugar. Ela foi criada para
ser recatada, elegante e obediente. O que diabos aconteceu com seu bom
senso? Alec MacNabb, foi o que aconteceu. Ela suspirou.
Parecia que a maldição que havia sobre ela havia se tornado ainda
mais sombria. Era muito pior assim, ter provado a paixão, acordar e ver que
ela estava destinada a viver uma vida seca e sem amor.
Ela se virou quando a porta se abriu.
Alec MacNabb ficou ali, olhando para ela, com raiva. Seu
coração deu uma cambalhota em seu peito e bateu a galope. Ele era
absolutamente aterrorizante, enfurecido e lindo. Seus lábios formigaram.
Tudo formigou.
— Escondida, lady?
O uso sarcástico de seu título a irritou.
— Você não bate antes de entrar no quarto de uma dama? — Ela
exigiu em tom gelado.
Ele jogou a cabeça para trás e riu, então chutou a porta e
caminhou mais para dentro do quarto.
— Acho que nos conhecemos bem o suficiente para dispensar
formalidades educadas como bater, não é? — Ele puxou a borda de seu
lenço para revelar uma pequena marca vermelha em sua garganta. — Eu
descobri isso esta manhã.
Caroline sentiu o calor no rosto.
— Eu não quis ferir você, meu senhor.
— Não doeu nem um pouco.
— Eu não costumo fazer, eu nunca fiz — ela balbuciou. — Você-
você sabia que você estava prometido, e você ainda... Oh! Como você é
desprezível!
Ele levantou o queixo.
— Em minha defesa, pensei que você fosse Sophie.
Ela cruzou os braços sobre o peito.
— Não estava tão escuro!
Ele ficou vermelho.
— Eu nunca a conheci! Eu só sabia que ela estava vindo à
Escócia, então poderíamos discutir a possibilidade de nos casar. — Ele
passou a mão pelo cabelo. — Olhe, você estava na torre e era inglesa.
Quantas damas inglesas poderiam estar aqui nas Highlands, minhas
Highlands, ao mesmo tempo? Foi uma suposição natural a fazer.
Ela sentiu o sangue drenar de seus membros.
— É por isso que você me propôs, eu suponho.
— Propus? Eu não fiz tal coisa. Eu posso ter dito muitas coisas no
calor da paixão na noite passada, mas tenho certeza que não propus a você!
Ela balançou a cabeça.
— Não, na torre, no dia em que você chegou. Você disse que a
capela estava pronta para a cerimônia de casamento. — Ela levantou a mão
quando ele começou a objetar. — Não há necessidade de se preocupar —
pensei que fosse algum tipo de brincadeira de verão, para propor a primeira
moça que você visse, ou algo do tipo. As garotas e eu estávamos
conversando sobre as celebrações do solstício de verão.
— Eu pensei que você fosse Sophie. Eu pensei que tinha... — Sua
voz sumiu.
— Pensou que tinha o quê? — Ela exigiu.
— Que eu tinha o direito de... Eu decidi me casar com você, por
causa de Glenlorne. Eu nem estava certo de que me casaria com ela, até
conhecer você.
— Ela, — Caroline corrigiu.
— Você, — ele disse. — Sophie tem dinheiro e posição, e eu
preciso dos dois para o meu povo, esta maldita pilha de pedras em ruínas, e
minhas irmãs. Elas merecem um futuro. O que eu não preciso é de mais
problemas. O que exatamente você pretende fazer?
Caroline olhou para ele.
— Eu? Você realmente imaginou que eu o forçaria a se casar
comigo?
Ela começou a rir. Ela não conseguiu evitar. Se ele soubesse a
verdade, ela viera até os confins da terra para evitar o casamento.
— Eu sou a governanta de suas irmãs! — Ela disse finalmente.
Ele se inclinou contra a mesa e cruzou os braços sobre o peito, as
longas pernas esticadas diante dele.
— Isso é outra coisa. Você realmente espera que eu acredite que o
conde Somerson permitiu que você assumisse um cargo de governanta? —
Perguntou. — Se não for para casamento, isso é algum tipo de aventura, um
escândalo familiar? De alguma forma eu tropecei no meio de tudo isso?
Ela baixou os olhos, toda a alegria desaparecendo.
Ele lançou um xingamento agudo e deu um passo na direção dela.
Ela se moveu para o outro lado da cama, para evitá-lo, e ele ficou olhando
para ela do outro lado da cama estreita. A fragrância do perfume dela subiu
em torno dele.
— Não me diga, ele nem sabe que você está aqui, não é?
Ela levantou o queixo.
— Eu sou uma mulher independente.
Ele estreitou os olhos em descrença.
— Ah! Mas Somerson concorda?
As bochechas dela se encheram de calor.
— Claro. Eu tenho vinte e três anos de idade. — Era uma
mentira. Faltavam três semanas até seu vigésimo terceiro aniversário, e
Somerson ainda era seu guardião em todos os aspectos.
Ele deu a volta na cama e ela recuou de novo, bem contra a cama.
Ele ficou de pé diante dela e colocou o dedo sob seu queixo.
— Você fugiu, — disse ele.
Ela virou a cabeça. Sua proximidade fez com que ela sentisse
água na boca de vontade de beijá-lo, suas mãos coçaram para tocá-lo.
— Eu escolhi sair.
Ele baixou os olhos para olhar para sua boca, e por um momento
ela pensou que ele a beijaria, mas deu passo para trás, e começou a andar
pela sala.
— Eu vou casar com Sophie Ellison, — ele disse ferozmente, e
ela olhou para ele. — Você entendeu?
Ela enrolou os dedos nas dobras da saia e assentiu. Ele parou e
olhou para ela, seus olhos brilhando de fúria.
— Por acaso você tem sessenta mil libras? — Ele perguntou.
Seu queixo caiu.
— Sessenta mil libras? — Ela repetiu. Ela possuía um dote
respeitável, mas não tanto assim. Ela supunha que Somerson poderia
simplesmente se recusar a pagá-lo se ela não se casasse ou se se casasse
aonde ele não queria. — Não, — ela disse simplesmente.
Ele começou a andar pela sala.
— Você já foi até a aldeia? Glenlorne precisa de dinheiro. Cada
casa de campo precisa de reparos. Inferno, elas deveriam ter sido demolidas
anos atrás, e novas construídas. Algumas delas são mais velhas que aquela
maldita torre! — Ele apontou à janela e os dois olharam na direção do local
do encontro. Ela sentiu o sangue encher suas bochechas. Isso era um pedido
de desculpas?
— Olha, eu não sou o tipo de homem que o Conde Somerson
consideraria para sua irmã. Apesar do que aconteceu entre nós, ele nunca
me veria como um marido para você. Você entende isso?
Ela não entendia. Se ele soubesse o tipo de homem com que
Somerson queria que ela se casasse... e se o Conde de Bray achava Alec
digno o suficiente para casar com sua única filha, então... Ainda assim, ela
assentiu. Ele não a queria, estava procurando uma desculpa. Suas bochechas
queimaram. Ela não o forçaria a fazer a coisa cavalheiresca, especialmente
porque estava tão claro que ele não queria se casar com ela.
Ele estava olhando para ela novamente, seus olhos vagando por
ela. Ela sentiu o calor subir sob o seu vestido. Foi difícil respirar, difícil
pensar.
— Isso é impossível, — ele murmurou.
— Você está me despedindo?
— Não! — Ele disse, então pensou. — Sim. Talvez fosse o
melhor. — Ela sentiu seu estômago se grudar em sua espinha. — Você
deveria ir para casa, de volta aonde você pertence.
— Eu... — ela começou, mas houve uma batida na porta. Ela
congelou, parecia em pânico. Se ele fosse pego aqui em seu quarto,
sozinho, seu destino seria selado; ela sabia disso. Quão afortunado ele foi
por não ser pego em seus braços, ambos nus, na noite anterior. Ele deve
estar muito aliviado, de fato. Ela apontou para a tela no canto, e viu como
ele passou por trás dela.
Ela abriu a porta para Muira.
— O Laird está aqui? — Ela perguntou, os olhos bisbilhotando
em todos os cantos visíveis.
— Claro que não! — Disse Caroline, sentindo o calor da pele. —
Por que você acha que ele estaria?
Muira sorriu, mas acenou com a mão.
— Och, apenas uma velha loucura de verão. Mais dois
convidados acabaram de chegar à porta, mais ingleses da mesma idade,
desta vez, insistindo que vieram resgatar Lady Sophie. Então eu pensei que
talvez por causa do meu mau domínio da língua, você poderia ser capaz de
ajudar, já que eu não posso encontrar Alec. A jovem está na sala azul,
desembalando, ou, pelo menos, observando suas empregadas fazerem isso
por ela. Ela tem uma dúzia de baús, um cheio de enfeites e tapeçarias e
novas cortinas para o dossel, como se as nossas não fossem boas o
suficiente.
— Esses cavalheiros ingleses deram seus nomes? — Caroline
perguntou, cruzando para arrumar o cabelo no espelho. Alec ficou atrás da
tela à sua esquerda, mas ela estava evitando olhar para lá enquanto Muira
estava assistindo. Ela podia sentir o calor dos olhos dele nela.
— Acredito que um deles disse que seu nome é Mamble. O outro
é um visconde chamado Speed.
Caroline deixou cair o pente, seus dedos de repente entorpecidos.
— Mandeville e Speed? Um com cabelos ruivos, o outro largo
como um barril?
Muira sorriu.
— Sim, os mesmos! Você os conhece?
Caroline sentiu seu peito desmoronar. Ela correu para a porta.
— Infelizmente, sim, e eles não estão aqui por causa de Sophie.
— Ela deslizou em torno de Muira e correu pelo corredor. Como diabos
seus pretendentes a encontraram aqui na Escócia? Somerson possuía braços
longos e um forte olfato. Sem dúvida, ele os colocara em seu rastro,
armados de mandados, cartas e licenças de casamento. Ela se casaria e se
deitaria antes que alguém em Glenlorne entendesse o que estava
acontecendo. Ela parou no topo da escada. Ela podia ouvi-los no corredor
abaixo, falando em voz alta, sobre cutelos, pistolas e espadas.
Aparentemente, eles estavam armados até os dentes.
Ela fechou os olhos. Ela precisaria mandá-los embora.
E se eles não fossem?
Ela olhou para a exibição de armas antigas que agora adornavam
a parede. Ela não podia entrar na sala levando uma lança e duvidava que
pudesse erguer um dos escudos de barro. Um par de ganchos segurava facas
longas e finas, protegidas por um escudo, seus cabos cravejados de pedras
preciosas, se os buracos vazios fossem alguma indicação, as pedras já
teriam ido, há muito tempo. Ela tirou uma e pesou na mão dela. Ela poderia
realmente? Ela considerou a alternativa, e enfiou o punhal em sua manga.
Ela respirou fundo e foi cumprimentar seus pretendentes.

Capítulo 23
A primeira coisa que ela viu foi as armas, eles as tiraram e as
colocaram na mesa, ao lado de suas mãos, como se estivessem prontos para
lutar — se algum dia terminassem as canecas de uísque. Ela tocou o punhal
para se acalmar um pouco e respirou fundo.
— Bom dia, meus senhores, — ela disse quando eles não notaram
sua entrada na sala. Ela ficou a uma distância segura quando eles saltaram,
pegando suas armas.
Eles não se apressaram em direção a ela. Eles ficaram
boquiabertos de longe, como se estivessem vendo um fantasma.
— Lady Caroline! — Gritou o Visconde Speed. As papadas
pesadas de Mandeville se agitaram quando ele se esforçou para falar e
falhou. Fungou, ficou vermelho e se atrapalhou com o lenço. Ele segurou o
quadrado de renda no nariz, olhando para ela por cima dele, seus olhos
cheios de horror, não paixão, nem mesmo triunfo.
— Posso perguntar se você está recuperada, lady? — Ele
perguntou, a questão saindo meio sussurrada por trás do lenço. Speed
espreitou por trás do volume protetor de seu companheiro.
— Recuperada? — Ela perguntou.
— A condessa Charlotte nos informou algumas semanas depois
que você havia passado mal, e se retirou do país para recuperar sua saúde,
— respondeu Speed.
— Nós pensamos que ela se referia à propriedade rural de
Somerson, não outro país realmente! — Acrescentou Mandeville.
— Houve alguma especulação sobre a natureza da sua doença, —
disse Speed. — Nos foi dado motivo para acreditar que era a praga. É peste,
lady?
Somerson explicou seu desaparecimento dizendo que ela estava
com a praga? Ela quase riu, mas Speed parecia triste.
— Faz algumas semanas que recebemos notícias sobre sua
condição. Nós presumimos que você fosse... — Mandeville lhe deu uma
cotovelada forte o suficiente para derrubá-lo na cadeira da qual ele havia
levantado recentemente.
— Temíamos que você estivesse perdida para sempre, digamos
assim, — disse Mandeville, abaixando um pouco o lenço.
— Sim, nós temíamos que você estivesse morta, especialmente
quando Lady Lottie cancelou seu casamento tão de repente, — disse Speed,
voltando a se levantar.
— Como você pode ver, eu estou longe de morrer, senhores, —
disse Caroline.
— De fato, estamos realmente felizes que o ar escocês, úmido e
insalubre, tenha sido gentil com você, — terminou Mandeville, mas não se
aproximou dela, nem guardou o lenço.
Ela deu um passo na direção deles e eles recuaram.
— Ainda assim, receio que sua jornada tenha sido em vão
Speed colocou a mão em seu coração.
— O casamento já aconteceu? Nós estamos apenas um dia
atrasados!
— Eu garanto a você que eu não...— Caroline começou, mas
Mandeville pegou sua espada.
— Onde está o guardião negro de Glenlorne? Juro que farei Lady
Sophie viúva e então, casarei com ela.
— Sophie? — Exclamou Caroline. — Você veio para se casar
com Sophie?
— Eu sei que ela deve estar aqui, — disse Speed. — Vimos a
carruagem de Lorde Bray. Eu reconheço os cavalos dele em qualquer lugar!
Melhor do que em Londres!
— Escócia, — lembrou Mandeville.
— Em qualquer lugar! — Speed respondeu, levantando o dedo no
ar para dar ênfase. A pele solta sob o queixo balançava como o papo de um
galo.
— Onde está a bela dama Sophie? Juro que posso sentir seu
perfume nesta sala, isto é, tenho certeza de que seria capaz de sentir o
cheiro dela se conhecesse o perfume dela!
— Você está aqui para se casar com Sophie? — Caroline
perguntou de novo, desnorteada. — Lady Sophie Ellison?
Apressou-se em se levantar.
— Perdoe-me, lady. Eu entendo seu desânimo, mas devemos
retirar nossa oferta pela sua mão. Eu sou o último da minha linhagem, não
posso me arriscar com uma noiva que teve a praga tão recentemente,
mesmo que você pareça recuperada. Você pode ter tido uma recuperação
falsa. — Ele suspirou e colocou a mão ossuda sobre seu coração. — Lady
Sophie estava na flor da saúde na última vez que eu a vi.
Mandeville olhou para o amigo ferozmente.
— Eu vou me casar com Lady Sophie, mesmo se for a última
coisa que eu faça! — Speed olhou para trás.
— Então não é por mim. — Caroline fez uma pausa. Ela sorriu.
— Vocês não estão aqui para...?
— Boa tarde, senhores. — Alec desceu as escadas atrás dela.
— Ora é Alec MacNabb! — Disse Mandeville, sorrindo. — Que
estranho encontrar você aqui, também. Eu não sabia que você havia saído
de Londres. Diga-me que você não está em busca de Lady Sophie também,
tememos que o lorde negro deste castelo já tenha se casado com ela!
Alec levantou uma sobrancelha e olhou para Caroline, mas ela
estava tão confusa quanto ele.
Speed pegou sua espada e brandiu-a.
— Eu juro que eu vou executar este imprudente conde escocês e
reivindicar a dama de volta à Inglaterra! — O visconde disse. — Onde está
Glenlorne? Simplesmente aponte sua direção! — Mandeville pegou sua
espada também.
Alec abriu a boca, mas Caroline apontou para longe de Alec, para
fora da janela, sobre as colinas.
— Não Glenlorne. Ele está em... Glenlyon Inn. É apenas uma
dúzia de quilômetros de distância.
— Em Glenlyon? — Disse Speed, balançando o olhar para o
horizonte.
Alec ficou em silêncio, observando-a divertido.
Mandeville brandiu sua espada na direção que Caroline apontou.
— Então nós vamos para Glenlyon Inn, e vamos arrastar a bela
dama Sophie de sua cama, se precisarmos, e o mataremos se o casamento já
tiver sido...
— Senhores, há uma dama presente, — disse Alec.
Ambos se curvaram, parecendo contritos, colocando suas espadas
atrás das costas.
— Claro, seu perdão, Lady Caroline, — disse Speed. — Eu não
consigo parar de pensar em você como... falecida.
Mandeville fez uma reverência e caminhou em direção à porta.
— Por favor, desculpe-nos, precisamos sair e resgatar nossa
noiva, — disse Mandeville, passando cuidadosamente por Caroline até a
porta. — Foi muito agradável ver você tão saudável, Lady. MacNabb, fique
atento com aquele Glenlorne.
Alec observou-os ir e se virou para ela.
— Eu posso explicar-— Caroline começou, mas ela parecia
hesitante.
— Como dois senhores, três, na verdade, querem se casar com a
mesma mulher?
— Bem, não, eu não posso explicar isso, — disse ela. — Eles
deveriam se casar comigo, — Caroline murmurou, e tirou o punhal da
manga. Ela colocou sobre a mesa. Alec olhou para a arma.
— Os dois?
— Qualquer um que eu escolhesse, — disse ela. Ela quase riu. —
Mas isso não importa agora.
— Estou vendo. — Ele cruzou para o lado e pegou o punhal,
examinando os lugares onde as gemas haviam sido arrancadas. Sua boca se
apertou. — Eu acredito que a possibilidade de se casar com um deles é o
motivo pelo qual você veio até a Escócia e assumiu o cargo de governanta?
Ele estava tão perto que Caroline podia sentir o cheiro de sua
pele, sentir o calor de seu corpo ao lado do dela. Ela baixou os olhos.
— Qual deles você escolheria? — Ele perguntou suavemente, e
ela estremeceu, imaginando os dedos ossudos de Speed em sua carne, ou o
peso de Mandeville sobre ela, na cama. Ela tentou abafar sua repulsa, mas
ele riu suavemente.
— Então agora nós temos a verdade, suponho. Você fugiu.
Aparentemente você foi esquecida, e Sophie é o novo prêmio.
Caroline sentiu uma onda de raiva. Ele achava que ela não era boa
o suficiente para Speed ou Mandeville? Ou para ele?
— Parece que você não é o único que deseja se casar com uma
fortuna, meu senhor, — disse ela bruscamente. — Não importa o que a
Sophie quer, ou se ela é feliz? Você tem mais consideração por ela do que
Speed ou Mandeville, ou é apenas seu enorme dote que importa? Suponho
que uma fortuna tão grande quanto a de Lorde Bray faz um curto caminho
para tornar uma moça adorável.
As bochechas dele coraram com o insulto, mas seus olhos
endureceram.
— Ciumenta?
Ela olhou para as pontas dos dedos. Ela fechou os olhos, sentiu a
saída aguda e repentina de lágrimas enquanto imaginava Alec nos braços de
Sophie, fazendo o que ele havia feito com ela, na torre, fazendo-a se sentir
amada e adorável pela primeira vez. Era quase insuportável.
— Claro que não.
— Você não é uma governanta, Caroline, — disse ele.
Ela endureceu. Então o que ela era? Nada para ninguém.
— Eu imploro para ficar, — disse ela.
— Você poderia ter se casado com um desses cavalheiros, mas
você fugiu. Você ama outra pessoa? — Ele perguntou.
Ela se arrepiou.
— Você imagina que uma noite com você, e eu estou... — Ela
fechou os lábios na admissão.
Ele colocou a mão sob o queixo dela, ergueu os olhos para os
dele, a poucos centímetros de distância.
— Você está o quê? — Sua voz era rouca, suave, potente por
causa do uísque.
Ela se afastou.
— Apaixonada! Eu não estou, asseguro-lhe. Foi-me dada uma
escolha, e tomei a minha decisão no assunto. Eu sou, meu senhor, de fato
uma governanta, essa foi a minha escolha.
Ele gemeu.
— E a minha escolha? — Ele disse, e ela se perguntou o que ele
queria dizer. — Você não pode ficar aqui, Caroline.
Caroline cruzou os braços sobre o peito.
— Por que não? Eu não estou cumprindo meus deveres
satisfatoriamente?
— Não é isso, é... — Seus olhos se moveram sobre ela como uma
carícia, e ela leu o desejo neles, e frustração. — Vá para casa, Caroline, de
volta para Somerson. Encontre um homem com quem você possa se casar.
O peso de sua situação caiu sobre ela como um manto. Era tarde
demais para isso. Ela considerou suas opções e não viu nenhuma.
— Se você me der licença, eu tenho lições para ver. — Antes que
as lágrimas de frustração caíssem, ela fugiu.
Alec observou-a ir e bateu com o punho na sólida mesa de
carvalho. Outro erro — este bem pior do que deixar cair uma maldita carta.
Desta vez, foi pessoal. Ele havia envolvido Caroline, uma inocente — pelo
menos ela havia sido até que ele a desonrou. Ele duvidava até que
Mandeville ou Speed a teriam agora. Ou Somerson. Ele deveria fazer a
coisa certa e se casar com ela, mas isso seria outro erro. Ele a destinaria a
uma vida de pobreza ao seu lado, destruiria seu clã, suas irmãs. Ela
começaria a odiá-lo.
Ele fechou os olhos. Ele quase acreditou que poderia ser o Laird
de Glenlorne, que seria capaz de liderar o seu povo nos passos de seu avô,
trazê-los de volta da miséria e pobreza para a prosperidade se ele tivesse
Sophie-Caroline, ao seu lado. Mas ele não era um herói, nem um líder. Ele
era um tolo.
Caroline precisava ir embora, pelo bem dos dois. Se ela ficasse,
ele poderia imaginar a tentação de tocá-la novamente, fazer amor com ela.
Ele ficava duro como um poste só de pensar nisso.
E Sophie? Ele cumpria seu dever, faria o possível para ser um
bom marido e gastar o dinheiro com sabedoria, mas ela não disparava o
sangue dele igual a Caroline Forrester. Havia uma chance de que ele
pudesse fazer seu casamento funcionar se Caroline permanecesse em
Glenlorne?
Imaginou-se falando seus votos para Sophie, sabendo que
Caroline estava na capela, lembrando-se da noite na torre. E a noite de
núpcias dele, apagando a vela e subindo na cama do lorde, pensando em
Caroline, não em Sophie? Quanto tempo levaria o desejo para morrer?
Foi ao escritório, vendo-o pelos olhos de Sophie, um pequeno
quarto surrado e gasto, e atravessou a sala. Pegou uma folha de papel e
sentou-se para escrever uma carta.
Caroline Forrester devia ir embora.

Capítulo 24

Devorguilla observou Brodie MacNabb sobre a mesa de chá, em


sua sala de estar particular. Ele se curvava, desajeitadamente, em uma
cadeira lateral delicada, sua grande estrutura sobrecarregando-a, fazendo-a
ranger sob seus músculos. A delicada xícara de chá em sua mão carnuda
parecia igualmente fora de lugar, e ele fez barulho quando bebeu, olhando-a
com olhos azuis brilhantes e sem graça por cima da borda, e ela sorriu. Ele
era perfeito. Não como homem. Como um peão.
— Ela é a moça mais bonita que eu já vi, — disse ele com a boca
cheia de bolo.
— Megan? — Ela perguntou, embora soubesse que ele quis dizer
outra pessoa.
— Lady Sophie, — disse Brodie, cuspindo migalhas.
— Ela vai se casar com Alec. Ela será a nova condessa de
Glenlorne, — Devorguilla disse suavemente.
Ela viu a cor subir sobre a pele avermelhada de Brodie, viu o
ciúme estreitar seus olhos. Ele parecia um boi, sem cérebro e sem graça,
mas pronto para atacar. Ela pensara em casar ele com Megan, sacrificar a
filha para conseguir o que ela mesma queria. Brodie não possuía o bom
senso de administrar uma propriedade. Ele permitiria que Devorguilla
fizesse isso, colocaria seus direitos no nome dela, exatamente como ela
havia enganado o pai de Alec. Durante toda a sua vida, Devorguilla
controlara os homens usando sua beleza, a atração de seu corpo, mas agora
estava velha demais para tentar Brodie. No entanto, ela ainda possuía
ambição, inteligência e um desejo, que a consumia, de ser rica. Ela vivera
na pobreza por tempo suficiente. Por toda as Highlands, lordes, e ladies
também, estavam usando suas terras para enriquecer. Só era preciso
ousadia. Ela esperava que Alec estivesse morto, que sua chance havia
chegado. Mesmo assim, ela não ficou surpresa quando ele retornou.
Desapontada, sim, mas não surpresa. Significava simplesmente que seus
planos precisavam mudar. Ela não fazia ideia de como ele conseguiu
agarrar uma herdeira, como a filha de Bray, mas sabia que ela não veria um
centavo do dote da moça. Assim que os votos fossem proferidos ele
desperdiçaria os recursos para construir cabanas para as hordas de bocas
inúteis e famintas que habitavam o território MacNabb. Para ela, era bem
simples, porque comprar pão para os camponeses, quando você poderia
comprar uma fábrica de lã, e abrir espaço para ela botando fogo nos
casebres miseravelmente habitados, onde viviam quatro ou cinco em uma
cama, e constantemente nasciam mais, no minuto em que se casavam, e
mudando-se para a casa ao lado para criar ainda mais famintos?
Seria uma gentileza expulsá-los, fazê-los ir para outro lugar,
suplicar a alguém por seu sustento. Ela manteria algumas pessoas para
trabalhar na nova fábrica, cuidar dos novos rebanhos. Ela não era sem
coração. Eles poderiam dormir debaixo das máquinas ou nos celeiros. E ela
poderia ter a vida que merecia, comprar uma grande casa em Edimburgo, ou
mesmo na Inglaterra, e ter criados para cuidar de todos os seus caprichos. O
dote de Sophie Ellison seria um grande passo para que isso acontecesse,
mas apenas se não fosse para a tarefa inútil de restaurar o clã. O clã estava
quase terminado, quase morto.
Ela era uma mulher inteligente, mais inteligente do que a maioria
dos homens que ela conhecia. Ela administrara o marido por muitos anos e
se livrara dele quando ele deixara de cooperar, recusando-se a assinar mais
papéis que colocara diante dele quando estava bêbado.
Se Alec estivesse tão morto quanto seu pai, e Brodie fosse Laird,
ela poderia controlar tudo, mais uma vez. Um simples acidente era tudo o
que precisaria, e o clã chamaria por Lorde Brodie. Ouvir Alec sendo
chamado pelo título fez seus dentes doerem. Ele foi o único a avisar o pai
dele, sobre ela. A princípio, Dougal não acreditara nele. Ela disse a ele que
Alec estava mentindo, e o convenceu a mandar seu filho embora. Levou
algum tempo, mas Dougal finalmente entendeu o que ele fizera. Ele era
teimoso demais para trazer o filho de volta para casa, mas nunca mais
confiara em Devorguilla. Ela sofreu por seu erro, mas agora ela se
certificaria de que se livrou de Alec para sempre, e nunca sofreria
novamente.
— Pegue outro pedaço de bolo, — disse ela para Brodie. Ele
estendeu seu prato ansiosamente. — Agora, você gostaria de ser o Conde de
Glenlorne? — Ela perguntou.
Sua testa franziu.
— Mas Alec é o conde, — disse ele.
— Mas você ainda é seu herdeiro, até que ele tenha um filho com
Lady Sophie.
Ela observou Brodie imaginar o que aconteceria, viu-o se mexer,
os olhos escurecendo, o punho apertando a delicada xícara de chá. Ela a
pegou da mão dele antes que ele a quebrasse.
— Claro, se você fosse conde, você poderia se casar com ela.
Os olhos dele brilharam, mas o brilho desapareceu quando ele
balançou a cabeça.
— Meu pai me enviou para que Alec pudesse me ensinar algumas
coisas, — ele disse. — Eu não sei como governar um lugar como
Glenlorne.
Devorguilla sorriu.
— Eu governo, Brodie. Eu governo. Eu posso lhe ajudar, e se
você fosse conde, você poderia se casar com Sophie, também.
— Sim? — Os olhos dele se arregalaram como uma criança.
Perfeito.
Ela deu um tapinha no joelho dele.
— Sim.

Capítulo 25

— Lady Sofia, podemos falar em particular?


