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Teoria Geral Direito Civil 2 - Sebenta Serafim Cortizo TGDC


II-1
Direito civil (Universidade Eduardo Mondlane)

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Serafim Cortizo
Teoria Geral do Direito Civil II
Aulas teóricas e casos práticos
resolvidos

2º Ano Direito – Ano lectivo 2011/2012

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Índice
Aulas 1 e 2 ..................................................................................................................................... 8
AUTONOMIA PRIVADA E O NEGÓCIO JURÍDICO ....................................................................... 8
O NEGÓCIO JURÍDICO................................................................................................................ 8
AS MODALIDADES DE NEGÓCIOS JURÍDICOS ............................................................................ 8
O CONTRATO ............................................................................................................................. 9
A PROCURAÇÃO (Negócio Unilateral) ....................................................................................... 9
NULIDADE E ANULABILIDADE.................................................................................................... 9
A LIBERDADE CONTRATUAL .................................................................................................... 10
CONTRATOS TÍPICOS E CONTRATOS ATÍPICOS ....................................................................... 10
REGIME DA NULIDADE E DA ANULABILIDADE (Revisões e casos práticos) ............................ 12
Aula 3........................................................................................................................................... 14
NEGÓCIO JURÍDICO (Continuação) - DECLARAÇÃO NEGOCIAL ............................................... 14
O SILÊNCIO (Como meio declarativo) – Artigo 218 ................................................................. 15
CONCEITO DE USO .................................................................................................................. 16
CONCEITO DE CONVENÇÃO .................................................................................................... 16
Aula 4........................................................................................................................................... 17
DECLARAÇÕES NEGOCIAIS (Continuação)............................................................................... 17
VALOR DECLARATIVO DO SILÊNCIO (Continuação)................................................................. 17
A FORMA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS (Artigo 219 e seguintes) .............................................. 17
FORMA AD SUBSTANCIAN E FORMA AD PROBATIONEN ........................................................ 18
FORMA CONVENCIONAL – Artigo 223 .................................................................................... 20
Aula 5........................................................................................................................................... 21
DECLARAÇÃO NEGOCIAL (Revisões)........................................................................................ 21
FIGURA DO SILÊNCIO COMO MEIO DECLARATIVO (Artigo 218) ............................................. 23
A FORMA (Artigo 219) ............................................................................................................. 24
Aula 6........................................................................................................................................... 25
FORMA DO NEGÓCIO JURÍDICO (Continuação) ...................................................................... 25
ARTIGO Nº 221 (ÂMBITO DA FORMA LEGAL) ......................................................................... 26
ARTIGO 221 Nº 1 ..................................................................................................................... 27
ARTIGO 394 Nº 1 ..................................................................................................................... 28
Aula nº 7 ...................................................................................................................................... 29
FORMA DO NEGÓCIO JURÍDICO (Conclusão) .......................................................................... 29
FORMA VOLUNTÁRIA .............................................................................................................. 30

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CULPA NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS – CULPA IN CONTRAHENDO ................................. 30


TESE DE MOTA PINTO E MENESES CORDEIRO (Abuso do direito) .......................................... 32
TESE DE MOTA PINTO ............................................................................................................. 32
TESE DE MENEZES CORDEIRO ................................................................................................. 33
INTERPRETAÇÃO DAS DECLARAÇÕES NEGOCIAIS ................................................................... 34
ARTIGO 236 – REGRA DE INTERPRETAÇÃO DAS DECLARAÇÕES NEGOCIAIS EM GERAL ........ 35
ARTIGO 236 Nº 1 (Sentido juridicamente vinculativo da declaração) .................................... 35
Aula nº 8 ...................................................................................................................................... 36
INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO E INTEGRAÇÃO DE LACUNAS (Continuação)......... 36
ARTIGO 237 ............................................................................................................................. 39
ARTIGO 238 (Negócios formais) .............................................................................................. 40
Aula nº 9 ...................................................................................................................................... 42
LACUNAS DO NEGÓCIO JURÍDICO – Artigo 239 ...................................................................... 42
VÍCIOS DO NEGÓCIO JURÍDICO (Artigos 240 e seguintes) ...................................................... 46
A VONTADE NO NEGÓCIO JURÍDICO ....................................................................................... 46
VONTADE DE ACÇÃO ............................................................................................................... 47
VONTADE DE DECLARAÇÃO .................................................................................................... 47
VONTADE NEGOCIAL (FUNCIONAL) ........................................................................................ 47
VÍCIO DA SIMULAÇÃO (Artigos 240 a 243) .............................................................................. 48
ARTIGO 240 Nº 1 – NEGÓCIO SIMULADO ............................................................................... 48
TIPOS DE NEGÓCIO SIMULADO ............................................................................................... 48
Aula 10......................................................................................................................................... 49
RECAPITULAÇÃO DA AULA ANTERIOR .................................................................................... 49
ARTIGO 241 ............................................................................................................................. 50
Aula 11......................................................................................................................................... 56
ARTIGO 241 Nº 2 – SIMULAÇÃO RELATIVA ............................................................................. 56
TESE DE MOTA PINTO ............................................................................................................. 58
TESE DE ANTUNES VARELA...................................................................................................... 58
TESE DE OLIVEIRA ASCENSÃO ................................................................................................. 59
ARTIGO nº 242 – LEGITIMIDADE PARA ARGUIR O VICIO DA SIMULAÇÃO .............................. 61
ARTIGO 242 Nº 2 ..................................................................................................................... 64
Aula 12......................................................................................................................................... 65
ARTIGO 243 ............................................................................................................................. 65
TESE DE MOTA PINTO E GALVÃO TELLES ................................................................................ 68

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Aula 13......................................................................................................................................... 71
VÍCIO DA SIMULAÇÃO (Conclusão) ......................................................................................... 71
Artigo 243 - Continuação da aula anterior .............................................................................. 71
TERCEIROS DE BOA-FÉ............................................................................................................. 75
TESE DE GALVÃO TELLES ......................................................................................................... 75
TESE DE ANTUNES VARELA, CASTRO MENDES E MENESES LEITÃO ........................................ 75
TESE DE MOTA PINTO, CARVALHO FERNANDES ..................................................................... 76
O DIREITO DE PREFERÊNCIA E SIMULAÇÃO ............................................................................ 77
Aula 14......................................................................................................................................... 83
A FIGURA DA RESERVA MENTAL – ARTIGO 244 ...................................................................... 83
DECLARAÇÕES NÃO SÉRIAS – ARTIGO 245 ............................................................................. 85
DECLARAÇÕES JOCOSAS.......................................................................................................... 86
DECLARAÇÕES CÉNICAS .......................................................................................................... 86
DECLARAÇÕES DIDÁCTICAS ..................................................................................................... 87
DECLARAÇÕES PUBLICITÁRIAS ................................................................................................ 87
Aula 15......................................................................................................................................... 89
ARTIGO 246 – VÍCIO DA FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO / VÍCIO DA COACÇÃO
FÍSICA....................................................................................................................................... 89
FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO.............................................................................. 89
A COACÇÃO FÍSICA .................................................................................................................. 91
Conceito de coacção física: ................................................................................................. 92
Conceito de coacção moral: ................................................................................................ 92
A COACÇÃO MORAL – ARTIGOS 255 E 256 ............................................................................. 93
Aula 16......................................................................................................................................... 96
USURA – O NEGÓCIO USURÁRIO (Artigos 282 e seguintes) ................................................... 96
ARTIGO 283 ........................................................................................................................... 100
JUROS USURÁRIOS – Artigos 559 - A e Artigo 1146 .............................................................. 101
ARTIGO 1146 Nº 1 ................................................................................................................. 102
Aula 17....................................................................................................................................... 103
VÍCIO DO ERRO (Regime geral do Erro - Artigos 247 a 254) ................................................. 103
ERRO NA DECLARAÇÃO (Artigos 247 a 250).......................................................................... 104
ARTIGO 247 – Erro na declaração ......................................................................................... 105
ARTIGO 249 – ERRO DE CÁLCULO OU DE ESCRITA (ERRO OSTENSIVO) ................................ 107
ARTIGOS 251 e 252 - ERRO NA FORMAÇÃO DA VONTADE (ERRO VÍCIO)............................. 110

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Aula 18....................................................................................................................................... 113


ERRO (Artigo 252 nº 1) .......................................................................................................... 113
ERRO SOBRE A BASE DO NEGÓCIO (Artigo 252 nº 2)............................................................ 114
ERRO SOBRE A BASE DO NEGÓCIO (Conceito) ...................................................................... 115
Aula 19....................................................................................................................................... 119
DOLO ..................................................................................................................................... 119
ERRO DESCULPÁVEL (Artigo 1636) ........................................................................................ 124
AULA 20 ..................................................................................................................................... 127
VÍCIOS SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO (Artigo 280) E VICIO SOBRE O FIM DO NEGÓCIO
(Artigo 281) ........................................................................................................................... 127
ARTIGO 280 nº 1.................................................................................................................... 127
NEGÓCIO FISICAMENTE IMPOSSÍVEL .................................................................................... 129
NEGÓCIO LEGALMENTE IMPOSSÍVEL .................................................................................... 129
ARTIGO 280 nº 2.................................................................................................................... 130
ARTIGO 281 ........................................................................................................................... 131
AULA 21 ..................................................................................................................................... 132
FORMAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO (Contratos e negócios jurídicos unilaterais) ............... 132
ARTIGO 224 Nº 1 ................................................................................................................... 132
ARTIGO 224 Nº 2 ................................................................................................................... 137
ARTIGO 224 nº 3.................................................................................................................... 137
ARTIGO 225 ........................................................................................................................... 138
ARTIGO 226 ........................................................................................................................... 139
ARTIGO 226 nº 1.................................................................................................................... 139
ARTIGO 226 nº 2.................................................................................................................... 140
AULA 22 ..................................................................................................................................... 140
OS CONTRATOS ..................................................................................................................... 140
1º REQUISITO – A DECLARAÇÃO QUE REVELE A VONTADE FIRME E INEQUÍVOCA DE
CONTRATAR........................................................................................................................... 142
2º REQUISITO – A DECLARAÇÃO TEM QUE SER COMPLETA ................................................. 143
3º REQUISITO – A FORMA (legalmente exigida) DO CONTRATO. ......................................... 143
Aula 23....................................................................................................................................... 146
DURAÇÃO DA PROPOSTA CONTRATUAL (Continuação) ....................................................... 146
ARTIGO 228 nº 1 Alínea c) ..................................................................................................... 150
ARTIGO 229 nº 2.................................................................................................................... 153
ARTIGO 229 nº 1.................................................................................................................... 154

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ARTIGO 230 (Irrevogabilidade da proposta) ......................................................................... 155


Aula 24....................................................................................................................................... 158
ARTIGO 234 (Excepções á Primeira parte do nº 1 do Artigo 224 - A aceitação é eficaz ainda
antes de chagar ao proponente). .......................................................................................... 158
ARTIGO 231 – Morte ou incapacidade do proponente ou do destinatário. ......................... 161
ARTIGO 231 nº 2.................................................................................................................... 165
Aula 25....................................................................................................................................... 167
FORMAÇÃO DOS CONTRATOS (Conclusão) .......................................................................... 167
ACEITAÇÃO – Artigo 235 ....................................................................................................... 167
CONTRATOS DE ADESÃO (Cláusulas contratuais gerais) Decreto-lei 446/85 ....................... 170
CONCEITO DE GENERALIDADE .............................................................................................. 172
CONCEITO DE RIGIDEZ........................................................................................................... 173
AS PROIBIÇÕES ...................................................................................................................... 175
Artigo 18º alínea g) “são absolutamente proibidas as cláusulas que excluam ou limitem o
direito de retenção”. ............................................................................................................. 177
ARTIGO 15º (Violação da boa fé) .......................................................................................... 178
AULA 26 ..................................................................................................................................... 178
CLAUSULAS CONTRATUAIS GERAIS – CONTRATOS DE ADESÃO (Conclusão) ....................... 178
ACÇÃO INIBITÓRIA (Artigo 25º e seguintes) ......................................................................... 188
Aula 27 e 28 ............................................................................................................................... 190
CLAUSULAS ACESSÓRIAS DO NEGÓCIO JURÍDICO: ............................................................... 190
CONDIÇÃO – TERMO – MODO (Clausula modal) – Artigo 270 (Condição e termo) ............. 190
CONDIÇÃO SUSPENSIVA ........................................................................................................ 190
CONDIÇÃO RESOLUTIVA........................................................................................................ 191
ARTIGO 272 ........................................................................................................................... 197
CONDIÇÃO E TERMO – Artigo 270 e seguintes (Conclusão) ................................................. 200
ARTIGO 274 ........................................................................................................................... 201
ARTIGO 275 ........................................................................................................................... 203
ARTIGO 276 ........................................................................................................................... 203
ARTIGO 279 - Cômputo do termo ......................................................................................... 204
Casos práticos resolvidos Parte 1 .............................................................................................. 205
Caso prático nº 1 ................................................................................................................... 205
Caso prático nº 2 ................................................................................................................... 208
Caso prático nº 3 ................................................................................................................... 209
Casos práticos resolvidos Parte 2 .............................................................................................. 211

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Caso prático nº 1 ................................................................................................................... 211


Caso prático nº 2 ................................................................................................................... 213
Caso prático nº 3 ................................................................................................................... 217
Caso prático nº 3 ................................................................................................................... 219
Caso prático nº 5 ................................................................................................................... 220
Caso prático nº 6 ................................................................................................................... 221
Caso prático nº 7 ................................................................................................................... 223
Casos práticos – A formação dos contratos .............................................................................. 223
Caso prático nº 1 ................................................................................................................... 223
Caso prático nº 3 ................................................................................................................... 228
Caso prático nº 4 ................................................................................................................... 230
Respostas a perguntas de testes e exames............................................................................... 233

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Aulas 1 e 2

AUTONOMIA PRIVADA E O NEGÓCIO JURÍDICO


Em Portugal vigora o princípio da autonomia privada, e o princípio da autónoma privada
consiste precisamente em os particulares poderem por vontade própria, e dentro de certos
limites, criarem novas relações jurídicas, ou poderem modificar ou extinguir relações que já
existem, ou seja, a lei não tem o monopólio da criação das relações jurídicas, pois a lei admite,
que os particulares, possam eles próprios, auto regular os seus próprios interesses, e o
instrumento por excelência ao serviço da autonomia privada é precisamente o negócio
jurídico, pois normalmente, é através de negócios jurídicos que os particulares vão criar,
modificar, ou extinguir relações jurídicas.

O NEGÓCIO JURÍDICO
Sendo certo que há várias definições de negócio jurídico, mas a ideia que está subjacente ao
negócio jurídico, é que num negócio jurídico estamos sempre perante uma conduta voluntária
que visa produzir efeitos jurídicos, pois quem celebra um negócio jurídico, tem uma conduta
que pode consistir em palavras ou em actos, e é essa conduta que visa produzir efeitos
jurídicos que são permitidos e tutelados pela ordem jurídica e por isso é que em qualquer
negócio jurídico, na sua estrutura encontramos sempre dois elementos que são a vontade e a
declaração.

Pois para haver negócio jurídico tem que ter havido vontade e a intenção de produzir efeitos
jurídicos, para criar, modificar e extinguir relações jurídicas, e em qualquer negócio jurídico
tem que haver o elemento vontade, que é o elemento psicológico, subjectivo e interno do
negócio jurídico, mas os negócios não podem ser celebrados por telepatia, pois não basta
haver uma vontade e uma intenção que têm que ser exteriorizadas, tendo que haver uma
conduta que seja detectável pelas outras pessoas como traduzindo a tal vontade.

A manifestação ou a exteriorização da vontade chama-se declaração negocial, portanto, em


qualquer negócio jurídico há sempre dois elementos, ou seja, a vontade que é a intenção de
produzir efeitos jurídicos e depois temos o elemento declaração negocial que é a própria
manifestação e a exteriorização da vontade, que é aquilo a que se chama o elemento externo
e objectivo do negócio jurídico porque é algo detectável, sendo que a declaração negocial só
tem que ser por escrito quando a lei o disser, pois há um principio fundamental no direito
privado português que é o principio da liberdade de forma, (artigo 219), pois os negócios
jurídicos, sejam negócios unilaterais ou sejam contratos, só têm que ter uma forma especial,
nomeadamente por escrito, só quando a lei o disser, sendo que o principio geral não é que os
negócios tenham que ser por escrito, pelo contrário, o principio geral é o da liberdade de
forma.

AS MODALIDADES DE NEGÓCIOS JURÍDICOS


Dentro do negócio jurídico há várias modalidades e há uma distinção essencial a fazer entre
negócio unilateral e negócio plurilateral, os contratos são negócios jurídicos plurilaterais.

Os negócios jurídicos unilaterais e plurilaterais, apesar de se distinguirem, têm uma coisa em


comum, pois ambos são negócios jurídicos, e quando se diz que na estrutura do negócio

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jurídico tem que haver vontade e declaração, tanto é verdade para os negócios unilaterais
como é verdade para os negócios plurilaterais, mas aqui há algumas diferenças, pois o negócio
unilateral é aquele que pode ser celebrado por uma só parte, ou seja, é aquele para cuja
perfeição basta uma só vontade e uma só declaração negocial, mas se ao invés, para que o
negócio jurídico fique perfeito tiver que haver a intervenção de duas, ou mais partes, e se tiver
que haver duas ou mais vontades e duas ou mais declarações, então está-se perante um
negócio plurilateral.

O CONTRATO
Um contrato é um negócio jurídico plurilateral, um contrato é um acordo, pois quando um
contrato é celebrado entre duas ou mais pessoas, no fundo é um acordo entre elas, mas
também não é qualquer acordo, mas sim um acordo juridicamente vinculativo, e quem diz
contrato diz acordo, ou consenso, e por isso o contrato pressupõe que haja consenso entre as
partes, sendo um negócio plurilateral (duas ou mais partes), pois se dissermos bilateral nem
sempre está certo porque há contratos que são celebrados por mais de duas partes.

Mas o facto de o contrato implicar várias partes, não impede que seja um negócio jurídico,
pois para ser um negócio jurídico, tem que haver tantas vontades e declarações, quantas as
partes do negócio jurídico, e no negócio bilateral tem que haver duas partes, duas vontades e
duas declarações.

A PROCURAÇÃO (Negócio Unilateral)


É um exemplo clássico de negócio unilateral, (artigo 262), na representação voluntária, como a
própria expressão indica, não é a lei que impõe que alguém seja representado, contrariamente
ao que que acontece no caso dos menores não emancipados e dos interditos, que têm que ser
obrigatoriamente representados, pois na representação voluntária há uma pessoa que apesar
de ser perfeitamente capaz pretende que na celebração de um determinado negócio jurídico
substituir-se por outra pessoa para celebrar esse negócio jurídico no seu lugar, portanto, a
representação é o acto através do qual o representado atribui poderes representativos ao
representante.

NULIDADE E ANULABILIDADE
No caso dos negócios anuláveis, quando há uma anulabilidade, uma das maneiras de a
anulabilidade se sanar é através da confirmação. Quem pode confirmar um negócio, a lei não
diz que são ambas as partes do contrato, quem confirma é quem poderia anular, portanto, um
acto de confirmação é um acto que pode ser praticado apenas por uma parte, pois o acto de
confirmação visa um efeito jurídico que é sanar uma anulabilidade, podendo concluir-se que o
acto de confirmação, é ele próprio um negócio jurídico unilateral, e até pode haver uma
situação em que o próprio acto de confirmação esteja viciado, por exemplo, por coacção
moral, logo este acto constituía um vício na confirmação do negócio jurídico.

A confirmação é um negócio unilateral e nessa medida, como negócio que é, pode acontecer
que tenha um vício.

A confirmação é um negócio jurídico porque é uma conduta voluntária que visa produzir um
efeito jurídico que é permitido e tutelado pela ordem jurídica, constituindo a sanação de um
negócio anulável, (artigo 288).

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A LIBERDADE CONTRATUAL
Acerca dos contratos há um princípio fundamental no direito português que é o princípio da
liberdade contratual, não confundir com liberdade de forma, porque a liberdade de forma
tanto se aplica aos negócios unilaterais como aos contratos, sendo um princípio próprio dos
negócios jurídicos, sejam unilaterais, sejam plurilaterais, mas matéria diferente é a liberdade
contratual, (artigo 405).

A liberdade contratual desdobra-se em duas vertentes;

a) Liberdade de celebração
b) Liberdade de estipulação
A liberdade de celebração significa que as pessoas, em princípio, têm liberdade para decidir se
celebram ou não determinado contrato, em princípio a lei dá liberdade às pessoas para
decidirem se querem, ou não, celebrar certo contrato, e essa liberdade é que designa por
liberdade de celebração.

A liberdade contratual vai mais longe, pois a lei também diz que as pessoas podem fixar
livremente o conteúdo do contrato, ou seja, de fixarem as cláusulas que irão reger esse
contrato e por isso é que se chama liberdade de estipulação.

CONTRATOS TÍPICOS E CONTRATOS ATÍPICOS


E a lei também admite que possam ser celebrados contratos atípicos, (artigo 405), que não
venham previstos na lei, pois não há uma lista taxativa de contratos em que quando se queira
contratar se tenha que escolher um contrato dentro de uma lista, pois a lei admite que os
particulares inventem novas figuras contratuais, ou celebrem contratos que sejam uma
mistura de várias figuras contratuais, ou seja, conforme a lei, esta prevê que se possam
celebrar contratos diferentes daqueles que estão previstos na lei, no código civil ou em
qualquer outro diploma, e esses contratos que não vêm previstos em lei alguma, são aquilo a
que se designa por contratos atípicos.

Aqueles contratos que vêm regulados na lei, são os contratos típicos, (contrato de compra e
venda, contrato de trabalho, contrato de arrendamento), sendo que a lei regula os principais
contratos, através do Código Civil ou de outros diplomas, e esses designam-se por contratos
típicos, pois basta que a lei os preveja, e o facto de a lei os prever, isso basta para ser
considerado um contrato típico.

Mas nos contratos atípicos, por vezes inicialmente um contrato pode ser atípico, ou seja, é
inventado pelos particulares, ou alguém decide copiar um contrato que vem contemplado
numa lei estrangeira, e ao fim de uns meses ou de uns anos, o legislador português, chega á
conclusão que seria boa ideia prever e regulamentar aquele contrato (contrato de leasing ou
de locação financeira, em Portugal apenas desde 1979), por exemplo, alugueres ou
arrendamentos, com um direito de o locatário poder ficar dono do bem no final do contrato, e
na altura a lei verificou que convinha regular a matéria da locação financeira (leasing), logo,
este contrato passou de atípico a típico.

A liberdade contratual compreende a liberdade de celebração e a liberdade de estipulação,


mas há limite, porque há contratos em que a lei restringe a liberdade de estipulação, por

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exemplo, no contrato de trabalho há muitos limites de estipulação (ordenados abaixo do


salário mínimo, ou apenas 4 dias de férias por ano) pois todas essas cláusulas violariam leis
imperativas e seriam eventualmente nulas, sendo que, a consequência que normalmente está
associada á violação das regras legais quando se celebram negócios jurídicos, essas
consequências muitas vezes têm a ver com tornar aquele negócio, de alguma maneira ineficaz,
ou ineficaz desde o inicio, se for nulo, ou será eficaz, mas pode ser anulado, depois a lei é que
preverá a sanção para os negócios jurídicos que não preenchem os requisitos legais, mas uma
vez o contrato celebrado não há liberdade para as pessoas decidirem se o cumprem ou não, já
que o contrato é juridicamente vinculativo, (artigo 406), pois os contratos devem ser
pontualmente cumpridos.

A ideia é a seguinte, ninguém é obrigado a celebrar um contrato, mas quem o celebrou, agora
fica vinculado a ele, e o principio geral é, se são necessárias várias vontades para celebrar um
contrato, também serão necessárias as mesmas vontades para o modificar ou para o extinguir,
a não ser que a lei preveja a modificação, ou extinção unilateral, ou a não ser que o próprio
contrato desse a possibilidade a um dos contraentes para posteriormente o poder modificar
ou extinguir.

Liberdade contratual não se deve confundir com liberdade forma por várias razões, porque
pode haver liberdade contratual mas não haver liberdade de forma, e o inverso também é
verdade, pois pode haver liberdade de forma sem haver liberdade contratual, porque a
liberdade de forma também existe para os negócios unilaterais, (artigo 219), pois este artigo
não se refere apenas aos contratos, mas sim nos negócios jurídicos, e quando diz que há
liberdade de forma para celebração de negócios, o que está a dizer é que tanto vale para os
negócios unilaterais como para os contratos.

Dentro dos contratos, que são acordos juridicamente vinculativos, há contratos que geram
obrigações para ambas as partes e há contratos que só geram obrigações para uma das partes,
e essa distinção dá lugar a uma classificação dentro dos contratos, porque aqueles contratos
que geram obrigações para ambas as partes, designam-se por contratos bilaterais ou
sinalagmáticos, enquanto, aqueles contratos que geram obrigações apenas para uma das
partes, designam-se por contratos unilaterais ou não sinalagmáticos, mas não se pode
confundir negócio unilateral e contrato unilateral, pois a primeira distinção a fazer é
determinar se estamos perante um negócio unilateral, ou se estamos perante um contrato,
porque qualquer contrato, seja sinalagmático ou não sinalagmático, se é um contrato é porque
é um negócio plurilateral, porque os contratos pressupõem sempre duas partes, duas
vontades, e duas declarações, pois qualquer contrato, por definição, é sempre um negócio
plurilateral e contrapõe-se aos negócios unilaterais, pois qualquer contrato pressupõe sempre
duas partes, duas vontades e duas declarações, pelo menos, e depois de se provar que é um
contrato, então vai-se ver, se aquele contrato cria obrigações para as duas partes ou se só cria
obrigações para uma parte, por exemplo, numa compra e venda, cria obrigações para os dois,
porque tem que haver vontade do vendedor e do comprador para que se forme o negócio,
porque o contrato gera um vinculo para ambas as partes, porque a prestação de um é a
contrapartida da prestação do outro, pois a obrigação de entregar um bem é a contrapartida
da obrigação do outro de entregar o preço.

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A grande maioria dos contratos são bilaterais ou sinalagmáticos, no sentido em que geram
obrigações para ambas as partes, mas na doação, que é um contrato, mas para haver uma
doação não basta a vontade do doador, neste caso, só se forma o negócio se a outra pessoa
aceitar, e neste caso não há margem para dúvidas, porque a lei, (artigo 940), define doação
dizendo que é um contrato, e se é um contrato, não basta apenas a vontade de uma das
partes, a outra parte tem que aceitar a doação, sendo que não há margem para dúvidas,
porque a lei é clara, pois não basta apenas a vontade de uma das partes para que se forme o
negócio, porque a transmissão da propriedade de forma gratuita implicará sempre a aceitação
do donatário, logo, a doação é um contrato, porque pressupõe duas partes, duas vontades e
duas declarações, e um dos efeitos da doação, é o efeito translativo, que é a transmissão da
propriedade, sendo que, quem doa, tem a obrigação de entregar o bem, mas o donatário não
tem a obrigação de receber o bem, mas sim o direito de reclamar a entrega do bem, e nessa
medida é que se diz que a doação só gera obrigações para um.

REGIME DA NULIDADE E DA ANULABILIDADE (Revisões e casos práticos)


A, vendeu invalidamente uma coisa a B. A propriedade transmitiu-se de A para B ou não?

Aqui o que haveria que distinguir é que tipo de invalidade é que está aqui em causa, porque a
palavra invalidade, não se refere apenas á nulidade ou á anulabilidade, pois a invalidade
abrange pelo menos a nulidade e a anulabilidade, e depois, discute-se se os negócios
inexistentes também são negócios inválidos ou não, pois há quem diga que a inexistência é
uma terceira modalidade de invalidade.

Mas há autores que dizem que não, porque se o negócio não existe, nem há que o qualificar
como válido ou inválido, pois o conceito de invalidade pressupõe algo que existe, pois há
autores que dizem que o conceito de válido ou inválido, só se coloca para algo que existe, e só
dentro dos negócios existentes é que se vai discutir os válidos e os inválidos, e para esses
autores, o negócio juridicamente inexistente, está fora desse padrão, a inexistência jurídica
não seria uma modalidade de invalidade.

No caso prático, é preciso distinguir se é um negócio nulo ou anulável, se o negócio era nulo
não se transmitiu a propriedade, pois o negócio nulo é ineficaz desde o inicio, portanto, os
negócios nulos não produzem efeitos desde o inicio, ou seja, os intervenientes poderão ter
agido como se o negócio fosse válido, mas se era nulo, juridicamente falando, não produziu
efeitos e nesse caso, e não há o efeito jurídico que é a transmissão da propriedade mesmo que
tenha havido a entrega material da coisa, e, por exemplo, se um negócio jurídico não respeitar
a forma legal exigida, se a lei não disser qual é a sanção, o negócio é nulo, (artigo 220), este é o
artigo regra para quando um negócio não tem a forma legal ou determinada, podendo o
legislador dizer que num caso de vício de forma, tal vício provoque anulabilidade, mas se o
legislador nada disser, o negócio é nulo.

A ideia chave é, se o negócio é nulo, é juridicamente ineficaz desde o início pois já nasce
privado de efeitos, logo, se estamos perante um negócio nulo, pois, juridicamente falando, a
propriedade não se transmitiu, mesmo que tenha havido uma entrega material.

Mas se for uma anulabilidade, a propriedade transmite-se, mas há uma diferença, o negócio
anulável é inválido, mas em relação á ineficácia, este começa por produzir efeitos, e produzem

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efeitos até que haja uma sentença que anule o negócio, e quando essa sentença surgir o
negócio é destruído retroactivamente desde a data em que se produziu o negócio.

Uma venda, ou uma doação inválida, transmitem a propriedade?

Depende, se o negócio é nulo não produz efeitos, e portanto, não transmite a propriedade, e
se o negócio é anulável, este produz efeitos inicialmente e transmite-se a propriedade, mas se
vier a ser anulado, esses efeitos serão destruídos retroactivamente.

É verdade que se o negócio vier a ser anulado, tudo se passará como se não tivesse produzido
efeitos, porque os efeitos que produziu, são retroactivamente destruídos.

Um negócio inválido pode vir a sanar-se e a convalidar-se?

Apenas e só no caso da anulabilidade, (artigo 286), e o negócio pode sanar-se pela


confirmação, (artigo 288), e pelo decurso do tempo.

A confirmação é um negócio jurídico unilateral, porque quem pode confirmar o negócio não é
qualquer pessoa, mas só quem tenha legitimidade para anular é que terá legitimidade para
confirmar.

Regra geral, quem pode anular um negócio anulável é a pessoa em cujo interesse a lei quis
proteger (artigo 287 nº 1), pois a pessoa que a lei quis proteger daquele vício, é que tem
legitimidade para anular o negócio (erro, incapacidade acidental, coacção moral).

Portanto, na anulabilidade não basta ter interesse para anular o negócio, não qualquer
interessado, mas sim, aqueles em cujo interesse a lei previu o vício.

No caso na nulidade quem pode invocar o vício, (artigo 286), é qualquer interessado com
interesse juridicamente relevante em anular o negócio e também terceiros com interesse
juridicamente relevante (credores).

Também pode acontecer que o juiz no decurso de um processo seja confrontado com um
negócio nulo, ele pode por sua iniciativa (oficiosamente) invalidar o negócio (artigo 286).

No caso da anulabilidade, é preciso distinguir um negócio anulável que está totalmente


cumprido e negócio anulável que não está totalmente cumprido, porque basta que não esteja
totalmente cumprido para se considerar que está totalmente incumprido, mas não confundir
cumprido e não cumprido, com celebrado e não celebrado, é evidente que se estamos a falar
de um negócio anulável é porque ele já está celebrado, pois se não estivesse celebrado ele não
existia.

No caso da anulabilidade, para saber qual é o prazo para anular, interessa saber se as
obrigações inerentes àquele contrato anulável, já tinham sido totalmente cumpridas ou não.

Se por acaso o negócio anulável gerou obrigações que já foram cumpridas, então quem quiser
e puder anular, tem o prazo de um ano a contar da cessação do vício ou do momento em que
se teve conhecimento do mesmo (menores, coacção moral – artigo 256).

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Aula 3

NEGÓCIO JURÍDICO (Continuação) - DECLARAÇÃO NEGOCIAL


Em qualquer negócio jurídico tem que haver dois elementos que compõem a estrutura do
negócio, a vontade, que é a intenção de produzir efeitos jurídicos e depois a declaração
negocial que é a manifestação da vontade, e essa manifestação da vontade, pode ser
manifestada de diversas formas, o que interessa é que interpretando a conduta daquela
pessoa, se perceba qual era a sua vontade negocial, havendo que atender á liberdade de
forma, (artigo 219), o que significa que só nos casos em que a lei exige uma forma especial, é
que essa forma terá que ser adoptada pelas pessoas que celebram um negócio jurídico, mas se
a lei nada disser, será um contrato atípico porque o mesmo não vem previsto nem regulado na
lei, logo a lei não exige uma forma especial para ele, porque se a lei exigisse uma forma para
ele é porque estava a prevê-lo.

Portanto, tanto gozam de liberdade forma todos aqueles negócios que vêm previstos na lei,
mas em que a lei nada diz sobre a forma, como aqueles negócios que nem sequer vêm
previstos na lei, mas que podem ser celebrados ao abrigo da liberdade negocial.

Quando as pessoas exprimem a sua vontade, tanto podem fazê-lo de modo directo como de
modo indirecto, por vezes as pessoas têm uma conduta, ou têm palavras que directamente
exprimem qual é a sua vontade, mas outras vezes, a conduta ou as palavras, directamente não
exprimem qual é a vontade, mas indirectamente retira-se da conduta, através de um raciocínio
lógico dedutivo, que através dessa conduta que aquela pessoa só pode ter querido aquilo
apesar de não o ter dito directamente.

E a lei permite em Portugal, que as pessoas, em regra, tanto possam optar nos negócios
jurídicos por recorrer a modos directos de manifestação da vontade, e neste caso designa-se
essa manifestação de vontade por declaração expressa, mas a lei também admite que os
negócios jurídicos possam ser celebrados em termos tais que a vontade possa ser
demonstrada de modo indirecto, ou seja, directamente aquelas condutas, ou aquelas palavras
querem dizer algo, mas indirectamente traduzem uma manifestação de vontade negocial, e
essas declarações em que a vontade se exprime de modo indirecto, designam-se por
declarações tácitas (artigo 217).

Resulta da leitura do artigo 217, que o que é verdadeiramente relevante para se dizer que a
declaração é expressa, é o facto de a vontade ser manifestada através de um meio directo, não
tem que ser forçosamente por palavras ou por escrito, se bem que, normalmente, os seres
humanos manifestam a sua vontade através de palavras, mas determinados gestos em
determinadas circunstâncias, também são considerados como manifestações expressas de
vontade.

Mas para além das declarações expressas e tácitas, também há uma figura jurídica que se
designa por silêncio, (artigo 218) e em certos casos, o silêncio tem valor declarativo.

Neste caso, a questão chave é saber que o silêncio tem um sentido jurídico diferente do
sentido com que falamos em silêncio na linguagem corrente.

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“A declaração é tácita, quando se deduz de factos que com toda a probabilidade a revelam”
(artigo 217), ou seja, na declaração tácita não se pode dizer que tal conduta, socialmente tem
aquele significado, mas pode dizer-se que, esta conduta logicamente, só pode ter querido
dizer que tal pessoa queria aquilo.

No artigo 288, quando se fala da confirmação do negócio anulável, este artigo admite que a
confirmação tanto possa ser expressa, como tácita, sendo a confirmação, ela própria, um
negócio jurídico unilateral, porque é uma conduta voluntária que visa produzir um efeito
jurídico que é sanar uma anulabilidade, e uma declaração tácita, é uma conduta que manifesta
que um contrato seja cumprido, mas indirectamente manifesta uma vontade de não por em
causa aquele contrato.

A lei portuguesa (artigo 217), em princípio dá igual valor às declarações expressas e às


declarações tácitas, no entanto, o legislador é livre de, em certos casos, só admitir declarações
expressas, e por tal motivo, há negócios jurídicos em que o legislador não admite o recurso a
declarações tácitas, pois há negócios jurídicos em que só se considera a vontade validamente
manifestada, se essa vontade tiver sido manifestada de um modo directo, logo, a declaração
tácita deve ser vista como aquela declaração em que a vontade se manifestou através de um
meio indirecto da manifestação da vontade, sendo que, a diferença entre declaração expressa
ou tácita, tem a ver com o modo directo e indirecto de manifestação da vontade.

O SILÊNCIO (Como meio declarativo) – Artigo 218


A primeira ilação que se retira do artigo 218, é que o silêncio, nem sempre, vale como
declaração negocial, só vale como declaração negocial em três casos:

1) Norma legal
2) Um uso
3) Convenção (acordo prévio)

Mas a questão chave é saber o que é que a lei entende por silêncio, e neste caso não é a
ausência de barulho ou de sons, pois pode haver uma declaração em que ninguém emite
nenhum ruído e não é através do silêncio, (escrever uma carta de concordância com
determinado negócio jurídico), havendo claramente uma manifestação da vontade através de
gestos.

No caso do silêncio, o que a lei entende por silêncio, é uma absoluta inércia, é quando
determinada pessoa, da sua postura, não se retira qualquer conduta, pois só se pode concluir
que se está perante uma situação de silêncio quando um caso não caia no artigo 217, porque
se se concluir que aquela pessoa, através dos seus gestos ou actos, que teve uma conduta, que
directa ou indirectamente exprimiu uma vontade, então poderá dizer-se que houve uma
aceitação expressa ou tácita, mas numa situação em que não se pode qualificar aquela inércia,
aquela abstenção da pessoa como sendo declaração nem expressa nem tácita, a questão que
se coloca, é se se poderá aceitar o silêncio, ou a inércia, como tendo valor declarativo, isto só
acontece em três casos, quando a lei o diz, quando existe um uso nesse sentido, ou numa
convenção.

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No Código Civil, há casos em que a lei dá valor ao silêncio, onde a lei prevê que em
determinada situação alguém se mantenha em silêncio (total inércia), havendo casos em que
esse silêncio é considerado como uma manifestação da vontade (artigo 993) na chamada
venda a contento.

A venda a contento, é uma venda em que apenas se considera o bem comprado se o


comprador ficar contente, e no nº 2 do artigo 923, vem um caso de silêncio como valor
declarativo onde se diz “a proposta considera-se aceita se, entregue a coisa ao comprador,
este não se pronunciar dentro do prazo da aceitação, nos termos do nº 1 do artigo 228”, neste
caso, se houver um contrato que possa ser qualificado como venda a contento, em que numa
venda o bem é entregue ao comprador e ele tem um prazo para dizer se está satisfeito, e
enquanto decorrer esse prazo considera-se que a venda ainda não está a produzir os seus
efeitos, se o comprador nada disser durante aquele prazo, (artigo 228), neste caso, o silêncio
do comprador, é interpretado juridicamente como significando que sim, que ficou satisfeito,
portanto, temos aqui um caso em que a própria lei dá valor declarativo ao silêncio.

CONCEITO DE USO
O uso é uma prática social reiterada, enquanto, o costume é uma prática social reiterada
acompanhada da convicção da sua obrigatoriedade, portanto, o costume é um uso em que
apenas não basta haver a prática social reiterada, tem que haver a convicção por parte de
quem age daquele modo, que aquela forma de actuar é vinculativa, portanto, o costume é um
uso com a convicção da sua obrigatoriedade.

No artigo 3º do Código Civil, os usos têm força social, mas só têm força jurídica quando a lei o
disser, portanto, juridicamente falando, normalmente os usos, não têm força jurídica, mas no
artigo 218 diz-se que se houver um uso, e se numa certa situação, a dar valor ao silêncio, então
esse uso terá força jurídica, porque há uma norma legal que o prevê, que é a norma do artigo
218 que está em perfeita harmonia com o artigo 3º que diz “os usos só são atendíveis quando
a lei o disser”, ora, neste caso o artigo 218 é a lei ao dizer “os usos são atendíveis quando dão
valor ao silêncio”.

Portanto, os usos podem ser territoriais, locais, podem ser usos no seio de uma categoria
profissional de pessoas, mas também é de admitir os usos particulares, pois pode haver usos,
não no sentido de uma prática social reiterada de um grupo social extenso, mas também nas
relações comerciais (hábito ou tradição) entre duas pessoas.

CONCEITO DE CONVENÇÃO
Neste caso é preciso perceber bem o significado de convenção, uma convenção é um acordo
entre as partes que concordam em dar valor a um futuro silêncio.

O silêncio é uma situação em que não há qualquer conduta reveladora da vontade, nem uma
conduta que revele a vontade de um modo directo, se fosse, era uma declaração expressa,
nem uma conduta que revele a vontade de modo indirecto, se fosse, era uma declaração
tácita, no silêncio há uma inércia pura e simples de uma pessoa, e não é possível socialmente
atribuir-lhe um sentido, e precisamente, porque não é possível socialmente atribuir um
sentido àquela inércia, em principio, como regra, o silêncio não tem valor declarativo, mas há
três casos em que terá, ou se houver uma norma legal, ou se por acaso existir um uso aplicável

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àquelas pessoas ao qual se atribua valor declarativo, e finalmente também tem valor
declarativo, se as partes interessadas tiverem previamente combinado entre si, e se por acaso
uma das partes se mantivesse em silêncio, esse silêncio valeria como declaração negocial.

Aula 4

DECLARAÇÕES NEGOCIAIS (Continuação)


Em qualquer negócio jurídico seja unilateral ou seja um contrato, tem sempre que haver a
manifestação da vontade e tem sempre que haver a declaração negocial, e a lei admite
declarações expressas e declarações tácitas, ou seja, a lei admite que a vontade seja
manifestada através de um meio directo de comunicação da vontade e quando o declarante se
socorre de um meio directo de manifestação da vontade, fala-se em declaração expressa, mas
a lei também admite que o declarante possa vir a declarar a sua vontade de modo indirecto,
ou seja, pode ter uma conduta ou palavras que directamente não manifestem essa vontade,
mas que indirectamente, deduz-se ao interpretar essa conduta e essas palavras, depreende-se
que era aquilo que aquela pessoa queria, e então estamos perante declarações tácitas, sendo
que o artigo 217, dá igual relevância às declarações expressas e às declarações tácitas, pois a
lei não diz qual delas tem mais valor, sendo que, este artigo diz que as declarações podem ser
expressas ou tácitas e isso significa, que em principio, seja qual for o negócio jurídico, a lei
tanto admite que a vontade seja manifestada de forma expressa, como de forma tácita.

No entanto, há casos em que a lei poderá proibir o recurso a declarações tácitas, pois se a lei
disser que a declaração tem que ser expressa, nesse caso, é evidente que está a afastar a
possibilidade de a declaração ser tácita, mas é preciso que a lei o diga, pois se nada disser,
tanto é admissível uma declaração expressa como uma declaração tácita.

VALOR DECLARATIVO DO SILÊNCIO (Continuação)


No artigo 218 vem referido o valor jurídico do silencio e naquelas situações em que uma
determinada pessoa não manifesta qualquer vontade e mantém-se em silencio, inerte, sem ter
nenhuma conduta reveladora da sua vontade, e a questão que se coloca é saber se essa
inércia, e se essa ausência de manifestação da vontade, poderá em certos casos, ser
interpretada como uma declaração negocial.

No artigo 218, só se dá valor jurídico ao silencio como declaração negocial em três casos, pois
para que o silencio valha como declaração negocial é preciso que, haja uma norma legal que
atribua esse valor declarativo ao silêncio, ou de haver um uso nas relações entre duas pessoas
no sentido de atribuir valor ao silencio, mas no artigo 218 é previsto um terceiro caso em que
o silêncio poderá ter valor declarativo, e será na situação em que foi combinado previamente
entre duas pessoas que em certa situação, se um adelas se mantivesse em silencio, que esse
silencio valeria como declaração negocial, ou seja, uma convenção que atribui valor ao futuro
silencio.

A FORMA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS (Artigo 219 e seguintes)


Uma questão que se discute é saber se o silêncio valerá como declaração negocial, no caso de
um negócio formal ou seja, um negócio para o qual a lei exige uma forma especial, mas

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quando se fala em negócio formal, quer dizer, um negócio para o qual a lei exige uma forma
especial, e no caso dos negócios formais, não se aplica o princípio da liberdade de forma.

Por exemplo, um contrato para o qual a lei exige uma forma especial, é num arrendamento
urbano por mais de seis meses, onde a forma legalmente exigida, é a forma escrita.

Artigo 219 “a validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial,
salvo quando a lei a exigir”.

Este é o princípio jurídico que se designa por liberdade de forma, e este princípio não é apenas
válido para os contratos, é válido para os negócios jurídicos, sejam eles unilaterais ou sejam
contratos, pois o princípio da liberdade de forma, é um princípio que tanto se aplica a negócios
unilaterais como a negócios plurilaterais, e como os contratos são negócios plurilaterais, quer
dizer que aos contratos se aplica o princípio da liberdade de forma, salvo, quando a lei a exigir,
neste caso, o legislador reserva-se o direito de, nos casos em que bem entender, de impor
uma determinada forma ao negócio.

Portanto, há situações previstas na lei, em que efectivamente, é obrigatória determinada


forma, porque o legislador o disse, porque se ele nada disser, há liberdade de forma, mas
liberdade de forma, não significa ausência de forma, porque um negócio jurídico tem sempre
uma forma, nem que seja, a forma oral, por exemplo, na compra e venda de um livro, que
pode ser oral, sendo que a forma da venda deste livro, foi a forma oral, sendo que quando a
lei impõe uma forma, chama-se um negócio formal, quando a lei não impõe essa forma, fala-
se em liberdade de forma.

Na compra e venda de imóveis, tem que ser a forma imposta pelo artigo 875, tem que ser por
escritura pública ou documento autenticado.

Se for uma doação de imóveis, aplica-se a forma do artigo 947 nº 1, e tem que ser por
escritura publica ou documento autenticado.

Portanto, nestes exemplos, não há liberdade de forma, mas na doação de coisas móveis, que
vem referida no 947 nº 2, e quando estamos perante uma doação de uma coisa móvel, a lei
distingue, consoante na altura da doação, haja uma imediata entrega da coisa, pois se a
doação da coisa móvel for feita com a entrega imediata da coisa, nestes casos, o acordo pode
ser oral e houver a entrega imediata do bem, mas se se doar um relógio ou uma jóia a alguém,
mas se a coisa não for entregue imediatamente, então a doação só é válida se for por escrito,
(artigo 947 nº 2).

Outra situação onde a lei exige forma especial é no Contrato Mútuo, artigo 1142 e seguintes,
contrato de empréstimo de dinheiro.

FORMA AD SUBSTANCIAN E FORMA AD PROBATIONEN


No nosso direito privado há o princípio da liberdade de forma, então, sempre a lei exige a
forma especial para certo negócio, a norma que exige uma norma especial, é uma norma
excepcional, porque contaria um princípio fundamental do ordenamento jurídico que é a
liberdade de forma.

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Nos casos em que a lei exige uma determinada forma para um negócio, há que distinguir,
atendendo aos regimes, existem dois tipos de forma legal:

1) Forma Ad Substancian
2) Forma Ad Probationen

Forma Ad Substancian: Quando a forma é exigida pela lei, como requisito de validade do
negócio, dizemos que a forma é ad substancian, ou seja, sempre que se conclua que a violação
da forma, implique a invalidade do negócio, é porque aquela forma é ad substancian.

Forma Ad Probationen: mas há casos em que a forma legal é exigida, não como requisito de
validade, mas apenas como requisito de prova do negócio, o que significa que se a forma não
for respeitada, o negócio é válido, mas que não pode ser provado, então é uma forma ad
probationen.

No artigo 220, quando um negócio não respeita a forma legal, se a lei não disser qual é a
consequência, o negócio é nulo, então se a regra é que a violação da forma implique nulidade,
sendo a nulidade uma modalidade de invalidade, então pode-se concluir que o artigo 220 está
a consagrar genericamente a ideia de que, a forma legal será um requisito ad substancian, e a
prova que é um requisito ad substancian, é que quando não é respeitada, a regra será o
negócio ser nulo, ou seja, inválido.

Mas temos que conjugar o artigo 220 com o artigo 364, porque este artigo é que vai ser
importante para se perceber melhor o que é a forma ad probationen, sendo que, o artigo
364 nº 1 diz que “quando a lei exigir, como forma da declaração negocial, documento
autentico, autenticado ou particular, não pode este ser substituído por outro meio de prova ou
por outro documento que não seja de força probatória maior”.

O que diz o 364 nº 1 está de harmonia com o artigo 220, “a declaração negocial que careça de
forma legalmente prescrita é nula, quando outra não seja a sanção especialmente prevista na
lei”, porque se não for respeitada a forma legal, o negócio é nulo e não se pode fazer prova
dele, mas o que é verdadeiramente importante para se perceber a forma ad probationen é o
nº 2 do artigo 364 “se, porém, resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas
para prova de declaração, pode ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial,
contanto que, neste ultimo caso, a confissão conste de documento de igual ou superior valor
probatório”, aqui quando se diz “apenas para prova”, quer dizer que já é apenas para a
validade, mas só para a prova, pois se o negócio não puder ser provado é como se não
existisse.

Mas o 364 nº 2 não diz que quando a lei exige a forma como requisito de prova, que o negócio
não pode ser provado de maneira nenhuma, o que diz é que, admite que o negócio possa ser
provado por confissão expressa, judicial e extrajudicial, contanto que a confissão conste de
documento igual ou probatório, ou seja, a lei tinha que admitir uma maneira de provar,
porque se não houvesse uma forma de provar o negócio tornava-se á mesma numa forma ad
substancian e o negócio nunca poderia valer, pois se o negócio não poder ser provado, nunca
pode valer, porque tem que ser provado para se aplicar.

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No fundo o que resulta é:

Se a forma é ad substancian, se a forma for violada, o contrato é nulo, se for ad probationen,


se a forma for violada o contrato é válido, mas só pode ser provado por confissão.

Portanto, o artigo 220 é uma regra geral que quando diz que não é respeitada a forma, o
negócio é nulo, logo, é uma regra que nos permite concluir que, sempre que o legislador exija
uma forma, e não esclareça claramente, se está a exigir a forma como requisito ad substancian
ou o requisito ad probationen, se ele não for claro, é porque é ad substancian, aliás, é isso que
quer dizer o artigo 364 nº 2, quando diz que “se resultar claramente da lei”, portanto a forma
só se considera ad probationen quando resulta claramente da lei como requisito de validade e
não como requisito de prova, portanto, se houver vício de forma, o negócio é nulo dos termos
do artigo 220, e se é nulo aplicam-se os requisitos do artigo 286, e se é nulo, não produz
efeitos, é do conhecimento oficioso do juiz, não há prazo para invocar o vício, não se sana pelo
decurso do prazo ou por confirmação, etc. e depois há uma série de consequências inerentes
ao facto de o negócio ser nulo por vício de forma.

Tudo isto tem a ver com aqueles casos em que a lei exige uma determinada forma e pode
haver uma outra situação em que a forma é obrigatória, porque pode acontecer que haja
liberdade de forma, porque a lei não impõe nenhuma forma especial, mas as partes terem
combinado previamente que só se vinculariam por uma certa forma, por exemplo, numa
compra e venda de um quadro pode ser oral, mas para uma das partes pode ser imprescindível
que o contrato tenha que ser por escrito, mas nada impede que duas pessoas combinem
previamente, que mesmo que venham a chegar a acordo, o acordo só valerá se for por escrito
ou por escritura publica, apesar de haver liberdade de forma, pois poderia existir um contrato
que fosse oral, mas que as pessoas tivessem combinado previamente que só se vinculariam
por escrito, nessas situações, são as pessoas que estão a ser mais exigentes do que a própria
lei o é.

FORMA CONVENCIONAL – Artigo 223


No artigo 223, “podem as partes estipular uma forma especial para a declaração; presume-se,
neste caso, que as partes se não se querem vincular senão pela forma convencionada”, ou seja,
isto tanto se aplica naqueles casos em que há liberdade de forma, mas em que combinam que
vai ser por escrito, mas também se pode aplicar a um caso em que a lei exige uma forma, mas
em as partes combinam que só querem celebrar um contrato se for por uma forma ainda mais
solene.

Seja no caso em que havia liberdade de forma, sendo no caso que não havia liberdade de
forma, mas que ainda se foi impor uma exigência maior, em qualquer dos casos, estamos
perante aquilo a que se chama uma forma convencional.

O que pode levar a que as duas partes se imponham uma forma convencional, uma das
hipóteses, é precisamente porque uma pessoa sabendo que o contrato pode ser oral, é um
contrato de tal modo avultado, que a pessoa pretende que fique uma prova escrita.

Quando era uma forma legal que era violada, em principio a consequência era a nulidade,
salvo em casos remotos ad probationen, mas se for uma forma convencional que é violada, a

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consequência até é bastante gravosa, conforme o artigo 223, onde a lei diz que as partes
estipularam previamente uma forma convencional, considera-se que não se querem vincular
se não for por uma forma convencionada, porque quando há uma forma convencional, se ela
não for respeitada, a consequência num certo sentido é mais grave que a nulidade, porque no
fundo é a inexistência, ou seja, sempre que as partes estipulem uma forma convencional, se
houver um acordo que não respeite essa forma convencional, é de entender que ainda não há
negócio.

No 223 nº 2 “se, porém, a forma só for convencionada depois de o negócio estar concluído ou
no momento da sua conclusão, e houver fundamento para admitir que as partes se quiseram
vincular desde logo, presume-se que a convenção teve em vista a consolidação de negócio, ou
qualquer outro efeito, mas ainda não a sua substituição”, neste caso, o que é de entender é
que se chegou á conclusão que seria boa ideia agir de modo, em que ambas as partes se
munam de um meio de prova mais sólido, ou seja, existe um acordo oral que é válido, mas
decidiu-se, também por acordo, reduzir esse acordo a escrito como meio de prova, pois em
caso de duvida, presume-se que as partes não querem por em causa a validade ou a existência
do seu acordo oral, mas pretende, a adopção de uma forma mais solene para tornar o negócio
mais sólido em termos de prova.

RESUMINDO:

Se a forma convencional foi estipulada antes e depois há um acordo que não a respeita, em
caso de duvida considera-se que não há negócio, se a forma convencional for estipulada
depois, ou na mesma altura, em caso de duvida considera-se que há negócio e que ela penas
foi estipulada para facilitar a prova, mas não para a validade do negócio, portanto, é diferente
a presunção do artigo 223 nº 1, da presunção do 223 nº 2.

Se se perguntar se a adopção de determinada forma para os negócios jurídicos é obrigatória


em Portugal, e que tipos de formas é que se conhecem.

Poderá responder-se que há dois tipos de forma obrigatória, a legal e a convencional.

A forma legal, é quando é imposta pela lei, a forma convencional é quando é imposta pelas
próprias partes a si mesmas, mas a regra não é a lei impor uma forma, pois o princípio geral é
o da liberdade de forma, mas quando a lei o exige tem que ser respeitada e depois logo se verá
se é ad substancian ou ad probationen, em princípio é ad substancian.

Aula 5

DECLARAÇÃO NEGOCIAL (Revisões)


Dentro das declarações negociais, a lei distingue declaração expressa e declaração tácita, neste
caso interessa saber qual é o critério de distinção, e também interessa saber se quando é
celebrado um negócio jurídico, se a lei admite quer as declarações expressas, quer as
declarações tácitas, sendo que, a regra está no artigo 217 e não há nada neste artigo que diga
que, tendencialmente, as declarações têm que ser expressas, pois a lei diz logo no início que a
declaração pode ser expressa ou tácita, porque para que a declaração tácita não valha, é

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preciso que a lei o diga, mas se a lei nada disser, a declaração tanto pode ser expressa como
tácita.

Não é correcto dizer que uma declaração por palavras pode ser expressa, e se não for por
palavras será sempre tácita, mas também pode haver uma declaração sem ser por palavras
que possa ser expressa, sendo que, uma declaração expressa sem ser por palavras, seria, por
exemplo, através de gestos que exprimam uma vontade, sendo que, certo tipo de conduta,
socialmente, pode ser interpretada como visando directamente manifestando uma anuência,
ou um sim, pois tanto vale dizer sim, como acenar com a cabeça de cima para baixo, como
numa situação em que dizem um valor de determinada coisa, eu imediatamente entrego o
dinheiro correspondente, portanto, pode haver declarações expressas sem ser através de
palavras, como se vê, e também é possível haver declarações feitas através de palavras, mas
que não são consideradas expressas, mas sim tácitas, como por exemplo, numa herança, pois
pode acontecer que a pessoa não diga que aceita directamente a herança, mas que se
comporte como herdeiro que fosse dono dos bens, pondo-se a vender e a doar bens da
herança, essa conduta só faz sentido se aquela pessoa se estiver a arrogar a titularidade do
bem, porque caso contrário não tem legitimidade para o transmitir, logo, isto é suficiente para
saber que houve uma aceitação tácita da herança.

No contrato de mandato, (artigo 1171), a lei fala em revogação tácita, no contrato de


mandato, o mandatário compromete-se a praticar um acto jurídico em nome do mandante, e
quando uma pessoa se compromete em praticar um acto jurídico em nome da outra, aquele
que se compromete em praticar o acto é o mandatário e aquele que o encarrega de praticar o
acto, é o mandante, mas acontecendo que A era o mandante e o B era o mandatário, e o A
encarregou o B de praticar certo acto jurídico, mas se posteriormente, o A encarregar um
terceiro C de praticar o mesmo acto jurídico, em principio vai-se interpretar a designação
desse segundo mandatário como traduzindo a vontade do mandante de revogar o primeiro
mandato, e neste caso é uma revogação tácita, porque pela lógica, se A encarregou B de um
acto, e agora encarrega C, é lógico deduzir daquela conduta, que sem dizer nada, que o A
pretende que seja outra pessoa a praticar esse acto e já não quer que seja o anterior.

Uma coisa é distinguir declarações expressas e declarações tácitas, mas outra coisa é distinguir
negócios em que há liberdade de forma e negócios em que não há liberdade de forma, pois
são planos diferentes, porque a distinção expressa e tácita é a distinção entre maneiras
directas e maneiras indirectas de exprimir a vontade, não se estando a discutir a forma,
porque pode haver declarações expressas e declarações tácitas em negócios em que há
liberdade de forma, e declarações expressas e tácitas em negócios em que em que a lei
imponha uma forma especial, havendo um ponto em comum, quer a declaração expressa e
tácita, quer a distinção de liberdade de forma especial são relevantes para sabermos se
determinada manifestação de vontade é válida e eficaz, e a questão que se coloca é saber se
num negócio formal (negócio em que a lei impõe determinada formula) se a vontade pode ser
manifestada tacitamente, ou se o conceito de declaração tácita só é admissível para os
negócios em que haja liberdade de forma?

Neste caso a resposta vem no artigo 217 nº 2 “o carácter formal da declaração não impede
que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos

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de que a declaração se deduz”, sendo que, este artigo diz expressamente que o negócio formal
não é incompatível com a existência de uma declaração tácita, portanto, pode haver
declarações tácitas nos negócios para os quais a lei exige forma escrita ou escritura publica,
mas é preciso que os factos dos quais de deduz a tal declaração tácita, sendo que a declaração
tácita é uma ilação que o interprete tira de certos factos, então, nos negócios formais para a
declaração tácita ser válida, é preciso que dos tais factos se retirou essa ilação, viessem eles
próprios mencionados num documento com a forma legal exigida.

FIGURA DO SILÊNCIO COMO MEIO DECLARATIVO (Artigo 218)


“O silêncio vale como declaração negocial, quando esse valor lhe seja atribuído por lei, uso ou
convenção”.

A regra é o silencio não valer como declaração negocial, ou seja, a partir de uma situação
jurídica de silencio, não é legitimo concluir que a pessoa, relativamente á qual houve esse
silêncio que terá querido manifestar determinada vontade negocial.

No entanto há três excepções, ao silêncio atribuído por uma norma legal, por uso ou por
convenção prévia.

Exemplos:

No caso da venda a contento, (artigo 923 nº 2), o silencio vale como declaração negocial, na
aceitação numa venda em que o bem é entregue ao comprador, mas que ele tinha um prazo
para não ficar dono do bem em definitivo, teria que o devolver dentro de certo prazo, e se
nada fizesse, no artigo 923 nº 2, esta ausência de manifestação vai ser interpretada como
consubstanciando uma aceitação, sendo este artigo um caso claro de um exemplo em que a
doutrina aceitaria uma declaração pelo silêncio.

No artigo 1054, nos contratos de arrendamento, diz que “findo o prazo do arrendamento, o
contrato renova-se por períodos sucessivos se nenhuma das partes se tiver oposto à renovação
no tempo e pela forma convencionados ou designados por lei”, nestes casos, a lei prevê que
num vulgar contrato de arrendamento para habitação, decorrido o prazo do arrendamento, se
não houver entretanto uma manifestação de vontade de uma das partes a opor-se à
renovação, vão decorrendo renovações automáticas do contrato, se o senhorio disser, o
contrato renova-se automaticamente, podendo-se concluir que é um caso em que a lei dá
relevância ao silêncio, ou seja, o facto de nenhuma das partes nada fazerem, é interpretado
como significando que pretendem que o contrato se renove.

As situações mais problemáticas serão nos casos do uso ou da convenção, porque na


convenção nunca poderá ser uma estipulação unilateral a dar valor jurídico ao silêncio alheio,
porque a lei exige, (artigo 218), que haja uma convenção que pressupõe um acordo, e o que
pode acontecer é que duas pessoas numa fase anterior à celebração de um negócio jurídico,
podem por acordo estipular que, numa certa situação se uma delas nada disser, a sua inércia
será interpretada como sendo a aceitação de um contrato, o que não pode acontecer é que
uma pessoa unilateralmente, decidir impor á outra o silencio com forma de declaração
negocial.

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A FORMA (Artigo 219)


Liberdade de forma não quer dizer que o negócio não vai ser celebrado sem forma alguma,
liberdade de forma, quer dizer que se pode escolher a forma, porque a celebração de um
negócio jurídico oralmente, tem a forma oral de celebração, ou se for celebrado através de
gestos, também é uma forma, pois não há propriamente negócios sem forma, sendo que, o
único tipo de vontade que pode ser demonstrado como não tendo forma, é o silêncio, ou seja,
para a celebração dos negócios, é sempre preciso que haja declaração negocial e na
declaração negocial, a vontade tem de ser manifestada de alguma forma que seja, sendo que,
o principio da liberdade de forma, significa apenas que quem vai celebrar um negócio pode
escolher a forma que quiser, (escrito, oralmente, etc.), isto não quer dizer que se pode
celebrar um negócio sem forma alguma, porque se não houver forma, não há nenhuma
exteriorização que possa ser interpretada como sendo uma manifestação de vontade.

Os negócios têm sempre uma forma, a questão é saber se é a lei que a impõe, ou se se pode
optar por qualquer forma, sendo que, o principio geral é o da liberdade de forma, sendo que, a
regra é que a liberdade de forma é para todos os negócios jurídicos, (artigo 219), sendo que,
este artigo, tanto se aplica aos negócios unilaterais como aos contratos, sendo que, a principal
diferença entre um negócio unilateral e um contrato, é que os contratos são negócios jurídicos
plurilaterais, tendo que haver sempre vontades e declarações consoante as partes, enquanto
no negócio unilateral apenas há que analisar a declaração, ao contrário dos negócios
plurilaterais que tem que ser analisadas tantas as vontades como quantos os contraentes.

Há que esclarecer um ponto importante, enquanto no contrato há várias declarações


negociais, e quando a lei exige forma escrita para o contrato, essa forma tem que ser
respeitada em todas as declarações negociais que o compõem, (no contrato de arrendamento
por mais de seis meses tem que ser por escrito), têm que ser por escrito, portanto, haveria um
vício de forma se um senhorio, por exemplo, se comprometesse por escrito, mas o
arrendatário oralmente, ou vice-versa, porque quando a lei diz que um contrato tem que ter
uma certa forma, em principio está a exigir essa forma para todos os elementos que compõem
esse contrato, ou seja, para todas as declarações, pois quando a lei diz que determinado
contrato terá que ser por escrito ou por escritura publica, isso quer dizer que todas as
declarações têm que ser por escritura publica, sob pena de, pelo facto de haver uma
declaração que não respeita a forma, ser suficiente para inquinar todo o contrato.

Quando a lei impõe uma forma esta é obrigatória, sendo que, quando não é respeitada a
forma legal, a consequência jurídica em principio será a nulidade, como é referido no artigo
220 “a declaração negocial que careça de forma legalmente prescrita é nula, quando outra não
seja a sanção especialmente prevista na lei”, pois neste artigo sempre que a lei fixe uma
determinada forma para um negócio jurídico se essa forma não for respeitada, em principio o
negócio será nulo, terá neste caso, o vício da nulidade, mas também é dito, a não ser que a lei
preveja outra consequência, pois pode haver certos casos em que a lei associe ao vício de
forma uma outra consequência que não seja a nulidade, pois o legislador pode decidir que em
certos negócios o vício de forma apenas dará lugar á anulabilidade, mas geralmente, se o
legislador não disser qual é o vício de forma, aplica-se o artigo 220.

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Tendo em conta o artigo 220, relativamente á forma, diz-se forma ad substancian quando a
forma é exigida pela lei como requisito de validade, e nestes casos, sempre que a violação da
forma implique invalidade, é porque está a ser exigida como requisito de validade, sendo que,
a regra por violação da forma, implique a nulidade, pois a lei faz depender a validade do
negócio pelo respeito da forma.

Mas também pode acontecer que a forma não seja exigida como requisito de validade, mas
como requisito de prova, então chamamos a isto, forma ad probationen, mas nestes casos é
preciso que o legislador o diga claramente como vem referido no artigo 364 nº 2 “se, porém,
resultar claramente da lei que o documento é exigido apenas para prova da declaração, pode
ser substituído por confissão expressa, judicial ou extrajudicial, contanto que, neste ultimo
caso, a confissão conste de documento de igual ou superior valor probatório”.

Ou seja, sempre que a lei não explique para que efeitos é que pede aquela forma, é porque é
para efeitos de validade, porque se a lei quisesse que fosse apenas para efeitos de prova, teria
que o dizer claramente, porque quando há casos em que a lei impõe uma forma legal, a
consequência é para validade ou para efeitos de prova, mas se a lei nada disser, é para o
requisito de validade.

Poderemos concluir que habitualmente a forma é para requisito de validade, com base no
disposto no artigo 220, quer no artigo 364 nº 2, á contrário senso, conjugado com o artigo 220,
e se só é requisito de prova quando a lei o diz claramente, quer dizer, que quando a lei nada
diz, é apenas para o requisito de validade, pois quando o negócio é nulo, é inválido, e se é
inválido, é porque a lei considera que a observância da forma que a lei exige, é o requisito de
validade.

Aula 6

FORMA DO NEGÓCIO JURÍDICO (Continuação)


Nas situações do artigo 223, haverá casos em que poderá existir liberdade de forma, porque a
lei não impõe uma forma especial, mas em que as partes combinam previamente que só
celebrarão um negócio jurídico por uma determinada forma, pois poderá haver um contrato
oral, mas as partes combinam em que só se vincularão por escrito, (compra e venda de um
quadro), e se esta forma for previamente combinada, então qualquer acordo oral que venha a
acontecer, não será considerado como sendo a celebração do contrato, porque as partes
combinaram previamente que só se vinculariam por uma forma escrita, e nestes casos em que
as partes se auto imponham uma forma mais solene do que aquela que a lei exige, fala-se em
forma convencional, sendo que esta forma também é obrigatória, não porque foi imposta pela
lei, mas porque as partes se impuseram a isso elas próprias.

Quando é violada a forma legal, em principio a consequência será a nulidade, (artigo 220), e se
a consequência da violação da forma legal é a nulidade, então poderá afirmar-se que em
Portugal, como regra, a forma quando é exigida por lei, é exigida como um requisito ad
substancian, como requisito de validade, mas também não é de excluir que se o legislador
quiser, possa exigir uma certa forma apenas como requisito de prova, tendo que o dizer
claramente, e se aquela forma é apenas para requisitos de prova, resulta claramente do artigo

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364 nº 2, que se o legislador quiser exigir a forma apenas como requisito de prova, então se
ela for violada o negócio será valido mas só poderá ser comprovado através de confissão,
sendo que, os efeitos do negócio ficam condicionados porque se não houver confissão da
outra parte, o juiz numa forma ad probationen não poderá aceitar outras provas que não
sejam a confissão.