Alec a encontrara de pé, no terraço que percorria o comprimento
da parte de trás do castelo, olhando para o outro lado do lago. Ela se virou e
sorriu para ele, seus dentes brilhando ao sol. Seu cabelo loiro brilhava
também, Alec pensou. Seu vestido elegante parecia estar fora de lugar,
especialmente com uma gola de pele, um xale de cashmere e luvas forradas
de pele, no auge do verão. Ela parecia com frio, mas para ele o dia estava
quente.
— Claro, Lorde Glenlorne, — disse ela. — Eu estava apenas
olhando a propriedade. Este lago é um grande banhado, você não acha? Se
essa metade fosse preenchida, então haveria espaço para um jardim de
rosas, ou mesmo para um labirinto. Podemos considerar colocar uma ilha.
Isso tornaria a visão muito mais interessante.
Preencher o lago? Alec piscou. Ele havia seguido Sophie para
fora para formalmente propor a ela. Ele se cansara do Sr. Parfitt
perseguindo-o pelo castelo com uma caneta na mão e um contrato de
noivado formal na outra. Ele prometera ao homem que ele proporia hoje, e
assinaria onde o Sr. Parfitt indicasse.
Uma vez que ele propusesse, ele poderia esquecer Caroline e se
concentraria em planejar um futuro com Sophie. Ele sentiu uma pontada de
culpa. Se ele conhecesse Sophie em Londres, em um baile, ele
provavelmente nem pediria a ela para dançar, não consideraria se casar com
ela, apesar de sua fortuna. Mas não era Londres, era Glenlorne e sem o
dinheiro dela... Ele deixou seus olhos vagarem pelas colinas, pelo lago e
pela aldeia.
Lembrou-se da esperança e da alegria nos rostos dos membros do
clã que o receberam em casa. Eles pensaram que ele poderia arrumar tudo
novamente, fazer um milagre.
Olhou para Sophie, para o rosto insípido dela, para os olhos azuis
levemente salientes e esperava que eles estivessem certos. Desta vez, ele
não falharia, prometeu e se voltou para Sophie, com determinação, já que
não sentia mais nada. Talvez, com o tempo, eles conseguissem se amar —
ou pelo menos, gostar — um do outro.
— E a torre lá, na colina, é um pouco sombria, não é? — Sophie
simplesmente continuou discutindo a paisagem, mal notando que ele não
havia dito uma palavra, nem mesmo concordado. Ele percebeu que ela
apontava para a velha torre. — Deveria ter sido construída em um lugar
mais agradável, onde as senhoras pudessem passear e os cavalheiros
pudessem propor. — Ela cruzou as mãos no colo, com recato. — Tenho
certeza que Glenlorne oferece muitas vistas agradáveis para serem
apreciadas. Você vai me mostrar uma delas?
Alec olhou para as colinas, salpicadas com urze roxas e ovelhas
brancas, para as sombras das nuvens que se moviam ao longo do gramado,
perseguindo o vento que varria as longas encostas, na forma brilhante do
lago ao sol, profundo e escuro, carregado de segredos antigos. Ele respirou
fundo o ar fresco, e seu coração cantou, e se perguntou que visão seria
melhor que essa.
Ainda assim, ofereceu o braço e Sophie colocou a mão enluvada
na manga dele e partiram em direção ao lago. Talvez, olhar para o morro do
Castelo de Glenlorne, encostado à majestade dos picos das montanhas, a
agradasse.
— Que ladeira íngreme é essa! — Ela disse depois de um
momento, e Alec olhou de volta para a colina que eles haviam descido. Eles
não haviam descido mais de vinte passos do terraço. — É preciso colocar
7
degraus, algo em estilo palladiano , com um templo grego no meio do
caminho, para que se possa descansar e contemplar as melhorias que se
pode fazer, — continuou ela.
— Você quer se sentar aqui? Não é um templo grego, mas muitas
vezes encontrei um bom lugar para contemplação. — Ele indicou a grama
longa e macia da encosta.
Os olhos azuis dela se arregalaram quando ela olhou ao redor,
então ela riu.
— Como você é bobo, meu senhor! Não há banco!
— Eu pretendia me sentar na grama, — disse ele com um de seus
sorrisos mais charmosos, e percebeu que cometeu dois erros, de uma só vez.
Sophie parecia horrorizada.
— No gramado? Como a moça que ordenha o leite?
— Eu pensei que os ordenhadores se sentavam em banquetas, em
laticínios, — ele brincou, mas ela olhou para ele sem expressão. Ele tirou o
casaco e galantemente espalhou-o na grama para ela. — Isso vai servir?
Os lábios dela ondularam sobre seus longos dentes, mas ela
cautelosamente se sentou.
— Lady Sophie, eu... — ele começou, mas uma rajada de vento
arrancou as palavras de seus lábios. Ela gritou quando puxou selvagemente
seu chapéu. Ele ficou entre ela e a rajada, formando um quebra-vento com o
corpo dele. Sophie piscou para ele, parecendo indiferente.
— Você gosta de Glenlorne, Lady Sophie? — Ele perguntou.
— É bastante selvagem, não é? Existem lobos nas colinas? —
Seus olhos azuis claros percorreram a paisagem, e ele teve a forte impressão
de que ela não pertencia a esse lugar, igual a uma agulha no palheiro. Ele se
forçou a sorrir tranquilizadoramente.
— Lobos? Suponho que sim, alguns, talvez, mas muito longe.
Também há cervos e raposas e...
— Raposas? — Lady Sophie se animou. — Você viaja para uma
caçada aqui? Eu gosto de uma caçada!
— Er, não. Nós caçamos, principalmente, perdizes e veados aqui
em Glenlorne, — disse ele.
— Oh. — O suspiro foi preenchido com desapontamento.
— Há alguns passeios gloriosos nas colinas, — ele ofereceu.
Ela franziu os lábios e examinou uma marca invisível em sua
luva, mas não respondeu.
A proposta de casamento dele ficou presa em sua garganta. Ele
olhou para o outro lado da aldeia. Toda casa de campo que ele podia ver
precisava de um novo telhado. Muitas casas pareciam tortas, prontas para
desmoronar e cair no lago. Isso certamente ele precisava consertar.
Ele respirou e continuou.
— Minha senhora, eu suponho que você sabe porque seu pai lhe
pediu para vir até aqui.
O olhar de Sophie estava sério.
— Sim, é claro. Para ver se nos serviríamos. Papai parecia bem
certo de que iríamos.
Alec esperou que ela desse a sua opinião sobre o assunto, mas ela
simplesmente piscou contra o vento e esperou que ele continuasse. Ele se
perguntou se deveria se ajoelhar, mas parecia bobo fazer isso em uma
colina. Ele estaria ajoelhado, e se ele se movesse, desceria a colina. Ele
manteve os pés juntos e apertou as mãos atrás das costas. Então ele soltou-
as, e ajustou uma no quadril, e enganchou o outro polegar em seu relógio de
bolso, do jeito que ele vira senhores ingleses fazerem quando desejavam
mostrar olhar imponente, mas, ainda à vontade.
— Minha senhora, — ele começou, mas o vento reapareceu e
arrancou o relógio de suas mãos. Ele rolou pela encosta como um
cachorrinho fugitivo. Sophie gritou em consternação, e Alec correu atrás
dele, prendendo-o sob a bota antes que ele alcançasse o lago. Ele o segurou
como um troféu de caça e sorriu para ela. Ela franziu a testa para ele.
Ele subiu o morro contra a brisa forte, apenas para descobrir que
o vento sacudia as penas que adornavam o elegante chapéu de palha,
ameaçando roubá-las também, e arremessá-las para o céu, onde o resgate
seria impossível. Na opinião de Alec, o chapéu seria muito mais atraente
sem os embelezamentos extravagantes e coloridos.
— Você estava dizendo, meu senhor? — Ela perguntou, meio
gritando contra o vento. Que estranho, não estava ventando quando eles
saíram.
— Eu estava prestes a pedir… — Ele gritou, mas o xale foi
apanhado pela brisa como uma folha, e ficou emaranhado ao redor do rosto
dela, colando-se a sua face, delineando seu nariz, olhos e a boca aberta
como uma máscara, enrolando a franja longa nas fitas de seu gorro
enquanto ela tentava agir, seus gritos abafados. Alec lutou com ele, tentando
libertá-la do aperto do vento. Ele puxou o xale e o enfiou no bolso que ficou
batendo contra a perna dele, como a cauda de um gato furioso, encurralado,
mas longe de ser derrotado.
— Obrigada, meu senhor. Eu tenho muito medo da escuridão —
explicou Sophie, respirando com dificuldade.
— Você tem? — Perguntou Alec. Era muito escuro nas
Highlands. Você pode ver as estrelas daqui, contá-las, quase tocá-las. Ele
sentia falta disso em Londres. Ele amava as noites escuras e tranquilas
daqui. Ele se sacudiu, lembrando porque a trouxe para fora. Parecia que o
vento estava ficando mais violento a cada minuto. — Quero dizer... Lady
Sophie, você me faria a honra de...
Algo puxou com força suas pernas, enganchando-se em torno de
seus joelhos, e ele perdeu o equilíbrio na grama escorregadia. O vento
arrancou um xingamento de seus lábios enquanto ele descia a colina, de
cabeça para baixo e pousou duro sobre seu cóccix, uma grande pedra
irregular entre as pernas abertas, e ele percebeu com horror, que se não
tivesse parado quando ele o fez, certamente provaria ser uma decepção para
Lady Sophie na noite de núpcias.
Ele deitou na urze, por um momento, para recuperar o fôlego.
Estranho, quase parecia que alguém o puxara, mas não havia ninguém ali,
além dele e de Sophie. Ele ficou em pé novamente e subiu a colina para o
lado dela. Os olhos de Sophie se arregalaram ao vê-lo. Ele olhou para
baixo. Havia uma raia verde na manga de sua camisa e uma mancha de
sujeira. Seu rosto doía, e seus dedos saíram manchados de sangue quando
ele tocou os arranhões em sua bochecha. Ele devia parecer um escocês
selvagem, depois de uma batalha. Imaginou seus ancestrais escalando uma
colina, depois de uma luta difícil, segurando suas espadas nas mãos
manchadas de sangue, ansiosos para ver suas mulheres. Olhou para Sophie,
sentada miseravelmente no vento com mechas de cabelo loiro soltas
estalando em torno de seu rosto como as velas de um navio em um
vendaval. Seu nariz estava vermelho, seus lábios brancos.
Lembrou-se da primeira vez que ele viu Caroline na janela da
torre. O vento deixara suas bochechas rosadas e seus olhos brilhavam. Seu
cabelo glorioso flutuava ao redor dela como uma bandeira de batalha. Ele
podia imaginar a alegria que um guerreiro sentiria voltando para casa com
tal visão. Ele olhou para a torre, mas a janela estava vazia. Ele segurou seu
punho em torno da espada imaginária em sua mão e olhou de volta para o
rosto de Sophie. Ele quase se virou e desceu a colina, mas se forçou a parar.
Aquilo precisava ser feito.
— Lady Sophie, você vai me dar a honra de se tornar minha... —
Ele exigiu mais rude do que pretendia, mas o vento girou em torno dele,
roubando suas palavras.
— O quê? — Ela gritou. — Eu não consigo ouvir!
— Você quer casar comigo? — Ele berrou.
Ela parecia aliviada, se não satisfeita.
— Sim. Podemos entrar agora?
— Eu acho que é uma boa ideia, — ele murmurou, embora
soubesse que ela não poderia ouvi-lo debaixo daquele barulho. Ele ajudou-a
a se levantar e pegou seu casaco. Deveria agradecê-la, dizer algo sobre sua
beleza ou como estava feliz? Mas ela já estava três passos à sua frente,
correndo para a segurança do castelo.
No momento em que chegaram ao terraço, e Sophie atravessou as
lajes com pequenos passos e se atirou para dentro, no minuto em que a
porta se fechou atrás dela, o vento morreu em um suspiro desconsolado.
Ele viu Megan no corredor, e ela parou para encará-lo.
— Você está todo ensanguentado e arranhado! — Exclamou ela.
— O que você estava fazendo?
— Propondo, — ele murmurou sombriamente.
Angus percorreu a largura do quarto de Caroline, de novo. Ela
estava lendo, em silêncio, perto da janela e não conseguia ouvi-lo.
— Eles querem se casar com ela, se deitar com ela, e matá-lo.
Então, Brodie fará o que Devorguilla lhe pedir para fazer.
Ele parou na frente dela, embora ela não tenha percebido.
— Você sabe que isso significa o fim do clã MacNabb, não sabe
moça? — Isso é um desastre. — Seria melhor se ele se casasse com você,
sem dinheiro, embora você seja rica!
Caroline virou a página e ele sorriu suavemente.
— Ach, você se parece com a sua avó no verão que eu me
apaixonei por ela, — disse ele, e estendeu a mão para tocar sua bochecha.
Ela olhou para cima, seu olhar passando por ele. Ele sentiu um choque de
surpresa. — Você sentiu isso? — Ele sussurrou. Ele colocou a mão dele na
dela, apertou o mais forte que conseguiu, e seus dedos se curvaram por um
momento. Ele sentiu uma chama de calor.
Ele apertou mais forte, mas não sentiu mais nada.
— Querida, eu preciso da sua ajuda. Alec precisa da sua ajuda, —
ele implorou, e ela piscou, e olhou em volta, surpresa.
Georgiana apareceu.
— Ela consegue me ouvir, — disse Angus, apontando para
Caroline. — Ela sabe que eu estou aqui!
Georgiana olhou para Caroline, surpresa, mas a neta estava
sentada lendo calmamente um livro, sem saber de Angus ou Georgiana.
Georgiana colocou as mãos nos quadris.
— Não há ninguém mais bobo que um velho idiota! O que diabos
você está fazendo? Eu precisava da sua ajuda!
Angus acenou com a mão entre os olhos de Caroline e o livro,
mas ela nem piscou. A esperança fracassou. Ele flutuou sobre Georgiana.
Caroline possuía seus olhos, o porte reto, esguio e elegante. Até o jeito que
ela franzia os lábios enquanto lia era como Georgiana. Havia uma dor no
peito de Angus, onde seu coração havia, uma vez, por anos, batido apenas
por ela.
— Bem, o que aconteceu? — Ele exigiu.
Georgiana olhou melancolicamente para Caroline.
— Eu tentei pará-lo, mas Alec propôs a Sophie.
— Quando? — Ele perguntou.
— Não mais de meia hora atrás.
— Ela aceitou?
Georgiana suspirou e Caroline ergueu os olhos.
— Claro que sim, — disse Georgiana.

Capítulo 26

Visconde Speed passeava pelo chão da sala de jantar


confortavelmente mobiliada que ele alugara — junto com os dois melhores
quartos da estalagem — em Great Glen Inn. Como as estalagens eram
poucas, aliás — ele não conseguia encontrar nada de bom neste lugar.
— Por Deus, farei linguiça de suas entranhas!
Mandeville, que estava roendo uma salsicha espetada em um
garfo, a colocou no prato.
— Nós não perguntamos especificamente se ele era Glenlorne,
embora ele estivesse no castelo do homem. Talvez devêssemos ter
adivinhado que MacNabb e Glenlorne eram o mesmo?
— Como poderíamos ter averiguado isso? — Speed se queixou,
enquanto ele dava outra volta pelo tapete puído. — Ele não parecia
diferente do que era em Londres.
— Claro que sim. — Mandeville deu outra mordida na linguiça.
— Ele estava em um castelo, e agora que penso nisso, duas das herdeiras
mais ricas da Inglaterra estavam no castelo junto com ele.
— Ele não pode se casar com as duas!
Mandeville encolheu os ombros, mastigando pensativamente.
— Esta é a Escócia. Talvez as leis aqui permitam tais coisas.
Speed franziu a testa.
— As leis do cavalheirismo não fazem tal concessão! Deve ser
uma herdeira por lorde, em todos os lugares. Não é justo de outra forma. —
Ele foi até o espelho acima do aparador. — Como ele faz isso, eu me
pergunto? Eu sempre consegui um certo apreço das mulheres. Meu rosto é
certamente bonito.
Mandeville olhou para o companheiro, em dúvida.
— Talvez seja o jeito aventureiro e charmoso dele, meu velho.
— O que ele tem, algum tipo de bebida Highlander, um prato
feito com entranhas de ovelha, talvez?
— Na maior parte do tempo, é muito irritante, embora as
mulheres gostem de pensar nisso como a essência do heroísmo. Elas
querem um homem charmoso e heroico do mesmo jeito que nós queremos...
— Ele fez um gesto sugestivo com as mãos diante do colete e apertou-as na
cintura.
Speed olhou novamente para o espelho, vendo algo
completamente diferente de seu nariz comprido e torto, seus pequenos
olhos, seus lábios finos e tortos.
— Certamente nós temos muito disso, — disse ele, e correu a
mão pelo cabelo engordurado, praticando seu sorriso mais sedutor, embora
estivesse com dois dentes faltando.
— De fato, mas temo que MacNabb possua mais.
— Então o que devemos fazer? Em Londres, nós simplesmente
começamos um boato de que ele está sem dinheiro, ou o chamamos por
trapacear as cartas e atiramos nele. Como diabo os lordes lidam com essas
questões nas Highlands? — Exigiu Speed, afastando-se do espelho para
andar novamente. — Não é provável que ele apareça com frequência. Há
poucas herdeiras aqui do calibre de Lady Sophie e poucos cavalheiros pelo
que vi.
Mandeville afastou o prato vazio e sentou-se.
— Então eu acho que estamos livres para fazer nossas próprias
regras, você não acha? Pense no velho costume escocês de reintegração,
pegar o que você quiser.
Speed acariciou a espinha no queixo, pensativamente.
— Eu pensei que isso só se aplicava ao gado?
Mandeville sorriu.
— De maneira nenhuma. Nos dias passados, um homem ousado
simplesmente pegava quem ele queria, leva-a, se deitava com ela e o
assunto estava resolvido para a satisfação de todos.
Speed franziu a testa.
— Ainda estamos falando de vacas?
Mandeville encheu a taça do melhor porto do estalajadeiro e
segurou-o contra a luz. Ele parou por um momento para olhar às
profundezas cor rubi antes de voltar para seu amigo.
— Não, vacas não. Mas uma boa mulher vale o mesmo esforço
necessário para capturar uma bela novilha, creio eu. — Ele pousou o copo e
se inclinou na direção de Speed. — E se Glenlorne fosse acidentalmente
ferido ou pior? A querida Sophie seria nossa para que a tomássemos.
Os olhos de Speed se iluminaram.
— Ah, que engenhoso!
Mandeville assentiu.
— Precisamente. — Mandeville pegou o copo e o esvaziou.
Speed sentou-se à mesa em frente ao amigo.
— Mas como vamos fazer isso? Poderíamos lhe bater na cabeça
em uma noite escura ou estrangulá-lo em sua cama.
O sorriso de Mandeville enrolou a carne de suas bochechas
vermelhas como uma vela.
— É uma terra boa para caçar, você não acha? Ouvi dizer que há
muitos jogos nessas colinas. Certamente Glenlorne poderia ser convencido
a nos convidar para uma caçada, — explicou Mandeville. — É uma coisa
cavalheiresca a se fazer.
Os olhos de Speed brilhavam como as fornalhas do inferno.
— Percebo. Um acidente, então, um tiro no coração.
— Quase como um duelo, uma maneira de resolver
honrosamente, — concordou Mandeville. — O que poderia ser mais justo
que isso?
— Mas como vamos determinar quem de nós vai se casar com
Lady Sophie na casa de Glenlorne? — Perguntou Speed.
Mandeville cruzou os braços sobre a barriga volumosa, dando um
sorriso amistoso ao amigo.
— Quem matar o conde, vai ganhar a dama.
— E o perdedor? — Perguntou Speed. — Parece vergonhoso ir
para casa de mãos vazias.
— Ainda há Lady Caroline.
Houve uma batida discreta e o estalajadeiro entrou.
— Mais vinho, senhores, cervejas ou outra linguiça? — Ele
perguntou polidamente.
— Linguiça? — Disse Mandeville, estendendo a taça para encher.
— Eu acredito que você se referiu a elas como salsichas quando
eu trouxe a primeira vez, senhor. Eu nunca vi ninguém comer nove delas
em todos os meus dias.
— O frio no ar dá um apetite, — disse Mandeville. — Não, estou
cheio. Traga-me alguns papéis para escrever, se você tiver, e encontre uma
maneira de enviar uma nota para Glenlorne.
O estalajadeiro assentiu e saiu.
— Você não pretende colocar o nosso acordo no papel, não é? —
Perguntou Speed.
— Claro que não, — respondeu Mandeville. Ele estendeu a mão
pela mesa. — Um aperto de mão nos bastará. Tenho a intenção de escrever
para Glenlorne, dar-lhe nossos parabéns e fazê-lo nos receber para um dia
de caçada nas colinas.
Speed sorriu alegremente.
— Faça com que ele nos convide para jantar também. Eu não
gosto tanto de linguiças quanto você.

Capítulo 27

O grande salão estava cheio de pessoas. Todo MacNabb, por


quilômetros, havia recebido o convite para comparecer a casa e ver o novo
Laird. Eles usavam seus tartans orgulhosamente, e os presentes para ele
estavam em seu assento na cabeceira da mesa, e todos disseram que uma
celebração tão grandiosa não havia sido vista, nem antes da Batalha de
Culloden, ou depois, quando o uso do tartan e até o gaélico foi proibido
pelos ingleses. Alec era o primeiro novo Laird desde que a lei foi revogada.
Se os ingleses esperavam que as velhas tradições se extinguissem nos
próximos anos, ficariam tristemente desapontados ao ver que o espírito dos
clãs das Highlands estava vivo e ativo em Glenlorne, naquela noite.
Lady Sophie, recém prometida ao Laird, sentou-se ao seu lado e
recebeu os parabéns do clã por suas núpcias próximas. Como ela entendia
pouco do que os escoceses diziam, mesmo em inglês, Alec precisava ser seu
tradutor.
— Vamos começar uma escola para ensiná-los a falar
corretamente, em inglês, — disse ela em voz alta, o que atraiu muitas
expressões, resmungos e comentários em gaélico.
Caroline sentou-se entre os criados, ignorando o pedido de Sophie
de que ela ocupasse um lugar à mesa principal. Caroline colocou um sorriso
brilhante no rosto e o segurou lá, apesar do fato de que seu estômago estava
apertado e seu coração morrendo em seu peito. Ela já havia passado por
tudo isso antes, e alguém poderia pensar que ela já estaria bem preparada
agora — observando um homem que ela admirava, celebrar seu noivado
com outra pessoa. Foi difícil o suficiente sentar no fundo da sala e sorrir
sem ter que assistir o feliz casal, arrulhando, de perto. Ela comeu pouco e
bebeu menos, lembrando-se muito bem do que acontecera na última vez em
que tomou cerveja em uma festa. Ela tentou não observar o casal feliz, mas
não conseguiu evitar. Alec olhou para Sophie educadamente, sorriu de seus
comentários, sussurrou em seu ouvido, segurou a mão dela. Sophie estava
tão nervosa quanto um pássaro, sem fôlego, esvoaçante e trêmula. Ela usava
o resgate de um rei em joias e um vestido de noite que seria mais adequado
para um grandioso baile em Carlton House do que para um salão das
Highlands.
— Maldito idiota. Ele está cometendo um erro grave, se você me
perguntar, — alguém murmurou ao lado dela. — Ela é a esposa errada para
ele. Ele passará a eternidade se arrependendo disso.
Caroline virou-se para ver o idoso cavalheiro ao seu lado, os
olhos atentos em Alec. Ele usava o tartan MacNabb da cabeça aos pés e
uma profunda carranca de desaprovação.
— Sophie é uma pessoa adorável, — disse ela. — Ela será uma
condessa maravilhosa, e tenho certeza de que eles serão muito felizes
juntos.
Ele pareceu surpreso, como se não soubesse que ela estava lá.
— Você pode me ver, moça? — Ela levantou as sobrancelhas
quando ele acenou sua mão diante de seus olhos, seguindo-a. Ele estava
bêbado? Não havia uma taça diante dele, cheia ou vazia.
— Você não quer fazer um brinde para desejar que eles fiquem
felizes?
— Felizes? É um erro! Ela será a morte dele, ou Devorguilla, e
não há nada que eu posso fazer para não ver acontecer. A culpa é minha.
O velho cavalheiro manteve os olhos no casal feliz e seu punho
cerrou-se no tampo da mesa. Ela se perguntou quem ele poderia ser. Havia
muitos homens de outros clãs, de outras propriedades MacNabb, partes
distantes das terras de MacNabb.
— Você é um dos parentes do conde? — Ela perguntou. — Você
teve uma longa jornada?
— Uma longa jornada? — Ele riu. — Sim, suponho que você
poderia dizer isso. — Ele estava olhando para ela, e ela sentiu o calor em
seu rosto.
— Perdoe-me. Você é muito parecida com sua avó.
Caroline inclinou a cabeça.
— Minha avó era a condessa de Somerson, senhor, na Inglaterra.
Ele fez uma careta.
— Sim, mas ela não foi sempre. Ela morava aqui nas Highlands,
uma vez, em Lullach Grange, com sua tia e tio. Ele era um soldado em Fort
William.
— Acho que você deve estar enganado, senhor, — disse Caroline.
— Você não sabia, moça? Ela nunca falou da Escócia ou de mim?
— Ela morreu quando eu estava apenas com sete anos. Eu me
lembro dela dizendo que visitou a Escócia, uma vez, no verão.
Ele olhou intencionalmente para o canto da sala.
— Você nunca contou a ela? — Ele murmurou. — Eu fui tão
pouco para você, gràdhach? — Caroline seguiu seu olhar, mas viu apenas
sombras. Sua companheira parecia tão profundamente infeliz que seu
coração se apoderou dele.
— Você deveria comer alguma coisa. Posso lhe dar um pouco de
comida? Muira fez tanto.
Ele olhou para as pessoas próximas, observou-as alegremente
comendo, bebendo e conversando, suas bochechas coradas pela bebida e o
prazer da noite. Ele sorriu. O sorriso parecia familiar.
— É uma alegria ver o clã feliz novamente. Eles estiveram pouco
felizes por muito tempo. Nos dias de meu pai, havia reuniões e jantares
regularmente. Um ancião contaria histórias de nossos antepassados, da
história escocesa. Não havia homem, mulher ou criança que não soubesse
de onde eles vieram e se orgulhasse disso. Mas não depois de Culloden.
Tudo terminou com Culloden. E agora. — Ele balançou a cabeça
tristemente. — É um clã quebrado. Eu estava com tanta esperança de que
Alec pudesse...
Ele olhou para o canto novamente e inclinou a cabeça como se
estivesse ouvindo. Caroline estudou seu perfil. Ele se parecia com Alec — o
mesmo queixo forte, olhos cinzentos e ombros largos. Ela podia imaginar
que nos anos vindouros, Alec se pareceria com esse parente, e seria bonito
em sua velhice. Ela sentiu uma pontada de arrependimento e lançou um
olhar para a mesa principal. Sophie foi falar com as garotas. A propósito,
sua mão delicada estava em concha na boca, sem dúvida fofocando.
Alec sentava-se sozinho, sua expressão indefinida. Ela respirou
fundo quando percebeu que ele estava olhando para ela, seus olhos na
sombra no salão à luz das velas, o copo do Laird na mão. Sua mandíbula
suavizou quando ele encontrou seus olhos, e ele sorriu fracamente e
assentiu. Ela devia desviar o olhar, não conseguia desviar o olhar dele. Ela
sentiu uma onda de desejo, de perda e uma sensação de afogamento nas
profundezas de seus olhos, como se tivesse mergulhado nas profundezas
geladas do lago. Ela viu quando ele engoliu em seco, viu a luz tocando os
músculos de sua garganta, suas maçãs do rosto salientes, brilhando em seus
olhos.
— Você está bem? — Muira perguntou, inclinando-se sobre o
ombro. — Você está sentada aqui sozinha.
— Sozinha? Eu estava falando com... — Ela olhou para onde o
velho cavalheiro estava, mas o banco estava vazio.
Quando ela olhou de volta para Alec, os olhos dele estavam em
Sophie.

Capítulo 28

— Eu quero que Caroline Forrester seja demitida.


Devorguilla olhou para o enteado surpresa.
— Ela fez algo errado?
— Ela é a meia-irmã do conde de Somerson, uma dama, não uma
criada.
Devorguilla estudou as unhas. Agora, o que ele tinha contra a
escolha de governanta para suas filhas? Ela não sabia que Caroline era uma
dama quando chegou para reivindicar o posto. Não que isso importasse —
na verdade, era ainda melhor assim, mesmo que Alec não aprovasse. A casa
e as meninas eram sua responsabilidade, com certeza. Ela não estava prestes
a permitir que ele interferisse. Além disso, as conexões de Lady Caroline
com o conde de Somerson seriam a coisa certa para lançar suas filhas na
sociedade inglesa. Ela só precisava manter Caroline aqui até a próxima
temporada de Londres.
Claro, Alec estaria morto até lá. O pensamento a fez sorrir.
— Muito melhor para as meninas se eu a manter, você não acha?
Quanto mais altas as conexões que elas fizerem, melhores serão suas
chances de sucesso no mercado de casamentos. Lady Caroline veio aqui de
livre e espontânea vontade e não fez nada. Vou convidá-la para ficar como
convidada, se isso for mais apropriado, e pedir a ela que me ajude a
preparar as garotas para a temporada, por gentileza. Isso é o que vou fazer,
está bem? Além do mais, e se Lorde Somerson se opusesse ao fato de
dispensarmos sua irmã sem motivo?
— Eu duvido que ele saiba que ela está aqui. Ela não pertence a
Glenlorne. Ela deveria estar em Londres, fazendo suas próprias conexões
no mercado de casamentos.
— Megan vai fazê-la sair na próxima primavera. Lady Caroline
está ajudando-a a aprender o que ela precisa saber. Você a atrapalharia
agora? Megan precisará saber como falar inglês, dançar e flertar e se
comportar, se quiser ter alguma chance de sucesso. Caroline concordou em
ensinar-lhes um pouco de francês também, de fato, uma habilidade
adicional. — Ela se levantou.
— Sophie pode ajudá-las, — disse ele.
— Sophie não fala francês, e ela não sabe tocar piano como
Caroline.
Ela leu a frustração nos olhos de Alec e se perguntou por que ele
se importava se Caroline Forrester permaneceria ou não? Era, ela decidiu,
uma tentativa de usurpar a pequena quantidade de poder que ela possuía, e
ela não suportaria isso.
Nas poucas semanas que ele estava em Glenlorne, ele ascendera
uma faísca nas pessoas. Ela nunca havia visto tanta esperança, tamanha
alegria. Ela acordou esta manhã ao som de tambores em algum lugar nas
colinas. Tambores! Era como se ele fosse William Wallace. Homens do Clã
que ela não via há anos, vinham prestar seus respeitos ajoelhados e
prometer sua lealdade a Alec MacNabb. Brodie nunca inspiraria tamanha
admiração, tal esperança. Brodie era um homem comum. Ela entendia
homens comuns, do tipo impulsionado pela luxúria e ganância. Ela não
fazia ideia do que impulsionava Alec. Ele era como seu avô, honrado. Ela
se lembrou da arrogância do velho em relação à honra e ao orgulho dos
MacNabbs. Enquanto Alec tentaria salvar o mundo, Brodie não discutiria
sobre governantas, vendas de terras ou ovelhas. Ele deixaria tudo isso para
ela.
Ela fez um último ponto em seu bordado e enfiou a agulha no
linho, e ficou de pé.
— Lady Caroline é útil para mim, — mais ainda agora que sei de
seus contatos familiares — e para as meninas. Ela fica.
Sem um olhar para trás, como se o enteado já estivesse morto, ela
saiu do quarto.

Capítulo 29

As colinas ficavam bonitas na chuva, pensou Caroline,


caminhando pelo vale, contornando o lago, subindo o caminho, até que
ficou com visão para todo o vale, que se espalhava para fora diante dela,
metade envolta na névoa, misteriosa e suave. As chaminés da aldeia
esfumaçando e a pedra amarela da torre brilhavam contra um céu de
estanho. O lago era escuro e cinza, da mesma cor dos olhos de Alec. Ela se
virou e continuou andando. Estava ameaçando chover a qualquer minuto, o
que provavelmente aconteceria, porque ela não encontrara mais ninguém no
caminho.
As meninas estavam olhando livros com Sophie, e Caroline se
desculpou quando Sophie se ofereceu para dar uma lição sobre as
diferenças sutis entre rendas francesas e belgas, e se surpreendeu que as
meninas já não soubessem. Na verdade Caroline foi embora porque sabia
que elas precisavam conhecer sua nova cunhada.
Depois do jantar, ela decidiu que seria melhor se deixasse
Glenlorne antes do casamento. Ela iria para Edimburgo e procuraria
emprego com outra família que desejasse que seus filhos aprendessem
inglês. Ela havia saído hoje para se despedir de Glenlorne.
Ela parou no topo da colina íngreme, no lado oposto do lago do
castelo, e olhou para as pedras cinzas, memorizando cada detalhe. No
castelo ela passara a se sentir em casa nos curtos meses em que estivera ali,
embora soubesse que não era. Era a casa de Sophie, ou seria daqui a uma
semana, quando o casamento aconteceria na antiga capela. Ela estava
evitando olhar à capela, e se virou para pegar o caminho sobre a colina e
descer pela floresta. Ela chegou em uma casa em uma clareira. No velho
lugar encurvada entre as árvores, uma beleza caída pelos tempos difíceis, a
natureza desenhava um xale de hera em torno dela. A entrada estava muito
coberta de vegetação, o teto caíra e as venezianas estavam desmoronando
por falta de tinta. Deve ter sido bonita uma vez, aqui entre as colinas.
Caroline se aproximou e encostou-se à parede de pedra que rodeava o
jardim e olhou à porta da frente, que estava firmemente trancada contra
intrusos. Ela sentiu um momento de tristeza pelo fato de o antigo lugar ter
sido abandonado e esquecido. Um caminho de laje levava a um jardim
emaranhado. Havia rosas, enormes, lutando entre as flores silvestres, rosas
inglesas. Caroline sorriu para as cabeças rosadas, espalhafatosas entre as
ervas brancas e amarelas. Elas eram como as do jardim de sua mãe, e
muitas vezes ela saía para cortá-las para trazer o aroma inebriante para
dentro de casa numa tarde de verão. Caroline passou pelo portão quebrado e
se inclinou para cheirar uma das rosas. Ela fechou os olhos para a
fragrância familiar
— Você não deve querer ir embora, moça, — disse uma voz, e ela
pulou. Um espinho beliscou sua luva e seu dedo. Ela afastou a mão. O
velho cavalheiro do jantar estava a observando.
— Você me assustou, — disse ela, e tentou passar por ele em
direção ao portão. — Perdoe-me. Eu temo que esteja invadindo.
— Não, você não está. Se alguém tem o direito de estar aqui, é
você. Você sabe que lugar é este? — Ele perguntou. Ela se virou para olhá-
lo. — É Lullach Grange, moça. Sua avó morou aqui uma vez, há muito
tempo.
— Parece tão triste, — disse Caroline.
— Sim. Ninguém mora aqui há muito tempo. Eu pensava que ela
ficaria aqui, na Escócia, em Glenlorne, mas outras pessoas não
concordaram. — Suas grossas sobrancelhas brancas se uniram. — E agora
você quer ir embora, também. — Ele olhou à casa, e ela sentiu a picada do
espinho e olhou para a mancha de sangue em sua luva. — Eu pensei que
talvez você fosse fazer sua casa aqui, ficar para sempre.
Caroline sentiu a pontada de lágrimas atrás de seus olhos, tão
afiada quanto o espinho.
— Você vai me desculpar? Preciso voltar ao castelo — ela
murmurou.
— Você o ama? — Ele perguntou quando ela chegou ao portão.
— Quem? — Sua voz tremeu quando o rosto surgiu em sua
mente.
— Oh, você sabe de quem estou falando. Alec, é claro.
A resposta pairou na ponta da língua. Claro que não. Mas ela não
disse. Ela descobriu que não podia falar a mentira sem chorar. Em vez
disso, ela balançou a cabeça e viu o rosto dele se contrair em tristeza. A
brisa sacudiu as pétalas da rosa, e elas caíram a seus pés, rosa e branco
contra a pedra negra, e começou a chover.
Caroline puxou o capuz para perto e subiu apressadamente o
caminho entre as árvores. Quando ela se virou para olhar para trás, o jardim
estava vazio.

Capítulo 30

Alec olhou para os registros com frustração. Glenlorne não teve


uma boa colheita em vinte anos. Os livros mostravam as pessoas que
morreram e nasceram e os gastos durante o tempo de seu pai como conde.
Dougal havia vendido quase a terça parte da terra que os MacNabbs
possuíam, usando os fundos para beneficiar as pessoas no castelo. Os gastos
de Devorguilla em roupas eram astronômicos.
Havia avisos e cartas do homem de negócios de seu pai em
Inverness, com anos de idade, advertindo seu pai de dívidas crescentes.
Havia também petições dos chefes de clãs para o seu Laird e de membros
do clã, pedindo uma extensão de seus aluguéis, ou um pouco de comida
para ajudá-los durante um inverno rigoroso. As condições haviam piorado
constantemente após a morte de seu avô, quase vinte anos atrás. E ainda os
gastos de Devorguilla haviam continuado. Seis barris de vinho,
contrabandeados da França a custo exorbitante, um piano, um colchão de
plumas feito na Inglaterra, quatro dezenas de metros de seda cara. Como ela
pode, com tantas bocas para alimentar, tanto para cuidar? Ele teria muito
para corrigir. Ele passou a mão pelo cabelo e se perguntou por onde
começar. As dívidas de jogo de seu pai, por si só, chegavam a milhares de
libras. Não demoraria muito até que os credores começassem a abrir
caminho até a sua porta, exigindo pagamento que estava atrasado há muito
tempo. O dote de Sophie seria sugado em pouco tempo, ele percebeu.
Mesmo aquela quantidade astronômica não seria suficiente.
Muira entrou correndo.
— Há um exército de carruagens vindo pelo vale. Estamos sendo
invadidos novamente? Certamente eles são ingleses. As pessoas locais vêm
a pé, de pônei ou de carroça. Devemos barrar as portas?
Alec foi até a janela e olhou para o fluxo escuro de veículos se
derramando sobre a borda do vale, partindo o pesado véu de chuva, vindo
para o castelo, e sentiu surpresa por um momento.
— O que será agora? — Ele murmurou, e se voltou para Muira.
— Melhor preparar chá para agora, penso eu, ferver óleo para mais tarde.
Provavelmente não é mais que um desfile de modistas ingleses e fabricantes
de badulaques convocados por Lady Sophie para prepará-la para o
casamento. — A palavra — casamento — ficou presa em sua garganta.
Muira fungou.
— Casamento! Você sabia que ela quer emplastrar as paredes do
grande salão, pintá-lo de amarelo, colocar cortinas chinesas? Não haverá
mais espadas ou escudos nas paredes, e positivamente nenhum tartan,
especialmente no casamento.
Alec estremeceu por dentro, mas se obrigou a sorrir.
— Será a casa dela, Muira. Ela vai querer colocar sua marca,
como qualquer noiva. Um pouco de tinta não será tão terrível, será? Agora
vá e ferva a chaleira para o chá.
Muira sacudiu a cabeça.
— É a minha casa também, e a sua e a de todos os MacNabb.
Alec observou-a e imaginou quanto custaria a renovação de
Glenlorne para o gosto de Sophie.
Ele subiu as escadas correndo e vestiu roupas inglesas, já que
Sophie o avisou que não gostava de kilts. Ele não ousara dizer isso a Muira.
Ele ajeitou o lenço, checou o relógio e vestiu um casaco azul escuro,
resistindo ao impulso de colocar uma espada e uma pistola sob o casaco,
por precaução.
Ele os ouviu chegando antes mesmo de chegar aos degraus do
castelo. Alguém estava gritando, uma efusão feminina de raiva.
— Este tempo não vai parar! Terminaremos nossos dias neste
lugar terrível, com febre nos pulmões e varíola com toda essa chuva! A gota
também marque minhas palavras. E que diabos ela estava pensando, vindo
aqui, de todos os lugares? Ela não poderia ter fugido para Brighton ou
Bath? Meu único conforto é que ela está provavelmente tão machucada
quanto eu, pelas terríveis estradas irregulares. E a lama — vou precisar de
novos vestidos, digo, e sapatos novos, e não estou feliz com a necessidade
de esperar até voltar a Londres para pegá-los! Cada peça que eu possuo está
arruinada! Mesmo assim, não me rebaixarei a usar qualquer coisa xadrez!
Não era um bando de modistas, então. Alec franziu os lábios e
esperou o lacaio descer do seu poleiro e abrir a porta. Sua libré estava de
fato lamacenta e a chuva caía sobre ele.
— Tem que haver algo decente para comer, ou eu vou mandar
esta carruagem de volta para a civilização de uma vez. De uma vez, você
ouviu? Eles provavelmente nem bebem chá, e se o fizerem, provavelmente
é feito de urtiga cozida!
A porta da carruagem se abriu e um cavalheiro saiu com uma
careta. Ele olhou para a fachada do castelo por um momento, depois subiu
os degraus. Ele não fez nada para ajudar a passageira dentro da carruagem,
que continuou inabalável com sua ladainha de reclamações e ameaças.
— Boa tarde, — disse Alec, dando um passo à frente.
— Somerson, — o homem se apresentou rispidamente, sem se
preocupar em estender a mão. — Você tem minha meia-irmã aqui, acredito?
Alec deixou seu olhar passar pelo poderoso conde inglês. Ele
estava com o rosto vermelho e suando, com a postura de um valentão. Ele
se levantou diante de Alec com o queixo erguido, os punhos cerrados, sua
postura desafiadora. Alec não conseguiu detectar a menor semelhança
familiar entre o conde e Caroline.
O lacaio ajudou a senhora a sair da carruagem. Ela escorregou no
degrau e gritou quando caiu no lacaio. Ele correu valentemente para segurar
seu grande peso. Outro lacaio correu para ajudar quando a dama gritou para
eles. Eles finalmente conseguiram colocar a dama com segurança em seus
pés com o chapéu torto.
Ela prendeu Alec com um olhar agudo, como uma ave de rapina
avistando uma lebre, e subiu os degraus até ele.
— Onde ela está? Eu juro que ela vai ser chicoteada por essa
tolice!
— Minha esposa, a condessa de Somerson, — disse o conde, sem
um indício de desculpas e sem sequer olhar para ela. A senhora pesava pelo
menos cem quilos e usava um vestido de veludo cor-de-rosa vívido,
enfeitado com folhas e um chapéu combinando. Alec fez uma reverência,
resistindo à vontade de rir. Ela o lembrava de uma porca premiada em uma
feira rural, ele pensou maldosamente, e forçou-se a sorrir para ela enquanto
se curvava sobre sua mão.
Outro cavalheiro saiu da carruagem, parecendo pálido. Ele
endireitou sua gravata e piscou como uma ovelha perdida na floresta.
— Meu futuro genro, visconde Mears, — disse Somerson.
A última a descer era uma jovem bonita, apesar de sua
semelhança familiar com Somerson. Seu nariz e olhos estavam inchados de
tanto chorar, e começou a fluir, novamente, quando ela colocou seus olhos
avermelhados em Alec.
— Por favor, onde está minha tia, senhor? Não me diga que ela
não está aqui, ou eu desabarei aqui nos degraus!
— Minha filha, Lady Charlotte, — disse Somerson.
— Não seja tão dramática, Lottie! — A condessa ordenou. —
Vamos arrancar este lugar pedra a pedra se tivermos que fazer isso até
encontrá-la, e então... — Ela levantou as mãos grossas, como se já tivesse o
pescoço delicado de Caroline em suas garras.
— Lottie! — Alec se afastou bem a tempo quando Sophie passou
por ele e se lançou nos braços de Lottie.
— Você já ouviu a notícia? É por isso que você está aqui? —
Sophie balbuciou. Ela lembrou Alec de um filhote de cachorro
entusiasmado. — Eu vou me casar! Oh, que bom te ver e que chapéu
adorável!
— Lady Sophie? — Gritou a condessa de Somerson, com os
olhos arregalados de susto. — O que você está fazendo aqui? — Ela olhou
para Alec. — Estou começando a suspeitar de um crime, quando duas e
agora três das herdeiras inglesas acabaram juntas em um castelo
extremamente remoto. Onde está esse homem chamado Glenlorne? Vou
dizer-lhe umas verdades!
— Eu acredito que este é ele, de pé diante de você, Charlotte, —
Somerson disse secamente. — Estou certo disso, senhor?
Alec se curvou.
— Realmente você está. Bem-vindos ao Castelo de Glenlorne.
Por favor, venham para dentro antes que a chuva comece realmente.
— Comece? Começou a chover no momento em que cruzamos a
fronteira, e não cessou nem um minuto desde então — resmungou a
condessa. Alec ofereceu-lhe o braço, já que Sophie estava ligada a Lottie,
dando-lhe um tapinha nas costas, oferecendo-lhe um novo lenço para conter
o dilúvio de lágrimas. Somerson subiu os degraus sozinho, sua expressão
sugerindo que ele não possuía nenhuma esperança real de conforto.
— Faça com que seus lacaios cuidem dos cavalos. Nossos
empregados e bagagem devem chegar dentro de uma hora. Essas três
carruagens contêm apenas o essencial, meu criado, a ajudante da condessa,
as criadas de Lottie.
Três carruagens e ainda mais a seguir? Alec cerrou os dentes e
assentiu. Onde diabos eles colocariam todos? E quanto tempo seus
convidados inesperados pretendiam ficar?
— Vamos incomodá-lo apenas o tempo suficiente para encontrar
Caroline, — disse o visconde Mears enquanto subia os degraus. — As
senhoras estão ansiosas para voltar a Londres.
— Boa tarde, Glenlorne. Há uma grande chuva por aqui. — Ele
se virou para encontrar Lordes Speed e Mandeville abrindo caminho pela
lama. — Há uma festa? — Perguntou Speed, olhando para o exército de
empregados carregando caixas, malas e baús escada acima.
— Viemos convidá-lo para caçar, — disse Mandeville com um
largo sorriso.
A chuva começou novamente, uma chuva repentina que ameaçava
inundar tudo em segundos, e Alec se afastou.
— Acho que é melhor discutirmos isso lá dentro, meus senhores.
Eu presumo que você conheça o Conde e a Condessa de Somerson? — Mas
os caçadores afiados já haviam subido os degraus, choramingando sobre a
água fria caindo nas costas, deixando Alec falando com a chuva.
— É uma invasão, depois de tudo, — disse Muira, observando o
caos.
Alec rangeu os dentes.
— Traga Lady Caroline, imediatamente.