ARTIGO Nº 221 (ÂMBITO DA FORMA LEGAL)


Artigo 221 nº 1 “as estipulações verbais acessórias anteriores ao documento legalmente
exigido para a declaração negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão
determinante da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à verdade do
autor da declaração”.

Artigo 221 nº 2 “as estipulações posteriores ao documento só estão sujeitas à forma legal
prescrita para a declaração se as razões da exigência especial da lei lhe forem aplicáveis”.

O artigo 221 só interessa quando existe uma forma legal, e só se aplica este artigo quando a lei
exige para certo negócio jurídico uma determinada forma, mas este artigo (221) não se aplica
aos negócios em que há liberdade de forma, só se aplica quando a lei exigir uma determinada
forma para o negócio jurídico.

Quando a lei exige uma certa forma para o contrato, está a exigi-la para as declarações que
compõem esse contrato, que é constituído por várias declarações, por exemplo, num contrato
de compra e venda, pelas declarações do vendedor e pelas declarações do comprador, neste
exemplo, não há duvidas, que quando a lei diz que a venda de imóveis tem que ser por
escritura publica, está a dizer que, quer a declaração de compra, quer a declaração de venda
tem que ser por escritura publica ou por documento autenticado.

A questão é saber, se quando a lei exige uma certa forma para o negócio, se está a exigir para
toda e qualquer cláusula do negócio ou só para as cláusulas que têm a ver com os elementos
essenciais do negócio, e resulta do artigo 221, que podem existir cláusulas do negócio às quais
não se aplique a exigência de forma que a lei prevê para o negócio como um todo, ou seja, é
concebível que a lei exija uma certa forma para um determinado negócio, mas que admite que
certas cláusulas de carácter acessório possam ser válidas, mesmo que não respeitem essa
forma, mas o artigo 221 vem referir em que termos isso é possível.

Tendencialmente, quando a lei exige uma determinada forma para um certo negócio todas as
cláusulas desse negócio têm que ser por essa forma, e diz-se tendencialmente, porque no
artigo 221, a lei admite que em certos casos, algumas cláusulas que respeitaram uma forma
menos solene, ainda assim, sejam válidas.

No artigo 221, há que distinguir, dentro das tais cláusulas acessórias em que se discute se
podem, ou não, ser por uma forma menos solene, há que distinguir as situações do 221 nº 1,
que são situações em que essas cláusulas acessórias foram estipuladas, antes do contrato ou
na altura da celebração do contrato, se são cláusulas anteriores ou contemporâneas, e há que
distinguir no nº 2 do artigo 221, que abrangem aqueles casos em que os contratos foram
celebrados pela forma exigida, e posteriormente foram introduzidas algumas cláusulas que
não observaram aquela forma legal, portanto, no artigo 221 nº 2, o que está em causa é a

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forma das cláusulas posteriores, no nº 1 do artigo 221, o que está em causa é a forma das
cláusulas anteriores ao negócio, ou contemporâneas do negócio.

ARTIGO 221 Nº 1
“As estipulações verbais acessórias anteriores ao documento legalmente exigido para a
declaração negocial, ou contemporâneas dele, são nulas, salvo quando a razão determinante
da forma lhes não seja aplicável e se prove que correspondem à verdade do autor da
declaração”.

Como se pode ver, são estipulações anteriores ou contemporâneas ao negócio, a regra é as


estipulações verbais serem nulas, quando a lei exige uma forma documental para o negócio, e
há cláusulas acessórias anteriores ou contemporâneas que são celebradas oralmente, mas a
doutrina entende, por interpretação extensiva, que também se aplica o nº 1 do artigo 221
naqueles casos em que as cláusulas acessórias até são por escrito, mas que são de uma forma
menos solene do que a forma exigida para o negócio como um todo.

Ou seja, se a lei exige para o contrato a forma escrita, e há cláusulas anteriores ou


contemporâneas que são orais, esta situação cai no nº 1 do artigo 221, e terá que se ver se
estas cláusulas são válidas ou inválidas, mas também se aplicará o nº 1 do artigo 221, se, por
exemplo, a lei exigir a escritura publica, que é a forma mais solene de todas se certas cláusulas
anteriores ou contemporâneas forem apenas por um documento particular escrito, porque o
espírito da lei não é só aplicar-se às cláusulas verbais, é aplicar-se a cláusulas acessórias para as
quais tenha sido observada uma forma menos solene, do que aquela que a lei exige, portanto,
também, se aplicam o nº 1 e o nº 2 do artigo 221, naqueles casos em que as cláusulas
acessórias foram por escrito, mas por uma forma menos solene daquela que é exigida para o
negócio como um todo.

No artigo 221 nº 1 começa por dizer que as cláusulas são nulas, mas introduz aqui uma
excepção e diz “salvo quando a razão determinante da forma lhes não seja aplicável e se prove
que correspondem á vontade do autor da declaração”, ou seja, no caso do nº 1, para que essas
cláusulas acessórias que observaram uma forma menos solene do que aquela que a lei exige
para o negócio, e para que essas cláusulas acessórias sejam formalmente válidas, em princípio
são nulas, a não ser que se prove duas coisas, por um lado, que as razões determinantes da
exigência da forma não lhe são aplicáveis, e também é preciso provar que essas cláusulas
correspondem á vontade do autor da declaração.

Para se provar que as cláusulas correspondem á vontade do autor da declaração, em principio


o que esta frase quer dizer, é que estas cláusulas são anteriores ao negócio, anteriores á
feitura do documento, ou se são contemporâneas, no raciocino do legislador, se estas
cláusulas são anteriores ou contemporâneas, interessa saber por que motivo não foram
aproveitadas pelas partes para colocar junto às cláusulas acessórias do documento, e ficando a
duvida, é preciso provar que apesar de terem sido estipuladas antes do tempo, as partes
pretendiam que na assinatura do documento essas cláusulas se mantivessem, e em caso de
duvida, o legislador pretende que se prove que as cláusulas correspondiam á vontade das
partes, porque são cláusulas anteriores á celebração do documento, mas também vai ter que
se provar que corresponde á vontade do autor da declaração, e provar também que a razão
determinante da forma não lhes é aplicável.

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No fundo, o que este artigo 221 nº 1 quer dizer, é que, se a lei exigir para um certo negócio
uma certa forma solene (documento escrito, escritura publica, etc.) e se as partes introduzirem
a esse negócio cláusulas acessórias verbalmente, ou mesmo que seja por escrito, de uma
forma menos solene, para essas cláusulas serem válidas, tem que se provar que quando a lei
exigiu a forma mais solene, não foi a pensar neste tipo de cláusulas, mas em cláusulas com
maior importância e relevância, sendo necessário provar que não foi por esse tipo de cláusulas
acessórias, que o legislador decidiu exigir a escritura publica ou um documento escrito.

A aplicação do nº 1 é complicada, porque para ser aplicado o nº 1, tem que se demonstrar que
a razão de ser da exigência da forma não é aplicável, mas isso implica ter que demonstrar qual
é a razão que leva o legislador, quando exige determinada forma, a fazê-lo, e saber porque é
que a lei para certos negócios exige determinada forma, (escritura publica ou documento
escrito).

Há várias explicações, por exemplo, no caso dos imóveis, uma das várias explicações da lei, por
exemplo, ao exigir a escritura publica ou um documento autenticado, é para impedir que o
negócio seja celebrado instantaneamente, pois são negócios que podem ter influencia na vida
das pessoas, pois o facto de terem que ir ao notário fazer uma escritura, ou depois terem que
ir autenticar o documento, vai atrasar um pouco a vinculação das partes, dando-lhes tempo
para pensarem melhor e, para eventualmente, mudarem de ideias sobre esse negócio, ou seja,
a formalização destes negócios é para levar as pessoas a reflectirem um pouco mais sobre
estes negócios, e para se verificarem menos irregularidades nestes contratos, e para os
mesmos contratos ficarem registados.

Há uma questão muito importante a referir que é a seguinte, o que diz o artigo 221 é, se certas
cláusulas acessórias que não respeitam a forma que a lei exigiu para o contrato como um todo,
se essas cláusulas, apesar de não terem respeitado essa forma, se são, ou não são válidas, e só
são válidas em certas circunstâncias, mas admitindo que são válidas, se se prova que a razão
de ser determinante da forma, e se conseguia demonstrar à luz do nº 1 e do nº 2 do artigo
221, que as cláusulas eram válidas.

ARTIGO 394 Nº 1
Não obstante serem válidas, se tiverem sido orais pode-se levantar o problema que tem a ver
com a aplicação do artigo 394 nº 1 que é um artigo muito importante pelas suas
consequências, “é inadmissível a prova por testemunhas, se tiver por objecto quaisquer
convenções contrárias ou adicionais ao conteúdo de documento autentico ou dos documentos
particulares mencionados nos artigos 373º a 379º quer as convenções sejam anteriores à
formação do documento ou contemporâneas dele, quer sejam posteriores”.

Não se pode confundir o artigo 394 com o artigo 221, mas há uma clara necessidade de
relacionar estes dois artigos, porque o ponto de partida tem que ser sempre o artigo 221, pois
nos casos em que a lei exige uma certa forma para um negócio, e há certas cláusulas
acessórias que são por uma forma menos solene, a primeira coisa a fazer é ver se as cláusulas
são válidas ou se são nulas, sendo que, neste caso, quem responde é o artigo 221, mas até se
provava, por exemplo, que aquela cláusula era válida, porque apesar de não ter respeitado a
forma que a lei exige para o negócio, era uma cláusula acessória, mas que mesmo não
respeitando uma forma solene, ainda assim, era válida, mas se a cláusula for oral.

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Mas depois levanta-se um problema que tem a ver com o artigo 394 nº 1, e o que resulta da
leitura deste artigo, é que, uma cláusula oral que contrarie aquilo que é dito num documento,
(escritura publica, documento autenticado ou simples documento particular), e se lhe foram
introduzidas cláusulas, quer antes, quer durante, quer depois, que o alteram ou que
acrescentam algo, e se essas cláusulas foram orais, mesmo que sejam válidas, e isso depende
do artigo 221, pois uma cláusula oral que contrarie um documento escrito, a lei diz que não
pode ser provado por testemunhas, pois tal é proibido por lei.

Ao proibir a prova por testemunhas, essas cláusulas, mesmo sendo válidas, acabarão por não
servir de nada, porque, normalmente, quando a cláusula é oral, a única prova que têm a as
partes, é precisamente testemunhas que tenham assistido ao acordo oral, e se não é possível
provar através de testemunhas, isto quer dizer que, um negócio foi celebrado como um todo,
mas foram introduzidas cláusulas acessórias oralmente, e mesmo que sejam válidas, não
podem ser provadas por testemunhas, portanto, isto é uma fortíssima limitação á
possibilidade prática de, através de estipulações orais, alterar aquilo que consta de
documentos escritos, mesmo que sejam válidas.

No artigo 395, refere-se “as disposições dos artigos precedentes são aplicáveis ao
cumprimento, remissão, novação, compensação e, de um modo geral, aos contratos extintivos
da relação obrigacional, mas não aos factos extintivos da obrigação, quando invocados por
terceiro”.

Se um contrato foi celebrado por escrito, mesmo que eventualmente possa ser revogado
oralmente, ou seja, se a revogação de um contrato escrito for oral, não pode ser provada por
testemunhas, mas se for uma alteração oral a um contrato oral, pode sempre ser provado por
testemunhas, o que a lei não permite que se prove por testemunhas é uma alteração oral a um
contrato que consta de um documento escrito, mesmo que seja um contrato para o qual
eventualmente até houvesse liberdade de forma, havia nesse caso, mas o facto é que o
contrato foi celebrado por escrito, e quando no artigo 395 se fala em remissão, a remissão é o
perdão da divida, pois no fundo, o que a lei vem dizer, é que se a divida consta de documento
escrito, um perdão oral não pode ser provado por testemunhas.

Aula nº 7

FORMA DO NEGÓCIO JURÍDICO (Conclusão)


Regra geral, há liberdade de forma, pois as pessoas quando celebram um negócio podem optar
pela forma que bem entenderem, no entanto há casos em que a lei impõe determinada forma
que se designa de forma legal, sendo que, a forma legal é exigida como requisito de validade,
forma ad substancian, como é referido no artigo 220 que quando há um vício de forma, o
negócio será nulo e se é nulo, é inválido.

Pode acontecer que o legislador exija uma certa forma, não como requisito de validade, mas
apenas como requisito de prova, então fala-se em forma ad probationen e aplica-se o artigo
364.

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Num negócio formal, sempre que são introduzidas, antes, durante ou depois, cláusulas orais
ou cláusulas por uma forma menos solene, a primeira questão é saber se são válidas ou
inválidas e neste caso, a resposta está no artigo 221, mas mesmo que se conclua que são
válidas, ainda se levanta o problema do artigo 394 nº 1 pois são cláusulas orais que modificam
o negócio celebrado por escrito, e quando isso acontece, aplica-se o artigo 394 nº 1 que
introduz uma forte restrição em matéria de prova, pois sempre que o negócio é celebrado
através de determinado documento, (particular, autentico, autenticado ou escritura publica),
num negócio celebrado por qualquer forma documental, quaisquer cláusulas orais que o
alterem, que o modifiquem, ou que lhe aditem algo, estas cláusulas orais, mesmo que sejam
válidas, não poderão ser provadas através de testemunhas, e isso significa que na maior parte
dos casos, se forem introduzidas cláusulas orais em negócios celebrados por forma
documental, mesmo que sejam válidas, acabará por ser impossível prová-las porque o meio de
prova que o declarante possui são testemunhas, mas como estas não são admitidas como
meio de prova, tendo em conta as restrições do artigo 394 nº 1, pois sempre que haja
cláusulas orais que de algum modo modifiquem, ou aditem algo ao negócio que foi celebrado
por documento escrito, se não podem ser provadas por testemunhas, então só poderão ser
provadas, por confissão (artigos 352 e seguintes – confissão judicial e confissão e extrajudicial).

Na forma, não é apenas a forma legal que é obrigatória, pois a forma legal é imposta por lei, e
por tal motivo é sempre obrigatória, mas o normal é haver liberdade de forma, mas as partes
também podem por acordo, auto impor-se a observância de determinada forma, pois pode
haver um negócio, para o qual existe liberdade de forma, mas em que as partes combinem que
só se irão vincular por escrito e chama-se a isto forma convencional (artigo 223) que também é
obrigatória apenas porque foi estipulada pelas partes.

FORMA VOLUNTÁRIA
No artigo 222 Nº 1, fala-se numa forma que já não é legal nem convencional, mas é a forma
voluntária, “se a forma escrita não for exigida por lei, mas tiver sido adoptada pelo autor da
declaração, as estipulações verbais acessórias anteriores ao escrito, ou contemporânea dele,
são válidas, quando se mostre que correspondem à vontade do declarante e a lei as não sujeite
á forma escrita”.

O artigo 222 está a pressupor que há liberdade de forma, e neste caso poderia ser oral, mas
calhou que ambas as partes, ou uma delas, ter celebrado o negócio por escrito e pode ser um
contrato para o qual exista liberdade de forma, e nesta caso, se forem introduzidas alterações
orais, no caso do artigo 222, em princípio são válidas, porque se está na presença de um
negócio em que há liberdade de forma, a não ser que haja uma norma legal que exija a forma
escrita.

CULPA NA FORMAÇÃO DOS CONTRATOS – CULPA IN CONTRAHENDO


A doutrina e a jurisprudência têm-se preocupado com a seguinte situação, em que por vezes
há negócios que são celebrados e que têm vício de forma, mas em que uma das partes agiu de
má-fé, pois sabia que havia um vício de forma e não informou a outra parte, tendo deixado
que o negócio tivesse sido celebrado, tendo a perfeita consciência que havia um vício que
tornava o negócio nulo.

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Nestes casos, levanta-se o problema, de aquele que agiu de má-fé, e que omitiu a informação
de que havia um vício de forma, poder vir mais tarde a poder invocar o vício.

Neste caso, quer a doutrina, quer a jurisprudência, têm-se preocupado com esta situação
porque considera-se que em certos casos, seria injusto, a pessoa causadora do vício, poder
prevalecer-se do próprio vício que foi causadora e vir pedir a nulidade do negócio com as
consequências que daí resultam, porque se é um negócio nulo, não produz efeitos jurídicos,
sendo que, a questão que se coloca é, admitindo que uma das partes agiu de má-fé, não
informando a outra que havia um vício, tendo mentido dizendo que estava tudo bem, quando
não estava, ou prometeu que nunca invocaria o vício mas invocou-o, a questão que se coloca é
a de saber se a lei tem algum mecanismo jurídico para proteger a outra parte que acreditou na
validade do negócio e que foi ludibriada.

Uma primeira hipótese é dizer que, se alguém celebra um negócio, sabendo que há um vício
de forma, e não informando a outra parte de que o negócio está viciado á partida, neste caso,
há aquilo que se designa por culpa na formação de um contrato, ou seja, má-fé na celebração
do contrato que vem prevista no artigo 227, uma figura jurídica que se designa por culpa na
formação dos contratos (culpa in contrahendo) “quem negoceia com outrem para conclusão
de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as
regras da boa-fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar á outra parte”.

Retira-se da leitura deste artigo, sendo certo que há liberdade contratual, e as negociações
servem para as pessoas chegarem a um acordo, há casos em que haverá “culpa in
contrahendo”, (má fé), quando alguém, leva demasiado longe as negociações, fazendo crer á
outra parte que o negócio vai ser fechado, quando de facto, não tem o propósito de o fazer.

Mas, se um dos contraentes ao contratar sabe que há um vício no negócio jurídico que o torna
inválido, tem o dever de informar a outra parte, caso contrário há má-fé e tendo em conta o
artigo 227, há que referir o seguinte:

Se um contrato foi celebrado entre A e B, e se esse contrato tiver um vício de forma, se se


demonstrar que uma das partes sabia que havia um vício de forma e não alertou a outra parte,
a outra parte pode vir a invocar a “culpa in contrahendo” e poderia pedir uma indeminização
pelos danos que eventualmente tivesse sofrido com aquela situação, e nestes casos é sempre
possível demonstrando que uma parte mentiu quanto à forma, ou omitiu uma informação
quanto á forma, nestes casos, o lesado pode pedir uma indeminização nos termos do artigo
227.

Outra hipótese possível nos negócios com vícios de forma, será de aproveitar alguma coisa
daquele negócio através das regras da conversão, (artigo 293), que é o caso dos negócios que
são celebrados com vício de forma, e sendo nulo, não pode valer como tal, mas por vezes é
possível transformar esse negócio nulo num negócio válido que permite alcançar resultados
parecidos.

As situações que se discutem na doutrina têm a ver com aqueles casos em que uma das partes
que causou o vício de forma, mais do que má-fé, agiu com aquilo a que se chama abuso de
direito, ou seja, mentiu ao outro, e nestes casos há quem considere que houve um abuso de

Serafim Cortizo 20100059 Página 31

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direito que vem previsto no artigo 334 que dá a noção do abuso de um direito “é ilegítimo o
exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-
fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.

O abuso do direito que neste caso se está a falar, seria o de uma das partes invocar a nulidade,
pois quando o negócio é nulo, a nulidade pode ser invocada por qualquer interessado (artigo
286), mas num contrato em que uma das partes mentiu á outra sobre a forma do contrato e
mais tarde essa parte vem invocar o vício de que foi causadora, que deu origem á nulidade,
sabendo que o negócio era nulo, mentiu á outra parte, garantindo que tudo estava em
conformidade, e mais tarde essa parte vem invocar o vício.

Neste caso, quem vem arguir a nulidade está no pleno exercício de um direito, todavia, há
quem considere que, num caso destes, se se provar que a parte que mentiu e ludibriou a outra
parte, que esta conduta é tão flagrantemente contrária á boa-fé, que não faz sentido esta
parte fazer-se prevalecer do direito de pedir a nulidade para tentar obter uma vantagem para
se fazer prevalecer da sua própria perfídia, e nestes casos, há quem considere que seria um
abuso de direito, vir invocar o vício tendo que indemnizar a outra parte, sendo que, é a partir
daqui que a doutrina diverge.

TESE DE MOTA PINTO E MENESES CORDEIRO (Abuso do direito)

TESE DE MOTA PINTO


Mota Pinto defende a tese de que se aquele que vier a invocar o vício de forma tiver sido o
causador do vício e tiver tido uma conduta particularmente censurável porque mentiu, Mota
Pinto considera que tendo em conta que havia um abuso de direito, nesse caso ele nem sequer
poderia invocar o vício.

Ou seja, para Mota Pinto e para alguma jurisprudência, o causador do vício de forma ficaria
inibido de pedir para ser decretada a nulidade deste negócio.

Esta tese levanta imensos problemas, porque quando a lei prevê a nulidade, não é
exclusivamente para a tutela de interesses particulares, normalmente é para tutelar casos de
interesse publico e sociais, no caso dos particulares em concreto, a lei opta sempre pela
anulabilidade.

Na tese de Mota Pinto, como não se podia invocar o vício de forma, porque houve abuso de
direito, sendo que a lógica desta tese, seria nem o causador do vício, poder vir a invocar o
vício, nem o juiz por sua iniciativa poder invocar o vício, pois caso contrário estaria a dar
cobertura á conduta de má-fé do causador do vício.

Grande parte da doutrina admite que se possa dizer que há abuso de direito se o causador do
vício invocar o vício, mas o que a maior parte da doutrina entende é que, se o causador do
vício invocar o vício, pode fazê-lo e o juiz decreta a nulidade, mas depois aquele que agir com
abuso vai ter que indemnizar a outra parte.

Mas na tese de Mota Pinto, nem sequer pode ser invocado o vício, nem o juiz pode invocar a
nulidade.

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TESE DE MENEZES CORDEIRO


Menezes Cordeiro tem uma construção mais arrevesada que Mota Pinto, partindo das
premissas de Mota Pinto desenvolve um raciocino um pouco diferente.

Meneses Cordeiro também parte de principio de que, se uma pessoa mente à outra, dizendo
que certo negócio é formalmente válido, sabendo que não é, ou se uma pessoa incute na outra
que nunca invocará o vício, mas se depois o vai invocar, ele também aceita que há abuso de
direito, mas ao contrário de Mota Pinto, ele entende que tendo em conta o interesse publico e
social que assiste nas situações em que a lei exige uma forma especial, ele entende, que se
facto for pedida a nulidade, o juiz deve-a decretar.

Mas Meneses Cordeiro vai mais longe, e diz que o juiz deve declarar a nulidade, apesar de ter
havido abuso, mas porque houve abuso, que é um acto ilícito, logo, haverá o dever de
indemnizar a outra parte.

Mas a lei portuguesa, dá prioridade á chamada responsabilidade civil, que é quando uma
pessoa causa danos a outra pessoa, tem o dever de a indemnizar se se verificarem que certos
requisitos, o lesado pode pedir uma indeminização ao causador dos danos.

No artigo 562 (obrigação de indeminização) para se perceber melhor a tese de Meneses


Cordeiro, diz-se “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que
existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”, a nossa lei não diz que
quem causa danos tem que pagar uma quantia em dinheiro, a lei diz que tem que reconstituir
a situação que existiria se não se tivessem causado os danos, que é uma questão diferente,
mas se não for possível a reconstituição natural, no artigo 566 a indeminização terá que ser em
dinheiro “a indeminização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja
possível, não repare integralmente os danos, ou seja excessivamente onerosa para o devedor”.

Salvo nos casos previstos no artigo 566, as pessoas devem recorrer á reconstituição natural,
tudo isto para explicar a tese de Meneses Cordeiro, que defende a tese, de que se uma pessoa
de má-fé mentir ao outro contraente fazendo-lhe crer que certa forma é boa, se essa pessoa
mais tarde vier pedir a nulidade, estará a agir com abuso de direito, no entanto pode obter a
nulidade, mas depois vai ter que indemnizar o lesado.

Mas como a lei dá prioridade à reconstituição natural, logo, segundo Meneses Cordeiro, o
lesado ao invés de pedir dinheiro pode exigir que aquele que pediu a nulidade, seja condenado
pelo tribunal a celebrar um novo contrato com a outra parte, só que desta vez formalmente
válido.

Neste caso, segundo Meneses Cordeiro, a tal pessoa que foi vítima de um abuso de direito,
num primeiro momento sujeitava-se a que o negócio fosse declarado nulo, mas depois,
através da reconstituição natural, poderia fazer com que o outro fosse condenado a celebrar
um novo negócio, invocando artigo 830 que prevê a chamada execução específica do contrato
promessa.

Meneses Cordeiro entende que o causador do vício não deve invocar o vício, mas se o fizer há
abuso de direito, e se o fizer, o juiz terá que declarar a nulidade, mas essa nulidade vai causar
danos á outra parte que pode pedir uma indeminização, e ao invés de pedir uma

Serafim Cortizo 20100059 Página 33

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indeminização em dinheiro vai pedir a reconstituição natural, e neste caso é pedir que aquele
que agiu com abuso de direito seja condenado a celebrar um negócio igual, mas desta vez,
válido, e se o outro não celebrar um negócio igual válido, a tal vitima do abuso de direito
poderia fazer-se prevalecer de um mecanismo que a lei prevê no artigo 830 para o contrato
promessa.

Basicamente o que Meneses Cordeiro quer dizer é se alguém causou um vício de forma e mais
tarde invoca o vício e isso é abuso de direito, mas o juiz tem que declarar a nulidade, mas ao
declarar a nulidade, surgiu um dano para a outra parte que tem direito a ser indemnizada pelo
abusador, que pelo artigo 334 diz que o abuso é uma conduta ilegítima, e a parte inocente ao
pedir uma indeminização, ao invés de pedir uma indeminização em dinheiro, pede uma
reconstituição natural, pedindo que haja uma sentença que condene o outro a celebrar um
novo negócio, mas se o outro não quiser celebrar um novo negócio, a vitima irá invocar as
regras do artigo 830 para obter uma sentença que equivalha à celebração do negócio.

INTERPRETAÇÃO DAS DECLARAÇÕES NEGOCIAIS


O negócio jurídico pressupõe uma, ou várias declarações negociais, no negócio bilateral há
uma declaração negocial, nos contratos, há duas, ou mais declarações negociais visto que há
negócios jurídicos plurilaterais.

No caso do negócio jurídico tem que se perceber o que as partes queriam exactamente, tal
como as leis carecem de ser interpretadas, também as declarações negociais carecem de ser
sempre interpretadas, porque muitas vezes, nem sempre, o conflito que surge em tribunal, é
saber se o contrato, foi ou não cumprido, mas outras vezes o que se discute é o próprio
significado das declarações negociais, porque por vezes, uma das partes dá um certo sentido
ao negócio e a outra parte diz que o negócio tem outro sentido, pois pode haver uma
divergência sobre o conteúdo do próprio negócio e sobre o modo em como devem ser
interpretadas as próprias declarações negociais, porque não são só as normas legais que têm
que ser interpretadas (artigo 9º), e se houver lacunas na lei, também há o artigo 10º que diz
como se integram essas lacunas.

Mas também nos negócios jurídicos e nas declarações negociais, levantam-se problemas de
interpretação e também nos negócios jurídicos se podem levantar problemas de lacunas, pois
pode haver negócios jurídicos lacunares em que é preciso integrar a lacuna, pois as partes não
estipularam aspectos relevantes, ou pode haver negócios jurídicos, sejam eles unilaterais ou
sejam contratos, em que surgem duvidas sobre o modo de interpretar o sentido que as
declarações têm efectivamente.

E tal como existem normas que ensinam a interpretar a lei, (artigo 9º), ou que ensinam a
integrar as lacunas na lei, (artigo 10º), também em matéria do negócio jurídico há normas
sobre a interpretação do negócio jurídico que são os artigos 236 ao 238, que são normas sobre
a interpretação das declarações negociais, e depois no artigo 239, existe um modo de integrar
as lacunas no negócio jurídico, porque pode haver lacunas no negócio e não apenas na lei.

É essencial, quando estamos a lidar com negócios jurídicos, sejam unilaterais ou sejam
contratos, a primeira coisa a fazer, é demonstrar o que foi celebrado num negócio jurídico e o
que foi estipulado entre as partes, mas para isso é necessário interpretar as declarações

Serafim Cortizo 20100059 Página 34

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negociais que compõem o negócio jurídico, aliás, a interpretação das declarações negociais até
é importante para se saber se efectivamente se formou um negócio, porque se se concluir que
um disse “alhos” e o outro respondeu “bugalhos”, não se formou um contrato, pois tem que
haver acordo e para haver acordo, as declarações têm que ser harmónicas entre si, pois se um
diz vendo e o outro diz compro, as declarações são harmónicas entre si, mas se um diz vendo e
o outro responde alugo, constata-se ao interpretar as duas declarações, que estão a falar de
algo diferente.

É preciso interpretar se as declarações são harmónicas entre si e se se formou um contrato,


mas depois também é preciso interpretá-las para se saber exactamente o que é que foi
estipulado, porque só sabendo o que foi estipulado, é que se pode concluir mais tarde, se uma
das partes, está ou não, a violar o contrato.

ARTIGO 236 – REGRA DE INTERPRETAÇÃO DAS DECLARAÇÕES NEGOCIAIS EM


GERAL
A regra geral sobre o modo de interpretar as declarações negociais, sejam negócios
unilaterais ou contratos, está no artigo 236, nº 1 “a declaração negocial vale com o sentido
que um declaratário normal, colocado na posição do real declaratário, possa deduzir do
comportamento do declarante, salvo se este não puder razoavelmente contar com ele”, 236 nº
2 “sempre que o declaratário conheça a vontade real do declarante, é de acordo com ela que
vale a declaração emitida”.

O legislador em certos casos, e para certos negócios, é livre para criar regras especiais sobre a
interpretação, por exemplo, se o negócio que estiver a ser interpretado for um testamento,
(negócio jurídico unilateral mortis causa), porque há dúvidas sobre o que o testador quis dizer,
e neste caso, não se deve ir para o artigo 236, mas para o artigo 2187 que é a regra especial
para a interpretação dos testamentos, e sempre que há uma regra especial, esta prevalece
sobre a regra geral.

ARTIGO 236 Nº 1 (Sentido juridicamente vinculativo da declaração)


Neste artigo, a primeira coisa é perceber o que é que a lei quer dizer com declarante e
declaratário.

O declarante é a pessoa que faz a declaração, é o autor da declaração, pois nos negócios
jurídicos há sempre uma declaração negocial (negócio unilateral e várias se for um contrato ou
um negócio plurilateral) e aquele a quem a declaração negocial é dirigida, é o declaratário.

No testamento, há apenas uma declaração que é feita pelo testador, o testador é o declarante,
mas num contrato, há dois declarantes e dois declaratários, (contrato de compra e venda), o
proponente é o declarante da proposta, mas é o declaratário na aceitação, quem faz a
proposta é o declarante, mas quando a outra parte responde a dizer que aceita, relativamente
à declaração de aceitação, o proponente nesse caso, é o declaratário, pois na celebração do
contrato vai haver dois declarantes e dois declaratários, o declarante, por exemplo, diz que
vende um quadro por 10 €, e quando o declaratário responde aceito, ele está a ser o
declarante e o autor da proposta passa a ser o declaratário.

Serafim Cortizo 20100059 Página 35

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Exemplo:

A dirigiu uma declaração negocial a B, o A que é o autor da declaração atribui á sua declaração
o sentido X, mas que o B atribuiu àquela declaração o sentido Y, então temos uma só
declaração, mas em que há duas interpretações divergentes sobre o seu sentido, sendo que o
critério de desempate é feito, em caso de litígio, através do juiz socorrendo-se do disposto no
artigo 236 nº 1, que diz que “a declaração vale com o sentido que o declaratário normal
colocado na posição de real declaratário, possa deduzir do comportamento do declarante”.

Logo, o juiz vai ver o que é que um declaratário normal, uma pessoa média, se tivesse sido
confrontada com uma declaração, o que é que uma pessoa normal teria percebido, ou seja, o
juiz vai tentar pôr-se na pele do real declaratário e o que é que uma pessoa media, se estivesse
no lugar do declaratário na altura em que a declaração foi feita, e imaginemos que o juiz
concluía que uma pessoa normal também teria percebido Y, então o juiz dirá que a declaração
significa Y, mas o juiz também pode concluir que uma pessoa normal também perceberia X,
mas também nada impede que o juiz conclua que uma pessoa normal teria percebido uma
terceira coisa, nem X nem Y, mas teria percebido Z, e se o juiz concluir que uma pessoa normal
teria percebido Z, o juiz dirá, esta declaração tem o sentido Z, pois o juiz, ou o interprete não é
obrigado a optar entre os dois sentidos que estão em litígio, pois até pode concluir que o
verdadeiro sentido é um terceiro sentido.

Só não será assim se se aplicar o 236 nº 2 “sempre que o declaratário conheça a vontade real
do declarante, é de acordo com ela que vale a declaração emitida”.

Exemplo:

Eu queria dizer X, mas o juiz até pode concluir que uma pessoa normal não perceberia X, mas
perceberia outra coisa qualquer, mas se se conseguir demonstrar que o declaratário percebeu
perfeitamente o que se pretendia dizer, porque estava mais ou menos a par do que eu queria
dizer de conversas anteriores, se se conseguir provar em tribunal que o declaratário real,
apesar de o declarante se ter exprimido mal, mas que percebeu o que se pretendia dizer,
então o juiz não aplica o nº 1 do artigo 236, mas sim o nº 2, que vai dar á declaração o sentido
que o declarante lhe quis dar, apesar de se ter exprimido incorrectamente, sendo que, o
raciocínio da lei é, se se pretendia dizer X, o declaratário percebeu que era X, e se há sintonia
entre as partes, não há razão para tentar ir averiguar o que é que uma pessoa média ou
normal perceberia.

Aula nº 8

INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO E INTEGRAÇÃO DE LACUNAS


(Continuação)
A declaração (negócio unilateral), ou declarações negociais (contratos) carecem de ser
interpretadas de modo a apurar qual é o seu sentido.

Já foi visto que pode acontecer que haja uma disputa entre o declarante e o declaratário
acerca do sentido prático a atribuir a determinada declaração negocial, pois pode acontecer o

Serafim Cortizo 20100059 Página 36

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autor da declaração (declarante) atribua á sua própria declaração um certo sentido, mas o
destinatário da declaração (declaratário) pode é ter dado a essa mesma declaração um outro
sentido, e quando isso acontece, haverá um litígio entre as partes e tornar-se-á necessário ao
juiz determinar qual é o sentido, juridicamente vinculativo da tal declaração negocial.

Já foi visto que, das duas, uma, ou o declaratário percebeu o que é que o declarante quis dizer,
e se provar o que o declaratário percebeu o que é que o declarante quis dizer, então mesmo
que o declarante se tenha expressado mal, aplica-se o nº 2 do artigo 236, e neste caso, dar-se-
á à declaração o sentido que o declarante lhe quis dar.

Quando não se prova o que o declaratário percebeu o que o declarante quis dizer, aplica-se o
nº 1 do artigo 236, e neste caso, o juiz, se não se demonstrar que o declaratário percebeu o
que o declarante quis dizer, e neste caso, o que o juiz vai tentar averiguar, é o que é que uma
pessoa normal (pessoa média) perceberia se estivesse colocada na posição do verdadeiro
declaratário no momento em que a declaração foi feita, e portanto, vai-se atender ao que um
declaratário normal perceberia e não àquilo que o verdadeiro declaratário percebeu, e por
isso, até pode acontecer que o juiz chegue á conclusão que um declaratário normal daria
àquela declaração o sentido que até pode não ser o sentido que o declarante lhe quis dar, nem
o sentido que o verdadeiro declaratário lhe deu, porque até pode acontecer que se conclua
que um declaratário normal daria àquela declaração um terceiro sentido, mas na maior parte
dos casos chegar-se-á á conclusão que um declaratário normal interpretaria o sentido que o
verdadeiro declarante lhe quis dar.

A lei fala no artigo 236 nº 1, no “declaratário normal colocado na posição do real declaratário”,
portanto, ser colocado na posição do real declaratário, significa desde logo ter um grau de
instrução e de conhecimentos jurídicos semelhante, porque, imagine-se que o declarante e o
declaratário antes de a declaração ser feita tinham andado em negociações prévias, é evidente
que aquilo que foi dito nas negociações prévias, é relevante para depois se interpretar uma
declaração que é feita do que se essa declaração surgisse de repente, e neste caso se se for
colocar um declaratário normal, imagina-se que ele também tinha participado nas negociações
prévias, ou seja, deduz-se que o declaratário normal tinha o mesmo grau de conhecimento e
de informação que tinha o verdadeiro declaratário e por isso é que a lei diz “o declaratário
normal colocado na posição do real declaratário”, pois a lei não apenas, interpreta-se como
um declaratário normal o faria, mas frisa colocado na posição do real declaratário.

Portanto, se o real declaratário conhecia certos hábitos de linguagem do declarante, então


tem que se imaginar uma pessoa normal que também conhecia os hábitos de linguagem do
declarante, porque pode haver um tipo de maneira de falar e de exprimir do declarante, que
seria difícil de captar por uma pessoa vulgar, mas não para quem já lhe conhecesse os seus
antecedentes.

No artigo 236 nº 1, tem na parte final uma restrição á sua própria aplicação, sendo que, já
vimos que se aplica sempre que o caso não caia no nº 2, porque primeiro vai-se ver se o
declaratário percebeu o que é que o declarante queria, se percebeu, dá-se o sentido que o
declarante quis porque foi percebido pelo declaratário, e neste caso aplica-se o nº 2 do artigo
236 e a declaração tem o sentido que o declarante lhe quis dar, mesmo que uma pessoa
normal não percebesse, mas que o declaratário real percebeu, mas admitindo que não se

Serafim Cortizo 20100059 Página 37

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consegue demonstrar que o declaratário real sabia o que o declarante queria, então aplica-se
o nº 1, onde se vai ver o que uma pessoa normal (média), minimamente diligente e sagaz
naquelas circunstâncias perceberia.

No entanto, a parte final do nº 1 introduz uma restrição ao dizer “salvo se este não puder
razoavelmente contar com ele”, “este”, é o declarante, ou seja, o que diz o nº 1 é, dá-se à
declaração o sentido que uma pessoa normal daria, mas depois diz, salvo se o declarante não
pudesse razoavelmente contar com esse sentido, ou seja, salvo se se concluísse que não era
razoável exigir do declarante que pudesse prever aquela interpretação, pois há casos em que o
declarante imagina que aquela declaração vai ser feita, pois há situações em que não lhe deve
ser atribuída responsabilidade pela compreensão que desencadeou nos outros, porque ele não
poderia prever que a interpretação que viesse a ser feita fosse aquela, e se se provar que o
declarante, que mesmo sendo atento, cuidadoso e diligente, nunca poderia ter imaginado que
a sua declaração fosse interpretada daquela maneira, então não se aplica a parte inicial do nº
1, ou seja, já não se vai dar á declaração o sentido que uma pessoa normal na posição do real
declaratário lhe daria.

Na parte final do artigo 236 nº 1, resulta que não se pode dar à declaração o sentido que o
declaratário normal daria, o que resulta da parte final do nº 1, é que o sentido não vai ser o
sentido que o declaratário normal daria, sendo que, a doutrina portuguesa conclui que,
sempre que se verifica a situação da parte final do nº 1 do artigo 236, não vai ser possível,
juridicamente, atribuir um sentido à declaração negocial, porque não se pode atribuir o
sentido que o declaratário normal daria, porque a parte final do nº 1 estabelece uma
excepção, mas a lei também não diz que se vai atribuir á declaração o sentido que o declarante
lhe quis dar, porque além de não ser dito pela lei, também contraria essa regra, logo, a
doutrina diz que, numa declaração em que não há a possibilidade prática de atribuir um
sentido jurídico, porque em alguns dos critérios interpretativos não se poderia atribuir
nenhum sentido jurídico, e nessa medida, alguns autores dizem que a declaração é ineficaz e
outros dizem que é uma declaração verdadeiramente nula, sendo que, a parte final do artigo
236 nº 1, é uma forma de proteger o declarante para evitar que ele seja confrontado com uma
interpretação que ela não poderia ter previsto, só que a lei protege-o, mas não prevê um
mecanismo alternativo de interpretação da declaração negocial chegando-se a um impasse.

Imaginando que se aplicou o artigo 236 nº 1 e se o juiz não consegue encontrar o verdadeiro
sentido interpretativo e se subsistirem várias interpretações possíveis, então há que passar ao
critério interpretativo do artigo 237, (casos duvidosos), apenas se recorre este artigo, se
interpretando com base no artigo 236, e se não se descobrir qual é o sentido interpretativo, é
que se recorre ao artigo 237, sendo que na maioria dos casos com o artigo 236 se chega a um
resultado interpretativo unívoco, dispensando o mecanismo do artigo 237.

Mas se o artigo 236 não permite obter uma resposta, pois há dois sentidos perfeitamente
plausíveis, e se o juiz está na dúvida sobre qual dos sentidos deve aplicar, então recorrendo ao
artigo 237 que diz “em caso de dúvida sobre o sentido da declaração, prevalece, nos negócios
gratuitos, o menos gravoso para o disponente e, nos onerosos, o que conduzir ao maior
equilíbrio das prestações”.

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ARTIGO 237
No artigo 237, a primeira constatação, permite solucionar os casos duvidosos de interpretação,
quando se esteja perante negócios gratuitos ou negócios onerosos, mas esta distinção só faz
sentido nos negócios de natureza patrimonial, havendo negócios de natureza pessoal, (o acto
de perfilhação, casamento), mas estes actos de natureza pessoal não se classificam como actos
onerosos ou actos gratuitos, pois são actos familiares e pessoais, mas no artigo 237, não se
solucionam todos os problemas interpretativos possíveis, porque visa fixar um critério de
interpretação quando há duvidas, mas que será, quanto muito, válido apenas para casos em
que os negócios sejam gratuitos ou onerosos, sendo que, esta distinção serve a penas para os
negócios de natureza patrimonial, onde sobrariam os negócios de carácter meramente
pessoal, onde a distinção de gratuito ou oneroso, não faz qualquer sentido.

No artigo 237, que só se aplica se não se conseguir solucionar um caso a partir do artigo 236,
diz que no caso de dúvida sobre o sentido da declaração prevalece nos negócios gratuitos o
menos gravoso que se pode escolher, e nos negócios onerosos, no que conduzir ao maior
equilíbrio das prestações.

Começando pelo negócio gratuito.

Exemplo 1:

A doou uma casa a B, sendo uma doação válida e pela forma exigida, mas em que surge uma
duvida interpretativa, pois o contrato está redigido de tal maneira que surge uma duvida em
saber se foi só uma doação da casa, ou se foi uma doação da casa e do recheio, e aplicando a
artigo 236, o juiz fica na duvida sobre se a doação abrangia ou não o recheio da casa, sendo
que, o donatário afirma que lhe foi doada, não só a casa, mas também o recheio, e o doador,
apenas garante que doou a casa, e partindo do principio que mesmo aplicando o nº 1 do artigo
236, mesmo indo ver o que o normal declaratário perceberia, ainda assim o juiz fica na duvida,
sobre se o normal declaratário perceberia que o recheio estava abrangido, ou se perceberia
que o recheio não estava abrangido, e imaginemos que a duvida era essa.

Neste caso, como estamos perante um acto gratuito, o juiz deve fazer a interpretação menos
gravosa para o disponente, e aqui o disponente é aquele que está a dispor de algo, (o doador),
pois o donatário está a beneficiar do acto de disposição, sendo que a lei diz que, se ao
interpretarmos um acto gratuito e ao estarmos no artigo 237, em caso de duvida sobre o
âmbito do acto gratuito, entre várias interpretações possíveis, deve-se fazer aquela que seja
menos gravosa, ou mais favorável, á pessoa que está a doar, sendo que, neste caso a
interpretação mais favorável para o doador, é a que não abrange o recheio, pois a que abrange
o recheio empobrece-o mais do que aquela que não abrange o recheio, sendo que, é uma
opção lógica do legislador, porque ao fim, e ao cabo, em caso de duvida deve ser protegido
quem está a doar, sendo que, é razoável que se houver uma duvida, é lógico que se interprete
a favor do doador que tem muito mais a perder que o donatário.

Mas no caso de uma venda, e no mesmo exemplo, a duvida era sobre se a venda da casa
abrangia ou não abrangia o recheio, mas aqui não se pode dizer ou concluir, que se no caso da
doação é a favor do doador, então no caso da compra e venda, é a favor do comprador, a lei
não diz que é a solução oposta no caso de um negócio oneroso, pois no caso do negócio

Serafim Cortizo 20100059 Página 39

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oneroso a lei diz outra coisa, no caso de ser um negócio oneroso vai-se dar o sentido que
conduzir ao maior equilíbrio das prestações, ou seja, neste caso há uma duvida em saber se a
venda da casa, abrangia ou não, o recheio.

No artigo 236 há uma interpretação possível que diz que sim, mas também há outra
interpretação possível no nº 1 que diz que não, então se há duas interpretações igualmente
plausíveis em que numa, o recheio está abrangido e noutra não, então concluímos que no
artigo 236 não está resolvido o problema, e temos que ir para o artigo 237, e então o juiz vai
ter que ver, qual é, dessas duas interpretações, aquela que conduz ao maior equilíbrio das
prestações, sendo aquela que torna o negócio mais equilibrado e mais justo para ambas as
partes e para isso o juiz vai ter que ver qual é o preço.

Exemplo 2:

Imaginemos que a compra e venda, como um todo foi por 500 mil €, mas demonstrava-se que
a casa valia 400 mil € e que o recheio valia 100 mil €, sendo que a duvida neste caso é saber se
o recheio está abrangido, logo, o juiz vai ter que ver qual o valor da casa e o valor do recheio, e
imaginemos que o juiz concluía que a casa valia 400 mil € e que o recheio valia 100 mil €.

Nesse caso, a interpretação mais justa é aquela que considera o recheio abrangido, pois se o
comprador está a comprar por 500, se a casa vale 400 e o recheio vale 100, a decisão mais
justa é que ele receba a casa e o recheio, porque se ele só receber a casa, e se se interpretar
pela opção em que não tem direito ao recheio, pois então estaria a pagar 500 por um bem que
só valia 400.

E nestes casos onde persiste a dúvida, Mota Pinto diz que em caso de dúvida insanável se deve
considerar que a declaração negocial é ineficaz, porque também não se consegue retirar dela
qualquer sentido.

Num negócio gratuito interpreta-se da maneira que seja mais favorável ao doador, se for um
negócio oneroso, dá-se prioridade á interpretação que conduza a menos injustiça para o
comprador, não se procurando nestes casos a solução mais justa, mas sim, a menos injusta.

ARTIGO 238 (Negócios formais)


No artigo 238 que fala dos negócios formais, e temos aqui uma norma especial quando a
interpretação incide sobre uma declaração que faça parte daquilo a que chamamos um
negócio formal, sendo que, negócios formais, são aqueles para os quais a lei impõe uma
determinada forma e são aqueles aos quais não se aplica a regra geral da liberdade de forma.

O artigo 238 tem que ser levado em linha de conta, quando se interpreta um negócio formal,
podendo também aplicar-se os artigos 236 e 237, mas quando se interpreta um negócio, seja
formal ou não, tem que se ir primeiro a estes artigos, mas também será necessário depois
atender a certas especificidades que vêm no artigo 238, que à partida não está a afastar os
artigos 236 e 237.

Artigo 238 nº 1 “nos negócios formais não pode a declaração valer com um sentido que não
tenha um mínimo de correspondência no texto do respectivo documento, ainda que
imperfeitamente expresso”.

Serafim Cortizo 20100059 Página 40

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A primeira constatação que se pode fazer é que esta norma é muito parecida com o que é dito
no artigo 9º nº 2, onde também se diz que quando se interpreta uma norma legal, que não se
pode dar a essa norma legal o sentido que não tenha o mínimo de correspondência no texto
da lei, ainda que imperfeitamente expresso.

Resulta deste artigo, que se está em presença de um negócio formal, (compra e venda de uma
casa), mas nos negócios formais só se pode aplicar o artigo 236 nº 2, se o tal sentido a que se
chegar, tiver o mínimo de correspondência no texto, senão, poderia acontecer que um
individuo chamaria a sua casa de tenda, e na escritura publica dizia “vendo a minha tenda”,
mas a venda de tendas não tem que ser por escritura publica, e neste caso, certo individuo ao
dizer que está a vender uma casa, mas usa uma palavra em código (tenda) mas o declaratário
até percebe que tenda quer dizer a casa nº tal, da avenida tal.

Num caso destes, se não fosse um negócio formal, desde que se provasse que quando se diz
“tenda”, quer dizer “a casa”, se fosse um negócio para o qual houvesse liberdade de forma,
bastava provar que o declaratário, ao ler na escritura publica “tenda”, percebia que queria
dizer “a casa”, e seria esse o sentido que se daria á declaração, só que a compra e venda de
casas é um negócio formal, e se permitisse numa situação dessas, dizer que “vendo a tenda”,
quisesse dizer “vendo a casa”, isso subverteria completamente as exigências da forma, porque
quando a lei exige que certos negócios sejam por escritura publica, é para que a partir da
leitura da própria escritura publica, se perceba o que é que está a ser transaccionado, mas
agora aqui, só aquele declaratário por causa daquele código usado (tenda=casa), só ele é que
conhecia aquelas particularidades linguísticas do declarante e mais ninguém consegue ao ler
uma escritura publica ao ler “vendo a minha tenda”, que isso quer dizer “vendo a minha casa
nº tal, situada na avenida tal”, e portanto, neste caso, mesmo à luz do artigo 236 nº 2 se
concluísse que estava a querer dizer que era aquela casa em concreto, o juiz aplicando o 238
nº 1, diria que isto não teria o mínimo de correspondência com a letra do texto da escritura
publica, ou seja, no texto da escritura publica não há o mínimo de correspondência que
permita que a partir da palavra “tenda”, perceber que é a casa tal, nº tal, na avenida tal, e se
não houver o mínimo de correspondência no texto, então está a ser violado o artigo 238 nº 1,
e então dir-se-ia, “o verdadeiro sentido da declaração é que se está a transaccionar a casa tal,
mas não é isso que resulta da escritura publica, logo há um vício de forma pela violação do
artigo 238 nº 1” e esta violação deste artigo, é concluirmos que a interpretação não tem o
mínimo de apoio no texto do documento e então dir-se-á que apesar da vontade das partes
ter sido vender a casa, não se pode aceitar que esta escritura publica esteja pela forma
adequada para vender a casa, porque não é possível juridicamente retirar deste texto esse
sentido, era a partir do artigo 236 nº 2, mas neste caso, e á luz do artigo 238 nº 1 não pode,
porque diz que não se pode atender a um sentido que não tem o mínimo de correspondência.

E isto também valeria para uma interpretação que não fosse feita com base no artigo 236 nº 2,
mas fosse feita com base no artigo 236 nº 1, ou seja, podia-se dar o caso de num negócio
formal, concluir-se que um declaratário normal teria percebido algo que não tem a mínima
correspondência com o documento.

Serafim Cortizo 20100059 Página 41

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Mas aqui pode-se perguntar como é que isso é possível? E como é que o declaratário normal
poderia perceber algo que não tinha o mínimo de correspondência como sentido do
documento?

Mas neste caso poderia, e lei não diz que é o sentido que o declaratário normal poderia
compreender o disposto no documento, mas sim do declaratário normal na posição do real
declaratário que soubesse que fulano tal chamava “tenda” á casa, mas como a interpretação
do artigo 236 nº 1, não é o declaratário normal em estado puro, mas na posição de real
declaratário, não é de excluir que se provasse que o declaratário normal até tivesse percebido
perfeitamente o sentido daquela escritura publica, só que aquele sentido não se retira da
leitura de um documento mas só para quem tivesse certo tipo de informação é que conseguia
lá chegar, e como o artigo 238 nº 1 diz que é preciso, que para que um sentido seja admitido
num negócio formal, é de ver se aquele sentido com base na leitura dos artigos 236 e 237, tem
o mínimo de apoio no texto.

Se tiver o mínimo de apoio no texto, pode valer aquele sentido, se não tiver o mínimo de apoio
no texto, á luz do artigo 238 nº 1, esse sentido não pode ser levado em linha de conta, e então
a doutrina entende que haverá aí um vício de forma.

Aula nº 9

LACUNAS DO NEGÓCIO JURÍDICO – Artigo 239

Além de haver problemas no que respeita á interpretação do negócio jurídico, também se


podem suscitar problemas que têm a ver com as lacunas do negócio jurídico, pois pode haver
um negócio jurídico que seja considerado lacunar.

No fundo, temos aqui uma grande semelhança com o que foi estudado quanto às leis, pois as
normas legais precisam de ser interpretadas e as declarações negociais também precisam de
ser interpretadas, pois podem existir lacunas no ordenamento jurídico, e a lei prevê modos de
integração de lacunas, como sendo a analogia, e também no caso do negócio jurídico, há o
artigo 239 que nos vem falar das lacunas do negócio jurídico e o modo de as integrar, pois
mesmo havendo problemas parecidos com a lei, mas em que as soluções são distintas, porque
uma coisa é interpretar uma norma jurídica e outra coisa é interpretar um negócio, e uma
coisa é integrar lacunas nas fontes do direito e outra coisa é integrar lacunas no negócio
jurídico.

Artigo 239 “na falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser integrada de
harmonia com a vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou
de acordo com os ditames da boa-fé, quando outra seja a solução por eles imposta”.

Temos aqui uma norma um pouco arrevesada, mas na realidade aquilo que se quer dizer é
quando estamos a interpretar as declarações negociais que compõem o negócio jurídico, e
digo declarações se estivermos perante um contrato, mas quando se está a interpretar a
declaração ou declarações que compõem o negócio jurídico, até se pode chegar á conclusão
que há aspectos de regulamentação do negócio que são lacunares, há pontos que deveriam

Serafim Cortizo 20100059 Página 42

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que ter sido previstos e tratados pelas partes e que na realidade não vêm regulados nessas
declarações negociais, e então suscita-se um problema que é o da lacuna do negócio jurídico.

A lei diz que quando um negócio jurídico não regula um certo ponto temos que ir ver se existe
uma norma jurídica (imperativa ou supletiva) que regula precisamente esse ponto, porque há
casos em que as partes ao celebrarem um negócio jurídico, não regulam determinado ponto
mas aí não se levantam problemas porque existem normas jurídicas de carácter supletivo que
se aplicam precisamente porque as partes nada previram acerca daquela situação, e as normas
supletivas existem precisamente para se aplicarem se não tiverem sido afastadas pelas partes,
pois há normas que são imperativas que se aplicam sempre, quer os destinatários queiram,
quer não, pois quando há uma norma imperativa que regula um negócio (unilateral ou
contrato) as partes não podem estipular algo diferente do que aquilo que está previsto na
norma imperativa, mas há casos em que um determinado ponto, que é regulado, não por uma
norma imperativa, mas por uma norma de carácter dispositivo, uma norma supletiva, e como a
própria expressão indica, é supletiva e só se aplica se quem celebrou o negócio não tiver
previsto qualquer regulamentação para aquele ponto, pois no fundo, é uma norma que se
aplica subsidiariamente, como solução para um caso que está omisso, e de facto nos negócios
jurídicos existem muitas regras supletivas que são regras que estão previstas pelo legislador
para só se aplicarem se ninguém disser nada em contrário, caso tal não se verifique, essas
normas serão afastadas.

Exemplo:

Numa compra e venda, as partes limitaram-se a estipular qual era a coisa que era vendida e
qual era o preço que era pago, mas podem não ter combinado nem oralmente nem por
escrito, (depende da forma do negócio), qual seria exactamente o momento em que o preço
deveria ser pago, o lugar onde o preço deveria ser pago, onde é que a coisa vendida deveria
ser entregue, sendo que, a questão que se coloca é, se pode o comprador decidir onde é que
vai entregar o preço.

Portanto, pode haver um contrato de compra e venda, em que aspectos relevantes como, o
local e o momento da entrega da coisa, o local e o momento do pagamento do preço não
foram especificados pelas partes, e na maior parte dos contratos as pessoas não falam nisso,
pois está mais ou menos implícito tacitamente que tudo vai ser feito logo a seguir à celebração
do acordo, mas o problema é que isso não foi estipulado, e nesses casos, quando se estipula
qual é o tempo e o lugar do pagamento do preço, há uma norma jurídica supletiva que se
aplica, e portanto, na prática não vai ser necessário recorrer ao artigo 239 porque temos uma
norma, que é a tal norma prevista na parte inicial do artigo 239 e a norma que eu estou a falar,
vem no artigo 885 nº 1 “o preço deve ser pago no momento e no lugar da entrega da coisa
vendida”, portanto, há aqui um critério para saber quando é que o preço dever ser pago e o
local onde deve ser pago.

Mas como é que se sabe que esta norma é supletiva?

Neste caso basta ler o artigo 885 nº 2 “mas, se por estipulação das partes ou por força dos usos
o preço não tiver de ser pago no momento da entrega, o pagamento será efectuado no lugar
do domicilio que o credor tiver ao tempo de cumprimento”, pois basta ler este artigo para se

Serafim Cortizo 20100059 Página 43

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perceber que a norma do nº 1 do artigo 885 é uma norma supletiva, porque ao ler o nº 2 este
está a admitir que possa haver uma estipulação das partes noutro sentido.

Portanto, se o nº 2 do artigo 885 admite que o regime do nº 1 possa ser afastado, é porque
obviamente, que o regime do artigo nº 1 não é um regime imperativo, porque se fosse
imperativo não poderia ser afastado, nem a lei poderia dizer, ou a admitir, que se houvesse
uma estipulação das partes, se poderia afastar o regime do artigo nº 1, portanto, isto é um
daqueles casos em que o elemento sistemático da interpretação é importante, pois quem
interpretar apenas o nº 1 do artigo 885, lendo apenas o nº 1, pois não se tem pista nenhuma
para concluir se a norma é imperativa ou supletiva, mas conjugando com o nº 2, percebe-se
que a norma do artigo nº 1 é supletiva, porque o nº 2 admite que possa ser afastada.

Portanto, neste caso, se houver uma compra e venda onde não se estipulou qual era o local,
ou o momento do pagamento do preço, não se pode propriamente dizer que existe uma
lacuna, porque haverá que aplicar o regime do artigo 885.

Neste caso, a ideia é ver se há uma disposição especial, a tal norma supletiva, se houver, o
problema está resolvido, se não houver uma disposição especial que regule o caso omisso,
então teremos que passar aos critérios da integração de lacunas que vem no artigo 239, sendo
que, o primeiro critério é se a declaração negocial deve ser integrada “de harmonia com a
vontade que as partes teriam tido se houvessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os
ditames da boa-fé quando outra não seja a solução por eles imposta”, ou seja, se há uma
lacuna no negócio jurídico, e se não há uma norma jurídica supletiva aplicável, o juiz vai tentar
ver e tentar perceber o que é que as partes queriam, ou teriam querido, se na altura em que
celebraram o negócio, tivessem previsto que havia aquela lacuna, ou seja, vai-se atender aqui
à vontade hipotética ou conjectural das partes, pois o juiz quando está a integrar a lacuna, se
não houver uma norma supletiva, vai ter que especular e tentar colocar-se no lugar dos
intervenientes, e tentar imaginar o que é que as partes teriam querido na altura de celebrar o
negócio.

Mas nem sempre prevalece essa vontade hipotética ou conjectural porque a norma diz (artigo
239) “ou de acordo com os ditames da boa-fé quando outra seja a solução por eles imposta”,
portanto, a lei aqui está a imaginar um cenário um pouco estranho, pois o juiz descobre qual é
a vontade hipotética das partes, e o que as partes teriam querido, mas conclui que aquilo que
elas teriam querido que é contrario à boa-fé, então o juiz não vai integrar a lacuna de acordo
com o que as partes teriam querido, mas sim, integrar a lacuna de acordo com aquilo que o
juiz considera a decisão mais justa e conforme à boa-fé.

RESUMINDO:

Ao interpretarmos certo negócio jurídico, conclui-se que a declaração ou as declarações


negociais não regulam todos os aspectos relevantes para aquele negócio, e então vai-se
procurar no ordenamento jurídico uma, ou várias regras jurídicas que se apliquem no caso de
as partes nada terem previsto, e essas regras jurídicas chamam-se regras supletivas, mas se
não se encontrarem regras supletivas, o juiz irá atender á vontade hipotética ou conjectural
das partes, ou seja, irá tentar descobrir, pensando quais são as finalidades do negócio, o que é
que provavelmente as partes teriam querido se alguém as tivesse alertado para o facto de

Serafim Cortizo 20100059 Página 44

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haver ali um ponto que precisava de ter sido previsto, e se o juiz concluir qual é efectivamente,
a vontade hipotética e conjectural das partes, é essa a solução que ele aplica, a não ser que a
solução a que ele chegou, lhe pareça ser contrária á boa-fé, e nesse caso, é de acordo com os
ditames da boa-fé.

Há vários autores na doutrina, que partindo do primeiro critério de integração de lacunas, (a


aplicação da norma supletiva), e segundo Meneses Cordeiro e Mota Pinto, quando explicam o
artigo 239 dizem que, quando se está perante o primeiro critério de integração de lacunas, que
é ir á procura de uma disposição especial, (norma jurídica supletiva), vamos imaginar que não
se encontra a norma supletiva, nem sempre se recorre ao segundo critério da vontade
hipotética ou conjectural, porque na opinião deles, se não for encontrada uma norma
supletiva, terá que se pensar se deveria existir essa norma supletiva, porque se se concluir que
a norma supletiva não existe, mas que deveria existir, então conclui-se que há uma lacuna na
lei.

O primeiro critério é o seguinte, primeiro há que ir á procura de uma norma supletiva, e só se


passa ao segundo critério se a norma supletiva não existir, mas Meneses Cordeiro diz que se
essa norma supletiva não existir, se calhar o que há aqui não é um problema de lacuna do
negócio, mas sim, um problema de lacuna na lei, porque é uma norma que falta.

Então Meneses Cordeiro diz que, se o primeiro critério de integração da lacuna no negócio é
ver se há uma norma supletiva, e se ela não existir, antes de se ir integrar a lacuna através da
vontade hipotética, terá que se ver, se devemos ou não entender se há uma lacuna na lei
porque há uma norma jurídica que falta, porque se se entender que há uma lacuna nas fontes
do direito, então o critério para integrar essa lacuna, não seria com base no artigo 239, mas
com base no artigo 10º.

Portanto, o raciocínio de Meneses Cordeiro e de Mota Pinto, é que não se pode passar
imediatamente á vontade hipotética e conjectural, só se deverá fazer isso depois de se ter
concluído que apesar de não haver norma supletiva, que isso não deve ser interpretado como
sendo uma lacuna no ordenamento jurídico, porque se se entender que é uma lacuna nas
fontes do direito, então uma maneira de resolver a integração de uma lacuna nas fontes do
direito, é através do artigo 10º e não através do artigo 239.

Nestes casos, só faz sentido falar em lacuna quando falta uma norma imperativa, que do ponto
de vista do legislador seria essencial existir, pois nas normas supletivas, o facto de o legislador
não as ver como determinantes, é que podem ser afastadas pela partes, pois parece discutível
falar em lacunas quando faltam normas supletivas, mas só se deve falar em lacunas quando as
matérias mereciam um tratamento imperativo, mas é muito discutível dizer que há uma
lacuna só porque não existe uma norma supletiva, porque o legislador não encara as normas
supletivas como algo de absolutamente imprescindível, a prova é que podem ser afastadas
pelas partes.

Serafim Cortizo 20100059 Página 45

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RESUMINDO:

Uma maneira de encarar o artigo 239 é dizer que, procura-se a norma supletiva, se não se
encontrar vai-se á vontade hipotética ou conjectural, e se a vontade hipotética ou conjectural
for contrária á boa-fé, vai-se aos ditames da boa-fé.

Outra maneira mais complexa de ver a questão, é ir à procura da norma supletiva, se não se
encontrar, primeiro tem que se reflectir e tentar perceber, se o que está em causa é uma
lacuna na lei ou se é uma lacuna no negócio, e se se concluir que há uma lacuna na lei, resolve-
se a questão através da integração de lacunas prevista no artigo 10º e a norma que se vai
descobrir no artigo 10º, seja por analogia ou através da norma que o interprete lhe daria, será
essa norma que depois será aplicada ao caso omisso no negócio.

Os problemas de lacunas levantam-se nos negócios atípicos, pois são aqueles que não vêm
regulados na lei, e quando um negócio é atípico, toda e qualquer regulamentação foi aquela
que foi estipulada pelas partes, e tudo o que as partes não estipularam pressupõe a existência
de lacunas, sendo que a lei admite contratos atípicos através do artigo 405 onde é dito que se
podem celebrar contratos diferentes daqueles que são previstos na lei.

VÍCIOS DO NEGÓCIO JURÍDICO (Artigos 240 e seguintes)


Pode acontecer num negócio jurídico tenha um vício que afecte a vontade, porque a vontade
se formou mal, devido a determinado facto, e depois terá que se ver qual é a consequência, se
é nulidade ou se é anulabilidade.

Mas também pode haver um vício num negócio jurídico que não afecte propriamente a
vontade, mas sim a declaração negocial, pois por vezes a vontade forma-se bem, mas no
momento de ser exteriorizada, por alguma razão aquilo que é declarado não corresponde à
vontade real, porque por vezes o problema não está da vontade que a pessoa teve, mas na
declaração que emitiu, pois pode haver uma discrepância, entre o que a pessoa quis e o que
declarou, portanto, o vício pode ser na declaração, mas também pode ser um vício que afecta
a vontade, ou seja, logo á partida, em certos casos a vontade forma-se mal, ou seja, a pessoa
quer algo que em condições normais não quereria, estando o problema na declaração
negocial.

A VONTADE NO NEGÓCIO JURÍDICO


Acerca do elemento vontade, ainda há que acrescentar algo, pois quando se fala na vontade,
pois a vontade é a intenção de produzir efeitos jurídicos, e a doutrina distingue três
subelementos dentro da vontade;

1) Vontade de acção.
2) Vontade de declaração.
3) Vontade negocial (ou funcional).
Isto é importante, porque pode haver situações em que o vício resulta de não ter havido
vontade de acção, outras vezes o vício resulta de não ter havido vontade de declaração, e
outras vezes o vício resulta de não ter havido vontade negocial ou funcional.

Serafim Cortizo 20100059 Página 46

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VONTADE DE ACÇÃO
Imaginemos que houve uma conduta que aparentemente foi interpretada como sendo uma
declaração negocial, mas se se provar que a pessoa não teve qualquer vontade de fazer
aqueles gestos, ou não teve qualquer vontade de emitir aquelas palavras, aqui faltou a
vontade de acção, pois a pessoa nem sequer quis fazer aqueles gestos ou dizer aquelas
palavras que foram interpretados como declaração negocial, logo, aqui a pessoa não teve
vontade de acção, e muito menos terá tido vontade de declaração nem vontade negocial,
sendo que, o mais grave num negócio jurídico é faltar a vontade de acção.

VONTADE DE DECLARAÇÃO
Mas pode acontecer que tenha havido vontade de acção, mas que não tenha havido vontade
de declaração, pois a pessoa teve uma acção que não teria o intuito de ser interpretado como
uma declaração negocial, num caso destes, pode ter havido uma conduta voluntária, a pessoa
quis aquela conduta, mas não lhe queria associar qualquer significado negocial, então diremos
que houve vontade de acção mas não houve vontade de declaração, e se não houve vontade
de declaração, também não houve vontade de produzir efeitos jurídicos.

VONTADE NEGOCIAL (FUNCIONAL)


Mas pode acontecer uma terceira hipótese, pois pode haver um caso de uma pessoa, em que
com aquelas palavras ou gestos quis mesmo fazê-los, teve vontade de acção, e queria com isso
celebrar um negócio jurídico, portanto, teve vontade de declaração, só que o negócio e os
efeitos jurídicos que queria, não eram aqueles que depois na prática se foram produzir.

Portanto, se há uma situação em que uma pessoa teve a vontade de acção e teve a vontade de
declaração para celebrar um negócio, mas não teve a vontade de que se produzissem aqueles
efeitos exactos que se produziram, então, foi um problema de falta de vontade negocial ou
funcional.

RESUMINDO:

Quando se fala em falta de vontade, temos saber em que é que estamos a falar, será um caso
extremo em que não houve vontade de acção, e consequentemente, não houve nenhuma
outra vontade, porque se não se tem vontade de acção e se nem sequer se quis fazer aquilo,
muito menos se quis celebrar um negócio e muito menos se quis produzir certos efeitos.

Portanto, quando não há vontade de acção, por arrastamento, falta a vontade de declaração e
a vontade funcional ou negocial, mas pode ter havido vontade de acção e a pessoa não ter
querido com isso fazer um negócio jurídico, porque a pessoa não associou gestos e palavras á
celebração de um negócio jurídico, aí a pessoa teve vontade de acção, mas não tinha qualquer
consciência ou vontade de celebrar um negócio jurídico e não tinha qualquer vontade de fazer
uma declaração negocial, e muito menos queria certos efeitos.

Portanto, se falta a vontade de acção, não haverá vontade de declaração nem vontade
funcional, pode haver vontade de acção e vontade de declaração, mas a pessoa não ter
querido aqueles efeitos jurídicos em concreto, podendo estar em erro sobre os efeitos que o
negócio produz, e num caso desses terá havido vontade de acção, mas terá faltado vontade
funcional ou negocial.

Serafim Cortizo 20100059 Página 47

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VÍCIO DA SIMULAÇÃO (Artigos 240 a 243)


Artigo 240 nº 1 “se, por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar
terceiros, houver divergência entra a declaração negocial e a vontade do real declarante, o
negócio diz-se simulado”.

Artigo 240 nº 2 “o negócio simulado é nulo”.

Daqui retiram-se duas informações, em primeiro lugar quando há um negócio simulado, é


nulo, a invalidade não é uma anulabilidade, mas uma nulidade, mas, de qualquer modo há dois
casos na lei, em que o negócio não é nulo, mas sim anulável.

Um dos casos é no casamento, pois pode haver casamentos simulados, e se o casamento for
simulado (artigo 1635 alínea d)) onde diz que o casamento é anulável por falta de vontade
quando tenha sido simulado.

Outro exemplo onde um negócio jurídico simulado, não é nulo, mas sim anulável, é no caso do
testamento simulado, e se o testamento for simulado, (artigo 2200), é anulável.

Portanto, são duas excepções ao nº 2 do artigo 240, mas são excepções que se limitam a
confirmar a regra, mas o que importa reter, é que os negócios simulados são nulos, excepto o
casamento e o testamento simulado, que são anuláveis.

ARTIGO 240 Nº 1 – NEGÓCIO SIMULADO


Para um negócio ser considerado simulado, o primeiro requisito para ser simulado é
demonstrar os requisito de que:

a) Existe uma divergência intencional entre a vontade e a declaração.


Quer-se dizer com isso, que quando é celebrado um negócio simulado, o declarante ao
fazer a sua declaração, propositada e conscientemente emite uma declaração que ele
sabe que não corresponde á sua vontade real, pois ele declara algo que não é aquilo
que ele quer, tendo a perfeita consciência que está a dizer algo que não corresponde á
sua vontade real, podendo dizer-se que há uma divergência entre a vontade real e a
vontade declarada.
b) Na simulação, há sempre um conluio entre o declarante e o declaratário.
c) O objectivo da simulação tem que ser o de enganar terceiros.

Para haver simulação tem que se provar que aquilo que foi declarado não corresponde á
vontade real do declarante, pois tem que haver uma divergência intencional, mas por outro
lado, o objectivo da simulação é enganar terceiros em conluio (acordo simulatório) com o
declaratário, e só quando de verificam estes três requisitos cumulativamente, é que se pode
dizer que certo negócio é simulado.

TIPOS DE NEGÓCIO SIMULADO


Há duas modalidades de negócio simulado:

a) Simulação absoluta – fala-se em simulação absoluta quando por detrás do negócio


simulado não se esconde qualquer outro negócio que as partes tenham querido
celebrar, neste caso não se trata de encapotar um negócio por detrás de outro, finge-se

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que se quer um negócio, mas não se quer nenhum, ou seja, o único negócio que as
partes quiseram celebrar, foi um negócio simulado.
b) Simulação relativa – na simulação relativa, por detrás do negócio simulado, esconde-se
um outro negócio de tipo ou de conteúdo diferente, que é um negócio que as partes na
realidade queriam celebrar, e a esse negócio que está escondido, mas que corresponde
á vontade real das partes, esse negócio oculto chama-se negócio dissimulado.

Para além da distinção entre simulação absoluta e simulação relativa, há outra classificação
autónoma, que distingue simulação inocente e simulação fraudulenta (artigo 242 nº 1), aqui há
um ponto em comum, seja simulação inocente ou simulação fraudulenta, é sempre simulação
com o intuito de enganar terceiros.

a) Simulação fraudulenta - são casos em que os simuladores não querem apenas enganar
terceiros, mas querem também enganar e prejudicar terceiros, e se querem
simultaneamente enganar e prejudicar, chama-se simulação fraudulenta.
b) Simulação inocente - se apenas querem enganar sem quererem prejudicar, chamar-se-
á simulação inocente.

Exemplos:

Enganar os credores para evitar penhoras de bens e simular um negócio de compra e venda de
bens penhoráveis (quadro) com um amigo para criar a aparência de um negócio de compra e
venda.

Aula 10

RECAPITULAÇÃO DA AULA ANTERIOR


O vício da simulação vem tratado nos artigos 240 e seguintes do Código Civil, e em princípio o
negócio simulado será nulo, (artigo 240 nº 2), terá como invalidade a nulidade, no entanto
também já foi visto que há dois negócios jurídicos que quando são simulados são apenas
anuláveis, que é o casamento civil simulado que é anulável (artigo 1635 alínea d)) e é o
testamento simulado que também é anulável (artigo 2200).

Em princípio quando há uma simulação haverá uma nulidade nos termos do artigo 240 nº 2,
mas para que o negócio seja simulado, já foi visto que é preciso demonstrar que se verificam
os requisitos da simulação que são três:

a) Divergência intencional entre a vontade e a declaração, (o que significa que para haver
simulação é preciso que o declarante ao emitir a sua declaração tivesse a consciência e
tivesse a vontade de emitir uma declaração que ele sabia não corresponder á sua
vontade real)
b) Para haver simulação é preciso que haja um a cordo simulatório entre o declarante e o
declaratário, ou seja, tem que haver um conluio entre o declarante e o declaratário

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c) Quando na simulação existe o intuito de enganar terceiros.

Também foi visto que quando na simulação existe o intuito de enganar terceiros mas não
existe o intuito de prejudicar, chama-se simulação inocente a esse tipo de simulação.

Mas se se quiser enganar e prejudicar terceiros, que é o mais frequente, chama-se simulação
fraudulenta.

Mas há outra distinção entre simulação absoluta e simulação relativa.

Na simulação absoluta há apenas um negócio que é o negócio simulado, enquanto que, na


simulação relativa, há dois negócios, que são o negócio simulado e o negócio dissimulado.

Na simulação absoluta, por detrás do negócio simulado, não se esconde qualquer outro
negócio que as partes tenham querido celebrar, pois o único negócio que se quis celebrar foi o
negócio simulado, pois não se queria esconder nenhum outro.

Na simulação relativa há dois negócios, que são o negócio simulado e o negócio dissimulado,
pois na simulação relativa, o negócio simulado esconde um negócio dissimulado, ou seja, na
simulação relativa por detrás do negócio simulado esconde-se um outro negócio de tipo ou
de conteúdo diferente que as partes quiseram efectivamente celebrar que é o negócio
dissimulado, o negócio simulado é sempre nulo, mas o negócio dissimulado só é inválido se
tiver um vício intrínseco, mas se não tiver nenhum vício e se a única particularidade era estar
escondido, não o torna inválido (artigo 241 nº 1).

Exemplos de simulação relativa:

Uma venda que escondia uma doação, eu para enganar os meus herdeiros legitimários fingi
que vendi, mas na realidade queria doar.

Uma doação que esconde uma venda, o meu senhorio para eu não exercer o meu direito de
preferência fingiu doar um bem a terceiro quando estava a vender, só para que eu não
pudesse exercer o direito de preferência.

Uma simulação quanto ao preço, compro uma casa por 500 mil, mas na escritura pública
declaro apenas 300 mil para enganar o fisco.

ARTIGO 241
Nº 1 “quando sob o negócio simulado exista um outro que as partes quiseram realizar, é
aplicável a este o regime que lhe corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, não
sendo a sua validade prejudicada pela nulidade do negócio simulado”.

Nº 2 “se, porém, o negócio dissimulado for de natureza formal, só é válido se tiver sido
observada a forma exigida por lei”.

Resumidamente, o nº 1 do artigo 241 diz que, se o negócio simulado esconder outro que é o
dissimulado, a validade do negócio dissimulado não é prejudicada pela nulidade do negócio
simulado, neste caso, o que a lei diz, é que se aplica ao negócio dissimulado o regime que lhe
corresponderia se fosse concluído sem dissimulação.

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Isto quer dizer que quando se está a resolver um caso prático de simulação relativa, a primeira
coisa a fazer é perceber qual é o negócio simulado e o negócio dissimulado, primeiro detecta-
se qual é o negócio simulado e qual é o negócio dissimulado, e ao detectar-se o negócio
simulado, conclui-se desde logo que é nulo (artigo 240 nº 2) e quanto ao negócio dissimulado,
como diz a lei, vamos imaginar que o negócio tinha sido feito às claras e o que aconteceria se
tivesse sido feito às claras.

Se se concluísse que ele teria um vício, então seria inválido, mas se se concluísse que caso ele
tivesse sido feito às claras, que seria perfeitamente válido, então não deixa de ser válido só
porque estava oculto, e neste caso a ideia é, ver o negócio dissimulado por aquilo que ele é e
não pelos seus antecedentes, mas sim, ver se existe ou não algum vício.

Exemplos:

Exemplo 1

Eu quero fazer uma doação a este senhor, mas porque receio que os meu herdeiros
legitimários, mais tarde quando eu morrer venham atacar esta doação, porque podem fazê-lo
em certos casos, eu combino com o donatário da doação, que ao invés de lhe doar às claras,
fingimos que é uma venda, porque as vendas não podem ser atacadas por que teoricamente a
venda não prejudica os herdeiros, por sai um bem e entra dinheiro, e neste caso temos que
criar a aparência que isto foi um negócio em qua saiu uma coisa e entrou dinheiro, mas eu
combino com ele que não tem que pagar nada.

No fundo, temos aqui uma venda que esconde uma doação e se os herdeiros, que eu neste
caso quis enganar provarem que tinham ocorrido esses factos, eles provam que houve uma
simulação relativa, pois havia uma venda simulada que escondia uma doação e então se há
uma venda simulada esconde uma doação, a venda é nula (artigo 240 nº 2) mas isto não quer
dizer que a doação seja nula, porque teríamos que ter este raciocínio de saber o que é que
teria acontecido se eu ao invés de ter recorrido a este expediente, se eu tivesse doado
directamente um bem a este senhor.

Os meus herdeiros não podem fazer nada enquanto eu for vivo, pois posso doar bens a quem
eu quiser, pois à partida, uma pessoa pode em vida doar bens a quem quiser desde que esteja
no seu prefeito juízo, portanto, se eu fizesse uma doação às claras, os meus herdeiros se
soubessem, tomavam boa nota, e mais tarde quando eu morresse, se se concluísse que aquela
doação punha em causa o quinhão hereditário deles, se eu tivesse feito uma doação às claras,
seria perfeitamente válida, mas os herdeiros mais tarde poderiam reagir contra ela se
ofendesse o seu quinhão legitimário, não por uma questão de invalidade, mas por causa das
regras do direito sucessório que existem para proteger os herdeiros.

Portanto, esta doação não foi feita às claras, foi às escondidas, e se fui desmascarado, a venda
é nula mas a doação é válida.

Exemplo 2

Uma pessoa que mora há três anos numa casa tem direito de preferência se o senhorio vender
a casa, e eu moro como arrendatário num andar há mais de três anos, e imaginemos que se o

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meu senhorio quiser vender a casa a um terceiro, depois de chegar a acordo quanto ao preço
com o terceiro, tem que se dirigir a mim e tem que me perguntar se eu quero exercer o direito
de preferência e se eu quiser exercer o direito de preferência, tenho que dar ao senhorio a
mesma quantia que o terceiro lhe oferece e se eu igualar a oferta do terceiro a casa ser-me-á
vendida a mim.

Mas imaginemos que o meu senhorio para me impedir de exercer o meu direito de preferência
fingiu que vendeu a casa a um amigo, mas declarou que fez uma doação, mas por detrás
combinaram um preço que foi pago.

No fundo, o negócio simulado é a doação que esconde o verdadeiro negócio que é a venda
para enganar o arrendatário, e então se eu demonstrar que houve uma simulação relativa e se
eu demonstrar que a doação é simulada, direi que a doação simulada é nula, mas essa doação
escondeu um negócio que foi uma venda, e esta venda foi o negócio que as partes quiseram
celebrar.

Então o que se dirá é que a doação é nula, agora a venda será aquilo que seria se tivesse sido
feita às claras, pois se o meu senhorio tivesse vendido a casa às claras a um terceiro, a venda
seria válida, só que ele teria violado o meu direito de preferência e eu depois poderia intentar
uma acção de preferência, mas a venda é válida.

Então diremos, a doação é nula por ser simulada, em relação à venda teríamos que ver o que
teria acontecido se não tivesse havido dissimulação, pois se ele tivesse feito a venda sem
dissimulação, o que haveria não era uma invalidade do negócio, mas sim uma violação do
direito de preferência que me permitiria a mim intentar uma acção de preferência e
depositava uma quantia igual à que foi paga, e a casa reverteria para mim.

Exemplo 3

Pode acontecer que o próprio negócio dissimulado tenha um vício intrínseco, porque
imaginem que eu celebrei um negócio simulado com uma criança de 10 anos e fiz-lhe uma
venda mas escondi uma doação, ou fiz-lhe uma doação mas escondi uma venda, ambos
fizemos um negócio simulado que escondia outro.

Então diríamos que, o simulado é nulo, quanto ao dissimulado, fingimos que era uma doação
mas era uma venda de um bem a uma criança de 10 anos, a doação é nula por ser simulada,
quanto á venda vamos ver o que é que aconteceria se eu tivesse às claras vendido um quadro
por 10.000 € a uma criança de 10 anos, então diríamos que é anulável por incapacidade de
exercício, e se seria anulável se tivesse sido feita sem dissimulação, também é anulável tendo
sido feita às escondidas.

Então neste caso diríamos que a doação é nula por ser simulada e a venda é anulável por
incapacidade de exercício, aqui temos os dois negócios com vício, mas o dissimulado tem vício
porque imaginando que tinha sido feito às claras (sem dissimulação) concluímos que ele de
facto tinha um vício intrínseco.

Tudo isto para perceberem que se estiverem a resolver um caso prático em que pareça que há
uma simulação, em primeiro lugar tem que se perceber se é uma simulação absoluta ou

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relativa e se há apenas um negócio, ou se há um negócio que esconde outro e depois, o


negócio simulado é nulo (artigo 240 nº 2) e depois pensa-se no negócio dissimulado, se tivesse
algum problema se tivesse sido feito às claras, se não houvesse problema às claras estaria tudo
bem, mas se se concluir que tinha um vício se tivesse sido feito às claras, não é por ter sido
feito às escondidas que o vício desapareceu ou se sanou.

A simulação relativa pode ser objectiva ou subjectiva.

Simulação objectiva: fala-se em simulação objectiva quando o elemento do negócio sobre o


qual incide a simulação não tem a ver com a pessoa ou pessoas que celebram o negócio.

Simulação subjectiva: fala-se em simulação subjectiva quendo o elemento do negócio sobre o


qual incide a simulação é a pessoa ou as pessoas que celebram o negócio.

Na simulação subjectiva podemos distinguir duas modalidades:

1) Simulação subjectiva por interposição fictícia de pessoas.


2) Simulação subjectiva por supressão do sujeito real.

Em ambos os casos é uma simulação subjectiva e em ambos os casos há uma aparência que o
negócio é celebrado entre certas pessoas, e na realidade não é exactamente entre essas
pessoas, mas sim com outras pessoas, e por isso é que é uma simulação subjectiva, pois é o
próprio sujeito de negócio que é o elemento sobre o qual incide a simulação.

Exemplo de interposição fictícia de pessoa – Caso prático

Artigo 2196 nº 1 “é nula a disposição a favor da pessoa com quem o testador casado cometeu
adultério”.

Isto significa que uma pessoa estando casada, se cometeu adultério com outra, se depois
deixar bens em testamento á pessoa com a qual cometeu adultério, essa deixa testamentária é
nula e depois há o risco de um qualquer herdeiro do falecido vir dizer que esta deixa é nula.

Esta norma também se aplica às doações, onde a lei também prevê que é nula a doação feita a
favor de pessoa com quem o doador cometeu adultério.

Imaginemos que uma pessoa, estando casada cometeu adultério, mas que quer deixar um
bem á pessoa com quem cometeu adultério, mas sabe que o adultério é do conhecimento
geral, e depois há o risco de os outros herdeiros invocarem o artigo 2196 e invocarem que
aquela deixa testamentária é nula.

O testador quer mesmo que o bem vá para a pessoa com quem cometeu adultério, então o
testador pode arranjar uma terceira pessoa como cúmplice e podem combinar o seguinte:

Imaginemos que o A é casado com B, e cometeu adultério com C, e o A quer deixar bens a C,
mas não pode fazer porque seria nulo, o que é que o A e o C fazem? Imaginemos que têm D
como uma pessoa amiga, então combinam o seguinte:

O A fará o testamento deixando o bem a D, mas esse testamento é fictício só para enganar os
herdeiros, ou seja, no testamento ele indicará D, mas ficará combinado com C e D que no

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testamento aparecerá designado D, mas a ideia é deixar que o bem discretamente reverta
para C.

Portanto, A, C e D, combinam que se fará um testamento a favor de D, e D concorda e combina


com A e C que depois de receber os bens, discretamente, passará os bens que herdou para C
que é o real destinatário deste testamento.

Aqui neste caso, temos uma simulação subjectiva por interposição fictícia de pessoa, porque o
A faz um testamento a favor de D, mas o A não quer deixar bens a D, mas deixar bens a C, e faz
a favor de D porque há um conluio entre A e D em que combinam sob a capa do testamento a
D, na realidade o que há é um testamento a favor de A para C.

Este é um exemplo de simulação relativa porque temos um testamento que não corresponde á
vontade real que é o testamento de A para D, que esconde a verdadeira deixa testamentária
que é o testamento de A para C.

Aqui qual é o elemento sobre o qual cai a simulação?

A simulação incide sobre o próprio destinatário do testamento, é uma simulação fictícia sobre
uma pessoa, porque diz que é para D, quando é para C, sendo uma simulação subjectiva e é de
interposição fictícia de pessoa, porque há aqui uma pessoa que está aqui só para fazer
número, que é D, querendo dar-se a ideia de que o bem vai para D, quando na realidade o
bem vai para C, portanto, cria-se a aparência que o bem é para D, sendo a pessoa fictícia,
porque não é ele o verdadeiro destinatário dessa deixa testamentária, portanto, aqui há um
testamento com uma simulação subjectiva através da modalidade de interposição fictícia de
pessoa.

Neste caso prático teria que se ver qual era o testamento simulado e qual era o testamento
dissimulado, neste caso, o testamento simulado é o aparente, e o aparente é o testamento de
A para D, sendo que o verdadeiro testamento seria de A para C, mas neste caso, o testamento
simulado é o de A para D que esconde o verdadeiro testamento que é o de A para C.

Vamos analisar este caso, começando sempre pelo negócio simulado.

O testamento de A para D é simulado é nulo, neste caso, excepcionalmente, é anulável (artigo


2200), mas esconde um outro testamento de A para C, aqui neste caso, se é uma simulação
relativa temos que analisar o dissimulado imaginando que tinha sido feito às claras, sendo que
o dissimulado é o testamento de A para C, então temos que ver o que é que aconteceria se o A
tivesse recorrido ao D, se o A tivesse feito o testamento directamente a favor de C, neste caso
seria nulo nos termos do artigo 2196 nº 1, que diz que é nula a deixa testamentária á pessoa
com quem foi cometido adultério.

Neste caso teríamos que dizer que, o testamento de A para D é um testamento simulado
porque não corresponde á vontade real dos intervenientes, sendo anulável (artigo 2200) mas
esconde um testamento que na realidade o testador quis fazer a favor de C, quanto a esse, por
força do artigo 241 nº 1, aplica-se ao regime do dissimulado como se fosse feito sem
dissimulação, aplicando o mesmo regime que se aplicaria se o testamento tivesse sido feito

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directamente a favor de C, e neste caso seria nulo por violação do artigo 2196 nº 1, alínea a) e
aqui diríamos que o negócio simulado é anulável e o dissimulado é nulo.

Isto é uma simulação subjectiva, porque claramente o elemento que é o objecto da simulação
é a pessoa beneficiária do testamento e é por interposição fictícia de pessoa por uma pessoa
que estava só a fazer numero, que era D, que estava ali só para encobrir a primeira
transmissão que se pretendia fazer de A para C.

Exemplo de supressão do sujeito real – Caso prático.

Imaginemos que o A transmitiu validamente uma coisa sua a B, e o B também transmitiu


validamente a mesma coisa a C.

Mas imaginemos que a transacção deste tipo de bem, dava lugar ao pagamento de um
imposto, então o que é que aconteceria pois houve dois negócios válidos e deveria haver dois
pagamentos de impostos, ou seja, quando A transmitia validamente a B, o B teria que pagar
imposto e depois quando o B transmitisse a C, o C teria que pagar imposto, e se tudo corresse
conforme a lei, estes dois negócios válidos teriam que dar lugar a dois actos tributáveis, pois
tributava-se a transmissão de A para B e a transmissão de B para C.

Mas imagine-se que depois de os três terem feito os dois negócios pensaram por que motivo
se teria que declarar um negócio de A para B, e outro de B para C e pagar dois impostos, vão
acordar em dizer que houve um negócio directo de A para C e neste caso só haveria uma
transmissão e só se pagaria um imposto, pois se dissessem que houve duas transmissões
pagariam dois impostos e assim neste caso apena se pagaria um imposto a dividir por B e C.

Então fazem declarações negociais dizendo que A vende a C, quando na realidade, tinha
havido uma venda de A a B e outra de B a C, aqui neste caso, o negócio simulado entre A e C
esconde dois negócios dissimulados, esconde o negócio de A para B e o negócio de B para C,
sendo que, o negócio de A para C está a esconder os dois negócios que de facto de fizeram que
foi o negócio de A para B e o negócio de B para C, com a particularidade de existir um sujeito
que por força do negócio simulado, que parece não existir que é o B, quando na realidade o B
tinha sido a pessoa mais activa neste caso, porque o B tinha sido parte nos dois negócios pois o
B comprou a A, e o B vendeu ao C, mas pela maneira como foi construído o negócio, ao
fazerem o contrato dizendo que foi entre A e C, suprimiram um dos sujeitos, neste caso o B
que foi o sujeito real dos negócios, e por isso é que se chama uma supressão do sujeito real.

Tanto no caso da interposição fictícia de pessoa como no caso da supressão do sujeito real, se
formos a ver bem a simulação não incide sobre o preço, nem sobre outro elemento objectivo
do negócio, nem sobre o tipo de negócio, a simulação incide directamente sobre o sujeito ou
os sujeitos do negócio.

Na interposição fictícia de pessoa, faz-se intervir uma pessoa a mais só para enganar, mas na
supressão do sujeito real, subtraindo uma pessoa só para enganar.

Aqui se houvesse um caso pratico na supressão de um sujeito real, teria que se concluir que
tinha havido um negócio simulado, que era o negócio entre A e C que escondia neste caso os
verdadeiros negócios que eram dois, que era o negócio de A para B e de B para C e depois

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diriam, o negócio simulado de A para C é nulo, quanto aos dois dissimulados, aplica-se o
regime que se aplicaria se fosse às claras, neste caso, eram os dois válidos, quanto muito, ao
aplicar-se o regime que lhe corresponderia, seriam ambos válidos e ambos os negócios
pagariam impostos, pois estes negócios não tinham nenhum vício, mas sim o esquema que
cobria aqueles dois negócios.

RESUMINDO:

Se estivermos perante um negócio simulado, ou uma simulação, tem que se ir ao artigo 240 nº
1 e tem que se dizer que há três requisitos:

1) Divergência intencional quanto á declaração.


2) Acordo simulatório
3) Enganar terceiros.

E depois tem que se ver se estes três requisitos estão reunidos e depois de se provar que há
um negócio simulado, e depois tem que se saber se foi uma simulação absoluta ou se foi uma
simulação relativa.

Se se demonstrar que foi uma simulação absoluta terá que se dizer que só há um negócio que
é simulado, logo é nulo, se se concluir que é um negócio dissimulado tem que se recorrer ao
artigo 241 nº 1 e tem que se dizer que ao negócio dissimulado aplica-se o regime que se
aplicaria se tivesse sido feito sem dissimulação, ou se tivesse sido feito às claras seria válido,
ou seria inválido porque haveria uma incapacidade de exercício, ou coacção dependendo das
circunstâncias.

A ideia é;

O negócio dissimulado deve ser analisado de per si, deve-se tentar ver se tem algum vício
intrínseco, e se o negócio dissimulado tem um vício intrínseco, não interessa se está escondido
ou se está às claras, esse vício é inválido, mas se o dissimulado em si mesmo não tem qualquer
vício, não é por ter sido celebrado por baixo de outro que passou a está ferido de algum vício,
pois se o dissimulado seria válido às claras, continua a ser válido apesar de ter sido feito às
escondidas.

Aula 11

ARTIGO 241 Nº 2 – SIMULAÇÃO RELATIVA


“Se, porém o negócio dissimulado for a natureza formal, só é válido se tiver sido observada a
forma exigida por lei”.

Existe uma grande polémica acerca da interpretação do artigo 241 nº 2 pois existem várias
posições quanto à sua interpretação para se saber se o negócio dissimulado é válido ou
inválido, sendo que a duvida reside na qualificação do negócio dissimulado.

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Á partida o nº 2 do artigo 241 está a dizer algo que é normal, ou seja, um negócio formal é um
negócio para o qual a lei exige uma determinada forma, e sempre que a lei exige uma forma
especial para um negócio chamamos-lhe negócio formal, mas se a lei exige uma forma em que
o negócio só é válido se respeitar a forma, e se tal não acontecer o negócio é nulo, mas no
caso do nº 2 do artigo 241, é saber que num caso concreto, se o negócio dissimulado,
respeitou, ou não respeitou a forma.

Exemplo:

Imaginemos que um negócio simulado é a compra e venda de um prédio, A e B celebraram


dissimuladamente uma compra e venda de um prédio, e digo dissimuladamente, porque o
negócio que queriam, não era uma venda, mas sim uma doação, portanto, um declarou que
vendia e o outro que comprava, mas por trás combinaram (o tal acordo simulatório) que era
uma doação e que o pseudo comprador não teria que pagar o preço ao pseudo vendedor, pois
o objectivo era apenas fazer ver a terceiros que era uma venda.

Primeiro, tinha que se demonstrar que havia aqui um negócio simulado face aos dados da
hipótese, A e B declararam que um vendia e o outro que comprava, quando na realidade era
um conluio cujo objectivo era enganar terceiros, ficando demonstrado que havia um negócio
simulado (artigo 240 nº 1) e passando á etapa seguinte, dir-se-ia que era uma simulação
relativa, porque na realidade as partes, apesar de não quererem aquele negócio, queriam um
outro negócio que está escondido por debaixo do simulado que é doação, e quando temos um
negócio que esconde outro, chama-se a isso simulação relativa.

Então a lei diz que, (artigo 241 nº 2), quando o negócio dissimulado tem natureza formal, só é
válido se tiver sido respeitada a forma, e neste caso acontece que, na compra e venda de
imóveis tem que ser por escritura publica (artigo 875) mas também a doação de imóveis, que
nesta caso é um negócio dissimulado, tem que ser por uma forma solene (artigo 947 nº 1) que
tem que ser por escritura publica ou por documento autenticado, pois aqui até há uma
coincidência, pois quer a venda, quer a doação de prédios, tem que ser por escritura publica
ou por documento autenticado e neste caso concreto, a tal venda simulada foi uma venda por
escritura publica, porque se fosse por um simples documento escrito, se não se provasse a
simulação, seria uma venda nula por vício de forma e neste caso, para se enganarem terceiros,
a venda teria que ser feita por uma forma válida, mas isto não impede que o negócio seja nulo,
é nulo por simulação.

Mas imaginemos que o acordo que o vendedor e o comprador fizeram por trás (neste caso o
doador e o donatário) em que estipularam que não era uma venda, mas sim uma doação, e
que esse acordo tinha sido feito oralmente, então aqui a questão que se coloca, é saber se no
negócio simulado não se levantava o problema da forma, á partida, teria que dizer-se que a
venda é nula por ser simulada, quanto á doação aplica-se o nº 1 do artigo 241 (aplica-se ao
negócio o regime que corresponderia ao negócio se o mesmo fosse feito sem dissimulação) e
se o tal individuo que quer enganar terceiros (herdeiros) se tivesse feito a doação às claras, a
doação seria perfeitamente válida, pois nada impede uma pessoa de doar bens a quem quiser,
neste caso, a venda simulada é nula, quanto á doação, aplica-se o regime que se aplicaria se
fosse feita às claras, mas só que mais tarde, as doações poderão vir a ser atacadas.

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Portanto, neste caso, se não houvesse um problema de forma quanto á doação, dir-se-ia que a
venda é nula por ser simulada, e a doação se fosse feita às claras não teria nenhum vício de
forma intrínseco e a doação permanece, neste caso destrói-se a venda e fica a doação.

Mas neste caso é preciso saber se a doação é válida num caso em que o acordo em que se
combinou que era uma doação foi feito oralmente, porque o que foi feito por escritura publica
foi a venda do imóvel, o acordo pelo qual foi combinado que não era uma venda, mas sim uma
doação, foi feito oralmente, mas imagine-se que até foi feito por documento escrito, mas não
foi feito por escritura publica ou documento autenticado, ou seja, os dois simuladores não vão
fazer uma escritura de venda simulada, pois normalmente um acordo simulatório é oral, ou é
por um documento escrito que as partes escondem.

Aqui neste exemplo, o problema que se coloca é que a lei exige escritura publica ou
documento autenticado para a doação, neste caso prático há um negócio que foi feito por
escritura publica, que o foi o negócio simulado, mas o facto é que a lei exige a escritura
publica, neste caso, para a doação e a questão é saber, se a doação é válida, pois o problema é
que a doação está escondida e o acordo que foi combinado para a doação foi feito oralmente
ou por um simples documento escrito.

TESE DE MOTA PINTO


Mota Pinto defende a seguinte tese, a lei exige escritura publica ou documento autenticado
para a doação, mas na prática, neste caso concreto, o acordo, feito por detrás, pelo qual
combinaram que seria uma doação não foi feita por escritura publica ou por documento
autenticado e se assim é, nos termos do nº 2 do artigo 241, a doação seria nula por vício de
forma, ou seja, segundo esta interpretação, a venda é nula por ser simulada e a doação é nula,
porque o acordo em que combinaram que era uma doação se não respeitou a forma que a lei
exige para a doação (artigo 947) que é a escritura publica ou documento autenticado, ou seja,
nesta posição doutrinária, que tem uma consequência, pois sempre que um negócio
dissimulado seja um negocio que exija a intervenção notarial, se aceitarmos esta tese, o
negócio dissimulado acabará sempre por ser nulo por vício de forma.

Segundo esta interpretação, como não é plausível que as partes vão através de um documento
solene reconhecer qual era de facto a sua vontade, neste caso, doar, seriamos levados a
concluir que nesta situação acabavam os dois negócios por ser nulos.

A venda, porque é simulada, e a doação porque nas declarações que traduzem a vontade de
doar, que foi aquilo que foi dito por detrás, pois o que foi dito às claras, não traduzia a vontade
de doar, mas às escondidas, manifestaram a vontade de doar, mas por detrás não
manifestaram essa intenção por escritura publica nem por documento autenticado, logo, para
Mota Pinto, o negócio é nulo.

TESE DE ANTUNES VARELA


Depois temos a tese oposta de Antunes Varela que diz que, a aceitar esta interpretação, todo o
artigo 241 cuja filosofia é tentar aproveitar o negócio dissimulado, pois como é referido no
artigo 241, o negócio dissimulado não é prejudicado pelo negócio simulado, e há quem diga
que ao aceitar a interpretação de Mota Pinto, o negócio dissimulado seria sempre nulo por
vício de forma nos casos em que fosse um negócio solene, precisamente porque as partes não

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se podem dar ao luxo de ir ao notário declarar que tinham feito um negócio simulado, e
portanto, a interpretação de Mota Pinto restringiria muito o âmbito da aplicação do artigo,
quando a ideia do legislador era tentar salvar o mais possível os negócios dissimulados.

Então esta tese oposta diz que, o que interessa para respeitar o nº 2 do artigo 241, é que
tenha sido usada no negócio simulado a forma que a lei exige para o dissimulado, sendo que o
que interessa é que o negócio simulado (que é o negócio que esconde o outro) tenha
respeitado a forma que a lei exige para o negócio dissimulado.

Segundo Antunes Varela, num caso destes, se no negócio simulado for utilizada uma forma
que é suficiente para o dissimulado, então o negócio dissimulado não terá um vício de forma,
mesmo que o acordo que foi feito por trás, não tenha sido feito pela forma que a lei prevê
para o negócio dissimulado, sendo que o acordo que foi feito por trás, os autores falam em
contra declarações, porque no negócio simulado as pessoas fazem as declarações e depois vão
por trás contradizer o que disseram pela frente, ou seja, o tal acordo simulatório em que
traduz um conluio em que as partes combinam por trás, no fundo as partes vêm por trás
contradizer o que disseram às claras.

Portanto, o tal acordo simulatório (conluio) consubstancia-se na emissão de contra


declarações, no sentido de, serão declarações que vêm contradizer outras, aquelas que as
partes tinham emitido á claras para enganar terceiros, ou seja, o dissimulado vem contradizer
o que estava no simulado.

A tese de Mota Pinto era a de que as declarações tinham que ser por escritura publica ou por
documento autenticado, porque eram as contra declarações que traduziam a vontade de doar,
mas segundo Antunes Varela, tal não é necessário, pois o que interessa é que no simulado
tenha sido utilizada a forma que a lei prevê para o dissimulado, e portanto, como foi usada a
forma de escritura publica, está tudo bem, só estaria mal para Antunes Varela, se por exemplo
o simulado fosse aquele negócio que tivesse sido celebrado por um vulgar documento escrito,
porque aí, como a lei exige para a doação mais do que um vulgar documento escrito, aí já não
se poderia dizer que a forma do dissimulado aproveitava a do simulado, pois para que a forma
do dissimulado aproveite a do simulado, é preciso que no simulado tenha sido usada uma
forma, ou mais solene, ou pelo menos igual àquela que a lei exige para o dissimulado.

Então temos duas posições distintas, uma que diz que o negócio dissimulado será sempre nulo
se as tais contra declarações não forem pela forma que a lei exige para o negócio dissimulado,
depois há outra tese que diz que o dissimulado é sempre formalmente válido,
independentemente da forma usada nas contra declarações no acordo que foi feito às
escondidas, desde que no simulado tenha sido usada a forma que a lei exige para o
dissimulado.

TESE DE OLIVEIRA ASCENSÃO


Depois temos uma tese intermédia, que tenta conjugar o que há de melhor nas outras duas,
mas nem sempre as soluções intermédias são as melhores.

Há quem diga que a forma usada no simulado pode aproveitar ao dissimulado, começando a
concordar com Antunes Varela, mas apenas naqueles casos em que o negócio simulado já

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contivesse os elementos essenciais do negócio dissimulado, pois se o negócio simulado não


contiver todos os elementos essenciais do dissimulado, então já não se pode dizer que a forma
do simulado aproveita a do dissimulado.

Exemplos:

1. A venda que esconde a doação


Há autores como Oliveira Ascensão que dizem que, se for uma venda simulada a esconder uma
doação de um prédio, aí a forma do simulado, por escritura publica, aproveita o dissimulado,
porque na venda já estão os elementos essenciais da doação, que são identificar as partes e a
coisa, e que a venda revele a vontade de transmitir, pois a venda é uma doação com mais
alguma coisa que é o preço, pois na pratica, na venda já constavam os elementos todos que
eram necessários para constar numa doação, e portanto, num caso destes, pode-se defender
que a forma usada na venda, o negócio simulado aproveita o dissimulado.

2. A doação que esconde a venda


Mas se fosse ao contrario, e continuando a referir a posição de Oliveira Ascensão, ao invés de
ser uma venda a esconder uma doação, se fosse uma doação a esconder uma venda, pois
tínhamos á mesma uma simulação relativa, pois, quer a doação, quer a venda têm que ser por
escritura publica ou documento autenticado, mas se fosse uma doação a esconder uma venda,
então mesmo que a doação fosse por escritura publica, essa forma não aproveitava a venda
(que era o negócio escondido) porque a escritura publica que foi utilizada, por razões óbvias,
não estava lá o preço que é um elemento essencial que tinha que constar na escritura publica,
porque uma doação com preço, toda a gente perceberia que não era uma doação.

Se fosse uma doação a esconder uma venda, segundo Oliveira Ascensão, já não se poderia
dizer que a forma do simulado aproveitava a do dissimulado, porque no dissimulado, haveria
um elemento essencial que era o preço que não teria cobertura através de escritura pública ou
documento autenticado.

Aceitando a tese de Oliveira Ascensão, a resposta é diferente se for a venda a esconder a


doação, ou se fosse a doação a esconder a venda, porque se for a venda a esconder a doação,
ele acha que na venda estão os elementos todos da doação, mas se for a doação a esconder a
venda, há um elemento essencial na venda que não estaria na escritura publica que é o preço,
e portanto, a tese de Oliveira Ascensão variaria se fosse a doação a esconder a venda, ou se
fosse a venda a esconder a doação.

RESUMINDO:

Na tese de Mota Pinto, se fosse uma doação a esconder uma venda, ou se fosse uma venda a
esconder uma doação, aquilo que é dito por trás é que teria que ser por escritura publica ou
por documento autenticado, portanto, se é uma doação a esconder uma venda, Mota Pinto
diria o mesmo, não interessa que a doação tenha sido por escritura publica mas se o acordo
que fizeram por trás, não era uma doação, mas sim uma venda, seria preciso que esse acordo
por trás fosse por escritura publica ou por documento autenticado.

E como a tese de Mota Pinto é bastante radical, onde o que interessa é a forma usada nas
contra declarações, ou seja, a forma do simulado nunca aproveita a forma do dissimulado, pois

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o que interessa é a forma pela qual foi feito o acordo às escondidas, e portanto, para Mota
Pinto, seja uma venda a esconder uma doação, seja uma doação a esconder uma venda, se as
contra declarações não foram feitas por escritura publica ou documento autenticado, seriam
sempre nulas, pois o simulado era nulo por ser simulado e o dissimulado era nulo por vício de
forma.

A tese de Antunes Varela também não varia consoante as situações referidas por Oliveira
Ascensão, porque para ele o que interessa é que no simulado tenha sido usada a forma do
dissimulado, portanto, tanto faz ser uma venda por escritura pública que esconde uma
doação, como uma doação por escritura pública que esconde uma venda, porque, seja num
caso ou seja no outro, foi usada no simulado a forma que a lei exige para o dissimulado.

A posição de Oliveira Ascensão é que não acaba por ser a mesma nos dois exemplos, porque
ela não aceita na totalidade a posição dos outros dois, pois ele entende que temos que ir ver
que elementos do dissimulado é que não estão cobertos pela forma do simulado.

ARTIGO nº 242 – LEGITIMIDADE PARA ARGUIR O VICIO DA SIMULAÇÃO


O negócio simulado é nulo, interessa saber quem é que o pode arguir e se não existisse o
artigo 242, iriamos para o 286, que diz que é qualquer interessado.

Artigo 242 nº 1 “Sem prejuízo do disposto no artigo 286, a nulidade do negócio simulado pode
ser arguida pelos próprios simuladores entre si, ainda que a simulação seja fraudulenta”.

O que diz o nº 1 do 242, depois de remeter para o artigo 286, é dizer que pode ser qualquer
interessado, mas depois refere que pode ser arguida pelos simuladores entre si, ainda que a
simulação seja fraudulenta.

À partida, esta segunda parte do nº 1 era desnecessária, porque se a lei diz que pode ser
invocada por qualquer interessado, os simuladores enquanto parte do negócio são sempre
pessoas interessadas na arguição do vício.

No antigo Código de Seabra os simuladores nunca poderiam invocar o vício, porque invocar o
vício era virem fazer-se prevalecer da sua própria perfídia e havia uma corrente que dizia isso,
mas como agora o legislador fazia questão de consagrar uma solução diferente, o legislador
receou que se dissesse apenas que o vício podia ser invocado por qualquer interessado, que se
dissesse que qualquer interessado poderia invocar o vício, exceptuando os simuladores, e
então o legislador, para não haver a mínima duvida, escreveu que os simuladores podem
invocar o vício, um contra o outro, mesmo que tenha havido simulação fraudulenta.

Exemplo:

Entre dois amigos combinavam que um fazia uma venda simulada ao outro, apenas para criar a
aparência de que certo bem já era seu, e para que um terceiro (credor) já não penhorasse o
bem.

Então foi feita uma compra e venda simulada e até para não haver duvidas, imagine-se que se
vendia um quadro oralmente, mas até foi feita por escrito, porque assim era mais fácil eu
exibir perante o credor a venda que eu tinha feito, mas neste caso, é uma venda simulada que

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é nula e se é nula, não produz efeitos, portanto, nem a propriedade se transmite para ele, nem
eu tenho direito ao preço.

Mas imaginem que eu afinal, sou um amigo da onça e decido vir-lhe cobrar o preço, e ele
responde que é apenas um negócio simulado, e eu faço-me de surpreendido porque digo que
não me lembro de ter feito com ele um negócio simulado.

Então eu vou a tribunal para o obrigar a pagar o preço, e ele para não pagar o preço, irá alegar
que a compra e venda é nula, arguindo o vício da simulação e pode fazê-lo neste exemplo, mas
se não se dissesse que os simuladores podem arguir o vício, poderia haver a tal corrente
doutrinária do Código de Seabra que dissesse que os simuladores, causadores do vício, não
podem invocar o vício um contra o outro.

E também vamos ver que o simulador pode invocar o vício contra terceiros de má-fé, o que
não pode é invocar o vício contra terceiro de boa-fé (artigo 243 nº 1).

Os simuladores podem arguir o vício um contra o outro, mas também podem arguir o vício
contra terceiros de má-fé, o que o simulador não pode é invocar o vício da simulação contra
terceiro de boa-fé.

Sendo certo que o simulador pode invocar o vício, quer contra outro simulador, quer contra
terceiro de má-fé, mas vai ter uma limitação em matéria de prova que vem referida no nº 2 e
nº 3 do artigo 394 que têm importância para a simulação;

Artigo 394 nº 2 “a proibição do numero anterior aplica-se ao acordo simulatório e ao negócio


dissimulado, quando invocados pelos simuladores”.

Artigo 394 nº 3 “o disposto nos números anteriores não é aplicável a terceiros”.

Isto significa que, apesar de a lei dizer no nº 1 do artigo 242 que o simulador pode invocar a
simulação contra o outro simulador, ou apesar de á contrario senso, no artigo 243 nº 1, que o
simulador também pode invocar o vício contra terceiro de má-fé, se por acaso o negócio
simulado foi feito por documento, a prova de que ele é simulado não pode ser feita por
testemunhas.

Exemplo:

Imaginemos que eu e um amigo meu, fizemos a compra e venda de um quadro por escrito, e
combinámos oralmente que era uma venda falsa e houve testemunhas desse facto, e que ele
não devia o preço e que eu também não deixava de ser o dono do quadro.

Só que há um problema, se for ele a intentar a acção, invocando a nulidade dizendo que o bem
era dele, eu terei que invocar que é um negócio simulado que é nulo e que o bem ainda é meu.

Neste caso, qualquer dos dois que quiser provar a simulação, não se pode socorrer das
testemunhas que presenciaram nossa combinação, porque não poderiam vir atestar uma
combinação oral que foi feita para contradizer um negócio escrito, ou seja, estamos em
presença de um negócio que foi celebrado por escrito e as contra declarações, o tal acordo
feito por trás, onde se disse oralmente que não era nenhuma venda, pois neste caso há o

Serafim Cortizo 20100059 Página 62

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problema da prova, porque se o simulado foi por documento e se as contra declarações foram
orais, mesmo que considerarmos que são válidas à luz da tese de Antunes Varela, se for o
simulador a invocar tem o problema da prova por causa do nº 2 do artigo 394, pois ele não
pode através de testemunhas demonstrar que oralmente se disse algo em contrario ao que
estava no documento, sendo uma forte limitação para os simuladores, mas que não se aplica a
terceiros, porque se for um terceiro a invocar o vício, se a prova que tem da simulação for uma
prova oral, ou seja, se forem testemunhas que ouviram uma combinação oral, aí as
testemunhas podem vir a ser ouvidas, apesar de virem atestar algo que foi combinado
oralmente e que contradiz um documento por escrito, porque os artigos 394 nº 2 e nº 3 dizem
é bem claro, porque só os simuladores é que não se podem socorrer das testemunhas neste
caso.

Mas se por acaso, o negócio simulado foi celebrado oralmente, ou seja, eu vendi
simuladamente um quadro, e todos me ouviram combinar que era um negócio simulado, ou
seja, todos ouviram um acordo oral que contradizia outro acordo oral, aí já é possível
socorrermo-nos de testemunhas, porque o nº 2 do artigo 394 não diz que os simuladores
nunca se podem socorrer de testemunhas, diz que não se podem socorrer de testemunhas em
situações idênticas ao do nº 1 (artigo 394) ou seja, na situação em que as testemunhas viriam a
certificar um acordo oral que contradizia um documento escrito, mas se o próprio simulado foi
oral, não há problema em provar através de testemunhas que houve outro acordo oral a
contradizer o acordo oral em que se consubstanciava o negócio simulado, mas se o negócio
simulado foi por documento, aí é que um acordo oral não vale.

O artigo 242 diz “sem prejuízo do artigo 286” e ao dizer isto, o que se está aqui a dizer, é que
se aplica aqui também o artigo 286 que é o artigo que diz que “a nulidade pode ser invocada
por qualquer interessado”, e assim sendo, normalmente quem será o interessado em invocar a
nulidade de um negócio simulado, são os terceiros que os simuladores quiseram enganar, por
exemplo, num acaso em que há um negócio simulado para enganar os credores para fazer crer
a um credor que um bem já não pertence ao devedor para que ele não o possa penhorar, o
credor pode ter interesse em vir demonstrar que o negócio é simulado, e se demonstrar que o
negócio simulado é nulo, e se demonstra que é nulo, o mesmo não produziu efeitos e se não
produziu efeitos, demonstra que o bem ainda é do simulador, mesmo que ainda esteja em
poder de outra pessoa.

Exemplo:

Caso prático

A e B casaram simuladamente, mas imaginem que o A antes de invalidar o casamento


simulado fez com o B, o A foi casar com C mas não se deu ao trabalho de obter a invalidação
do primeiro casamento.

Há aqui um crime de bigamia, porque mesmo quando o primeiro casamento é inválido, só é


permitido um segundo casamento depois de o primeiro ser declarado inválido, portanto, numa
situação destas, os dois casamentos são inválidos, um que anulável por ser simulado, e o outro
é anulável porque há um impedimento dirimente que é o facto de um dos cônjuges já ser
casado com outra pessoa.

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As pessoas podem casar com inúmeras pessoas, mas tem que ser sucessivamente e não
simultaneamente, pois uma pessoa não pode estar casada com várias pessoas ao mesmo
tempo, sendo que o vício do segundo casamento é haver um primeiro casamento.

Então neste exemplo se A casou simuladamente com B e depois A casou com C, o C não foi
interveniente no primeiro casamento, mas o C tem interesse em que o primeiro casamento
seja anulado por simulação, porque se o primeiro casamento for anulado por simulação,
desaparece o vício que afecta o segundo casamento, pois o problema do segundo casamento é
o facto de estar a coexistir com um casamento anterior, pois se o primeiro casamento for
declarado inválido, deixa de haver aquele óbice ao segundo casamento, e portanto, neste
exemplo, o C que é parte no segundo casamento, mas que é terceiro no primeiro, pois é
prejudicado pelo primeiro casamento, sendo neste caso, um terceiro interessado em pedir a
invalidação do primeiro casamento do seu cônjuge, provando a simulação do primeiro
casamento entre A e B, porque a existência do primeiro casamento está a viciar a validade do
segundo.

ARTIGO 242 Nº 2
“A nulidade pode também ser invocada pelos herdeiros legitimários que pretendam agir em
vida do autor da sucessão contra os negócios por ele simuladamente feitos com o intuito de
os prejudicar”.

Uma pessoa, se à data da sua morte tiver descendentes, ou cônjuge, ou ascendentes, essas
pessoas têm sempre o direito em herdar e se uma pessoa á data da sua morte for casado, ou
tiver filhos, pais, etc. esses descendentes, ascendentes ou cônjuges, são aquilo que a lei chama
de herdeiros legitimários (artigo 2157) pois quando uma pessoa é herdeira legitimaria tem
sempre o direito de herdar uma parte dos bens do falecido, quer ele queira, quer não, excepto
se tenham praticado um acto passível de deserdação nos casos do artigo 2166.

Se à data da morte, o único herdeiro legitimário é o cônjuge, tem que lhe deixar 50 %, dos
bens, a outra metade pode ser deixada a quem quiser.

Se à data da morte, o único herdeiro legitimário em vez de ser um cônjuge, é um filho,


também recebe 50 % dos bens e a outra metade vai para quem quiser.

Mas se á data da morte, os herdeiros legitimários são dois filhos, ou há um cônjuge e um ou


dois filhos, 2/3 têm que ir obrigatoriamente para os herdeiros legitimários, sendo que, apenas
1/3 pode ser deixado a quem quiser.

Então aquela parcela de bens que têm que ir obrigatoriamente para os herdeiros legitimários,
designa-se por quota indisponível, porque o falecido não pode dispor dela (1/3) pois têm que
ser deixados 2/3 aos herdeiros legitimários.

Caso prático:

A queria fazer uma doação a B, mas para que ninguém soubesse disseram que era uma
venda.

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Tem que se dizer que há aqui uma simulação e depois há que se dizer que há uma venda que
esconde uma doação, mas pode não estar implícito que é um prédio, eu posso dizer uma coisa
e uma coisa é um conceito amplo, pois tanto é coisa uma caneta, como é coisa um prédio, que
pode ser ou não registável, pois tem que se abrir uma sub hipótese pois até pode haver uma
situação em que haja ou não, liberdade de forma para a sua transmissão.

Caso prático:

A vende simuladamente a B um prédio, mas na realidade o que quer é fazer uma doação.

Pronuncie-se sobre a sua validade.

Então as pessoas têm que se pronunciar sobre a validade do simulado e sobre a validade do
dissimulado pois as pessoas é que têm que perceber que é uma simulação relativa, pois se se
diz que é uma venda, mas na realidade é uma doação, têm que dizer que há ali uma simulação
relativa, porque há um negócio que é uma venda, mas que esconde uma doação e depois
pronunciam-se sobre a validade dos dois.

Quanto á venda dirão que é nula por ser simulada, (artigo 240 nº 2), depois quanto á doação, o
que se dirá, é que não tiver nenhum vício intrínseco é perfeitamente válida porque se aplica o
regime que corresponderia se fosse às claras.

Só que, se se conclui que para aquele negócio dissimulado a lei exige uma certa forma, no caso
de ser um negócio formal, então já terá que se aplicar o nº 2 do artigo 241 que se pronuncia
sobre o aspecto da validade e se se concluir que o negócio dissimulado tem que ser por
escrito, mas que o acordo que foi feito às escondidas foi oral, terá que dizer-se que, segundo
Mota Pinto, seriam os dois nulos, um por ser simulado e o outro por vício de forma porque o
acordo feito por trás não tinha a forma exigida.

Todavia, na tese de Oliveira Ascensão, o simulado seria nulo, mas o dissimulado seria válido,
porque a forma que foi usada no simulado era suficiente para o dissimulado.

Aula 12

ARTIGO 243
Artigo 243 nº 1 “a nulidade proveniente da simulação não pode se arguida pelo simulador
contra terceiro de boa-fé”.

Portanto, já vimos que pode ser arguida contra outro simulador ou contra terceiro de má-fé
mas sem o recurso à prova testemunhal se for para contradizer algo que consta de um
documento, mas a lei diz que não pode ser arguida contra terceiro de boa-fé.

Artigo 243 nº 2 “a boa-fé consiste na ignorância da simulação ao tempo em que foram


constituídos os respectivos direitos”.

Enquanto no artigo 291, quando se fala em boa-fé exige-se uma ignorância não culposa,
(aquele que ignorava sem culpa), a chamada boa-fé em sentido ético, aqui no artigo 243 nº 2,
para haver boa-fé basta que alguém ignore o vício pré existente, mas quer ignore com culpa,

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quer ignore sem culpa, portanto, aqui desde que o terceiro prove que ignorava quando
adquiriu o direito que invoca, que ignorava que tinha havido previamente um negócio
simulado, automaticamente, considera-se que esse terceiro está de boa-fé.

Artigo 243 nº 3 “considera-se sempre de má-fé o terceiro que adquiriu o direito posteriormente
ao registo da acção de simulação, quando a este haja lugar”.

Aqui neste caso, se se demonstrar que certo terceiro adquiriu um direito sobre um bem já
depois de ter sido registada uma acção tendo em vista obter a nulidade por simulação, pois
imaginemos que houve um negócio simulado que tinha por objecto um bem registável, se
forem intentar uma acção de invalidação desse negócio, no artigo 291 já foi visto que quando
há uma acção de invalidade que tem por objecto um bem registável, tem que se dar
publicidade á própria acção que é objecto de registo, e portanto, se quando o terceiro adquiriu
o direito, se já estava registada uma acção de invalidade por simulação, o terceiro, como diz a
lei, é sempre considerado de má-fé, e quando a lei diz “sempre”, estamos aqui perante uma
presunção não ilidível, que não admite uma prova em contrário.

No artigo 243 nº 3, estamos perante um caso em que claramente a lei proíbe que seja feita
prova em contrário, porque a lei diz que se já tivesse havido registo, um terceiro considera-se
sempre de má-fé, pois aqui a palavra-chave, é a palavra “sempre”, pois ao dizer que o terceiro
considera-se sempre de má-fé, quer dizer que ele não ganha nada em dizer que ignorava a
simulação, pois se ele adquiriu o seu direito já depois de registada a acção, diz a lei que ele se
considera sempre de má-fé.

Exemplos:

Conflito entre um simulador e um terceiro de boa-fé.

Caso prático nº 1

A vendeu simuladamente uma coisa a B e depois B transmitiu essa coisa a um terceiro C que
está de boa-fé.

Num caso destes em que o terceiro está de boa-fé, o A que é o verdadeiro dono do bem, pois
não podemos esquecer que se o negócio entre A e B é nulo, se é nulo não produz efeitos e se
não produz efeitos, não transmite a propriedade a B e se a propriedade não se transmitiu para
B, quando B vendeu ou doou a C estava a fazer uma doação de bens alheios que também é
nula, ou seja, a invalidade do primeiro negócio, neste caso a nulidade do primeiro negócio
implica por um efeito cascata a nulidade dos negócios subsequentes.

Portanto, à luz das regras gerais da nulidade, sendo um negócio entre A e B simulado e
consequentemente nulo, independentemente de saber se a coisa foi entregue a B e
independentemente de saber se o B pagou o preço, o facto é que o negócio não produziu
efeitos pois B não ficou dono e se não ficou dono, não podia transmitir a C, logo, pela lógica,
sendo o primeiro nulo, os seguintes também seriam nulos por ilegitimidade, mas o facto é que
a lei diz no artigo 243 nº 1 que o simuladores não podem invocar o vício contra terceiro de
boa-fé, neste caso o A não pode ir ter com C e pedir a devolução do bem, porque a venda feita
a B é uma venda simulada, porque para que o A prove que o bem é seu, o A vai ter que alegar

Serafim Cortizo 20100059 Página 66

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que celebrou um negócio simulado, mas a lei diz no artigo 243 nº 1, que a simulação não pode
ser oposta pelo simulador a terceiro de boa-fé.

Neste exemplo, nem o A nem o B podem ir exigir do C, se estiver de boa-fé, a entrega do bem
porque para tal teriam que alegar contar ele que tinha havido previamente um negócio
simulado, só que não o podem fazer por força do artigo 243 nº 1.

Caso prático nº 2

A vendeu simuladamente uma coisa a B e agora aparece C que é o credor de B a pretender


penhorar esse bem.

Quando o A vende simuladamente uma coisa a B, cria-se uma aparência que o bem pertence a
B, e o credor C acredita que o bem é do B, mas o C não sabe que o negócio é simulado, mas
como credor que é, vai tentar penhorar os bens de B e um dos bens que ele pensa que
pertence a B é aquela coisa que lhe foi vendida simuladamente.

Então imaginemos que o C obteve numa acção executiva a penhora do bem que tinha sido
vendido simuladamente e neste caso vai surgir um conflito entre o A que é o verdadeiro dono
do bem e o C, pois e a venda era nula, o A era o verdadeiro dono do bem, mas o bem que é
doado está a ser penhorado está pagar uma divida de C porque há uma aparência que o bem é
do B.

Então o A poderia sentir-se na necessidade de intervir nessa acção executiva vindo alegar que
esse bem não pode ser penhorado porque ainda lhe pertence, mas só consegue provar que é
dono desse bem dizendo que celebrou um negócio simulado com B, mas para isso teria que
opor a simulação ao C que é um terceiro de boa-fé, pois neste caso, a lei diz, o simulador não
pode invocar o vício da simulação contra terceiro de boa-fé (artigo 243 nº 1).

Temos então aqui um exemplo que se o A, nessa acção executiva intervier dizendo que esse
bem lhe pertence e não pode ser penhorado, tendo que dizer que simulou a venda, então se
simulou a venda não pode opor a simulação a C que é um terceiro de boa-fé.

No primeiro exemplo A, vendia a B e depois o B transmitia a C e se o C estava de boa-fé, o A


não podia reclamar o bem a C, neste segundo exemplo, A vende a B, o B não vende a C, mas há
á mesma um terceiro de boa-fé que não é um sub adquirente, mas é um credor pois o C não
foi adquirir o bem ao B, mas esse C é credor de B e que está convencido que o bem é de B e
que obteve a penhora do bem e agora essa penhora só poderia ser levantada, se se provasse
que o bem não era do B, mas que ainda era do A, mas o A não pode fazer essa prova, porque a
única maneira que ele tem de provar é invocando a simulação, mas não o pode fazer, porque a
lei o proíbe, se o C estiver de boa-fé. Mas se o A provasse que o C quando fez a penhora que
tinha havido previamente um negócio simulado, então já prevaleceria o interesse do A.

Há quem conclua num caso destes, uma vez que o simulador não pode invocar o vicio contra
terceiro de boa-fé, há quem diga que o terceiro de boa-fé fica dono do bem, mas o
entendimento dominante não é bem assim, porque na realidade, o C como terceiro só se
tornaria dono do bem se resultasse da lei que ninguém poderia invocar o vício contra terceiro
de boa-fé, mas o que a lei diz, é que os simuladores não podem.

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Mas não são só os simuladores que podem arguir a simulação, também os terceiros podem
arguir a simulação e então, para podermos afirmar que neste dois exemplos que o C é que tem
direito a ficar com o bem, ou que o C é que tem direito a penhorar o bem, não basta dizer que
o simulador não pode invocar o vício contra ele, teria que se provar que também nenhum
terceiro pode invocar o vício contra um terceiro de boa-fé, pois aí é que há polémica na
doutrina, pois há quem diga que ninguém pode invocar o vício contra terceiro de boa-fé.

TESE DE MOTA PINTO E GALVÃO TELLES


Segundo Mota Pinto e Galvão Telles, acham que nestes exemplos que foram dados, nem os
simuladores nem outros terceiros, seja de boa ou má-fé, podem invocar o vício contra terceiro
de boa-fé, mas há correntes doutrinárias que dizem que um terceiro de boa-fé poderá invocar
o vício contra um terceiro de boa-fé.

Nos exemplos que eu dei poderemos dizer que:

1) A é o simulador alienante (porque finge transmitir o bem)


2) B é o simulador adquirente (porque finge adquirir o bem)
3) C é o sub adquirente do simulador adquirente (C foi adquirir ao B que tinha adquirido
do simulador alienante A, mas no exemplo do credor, C é credor do simulador
adquirente).
Nas situações que levantam polémica na doutrina, esta está a prever os casos em que o
simulador tende a invocar o vício contra terceiro de boa-fé e conclui-se com base do artigo 243
nº 1 que, o simulador não pode invocar o vício contra terceiro de boa-fé, mas isso significa á
contrario senso, que o simulador já pode invocar o vício contra terceiro de má-fé, pois se A
vendesse simuladamente a B e depois B transmitiu a C e se provar que C sabia, quando
celebrou o negócio com B, se sabia que tinha havido previamente um negócio simulado, então
neste caso, C já é um terceiro de má-fé e se o A conseguir provar isso, o A apesar de ser
simulador, prevalece-se contra o C que é um terceiro de má-fé.

Mas imaginemos que o C não é um sub adquirente mas é um credor de B, mas se se provar
que é um credor de má-fé, então o A já pode deduzir os tais embargos de terceiros, contra
terceiro de má-fé, sendo certo que neste caso contra terceiros de má-fé o A não se poderá
socorrer da prova testemunhal se fosse contra outro simulador.

A simulação pode dar origem a conflitos entre terceiros e isto quer dizer, um conflito entre um
terceiro que pretende invocar o vício da simulação e outro terceiro a quem não convém que
seja invocado o vício da simulação.

Estes conflitos, podem ser conflitos entre dois terceiros de má-fé, ou seja, dois terceiros que
quando adquiram os respectivos direitos sabiam que tinha havido um negócio simulado.

A situação polémica é quando os dois terceiros estão de boa-fé, ou seja, qualquer dos terceiros
na altura em que adquiriu o seu direito ignorava que tinha havido previamente um negócio
simulado, então poderemos dizer que ambos os terceiros estão de boa-fé.

Pode também, haver uma situação de haver um conflito entre um terceiro que está de boa-fé
e outro que está de má-fé, ou seja, quando um dos terceiros se arroga o direito de que quando

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adquiriu o bem sabia que havia um negócio simulado e o outro que se arroga o direito de que
quando adquiriu o bem, ignorava que tinha havido um negócio simulado.

Há três casos mais frequentes de conflitos entre terceiros gerados por um negócio simulado.

1) O primeiro conflito possível é um conflito entre dois sub adquirentes, ou seja, será um
conflito entre um terceiro sub adquirente e outro terceiro que é sub adquirente do
simulador alienante.
2) O segundo conflito será entre dois credores, ou seja, um conflito entre o credor e o
simulador adquirente e o credor do simulador alienante.
3) O terceiro conflito é um conflito entre um credor de um dos simuladores e um sub
adquirente de outro simulador.

Aqui há duas variantes:

a) Pode ser um conflito entre o credor do simulador alienante e um sub adquirente do


simulador adquirente.
b) E pode ser um conflito entre o sub adquirente do simulador alienante e um credor do
simulador adquirente.

Exemplos:

1º Conflito

O primeiro conflito possível era entre dois sub adquirentes, o sub adquirente do simulador
alienante e o sub adquirente do simulador adquirente.

A vende simuladamente uma coisa a B, seguidamente B foi transmitir essa coisa a um


terceiro C, por sua vez, A foi transmitir a mesma coisa a um terceiro D.

O A e o B são simuladores, o A é o simulador alienante, o B é o simulador adquirente, o B foi


transmitir a mesma coisa a C que é o sub adquirente do simulador adquirente, mas o A que era
o simulador alienante, foi ele próprio transmitir e mesma coisa a uma terceira pessoa
chamado D e neste caso o D é o sub adquirente do simulador alienante.

Num caso destes, o conflito que se vai estabelecer é entre C e D, pois o A e o B já estão fora do
caso, pois o B já vendeu o bem e o A também já o transmitiu, pois no conflito entre C e D, cada
um deles alega que é o dono do bem.

O C dirá que é o dono porque o B comprou a A e transmitiu-me a mim C, mas o A dirá que
ainda é o dono do bem porque os negócios que foram feitos eram todos nulos e neste caso
quem tem interesse em invocar a simulação é o D, porque para que o B possa prevalecer sobre
o C, o D tem que provar que comprou a A, o verdadeiro dono, e para isso o D vai ter que
provar que o negócio entre A e B é nulo e que consequentemente o negócio que de
transmissão para C também é nulo e se o primeiro é nulo, o B não ficou dono, e se não ficou
dono não podia transmitir a C, e se o D conseguir provar que o negócio de A para B é nulo, e o
de B para C também é nulo, então o D consegue provar que quando comprou o bem a A, o A
ainda era o dono do bem, e portanto, o B vai demonstrar que comprou ao verdadeiro dono e

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se o D comprou ao verdadeiro dono, é normal que diga que é o proprietário, mas para isso
terá que provar que o negócio de A para B era nulo tendo que invocar a simulação contra o
terceiro C, e consoante a boa ou má-fé dos personagens, poderá ser que sim ou poderá ser
que não.

2º Conflito

O segundo conflito era entre dois credores, o credor do simulador alienante e o credor
simulador adquirente.

A vendeu simuladamente a B, B tem um credor chamado C, por sua vez A tem um credor
chamado D.

O conflito que pode surgir aqui pois o C é credor do B, e imaginem que o C quer penhorar o
bem para cobrar o crédito que tem face ao B, pois há uma aparência que o bem é do B, pois
houve um negócio simulado e imaginemos que o C quer penhorar aquele bem. Mas
imaginemos que o D que é o credor do A também quer penhorar o bem.

Claro que, para o D poder penhorar o bem tem que demonstrar que o bem ainda é do A,
porque se o bem já tivesse sido vendido validamente ao B, o D já não pode penhorar o bem,
pois para penhorar o bem tem que provar que o bem ainda é do A, e consegue-o alegando e
demonstrando que houve um negócio simulado de A para B, pois se é um negócio simulado, é
nulo, se é nulo não produziu efeitos e se não produziu efeitos, o bem continua a pertencer a A
e se o bem é do A, D pode penhorar o bem e aquele C não pode porque está a querer fazer-se
pagar por um bem que não pertence ao seu devedor, o C é credor do B, mas o bem não é do B,
o bem é do A.

Mas para se provar que o bem é do A, o D, vai ter que provar que houve uma simulação, sendo
que o conflito que pode surgir entre os dois credores, o D credor do simulador alienante e C
credor do simulador adquirente e porque o D na qualidade de credor do simulador alienante,
para fazer valer o seu direito de crédito, precisa de provar que é um negócio simulado para
provar que o bem ainda é do A para o poder penhorar.

Aquele que não tem interesse para que se fala essa prova é o C, porque se não puder ser
invocada a simulação do negócio entre A e B, prevalecerá a aparência que o bem é do B, e se o
bem é do B, quem o pode penhorar é o credor do B que é o C.

Portanto, neste exemplo, o conflito entre os dois terceiros, é que há um terceiro que é o D que
tem interesse em invocar o vício, e há um terceiro C para quem é fundamental que o vício não
possa ser invocado, pois se o vício não puder ser invocado, é o C que prevalece.

3º Conflito

A vende simuladamente uma coisa a B, e B transmite a C, por sua Vez A tem um credor D.

Aqui mais uma vez é um conflito entre C e D, o D é o credor do simulador alienante e o C é o


sub adquirente do simulador adquirente.

O que é que é necessário para o D poder penhorar o bem?

Serafim Cortizo 20100059 Página 70

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O D para poder penhorar o bem, tem que provar que o bem pertence ao A, mas para isso, tem
que provar que o negócio de A para B é nulo por ser simulado, e que o negócio seguinte de B
para C também é nulo por falta de legitimidade do B.