Capítulo 31

O céu estava tão sombrio e ameaçador como se estivesse


anoitecendo quando Caroline retornou ao castelo, embora fosse apenas a
hora do chá. A garoa havia se transformado em um aguaceiro estridente,
agudo e frio.
Ela entrou pela cozinha, e Muira estava mexendo na panela sobre
o fogo, que cheirava deliciosamente. Uma junta de carne de veado estava
assando na imensa lareira, junto com três galinhas gordas. Uma peça de
salmão rosa jazia sobre a mesa, olhando para Caroline, surpreso, à espera de
sua vez.
— Cheira a Natal aqui! — Disse Caroline, tirando o capuz
encharcado e o manto.
Muira se virou para ela, com a concha de madeira pronta.
— Fora! — Ela gritou. — Você não vai invadir este lugar ou a
Escócia, com seus cães sassenachs! — Ela abaixou a arma quando viu que
era Caroline. — Och, eu não quis dizer você, eu pensei que era a outra,
novamente, aquele cozinheiro inglês trouxe companhia com ele. Ela insiste
que ele deve preparar uma refeição adequada. Eu insisti que ela fosse
embora antes que eu saísse com o cutelo na mão. O rosto dela se suavizou
quando ela olhou para Caroline. Caroline supunha que ela se referia ao
cozinheiro de Sophie, que estava com medo de colocar os pés no domínio
de Muira.
— Você parece uma gatinha afogada, moça! Onde você esteve?
Não é um dia para estar ao ar livre, embora esteja tão tempestuoso aqui
dentro. O Laird está procurando por você a tarde toda.
O peito de Caroline se apertou.
— Oh? Bem, ele vai ter que esperar um pouco mais. Eu preciso
de um banho e um vestido seco, no mínimo. — Uma das razões pelas quais
ela saiu, foi para evitar Alec.
Muira pegou seu manto e o pendurou junto ao fogo.
— E você vai precisar de um gole de uísque aquecido junto com
ele para afastar o frio. Não vai demorar um momento para preparar, sente-
se, moça.
— Estou bem, Muira. Fui até Lullach Grange e fui pega pela
chuva. Não há mal nenhum. — Caroline se sentou no banco perto do fogo
para tirar suas meias e botas encharcadas. Mesmo suas meias estavam
molhadas, mas removê-las teria que esperar até que ela estivesse na
privacidade de seu próprio quarto, o mesmo com seu vestido e anáguas.
— No Grange? — Perguntou Muira. — Agora, porque alguém
quereria ir lá, mesmo com bom tempo?
— Eu tive companhia. O velho cavalheiro do jantar estava lá.
— Que velho cavalheiro seria esse? — Muira perguntou,
mexendo a sopa e empurrando o caldeirão no coração do fogo para aquecer.
— Eu nem sequer pensei em perguntar o nome dele.
— Bem, é melhor contarmos a Alec que há alguém no antigo
lugar que não deveria estar lá. O Grange foi trancado desde a morte de
Laird Angus, cerca de vinte anos antes, e mesmo antes disso. Havia um
major inglês que morava lá, uma vez. Ele foi morto em Culloden e o lugar
foi abandonado. Algumas pessoas acham que é assombrado. — Os olhos
dela se arregalaram. — Och, você viu um fantasma?
Caroline sorriu.
— Não, claro que não. Ele não era nenhum major inglês, ele era
um escocês.
— Oh? E como pode saber? — Muira serviu uma caneca meio
cheia de uísque, dourada à luz do fogo. Ela puxou o atiçador e o enfiou no
copo, que chiou ao aquecer o uísque. O rosto marcado de Muira estava
radiante no brilho do fogo, seus olhos afiados como os de um pássaro.
— Ele estava vestindo xadrez MacNabb da cabeça aos pés. Ele
disse que sabia meu...
A porta da cozinha se abriu. A concha de Muira subiu novamente.
Jock MacNabb estendeu a mão para o punhal, depois baixou a mão.
— Pelo amor do piedoso, Muira, você me assustou!
— Acabamos de falar sobre fantasmas, — disse Muira, largando a
concha e virando as galinhas.
— Oh, aí está, Lady Caroline. O cortejo de Alec está ansioso para
ver você. Ele me disse para sair e procurar por você. Fico feliz que isso não
seja necessário agora. — Esfregou o cotovelo.
— A dor de novo? — Disse Muira, notando o gesto. — Você vai
precisar de linimento para isso. Vou fazer um pouco depois que o pão sair
do forno. — É melhor você ir dizer a Alec que Lady Caroline precisa de um
banho quente antes de vê-lo. Ela está encharcada até os ossos.
Jock roubou um doce da prateleira quando Muira se afastou.
— Sim, eu vou, mas ele não vai gostar.
Ela engoliu em seco, imaginando o que ele queria. Ela não estava
pronta para enfrentá-lo ainda, não sabendo que ela o amava, não até que ela
tivesse suas emoções sob controle, ela estava certa de que poderia esconder
seus sentimentos.
— Por favor, diga a sua senhoria que falarei com ele antes do
jantar, assim que eu estiver seca, — disse Caroline. Suas meias molhadas
deixaram pegadas escuras nas lajes enquanto ela cruzava as escadas dos
fundos.
— Vou mandar um pouco de água quente, — Muira gritou atrás
dela.

Capítulo 32

Georgiana apoiou-se no corrimão da galeria para inspecionar os


convidados no salão abaixo.
— Aquele é seu neto? O sujeito tempestuoso com os olhos
esbugalhados? — Perguntou Angus.
— Sim — Georgiana suspirou. — Aquele é Somerson. — Ela não
teve nenhum prazer em vê-lo aqui. Ele veio por causa de Caroline, e ela
esperava que sua neta fosse forte o suficiente para resistir a ele. Ela podia
sentir a raiva que emanava de Somerson, viu-o procurando Caroline,
checando o relógio. Quanto mais tempo ela esperasse, pior seria para ela.
— Eu vejo que é do lado da família do seu marido, — disse
Angus acidamente.
— O que isso quer dizer? — Georgiana exigiu, desanimada.
— Ele não é um rapaz atraente, não é? — Angus pensou,
acariciando o queixo. — Não como você e Caroline.
— Neville dificilmente é um rapaz e é um dos homens mais
poderosos da Inglaterra, — Georgiana fungou.
— Neville? — Angus riu. — Poderoso, e um dos mais bonitos,
também... pela aparência dele.
— Ele é a própria imagem de seu avô, — disse Georgiana,
lembrando-se do marido. — A maçã não caiu longe da árvore.
— Parece com uma minhoca, se você me perguntar. Diga-me,
você já viu ele? Ou o seu fantasma, pelo menos, do jeito que você me vê?
Georgiana estremeceu.
— Meu marido? Claro que não. Nem eu desejaria. Os longos anos
de nossa vida conjugal foram tempo suficiente juntos para nós dois. Mais
do que suficiente.
— Homem de sorte, — murmurou Angus.
— Você sente muita falta do seu túmulo? — Perguntou
Georgiana, com raiva.
— Eu quis dizer que eu me ressinto de cada minuto que não
passei com você, cada um que me foi negado, — retrucou Angus. — Eu
quis dizer isso como um elogio. Você não reconheceu isso?
Georgiana olhou para as mãos, lembrou-se de onde a aliança
luxuosa pesara sobre o dedo, e olhou para o dedo da outra mão, onde usara
o modesto anel de compromisso de Angus até morrer. Ela valorizava muito
mais o minúsculo rubi do que o maciço anel de safira e pérola. Ambos
foram embora agora, claro. As safiras enfeitavam o dedo gordo de
Charlotte.
— Perdoe-me. Somerson não era de dar elogios, pelo menos não
alguma que fosse direcionado a mim. Eu esqueci o hábito de ser elogiada.
— Então ele era um tolo, assim como um bobo. Eu diria a você
todos os dias o quanto você é linda.
8
— Uggsome ?
— Isso é o oposto do belo, — disse Angus, olhando para Neville
Forrester.
Georgiana sentiu lágrimas nos olhos.
— Não podemos mudar o que passou. Nosso tempo chegou e se
foi. Só podemos ajudar Caroline e Alec a verem como é importante amar e
ser amado. Você entende isso agora?
— Claro que sim. E tenho certeza de que é por isso que sua
Caroline consegue me ver.
— Porque ela está apaixonada por Alec? — Georgiana perguntou
esperançosamente.
— Ela diz que não está. Eu perguntei a ela diretamente. Eu teria
jurado... Och, eu vi os olhares que eles trocam. Eles queimam o ar. — Ele
empurrou a boina para trás. — Eu pensei que nosso plano estava
funcionando. Eu pensei que a moça conseguia me ver porque ela pertence a
este lugar, que ela queria estar em Glenlorne. Claro, eu também pensei em
você. Nós falhamos em nosso próprio tempo, gràdhach, e há mais em jogo
agora. — Ele se virou para ela, e ela viu lágrimas em seus olhos. —
Podemos consertar isso — fazer com que eles vejam — ou um idiota de um
inglês vai conseguir destruir tudo?
Georgiana olhou para o rosto duro e insensível do neto.
— Agora cabe a Caroline e Alec. Eles devem encarar o passado e
encontrar um caminho. Nós não podemos fazer muito.
A boca de Angus se torceu amargamente.
— Então daqui a sessenta anos, serão Alec e Caroline, aqui,
lamentando o passado, — disse Angus, — e eu não desejaria a ninguém
esse tipo de tormento.
— Onde está ela, Glenlorne? Sua carta dizia que ela estava aqui.
— O conde de Somerson olhou ao redor do grande salão de Glenlorne
como se estivesse nas favelas mais escuras de Londres, e sua meia-irmã
estivesse em uma vida no submundo. Isso fez Alec olhar ao redor de sua
casa, mas em vez de vergonha, ou culpa, ele sentiu orgulho. As paredes
eram fortes, o clã orgulhoso. Eles se importavam um com o outro, ao
contrário deste tolo, e Bray também, que possuía tudo que o dinheiro podia
comprar, mas não possuía qualquer resquício de bondade humana.
— Garanto-lhe que ela está aqui, meu senhor, — disse
Mandeville, bebendo outra caneca de cerveja e pegando o jarro. — Nós a
vimos ontem.
Alec ignorou-o.
— Eu entendo que Lady Caroline simplesmente foi dar uma
volta. Ela provavelmente estará de volta em breve.
— Neste tempo? — A condessa Charlotte gritou. — Ela vai
procurar a morte dela!
De fato. Alec olhou pela janela para o aguaceiro constante. Onde
diabos ela estava? Ele viu imagens de inundações repentinas, penhascos
escorregadios, fendas profundas e Caroline deitada, quebrada e
ensanguentada na urze. Ele olhou para o relógio dele. Ele havia enviado
Jock e Hamish para procurá-la, uma hora atrás. Se eles não voltassem em
dez minutos, ele mesmo iria procurá-la, deixaria seus convidados, e deixaria
Sophie e as meninas se divertirem. Sophie levara Lottie para colocá-la na
cama. Devorguilla e as meninas estavam administrando a hercúlea tarefa de
encontrar alojamentos para todos, desde o conde até seu lacaio mais baixo.
Restou alguém na Inglaterra?
— Não tenha medo, querida condessa. Lady Caroline parecia
muito recuperada ontem, e dificilmente à beira da morte agora, — disse
Speed. — Você estava certo em mandá-la aqui para as Highlands. Parece ter
lhe feito muito bem e colocou a cor de volta em suas bochechas, por assim
dizer, desde que ela não se afogue no dilúvio, não é.
— Se afogar? — Disse Charlotte. Alec notou que ela parecia mais
esperançosa do que triste, com a perspectiva. — Isso é uma possibilidade?
— Não, — disse Alec rapidamente. A menos que o chão se
tornasse escorregadio, ou ela perdesse o equilíbrio e caísse contra uma
rocha... — Não, — ele disse novamente. — Ela provavelmente se abrigou
na aldeia. Os habitantes locais são muito gentis com... — ele se impediu de
dizer — estranhos. — Caroline dificilmente era uma estranha agora. Ela
conhecia a maioria dos aldeões pelo nome, conhecia seus filhos, levava
cestas de comida e remédios de Muira para os doentes e idosos, parando
para ouvir suas histórias. Caroline seria calorosamente recebida em
qualquer casa para esperar o tempo melhorar. Ele se sentiu preencher de
orgulho.
— Ela está com camponeses? — O rosto de Charlotte se enrugou
de desgosto. — Ela vai pegar pulgas ou pior. Ela já está à beira da ruína e as
pulgas certamente a derrubarão.
— Eu sairia e procuraria por ela, — disse o visconde Mears
corajosamente, então se acalmou instantaneamente. — Se eu soubesse o
caminho.
— E arriscar sua própria saúde? — Charlotte exigiu. — Eu
deveria dizer que não.
— Não tenho dúvidas de que ela voltará assim que a chuva parar,
— disse Alec novamente.
— Será que a qualquer momento hoje? — Somerson disse,
impaciente. — Eu entendo que chove quase constantemente nas Highlands.
— Seu avô disse isso, contava histórias terríveis sobre o tempo.
Ele lutou com o exército do rei no '45 ', — disse Charlotte.
— Muito bem, meu senhor! — Disse Mandeville, erguendo o
copo, depois encontrou o olhar aguçado de Alec e ficou vermelho. — Er,
nós poderíamos montar uma busca adequada para Lady Caroline.
— Quando a chuva parar, — acrescentou Speed.
Alec olhou para os cavalheiros da sala. Mears parecia
preocupado, mas manso. Mandeville estava se ajudando com mais cerveja.
Speed examinava a marca do fabricante no fundo da caneca de estanho,
avaliando seu valor. Somerson parecia aborrecido com a demora, e
Charlotte estava esperançosa de que Caroline nunca mais voltasse.
Nenhuma pessoa se importava se Caroline estava segura ou não.
Ele cometeu um erro terrível enviando a carta para Somerson.
Ele olhou pela janela para a velha torre, solitária e abandonada no
chão, e se perguntou se ela estava lá. Ele se imaginou encontrando-a lá,
beijando a chuva de seus lábios, segurando seu corpo contra ele, para
aquecer sua pele molhada.
Jock chegou ao lado de Alec e sussurrou em seu ouvido.
— Ela está lá em cima, segura. Chegou em casa uma hora depois,
parecendo um arminho afogado.
Alívio e raiva inundaram o peito de Alec. Ela estava segura.
Não, ela estava se escondendo. Ele olhou ao redor da sala. Ele
seria tentado a se esconder dessas pessoas, se elas fossem parentes dele.
Ainda assim, ela não podia evitá-los para sempre. Ele fez uma careta para
sua covardia.
Ele ficou de pé.
— Desculpem-me? — Ele não esperou por uma resposta. Ele se
virou e saiu da sala. Deu dois passos de cada vez e não parou até chegar ao
quarto de Caroline, na torre.

Capítulo 33

O quarto da torre que Caroline ocupava agora fora seu quarto de


dormir. Ele conhecia cada pedaço das íngremes escadas de pedra que
levavam a ela, todas as pedras na parede. Havia sido um santuário, um lugar
para manter coleções infantis de seixos lisos e ovos de pássaros, estilingues,
espadas de madeira e os livros que ele adorava.
Ele bateu e esperou.
— Entre, Muira, — disse ela. Ele abriu a porta, furioso por ela ter
se arriscado, por tê-lo deixado com sua família, por ter saído de Londres.
Caroline estava de fato molhada, mas de modo algum se parecia
com uma doninha afogada.
Ela se sentava em uma banheira de água quente, o vapor em volta
dela. Seus olhos se arregalaram acima das bochechas rosadas ao vê-lo na
porta antes de agarrar o pano mais próximo e arrastá-lo à banheira com ela.
A fina peça de tecido encharcou-se e moldou-se à sua figura. Ele podia ver
o contorno escuro de seus mamilos, a longa extensão de suas pernas. A
imagem daquelas pernas, daqueles seios à luz do luar secaram sua boca. Ele
deveria se afastar, sair, mas ele não conseguia se mover. Inferno, ele não
conseguia nem respirar.
— O que você está fazendo aqui? — Ela exigiu, lutando com o
tecido.
— Você me disse para entrar, — disse ele.
— Só porque eu pensei que você fosse Muira, com mais água
quente! — Ela estava espalhando água por todo o chão, enquanto tentava
afundar mais profundamente na banheira, e controlar o frágil tecido ao
mesmo tempo. — Vá embora!
Ele deveria ir. Era a coisa mais cavalheiresca a fazer, o mais
inteligente, mas ela estava nua, molhada e adorável, e o quarto cheirava a
flores silvestres — o sabonete, — ele presumiu, ou talvez fosse apenas
Caroline. Aquele quarto nunca cheirava a flores silvestres quando ele
morava aqui. Deveria ter parecido estranho, mas a câmara ainda parecia sua
casa, seu santuário, mesmo com as coisas dela espalhadas — seus livros,
sua escova de cabelo, suas roupas molhadas penduradas sobre cadeiras e
ganchos. Ele não conseguia mexer os pés, não conseguia tirar os olhos das
piscinas douradas dos olhos dela, dos lábios rosados e doces, do declive
molhado dos seios, do longo comprimento branco das pernas. Ele acariciou
aqueles seios, os chupou, e aquelas pernas estiveram enroladas em torno de
seus quadris enquanto ele...
— Se você não vai sair, pelo menos se vire, ou me dê uma toalha,
ou um cobertor, ou qualquer coisa!
Ele lhe entregou uma toalha e se afastou. Ouviu-a se levantar da
água, resistiu à vontade de espiar, ouviu o farfalhar de tecido quando ela se
enrolou.
— Onde você esteve o dia todo? Somerson está supondo que você
teria se afogado na tempestade, — disse ele.
O farfalhar do linho parou.
— Somerson? Aqui? Como? Eu suponho que Sophie escreveu
para Lottie?
Ele se virou para encará-la, a admissão de que ele escrevera a
carta na ponta da língua, mas sua língua ficou presa entre os dentes quando
a viu. Ela estava ao lado da banheira de madeira como uma deusa grega. O
tecido molhado delineava seu corpo esguio do peito até a coxa, os ombros
brancos, molhados e perfeitos. O desejo se agitou, expulsando qualquer
chance de pensamento inteligente, e ele ficou, instantaneamente, duro, tão
pronto quanto ele estivera na torre. Ele desviou o olhar, mas seus olhos
caíram na cama, o que piorou ainda mais.
— Ele está lá embaixo. Somerson, eu quero dizer. Ele chegou
algumas horas atrás, — ele disse rouco.
— Ele está sozinho?
— Sozinho? Não. Ele trouxe toda a família.
Ela engasgou e a toalha escorregou, deslizando pelo contorno de
seus seios. Ela se virou, caminhando em direção à divisória, mas o linho
delineou seu traseiro perfeito. Ele engoliu um gemido.
— Lady Somerson também está aqui, Lady Charlotte, sua futura
sogra, Mandeville e Speed, todos no andar de baixo, esperando por você. —
Concentrou-se em contá-los em seus dedos, mas não adiantou. Sua ereção
se recusou a diminuir. A toalha molhada foi atirada por trás da tela da
divisória, e ela caiu no chão ao lado da banheira, zombando dele. Ele não
precisava vê-la. Ele conhecia o corpo dela, como a pele dela era sedosa,
como a boca dela era doce, os sons doces que ela fazia quando ele a amava.
E tudo que ele podia fazer era ficar onde estava.
— O que é Starbury? — Ele perguntou, tentando ignorar o
farfalhar do tecido enquanto ela se vestia.
— Starbury? É uma das propriedades de Somerson, uma muito
pequena em Shropshire, na fronteira com o País de Gales. Por quê? — Ela
perguntou.
— Porque Somerson mencionou Starbury para Mears, como seu
próximo destino no caminho de volta a Londres.
Ela ficou em silêncio.
— É um lugar agradável? — Ele perguntou.
— É remoto e bastante desolado. Minha mãe odiava o lugar. Ela o
chamava mais de prisão do que de casa, o tipo de lugar que alguém vai para
morrer sozinho.
Alec fechou os olhos. Claro que parecia uma prisão. Era para ser
uma prisão para Caroline. Somerson queria levá-la até lá e deixá-la.
Ela saiu de trás da tela, usando um vestido simples e fechado.
Ainda assim, a respiração dele ficou presa na garganta, e ele não queria
nada mais do que desfazer os minúsculos botões que prendiam a roupa até o
queixo dela, e deitá-la nua na estreita cama. Ela ficou fora do alcance e ele
notou que seus pés estavam descalços sob a bainha do vestido, do jeito que
estiveram no solstício de verão. Seu cabelo também estava solto, enrolando-
se ao redor do rosto. Ela apontou para as meias, penduradas no respaldo de
uma cadeira.
— Eu vou descer assim que terminar de me vestir. — Ele não
conseguia desviar o olhar. Ela encontrou seus olhos e deve ter visto o calor
lá. As manchas coloridas em suas bochechas se expandiram e seus olhos
escureceram antes de desviar o olhar. — Por favor, vá, — ela implorou.
— O que você quer que eu faça, Caroline? — Ele perguntou.
Uma dúzia de emoções em cascata surgiram através de seus olhos
— esperança, medo, raiva e resignação — antes de seus cílios se abaixarem
para esconder o que ela estava pensando. Ela ficou com a cabeça baixa, mas
a coluna estava rígida.
— Eu quero, eu preciso que você vá, antes que eu faça alguma
coisa que vou me arrepender, — ela sussurrou.
Ele andou em direção a ela, suas botas crepitando no tapete de
palha trançada. Ele segurou sua bochecha, e ela pressionou a palma da mão
dele como um gato, suspirando ao toque.
— Eu não posso, — ele murmurou. — Eu deveria sair por aquela
porta, mas não posso me obrigar a fazê-lo, — ele murmurou, sua outra mão
encontrando a cintura dela, puxando-a para perto. Ele se inclinou à frente,
sua testa descansando na dela, respirando, sentindo o calor do corpo dela.
Ele queria beijá-la. Ele ergueu o queixo, mas ela virou o rosto com uma
objeção murmurada.
Ele beijou sua bochecha em vez disso, sua orelha, o lado de sua
boca até que ela gemeu, e o beijou de volta, seus lábios encontrando os
dele, agarrados. Ela deslizou as mãos até a frente de seu casaco nas lapelas,
em seguida, em volta do pescoço, emaranhando os dedos em seus cabelos
enquanto ele aprofundava o beijo.
Não havia sido a cerveja de verão. Não foram os tambores, nem a
luz do fogo. Foi Caroline. Ele a queria como nunca quis qualquer outra
mulher, e não apenas fisicamente. Ele queria olhar nos olhos dela, saber
como ela se sentia, conversar com ela, caminhar pelas colinas com ela, ao
lado dela, de mãos dadas, adormecer e acordar ao lado dela. Ele provou o
sal de suas lágrimas e se afastou.
Seus olhos estavam brilhantes de lágrimas, escuros de desejo. Ele
poderia tê-la se ele quisesse. Ele poderia levá-la para a cama, deitá-la e
fazer amor com ela — e ela nunca o perdoaria. Ele sentiu uma onda de
raiva, por ela, por si mesmo. O que diabos ele estava fazendo?
— Eu tenho responsabilidades, — disse ele em voz alta. — Eu
estou prometido para Sophie. Seu irmão está aqui embaixo. — Ele olhou
novamente para os lábios dela, meio separados e apetitosos, vermelhos de
seus beijos, e sua boca se encheu de água. Ele fechou os olhos. — Você
sabe o que aconteceria se você ficasse. Você merece coisa melhor. Sophie
merece coisa melhor.
— Você acha que eu consentiria em ficar aqui e ser sua amante,
viver sob o mesmo teto que sua esposa, competir com ela pelas migalhas de
sua atenção? Como você faria isso, Alec? Você me colocaria em uma
cabana na aldeia, deslizaria para me visitar nas noites sem lua? — Ela
estava com raiva, e tinha todo o direito de estar.
Ele passou a mão pelo cabelo, queria arrancá-lo pelas raízes.
— Foi um erro, — disse ele. — Aquela noite na torre. Estava
errado, mas se eu fizer isso agora, farei tantas outras coisas erradas, você
não vê?
Ela levantou o queixo.
— Eu não pedi para você fazer a coisa certa! Foi meu erro
também, meu senhor. Não pedi nada e não vou pedir se é disso que tem
medo.
— Então, para onde você vai? — Ele perguntou de novo.
— Você se importa, desde que eu tenha ido embora?
Alec não respondeu. Ela pegou suas meias e foi para trás da tela.
Ele ficou e esperou, sem saber o que dizer, ou como consertar aquilo. Ela
saiu de trás da tela e foi até a penteadeira. Ela enrolou o cabelo em um
coque apertado com uma eficiência feroz. Quando terminou, parecia cada
centímetro da educada governanta intocável — exceto pela vulnerabilidade
em seus olhos em conjunto com seus ombros — quando ela encontrou o
olhar dele no espelho.
— Você ainda pode se casar, — ele disse devagar.
Ela balançou a cabeça e não disse nada.
— Olhe, você ainda poderia se casar com Speed ou Mandeville.
Eles podem não se importar que você não seja uma empregada. Eles podem
até não saber, — ele disse, e ela olhou para ele surpresa. Para sua surpresa,
ela riu, um som amargo e sem alegria.
— Eu disse algo divertido? — Ele disse, de repente irritado.
— De maneira alguma, meu senhor, — ela disse sarcasticamente.
— Se você vir meu irmão, você pode dizer a ele que eu vou vê-lo no jantar.
— Ela foi até a porta e abriu-a, deixando-o no quarto, sozinho. Ele escutou
seus passos correndo pelos íngremes degraus de pedra como se ela não
conseguisse se afastar dele rápido o suficiente.

Capítulo 34

Caroline levou para Lottie uma xícara de seu chá de hortelã


favorito quando Muira lhe disse que a jovem estava se sentindo mal depois
de sua jornada.
Como esperado, ela encontrou a sobrinha sentada com Sophie, e
também como esperado, Lottie estava informando sobre as últimas fofocas
de Londres sobre os amigos, conhecidos e inimigos.
— Eu vim pedir um vestido emprestado para usar no jantar, —
disse Caroline quando Lottie se lançou nos braços de sua tia.
— Claro, coitadinha. Minha mãe disse que você saiu sem nada.
Eu estava tão preocupada!
— Você fugiu? No entanto, todo mundo acha que você está
afastada do país, com uma doença grave. — Sophie disse, piscando. — Eu
acreditei em cada palavra!
— Mamãe espalhou essa história, pelo menos para aqueles que se
importaram em perguntar, já que realmente não fazíamos ideia do que havia
acontecido com você! — Respondeu Lottie. — Eu suspeitava que você
havia sido sequestrada por piratas e vendida para o harém de um paxá, —
disse Lottie à amiga. — Eu jurei usar xales de cashmere para sempre, por
causa de Caroline, e então papai recebeu a carta de Lorde Glenlorne.
— A carta de Glenlorne? — Caroline murmurou. — Glenlorne
escreveu para Somerson? — Ela sentiu o calor subindo sob o colarinho. Ela
presumira que Sophie havia escrito. Quão desesperadamente ele queria que
ela fosse embora. Seu coração pesou na boca do estômago.
— Quando papai mostrou a carta de Glenlorne para mamãe, ela
gritou tão alto que os vizinhos mandaram três lacaios fortes para ver se
havia alguma coisa errada. Ela gritou por tanto tempo que desmaiou, e o
médico teve que ser chamado para atendê-la.
— Eu não pretendia causar tanta confusão, — disse Caroline,
apesar de não ter ficado surpresa de a casa ter sido virada de cabeça para
baixo, tanto pela sua partida, quanto pela notícia de que ela estava segura na
Escócia. — Ele simplesmente não a queria.
— Oh! Eu entendo completamente!
— Você entende? — Caroline perguntou.
— Claro! Como você é doce, Caroline. Você não queria que seu
casamento tirasse a atenção do meu. Você não precisa se preocupar, eu teria
aceitado uma cerimônia dupla. Agora espero que possamos nos casar aqui,
com Sophie, uma cerimônia tripla. Tenho certeza de que papai não se
oporia. Ele e mamãe estão muito ansiosos para vê-la finalmente casada.
— Oh! Lottie, que maravilha! — Murmurou Sophie. — Vamos
colocar nossas cabeças juntas e fazer planos de uma só vez! Você e William,
Glenlorne e eu, e Caroline e...
— Não importa quem você escolheu. Você pode anunciar no
jantar. Tenho certeza de que papai vai insistir para que você faça, de fato —
interrompeu Lottie.
Somerson ainda acreditava que ela escolheria? Não entendia por
que ela fugira naquela noite, ou, talvez, simplesmente não se importasse.
Ele não podia forçá-la a se casar, é claro, mas como sua guardiã, ele poderia
fazê-la infeliz até que ela fizesse o que lhe mandassem.
— Mas... — Caroline começou, mas Sophie abriu a porta do
guarda-roupa e começou a tirar os vestidos. — Acho que devemos nos
vestir para hoje à noite, talvez todas da mesma cor. Ou devemos vestir
branco, mas com as faixas diferentes?
Caroline lhes permitiu escolher um vestido para ela — branco
com uma faixa vermelha — não se importando com o que ela usaria. Ela
escapou de Londres, simplesmente para ser forçada a fazer a mesma
escolha aqui, e desta vez, não havia para onde fugir. E foi Alec quem
assegurou seu destino. Seu peito doía com a ideia de que ele a havia traído.
Ela deixou a segunda criada de Lottie ajudá-la como o vestido e se olhou no
espelho. Ela estava tão pálida quanto a musselina. Respirou fundo e a
empregada prendeu o colar que Sophie insistiu que ela usasse: um pingente
violeta, feito de ametistas e safiras. Violetas cresciam à sombra da velha
torre. Ela decidiu que odiava violetas. Lottie usava no peito, um coração
feito de rubis e Sophie usava uma tiara de diamantes.
O reflexo no espelho disse a Caroline que ela era a mesma mulher
que tinha fugido de Londres e, no entanto, ela não era. A velha Caroline era
uma dama nascida e criada para se casar, para ter herdeiros e administrar
uma casa, e essa era a extensão e o propósito de sua vida. Mas as coisas
mudaram. Havia uma nova luz em seus olhos, um determinado Somerson
diria teimosia, e Charlotte diria obstinada. Ela conseguiu sorrir quando o
rosto feliz de Lottie apareceu no espelho ao lado do dela.
Ela não deixaria Somerson decidir seu destino. Ela não seria
forçada a tomar uma decisão da qual se arrependeria toda a sua vida,
mesmo quando sonhava com os braços de Alec MacNabb ao redor dela, a
boca dele na sua, a vida dele unida à dela. Ela viu um rubor crescer em suas
bochechas, ficando ainda mais brilhante quando Sophie olhou por cima do
ombro, a imagem da alegria nupcial.
Ela estivera sozinha no mundo, mas ela conseguiu chegar a
Glenlorne e encontrou um emprego honrado. Ela poderia fazer isso outra
vez. Ela sentiu um novo senso de propósito e ergueu o queixo.
— Por favor, desculpe-me, devo verificar as meninas antes de
descermos, — disse ela.