Neste caso, quem tem interesse em invocar a simulação é o D para poder penhorar o bem, e
quem tem interesse em que a simulação não possa ser invocada é o C, porque se não puder
ser invocada, prevalece a aparência de que o bem é do C.

A vende simuladamente um bem a B, B tem um credor C e por sua vez, A transmite a D.

Aqui neste caso o conflito surgirá quando o C que é o credor do B, pretender penhorar o bem,
com o argumento de que o bem, aparentemente é do B, o C que é o credor do B queria
penhorar o bem, mas o D vem alegar que não é possível porque o bem é dele (D), mas para D
dizer que o bem é seu vai ter que demonstrar que houve um negócio simulado de A para B e
que o bem continua a ser do A e se continua a ser do A, o A podia validamente ter feito o que
fez que foi transmitir a D e neste caso o D terá que demonstrar que a venda de A para B é nula
porque foi simulada.

Nestes casos, quando há um conflito entre terceiros, a lei dá prevalência, porque não é um
conflito entre simuladores, é um conflito entre dois terceiros e aqui neste caso há que atender
à questão de saber se esses terceiros estavam de boa ou de má-fé.

Quando os dois terceiros estão de má-fé a opinião da doutrina é unânime e há uma solução
clara apontada pelo doutrina, que prevalece sempre o que está de boa-fé, sendo que o único
caso duvidoso é quando os dois terceiros estão de boa-fé, porque veremos que quando os dois
terceiros estão de boa-fé, nestes três exemplos, há autores que dizem que prevalece o C,
aquele que confiou na aparência do negócio simulado, e há outros que defendem que
prevalece o D que é o que se arroga o direito de ser o verdadeiro dono.

Aula 13

VÍCIO DA SIMULAÇÃO (Conclusão)

Artigo 243 - Continuação da aula anterior


Em relação aos exemplos de conflitos da última aula, resta saber qual é a posição que
prevalece, quem é que dos terceiros pode invocar os vícios, que nestes exemplos todos foi o
sujeito D, ou do credor terceiro que alega que confiou no negócio simulado e que adquiriu o
seu direito á sombra de um negócio simulado?

Nestes casos, a doutrina verdadeiramente só está dividida, no caso dos conflitos serem entre
dois terceiros de boa-fé, só que, quer o C quer o D, serem terceiros de boa-fé, é que divide a
doutrina sobre se se deve dar prevalência ao C, ou se se deve dar prevalência ao D, ou se tem
que se ver caso a caso, porque se for uma situação em que os dois terceiros estão de má-fé, ou
se é só dum dos terceiros que está de boa-fé e o outro está de má-fé, nesta situação os
autores acabam por chegar todos á mesma conclusão, sendo que a polémica é só quando os
terceiros estão de boa-fé.

Serafim Cortizo 20100059 Página 71

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Vamos começar por analisar os casos em que os terceiros estão de má-fé, ou um dos
terceiros está de boa-fé e o outro está de má-fé.

Imaginemos uma situação em que os terceiros estão de má-fé (artigo 243 nº 2 e nº 3) e em


principio, se quando o terceiro adquiriu o direito de que se arroga ignorava que tinha havido
previamente um negócio simulado, ele é considerado um terceiro de boa-fé, mas se na altura
em que pretendeu constituir um direito de que se arroga, se ele já sabia que tinha havido um
negócio simulado, é um terceiro de má-fé, sendo que no artigo 243 nº 3 quando refere que se
o terceiro adquiriu um direito já depois de registada uma acção de simulação, aí considera-se
que ele está sempre de má-fé, mesmo que ignorasse que o negócio era simulado, mas como
era suposto ir ao registo antes de pretender adquirir os direitos, e se o direito de que ele se
arroga já foi adquirido depois do registo de uma acção de simulação, ele seria sempre
considerado um terceiro de má-fé.

O critério para se saber se o terceiro, está ou não de má-fé está no artigo 243 nº 2.

Exemplo:

Caso prático

Imaginemos um conflito entre dois sub adquirentes, portanto, o primeiro conflito entre o C e
o D, o B transmitiu o direito a C, e por sua vez o A transmitiu a D.

Neste caso, havia aqui um conflito entre dois sub adquirentes, C que era o sub adquirente do B
(simulador adquirente) e o D (sub adquirente do A, o simulador alienante). Pois quando C
comprou a B, ou se quando o bem foi doado por B a C, se C sabia que era um negócio
simulado, estaria de má-fé, mas se não sabia, estaria de boa-fé. O mesmo se diga quanto ao
negócio entre A e D, pois se quando o D celebrou o negócio com A, se sabia previamente que
era um negócio simulado, se D sabia estava de má-fé, mas se não sabia, estaria de boa-fé.

Então, imaginemos, que quer o D, quer o C estavam ambos de ma fé, ou seja, qualquer deles
sabia que quando celebrou o respectivo negócio, que previamente tinha havido um negócio
simulado entre A e B.

Se estavam os dois de má-fé, toda a doutrina é unânime em defender que nesse caso há que
aplicar o regime geral da nulidade, que ela pode ser invocada por qualquer interessado e neste
exemplo, o interessado em invocar a nulidade é o D, pois é o D que precisa de demonstrar que
o negócio é nulo para conseguir demonstrar que o bem na altura em que o adquiriu ainda
pertencia ao A, e se estão ambos de má-fé, toda a doutrina em Portugal defende que o D pode
invocar a nulidade contra C e se tal é possível, isso significa que desde que o D prove que o
negócio entre A e B era um negócio simulado e consequentemente nulo, ficará feita a prova de
que a propriedade não se transmitiu de A para B e por um efeito cascata, fica feita a prova, de
que se não se transmitiu para B, também B não poderia depois transmitiu para C,
precisamente por causa daquelas regras que de que as vendas ou as doações de bens alheios
são nulas por ilegitimidade.

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Portanto, se quer C quer D estavam de má-fé, prevalece a posição daquele que ao abrigo da lei
pretende invocar a nulidade que neste caso é o D, sendo certo que o próprio C se tiver
interesse em invocar a nulidade também o pode fazer.

Exemplo:

Imaginem que o C comprou ao B e agora o C está arrependido da compra. O C quer receber o


dinheiro de volta, apesar de estar de má-fé. Mas um terceiro de má-fé também pode invocar o
vício da simulação, pois até os próprios simuladores podem invocar o vício da simulação
(artigo 242 nº 1) pois estar de má-fé não é impeditivo para que não se possa invocar o vício da
simulação, pois o próprio C neste exemplo teria interesse em invocar o vício da simulação, se
tendo comprado um bem a B quiser desfazer o negócio para reaver o dinheiro, tendo que
alegar que a compra que fez foi nula, mas para provar que a compra que fez é nula, é preciso
que prove que o B não era o dono desse bem.

Então, se os dois estão de má-fé, há que aplicar o regime geral da nulidade da simulação, e
portanto, os vícios podem ser invocados e sendo invocados os vícios, far-se-á prova de que o
bem nunca tinha chegado a sair da esfera jurídica do A até ao momento em que ele o
transmitiu a B, pois se o negócio entre A e B era nulo e não produziu efeitos, logo, o negócio
entre B e C também não produziu efeitos, ou seja, A continuou a ser o dono, pois quando A
vendeu ou doou a D, vendeu ou doou um bem próprio e o negócio é válido.

Se estiverem os dois de má-fé, se for um conflito entre dois credores, ou entre o credor de um
e o simulador adquirente e o sub adquirente do outro, o raciocino da doutrina é exactamente
o mesmo, se são os dois credores, prevalecerá o credor do verdadeiro dono e o credor do
verdadeiro dono, é o credor do simulador alienante, precisamente porque o negócio era nulo,
logo, a propriedade não se transmitiu do simulador alienante para o simulador adquirente.
Portanto, se o credor do simulador alienante demonstrar que o negócio entre A e B era
simulado e consequentemente nulo, retira a base para que o C que é credor do B possa
penhorar o bem, porque o que a lei prevê é que o credor se possa fazer pagar pelos bens do
devedor e não por bens de terceiros, portanto, o C não pode fazer-se pagar por um bem do A,
mas pode fazer-se pagar pelo bem do B, mas se se provar que o bem não é do B, mas sim do A,
o C fica impossibilitado de penhorar o bem.

RESUMINDO:

Se for um conflito entre dois terceiros de má-fé, seja um conflito entre dois sub adquirentes,
seja um conflito entre dois credores, ou entre um credor e um sub adquirente, toda a doutrina
diz que prevalece aquele que pretende invocar a nulidade.

Exemplo:

Imaginemos que é um caso em que o D é o terceiro de boa-fé e o C é o terceiro de má-fé, e


num caso em que o C quando constituiu os seu direitos sabia perfeitamente que tinha havido
previamente um negócio simulado, enquanto que o D não sabia e neste caso ninguém duvida
que querendo D invocar o vício e sendo uma pessoa de boa-fé contra uma pessoa de má-fé,
pode obviamente invocar o vício, pois a lei não proíbe que se invoque o vício contra pessoas
de má-fé, pelo contrario, a lei até diz no artigo 243 nº 1 que o próprio simulador pode invocar

Serafim Cortizo 20100059 Página 73

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o vício contra terceiro de má-fé, mas o que diz é que “não se pode invocar o vício contra
terceiro de boa-fé”.

Se o simulador que é a pessoa de má-fé, pode apesar de a sua má-fé invocar o vício contra
terceiro de má-fé, por maioria de razão, um terceiro de boa-fé, pode invocar o vício contra um
terceiro de má-fé e além do raciocínio por maioria de razão, ainda haveria o raciocínio do
artigo 242 que diz que qualquer interessado pode invocar o vício, e o tal terceiro de boa-fé o D
não só era o interessado como também vai entrar em choque com uma pessoa de má-fé.

Então se o D nos exemplos anteriores fosse sempre a pessoa de boa-fé e o C em todos os


exemplos, fosse sempre a pessoa de má-fé, prevaleceria sempre o D, quer fosse um conflito
entre dois sub adquirentes, quer entre dois credores, quer entre o credor de um e o sub
adquirente do outro.

Agora, numa terceira situação, nestes exemplos todos inverter as situações e o terceiro de má-
fé e o D e o de boa-fé é o C, então aqui temos um terceiro de má-fé (D) que está querer
invocar o vício contra o C que está de boa-fé.

Neste caso, é de entender que havendo um conflito entre um terceiro de má-fé e um terceiro
de boa-fé, que é mais razoável que se proteja o terceiro de boa-fé baseando-nos no
argumento da interpretação extensiva do artigo 243 nº 1, porque este artigo diz que o
simulador não pode invocar o vício contra terceiro de boa-fé, mas se concluirmos que a razão
de ser da norma é impedir que quem agiu de má-fé possa invocar o vício contra quem agiu de
boa-fé, então se é essa a intenção do legislador, faz sentido pensar que tal como ele não quis
que o simulador não pudesse invocar o vício contra terceiro de boa-fé, também não terá
querido que um terceiro de má-fé, pudesse invocar o vício contra terceiro de boa-fé, porque o
terceiro de má-fé tem um ponto em comum com o simulador que é precisamente a má-fé e se
nós entendermos que o elemento teleológico do artigo 243 nº 1, que a razão de ser da norma
é a da tutela da pessoa, que de boa-fé confiou num negócio simulado, é protegê-lo face ao
terceiro que agiu de má-fé, e se a ideia é proteger a boa-fé contra a má-fé, então faz sentido
entender que o legislador certamente que terá querido que essa protecção se aplicasse
quando a pessoa que visse invocar o vício, não fosse o simulador mas que fosse uma pessoa
que na realidade deve ser equiparada ao simulador porque também está de má-fé. E por isso a
doutrina tem defendido, nomeadamente Castro Mendes, uma interpretação extensiva do
artigo 243 nº 1, de modo a, onde se lê que o simulador não pode invocar o vício contra um
terceiro de boa-fé, ler-se-á que o simulador e o terceiro de má-fé, não podem invocar o vício
contra terceiro de boa-fé.

Mas vamos ver que esta interpretação não era feita e que o terceiro de má-fé poderia invocar
o vício contra terceiro de boa-fé. Isso permitiria defraudar e contornar o artigo 243 nº 1, pois
se o terceiro de má-fé pudesse invocar o vício contra um terceiro de boa-fé seria fácil tornar o
artigo 243 nº 1 “letra morta”, porque vejamos, A vendeu simuladamente uma coisa a B, e
depois B transmitiu a C que estava de boa-fé, já vimos que o A não pode ir reclamar a coisa ao
C porque o A é o simulador e não pode ir invocar o vício contra terceiro de boa-fé.

Serafim Cortizo 20100059 Página 74

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TERCEIROS DE BOA-FÉ

TESE DE GALVÃO TELLES


Galvão Telles defende uma posição extrema que diz que havendo um conflito entre dois
terceiros boa-fé, deve sempre prevalecer o terceiro que confiou na aparência do negócio
simulado, nestes exemplos era o C.

Galvão Telles defende esta tese, porque no fundo ele alarga o âmbito do artigo 243 nº 1, o
raciocínio dele é o seguinte, o simulador não pode invocar o vício contra terceiro de boa-fé,
porque o terceiro de boa-fé confiou numa determinada aparência e merece ser protegido por
ter confiado naquela aparência e com base na ideia de que o artigo 243 nº decidiu proteger o
terceiro que confiou na aparência, no fundo o que Galvão Telles faz é alargar o âmbito do
artigo 243 nº 1 e concluir que esse artigo quer sempre proteger a pessoa que confiou na
aparência.

Mas esta tese parece criticável porque não se pode dizer que o espírito do artigo 243 nº 1 é
simplesmente proteger o terceiro porque confiou na aparência, é proteger o terceiro que
confiou na aparência em detrimento da pessoa que é o simulador, ou seja, a lei quer é
proteger o terceiro de boa-fé, se o conflito for com uma pessoa de má-fé, neste caso o
simulador, pois neste caso, parece que Galvão Telles vai demasiado longe quando com base na
ideia de que na situação coberta pela letra da lei, de facto o artigo 243 nº 1 quer proteger o
terceiro de boa-fé impedindo que contra ele seja invocado o vício, mas o facto impedir que o
simulador invoque o vício contra ele não é argumento para dizer que a lei também teria
querido que um terceiro de boa-fé invocasse o vício contra esse terceiro de boa-fé. Ou seja, na
tese de Galvão Telles ninguém pode invocar o vício contra um terceiro de boa-fé e o terceiro
de boa-fé tem sempre que ser protegido.

TESE DE ANTUNES VARELA, CASTRO MENDES E MENESES LEITÃO


Esta tese é oposta à de Galvão Telles e defende que, estando os dois de boa-fé, o caso deve ser
resolvido, no fundo, da maneira exactamente igual á que é resolvida quanto estão os dois de
má-fé com base nos princípios gerais da nulidade.

Objectivamente é um negócio simulado e objectivamente, o negócio é nulo, objectivamente a


nulidade pode ser invocada por qualquer interessado, logo, esta tese é dizer que face á lei,
sendo que é uma situação que não está prevista, mas se se começar a pensar quem é que
merece maior protecção, quanto á boa-fé, estão empatados não havendo um argumento para
achar que a confiança de um deve merecer maior protecção do que a confiança do outro,
então se a boa-fé não é decisiva como critério de desempate, então é de ir ver qual dos dois
terceiros se arroga do direito que deriva do verdadeiro titular, e nestes exemplos todos é
sempre o D porque em todos os exemplos, o direito que o D invocava era sempre um direito
que derivava do A (simulador alienante) ou porque ele era credor do simulador alienante, e á
luz do direito substantivo, o simulador alienante não tinha deixado de ser o dono do bem,
porque a venda simulada de A a B é nula, e o bem continua a ser do A, mas se o B transmitiu a
um terceiro C, esteja C de boa-fé ou não, o facto é que o segundo negócio também estava
ferido de ilegitimidade (doação ou venda de bens alheios) e em todos os exemplos vistos, à luz
do direito substantivo, por força da nulidade do negócio simulado que depois se contagia aos

Serafim Cortizo 20100059 Página 75

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actos seguintes, o A nunca tinha deixado de ser dono do bem, excepto quando transmitiu a D,
e portanto, podemos dizer que quando os dois terceiros estão de boa-fé, segundo esta tese,
numa situação destas, quanto à boa-fé estão em igualdade de circunstâncias, não há
argumento que justifique a boa-fé de um seja mais titulada que a boa-fé do outro, e portanto,
há que atender aos princípios gerais, que se formos a ver bem quem merece maior protecção,
o credor do verdadeiro dono ou o credor do falso dono?

Parece que é evidente, que se o bem vai ser penhorado, é mais justo que seja penhorado pelo
credor do verdadeiro dono do bem (A) do que ser penhorado pelo falso dono do bem.

TESE DE MOTA PINTO, CARVALHO FERNANDES


Esta é uma tese intermédia, em que defendem que não se pode decidir linearmente que no
caso da boa-fé que um terceiro merece sempre ser protegido, pois segundo esta tese, há que
atender a que merecem ambos igual tutela e atender a outros factores como por exemplo, no
caso de um conflito entre dois credores, saber qual foi o primeiro que foi a tribunal penhorar o
bem ou o primeiro que registou a penhora do bem, e nesta tese, havendo um conflito entre C
e D, em que são ambos credores, e estando os dois de boa-fé, aquele que prevalecerá será o
credor que em primeiro lugar, numa acção executiva obtiver a penhora do bem, então esta
tese, na pratica beneficiará o C, porque normalmente nestas situações o C era o primeiro a ir
adquirir o direito.

Há que conjugar o artigo 243 nº 1 com o artigo 291, porque ao confrontar o artigo 291 como
artigo 243 nº 1 poderá constatar-se que haverá algumas semelhanças entre as normas, porque
por exemplo, no artigo 291 é uma situação em que há um primeiro negocio inválido de A para
B e depois B transmite a C esse bem e foi visto que no caso do artigo 291, a questão que se
colocava era saber se a invalidade do primeiro negócio era ou não era oponível a terceiros,
sendo que foi visto que era oponível a terceiro, excepto se se verificarem todos os requisitos
do artigo 291, ser um bem registável, se o terceiro estava de boa-fé, adquirido a titulo
oneroso, ter registado antes da acção de invalidade, já terem passado três anos, neste caso,
bastava que faltasse um requisito para o terceiro de boa-fé já está sujeito que a invalidade
inicial lhe seja oposta.

Há autores que consideram que o artigo 243 nº 1 é uma norma especial face ao artigo 291, por
exemplo, Mota Pinto considera que, quando o primeiro negócio é um negócio simulado e
depois há uma subsequente transmissão a um terceiro, que nunca se aplica o artigo 291 mas
sempre o artigo 243 nº 1.

Exemplo:

Caso prático

A vende simuladamente a B e depois B transmite a C que está de boa-fé, será que o C ficou
dono do bem?

O C não fica dono do bem, porque apesar de os simuladores não poderem invocar o vício
contra o C, apesar de um terceiro de má-fé não poder invocar o vício contra o C, foi visto,
segundo uma das posições da doutrina, o terceiro de boa-fé pode invocar o vício contra o C, e
portanto, enquanto alguém puder invocar o vício contra o C, o C não pode afirmar que o bem

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é dele, porque o C está sempre em perigo face a um terceiro de boa-fé que surja em conflito
com ele, sendo que o entendimento dominante será o de que, é verdade que o artigo 243 nº 1
impede o simulador, ou um terceiro de má-fé, por interpretação extensiva de invocar o vício
contra terceiro de boa-fé, mas o C que é um terceiro de boa-fé só ficará mesmo dono do bem,
partindo do principio que é um bem registável, se estiverem reunidos a seu favor os requisitos
do artigo 291, que pela sua letra, aplica-se sempre que há um negócio inválido anulável, mas
para Mota Pinto, o artigo 291 aplica-se sempre que o primeiro negócio é nulo ou anulável,
excepto de for uma nulidade por simulação e nestes casos aplica-se o artigo 243 nº 1.

Mas o entendimento correcto parece ser o seguinte, no artigo 291 aplica-se sempre que esteja
em causa um primeiro negócio inválido e um bem registável e neste caso C só fica mesmo
dono do bem quando estiverem reunidos a seu favor os requisitos do artigo 291, porque se
não estiverem reunidos esses requisitos, C fica sempre à mercê de outro terceiro de boa-fé, e
quando se diz que o D prevalece sobre o C quando estão ambos de boa-fé, excepto se o C
puder invocar o artigo 291, porque aí o conflito já não estava a ser resolvido com base nas
regras da simulação, mas com base nas regras das inoponibilidades das nulidades a terceiros
de boa-fé quando o terceiro de boa-fé preenche certos requisitos.

Exemplo:

Caso prático

A vende simuladamente a B, B vende a C que está de boa-fé e depois o A passados uns anos
transmite a D.

Mesmo que fossem tentados a dizer que D face á luz da posição dominante, o D prevalece
porque adquiriu do verdadeiro dono, mas há que ter cuidado, porque quando o D adquiriu do
verdadeiro dono, até podia já entretanto o C ter reunidos a seu favor os requisitos do artigo
291, porque imaginemos que o negócio simulado foi no ano de 2003 de um bem registável, em
2004 o B vendeu a C (negócio oneroso, boa fé, o C registou) mas passados mais seis ou sete
anos, o A transmite a D, neste caso, é evidente que se o D vier a invocar a simulação com base
no argumento de que está de boa-fé, sujeita-se a que o C diga que já é dono do bem á luz do
artigo 291, sendo que não é de excluir a aplicação do artigo 291.

Portanto, aqueles que defendem que normalmente prevalece sempre o D, farão essa ressalva
do artigo do artigo 291, ou então a ressalva do “uso capião” porque por vezes uma pessoa
adquiriu um bem de um falso dono, mas teve o bem em seu poder o número de ano
suficientes para poder adquirir o bem por uso capião.

O DIREITO DE PREFERÊNCIA E SIMULAÇÃO


O direito de preferência, consiste no seguinte:

O direito de preferência pode resultar da lei ou pode resultar do negócio jurídico. Resulta da
lei quando há uma norma jurídica que dá direito de preferência a uma pessoa, por exemplo, há
uma norma legal que diz que se uma pessoa for arrendatária de um prédio urbano há mais de
três anos tem direito de preferência se o seu senhorio decidir vender o bem, pois há uma
norma legal que diz que quando há uma situação de co propriedade, em que há vários co
proprietários, cada um deles com uma percentagem de um bem, por exemplo, há dois co

Serafim Cortizo 20100059 Página 77

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proprietários, cada um deles tem 50 %, mas quando há vários co proprietários nenhum deles é
verdadeiramente dono da coisa, mas apenas dono da uma percentagem da coisa, e a lei prevê
que quando um co proprietário vende a quota, pode vender os seus 50 % e neste caso, os
outros co proprietários têm direito de preferência, excepto se um co proprietário vende a
outro co proprietário.

Por exemplo se existem três co proprietários, A, B e C, se o A quiser vender ao co proprietário


B, aí o C não tem direito de preferência porque é algo que se está a passar no grupo dos co
proprietários, mas se entre A, B e C e se A quiser vender a um chamado D exterior à
comunhão, os outros co proprietários têm direito de preferência.

Mas também pode acontecer que o direito de preferência possa ser constituído através de um
contrato que esse chama pacto de preferência.

Exemplo:

Eu sou dono de um bem e esta senhora tem o direito de preferência se eu decidir vender o
bem, mas não confundir preferência com promessa de venda, eu não lhe prometo que vendo,
eu não me estou a comprometer a vender, eu estou a comprometer-me, que se por acaso eu
vender primeiro consulto-a, e o direito de preferência que resulta de um contrato que cria o
direito de preferência, chama-se pacto de preferência. O direito de preferência tanto pode
resultar da lei, como pode resultar de um pacto de preferência, e portanto, eu posso por
acordo com outra pessoa dar-lhe preferência se eu vender um quadro, ou uma jóia ou uma
casa.

Por exemplo, se o meu senhorio tivesse celebrado comigo um pacto de preferência, eu não
teria que esperar os três anos previstos na lei para ter o direito de preferência, eu teria esse
direito mesmo que ao fim de quinze dias ele decidisse vender.

O direito de preferência não é o direito de adquirir a todo o custo, a lógica do direito de


preferência, é que se o dono do bem decidir transmitir a um terceiro e chegar a acordo com
um terceiro sobre o preço, antes de concretizar a venda a um terceiro deve dirigir-se ao
preferente e dar-lhe a possibilidade de exercer o direito de preferência e nestes casos, o
preferente tem oito dias para decidir.

Então dizemos que quando o preferente declara que quer preferir, ele vai comprometer-se a
dar aquilo que a doutrina chama, “o tanto pelo tanto”, ou seja, ele tem que dar ao dono do
bem a mesma quantia que o terceiro se disponibilizou a dar, pois a ideia é igualar a oferta e
em caso de igualdade de condições, é o preferente que fica com o bem.

Imaginemos então o seguinte caso:

Caso prático:

O A é dono de um prédio, o B é o arrendatário e já reside no prédio há mais de três anos, e já


tem direito de preferência de origem legal, e como o B tem direito de preferência, isso
significa que se o A decidir vender o bem a alguém depois de chegar a acordo sobre o
eventual preço, o A tem que se dirigir ao B, que é o preferente, e perguntar-lhe se ele quer

Serafim Cortizo 20100059 Página 78

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preferir dizendo-lhe quais são as condições de venda e o preço e o B se quiser prefere, se não
quiser não prefere.

Mas imaginem que o A não se dirigiu ao B e foi vender ao C, portanto, violou o direito de
preferência. Só que o A não só viola o direito de preferência, pois vende ao C sem consultar o
B, como ainda por cima, o A ao vender ao C, declarou na escritura pública 300 mil euros mas o
preço verdadeiro eram 500 mil euros e já sabemos o que pode levar o C a declarar 300 mil,
quando verdadeiro preço é 500 mil, a ideia é enganar o fisco, sendo uma simulação relativa
porque há um negócio simulado que é a venda por 300 mil que esconde o verdadeiro negócio
que é a venda por 500 mil.

Então temos uma simulação que é a venda de A a C, que neste caso é o simulador,
aparentemente por 300 mil que é declarado na escritura, mas por trás combinaram que era
por 500 mil, neste caso temos uma simulação relativa em que há um negócio simulado por 300
mil que esconde o verdadeiro negócio por 500 mil.

Em condições normais quando há uma simulação relativa diríamos que o negócio simulado é
nulo, e aplica-se ao dissimulado o regime que se aplica ao negócio feito às claras e se o negócio
às claras fosse por 500 mil, era válido só que ia pagar mais imposto.

Mas voltando ao exemplo, A é o dono do bem, o B é o arrendatário, que por acaso até tem o
direito de preferência por já lá está há mais de três anos, o A vende a C sem consultar o B, que
é uma violação do direito de preferência, mas noutra vertente, quando o A vende a C, além de
estar a violar o direito de preferência de B, ainda por cima celebrou um negócio simulado,
(simulação relativa), porque declarou um preço falso para enganar o fisco.

Então imaginem que quando o B descobre que foi violado o seu direito de preferência, o B
pode intentar uma acção de preferência contra o terceiro C, mas uma pessoa quanto intenta
uma acção de preferência tem que pagar o preço. E então o B intenta uma acção de
preferência e entrega os 300 mil euros que foi o valor declarado, mas na escritura publica
estão 500 mil euros, mas o A fica assustado porque o preço real são 500 mil, mas alega que
300 mil é o preço simulado pois o preço real são 500 mil e a lei diz que, segundo o A, o negócio
simulado por 300 mil é nulo e o que prevalece são os 500 mil, e imaginemos que o A diz isso ao
B, mas o B responde que o A não pode invocar contra ele a simulação porque o B é um terceiro
de boa-fé que desconhecia o negócio simulado e B alega que como é um terceiro de boa-fé, o
A não pode invocar contra ele o vício da simulação tendo em conta o artigo 243 nº 1 que diz
que, o simulador (A) não pode invocar a simulação contra terceiros de boa-fé, que neste caso é
o B, mas o A diz que o B tem que exercer o direito de preferência pelos 500 mil e não pelos
300 mil que era um preço falso, mas para que o A possa dizer isto, tem que demonstrar que
houve uma simulação, e neste caso o B alega que o A não pode invocar contar ele a simulação,
porque ele (B) ignorava que o A e o C tinham celebrado um negócio e ainda mais, um negócio
simulado, logo, o B alega que não lhe é oponível o vício da simulação, e portanto, quer preferir
por 300 mil.

E neste caso, a doutrina está dividia, sobre se se deve fazer a interpretação que está a fazer o
B, dizendo que não lhe é oponível a simulação e que ele pode preferir pelo valor do negócio

Serafim Cortizo 20100059 Página 79

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simulado, mas há autores que dirão que neste caso não se aplicará o artigo 243 nº 1 e que
deve prevalecer o valor real que está no negócio dissimulado que são os 500 mil.

A polémica surge devido a uma posição doutrinária, com a qual eu concordo, que é defendida
por Antunes Varela, Castro Mendes e Meneses Leitão que defendem que neste caso há que
aplicar o artigo 243 nº 1, sendo que objectivamente o B é um terceiro de boa-fé, e se está de
boa-fé não se lhe pode opor o vício da simulação, portanto, não podem vir demonstrar
perante ele que o negócio verdadeiro foi por 500 mil, porque para demonstrem que o negócio
foi por 500 mil têm que demonstrar que houve uma simulação e o artigo 243 nº 1 diz que não
é oponível a terceiros de boa-fé, sendo que o B tem toda a razão porque está de boa-fé e pode
preferir pelo valor declarado, porque para lhe poderem opor o valor oculto, é preciso invocar
contra ele a simulação, e a lei não admite o simulador possa invocar a simulação contra B que
é um terceiro de boa-fé.

Há outra posição defendida por outros autores como Meneses Cordeiro, Mota Pinto, Carvalho
Fernandes e Almeida e Costa, que dizem que neste exemplo não se aplica o artigo 243 nº 1,
pois segundo eles a razão de ser do artigo 243 nº 1 é a de impedir que um terceiro de boa-fé
seja prejudicado por um negócio simulado, pois é o que está contemplado no espírito da lei.

Mas já não faria parte do espírito da lei, não permitir que o terceiro de boa-fé obtenha um
benéfico ilegítimo á custa do simulador, porque o que eles dizem é que o objectivo da norma e
impedir que ele tenha um prejuízo mas não permitir-lhe que ele tenha um lucro, ou uma
vantagem indevida, e dizem estes autores que, neste caso é uma vantagem indevida porque
vai permitir ao individuo aproveitar-se do facto de a simulação que lhe poderia ser oposta de
comprar um bem por um valor inferior ao valor real, e neste caso eles dizem que o terceiro
não merece protecção porque o espírito do artigo 243 nº 1 é impedir que o terceiro de boa-fé
seja prejudicado e não é permitir-lhe que obtenha um enriquecimento que, segundo eles, seria
considerado injusto e ilegítimo.

Portanto, neste caso é fazer uma espécie de interpretação restritiva do artigo 243 nº 1, do que
é que se entende por terceiro de boa-fé e neste caso, entende-se por terceiro de boa-fé,
aquele que ignorava a simulação e que seria invocado pela invocação dela, mas já não se
considera, para estes autores, um terceiro de boa-fé aquele que ignorava a simulação mas que
a quer invocar para obter um beneficio, que caso contrário não obteria, mas á partida esta
tese não parece que tenha cobertura na letra da lei, sendo que esta tese é defendida
maioritariamente pela doutrina.

CASO PRÁTICO RESOLVIDO

A pai de B e de C pretendia vender um terreno seu a B por 100 mil Euros. Mas por recearem
que C não desse a autorização exigida no artigo 877 do Código Civil, A e B optaram por
celebrar um contrato de doação por escritura pública, acordando oralmente, sem que C
soubesse, que B teria mesmo teria mesmo que pagar a referida quantia a A.

Quid Juris?

Este caso prático tem a ver com a matéria da simulação.

Serafim Cortizo 20100059 Página 80

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Há aqui um negócio simulado que é uma doação prevista no artigo 240 nº 1 e neste caso há o
intuito de enganar terceiros, que neste caso é o filho C, tendo celebrado um acordo
simulatório, sendo que A e B estão de conluio, havendo uma divergência intencional entre A e
B entre a vontade e a declaração, tendo que se demonstrar a declaração que foi feita não
corresponde à vontade real dos simuladores e que foi feita intencionalmente uma declaração
que não corresponde á vontade real, sendo que A e B queriam realizar uma venda mas
declararam que era uma doação, havendo uma divergência intencional entre a vontade e a
declaração, porque A e B declararam um que doava e outro que aceitava a doação, quando na
realidade, nem A queria doar nem B queria receber uma doação, porque o que eles na
realidade queriam algo diferente, pois a sua vontade real era efectuar uma venda mas
declararam que foi uma doação.

Então dir-se-ia que há uma divergência entre a vontade e a declaração porque declararam
doar, quando a vontade real era vender, sendo que há um conluio entre o declarante e o
declaratário porque eles fizeram isso por acordo entre si e havia o intuito de enganar terceiros,
neste caso o C, assim sendo, o negócio é simulado (artigo 240 nº 1).

Depois de se demonstrar que é um negócio simulado nulo (artigo 240 nº 2) sendo uma
simulação relativa prevista no artigo 241, porque por detrás de um negócio simulado da
doação, esconde-se outro negócio dissimulado que é aquele que as partes efectivamente
quiseram celebrar que é uma venda, sendo neste caso uma simulação fraudulenta porque há o
objectivo de enganar e prejudicar o terceiro C (artigo 242 nº 1) pois pretendia-se frustrar o
direito de C, como outro filho que é, de se opor ou não á venda (artigo 877) e ao fingirem que
é uma doação estão a frustrar o direito que C teria em se opor, porque se a venda tivesse sido
feita á claras ele poder-se-ia opor, mas ao fazer uma venda encapotada ao fingir que é uma
doação, estão a impedir o C de exercer um direito que a lei lhe dá que é o direito de se poder
opor a vendas feitas pelos seus pais a irmãos seus e neste caso, é uma simulação fraudulenta.

Voltando à simulação, que sendo relativa, conclui-se que há dois negócios e neste caso tem
que se analisar os tais dois negócios quanto à sua validade.

Quanto á doação, é nula porque é simulada nos termos do artigo 240 nº 2, apesar de ter sido
feita por escritura pública, não havendo o vício de forma, mas sim o vício da simulação.

No negócio dissimulado, que é a venda, está em causa saber se a venda é válida ou inválida,
porque objectivamente o bem foi parar ao B à revelia do C, sendo que neste caso na venda,
que é um negócio formal porque respeita a forma exigida por lei, (escritura publica, artigo
875), sendo que o regime que a lei aplica ao negócio dissimulado que lhe corresponderia se
tivesse sido concluído sem dissimulação, ou seja, se tivesse sido feito às claras (artigo 241 nº
1). Mas se A tivesse vendido às claras a B, o negócio seria inválido e anulável nos termos do
artigo 877 nº 2, porque o C não autorizou a venda, porque a venda entre A e B foi feita
encapotadamente escondida por uma doação, sendo que a doação é nula por simulação, à
venda aplica-se o regime que lhe corresponderia se tivesse sido concluída sem dissimulação e
tem que se ir ver o que é que aconteceria se A tivesse simplesmente vendido a B nos termos
em que o fês, sendo que neste caso, faltaria a autorização do outro filho (C). E se A vendendo
às claras a B é anulável, (artigo 877 nº 2), é á mesma anulável tendo sido feita às escondidas,
pois o facto de estar escondido não apagou o vício.

Serafim Cortizo 20100059 Página 81

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Então dir-se-ia que no negócio a doação é nula por ser simulada, a venda é anulável pela
violação do artigo 877 nº 2, mas se houver um vício de forma esta venda será nula e neste caso
o vício mais grave absorve o menos grave, pois quando o negócio e simultaneamente nulo e
anulável e então não produz efeitos, pois a venda, sendo um negócio formal porque o artigo
875 exige escritura publica ou documento autenticado e quando o negócio dissimulado é
formal, só é valido se respeitar a forma, e portanto, poderia haver uma situação em que
independentemente da anulabilidade por falta de autorização, subsiste um problema que é
saber se afinal o vício não será ainda mais grave e se não haverá uma verdadeira nulidade.

Chegados a este ponto temos uma doação simulada por escritura publica, que esconde uma
venda que é o negócio dissimulado e o acordo que foi feito por trás, combinado que não era
uma doação mas sim uma venda, o acordo em que se consubstancia o chamado acordo
simulatório, o que nos permite concluir que não há uma doação, mas sim uma venda, foi o
acordo oral feito por trás, mas que foi dito que teria que ser pago o preço e neste caso o
negócio que se transmite contra um preço chama-se venda que consubstanciada por um
acordo oral prévio entre A e B onde disseram que seria pago o preço.

Conclui-se que a doação é nula por ser simulada, mas já foi visto que a venda é anulável e
neste caso é que surgem as opiniões divergentes da doutrina e neste caso Mota Pinto diria que
o negócio era nulo porque as declarações que revelam a vontade de vender foram feitas por
trás e essas declarações feitas por trás, são aquelas a que a doutrina chama de contra
declarações, porque vêm contradizer o que foi dito às claras. Ou seja, às claras diz-se que é
uma doação e por detrás contariam o que foi dito às claras, e neste caso, no tal acordo
simulatório, aquelas declarações feitas por trás e que traduzem a verdadeira vontade, elas são
simultaneamente contra declarações, no sentido em que vêm contradizer aquilo que foi dito
às claras que foi o tal acordo oral em que se combinou uma doação e que às escondidas se
pretendia fazer uma venda e que tinha que se pagar o preço.

O que Mota Pinto defendia é que, se a lei exige escritura publica ou documento autenticado
para a venda, então têm que ser aquelas declarações que traduzem a vontade de vender que
tem que ser por escritura publica ou por documento autenticado e neste caso as declarações
que traduzem a vontade de vender, foram aquelas que foram feitas por trás, mas que foram
feitas oralmente, então conclui-se que são nulas por vício de forma e para Mota Pinto não
interessa que a doação tenha sido feita por escritura publica, mas o que interessa não é a
escritura publica da doação, mas sim a da venda e aqui neste caso o negócio dissimulado seria
nulo por vício de forma e segundo a tese de Mota Pinto, teria que dizer-se que o negócio é
anulável pela violação do artigo 877 e por acréscimo, á luz desta posição, seria formalmente
nulo.

Mas ainda há outra posição antagónica defendida por Antunes Varela e Castro Mendes, em
que vem dizer que o que conta é que o negócio dissimulado pode aproveitar ao simulado a
forma que foi usada no negócio simulado, sendo que o raciocínio é o seguinte, para cumprir o
artigo 241 nº 2 e para se considerar que foi respeitada a forma que a lei exige para o
dissimulado, não é necessário que as contra declarações sejam por essa forma, basta que no
negócio simulado que se está a esconder, tenha sido respeitada a forma que a lei exige para o
dissimulado que neste caso, é a escritura publica ou documento autenticado, sendo que a

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forma utilizada na doação foi a escritura publica, sendo que a forma usada no negócio
simulado é uma forma que de per si seria suficiente também para o dissimulado e estes
autores entendem que o artigo 241 nº 2, que seria inaplicável na tese de Mota Pinto, eles
acham que o espírito da lei é salvar os negócios dissimulados, porque basta que no simulado
tenha sido usada a forma que tenha sido suficiente para o dissimulado.

Neste caso, segundo Mota Pinto, se se entender que a forma tem que ser respeitada nas
contra declarações o negócio dissimulado seria nulo porque foi oral e deveria ter sido por
escrito (escritura publica e documento autenticado), se se entender que forma do simulado
aproveita o dissimulado, como na doação foi usada escritura publica que é a forma mais do
que suficiente para aquela venda, então não haverá vício de forma.

Mas há uma posição intermédia que diz que a forma do simulado só aproveita ao dissimulado,
quando o simulado contém os elementos essenciais do dissimulado e aqui a doutrina também
se divide porque Oliveira Ascensão acha que a doação contém os elementos essenciais da
venda, porque a forma da doação não pode aproveitar á venda porque há um elemento
essencial da venda que não estava contido na doação que é a referência ao preço e então,
naqueles que defendem esta tese intermédia, dirão que a forma do simulado só aproveitaria
ao dissimulado naqueles casos em que o simulado contém os elementos essenciais do
dissimulado, mas quando há uma doação a esconder uma venda, o elemento essencial da
venda que é o preço não constaria da doação.

Aula 14

A FIGURA DA RESERVA MENTAL – ARTIGO 244


Artigo 244 nº 1 “há reserva mental, sempre que é emitida uma declaração contrária à vontade
real com o intuito de enganar o declaratário”.

Artigo 244 nº 2 “a reserva não prejudica a validade da declaração, excepto se for conhecida do
declaratário; neste caso, a reserva tem os efeitos da simulação”

O nº 1 do artigo 244 diz que há reserva mental sempre que é emitida uma declaração
contrária á vontade real com o intuito de enganar o declaratário. A primeira constatação é de
que na reserva mental, tal como acontece na simulação, existe uma divergência intencional
entre a vontade e a declaração, pois aqui na reserva mental tal como na simulação, encontra-
se um ponto em comum que é o facto de entre as duas figuras haver uma divergência
intencional entre a vontade e a declaração, ou seja, na reserva mental, tal como na simulação
o declarante vai voluntariamente emitir uma declaração que ele sabe não corresponder á
sua vontade real, e portanto, propositadamente, aquilo que ele vai declarar não é o que ele
quer, havendo, portanto, uma divergência intencional entre a vontade e a declaração.

A partir daqui há diferenças face ao regime da simulação, pois na reserva mental não há
nenhum conluio entre o declarante e o declaratário, pelo contrário, o objectivo da reserva
mental é o declarante enganar o declaratário, pois aqui na reserva mental não se pretende
enganar terceiros, mas sim enganar o declaratário.

Serafim Cortizo 20100059 Página 83

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No nº 2 do artigo 244 diz-se que “a reserva não prejudica a validade da declaração”, e isto é
importante, porque no fundo, o que a lei está a dizer é que, o facto de haver reserva mental
não torna a declaração inválida, ou seja, a lei não declara a reserva mental como uma causa de
invalidade de um negócio jurídico, pois em principio, é certo que na parte final do nº 2 já se
abre uma excepção, mas em principio, se alguém agir com reserva mental a sua declaração
não vai ser considerada inválida, pelo contrario, o declarante vai ficar amarrado á declaração
que proferiu, porque se a lei dissesse que quando há reserva mental a declaração é inválida,
deixava de haver segurança na medida jurídica, pois qualquer pessoa celebrava um negócio
jurídico e depois dizia que não queria, disse que comprava mas não quer comprar e como é
evidente, a lei nunca poderia vir dizer que quando há reserva mental a declaração é inválida,
pois se o dissesse, então quando celebrasse-mos um negócio com outra pessoa, estaríamos
sempre na duvida se a pessoa estando a agir com reserva mental e passados uns minutos, ou
umas horas depois vir arguir uma invalidade.

A lei, em homenagem á necessidade que há de segurança jurídica e de confiança na vida


jurídica, o que a lei no fundo vem dizer é que se houver reserva mental e se o declarante quer
enganar o declaratário fazendo uma declaração que não corresponde á sua vontade real, na
realidade, o grande enganado é o próprio declarante porque ficava amarrado a declaração que
fês e só não será assim, se o declaratário se tiver apercebido dessa divergência entre a vontade
e a declaração, porque se o declaratário, o destinatário da declaração, aquele a quem se quis
enganar se se tiver apercebido que está a ser enganado e mesmo assim celebrar um negócio
jurídico fazendo-se de despercebido, ele aí já não mercê protecção porque ele aí sabia que a
declaração do outro não correspondia á sua vontade real, e aí já não se pode dizer que há uma
confiança do declaratário que precisava de ser tutelada, pois a protecção do declaratário, é
admitindo que ele não sabia ou não se apercebeu que o estavam a querer enganar, pois se ele
se apercebesse, não celebraria o negócio, pois o que a lei vem dizer, é que se por acaso o
declaratário se apercebeu dessas divergências, ou porque o declarante não foi muito hábil na
maneira de o tentar enganar, ou porque o declaratário era muito astuto, ou porque alguém
preveniu o declaratário que o declarante estava a tencionar fazer uma declaração para o
enganar, mas se aquilo que na reserva mental se conseguir provar que o declaratário se
apercebeu na altura do negócio que a declaração não correspondia à vontade real, então diz a
2ª parte do nº 2 do artigo 244 que nesse caso a reserva mental já produz os efeitos da
simulação e ao produzir os efeitos da simulação, nesse caso significa que a declaração será
nula tal como a lei prevê no nº 2 do artigo 240, em que o negócio simulado é nulo e
produzindo os efeitos da simulação, se subsequentemente houver um negócio com terceiros,
tal como a simulação não pode ser oposta a terceiro de boa-fé pelos simuladores, também
uma declaração com reserva mental, admitindo que é nula, também não pode ser oposta a
terceiro de boa-fé.

Exemplos:

Um clube de futebol não está verdadeiramente interessado em contratar um certo jogador,


mas não quer que vá reforçar a concorrência, pois como todos os anos há dois momentos em
que o mercado está aberto e em que é possível celebrar contratos e depois passando essa
data, tal já não é possível.

Serafim Cortizo 20100059 Página 84

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Imaginemos que um clube que não quer que um jogador mas que receia que vá para a equipa
rival, celebra com esse jogador um contrato de trabalho, mas o clube está com reserva mental,
pois apenas quer enganar o jogador e quando se chegar à data do fecho das inscrições dizer
que já não quer o jogador, porque a partir da data limite das inscrições já não se pode
inscrever esse jogador e ele já não pode reforçar a equipa rival.

Imaginemos que a ideia foi essa, e o clube celebrar um contrato promessa de trabalho com
esse jogador e depois quando já não houver o risco de ir jogar para a equipa rival diz-se ao
jogador que de facto o clube não o queria, e isso seria um negócio feito com reserva mental,
pois o clube não tinha qualquer intenção de o recrutar tratando apenas de o enganar e
impedir que fosse jogar na equipa rival, e neste caso a reserva mental é dizer que se lhe dá
trabalho para depois á posteriori o declarante vir dizer que tal contratação não correspondia á
vontade real do clube.

Mas neste caso, o tal clube se agisse assim, na prática acabaria por ficar amarrado ao contrato
que tinha celebrado, pois não pode à posteriori vir dizer que não se queria contratar o jogador
e que tinha sido só para evitar que ele fosse reforçar o clube rival, e isso não é motivo jurídico,
por que lei diz que a reserva mental não prejudica a validade não ser que se prove que o
declaratário se apercebeu que o declarante não tencionava cumprir o contrato porque nesse
caso o declaratário já não merece qualquer protecção especial.

Exemplo:

Eu tenho um vizinho que está empoleirado numa janela e que se quer suicidar devido a uma
série de problemas pessoais, entre os quais o facto de ter perdido o emprego, e eu digo
generosamente que lhe arranjo trabalho, mas eu no fundo, não lhe quero arranjar um
emprego eu quero apenas impedir que ele salte da janela e se suicide, mas neste caso eu
tenho que ser convincente porque se ele descobrir que eu estou a mentir suicida-se na
mesma.

Mas depois, imaginemos, que passados uns tempos ele vem ter comigo para lhe arranjar
trabalho no meu estabelecimento e eu digo que não lhe tencionava arranjar emprego e foi só
para evitar que ele se suicidasse, e imaginemos que ele ia para tribunal e invocava a primeira
parte do artigo 244 nº 2, dizendo que a reserva não prejudica a validade da declaração, pois eu
naquele caso agi com reserva mental e o facto é que ele não se apercebeu da reserva, e
portanto, á partida face á letra da lei eu estaria vinculado á promessa que lhe fiz de arranjar
emprego, apesar de o ter feito por uma boa causa e num caso destes.

DECLARAÇÕES NÃO SÉRIAS – ARTIGO 245


Artigo 245 nº 1 “a declaração não séria, feita na expectativa de que a falta de seriedade não
seja desconhecida, carece de qualquer efeito”.

Artigo 245 nº 2 “se, porém, a declaração foi feita em circunstâncias que induzam o
declaratário a aceitar justificadamente a sua seriedade, tem ele o direito de ser indemnizado
pelo prejuízo que sofrer”.

As declarações não sérias, também são casos em que existe uma divergência intencional
entre a vontade e a declaração, tal como na simulação e na reserva mental, mas a grande

Serafim Cortizo 20100059 Página 85

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diferença face á reserva mental cujo objectivo era enganar o declaratário, aqui nas
declarações não sérias, apesar de a pessoa voluntariamente e deliberadamente, emitir uma
declaração que não corresponde á sua vontade real, aquele que profere uma declaração não
séria não tem o intuito de enganar quem quer que seja, pois não pretende enganar terceiros,
nem sequer pretende enganar o declaratário aqui é que está a diferença face á reserva
mental, porque a lei diz que a declaração não séria caracteriza-se pelo facto de o declarante
estar convencido que o declaratário vai perceber que ele não está a falar a sério, pois a lei diz
“na expectativa de que a falta de seriedade não seja desconhecida”, ou seja, na declaração não
séria, o declarante emite uma declaração que não corresponde à sua vontade real, pois ele
está convencido que o declaratário perceberá que ele não está a falar a sério e que na
realidade ele não quer aquilo.

Na reserva mental o declarante quis enganar, na declaração não séria, o declarante não quer
enganar o declaratário e então poderá perguntar-se, se não quer enganar terceiros nem
enganar o declaratário, por que razão há-de emitir uma declaração que não corresponde à sua
vontade real? Isto conduz-nos às várias modalidades que a doutrina distingue como
declarações não sérias:

1) Declarações jocosas.
2) Declarações cénicas.
3) Declarações didácticas
4) Algumas declarações publicitárias.

DECLARAÇÕES JOCOSAS
Por vezes uma pessoa na brincadeira diz algo que não corresponde á sua vontade real, mas diz
no gozo convencido que o interlocutor vai perceber que ele está na brincadeira, e isto tanto
pode acontecer em declarações negociais como em declarações não negociais, pois aí muitas
vezes depende do próprio contexto, se a pessoa diz aquilo a rir ou com um ar sério, e portanto,
há casos em que as pessoas na brincadeira declaram algo que pode aparentemente parecer
uma declaração negocial mas sem terem qualquer propósito de celebrarem um negócio
jurídico e convencidos que o interlocutor perceberá que ele não está a falar a sério, pois há
declarações que são feitas na brincadeira e em que o declarante está convencido que o
declaratário vai perceber que ele está na brincadeira, mas até pode acontecer que o
declaratário pense que ele está a falar a sério, mas se se provar que o intuito era o da
brincadeira e que o intuito não era enganar, mesmo que se engane, considera-se que é uma
declaração não séria e nesse caso será ineficaz ao contrario da declaração sob reserva mental
que em principio é válida e eficaz e em principio vincula o declarante, enquanto que a
declaração não séria, a lei diz que carece de efeitos não criando relações jurídicas nem direitos
nem obrigações.

DECLARAÇÕES CÉNICAS
São aquelas declarações que são proferidas, por exemplo, durante um filme ou uma
telenovela, ou no palco de uma peça de teatro, e imaginemos que numa peça de teatro
perante milhares de pessoas que estão a assistir, o actor tal celebra em pleno palco um
contrato com actor tal, neste caso, é evidente que não passa pela cabaça do actor que o outro

Serafim Cortizo 20100059 Página 86

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leve a sério que durante a representação se um disse que lhe vendia um quadro o outro vir
dizer que, havendo milhares de pessoas que assistiram á peça e ouviram dizer que vendia, ou
uma dizer que prometeu outra em casamento, mas que isso não é verdade porque é apenas
uma peça de teatro.

É evidente que uma pessoa que está a representar um papel, pode dizer que quando emite a
sua “deixa” está na expectativa que a outra pessoa perceberá entre a realidade e o papel que
se está a representar por muito realista que seja e isso seriam declarações cénicas.

DECLARAÇÕES DIDÁCTICAS
Por exemplo, eu já vendi o meu relógio várias vezes nas aulas, mas vendi para exemplificar
explicações que eu estava a dar, mas um aluno pensava que eu estava a sério e vinha-me
depois comprar o relógio, mas toda e qualquer proposta feita nas aulas é feita com o intuito de
explicar a matéria e não passa pela cabeça do declarante que o interlocutor está a levar a coisa
a sério e aproveitar a oportunidade para celebrar um negócio jurídico.

Portanto, estes casos de declarações jocosas, cénicas e didácticas são situações que podem
explicar porque é que uma pessoa vai declarar algo que não corresponde á sua vontade, mas
também tem que haver um motivo e se não é para enganar terceiros, se não é para enganar o
declaratário, pode ser pelo prazer da brincadeira, ou porque há um papel a representar, ou
porque há uma matéria a demonstrar numa aula.

DECLARAÇÕES PUBLICITÁRIAS
Também se pode admitir que certas declarações publicitárias sejam declarações não sérias,
mas é preciso ter cuidado, porque certas empresas pretendem desvincular-se de certas
promessas publicitárias que fazem, pois se se diz que um computador tal tem X de memória,
ou se se diz num anuncio que um carro tal atinge a velocidade tal, isto não pode ser visto como
declarações não sérias e parte-se do principio que essa empresa não fica vinculada ao
conteúdo das suas próprias mensagens publicitárias, mas quando há publicidade em que se vê
um carro a voar, é evidente que são exageros publicitários que não passa pela cabeça de
ninguém que alguém acredite que o carro consegue voar, sendo que a publicidade é
vinculativa, mas há um certo tipo de publicidade que pelo seu exagero e pelo seu carácter
totalmente irrealista, percebe-se que o objectivo não passa pela cabeça do publicitário que
quem ouça ou veja aquele anuncio acredite que se está a falar a sério.

Portanto, a ideia é;

Tanto na reserva mental como na declaração não séria, alguém emite uma declaração que não
corresponde à sua vontade real e em ambos os casos, essa divergência entre a vontade e a
declaração é voluntária, pois na reserva mental uma pessoa declara algo que voluntariamente
não corresponde á sua vontade real, e nas declarações não sérias, também voluntariamente
uma pessoa declara algo que não corresponde á sua vontade real, a grande diferença tem a
ver com a motivação e com a intenção, pois na reserva mental quer-se enganar o declaratário,
quer tenha conseguido enganar quer não, porque na reserva mental a coisa tem que ser vista
pela óptica do declarante, se quis ou não quis enganar e se quis, é reserva mental.

Serafim Cortizo 20100059 Página 87

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Depois há que saber se o declaratário foi enganado. Se foi enganado, a declaração é válida,
mas se o declaratário se apercebeu da reserva, já foi visto que é nula.

Nas declarações não sérias, o problema coloca-se nos mesmos termos, pois para a declaração
não ser ineficaz basta que se consiga provar que não se quis enganar, mas se não queria
enganar e enganou, é á mesma uma declaração não séria e aplica-se á mesma o nº 1 do artigo
245 e a declaração não produz efeitos, portanto, mesmo que o declarante tenha enganado
não fica amarrado á declaração.

No entanto, se é um caso em que enganou e o juiz concluir que a maior parte das pessoas
também seria enganada, porque aquilo foi feito de uma maneira tão pouco evidente que é
normal que a maior parte das pessoas acredita-se naquela declaração, então se isso acontecer
aplica-se o nº 2 do artigo 245 que diz “se, porém, a declaração foi feita em circunstâncias que
induzam o declaratário a aceitar justificadamente a sua seriedade, tem ele o direito de ser
indemnizado pelo prejuízo que sofrer”.

Mas note-se, o nº 2 não diz que nestes casos afinal a declaração produz efeitos, pois uma
declaração não séria nunca produz efeitos, quer tenha enganado, quer não, quer tenha sido
feita em circunstâncias em que era normal enganar, quer não, desde que se prove que não
houve o intuito de enganar ela não produz efeitos, pois não cria, modifica ou extingue relações
jurídicas sendo uma nulidade ou uma ineficácia originária, ou até uma verdadeira inexistência
jurídica, pois segundo Oliveira Ascensão, numa declaração não séria ela seria juridicamente
inexistente, pois ele baseia-se no conceito de negócio jurídico, onde tem que haver vontade e
aqui neste caso, aquela pessoa não tem qualquer vontade de celebrar um negócio, nem
sequer de emitir uma verdadeira declaração negocial, pois a única vontade que houve foi de
dizer aquelas palavras ou fazer aqueles gestos, mas na declaração não séria, não há qualquer
vontade de produzir efeitos jurídicos, nem sequer vontade de que uma conduta valha como
declaração negocial, sendo discutível se é nulo ou inexistente, pois a lei diz apenas que não
produz efeitos, pois quando a lei quer dizer que é nulo, di-lo expressamente e também quanto
á inexistência quando a lei quis qualificar um negócio como inexistente fê-lo, mas neste caso
há uma conduta voluntária e há um mínimo de vontade, sendo que somos mais inclinados
para dizer que é uma ineficácia originária e não propriamente uma inexistência jurídica.

Portanto, como foi visto, quer na simulação, quer na reserva mental, quer nas declarações não
sérias, encontramos um ponto em comum pois neste três casos há uma divergência
intencional entre a vontade e a declaração, mas depois há uma série de diferenças. Na
simulação quer-se enganar terceiros e há conluio entre o declarante e o declaratário. Na
reserva mental quer-se enganar o declaratário. Na declaração não séria não se quer enganar
ninguém e obviamente que a gravidade das condutas vai diminuindo e no caso da declaração
não séria, a lei entende que a única consequência desfavorável poderá ser aquela que vem no
nº 2 do artigo 245 em que a pessoa tem que indemnizar a outra em certos casos, mas nunca
ficar amarrado á declaração que proferiu.

Serafim Cortizo 20100059 Página 88

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Aula 15

ARTIGO 246 – VÍCIO DA FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO / VÍCIO DA


COACÇÃO FÍSICA

FALTA DE CONSCIÊNCIA DA DECLARAÇÃO


Artigo 246 “a declaração não produz qualquer efeito, se o declarante não tiver a consciência de
fazer uma declaração negocial ou for coagido pela força física a emiti-la; mas, se a falta de
consciência da declaração foi devida a culpa, fica o declarante obrigado a indemnizar o
declaratário”.

Neste caso está-se a imaginar um cenário em que alguém tem uma conduta, seja por palavras
ou por gestos que o próprio não interpreta como sendo uma declaração negocial, pois não tem
qualquer intuito de produzir uma declaração negocial, nem tem a consciência que aquelas
palavras e aqueles gestos vão ser interpretados como uma declaração negocial, só que o
problema é que de facto, naquele local, perante aquelas pessoas, aquela conduta vai ser
interpretada como sendo uma declaração negocial, como sendo a manifestação de uma
vontade jurídica, quando na realidade a pessoa que teve a conduta, não só não queria celebrar
qualquer negócio jurídico, como nem sequer tinha consciência de que os seus gestos e as duas
palavras iriam ser interpretados objectivamente como configurando uma manifestação de
vontade negocial.

Exemplo:

Na Alemanha num leilão de vinhos, as pessoas sempre que queriam fazer uma proposta
superior á proposta anterior levantavam o braço e estava estipulado que sempre que sempre
que um dos assistentes do leilão levantava o braço que isso significava que ele estaria a
oferecer mais dinheiro. Havia um individuo que não estava a par disso e que estava presente
no leilão e esse individuo a certa altura viu chegar um amigo e levantou o braço para o
chamar, só que o azar dele é que mais ninguém levantou o braço a seguir e as pessoas que
estavam naquela sala consideraram que ele tinha acabado de fazer a licitação mais alta e que
era ele que tinha comprado o vinho e que tinha que o pagar, pois quando vieram ter com ele
para lhe entregar o vinho exigindo pagamento, ele alega que não comprou vinho nenhum, mas
foi-lhe dito que o tinha feito porque tinha manifestado essa intenção levantando o braço,
sendo que ele alega que não fazia a mínima ideia que o gesto de levantar o braço tinha esse
significado negocial, pois diz que levantou o braço para chamar um amigo que viu á porta da
sala.

Neste caso, apesar de a conduta ter sido voluntária, quando foi levantado o braço não havia a
intenção nem o propósito de celebrar qualquer negócio jurídico, nem sequer o propósito de
emitir qualquer declaração negocial, nem sequer a consciência de que aquele seu gesto,
naquele contexto iria ser interpretado que valia como declaração negocial, e depois o
ordenamento jurídico alemão criou a figura jurídica que se chamava “a falta de consciência da
declaração”, dizendo que se uma pessoa tiver uma conduta, seja através de palavras ou
gestos, que objectivamente consubstancia uma declaração negocial, mas que para o próprio
não tinha esse significado, porque ele nem sequer tinha consciência que aquela sua conduta

Serafim Cortizo 20100059 Página 89

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valia como manifestação de vontade negocial, então entendeu que não era justo nem razoável
amarrar aquela pessoa às consequências jurídicas de uma conduta, é certo, voluntária, mas á
qual ela não associava qualquer significado negocial e é isso que diz a lei no artigo 246, que a
declaração feita sem consciência, ela carece de qualquer efeito.

Nestes casos, (artigo 246), a lei diz que a declaração não produz quaisquer efeitos. No entanto
na parte final diz-se que “se a falta de consciência da declaração foi devida a culpa, fica o
declarante obrigado a indemnizar o declaratário”, ou seja, pode acontecer que a pessoa
tenha tido falta de consciência na declaração por alguma negligência da sua parte mas que
tinha tido a obrigação de ter sido mais atento às regras que estavam a ser explicadas as
pessoas que estavam presentes (exemplo do leilão dos vinhos). Então, se se demonstra que
aquela pessoa que já provou que houve falta de consciência da sua parte, e se se demonstrar
que essa falta de consciência se deveu a culpa sua, ainda assim a lei não diz que aquele
negócio jurídico é ineficaz, ele é sempre eficaz e produz efeitos, mas tem que se provar que
por culpa do tal declarante, como diz o artigo 246, o declarante fica obrigado a indemnizar o
declaratário se daí resultarem danos para o declaratário.

Importa distinguir falta de consciência da declaração da incapacidade acidental (artigo 257)


que são figuras distintas porque as consequências jurídicas são radicalmente distintas, pois se
houver falta de consciência na declaração, ela não produz qualquer efeito e na prática não vai
criar direitos nem obrigações enquanto que se houver uma incapacidade acidental, o vício gera
uma anulabilidade e neste caso o negócio é eficaz até ser anulado e pode até nunca vir a ser
anulado.

Recordando o artigo 257, “a declaração negocial feita por quem, devido a qualquer causa, se
encontrava acidentalmente incapacitado de entender o sentido dela ou não tinha o livre
exercício da sua vontade é anulável, desde que o facto seja notório ou conhecido do
declaratário”. Como já foi visto há exemplos clássicos de aplicação do artigo 257, tal como nos
casos em que alguém celebra um negócio jurídico estando embriagado, ou estando drogado,
ou no decurso de uma crise de loucura passageira etc. portanto, há determinadas situações
em que a pessoa não está no pleno gozo das sua faculdades mentais e nestes casos, a lei
admite que o negócio possa ser anulado mas é preciso que se verifiquem vários requisitos,
alguns deles têm a ver com o próprio declarante e outros têm a ver com o declaratário.

É evidente que para uma pessoa anular um negócio com base no artigo 257, a primeira cosa
que vai ter que demonstrar é que quando celebrou o negócio e quando fez a sua declaração
estava numa situação de incapacidade acidental, mas isso não chega para anular o negócio
porque a lei exige um requisito que tem a ver com o declaratário, porque a lei diz que é preciso
para anular o negócio uma de duas coisas, ou que o declaratário se tivesse apercebido da
incapacidade acidental, ou então, se não se apercebeu tem que se demonstrar que essa
incapacidade era notória e evidente, e se o declaratário não se apercebeu é porque foi pouco
diligente, portanto, isto é o que quer dizer a parte final do nº 1 do artigo 257, quando diz que é
preciso que o facto (a incapacidade seja notória) ou conhecida do declaratário.

Portanto, uma pessoa que celebrou um negócio jurídico sob incapacidade acidental, mesmo
que prove ao juiz que houve incapacidade acidental, vai ter que provar outra coisa que é
comprovar que o declaratário se apercebeu ou provar, que apesar de o declaratário não se ter

Serafim Cortizo 20100059 Página 90

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apercebido, que deveria ter-se apercebido porque a incapacidade era notória, saltava á vista e
era susceptível de ser conhecida, portanto, estes são os requisitos da incapacidade acidental
previstos no artigo 257.

Mas pode haver situações que estejam na fronteira entre a incapacidade acidental e a falta de
consciência porque, tendo em conta que existe um conceito que é a falta de consciência da
declaração, isso também é uma pista para circunscrevermos o conceito de incapacidade
acidental, pois não podem existir conceitos de incapacidade acidental que se apliquem a casos
em que o declarante nem sequer tem consciência do que é que está a fazer pois não é de
excluir que haja um individuo que esteja de tal modo bêbado, ou de tal modo drogado, que
nem sequer se aperceba que as suas palavras ou os seus gestos configuram uma declaração
negocial e se nem sequer se apercebeu disso não há incapacidade acidental neste caso é mais
grave que é a falta de consciência na declaração.

Na incapacidade acidental, para além da incapacidade acidental, tem que ser uma situação em
que obviamente há uma falta de discernimento, mas pelo menos a pessoa tem consciência de
que está a fazer uma declaração negocial, mas note-se, tudo isto não é invalidade pelo facto
de a pessoa celebrar um negócio bêbada e a seguir já não se lembra, o que interessa é que no
momento em que celebrou um negócio, tivesse a consciência da sua declaração. Portanto, em
princípio um individuo que celebra um negócio bêbado será um caso de incapacidade
acidental, mas se se demonstrasse que por causa do álcool a pessoa naquele momento já
estava numa situação em que já não percebia o que estava a fazer, aí a situação já é de tal
modo grave, que se se demonstrar que não tem consciência da sua declaração, não é o artigo
257 que responde ao caso, será o artigo 246.

A COACÇÃO FÍSICA
O artigo 246 também prevê o vício da coacção física e a lei diz que quando há coacção física, a
declaração não produz quaisquer efeitos, portanto, um negócio sob coacção física, não cria
direitos e obrigações, não constitui nem modifica relações jurídicas.

Aqui a questão chave é distinguir a coacção física da coacção moral, porque a coacção física
vem no artigo 246 e quando ela existe o negócio não produz quaisquer efeitos, mas existe
outra figura que á a coacção moral que vem nos artigos 255 e 256 e quando existe coacção
moral, a consequência jurídica é bem diversa pois nos casos da coacção moral o negócio é
apenas anulável, a coacção moral gera anulabilidade, ao passo que a coacção física gera uma
absoluta ineficácia.

É absolutamente essencial distinguir coacção física de coacção moral, por causa das próprias
consequências jurídicas, mas essa distinção nem sempre é evidente contrariamente ao que se
poderia pensar, porque há primeira vista uma pessoa que se agarra-se apenas ao sentido
literal das palavras, “se um individuo é ameaçado é coacção moral, se há constrangimento
físico é coacção física”, pois esta frase poderia ser muito lógica só que está errada pois a maior
parte dos casos em que há constrangimento físico estamos perante coacção moral e por isso é
que é difícil explicar a alguém porque é que nas situações em que há verdadeiras agressões
físicas, não se chamam agressões físicas, mas sim coacção moral.

Serafim Cortizo 20100059 Página 91

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Conceito de coacção física:


Dizemos que há coacção física quando a vontade do declarante é totalmente suprimida sendo
ele um mero instrumento, um mero autómato nas mãos do coactor.

Conceito de coacção moral:


Na coacção moral a coacção traduz-se numa ameaça ilícita ou então num constrangimento
físico que não chega ao ponto de suprimir totalmente a vontade do coagido nem tendo este
uma margem de liberdade para recusar emitir a declaração negocial.

Exemplos:

O exemplo do leilão, estou num leilão atrás de um individuo e a certa altura pego no braço do
individuo á força e levanto-lhe o braço, se eu levantar o braço da outra pessoa à força, na
realidade, o braço que se levantou foi o dele, mas o cérebro que comandou aquele gesto não
foi o do dono do braço, foi o meu, portanto, aqui neste caso, a vontade dele foi totalmente
suprimida, não se trata de ele ter medo, na coacção física o objectivo não é meter medo, mas
é uma situação em que aquela pessoa não tem o controlo da sua vontade à hora em que se
sobrepõe, pois se se levantar o braço de uma pessoa á força seria uma situação de coacção
física, porque sendo certo que o braço de uma certa pessoa que se levantou e vai-se atribuir a
declaração àquela pessoa, mas na realidade a vontade que comandou aquele gesto foi uma
vontade exclusivamente de outra pessoa.