Capítulo 35

— Deixe-me ver, — disse Caroline.


Alanna girou no lugar, exibindo seu vestido de musselina rosa e
branco, enfeitado com renda nas mangas e na bainha.
Megan ainda estava se preparando em frente ao espelho, mexendo
em seus cabelos.
— Você parece tão bonita! — Sorcha chiou, observando suas
irmãs, e fingindo que não se importava que ela era muito jovem para poder
jantar em uma companhia tão estimada. — Sophie diz que você é a filha de
um conde da mesma forma que nós, Srta. Forrester. Devemos fazer uma
reverência quando nos encontrarmos?
— Mamãe disse que vamos chamá-la de Lady Caroline em vez de
senhorita Forrester, — disse Alanna.
— Eu ainda sou a mesma pessoa, — disse Caroline. Ela
caminhou até Megan e pegou o pente para enrolar um cacho ou dois nos
cabelos.
O reflexo de Megan olhou para o dela.
— Mamãe convidou Brodie para o jantar. Eu acho que ela pode
ser capaz de ver tanto quanto eu... — Ela engoliu, corando. — Oh, eu
gostaria de ter algo realmente elegante para usar, como Sophie e Lady
Lottie.
Caroline soltou o colar que Sophie insistiu que ela usasse. Ela
colocou em volta do pescoço de Megan.
— Aqui. Isso parece adorável
Sorcha inclinou-se para examinar o violeta das joias e fez
beicinho.
— Eu ainda acho que é injusto que eu não possa descer para
jantar. Eu janto com a família todas as noites.
— Mamãe diz que devemos observar estritamente as regras
inglesas hoje à noite, — disse Alanna. — E na Inglaterra você seria criança,
ainda jantando no berçário.
Sorcha mostrou a língua para sua irmã.
— Eu ainda estarei lá, observando da galeria acima do corredor.
— Eu direi a Muira para lhe pegar e mandá-la à cama, —
retrucou Alanna, com as mãos nos quadris.
— Muira provavelmente tem mais chances de estar lá,
observando também, resmungando sobre o sangue sassenach — disse
Megan, em seguida, levou a mão aos lábios e olhou para Caroline pedindo
desculpas. — Oh, me desculpe, senhorita.
— É hora de descer, ou vamos nos arriscar a chegar atrasadas, —
disse Caroline, e conduziu as moças até a porta. Respirou fundo e desejou,
por um momento, poder ficar com Sorcha. Alanna enfiou a mão na de
Caroline enquanto desciam as escadas, e Caroline ficou contente com o
conforto, embora supusesse que Alanna pensava que Caroline é que a
estava consolando. Ela se preparou para enfrentar a raiva de seu meio-irmão
e a pontada de desprezo de Charlotte.
Os cavalheiros levantaram-se quando as damas entraram no salão.
— Aí está você, Lady Caroline. Nós estávamos falando de montar
uma busca por você, assim que a chuva parasse, mas você já estava seca, —
disse o visconde Speed.
— Como você está, caríssima, — disse William, chegando a
apertar a mão dela e beijando sua bochecha. Ele era quase um estranho,
embora tivessem crescido juntos, e fossem amigos uma vez. Ela sonhara em
ser sua esposa, embora ela não pudesse imaginar se casar com ele agora. Ou
com qualquer um. Ela evitou olhar para Alec e lançou a William um sorriso
brilhante.
Seu irmão estava esperando ela ir até ele, as mãos cerradas em
punhos, sua cor vermelha. Ela fez uma reverência, sentindo o olhar dele,
aborrecido.
— Bem, bem, aqui está você finalmente, e parece muito bem. —
Ele disse como se o fato de sua saúde estar boa o incomodasse. — Temos
muito a discutir e, mesmo que sua tola pequena aventura tenha diminuído
seu valor como esposa, tenho outros planos para o seu futuro. Nós
falaremos imediatamente depois que o jantar terminar. — Ele fez um
comando. Caroline sentiu uma onda de raiva. Ele realmente esperava que as
coisas voltassem à sua última conversa, como se nada tivesse acontecido?
Ela levantou o queixo.
— Receio precisar colocar Lady Sorcha na cama depois do jantar.
Talvez amanhã, depois das aulas das meninas, que terminam às onze horas.
Ela viu o rosto de Somerson mudar de vermelho para roxo, com
raiva. Seu punho cerrou e por um momento ela temeu que ele pretendesse
atingi-la. Ela sentiu os olhos de Lottie sobre ela e os de Alec, mas manteve
os olhos fixos no meio-irmão. Ele abaixou a mão.
— De todo o nervosismo... — Charlotte começou, mas Lottie
colocou a mão no braço da mãe.
— Talvez devêssemos tomar nossos lugares à mesa, — disse
Lottie. — Talvez seja o ar das Highlands, mas eu, por exemplo, estou
realmente faminta.
— Lottie! — Charlotte a admoestou — e o grande tamanho de
sua pessoa — sobre sua filha. — Uma dama nunca se descreve como
faminta!
— Och, eles deveriam dar risada. Eu vi aquela Lady no chá,
devorando todos os bolos, — Angus disse para Georgiana de seu poleiro na
galeria, logo atrás da jovem Sorcha, que estava com o rosto pressionado,
ansiosamente, através do corrimão. — Eu conheci guerreiros que não
conseguiam comer tantos bolos quanto ela, mas eles não eram tão grandes,
é claro. — Ele riu de sua própria piada.
Georgiana estava olhando para a neta com orgulho manifesto em
seus olhos.
— Caroline parece atraente hoje à noite, não é? Eu não acho que
Alec tenha olhado para qualquer outra pessoa na sala, desde que ela chegou.
E eu gostei bastante do jeito que ela enfrentou Somerson. Isso exigiu
coragem.
Alec sentiu-se arrepiado quando Somerson ameaçou Caroline.
Não permitiria que ele a prejudicasse, guardião ou não. Ela o havia
enfrentado e, como a maioria dos valentões, sua arrogância desmoronara
diante da demonstração de força.
Ele viu Caroline se virar, olhar para Mears com um olhar
apaixonado. Ela nem sequer olhou para Alec.
Muira anunciou a refeição e Alec pegou o braço de Sophie e
levou sua noiva à esquerda, mas Devorguilla deu um tapinha no assento ao
lado de si, mais adiante na mesa.
— Venha e sente-se aqui, minha querida menina, entre eu e
Brodie, para que possamos nos conhecer melhor. — Ele viu como Sophie
tomou aquele lugar, e ofereceu para Brodie, um sorriso suave. Brodie riu.
Todos na sala olharam desconfiados para o homem jovem e desajeitado, que
estava olhando para Sophie e corando como uma moça.
Megan ansiosamente se moveu para se sentar ao lado de Brodie,
mas sua mãe balançou a cabeça.
— Você deve se sentar mais abaixo na mesa. Ao lado do Visconde
Speed, talvez? Alanna, você senta ao lado de Lorde Mandeville. — Angus
notou que Megan parecia arrasada. Lorde e Lady Somerson ocuparam seus
lugares, e o reverendo Parfitt sentou-se ao lado do visconde Mears e fez
sinal para Caroline, que tomou o seu lugar à esquerda do assento de Alec, à
cabeceira da mesa. Ele conseguia sentir o seu perfume, ver a pulsação
agitada em sua garganta, ouvir o farfalhar do vestido de tafetá quando sua
respiração ficou presa na garganta. Sua cor era brilhante e, à luz das velas,
ela era mais adorável do que qualquer outra dama na sala. O Sr. Parfitt
limpou a garganta e entoou as graças, e Caroline manteve os olhos baixos,
como se o padrão em seu prato fosse intensamente fascinante.
Caroline se recusou a olhar para Alec, já que era culpa dele que
Somerson estivesse aqui. Quando ele moveu o joelho para cutucar o dela,
ela afastou a saia e o ignorou. Do outro lado, William sorriu quando ela
bateu nele. Ela moveu os joelhos de volta para Alec.
Alec se virou quando o Visconde Speed se inclinou à frente.
— Acho que amanhã seria um grande dia para caçar, Glenlorne.
Mears, Somerson, vocês estão para prontos atirar? — Ele riu de sua própria
piada de mau gosto. Alec forçou um sorriso. Tentou imaginar Caroline
casada com Speed e não conseguiu.
— Eu gosto de javali, — Charlotte disse entusiasmada. — Você
tem javali aqui?
— Aí, não, minha senhora. Eles estão extintos há vários séculos,
creio eu, — Alec respondeu. — Eu posso oferecer perdiz, ou carne de
veado, talvez, se a caçada for boa. O lago está cheio de peixes e o rio está
repleto de salmão.
— Eu adoro o jeito que Muira faz perdiz ao molho de uísque, —
Alanna disse, e Mandeville se sentou.
— Molho de uísque? Que uso engenhoso do líquido, — disse ele.
— Na verdade, acho que devemos ter isso para o jantar de
amanhã, depois da caçada, — Charlotte disse ansiosamente.
— Acho que vou participar da caçada também, — disse Sophie.
— Vamos para o ar fresco.
— Eu também vou, — acrescentou Brodie imediatamente, seus
olhos em Sophie.
— A que horas vamos sair? — Perguntou Megan, com os olhos
fixos no namorado desgarrado.
— Eu irei se Caroline também for, — disse William, dando-lhe
um sorriso suave, e Caroline sorriu de volta. Para os olhos de Alec, Mears
parecia tão fascinado quanto Brodie, e Caroline não possuía olhos para mais
ninguém. Ele sentiu uma pontada de ciúmes.
— Se as meninas forem, — disse ela. — E Lottie também, é
claro.
— Oh! Claro, — Mears disse, piscando para sua noiva como se
ele a tivesse esquecido, completamente.
Alec franziu a testa. Havia algo entre William Mears e Caroline?
O visconde começou a tagarelar sobre sua mãe, e alguém chamado Sinjon,
e os olhos de Caroline brilharam enquanto ela se agarrava a cada palavra,
ignorando Alec inteiramente. Ele cutucou o joelho dela, novamente,
debaixo da mesa, e uma onda de cor inundou o rosto dela, ele observou seus
dedos apertarem na haste de sua taça de vinho. Então, ela estava ciente dele,
mesmo que fingisse não estar. Isso fez emergir o diabo nele.
Quando Muira tirou os pratos de sopa de picanha e serviu o
segundo prato, salmão, ele tirou o sapato. Quando Hamish veio encher as
taças de vinho, ele encontrou a bainha de sua saia e passou o pé pela maciez
de suas anáguas, até tocar o tornozelo dela. Os olhos dela se arregalaram e
seus lábios se abriram surpresos, mas ela manteve o olhar fixo em William,
rindo de suas piadas, fingindo que Alec não estava lá. Ele não suportaria
isso.
Ou ela estava muito enganada, ou o pé de Alec estava acariciando
seu tornozelo. O que ele estava fazendo? Ele fez cócegas, e Caroline tentou
afastar o pé, mas esbarrou em William e suas sobrancelhas se ergueram, e
ele deu-lhe um sorriso malicioso. Ele pensava que ela estava flertando com
ele? Ela moveu as pernas para trás, novamente. O pé de Alec voltou.
— E sua mãe, ela está bem? — Caroline perguntou a William,
tentando ignorar o fato de que o pé de Alec estava subindo em sua
panturrilha, esfregando, provocando.
O joelho de William pressionou contra o dela do outro lado, e ela
se mexeu, mas isso a aproximou de Alec. Ela lançou-lhe um olhar
penetrante, mas ele apenas sorriu para ela e bebeu seu vinho.
— Acabamos de afirmar que ela está muito bem, — disse
William.
Os dedos buscadores de Alec alcançaram seu joelho, fazendo
cócegas. Ela engoliu uma risadinha, escondendo-a comendo uma garfada de
salmão.
— E Sinjon e Evelyn? — Ela perguntou pelo irmão de William e
sua esposa.
— Saudável, tanto quanto eu sei. — William se inclinou para
frente e sorriu para ela, assim que os dedos de Alec escorregaram para a
parte de trás de seu joelho, movendo-se ali, contra a carne sensível. Ela
engasgou e William sorriu para ela. — Posso dizer que você está
particularmente adorável esta noite? — Perguntou William, seus olhos
examinando seu rosto. Uma vez ela teria dado qualquer coisa para ver
aquele olhar bobo em seu rosto. Agora, ela estava horrorizada.
— Obrigada, — ela murmurou. O pé de Alec estava
insistentemente trabalhando em seus joelhos, tentando separá-los. Ela
teimosamente os manteve fechados. O que diabos ele estava fazendo?
— E como está seu pai? — Ela perguntou a William, lembrando-
se de que eles também já haviam discutido sobre ele.
O pé de Alec subiu mais alto, os dedos dos pés flexionando
insistentemente onde a meia terminava e a pele nua começava. Ela lançou-
lhe um olhar penetrante e ele levantou uma sobrancelha e mexeu os dedos
dos pés. Sua liga estalou e ela pulou.
— Você está bem, Caro? — Perguntou William, acariciando-a nas
costas, seu toque quente entre as omoplatas, demorando-se um pouco
demais.
— A torre não é adorável ao luar? — Perguntou Alec. — Tem
sido um lugar de encontros durante séculos, especialmente no Solstício de
Verão. — Todos olharam para a cena pitoresca além da janela, e Caroline
lançou para Alec um olhar penetrante. Ele sorriu para ela, um lento e torto
sorriso de pura sedução. O coração dela deu uma cambalhota lenta. Ele
aproveitou o choque dela para deslizar o pé entre os seus joelhos. Ela tomou
um gole de vinho para esconder seu suspiro.
— Eu acredito que vou ficar em segurança dentro de casa
amanhã, — Somerson estava dizendo. — Eu não gosto de caçar nem no
melhor dos tempos. O tempo úmido aqui não combina comigo.
— Às vezes venta muito, — acrescentou Sophie.
Ele estava acariciando o interior de sua coxa. Caroline sentiu um
arrepio de desejo passar por ela.
Ele estava sentado, calmamente, jantando, presidindo a mesa
cheia de convidados como se tivesse com os sapatos calçados, os pés no
chão, onde eles pertenciam, e não os estivesse passando nela, selvagens. Ela
tentou se afastar, mas, além da inacreditável grosseria de sair no meio da
refeição, estava presa. Ele não tinha piedade? Ela enviou-lhe um olhar
suplicante, mas ele apenas levantou uma sobrancelha arqueada e sorriu. Seu
pé permaneceu.
— Devemos partir ao amanhecer? — Perguntou Speed
ansiosamente.
Ela se abaixou e cravou as unhas no pé de Alec, e ele lhe deu um
olhar perverso que lhe disse que ele não pretendia parar. Ela engasgou
quando seu pé deslizou ainda mais, chegando a descansar contra um ponto
muito sensível no ápice de suas coxas. Um grito suave de surpresa escapou
de seus lábios. Ela não conseguiu evitar.
— Eu concordo com Caroline, — disse Sophie. — Devo dizer
que dez horas é bom o bastante. Talvez as onze.
Os dedos de Alec se mexeram, e Caroline lançou-lhe um olhar de
pura angústia, implorando-lhe que parasse.
— Mais vinho, Lady Caroline? — Ele perguntou polidamente. —
Você parece corada.
Corada? Ela estava em chamas. Ele era o próprio diabo, ela
decidiu. Ela se mordeu para não soluçar, quando ele mudou o pé
novamente, pressionando suavemente.
— Ou poderíamos planejar sair ao meio-dia e almoçar ao ar livre,
se o tempo estiver bom. — Lottie sugeriu esperançosamente.
— Você deve estar de volta a tempo para o chá, — disse
Charlotte.
Caroline estava derretendo. Sophie e Lottie estavam agora
falando sobre o que vestiriam, se os hábitos de andar ou os vestidos de
andar fossem mais adequados. Os dedos do pé de Alec eram tão persuasivos
quanto seus dedos da mão, provocando-a, exigindo uma resposta. Era quase
impossível respirar. Ela lambeu os lábios. Sempre que ela voltava sua
atenção para William, começava uma conversa, Alec mexia os dedos dos
pés. Quem imaginava que um homem poderia fazer uma coisa dessas com
os pés? Ela fez o melhor que pôde para ouvir o que William estava dizendo,
para responder aos comentários que outras pessoas fizeram para ela, mas,
na verdade, ela não estava ciente de ninguém além de Alec e do que ele
estava fazendo com ela. Foi a refeição mais longa da vida dela.
Na galeria Angus viu quando Devorguilla se inclinou para
sussurrar para Brodie. Ela pressionou algo na mão dele. Ele se desculpou e
saiu da sala.
— O que ele está fazendo? — Perguntou Angus. — Algo não está
certo. — Ele assistiu Devorguilla lançar para Alec um olhar presunçoso,
cravejado de puro ódio, mas Alec estava muito ocupado com Caroline para
notar. A moça estava invulgarmente corada, e os olhos de Alec estavam com
as pálpebras pesadas. Angus se virou para observar o retorno de Brodie.
Caroline mal conseguia pensar, quanto mais continuar uma
conversa. Alec manteve o lento e suave tormento durante a refeição. Apesar
de seu desânimo, o desejo doce e quente fluiu através de suas veias. Ela
estava com os mamilos endurecidos, esfregando contra o linho de seu
decote. Ela torcia o guardanapo no colo, estrangulando-o a cada pequeno
movimento dos dedos dele contra seu sexo. Suas bochechas queimavam.
Seu corpo inteiro queimava. Ela não conseguia olhar para ele, não se
atreveria, sabendo que, se o fizesse, explodiria. Ela torceu o guardanapo de
linho com mais força para não gritar.
Finalmente os últimos pratos foram removidos e ela agradeceu
que a refeição — e certamente o lento e sensual tormento — acabou.
Certamente eles se levantariam da mesa e se retirariam, e ela finalmente
estaria fora do alcance perverso dele. Ela estava exausta, os nervos
desgastados como uma corda de arco.
Hamish carregou uma bandeja de copos e uma garrafa de uísque
de ouro e colocou-a no aparador. Muira apagou metade das velas.
— O que é isso? — Perguntou Sophie.
Devorguilla sorriu.
— Um tratamento especial. Espere e verá.
Hamish e Leith abriram as portas da cozinha e tomaram seus
lugares em ambos os lados do portal, vestidos com seus tartans.
— Você gosta de um homem de trajes escoceses, Caroline? —
Perguntou William. — Eu não posso decidir se eu gosto ou não. É muito
diferente do que os ingleses usam. Eu não posso deixar de sentir um pouco
de medo por isso. Vivendo no norte da Inglaterra, eu cresci na terrível
rebelião de '45. Minha ama costumava me dizer que, se eu não fosse dormir,
o próprio Bonnie Prince Charlie desceria das colinas, me arrastaria pela
fronteira e me comeria. Por muito tempo imaginei uma nação de homens
comendo bebês de saias à espreita ao lado de Halliwell Hall.
O pé de Alec ficou tenso, indignado, parando por fim. Ele
certamente o retiraria agora que a conversa havia tomado um rumo sério,
ela pensou, e ela estaria livre.
Mas ele não fez. Em vez disso, os dedos do pé dele enrolaram-se,
flexionaram-se e a tocaram, e ela engoliu os ofegos.
Ela ouviu o gemido baixo das gaitas de fole enquanto elas
respiravam para cantar, elevando-se com um ruído que preenchia a sala
enquanto os flautistas saíam da cozinha.
Megan, Lottie e Alanna gritaram de alegria quando os flautistas
apareceram e, lentamente, marcharam pelo comprimento da mesa, tocando
uma música alegre. Sophie se encolhia a cada nota.
Caroline respirou fundo — não por causa da magnificência da
música antiga que preenchia o salão, mas porque os dedos de Alec estavam
em movimento novamente. Ela não podia suportar. Certamente ela morreria
do tormento. Ela deixou seus olhos se fecharem, e sua respiração veio em
curtos suspiros que ela não conseguia controlar. Ela agarrou a borda da
mesa. Como ele a fazia sentir isso, levava-a ao limite, ameaçava empurrá-la
da borda. O calor subiu do broto macio e inchado que os dedos do pé dele
provocaram, e ela sentiu subir por sua barriga e seios, até que teve certeza
de que explodiria em chamas.
Atrás dos gaiteiros vinha Muira, carregando pudim em uma
enorme travessa, decorada com os símbolos do clã, urzes, pinheiros e
amoras.
E atrás dela, Brodie carregava a taça do Laird.
O pé de Alec captou o ritmo da música, latejando, empurrando,
brincando, esfregando cada vez mais rápido, dançando ao ritmo de uma
corrida louca.
Muira acendeu uma vela no pudim e ela explodiu em chamas.
Todos na mesa gritaram, Caroline mais alto de todos, quando a sensação a
levou ao limite. Alec segurou sua mão debaixo da mesa, apertou-a.
Ela olhou para ele com horror, mortificada. Felizmente, todos os
olhos estavam no pudim e não nela.
Ele teve a audácia de sorrir, dando-lhe um sorriso de puro orgulho
masculino.
Caroline enfiou o garfo sob a toalha da mesa e fincou-lhe na
perna, o sorriso aumentando até que desapareceu. Desta vez, foi o grito dele
que o turbilhão dos foles escondeu.
— Por que Brodie estava carregando a taça? — Perguntou Angus.
— Vai contra a tradição.
— O quê? — Georgiana observava as chamas azuis sobre o
pudim.
— Deve ser Jock, o senescal de Alec. — Angus olhou para
Brodie, viu ele olhar rapidamente para Devorguilla, que sorria como a
megera que era. Não havia orgulho ou alegria em seu sorriso, apenas pura
malícia. A podridão levantou-se dela. Ela assentiu com a cabeça, e Brodie
avançou, levando a taça ao longo do comprimento da mesa para Alec.
Angus olhou para a taça que passava sob o poleiro, sentiu uma pontada de
aviso e de medo.
— Não, — ele assobiou. — Ela não iria!
— Qual é o problema? — Perguntou Georgiana. — Olhe para
Caroline, ela está positivamente radiante hoje à noite.
— Gràdhach, ela vai envenená-lo.
A testa de Georgiana franziu-se.
— Por que Caroline envenenaria Brodie?
— Não Caroline, Devorguilla, e não Brodie, ela vai envenenar
Alec!
Angus olhou para a mesa, desesperado. Os olhos de Megan
estavam brilhando de orgulho quando Brodie passou por ela. Sophie estava
considerando os flautistas dos foles, como se ela os desejasse nas
profundezas de Hades. Somerson parecia entediado. Alec, o tolo, só possuía
olhos para Caroline. Então, aparentemente, o jovem visconde que estava
sentado ao lado dela também.
— Alec! — Gritou Angus. — Alec, não beba, rapaz! — Mas ele
não conseguia ouvir.
Angus se inclinou sobre o corrimão, flutuou para baixo, tentou
impedir Brodie, empurrá-lo ou derrubar o copo de sua mão, mas Brodie
passou direto através dele. Angus agarrou inutilmente a taça.
Foi então que Caroline se virou e o viu por cima do ombro. Ela
sorriu para dar as boas-vindas. Ela imaginou que ele era parte da maldita
cerimônia idiota. Ele balançou sua cabeça, desesperado agora. Brodie
chegou ao lado de Alec, curvou-se e segurava o copo do lorde com um
sorriso doentio no rosto corado. Alec acenou para seu primo e estendeu a
mão para pegar a taça. Angus olhou para Caroline desesperadamente.
— Moça, faça alguma coisa! — Ele chorou. Ele viu o sorriso de
Caroline desaparecer, viu sua cor rubra se transformar em cinza. Ela
começou a se levantar, os olhos ainda sobre ele, franzindo a testa enquanto
abria a boca para falar. Angus observou quando o ombro dela bateu na taça,
enviando-a, girando, para longe das mãos de Brodie.
Todos na sala assistiram o arco da taça através do ar, da luz das
velas, os enfeites de prata da taça brilhando, o vinho rubi espirrando e
caindo no chão. O cálice tocou a pedra, ecoando pelo antigo salão até as
próprias vigas, como um aviso de traição e assassinato.
Devorguilla se levantou, a cadeira se inclinando para trás. A taça
aterrissou espalhando uma piscina de vinho com um estrondo. Ela olhou
para o líquido que fluía em sua direção, surpresa, o mal procurando sua
fonte, Angus pensou enquanto se retirava do caminho.
Angus olhou para Caroline, que não tirara os olhos dele. Ela ficou
olhando para ele, seus olhos vazios, surpresos, como se ela tivesse visto um
fantasma.
Ele sorriu. O que mais ele poderia fazer? Ela sabia o que ele era
agora. Ninguém mais o havia visto. Ele sorriu para ela e tocou a mão na
boina e voltou às sombras.
Muira correu para limpar o líquido derramado, o pano branco
logo ficou vermelho sangue. Um cheiro fraco e familiar chegou até ela, e
ela franziu a testa. Muira mergulhou um dedo nos restos da taça e o provou.
Com horror, ela olhou para Devorguilla, que estava sentada em silêncio,
novamente, com o rosto tenso. Devorguilla captou seu olhar e devolveu
com um de pura malícia. Muira fez um sinal contra o mal.

Capítulo 36

Somerson jogou o guardanapo e se levantou.