Agora imaginemos que o exemplo era diferente, eu quero que o individuo levante o braço, eu
torço-lhe o braço esquerdo e digo-lhe ao ouvido para levantar o braço direito porque senão
parto-lhe o braço. Isto é um caso de coacção moral porque a aqui a vontade está totalmente
suprimida pois se não levantar o braço pode ficar com o outro partido, portanto, se torcer o
braço esquerdo de uma pessoa para que ela levante o braço direito, no fundo o braço
esquerdo está a ser torcido para induzir o dono desse braço a levantar o outro e essa indução
será pela dor que receia vir a sentir, pois neste caso está implícita uma ameaça em que a dor
vai piorar, ou que o braço se vai partir, portanto, neste caso é causar medo e incómodo na
outra pessoa que faz a opção de levantar o braço, sendo que o negócio é inválido porque a
coacção moral gera nulidade.

Exemplo:

Uma situação clássica em que A pretende que B lhe faça uma doação, mas o B não quer doar,
então o A escreveu uma minuta de contrato e vai torturando o B até ele assinar, neste caso da
tortura é considerada coacção moral, sendo unânime em toda a doutrina portuguesa, porque
aqui o constrangimento físico não visa suprimir totalmente a vontade do coagido, mas sim
para moldar a vontade do outro para o levar a assinar algo que não quer, ou seja, quem
tortura alguém não está a prescindir da vontade da outra pessoa, está sim a querer conduzi-la
numa certa direcção, enquanto que na verdadeira coacção física suprime-se completamente,
levantar o braço da pessoa á força, a vontade da pessoa que não concorda, mas o facto é que
o seu braço está a ser erguido, enquanto que no caso da coacção moral é o medo da
continuação e do agravamento da dor, portanto, está sempre subjacente nestes casos de
constrangimento físico uma ameaça, enquanto que na coacção física não está subjacente
nenhuma ameaça, pois o que pretende o coactor, é através da sua força provocar determinada

Serafim Cortizo 20100059 Página 92

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conduta sem pensar no que o coagido pensa, ao passo que na coacção moral, o coactor quer
influenciar a vontade do coagido.

Na coacção física não existe nenhum dos sub elementos da vontade, porque quando se fala
em vontade, podemos estar a falar na vontade de acção, na vontade de declaração e na
vontade funcional ou negocial, pois a vontade de acção é a pessoa ter querido dizer aquelas
palavras ou fazer aqueles gestos, na vontade de declaração é ter querido com aquelas palavras
ou gestos ter querido fazer uma declaração negocial e a vontade funcional ou negocial, é ter
querido que aquela declaração produzisse determinados efeitos jurídicos concretos, pois
quando a vontade está perfeita, existe uma vontade de acção, a vontade de declaração e a
vontade negocial ou funcional, mas na coacção física faltam essas três vertentes da vontade,
porque na coacção física, o coagido obviamente não tem qualquer vontade de produzir efeitos
jurídicos, pois falta-lhe a vontade funcional ou negocial.

Na coacção física o coagido também não queria emitir nenhuma declaração negocial (falta-lhe
a vontade de declaração) e na coacção física ele nem sequer queria fazer aqueles gestos que
acabou por ter que fazer de forma forçada, pois ele não queria levantar o braço, portanto, na
coacção física falta a vontade nas suas três vertentes, a vontade de acção, a vontade de
declaração e a vontade funcional ou negocial, então se a vontade falta em todas as suas
vertentes, forçoso é concluir que não há vontade e se dizemos que para haver negocio
jurídico, um dos seus elementos essenciais é a vontade, sendo que na coacção física visto que
o vício é a falta de vontade em todos os seus sub elementos, então neste caso a ilação que se
retira é que o vício é de tal modo grave que na realidade há uma mera aparência de negócio,
mas aquilo que aconteceu não pode ser visto como um negócio jurídico, porque se um negócio
jurídico é uma conduta voluntária que visa produzir efeitos jurídicos, permitidos e tutelados
pela lei jurídica, se o negócio jurídico é o acto de auto regulação dos interesses, aqui não há
nada disso, pois a pessoa a quem é imputada aquela declaração, não quis auto regular
nenhum interesse, não teve nenhuma conduta voluntária e tudo o que aparentemente deriva
dela, no fundo é fruto da vontade de outra pessoa.

A COACÇÃO MORAL – ARTIGOS 255 E 256


Artigo 255 nº 1 “diz feita sob coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de
um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração”,
nº 2 “a ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de
terceiro”, nº 3 “não constitui coacção a ameaça do exercício normal de um direito nem o
simples temor reverencial”.

Artigo 256 “a declaração negocial extorquida por coacção é anulável, ainda que esta provenha
de terceiro; neste caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua
consumação”.

Na coacção moral há que distinguir duas situações:

a) O caso em que o coactor é o declaratário (nos casos mais frequentes).


b) O coactor pode ser um terceiro.

Serafim Cortizo 20100059 Página 93

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Esta distinção é essencial, porque na resolução de um caso prático, os requisitos da coacção


moral não são exactamente os mesmos, quando o coactor é o declaratário ou quando o
coactor é um terceiro e se o caso pratico não for esclarecedor e apenas disser “que fulano tal
foi coagido”, têm que distinguir consoante o coactor tenha sido o declarante ou um terceiro,
mas se se perceber pela leitura do caso pratico que foi o declaratário que ameaçou o outro,
não vale a pena vir falar-se na coacção por terceiro.

Mas quando o coactor é o declaratário, os requisitos para se demonstrar que há coacção moral
são aqueles que vêm referidos no artigo 255 nº 1 que fixa os requisitos necessários para haver
coacção moral quando o coactor é o declaratário (a outra parte do negócio) que são aquilo a
que chamaremos os requisitos da ameaça, pois na coacção moral há uma ameaça, pois
mesmo quando há constrangimento físico está subjacente uma ameaça.

A ameaça tem que preencher três requisitos para haver anulabilidade por coacção moral no
caso de ser o declaratário o coactor;

1) Ameaça ilícita.
2) Ter que se demonstrar que a tal ameaça ilícita tinha como objectivo extorquir a
declaração negocial.
3) É preciso que essa ameaça seja essencial.
Mas se a ameaça provém de um terceiro, a ameaça não basta que preencha três requisitos,
mas têm que preencher cinco, aplicando-se á mesma os três princípios já enumerados (artigo
255 nº 1) mas também se aplicam quando o coactor é um terceiro aplicam-se os requisitos do
artigo 256.

Requisitos da ameaça por parte de terceiro;

1) Ameaça ilícita.
2) Ter que se demonstrar que a tal ameaça ilícita tinha como objectivo extorquir a
declaração negocial.
3) É preciso que essa ameaça seja essencial.
4) Provar que o mal de que a pessoa foi ameaçada é um mal grave.
5) Provar que era justificado o receio da sua consumação.

O primeiro requisito é o de ser uma ameaça ilícita “o mal de que o declarante foi ilicitamente
ameaçado”, mas a lei também diz que aquele que ameaçou tenha tido por objectivo extorquir
uma declaração negocial, a razão de ser da ameaça ilícita é tentar obter do ameaçado a
declaração negocial que é o que diz a parte final do artigo 255 nº 1 “de que o declarante foi
ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração negocial”, e isto é importante
porque pode ter havido uma ameaça ilícita e pode haver depois uma declaração negocial mas
sem que se demonstre que aquela ameaça ilícita não foi feita para obter da outra parte a
declaração negocial e depois há um terceiro requisito que eu designei por essencialidade,
onde se terá que provar que a ameaça foi essencial, mas a lei aqui não usa a palavra essencial
mas há uma palavra-chave que é a palavra determinada e diz-se no artigo 255 nº 1 “a
declaração determinada pelo receio do mal”, ou seja, dizemos que a ameaça é essencial no
sentido em que terá sido uma ameaça determinante para a formação da vontade, ou seja,
foi por causa da ameaça que se formou aquela vontade negocial, ou seja, para anular um

Serafim Cortizo 20100059 Página 94

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negócio, o coagido vai ter que demonstrar que se não tivesse havido a ameaça ele não teria
celebrado qualquer negócio jurídico, ou então teria celebrado um negócio diferente daquele
que efectivamente celebrou, portanto, a ameaça é essencial se se provar que sem ela não teria
havido negócio, ou teria havido um negócio, mas em termos diferentes, portanto, estes são os
três requisitos quando a ameaça provém do declaratário, ilicitude, intenção de extorquir a
declaração e essencialidade.

Mas se estiverem a resolver um caso prático em que a ameaça provém de um terceiro, para
além dos três requisitos que foram referidos, ainda há os dois requisito do artigo 256, onde
tem que se provar que o mal que a pessoa foi ameaçada é um mal grave e que era justificado o
receio da consumação, enquanto no nº 1 do artigo 255 basta que haja uma ilicitude quando é
o declaratário a ameaçar, mas quando há um terceiro a ameaçar o mal de que ele ameaça o
declarante tem que ser um mal grave e o conceito de gravidade, competirá ao juiz analisar.

As consequências possíveis da coacção moral implicam a anulação do negócio jurídico, se se


verificaram todos os requisitos, consubstanciam crimes de ameaças e ofensas corporais e
também podem gerar responsabilidade civil, porque a pessoa ao ser ameaçada ou ser objecto
de constrangimento físico vai ter danos e prejuízos e não é de excluir que o coagido, para além
de obter mais tarde a anulação do negócio jurídico, ainda consiga obter uma indeminização
pelos danos que sofreu e consiga que o coactor vá para a prisão pelos crimes cometidos.

Diz o nº 2 do artigo 255 que “a ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou
fazenda do declarante ou de terceiro”, ou seja, o mal de que o declarante é ameaçado não tem
que ser forçosamente ameaçar que o vão matar ou que lhe vão bater, pois ele pode ser
ameaçado de actos que atentarão contra o seu património (a fazenda) como por exemplo
dizer que com exemplo de coacção moral “se não celebrares este negócio comigo eu parto os
vidros da tua janela, ou derrubo esta prateleira com porcelanas, ou mato o teu cão” e também
é coacção moral ameaças contra a honra como por exemplo dizer “eu vou divulgar aqueles
factos que queres manter em segredo”, portanto, no fundo está a ameaçar revelar dados que
têm a ver com a intimidade da vida privada e isso tem a ver com direitos de personalidade que
não devem ser violados, portanto, a ameaça não tem que ser forçosamente bater ou matar,
podem ser atentados contra o património e contra a honra, bom nome e reputação da pessoa.

O alvo da ameaça não tem que ser forçosamente o declarante, como por exemplo dizer, “se
não doares mato o teu filho” isto é á mesma uma ameaça relevante porque a lei diz “a
ameaça tanto pode respeitar à pessoa como à honra ou fazenda do declarante ou de
terceiro”.

Na parte final do nº 3 do artigo 255, diz-se que “não é coacção o simples temor reverencial”,
a lei não diz o que é o temor reverencial, mas apenas diz que o temor reverencial não é
coacção, mas o temor reverencial não é causa de invalidade por coacção moral.

Na coacção moral para celebrar o negócio é preciso que tenha havido uma situação em que o
declarante teve medo da concretização de uma ameaça ilícita, mas no temor reverencial,
alguém celebra um negócio jurídico porque tem medo, nomeadamente, medo de desagradar a
outra pessoa, mas esse medo que tem de desagradar a outra pessoa, não é o medo que
resulte de uma ameaça ilícita, pois a outra pessoa não a ameaçou, mas ela tem medo de

Serafim Cortizo 20100059 Página 95

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desagradar á outra, e fala-se em temor reverencial nos casos em que por exemplo, uma
pessoa tem uma divida de gratidão para com outra e essa outra pessoa propõe um negócio
jurídico, mas a outra pessoa mesmo que não queira celebrar esse negócio jurídico não tem
coragem para dizer que não pois tem medo de desagradar a essa outra pessoa, e se um
negócio jurídico foi celebrado nessas circunstâncias não se pode mais tarde ir anular esse
negócio jurídico dizendo que não o queria celebrar e que apenas o celebrou porque tinha
medo que a outra pessoa ficasse chateada com isso, porque numa situação de temor
reverencial pode acontecer que numa relação hierárquica em que o inferior hierárquico sente
receio de dizer que não ao superior hierárquico sem que tenha havido qualquer ameaça
expressa ou implícita. Se não tiver havido uma ameaça, expressa ou tácita, não se pode mais
tarde querer anular o negócio dizendo que no íntimo se tinha medo. Portanto, o temor
reverencial resulta, ou de não se querer fazer zangar uma pessoa pela qual se tem um divida
de gratidão moral ou a pessoa que está numa posição de superioridade hierárquica receando
alguma represália.

Apesar de o temor reverencial não ser em principio causa de invalidade do negócio jurídico, eu
não excluo que em certos casos, o temor reverencial poderá vir a enquadrar-se na figura da
usura no negócio usurário quando alguém se aproveita de uma fragilidade alheia, pois pode
haver um caso em que uma pessoa se aproveite do temor reverencial que sabe que causa a
outra pessoa, neste caso está-se a aproveitar de um ascendente sobre outra pessoa para
tentar obter benefícios excessivos, e eu não excluo que o aproveitamento excessivo do temor
reverencial possa cair na figura da usura.

Aula 16

USURA – O NEGÓCIO USURÁRIO (Artigos 282 e seguintes)


Artigo 282 “é anulável, por usura, o negócio jurídico quando alguém, explorando a situação de
necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de
outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios
excessivos ou injustificados”.

Quando existe usura o negócio é anulável e quando a lei diz que o negócio usurário é anulável
está a prever uma anulabilidade, porque se fosse uma nulidade, a lei diria que o negócio é nulo
e neste caso aplicam-se os artigos 287 e 288.

Dissecando o artigo 282, chamando á atenção para os vários requisitos que têm que se
verificar, para se poder qualificar o negócio como sendo um negócio usurário.

A primeira ideia, é que nos negócios usurários estamos sempre perante situações em que por
força do negócio, alguém vai conceder a outra pessoa benefícios excessivos ou benefícios
injustificados, porque o negócio usurário, no fundo é um negócio desequilibrado porque
alguém vai conceder a outra pessoa benefícios que são excessivos ou benefícios que são
injustificados, porque se o negócio não criar para uma parte benefícios excessivos ou
benefícios injustificados, nunca se pode falar em usura.

Serafim Cortizo 20100059 Página 96

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Mas não basta num negócio concluirmos que uma parte obteve vantagens excessivas para
automaticamente qualificarmos o negócio como usurário, porque há outros requisitos neste
artigo, pois é preciso que na origem da concessão destes benefícios tenha estado o facto de
que a pessoa que concedeu aqueles benefícios excessivos, ou que concede esses benefícios
injustificados é uma pessoa que tem que estar numa situação de vulnerabilidade e de
fragilidade.

A ideia de vulnerabilidade e de fragilidade é retirada da ideia da leitura do artigo 282 nº 1, que


é uma pessoa que á partida está numa situação de necessidade, ou que é inexperiente, ou que
age com ligeireza, ou que é dependente, ou que tem fraqueza de carácter, ou que tem um
estado mental perturbado, tudo isto são situações de vulnerabilidade, pois quem está numa
situação de necessidade não está nas condições ideais para tomar decisões sobre os negócios
que celebra, pois quem é inexperiente, ou quem é dependente emocionalmente de outra
pessoa, também não está nessas situações, portanto, quando nós dizemos que para haver
negócio usurário não basta que alguém conceda benefícios excessivos ou injustificados a outra
pessoa, é também preciso que a pessoa que concede os benefícios estivesse á partida numa
situação de particular fragilidade, numa situação de vulnerabilidade, mas não basta provar que
a pessoa estava numa situação de vulnerabilidade e que concedeu benefícios excessivos e
injustificados porque ainda há um terceiro requisito, porque a lei prevê que alguém explore
essa vulnerabilidade, porque diz que alguém explorando, ou seja, para haver usura é preciso
que se prove que alguém se aproveitou (explorar conscientemente) conscientemente da
fragilidade e a vulnerabilidade da outra pessoa para obter dela a concessão de benefícios
excessivos ou injustificados.

Para haver usura tem que haver;

a) Benefícios excessivos ou injustificados.


b) Tem que ser um caso em que quem concede esses benefícios o fez estando numa
situação de fragilidade e vulnerabilidade.
c) É preciso que a pessoa que obtém esses benefícios se tenha aproveitado
conscientemente e explorado essa situação de vulnerabilidade.

Exemplos:

Imaginemos que o meu vizinho foi mordido por uma cobra venenosa e está quase a morrer
porque não tem tempo de ir para o hospital e precisa de um antídoto e por acaso eu tenho o
antídoto em minha casa que custou 10 euros na farmácia e ele vem ter comigo desesperado e
eu digo-lhe que lhe vendo o antídoto por 10 mil euros, mas imaginemos que ele até diz que eu
o estou a explorar mas eu digo que a vida dele vale muito para mim e 10 mil até é pouco. O
facto é que o vizinho não quer morrer e promete pagar os 10 mil euros.

Então eu vendi-lhe o antídoto por 10 mil euros que é um medicamento que custa 10 euros e
claramente há um benefício excessivo mas que eu obtive porque ele estava numa situação de
necessidade porque a alternativa era morrer e portanto, ele prontificou-se a pagar os 10 mil
euros. Ele depois de recuperar, pode á posteriori, se me pagou os 10 mil euros, tentar reaver o
dinheiro anulando o negócio alegando que foi um negócio usurário e que eu me aproveitei da
sua situação de necessidade e obtive benefícios que eram excessivos, porque neste exemplo, o

Serafim Cortizo 20100059 Página 97

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medicamento que eu lhe vendi valia muitíssimo menos do que o preço que eu efectivamente
cobrei e isto seria um acaso de usura.

E nestas situações, demonstrando que a outra pessoa estava numa situação de fragilidade e
que alguém se aproveitou disso para obter para si ou para terceiros, pois também pode haver
usura no caso em que eu induza alguém, não a contratar comigo, mas a contratar com outra
pessoa, portanto, tanto é usura eu levar uma pessoa a contratar comigo como a contratar com
terceiro através de um negócio desequilibrado aproveitando-me da situação de necessidade.

Mas aqui também é preciso ter cuidado quanto ao conceito de negócio desequilibrado, porque
num certo sentido, não há negócio mais desequilibrado do que na doação, porque na doação
alguém oferece um bem sem receber nada em troca. Só que quando há uma doação não as
vamos qualificar todas como usurárias, como é evidente, porque nós não podemos ver a
doação como a concessão de um beneficio injustificado, porque muitas vezes há uma
justificação que é precisamente a vontade de oferecer, e o que explica a doação do ponto de
vista do doador é o prazer que ele tem em dar pois não podemos dizer, que se ofereceu é
porque está a ser explorado e não é porque o negócio é desequilibrado que automaticamente
é usura, porque senão também não poderia haver o conceito de “bom negócio”, pois quando
uma venda é muito boa para um, é má para o outro, pois não basta ter havido um bom
negócio para uma das partes e desequilibrado para a outra parte para se vir pedir a anulação
por usura, pois é preciso que se prove que se estava numa situação de tal vulnerabilidade, de
necessidade, ou um problema de estado mental, ou de inexperiência ou de dependência, e
esta dependência que está aqui pensada pode ser uma dependência psicológica pois uma
pessoa pode ter um ascendente psicológico sobre outra podendo até aqui falar-se nas
situações de temor reverencial, e eu até disse no outro dia que as situações de temor
reverencial não são situações de coacção moral (artigo 255 nº 3) porque quando alguém
celebra um negócio porque tem medo de desagradar a outra pessoa, mas não foi ameaçada, a
pessoa que celebrou o negócio só porque não quer desagradar não pode mais tarde anular
esse negócio.

No entanto, pode haver casos de temor reverencial que simultaneamente caiam na figura da
usura, porque imaginem que eu me apercebi que uma certa pessoa tem temor reverencial
face a mim e que essa pessoa nunca me dirá que não, então eu aproveito-me desse facto de
ter esse ascendente emocional sobre a pessoa para lhe propor um negócio muito vantajoso
para mim e muito mau para ela pensando que ela não me irá dizer que não. Se essa pessoa
celebra um negócio muito vantajoso para mim, mas muito ruinoso para ela, ela poderia tentar
anular esse negócio, não invocando o temor reverencial, mas invocando que aquele temor
reverencial que lhe provocou uma situação de dependência face a mim e que eu me aproveitei
conscientemente dessa situação de dependência ou da sua fraqueza de carácter (artigo 282)
portanto, há várias figuras onde se pode encaixar este tipo de caso e o que eu diria é o
seguinte;

O temor reverencial em principio não é uma causa de anulação, mas pode acontecer que
alguém se aproveite conscientemente do temor reverencial que se provoca noutra pessoa,
para induzir a outra pessoa a celebrar um negocio que é altamente desfavorável para essa tal

Serafim Cortizo 20100059 Página 98

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pessoa e que é altamente favorável para a pessoa que tem o ascendente psicológico e
emocional e se isso acontecer estão preenchidos todos os requisitos da usura, que são;

a) Um negócio que provoca benefícios excessivos.


b) Situação de vulnerabilidade.
c) Aproveitamento consciente dessa situação de dependência.

E quando estão reunidos estes requisitos, o negócio é anulável como diz o artigo 282.

Mas a lei permite á vitima da usura, que quem pode anular, é quem a lei quis proteger e neste
caso a lei quer proteger a vitima da usura, pois quem pode mais tarde anular o negócio é a
pessoa que concedeu os benefícios excessivos e injustificados, e essa pessoa que foi vitima da
usura desde que prove que os requisitos da usura pode anular o negócio, claro, que se é um
negócio anulável já cumprido, tem um ano para o fazer, aplicando-se o regime dos artigos 286
e seguintes.

Mas a lei no artigo 283 prevê que a vítima da usura ao invés de pedir a anulação do negócio,
possa em alternativa pedir a modificação desse negócio, ou seja, a vítima da usura não vem
pedir ao juiz que anule o negócio, vem é pedir ao juiz que torne o negócio mais justo que é o
que diz o artigo 283 nº 1 quando se diz que “em lugar da anulação, o lesado pode requerer a
modificação do negócio segundo juízos de equidade”.

Exemplo:

Há um individuo drogado e acaba de chegar um carregamento de droga á cidade e esse


individuo que está a precisar de uma dose de droga e precisa de dinheiro, e tem um relógio
muito valioso que vale 50 mil euros e vem ter comigo e quer-me vender o tal relógio, e como
eu sei que ele está ansioso para obter dinheiro, eu ofereço-lhe 5 mil euros pelo relógio que
vale 50 mil, ele até pode dizer-me que o estou a explorar e eu digo, que estou mas se não está
contente vá à esquadra pedir mais dinheiro e o individuo que precisa desesperadamente do
dinheiro vende-me por 5 mil euros, um relógio que vale 50 mil para comprar droga e eu estou
a negociar nas minhas condições e se demonstrar isto tudo, ele poderia á posteriori vir pedir a
anulação do negócio.

Neste exemplo do drogado que me vendeu o tal relógio que valia 50 mil euros por 5 mil euros,
ele agora quer anular o negócio para reaver o relógio e nesse caso ele intenta uma acção de
anulação, porque se a anulação for considerada procedente cada um terá que devolver o que
recebeu, eu terei que devolver o relógio e ele tem que me devolver os 5 mil euros.

Mas imaginemos que ele não tem o dinheiro e que quer mais dinheiro para comprar mais uma
dose de droga, ele não quer reaver o relógio, ele quer é vende-lo por 50 mil euros e indo a
tribunal provando que foi vitima de usura, em vez de pedir ao juiz que anule o negócio, ele
pode ao juiz que modifique o negócio segundo juízos de equidade (justiça no caso concreto) e
o juiz modificando o negócio segundo juízo de equidade, é corrigir a prestação que foi
acordada de modo a torná-la justa, ou seja, o problema daquele negócio era o facto de o
comprador ter obtido um beneficio excessivo e corrige-se essa situação forçando o comprador
a pagar mais.

Serafim Cortizo 20100059 Página 99

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Portanto, o tal drogado que foi vitima de usura, pode optar, ou vem pedir a anulação do
negócio e então consegue reaver o relógio mas também terá que devolver o dinheiro, o que
para ele pode ser um problema porque já não tem os 5 mil euros, ou até pode não querer o
relógio mas apenas o dinheiro e se ele não quer o relógio para nada e se não está me
condições de devolver os 5 mil euros, pois ao invés de pedir a anulação do negócio ele pode
pedir a modificação do negócio que neste caso é fazer subir o preço, porque nesta caso, o
preço era usurário porque era demasiado baixo.

ARTIGO 283
Artigo 283 nº 1 “em lugar de anulação, o lesado pode requerer a modificação do negócio
segundo juízos de equidade”, nº 2 “requerida a anulação, a parte contrária tem a faculdade de
opor-se ao pedido, declarando aceitar a modificação do negócio nos termos do número
anterior”.

Quero chamar a atenção para o nº 2 do artigo 283 e aqui a parte contrária é a parte que
obteve os tais benefícios excessivos ou injustificados.

Então imaginemos que o tal drogado que agora já está reabilitado, que agora quer reaver o
relógio e vem pedir a anulação da venda que me fez do relógio, mas eu que o comprei por 5
mil euros, prefiro pagar mais pelo relógio do que ficar sem o relógio. Então eu que sou a
pessoa que beneficiou da usura, eu posso evitar a anulação do negócio dizendo que me
disponibilizo a pagar pelo relógio o preço justo, ou seja, disponibilizo-me a aceitar a
modificação do negócio nos termos do número anterior, ou seja, a vitima da usura não pediu a
modificação, ela quis anular o negócio, mas eu posso evitar a anulação disponibilizando-me
perante o juiz para que o negócio seja tornado justo, pois a vitima da usura pode optar entre
anular e modificar, mas se a vitima da usura optar por anular, o beneficiário da usura pode
evitar a anulação prontificando-se a anuir a uma modificação. Mas o inverso já não é verdade,
ou seja, se a vítima da usura pedir a modificação, o beneficiário não pode dizer que não quer a
modificação e prefere a anulação, pois se a vítima pede a modificação o juiz modifica se tal for
possível.

Na usura, não basta um negócio ser muito vantajoso para uma parte para automaticamente
ser usurário pois é preciso que se prove que houve um aproveitamento consciente de uma
situação de vulnerabilidade da outra parte de modo a levá-la a conceder os tais benefícios
excessivos ou injustificados.

E também já sabemos que a vítima da usura tem três hipóteses;

a) Uma é não fazer nada e resignar-se e então o vício sana-se ao fim de um certo tempo.
b) A outra é anular o negócio.
c) A outra é pedir a modificação do negócio.

E se quiser anular, o beneficiário da usura pode-se opor á anulação pedindo ele próprio a
modificação.

Há um regime especial quando a usura tem por objecto os juros, porque por muitas vezes, a
única coisa que há de usurário num negócio jurídico são os juros que são estipulados, aliás,

Serafim Cortizo 20100059 Página 100

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historicamente falando, era considerada usura nos contratos de empréstimo de dinheiro e a


usura tinha a ver com os juros que eram cobrados, e a lei tem um regime especial quando a
usura tem por objecto os juros que são estipulados em certos negócios jurídicos, e a lei faz
alusão a essa regime especial no artigo 282 nº 2, onde a lei diz que “fica ressalvado o regime
especial estabelecido nos artigos 559 – A e 1146”.

JUROS USURÁRIOS – Artigos 559 - A e Artigo 1146


Artigo 559 - A “é aplicável o disposto no artigo 1146 a toda a estipulação de juros ou quaisquer
outras vantagens em negócios ou actos de concessão, outorga, renovação, desconto ou
prorrogação do prazo de pagamento de um crédito e em outros análogos”.

Artigo 1146 “é havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros
anuais que excedam os juros legais, acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou não garantia
real”.

Nestes artigos para se saber se os juros são ou não são usurários, o que interessa é o que via
ver neste artigos para os quais a lei remete.

No artigo 559 - A o que a lei vem dizer é que, nestas situações do artigo 559 - A aplica-se o
regime do artigo 1146 que é um artigo, que directamente falando aplica-se apenas ao contrato
de mútuo (empréstimo de dinheiro) e no artigo 1146 prevê-se a hipótese de num contrato de
empréstimo de dinheiro (contrato de mútuo) e quem empresta dinheiro é o mutuante e
aquele a quem é emprestado é o mutuário e o artigo 1146 vem dizer quando é que os juros
num contrato de empréstimo são considerados usurários e esta artigo apenas se aplica aos
juros de contrato de mútuo. No entanto vimos que o artigo 559 - A manda aplicar este regime
aos juros de outros contratos, pois se ao invés de ser um contrato de mútuo forem juros
porque eu vendi uma casa mas combinou-se que o preço seria pago daqui a um ano, aí não há
juros de um empréstimo, mas juros de uma concessão de crédito, ou pode haver uma
empreitada em que se prevê o pagamento de juros por cada dia de atraso e nestes casos,
sempre que se estipulam juros para se saber se são ou não usurários, mesmo que os juros
tenham sido estipulados em contratos que não sejam contratos de mútuo, porque se é
contrato de mútuo aplica-se directamente o artigo 1146, mas se é um contrato que não é de
mútuo também se aplica este artigo por força da remissão do artigo 559 - A.

Há dois tipos de juros;

a) Juros moratórios são juros para serem pagos quando existe mora.
b) Juros remuneratórios ou compensatórios

Quando se fala em mora, diz-se que o devedor entra em mora quando não paga a divida na
data prevista, e nos casos em que um devedor de dinheiro se uma pessoa não cumpre na data
prevista, ao entrar em mora a lei prevê que por cada dia de atraso, essa divida vença juros, os
chamados juros de mora e a lei fixa uma taxa anual de juros de mora e neste caso;

Imaginemos que o credor do devedor no contrato que celebraram o juro de mora a pagar seria
superior ao juro legal, pois o problema só se coloca quando o juro que as partes estipularam é
um juro superior ao juro legal, o juro é por exemplo 4% e foi combinado um juro superior e a

Serafim Cortizo 20100059 Página 101

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questão que se coloca é saber se se pode estipular um juro superior ao legal, poder pode-se,
mas se for um juro demasiado superior ao legal torna-se juro usurário. Mas não basta ser
superior ao juro legal pois as partes podem combinar um juro de mora superior ao legal, mas
só se exceder o juro legal em certo número de pontos percentuais é que passa a ser um juro
usurário, portanto, para se saber se o juro é ou não usurário, basta que se compare o juro legal
neste artigo. Se o juro combinado pelas partes exceder estes limites é usurário, se apesar de
ser um juro superior ao legal mas dentro dos limites não é um juro usurário, mas isto
relativamente ao juro de mora.

Mas nos juros remuneratórios ou compensatórios que não têm nada a ver com a mora,
porque, imaginemos;

Se se pedir dinheiro emprestado ao banco e se não se pagar na data prevista, é evidente que
terão que se pagar juros de mora, mas se se pagar na data prevista também se pagam juros
porque os bancos não emprestam um valor sem cobrar juros porque senão o banco não teria
lucro e nos casos em que os bancos emprestam dinheiro, podem exigir o pagamento de um
juro que remunere o facto o banco de ter ficado privado durante certo tempo do seu dinheiro.

Mas o juro moratório ou compensatório também terá que ser previamente estipulada a
cobrança ou não de um juro, mas a taxa legal que a lei fixa para os juros é a mesma para os
moratórios e para os compensatórios, e portanto, saber se o juro estipulado pelas partes é ou
não é usurário, seja no caso do juro de mora ou no juro remuneratório, é sempre usurário se
exceder o juro legal em X pontos percentuais, não é usurário se não exceder o juro legal nesses
pontos percentuais. E a resposta para esses pontos percentuais está no artigo 1446 nº 1 e nº 2.

O artigo 1146 nº 1 refere-se aos juros remuneratórios ou compensatórios e são juros apenas
para remunerar o credor do sacrifício que ele faz ao privar-se do dinheiro, e a lei admite neste
artigo, que o credor possa ser remunerado pela privação que teve do dinheiro ou pela
vantagem que concedeu ao outro e aí a lei permite que se estipulem juros remuneratórios ou
compensatórios. E saber se o juro remuneratório ou compensatório, é ou não é usurário,
aplica-se o nº 1 do artigo 1146, mas se o juro estipulado for um juro moratório, para se saber
se é ou não é usurário, aplica-se o nº 2 do artigo 1146.

ARTIGO 1146 Nº 1
“É havido como usurário o contrato de mútuo em que sejam estipulados juros anuais que
excedam os juros legais, acrescidos de 3% ou 5%, conforme exista ou não garantia real”.

Há casos em que o credor tem a seu favor aquilo que se chama uma garantia real pois o
devedor hipotecou uma coisa a favor do credor, ou concedeu um penhor e quando o credor
goza da protecção de ter uma garantia real, a lei considera que não se justifica cobrar um juro
tão alto como se cobraria se não tiver uma garantia real, porque quando não tem garantia
corre maior risco e por isso é que a lei diz que, se tem garantia real só pode estipular o juro
remuneratório compensatório que no máximo exceda o juro legal em 3% e se o juro legal fosse
4%, só poderia estipular até 7%.

Serafim Cortizo 20100059 Página 102

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A ideia é, sabendo qual é a taxa legal de juro, se é um juro remuneratório só se pode acrescer
em 3% acima se houver uma garantia real e até 5% acima se não houver uma garantia real,
mas acima de 6% já seria um juro usurário.

No caso do juro moratório que é estipulado como sanção no atraso do pagamento e nestes
casos a lei também distingue consoante haja ou não haja garantia real. Se houver garantia real
é possível estipular o juro até 7% acima e como neste caso o juro das dividas civis é de 4% é
possível estipular até 11% sem ser um juro usurário, mas e não houver garantia real pode-se
acrescentar até 9% acima do valor em mora e neste caso até 13%.

Quando os juros excedem estes limites, automaticamente, são considerados usurários e não
é necessário provar que se verificam os requisitos do artigo 282 nº 1 porque isto é uma
norma especial face ao artigo 282 nº 1.

O artigo 1146 nº 4 diz “o respeito dos limites máximos referidos neste artigo não obsta à
aplicabilidade dos artigos 282 e 284”, e neste caso a ideia é a seguinte;

Se forem violados os limites deste artigo, é sempre usurário e aí não é preciso ir para o artigo
282, mas aparentemente, o que o nº 4 está a querer dizer é que pode haver um juro que não
ultrapasse esses limites, mas que ainda assim possa ser considerado usurário, mas aí para ser
usurário um juro que não ultrapassa os limites, já vai ter que se provar que vai cair no âmbito
artigo 282 nº 1, onde fosse uma situação em que não teria que se cobrar juro algum, que
nesse caso seria injustificado e se excede esses limites é sempre usurário, mas se não excede
esses limites pode ser usurário, e seria necessário provar que se verificava a situação do artigo
282 nº 1, ou seja, nesse caso que uma pessoa estaria numa situação de fragilidade e o outro
que se aproveita disso para obter benefícios excessivos.

Aula 17

VÍCIO DO ERRO (Regime geral do Erro - Artigos 247 a 254)


O Erro: é uma falsa ou inexacta representação da realidade.

Modalidades de erro:

1) Erro na declaração ou erro obstáculo (artigos 247 a 250).


2) Erro na formação da vontade ou erro vício (artigos 251 e 252).
3) Erro simples Vs. Erro qualificado por dolo (quando o erro do declarante foi causado
deliberadamente por outra pessoa, pessoa essa, que age com dolo, dizemos que é um
erro qualificado por dolo e também há dolo quanto se mantém o outro contraente em
erro) (artigos 253 e 254).

Há que analisar estes artigos um a um, porque apesar de a lei prever nestas situações todas a
anulabilidade como consequência do erro, os requisitos da anulabilidade não são os mesmos
em todas as modalidades de erro, pois há casos em que para certos erros os requisitos da
nulidade são uns e para outros erros são outros. Portanto, só qualificando previamente o erro
é que sabemos qual é o artigo aplicável e só sabendo qual é o artigo aplicável é que podemos

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aplicar os artigos a esses tipos de erro, pois há vários tipos de erro com regimes diferentes e
formas diferentes de anular os negócios e por isso temos que conseguir saber qual é o tipo de
erro que temos perante nós.

A principal distinção de erro, é entre erro na declaração e erro na formação da vontade.

ERRO NA DECLARAÇÃO (Artigos 247 a 250)


No erro da declaração existe uma divergência não intencional entre a vontade e a
declaração, divergência essa, que se deveu a um erro do declarante. Há erro na declaração
quando o declarante faz uma declaração que objectivamente tem outro sentido do que
aquele que ele lhe quer dar, havendo uma discrepância e uma falta de harmonia entre aquilo
que é a vontade real do declarante e aquilo que na realidade declarou.

Exemplo 1:

Eu quero vender uma caneta por 70 euros, eu pensei em 70, mas por lapso disse 60 que são
palavras parecidas, o problema só se coloca se a outra pessoa diz que aceita, porque formou-
se um contrato por 60 euros quando na realidade ele seria por 70 euros, sendo que neste caso
se a outra pessoa aceitou, eu disse 60, mas de facto queria dizer 70.

Mas pode haver erros de declaração em declarações escritas, pois imaginem que eu quero
vender um quadro meu por 10 mil euros e escrevo uma carta a este senhor na qual eu
pretendo efectivamente manifestar a minha vontade de lhe vender o quadro por 10 mil euros,
mas como eu não escrevo por extenso, mas através de algarismos, eu por lapso esqueci-me de
por um zero (0) e o que ia no meu texto era um 1 e 3 zeros, (1000 euros), mas eu estava a
pensar em 10 mil, mas faltou ali um zero e não interessa saber porque é que faltou um zero,
mas o facto é que eu escrevi 1000 e a outra pessoa respondeu á minha carta a dizer que aceita
e neste caso formou-se um contrato por 1000, porque objectivamente qualquer normal
declaratário se recebe uma carta que diz que se lhe vende por mil ele respondeu que aceitava.
Mas eu não queria vender o quadro por mil eu queria vender o quadro por 10 mil e neste caso,
ou me conformo ou resigno com a situação ou vou tentar anular este negócio invocando um
erro na declaração e já vamos ver que não é nada fácil anular um negócio com base no erro da
declaração.

Neste caso, a minha vontade real era vender por 10 mil e eu declarei que vendia por mil e isto
não foi de propósito porque eu não queria enganar o outro, porque senão seria reserva
mental, sendo que neste caso é uma divergência, mas é uma divergência não intencional,
sendo um erro na declaração, mas é uma questão diferente saber se releva juridicamente
como causa de anulabilidade, porque o erro na declaração só releva exactamente em certas
circunstâncias, assim como o erro na declaração da vontade, também só releva em certas
circunstâncias.

Exemplo 2:

Duas pessoas fizeram-me duas propostas de contrato e eu escrevi duas cartas, numa dizia que
não aceitava e na outra dizia que aceitava, só que ao pôlas no correio troquei os destinatários,
mandei para aquele cuja proposta eu não queria aceitar, a carta onde eu dizia aceito e mandei
para aquele cuja proposta eu queria aceitar, a carta a dizer rejeito.

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No fundo, eu quando escrevi a carta pretendia dirigi-la a uma certa pessoa a dizer aceito, mas
o facto é que a dirigi a outra pessoa que por acaso tinha-me feito uma proposta contratual e
por isso, a carta que seguiu onde eu dizia aceito, não traduzia a minha vontade real
relativamente á proposta que me tinha sido feita e isto também seria um erro na declaração.

Exemplo 3:

Também pode haver erro na declaração no caso em que alguém que domina mal a língua
portuguesa, um estrangeiro, na prática julgando que está a fazer uma declaração com certo
sentido, na realidade está a dizer uma coisa diferente e imaginemos um estrageiro que julga
que vender um bem se diz “alugar” e ele diz a alguém “alugo-te isto” quando ele no seu intimo
está a pensar em vender, mas objectivamente as suas palavras não significam vender, mas sim
alugar ou vice-versa. Neste género de exemplo em que uma pessoa está objectivamente está a
emitir uma declaração negocial e até quis aquelas palavras porque lhes associava um sentido
diferente daquele sentido que as palavras têm e portanto, isso também é um erro na
declaração e neste género de situações, quando isto acontece temos que ir ver se o negócio é
ou não é anulável e o problema só se coloca se o declarante não se resignar com o seu erro e
pretender desvincular-se da declaração que fez, pois se ele não invocar o erro mais ninguém o
irá fazer por ele.

Para sabermos se o erro na declaração é ou não é, fundamento de anulabilidade, temos que


atender aos requisitos do artigo 247 e portanto, não basta num caso prático dizer que “fulano
tal declarou algo que não correspondia á sua vontade real devido a um erro sendo um erro na
declaração no artigo 247” neste caso não se pode mudar de assunto e têm que dizer como
aplicar o artigo 247 porque este artigo prevê vários requisitos e temos que ver se eles se
verificam ou não.

ARTIGO 247 – Erro na declaração


“Quando em virtude de erro, a vontade declarada mão corresponda à vontade real do autor,
a declaração negociável é anulável, desde que o declaratário conhecesse ou não devesse
ignorar a essencialidade, para o declarante, ao elemento sobre o qual incidiu o erro”.

Neste caso, a pessoa que vem invocar o erro, aqui a lei está-lhe a chamar declarante, porque é
aquele que fez a declaração onde existe o erro e isso também não quer dizer que o outro
também não seja declarante, pois se for um contrato são os dois declarantes e declaratários,
pois em qualquer contrato tem que haver várias declarações negociais e como eu já disse, se
num contrato tem que haver várias declarações negociais, cada um dos contraentes é
declarante quanto à declaração que faz e é declaratário quanto á declaração que lhe é dirigida,
pois quando eu digo a alguém “vendo o meu relógio por 500 euros” eu estou a ser declarante
e ele está a ser o declaratário, mas quando ele responde “aceito” ele é o declarante e eu sou o
declaratário.

Mas no caso que estamos a analisar, uma das partes é que veio invocar o erro na declaração e
aqui quando a lei fala em declarante, está-se a referir ao autor da declaração relativamente á
qual existe o tal erro, não quer dizer que o outro, não tenha ele próprio feito uma declaração,
e para ser anulável é porque há um contrato e obviamente que a outra parte também fez uma
declaração e neste caso como é a minha declaração que está a ser discutida, como ponto de

Serafim Cortizo 20100059 Página 105

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referencia da lei, eu estou a ser o declarante face á declaração que está viciada e ao
declaratário que face á declaração que eu alego que está viciada.

O que resulta desta segunda parte do artigo 247, é que para ser anulável a declaração em que
houve um erro na manifestação da vontade, com diz aqui a lei, é preciso que o declaratário
“conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade, para o declarante, ao elemento sobre
o qual incidiu o erro”. Se se diz que o outro conhecesse ou não devesse ignorar a
essencialidade para o declarante, é porque há aqui um requisito que ainda tem a ver com o
declarante, ou seja, para que o declarante possa anular tem que provar que aquele erro para
ele era essencial, ou seja, o errante para poder anular, tem que demonstrar que o elemento
sobre o qual incidiu o seu erro era para ele um elemento essencial, ou seja, eu teria que
demonstrar em tribunal que, no exemplo da carta que eu escrevi, eu queria escrever 10 mil e
escrevi mil, o elemento sobre o qual caiu o erro foi o elemento preço, pois eu tinha que
demonstrar para mim os 9 mil euros de diferença eram absolutamente essenciais e que eu
nunca venderia o quadro por mil.

Mas também há um requisito que tem a ver com o declaratário, pois é preciso provar que o
declaratário sabia, ou tinha obrigação de saber que aquele elemento sobre o qual recaiu o erro
era essencial para o declarante.

Imaginemos que o erro foi eu querer alugar e vendi, neste caso eu teria que provar que era
essencial que queria lugar e nunca vender e o outro sabia isso e portanto, há aqui um requisito
que tem a ver com a pessoa do declaratário, mas é o declarante que tem que provar os
requisitos todos, porque quem tem que provar os requisitos da anulabilidade é quem quer
anular e terá que provar que:

a) Houve uma divergência entre a vontade e a declaração.


b) A sua declaração não corresponde á sua vontade real.
c) Que o elemento sobre o qual incidiu o erro era um elemento essencial para si.
d) Tem que provar que o declaratário sabia, ou que pelo menos tinha obrigação de
saber que aquele elemento sobre o qual recaiu o erro era um elemento essencial
para o declarante.

Só provando todos estes requisitos é que efectivamente estão preenchidos os requisitos do


artigo 247 e só provando isto tudo é que este artigo se aplica e o negócio será anulado, porque
se faltar algum destes requisitos, podemos à mesma dizer que há um erro na declaração, mas
devemos concluir que é um erro na declaração que não é relevante como causa de
anulabilidade.

Há um ponto muito importante a referir que tem a ver com algo que nós já vimos aqui nas
aulas, determinar se há ou não há um erro na declaração, pressupõe a prévia interpretação da
declaração negocial, pois só depois de interpretada a declaração negocial, nos termos do
artigo 236 e seguintes, é que podemos concluir se há ou há um erro na declaração, ou seja, a
interpretação é uma questão prévia face á determinação, se houve ou não houve um erro,
porque já vimos que pode acontecer que o declarante na sua declaração use palavras que
objectivamente não exprimem correctamente a sua vontade, mas se o declaratário tiver
percebido o que ele quis dizer, já vimos que se aplica o nº 2 do artigo 236, ou seja, sempre que

Serafim Cortizo 20100059 Página 106

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o declaratário percebe que o que é que o declarante quis dizer, a declaração já vale com o
sentido que o declarante lhe quis dar e como está previsto no nº 2 do artigo 236, que quando
alguém emite uma declaração negocial, se por acaso o declaratário tiver percebido aquilo que
o declarante queria dizer, a declaração valerá com o sentido que o declarante lhe quis dar,
mesmo que o declaratário normal não conseguisse perceber aquela declaração, pois em regra
para se interpretar uma declaração vai-se ver o que o declaratário normal perceberia, mas só
se recorre ao nº 1 do artigo 236 partindo da premissa que o declaratário não percebeu o que é
que o declarante queria dizer.

Sendo certo que o artigo 247 diz, que quando há um erro na declaração com aqueles
requisitos enunciados que o negócio é anulável, o artigo 248 admite que o declaratário possa
evitar a anulação do negócio, porque imaginem que a outra parte não lhe agrada que o
negócio seja anulado e se a outra aparte do negócio não quiser que ele seja anulado tem uma
possibilidade que a lei põe á sua disposição no artigo 248 por diz este artigo que “a
anulabilidade fundada em erro na declaração não procede, se o declaratário aceitar o
negócio como o declarante o queria”, e se o declaratário aceitar o negócio como o declarante
o queria, já não se pode anular.

Exemplo:

Eu queria vender um quadro por 10 mil euros, mas por lapso escrevi mil euros, a outra pessoa
aceitou, formou-se um contrato por mil euros e imaginemos que eu conseguia demonstrar em
tribunal que tinha havido um erro na declaração da minha parte com todos os requisitos do
artigo 247. Se eu provasse os requisitos todos do 247 o juiz anularia a venda que eu fiz, mas se
a outra pessoa estiver mesmo muito empenhada no quadro, ele tem uma maneira de evitar a
anulação que é dizer que paga os 10 mil, pois se o problema é a vontade real ser 10 mil, mas se
por lapso foram apenas declarados mil, ele dispõe-se a pagar de modo a que o negocio valha
pela vontade real do errante e se ele se disponibilizar para que o negócio fique concluído e
para ficar com o quadro, tem sempre a possibilidade de nos termos do artigo 248,
disponibilizar-se para que o negócio fique nos termos que o errante quis, que era receber os
10 mil euros pelo quadro.

ARTIGO 249 – ERRO DE CÁLCULO OU DE ESCRITA (ERRO OSTENSIVO)


“O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou
através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à rectificação
desta”.

A primeira constatação que podemos fazer, é que quando existe este tipo de erro a lei não
prevê que o negócio seja anulado, o que a lei prevê é que haja uma rectificação da declaração
e rectificar a declaração, significa pôla de acordo com a vontade real, pois tínhamos uma
declaração que era discrepante com a vontade real e agora é rectificada e passa a estar em
harmonia com a vontade real e portanto, no caso do artigo 249 o negócio não se anula mas
vai-se para outra solução e põe-se a declaração a valer com o sentido que o errante queria,
vai-se rectifica-la de modo a ela passar a estar em harmonia com a vontade do declarante, ou
seja, no artigo 249 este erro não permite anular o negócio porque a lei opta por uma solução

Serafim Cortizo 20100059 Página 107

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que em principio até dá para o errante que é, vai-se dar á declaração o sentido que o errante
lhe teria querido dar e vai-se dar esse sentido, porque se rectifica passando a ter o sentido que
ele lhe teria querido dar, mas sem a tal divergência entra a vontade e a declaração.

Por isso é que é importante saber se num caso prático o erro que estamos a analisar cai no
artigo 247 ou se cai no artigo 249 e isto é importante, porque se cair no artigo 247 é
fundamento de anulação, mas se cair no artigo 249 não é fundamento de anulação, mas
apenas motivo de rectificação.

Mas a parte fundamental para se perceber este artigo é aquele trecho onde se diz “revelado
no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é
feita” e o que se revela no contexto é o próprio erro, pois o que a lei está a dizer é que este
erro é um erro detectável, ou seja, nas circunstâncias em que a declaração é feita, é possível
apercebermo-nos que houve um erro, que é um erro cognoscível, detectável e por isso é que a
doutrina diz que é um erro ostensivo, porque é um erro que salta á vista, se forem declarações
escritas, quem as ler percebe que há um erro, mesmo que sejam declarações orais percebe-se
que há um erro, pois aqui prevê-se um tipo de erro de calculo ou de escrita mas que é
detectável por quem se encontra nas circunstâncias em que o negócio está a ser celebrado.

Exemplo 1:

Imaginemos um contrato de compra e venda de uma casa, em que foi vendida a casa e o
recheio da casa e no contrato de compra e venda na escritura pública dizia-se “o andar é
vendido por 380 mil euros, o recheio por 70 mil euros, o que dá 550 mil euros”. É evidente que
a lei neste texto percebe que há um erro porque 380 mais 70 dá 450 mil euros e não dá 550
mil e num caso destes, apesar de se ter dito que se estava a vender por 550 mil, o comprador
não precisa de anular a compra, porque nas próprias declarações estão os ingredientes porque
não foi apenas apresentado um resultado final, pois se a escritura publica dissesse assim “a
casa e o recheio são vendidos por 550” e se por trás se tinha estado a pensar que era 450 isto
não é um erro ostensivo porque quem olha para a escritura publica não tem maneira nenhuma
de saber como é que se chegou ao número 550, mas já é diferente quando na escritura publica
se discrimina os elementos que vão ser somados, portanto, isto é um exemplo de um erro
ostensivo.

Já não é um erro ostensivo o comprador andar a pensar “eu quero comprar casa por 380,
quero comprar o recheio por 70 e depois faz ao outro uma proposta a dizer que compra por
550 mil”, aí tudo se passou na cabeça do comprador que ao somar 380 a 70 na sua cabeça
descobriu que o resultado errado de 550 e dirigiu-se ao dono da casa dizendo que compra
tudo por 550 mil, neste caso, é evidente que ele está em erro, mas não se pode dizer que é um
erro ostensivo pois não é um erro que o outro tenha obrigação de detectar caindo no artigo
247, porque isto não é um erro ostensivo porque no contexto da declaração não é possível
detectar o erro.

Exemplo 2:

Num contrato de arrendamento onde se diz assim “ o presente contrato de arrendamento tem
a duração de 6 meses começando no dia 1 de Agosto e terminando a 31 de Dezembro”, neste

Serafim Cortizo 20100059 Página 108

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caso de 1 de Agosto a 31 de Dezembro são 5 meses, e portanto aqui há um erro ostensivo


porque quem olha para aquele texto escrito, pode aperceber-se que há um erro. Mas a ideia é,
quando o erro é ostensivo, não há necessidade de anular, corrige-se e naquele exemplo de há
pouco a casa vendida por 350, recheio por 70, total 550 mil euros, está ali um erro de 100 mil a
mais e neste caso o comprador não tem que anular a compra, o comprador pode exigir que
onde está escrito 550 que se leia 450 porque neste caso aplica-se o artigo.

Normalmente, no vulgar erro na declaração a única maneira que há de o errante se


desvincular do negócio é anulando nos termos do artigo 247, mas se esse erro é um erro
ostensivo, no sentido do artigo 249, o errante como o argumento de que aquele erro era
cognoscível e que saltava á vista e onde há no fundo, uma espécie de lapso material, ele pode
nos termos do artigo 249 obter a satisfação do seu interesse, não recorrendo á anulação, mas
obtendo que a declaração seja corrigida para passar a estar de harmonia com a sua vontade
real, pois quando se rectifica a declaração, ao ser rectificada passa a ter o sentido igual á
vontade real, logo deixa de haver erro.

Também vimos que naquelas situações que há primeira vista uma pessoa faz uma declaração
que tem um sentido diferente da sua vontade real, mas se se conseguir provar que o
declaratário se apercebeu do que ele queria dizer, então como se aplica o artigo 236 nº 2, vai-
se acabar por dar á declaração o sentido que ele lhe queria dar, apesar de ele se ter exprimido
mal, e apesar de no artigo 236 nº 2 a declaração valer com o sentido subjectivo, por muito mal
manifestada que ela tenha sido, na realidade, graças ao artigo 236 nº 2, constatamos que
afinal não há nenhuma divergência entre a vontade e a declaração, visto que a declaração tem
o sentido jurídico igual ao da vontade. Portanto, quer no artigo 236 nº 2, quer no artigo 249,
há como uma rectificação do sentido objectivo das palavras de modo a faze-las coincidir com a
vontade subjectiva e portanto, nem sempre o erro na declaração dá lugar a uma anulação num
negócio jurídico com se pode ver, só dá nas situações do artigo 247 que não são assim tão
simples de se verificarem.

Ainda acerca do erro na declaração, temos no artigo 250 que fala do erro na transmissão da
declaração e aqui está-se a pensar em casos em que o declarante se serve, por exemplo, de
um intermediário para manifestar a sua vontade.

Exemplo:

Imaginemos que há uma pessoa em Braga que me fez uma proposta de compra, e há um
amigo meu que me anuncia que vai amanhã a Braga, e esse meu amigo também conhece a
pessoa que me fez a proposta e eu digo ao meu amigo para dizer ao fulano tal que eu aceito a
proposta dele. Mas pode acontecer que o tal meu amigo chegue lá e diz que fulano tal manda
dizer que não aceita. Ele transmitiu mal a minha vontade, ou eu digo que vendo um quadro
por 100 mil e ele diz que eu só vendo por 10 mil e transmite mal a minha mensagem. Nesses
casos, temos uma pessoa que tinha uma vontade real, não a dirigiu directamente ao
declaratário e serviu-se de um mensageiro, e nestes exemplos há um mensageiro, mas note-se
que esse individuo não é meu representante, pois não se trata de ele dizer que vem em nome
de fulano tal dizer isto e neste caso quando usamos um intermediário que não é um
representante chamamos a essa pessoa um “núncio”.

Serafim Cortizo 20100059 Página 109

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Então, o artigo 250 prevê os casos em que alguém forma determinada vontade negocial, mas
porque se serve de um intermediário para dirigir a sua vontade negocial ao declaratário, por
alguma razão o intermediário transmite mal a declaração da pessoa que o incumbiu de
transmitir a declaração, e quando isso acontece há que distinguir se o intermediário agiu ou
não com dolo, porque pode acontecer que o intermediário, propositadamente, de má-fé,
intencionalmente, transmitiu mal a mensagem negocial e se isso acontecer, se houver má-fé
do intermediário (dolo), desde que se prove isso, o negócio é sempre anulável através do
artigo 250 nº 2 “quando, porém, a inexactidão for devida a dolo do intermediário, a
declaração é sempre anulável”, aqui a lei claramente que desprotege o declaratário, mas
desprotege o declaratário porque seria um enorme risco deixar o declarante nas mãos do
intermediário e por isso é sempre anulável se tiver havido dolo, só que apesar de
aparentemente esta norma ser de fácil aplicação, na realidade é de difícil aplicação, porque
para se aplicar o nº 2 do artigo 252 em primeiro lugar tem que se demonstrar que a minha
vontade real não era coincidente com aquilo que disse o intermediário e tenho que
demonstrar que o intermediário fez de propósito ao transmitir mal a minha vontade, porque
ele pode não ter agido com dolo, pois o nº 2 é só em caso de dolo pois não se aplica o nº 2 do
artigo 250 se o intermediário for apenas censurável por negligencia e se assim é, aplica-se o nº
1 do artigo 252 e também se aplica em casos em que o intermediário até pode não ter tido
culpa nenhuma, pois até pode ter havido culpa do declarante no modo confuso, ou pouco
claro como comunicou a sua vontade ao intermediário.

Então, sempre que o intermediário transmite mal, mas sem ter havido dolo da sua parte, os
casos de dolo são cobertos pelo artigo 252 nº 1, pois há casos em que o intermediário age com
negligencia e há caso em que nem sequer há negligencia do intermediário, ele é apenas
censurável, porque objectivamente foi mal transmitido, mas nos casos do nº 1 do artigo 250 “a
declaração negocial inexactamente transmitida por quem seja incumbido da transmissão
pode ser anulada nos termos do artigo 247”, e neste caso, além de ser referido este artigo na
resolução de um caso prático, tem que se mencionar os seus requisitos que são, tem que
haver uma divergência entre a vontade e a declaração, mas depois tem que se demonstrar
que o ponto sobre o qual incide essa divergência é algo que era essencial para o declarante e
depois ainda se tem que se provar o requisito que tem a ver com o declaratário sabia, ou não
devia ignorar, que aquele elemento sobre o qual recaiu o erro era essencial.

ARTIGOS 251 e 252 - ERRO NA FORMAÇÃO DA VONTADE (ERRO VÍCIO)


Aqui estamos num erro na formação da vontade, porque como vimos há pouco, no erro da
declaração a vontade do declarante formava-se bem, o problema do erro na declaração não
foi a formação da vontade que se formou sem vícios, o problema surgiu no momento em que a
vontade foi exteriorizada, portanto, nos casos que estivemos a ver até ao momento a pessoa
não vem dizer que a sua vontade se formou mal, mas quando chegou o momento de a
exteriorizar, devido a um erro houve uma discrepância entre o que pensava e aquilo que se
disse.

Mas agora vamos ver casos, em que logo á partida a vontade forma-se mal, ou seja, uma
pessoa vai querer algo, mas aquilo que vai querer só o quer devido a um erro, pois se tivesse
conhecimento da realidade não quereria aquele negócio.

Serafim Cortizo 20100059 Página 110

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No erro da formação da vontade, o declarante declara o que quis, mas aquilo que quis só o
quis devido a um erro.

Artigo 251 “o erro que atinja os motivos determinantes da vontade, quando se refira à pessoa
do declaratário ou ao objecto do negócio, torna este anulável nos termos do artigo 247”.

Artigo 252 nº 1 “o erro que recaia nos motivos determinantes da vontade, mas se não refira á
pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes
houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo”, nº 2 “se, porém, recair sobre
as circunstâncias que constituem a base do negócio, é aplicável ao erro do declarante o
disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstâncias
vigentes no momento em que o negócio foi concluído”.

O artigo 251 aplica-se a duas situações de erro na formação da vontade;

a) Erro sobre o objecto do negócio.


b) Erro sobre a pessoa do declaratário.

Exemplos:

Eu compro um quadro que penso que foi pintado pelo Leonardo da Vinci e depois descubro
que é uma falsificação ou uma cópia, eu estou em erro sobre o objecto, porque um elemento
determinante para a identificação de um quadro é o seu autor e eu atribuía um quadro a um
certo pintor e estava enganado, isto é um erro sobre um objecto, ou então eu compro um
objecto amarelado que eu penso que é ouro, mas é latão, portanto, tudo isto são situações de
erro sobre o objecto do negócio.

Mas este artigo também se aplica a erros sobre a pessoa do declaratário, ou seja, o
declarante, aquele que forma mal a sua vontade poderá estar em erro acerca da pessoa do
declaratário, da pessoa com quem vai celebrar o negócio e o erro acerca da pessoa do
declaratário, pode ser um erro sobre a identidade do declaratário, ou pode ser um erro sobre
as qualidades ou características do declaratário.

Exemplos:

Eu fiz uma doação a um individuo porque pensava que tinha salvo a vida ao meu pai durante a
guerra, mas estava enganado. Ou pensava que certa pessoa era o filho de uma amiga minha,
mas não era. Nesses casos a pessoa até está me erro sobre a identidade da pessoa com quem
celebrou o negócio, ou seja, a minha vontade formou-se mal, porque na realidade, é verdade
que eu quis doar um bem àquela pessoa, eu não posso negar que tive vontade de doar o bem
àquela pessoa, portanto, não há divergência entre a vontade e a declaração, mas eu tive
vontade de doar àquela pessoa em concreto, porque pensava que tinha salvo a vida ao meu
pai, ou que era um filho da tal minha amiga, pois se eu soubesse que ele não tinha salvo a vida
ao meu pai, ou se eu soubesse que ele era o filho de uma amiga, nunca teria tido vontade de
lhe doar o bem.

Serafim Cortizo 20100059 Página 111

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Portanto, sempre que há um erro sobre o objecto do negócio ou sobre a pessoa do


declaratário e nestes casos só se aplica o artigo 251 quando a pessoa sobre a qual recai o erro
é o declaratário, porque pode haver um caso em que o errante (o declarante) pode estar em
erro acerca de si próprio e apesar de ser um erro sobre uma pessoa, não se aplica o artigo 251,
pois neste artigo a pessoa relativamente á qual está prevista em cair no erro, é a pessoa do
declaratário.

Exemplo:

Eu fiz uns exames médicos, mas houve uma troca dos exames e vieram-me dizer que eu tinha
uma doença gravíssima e que ia morrer até ao fim do mês e então eu pensei que se vou
morrer, então vou oferecer os meus bens às pessoas minhas amigas porque pensava que iria
morrer nos dias mais próximos e depois, imagine-se que vão passando os dias, as semanas e os
meses e começo a pensar que estou ainda vivo mas pobre porque não tenho nenhuma doença
mortal e vou ter com os tais meus amigos e pedir os meus bens de volta. Eu doei os bens
porque estava em erro acerca de uma pessoa, eu mesmo e neste caso é um erro sobre a
pessoa do declarante e este caso não cai no artigo 251, mas cai no artigo 252 nº 1, entre aquilo
que se chama “um erro sobre os motivos”, porque o artigo 252 nº 1 aplica-se a todos os casos
de erro na formação da vontade que não caem no artigo 251, ou seja, o artigo 252 nº 1 é
aquilo a que chamamos um artigo residual, que fica com as sobras, sendo que o que cai no
artigo 251 é o erro sobre o objecto ou sobre a pessoa do declaratário, sendo que o erro sobre
a pessoa do declarante, como no exemplo que eu dei, cai directamente no artigo 252 nº 1.

Antes de sair do artigo 251, a lei fala aqui em objecto, e no conceito de objecto do negócio,
não se deve confundir com objecto com coisa, pois não tem forçosamente uma coisa, pois nos
exemplos que eu dei até era uma coisa e estava enganado acerca de um aspecto que tinha a
ver com um quadro, ou com uma vivenda ou se aquele relógio não era de uma marca, mas era
de outra, mas o erro sobre o objecto do negócio até pode ser um contrato de prestação de
serviços, pois uma pessoa pode estar em erro acerca do serviço que lhe vai ser prestado, pois
uma pessoa pode ter encomendado um serviço, pensado que um serviço tem um certo
conteúdo e depois aparece-me outro serviço que não estava previsto.

Há quem diga que os erros do artigo 251 são erros de facto, mas os erros do artigo 251
também se podem aplicar as casos que sejam de erro de direito, pois a pessoa pode ter
celebrado um negócio porque tem um desconhecimento das regras jurídicas que a levam a
associar àquele negócio certos efeitos que ele na realidade não tem, mas aqui está-se a
pensar no objecto do negócio como conteúdo do negócio, pois a generalidade da doutrina,
considera que quando o erro é sobre o próprio conteúdo jurídico do negócio (sobre os efeitos
que o negócio produz) que é um erro sobre o objecto num sentido amplo que abarca o próprio
conteúdo.

Exemplo:

Imaginemos um individuo cujo sonho era dar aulas, mas convenceu-se erradamente de que se
comprasse um colégio que sendo co proprietário do colégio que poderia dar aulas e o motivo
que o levou a comprar o colégio foi o de pensar que um dos efeitos jurídicos dessa compra
seria habilitá-lo enquanto proprietário de poder dar aulas, mas ao descobrir que o facto de ser

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dono de um colégio, só por si não o habilitava a poder dar aulas, imaginemos que essa pessoa
pretendia anular o negócio. Na realidade o que estava aqui em causa é que ele não estava em
erro acerca do objecto de negócio, ele não está em erro acerca das características do colégio,
mas ele está em erro acerca dos efeitos jurídicos do negócio que celebra, porque ele associa
aquele negócio um efeito jurídico que é o de poder dar aulas e descobrindo que afinal não o
pode fazer e imaginemos que ele quer anular o negócio dizendo “a minha vontade formou-se
mal, é verdade que eu quis comprar o colégio, mas quis comprar o colégio devido a um motivo
erróneo, porque pensava erradamente que isso me permitiria dar aulas”. Há quem considere
que isto seria um erro de direito, porque ele está em erro é acerca das regras jurídicas que
regem esta matéria.

Quando existe um erro que cai no artigo 251, para saber se o negócio é ou não anulável, a lei
remete para o artigo 247 e para aqueles requisitos desse artigo aplicam-se nos casos do artigo
251, tendo-se que provar que o erro caiu sobre um elemento essencial e que a outra parte
tinha obrigação de saber que era essencial, portanto, é preciso nos casos do artigo 251 provar
os requisitos do artigo 247.

O facto de o artigo 251 remeter para o artigo 247 não permite que se diga que no artigo 251
é um erro na declaração, pois no artigo 251 há um erro na formação da vontade, mas quanto
aos requisitos da anulabilidade, é que se aplicam os mesmos do erro na declaração, pois o que
há aqui é uma norma remissiva, pois o artigo 251 remete para o artigo 247, mas isso não
permite afirmar que o artigo 251 é um erro na declaração, não é, mas sim um erro na
formação da vontade.

Aula 18

ERRO (Artigo 252 nº 1)


Quando existe um erro na formação da vontade, esse erro na formação da vontade pode
incidir sobre o objecto ou sobre a pessoa do declaratário, e quando isso acontece aplica-se o
artigo nº 251, que acaba por ter requisitos de anulabilidade semelhantes ao do erro na
declaração e o artigo 251 remete para o artigo 247, mas como eu já frisei, o artigo 251 não é
um erro na declaração, mas sim um erro na formação da vontade, mas que tem requisitos
iguais ao erro na declaração.

Mas pode haver um erro na formação da vontade que incida sobre motivos diferentes
daqueles que têm a ver com o objecto ou com a pessoa do declaratário:

Exemplo:

Se eu fizer uma doação a pessoas minhas amigas, porque me convenci erradamente que tinha
uma doença mortal e que ia morrer muito em breve, e assim sendo, podia fazer essas doações,
e depois venho a descobrir que quando fiz as doações, que estava enganado, porque tinha
havido uma troca de análises e um erro de diagnóstico e que na realidade eu não tinha a tal
doença mortal, e até pode acontecer que eu pretenda anular as doações que fiz e pretenda
reaver os bens que doei, neste caso, a minha vontade de doar é que se formou mal, porque eu
de facto quis doar, porque pensava que tinha uma esperança de vida muito curta, e se eu

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soubesse que não estava doente, eu nunca teria feito aquelas doações, e neste caso, a minha
vontade formou-se mal, porque de facto eu quis doar, mas quis doar porque estava em erro
acerca do meu estado de saúde.

Estar em erro acerca do meu estado de saúde, não é um erro sobre o objecto, o objecto são os
bens doados, mas também não é erro sobre a pessoa do declaratário, pois o declaratário são
os tais amigos a quem eu doei, eu estou em erro acerca de mim próprio, e neste caso sobre o
meu estado de saúde. Este erro não cai no artigo 251, visto que este artigo só se aplica ao erro
sobre o objecto ou sobre a pessoa do declaratário, e então se não cai no artigo 251,
automaticamente, e por exclusão de partes, cai na norma residual do artigo 252 nº 1, pois os
erros na formação da vontade que não caiam no artigo 251, caiem no artigo 252 nº 1 que
prevê o caso daquilo que a lei chama erro sobre os motivos.

Se formos a ver bem, todos os erros na formação da vontade são erros sobre os motivos, e o
artigo 251 fala em motivos que incidem sobre o objecto, ou sobre a pessoa do declaratário,
mas a lei usa no artigo 252 nº 1 a expressão erro sobre os motivos para se aplicar a todos os
motivos, excepto, os motivos que tenham a ver com o objecto ou com a pessoa do
declaratário. Qualquer erro na formação da vontade que não tenha a ver, nem como objecto
nem com a pessoa do declaratário, designamo-lo por erro sobre os motivos e aplica-se o
artigo 252 nº 1 “o erro que recai sobre nos motivos determinantes da vontade, mas se não
refira á pessoa do declaratário nem ao objecto do negócio, só é causa de anulação se as partes
houverem reconhecido, por acordo, a essencialidade do motivo”.

Quando estamos perante um erro sobre os motivos, que seria este exemplo que eu dei, é um
exemplo de um erro sobre os motivos, mas para que um negócio possa ser anulado, o errante
(aquele que fez a declaração em erro) para anular o negócio, a lei aqui não remete para outro
artigo, no caso do artigo 251 mandava aplicar o artigo 247, mas o artigo 252 nº 1 não manda
aplicar outro artigo, e aplica-se o próprio 252 nº 1, e o este artigo nos vem dizer, é que o tal
erro sobre os motivos só é causa de anulação “se as partes houverem reconhecido por acordo,
a essencialidade do motivo” e isto é diferente do artigo 251, porque este remetia para o
artigo 247, sendo que era necessário nos erros do artigo 251 provar que o declaratário sabia
ou não deveria ignorar que aquele elemento era essencial.

Mas aqui é diferente, pois para anular, não basta o errante provar que o outro sabia que
aquele elemento era essencial, é preciso que o errante prove que tinha havido um acordo
prévio das partes no sentido de fazer depender (o negócio) no sentido de não se vir a apurar
um erro, ou seja, as partes poderiam ter combinado que, se por acaso, se vier a descobrir que
eu estou bem de saúde, então o negócio fica sem efeito e neste caso, aplicando o artigo 252 nº
1, para se poderem anular as doações seria necessário que tivesse ficado combinado que, se
eu por acaso viesse a descobrir que estava de boa saúde e só então é que o negócio seria
anulado e era preciso que o outro tivesse concordado com isso.

ERRO SOBRE A BASE DO NEGÓCIO (Artigo 252 nº 2)


Artigo 252 nº 2 “se, porém, recair sobre as circunstâncias que constituem a base do negócio, é
aplicável ao erro do declarante o disposto sobre a resolução ou modificação do contrato por
alteração das circunstâncias vigentes no momento em que o negócio foi concluído”

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Este artigo desperta muitas dúvidas, em primeiro lugar porque fala num erro que recai sobre
as circunstancias que constituem a base do negócio, mas não explica aqui o que é a base do
negócio, mas neste caso, a base do negócio não é sinónimo de objecto do negócio, e por outro
lado a lei aqui diz que se aplica a este erro um regime para o qual remete e diz “aplica-se o
regime sobre a resolução ou modificação do contrato por alteração das circunstancias
vigentes no momento em que o negócio foi concluído”, ou seja, na prática este artigo está a
fazer uma remissão para o artigo nº 437, quando manda aplicar o regime da alteração das
circunstâncias, esse regime vem no artigo 437, o que significa que para se interpretar o artigo
252 nº 2 também temos que ver o artigo 437.

Artigo nº 437 “se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem
sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito á resolução do contrato, ou á
modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ele
assumidas afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta a modificação do
contrato nos termos do número anterior”.

Não se pode nem se deve confundir erro sobre a base do negócio com a alteração normal de
circunstâncias e por alguma razão há dois artigos distintos. O erro sobre a base do negócio é
o artigo 252 nº 2 havendo uma remissão para o artigo 437. Se for alteração normal de
circunstâncias cairia exclusivamente no artigo 437 e não seria um caso de erro pois quando
há uma alteração normal das circunstâncias, não há erro nenhum e aplica-se o artigo 437.
Quando há erro sobre a base do negócio, é que o artigo 252 nº 2 manda aplicar os requisitos
do artigo 437.

ERRO SOBRE A BASE DO NEGÓCIO (Conceito)


Fala-se em erro sobe a base do negócio quando o erro recai sobre um elemento que foi
decisivo para a vontade de ambas as partes contratarem, ou seja, ambas as partes
assentaram a sua decisão de contratar no mesmo pressuposto erróneo.

Exemplo:

Este caso é conhecido como “o caso da coroação” e teve lugar em Inglaterra a propósito da
coroação da rainha Victória.

Houve uma situação em que ia haver uma cerimónia de coroação e estava previsto um desfile
pelas ruas de Londres, para que a população pudesse aplaudir a rainha, e houve muita gente
que pagou fortunas para arrendar janelas de certos edifícios para poderem assistir ao desfile
por onde iria passar o cortejo, e houve pessoas que pagaram grandes quantias para poderem
estar á janela de casas alheias a ver passar a rainha, e houve uma série de contractos de
arrendamento de janelas que foram celebrados.

Só que houve algumas pessoas que se enganaram, e convencidas que o cortejo iria passar em
determinadas ruas que não estava previsto passar, arrendaram janelas em ruas em que o
cortejo na realidade não passou porque não estava previsto passar, e depois levantaram-se
problemas, porque os senhorios recusaram-se a devolver o dinheiro das rendas pagas e o caso
posteriormente chegou aos tribunais.

Serafim Cortizo 20100059 Página 115

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As pessoas estavam em erro porque estavam convencidas que o cortejo passaria em certas
ruas, quando desde o início estava previsto que não passaria naquelas ruas.

Então quando o caso chegou a tribunal foi feita uma construção jurídica em que se vem dizer
que:

É verdade que entre as partes não havia uma cláusula dizendo que se por acaso o cortejo não
passasse nesta rua o contrato fica sem efeito. O certo é, que nenhuma das pessoas teve a
precaução de por uma clausula destas, mas se houvesse uma clausula a dizer que se por acaso
o cortejo não passar nesta rua, o contrato ficaria sem efeito, o problema estaria resolvido, mas
os tribunais londrinos entenderam que o contrato de arrendamento de janelas é um contrato
completamente análogo, porque normalmente ninguém arrenda janelas pois nem as pessoas
querem arrendar uma janela alheia, nem ninguém põe anúncios a querer arrendar janelas e só
em situações muito excepcionais é que isso acontece, e naquele caso o tribunal decidiu que
neste tipo de caso é tão evidente que o pressuposto da decisão de contratar de ambas as
partes, que é a passagem do cortejo, que nem é preciso dizer que o contrato ficaria sem efeito
se o cortejo não passasse ali, pois é um contrato em que a sua única razão de ser dele, é
precisamente esse pressuposto, e é evidente que esse mesmo pressuposto não tinha o mesmo
valor para o arrendatário nem para o senhorio.

Para o arrendatário era decisivo porque não queria pagar dinheiro para estar ali a ver passar
umas carroças, do ponto de vista do senhorio, este não se importava de ganhar a vida a
arrendar janelas, pois para os senhorios é irrelevante, se passa ou não passa a rainha no
cortejo, ele quer é receber o dinheiro, mas sabe perfeitamente que aquele tipo de contrato
nunca o faria se não tivesse previsto passar a rainha.

Então como os tribunais ingleses decidiram que não era preciso haver uma clausula a dizer que
o contrato ficaria sem efeito se o cortejo não passasse ali, porque era algo que era um
pressuposto do próprio contrato, e a construção doutrinária foi dizer que, nesse tipo de
situação, o elemento sobre o qual recai o erro é um elemento essencial para o negócio, no
fundo é o facto que explica aquele negócio e na própria base do negócio nem sequer é
necessário haver uma haver uma combinação como aquela que vem na parte final do nº 1 do
artigo 252, porque o grande interesse do erro sobre a base, é não ter que se aplicar a parte
final do nº 1 do artigo 252, pois não é necessário para poder anular este negócio, demonstrar
que tinha havido um acordo sobre a essencialidade do motivo, e mesmo que não tenha havido
um acordo, é evidente que havia um entendimento comum das partes sobre o que era a
essencialidade do negócio.

No erro sobre a base há um pressuposto comum a ambas as partes, o que não quer dizer que
haja um erro comum, mas há pelo menos um pressuposto comum a ambas as partes que
explica que tenha sido celebrado aquele negócio com aquele teor, e nessas situações, vendo
agora o regime da lei, o artigo 252 nº 2 não diz, literalmente falando, que o negócio é anulável,
o que é dito neste artigo é que o negócio pode ser “resolvido ou modificado desde que se
aplique o disposto sobre a resolução ou modificação de um contrato pela alteração das
circunstancias vigentes no momento em que o negócio foi concluído”, portanto, não se fala
aqui em anular, diz que se aplica o regime que a lei prevê para a alteração das circunstancias e
que o regime em que havendo alteração normal das circunstancias, uma parte pode resolver o

Serafim Cortizo 20100059 Página 116

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contrato ou modificá-lo, porque a lei remete para ele, mas não devemos confundir a a
situação do artigo 437 com a situação do erro sobre a base.

Artigo nº 437 “se as circunstâncias em que as partes fundaram a decisão de contratar tiverem
sofrido uma alteração anormal, tem a parte lesada direito á resolução do contrato, ou á
modificação dele segundo juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ele
assumidas afecte gravemente os princípios da boa-fé e não esteja coberta a modificação do
contrato nos termos do número anterior”.

A ideia é a seguinte, está-se a imaginar neste artigo que há um contrato que é celebrado com
uma certa base, mas em que o cumprimento vai ser noutra data, e pode acontecer que nesse
intervalo de tempo entra a data em que o contrato foi celebrado e a data em que é suposto
ser cumprido, pode haver uma alteração imprevisível e tem que ser uma alteração drástica,
pois não basta haver uma pequena alteração de circunstancias, mas sim num caso em que
possa haver uma alteração tão drástica e tão imprevisível, que faça ter que cumprir o contrato
nos termos acordados se torne profundamente injusto, porque os termos acordados foram a
pensar em certas circunstancias e pode ter acontecido uma alteração radical dessas
circunstancias, e que quando chega o momento de cumprir, uma das partes pelo menos, será
altamente prejudicada se tiver que cumprir nos termos em que se vinculou.

Exemplo:

Imaginemos que eu contratei um escultor para fazer uma estátua em mármore comigo a
cavalo, e combinámos um certo preço para a obra que cobriria o trabalho do escultor e o
preço do mármore.

Mas imaginemos, que por alguma razão, o preço do mármore subia cinquenta vezes, pois
aquela matéria-prima que quando combinamos o preço da escultura tinha um certo preço, e
agora passava a custar cinquenta vezes mais, neste caso, poderá ser considerado injusto eu
insistir como escultor para que cumpra o contrato nos termos que tinham sido acordados,
quando é certo, que houve uma alteração anormal em poucos meses, que foi o preço subir
cinquenta vezes.

Num caso destes, admitindo que o preço da matéria-prima subia tanto, se eu exigisse que ele
cumprisse naquelas condições, ele iria fazer a estátua perdendo imenso dinheiro e num caso
destes, se a outra parte conseguir demonstrar que houve essa alteração anormal, imprevisível,
radical e se conseguir provar que é contrário á boa-fé, eu fazer finca-pé, para que a pessoa
cumpra naqueles termos, porque não basta provar a alteração, mas também é preciso que
devido à exigência das obrigações afecte gravemente o principio da boa-fé.

Aqui, num caso destes, o lesado (o escultor que vai ter que fazer uma estátua pelo preço da
matéria prima que subiu cinquenta vezes) ele pode pedir em tribunal, uma de duas coisas, ou
que o contrato seja resolvido, (rescindido unilateralmente), ou então pode pedir a sua
modificação segundo um juízo de equidade, que neste caso é fazer uma actualização do preço
para tornar o contrato mais equilibrado e justo.

E neste caso, não é qualquer alteração de circunstâncias que permite resolver um contrato,
mas tem que ser uma alteração anormal e imprevisível das circunstâncias.

Serafim Cortizo 20100059 Página 117

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RESUMINDO:

A diferença chave entre a alteração normal de circunstâncias e no erro sobre a base, é que na
alteração normal de circunstâncias, não há nenhum erro á partida, porque á partida as pessoas
têm uma visão correcta da realidade, pois quando celebram um negócio não estão em erro, só
que depois a realidade evolui de uma maneira e as circunstancias em que o negócio é
celebrado alteram-se posteriormente.

Coisa diferente, é no erro sobre a base, pois quando na altura em que é celebrado o negócio as
pessoas já tinham uma visão errada da realidade, e quando há um erro sobre a base do
negócio, a lei diz que se aplica o regime da alteração normal de circunstancias, e portanto, se
nos agarrarmos á letra da lei, isso quer dizer que havendo um erro sobre a base do negócio,
aquele que se sente lesado com aquele erro, mesmo que seja um erro bilateral, aquele que se
sente lesado por erro sobre a base, se se aplica o artigo 437, face á letra da lei, o errante
poderia pedir, ou a modificação do contrato, ou a sua resolução.

Mas a maioria da doutrina portuguesa diz que não é assim, porque apesar de a lei remeter
para o artigo 437, se aqui há um vicio, a forma normal de agir contra o vicio é a anulação, e
não é a resolução, e apesar de serem designações muito parecidas, (são rescisões unilaterais
do contrato) na resolução é um regime jurídico para rescindir contractos válidos, ao passo
que a anulação serve para destruir contractos inválidos.

E a maioria da doutrina diz que, apesar de se falar aqui em resolução, é um lapso, porque se há
um erro, há um vício e quando há um vício, o modo normal de rescindir unilateralmente um
contrato é através da modalidade de invalidade, e a modalidade de invalidade equivalente á
resolução, seria a anulação, e parte da doutrina, diz que, onde se lê resolução deve ler-se
anulação.

Discute-se, se o erro sobre a base do negócio (erro na formação da vontade) pois há quem diga
que qualquer erro da formação da vontade, pode ser um erro sobre a base do negócio pois
basta que, ambas as partes se tenham baseado no mesmo pressuposto erróneo.

Há uma concepção dominante, que considera que pode haver um erro sobre a base do
negócio, em que o elemento sobe o qual recaiu o erro pode ser um motivo que vem no artigo
251 ou um motivo que vem no artigo 252 nº 1, pois bastaria que fosse um erro bilateral, mas
teria que haver um pressuposto erróneo a ambas as partes, e já se aplicaria o artigo 252 nº 2.

Exemplo:

Imaginemos que eu compro um quadro muito caro, porque penso que é do Leonardo da Vinci,
mas o vendedor vendeu-me o quadro muito caro, porque também pensava que era do
Leonardo da Vinci.

O que fez que combinássemos um preço tão elevado, foi o pressuposto comum a ambos de
que o quadro era do Leonardo da Vinci, e na doutrina, há quem diga que isto apesar de ser um
erro sobre o objecto, neste exemplo, é simultaneamente um erro sobre a base, pois há quem
considere que nada impede que um erro seja simultaneamente sobre o objecto ou sobre a
base do negócio.

Serafim Cortizo 20100059 Página 118

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Esta situação é discutível porque, segundo Castro Mendes, ele defendia que o erro sobre a
base do negócio, seria sempre um erro que nunca poderia incidir nem sobre o objecto, nem
sobre a pessoa do declaratário, e para Castro Mendes, o erro sobre a base do negócio é um
erro na formação da vontade, mas que pode cair sobre qualquer motivo, excepto sobre o
objecto e sobre a pessoa do declaratário, sendo que Castro Mendes agarrava-se ao elemento
sistemático e á colocação da norma, porque no artigo 252 nº 2 vem uma norma que se chama
“erro sobre os motivos” e o artigo 252 nº 2 é a continuação do nº 1 que diz “se porém” e neste
caso, está-se a estabelecer uma restrição ao que acabou de ser dito e então o professor Castro
Mendes defendia a tese, de que, tendo em conta a colocação sistemática da norma sobre o
erro sobre a base, que era o artigo do erro sobre os motivos, e tendo em conta que esta norma
é a continuação da frase anterior, ele defendia que o erro sobre a base podia ser um erro
comum a ambas as partes, que podia incidir sobre qualquer elemento na formação da
vontade, excepto no objecto e na pessoa do declaratário, e portanto, poderia ser erro sobre a
base do negócio se por exemplo o erro, fosse um erro na pessoa do declarante comum a
ambas as partes.

Segundo Castro Mendes, quando o um erro, for um erro bilateral e se for um erro sobre o
objecto ou sobre a pessoa do declaratário, nunca se pode aplicar o artigo 252 nº 2 porque este
artigo, pela sua colocação sistemática só se aplica aos erros bilaterais sobre os motivos, e para
Castro Mendes, se fosse um erro bilateral, ou sobre a pessoa do declaratário, por exemplo,
fazer uma doação a um amigo porque penso que está pobre, ou comprar um quadro por um
preço muito alto, porque eu e o vendedor pensamos que é do Rembrandt, segundo Castro
Mendes, o único artigo que se podia aplicar seria o artigo 251 e não o artigo 252 nº 2, e neste
caso pode haver interesse em aplicar este artigo porque se só se puder aplicar o artigo 251, a
alternativa é, ou anular ou deixar estar como está, mas se se puder aplicar o artigo 252 nº 2, há
uma terceira hipótese que é modificar o contrato, porque eu posso ter comprado um quadro
do Leonardo da Vinci e depois descubro que o quadro não é do Leonardo da Vinci, mas é de
outro pintor que também é bom mas que não vale tanto, se calhar eu até quero ficar com o
quadro, e portanto, a vantagem de se aplicar o regime do erro sobre a base às situações do
artigo 251, é poder haver a modificação do negócio, porque se é para anular, anula-se com
base no artigo 251.

Aula 19

DOLO
O dolo enquanto conduta geradora de erro vem previsto nos artigos 253 e 254, mas o que nos
interessa aqui é o dolo enquanto conduta culposa que induz outra pessoa em erro, e partindo
do principio que o dolo se deve a erro de outra pessoa, agora vamos ver um caso em que uma
pessoa celebra um negócio em erro, seja erro na formação da vontade, ou seja erro na
declaração, mas se esse erro foi provocado, ou se foi forçado por uma conduta dolosa do
declaratário ou de terceiro.

A noção de dolo para o efeito que nos interessa, consta do artigo 253 nº 1 que diz “entende-se
por dolo qualquer sugestão ou artificio que alguém empregue com a intenção ou consciência

Serafim Cortizo 20100059 Página 119

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de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo


declaratário ou terceiro, do erro do declarante”.

Neste artigo está-se a partir do principio que alguém celebrou um negócio em erro (erro na
formação da vontade, ou erro na declaração) mas que esse erro de algum modo se deveu a
dolo de uma outra pessoa, que pode ser o declaratário, ou um terceiro e a lei define aqui o
dolo como sendo uma conduta que consiste em alguém recorrer a sugestões ou a artifícios
com a intenção ou a consciência de induzir uma pessoa em erro, e há dolo, se alguém
deliberadamente tem uma conduta que visa colocar outra pessoa em erro, mas para haver
dolo não é absolutamente necessário que a conduta se tenha traduzido em colocar a outra
pessoa em erro, porque pode haver um caso em que a outra pessoa já estava em erro, mas
que a pessoa que age com dolo, ainda vai tentar reforçar esse erro.

Portanto, não é apenas dolo a conduta que visa induzir a outra pessoa em erro, também é dolo
a conduta que visa manter a outra pessoa em erro, e a lei diz que também há dolo, se houver
uma conduta que consista na dissimulação do erro, ou seja, pode acontecer que o declaratário
se aperceba do erro da outra parte e em vez de o alertar para o erro, não fez nada para narrar
a verdade, portanto, o mero facto de não alertar o errante para o seu erro, pode ser suficiente
para haver dolo.

Exemplo:

Imaginemos que eu sou proprietário de um quadro que é uma cópia de um quadro de um


pintor célebre, eu sei que é uma cópia e digo a um potencial comprador, que o quadro é
genuíno e que foi mesmo pintado por aquele pintor, quando eu sei que é uma cópia, e se
mesmo assim proponho a alguém que contrate comigo, eu estou a agir com dolo.

Também há dolo, se perante um erro de determinada pessoa, alguém agir deliberadamente


para a manter em erro e para reforçar o seu erro.

Mas a lei chega ao ponto de dizer que em situações que a pessoa deve agir de boa-fé, e agir de
boa-fé, significa desde logo, se tem conhecimento do vicio, alertar a outra parte para o vicio,
mas se uma pessoa celebra um contrato com alguém, sabendo que existe um vicio e sem
alertar a outra pessoa para o vicio, há claramente culpa na formação do contrato e o artigo
227 prevê essa situação e até diz que quem “agir com culpa na formação de um contrato tem
que indemnizar a outra parte”, portanto, é uma conduta dolosa, alguém saber que existe um
vicio e não alertar a outra pessoa para o mesmo e por isso se percebe que o artigo 253 nº 1
que considera dolo a dissimulação do erro da outra parte.

A lei no artigo 253 nº 2 vem dizer que há certas situações que não são consideradas dolo ilícito
mas caracteriza situações que são dolo não ilícito “não constituem dolo ilícito as sugestões ou
artifícios usuais, considerados legítimos segundo as concepções dominantes no comercio
jurídico, nem a dissimulação do erro, quando nenhum dever de elucidar o declarante resulte da
lei, de estipulação negocial ou daquelas concepções”.

Começando por esta parte final, eu disse há pouco que em certas situações existe o dever de
alertar a pessoa que está em erro para o seu erro, mas há que distinguir situações.

Serafim Cortizo 20100059 Página 120

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Exemplo:

Imaginemos que eu sou dono de uma loja e que vendo frigoríficos e há um individuo que entra
na minha loja e que olha para um frigorifico e diz “finalmente esta é a loja que vende mais
barato esta marca de frigoríficos” eu não tenho a obrigação de dizer que se for a outro lado
encontrará ainda mais barato, pois neste tipo de erro eu não tenho a obrigação de dizer que
está enganada e que há frigoríficos mais baratos, ou seja, neste tipo de informação considera-
se que seria excessivo exigir de uma pessoa que de esse tipo de informação, portanto, como
diz a lei, há casos em que não existe o dever de elucidar, e é evidente que isto tem que ser
visto caso a caso, mas a lei está a admitir que haja situações em que seja legitimo alguém
elogiar o produto que vai fornecer, sem que forçosamente haja dolo.

Mas a doutrina tem chamado á atenção para o seguinte, é que cada vez mais têm surgido
regras, como sabem, de tutela dos consumidores e leis de defesa dos consumidores e hoje em
dia está-se muito mais exigente com o tipo de informação que se exige aos fornecedores de
bens e serviços, do que o que se exigia na altura em que o Código Civil foi feito e à medida que
vai surgindo legislação de protecção dos consumidores, cada vez mais, aquilo que é
considerado “dolo bom” vai-se restringindo porque cada vez mais existe um dever maior de
informação do próprio cliente.

Tudo isto para dizer que quando estamos a analisar uma conduta para saber se é dolo, e
estamos a pensar no dolo que de algum modo tenha contribuído para um determinado erro,
neste caso temos que atender á definição do nº 1 do artigo 253 e depois com as restrições do
nº 2 do artigo 253.

Quando existe dolo, no fundo, não existe aqui um vicio chamado dolo, existe sim, um vicio de
um erro qualificado por dolo, porque o vício que vem aqui tratado no artigo 253 e no artigo
254, também é uma situação de erro porque está-se a imaginar um erro, só que há um erro
que tem a característica, de nesse erro ter havido uma conduta particularmente censurável de
uma outra pessoa, que pode ser o declaratário ou um terceiro, mas este vicio não é dolo no
sentido de o vicio nada ter a ver com o erro, aqui é um erro provocado pelo dolo, e como é
dito no nº 1 do artigo 253, “fala-se em sugestão ou artificio para induzir ou manter em erro
(…) ou dissimular o erro”, portanto, se não houver erro nenhum, a pessoa até pode agir com
dolo e não conseguir induzir outra pessoa em erro, mas aí não há nenhuma causa de
anulabilidade, pois o que interessa é saber, se aquele dolo deu lugar ao erro e se deu lugar ao
erro, ou se contribui para o erro, diz o artigo 254 nº 1 ”o declarante cuja vontade tenha sido
determinada por dolo pode anular a declaração; a anulabilidade não é excluída pelo facto de
o dolo ser bilateral”, portanto, o facto de os indivíduos se andarem a enganar um ao outro,
não impede que o negócio seja anulável, ou seja, não há como uma compensação de culpas, a
ideia é, se o dolo for bilateral, quer dizer que os dois se induziram em erro reciprocamente e
qualquer deles pode invocar o seu próprio erro, portanto, o facto de haver dolo das duas
partes, não impede que o negócio seja anulável por erro. Mas normalmente o dolo não é
bilateral, o mais frequente será uma parte ter sido induzida em erro por outra pessoa e só uma
pessoa tenha agido com dolo, mas nada impede que sejam as duas, mas isso será menos
frequente

Então quando o erro for devido a dolo, o declarante pode anular a declaração.

Serafim Cortizo 20100059 Página 121

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Hão-de reparar que a lei aqui parece menos exigente do que nos outros artigos que vimos até
ao momento, porque quando é um erro na declaração, não bastava dizer que se há erro pode-
se anular, (artigo 247), pois era preciso provar que para além da essencialidade, que o
declaratário conhecia, ou não deveria ignorar a essencialidade, e não esqueçamos que o artigo
247 também se aplica ao erro sobre o objecto, ou sobre a pessoa do declaratário, por remissão
do artigo 251 e quando era um erro sobre os motivos, não bastava demonstrar que tinha
havido um erro essencial, pois segundo o artigo 252 nº 1, era preciso demonstrar que as partes
tinham reconhecido por acordo a essencialidade do motivo. No erro sobre a base do negócio,
como foi visto, tinha que se demonstrar que ambas as partes assentaram a decisão de
contratar num pressuposto erróneo, aqui neste caso, o artigo 254 nº 1, parece ser bastante
mais sintético, ao dizer que quando há dolo o negócio é anulável, mas isso não quer dizer que
sejam muito mais fácil de anular pois continua a ser necessário comprovar que:

1) Houve um erro.
2) Que esse erro de deveu a dolo.
3) Provar que houve dolo.

E se provar que houve erro e que houve dolo, então pode-se anular o negócio e apesar de a lei
não falar aqui em elemento essencial, a doutrina defende que em qualquer erro, só faz
sentido anular, se o erro for essencial para a pessoa cair em erro, ou seja, seja erro simples, ou
erro provocado por dolo, o negócio só é anulável se o errante demonstrar que se não tivesse
sido o erro que não teria celebrado o negócio, ou tê-lo-ia celebrado em moldes diferentes
porque, se se provar que o erro não foi essencial e que a pessoa em qualquer circunstancia
acabaria sempre por celebrar o negócio naqueles termos, se não for essencial não há
justificação para anular, portanto a doutrina considera que apesar de a lei aqui no artigo 254
não se referir á essencialidade, que é de entender que mesmo aqui, para que o errante possa
anular; vai ter que provar que houve erro, que o erro foi essencial e que houve dolo, e
portanto, a essencialidade também teria que ser provada aqui apesar de a letra da lei não o
dizer, porque o raciocínio será o de dizer que se não foi essencial, quer dizer que não foi
determinante na formação da vontade do errante, e se não foi determinante, não há razão
para que se possa destruir o negócio.

RESUMINDO:

No artigo 254, aquele cuja declaração está ferida de erro;

a) Vai ter que demonstrar o seu erro.


b) Vai ter que demonstrar que incidiu sobre o elemento essencial.
c) E depois vai ter que demonstrar o dolo, e demonstrado isso, o negócio é anulável sem
mais.

Ou seja, quando há dolo não é preciso provar que o outro conhecia a essencialidade, nem é
preciso provar que tinha havido um acordo entre as partes acerca da essencialidade, e mesmo
no caso do artigo 252 nº 1, (caso de erro sobre os motivos), se houver dolo não é preciso
provar aquele requisito da parte final do artigo 252 nº 1, em que tinha havido um acordo
prévio ente as partes acerca da essencialidade do motivo, porque a partir do momento em que

Serafim Cortizo 20100059 Página 122

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prova o dolo, torna-se mais fácil a anulação do negócio, ou seja, a lei deixa de ser tão exigente,
precisamente, porque havendo dolo, a outra parte merece menor protecção.

No entanto, é importante perceber, que há que distinguir consoante o autor do dolo seja o
declaratário, a outra parte do negócio, ou o autor do dolo seja um terceiro, porque quando o
autor do dolo é o declaratário, aí não há duvida nenhum que se aplica o artigo 254 nº 1 sem
restrições e desde que o declarante prove o seu erro, a essencialidade e prove o dolo, o
negócio é sempre anulável.

Mas se o autor do dolo é um terceiro, pois, por exemplo, alguém pode ter induzido uma
pessoa em erro para celebrar um contrato com uma pessoa de família, na realidade houve
dolo, mas neste caso o terceiro face ao negócio, pois o contrato que vai ser celebrado é entre a
pessoa interessada e o terceiro (causador do dolo) que propõe o negócio, e neste caso,
quando o dolo é do declaratário, o negócio é sempre anulável nos termos do artigo 254 nº 1, já
quando o dolo é de terceiro, tem que se atender ao nº 2 do artigo 254 “quando o dolo provier
de terceiro, a declaração só é anulável se o destinatário tinha ou devia ter conhecimento
dele; mas, se alguém tiver adquirido directamente algum direito por virtude da declaração,
esta é anulável em relação ao beneficiário, se tiver sido ele o autor do dolo ou se o conhecia ou
devei ter conhecido”.

Portanto, se eu induzir alguém em erro para celebrar um contrato com algum familiar meu,
este contrato só é anulável por dolo, se o errante provar que aquele meu familiar sabia, ou
devia saber que ele tinha sido induzido em erro.

Depois a lei acrescenta que “se alguém tiver adquirido directamente algum direito em virtude
da declaração, esta é anulável em relação ao beneficiário se tiver sido ele o autor do dolo, ou
se o conhecia ou devia ter conhecido”, ou seja, pode-se dar o caso de o errante não poder
anular o negócio por dolo, porque não consegue provar que o dolo é de terceiro, e
imaginemos que o errante conseguiu provar em tribunal que houve erro (dolo de terceiro),
mas não consegue provar que o declaratário conhecia ou devia conhecer o dolo. Se o errante
não conseguir provar que o declaratário não tinha conhecimento do dolo, ele não pode anular
por dolo, visto que o artigo 254 nº 2 diz que, para o negócio ser anulado é preciso que o
declarante deve-se conhecer o dolo.

Mas imaginemos que aquele negócio, que ele não pode anular por dolo, tinha derivado uma
vantagem para o autor do dolo, imaginemos que alguém foi induzido em erro para celebrar
um negócio do qual resultaria uma comissão para o terceiro, e esse terceiro para receber a
comissão induzia alguém para comprar determinada coisa, pois até pode ser que esse alguém
que comprou a coisa pode ser que não consiga anular o negócio por dolo (do terceiro) porque
não vai conseguir provar que quem lhe vendeu, sabia ou devia conhecer o dolo, e se por acaso
a pessoa enganada pagou uma comissão do serviço prestado, essa comissão pode ser reavida.

O que se quer evitar é, uma coisa é não se conseguir anular o negócio por dolo, negócio esse
que é celebrado com o declaratário, outra coisa é o autor do dolo, ou outro terceiro que sabia
do dolo, poder vir a beneficiar de um negócio sem sofrer qualquer consequência, e por isso é
que a lei na segunda parte do artigo 254, vem dizer que se “alguém tiver adquirido

Serafim Cortizo 20100059 Página 123

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directamente algum direito por virtude da declaração, esta é anulável em relação ao


beneficiário, se tiver sido ele o autor do dolo ou se conhecia ou devia ter conhecido”.

Na realidade este erro é sobre a formação da vontade, é um erro sobre o objecto, e o erro
sobre o objecto (artigo 251) é anulável, quando se verificam os requisitos do artigo 247 e para
anular um negócio em que haja um erro sobre o objecto, bastaria provar que para além do
erro, foi essencial e que o declaratário conhecia ou não devia ignorar a essencialidade.

Neste exemplo, tendo em conta as circunstâncias do negócio, o declaratário (o vendedor)


sabia perfeitamente que, para o comprador, era essencial que certo objecto que ele estaria a
comprar, fosse efectivamente aquilo que ele quereria comprar, e apesar de o errante não
poder anular por dolo, (com base no artigo 254), e admitindo que não conseguia provar que o
declaratário conhecia o dolo, o errante poderá ter que demonstrar que, independentemente
de ter havido dolo, houve um erro sobre o objecto que preenche os requisitos do artigo 251.

ERRO DESCULPÁVEL (Artigo 1636)


Há uma parte da doutrina, baseando-se ano artigo 1636, um dos requisitos do erro é ele ser
desculpável e na parte geral do Código Civil, em todos aqueles artigos (247 a 254) a lei, em
lado algum, diz que o erro tem que ser desculpável, ao contrário do artigo 1636.

Há autores que a partir do artigo 1636, fazem uma extrapolação e dizem que o artigo 1636, no
fundo, é um afloramento do principio geral, e o principio geral seria que, em principio todos os
erros para serem relevantes, teriam que ser desculpáveis, porque há quem diga que não é só
no artigo 1636 que o erro tem que ser desculpável, os professores Galvão Telles e Meneses
Cordeiro, qualquer dos dois, defende a tese de que o errante só merece tutela se o erro for
desculpável e se o seu erro se deveu a negligencia, porque não foi suficientemente atento e
diligente, esses autores entendem que quando o erro não é desculpável, e apesar de a lei só
falar da desculpabilidade no artigo 1636, que a desculpabilidade deve ser uma exigência para
qualquer situação de anulabilidade por erro, sendo que estes autores aplicariam os artigos
246, 247, 251, 252 e em todos esses artigos que exigiriam o requisito do erro.

A doutrina dominante não subscreve essa tese, e eu concordo com a doutrina dominante,
porque ao fim e ao cabo, se a lei quisesse que a desculpabilidade fosse um requisito do erro,
tê-lo-ia dito na parte geral do Código Civil, quando é certo que no artigo 1636 a lei falou em
desculpabilidade, e mais logico do que dizer que o artigo 1636 é um afloramento de um
principio geral, é mais logico ver o artigo 1636 como uma excepção ao regime geral.

O que podemos dizer é que o legislador quando quis exigir a desculpabilidade não fez
cerimónias exigiu-o, mas se nos outros casos não exigiu a desculpabilidade, é porque entendeu
que não era imprescindível que o erro fosse desculpável.

Exemplo:

Pode acontecer que uma pessoa compre uma casa ou um automóvel ignorando que estão
hipotecados, pois a hipoteca é uma garantia que pode incidir sobre coisas registáveis e eu para
obter um empréstimo, posso hipotecar a minha casa ou o meu automóvel a favor do credor e

Serafim Cortizo 20100059 Página 124

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também há uma garantia que eu posso constituir se for sobre um bem não registável, pois se
eu quiser dar de garantia um quadro ou uma jóia, então eu não posso criar uma hipoteca,
porque não há hipotecas sobre bens não registáveis, mas eu posso criar uma garantia
equivalente ao penhor, pois o penhor é para as coisas móveis não registáveis e a hipoteca é
para os bens imóveis e móveis registáveis, portanto, a pessoa hipoteca casas, terrenos,
automóveis etc., mas no caso do penhor, dizemos que empenha uma coisa.

Imaginem que eu comprei uma casa mas ignorei que estava hipotecada e na maior parte dos
casos o erro é indesculpável, porque a hipoteca só produz efeitos se estiver registada
(conservatória do registo predial) e neste caso o comprador tem a possibilidade prática de
saber se existiu ou não hipoteca, basta deslocar-se á conservatória. Claro que mesmo aí podia
ser que caísse em erro porque o conservador podia dar-lhe uma informação errada, ou ele vai
à conservatória e via que a casa não estava hipotecada e saía e fazia a escritura pública e
naquele intervalo de tempo, a casa era hipotecada, portanto, mesmo que a pessoa seja
diligente, haveria sempre um risco, mas na maioria dos casos se alguém comprar uma casa
ignorando que está hipotecada, é porque não foi à Conservatória e porque não se informou, e
para Galvão Telles e Meneses Cordeiro seria um exemplo de um erro indesculpável, e não se
poderia anular o negócio.

Mas a doutrina, largamente maioritária, até apresenta esse exemplo como um caso de um
negócio que pode ser anulado, pois até é uma situação que vem na parte especial do Código
Civil no capítulo da “compra e venda de bens oneráveis” e se virmos o artigo 905, que se aplica
quando alguém adquire um bem, ignorando que esse bem está onerado por outro direito.

Artigo 905 – Venda de bens onerados (anulabilidade por erro ou dolo) “se o direito
transmitido estiver sujeito a alguns ónus ou limitações que excedam os limites normais
inerentes ao direito da mesma categoria, o contrato é anulável por erro ou dolo, desde que no
caso se verifiquem os requisitos legais da anulabilidade”.

Exemplo:

Imaginemos um bem sobre o qual recai um usufruto, um bem que está hipotecado, um bem
sobre o qual recai um penhor, tudo isto são situações em que o bem está onerado e
imaginemos que alguém compra esse bem, ignorando que ele está hipotecado, ou que está
empenhado, ou que há um usufruto, tudo isto são situações que cairão no artigo 905, que diz
que o negócio é anulável, excepto Galvão Telles e Meneses Cordeiro que colocarão em causa a
desculpabilidade do erro, pois segundo eles, quem compra um bem hipotecável é porque não
se informou, sendo que a maioria da doutrina diz que o erro não é desculpável, ao contrário de
Galvão Telles e Meneses Cordeiro que acham que o erro tem sempre que ser desculpável.

Outra questão acerca do erro.

A doutrina diz que o erro que é causa de anulação é o chamado erro próprio, não sendo causa
de anulação o chamado erro impróprio.

Um erro impróprio é o erro que recai sobre o requisito de validade do negócio, e quando se diz
que um erro improprio não é causa de anulação, o que se quer dizer é que, quando o erro
recai sobre um requisito de validade de um negócio, o erro não releva.

Serafim Cortizo 20100059 Página 125

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Exemplo:

Imaginemos que eu comprei uma casa por um simples documento escrito, e já vimos que uma
casa não pode ser comprada por um simples documento escrito, tem que ser comprada, ou
por escritura pública, ou por documento escrito autenticado (artigo 875). Neste caso o
contrato é nulo por vício de forma, pois eu posso ter comprado o bem por essa forma porque
eu pensava que essa forma era suficiente, mas neste caso eu não posso dizer que o negócio é
anulável por erro, é anulável por vício de forma e é este que prevalece, mas até poderia
acontecer que a pessoa estivesse em erro acerca do requisito de validade que implica
anulabilidade.

Exemplo:

Eu contratei com um individuo de 17 anos porque pensava que a maioridade era aos 17, mas
este negócio não é anulável por erro, mas sim por incapacidade de exercício da outra parte,
senão, sempre que a pessoa desconhecesse a lei relativamente a um vicio, haveria sempre dois
vícios, o próprio vicio que ele desconhecia, e o vicio do erro por ele desconhecer aquele vicio,
e é isso que a doutrina quer dizer, quando diz que só releva o erro próprio e se o erro é sobre a
falta do requisito de validade, e o que torna o negócio inválido é a falta do tal requisito de
validade e não tem bada a ver com o erro especificamente.

Voltando ao dolo.

O dolo em certas circunstâncias facilita a anulação por erro, visto que o artigo 254 nº 1,
permite que se anule o negócio em que há erro se houver dolo, porque já não é preciso provar
certos requisitos mais exigentes dos artigos anteriores. Mas também é preciso não esquecer
que o dolo é visto pela lei como uma conduta ilícita, aliás, basta confrontar o artigo 253 nº 1
com o artigo 253 nº 2, pois no artigo 253 nº 2 fala-se no dolo que não é ilícito, o que quer dizer
que o que vem no artigo 253 nº 1 é um dolo ilícito.

Se alguém agindo com dolo induzir outra pessoa em erro, independentemente de o negócio
ser ou não ser anulável, mas como a conduta dolosa é uma conduta ilícita e como dessa
conduta ilícita podem resultar danos, aqui a vitima dessa conduta ilícita, poderia,
independentemente de saber se consegue ou não anular o negócio, pode vir a invocar os
prejuízos que sofreu com aquele negócio, provocado por uma conduta ilícita e culposa e vir
pedir uma indeminização ao autor do dolo, ao abrigo das regras da responsabilidade civil,
portanto, á luz do artigo 483 nº 1 do Código Civil, se uma conduta dolosa provocar danos a
alguém, esse alguém pode pedir uma indeminização.

Se o autor do dolo for o declaratário, que é parte no negócio, no fundo aí já caímos naquele
artigo que fala na culpa na formação dos contratos (artigo 227) e que prevê, que aquele que
age com culpa na formação dos contractos tenha que indemnizar o outro, e na situação do
artigo 227, nem sequer precisamos de nos socorrer da situação do artigo 483, que se aplica
apenas aos terceiros, mas se aquele que age com culpa na formação dos contratos, é um dos
contraentes, sem prejuízo nos termos do artigo 483 nº 1, pois há uma norma no artigo 227.

Portanto, isto para dizer que a conduta dolosa pode ter outras consequências que não apenas
a anulação do negócio jurídico, pois até pode dar lugar ao pagamento de uma indeminização e

Serafim Cortizo 20100059 Página 126

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então poderia acontecer que não fosse possível anular o negócio, porque não se conseguiria
demonstrar certos requisitos, mas demonstrando que o erro foi provocado por dolo, pelo
menos poder-se-ia pedir uma indeminização a essa pessoa que agiu de modo censurável.

Quem leia o artigo 253 fica com a ideia que o dolo só releva quando é dolo que provoca um
erro na formação da vontade, porque diz-se “sugestão ou artificio que alguém empregue com
a intenção ou a consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração (…) ”, há
autores que quando explicam a figura do dolo, circunscrevem o dolo a casos de erro na
formação da vontade.

É verdade que na maior parte dos casos de dolo, são dolo porque visa levar alguém a formar
mal a sua vontade, mas não é de excluir que também possa haver dolo, não numa situação em
que se leva alguém a formar mal a vontade, mas numa situação em que o dolo visa levar
alguém a exprimir mal a sua própria vontade, o que seria por exemplo numa situação em que
alguém, por exemplo, um estrangeiro que quer fazer uma declaração com um certo teor, e
pergunta-me a mim como é que se diz certa frase em português e eu minto-lhe dizendo uma
frase que corresponde a outra declaração negocial que ele quer fazer, ou seja, por causa do
dolo, ele foi fazer uma declaração que não corresponde á vontade real dele, pois ele está a
dizer certas palavras pensando que tem um sentido jurídico quando tem outro e isso pode ser
devido a uma conduta dolosa de outra pessoa, o que se quer dizer com este exemplo é que
pode haver dolo quando se leva alguém a direccionar e a formar mal a sua vontade.

AULA 20

VÍCIOS SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO (Artigo 280) E VICIO SOBRE O FIM DO


NEGÓCIO (Artigo 281)
Estes vícios são vícios que afectam a vontade nem que afectam a declaração, mas são vícios
que incidem sobre o próprio objecto do negócio ou sobre o fim do negócio.

Artigo 280 nº 1 ”é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente impossível,
contrário á lei ou indeterminável”, artigo 280 nº 2 “é nulo o negócio contrário á ordem publica,
ou ofensivo dos bons costumes “.

ARTIGO 280 nº 1
A primeira constatação é de que neste artigo 280 prevêem-se vícios que implicam a nulidade
do negócio, o que significa que estes negócios não produzem quaisquer efeitos, visto que os
negócios nulos são originariamente ineficazes, e estes negócios que vêm no artigo 280 não
podem ser confirmados, nem se sanam pelo decurso do tempo pois os negócios nulos não se
convalidam nem são sanáveis.

A lei diz “é nulo, todo o negócio cujo objecto seja contrário á lei”, ou seja, quando é celebrado
um negócio, as partes estão a combinar e acordar algo e aquilo que está a ser acordado e
estipulado entre as partes, pode ser algo que a lei proíbe.

Serafim Cortizo 20100059 Página 127

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Exemplo:

Eu celebro um contrato com determinado individuo, em que eu digo que lhe darei 50.000 € se
ele matar uma certa pessoa, de quem eu claramente não gosto e ele aceita, quer isto dizer que
é um contrato de prestação de serviços, mas o problema deste contrato é o objecto, aquilo
que está a ser estipulado, que é um crime, que é um homicídio.

O homicídio é um acto ilícito, e portanto, um negócio onde se estipula que será praticado um
acto ilícito, é um negócio que tem um objecto contrário á lei e este tipo de contrato, será um
tipo de contrato com objecto contrário à lei, e portanto é nulo, ou seja, sendo nulo, nem eu lhe
posso exigir o cumprimento, nem ele me pode exigir o pagamento do preço e qualquer um de
nós pode considerar que aquele contrato não é vinculativo, visto que é nulo logo á partida
porque o objecto é contrário á lei.

Exemplo:

Imaginem que eu tenho um acordo com certo juiz, e que eu pago uma avença ao juiz de 500 €
por mês e ele compromete-se, que sempre que julgue um caso que envolva um cliente meu,
de julgar sempre a meu favor.

Num caso destes, o tipo de acordo que está a ser feito, também tem um objecto contrario á
lei, porque na realidade o juiz está a prescindir da sua independência e da sua autonomia e
está a aceitar ser corrompido, e portanto, este negócio é nulo por ter um objecto contrario à
lei, porque aquilo que está a ser estipulado é algo que a lei proíbe, pois isto não é um vicio de
forma, nem um vicio na declaração, nem na vontade, é o próprio objecto e o conteúdo do
negócio e aquilo que está a ser estipulado, pois esse compromisso que ele assume é contrário
á lei porque pressupõe um acto ilícito, que é eu estar a pagar ao juiz e ele está a aceitar
receber dinheiro, quando ele deve ser isento e não pode aceitar dinheiro, e portanto, isso seria
um negócio em que o objecto é contrário á lei e assim sendo, o negócio é nulo.

Mas a lei também diz que é nulo, o negócio cujo objecto seja indeterminável, ou seja, pode
haver um negócio em que não se consiga determinar exactamente o que é que está a ser
objecto do próprio negócio.

Exemplo:

Um contrato em que se dissesse assim “vendo-te uma coisa por 1000 €”, e o outro responde
“aceito”, em principio é um acordo, mas um acordo sobre que motivo? Vender uma coisa é
demasiado vago, pois temos aqui um objecto que é indeterminável pois há triliões de coisas, e
por isso um contrato onde se dissesse “vendo-te uma coisa por 1000 €”, seria nulo por
indeterminabilidade do objecto. Note-se, o objecto pode ser indeterminado, não pode ser é
indeterminável, pois podia ser um caso em que se dissesse assim, “vendo-te por 1000 € um dos
três selos que eu herdei do meu bisavô”, mas aí, o objecto pode estar indeterminado, mas é
determinável, pois daqueles três selos que eu estou a vender, é um deles que eu estou a
vender por 1000 € e neste caso o objecto é determinável pois é á escolha de um dos três selos.

A lei também diz que é nulo o negócio cujo objecto seja fisicamente impossível, ou
legalmente impossível.

Serafim Cortizo 20100059 Página 128

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NEGÓCIO FISICAMENTE IMPOSSÍVEL


Aqui a lei está a pensar naqueles casos, em que, por força do negócio, alguém se compromete
a fazer algo que é impossível fazer, não é só impossível para ele, é impossível para outra
pessoa, pois não basta que haja uma impossibilidade subjectiva, tem que ser um caso em que
ninguém esteja em condições de poder realizar aquela conduta.

Exemplos:

Imaginemos um negócio em que alguém se comprometia a esvaziar a água do mar, isto é um


negócio fisicamente impossível.

Imaginemos que eu quero ir ao Sol, e há uma empresa de transportes que se compromete a


transportar-me até ao Sol. Num caso destes, face á actual evolução científica e tecnológica
claramente não é possível alguém transportar outra pessoa até ao Sol. Portanto, um negócio
em que alguém se compromete a levar-me até ao Sol, se eu viesse exigir o cumprimento a
empresa podia defender-se dizendo que o negócio seria nulo por ser fisicamente impossível.

Agora, já não é nulo um contrato em que uma empresa de transportes se comprometa a levar-
me até á Lua, porque mesmo que aquela empresa não o consiga fazer em concreto, não é algo
de impossível pois já houve pessoas que foram á Lua, e actualmente não é fisicamente
impossível levar pessoas á Lua.

NEGÓCIO LEGALMENTE IMPOSSÍVEL


Mas a lei também prevê que seja nulo o negócio que seja legalmente impossível, portanto,
aquilo que é estipulado não é possível face á lei e aqui pode ser difícil distinguir um negócio
legalmente impossível e um negócio com um objecto contrario á lei, mas um negócio
legalmente impossível, seria por exemplo, alguém celebrar um contrato com um animal como
sujeito do negócio, pois os animais não têm personalidade jurídica. Se alguém celebrasse um
contrato com um cão, podíamos dizer que era um negócio legalmente impossível, e até é mais
lógico dizer que é contrário á lei.

O professor Antunes Varela, num dos exemplos que ele dá de negócio legalmente impossível,
é o caso de dois irmãos que prometerem casar um com o outro. De facto a lei não permite o
casamento entre dois irmãos, porque são parentes de segundo grau de linha colateral, e neste
caso há um impedimento dirimente ao seu casamento, e se dois irmãos se casarem um com o
outro, esse casamento é anulável e no caso de casamento civil é inválido na vertente da
anulabilidade. No caso de dois irmãos quererem casar um com o outro, diremos que é
legalmente impossível, porque a lei não permite o casamento entre dois irmãos? Ou é
contrário á lei porque a lei o proíbe expressamente?

Podemos ver isto por uma óptica, ou por outra, mas eu talvez me inclinasse para achar que era
um negócio contrário á lei, mas o professor Varela vê a questão, mais como um negócio
legalmente impossível, mas de qualquer modo, não há duvida nenhuma que a consequência
será a nulidade.

Aqui estamos perante vícios que não afectam, nem a vontade nem a declaração, afectam o
próprio objecto do negócio, aquilo que está a ser estipulado pelas partes, um serviço que as

Serafim Cortizo 20100059 Página 129

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partes estão a acordar realizar uma para com a outra, uma coisa que as partes estão a
combinar que será alienada e por exemplo, é legalmente impossível vender um bem que já
não existe, pois, por exemplo, eu posso vender uma coisa minha, mas se a coisa entretanto se
tiver extinguido, e imaginemos, que eu vendia hoje um livro que eu ignoro que tenha ardido
ontem, e que eu ignoro que tenha ardido num incêndio, no fundo eu estou a vender um bem
que nem sequer existe, pois a compra e venda tem que ter por objecto uma coisa que existe.

ARTIGO 280 nº 2
Neste artigo é dito que “é nulo todo o negócio contrário á ordem pública ou ofensivo dos
bons costumes”.

Comecemos pela parte do negócio ofensivo dos bons costumes, neste caso a lei não explica o
que é que entende por “bons costumes” e a doutrina também não é muito clara quando fala
no conceito de “bons costumes”, até porque se diz que é um conceito um pouco
indeterminado, mas os bons costumes têm a ver com o que vem consagrado na chamada
“moral dominante”, pois em todas as sociedades existe uma moral dominante, pois podemos
concordar ou discordar das regras morais prevalecentes numa certa sociedade, e essas regras
morais nem sempre são as mesmas, ou seja, hoje pode haver condutas que as pessoas acham
perfeitamente conformes á moral e que há umas décadas atrás as pessoas achariam imorais e
vice-versa. Portanto, em todas as épocas e consoante o local, existe sempre uma moral social
dominante, boa ou má.

O negócio contrário aos bons costumes, e quando se fala aqui de bons costumes, não é no
sentido do costume como fonte de direito (prática social reiterada com convicção de
obrigatoriedade) são os bons costumes, no sentido daquilo que são considerados boas práticas
sociais do ponto de vista da sua moralidade, e por isso é que os autores muitas vezes quando
dão exemplos de negócios contrários aos bons costumes, têm muito a tendência de dar
exemplos que se confundem sempre com uma certa moral de índole sexual e quase sempre os
exemplo que dão seria dizer que, “seria contrário aos bons costumes um contrato de
arrendamento ser para abrir um bordel”.

O artigo 280 nº 2 também diz que “é nulo o negócio contrario à ordem publica” e aqui ordem
publica não tem nada a ver com a expressão “ordem publica” que por vezes usamos quando
dizemos que, “houve desacatos, que foi posta em causa a ordem publica”, não é neste sentido
que se está aqui a falar de ordem publica, se bem que seja num sentido possível de ordem
publica, pois é verdade, que por vezes falamos em condutas que atentam á ordem publica, e
neste caso, está-se a pensar em condutas violadoras da lei (queimar automóveis, partir
montras) mas não é nesse sentido que a lei, fala em ordem publica, aqui a ideia é outra.

O legislador, há condutas que pretende impor e há condutas que pretende proibir, e quando
quer impor ou proibir uma conduta, cria regras jurídicas imperativas e através de regras
imperativas pode impor a prática de certas condutas e certos actos, ou pode proibir a prática
de certos actos, e nós já vimos que quando um negócio jurídico viola uma regra imperativa,
mesmo que a lei não diga qual é a consequência, deve-se entender que um negócio que viola
uma regra imperativa é nulo (artigo 294) a não ser que a lei preveja outra sanção, e isto é
muito útil, porque há negócios que violaram uma regra imperativa, mas se a lei não diz qual é
a consequência, (se são nulos ou se são anuláveis), e então nestes casos aplica-se o artigo 294.

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Mas pode acontecer que pode haver negócios que não violem nenhuma regra imperativa
concreta, mas que na prática aqueles negócios atentam contra princípios e valores
fundamentais da ordem jurídica, e o negócio não pode ser aceite apesar de não estar a violar
uma regra concreta e então é por isso é que surgiu o conceito de “ordem pública” e quando se
fala aqui em ordem pública;

A ordem pública é o conjunto de princípios e valores essenciais da ordem jurídica de cuja


observância o legislador não prescinde.

Ou seja, é possível tentar demonstrar que um certo negócio, apesar de não violar uma regra
imperativa concreta, que aquilo que está a ser estipulado vai contra os princípios e valores
básicos do ordenamento jurídico, e se se provar que o negócio jurídico, apesar de não violar
nenhuma regra imperativa concreta, se se provar que vai contra princípios e valores básicos do
ordenamento jurídico, então ele será considerado nulo, com base no argumento de que é
contrario à ordem pública, portanto, a ordem pública é um conceito residual que permite
tornar nulos os negócios, que na realidade não violem nenhuma regra imperativa. Não violam
regras imperativas, mas conduzem a resultados que a ordem jurídica reprova, e portanto,
ofendem princípios e valores essenciais de que a ordem jurídica não prescinde, e portanto,
nessa medida, são nulos.

ARTIGO 281
As situações do artigo 280 não se enquadram nas situações do artigo 281, no artigo 280, onde
o que estava em causa é o objecto do negócio, aquilo que era objecto de estipulação das
partes e no artigo 281, estamos perante um vício que afecta o fim do negócio

Artigo 281 “se apenas o fim do negócio jurídico for contrario á lei ou à ordem pública, ou
ofensivo dos bons costumes, o negócio só é nulo quando o fim for comum a ambas as partes”.

Aqui está-se a pensar num caso em que alguém celebra um negócio jurídico tendo uma
finalidade ilícita, a razão que leva aquela pessoa a celebrar um negócio jurídico, é um fim
ilícito. Mas se apenas aquela pessoa tem uma finalidade ilícita, isso não é suficiente para
tornar o negócio nulo.

Exemplo:

Imaginemos que eu vou comprar um martelo, a compra de um martelo não é um negócio com
um objecto contrário à lei, pois não há nenhuma legal que proíba que alguém compre um
martelo.

Mas imaginemos que eu comprei um martelo para bater com o martelo na cabeça de outra
pessoa e quero matar ou ferir certa pessoa com gravidade. A finalidade que eu tenho em vista
ao comprar o martelo é uma finalidade ilícita, mas isso só por si não torna o contrato nulo, pois
ninguém duvidará, que se eu posteriormente utilizar o martelo para bater noutra pessoa, que
eu estou a cometer um acto ilícito, um crime de ofensas corporais, e não há duvida nenhuma
que a utilização que eu vier a fazer do martelo poderá ser ilícita, mas a compra em si, do
martelo, esta situação não se enquadra no artigo 280, porque não se pode dizer que é
contrario á lei acordar a compra e venda de um martelo, mas o contrato será nulo se a minha
finalidade ilícita (do uso do martelo) for partilhada pela outra parte (que vende o martelo) e se

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aqui um negócio que estiver a ser estipulado, é uma finalidade comum a ambas as partes,
então o próprio contrato é nulo, agora, se a outra pessoa simplesmente me vende o martelo,
não há motivo para considerar o negócio ilícito.

Por exemplo, eu posso comprar uma máquina de fotocópias muito sofisticada e o meu
objectivo é falsificar Euros ou Dólares, neste caso a minha finalidade é licita, (compra da
máquina de fotocópias) porque o contrato de compra e venda é perfeitamente válido, mas se
eu disser a alguém para me fabricar uma maquina de fotocópias com certas características, e
em contrapartida o lucro dos Euros e Dólares falsificados, são a dividir pelos dois, e num caso
destes, o fim pelo qual a outra pessoa me vende a máquina de fotocópias está a participar
também de uma actividade ilícita porque é um negócio em que ambos têm a mesma
finalidade, que é o fornecimento de uma máquina de fotocópias para cometer um crime de
falsificação de moeda, e aí, o próprio contrato de compra e venda da máquina é nulo, se a
finalidade ilícita for comum a ambos, mas se o fim ilícito era só da parte de um dos
contraentes, o negócio era perfeitamente válido, pois o que será ilícito será o uso que eu
venha a fazer da máquina de fotocopias, como será ilícita a utilização que eu fizer do martelo.

AULA 21

FORMAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICO (Contratos e negócios jurídicos


unilaterais)
Sobre os negócios jurídicos já vimos muita coisa, tem que haver vontade, tem que haver
declaração, que a declaração pode ser escrita, expressa ou tácita, que por vezes o silêncio tem
valor declarativo, e já vimos quando é que é obrigatório respeitar determinada forma, mas
ainda há uns aspectos respeitantes ao negócio que têm que ser vistos.

Desde logo, interessa saber quando é que uma declaração negocial se torna perfeita e quando
é que se torna eficaz e para tal, para sabermos quando é que uma declaração se torna perfeita
e quando é que se torna eficaz, temos que atender ao disposto no artigo 224, que é um artigo
importantíssimo no que respeita aos negócios jurídicos e aos contratos, e na própria epígrafe
está escrito “eficácia da declaração negocial”.

Artigo 224 nº 1 “a declaração negocial que tem um destinatário determinado torna-se eficaz
logo que chega ao seu poder ou é dele conhecida; as outras logo que a vontade do declarante
se manifesta na forma adequada”, artigo 224 nº 2 “é também considerada eficaz a declaração
que só por culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida”, nº 3 “a declaração
recebida pelo destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é
ineficaz”.

ARTIGO 224 Nº 1
Ao lermos o nº 1 do artigo 224, constatamos que dentro do nº 1 há duas partes separadas por
ponto e virgula, há declarações às quais se aplica a primeira parte do nº 1 do artigo 224 e há as
declarações às quais se aplica a segunda parte o nº 1 do artigo 224.

Diz este preceito na parte inicial que “a declaração negocial que tem um destinatário torna-
se eficaz logo que chega ao seu poder ou que dele se torna conhecida”, portanto, na primeira

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parte do nº 1, está-se a pensar naquelas declarações negociais que têm um destinatário


determinado, ou seja, sempre que uma declaração se dirige a uma pessoa determinada,
aplica-se a primeira parte do nº 1, onde é dito que “essa declaração é eficaz quando chega ao
poder do destinatário, ou é dele conhecida”, e aqui o que conta é o primeiro de dois
momentos;

1) Se a declaração primeiro for recebida e só depois for conhecida (que é o mais


provável) e quando a recepção antecede o conhecimento, o que conta é o momento
da recepção, pois é no momento em que ela é recebida é que se torna eficaz.
2) Se forem declarações que não têm destinatário determinado, então já se aplica a
segunda parte do nº 1 do artigo 224.

Estava eu a dizer que, se a declaração tiver um destinatário determinado, diz a lei, que ela é
eficaz logo que chegue ao seu poder, ou que é dele conhecida, neste caso, é num caso, ou
noutro, ou é quando chega ao poder ou quando é conhecida e portanto, o que prevalece é o
primeiro momento.

Exemplo:

Imaginemos uma situação clássica em que A escreve uma carta a B, carta essa na qual consta
um documento que consubstancia uma declaração negocial, pode ser uma proposta de
contrato, ou pode ser uma declaração unilateral, ou um negócio unilateral.

A quer dirigir uma declaração a B, e escreve uma carta a B, quando é que a declaração se
considera recebida? É quando a carta é depositada na caixa de correio do B, mas o facto de a
carta estar na caixa de correio do B, não significa que ele vá tomar imediatamente
conhecimento daquela declaração, pois até pode acontecer que ele só abra a caixa de correio
passados 20 dias, ou que abra a caixa de correio e rasgue o envelope sem o abrir, mas isso não
interessa, pois a declaração chegou ao seu poder e á sua esfera de acção.

A lei neste caso, vem dizer que neste tipo de declarações que têm destinatários determinados,
o que conta para a eficácia da declaração, não é o momento em que a declaração é conhecida,
mas no momento em que é recebida, e em que chega ao poder do destinatário.

A lei dá prevalência á recepção, por na esmagadora maioria dos casos, o que prevalece é o
momento em que chegou ao poder, e a lei optou por esta via, se pensarmos com base na
pureza dos princípios, o objectivo da declaração que é dirigida a uma pessoa é que seja
conhecida do destinatário, pois quando A dirige uma declaração a B, é para que o B tome
conhecimento dela, porque poderia parecer mais logico que a lei dissesse, que o que
prevaleceria era o momento do conhecimento, só que se iriam levantar problemas
complicados de prova, pois já não é fácil o declarante provar que o declaratário recebeu a
declaração, mas muito mais difícil será o declarante provar que o declaratário tomou
conhecimento da declaração.

Ou seja, se eu tomar certas precauções, poderei provar que uma carta minha chegou ao
destino, pois posso tê-la enviado registada ou com aviso de recepção e até posso ter
testemunhas que me vêm colocar a carta na caixa de correio do destinatário, eu poderei

Serafim Cortizo 20100059 Página 133

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provar eventualmente a recepção da carta, mas o problema é provar que a outra pessoa
tomou conhecimento do conteúdo da mesma, e neste caso, se a lei exigisse que para a
declaração ser eficaz, o que contasse fosse o momento do conhecimento, isto prestava-se a
falcatruas e podia acontecer que o destinatário se recusasse a tomar conhecimento da
declaração, e seria deste modo extraordinariamente difícil para o declarante provar o
conhecimento.

Por isso a nossa lei entendeu que, por uma questão de facilidade de prova, que era mais
conveniente dar prevalência ao momento em que a declaração chega ao poder do destinatário
e por isso, qualquer declaração negocial que tem um destinatário determinado, segundo o
artigo 224 nº 1, primeira parte, o momento em que essa declaração se considera perfeita e
eficaz, é quando chega ao poder do destinatário, ou seja, quando é por ele recebida e por isso
é que se diz na doutrina, no que respeita às declarações que têm um destinatário
determinado, em Portugal está consagrada a teoria da recepção.

A lei não quis optar pela teoria do conhecimento, se bem que no artigo 224 nº 1 na primeira
parte, a dada altura também fala do conhecimento quando diz “quando chega ao seu poder
ou dele é conhecida”, mas é “ou” e aqui a lei está apenas a prever a possibilidade que não é
frequente, mas pode acontecer que alguém, tome conhecimento de uma declaração ainda
antes de ela ter chegado ao seu poder.

Exemplo:

Aquele senhor tinha-me feito uma proposta de contrato e eu escrevi-lhe hoje uma carta a
dizer que aceitava a proposta dele, carta essa que ele só iria receber, na melhor das hipóteses,
amanhã ou na segunda-feira, mas como hoje á noite o vejo aqui, aproveitei para lhe dizer que,
relativamente á proposta que me tinha feito, fica desde já a saber que hoje lhe mandei uma
carta a dizer que aceitava. Neste caso, antes de receber a minha resposta, ele já tomou
conhecimento do seu teor.

E quando isso acontece, apesar de serem situações pouco frequentes, mas sempre que o
destinatário toma conhecimento da declaração antes de a receber, de qualquer modo ele vai
receber a minha declaração num momento posterior ao momento em que tomou
conhecimento do teor e quando isso acontece, aí sim, prevalece o momento do conhecimento
e então a declaração é eficaz quando é conhecida, mas só prevalece o momento do
conhecimento, quando o conhecimento é anterior á recepção, mesmo não sendo frequentes,
mas nos casos em que o conhecimento do conteúdo da declaração seja anterior á recepção, aí
sim, prevalece o momento do conhecimento.

Nas situações mais frequentes, que são aquelas em que primeiro a declaração é recebida e só
depois é que é conhecida, o que conta é o momento da recepção e isto é muito importante,
porque imaginem que, voltando ao exemplo anterior;

Foi-me feita uma proposta de contrato e eu respondo a dizer que aceito, essa aceitação tem
um destinatário determinado, porque quem aceita dirige-se ao proponente, e a declaração
pela qual eu digo que aceito tem um destinatário determinado, logo, aplica-se a primeira parte
do nº 1 do artigo 224, sendo que a minha aceitação é eficaz quando chega á caixa do correio

Serafim Cortizo 20100059 Página 134

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dele, mas se ele tomou, ou não tomou conhecimento da carta, não é determinante, porque o
contrato formou-se quando a aceitação foi eficaz, que foi no momento em que a carta foi por
ele recebida e só prevaleceria o conhecimento se este fosse anterior à recepção.

Estas declarações que têm um destinatário determinado e se tornam eficazes quando são
recebidas, a lei quer dizer que têm que ser efectivas para se tornarem eficazes, e então a
doutrina portuguesa tem dois tipos de designações para este tipo de declarações que vêm na
primeira parte do artigo 244 nº 1, alguns autores, sobretudo os professores de Coimbra
chamam a este tipo de declarações, declarações receptícias que são as declarações que têm
um destinatário determinado e que só são eficazes quando são recebidas pelo destinatário.
Já será mais frequente nos autores das universidades de Lisboa chamar essas declarações de
declarações recipiendas.

A segunda parte do nº 1 do artigo 224 refere-se àquelas declarações que não têm um
destinatário determinado, e portanto, a segunda parte do nº 1 do artigo 224, onde diz “as
outras”, as outras são as declarações que não têm destinatário determinado e aqui neste caso,
se as “outras” são aquelas que não têm destinatário determinado, podem abranger duas
situações distintas;

1) As outras, poderão se aquelas declarações que têm destinatários indeterminados e se


uma declaração tiver destinatários indeterminados, para sabermos quando é que se
tornam eficazes temos que atender á segunda parte do nº 1 do artigo 224.
2) Também se poderá aplicar a segunda parte do nº 1 do artigo 224 àquelas declarações
que pura e simplesmente não têm destinatário nenhum, nem determinado, nem
indeterminado.

Nessas “outras” a lei já não exige, que para se tornarem eficazes tenham que ser recebidas,
onde a lei diz que “as outras, (as declarações que não têm destinatário determinado) logo
que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada”. Nestas que não têm
destinatário determinado, o momento da perfeição e da sua eficácia, não é o momento em
que aquela declaração é recebida ou conhecida, mas sim no momento em que a declaração é
emitida que é quando o declarante manifesta a vontade.