— Se as festividades da noite terminaram, eu preciso de um lugar
tranquilo onde eu possa falar com Caroline, sozinho.
Alec sentiu-a tensa, mas assentiu.
— Claro, — ele disse. — Meu estúdio está à sua disposição. —
Ele ainda não estava certo do que acabara de acontecer. Brodie correu para
a cozinha, e Muira e Devorguilla estavam se encarando como dois gatos
prestes a lutar. Os olhos cor de avelã de Caroline estavam tão grandes
quanto pires, quando se viraram para os cantos escuros do salão. Talvez ele
tivesse ido longe demais provocando-a, dando-lhe prazer no jantar com seu
meio-irmão do outro lado da mesa. Olhou novamente para William Mears,
que estava olhando para Caroline como se tivesse sido ele quem recebeu
prazer. Ele se perguntou novamente como ela o conhecera quando era uma
garota — talvez alguns beijos roubados, ou até mesmo uma profunda
amizade. Ele sentia por ela o que Alec sentia? Dificilmente. Alec viu
Caroline partir com Somerson, viu o balanço de seus quadris, o elegante
conjunto de sua cabeça. Momentos atrás, ele estava brincando com ela, mas
ele era o único que ainda estava queimando com desejo, que estava ainda
pior agora. Ele havia cometido outro erro grave. Como ele se impediria de
subir as escadas para a torre agora?
Ele precisava de um banho frio, ou de um longo mergulho no lago
gelado. Quando a comitiva se dispersou, ele subiu, se colocou no calor e
conforto de seu tartan e saiu para a noite escura. O ar estava doce e fresco
por causa da chuva e perfumado de pinho e urzes.
Ele ouviu o som dos soluços de sua irmã antes de vê-la encolhida
em um banco de pedra junto à parede, os joelhos enrolados sob o vestido
branco. Megan parecia um fantasma de coração partido.
Alec sentou-se ao lado dela e puxou-a contra seu ombro e deixou-
a soluçar, até que sua tristeza diminuísse.
— O que aconteceu? — Ele perguntou.
— Eu pensei que Brodie me amava.
— Talvez ele a ame, — disse Alec.
— Então porque ele estava olhando para Sophie a noite toda? Por
que ele não estava olhando para mim? Ele mal disse duas palavras para
mim desde que ela chegou.
Como poderia Alec não entender? Toda a vez que Mears olhava
para Caroline ele era consumido pelos ciúmes, mas se Brodie tivesse
puxado Sophie em seus braços e a sentado na mesa para ter o seu momento
com ela durante a refeição, ele não teria sentido nada além de uma leve
surpresa, por ser o momento inapropriado — não que ele permitisse tal
impropriedade depois que eles se casassem, é claro. Ele reconhecia os
sentimentos de sua irmã por conta de seus próprios sentimentos sobre
Caroline.
— Brodie é muito jovem, assim como você, moça. Ele nunca
esteve mais longe de casa do que Glenlorne, — disse Alec. — E Ben Ardle
está a apenas dezesseis quilômetros de distância e não é tão grande quanto
Glenlorne. Você viu a tiara que Sophie usava hoje à noite? Talvez ele
estivesse olhando para aquilo. Aquilo impressionaria qualquer pessoa.
— Eu tenho joias também. — Megan fungou. Ela mostrou-lhe a
flor bonita em sua garganta. As pedras roxas e azuis brilhavam à luz das
velas que se derramavam pela janela.
— Onde você conseguiu isso? — Perguntou Alec.
— Lady Caroline emprestou para mim. Eu acredito que é de Lady
Lottie. Ela usaria isso, mas ela pode ver que eu queria parecer
especialmente bonita esta noite, para Brodie. Ela não é especial, Alec? Ela é
uma pessoa adorável. Ouvi a condessa Charlotte dizer que eles querem
mantê-la trancada pelo resto de sua vida, ou casá-la com um vendedor.
Alec se mexeu desconfortavelmente com a mudança de assunto.
Sua irmã colocou a mão na manga dele.
— Você não os deixaria fazer isso, você deixaria? As pessoas têm
que ouvi-lo, porque você é o Laird, não é? Ela poderia ficar aqui, ficar
conosco.
Alec fechou os olhos por um momento.
— Lorde Somerson é o irmão dela e seu guardião. Eu só quero o
que é melhor para ela, — ele disse, mas conseguia ouvir a dúvida em seu
tom. Ele sentiu outra pontada de culpa. Ele nunca deveria ter escrito para
Somerson.
— Eu sei que você não gosta dele, ou da condessa Charlotte. Não
deixarei transparecer pelo bem de Lady Caroline, mas não há nada que você
possa fazer? Se você não fosse noivo de Sophie, poderia se casar com
Caroline, não poderia? Eu queria que Sophie nunca tivesse vindo. Ela quer
mudar tudo.
— Eu pensei que nós estávamos falando de Brodie? — Alec
tentou esclarecer a situação.
— Suponho que estávamos, não? Você poderia mandá-lo se casar
comigo?
Alec acariciou seu queixo.
— Eu poderia, suponho. E se ele se recusar, eu poderia mandar
executá-lo. — Ele brincou, mas ela não sorriu. — Você gostaria disso,
querida, um homem que precise ser obrigado a casar com você? Você é
jovem ainda. Vá a Londres para a temporada, veja a cidade, conheça
pessoas e depois...
Megan engasgou.
— Não me diga que você quer que eu case com um inglês
também!
Ele balançou a cabeça, bateu na ponta do nariz dela, e se
perguntou de novo quando as sardas haviam desaparecido.
— Eu quero que você se case com um homem que você ame e
que ame você.
Ela pensou por um momento, depois se inclinou para beijar sua
bochecha.
— Eu não fazia ideia de que você era tão sentimental, Alec.
— Espere um pouco. Os homens são mais lentos para crescer do
que as mulheres. Esqueça Brodie por um ano ou dois, e depois veja se ele
ainda tem o seu coração.
— Obrigada, Alec. Você é muito sábio. É uma coisa boa você ser
o Laird de Glenlorne. As coisas vão ficar bem de novo agora, não vão?
Você vai fazer tudo certo. — Ela se levantou. — Eu vou entrar para falar
com Lottie. Ela disse que conhece todo mundo na Inglaterra que vale a pena
conhecer, e ela ficaria feliz em me patrocinar. Ela será uma dama casada até
lá, é claro.
Ele ficou onde estava e a observou ir. Se todos os problemas do
coração fossem tão fáceis de resolver, ele pensou.
Ele olhou às colinas, à velha torre, suas paredes desmoronadas tão
cheias de buracos que as estrelas brilhavam através dela. Seria um símbolo
da permanência do clã aqui nesta terra, ou o emblema de um povo tão
desmoronado e desesperado quanto a torre?
Havia quatrocentos anos contra o vento, a chuva, a neve e até
contra a guerra. Ela esteve lá durante toda a sua vida, mas ele mal a notou,
até o dia em que viu Caroline de pé na janela. A lembrança de encontrá-la
ali, de fazer amor com ela sob o teto aberto na véspera do solstício de verão
o deixou instantaneamente, desconfortavelmente, duro novamente. Quanto
tempo levaria para esquecê-la uma vez que ela deixasse Glenlorne? E se ela
ficasse, como Megan sugeriu?
Ele não podia imaginar Glenlorne sem ela. Ansiava por vê-la
todas as manhãs, vislumbrá-la caminhando até a aldeia ou subindo as
colinas apenas para ver a paisagem. O clã a aceitou com rapidez — até
mesmo Muira — uma honra rara para uma estrangeira. Entre Alec e a torre,
o lago brilhou e o vento estava ocupado soprando as últimas nuvens de
chuva do céu. Ele respirou fundo e percebeu o quanto ele amava Glenlorne,
do jeito que ele amava quando criança, quando seu avô ainda vivia.
Alec se sentia vivo aqui, não a criatura cheia de vergonha e
sombria que ele era em Londres. Angus MacNabb tinha sido severo e
taciturno durante sua vida, mas ele fez seu clã se sentir seguro e bem
cuidado. Alec se perguntou se ele conseguiria fazer isso também. Ele se
imaginou com uma família, um lar feliz, a vila reconstruída, uma escola, as
encostas repletas de ovelhas gordas e o gado resistente das Highlands. E
uma esposa amorosa, claro. Sophie
No entanto, Sophie era a única parte da imagem que soava falsa.
E ela era a única pessoa que ele precisava — junto com sua fortuna — para
que isso acontecesse.
— Que diabos você estava pensando? — A voz áspera de
Somerson exigiu, vagando pela janela acima de Alec. — Você considerou
minha posição por um momento antes de fugir, o embaraço que você
poderia ter causado?
— Você disse às pessoas que eu havia me retirado do país, doente.
Quanto tempo antes de você simplesmente dizer a eles que eu estava morta?
— Caroline respondeu. — Parece-me que você encontrou uma solução mais
conveniente.
— Não seja imprudente! — Ele berrou. Alec ouviu os passos
pesados de Somerson atravessarem o chão.
Alec ficou de pé em um instante. Ele se achatou contra a parede e
espiou pela janela aberta, através das sombras, pronto para impedir
Somerson de ferir Caroline. Ela estava de pé diante dele, com o queixo
erguido.
Alec recuou para as sombras para observar e ouvir. A espionagem
era uma habilidade útil que ele aprendera a serviço de Westlake.
— Você não vai me atacar, Neville. As pessoas veriam as marcas.
Eu não pretendia causar-lhe qualquer inconveniente. Eu simplesmente senti
que não possuía uma escolha.
— Você teve muitas escolhas. Dois bons pretendentes...
— Eu não amo nenhum deles. Eu nunca poderia amá-los, — disse
Caroline sem fôlego.
— Amor? Você parece sua mãe. Ela me disse que amava meu pai,
mas ela não passava de uma caçadora de fortunas. O amor não tem nada a
ver com o casamento para a nossa classe. Os enlaces nobres são feitos por
razões financeiras, para ganhos políticos, por terras e pedigree. Eu escolhi
pretendentes para você que respondiam a todos esses requisitos. O amor
não tem nada a ver com isso. Você tem muita sorte em receber propostas.
Você nunca teve uma temporada, nunca foi apresentada à sociedade. Falei
com Speed e Mandeville, com ambos. Eles ainda estão dispostos a se
casarem com você, embora você esteja arruinada. Se você tivesse feito isso
na Inglaterra, ninguém se casaria com você. Como vê, você é malditamente
afortunada, eu ainda posso consertar esse — pequeno erro.
— Eu não me sinto afortunada, — Caroline respondeu
tristemente. — Nem estou disposta a casar com nenhum cavalheiro.
— Então você não vai se casar, — ele ameaçou. — Eu sou seu
guardião, e se você não me obedecer, então eu vou levá-la para Starbury
Manor. Você vai ficar lá, permanentemente, e você desejaria estar realmente
morta. Você não tem escolha.
— Há uma outra escolha, Neville, — ela disse suavemente.
Caroline estava de pé no tapete em frente à escrivaninha, as mãos
entrelaçadas, mas não parecia submissa nem um pouco. A luz da vela
flamejou sobre duas manchas de cor em suas bochechas pálidas, e ela
levantou a cabeça. Alec sentiu uma onda de orgulho.
— Então você vai fazer o que eu digo e casar com quem eu
ordenar?
— Não. — Sua voz era baixa, mas firme.
— Não? — Alec ouviu a raiva no tom de Somerson.
— Vou assinar um papel, dar tudo o que tenho para você, você
pode ter meu dote.
Somerson olhou para ela, estreitando os olhos em descrença.
— O quê? Você ficaria sem dinheiro!
— Estou ciente das consequências. Eu entendo que meu dote é
bem grande. Deixe-me ir, Neville, e você pode ficar com o dinheiro. É um
arranjo melhor, não é? Você queria me casar com quem quisesse me levar.
Você ainda teria que pagar meu dote para meu marido. Dessa forma, você
pode mantê-lo e ainda se livrar de mim.
Somerson considerou o assunto, em silêncio.
Alec olhou para ela. Lady Caroline Forrester, meia-irmã de um
dos homens mais poderosos da Inglaterra, estava jogando tudo fora para ser
livre. Não foi isso que ele fez quando saiu de casa, jurando ir ao Ceilão,
fazer seu próprio caminho no mundo e nunca mais voltar? Não deu certo
para ele. Foi abatido e roubado no mesmo dia em que chegou a Londres. Se
não fosse por Westlake tirá-lo da sarjeta, ele provavelmente estaria morto
agora. Caroline não possuía tal protetor, não possuía nenhuma esperança,
mas ela estava com os ombros eretos, o queixo erguido, os olhos límpidos,
seguros do que estava fazendo.
— Muito bem. Se é isso que você quer. Eu escreverei o contrato
hoje à noite.
Ela balançou a cabeça.
— Quero que o homem de papai em York faça isso. Ele cuidou do
testamento da minha mãe também.. Eu quero que seja feito legalmente,
então nem você, nem eu, podemos voltar e dizer que fomos enganados.
— Eu sou o conde de Somerson! Ele vai escrever o que eu disser
a ele.
— Talvez sim, mas ele me conhece, conheceu minha mãe. Eu
insisto nessa condição.
— Você não está em posição de insistir em nada! — Somerson
lembrou a ela.
— Se você me mantiver, isso vai lhe custar dinheiro, quer eu me
case ou viva minha vida em isolamento em Starbury. Você tem tudo a
ganhar e apenas uma meia-irmã indesejada a perder.
Alec a observou se mover para a porta.
— Onde você está indo? Eu não lhe dei licença para ir embora —
Somerson balbuciou.
Caroline se virou para enfrentar seu meio-irmão.
— Eu disse o que queria dizer. O que mais há para falar? Por
favor me desculpe. Eu ainda estou empregada aqui, e devo verificar as
meninas.
— Por que você, — Somerson começou, mas parou quando
percebeu que ela havia saído do quarto e ele estava falando com o vazio.
Alec sentou-se em um banco para considerar o que ouviu. Ela era
corajosa e esperta, sabia exatamente como derrotar Somerson, mesmo que
isso lhe custasse tudo. Ela entendia o que estava fazendo, ficou claro em
seus olhos. Sua liberdade, sua honra, sua independência, e sua vida valiam
mais para ela do que dinheiro. Ele inclinou a cabeça para trás e riu
silenciosamente.
Ela era linda, corajosa, uma tigresa de frente para um dragão.
Ele estava mais tentado do que nunca a encontrá-la, puxá-la em
seus braços, e... ele gemeu e ficou de pé, e pegou o caminho que levava ao
lago. Ele precisava de um longo e frio mergulho.
— Você viu aquilo? — Angus perguntou a Georgiana enquanto
Caroline saía da sala. — Primeiro ela salvou a vida de Alec, e depois ela
colocou o bastardo do Somerson em seu lugar! Ela é magnífica.
Georgiana suspirou.
— Ela ainda vai embora, Angus. Ela não pode ficar.
— Por que não? Alec vai mantê-la segura, — disse Angus. — Ele
é um homem de honra. Ele fará o certo por ela.
Georgiana cruzou os braços sobre o peito.
— Eu diria que ela é mais do que isso, ela pode cuidar de si
mesma. Alec está prometido a Sophie. Se Caroline ficar aqui, ela ainda
estará condenada a viver uma vida de mágoa e tristeza, você não vê? Ela
tem orgulho e honra próprios. Ela nunca consentiria em viver como amante
do seu neto.
Angus olhou para ela.
— E as meninas? Elas começaram a amá-la. Depois, tem os
aldeões. Eu duvido que eles vão amar Sophie. Caroline pertence a
Glenlorne, mas Sophie será para sempre uma estranha. — Ele olhou para
sua amada, percebendo que ela teria sido uma estranha em Glenlorne
também se ela tivesse ficado, odiada pelo clã apenas por ser a filha de um
inimigo. — Você nunca poderia ter ficado comigo, poderia, todos aqueles
anos atrás?
Ela sorriu tristemente.
— Você acha que eu não tenho a coragem de Caroline? Teria sido
quase impossível, mas eu teria tentado, Angus. Eu teria suportado qualquer
coisa para estar com você, para passar minha vida aqui. Como você pode
perguntar isso?
— Como eu não posso? — Ele exigiu. — É impossível, mesmo
agora.
— Se você acredita mesmo nisso, então esta maldição nunca
terminará, — disse Georgiana com tristeza, e desapareceu na escuridão.
Angus estava sentado na margem do lago, observando Alec nadar
nas águas geladas, no escuro. Ele esteve lá tempo suficiente para congelar,
mas ele nadou para a frente e para trás, para a frente e para trás, seu corpo
musculoso cortando a superfície negra como um homem tentando escapar
de um naufrágio.
Angus ainda estava esperando quando Alec finalmente saiu e
desabou no banco ao lado de seu tartan. Angus sabia muito bem por que
Alec estava aqui. Era por causa de Caroline. Ele passou muitas noites na
água gelada, tentando esquecer Georgiana, seu corpo tão teimoso quanto
seu coração partido por deixá-la ir. Ele olhou à água fria e sabia que Alec
estava começando a enfrentar uma vida inteira de noites assim.
— Rapaz, você vai ter que consertar isso, — ele murmurou,
embora soubesse que Alec não poderia ouvi-lo.
— Como diabos eu devo consertar isso? — Alec murmurou para
o lago.
— É um enigma. Eu sei que você precisa do dinheiro.
— Sophie, — ponderou Alec.
— Sim. Ela tem muito, mas há mais do que apenas dinheiro. Eu
vivi minha vida inteira sem amor, nadando neste maldito lago porque eu
não conseguia esquecê-la.
— Caroline, — Alec suspirou.
— Georgiana, — suspirou Angus. — Não que eu pudesse ter me
casado com ela, entende. — Ele tirou a boina e jogou no chão frustrado. —
Eu não tive escolha, e você tem. Eu entendo, rapaz, verdadeiramente eu
entendo. Você precisa escolher entre o desejo do seu coração e seu dever
como Laird.
Alec olhou para o lago e à torre, sem ouvir uma palavra, e Angus
seguiu seu olhar.
— Sim, eu tenho minha própria história com aquela torre, rapaz.
Eu sei muito bem que isso pode deixar um homem maluco, lembrando,
desejando que as coisas tivessem sido diferentes. Alec não se mexeu. —
Och, eu não lhe ensinei nada? Responsabilidade, dever, lembro-me de
ensinar isso. Provavelmente sentado bem aqui também. O clã vem primeiro,
eu me lembro de dizer a você. Eu acreditava nisto então. Eu deveria ter lhe
ensinado sobre o amor. Quando perdi Georgiana, casei-me por dinheiro. Eu
precisei, depois de Culloden. A família da sua avó era leal à Coroa. Eles
mantiveram suas terras, sua fortuna e ajudavam a caçar os pobres tolos que
lutavam por Charlie, mas casar-me com ela significava que eu poderia
manter Glenlorne, e eu pensei que era tudo o que importava. Eu não poderia
ter ido atrás de Georgiana, você entende — ela já estava casada com
Somerson, meu rapaz. Era tarde demais para nós. Mas você, Alec, você tem
uma escolha a fazer, e eu espero que você faça, antes que seja tarde demais.
Alec esfregou o cabelo molhado com uma dobra de seu tartan,
indiferente.
— Eu sei o que você está pensando. Passei muitas noites nadando
aqui, tentando não me lembrar, — disse Angus. Ele sorriu para a água. —
Och, ela era uma coisa doce, assim como Caroline é.
Alec levantou-se e envolveu seu tartan xadrez em torno de seus
quadris, cingindo-o no lugar. Ele não se incomodou em colocar a camisa. A
jogou por cima do ombro e voltou para Glenlorne.
Angus o observou ir e sentiu novamente, a agonia da perda.

Capítulo 37

Estava feito. Caroline andava de um lado para o outro no quarto


dela. Ela estava livre. Não estava?
A liberdade teve um preço. Um preço terrível. Ela provavelmente
passaria a vida cuidando dos filhos de outras pessoas como governanta ou
professora. No entanto, ela não faria de outra forma.
Ela provavelmente nunca se casaria e não desejaria. Seu coração
pertencia novamente a um homem que ela não podia ter. Infelizmente, desta
vez ela não estava apenas esperando com carinho que um certo cavalheiro a
propusesse, e fazendo o seu melhor para se convencer de que estava
apaixonada por ele.
Agora ela sabia que aqueles sentimentos pálidos não tinham sido
amor, apenas um desejo de pertencer a algum lugar, com alguém, porque
ela havia sido criada para esperar casar dentro de sua classe, produzir
herdeiros, e cuidar de suas propriedades. Não haveria aventuras, nem
surpresas, nem Alec.
Mesmo que estivesse ferida neste momento, ela não trocaria as
últimas semanas por nada no mundo.
Era um alívio estar livre de Somerson, ser independente, embora
tivesse sido mimada e cuidada durante toda a sua vida, ter dinheiro e luxos.
Ela poderia viver sem eles. Perder Alec foi mais difícil. Agora sua escolha
estava feita, ela sabia agora que não poderia permanecer em Glenlorne e ver
ele se casar com Sophie.
Ela foi até a janela e sentou-se na borda, olhando para a velha
torre, de pé sobre o vale.
— Mantenha-o seguro, faça-o feliz, — ela sussurrou.
O barulho do cascalho pegou-a de surpresa. Quem estava lá fora a
esta hora tardia? Alec subia a estrada. Seus olhos se arregalaram e ela olhou
para ele do anonimato de sua janela, bem acima dele. Ele estava usando o
kilt, mas o peito estava nu, a camisa por cima do ombro. Seu cabelo estava
molhado, brilhante. A luz das tochas que iluminavam o exterior do castelo
chamejava sobre os ombros largos e o peito nu, transformando a carne em
ouro.
A boca de Caroline se encheu de água, e ela sabia exatamente o
quão quente a pele dele era, o quão duro era o músculo por baixo, e como
ela havia cravado as unhas nos ombros dele enquanto ele a amava. Sua
primeira vez. E a última, se ela não contasse o jogo perverso que ele fez
com ela no jantar. Seu corpo corou e formigou. Ela queria mais.
Ela mordeu o lábio e fechou os olhos, tentando acalmar o desejo.
Quando ela os abriu os novamente, Alec parou de andar. Ele
estava abaixo da janela dela, olhando para ela, do jeito que ele olhara no dia
em que ela o viu pela primeira vez. Ela prendeu a respiração e apertou a
mão na pedra do peitoril, e sentiu seu olhar como um dedo suave movendo-
se sobre sua pele, seu batimento cardíaco acelerado, elevando os arrepios,
fazendo seu desejo correr pelas veias. Ela olhou para trás, incapaz de se
mover, mesmo que fosse para romper o feitiço.
Ele gemeu e o som suave ecoou nas pedras.
Ela viu quando ele se virou, do mesmo jeito que ele veio, e
desapareceu no caminho que levava ao lago.
Por um longo momento Caroline permaneceu na janela,
observando o caminho escuro, desejando que ele voltasse, subisse as
escadas, abrisse a porta do quarto dela como antes. Ele não viria. Ela
deveria ir para a cama, ser sensata, mas que sentido havia em deitar? Ela
não dormiria, não com tanta coisa na cabeça para impedi-la. Ela precisava...
Ela fechou os olhos. Ela não deveria.
Ela pegou um xale e desceu as escadas correndo.

Capítulo 38

Ela ouviu o barulho de água quando ela se aproximou do lago.


Ela parou nas sombras e olhou através da superfície escura e sedosa. Ela viu
a cabeça dele aparecer, como uma lontra, e ela deslizou mais
profundamente na escuridão sob as árvores, e quase tropeçou nas roupas
dele, descartadas. Ela deveria ir, ela pensou, ir embora antes que ele a visse,
e exigisse uma explicação. Ela não possuía uma. Ela estava em uma missão
idiota. Ela se virou.
— Não vá, — ele a chamou. — Ou, pelo menos, não vá se você
estava procurando por mim.
Caroline juntou as mãos com força enquanto entrava em cena.
— Eu não estava, — disse ela. — Na verdade não. Eu não
conseguia dormir. Eu estava apenas andando. — Aquilo soou como uma
desculpa bem fajuta, de fato — que tipo de tolo andaria sozinho à noite?
Lembre-se, que tipo de doido nadaria à meia-noite? — A água está fria? —
Ela perguntou, esforçando-se por um tom de conversa.
— Não é frio o suficiente, — ele respondeu.
Caroline franziu a testa.
— O que isso significa?
— Quer se juntar a mim e descobrir?
Ela piscou. Ele estava sugerindo que ela tirasse a roupa, colocasse
ao lado da sua na margem e nadasse? Ela nunca fez uma coisa dessas, nem
mesmo quando criança. Ainda assim, ela foi tentada. Ela viu as crianças
locais nadando no lago durante o dia. Era apenas mais um dos prazeres de
Glenlorne. Um raio de consternação a perfurou.
— Estou indo embora, — ela disse.
— Fique à vontade, — ele falou de volta.
— Quero dizer, estou deixando Glenlorne.
Ele ainda estava na água por um momento. Ela olhou para os
dedos, brancos como os ossos ao luar.
— Eu vou ficar para o casamento — o casamento de Lottie, —
então eu irei. — Ela tomou a decisão enquanto falava. Ela não podia ficar
para o casamento, assistir Sophie sorrir e corar enquanto Alec sorria para
ela, a beijava, a amava.
Demasiado tarde ela percebeu que ele estava saindo. Ela viu a
silhueta dele se levantando do lago, ombros largos, quadris estreitos, pernas
compridas, a água escorrendo de sua pele enquanto ele caminhava em sua
direção. Ela não conseguia tirar os olhos dele. Seu coração se apertou e sua
boca secou em cinzas.
Ele parou a poucos metros dela.
— E para onde você vai? — Ele colocou suas mãos nos quadris,
como se ele estivesse completamente alheio a sua nudez. Parecia uma
estátua grega, sem a folha de figo, esculpida e perfeita. Um arrepio de
desejo passou por ela. Ela se inclinou para pegar a camisa dele, entregando
a ele com os olhos devidamente desviados.
Ele jogou-a de lado e deu um passo em direção a ela. Colocou um
dedo sob o queixo dela e forçou-a a olhar para ele.
— E para onde você vai? — Ele perguntou novamente. — Eu
acho que mereço uma resposta.
A raiva explodiu e ela afastou a mão dele.
— Como posso ficar? Depois do jantar hoje à noite, depois... —
Ela parou.
— O que William Mears é para você, Caroline? — Ele perguntou.
— Você se ilumina no momento em que ele sorri para você.
— William? — Ela guinchou. — Você fez aquilo porque eu sorri
para Will?
Ele colocou as mãos nos quadris novamente, e ela tentou o seu
melhor para não olhar o comprimento de seu corpo.
— Will, é assim?
— Nós crescemos juntos. Todos pensaram que poderíamos nos
casar algum dia, mas ele é prometido de Lottie. Você não pode ter ciúmes
de Will. Eu não o amo... — Ela parou antes de admitir algo que deveria ser
mantido escondido.
— Ele certamente parecia enamorado de você. Eu conheço a
luxúria quando a vejo.
Ela também, e a evidência de seu desejo era óbvia. Ela cruzou as
mãos sobre o peito.
— Will é como um irmão.
— Ele não estava olhando para você como um irmão.
— Ainda assim, isso não lhe dava o direito de fazer o que você
fez.
— Você gostou.
— Eu estava mortificada.
Eles estavam de pé, nariz com nariz. Ele estendeu a mão e
acariciou a bochecha dela com seu dedo gelado.
— Você sabe quão bonita você é quando está devidamente
satisfeita?
— Aquilo não foi apropriado! Por que você acha que eu te espetei
com um garfo? — Ela cometeu o erro de olhar para a perna, procurando
pelas feridas. Sua respiração ficou presa com a visão de sua ereção.
— Não vá, — ele sussurrou.
— Você quer dizer agora, neste momento? — Ela perguntou,
surpresa com o tom rouco de sua voz, a fraqueza em suas pernas. — É tudo
o que existe, Alec. Eu não posso ficar.
— As garotas precisam de você.
— Não é sobre isso, — ela murmurou, intoxicada pela
proximidade de seu corpo.
— Eu também preciso de você, — ele disse.
Caroline viu o movimento de sua garganta quando ele engoliu em
seco. Ela balançou a cabeça.
— Só porque eu sou sua serva. Porque eu sou conveniente. Você
tem Sophie. Não há necessidade de pedir desculpas pelo que aconteceu na
torre. Foi o fogo, a bebida, o...
Seus dedos em sua bochecha a pararam. Sua mão era macia, fria,
gentil enquanto acariciava seu rosto, envolvendo sua bochecha.
— Foi mais do que isso. Não se menospreze. Eu queria você
Ela olhou para as cavidades escuras de seus olhos.
— Você pensou que eu era Sophie.
— Eu pensava que você era perfeita.
Ela sentiu a proximidade de seu corpo, o calor de sua pele, apesar
do fato de que ele estava nadando em águas geladas momentos antes. Ela
apertou a bochecha contra a palma da mão dele e fechou os olhos por um
momento, desejando que apenas desta vez, que tudo fosse verdade, e real, e
ela não estivesse amaldiçoada.
Ele gemeu.
— Droga, Caroline, ou me beije ou me mande de volta para o
lago gelado! Não suporto mais isso, estar perto de você, e não tocar em
você.
Com um grito de necessidade, ela o beijou, batendo seus lábios
nos dele, pressionando-se contra o comprimento úmido de seu corpo nu.
Alec pegou os lábios dela contra os dele. Seu corpo estava quente
contra sua pele fresca, e ele moldou o comprimento do corpo dela ao dele,
devorando-a, empurrando a língua em sua boca A língua dele, deleitando-se
com o gosto dela. Ela era tudo o que ele lembrava que ela era, tudo que ele
sonhou por semanas. Mais. Ele rompeu o beijo, pressionando suavemente
em seus ombros.
— Deus, Caroline. Desta vez eu vou lhe dar a chance de dizer
não, de me recusar. Corra de volta para o castelo e tranque sua porta. — Ele
murmurou contra seu ouvido, beijando a pele.
— Não, — ela disse.
— Eu não posso pedir para você ficar. — Sua mão mergulhou no
corpete de seu vestido para envolver seu seio, o peso suave enchendo sua
palma, o mamilo endurecendo com seu toque.
— Eu estou indo embora, — ela murmurou, beijando sua
bochecha, seu queixo, sua boca.
— Esta é a última vez, — ele murmurou contra os lábios dela.
— A última vez, — ela concordou, sua voz rouca.
Ele não conseguia mais pensar, não queria considerar o que a
manhã traria, ou como seria Glenlorne sem ela. Ela mordiscou o lóbulo de
sua orelha e ele gemeu.
Ele pressionou as costas contra uma árvore, abriu as pernas,
puxou-a entre elas, e ela arqueou os quadris contra ele, esfregando-se,
pequenos suspiros de desejo escaparam dela. Não havia necessidade de
dizer a ela o que ele queria. Ela já sabia. Ela se abaixou e agarrou seu pênis
e ele gemeu.
As mãos dele se atrapalharam com os botões na parte de trás de
seu vestido, a luxúria tornando-o desajeitado. Sua exploração gentil em seu
corpo o estava deixando louco, dificultando a concentração. Deixou os
botões e deslizou os dedos pelos contornos quentes dos seios para retirá-los
do corpete. Seus mamilos atingiram instantaneamente os dedos dele, e ela
ofegou e jogou a cabeça para trás, oferecendo-se para as mãos dele,
exigindo mais sem palavras.
Ele segurou a mão dela, percorreu os poucos passos até onde
estava jogado o tartan descartado e caiu, puxando-a para baixo em cima
dele. Longos cabelos caíram sobre ele, fazendo cócegas em seu rosto e seu
peito. Ele podia sentir o calor dela quando ela montou em seus quadris, e
ele se atrapalhou para levantar a saia, deslizando a mão por cima das coxas
sedosas, mergulhando entre suas pernas até encontrar os pelos em seu
centro. Ele inseriu um dedo, sentiu ela tremer e suspirar. Ela estava
molhada, pronta para ele, e ele acariciou as pétalas macias de sua carne,
deixando-a ainda mais molhada. Ele a viu gemer, beijando-a com força,
usando a língua em sua boca enquanto usava os dedos abaixo, a elevando
cada vez mais alto.
— Agora, — ele ordenou, segurando os quadris dela,
posicionando-a. Ela mergulhou sobre ele e estremeceu em um clímax
renovado quase imediatamente. Ele empurrou dentro dela, duro e rápido,
motivado pela necessidade, segurando as nádegas em suas palmas, sentindo
a flexão dos globos quentes da carne feminina enquanto ela se movia com
ele, lutando por prazer no mesmo tempo que ele. Na escuridão, ele podia
ver os seios expostos acima dele, os mamilos redondos e escuros, viu seu
lábio preso entre os dentes brancos.
— Mais uma vez, amor, — ele murmurou, segurando sua própria
liberação, era como tentar segurar uma tropa de cavalos fugitivos. Ele
estava no limite, enterrado no profundo paraíso de seu corpo. Ela deu um
grito suave, girando os quadris, tentando levá-lo ainda mais fundo. Ele
parou de pensar em qualquer coisa, além de como ela era deliciosa, como
tudo parecia certo. Ele cerrou seus dentes e empurrou dentro dela até que
ela gritou, e ele pressionou dentro dela o mais longe que conseguiu ir, e
deixou as ondas derretidas de sua liberação reivindicá-lo.
Ele a apertou contra o peito. Ainda dentro dela, acariciando os
planos suaves de suas costas, ouvindo sua respiração cantando através de
seu corpo. Ele beijou seu pescoço e ela levantou a cabeça para beijar seus
lábios novamente. Ele acariciou suas costas, memorizou as curvas de sua
figura, a suavidade de suas coxas e nádegas, o cheiro de sua pele.
— Quando você vai partir? — Ele perguntou.
— Em alguns dias. Uma vez que os arranjos sejam feitos, —
disse ela, e levantou-se, escorregando de seu corpo. Ele sentiu o ar frio da
noite. Ela colocou uma mecha de cabelo atrás da orelha e se virou,
erguendo-se para endireitar o vestido timidamente. Ele se apoiou no
cotovelo.
— Venha dormir por um tempo, — disse ele, estendendo a mão.
— Meu plaid vai nos cobrir.
Ela ficou onde estava.
— Eu queria. Mas está quase amanhecendo. Alguém pode nos
ver, e precisamos nos levantar em algumas horas para a caçada.
Ele esqueceu isso.
— Claro, — ele disse, levantando-se. — Eu voltarei com você,
pelo menos até a base da colina. — Ele puxou a camisa por cima da cabeça,
sacudiu o plaid, dobrou-o, enrolou-o nos quadris e prendeu o cinto. Ela
caminhou à frente dele ao longo do caminho estreito, samambaias e flores
roçavam sua saia.
Eles chegaram ao ponto onde a floresta terminava e o gramado
começava, e ela parou, virando-se para ele nas sombras. Ele tocou o rosto
dela.
— Eu desejo, — ele começou, mas ela abaixou a cabeça, e falou
de volta.
— Você está prometido para Sophie.
— Sim. Seria desonroso romper o noivado, isso... — Ele gemeu.
— Eu nunca fiz uma coisa honrosa na minha vida, então por que isso
importa tanto agora?
Ela sorriu na meia luz.
— Porque você é o Laird de Glenlorne. Seu clã precisa de um
líder, Alec — ela disse suavemente. — Isso é o que importa.
— Eu não fui honrado com você.
— Eu não culpo você por nada disso. Nem me arrependo do que
aconteceu.
— Você é uma mulher notável, Caroline. Para onde você vai
quando partir?
Ela balançou a cabeça, e permaneceu muda.
— Pelo menos deixe-me ajudá-la a encontrar um lugar, — ele
ofereceu.
— Não, Alec. Eu não quero isso.
— Por quê? — Ele perguntou, embora já soubesse a resposta.
— Porque você saberá onde me encontrar. É melhor nos
separarmos definitivamente. — Ela se virou e começou a caminhar em
direção ao castelo. Ele pegou o braço dela, puxou-a para trás.
— Você saberá onde me encontrar, no entanto. Você vai voltar
para mim se precisar de ajuda, não vai? — Ele a queria novamente, queria
arrastá-la para baixo, deitá-la nas samambaias, e deixar que a encontrassem
em seus braços, mas ele não podia.
Ele tinha responsabilidades. Como ele odiava esta palavra.
Ele se virou, frustrado, com raiva, e voltou para a floresta.
— Você não vai voltar para o castelo? — Ela chamou atrás dele.
Ele parou.
— Acho que vou dar outro mergulho, — disse ele. Ele voltou e
beijou sua testa. — Boa noite, Caroline, — ele disse suavemente.
Ela encontrou os olhos dele.
— Boa noite, Alec.
Ele sabia que ela estava ali o observando se afastar, mas ele não
olhou para trás.