Estas declarações que vêm na segunda parte do nº 1, como não se lhes aplica a teoria da
recepção, serão declarações não receptícias ou não recipiendas, porque são declarações para
cuja eficácia não é necessária a sua recepção,

Exemplos:

1) Há muitas propostas que são dirigidas a pessoas determinadas, por exemplo, eu quero
contratar com aquele senhor e então dirijo-lhe uma proposta a ele, é uma proposta
dirigida a uma pessoa determinada, mas eu posso colocar um anúncio num jornal a
dizer que vendo o quadro X do pintor tal por Y Euros, pois nada impede que eu coloque
um anúncio num jornal a dizer que vendo aquele quadro por uma certa quantia de
Euros. Eu aqui não me estou a dirigir a nenhuma pessoa em concreto, estou-me a dirigir
ao público em geral, pois é uma proposta feita a pessoas indeterminadas e obviamente
que a minha intenção não é vender o quadro a todos, mas a ideia é que para mim, é-

Serafim Cortizo 20100059 Página 135

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me indiferente que vai comprar, o que eu quero é que apareça alguém pronto a aceitar
as condições que eu estipulei, e se eu ponho um anuncio nestes termos, estamos
perante uma proposta dirigida a pessoas indeterminadas, e essa proposta dirigida a
pessoas indeterminadas chama-se “oferta ao público”, e então temos aqui um
exemplo de uma declaração não recipienda ou não recepetícia que é a chamada
“oferta ao público”.

2) Há uma figura jurídica que é o negócio jurídico unilateral que se chama “promessa
pública”, não confundir com “oferta ao público”, (artigo 459), na promessa pública diz
o artigo “aquele que, mediante anuncio público, prometer uma prestação a quem se
encontre em determinada situação ou pratique certo facto, positivo ou negativo, fica
vinculado desde logo à promessa”, eu disse que um exemplo clássico de promessa
publica, é quando uma pessoa é proprietária de um animal e se esse animal despareceu
e essa pessoa coloca um anuncio num jornal a dizer que dá uma recompensa
(alvissaras) a quem encontrar o animal desaparecido, ou então também se pode por
num jornal, que se dá uma recompensa a quem possa testemunhar determinado facto.

3) Também seria promessa pública eu dizer que dou um premio de 10.000 Euros á pessoa
que tiver a melhor nota de média final em TGDC II, e num exemplo destes, se se disser
isso, no fundo, está-se a fazer uma promessa publica, pois isto não é uma proposta de
contrato, nem uma proposta que pressuponha uma aceitação, pois se eu declarar que
dou uma recompensa a quem tiver a melhor nota na cadeira, ou se eu disser que dou X
a quem atravessar o Canal da Mancha a nado, nestes casos, eu estou a fazer uma
promessa através de uma comunicação, e a lei diz que eu fico desde logo vinculado, e
quando no artigo 459, se diz que quando alguém faz uma proposta destas fica
vinculado “desde logo”, este termo também indicia que estamos perante um negócio
unilateral, porque se a lei visse esta figura como havendo necessidade de um contrato,
então a pessoa não ficava vinculada desde logo, mas só quando houvesse aceitação,
mas o facto de a lei dizer “desde logo”, mostra que bastou aquela declaração para
automaticamente se produzir um efeito jurídico, logo tanto a “oferta ao público”,
como a “promessa pública” são declarações não recipiendas ou não receptícias e só se
tornam eficazes nos termos da segunda parte do nº 1 do artigo 224.

Como se vê, pode haver declarações recipiendas ou receptícias em contratos ou em negócios


unilaterais e também pode haver declarações não recipiendas ou não receptícias também
em contratos (negócios plurilaterais) ou em negócios unilaterais.

A aceitação, normalmente é uma declaração recipienda ou recepetícia, porque quem aceita


uma proposta dirige-se ao autor da proposta, pois a aceitação tem sempre um destinatário
que é o proponente enquanto que a proposta pode não ter um destinatário concreto (oferta
ao público) e mesmo na oferta ao público, dirige-se ao proponente, pois não foi o público em
geral que fez a proposta, pois a aceitação tem que se dirigir á pessoa que fez a proposta, e
para se formar um contrato, tem de haver acordo, e esse acordo prevê uma proposta a que se
vai juntar uma aceitação, pois quem aceita deve dirigir-se sempre ao proponente, e nessa
medida podemos afirmar que a aceitação é uma declaração recepetícia ou recipienda, porque

Serafim Cortizo 20100059 Página 136

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como tem um destinatário determinado que é o proponente, deve-se aplicar a primeira parte
do nº 1 do artigo 224.

No entanto há uma excepção e há um caso excepcional que são as situações que vêm no
artigo 234, e neste artigo a lei prevê que em certos casos a aceitação seja eficaz ainda antes
de ter sido recebida ou conhecida pelo proponente, mas isto é uma excepção á primeira
parte do nº 1 do artigo 224.

ARTIGO 224 Nº 2
No nº 2 do artigo 224, diz-se que: “é também considerada eficaz a declaração que só por
culpa do destinatário não foi por ele oportunamente recebida”.

A lei no nº 2 do artigo 224 quer criar um regime que evite que o declaratário de má-fé, actue
para tornar impossível a recepção da declaração.

Exemplo:

Imaginemos que uma pessoa faz uma proposta de contrato, e depois vem uma carta, que uma
pessoa suspeita que é uma aceitação, e está arrependida da proposta que fez e tenta esquivar-
se á recepção da carta.

Como resulta da leitura do nº 2 do artigo 224, se a declaração chegar tardiamente, ou se nem


sequer chegar a ser recebida, se se demonstrar que isso se deveu a culpa do próprio
declaratário, que até pode ter agido de má-fé, ou ter dado a morada errada, ou agir de modo a
tornar impossível a recepção da declaração, e imaginemos que era uma declaração que tinha
que ser entregue em mão e ele recusou-se a recebê-la, e nesse tipo de situações a declaração
não foi recebida por culpa do destinatário e nestes casos, é como se tivesse sido recebida e é
considerada eficaz.

ARTIGO 224 nº 3
O nº 3 do artigo 224 prevê a hipótese inversa, que é a declaração poder ter sido recebida, mas
naquelas circunstâncias objectivas, seria impossível ao declaratário tomar conhecimento dela
e então é como se fosse ineficaz, pois diz aqui o artigo “a declaração recebida pelo
destinatário em condições de, sem culpa sua, não poder ser conhecida é ineficaz”.

Exemplo:

Um exemplo possível seria, num contrato, o aceitante dirigir-se ao proponente numa língua
que o proponente ignora, mas depende, pois pode é ter havido culpa do proponente, pois se
eu fiz uma proposta a um chinês e disse que falo perfeitamente chinês, sujeito-me a que se ele
me responder em chinês, eu não perceba, e neste caso se a declaração vem numa língua que a
pessoa não conhece, nem é suposto conhecer, neste caso é como se não tivesse recebido a
declaração.

Como se vê, tudo quilo que eu disse acerca do artigo 224, tanto vale para as declarações
negociais que fazem parte dos contratos, portanto, propostas e aceitações, como vale para a
declaração negocial que integra o negócio jurídico unilateral, e portanto, é essencial a
distinção entre declaração recipienda e não recipienda ou recepetícia e não recepetícia.

Serafim Cortizo 20100059 Página 137

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ARTIGO 225
Artigo 225 “a declaração pode ser feita mediante anúncio publicado num dos jornais da
residência do declarante, quando se dirija a pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja por ele
ignorado”.

Este artigo 225 vem alargar as situações em que alguém faz uma declaração através de um
anúncio publico, e já tinham sido vistas duas situações em que alguém fazia uma declaração
através de anúncio público.

Uma era a tal “promessa pública” que vinha no artigo 459 e a outra era aquela proposta feita
a pessoas indeterminadas a “oferta ao público”, e quer na promessa pública, quer na oferta ao
público, de facto as pessoas exprimem a sua vontade através de declarações que são
publicitadas através de anúncios ou em jornais.

Mas aqui o artigo 225 está a prever um caso em que alguém se socorre de um anuncio publico,
mas não para se dirigir a pessoas indeterminadas, e os exemplos que eu tinha dado até agora
de anuncio público era para se dirigir a pessoas indeterminadas, mas também é possível
recorrer ao anúncio público naqueles casos em que o declarante se quer dirigir a uma pessoa
determinada, só que o declarante não sabe o nome dessa pessoa, ou não sabe onde é que ela
reside, pois eu posso querer dirigir-me a um certo individuo, e até posso saber o nome dele,
mas não faço a mínima ideia onde é que ele reside e não sei para onde é que o posso
contactar.

E se eu quero dirigir uma declaração negocial, seja negócio unilateral, seja proposta, seja
aceitação, a uma pessoa que eu até sei quem ela é, mas não faço a mínima ideia onde é que
reside, ou onde é que se encontra, pois eu posso querer-me dirigir a um certo individuo e até
posso saber o nome dele mas não fazer a mínima ideia onde é que ele reside e não sei para
onde é que o hei-de contactar, e se eu quero dirigir uma declaração negocial, seja um negócio
unilateral, seja uma proposta, seja uma aceitação a uma pessoa que eu até sei quem ela é mas
que não faço a mínima ideia onde é que se encontra, tenho uma possibilidade, desde que, não
haja obstáculos de forma, o artigo 225 aplica-se se o A se quer dirigir ao B, mas não faz ideia
onde é que o B reside, ou então eu posso-me querer dirigir a uma pessoa em concreto mas
cujo nome eu até ignoro e nas situações em que queremos dirigir uma declaração negocial a
alguém cuja identidade ou paradeiro ignoramos, a lei admite, que há falta de melhor, que o
declarante se possa socorrer de um anúncio público publicado num jornal, e nesse caso é num
jornal da residência do declarante.

Neste exemplo, e segundo o artigo 225, temos um caso em que na realidade esta declaração
tem um destinatário determinado, pois o facto de ele ignorar o nome ou a morada, ele está a
querer-se dirigir a uma certa pessoa em concreto, cujo nome ignora e cuja morada
desconhece, é portanto, uma declaração que tem um destinatário determinado e aqui pode
levantar-se uma questão que a lei não esclarece, visto que sendo um destinatário determinado
se deve aplicar a primeira parte do nº 1 do artigo 224?

Eu penso que não, porque esta situação tem muito mais analogia com um caso em que alguém
se dirige a pessoas indeterminadas, porque aqui continuaria a haver o problema da recepção,
pois se se aplica-se a primeira parte do nº 1 do artigo 224, a declaração só seria eficaz quando

Serafim Cortizo 20100059 Página 138

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o outro lê-se o jornal, e neste caso seria impossível de provar se essa pessoa alguma vez leu o
jornal ou se pegou nele, e portanto, é de entender que na situação do artigo 225, que na
minha opinião, se deve aplicar o regime previsto para as declarações que não têm destinatário
determinado, sendo uma situação mais próxima da oferta ao público ou da promessa pública
pois não é dirigida a pessoas indeterminadas, mas que há um ponto em comum, que é através
de um anúncio público, e portanto, o que deve contar é o momento em que o anuncio é posto
a circular.

ARTIGO 226
O artigo 226 prevê duas situações claramente distintas, e neste caso, há que distinguir muito
bem o nº 1 e o nº 2 do artigo 226 e continuamos neste caso a falar de normas que se aplicam
ao negócio jurídico.

Artigo 226 nº 1 “a morte ou incapacidade do declarante, posterior á emissão da declaração,


não prejudica a eficácia desta, salvo se o contrário resultar da própria declaração”, artigo 226
nº 2 “a declaração é ineficaz, se o declarante, enquanto o destinatário não a receber, ou dela
não tiver conhecimento, perder o poder de disposição do direito a que ela se refere”.

ARTIGO 226 nº 1
No artigo 226 nº 1, se uma pessoa emite uma declaração e se depois de emitida a declaração,
essa pessoa morre ou torna-se incapaz, ainda antes de a declaração ser recebida pelo
destinatário, de qualquer modo, se essa morte ou incapacidade do declarante são posteriores
á emissão da declaração, como diz aqui a lei, isso não prejudica a ineficácia da declaração pelo
facto de a pessoa ter morrido, ou ter-se tornado incapaz, só por si, não impede que a
declaração venha a ser eficaz.

Este artigo 226 nº 1, aplica-se a qualquer negócio jurídico, mas há um regime especial para a
proposta, que é o regime do artigo 231 nº 1, e se se confrontar o artigo 231 nº 1 com o artigo
226 nº 1, verão que há aqui uma parte que é coincidente, pois diz o artigo 231 nº 1 que: ”não
obsta á conclusão do contrato a morte ou incapacidade do proponente, excepto se houver
fundamento para presumir que outra teria sido a sua vontade” e se compararmos o nº 1 do
artigo 226, com o nº 1 do artigo 231, constatamos que o nº 1 do artigo 226 pela sua letra, é
mais abrangente, porque no nº 1 do artigo 226 não se está a distinguir se é uma proposta, ou
se é uma aceitação, ou se é um negócio unilateral, pois aqui fala-se apenas numa declaração
que foi feita, enquanto no nº 1 do artigo 231, aquele que morre ou fica incapaz é o autor de
uma proposta de contrato.

Quando o declarante que morre ou fica incapaz, tinha feito uma proposta de contrato, o que
se aplica é a regra especial do artigo 231 nº 1, pois se a pessoa que morre ou fica incapaz, fez
uma declaração que não é uma proposta de contrato, ou outra declaração qualquer, havendo
morte ou incapacidade subsequente, é o artigo 226 nº que se aplica, excepto se for uma
proposta, pois neste caso temos a regra especial do artigo 231 nº 1.

O interesse de haver uma regra especial, é que se compararmos o artigo 231 nº 1 com o artigo
226 nº 1, a diferença é subtil mas existe, porque no artigo 226 nº 1 diz-se que “se a morte ou
incapacidade não prejudica a declaração salvo se o contrário resultar da própria
declaração”, ao passo que no artigo 231 nº 1 não se diz que “salvo se o contrário resulta da

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declaração” mas diz-se “excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a
sua vontade”, pois não é exactamente o mesmo pois a diferença, verdadeiramente, está na
parte final, porque se a parte final fosse igual não fazia sentido existir o artigo 231 nº 1 que é
uma regra especial para a proposta, ao contrário do artigo 226 nº 1 que é uma norma para a
declaração negocial.

ARTIGO 226 nº 2
No artigo 226 nº 2, está-se a pressupor que uma pessoa que tinha legitimidade para um certo
negócio, perca essa legitimidade, no intervalo de tempo que medeia entre a emissão da
declaração e a sua recepção, ou seja, alguém que na altura em que emite a declaração tem
legitimidade, mas na altura em que ela é recebida pelo declaratário, essa legitimidade já não
existe.

Exemplo:

Imaginemos que eu sou titular de um direito de usufruto, a lei admite que eu possa transmitir
esse direito de usufruto (artigo 1444) a um terceiro pelo período ao qual eu tenho o direito de
gozar o bem.

Mas imaginemos que eu escrevia um texto numa carta a dizer a alguém que transmitia um
direito de usufruto sobre uma cosia, e naquele intervalo de tempo, entre a altura eu que emiti
a declaração e em que a minha carta foi expedida, a lei permitia que o direito de usufruto
fosse transmissível, mas a minha carta chega três dias depois ao destino, e naquele intervalo
de tempo, entrou em vigor uma lei que veio alterar o artigo 1444 e que diz que o direito de
usufruto é intransmissível, então acontecia que eu na altura em que fiz a declaração tinha
poder de disposição sobre um direito, mas na altura em que ela é recebida e se tornaria eficaz,
já eu tinha perdido o poder de disposição, e neste exemplo, aplicar-se-ia o artigo 226 nº 2 que
diz que “a declaração é ineficaz se o declarante (…) perder o poder de disposição do direito a
que ela se refere”, mas note-se, que o artigo 226 nº 2, está a pressupor que a perda do poder
de disposição seja anterior á recepção da declaração, porque se eu escrevi a carta a dizer que
transmito o usufruto e a carta é recebida, e passado um dia é que a lei muda, já não se aplica o
artigo 226 nº 2, porque aí não se pode dizer que eu perdi o poder de disposição antes de a
minha declaração ter sido recebida, eu perdi, quanto muito, depois e não antes.

O artigo 226 nº 2 é só para as hipóteses em que a perda do poder de disposição é anterior à


recepção da declaração, tornando-se a declaração ineficaz.

AULA 22

OS CONTRATOS
É preciso não esquecer que, estatisticamente falando, que a grande maioria dos negócios que
celebramos são contratos.

Um contrato e um negócio plurilateral, e que pressupõe pelo menos duas partes, e é preciso
que haja pelo menos duas declarações, e grande parte dos contratos são negócios
plurilaterais, porque são negócios que só podem ser celebrados por duas partes (a compra e

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venda, pressupõe um comprador e um vendedor, um contrato de arrendamento pressupõe


um senhorio e um inquilino) e portanto, a maior parte dos contratos pressupõe apenas duas
partes, mas pode haver acordos celebrados entre mais que duas partes (criação de uma
associação, o contrato de formação terá tantas partes quantos os associados)

Um contrato, não é um qualquer acordo, porque há acordos que não são juridicamente
vinculativos, pois é preciso que as pessoas tenham querido colocar aquele acordo sob a alçada
do direito.

Nos contratos tem que haver duas vontades e duas declarações, por vezes as declarações que
consubstanciam um contrato são diferidas no tempo, temos uma declaração que é uma
proposta, á qual se segue outra que é a aceitação, e essas duas declarações formam um
contrato se forem convergentes, pois não basta haver duas declarações, pois se um diz
“vendo” e o outro responde “alugo”, há duas declarações mas que não são convergentes, pois
as declarações têm que ser harmónicas entre si e têm que ser convergentes, e só sabemos que
há convergência interpretando as declarações negociais, pois é para isso que existem as regras
do artigo 236, e portanto, para saber se se formou um contrato, temos que interpretar a
declaração de ambas as partes, e depois compara-se os sentidos a que chegámos, e se são
convergentes dizemos, há um acordo no que respeita às declarações, e então há contrato e
depois vamos ver se há algum vicio, pois as declarações podem ser convergentes, mas as
vontades podem não o ser, pois poderá haver um erro na declaração que poderá de certa
forma viciá-la, mas para que se forme um contrato, o que é verdadeiramente imprescindível, é
que as declarações sejam convergentes e não é necessário que as vontades sejam
convergentes, pois a convergência das vontades pode ser importante para se saber se o
contrato é válido ou inválido, mas são dois planos distintos.

Primeiro temos que saber se o contrato se formou, e só se ele se formou, é que faz sentido
saber se é válido ou inválido, porque se o contrato não se tiver formado, nem há que dizer que
é inválido, pois o facto de dizer que o contrato é inválido, já pressupõe que tenhamos
demonstrado previamente que efectivamente se formou o contrato.

Na formação de um contrato, nem sempre podemos dizer, temos aqui a proposta e temos
aqui a aceitação, porque muitas vezes as declarações negociais foram reduzidas a escrito e
constam de um documento único subscrito por ambas as partes, e quando há uma declaração
escrita por várias pessoas, (escritura pública constitutiva de uma associação), temos um
documento único assinado por várias pessoas e neste caso, cada uma ao assinar aquele texto,
está a apropriar-se juridicamente daquele texto, pois não é preciso fazer vários documentos à
parte, pois naquele único documento, o que está lá dito é aceite por cada um ao colocar lá a
sua assinatura.

Portanto, para haver contrato tem que haver várias declarações negociais, mesmo que não
seja possível descortinar uma proposta de uma aceitação, o que interessa é que se diga é que
entre as partes há convergência entre essas partes.

Muitas vezes, um contrato pressupõe uma declaração, a que chamamos proposta, à qual se
segue outra a que chamamos aceitação.

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Partindo da premissa em que nos contratos, há primeiro uma proposta, à qual se seguirá uma
aceitação, e o que caracteriza uma declaração para podermos chamar proposta, e segundo a
doutrina, que apresenta vários requisitos que têm que se verificar para podermos chamar uma
declaração de proposta contratual, e para estarmos perante uma proposta é preciso que:

a) A declaração como primeiro requisito revele uma vontade firme e inequívoca de


contratar.
b) A declaração tem que ser suficientemente completa.
c) A declaração tem que respeitar a forma legalmente exigida.

1º REQUISITO – A DECLARAÇÃO QUE REVELE A VONTADE FIRME E


INEQUÍVOCA DE CONTRATAR.
O que a doutrina diz é o seguinte:

Uma declaração só pode ser considerada uma proposta se bastar um “sim” ou um “aceito”
para o contrato se formar, ou seja, a vontade não pode ser apresentada em termos dubitativos
ou hipotéticos, pois quando estamos perante um verdadeira proposta, aquela pessoa já disse
tudo o que tinha a dizer e dá-se a ultima palavra ao destinatário da proposta, pois a ultima
palavra é de quem aceita.

Portanto, e repito, se o proponente pretende exprimir uma vontade de contratar em termos


dubitativos ou em termos hipotéticos, ou querendo reservar para si a ultima palavra, no fundo
ele está a querer ser ele o aceitante, pois no fundo ele está a pedir ao outro que lhe faça uma
proposta, que é uma questão diferente, por isso é que a doutrina distingue proposta e convite
a contratar, pois uma coisa é uma proposta, pois quando alguém, faz uma proposta está-se a
sujeitar ao “sim” do outro para que se forme o contrato.

Por vezes, o que acontece é que o pseudo proponente, na realidade, o que ele quer é que lhe
façam uma proposta, pois no fundo está a convidar a outra pessoa a fazer propostas, pois é
evidente que digo assim; “vende-se um quadro do Picasso”, neste caso eu estou a
disponibilizar-me para receber propostas das outras pessoas quanto à venda do meu quadro,
pois eu posso dizer “vende-se um quadro do Picasso ao melhor preço”, eu estou à espera que
as pessoas me façam propostas e eu aceitarei aquela que seja a melhor de todas, e portanto,
por vezes, o que há, é sobretudo, naqueles anúncios públicos, nem sempre estarmos perante
ofertas ao público (anuncio num jornal a revelar vontade de celebrar um contrato) mas, neste
caso, só é considerada uma verdadeira proposta se bastar alguém vir dizer que “sim” para se
formar um contrato.

SINTETIZANDO:

Para ser proposta, tem que ser uma declaração que forme uma vontade firme e inequívoca,
que não seja feita em termos dubitativos ou hipotéticos, em que o declarante aceite ficar
vinculado com um “sim” ou um “aceito” da outra parte, ele não pode querer ter a ultima
palavra, porque se quiser ter a ultima palavra, para ele não é uma proposta mas apenas um
convite a contratar.

Serafim Cortizo 20100059 Página 142

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2º REQUISITO – A DECLARAÇÃO TEM QUE SER COMPLETA


A proposta tem que conter aqueles elementos para se perceber que tipo de contrato é que se
está a querer propor, ou seja, se o A propõe algo a B, isto não pode ser considerada uma
proposta contratual, mas admitindo que o é, o contrato seria nulo por indeterminabilidade do
objecto, e partindo do princípio, que as pessoas não querem à partida celebrar contrato nulos
por indeterminabilidade do objecto, a proposta tem que conter o mínimo de elementos para
que a outra pessoa esteja em condições, de através de um “sim”, de se formar contrato.

Porque se eu digo “vendo-te o meu quadro”, sem especificar o preço, neste caso há aqui um
elemento determinante que está a faltar, e portanto, que um simples “sim” não permitiria
formar um contrato válido, e aí parte-se do principio que a pessoa não se está a querer
vincular imediatamente, porque neste caso o que se está a querer dizer é “vamos negociar
porque estou disponível para vender”, e portanto, a tal declaração a que chamamos proposta
tem que conter aqueles elementos básicos e essenciais para o tipo de negócio jurídico que se
pretende celebrar, sob pena de nem se saber que negócio é que está a ser celebrado e sob
pena, caso se a outra pessoa aceitasse, fosse um contrato nulo por indeterminabilidade do
objecto. Ora, o objectivo de uma proposta contratual não é dar origem a um contrato nulo,
pois o que se pretende é auto regular os interesses, e portanto, a proposta deve ser
minimamente completa.

3º REQUISITO – A FORMA (legalmente exigida) DO CONTRATO.


Neste caso, depende, porque se se dissesse que a proposta tem sempre que se revestir da
forma legalmente exigida, então nunca haveria contratos nulos por vício de forma, neste caso,
o que interessa é saber se as pessoas se quiseram vincular daquela forma.

Exemplo:

Imaginemos que eu vendia oralmente um prédio a outra pessoa, neste caso temos que ver se
a nossa intenção é ficarmos vinculados através daquele acordo oral, temos que nos render à
evidência que é um contrato, mas que é nulo por vício de forma, pois a lei não permite que as
pessoas se vinculem oralmente na compra e venda de um prédio, e portanto, nós estamos a
pretender um efeito jurídico que não é possível através daquela forma, e neste caso, o
contrato que se formou, é nulo por vício de forma.

Situação diferente é outra, pois nós sabemos que os imóveis são adquiridos através de
escritura pública ou documento autenticado, mas toda e qualquer compra e venda de um
imóvel, pressupõe um prévio acordo oral, uma negociação, sendo que estas negociações e
este pré acordos contratuais são a base do posterior contrato de compra e venda de um
imóvel por escritura pública, ou documento autenticado.

Mas a proposta só por si não forma um contrato, pois se não houver a aceitação, não se forma
contrato algum, pois a proposta é apenas um elemento que compõe o contrato, sendo que o
contrato pressupõe, pelo menos, duas declarações e a proposta só por si, não é suficiente para
que se forme o contrato.

Serafim Cortizo 20100059 Página 143

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Exemplo:

Imaginemos que se forma uma proposta, A dirige uma proposta a B, neste caso, seria uma
proposta dirigida a pessoa determinada, ou então A põe um anúncio num jornal fazendo uma
oferta ao público, aí é uma proposta feita a pessoas indeterminadas.

Para que se forme contrato terá que haver uma aceitação, se não houver aceitação, não
haverá contrato.

Então, imaginemos uma proposta;

A dirige uma proposta a B (a pessoa determinada) ou então A põe um anúncio num jornal a
fazer uma oferta ao público (a pessoas indeterminadas), nestes casos para que se forme um
contrato, terá que haver uma aceitação, mas se não houver aceitação, não haverá contrato.

A questão que se coloca é que, tem que haver uma aceitação, mas não há obrigatoriedade
nenhuma de haver aceitação, porque o destinatário da proposta é livre de a recusar, ninguém
é obrigado a contratar contra vontade, mas a pessoa sabe que se quiser contratar tem que
aceitar e isso já é uma questão diferente.

De qualquer modo, o destinatário da proposta não tem a vida inteira para decidir se aceita, há
sempre um prazo para o destinatário aceitar a proposta, e isto é importante, pois quem é
destinatário de uma proposta contratual, seja um destinatário concreto, quando a proposta é
recipienda, sejam destinatários indeterminados, quando é uma oferta ao publico, quem quer
aceitar a proposta tem que o fazer dentro de certo prazo, porque a proposta tem um prazo
de vigência (tem uma certa duração), isso significa que se a proposta não for aceite dentro
desse prazo, o direito de aceitar a proposta caduca, pois há um prazo para aceitar a proposta
que vem no artigo 228, que fala na duração da proposta contratual, sendo que os prazos do
artigo 228 é que variam.

No artigo 228 há três hipóteses;

1) O proponente ao fazer a proposta fixa ao destinatário um prazo limite para aceitar


(artigo 228 alínea a)).
2) Nos casos em que o proponente não fixou os prazos ao destinatário, mas que quer
uma resposta imediata (artigo 228 alínea b)).
3) Nos casos em que não se fixou um prazo limite, nem se pediu resposta imediata
(artigo 228 alínea c)).

Artigo 228 alínea a) “a proposta do contrato obriga o proponente nos termos seguintes; e for
fixado pelo proponente ou convencionado pelas partes um prazo para a aceitação, a proposta
mantém-se até o prazo findar”.

Então dentro do prazo, para se formar um contrato, é preciso que dentro do prazo fixado
ocorra a aceitação do contrato, e aqui convém recordar que a aceitação é uma declaração que
tem um destinatário determinado, que é o proponente, porque quem aceita dirige-se ao
proponente, logo, se a aceitação tem um destinatário determinado, aplica-se a primeira
parte do nº 1 do artigo 224, sendo que, a aceitação é dirigida ao proponente que é um

Serafim Cortizo 20100059 Página 144

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destinatário determinado, logo, a aceitação é uma declaração recipienda ou recepetícia.


Neste caso a aceitação é eficaz, não quando é emitida, mas quando é recebida.

Quanto à fixação do prazo, segundo o que diz a doutrina, o prazo fixado, muitas vezes é um
prazo que é fixado expressamente (o proponente diz que alguém tem até ao dia 31 de
Dezembro, ou 15 dias a partir do dia de hoje, ou 15 dias após a recepção da proposta) pois o
proponente pode fixar o prazo e os termos em que ele vigora.

Mas há prazos que podem ser fixados tacitamente (implicitamente) porque há situações, em
que pela lógica, tem que haver um prazo.

Exemplo:

Se uma pessoa faz uma proposta a outra de uma encomenda de uma árvore de Natal, não é
para que o dono da árvore responda depois do Natal, pois está implícito que se pretende a
árvore de Natal antes do próximo Natal e não do Natal do próximo ano.

Lendo-se o artigo 228 alínea a) há uma questão que se levanta, pois lendo-se este artigo
concluímos, pois a lei diz que “a proposta obriga o proponente”, e diz obriga porque no nosso
ordenamento jurídico vigora o princípio da irrevogabilidade da proposta, pois a proposta em
princípio é irrevogável (artigo 230 nº 1), pois em Portugal quando é feita uma proposta de
contrato, regra geral, a proposta é irrevogável.

Isso significa que quando A faz uma proposta a B, sendo a proposta irrevogável, o A fica
amarrado á sua proposta nos prazos do artigo 228, porque não pode revogar a proposta e por
isso é que a lei diz que “a proposta obriga o proponente”.

Grande parte da doutrina diz que o destinatário da proposta tem um direito potestativo, que é
o direito de aceitar a proposta, e a doutrine defende que quando o proponente faz uma
proposta ao destinatário da proposta, nasce na esfera jurídica do destinatário da proposta o
direito potestativo de aceitar a proposta, sendo esta a posição dominante em Portugal, da qual
eu discordo.

Eu não nego, nomeadamente quando a proposta é irrevogável, não há duvida nenhuma que se
a minha proposta é irrevogável, e se eu faço uma proposta àquela senhora, durante o período
de vigência da proposta, eu estou á mercê de uma decisão unilateral dela, pois eu sei que só
depende da vontade dela formar-se um contrato, e se ela disser sim, há contrato.

Eu não aceito que se trate aqui de um direito potestativo constitutivo, porque iria criar uma
nova relação jurídica, porque dizer que ela tem o direito potestativo de criar um contrato,
daria a ideia de que o contrato se vai formar por vontade unilateral dela, e não é bem assim, é
verdade que depois de eu fazer a proposta, tudo fica dependente dela, pois na formação do
contrato foi tão importante a vontade de aceitação dela, como a da minha proposta, pois se eu
não tivesse feito essa proposta, ela nunca conseguiria sozinha formar um contrato, ou seja,
dizer que ela tem o direito potestativo de aceitar, tal como defende a doutrina portuguesa, dá
a ideia de que depende de uma única pessoa a formação do contrato, mas na realidade, não
dependeu só dela a formação do contrato, pois dependeu, tanto dela como de mim, a única
particularidade, é que, como eu fui a primeira pessoa a exprimir a minha vontade, e agora só

Serafim Cortizo 20100059 Página 145

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depende dela, mas isto é mais uma questão de qualificação jurídica, mas eu estou de acordo,
que se a proposta é irrevogável, a partir do momento em que eu faça a proposta, para se
formar contrato já só falta a vontade dela e nisso estamos todos de acordo, a duvida reside em
saber, se a decisão se vai criar exclusivamente por decisão dela.

Pode acontecer que o proponente tenha fixado ao destinatário um prazo muito longo para
aceitar, e a questão que se coloca é, sendo a proposta revogável, pois se for revogável, não há
grande problema, porque o proponente pode sempre libertar-se da proposta revogando-a,
mas imaginem que é irrevogável, será razoável ficar vinculado, 23, 30 ou 40 anos numa
situação jurídica que está bloqueada á espera que a outra pessoa se decida?

Então, Pessoa Jorge e Meneses Cordeiro defendem a tese de que, sendo que a proposta seja
feita por um prazo superior a 20 anos, que decorridos que sejam 20 anos, o proponente pode-
se libertar dela, (apesar de ser uma proposta irrevogável), ao fim de 20 anos o proponente
poder-se libertar da proposta invocando a prescrição do direito do destinatário em aceitar a
proposta, ou seja, vem dizer que o destinatário da proposta prescreveu o seu direito de
aceitar, e quando um direito prescreve, quer dizer que se extingue pelo decurso do tempo.

Então Meneses Cordeiro e Pessoa Jorge, chamam á atenção para dois artigos, um é o artigo
298 nº 1 que consagra um principio geral que é, em principio todos os direitos prescrevem ao
fim de certo tempo, mas não diz em que prazo, e então temos que ir ao artigo 309, que diz que
há um prazo que é o prazo ordinário de prescrição, (prazo regra) e diz o artigo 309 que o prazo
é de 20 anos.

Então o raciocino de Meneses Cordeiro e Pessoa Jorge é;

A lei, nada diz sobre a extinção pelo decurso do tempo, do direito que tem o destinatário de
uma proposta de a aceitar, a lei não prevê que o direito de aceitar a proposta se extinga pelo
decurso do tempo, no entanto, há uma regra geral no artigo 298 nº 1 que diz que todos os
direitos, em regra, são prescritíveis, excepto os direitos indisponíveis, logo, o seu raciocino é o
seguinte;

O direito de aceitar a proposta nos termos do artigo 298 nº 1, é um direito que pode
prescrever pelo decurso do tempo, e quando a lei não diz qual é o prazo, aplica-se o prazo
ordinário que é de 20 anos, logo, mesmo que o proponente tenha dito ao destinatário que o
destinatário tem 40 ou 50 anos para aceitar a proposta, decorridos que sejam 20 anos, sobre a
data da proposta, o proponente poderia vir dizer ao destinatário da proposta que o direito de
aceitar prescreveu.

Aula 23

DURAÇÃO DA PROPOSTA CONTRATUAL (Continuação)


A aceitação dirige-se sempre a um destinatário determinado que é o proponente, e portanto,
aplica-se o artigo 224 nº 1 (primeira parte) o que significa que a aceitação só é eficaz depois de
ser recebida pelo destinatário ou ser dele conhecida, portanto, o que conta não é quando a
aceitação é emitida, mas sim, quando é recebida.

Serafim Cortizo 20100059 Página 146

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Se o prazo limite para uma certa aceitação é, por exemplo, dia 30, não basta que no dia 30 seja
escrita a carta e que seja posta no correio, é preciso que, o mais tardar dia 30, ela chegue ao
seu destino, pois há que aplicar o artigo 224 nº 1 (primeira parte).

Estávamos a analisar as várias alíneas do artigo 228 e ainda só tínhamos visto a aliena a) do nº
1 e na alínea a) prevê-se a hipótese de o proponente ter fixado um prazo ao destinatário e
quando o proponente fixa um prazo, esse prazo é vinculativo, e portanto, seja um prazo longo
ou um prazo curto, o destinatário da proposta se quiser celebrar um contrato vai ter que
arranjar maneira de aceitar a proposta dentro desse prazo, sendo que, o proponente é livre de
fixar prazos muito curtos para a aceitação, ou pode até fixar um prazo muito longo, e era
precisamente aí que ficamos, porque vimos que, se o proponente fixar um prazo muito longo,
é de entender que o mais tardar, ao fim de 20 anos, que o proponente fica liberto da sua
proposta, porque o direito de aceitar a proposta é um direito susceptível de prescrever como
diz o artigo 298 nº 1, que prevê “a generalidade dos direitos se extingue, pelo decurso do
tempo”, portanto, este artigo consagra o principio geral, que é o princípio de que os direitos
prescrevem.

É verdade que há excepções, pois como é previsto no artigo 298 nº 1, diz que “não prescrevem
os direitos que a lei declara isentos de prescrição”, mas a lei não fiz que o direito de aceitar
uma proposta está isento de prescrição.

E também não prescrevem os chamados “direitos indisponíveis” e direito indisponível,


significa um direito de que o titular não pode dispor nem pode transmitir e não pode renunciar
a ele. Mas nós não podemos dizer que o direito de aceitar a proposta é um direito
indisponível, pois a própria pessoa pode-se recusar a aceitar, e é a melhor prova de todas de
que o direito é perfeitamente disponível.

Então, se o direito de aceitar a proposta, não está isento de prescrição e se não é um direito
indisponível, e visto que a lei não fixou qualquer prazo, há que aplicar o regime do artigo 298
nº 1, que diz que os direitos, regra geral, prescrevem.

E como a lei não prevê, especificamente esta situação, há que aplicar o prazo ordinário de
prescrição que é de 20 anos, conforme preceitua ao artigo 309, que prevê que o prazo
ordinário de prescrição é de 20 anos, ou seja, um direito pode prescrever e se a lei não
esclarecer qual é o prazo, aplica-se o prazo de 20 anos do artigo 309, e é com base neste artigo
que os professores Meneses Cordeiro e Pessoa Jorge, defendem a tese de que nas propostas
de muito longa duração, o proponente ficaria liberto dela ao fim de 20 anos, porque ao fim de
20 anos poderia invocar a extinção do direito que tinha o destinatário da proposta em poder
aceitar a mesma.

Tudo isto só tem interesse nos casos, que são a regra, nos casos em que a proposta seja
irrevogável, porque a proposta de contrato, regra geral é irrevogável (artigo 230) e portanto,
regra geral, o proponente não pode retirar a proposta que fez, pois e regra geral, o
proponente fica amarrado á sua proposta, enquanto não terminar o prazo que o destinatário
tem para aceitar.

Serafim Cortizo 20100059 Página 147

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A fixação do prazo pode ser expressa ou estar implícita, ou ser tácita, pois há casos em que
expressamente não se diz que há um prazo, mas tendo em conta o objectivo que se tem na
celebração do contrato, a outra parte percebe que a aceitação vai ter que ser feita antes de
certa data, isto quanto ao artigo 228 aliena a).

Depois temos as alíneas seguintes, nomeadamente a alínea b) que é uma alínea que levanta
problemas pois até é dos preceitos mais polémicos a interpretação da aliena b) do artigo 228
nº 1.

Na aliena b) do artigo 228, está-se a prever a hipótese de o proponente ter pedido resposta
imediata, pois o proponente não fixou um prazo ao destinatário.

Quando o proponente quer resposta imediata, na prática não está a fixar um prazo e neste
caso, temos que saber, quer o proponente, quer o destinatário da proposta, há que
determinar qual é o prazo, dentro do qual o destinatário tem que responder quando lhe
pedem uma resposta imediata, porque certamente resposta imediata não significa um décimo
de segundo depois de receber a proposta, e neste caso temos que atender ao disposto na
alínea b) do artigo 228.

Artigo 228 aliena b) “se não for fixado prazo, mas o proponente pedir resposta imediata, a
proposta mantém-se até que, em condições normais, esta e a aceitação cheguem ao seu
destino”.

Quando o proponente pede resposta imediata;

Exemplo:

Imaginemos que o A escreveu uma carta a B fazendo uma proposta de contrato e nessa carta,
o proponente diz que quer resposta imediata.

Neste caso, interessa saber afinal, durante quanto tempo é que o proponente fica vinculado á
sua proposta, ou na óptica do destinatário, qual é o prazo que o destinatário tem para aceitar
a proposta, e neste caso aceitar, é fazer chegar a aceitação ao poder do proponente.

Diz-se no artigo 228 aliena b) que “a proposta mantém-se até que, em condições normais
esta aceitação chegue ao seu destino”.

Exemplo:

Imaginemos uma proposta contratual que foi emitida e posta no correio no dia 1 de certo mês
em que o proponente pediu resposta imediata, neste caso, aplicando o artigo 228 nº 1 b) que
o próprio proponente quando escreve a carta, consiga imaginar certamente até que dia vai
estar vinculado, e também é necessário que o destinatário quando receber a carta consiga ter
uma ideia de qual é a data limite para ele fazer chegar ao destinatário da aceitação, pois tem
que ter uma maneira de saber quanto tempo é que terá para aceitar aquela proposta.

A lei diz que neste caso em que se quer resposta imediata e não se fixou um prazo, aplica-se a
alínea b) do artigo 228 nº 1 que refere “a proposta mantém-se até que, em condições normais

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esta aceitação chegue ao seu destino”, ou seja, para determinarmos qual é o prazo da alínea
b), vamos ter que somar dois prazos;

1) Vamos ter que somar o prazo em que em condições normais uma proposta contratual,
enviada pelo correio, demora a chegar ao destinatário em que é pedida resposta
imediata e para aplicar o artigo 228 b).
2) Vamos ter que somar o tempo que, em condições normais, uma proposta enviada por
aquele meio demora a chegar ao destino, e depois vai-se somar outro prazo, visto que
há que haver uma resposta imediata á proposta inicial.

Imaginemos que em Portugal uma carta, em regra, leva dois dias a chegar ao seu destino, e se
o juiz concluísse que a regra da média de uma carta em Portugal demora dois dias a chegar ao
destino, o juiz diria que uma carta enviada dia 1, em condições normais chegaria dia 3 e sendo
pedida uma resposta imediata, essa resposta imediata terá que ser no dia 3, ou o mais tardar
no dia 4, dependendo também da hora em que se recebeu a proposta no dia 3, porque se se
recebeu no dia 3 às 23:59 horas, obviamente que não será fácil responder no mesmo dia, pois
também pode ser relevante saber a que horas do dia é que a declaração foi recebida, para se
saber que ainda se consegue responder dentro do mesmo dia.

Neste caso, se o juiz entendesse que “em condições normais uma carta de Lisboa para Faro,
demora dois dias, e em condições normais uma carta de Faro para Lisboa também demora dois
dias, logo, se foi pedida resposta imediata, nos termos do artigo 228 nº 1 b), somar-se-iam dois
dias para lá e dois dias para cá, que dá quatro dias, logo uma carta que partiu dia 1, o mais
tardar dia 5, teria que chegar a aceitação da proposta, ou no dia 6 se ele entendesse que a
resposta imediata não impeça o destinatário de reflectir umas horas sobre a proposta que lhe
foi feita, e então o juiz diria, se é pedida resposta imediata, o prazo é 2+2 = 4 dias”.

Mas se o juiz entendesse que era 3 dias, pois tudo depende do que se entendeu por condições
normais, se atender que condições normais é dois dias, para dar a resposta imediata, tem
quatro dias para o fazer a contar do momento em que a proposta foi emitida, não são
quatro dias a contar da recepção da proposta.

Então isto significa o seguinte;

Se a carta, em condições normais demora dois dias, mas imaginem que naquele caso demorou
quatro dias, e se por acaso a carta que eu enviei de Lisboa no dia 1 a pedir resposta imediata,
chegou a Faro no dia 5, isso não quer dizer que o destinatário tenha 2 dias para mandar a
resposta, porque o destinatário terá que fazer a conta “para lá são 2 dias e para cá são 2”,
portanto, estou vinculado até dia 5 e ele quando recebe a minha proposta olha para o carimbo
e vê dia 1 e fazendo as contas dirá, que tem que responder até ao dia 5.

No Código do Processo Civil no artigo 254 tem um preceito que se refere às notificações
judiciais enviadas pelo correio, e nessa norma presume-se que as notificações enviadas por
correio demoram a chegar ao destino 3 dias depois da data do carimbo, e com base neste
preceito, há autores, nomeadamente Meneses Cordeiro que diz que, se o legislador, para as
notificações judiciais que vão pelo correio, achar normal presumir que chegam ao destino 3
dias depois, é porque aparentemente para o legislador, 3 dias é o prazo normal para as cartas

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chegarem ao seu destino, e neste caso não há motivo para que uma carta com uma proposta
de aceitação demore mais tempo a chegar ao destino.

Então há autores que defendem que, se a lei no artigo 228 aliena b) não esclarece quais são
as condições normais, mas no Código do Processo Civil há uma norma que parece achar que
é normal que uma carta chegue ao destino 3 dias depois do carimbo, então é razoável
aplicar logicamente essa norma no artigo 228 b) e dizer que quando estamos perante cartas
de correio normal, é de entender que o prazo normal para a carta chegar ao destino será 3
dias, e portanto, também o prazo normal para o regresso, será mais 3 dias.

E quem raciocina assim, dirá que quem tiver escrito uma carta no dia 1 com uma proposta, que
o prazo para o destinatário aceitar será 3+3 = 6 dias e será até dia 7, mas note-se, tudo
depende de o juiz subscrever a aplicação analógica do artigo 254 do CPP, porque eu reconheço
que é prático aplicar o artigo 254 do CPP por analogia, e assim ficamos com um prazo que não
levanta dúvidas.

Por outro lado, tenho algumas duvidas em aplicar por analogia o artigo 254 do CPP, porque a
aplicação analógica deste artigo pressupõe uma lacuna, e neste caso teríamos que demonstrar
que há uma lacuna no artigo 228 b) e na realidade, não há propiamente uma lacuna, o que há
é um conceito indeterminado e aqui, quando se fala em condições normais, é uma questão de
o juiz se informar, e nesse caso ele obtém informação junto dos correios, do tempo que
normalmente demora uma carta, porque o que interessa é efectivamente o tempo que
normalmente demora.

Portanto, como se vê, quando se pede resposta imediata, quer o proponente para saber
quanto tempo fica vinculado, quer o destinatário para saber quanto tempo tem para aceitar a
proposta, qualquer deles vai ter que fazer uma conta que é tomar como ponto de referencia o
momento da emissão da proposta e depois somar-lhe dois prazos:

a) O prazo em que em condições normais a proposta demora a chegar ao destino.


b) O prazo em que em condições normais a aceitação demoraria a chegar ao destino, a
partir da premissa em que a resposta vai ser imediata.

ARTIGO 228 nº 1 Alínea c)


Na alínea c) do artigo 228, estamos perante um caso em que o proponente estipulou um prazo
ao destinatário, mas também não lhe pediu resposta imediata, sendo que, esta alínea aplica-se
por exclusão de partes, num caso que não se enquadra nem na alínea a) nem na alínea b) do
artigo 228 e então o caso cai na aliena c).

Artigo 228 nº 1 alínea c) “se não for fixado prazo e a proposta for feita a pessoa ausente ou,
por escrito, a pessoa presente, manter-se-á até cinco dias depois do prazo que resulta do
preceituado na alínea precedente”.

A lei não está aqui a dizer que o prazo é de 5 dias, o que está a dizer é que é 5 dias somados ao
prazo da alínea anterior e isto significa que quando uma situação cai na alínea c), como se têm
que somar 5 dias ao prazo da aliena anterior, para se aplicar bem esta norma, vão ser
obrigados a imaginar qual seria o prazo para aceitar, se tivesse sido pedida resposta imediata,

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vão ter que imaginar que se aplicava a alínea b) e depois de descobrirem qual é o prazo, se
fosse uma resposta imediata, seria somar 3+3 = 6 e depois teriam que somar mais 5 dias, e se
tiverem concluído que no caso de resposta imediata seria de 6 dias, como estamos na alínea
c), somam-se mais 5 dias e o prazo é de 11 dias.

Mas se tiverem concluído que o prazo da resposta imediata, imaginemos que era correio azul,
e que se concluía que o prazo normal para a carta chagar ao destino, era de 1 dia para lá e
outro para cá, e se fosse pedida resposta imediata seriam 2 dias, e como não se pediu, são
mais 5 dias, 2+5 = 7 dias, o problema não está em somar-se, o problema está na aplicação da
alínea b) do artigo 228.

Agora, uma coisa é certa, é errado dizer que o prazo da aliena c) é pura e simplesmente de 5
dias, mas sim 5 dias somados aos prazos da alínea b). E portanto, o que têm que fazer é
imaginar que quando estão na alínea c) que se aplicava a alínea b) e depois de calcular qual é o
prazo, nos termos da alínea b) somam-se mais 5 dias.

Exemplos:

Imaginemos que eu enviei um telegrama hoje de manhã em que não pedi prazo nem resposta
imediata, neste caso aplica-se a alínea c). Se eu tivesse pedido resposta imediata, se eu mandei
um telegrama de manhã e se teriam que me responder ainda hoje, mas como eu não fixei
prazos e não se aplica a alínea c), temos que juntar 5 dias.

Se eu hoje tivesse mandado uma carta e se defendesse a tese que se aplicava por analogia a
regra do CPP, no caso da resposta imediata, então diríamos, a carta foi enviada, hoje dia 2 e
presume-se que chegue ao destino, o mais tardar 3 dias depois, no dia 5 e depois uma
resposta imediata, presume-se que chegue ao destino no dia 8, mas como não foi pedida
resposta imediata, ainda teremos que somar 5 e então dir-se-á que a data limite seria até ao
dia 13 e se por acaso o dia 13 fosse um dia não útil, passaria para o primeiro dia útil
eventualmente.

Estes prazos da alínea b) e da alínea c) do artigo 228, não tem nada de transcendente, pois é
somar 5 dias aos prazos da alínea b) e no fundo, quer se aplique a alínea b) quer a alínea c),
tem que se atender, não ao período de tempo que na realidade a proposta demorou a chegar
ao destino, ou que a aceitação demorou a chegar ao destino, mas sim o período que em
condições normais demora, porque só se se atender aos períodos normais é que as pessoas
podem prever antecipadamente, por exemplo, que um telegrama demora umas horas, mas
não posso prever antecipadamente que o meu telegrama vai levar 8 dias a chegar ao destino e
portanto, por isso é que a lei se deu ao trabalho de na alínea b) dizer “condições normais”.

Mas a aplicação desta alínea c) pressupõe que vejamos o que é que a lei entende aqui por
“pessoa presente” e por “pessoa ausente”.

Aqui a distinção entre ausente e presente não é uma distinção puramente geográfica, ou seja,
o que interessa para ser considerado por contrato entre presentes é que as partes estejam em
comunicação instantânea, e quando digo comunicação instantânea é a comunicação que
permite ao destinatário, imediatamente dar a sua aceitação se quiser.

Serafim Cortizo 20100059 Página 151

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Exemplo:

Se eu estiver ao telefone com uma pessoa que está em Macau e se celebrarmos um contrato
por telefone, ou por vídeo-conferência, pois se as pessoas estiverem em comunicação
instantânea em que uma declaração é emitida, e o outro está em condições de imediatamente
se seguir uma aceitação e então diremos que a proposta que foi feita, é uma proposta entre
presentes, apesar de estarem em locais muito longínquos do mundo.

Mas isto já não se aplicaria se eu mandasse a resposta por fax, porque não é necessariamente
suposto que a outra pessoa esteja ao pé do fax no momento em que o recebe, mas uma
resposta entre presentes pressupõe, não uma proximidade geográfica, mas proximidade em
termos comunicacionais, pois é possível àquela proposta seguir-se imediatamente uma
aceitação.

O artigo 228 nº 1 c) aplica-se, como diz a lei, se for uma proposta a pessoa ausente, ou por
escrito a pessoa presente

Mas há uma situação que não está aqui coberta, pois esta aliena c) aplica-se quando não foi
fixado prazo e nem foi pedida resposta imediata, mas aplica-se a dois casos;

a) Ou a proposta feita a pessoa ausente.


b) Ou por escrito a pessoa presente.

Mas há um caso que não está aqui coberto que é uma proposta oral a pessoa presente e que
não fixado nenhum prazo nem foi pedida resposta imediata.

Como eu não fixei nenhum prazo, não se aplica a aliena a) e como eu não lhe pedi resposta
imediata, não se aplica a alínea b), mas quando é uma proposta oral feita a uma pessoa
presente, o caso também está fora da alínea c), sendo que é uma situação que não está aqui
coberta mas que pode acontecer, pois há imensas propostas orais em que não é fixado
nenhum prazo e até é raro pedir-se uma resposta imediata.

Exemplo:

Imaginemos que eu fazia a tal proposta oral a pessoa presente e dizia ao vosso colega, “vendo-
lhe esta caneta por 50 Euros”, aqui a questão é saber, que certamente tem que haver um
prazo, não vamos dizer que há uma lacuna e portanto, não há prazo.

Aqui neste caso, a doutrina defende que se deve aplicar neste caso quando é uma proposta
oral a uma pessoa presente, em que não se fixa prazo, nem se pede resposta imediata, e
nestes casos, a doutrina defende que a maneira mais adequada de colmatar a lacuna, é aplicar
o prazo previsto para o caso em que se pede resposta imediata, e a doutrina defende que se
deve entender que o proponente pretende resposta imediata.

Chega-se a esta conclusão com base no raciocínio à contrário sensu do artigo 228 alínea c) e o
raciocínio é dizer que, se perante uma pessoa presente, se eu lhe entregar por escrito o outro
tem direito a 5 dias, à contrário sensu, se for oral, o outro não terá prazo nenhum. O raciocino
é a lei entender que só se devia dar um prazo, no caso em que a proposta é feita a pessoa

Serafim Cortizo 20100059 Página 152

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presente, mas por escrito, logo, se for feita a pessoa presente oralmente, por exclusão de
partes se há um prazo quando é por escrito, ou quando é oralmente, à contrário sensu, não
haverá prazo, e se não houver prazo, isso quererá dizer que a resposta terá que ser imediata.

Pela lógica do que foi dito, se o proponente só está vinculado dentro destes casos e se a
proposta só o obriga dentro destes casos, daí resulta que se a aceitação se tornar eficaz já
depois destes prazos decorridos, em principio não se forma contrato algum, porque para que
se forme contrato é preciso que a aceitação se torne eficaz no momento em que a proposta
ainda estivesse de pé, mas se a proposta já caducou e se já passou o prazo, e se eu disse a uma
pessoa que tinha até dia 30 para aceitar e a pessoa vem agora no dia 2 a dizer que aceita,
quando ela vem aceitar e quando eu recebo a aceitação, já tinha caducado o direito dessa
pessoa de aceitar, e portanto, em principio quando não são excedidos os prazos do artigo 228,
não se forma contrato mesmo que haja uma aceitação.

E digo em principio, porque há uma excepção no artigo 229 nº 2.

ARTIGO 229 nº 2
“O proponente pode, todavia, considerar eficaz a resposta tardia, desde que ela tenha sido
expedida em tempo oportuno, em qualquer outro caso, a formação do contrato depende de
nova proposta e nova aceitação”.

A primeira parte do nº 2 do artigo 229 aplica-se quando a aceitação chega ao proponente


tardiamente, mas constata-se que foi expedida oportunamente.

Porque se a aceitação chegar tardiamente, mas tiver sido expedida tardiamente, o que se
aplica é a segunda parte do artigo 229 nº 2.

Exemplos:

Imaginemos que eu tinha feito uma proposta de contrato àquela senhora e tinha-lhe escrito
uma carta, e na minha proposta de contrato tinha-lhe fixado como data limite para a aceitação
o dia 30 de Novembro e se a data limite era dia 30 de Novembro, era necessário que até dia 30
de Novembro eu recebesse a aceitação ou tomasse dela conhecimento, mas como
normalmente a recepção é anterior ao conhecimento, em princípio o que seria necessário, era
que o mais tardar em 30 de Novembro, eu tivesse recebido a aceitação.

Imaginem que eu só recebia a aceitação da vossa colega no dia 2 de Dezembro, não há duvida,
neste caso que é uma aceitação tardia porque chegou tardiamente, mas imaginem que eu olho
para o carimbo da carta e vejo que ele tinha posto a carta no correio no dia 25 de Novembro, e
então neste caso, eu constato que, não há duvida que a aceitação é tardia, porque chegou dia
2 de Dezembro, quando a data limite era 30 de Novembro, mas neste caso, não se pode dizer
que foi expedida tardiamente, porque foi expedida 5 dias antes da data fixada como data
limite, e uma carta com uma aceitação enviada no dia 25 de Novembro, se tudo corresse
normalmente, pois mandar a carta no dia 25 era com a antecedência mais que suficiente, para
poder cumprir o prazo fixado pelo proponente.

Neste caso eu constato, que de facto, a aceitação da vossa colega é tardia porque chegou no
dia 2 de Dezembro, quando deveria ter chegado, o mais tardar no dia 30 de Novembro, mas

Serafim Cortizo 20100059 Página 153

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constato que foi expedida em tempo oportuno (dia 25 de Novembro) e que era uma
antecedência suficiente para chegar a dia 30 de Novembro.

E neste caso, só porque a recepção é tardia, mas a expedição não é tardia, aplica-se a primeira
parte do nº 2 e então, eu proponente, se ainda estiver interessado no contrato, posso
considerar eficaz a aceitação dela, apesar de ter sido uma aceitação tardia, mas posso
considera-la eficaz porque foi expedida em tempo oportuno.

Quando se aplica esta primeira parte do nº 2 do artigo 229, estamos perante uma situação em
que fica ao critério do proponente decidir se o contrato se forma ou não, porque o proponente
é que decide se vai ou não admitir aquela aceitação tardia, porque se o proponente não quiser
não se formará contrato, apesar de a aceitação ter sido expedida em tempo oportuno.

Se este caso cair na segunda parte do nº 2, a aceitação é tardia e a própria expedição foi
tardia, e imaginemos que a data limite era dia 30 de Novembro e eu recebi hoje dia 2 de
Dezembro, um telegrama a dizer que aceitava, é evidente que neste caso, a expedição foi
tardia, pois não se pode esperar que uma declaração emitida em 2 de Dezembro chegue
retroactivamente ao seu destino no dia 30 de Novembro, ou se eu constacto que o carimbo da
carta com a resposta que foi posta no correio no próprio dia 30, neste caso, não é considerada
antecedência suficiente a expedição de uma carta no próprio dia da data limite, e uma carta
expedida no dia 30, não é antecedência suficiente para chegar no próprio dia 30 e neste caso
quando a aceitação é tardia, e foi expedida tardiamente, não se pode formar contrato por
vontade do proponente e tem que haver duas novas declarações de proposta e duas novas
declarações de aceitação.

ARTIGO 229 nº 1
“Se o proponente receber a aceitação tardiamente, mas não tiver razões para admitir que
ela foi expedida fora de tempo, deve avisar imediatamente o aceitante de que o contrato se
não concluiu, sob pena de responder pelo prejuízo havido”

Exemplo:

Eu fiz uma proposta á vossa colega, em que a data limite para aceitar era dia 30 de Novembro,
e ela expediu a carta com a aceitação no dia 25 de Novembro, mas por algum motivo a carta
que ela me escreveu dia 25, só chegou ao meu poder no dia 2 de Dezembro.

E já vimos que nos termos da primeira parte do nº 2, se eu quiser posso considerar eficaz a
proposta e forma-se contrato, mas também se eu quiser posso não a considerar eficaz.

Então se por acaso eu não quiser que se forme contrato, nessa situação, eu tenho a obrigação
de avisar o aceitante porque é um caso em que o aceitante vai estar convencido que se
formou um contrato, porque ele expediu a aceitação dele em tempo oportuno e ela está a
contar legitimamente que se forme contrato, porque sabe que escreveu a carta com a a
antecedência suficiente, o facto é que a carta chegou no dia 2, mas isso ela não pode adivinhar
e num caso desses, como ela está a contar que o contrato se formou, porque expediu em
tempo oportuno, se eu não quero que aquele contrato se forme, e se eu não me quero
prevalecer do poder que me dá a primeira parte do nº 2, que me permite considerar eficaz

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aquela aceitação tardia por ter sido expedida em tempo oportuno, mas se eu não a quiser
considerar eficaz, então tenho a obrigação de prevenir o aceitante.

Mas se eu quiser que não se forme contrato, mas sendo uma expedição em tempo útil, se não
lhe disser nada, a única consequência é a que vem na parte final do nº 1, e aí eu terei que
responder pelos prejuízos que a outra parte sofrer.

Caso prático

Quando uma aceitação é tardia forma-se contrato?

Não podem responder peremptoriamente que quando a aceitação é tardia, nunca se forma
contrato, pois não é verdade, o que terá que se dizer é que quando a aceitação é tardia, só se
forma contrato se o proponente quiser, e mesmo aí, o proponente só tem liberdade para crer
que se for um caso em que só a aceitação é que é tardia, mas que a expedição não é tardia,
porque se houver um duplo caracter tardio, quer a aceitação, quer a expedição, se são feitas
tardiamente, e se houver essa dupla extemporaneidade, então, mesmo que o proponente
quisesse, não se formaria contrato porque a segunda parte do nº 2 diz que nesses outos casos
tem que haver uma nova proposta e uma nova aceitação, sendo que, o processo negocial
como que recomeça.

ARTIGO 230 (Irrevogabilidade da proposta)


Artigo 230 nº 1 “salvo declaração em contrário, a proposta de contrato é irrevogável depois de
ser recebida pelo destinatário ou de ser dele conhecida” Artigo 230 nº 2 “se, porém, ao mesmo
tempo que a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retractação do proponente ou
tiver por outro meio conhecimento dela, fica a proposta sem efeito”.

Aqui há que distinguir duas situações;

Pode acontecer que o proponente ao fazer a proposta, inclua na proposta uma cláusula de
revogabilidade, ou seja, o proponente ao dirigir-se inicialmente ao destinatário, pode dizer que
se reserva o direito de revogar a proposta, e pode dizê-lo porque é exactamente isso que a lei
quer dizer na parte inicial quando diz “salvo declaração em contrário” do proponente, ou seja,
o proponente pode ao mesmo tempo que anunciar a proposta, dizer que a mesma é
revogável.

A lei prevê a irrevogabilidade da proposta, porque a nossa lei entende que quando uma pessoa
vai fazer uma proposta a outra, vai fazer nascer na esfera jurídica do destinatário uma
expectativa jurídica, e vai acreditar que se dissesse que sim, dentro de certo prazo, se vai
formar um contrato com um certo conteúdo.

Então o raciocínio do legislador é;

Se o proponente ao fazer a proposta cria expectativas ao destinatário, então não deve frustrar
as espectativas do destinatário, enquanto perdurar o prazo da aceitação, e a maneira de ele
frustrar as expectativas é de não poder revogar a proposta. Mas esta solução já não será
necessária se quando faz a proposta, o proponente disser imediatamente que ela é revogável,
porque neste caso a pessoa não visa criar expectativas de que só depende dela a formação do

Serafim Cortizo 20100059 Página 155

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contrato. E por isso a lei não vê com qualquer relutância a possibilidade de o proponente dizer
á partida que aquela proposta é revogável.

Mas existe um limite temporal, findo o qual já não é possível revogar a proposta, pois só se
pode revogar a proposta, mesmo quando isso é possível, enquanto o contrato não estiver
formado, pois uma vez formado um contrato, já não é uma proposta autónoma, pois a
proposta perdeu a sua individualidade, e a partir do momento em que haja uma aceitação
eficaz fala-se já num negócio jurídico pluri ou bilateral, pois uma vez o contrato formado, o
proponente nunca poderia revogar a proposta mesmo que houvesse uma clausula de
irrevogabilidade, porque neste caso, revogar a proposta seria revogar o contrato
unilateralmente e os contratos são para cumprir, não é para revogar unilateralmente.

Exemplo:

Imaginemos que eu celebrei um contrato com alguém e que pus um limite de 9 de Dezembro
para aceitar, mas também disse na proposta que era revogável e imaginemos que no dia 5 eu
escrevo uma carta a dizer que revogo, mas ele também me escreve uma carta a dizer que
aceita.

Aqui o que interessa saber é qual é a carta que chega primeiro. Se chegar primeiro a carta
com a aceitação, então quer dizer que quando a minha revogação chegar ao destino já há
contrato. Se a carta com a revogação chegar ao destino antes de eu receber a carta com a
aceitação, prevalece a revogação. Mas isto só acontece se a proposta for revogável, mas
nunca depois de o contrato estar efectivamente formado.

Mas imaginemos que o proponente não disse que a proposta era revogável, então, quando
assim é, se o proponente não se tiver reservado a possibilidade de revogar a proposta, ainda
assim poderá revogá-la, desde que se verifiquem os requisitos da parte final do nº 1 e do nº 2
do artigo 230.

O que a lei diz é que “a proposta de contrato é irrevogável depois de ser recebida pelo
destinatário ou de ser dele conhecida ” o que quer dizer que a proposta é sempre revogável,
se a revogação ocorrer num momento anterior ou no mesmo momento da própria recepção
da proposta.

Exemplo:

Eu hoje escrevi uma carta àquele senhor com uma proposta de contrato, carta essa que ele vai
receber previsivelmente na 2ª feira, mas eu posso-lhe fazer um telefonema amanhã, ou
mandar um fax no Domingo a dizer que revogo a proposta, e num caso desses, ele vai receber
a revogação ainda antes de receber a proposta, pois a proposta só a recebe pelo correio na 2ª
feira e antes de receber a proposta já recebeu um telegrama meu, ou um fax, ou um
telefonema a revogar a proposta.

E nesse tipo de situação sempre que a revogação opere antes da recepção da proposta, a
revogação é perfeitamente válida e eficaz (artigo 230 nº 2 parte final - “ao mesmo tempo que
a proposta, ou antes dela, o destinatário receber a retractação do proponente ou tiver por
outro meio conhecimento dela, fica a proposta sem efeito”) pois neste caso não era preciso

Serafim Cortizo 20100059 Página 156

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que houvesse uma clausula de revogabilidade, e neste caso não há problema porque não se
pode esquecer o elemento teleológico, pois quando a lei prevê a irrevogabilidade, já vimos que
é para proteger as expectativas do destinatário da proposta, e o destinatário da proposta não
tem expectativa nenhuma se antes de receber a proposta, já tiver recebido a revogação. Mas a
lei também permite que o efeito revogatório opere num caso em que a revogação, ao invés de
chegar antes, basta que chegue ao mesmo tempo.

Tese do professor Heinrich Horster

Ele foca a seguinte situação:

Imaginemos que a carta com a proposta chega no dia 2 ao destino, a carta com a revogação
chega no dia 3, mas o destinatário estava de férias e só regressa no dia 4 e só nesse dia é que
abre a carta.

A questão que se coloca, é a de saber, se se deve entender ou não, que aqui a revogação
operou.

Segundo o professor Horster, apesar de a revogação ter chegado depois da proposta, como o
que está em causa é o problema da tutela das expectativas do destinatário, aqui neste caso
apesar de a revogação ter chegado posteriormente, como foi conhecida ao mesmo tempo, o
professor Horster acha que neste caso a revogação é eficaz apesar de ter chegado depois.

Ela baseia-se em que é eficaz, por causa daquilo que ele considera ser o elemento teleológico
do artigo 230, ou seja, segundo ele, a razão de ser do artigo 230 é de proteger as expectativas
do destinatário da proposta e evitar que ele seja frustrado nas suas expectativas, e neste caso,
se se provar que ele tomou conhecimento das duas declarações na mesma altura, não faz
sentido não aceitar a revogação só porque chegou depois, mas é verdade que chegou depois,
mas que ambas foram conhecidas ao mesmo tempo, sendo que, segundo ele, esta revogação é
eficaz.

Em relação a esta posição, temos que nos recordar do elemento teleológico do artigo 224 e
qual é a razão de ser, para que a lei considere eficaz as declarações, não quando são
conhecidas, mas quando são recebidas, porque para a nossa lei o que conta não é o
conhecimento, o que conta é a recepção e a lei optou pela recepção por causa das
dificuldades quase intransponíveis para provar o momento do conhecimento.

ARTIGO 230 nº 3 – Revogação da Oferta ao publico

Artigo 230 nº 3 “a revogação da proposta, quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja
feita na forma de oferta ou em forma equivalente”.

A proposta ao público ou oferta ao público é uma proposta dirigida a pessoas indeterminadas,


e por isso essa proposta é uma declaração não recipienda ou não recepetícia, porque se aplica
a segunda parte do nº 1 do artigo 224 e quando a proposta se dirige ao público, ela não tem
um destinatário determinado e para ser eficaz não tem que ser recebida, basta que tenha sido
emitida.

Serafim Cortizo 20100059 Página 157

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Quando estamos perante uma oferta ao público, a regra que se retira do artigo 230 nº 3 é que,
quando estamos perante uma oferta ao público, em princípio a oferta ao público é sempre
revogável, prevalecendo a regra da revogabilidade, ou seja, só será irrevogável se a pessoa no
anúncio tiver dito que se compromete a não revogar a proposta.