Capítulo 39

A turma da caçada esperava que a neblina se dissipasse antes de


partir às colinas para caçar. Leith olhou para as pessoas que estavam atrás
dele e virou o corpo para olhar para o companheiro.
— O que exatamente estamos procurando, Jock?
Jock examinou as urzes, a mata junto ao lago e as encostas que
levavam à antiga torre.
— Qualquer coisa na qual os sassenachs possam atirar.
Leith estufou as bochechas e soprou ar.
— A temporada de perdizes não começará antes de quase uma
quinzena.
Jock cuspiu na urze.
— Sim, eu sei. Os sassenachs também. Vamos esperar que as
perdizes não saibam.
— Existem lebres. Eles gostarão?
Jock suspirou.
— Desde que não atire nas ovelhas, tudo bem para mim.
Ele deu um tiro e Leith mergulhou na urze. Um pássaro se
afastou, soltando seu descontentamento, mas ileso.
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— Aquilo é um bonxie ! — Leith apontou. — Você não pode
comer aquilo! — Ele tirou sua boina e ficou boquiaberto olhando o buraco
da bala.
A ave girou e veio mergulhar em seu pretenso assassino. Várias
senhoras na trilha gritaram, soando como gaivotas, e os homens se
abaixaram e tentaram recarregar ao mesmo tempo. Apenas o Laird e suas
irmãs agitaram os braços para afastar o pássaro. Leith tirou a poeira das
calças e Jock lhe deu uma cotovelada.
— Vamos rapaz. Comece a procurar por algo que eles possam
apontar, atirar e correr como se fugissem do diabo para o outro lado.
Lottie observou como Sophie puxou o elegante xale de cashmere
com mais força sobre o casaco pesado que estava abotoado até o queixo. Seu
nariz estava vermelho de frio. Na opinião de Lottie, o tempo estava bastante
agradável, embora houvesse uma névoa prateada nas encostas.
— Talvez Lorde Somerson, Charlotte e a condessa Devorguilla
fossem sensatos em ficar para trás. Espero que o tempo permaneça estável
— disse Sophie, ansiosa. — Isso é considerado estável?
— Eu não sei, mas você está certa — na Inglaterra, ficaríamos em
casa com mamãe e ficaria entediada, — respondeu Lottie.
— Como é que vamos ver alguma coisa, quanto mais caçar com
toda essa neblina? — Reclamou Sophie. — A grama molhada vai arruinar
minhas botas.
— Você deveria ter usado umas mais resistentes, — disse Lottie.
— Eu uso minhas botas de montaria, veja?
Sophie fungou.
— Mas estas combinam com o meu vestido. Elas são tingidas à
mão para combinar perfeitamente. O que eu vou vestir se elas estiverem
arruinadas? — Ela moveu o delicado arco em seu ombro. Até a aljava
combinava com suas botas, e a penugem das flechas, combinava com as
plumas de seu pequeno e elegante chapéu.
— Você acha que um dos cavalheiros me emprestaria uma arma e
me ensinaria a atirar? — Perguntou Lottie.
Sophie pareceu horrorizada.
— Bom céu, Lottie, você não pode dizer isso! Uma arma?
Lottie levantou o queixo.
— Eu quero dizer exatamente isso. Meu pai me proíbe, o que me
deixa mais ansiosa para tentar.
— Meu pai diz que atirar com arco e flecha é a única arma
adequada para uma dama.
— Mas você já atirou em algo que não seja um alvo? Uma perdiz
ou um faisão, talvez? — Perguntou Lottie, olhando o pequeno arco
decorado.
— Claro que não! Por que eu faria isso? Nós temos jardineiros e
caçadores para fazer isso.
— Somente pela aventura.
Sophie parecia mais horrorizada com a ideia de aventura do que
com a ideia de caçar alguma coisa.
— Aventura? Ora, sua criatura ousada, o que na terra você
conseguirá com isso, Lottie? — Ela apontou para onde William estava
andando na frente delas, com Caroline. — O que seu noivo diria sobre isso?
Lottie fungou.
— William não se importa com aventuras, ou por excitações de
qualquer tipo. Ele nem gosta de dançar. Ele também não se dedica a esportes
masculinos como boxe ou corridas de cavalos.
Os olhos de Sophie estalaram.
— Cruzes!
— Eu tive um admirador, uma vez, que me deixava segurar as
rédeas, foi bem emocionante. Eu perdi meu chapéu.
— Espero que não tenha sido caro, — disse Sophie. — Graças a
Deus, seu William é do tipo sensato. Você estará totalmente a salvo de danos
com ele.
— Sim, suponho que sim, — murmurou Lottie. — Oh, eu queria
ser tão corajosa quanto Caroline. Eu adoraria ter uma aventura, mesmo que
pequena, antes de passar o resto dos meus dias sendo totalmente segura.
Sophie riu acidamente.
— Não seja boba. Charlotte diz que ela está muito arruinada.
Lottie observou sua tia conversando com William enquanto eles
caminhavam.
— Ela não parece arruinada. Ela parece... Eu não sei. Mais feliz,
mais bonita, viva.
Sophie ergueu o queixo.
— Nenhum cavalheiro decente, de título e fortuna sequer olhará
para ela agora, pelo menos não como esposa.
Os olhos de Lottie se arregalaram quando ela considerou o que
isso significava.
— Pobre tia Caro!
O sorriso de Sophie era apertado e malicioso.
— Então você vê agora o que desejar aventuras vai lhe trazer?
— Talvez você esteja certa, — Lottie murmurou, olhando para sua
tia.
Caroline jogou a cabeça para trás e riu de algo que William disse,
seu cabelo ruivo brilhando contra a névoa, suas bochechas ficando
vermelhas. Lottie franziu a testa. Ela nunca conheceu o lado divertido de seu
noivo.
Sophie pegou o braço dela.
— Claro que eu estou, eu nunca estou errada. — Ela acenou para
um servo que carregava cadeiras dobráveis com o monograma do brasão de
Bray. — Vamos sentar aqui por um tempo e descansar, — ela disse, embora
eles não tivessem saído nem há meia hora. Lottie sentou-se ao lado da amiga
e observou Caroline e o resto do grupo desaparecerem na neblina.
— Devo dizer, Caroline, você está bem esta manhã, — disse
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William, quando caminhavam atrás dos ghillies . — Muito bem, na
verdade.
Caroline olhou para ele.
— Não me diga que Somerson também disse a você que eu estava
à beira da morte.
— Não, claro que não. Eu sou quase da família. Disseram-me que
você havia se afastado de Somerson Park para considerar suas escolhas
matrimoniais. Ele estava olhando para ela com o tipo de interesse que ela
uma vez ansiara. Ele deveria olhar daquele jeito para Lottie, não para ela,
mas Lottie estava sentada na encosta da colina com Sophie, com Brodie
descansando a seus pés como um cachorro grande.
— Eu estou, — disse ela, voltando sua atenção para ver Alec
andando com Megan.
— Oh! — Ele murmurou, e parecia quase abatido. — Quero dizer,
decidi não me casar, — esclareceu Caroline.
— Oh! — William se iluminou. Ele lambeu seus lábios e deu um
passo para o lado dela.
— Lottie vai ser uma linda noiva.
— Quem? — Perguntou William como uma coruja distraída.
Caroline levantou uma sobrancelha e lançou-lhe um olhar reprovador. —
Oh! Lottie! Sim, claro. Lottie. — Ele disse o nome dela como se estivesse
tentando lembrar se conhecia uma dama com esse nome.
— Estou ansiosa pelo casamento, — disse Caroline, enfatizando a
palavra. — Minha querida sobrinha e meu amigo de infância.
Ele estremeceu e mordeu o lábio, os olhos redondos e tristes como
os de um filhote de cachorro.
— Amigo? — Ele perguntou.
— Amigo, — ela disse com firmeza.
— Oh! — Desta vez, sua voz caiu uma oitava, indo para as
profundezas da decepção. — Caroline, se você não vai se casar, o que você
vai fazer? Você vai tomar um... — Ele ficou rosa até as pontas das orelhas.
— Um protetor?
Caroline piscou para ele por um momento. Estaria ele
honestamente sugerindo que se não fosse boa o suficiente para se casar, ela
poderia consider se tornar a amante do marido de sua sobrinha? Ela jogou a
cabeça para trás e riu.
— Eu sou perfeitamente capaz de me proteger. — Ela lançou um
olhar para Lottie. — Oh, olhe, lorde Mandeville está mostrando a Lottie
como atirar.
O rosto de William passou de escarlate para branco como a neve
em um instante, e subiu a encosta até a noiva dele.
— Eu decidi que você está certo, Alec. Brodie não é o homem para
mim. — Megan passou o braço pelo braço de Alec enquanto atravessavam a
urze.
— Oh? E o que a fez decidir isso? — Ele perguntou. Olhou por
cima do ombro para o lugar onde Caroline andava com William Mears,
notou a cor rubra em suas bochechas e sentiu uma onda de desejo. Ele
engoliu um gemido e se concentrou em sua irmã.
— Ele é um pouco bobo, não é? Ele não lê livros. Ele nem
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conhece a história do clã e acha que seu avô costumava ser o seannachie do
nosso avô! O vovô não descansaria em seu túmulo se pensasse que as velhas
histórias estavam prestes a se perder.
— E o que você propõe que façamos a respeito disso? —
Perguntou Alec.
— Seria difícil aprender isso? Não apenas contando em voz alta.
Eu poderia escrevê-las, guardá-las, passá-las para meus próprios filhos, e
para os seus.
Alec olhou para ela surpreso.
— Não, não seria difícil. Eu diria que há muita gente velha que se
lembra bem das histórias. Você está dizendo que deseja ser a próxima
seannachie dos MacNabb? Levará tempo para juntar todas essas histórias.
Sem mencionar que algumas pessoas podem lembrar a mesma coisa, de
maneira diferente das outras.
Megan sorriu.
— Eu quero. Eu amo Glenlorne, e vai demorar muito até a
temporada de Londres.
— E se você se casar com um lorde inglês? — Perguntou Alec.
— Então eu estaria mais bem preparada para passar os verões aqui
na Escócia, não é mesmo?
Alec examinou seu rosto jovem, viu a confiança em seus olhos.
Ele beijou sua testa.
— Com quem quer que você se case, moça, ele será o mais
sortudo dos homens.
Ela sorriu para ele, depois protegeu os olhos com a mão e olhou
para os ghillies, batendo de leve nos arbustos.
— Acho que vou começar perguntando a Jock, — disse ela. — Ele
conhece todo mundo. Você acha que ele vai se importar?
Alec riu.
— Está doida? Eu acho que você vai ter dificuldade em fazê-lo
parar de falar quando ele começar.
Ele observou sua irmã descendo a colina.
— Oh! — Caroline encontrou Alec encostado em uma árvore,
olhando para a floresta. — Oh! — Ela parou onde estava, sentindo o calor da
pele. — Eu estava procurando por Megan. Eu pensei que ela estava com
você. — Ele colocou um dedo nos lábios dela e apontou. Em uma pequena
clareira, uma corça e sua cria estavam pastando. Sua arma estava encostada
na árvore ao lado dele. Ela sentiu uma emoção quando olhou para eles. Ele
esperou até eles seguirem em frente.
— Megan está com Jock e Leith. Ela está segura o suficiente, —
disse ele.
A neblina levantou e o sol estava começando a sair. O rosto dela
estava vermelho com o calor crescente do dia. Alec sentiu o coração apertar,
e ele enrolou as mãos em punhos para evitar alcançá-la e derrubá-la na urze.
Ela estava corada sob o seu escrutínio, provavelmente totalmente
consciente do que ele estava pensando. A ideia de que ela estava pensando a
mesma coisa, fez pouco para conter o desejo dele. Ela se virou, as bochechas
vermelhas e fingiu estar interessada na vista.
Ele olhou à floresta através dos olhos dela. A floresta estava fresca
e escura e cheirava a pinheiros. Acima da copa das árvores, a velha torre
olhava para eles. Ele começou a andar ao longo do caminho, com a intenção
de guiá-la de volta aos outros, antes de ceder ao desejo de beijá-la ou fazer
muito mais do que isso. Eles caminhavam em silêncio, o chão coberto de
musgo abafando seus passos.
Um soco forte no ombro atirou Alec para trás. Seus dentes bateram
quando a força do golpe expeliu o ar de seus pulmões. O jorro quente de
sangue veio em seguida, no momento em que outra bala zuniu no alto,
depois a dor.
— O que... — Caroline começou. O próximo tiro atingiu a árvore
ao lado de seu rosto. Ele pegou a mão dela e a arrastou para o chão.
— Alguém está atirando em nós! — Ela disse sem fôlego. —
Parem! — Ela gritou para avisar o caçador de seu erro.
A próxima bala atingiu o chão ao lado deles.
Seu braço direito parecia de chumbo, e ele sentiu o sangue fluir
sob o paletó, a manga e formava um rio vermelho. Ele circulou seu braço
esquerdo ao redor da cintura dela, puxou-a contra ele e mergulhou atrás do
tronco protegido de uma árvore caída. O esforço fez sua cabeça girar e ele
lutou contra a repentina onda de dor.
— Quem está atirando? — Ela sussurrou, olhando ao redor, os
olhos arregalados como pires. — Certamente é um erro, — ela disse
novamente, mas mais uma bala passou voando, e ela deu um grito abafado.
Ele examinou a densa vegetação rasteira, mas não viu nada. Sua arma estava
onde ele caiu, uma dúzia de passos fora do alcance.
— Alec, você está sangrando! — Ela disse, seu grito suave, mas
ainda alto o suficiente para atrair mais uma bala. Ela atingiu a madeira da
árvore ao lado de seu esconderijo. Uma onda de dor tomou conta dele
enquanto as mãos dela vagavam por seus membros, procurando pela ferida,
ainda escondida sob o casaco. Sua expressão mudou para medo e
preocupação. Mesmo suave como seu toque era, ainda era agonia.
— Pare, — ele disse, mais rude do que pretendia. — É meu
ombro. Um caçador, provavelmente.
Ela viu o sangue na mão dele e gritou quando tirou o casaco e viu
a camisa ensanguentada.
— Isso não é um problema. Nós precisamos levá-lo de volta ao
castelo.
— Isso é três quilômetros de distância, pelo menos, — ele
murmurou.
— Então eu vou pedir ajuda, — ela disse desesperadamente. Era
sua imaginação ou havia lágrimas nos olhos dela? Eles estavam brilhando,
mas o queixo dela estava fixado em um ponto determinado, sem tremer de
medo.
— Não, — ele disse com os dentes cerrados. — Não com alguém
atirando. Nós vamos ter que esperar por Leith e Jock.
Caroline pegou o lenço e apertou com força contra o ferimento.
Ele respirou fundo através dos dentes cerrados pela dor. A frágil renda estava
encharcada em um instante. Ela jogou fora.
— Eu preciso tirar minha anágua, — ela murmurou, e Alec deu um
sorriso torto.
— Eu pensei que nós havíamos concordado... — Ele disse. Ela
corou.
— Não seja bobo. Sua própria vida pode estar na balança.
Ela se levantou e começou a levantar a saia. Ela não havia
levantado até o tornozelo quando outro tiro soou. Ela caiu no chão coberto
de musgo ao lado dele.
— Eu acho que eles estão se aproximando. — Eles se deitaram
lado a lado em silêncio, com os ouvidos atentos, ouvindo passos batendo na
vegetação rasteira.
Eles ouviram vozes agora, vozes masculinas.
— Você acertou ele?
— Eu saberei quando ver seu cadáver, não saberei?
Alec se preparou. Eles estavam chegando mais perto. Os olhos de
Caroline ardiam como brasas quando ela examinou a vegetação rasteira.
— Caroline... Fique aqui, — ele sussurrou.
Ela estava usando um conjunto de equitação verde emprestado de
Lottie. Ela quase se misturava às árvores cobertas de musgo. Talvez, ele
esperava, que se ele distraísse seus perseguidores, eles não a veriam, e ela
estaria segura, mas ela balançava a cabeça, sua expressão feroz, parecendo
tão protetora quanto uma mãe loba. Ela começou a procurar no chão ao redor
dela, cavando os dedos na terra. Ela surgiu com uma pequena rocha.
Um galho estalou e ela respirou fundo. Ela se levantou apenas o
suficiente para jogar a pedra na vegetação rasteira. A pedra saltou através das
folhas, fazendo um barulho profano no silêncio sombrio.
— Lá! — Ela ouviu um barulho, escutou seus perseguidores
correndo em direção ao som.
— Você pode ficar de pé? — Ela perguntou, colocando o braço ao
redor dele. — Precisamos nos mover.
— E vamos para onde? — Ele perguntou.
— Para lá, — ela apontou para o velho Grange. Ele não sabia que
eles estavam perto da casa abandonada, ele não esteve aqui por anos. Ele
estava envolto em hera, trancado, quase invisível, as árvores faziam o
possível para sufocá-lo completamente.
— Caroline, está trancado. Não há como entrar, — disse ele. — É
mais seguro ficar na floresta.
Ela olhou para ele como se ele fosse um idiota, e o puxou,
tentando ajudá-lo a se levantar, embora seu corpo fosse frágil comparado ao
dele.
— Oh! A porta está totalmente aberta, Laird.
Alec olhou para a velha casa e piscou. Alguns momentos antes, a
porta estava fechada, trancada, coberta de trepadeiras. Agora estava bem
aberta e as videiras acenavam com a brisa.

Capítulo 40
— Três lebres, uma perdiz e um texugo, — disse Leith quando
entraram na cozinha. Ele os colocou na mesa de Muira.
— Onde está Alec? — Ela perguntou, com os olhos arregalados.
— Ele ainda não voltou? — Perguntou Jock. Muira olhou
horrorizada para os bichos espalhados pela cozinha.
Jock sorriu.
— Eu sei o que você está pensando, não tem muita carne para o
jantar, mas quando os sassenachs pararam para um piquenique, tivemos
tempo para pegar um pouco de salmão e algumas trutas para você, Muira. —
Eles estão no cesto ao lado da perdiz.
Jock olhou para Leith, que estava se lambuzando com um bolo de
aveia com manteiga.
— Eu vi Alec esta manhã com Megan, mas ela voltou conosco.
Muira cruzou as mãos e Jock franziu a testa.
— O que há de errado, Muira? Porque você tem esse olhar. A
última vez que eu o vi, a velha Jeannie MacNair morreu na tarde seguinte.
Ela estendeu os polegares.
— Meus polegares formigam quando o mal está próximo, — disse
ela. Ela arrancou o bolo de aveia da mão de Leith. — Você precisa ir e
encontrá-lo. Não volte até que o encontre.
Jock sabia que era melhor não ignorar uma das premonições de
Muira.
— Tem certeza de que é Alec?
— Tão certa como eu já estive. Vá, não há tempo a perder.
— Eu tenho isso, Devorguilla, — Brodie murmurou, e segurou um
pedaço de pano encharcado de sangue. — A prova.
Ela olhou para ele com desdém.
— O que você quer dizer?
— Eu encontrei isso na floresta. É sangue, então ele deve estar
morto. — Ele abriu um largo sorriso, seu belo rosto brilhando. — Eu atirei
bem entre os olhos.
Devorguilla levou a mão à garganta. Ela olhou para o pano
ensanguentado, depois olhou para Brodie.
— Tem certeza?
— Sim. Então, quando eu posso me casar com Sophie?
— Você me trouxe o corpo dele? — Perguntou Devorguilla. Ela
queria ver, olhar para baixo, para o cadáver do seu enteado e saber que ela
ganhara, que Glenlorne era seu, finalmente.
— Não, apenas isso. Amanhã é cedo demais para o casamento? —
Brodie perguntou.
Devorguilla pegou o pano na mão.
— Isto é um lenço, não um cadáver. E não há como dizer se o
sangue é de Alec ou não. Ele poderia estar no andar de baixo agora mesmo,
desfrutando de um pouco de uísque. — Ele se levantou, olhando-a
inexpressivamente. — Seu tolo! — Ela o amaldiçoou.
O sorriso de Brodie desapareceu.
— Mas e a Sophie?
Devorguilla jogou o lenço na lareira e olhou para ele.
— Você nem vai sentir o cheiro de sua bainha se não puder ter
certeza de que Alec está morto. Você voltou cedo demais.
Brodie mexeu os pés.
— Eu não posso evitar. Eu estou apaixonado
Devorguilla olhou para ele, forte como um carvalho e tão estúpido
quanto um mastro. Ela confiara tudo a um idiota. Ele deixou cair o cálice
envenenado ontem à noite, e não conseguiu sequer um simples acidente de
caça.
— Tudo o que você precisava fazer para ganhar Sophie era matá-
lo, Brodie MacNabb, e você não poderia fazer isso direito, — disse ela,
desejando que ela tivesse nascido um homem, um laird, capaz de governar.
Ele empurrou seu lábio inferior em uma expressão chorosa.
— Você não pode provar que eu não atirei nele.
— E não há provas de que você também tenha atirado. É melhor
descermos e ver se ele já voltou.
— E se ele estiver lá? — Perguntou Brodie.
— Então vamos precisar tentar novamente. — Ela o empurrou
para fora da porta.
Não havia sinal de Alec no corredor, nem no andar de baixo. As
senhoras estavam apreciando o chá, uma mistura inglesa do estoque pessoal
de Lady Charlotte, que ela trouxe com ela. Havia também bolos e tortas de
creme que Muira havia feito com morangos tardios. Os cavalheiros estavam
à beira da lareira, bebendo canecas de cerveja e copos de uísque e
comparando a caçada na Escócia com as da Inglaterra, em suas próprias
propriedades.
Devorguilla se forçou a sorrir.
— Vocês tiveram alguma sorte hoje, meus senhores? —
Devorguilla perguntou ao Visconde Speed e a Lorde Mandeville.
— Sorte? — Visconde Speed empalideceu.
— Sim. Você matou algo?
O visconde ficou ainda mais pálido.
— Eu acredito que devemos ter matado, condessa, — ele
murmurou, seus olhos passando rapidamente para a porta como se ele
estivesse esperando alguém entrar. Tomou um gole de cerveja. Estava na
ponta da língua para fazer a pergunta óbvia quando Megan falou primeiro.
— Alguém viu Alec?
— Por que eu saberia onde ele está? — Gritou Speed, ficando de
pé.
Megan levantou as sobrancelhas.
— Alguém em nosso grupo deve tê-lo visto. Eu estava com ele por
um tempo quando partimos, mas passei o resto da tarde com Jock e Leith.
— Com os ghillies? — Devorguilla disse, horrorizada. Ela estava
desesperada em transformar suas filhas em damas. Quanto mais cedo ela
pudesse levá-las para a Inglaterra, melhor.
— Ele estava na floresta, — Lorde Mandeville deixou escapar.
— Provavelmente perseguindo veados, então, — disse Megan. —
Ou pescando. Ele provavelmente só esqueceu que horas são.
— E se ele estiver morto? — Brodie perguntou, e todos os olhos se
voltaram para olhá-lo. Devorguilla fechou os punhos nas dobras de suas
saias para evitar estrangulá-lo.
— Morto? — Os olhos de Lorde Mandeville brilharam como
chamas em seu rosto corado. — O que lhe deu essa ideia, meu bom
companheiro?
Brodie deu de ombros.
— Ele pode estar, não é?
— O homem mal demorou uma hora, — disse Somerson, olhando
para o relógio.
— Ele poderia ter parado na aldeia, — sussurrou Alanna, com os
olhos arregalados. — Para levar um peixe fresco, ou um coelho ou dois para
alguém. Ele é um caçador experiente.
Devorguilla colou um sorriso que parecia fino e esticado.
— Talvez alguém deva sair e ver se ele está ferido. Ele pode
precisar de ajuda. — Ela enviou à Brodie um olhar de relance. — Brodie,
você poderia ir.
— Eu? Mas eu pensei... — Ele olhou para Sophie.
— Você, — ela insistiu, e os olhos dele se voltaram para ela.
— Oh! — Ele disse. — Eu.
— Eu vou acompanhá-lo, — disse William Mears, e levantou-se.
— Oh, eu não acho que isso seja necessário, — Devorguilla
ronronou. — Brodie conhece a terra, sabe onde procurar.
— Então Speed e eu o acompanharemos. Está quase escurecendo e
pode haver lobos por aí, — disse Lorde Mandeville. — Eu insisto.
— Eu posso... — Megan começou, mas Devorguilla enviou-lhe
um olhar de reprovação.
Devorguilla sorriu.
— Este é trabalho de homem. Você vai ficar aqui.
— Eu repreenderei Alec quando ele voltar, por nos deixar
preocupados, — disse Sophie. — Suponho que teremos que esperar ele para
jantar.
— É verdade? — Perguntou a condessa Charlotte. Ela pegou o
último bolo de creme do prato e colocou em sua boca para evitar a fome. —
Tem mais pão? — Ela perguntou, esperançosa. Devorguilla sorriu para ela, e
imaginou seu rosto quando o corpo de Alec fosse carregado pelo corredor e
colocado sobre a longa mesa, outro Laird de Glenlorne, morto. Ela lhe daria
um glorioso funeral. Ela até fingiria algumas lágrimas. Ela sorriu ao pensar
enquanto olhava para o relógio.
Ela mal podia esperar.

Capítulo 41

Caroline ajudou Alec a entrar no santuário sombrio e frio do


Grange. Ele escorregou para o chão assim que eles chegaram na porta.
— Fique quieto, — ela disse, ajoelhando-se ao lado dele e
puxando o casaco dele. Ele cerrou os dentes, mas não reclamou.
— Tenho certeza de que parece pior do que realmente é, — disse
ele, e ela lançou-lhe um olhar duvidoso.
— Dói? — Ela perguntou, sabendo que doía, apenas pela palidez
de seu rosto e as gotas de suor em sua testa.
— Claro que sim, mas me permita algum orgulho masculino.
Ela ignorou isso e desabotoou a camisa dele, consciente do calor
de sua pele, o bater do coração dele sob seus dedos. Seu pulso era forte e
isso, certamente, era um bom sinal. Ela tirou o trapo ensanguentado do
ombro dele e começou a procurar a ferida de bala.
— Ah! — Ela chorou quando achou.
— É ruim?
— Depende, — ela murmurou. — Está no seu braço. — Ela
puxou-o para virá-lo, e a respiração sibilou através dos dentes dele, quando
ele reprimiu uma maldição. — Eu preciso ver se a bala atravessou, ou se
ainda está dentro, — ela disse secamente.
Ele forçou seu corpo à frente para que suas mãos sondassem e
pudessem procurar. A sala girou diante de seus olhos.
— Ah! — Ela disse novamente.
— Isso é bom?
— Sim. Onde quer que a bala passasse, ela passou direto. Você
tem um frasco de uísque? — Ela perguntou.
— No meu casaco, — disse ele, observando-a. Ela pegou o frasco
de prata e abriu-o. A fragrância forte do uísque superou o cheiro úmido e de
mofo do Grange. Ele estendeu a mão boa para o frasco, mas ela balançou a
cabeça.
— Aqui primeiro.
Ele amaldiçoou quando ela derramou sobre a ferida, incendiando-
a.
— Você já foi baleado antes? — Ela perguntou.
— Claro que não! — Ele disse. — Ninguém nunca tentou me
matar antes, nem mesmo quando eu morava em Londres. Fui esfaqueado —
bem, cortado com uma faca, tive minha parcela de cortes e contusões, mas
nunca baleado, nem uma vez.
A respiração dele ficou presa na garganta quando ela se levantou e
levantou a saia, expondo o comprimento sedoso de sua panturrilha bem
torneada. Ele agarrou o frasco e deu um longo gole.
Caroline estava ciente de que ele estava olhando para as pernas
dela, mas ele precisava ser ajudado. Ainda assim, suas bochechas
inflamaram quando ela se atrapalhou com os laços de sua anágua. Ela os
abriu e deixou a saia cair, ciente da luz brilhante em seus olhos.
Ela rasgou a roupa e fez um bloco grosso para pressionar a ferida.
O sangramento já estava diminuindo. Ela pegou a mão esquerda dele e
colocou sobre o tecido.
— Pressione, — disse ela, e rasgou outra tira para atar a ferida. —
Nós precisamos levá-lo de volta para Muira.
Houve uma batida na porta. Caroline ofegou. Vozes abafadas
falavam e punhos socavam.
Caroline engasgou e tentou se levantar, mas Alec agarrou a mão
dela.
— Não se mova, — ele sussurrou.
Seu coração batia em seu pescoço.
— A porta não está trancada. Não me lembro de fechá-la.
— Parece fechada para mim, — disse ele, e ela se encolheu
quando o painel grosso balançou contra o marco, quando um corpo pesado
bateu contra ele.
Ele puxou-a para perto de si, e colocou o braço bom ao redor dos
seus ombros. Caroline colocou a mão sobre a boca para não gritar quando
um rosto apareceu na janela, uma face feia espalmada contra o vidro, mãos
sujas em volta de um olho brilhante.
— Seu visconde Speed, — eu acredito, — Alec murmurou. —
Certamente Mandeville não deve estar muito atrás. — A porta sacudiu
novamente, mas não se abriu.
— Dificilmente será meu Visconde Speed, — ela murmurou.
Outro rosto apareceu ao lado de Speed.
— Brodie, — disse Alec suavemente, e amaldiçoou. — Eu não
pensei que ele teria coragem. Mas não estou surpreso por ele ter atirado.
— Brodie atirou em você? Seu primo?
— Meu herdeiro, — ele disse secamente. — Duvido que você
tenha pensado nisso.
Caroline observou a porta tremer, mas se manteve firme, como se
tivesse sido trancada — mas não por sua mão. Ela a deixou aberta, ela tinha
certeza, porque estava mais preocupada com Alec. Ela prendeu a respiração
quando anos de sujeira e pedaços de gesso podre caíram no chão, fazendo
um barulho terrível nas tábuas secas do piso antigo, como centenas de
pequenos pés correndo para ela. Ela encontrou-se enrolando mais perto de
Alec, com medo de roedores e homens, e tudo mais. Ele apertou seu ombro e
beijou sua testa, e ela se sentiu mais segura.
Assim como chegaram, os homens foram embora e houve silêncio.
Estava ficando escuro, os últimos vestígios de luz desaparecendo, deixando a
mobília velha fantasmagórica e branca contra a escuridão. Ela estremeceu e
virou-se para Alec. Ele não se moveu e ela se perguntou se... Ela estendeu a
mão para sentir a pressão dele, e a mão dele subiu para cobrir a dela.
— Estou bem, Caroline, — ele murmurou fraco. — Nós vamos
uma vez que está escuro. — Ele a puxou de volta contra o seu lado,
mantendo-a aquecida.
Ela se agitou, tateando o curativo, procurando por sinais de sangue
fresco que ela não conseguia ver.
— Onde você aprendeu a enfaixar um ferimento à bala? — Ele
perguntou, sua voz quente, com cheiro de uísque, perto da sua orelha.
— Minha mãe estava muito doente. Entre governantas, passei
meus dias na cozinha com os criados. Um dia, um dos vigilantes tropeçou na
arma e disparou na perna. Eles esqueceram que eu estava lá, mas nunca
esqueci o que vi. Cook arregaçou as mangas, pegou o conhaque, pegou uma
colher e depois despejou um pouco sobre a ferida. Ela usou curativos
adequados, é claro.
— Ele sobreviveu? — Perguntou Alec.
— Sim, claro.
— Então há esperança para mim, suponho. A menos que ela tente
novamente.
— Ela? — Perguntou Caroline. — O que você quer dizer?
— Devorguilla. Não tenho dúvidas de que ela colocou Brodie
nisso. Provavelmente prometeu a ele as riquezas de Glenlorne se ele fizesse
o que ela mandasse. Ele vai ficar desapontado, — ele murmurou. — Mas
não importa. Você está deixando muita coisa para trás, e há outras coisas que
devemos discutir.
— Como o quê? — Ela perguntou.
— Como o que acontecerá se você estiver esperando um filho
meu.
Ela sentiu o choque daquela revelação através dela. Uma dúzia de
emoções se seguiu, uma manada inteira de cavalos fugitivos. Pavor, medo,
vergonha, e até prazer.
— Eu garanto a você que eu não... — Ela levantou o queixo. Era
cedo demais para dizer, claro. Ela resistiu ao desejo de acariciar sua barriga
lisa. — E se eu estiver? Isso dificilmente mudaria alguma coisa.
— Claro que sim. Eu vou lhe proteger, verei para que você tenha
dinheiro, um lugar para morar.
Ela riu e ele parou. Ela podia sentir os olhos dele nela.
— Não, Alec, — ela disse, sóbria. — Eu não vou voltar, não vou
interferir. Meu tempo aqui está acabado, não importa o que aconteça. Ela
sabia que sua cabeça estava no ombro dele, desmentindo sua independência.
Alec suspirou.
— Como eu gostaria de ter conhecido você em Londres, — ele
disse.
— Você não teria me dado uma segunda olhada.
— Eu não teria sido capaz de desviar o primeiro olhar.
Caroline sentiu sua respiração ficar presa na garganta.
— Talvez seja melhor imaginar o que poderia ter sido.
— Eu nunca pensei que seria o conde de Glenlorne, nunca quis ser.
Eu não achei que poderia até que eu vi você na torre, e a imaginei ao meu
lado.
— Eu estive aqui por semanas antes de você chegar em casa, Alec.
Não havia esperança, nem alegria, nem sorrisos. É diferente agora e isso é
por sua causa. Você fez um bom começo.
— Eu não sou o Laird que meu avô era, se é isso que eles estão
pensando. Eu não posso trazer de volta os dias de paz, poder e prosperidade.
Esses dias se foram há muito tempo, para nunca mais voltar.
Ela levantou a mão para o peito dele, desenhou círculos com a
ponta do dedo.
— Seu clã quer um novo começo. Você já lhes deu isso — uma
condessa nova, um belo Laird. O irmão de Jock tem ideias para criar um
novo tipo de ovelhas com lã melhor e mais grossa, Alec e Annie MacNabb
tem algumas ideias para tecer xales com novos padrões. Ela viu um dos
xales de Sophie. Ela pensou que o clã poderia confeccioná-los aqui e vendê-
los em Glasgow ou Edimburgo. Muitos outros também têm ideias. Alastair
MacNabb quer construir pontes. Eles só querem sua bênção e um pouco de
dinheiro. Eles estão dispostos a dar a Glenlorne seu tempo, sua lealdade. É a
casa deles também. O dinheiro de Sophie fará muito bem.
Ele pegou a ponta do dedo dela, levou-a aos lábios e a beijou.
— Você é uma moça esperta, Caroline. Você sabia que meu avô foi
marinheiro por um tempo? Ele me contou sobre as maravilhas que viu
enquanto estava a bordo do navio. Outros lugares, novas ideias, diferentes
maneiras de fazer as coisas. Maravilhas.
— O dote de Sophie vai ajudá-lo a fazer todas essas coisas, Alec,
— disse ela.
— Na verdade, eu não vou gastar o dinheiro dela de jeito nenhum.
Eu tenho um conhecido em Londres, um conde, que é dono de uma
companhia de navegação. Ele me incentivou a investir durante anos. Escrevi
para ele, perguntei-lhe se transportaria a lã de Glenlorne, investindo em
novos empreendimentos. Ele se ofereceu para me aconselhar. Eu acho que
meu investimento poderia ser muito bom. Vou precisar de dinheiro para um
investimento inicial, é claro, que virá do dote de Sophie, mas vou substituir
cada centavo, colocá-lo em confiança, fazer o meu próprio caminho sem
viver sob o jugo da minha esposa.
Caroline sentiu um inchaço de orgulho e amor.
— Isso é maravilhoso, — disse ela.
— Se eu sobreviver.
— A ferida é realmente pequena, — disse ela.
— E da próxima vez? — Brodie está tentando atirar em mim, e
Speed e Mandeville têm algum motivo para querer me matar.
— Eles querem Sophie, o dote dela é muitas vezes maior do que o
meu, — murmurou Caroline.
— Ah! Sim, e ainda tem você, se Somerson descobrir que eu me
aproveitei da irmãzinha dele, ele provavelmente vai tentar me matar.
Ela sorriu.
— Não, ele não atiraria em você, ele simplesmente pagaria alguém
para lhe matar, — ela brincou. — Além disso, se alguém pode entender que
você preferiu se casar por dinheiro, este é Somerson. — Ela percebeu tarde
demais como isso soava. — Quero dizer, ele não entende o amor. — Ela
quase mordeu a língua. Ela nunca teve a intenção de admitir que estava
apaixonada por Alec.
— É por isso que você desistiu do seu dote? O dinheiro significa
muito pouco para você?
— Como você sabe disso? — Ela perguntou.
— Glenlorne é um antigo castelo com rachaduras nas paredes,
janelas que não fecham com força suficiente. Eu ouvi sua conversa com
Somerson. Você está assumindo um risco enorme.
— Eu sempre tive dinheiro, é claro, ou pelo menos, nunca quis
nada que o dinheiro pudesse comprar. No entanto, acho que sou mais feliz
sem isso. Eu posso fazer minhas próprias escolhas, viver minha própria vida.
Certamente há outras pessoas na Escócia que desejam que seus filhos
aprendam inglês.
— Então você vai ficar na Escócia? — Ele perguntou.
— É o primeiro lugar em muito tempo que me sinto em casa.
— Não será fácil. Os escoceses suspeitam de sassenachs. Prometa-
me que você vai escrever para mim se precisar de ajuda. No mínimo, deixe-
me ser o irmão que Somerson não é.
— Eu nunca poderia pensar em você como um irmão, — ela
sussurrou.
— Caroline, eu nunca estive...
A porta se abriu e uma longa poça de luar percorreu o chão.
Caroline ficou de pé, corajosamente entre Alec e os intrusos.
Jock deu um salto para trás, alarmado, quando ela se adiantou,
voltando-se para Leith.
— Deus, garota, eu pensei que você fosse um fantasma! — Jock se
mexeu e empurrou sua boina aliviado. — Alec, rapaz! Você está bem? Nós
estamos procurando por você por horas. Muira insistiu que algo maligno
havia acontecido a você. — Ele se agachou na frente de Alec.
— Ele foi baleado, — disse Caroline. — Como você abriu a porta?
Jock olhou por cima do ombro. A porta? Eu não abri. Eu estava em
pé quando chegamos aqui, e ela se abriu, senão eu nem teria me dado ao
trabalho de procurar neste lugar antigo.

Capítulo 42

— Estamos perdidos, — disse o visconde Speed, sombrio. — Nós


estamos circulando nesta floresta, no escuro, por horas. Eu juro que já vi
esse toco de árvore antes.
— É muito escuro até para ver uma mão na frente do seu rosto, —
Brodie disse, de pé em uma poça de luar, olhando para sua própria palma.
— Eu pensei que você havia dito que conhecia estes bosques
intimamente, — disse Mandeville.
— Claro que sim! — Brodie disse, e partiu direto para uma
espessa porção de cardos. Speed e Mandeville seguiram, ficando abaixados.
Brodie parou de repente, e eles bateram em suas costas.
— Pelo amor de Deus e de todos os seus anjos, o que é agora?
Você viu alguma coisa? — Mandeville disse, endireitando o casaco.
— Não, mas eu ouvi alguma coisa, — Brodie respondeu,
balançando a arma descontroladamente para cada sombra. Acabou
cutucando a barriga inchada de Mandeville.
O inglês empurrou o cano para longe com a ponta do dedo.
— Bem, e soou como?
— Foi um som terrível de gemido, — disse Brodie.
— Como uma pessoa ou um animal? — Perguntou Speed. — Que
tipo de animais estarão nesta floresta à noite, afinal?
— Coisas assustadoras, — Brodie respondeu em voz baixa. —
Grandes, enormes, veados desagradáveis; texugos furiosos que poderiam
roer a perna de um homem, morcegos...
— Ugh! Eu odeio morcegos. — Speed estremeceu.
— E fantasmas? — Alguém perguntou em um tom oco.
— Fantasmas? — Exclamou Lorde Mandeville.
— Os mortos, — disse Speed em uma voz oca. — Os mortos
recentes pelo menos. Eles caminham até nós e nos tocam no ombro,
ensanguentados e sombrios, vestindo nada além de roupas cinzas, e quando
você se vira... — Ele gritou, descobrindo Brodie atrás dele, em vez de na
frente, onde ele estivera um momento antes. Ao choramingar de Speed,
Brodie levantou a arma, o que deixou os olhos do visconde arregalados.
Mandeville pegou o lenço e enxugou o suor do rosto.
— Fantasmas. Ha! Não existe tal coisa, e se houver, você só
precisa olhá-los nos olhos...
— Se ainda tiver olhos para olhar, — acrescentou Speed.
— Você olha nos olhos dele e diz: Vá embora. — Ele acenou com
uma mão carnuda.
— É assim mesmo?
— Qual de vocês disse isso? — Perguntou Lorde Mandeville.
— Não fui eu, — disse Brodie.
— Nem eu, — disse Speed, ansiosamente. — O que é esse
barulho?
Mandeville olhou ao redor do amigo. Brodie estava tremendo tanto
que sua arma estava batendo contra a fivela do cinto. Ele estava olhando
para a escuridão acima das cabeças dos ingleses, o rosto branco, os olhos
vazios.
— Fan-fantasma! — Ele conseguiu dizer, e levantou o dedo para
apontar.
Speed fechou os olhos e começou a murmurar o que ele esperava
ser um encantamento contra os maus espíritos, a má sorte e a varíola. Girou
quando ouviu o grito de Mandeville, e olhou diretamente nos olhos de uma
forma brilhante sentada em um galho, logo acima de sua cabeça, sorrindo
para eles, um pano fúnebre ainda envolto em torno de seu terrível queixo,
seus dentes nus, os buracos dos olhos vazios. Ergueu uma mão ossuda para
desenrolar o tecido, e a queixada caiu sobre o peito oco.
Speed sentiu algo quente e úmido se espalhar sobre as meias,
sentiu o cheiro acre de urina, mas não conseguiu desviar o olhar. A coisa
horrível na árvore sorriu, se algo tão horrível pudesse ser chamado de
sorriso. Então ele se lançou para frente.
— Vá embora! — Disse o fantasma, mas a essa altura, Speed,
Mandeville e Brodie já haviam fugido.
— Isto foi realmente necessário? — Georgiana perguntou para
Angus, flutuando para observar os homens fugindo pelas colinas. — Foi
bastante indigno.
Angus esfregou as mãos alegremente.
— O mais divertido que eu já tive, deste lado do túmulo, de
qualquer maneira. Eu nunca gostei do ramo da família de Brodie, pois todos
eles são parentes. Que vergonha para um homem eles são.
— E agora ele está correndo pelo campo contando histórias de
fantasmas apodrecendo nas árvores. — Georgiana fungou.
— Bem, fiz o trabalho, não é? Eu suponho que um fantasma em pé
em uma colina teria sido adorável, mas eu não tenho nenhum fole!
Georgiana sorriu.
— Oh, bem, talvez tenha valido a pena ver Lorde Mandeville
correndo pelas colinas daquele jeito. Eu me lembro da avó dele. Ela
engasgou com uma ameixa cristalizada em um jantar. Eu diria que ele não
vai parar até que ele cruze a fronteira. Ele não nos perturbará mais.
— Ou a Alec, — acrescentou Angus.
— E Devorguilla? — Perguntou Georgiana.
Angus sorriu para ela.
— Eu acho que podemos deixá-la para Muira.

Capítulo 43

William vagou pelos confins do castelo de Glenlorne no dia


seguinte. Alec MacNabb fora encontrado e trazido de volta vivo, enfaixado
com as anáguas de Caroline. A visão dele, sangrando e pálido, fez a condessa
Charlotte desmaiar, ou talvez fosse a visão de Caroline com seu vestido sujo
de sangue, sem as roupas de baixo adequadas. William quase desmaiou.
Caroline crescera desde a última vez em que ele a vira em Londres, ou
desabrochara, ou o que as jovens garotas faziam para passar de garotas
desmioladas para mulheres adoráveis e desejáveis.
Ele cometera o erro de tentar fazer a coisa cavalheiresca e pegar
Lady Charlotte enquanto ela desmaiava, e serviu apenas para fornecer um
lugar macio para ela pousar. Ele ficou preso debaixo dela por alguns minutos
antes que os sais aromáticos pudessem ser encontrados e trazidos para
revivê-la, já que ninguém poderia levantá-la. Ele tinha uma contusão no
cotovelo, onde a gentil e adorável Lady Sophie insistira em fazer um
curativo. Lottie, que seria sua esposa em apenas alguns dias, estivera mais
preocupada com Caroline e Glenlorne, e com a intenção de ouvir os detalhes
de seu infeliz acidente para prestar-lhe qualquer atenção. Ele havia notado
uma tendência imprópria em Lottie ultimamente, da qual ele não gostava
nem um pouco.
Ele estava tremendo depois de dez longos minutos presos sob a
condessa Charlotte, e enjoado por causa dor em seu cotovelo e da visão de
tanto sangue, enquanto os olhos de Lottie estavam absolutamente brilhantes.
Ele teria que conter esse traço selvagem em sua esposa cedo, ele decidiu, se
ele pudesse, é claro. Era óbvio que Somerson não conseguira fazer muito
com a mãe de Lottie.
Era por isso que ele estava rondando o castelo agora, tentando
escolher o que dizer para Lottie, como domar o touro firmemente pelos
chifres, ou a vaca, visto que ele era o touro, neste caso, e dizer-lhe
exatamente como ele esperava que ela se comportasse a partir deste
momento. E se ela se recusasse a obedecer, bem, esse era o problema. E se
ela se recusasse? Ele tinha a horrível sensação de que seria o único a
concordar em obedecê-la, e isso, é claro, ele nunca faria. Ele era gentil,
refinado, e não dado a extremos de temperamento, aventuras ou mesmo de
decisões definitivas. Ele esperava que sua esposa fosse igual. Sua mãe estava
satisfeita em se sentar em um canto e fazer bordados com imagens
aprimoradas. Ele foi criado para acreditar que toda mulher deveria ser como
ela, assim a casa de um homem seria feliz.
Ele entrou no estúdio.
Houve um farfalhar de seda quando alguém se levantou de uma
cadeira perto da janela. Lady Sophie deixou cair o bastidor de bordar no
chão.
William fez uma reverência.
— Minhas desculpas, minha senhora. Eu não sabia que a sala
estava ocupada. Estou me intrometendo?
— Oh não, não mesmo, — ela murmurou.
Ele atravessou a sala e se inclinou para recuperar o bordado no
mesmo momento em que ela fez. Suas cabeças se bateram e ele pegou seu
cotovelo quando ela cambaleou para trás, a mão delicada em sua testa. Ele
sentiu o cheiro de lavanda e rosas. Sua mãe usava lavanda e rosas. Ele a
ajudou e entregou o bordado.
— Lar doce lar, — dizia a homilia bordada.
William ocupou a cadeira em frente à Sophie, e notou como ela
estava linda hoje, num vestido discreto, porém elegante, em um tom mais
sutil de rosa do que aquele que Lottie teria escolhido.
— Posso oferecer meu sincero alívio por Glenlorne não ter sido
seriamente prejudicado? — Ele perguntou.
Ela sorriu pálida.
— Eu estava no andar de cima para vê-lo. Muira o confinou na
cama, insistindo que ele deve beber uma poção de ervas horripilantes, para
aumentar sua força.
Ela parecia ansiosa e seu queixo estremeceu. Ele estava com os
sais aromáticos em seu bolso depois de sua recente provação, e ele procurou
por eles agora, por via das dúvidas.
— Ele está muito doente, ou com muita dor? — Perguntou
William alarmado.
Ela afastou as lágrimas, e ele galantemente pegou o lenço e
colocou na mão dela. Ela o estudou, passando os dedos delicados sobre o
monograma.
— Ele parecia perfeitamente bem para mim. Ele não estava tão
entusiasmado em me ver como deveria.
— Talvez seja o choque... — William começou, mas ela balançou
a cabeça, e um delicado cacho loiro desprendeu-se e caiu em sua testa. Ele
apertou os dedos contra a urgência de colocá-lo de volta para onde ele
pertencia. Ele não suportava a desordem.
— Não foi o choque! Ele estava estudando alguns papéis, e parecia
que nada do que eu dissesse poderia distraí-lo deles.
— Que tipo de papéis? O Times, talvez? Ele não via o jornal de
Londres há semanas e, se Glenlorne tivesse um, William subiria e pagaria ao
homem se precisasse, ou, talvez, ele emprestasse.
— Não, eram documentos. Ele disse que estava fazendo planos. E
tudo o que ele queria falar era sobre os preços de lã e sobre ovelhas. — Ela
fez uma careta e passou a mão pelo vestido. — Eu coloquei este vestido para
impressioná-lo, e ele nem percebeu. Não ofereceu nem mesmo um elogio
nos cinco minutos que passei com ele. — Ela se inclinou para ele, com
lágrimas nos olhos, a boca franzida como um único botão de rosa. — Eu
pergunto a você, eu sou bonita, Lorde Mears?
William piscou. Bonita? Ela era a beleza em pessoa.
— Muito bonita, de fato, lady Sophie.
Ela sorriu para ele, um sorriso doce e terno de profunda gratidão
que fez William Mears se sentir o herói da história.
— Eu vim aqui para medir esse quarto e planejo torná-lo uma
biblioteca, você vê, como a grande biblioteca de papai em Ellison Park, mas
Alec não mostra nenhum interesse nos meus planos. Eu não tenho vontade
para medir nada. — Ela havia jogado os papéis e as fitas de medição bem
longe.
— Você gosta de ler? — Perguntou William. A leitura não era boa
para as mulheres. Isso lhes dava ideias, desejos, pensamentos de outras
coisas além do dever. Lottie lia. O mesmo aconteceu com Caroline, isso
mais do que provava seu ponto de vista.
Sophie inclinou a cabeça.
— Ler? Oh! não. Isso machuca meus olhos. Mas todas as casas
verdadeiramente elegantes têm bibliotecas — para servir chá e jogar cartas.
William se iluminou.
— Exatamente meus pensamentos! — Ele olhou ao redor da sala
desmazelada, das paredes frias de pedra, dos móveis esparsos. — Eu
adoraria ouvir o que você pretende fazer nesta sala. Estou no processo de
renovação da minha casa em Ryecroft. Cheguei até as paredes da sala de
jantar, decidi que devia ser de seda chinesa, como o príncipe de Gales tem
em Brighton.
Os olhos de Sophie se arregalaram como duas piscinas azuis
iluminadas pelo sol.
— Sério? — Ela perguntou, apertando o lenço no peito.
— Eu tenho o mesmo problema que você. Estou muito ansioso
para voltar para casa e continuar o trabalho, mas Lottie não está nem um
pouco interessada em olhar para amostras de cetim ou considerar a cor que
deveria ser a sala do café da manhã. Amarelo, ela diz, mas que tom preciso
de amarelo?
Sophie ficou boquiaberta.
— Lottie? Verdade? Eu pensei que ela adorava moda.
— Assim como eu. Acho que esta viagem às Highlands a afetou
estranhamente. Ela tentou me encorajar a caminhar nas colinas hoje de
manhã, pode considerar a escalada de um dos picos mais altos por causa da
vista? — A vista, Lady Sophie! E depois de todo o exercício que ela teve
ontem, vagando pelos campos.
Sophie suspirou, um som como uma brisa refrescante em um
jardim de rosas em uma manhã de verão.
— Foi muito cansativo, de fato. E há uma visão perfeitamente boa
da janela, enquanto a pessoa está segura dentro de casa. Não vejo
necessidade de tentar os caprichos do vento e da chuva.
— Ou do sol, — acrescentou William, olhando para a manhã
ensolarada.
— Precisamente, — disse Sophie, e se inclinou para frente. —
Posso confiar em você, meu senhor?
William também se inclinou e baixou a voz.
— Claro, querida senhora. Você pode me dizer qualquer coisa e eu
vou mantê-la estritamente confidencial. Eu sou a alma da discrição,
asseguro-lhe. — Ele colocou a palma da mão em seu próprio peito e inclinou
a cabeça em direção a ela, na pose de um herói.
Ela mordeu o lábio, pegando as pétalas rosadas entre os dentes.
— Eu começo a temer que não serei feliz aqui.
Ele recuou um pouco.
— Sério?
Ela fechou os olhos e cílios dourados varreram suas bochechas.
— Glenlorne nunca notou que eu sou bonita. Nem sequer tentou
me beijar. Nem mesmo uma vez.
Os olhos de William caíram para os lábios dela.
— Nem mesmo uma vez? — Ele murmurou.
— Chocante, não é? Ora, mal posso contar o número de
pretendentes que eu tive em Londres e todos e cada um deles queria roubar
um beijo. Oh! Eu choquei você? — Ela perguntou, colocando a mão na
manga dele, dando-lhe um apertão.
William engoliu em seco.
— Não. — Ele limpou a garganta e tentou novamente. — De
maneira nenhuma. Se eu fosse um dos seus pretendentes, certamente teria
lhe beijado, depois de pedir sua permissão, claro.
Sophie sorriu com felicidade, seus olhos brilhando.
— Você teria?
— Sim, — disse ele, e passou a língua sobre os lábios, criando
coragem. — Eu a beijaria agora, se você permitisse.
Ela riu e se inclinou mais perto, franzindo os olhos.
— Não devemos, é claro, mas que mal pode fazer um beijo?
Ele se inclinou ainda mais.
— Que mal, de fato?

Capítulo 44

Além de ser o espião mestre da Coroa e um dos principais pares do


reino, o conde de Westlake também possuía uma frota de navios mercantes,
que viajavam pelo mundo para comercializar tudo, de especiarias a têxteis e
plantas exóticas. Ele permitia que os investidores comprassem seus
empreendimentos de remessa ocasionalmente, e havia oferecido uma
oportunidade muito rara para Alec. Depois de analisar os planos para as
próximas viagens, ficou claro para Alec que Westlake estava atento a
produtos de qualidade e que os riscos haviam sido cuidadosamente
considerados. Ao investir alguns milhares de libras do vasto dote de Sophie,
Alec seria capaz de ganhar um retorno considerável. Com esse dinheiro, ele
poderia investir em melhorias em Glenlorne, incluindo algumas das ideias
que Caroline sugeriu, e que gerariam uma boa renda. Ele estimava ser capaz
de restituir o dinheiro de Sophie dentro de três anos.
Alec olhou pela janela da antiga torre, sentindo-se esperançoso de
que ele seria capaz de deixar uma propriedade rentável para seus herdeiros.
Quando chegasse o momento para isso, e ele seria capaz de deixar o dote de
Sophie, intocado.
Devorguilla gritou quando Muira saiu das sombras à sua frente. A
condessa segurava um copo na mão e o líquido espirrou sobre a saia.
— O que é isso? — Muira exigiu.
— É só uma taça de vinho para Alec. Eu queria ver como ele
estava se sentindo.
— Este está envenenado também?
A pele de Devorguilla se arrepiou.
— O que você quer dizer? Tem casca de salgueiro, para dor. — Ela
tentou passar pela velha criada. Muira ficou em seu caminho.
— Eu não vou deixar você envenená-lo do jeito que você
envenenou o pai dele.
— Não seja ridícula, — Devorguilla disse, empertigando-se em
sua altura total. — Volte para a cozinha onde você pertence.
— Sempre me perguntei, mas não tinha nenhuma prova até ontem
à noite, — disse Muira. — O vinho que você e o jovem Brodie tentaram dar
a Alec estava envenenado com beladona. Encontrei mais escondida em seu
quarto, o suficiente para matar uma dúzia de Lairds.
— Como você ousa tocar em meus pertences!
— Brodie me disse, — disse Muira. — Sobre o seu plano para
matar Alec. Ele estava escondido no celeiro esta manhã, choramingando
sobre fantasmas e pecado.
Devorguilla engoliu em seco.
— O que você quer?
Muira sorriu devagar.
— Eu quero que você beba desse copo.
Devorguilla empalideceu.
Muira deu um passo na direção dela.
— Ou você pode deixar Glenlorne e nunca mais voltar. Se você
ficar, eu conheço mais poções do que você, venenos que causam agonia que
duram horas antes de morrerem gritando, tentando arrancar suas próprias
entranhas. Você entende o que estou dizendo?
Devorguilla engoliu em seco.
— Mas as meninas, elas precisam de mim. Eu sou a mãe delas.
— Elas têm Alec.
— Para onde eu vou? — Ela ouviu o tom de choramingo em sua
própria voz, sabia que havia perdido.
Muira encolheu os ombros.
— A mãe de Brodie é sua prima. Você poderia ir para lá. Não me
importa, contanto que você não volte aqui. Nunca. Ou você pode beber esta
bebida suja, mas eu terei sua decisão aqui e agora.
Devorguilla olhou para a taça. Ela viu seu marido morrer. Foi lento
e doloroso. Mesmo que ela desejasse que Alec morresse, ela não estava com
vontade de experimentar aquilo. Ela olhou nos olhos de Muira novamente,
viu a determinação gelada, que rivalizava com a dela. Esta era uma luta que
ela não sobreviveria, muito menos ganharia. Não havia escolha.
— Eu vou.
Angus limpou a lágrima de seus olhos quando Devorguilla subiu
na carroça com Brodie e foi embora.
— Você não está feliz em vê-la ir? — Perguntou Georgiana.
— Claro que eu estou! É só que não terminou do jeito que
esperávamos, e o casamento é amanhã. É uma questão de honra, claro e,
também, fortuna. Alec prometeu se casar com Sophie, e não pode voltar
atrás em sua palavra. Um MacNabb nunca volta atrás em sua palavra.
— Fortuna! — Georgiana zombou. — Ele fará fortunas se seguir o
que começou. Ele é inteligente, mas não consegue ver o que é realmente
importante.
Angus olhou para ela com tristeza.
— Você não pode comer amor, gràdhach, nem pode telhar casas,
ou alimentar crianças com isso.
Georgiana sacudiu a cabeça.
— O amor sempre encontra um caminho, Angus.
— Não, isso não acontece. Não para nós, isso não aconteceu.
Quem vai dizer que ele não vai amar Sophie?
— Não para nós? — Georgiana colocou as mãos nos quadris. — E
quem pode dizer que esta não é a nossa segunda chance? — Ela deixou
Angus olhando para as sombras vazias.

Capítulo 45

Caroline estava fazendo as malas quando Lottie entrou na sala.


— Feliz aniversário, querida! — Ela exclamou, e deixou cair um
pacote embrulhado na cama e deu um abraço na tia.
Caroline sorriu.
— Eu não achei que alguém se lembraria, — disse ela.
Lottie sorriu.
— Como eu poderia esquecer? Meu aniversário é apenas doze dias
depois do seu.
— Você será uma senhora casada até lá, — brincou Caroline, e foi
até o pacote.
— Sim, eu vou, não vou? — O sorriso de Lottie desapareceu.
— Você não está feliz? — Caroline perguntou, abrindo o presente.
— Eu pensei que estava. William parecia tão gentil e encantador e
sereno. Agora eu acho que “sereno” pode ter sido a palavra errada.
— Oh!
Lottie mordeu o lábio.
— Estou terrivelmente temerosa de que ele é apenas aborrecido, e
não sereno, o que me faz perguntar se ele realmente é encantador e amável,
ou se eu cometi um erro terrível. Ele é bonito, pelo menos, não é?
O coração de Caroline temeu por sua sobrinha. Ela uma vez havia
imaginado William como o marido perfeito. Agora ela não podia imaginar
mais ninguém, além de... ela respirou e parou aquele pensamento em seus
caminhos muito perigosos. Amanhã ela sairia de Glenlorne e nunca mais
veria Alec MacNabb.
— Sim, ele é muito bonito, — ela murmurou para Lottie, que
pensava em William.
— Eu amo dançar, mas William não dança. Você vê isso como um
problema?
Caroline lembrou-se da maneira que dançara na véspera do
solstício de verão, leve como uma pluma nos braços de Alec, os pés
descalços na grama fresca, o corpo quente de desejo... Ela dançaria com
qualquer outra pessoa e sentiria a mesma emoção em seus braços?
— Dançar não é tão importante, — ela mentiu.
— E William se recusa a viajar, ou a caçar. Eu queria ir a Paris
para nossa viagem de casamento, agora a cidade está aberta novamente e
Napoleão se foi. Ele me disse que fica enjoado e não pensaria em uma
jornada tão perigosa. Perigosa! Ora, minha amiga Anne Thorndale foi a Paris
comprar todo um novo guarda-roupa e diz que é perfeitamente maravilhosa e
bastante segura. Ela não sofreu nem um pouquinho de mal-estar, — disse
Lottie. Ela pegou o embrulho e começou a enrolar a corda entre os dedos,
estudando o anel de noivado, o diamante perfeitamente respeitável, se não
imponente, cercado por gordas pérolas.
Caroline lembrou-se do anel de rubi que a mãe lhe deixara e
esfregou o dedo onde uma vez ele estivera. Ela dera ao cavalheiro da rua, em
Londres, na noite em que fugira de Somerson House. Ela mudaria isso
agora, se ela pudesse voltar no tempo, ficaria onde ela pertencia? Ela sabia
que não.
— Você viajou para cá, sozinha, não foi? — Perguntou Lottie.
— Sim, — Caroline murmurou. — Tenho certeza que você acha
que eu fui tola de fugir assim. Eu não pensava nos perigos que poderia ter
enfrentado. — Especialmente se ela não tivesse recebido o conselho do
estranho sobre a carruagem do Royal Mail, e as moedas que ele lhe deu para
a passagem.
— Oh, eu sei, mamãe diz que você está muito arruinada, e eu achei
que era tola de fugir à noite, do jeito que você fez, mas olhe para você agora,
eu diria que suas aventuras foram o que a tornaram feliz!
Ou levaram a minha ruína, pensou Caroline. Ela olhou para a
pequena valise, meio escondida pela porta aberta do guarda-roupa. Ela
levaria os poucos vestidos que comprara em Edimburgo, um livro ou dois, e
nada mais. Ela não podia ficar, não podia assistir Alec se casar com Sophie,
prometer amá-la e respeitá-la todos os dias de sua vida. Ela sentia muito por
não estar lá para ficar com Lottie, mas precisava ir embora. Ela iria para
Edimburgo ou para Glasgow e encontraria outro emprego. Ela escreveria
uma carta para Somerson, cumprindo sua promessa de renunciar ao dote e
cortando seus laços com a família.
Lottie apertou o pacote nas mãos e o papel estalou.
— Caroline, eu decidi não me casar com William. Tomei essa
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decisão agora, na verdade. Meu irmão George está indo ao Grand Tour . Ele
sai no mês que vem e acho que vou com ele. — Ela se levantou. — Eu
choquei você?
— Francamente sim. Tem certeza? O que seus pais dirão? —
Perguntou Caroline.
— Bem, eu preciso de uma acompanhante, claro, além de George
— uma companheira. Eu pensei que talvez você gostaria de me acompanhar.
Oh! Caroline, pense na diversão que teremos. Mamãe não pode se opor se
você estiver comigo, e George estará lá, com seu tutor e seu valete.
Caroline estudou o rosto corado da sobrinha, viu a faísca em seus
olhos — determinação, deleite e travessura.
— Por favor, diga que sim, querida!
O estômago de Caroline se amarrou em um nó. Ela lhe oferecia
um novo destino, uma maneira de esquecer Alec. Ela tentou se imaginar ao
lado de Lottie, em um navio, em Paris ou na Itália, e viu apenas Glenlorne
em sua mente.
— Se é isso que você quer, — ela disse lentamente.
A corda que mantinha o presente fechado se soltou nos dedos de
Lottie, e ela olhou para o pacote em seu colo, surpresa, como se tivesse
esquecido que estava ali.
— Aqui estou eu choramingando, e este é o seu dia, e você deveria
abrir o seu presente. — Ela o entregou para Caroline. — É um xale, — ela
disse antes mesmo de Caroline tê-lo desembrulhado. — A melhor caxemira.
Era para a minha viagem de núpcias, mas não suporto usá-lo agora, e
comprarei algo novo e exótico em Paris, ou na Itália. As cores ficarão
melhores em você, de qualquer maneira.
Caroline levantou o lindo xale. Era verde-musgo, com uma
profunda orla estampada em ouro e laranja, as cores das colinas de
Glenlorne.
— Oh, Lottie, é adorável, mas eu realmente não deveria...
Lottie bufou e arrancou-o das mãos de Caroline, envolvendo-o
sobre os ombros dela.
— Bobagem! Você está linda. Realça o tom dourado da sua pele e
o verde dos seus olhos. Ela mexeu no xale, envolvendo-o nos cabelos de
Caroline, jogando as pontas sobre os ombros.
— Oh, você parece uma mulher das Terras Altas da Escócia! —
Ela disse. — Como se você pertencesse a este lugar.
Ela apertou as mãos de Caroline.
— É melhor eu ir ver mamãe agora. Ela deve ter acabado de tomar
o café da manhã e estará ansiosa para almoçar. Ela é sempre mais acessível
com o estômago cheio. Me deseje sorte?
— Sorte, — disse Caroline. — E quanto a William?
Lottie se virou na porta.
— Mamãe é a parte difícil. Eu diria que William simplesmente
encontrará outra noiva.
Paris, Itália, as cidades termais... Em qualquer lugar, pensou
Caroline, tirando o xale e colocando-o na valise.
— Europa. — Ela sussurrou a palavra como ela uma vez havia
sussurrado, — Escócia. — Era um destino.
Ainda assim, ela não conseguia se livrar daquele sentimento de
que, mais uma vez, estava fugindo.

Capítulo 46

Caroline observou Alanna atravessar graciosamente a sala com um


livro na cabeça, a coluna ereta, o queixo erguido. Megan seguiu-a. O livro de
Sorcha caiu no chão com um estrondo.
— Nunca poderei entrar em um salão de baile como uma dama —
Sorcha gemeu quando Caroline pegou o livro com um sorriso. — E eu não
tenho certeza se quero.
Muira sorriu de onde estava costurando perto da janela onde a luz
era melhor. Ela disse às garotas que a mãe delas decidira fazer uma visita
prolongada a uma prima por causa de sua saúde, e teve que sair naquele
mesmo dia, já que Brodie também decidira deixar Glenlorne. As garotas
ficaram surpresas, mas teriam que esperar pelos casamentos. E se elas
perguntassem depois, bem, Muira estava certa de que ela pensaria em algo
para lhes dizer.
— Tudo bem, moças, há uma abundância de homens solteiros aqui
nas Highlands. Quem não vai querer vocês, mesmo se não puderem levar um
livro sobre o topo de sua cabeça, — Muira acalmou Sorcha agora.
Megan puxou a trança da irmã mais nova.
— Você tem anos para praticar.
— Ela vai precisar de cada um deles, — disse Alanna
indelicadamente, girando no lugar, com o livro firmemente no lugar em sua
cabeça. — Sophie disse que mandaria um mestre de dança para nós e um
professor de música. Nós vamos aprender a tocar piano, então podemos
listá-lo como uma de nossas realizações. Sophie diz que uma debutante de
sucesso deve ter uma longa lista de realizações.
— Eu prefiro ler livros do que carregá-los na minha cabeça. —
Sorcha fungou. — E eu preferiria ter realizações úteis. Eu posso escalar uma
árvore e ganhar uma corrida a pé, e fazer uma torta.
Alanna revirou os olhos.
— Útil se você se casar com um vendedor de uma perna só, que
tenha uma macieira.
— Não provoque! — Disse Megan. — Eu diria que quando Sorcha
for mais velha, ela se tornará a beleza da família e se casará com um príncipe
que a adorará.
Sorcha mostrou a língua para a irmã do meio e pareceu pouco
bonita.
— Seu rosto vai ficar assim, jovem senhorita, e eu vou ter que
ferver uma poção de raízes e pés de ovelha para ajustá-lo novamente, —
disse Muira.
Jock bateu timidamente à porta, procurando por Caroline.
— Aqui está a senhorita. Há ainda outro inglês aqui para ver você.
Ele está no estúdio, er, biblioteca. Eu sei que Lady Sophie quer que aquilo
seja chamada de biblioteca a partir de agora.
— É a mesma sala que sempre foi, — disse Muira amargamente.
— O lugar onde o Laird sempre foi beber e xingar com os membros do clã,
para fugir de ouvir as mulheres. Eu não sei onde Alec irá uma vez que ela
seja a dona daqui.
Jock arrastou os pés.
— Mesmo assim, Lorde Somerson também está lá embaixo e pede
que eu chame a senhorita, se me perdoar.
Muira dobrou a costura na cesta e sorriu para Caroline.
— Por que eu não levo as moças até a cozinha e lhes ensino outra
habilidade útil para uma esposa adequada enquanto está ocupada? Tal como
fazer um bom ensopado de carneiro. Na minha opinião, essa é uma maneira
muito melhor de ganhar um homem, do que dançar, ler ou equilibrar livros
na cabeça o dia todo.
Caroline reconheceu o homem pequeno com o cabelo ralo, do
funeral de sua mãe. Ele ficou de pé quando Caroline entrou na sala,
endireitando seu casaco preto sóbrio. Somerson levantou-se mais devagar,
observando a convenção social, mesmo quando seus olhos se encheram de
desdém pela meia-irmã. Ele não havia falado uma palavra com ela, em dias.
— Bom dia, Lady Caroline. Você se lembra de mim? Sou o Sr.
Rice, de Berwick. Eu era o homem de negócios do seu pai, no Norte, depois
o da sua mãe. Nós nos conhecemos no funeral de sua mãe. — Ele se curvou
e Caroline fez uma reverência. Ele pegou a pilha de documentos na mesa e o
estojo de couro desgastado do qual eles saíram.
— Claro que me lembro de você. Como foi sua jornada? —
Caroline perguntou educadamente. Ela não esperava que ele viesse
pessoalmente.
— Minha jornada foi boa, — ele começou, mas Somerson
interrompeu.
— Sente-se Caroline, e vamos acabar logo com isso. — Ele se
virou para o Sr. Rice. — Eu confio que você trouxe uma carta de acordo com
as minhas instruções para Caroline assinar?
O Sr. Rice virou-se para Caroline.
— É do meu conhecimento pela carta de Sua Senhoria que você
deseja renunciar à sua herança, minha senhora.
Caroline olhou para Somerson, que estava olhando furioso para o
homem de negócios.
— Eu sou seu guardião. Você pode endereçar seus comentários
para mim. Caroline, assine o papel e saia da sala imediatamente.
Rice sorriu educadamente, sem medo de Somerson.
— Receio não ter trazido nenhuma dessas cartas, meu senhor.
Como o homem de negócios de Lady Marjorie, meu negócio é diretamente
com Lady Caroline agora. Eu acredito que eles estão em ordem e parabéns
pelo aniversário, minha senhora?
— Obrigada, senhor Rice, — disse Caroline.
Somerson levantou-se.
— Você pode ir, senhor. Você não tem nada para discutir com
ninguém, além de mim mesmo. Eu sou o chefe dessa família e Caroline é
minha dependente. Se não houver nada para assinar neste momento, então
terei meu próprio homem em Londres elaborando os documentos
necessários. Bom dia.
Rice não se mexeu. Ele pegou o documento principal da pilha de
papéis.
— Não a partir de hoje, meu senhor. Eu tenho uma cópia da
vontade de Lady Marjorie, sua falecida mãe deixou algumas instruções
muito específicas. Ela lhe deixou algumas joias.
— Sim, um pequeno anel de rubi que ela usava todos os dias. Ela
me deu antes de morrer — disse Caroline, esfregando o dedo onde o anel
estivera assentado.
— Há várias outras peças, um broche de esmeralda, um colar de
pérolas com um fecho de diamante...
— Se foram presentes de meu pai, eles pertencem à condessa
Charlotte, depois as minhas filhas, não a Caroline.
— Eles pertenciam originalmente à própria mãe de Lady Marjorie,
meu senhor. — O Sr. Rice deslizou o documento através da mesinha para
Somerson. — Agora, se você se lembra do testamento de seu pai, meu
senhor, ele deixou várias instruções sobre a herança de Lady Caroline. Eles
são reafirmados aqui, na vontade da sua madrasta.
Caroline sentiu sua respiração ficar presa na garganta. Somerson
prendeu o homenzinho, com um olhar que envergonharia uma ave de rapina.
— Ela dificilmente era minha madrasta. Ela era um pouco mais
velha do que eu quando se casou com meu pai.
— Talvez, meu senhor, mas o falecido conde queria tanto a esposa
quanto a filha bem cuidadas após a sua morte.
— Marjorie não sofreu pela minha mão. Depois que meu pai
morreu, eu dei a ela uma casa para morar por toda a vida dela — disse
Somerson.
Caroline recordou a mansão sombria e mal reparada onde crescera,
o mais longe possível de Londres, sem dinheiro destinado a roupas ou
sutilezas, além do básico. Apenas um mês após a morte de sua mãe,
Somerson vendera o lugar sem dizer uma palavra para Caroline, e ela fora
forçada a depender da gentileza dos vizinhos por quase um ano, antes que
Somerson a convocasse a Londres e lhe oferecesse uma escolha.
— O testamento de sua senhoria fornece um legado específico
para Caroline, — disse o homem de negócios intencionalmente.
Caroline olhou para o seu meio-irmão. Seu rosto largo estava
vermelho e gotas de suor rolavam pela testa.
— O que isso significa? — Ela perguntou para Rice.
Somerson jogou o papel de lado.
— Isso não significa nada! Eu sou seu guardião. Eu controlo o
dinheiro dela, o qual ela agora insiste que deseja renunciar para poder ser
independente. Ela voluntariamente se ofereceu para cortar seus laços
familiares e eu concordei.
Caroline pegou o testamento e examinou as provisões
cuidadosamente escritas.
— Há uma cláusula no testamento que se Lady Caroline não
estiver casada até os 23 anos, o que é hoje, então ela assumirá o controle de
todo o dinheiro que lhe foi confiado.
Caroline leu as palavras, arregalando os olhos com a quantidade de
dinheiro que estava prestes a herdar.
— E se eu tivesse casado antes de hoje? — Perguntou ela.
— Então o senhorio teria negociado o pagamento do seu dote com
o seu marido, é claro. O resto do dinheiro teria permanecido em seu nome.
Somerson se levantou e foi até a janela.
— Como isso é possível? Marjorie Kirk era filha de um barão sem
dinheiro quando enganou meu pai para que se casasse com ela. Este é o
dinheiro do meu pai e, portanto, meu, e pretendo contestar sua vontade.
Onde ela teria conseguido essa quantidade de dinheiro a menos que ela
roubasse de sua propriedade?
O Sr. Rice retirou pacientemente outro documento.
— Foi um presente de casamento, meu senhor, um testamento
criado pela condessa viúva de Somerson, para a nova condessa.
Somerson se virou e voltou para a mesa.
— Minha mãe? Minha mãe estava morta!
— Eu quis dizer sua avó, meu senhor, condessa Georgiana
Somerson.
As sobrancelhas de Somerson se juntaram em confusão. Seu rosto
parecia dobrar ao redor da dura linha de seus lábios.
— Minha avó? — Ele assobiou.
— De fato. Colocados em confiança, os fundos seriam para
qualquer filho da união entre seu pai e Lady Marjorie, já que você herdaria a
totalidade dos títulos, propriedades e a fortuna do conde de Somerson.
— Como seria apropriado. É a lei, e tudo estava ligado à herança!
— Esta carta me foi dada para guardar em confiança até que Lady
Caroline se casasse ou comemorasse seu vigésimo terceiro aniversário. —
Ele entregou para Caroline um envelope amarelado, selado com cera
vermelha.
Somerson pegou-a da mão dela, antes que ela pudesse abri-la.
Caroline ficou tentada a pegá-lo de volta, mas se virou para o sr.
Rice.
— Então eu tenho dinheiro, separado do meu dote, que também é
meu a partir de hoje, e Somerson não é mais meu guardião?
Rice assentiu.
— Há uma pequena propriedade também.
— Ela vai possuir terra? Terra Somerson? — Somerson balbuciou.
— A propriedade em questão é uma pequena casa deixada à
condessa Georgiana por um tio, lorde Howden. Está aqui na Escócia e não
faz parte de nenhuma das propriedades de Somerson.
— Lullach Grange, — sussurrou Caroline.
— Essa mesma, você sabia dessa propriedade? — Perguntou Rice.
— Sim, eu sei, — disse ela.
— Você está realmente dizendo que minha meia-irmã, minha
tutelada, agora é independente e pode viver como ela quiser? — Perguntou
Somerson. — Eu nunca precisarei vê-la novamente, ou pagar-lhe um
centavo?
O Sr. Rice sacudiu a cabeça.
— Mesmo que ela renuncie aos laços com você, meu senhor, o
dinheiro é legitimamente de Lady Caroline. Lady Georgiana insistiu em
investir o dinheiro, é claro, e os fundos agora somam quase cinquenta mil
libras. É claro que o dote dela também deve ser entregue a Lady Caroline.
Não seria um dote, mas seu legado, neste momento. — Ele olhou para os
registros na frente dele. — Vinte e cinco mil libras.
Caroline olhou para Somerson:
— Você me disse que meu dote era de oito mil libras!
Ele levantou o queixo.
— Parecia o suficiente. Mandeville e Speed estavam dispostos a
aceitar essa quantia.
Ela fechou os olhos.
— Eles eram os menores solicitantes, não eram?
Seu meio-irmão zombou.
— Na verdade eles eram. Quem mais gostaria de você na sua
idade? Você vai redigir a carta para Caroline assinar, recusando os termos do
legado, — ele ordenou, mas o sr. Rice apenas sorriu.
— Receio que isso seja uma questão de Lady Caroline agora. —
Ele pegou uma nova folha de papel, mergulhou a caneta na tinta e esperou.
— Como posso prestar o serviço para você, minha senhora?
— E você herdou Lullach Grange? — Perguntou Angus a
Georgiana. — Ela está na terra de Glenlorne!
— Eu sei que meu tio comprou a casa e o jardim de seu pai de
forma justa, Angus MacNabb. Ele não queria enganar ninguém.
— Você não me disse que você era a dona. E se eu recusasse ou
Caroline nunca tivesse vindo aqui?
— Eu não tinha como saber, embora eu esperasse que ela viesse.
— Você me acordou da minha sepultura por nada, para reviver
toda a mágoa novamente?
— Eu estava viva quando fiz meu testamento, Angus. Eu não tinha
esperança de ver você de novo, em ambos os lados da sepultura. Eu só sabia
que o verão que passei aqui, foi o momento mais feliz da minha vida. Eu
estava errada em esperar que minha neta conhecesse a alegria que eu tive,
talvez vivesse toda a sua vida aqui, apaixonada? Eu não tive escolha, Angus,
nenhuma e eu queria ter certeza de que Caroline teria uma escolha.
— Ela tem dinheiro suficiente para se casar com Alec agora, —
Angus se entusiasmou. — Tudo funcionou do jeito que você planejou.
— Alec ainda está prometido para Sophie, — Georgiana o
lembrou com tristeza. — Se eles não tivessem honra, amor por este lugar e
as pessoas que são importantes para eles, então sim, eles poderiam se casar.
Não era sobre o dinheiro de Caroline. Agora, nem é sobre o amor. Eles têm
isso em grande quantidade. Nós simplesmente não contamos com honra, e
dever, Angus.
— Devem estar amaldiçoados! O amor nunca triunfa? O que
Caroline fará agora?
— Eu suponho que continuará com sua vida. Ela tem escolhas a
fazer. Nós não podemos escolher por ela, ou estaremos sem honra também.
— Então nós falhamos? — Disse Angus. — Tudo isso foi em vão?
— A maldição continuará, — Georgiana concordou brandamente.
— A menos que eles encontrem uma maneira de quebrá-la, e temo que seja
tarde demais para isso, Angus.

Capítulo 47

— O saguão foi elevado para as adoráveis noivas? — Disse Parfitt


enquanto todos se reuniam antes do jantar, na noite anterior à cerimônia
dupla.
— Eu gostaria de dizer algo primeiro, — disse Lottie.
Alec segurou a respiração, à espera de um discurso romântico e
lágrimas de uma noiva chorona, embora Lottie parecia notavelmente calma
esta noite, especialmente quando ela começou a remover o anel de noivado
de sua mão enluvada.
— William, eu mudei de ideia.
Sophie engasgou de horror. Caroline ficou em silêncio, observando
sua sobrinha. William Mears ficou vermelho do queixo até as pontas das
orelhas.
A condessa Charlotte franziu a testa.
— Não me diga que você quer se casar em Londres ou em
Somerson Park, afinal, Lottie!
— Na verdade, mamãe, não quero me casar. Bem, pelo menos eu
não quero me casar com William.
O grito de Charlotte, misturado com o mais profundo berro de
raiva de Somerson, levou Muira, Jock e Leith a correr da cozinha, onde
aparentemente haviam pegado algo útil, como uma arma em seu caminho.
Muira brandiu um garfo aparentemente letal, Jock estava com um rolo, e
Leith com os olhos selvagens levou a travessa, pronto para jogá-la. Chegou a
tempo de suavizar a queda enquanto a condessa Charlotte desmaiava e caía
sobre ele. A travessa bateu no chão e se quebrou, o que fez Muira gritar.
— Aqui, — disse Lottie. Ela entregou o anel a William, que
parecia polidamente atordoado, olhando para ela. Então ela enfiou a mão no
bolso e pegou os sais aromáticos obviamente prontos para a reação da
condessa. — Eu pensei que precisaria deles. — Lottie se inclinou sobre
Charlotte e acenou o frasco debaixo do nariz da condessa, em seguida, deu
um aceno para Leith, que ainda estava preso debaixo dela. William ficou
parado olhando fixamente para o anel na palma da mão.
A primeira pessoa que Charlotte viu quando acordou foi Caroline,
e ela gritou novamente, e começou a chorar alto, com lágrimas barulhentas.
— Estou sufocando, — disse Leith por baixo de sua vasta
estrutura. O Sr. Parfitt murmurou preces enquanto puxava o braço da
condessa, tentando levantá-la.
— Isso é tudo culpa sua! Você a encorajou a fazer isso! —
Charlotte falou, atirando ódio e culpando Caroline.
— Não, mamãe, não tem nada a ver com Caroline. Eu só decidi
que casar com William não era o que eu queria fazer.
— O que você quer fazer? Você está ciente do escândalo que isso
causará? Mears é um homem perfeitamente decente, — disse Somerson. —
Tem mais alguém?
Lottie chupou sua bochecha.
— Bem, há George, meu irmão George. Você vê, eu quero uma
aventura. Eu pretendo ir com George quando ele sair em seu Grand Tour.
Charlotte gritou novamente, e Leith gemeu, suas pernas se
debatendo sob a condessa enquanto ele lutava para escapar. Alec teve pena
dele e ajudou o Sr. Parfitt e Jock a levantar a condessa afetada e ajudá-la a se
sentar em uma cadeira.
— Eu não vou permitir! — Protestou a condessa. — Nem seu pai.
Lottie mal parecia dissuadida.
— Caroline virá comigo e minha empregada, e George e seu tutor
e o valete. Será perfeitamente adequado. Além disso, se houver um
escândalo sobre meu compromisso rompido, não seria melhor se eu fosse
embora por um tempo? Não tenho intenção de me esconder nas sombras de
Somerson Park.
Alec olhou para Caroline, surpreso. Ela encontrou seus olhos por
apenas um momento antes de desviar o olhar, suas bochechas corando.
— Europa! — Disse Megan. — Que maravilha. Posso ir junto?
— Eu não vou esperar por você, — disse William. Ele estava
sentado no sofá, com o anel ainda na palma da mão estendida. Sophie estava
ao seu lado, acariciando seu braço com apoio, encarando Lottie com raiva.
— Eu não espero que você faça, — disse Lottie, e deu-lhe um
sorriso triste. — Desejo-lhe toda a felicidade William, realmente eu desejo,
mas não comigo.
Alec olhou novamente para Caroline, mas ela saiu do recinto.
— Quando você vai embora? — Perguntou Sophie a Lottie.
— Amanhã, — respondeu Lottie. — Um recomeço bem cedo.
— Logo depois do casamento, então? — Perguntou Sophie.
— Hum, antes seria melhor.
Alec sentiu seu estômago se transformar em ferro. Caroline estava
saindo logo de manhã, indo embora, fugindo. Ele se perguntou se ela queria
dizer adeus, ou se ele apenas acordaria amanhã para não a encontrar mais.
— Neville, estamos indo também, já que não adianta ficar mais
um momento, — disse Charlotte. — Ordene que os cavalos sejam
preparados e tenha tudo embalado de uma só vez.
— E o jantar? — Perguntou Muira.
William sacudiu a cabeça.
— Eu não estou com fome.
— Então eu também não estou, — disse Sophie.
— Tenho que fazer as malas, — disse Lottie.
Charlotte olhou para os pedaços da travessa, no chão, as vagens e a
massa esmagada e espalhada como um coração partido.
— Talvez você possa mandar uma travessa para o meu quarto, e eu
vou comer enquanto minha empregada empacota tudo. Faça isso depressa.
Alec não se incomodou em bater quando chegou ao quarto de
Caroline. Ele simplesmente abriu a porta e entrou, deixando o painel bater na
parede com um estrondo. Ela estava sentada à mesa, a caneta na mão, e
olhou para ele com os olhos arregalados. Havia lágrimas nos olhos dela, mas
ele ignorou aquilo.
— Você pretendia dizer adeus? Ah, não para mim, claro, mas e as
meninas e Muira, e as crianças da aldeia? Há quanto tempo você sabe que
vai partir pela manhã?
Outro rubor encheu suas bochechas.
— Eu estava escrevendo uma carta para você, — ela murmurou.
— Sua renúncia? — Ela assentiu com a cabeça. — Não é essa a
saída do covarde? Você tem uma carta para Sophie também? Ela, pelo
menos, merece algo melhor. Ela não tem família aqui, ninguém, a não ser
você e Lottie...
— Ela tem você! — Caroline disse ferozmente, a tristeza se
transformando em raiva. Ele leu o ciúme em seus olhos cor de avelã, e dor.
Ele sentia a mesma dor esfaqueá-lo.
— Sim, ela tem, — ele disse.
— Aqui, você pode muito bem ter isso agora, — disse ela,
atravessando a sala em passos curtos e abruptos para entregar um pedaço de
papel. Ele o pegou e olhou para ele.
— Eu não entendo, — disse ele, sentindo o calor subindo sob o
colarinho. — O que diabos isso significa?
— É a propriedade de Lullach Grange, um presente de casamento.
Eu descobri ontem que eu herdei a casa da minha avó. Eu não posso ficar
com isso.
— Por quê? — Ele exigiu.
Ela encontrou seus olhos corajosamente, dignidade guerreando
com lágrimas.
— Isso me atrairá de volta para cá.
— Você odeia tanto este lugar?
Ela baixou o olhar para as mãos.
— Bem ao contrário, mas eu não pertenço a este lugar.
Ele não podia imaginar Glenlorne sem ela.
— E as meninas? O que elas farão sem você? Elas a adoram.
— Elas terão Sophie.
Alec passou a mão pelos cabelos.
— Oh, eu posso ver que vai ser um grande casamento, com cada
maldita pessoa em lágrimas — pelo menos os que sobraram.
— Ela é linda, Alec. Ela será uma esposa maravilhosa. — Havia
adeus em sua voz, em seus olhos. Seu coração se partiu em seu peito.
Ele agarrou seus ombros.
— Mantenha a Grange, Caroline. Deixe-a trazê-la de volta em um
ano, ou dois anos, em cinco, apenas prometa que você voltará... — Ela parou
a última palavra — eu... — com um dedo nos lábios. Sua pele estava fria e
sua boca se encheu de água para beijá-la.
Seus olhos encontraram os dele.
— É melhor assim, limpo e rápido. Você vai se apaixonar por So...
Sophie apareceu na porta aberta.
— Oh! Caroline, eu apenas preciso ter seu conselho sobre como
usar o meu cabelo amanhã, Lady Charlotte mandou cada donzela do lugar
ajudar a fazer suas malas, e eu não posso suportar ter que pedir para Lottie,
agora que ela rompeu com o Will... — Ela parou quando viu Alec,
praticamente segurando Caroline nos seus braços.
Alec observou os olhos da noiva, viu a compreensão nas
profundezas azuis pálidas.
— Oh! — Ela respirou e apertou a mão contra o peito. — Oh!
Caroline se afastou dele, e forçou um sorriso.
— Eu estava dando a Alec meu presente de casamento para ele dar
para você amanhã, Lullach Grange.
Sophie franziu os lábios, ainda olhando de Alec para Caroline e de
volta para Alec. Ela não fez nenhum movimento para pegar a escritura que
Caroline estendeu para ela. Suas bochechas empalideceram até o marfim,
depois coraram um tom profundo de rosa.
— Então eu deveria lhe agradecer.
Alec se sentiu como um canalha. Sophie segurou-se rigidamente e
forçou um sorriso. A tensão, a suspeita e a tristeza naquela sala eram
espessas, dificultavam a respiração.
Sophie não era idiota. Ela sabia muito bem o que tinha visto e
nunca esqueceria. Era uma maneira horrível de começar um casamento. Ela
se sacudiu, sorriu para Caroline e voltou à porta.
— Acho que vou dormir, — disse ela, recuando.
— Sophie, — Alec começou, mas ela sorriu para ele
brilhantemente e balançou a cabeça.
— Ah não. É má sorte para o noivo ver a noiva antes do
casamento, Alec, muito azar mesmo. Boa noite
Ele a observou ir, ouviu seus pés recuarem pelo corredor, o
farfalhar de seu vestido de tafetá e abaixou a cabeça.

Capítulo 48

Caroline não dormiu nada. Uma vez que seus poucos pertences
estavam embalados, e ela escrevera as cartas para Megan, Alanna e Sorcha,
sentou-se e olhou à velha torre no morro. Ela traçou seus contornos com a
ponta do dedo, fixou-a em sua memória para mantê-la aquecida e lembrá-la
da felicidade pelos próximos anos. De madrugada, ela saiu do quarto para
colocar as cartas nos quartos das meninas.
Ela quase se assustou ao ver Sophie no corredor.
Ela não estava vestida para o casamento. Ela estava vestida para
viajar. Sophie soltou um grito assustado ao ver Caroline.
— Oh, Caroline, você me assustou!
— Você está se preparando para o casamento tão cedo? —
Perguntou Caroline.
Sophie levantou o queixo.
— Eu decidi não me casar com Glenlorne. Na verdade, estou
partindo. Se Lottie pode fazer isso, eu também posso.
O queixo de Caroline caiu.
— Mas porque... — Ela girou ao som de passos atrás dela, e
encontrou William rastejando para fora de seu quarto, vestido também.
— Caroline! — Ele gritou de surpresa, e deixou cair a valise que
estava carregando. Ele tirou sua cartola e a escondeu atrás das costas. Então
olhou para Sophie, seu rosto corando.
— Eu suponho que você nos pegou, Caroline. Estamos fugindo, —
disse Sophie. Ela moveu-se para ficar com William, ligando seu braço ao
dele. Colocou a mão dele, na dela, e ela viu o anel de Lottie no dedo de
Sophie.
— O quê? — Caroline olhou para eles.
— Eu nunca teria sido feliz aqui em Glenlorne. Eu odeio as
Highlands, e Alec simplesmente não me ama, e posso ver agora que ele
nunca poderia me amar. Ele é honrado e, como meu pai não lhe deu outra
escolha senão me aceitar, ele teria se casado, apesar do fato de ele estar
apaixonado por outra pessoa.
Os olhos de William se arregalaram.
— Realmente? Por quem?
Caroline sentiu o calor do rosto, mas Sophie ignorou a pergunta de
William.
— Eu não suportaria casar com um homem que não me adorasse.
William me adora e descobri que também o adoro. Temos muito em comum,
enquanto Alec e eu... — Ela encolheu os ombros. — Acho que ele vai ficar
aliviado, em vez de angustiado, quando descobrir que fui embora.
— William, isso é por causa de Lottie? Seu orgulho está tão
ferido?
— Não, eu posso ver que Lottie está certa. Nós não daríamos
certo. Sophie não se importa com aventuras ou longas caminhadas nas
montanhas ou olhar as vistas das montanhas.
— E William entende a importância do tom perfeito de amarelo,
— Sophie disse. Ela se adiantou para apertar o braço de Caroline. — Não
pareça tão ferida, Caroline. Eu entendo, eu realmente entendo. Desejo-lhe
apenas felicidade, aconteça o que acontecer.
Caroline sentiu uma pontada aguda de pânico e culpa.
— Estou indo embora, Sophie, hoje, com Lottie. Isso não é
necessário. Não há nada... — Sophie a parou com um sorriso.
— Se ele olhasse para mim do jeito que ele olha para você, mesmo
que por uma só vez, bem, ele não olhou, então, é isso.
— Eu confio que você não vai contar a ele! — Disse William. —
Se Glenlorne descobrir que eu roubei Sophie, pode se sentir obrigado a vir
atrás de nós e me desafiar para um duelo, e você sabe que eu sempre fui
fraco no tiro, querida, e com uma espada, eu sou ainda pior. Não que eu não
lutaria por Sophie, é claro.
— Oh, William, — Sophie respirou, e ficou na ponta dos pés para
beijar sua bochecha. Ela se virou e sorriu para Caroline, e Caroline viu toda
a felicidade em seu rosto que uma noiva deveria sentir. — Deseje a
Glenlorne o melhor quando você o vir. É bastante óbvio para mim que as
aventuras servem apenas para nos mostrar aonde realmente pertencemos.
William é aonde eu pertenço. Adeus, Caroline.
Caroline observou-os ir, atordoada. Outra porta se abriu e uma
pequena trupe de criados em libré, de Somerson passou correndo por ela,
carregando as caixas, malas e bagagens que levaram para o castelo de
Glenlorne, apenas uma semana e três dias antes.
Lottie saiu do quarto e precisou se pressionar contra a parede.
— Deus, que confusão! Felizmente mamãe trouxe apenas o
essencial nesta viagem. São necessárias quatro viagens para mover tudo o
que ela precisa para a temporada, de Somerson Park à casa de Londres, —
disse Lottie. — Você está pronta para ir?
Caroline olhou para o outro lado da galeria, para fora da janela,
para a Torre de Glenlorne. Parecia fazer a mesma pergunta. Imaginou Alec
sentado na capela, à espera de sua noiva, andando no chão de pedra diante
do altar, com o reverendo Parfitt batendo seus dedos longos no livro de
orações e enxugando a testa. Os moradores estariam acordados, vestidos
com seu melhor traje, os MacNabb vestindo kilts, faixas e boinas e indo até
o vale em direção ao castelo por trás dos flautistas de fole para testemunhar
o casamento de seu senhor.
Alec estaria lá quando a porta da capela finalmente se abrisse, e
ele não entenderia, nunca saberia o que aconteceu quando Sophie não
chegasse. Caroline fechou os olhos. Era tudo culpa dela.
— Caroline? — Perguntou Lottie, franzindo a testa.
Ela deveria ir. Ela deveria seguir Lottie descendo as escadas e
nunca olhar para trás. Ela deu o primeiro passo e parou.
— Eu preciso encontrar Alec e dizer a ele, — disse ela, e desceu as
escadas correndo.

Capítulo 49

Ele puxou as mangas do paletó e passou a mão sobre o xadrez


MacNabb de seu kilt. Ele não dormiu. Ele se levantou, se vestiu e saiu para
uma longa caminhada, subiu até a velha torre e observou o nascer do sol,
pensando em Caroline. Não importa o quão duro ele tentasse substituir o
rosto dela pelo de Sophie, era Caroline que ele via — Caroline rindo com as
garotas, Caroline aprendendo gaélico dos aldeões, a paixão de Caroline
enquanto ele fazia amor com ela, Caroline com a expressão determinada
enquanto rasgava suas anáguas para enfaixá-lo. Ele olhou para a janela vazia
da torre e lembrou-se da primeira vez que a vira ali, com os cabelos ruivos
voando ao vento do solstício de verão, a expressão feliz quando ela olhou
para o vale. Ela caiu em seus braços e ele sentiu como se pertencesse a ele.
Ele se lembrava dela à luz de velas, a luz das estrelas, a luz do fogo, a luz do
sol e até na chuva. Ela teria ido embora quando ele voltasse para o castelo.
Sem ela, o castelo pareceria vazio e desolado como a velha torre.
Suas mãos se apertaram com frustração. Em uma hora, ele se
comprometeria com Sophie Ellison, prometendo honrá-la e apreciá-la todos
os dias de sua vida, para ficar ao lado dela, para ser fiel e verdadeiro. Esta
noite, ele a levaria à cama e cumpriria sua promessa. Ele fechou os olhos.
Até então, Caroline estaria a quilômetros de distância, perdida para ele, para
sempre. Como ele desejava agora ter ficado em Londres, ou ter ido para o
mar, ou fazer qualquer coisa para evitar isso. Lançou um último olhar à
janela acima dele, olhando como um bando de cotovias explodiu através
dela, para o céu iluminado. Voando, celebrando o amanhecer com seus
trinados. Ele caminhou de volta até o castelo, indo à capela além dele. Ele
passou pelo túmulo de seu avô e o de seu pai. Ele sentia como se os olhos de
cada ancestral MacNabb estivessem sobre ele, observando-o, instigando-o a
fazer a coisa certa.
E a coisa certa era casar com Sophie, não era?
Entrou na capela, construída nos dias em que os MacNabbs eram
católicos, e desde então redecorada e simplificada ao estilo presbiteriano. O
pequenino altar estava enfeitado com flores — Muira e as meninas haviam
arrumado isso, escolhendo flores por causa de seus significados. Havia potes
de alho e cebolinha junto à porta, o cheiro forte destinado a afugentar o mal.
Sophie levaria um buquê de rosas cheirando a amor, urzes para a boa sorte e
hera para a fidelidade.
O interior da igreja cheirava ao cabelo de Caroline, lavado com o
sabonete de flores silvestres de Muira. Ele fechou os olhos contra o desejo
por ela e foi sentar-se nos degraus do altar, olhando em volta. Quantos
MacNabbs haviam se casado aqui? Inúmeros, com certeza, aldeões,
membros do clã e Lairds. Era seu trabalho assegurar que incontáveis
MacNabbs tivessem essa chance, seus próprios filhos e filhas, os filhos de
seus parentes. A responsabilidade pesava sobre seus ombros.
Ele checou seu relógio. Sophie estaria vestida agora, e as garotas
estariam colocando flores no cabelo dela, junto com as fabulosas joias de
Bray, é claro. O Sr. Parfitt traria o anel que Lorde Bray enviara para colocar
no dedo de Sophie. Era enorme, um diamante cercado por safiras, para
combinar com seus olhos. Ele colocou a mão no bolso, mas tirou quando a
porta se abriu.
Alec olhou para cima, esperando Sophie. Ele se levantou, respirou
fundo e esperou.
O sol da manhã pegou o cabelo ruivo de Caroline, fez brilhar. O
fôlego ficou preso em sua garganta.
— Alec! — Ela correu pelo corredor até ele, seus passos afiados
no chão de pedra.
Ele resistiu ao desejo de abrir os braços e pegá-la. Ele soltou a
respiração que estava segurando.
— Caroline, — ele disse. Ele não foi mais longe. Uma dúzia de
perguntas lhe veio à mente, mas ele não podia fazer nenhuma delas. Ela
parou a poucos metros dele.
— Ela se foi, Alec.
— Quem? — Ele perguntou como um idiota. Havia mais alguém
no mundo além de Caroline? Seus olhos, seus cabelos, ele os devorava.
— Sophie, ela saiu esta manhã, fugiu com William.
Levou um momento para que o significado daquilo penetrasse em
sua mente. Ele olhou para ela, viu a tristeza em seus olhos, as lágrimas em
seus cílios.
— É minha culpa, claro. Ela viu você no meu quarto, imaginou...
— Ele sentiu uma onda de alívio passar por seus membros. — Ela imaginou
o pior, Alec. Não haverá casamento algum.
Ele inclinou a cabeça.
— Você quer dizer que ela viu a verdade.
— Ela pensou que você, — ela engoliu em seco. — Quero dizer,
que eu...
Ele sorriu. Ele não conseguiu evitar. Seu rosto se esticou em um
sorriso. Ele se sentia tão livre e feliz quanto as cotovias.
— Ela conseguiu ver que eu a amo, é isso que você quer dizer? —
Ele perguntou. — E que você me ama, e que pertence a Glenlorne, e que
Glenlorne precisa de você?
Ela fechou a boca com um estalo e olhou para ele. Ele deu um
passo à frente e a pegou em seus braços e a beijou, até que seus lábios se
suavizaram e ela o beijou de volta. Ele estava errado, ela cheirava melhor
que as flores. Ela se afastou e olhou para ele.
— Você não entende? Não vai haver casamento.
— De fato, haverá um casamento. Eu não me importo em me casar
sem uma fortuna. Nós vamos encontrar uma maneira. Contanto que eu tenha
você ao meu lado, encontraremos um jeito.
Ela olhou para ele. A porta se abriu atrás deles. Nenhum dos dois
olhou para ver quem era. Ele caiu de joelhos.
— O que você diz? Você quer casar comigo, moça?
— Sim, — ela suspirou. — Sim, eu quero.
O Sr. Parfitt veio para dar a triste notícia para Glenlorne de que sua
noiva partira, horas antes, com outro cavalheiro. Ele balançou a cabeça
enquanto passava pelas lápides do pequeno cemitério. Deve ser algo no ar
das Highlands. Ele nunca havia visto tantos compromissos rompidos em sua
vida. Ele nunca havia conduzido um casamento antes, sendo novo no clero.
Ficou feliz, honrado e muito bem pago quando Lorde Bray o contratou para
acompanhar a filha ao norte e vê-la se casar o mais rápido possível. Ele
falhou. Ele olhou para o céu, perguntou ao Senhor acima, como ele
explicaria tudo isso para o conde — bem, ambos os condes, o pai e o noivo.
Ele esperava uma nomeação para uma paróquia rica, e agora ele teria sorte
de encontrar um emprego de acompanhante de prisioneiros para o carrasco,
em uma prisão de Londres.
Suspirou, abriu a porta da capela e parou no caminho. O lorde
estava lá esperando, com certeza, mas ele não estava sozinho, nem triste.
Lady Caroline estava em seus braços. Os dois sorriram quando o viram na
porta.
— Estamos prontos, — disse o conde. O clérigo apertou ainda
mais seu livro de orações.
— Mas... — Ele olhou para os rostos corados do feliz casal, viu a
alegria nos olhos da jovem mulher, o orgulho no noivo — tudo o que estava
faltando em cada casal de noivos aqui em Glenlorne, até agora. Tocou seu
coração. Ele suspirou e subiu os degraus até o altar. — Isso é muito
incomum, — disse ele. A porta se abriu novamente e as pessoas começaram
a se amontoar na igrejinha. Parfitt reconheceu as irmãs do lorde, a
governanta, os ghillies e dezenas de outras pessoas. Eles não pareciam
surpresos ao ver Lady Caroline ao lado do Laird. Na verdade, eles sorriram e
cutucaram um ao outro, sussurrando que sabiam disso o tempo todo. E eles
sorriram, como se tudo estivesse certo no universo de Glenlorne e de Deus.
Quem era ele para contestar isso?
— Vamos começar? — Ele disse, e abriu o livro de orações.
Ele não parou até chegar à parte sobre a troca de anéis.
— Você tem um anel, meu senhor? Eu tenho o diamante Bray no
meu bolso, é claro, mas nessas circunstâncias, parece errado usá-lo agora.
O lorde franziu a testa por um momento, depois enfiou a mão no
bolso.
— Eu tenho um, — disse ele. Ele pegou um anel de rubi e
colocou-o no livro de orações, onde ele brilhava como uma gota de sangue.
— Isso vai funcionar muito bem, — disse Parfitt, mas a noiva
engasgou.
— Onde você conseguiu isso? — Ela perguntou.
— Sua senhoria somente...— Parfitt começou, mas ela estava
olhando para o Laird. Ele era tão alto que ela precisou inclinar a cabeça para
trás para olhá-lo. Seu rosto brilhou na luz da manhã que entrava pela janela
atrás dela, transformando seu cabelo em um resplendor celeste.
— Espero que sirva, — disse o Laird. — Eu conheci uma moça na
rua em Londres. Ela estava fugindo. Tentei impedi-la, mas ela insistiu em
continuar fugindo. Ela era muito corajosa, Caroline, como você. Dei-lhe
algum dinheiro para a viagem e ela insistiu em me pagar com o anel. Espero
que ela esteja segura.
— Era o anel da minha avó, Alec. Dei a um homem gentil que me
ofereceu dinheiro e conselhos quando eu estava sozinha e com medo. Era
você?
Eles se encararam por tanto tempo e com tanto amor que o Sr.
Parfitt foi obrigado a limpar a garganta.
— Então, podemos continuar?
Aplausos ecoaram dos bancos enquanto o Laird colocava o rubi no
dedo da noiva. Até o Sr. Parfitt enxugou uma lágrima de seu olho, e lhes
desejou boa sorte e quis dizer isso quando apertou a mão do lorde e mandou
Alec MacNabb beijar sua noiva, é claro.
A festa de casamento seguiu-se imediatamente, realizada lá fora na
encosta, e cada casa na vila trouxe a própria versão da cerveja para brindar o
casal feliz. As gaitas de fole saíram e tocaram alegremente até o pôr do sol e
além dele. A noiva dançou feliz, com cada membro do clã, o noivo dançou
com as servas e matronas que coraram, e beijou cada bebê na aldeia para
garantir sua própria fertilidade, enquanto sua noiva corava.
Lottie sentou-se com as irmãs de Alec e apreciou o brilho de
felicidade em sua tia, e a invejou um pouco. A aventura de Caroline
terminara exatamente como deveria — ela pertencia à Escócia, a Glenlorne,
e ao lado de Alec MacNabb.
— Eu sempre soube que Caroline gostava de Alec. — Megan
suspirou enquanto os observava ceder ao encorajamento da multidão e se
beijarem. O anel de rubi brilhava à luz do fogo.
— Caroline e Alec? Nunca vi nenhum sinal disso, — disse Alanna.
— Ela o salvou quando ele foi baleado, — disse Sorcha.
— Bobagem! Teríamos feito o mesmo se estivéssemos lá! —
Disse Alanna.
— Eu o vi olhar para ela também, do mesmo jeito que Sorcha olha
para o bolo, — disse Megan.
— Bolo? — Perguntou Alanna.
— Como se ela fosse doce e deliciosa e ele estivesse morrendo
para devorar ela. — Megan suspirou.
— Acho que sei o que você quer dizer, — disse Lottie. — Do jeito
que ele está olhando para ela agora.
— Sim, assim mesmo, — respondeu Megan. — Eu não vou casar
até que alguém me olhe assim.
— Nós não vamos nos casar sem a fortuna de Sophie. — Alanna
suspirou. — Ela prometeu me levar a Londres para a temporada. Eu suponho
que ainda estamos sem dinheiro!
Lottie franziu a testa.
— Sem dinheiro? A fortuna de Caroline é, pelo menos, tão grande
quanto a de Sophie.
Megan e Alanna a encararam.
— Verdade. Minha mãe ficou horrorizada, claro, mas é verdade.
Muira já contou a velha história da moça inglesa e do filho do Laird de
Glenlorne? Minha avó e de Caroline me contaram a história uma vez.
As garotas balançaram a cabeça, Lottie sorriu e começou.
— Era o Solstício de Verão e o tempo era perfeito para se
apaixonar...

Epílogo

— Como sabemos se a maldição terminou? — Perguntou Angus


das sombras.
Georgiana enxugou uma lágrima.
— É claro que terminou, olhe para eles! — Eles assistiram quando
Caroline jogou a cabeça para trás e riu quando Alec a girou através da
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grama, dançando o reel . Ela havia tirado os sapatos, soltado o cabelo e
parecia uma fada e tão bonita quanto qualquer moça da aldeia. Alec olhou à
noiva com tanto amor que o peito de Georgiana doeu.
— Você costumava olhar para mim assim, meu amor, — disse ela
com um suspiro que fez um tremular nas proximidades da tocha.
— Eu ainda olho, gràdhach. Eu nunca parei de amar você, nunca
irei, — disse Angus.
— Então, por que ainda estamos aqui? — Perguntou Georgiana.
Um jovem casal passou correndo por eles e esbarrou em Georgiana.
— Oh, perdão. Eu não vi vocês, — a moça disse educadamente, e
eles continuaram.
Georgiana se virou para Angus. Ele estava olhando para o casal
que estava partindo da festa, surpreso.
— Você viu isso?
— Você sentiu isso? — Perguntou Angus.
— Gràdhach... — Ele começou e tentou flutuar em direção a ela.
Ele tropeçou em um tufo de grama e a boina caiu sobre seus olhos. Ele se
endireitou e olhou para baixo, viu suas botas sólidas e esmagando uma flor
silvestre. Ele olhou para Georgiana, novamente, e ela viu a dor em seus
olhos, viu a esperança. Ele estendeu a mão até sua bochecha, ela fechou os
olhos e esperou. Seu toque era tão quente e real quanto ela se lembrava. Ela
apertou a bochecha contra a palma da mão dele, colocou a mão no peito
dele, sentiu-o sólido sob os dedos, a respiração e o sangue cantando sob a lã
quente de seu tartan. Ela podia sentir o cheiro das flores, também, sentir a
brisa suave da noite em sua pele. Eles olharam nos olhos um do outro, eles
se viram do jeito que estavam na última noite em que se conheceram, anos
atrás, uma vida e uma morte atrás. Ele sorriu enquanto respirava de verdade,
depois jogou a cabeça para trás e riu.
Ele pegou a mão dela na sua, beijou-a e ela apertou de volta.
— Eu diria que a maldição acabou com certeza, — disse ela.
Angus sorriu para ela.
— Vamos, — disse ele. — É hora de ir.
De mãos dadas, eles caminharam pela urze, subiram o vale até a
torre, até que a sombra os engoliu.
Notas
[←1]
Moggy é um gato de origem desconhecida / raça mista. Eles são o tipo mais comum de gatos
domesticados e vêm em todas as formas, tamanhos e cores.
[←2]
Príncipe Charles Edward Stuart, 1720 - 1788. Filho mais velho do Príncipe James Francis
Edward Stuart. Uma das figuras mais românticas da história da Europa, no coração de uma
história trágica de lealdade e devoção. O Jovem Pretendente levou uma busca fútil para salvar
a alma da Escócia.
[←3]
Os ferreiros em Gretna ficaram conhecidos como "sacerdotes da bigorna", culminando com
Richard Rennison, que realizou 5.147 cerimônias. O ferreiro local e sua bigorna tornaram-se
símbolos duradouros dos casamentos de Gretna Green.
[←4]
A Batalha de Culloden no dia 16 de Abril de 1746, entre as tropas do governo britânico e os
rebeldes jacobitas, ocorreu no pântano de Culloden (Culloden Muir, também conhecido como
Drummossie Muir) perto de Inverness, na Escócia, e terminou com uma vitória para as tropas
do governo inglês.
[←5]
Tecido muito denso de algodão com um acabamento acetinado e brilhante. É resistente e
duradouro, geralmente estampado com motivos florais, frutas ou pássaros. Uso: Decoração,
forração de sofás, almofadas e cortinas.
[←6]
Sassenachs: Estrangeiro, mas geralmente reservado para ofensivamente referir-se a um inglês.
[←7]
O palladianismo ou arquitetura palladiana é um estilo arquitetônico derivado da obra prática e
teórica do arquiteto italiano Andrea Palladio (1508-1580), um dos mais influentes personagens
de toda a história da arquitetura do Ocidente.
[←8]
Uggsome: Repugnante, nojento em gaélico escocês.
[←9]
O Great skua (Stercorarius skua) é uma grande ave marinha da família dos sku Stercorariidae.
Acredita-se que o nome em inglês e o nome da espécie "skua" tenham origem no skúvur ou
skúvur [ˈskɪkvʊər] faroense e seja o único nome de pássaro conhecido originário das Ilhas
Faroe que entrou em uso regular em outros lugares. Na Grã-Bretanha, às vezes é conhecido
pelo nome de bonxie, um nome Shetland de origem nórdica.
[←10]
Ghillies: Gillie ou ghillie é um termo escocês que se refere a um homem ou um menino que
atua como um atendente em uma pesca, caça ou expedição de perseguição de cervos,
principalmente nas Highlands ou em um rio como o Rio Spey.
[←11]
Seannachie: contador de histórias.
[←12]
Grand Tour era o nome dado a uma tradicional viagem pela Europa, feita principalmente por
jovens de classe-média alta. Trata-se da origem histórica do turismo contemporâneo,
principalmente da maneira como ele é entendido no Ocidente.
[←13]
Reel: Uma animada dança folclórica escocesa ou irlandesa.
Table of Contents
Notas

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