Na oferta ao publico, o legislador prescindiu da regra da irrevogabilidade por uma razão muito
lógica, porque já vimos que a razão de ser da regra da irrevogabilidade é proteger as legitimas
expectativas do destinatário, mas as expectativas do destinatário na proposta ao público são
bem diferentes, quando o destinatário de uma proposta concreta a que só a ele é dirigida, do
que quando ele é uma pessoa do publico que vê um anúncio num jornal e a lei entende que
ninguém cria com, a oferta ao publico demasiadas expectativas dignas de protecção e por isso,
a lei admite que o proponente na oferta ao publico, possa livremente revogar a oferta (artigo
230 nº 3).

Mas também aqui há um limite temporal que é o de nunca se poder revogar uma proposta a
partir do momento em que o contrato se formou.

Na revogação de uma oferta ao público nº 3 do artigo 230 diz que “a revogação da proposta,
quando dirigida ao público, é eficaz, desde que seja feita na forma de oferta ou em forma
equivalente”, e portanto, o normal é colocar uma proposta num certo jornal e colocar a
revogação no mesmo jornal em forma igual ou equivalente com públicos-alvos que sejam os
mesmos destinatários.

Caso prático

Em Portugal uma proposta de contrato é revogável?

A resposta é depende, se for uma oferta ao publico é revogável desde que a rescisão seja
anterior á formação do contrato, mas se for uma proposta feita a pessoa determinada também
é revogável se houver uma clausula de revogabilidade, isto é, se o proponente quando fez a
proposta tiver advertido o destinatário que se reservava o direito de revogar e aqui ele só
poderá revogar se a revogação for eficaz antes de uma eventual aceitação, mas se ele não
colocou uma clausula de revogabilidade, mesmo assim poderá revogar, mas vai ter que
acelerar os acontecimentos de tal modo em que consiga que a revogação chegue ao poder e
ao conhecimento do destinatário, antes ou ao mesmo tempo que esse destinatário receberá a
própria proposta.

Aula 24

ARTIGO 234 (Excepções á Primeira parte do nº 1 do Artigo 224 - A aceitação é


eficaz ainda antes de chagar ao proponente).
Neste artigo a lei prevê que uma aceitação possa ser eficaz, ainda antes de chegar ao poder,
ou de ser conhecida pelo proponente e no artigo 234 a lei é uma excepção à primeira parte do
nº 1 do artigo 224.

Nos termos do nº 1 do artigo 224, em principio, a aceitação é eficaz quando chega ao seu
destinatário que é o proponente, ou é dele conhecida, mas o artigo 234 vem-nos dizer que:

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“Quando a proposta, a própria natureza ou circunstancias do negócio, ou os usos tornem


dispensável a declaração de aceitação, tem-se o contrato por concluído logo que a conduta
da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta”.

Este artigo 234 tem que ser interpretado com alguma cautela, pois desde logo tem uma
epigrafe enganosa ao dizer “dispensa da declaração de aceitação” e quem se baseia apenas
na epigrafe, considerará que existem situações em que a lei dispensa á pessoa que recebeu
uma proposta, da necessidade de aceitar e seria um caso em que aparentemente formar-se-ia
um contrato sem haver uma aceitação, mas isso seria uma visão errada porque a epigrafe é
enganosa, porque na realidade, lendo a epigrafe do artigo 234, constatamos que no artigo 234
há efectivamente uma aceitação, pois não se pode dizer que neste artigo se prescinde da
necessidade de haver uma aceitação de uma proposta para que o contrato se forme.

O artigo 234 diz que “quando a proposta, a própria natureza ou circunstancias do negócio, ou
os usos tornem dispensável a declaração de aceitação e tem-se o contrato por concluído logo
que a conduta da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta ”, ou seja, conclui-se
que para que o contrato se forme, é preciso que a outra parte, que é o destinatário da
proposta, mostre a intenção de aceitar, e uma conduta que mostra a intenção de aceitar,
chama-se precisamente aceitação, e portanto, lendo a parte final do artigo 234, tem
efectivamente que haver uma conduta reveladora da vontade de aceitar.

1) Aquilo que a lei dispensa neste artigo não é a necessidade de haver uma aceitação,
porque lendo a parte final do artigo 234, conclui-se que só se forma contrato se
houver uma declaração que possa ser interpretada como sendo um aceitação.
2) A lei dispensa e diz-se aqui que “tem-se o contrato por concluído logo que a conduta
da outra parte mostre a intenção de aceitar a proposta”.

Se nos recordarmos das situações normais, o contrato considera-se formado é quando essa
manifestação da vontade de aceitar é recebida ou conhecida pelo destinatário, que é o
proponente, e aplicando o artigo 224 nº 1 primeira parte, o que conta para se considerar o
contrato formado, não é o momento em que é emitida a aceitação, mas no momento em que
ela é recebida ou conhecida, e portanto, num vulgar contrato, por exemplo, se alguém me
escreve uma carta a perguntar se eu quero comprar um quadro por X e eu escrevo outra carta
a dizer que aceito, é verdade que quando eu ponho a minha carta no correio a dizer que
aceito, pode-se dizer que há uma conduta da minha parte que revela a vontade de aceitar,
mas não é nesse momento que o contrato se forma, é sim no momento em que a carta chega
á caixa do correio do destinatário, (artigo 224 nº 1 primeira parte).

Normalmente, o contrato forma-se, não é quando o destinatário da proposta revela a vontade


de aceitar, mas é quando essa manifestação chega ao poder ou ao conhecimento.

Então a originalidade do artigo 234, é que se o contrato, como se diz aqui na lei “se tem por
concluído logo que a conduta mostre a intenção de aceitar” isto quer dizer que a lei está aqui
a dispensar o caracter recipienda ou recepetícia da aceitação, e o que a lei está aqui a dizer, é
que nestas situações do artigo 234, basta o destinatário da proposta ter uma conduta
reveladora de que quer aceitar para que imediatamente o contrato se forme.

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E portanto, o que há aqui é uma aceleração na formação do contrato, pois normalmente o


contrato formar-se-ia quando a conduta reveladora da vontade de aceitar fosse recebida ou
conhecida pelo proponente, e provavelmente seria só no momento da recepção ou do
conhecimento, mas aqui considera-se determinante o momento em que a conduta tem lugar e
não no momento em que chega ao destino, e portanto, é de entender que aqui o que o
preceito pretende dispensar é o caracter recipiendo ou recepetício da aceitação.

E nestes casos a aceitação é eficaz quando é emitida e não quando é recebida.

Mas a lei diz que isto só é possível “quando a proposta, a própria natureza ou circunstâncias
do negócio, ou os usos tornem dispensável a declaração de aceitação”.

Exemplo:

Este exemplo era dado pelos professores Pires de Lima e Antunes Varela no Código Civil
Anotado.

Imaginemos que uma pessoa era proprietária de um ou vários livros, e pretende que esses
livros sejam encadernados e dirige-se a um encadernador fazendo uma proposta de contrato,
no sentido de aqueles livros virem a ser encadernados.

Acontece que a pessoa, o proprietário dos livros, não se limita a escrever uma carta ao
encadernador a manifestar uma vontade que os livros sejam encadernados, mas a
acompanhar a carta vão os próprios livros.

Eu sem saber se o outro, vai aceitar ou não, escrevo-lhe uma carta fazendo-lhe uma proposta
em que ele celebre comigo um contrato pelo qual se vinculará a encadernar os meus livros,
mas a acompanhar a minha proposta e os próprios livros.

Num caso destes, segundo estes autores, era de entender que ao mandar os próprios livros,
esperava uma resposta positiva, e no fundo o que eu estou a dizer á outra pessoa, na prática é,
se por acaso concordares, põe imediatamente mãos á obra, e portanto, segundo Pires de Lima
e Antunes Varela, num caso destes em que eu fiz uma posposta para que os meus livros
fossem encadernados, mas eu mandei ao mesmo tempo a proposta e os próprios livros, para
que o encadernador disse que estava combinado, num caso desses, o contrato poder-se-ia
formar no momento em que o encadernador tivesse uma conduta que fosse reveladora da sua
vontade de aceitar, e uma conduta reveladora da vontade de aceitar, era ele pôr-se a
encadernar os livros, e portanto, segundo Pires de Lima e Antunes Varela, num exemplo
destes, quando o encadernador começasse a encadernar os livros, mesmo sem me ter
respondido, o facto de ele se por a encadernar os livros, é uma conduta que, tacitamente e
obviamente, revela uma vontade de aceitar a minha proposta e então neste caso, seria um
caso em que um contrato se formaria no momento em que o encadernador, começasse a
praticar actos relativamente aos livros que fossem interpretados como sendo uma
manifestação da vontade de aceitar, e aí o contrato formava-se logo nesse momento, ou seja,
no momento em que eu o proponente, ainda não fazia a mínima ideia de que o outro
tencionava aceitar, porque não me respondeu a dizer que sim, nem eu ainda tomei
conhecimento desses actos materiais de encadernação do livro.

Serafim Cortizo 20100059 Página 160

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O que legitimará a aplicação deste artigo, será o facto de se dizer que as circunstâncias da
proposta que já era acompanhada pelo objecto de execução do contrato, e ao mandar
imediatamente o objecto, estou claramente a dizer ao outro, que se aceita, pode logo avançar.

Então a originalidade desta norma, é o momento da formação do contrato, pois não é


quando a aceitação é recebida ou conhecida, mas sim quando há conduta reveladora da
vontade de aceitar.

Há autores, como por exemplo, Galvão Telles que diziam que a razão de ser desta norma era
apenas a de permitir uma aceitação tácita e que o objectivo da norma é permitir aceitações
tácitas, e é verdade que o tipo de aceitação que aqui se está a imaginar, na maior parte dos
casos é uma aceitação tácita, mas se a razão de ser desta norma neste artigo, fosse permitir
aceitações tácitas, esta artigo seria desnecessário porque já vimos que no artigo 217 que diz
que as declarações podem ser expressas ou tácitas, e por isso não devemos dizer que a razão
de ser do artigo 234 é permitir uma aceitação tácita, nem muito menos devemos dizer que a
razão de ser do artigo 234 é permitir aceitações tácitas, porque para isso já existe o artigo 217
e também não podemos dizer que o artigo 234 permite que se forme um contrato sem haver
aceitação, porque ao ler o artigo, vai ter que haver uma conduta reveladora da vontade de
aceitar, e uma conduta reveladora da vontade de aceitar chama-se aceitação, e portanto, a
epigrafe é enganosa e a razão de ser do artigo 234, tem a ver com o momento da formação do
contrato ao dizer-se “tem-se o contrato por concluído logo que a conduta da outra parte
mostre a intenção de aceitar a proposta” e este logo que é revelador em como que há uma
aceleração do contrato.

Caso prático

A proposta e a aceitação são declarações recipiendas ou não recipiendas?

A proposta é recipienda quando tem um destinatário determinado, mas se tiver destinatários


indeterminados, como a “oferta ao público” é não recipienda, ou seja, é eficaz mesmo antes
de ser recebida.

Já quanto á aceitação, em principio, a aceitação é sempre uma declaração recipienda, porque


a a aceitação tem sempre um destinatário determinado que é o proponente, e regra geral
aplica-se á aceitação o artigo 224 nº 1 primeira parte, mas excepcionalmente, a aceitação,
apesar de ter um destinatário determinado, pode ser considerada não recipienda ou não
recepetícia naqueles casos em que no artigo 234 não precisa de ser recebida para ser eficaz,
pois basta que seja emitida.

ARTIGO 231 – Morte ou incapacidade do proponente ou do destinatário.


Neste caso há que distinguir as situações do nº 1 do nº 2 do artigo 231.

Artigo 231 nº 1 “não obsta á conclusão do contrato a morte ou incapacidade do proponente,


excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a sua vontade” artigo 231 nº
2 “a morte ou incapacidade do destinatário determina a ineficácia da proposta”.

A lei, no artigo 231 nº 1 está a prever a possibilidade de uma pessoa fazer uma proposta
contratual, e antes do contrato se formar, e já sabemos que o contrato se forma com a

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recepção da aceitação, e depois de ter emitido a proposta, mas antes de ter recebido a
aceitação, e durante o período da formação do contrato, se entretanto esse proponente
morre, ou esse proponente fica juridicamente incapaz, mas está-se a pensar numa morte
superveniente á emissão da proposta ou numa incapacidade jurídica superveniente à emissão
da proposta.

O artigo 231 nº 1 não se aplica se aquele que faz a proposta, se na altura em que a faz, já é
incapaz, e se aquele que faz a proposta é incapaz, o que se aplica são as regras da invalidade
do negócio jurídico, e temos que ver se é uma incapacidade de gozo, ou de exercício para
discutir se é um negócio nulo ou anulável, pois aqui não se está a pensar numa incapacidade
originária, está neste caso a pensar, numa incapacidade de uma pessoa que quando emite a
proposta é juridicamente capaz, mas que supervenientemente se torna incapaz, porque quer
esta morte, quer esta incapacidade, têm que ser posteriores á emissão da proposta, mas tem
que ser anteriores à formação do contrato (durante o período de formação do contrato) e
posteriores á recepção da proposta.

Na pratica o nº 1 do artigo 231 vem dizer que se a morte do proponente não obsta á formação
do contrato, isso quer dizer que se é feita um a proposta por alguém, e essa pessoa entretanto
morre, e isso não impede que se possa formar contrato, mas para se formar contrato vai ter
que haver uma aceitação, como é evidente, o que a lei está a dizer é que pelo facto de o
proponente morrer, não impede que o destinatário da proposta aceite a proposta, e a prova
em não impede que se aceite a proposta, é quando este artigo diz que “a morte não obsta à
formação do contrato”, sendo que este contrato vai-se formar com os herdeiros do
proponente, mas este contrato não se celebrará com os herdeiros se estes repudiarem a
herança.

Este artigo também se aplica á incapacidade, e como eu disse, está a pensar numa
incapacidade superveniente, porque se for uma incapacidade que já existe no momento da
proposta, se se vier a formar um contrato, haverá que aplicar as regras sobre as incapacidades
e será um problema sobre a validade ou de invalidade, se o proponente já era incapaz no
momento em que fez a proposta, mas neste caso está-se a pensar numa incapacidade
posterior á proposta de contrato.

Quando a lei diz que essa morte ou incapacidade não impede a formação do contrato, quer
dizer que o destinatário da proposta pode aceitar a proposta mesmo sabendo que o
proponente morreu, ou eventualmente, não sabendo que o proponente morreu, mas a lei diz
que “não obsta, excepto se houver fundamento para presumir que outra teria sido a sua
vontade”, e portanto, há casos em que a morte ou a incapacidade obstam mesmo à formação
do contrato.

Exemplo:

Imaginemos que eu tenho uma doença muito grave e sei que posso morrer muito em breve e
posso fazer uma proposta a alguém, mas digo na proposta que se eu entretanto morrer, a

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proposta fica sem efeito. Neste caso há fundamento para presumir que outra teria sido a
vontade do proponente.

Ou então, se estiver a decorrer contra mim uma acção de interdição ou de inabilitação, já


existem limitações ao negócio a celebrar tendo em conta os artigos 149 e 150, mas de
qualquer modo, eu posso dizer á cautela, que se eu vier a ser declarado interdito ou
inabilitado, a minha proposta fica mesmo sem efeito e neste caso o contrato nem sequer se
forma.

No artigo 231 nº 1, até se consagra uma solução parecida com o artigo 226 nº 1, onde a
diferença é que, no artigo 226 nº 1 aplica-se às declarações negociais em geral, pois pelo
modo em como está redigido, a sua abrangência aplica-se a qualquer declaração negocial
em que o declarante morre ou fica incapaz depois de emitir a declaração. O artigo 231 nº 1 é
uma norma especial para o caso em que a declaração negocial é uma proposta, e o que
podemos dizer, é que se não existisse o artigo 231 nº 1, no caso de o proponente morrer de
pois de fazer a proposta ou tornar-se incapaz depois de fazer a proposta, aplicar-se-ia o
artigo 226 nº 1, pois este artigo tem amplitude suficiente para se aplicar a uma proposta, no
entanto, como existe uma norma especial no artigo 231 nº 1, o que podemos dizer é que o
artigo 226 nº 1 se aplica a toda e qualquer declaração negocial que não seja proposta
contratual.

E quando há uma regra especial (artigo 231 nº 1) ela prevalece sobre a regra geral.

Acerca do artigo 231 nº 1, a generalidade da doutrina é unânime com o que eu acabei de dizer,
mas o professor Heinrich Horster, a propósito do artigo 231 nº 1, levanta algumas questões
que interessa aqui abordar, porque ele parte da letra da lei e o artigo 231 nº 1 diz claramente
que o facto de o proponente morrer, depois de ter emitido a proposta e antes de ter havido
aceitação, e não há dúvida que resulta do texto legal, que isso não impede o destinatário da
proposta de a aceitar e formar-se-á contrato, mas o professor Horster levanta uma questão ao
dizer que para se formar contrato é preciso que a aceitação seja eficaz, e segundo ele, a
aceitação tem um destinatário determinado, pois se a declaração for dirigida para a casa do
proponente que já morreu, existe uma impossibilidade prática de a declaração ser recebida, e
então diz o professor Horster que se o contrato se vai formar com os herdeiros, a aceitação
teria que ser dirigida aos herdeiros, sendo que esta posição não tem o apoio do resto da
doutrina.

A aceitarmos esta tese, obviamente que reduzir-se-ia á posição ínfima os casos da aplicação
dos casos do artigo 231 nº 1, porque na esmagadora maioria dos casos, ou o aceitante não
fazia a mínima ideia, ou ignorava que o proponente tinha morrido, e o mais plausível é que
mande a carta para o domicilio do morto.

Ou mesmo que o destinatário da resposta saiba que o proponente morreu, mas aqui levantar-
se-ia o problema de saber quem são os herdeiros do proponente, e neste caso, ou não se
dirigia a eles porque não sabia que o proponente tinha morrido, ou mesmo sabendo eu o
proponente morreu, não teria tempo para averiguar quem eram todos os herdeiros, e segundo
o professor Horster, se não for possível dirigir a aceitação a todos os herdeiros, que ele próprio
reconhece que não é plausível que isso aconteça, ele entende que só é viável a aplicação do

Serafim Cortizo 20100059 Página 163

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artigo 231 nº 1, naqueles casos em que a aceitação para ser eficaz não precisa de ser
recebida por ninguém, que são os casos do artigo 234, onde apenas basta a manifestação da
vontade de aceitar e não tem que ser recebida por ninguém, não havendo o problema de a
mesma ser recebida pelo morto ou pelos herdeiros, e para ele é um caso em que se aplica o
artigo 234, e então não há obstáculos á aplicação do artigo 231 nº 1, ou se for um caso em que
se aplique o artigo 234, só se pode aplicar o artigo 231 nº 1 se o destinatário da proposta ao
aceitar, se dirigir a todos os herdeiros do proponente, o que por um lado é difícil, por um lado,
porque até pode ignorar que o proponente morreu, por outro lado, pode saber que o
proponente morreu mas não fazer a mínima ideia de quem são os herdeiros, e depois pode
saber quem são os herdeiros, mas nem sequer saber a morada, e na prática, para o professor
Horster aplica-se o artigo 231 nº 1 aos casos do artigo 234, sendo de aplicação muito insipiente
nos demais casos.

Exemplo:

Imaginemos que eu recebi uma proposta de contrato de uma pessoa que morreu, e tomo
conhecimento que o proponente morreu ainda antes de eu ter respondido a dizer que aceito.

Em primeiro lugar, mandava resposta para casa do morto, ou seja, a morada que me foi
indicada do proponente, mas á cautela, e partindo do principio que naquele caso a minha
aceitação não se enquadra nos casos do artigo 234, e sabendo que o proponente morreu, e
não sabendo quem são os herdeiros, eu ao mesmo tempo que mandava a resposta para a casa
do morto, talvez se eu estivesse muito empenhado no contrato, tentaria de prevalecer-me no
disposto no artigo 225, ou seja, o artigo 225 prevê que quando uma pessoa se quer dirigir a
pessoa desconhecida, ou a pessoa cujo paradeiro ignora, diz o artigo 225 que quando o
declarante se quer dirigir a uma pessoa que não sabe quem é, ou não sabe onde está, o
declarante pode-se socorrer de um anúncio público publicado num jornal da sua própria área
de residência.

Então se alguém me faz uma proposta de contrato, e eu sei que a pessoa morreu ainda antes
de eu responder, mas também sei que o artigo 231 nº 1 me permite aceitar, então eu
mandarei a resposta para casa do falecido, e se eu não souber quem são os herdeiros, nem
souber a sua morada e nem quantos são, e se eu estivesse muito empenhado no contrato,
talvez conjugasse a resposta para casa do morto, com o recurso ao artigo 225, e punha um
anúncio num jornal da minha zona de residência dirigindo-me aos herdeiros do falecido
dizendo que aceito a proposta que me foi feita.

Mas nós estávamos a ver até agora, um cenário em que quem morria ou ficava incapaz era o
proponente (artigo 231 nº 1), e que certa pessoa viva e capaz fazia uma determinada proposta
de contrato, e essa pessoa que fez a proposta quando estava viva e capaz, entretanto morria
ou tornava-se incapaz ainda antes de haver contrato e antes de haver aceitação.

Mas a morte e a incapacidade também podem calhar ao destinatário da proposta, que pode
morrer antes de haver contrato e entretanto pode-se tornar incapaz.

Serafim Cortizo 20100059 Página 164

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Exemplo:

Imaginemos que eu, hoje 2ª feira, escrevo uma carta a uma pessoa com uma proposta de
contrato, e imaginem que temos uma carta que será recebida na 6ª feira, nada impede que
essa pessoa morra amanhã, e até pode acontecer que quando a minha carta chegar ao
destino, o destinatário já tenha morrido.

Ou até pode acontecer que eu enviei a tal carta a uma pessoa, que hoje é capaz, mas que
amanhã estará interdito ou inabilitado, e quando receber a minha carta já estará interdito ou
inabilitado.

Então aqui neste caso aplica-se o nº 2 do artigo 231, mas aqui é preciso ter cuidado porque a
solução não é equiparável á situação do nº 1, pois não vai dar ao mesmo, ser o proponente a
morrer ou ser o destinatário da proposta a morrer, e também não vai dar ao mesmo ser o
proponente a ficar incapaz, ou o destinatário da resposta a ficar incapaz, porque,
curiosamente, e se eu fizer uma proposta de contrato a alguém, e se essa pessoa morrer, os
seus herdeiros não podem aceitar no lugar do falecido, pois o nº 2 do artigo 231 é bem claro
ao dizer que “a morte ou incapacidade do destinatário determina a ineficácia da proposta”, e
se a morte ou incapacidade do destinatário determina a ineficácia da proposta, quer dizer que
a posposta se extingue, e ao extinguir-se não pode ser aceite, porque se ela se torna ineficaz,
de nada serviria aos herdeiros do destinatário da proposta a virem aceitá-la, e de nada serviria
ao tutor da pessoa que foi declarada incapaz de vir aceitá-la no lugar do interdito.

ARTIGO 231 nº 2
Mas para se distinguir o nº 2 do artigo 231, temos que distinguir vários momentos, pois há
vários momentos que não levantam duvidas, mas há um que levanta várias dúvidas.

Vamos distinguir os vários cenários do artigo 231 nº 2.

Caso prático

A escreve a B uma carta com uma proposta de contrato, e imaginemos que;

1) B morre ou fica incapaz antes de receber a carta.


2) B morre ou fica incapaz, já depois de ter recebido a carta, mas antes de ter emitido
uma aceitação.
3) B morre ou fica incapaz, já depois de ter emitido a sua aceitação, mas antes de esta ter
sido recebida pelo proponente A.
4) B morre ou fica incapaz, já depois de ter emitido a sua aceitação e desta ter sido
recebida pelo proponente A.

Cenário 4

Na última hipótese, esta está claramente fora do artigo 231 nº 2, e que neste caso não se pode
aplicar a esta hipótese, porque nesta hipótese, a morte ou a incapacidade do aceitante é
posterior á própria formação do contrato, pois este artigo está sempre a pensar em mortes e
em incapacidades que surgem durante a formação do contrato, pois se o B morre já depois de

Serafim Cortizo 20100059 Página 165

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haver contrato, e depois de a sua aceitação ter sido recebida, esta hipótese está fora do
âmbito do artigo 231 nº 2.

Cenário 1

Na primeira hipótese, não há duvida nenhuma que o primeiro cenário está abrangido no nº 2
do artigo 231, que é quando o destinatário morria ou ficava incapaz, ainda antes de ter
recebido a proposta, e quando isso acontece, claramente que a proposta fica ineficaz, e
portanto, se quando a proposta chega ao destino, o destinatário já morreu ou se já se tornou
incapaz, não há hipótese nenhuma de a aceitar porque a proposta torna-se ineficaz.

Cenário 2

Na segunda hipótese, também não há duvida nenhuma para a doutrina em que se aplica o nº 2
do artigo 231, ou seja, se a morte ou a incapacidade do destinatário, ocorrerem já depois de
ele ter recebido a proposta, mas antes de ter respondido, ou seja, o destinatário, morre ou fica
incapaz, já depois de ter recebido a proposta, mas antes de ter respondido ou emitido uma
aceitação.

Cenário 3

Na terceira hipótese, que é a situação que pode ser mais duvidosa, ou seja, é um cenário em
que o destinatário da proposta, está vivo e está capaz quando recebe a proposta, está vivo e
está capaz quando responde a dizer que aceita, mas morre naquela intervalo de tempo que
medeia entre a emissão da aceitação e a recepção da aceitação, e a dúvida é saber se este
caso está abrangido pelo nº 2 do artigo 231.

A doutrina não se tem pronunciado muito sobre o assunto, mas há um exemplo um pouco
dúbio, dos professores Pires de Lima e Antunes Varela em que esta situação estaria no nº 2 do
artigo 231.

Pessoalmente, acho que não porque na situação do nº 2 do artigo 231, estamos perante um
caso em que o próprio destinatário da proposta, pois no fundo, já não há apenas uma
proposta pois já foi emitida uma aceitação, e temos um individuo que aceita e que enquanto a
sua aceitação se dirige para o destino (para o proponente), ele, entretanto, morre ou fica
incapaz.

Na minha opinião a este caso deve-se aplicar o nº 1 do artigo 226 que é, quando o declarante
morre ou fica incapaz depois de emitir a sua declaração, e neste exemplo, o B quando morre é
o declarante e já fez a sua declaração.

O B recebeu a proposta, estava vivo e capaz, quando respondeu estava vivo e capaz, e a morte
ou a incapacidade surgem no período de tempo, que mediou entre o momento em que ele
emitiu a aceitação e o momento em que a aceitação chega ao destino, e este caso, parece-me
enquadrar-se no nº 1 do artigo 226, que prevê as situações em que alguém faz uma declaração
negocial e morre ou fica incapaz, entre o momento em que emitiu a declaração e o momento
em que ela chega ao seu destino, e portanto, a este cenário eu não lhe aplicaria o nº 1 do
artigo 231.

Serafim Cortizo 20100059 Página 166

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Os argumentos pelos quais não se aplicaria o nº 1 do artigo 231 seriam;

a) O primeiro argumento seria a aplicação do nº 1 do artigo 226.


b) O segundo argumento seria dizer que no nº 2 do artigo 231, quando se diz que a morte
ou a incapacidade do destinatário determina a ineficácia da proposta.

Parece estar-se a pressupor, que naquele momento ainda só há uma declaração que é a
proposta, porque se se quisesse abranger o terceiro cenário, então seria mais l lógico dizer que
a morte e a incapacidade do destinatário determinam a ineficácia da sua aceitação, e o facto
de dizer que determina a ineficácia da proposta, não é um argumento muito sólido só por si,
mas um argumento no sentido, em que a lei está a pensar num cenário em que a única
declaração que até ao momento foi emitida, é apenas a proposta.

E a situação em que há apenas proposta, é no cenário 1 e no cenário 2, porque no cenário 3


quando a morte ou a incapacidade surge, já há uma outra declaração que é a própria
aceitação.

Mas vendo a questão por outra óptica

Temos sempre que nos interrogar, porque é que há uma grande discrepância entre duas
normas, e temos que pensar, porque é que a morte do proponente não impede que se forme
contrato? E porque é que a morte do destinatário há-de impedir?

Aparentemente e até por uma questão de simetria devia dizer-se;

Se o proponente morre o contrato forma-se com os herdeiros, e então, se o destinatário


morrer, o contrato forma-se com os herdeiros, qual é o problema? E porque é que lei tem uma
solução diferente?

Mas é porque há aqui uma razão de ser, pois se a lei dissesse que, se a morte do destinatário
não impediria a formação do contrato, podia-se criar uma situação de indefinição, havia
sempre um prazo para aceitar, apareceriam uns indivíduos que diziam que eram herdeiros a
dizer que aceitavam, mas será que seriam mesmo os herdeiros? Ou seja, poderia haver uma
situação de dúvida em saber, se se tinha formado ou não o contrato, e só quando se decidisse
quem eram os herdeiros, pois podia demorar anos, é que se poderia saber se as declarações
de aceitação, correspondiam ou não á formação de um contrato e então a lei entendeu que
quando é o destinatário que morre, não convém que dure muito tempo a duvida sobre se o
contrato se formou, porque pode surgir a duvida, se quem aceita tinha poderes para aceitar, e
por isso há uma explicação para a lei ter um tratamento diferente do nº 1 e no nº 2.

Aula 25

FORMAÇÃO DOS CONTRATOS (Conclusão)

ACEITAÇÃO – Artigo 235


Já vimos que existe um prazo para aceitar como vem no artigo 228, que ao prever os prazos de
duração da proposta, está na prática a prever os prazos para a própria aceitação.

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Mas imaginemos que alguém aceita uma certa proposta de contrato, e quem aceita a proposta
de contrato, imaginemos que muda de ideias, e que o aceitante quer revogar a aceitação, ou
então, imaginem que o destinatário da proposta, respondeu a dizer que não queria e que
rejeitava a proposta, e muda de ideias e afinal quer aceitar a proposta.

Essas situações em que aceitou, mas depois já não quer, ou em que rejeitou e afinal até quer,
e esses casos vêm tratados no artigo 235 do Código Civil.

Artigo 235 nº 2 “a aceitação pode ser revogada mediante declaração que ao mesmo tempo, ou
antes dela, chegue ao poder do proponente ou seja dele conhecida”.

No nº 2 do artigo 235, está-se a imaginar que determinada pessoa a quem foi feita uma
proposta de contrato começou por responder a dizer que aceitava, e entretanto mudou de
ideias e pretende revogar a aceitação.

A lei permite que a aceitação seja revogada, desde que a revogação da aceitação, chegue ao
proponente, antes, ou ao mesmo tempo do que a própria aceitação, e o nº 2 do artigo 235
consagra um regime parecido com o do nº 2 do artigo 230, e já vimos que no nº 2 do artigo
230 situações em que é possível revogar a proposta, desde que a revogação da proposta
chegue ao destinatário, antes ou ao mesmo tempo que a proposta.

Aqui no nº 2 do artigo 235 é exactamente o mesmo mecanismo, só que aqui está em causa a
revogação da aceitação que pode ser revogada, desde que a declaração de revogação chegue
ao proponente (destinatário da aceitação) antes da aceitação, ou pelo menos ao mesmo
tempo que a aceitação.

Uma coisa é certa, se a aceitação já tiver chegado ao proponente, ela já não pode ser
revogada, porque a partir do momento em que a aceitação chegou ao proponente, o contrato
formou-se, e permitir a revogação da aceitação, equivaleria a permitir a rescisão unilateral do
contrato, portanto, uma vez formado o contrato, já não é possível revogar a aceitação, e
portanto, quem quer revogar a aceitação tem que ser suficientemente rápido para que a
revogação chegue antes da aceitação, ou que pelo menos, chegue ao mesmo tempo (artigo
235 nº 2).

Agora imaginemos que a situação é diferente;

A fez uma proposta a B, e B respondeu a dizer que não aceitava e rejeitou a proposta, mas
entretanto, muda de ideias e afinal quer aceitar, no fundo ele quer revogar a rejeição.

Esta situação está prevista no artigo 235 nº 1 que diz que “se o destinatário rejeitar a
proposta, mas depois a aceitar, prevalece a aceitação, desde que esta chegue ao poder do
proponente, ou seja dele conhecida ao mesmo tempo que a rejeição, ou antes dela”.

E neste caso, é exactamente a mesma lógica e o mesmo mecanismo do nº 2 do artigo 235 ou


que o nº 2 do artigo 230, pois também aqui respondeu a dizer que rejeitava, mas muda de
ideias, e pode mudar de ideias, desde que consiga que a aceitação chegue ao poder do
proponente, antes de o proponente receber a rejeição da aceitação (artigo 235 nº 1).

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Já vimos que quem aceita tem que se dirigir á pessoa que fez a proposta, e como é logico, o
aceitante dirige-se sempre ao propoente, e por isso é que nós dizemos que a aceitação tem
um destinatário determinado que é o proponente, por isso é que na maioria esmagadora dos
casos, a aceitação é eficaz quando é recebida pelo proponente porque se aplica o artigo 224 nº
1 (primeira parte) pois sendo a aceitação uma declaração com um destinatário determinado,
aplica-se a primeira parte do nº 1 do artigo 224 que é uma declaração recipienda ou
recepetícia e torna-se perfeita e eficaz quando é recebida ou conhecida do destinatário.

No entanto recordo que vimos que, nas situações do artigo 234, a lei prescinde do carácter
recepetício ou recipiendo da aceitação e neste caso, a aceitação é eficaz, não quando é
recebida ou conhecida, mas quando se verifica uma conduta reveladora da vontade de aceitar,
não é preciso que haja um conhecimento ou recepção por parte do destinatário, ou seja, pelo
proponente, mas o artigo 234 é uma excepção, a regra está no artigo 224 nº 1 (primeira parte).

Aceitação significa que o destinatário da proposta concorda com ela, e a aceitação pressupõe
anuência, concordância, pois não podemos falar em aceitação se a pessoa que responde ao
proponente discorda das condições apresentadas pelo proponente, e como é evidente, a
aceitação significa um “sim”, e portanto, tem que haver concordância entre o que é dito na
aceitação e aquilo que é dito na proposta, e por isso é de entender que, se alguém disser que
aceita uma proposta, mas na realidade quer introduzir na proposta modificações e
aditamentos, restrições que por muito insignificantes que sejam, se aquele a quem foi dirigida
a proposta vier dizer que aceita, mas na realidade quer introduzir aditamentos, modificações
ou restrições, na prática temos que concluir que ele não está a concordar plenamente com a
proposta, visto que lhe está a acrescentar algo ou que lhe está a retirar algo, ou a alterar algo,
e por isso é que o artigo 233 nos diz que “a aceitação com aditamentos ou outras limitações,
importa a rejeição da proposta”.

Isto é importante, porque o que a lei está a dizer na prática é o seguinte:

Se a resposta for “sim, mas” esse “mas” estraga tudo, pois o “sim, mas ” quer dizer “não”,
aceitação é um “sim incondicional”.

Exemplo:

Imaginemos que alguém quer comprar um quadro meu por 10.000 €, tanto é rejeição eu dizer
não aceito, como é rejeição eu dizer que aceito por 100 mil euros, na realidade eu estou a
discordar daquilo que foi proposto, pois neste caso eu estou a utilizar a palavra “aceito”, mas
na realidade eu estou a rejeitar aquilo que me está ser proposto, e por isso percebe-se que o
artigo 233 diga que essa aceitação com aditamentos, limitações, restrições e modificações
importa a rejeição da proposta.

No entanto a lei diz na segunda parte do artigo 233 que se a modificação (introduzida pelo
destinatário da proposta que responde ao proponente) for suficientemente precisa equivale
a uma nova proposta.

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Exemplo:

Imaginemos que uma pessoa me faz uma proposta de compra de um quadro meu, dizendo
que me oferece pelo quadro 5.000 €, se eu responder que quero 5.200 €, ou se eu responder
aceito por 5.200 €, na realidade isto não é uma aceitação porque me propuseram 5.000 e eu
estou a responder 5.200 €, mas eu estou a introduzir á proposta inicial uma alteração
suficientemente precisa, pois estou a quantificar aquilo que eu quero, porque quando eu
respondo 5.200 €, estou simultaneamente a rejeitar a proposta, visto que introduzi uma
modificação, mas estou ao mesmo tempo a fazer uma contra proposta, ou seja, como
introduzi uma alteração precisa, a minha declaração com essa alteração precisa, equivale a
uma proposta, ou seja, transformo-me eu em proponente pois a minha declaração pode ser
interpretada como uma contra proposta e quando eu digo 5.200 €, se o outro aceitar, formou-
se um contrato, mas isso aconteceu porque eu introduzi uma alteração suficientemente
precisa.

O artigo 233 deve ser relacionado com o artigo 232, porque o artigo 232 diz-nos que “o
contrato não fica concluído enquanto as partes não houverem acordado em todas as
cláusulas pelas quais qualquer dela tenha julgado necessário o acordo”.

Neste caso, o que a lei nos está a dizer é que para se formar contrato tem que haver acordo
total, enquanto no período das negociações subsistir alguma divergência entre as partes, por
muito insignificante que seja ou pareça, é de entender que não há contrato formado, e como
eu disse, se a dada altura, até pode haver um contrato, em que na proposta inicial continha
100 clausulas, e há acordo sobre 99 dessas clausulas, e a única divergência é se a coisa vendida
é entregue às 13:00 ou às 14:00 horas, ou se o preço é 1 milhão, ou se é 1 milhão e 1 cêntimo,
enquanto subsistir uma divergência entre as partes não há contrato formado, pois o contrato
pressupõe acordo total.

Para se concluir que há acordo, porque as vontades e as declarações podem não coincidir,
para haver contrato, é de entender que a lei não está a exigir que as partes sejam
concordantes, porque até é claro que se forma um contrato apesar de as vontades serem
divergentes, mas o que interessa é que as declarações emitidas pelas partes sejam
congruentes, logo, forma-se contrato quando há consenso, mas se não ocorrer esse acordo e
se não houver esse consenso, não se forma um contrato e então diremos que há dissenso
(ausência de consenso).

CONTRATOS DE ADESÃO (Cláusulas contratuais gerais) Decreto-lei 446/85


A matéria das cláusulas contratuais gerais não vem regulada no Código Civil, mas vem regulada
num diploma anexo ao CC que é o decreto-lei 446/85 de 25 de Outubro.

Visto que este diploma regula as cláusulas contratuais gerais, interessa ter uma ideia do que é
que se entende por cláusulas contratuais gerais e por contratos de adesão.

A partir do século XIX a evolução da tecnologia permitiu que passasse a ser possível produzir
bens em massa (em série) e prestar bens e serviços, e consequentemente, para celebrar mutos
contratos de prestação de serviços.

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Esse fenómeno levou a que essas entidades passassem a ter tendência para celebrar como que
uma espécie de minuta de contrato, os seja, sabendo uma empresa que nos próximos tempos
poderá ter necessidade de celebrar centenas ou milhares de contratos iguais, é natural que
essa empresa tenda a uniformizar as suas próprias cláusulas contratuais.

A produção em massa deu lugar a uma contratação em massa, a contratação em massa,


tornou necessário que passassem a existir cláusulas pré determinadas destinadas a ser
inseridas em todos os contratos futuros daquela entidade.

Isto para dizer que a partir de finais do século XIX passou a ser frequente verificarem-se
contratos, cujo teor era igual a muitos outros contratos, porque no fundo eram cláusulas pré
determinadas por uma parte e que normalmente não eram passiveis de serem negociadas
pelos clientes.

O problema surgiu quando se começou a verificar que nestes contratos que eram celebrados
em série, e que o texto era pré elaborado pelo fornecedor e prestador de serviços, e que a
pessoa que elaborava os contratos tinha a tendência de incluir cláusulas injustas e abusivas
muito mais vantajosas para o prestador de serviços do que para os clientes.

E paralelamente ao fenómeno da existência de contratos standard e de cláusulas utilizadas


igualmente em múltiplos contratos, surgiu o fenómeno da constatação de que, cada vez mais
eram frequentes as cláusulas injustas e abusivas, e cada vez mais era frequente os clientes
nem sequer tinham conhecimento de certas cláusulas e então passou-se a falar de contratos
de adesão (1900).

Neste tipo de contratos (contratos de adesão) em que as clausulas são pré determinadas pela
pessoa que contrata em série, essas cláusulas são apresentadas aos clientes em termos que
não admitem discussão e neste tipo de contratos, a partir de determinada altura a sua
particulariedade, não era só as clausulas serem pré elaboradas, ou muitas vezes serem
injustas, mas havia também a particulariedade de quem as utilizava, não aceitar discuti-las.

E porque os clientes normalmente não podiam discutir as cláusulas, chamaram-se a estes


contratos, contratos de adesão, contratos de adesão porque existe liberdade contratual, mas
se quiserem um contrato, este tem que ser aceite em bloco, aceitando todas as cláusulas do
contrato.

As características para qualificar uma cláusula contratual como sendo uma cláusula
contratual geral, é preciso em primeiro lugar que observem três requisitos:

1) Estejamos perante clausulas pré determinadas (pré elaboradas).


2) São cláusulas gerais, tendo em vista ser utilizadas pelo seu utilizador numa
multiplicidade de contratos futuros daquele tipo.
3) Rigidez das cláusulas (que são clausulas relativamente ás quais não há nem liberdade
nem possibilidades de negociação).

Estamos a resolver um caso prático em que pretendemos saber se estamos em presença de


cláusulas contratuais gerais, logo teremos que demonstrar que eram cláusulas que já tinham
sido elaboradas previamente, depois vamos ter que demonstrar que tinham sido elaboradas

Serafim Cortizo 20100059 Página 171

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previamente para serem inseridas numa multiplicidade de contratos, e aqui é que está a ideia
de generalidade, e é preciso finalmente que se prove que são clausulas apresentadas aos
destinatários (clientes ou consumidores) em termos peremptórios em termos de que não se
admite discutir e negociar essas cláusulas que são apresentadas de forma rígida.

Artigo 1º da Lei das Cláusulas Contratuais Gerais:

“As cláusulas contratuais gerais elaboradas sem prévia negociação individual, que
proponentes ou destinatários indeterminados se limitem respectivamente a subscreve-la ou
a aceitar, regem-se pelo presente diploma”.

Nesta definição encontramos os ingredientes referidos há pouco, e na parte em que diz “se
limitem respectivamente a subscreve-la ou a aceitar, regem-se pelo presente diploma”,
mostra a ideia da rigidez, porque no fundo, a liberdade que têm é para dizer que “sim” e a
ideia da generalidade está no facto em que são cláusulas em que se dirigem a destinatários
indeterminados e neste caso, visam aplicar-se a um numero indeterminado de contratos.

E a ideia de pré elaboração está no facto de se dizer que “as cláusulas contratuais gerais
elaboradas sem prévia negociação”, e neste caso quer dizer que foram elaboradas apenas por
uma parte.

E portanto, temos aqui os ingredientes, pré elaboração, generalidade e rigidez e é isso que têm
que procurar num caso prático para saber se aplicam esta lei.

Ainda acerca destes três requisitos eu ainda quero aprofundar um pouco esta ideia acerca de
cada um deles.

Não é necessário que a pré elaboração tenha sido feita pela pessoa (singular ou colectiva) ou
seja, aquela entidade que contrata em massa, que tenha sido ela que as tenha pré elaborado,
pois pode ser o clausulado aplicado por outras empresas e que este seja copiado, e isto pode
querer dizer que não fui eu que pré determinei estas cláusulas, mas que seleccionei
previamente estas clausulas que pretendo que sejam introduzidas nos meus contratos futuros,
portanto, o que interessa não é saber se foi aquela entidade em concreto que as elaborou, o
que interessa é que se não as elaborou, que pelo menos tenha seleccionado clausulas já
existentes e tenha decidido que doravante as utilizaria na sua contratação futura.

CONCEITO DE GENERALIDADE
Para haver generalidade não basta que as clausulas façam parte de uma declaração negocial
que se dirija a pessoas indeterminadas e isto é muito importante.

Imaginem uma oferta ao publico, pois nada impede que eu faça uma oferta ao publico em
termos rígidos, ou seja, eu posso por um anuncio num jornal a dizer que “vendo um quadro
Gioconda por X, é pegar ou é largar”, não há duvida nenhuma que neste caso eu estou a fazer
uma proposta com caracter rígido e não há duvida nenhuma que me estou a dirigir a pessoas
indeterminadas, mas isto não clausulas contratuais gerais, por que estas clausulas são só para
um contrato, pois apesar de eu me dirigir ao publico, eu só vou vender àquela pessoa que
aparecer a dizer que “sim“ e aqui neste caso, para haver generalidade não basta que se diga

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que a proposta do utilizador foi dirigida a um numero indeterminado de pessoas, tem que ser
clausulas que visam ser introduzidas num numero indeterminado de contratos.

CONCEITO DE RIGIDEZ
Quanto ao conceito de rigidez, que é o requisito essencial porque é a rigidez que permite que
se diga que estamos perante contratos de adesão, é o facto de o utilizador não admitir discutir
ou negociar as clausulas, o que permite dizer que elas são rígidas para se dizer que a outra
parte ficou numa posição de “pegar ou largar”.

E quanto à rigidez também importa dizer algo, que é o seguinte:

A rigidez de que estamos a falar, não é propriamente uma rigidez jurídica, mas uma rigidez
fáctica, neste caso, seria errado pensar que estas clausulas são rígidas porque a lei não permite
que sejam alteradas, porque imaginemos que eram clausulas que a lei não permitia que
fossem alteradas, pois há clausulas que a lei impõe, pois pode haver contratos em que a lei
determine que estejam contempladas num contrato certo tipo de clausulas, e neste caso, se
for uma clausula que a própria lei impõe, então é uma rigidez de natureza legal, que tanto se
impõe ao aderente como ao utilizador, e isso não são clausulas contratuais gerais, pois nós não
podemos chamar clausulas contratuais gerais às normas injuntivas que têm forçosamente que
constar de um contrato, de facto é algo de rígido, mas neste caso é rígido para ambas as partes
e aqui não há que falar em clausulas contratuais gerais.

Quando se fala na rigidez, é numa rigidez fáctica, pois são cláusulas que seria possível discuti-
las e negocia-las, pois são cláusulas pré elaboradas que teoricamente podem ser discutidas e
negociadas, e teoricamente podem ser alteradas, só que na prática o utilizador recusa-se a
fazê-lo.

Sendo certo que teoricamente, não há duvida nenhuma que aqueles que são confrontados
com as cláusulas contratuais gerais podem sempre recusá-las e então não há contrato, mas
também não há duvida nenhuma que nada impede que eu tente sugerir à entidade que está a
contratar comigo que concorde em alterar as clausulas, ou seja, não haveria nada de ilícito se o
utilizador decidisse abrir uma excepção, pois as clausulas não são rígidas por serem impostas
por lei, são rígidas porque se constata que o seu utilizador, normalmente, não admite discuti-
las.

Para que aplique esta lei (446/85) não é preciso que todas as clausulas do contrato, sejam
clausulas contratuais gerais, pois pode haver um contrato com 40 clausulas em que só 3 é que
sejam clausulas contratuais gerais, porque só quanto a 3 delas, é que se verificam estes
requisitos da pré elaboração, da utilização sistemática em todos os contratos, da rigidez e
portanto, não é forçoso que para se aplicar esta lei, que tudo tenha que ser objecto de adesão
e que todas as clausulas sejam rígidas, pré determinadas e gerais, mas basta que num contrato
haja uma clausula contratual geral, para já se poder aplicar a lei no que respeita a essa
clausula.

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Então:

Em primeiro lugar temos que demonstrar que estamos perante uma ou várias cláusulas
contratuais gerais, portanto, pré determinadas, generalidade e rigidez e uma vez que feito
isso, já podemos aplicar esta lei.

Esta lei existe não propriamente para proibir as cláusulas contratuais gerais, apesar de haver
algumas que são proibidas como iremos ver. A ideia também não é autorizá-las, porque elas já
eram possíveis ao abrigo da liberdade contratual, e portanto, o objectivo do diploma é
claramente proteger os aderentes, ou seja, este diploma não existe para proteger aquela
entidade que utiliza na sua contratação clausulas contratuais gerais e não é essa a
preocupação do legislador, mas sim proteger quem utiliza as cláusulas contratuais gerais, ou
seja, para proteger as pessoas que contratam com quem utiliza clausulas contratuais gerais.

E já vimos que as pessoas que contratam com quem utiliza cláusulas contratuais gerais
designam-se por aderentes (porque para contratar têm que aceitar em bloco a um
regulamento contratual pré existente) e a lei protege os aderentes através de vários
mecanismos nos quais o legislador protege os aderentes;

Desde logo protege os aderentes proibindo certas cláusulas, pois há cláusulas contratuais
gerais que são proibidas (artigos 15º a 23º).

Desde já digo que sempre que num contrato é introduzida uma cláusula contratual geral que
é proibida por lei essa cláusula é nula (artigo 12º), portanto, se o utilizador utilizar na sua
contratação e em contratos concretos clausulas contratuais gerais que a própria lei proíbe, já
sabemos que a consequência é a nulidade dessas cláusulas.

Aqui no que respeita às clausulas proibidas há que ter presente o seguinte;

Há países em que a lei sobre cláusulas contratuais gerais, é uma lei que visa a protecção dos
consumidores e há países em que só se protege os aderentes que sejam os consumidores
finais, pois há países que consideram que quando os aderentes são empresários, que estes não
merecem protecção alguma porque estão em condições e têm peso económico e social, e
informação suficiente para se protegerem.

Em Portugal, a nossa lei, tanto protege os aderentes que são consumidores, como os
aderentes que são empresários, no entanto, o modo como a lei protege os consumidores é
mais intenso do que o modo em como protege os aderentes que sejam empresários, ou seja,
por outras palavras, há mais cláusulas proibidas quando os aderentes são consumidores, do
que cláusulas proibidas quando os aderentes são empresários.

Fundamentado o que acabei de dizer, se olharmos para a lei, entre os artigos 17º e 19º, temos
uma secção que se chama “Relações entre empresários ou entidades equiparadas” e aqui
quando se fala em “entidades equiparadas” podem ser por exemplo, profissionais liberais ou
outros, e portanto, os artigos 17º, 18º e 19º referem-se às relações entre empresários.

Se olharmos para estes artigos, constatamos que nas relações entre empresários, as cláusulas
proibidas são aquelas que vêm no artigo 18º e no artigo 19º e também o artigo 15º que diz

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que são proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias á boa-fé, e são proibidas seja
qual for o tipo de aderente e portanto, se o contrato de adesão tiver sido com um aderente
empresário, ele só pode alegar que a cláusula usada era proibida, se essa clausula se
enquadrar no artigo 15º, 18º e no artigo 19º.

Mas agora imaginemos que os aderentes são os consumidores finais, e aí nesse caso, já se
aplicam os artigos 20º e seguintes e quando os aderentes são os consumidores finais, também
temos á partida as proibições da boa-fé do artigo 15º, 21º e 22º, mas é preciso não esquecer, e
isto é muito importante, que no caso dos consumidores, além de serem clausulas proibidas,
(artigos 15º, 21º e 22º), também são proibidas por força do artigo 20º, aquelas que já eram
proibidas nas relações entre empresários, ou seja, se o artigo 20º remete para as normas
anteriores, então quer dizer que se aplica aos consumidores os artigos 18º e 19º e além disso
por acréscimo, as normas dos artigos 21º e 22º, ou seja, quando o aderente é um consumidor,
há 5 artigos que têm clausulas proibidas, enquanto se o aderente for um empresário, têm que
ler os artigos 15º, 18º e 19º.

AS PROIBIÇÕES
Hão-de reparar que no artigo 18º se fala em “Clausulas absolutamente proibidas” e o artigo
19º diz “Clausulas relativamente proibidas” e esta distinção entre cláusulas “absolutamente
proibidas” e “relativamente proibidas” também a encontramos nos artigos 21º e 22º, que são
normas que também só se aplicam aos consumidores, ou seja, temos dois artigos com
“cláusulas absolutamente proibidas” (artigos 18º e 21º) e temos dois artigos com “cláusulas
relativamente proibidas” (artigo 19º e 22º).

A diferença é simples;

Quando a cláusula é absolutamente proibida, quer dizer, que em caso algum é admitida e
nunca podem ser inseridas num contrato sob pena de serem nulas (clausulas do artigo 18º).

Já se for uma cláusula que venha prevista no artigo 21º, ela só é proibida se os aderentes
forem consumidores, mas as cláusulas do artigo 21º não são proibidas se os aderentes forem
empresários e neste caso não é nula porque nem sequer é proibida.

Vimos que há dois artigos que prevêem cláusulas relativamente proibidas que são os artigos
19º e 22º, ora, quer o início da redacção do artigo 19º, quer a redacção do início do artigo 22º,
são iguais ao dizerem “são proibidas consoante o quadro negocial padronizado” ou seja, são
proibidas, dependendo da situação concreta

Também vimos que há dois artigos que prevêem “cláusulas relativamente proibidas”, que são
os artigos 19º e 22º e quer o início da redacção do artigo 19º quer a redacção do artigo 22º são
iguais.

Artigo 19º “são proibidas consoante o quadro negocial padronizado”, ou seja, são proibidas,
mas depende da situação concreta, e no artigo 22º é a mesma coisa.

Já vimos que no artigo 19º alínea a), vimos que se aplica quer os aderentes sejam empresários,
quer os aderentes sejam consumidores, mas são clausulas relativamente proibidas, e o que diz

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a lei na alínea a) é que “são proibidas as clausulas que estabeleçam a favor de quem as
predisponha, prazos excessivos para a aceitação ou rejeição das propostas”.

Neste caso, imaginemos que somos confrontados com um caso em que o utilizador da clausula
contratual geral, goza de um certo prazo para aceitar ou rejeitar a proposta, e a questão é
saber se o prazo é excessivo, e aqui o conceito de excessivo a lei diz que “é consoante o
quadro negocial padronizado” e neste caso temos que ver que tipo de contrato é que está em
causa, ou seja, para um certo tipo de contrato, de maior complexidade, em que estão em jogo
valores muito avultados, que tem clausulas muito sofisticadas e complexas, pode justificar um
prazo de reflexão grande, e então aí, nesses casos, o prazo poderá não ser excessivo, e isto foi
para dar um exemplo do que é que significa o quadro negocial padronizado, e a própria
expressão excessivo, obriga a que vamos ver em concreto, o tipo de negócio que está ali em
causa, os valores que estão em causa, o tipo de clausulas, pode ser que excessivo numa
situação mas não ser noutras.

Por exemplo no artigo 19º aliena c) “são proibidas as clausulas que consagrem clausulas
penais desproporcionadas aos danos a ressarcir”, por exemplo uma clausula que diga “se o
contrato não for cumprido tens que pagar 50.000 € independentemente dos danos”, mas aqui
há que ver que tipo de contrato é que está em causa, ou seja, nas situações do artigo 19º e do
artigo 22º, nós não podemos olhar para a clausula e dizer automaticamente, é proibida, logo, é
nula, o que temos que dizer é;

Será proibida em certos casos, mas não será noutros e deixa-me ver, se neste tipo de situação,
é de admitir ou não é de admitir a clausula, portanto, as clausulas que vêm nos artigos 19º e
22º, o interprete vai ter que fazer um juízo de valor antes de concluir que a clausula é proibida,
enquanto que nas clausulas dos artigos 18º e 21º não tem que haver juízo de valor nenhum,
pois nos artigos 18º e 21º, basta constatar que está lá aquela clausula para automaticamente
dizer que é nula, e não interessa saber em que contexto é que a clausula foi introduzida, e nas
situações dos artigos 18º e 21º a clausula não devia lá estar, logo, é nula.

Nas situações dos artigos 19º e 22º, se a clausula lá está, há que ver se deveria ou não deveria
lá estar e então há que atender às circunstâncias do próprio negócio.

Chamo a atenção para uma clausula que é muito frequente ser discutida nos tribunais, e que
às vezes até nos contratos internacionais, os clientes estrangeiros, tentam muitas vezes que os
fornecedores de produtos introduzam clausulas com o teor do artigo 18º aliena c) e se
olharem para o artigo 18º aliena c) diz que “são em absoluto proibidas as clausulas
contratuais gerais que excluam ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade
por não cumprimento definitivo, mora ou incumprimento defeituoso, em caso de dolo ou de
culpa grave”,

Neste caso, se certa entidade, (pessoa singular ou colectiva, portuguesa ou estrangeira), se se


provar que aquela entidade, que através de uma clausula contratual geral, que é usada
habitualmente, mas se é uma clausula que preenche os requisitos da pré elaboração, da
generalidade e da rigidez, e se a clausula diz que o fornecedor não se responsabiliza em caso
de incumprimento seu, ou de cumprimento defeituoso, ou de atraso, essa clausula, se for uma
clausula contratual geral, só é possível estabelecer uma limitação á responsabilidade, para os

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caso de culpa leve, ou seja, seria possível num contrato dizer “caso se prove que a minha
culpa, foi uma culpa leve, não haverá responsabilidade”, mas o que não se pode é
genericamente excluir a responsabilidade, em qualquer situação, porque a lei diz que é nula a
clausula proibida se excluir a responsabilidade por incumprimento, ou mora, ou cumprimento
defeituoso se excluir em caso de dolo ou de culpa grave, e á contrario sensu, a clausula só é
válida se excluir a responsabilidade, em caso de culpa ligeira.

Mas em Portugal e face á lei portuguesa, a cláusula, quanto muito só permite afastar a
responsabilidade em caso de negligência leve, não podendo afastar nem no caso de dolo
(intencionalidade) nem no caso de negligência grosseira.

Por exemplo, no artigo 18º alínea a) “são absolutamente proibidas as clausulas que excluam
ou limitem, de modo directo ou indirecto, a responsabilidade por danos causados à vida, á
integridade moral ou física ou á saúde das pessoas”, neste caso, o fornecedor de um produto,
mesmo que possa limitar a sua responsabilidade no caso de culpa leve face ao outro
contraente, não pode afastar a indeminização sobre danos se ele forneceu um produto que
possa causar a morte de alguém, e nesse tipo de situação, a aliena a) não permite de modo
algum, independentemente de saber se a culpa é leve ou se é grosseira, desde o momento em
que haja culpa.

Artigo 18º alínea g) “são absolutamente proibidas as cláusulas que excluam ou


limitem o direito de retenção”.
O direito de retenção, resumidamente, é o seguinte;

Em certos casos, imaginemos que eu sou credor de uma pessoa, por exemplo desta colega, e
ela tem uma divida para comigo, e imaginemos que eu tenho uma coisa dela em meu poder,
em certos casos, o credor pode reter o bem do devedor até que o devedor pague a divida, mas
é só em certos casos, pois o credor só pode reter o bem do devedor se a coisa que estiver
retida esteja relacionada com a divida, e imaginemos que a coisa eu tenho em meu poder, é
uma coisa dela, mas que eu tive que realizar despesas relativamente àquela coisa, e despesas
que são da responsabilidade da vossa colega, aí ela tem uma divida para comigo que é a
indeminização da despesas, e eu tenho em meu poder a coisa que deu origem às despesas, eu
posso reter essa coisa atá que ela me pague (artigo 754) agora o que eu já não poderia fazer, e
imaginemos que eu lhe tinha emprestado 100 euros, que ela já deveria ter pago e não pagou,
e eu hoje, no inicio da aula pedia-lhe o relógio emprestado para cronometrar a aula e ela
emprestava-se o relógio, e no final da aula vinha-me pedir o relógio e eu dizia que não lho dou
enquanto não me devolver os 100 euros que me deve, eu aqui não tenho o direito de
retenção, porque a coisa que eu estou a reter (o relógio) não tem a ver com o empréstimo que
eu lhe tinha feito de 100 euros, e isto para mostrar que nem sempre existe direito de retenção.

Na aliena b) do artigo 18ª, resulta que não é possível através de uma clausula contratual geral,
antecipadamente, afastar a possibilidade de um determinado credor poder exercer o direito
de retenção, mesmo que essa clausula seja estipulada, é pura e simplesmente nula porque é
proibida.

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ARTIGO 15º (Violação da boa fé)


“São proibidas as cláusulas contratuais gerais contrárias à boa-fé”.

Aqui, nem sequer se define o que é a boa-fé, isto é uma norma jurídica de caracter um pouco
ambíguo, porque permite considerar proibidas, e consequentemente nulas, clausulas que no
entendimento do intérprete contrariem a boa-fé, no fundo, a lei entende que são clausulas
que são consideradas injustas e abusivas, e por exemplo, clausulas que a serem admitidas,
impedem que uma das partes alcançar os resultados pretendidos, ou seja, quando uma pessoa
celebra um contrato, tem em vista um certo objectivo, e pode haver uma clausula que
insidiosamente foi enfiada num contrato, e que na pratica venha esvaziar o conteúdo que a
outra parte pretendia, e isso seria um exemplo claro de um contrato contrario á boa-fé.

AULA 26

CLAUSULAS CONTRATUAIS GERAIS – CONTRATOS DE ADESÃO (Conclusão)


O problema destas clausulas contratuais gerais não é o faco de serem clausulas pré
elaboradas, e não é o facto de se destinarem a uma multiplicidade de contratos, o problema
está no facto em que, se as clausulas são elaboradas apenas por uma das partes, e essa parte
terá tendência e a propensão de elaborar clausulas eu lhe sejam muito favoráveis, e a
experiencia mostra que estas clausulas contratuais gerais, normalmente desprotegem as
pessoas com quem se contrata, e normalmente são clausulas que são feitas a pensar na
protecção exclusiva dos interesses do utilizador, e portanto, os problemas que surgiram ao
longo de décadas e que deram origem a este diploma, tinham a ver com o facto de muitas
vezes se estipularem clausulas injustas e abusivas.

E a titulo de exemplo, havia contratos em que alguém comprava um carro japonês e havia um
clausula no contrato que dizia, “no caso de haver algum vicio ou defeito, o litigio será dirimido
no tribunal de Tóquio” e era evidente que se a pessoa compra um carro em Portugal e é
confrontada com uma clausula do contrato em que diz que se houver um problema, e se
quiser batalhar judicialmente, tem que o fazer no Japão, á partida, se uma clausulas dessas
puder valer, obviamente que fará com que a maioria esmagadora das pessoas desistam de
litigar e de defender os seus interesses, porque só de pensarem que têm que arranjar um
advogado no Japão, informarem-se acerca da lei japonesa, e tudo isso é algo que não é
acessível ao vulgar cidadão, e este é o tipo de exemplo de clausulas que muitas vezes eram
inseridas nos contratos, ou então clausulas que diziam que o vendedor não se responsabilizava
pelos defeitos, ou que não era possível anular o negócio em caso de vícios, e havia este tipo de
clausulas absolutamente chocantes, ou então era que o problema em que os aderentes que
iam contratar com base nestas clausulas, nem tinham tempo nem oportunidade para lerem as
clausulas, e muitas vezes as pessoas nem tomavam conhecimento dessas clausulas, e por isso
é que surgiu a necessidade de legislar sobre este tipo de clausulas.

E neste caso, para estarmos perante cláusulas contratuais gerais, é preciso que as referidas
cláusulas preencham 3 requisitos;

a) Clausulas pré elaboradas.


b) Cláusulas gerais.

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c) Rigidez das cláusulas.

Começamos a ver na ultima aula que o objectivo desta lei não é proibir as clausulas contratuais
gerais, mas o objectivo da lei é claramente proteger os aderentes, e os aderentes são aqueles
que contratam com o utilizador das clausulas contratuais gerais, mas só se pode recorrer ao
decreto-lei 446/85 depois de ser ter demonstrado que estamos perante clausulas contratuais
gerais e depois, e então sim, aplica-se o decreto-lei 446/85.

Quando se diz que as clausulas contratuais gerais são rígidas, não é no sentido de a lei proibir
que sejam negociadas, porque se for a própria lei que as impõe, então não há que falar em
clausulas contratuais gerais, pois são normas legais e se a lei diz que tem que ser assim, então
o próprio utilizador dirá, que neste caso não está a impor nada, pois é a própria lei que o diz, e
portanto, as clausulas contratuais gerais, quando dizemos que são rígidas, não é no sentido de
juridicamente não poderem ser alteradas, porque se juridicamente não puderem ser alteradas,
é porque na realidade não são clausulas contratuais, são clausulas legais.

Primeiro demonstra-se que são cláusulas contratuais gerais, (pré elaboração, generalidade e
rigidez) depois vamos ao diploma (445/85), e este diploma visa proteger os aderentes (aqueles
que contratam com o utilizador), e já vimos uma maneira de este diploma proteger os
aderentes que é através da proibição de certas cláusulas, pois há clausulas que são proibidas
pela própria lei (artigo 15º ao artigo 23º) onde existe uma lista de cláusulas que são proibidas.

Sempre que uma cláusula contratual geral proibida for utilizada e inserida num contrato, a
consequência é a nulidade (artigo 12º) e portanto, uma cláusula que esteja abrangida pelos
artigos 15º e seguintes e que consta da lista das proibições, se for inserida num contrato,
porque é proibida, é nula.

Também vimos que a nossa lei de clausulas contratuais gerais, não é uma lei que
exclusivamente visa proteger os consumidores, há países em que só se protege os aderentes
que sejam consumidores finais, porque há países em que se considera que se é uma relação
entre empresários, em que um dos empresários é o aderente, este não precisa de protecção
especial porque tem peso económico e social e informação jurídica suficiente para se
defender, mas em Portugal, a lei tanto protege os aderentes que são consumidores, como
aderentes que são empresários, mas interessa saber se os aderentes são consumidores ou se
são empresários, porque como vimos, as clausulas que são proibidas nos casos de o aderente
ser empresário, são as dos artigos 15º, 18º e artigo 19º, enquanto se o aderente for
consumidor, são os artigos 15º, 18º, 19º, 20º, 21º e 22º, ou seja, há mais clausulas proibidas
quando os aderentes são consumidores, do que quando os aderentes são empresários, e nessa
medida, podemos dizer que os consumidores são mais protegidos do que os empresários.

Chamo a atenção para o facto de quando a lei a partir do artigo 17º fala em relações entre
empresários, acrescenta “ou em entidades equiparadas”, porque pode haver pessoas que não
são propiamente empresários, mas que contratam em massa, e têm já um clausulado
preparado para todos os seus contratos.

Serafim Cortizo 20100059 Página 179

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Como em tudo na vida, há sempre uma primeira vez, e quando uma pessoa tem cláusulas
contratuais gerais, há uma primeira vez em que as insere em certo contrato, e há um aderente
que vai estrear aquelas cláusulas.

E imaginemos que um empresário elaborou clausulas para incluir em todos os seus contratos
futuros, mas há sempre um primeiro contrato que é celebrado, e o facto de ser logo o primeiro
contrato, não impede que se qualifique a clausula como clausula contratual geral, ou seja, não
é preciso que as clausulas já tenham sido utilizadas em algumas dezenas ou centenas de
contratos, para serem promovidas a clausulas gerais, pois basta que tenha sido elaborada para
ser inserida nos contratos futuros, e se foi elaborada para ser inserida em contratos futuros, ao
ser inserida pela primeira vez num contrato, já podemos classificar a clausula como uma
clausula contratual geral, não porque já tenha sido inserida muitas vezes, mas porque foi feita
a pensar em muitos contratos, e até pode acontecer que aquele empresário que elaborou
clausulas contratuais gerais, celebre um contrato, ou dois e depois abandona a actividade, na
pratica estas clausulas só foram utilizadas duas vezes, mas eram clausulas contratuais gerais
porque foram elaboradas previamente para serem inseridas numa multiplicidade de contratos
futuros.

Vimos que as clausulas proibidas, são nulas, e a partir daqui levantam-se algumas questões, e
uma delas é saber se:

Imaginemos que num contrato foi inserida uma cláusula contratual geral proibida, ela é nula,
mas aquele contrato pode ter dezenas de cláusulas, mas nem todas serem cláusulas
contratuais gerais, aliás, basta que haja uma cláusula contratual geral num contrato para se
poder aplicar a lei, e a lei só se aplica àquela cláusula contratual geral, pois não é preciso que
todas as cláusulas sejam cláusulas contratuais gerais, basta que se prove que uma o era, e
nesse caso, pode-se aplicar esta lei.

Mas imaginemos que alguém celebrou um contrato que tem muitas cláusulas gerais ou sem
ser gerais e em que só uma é que é proibida, e se é proibida é nula, mas não é só o problema
de saber se a nulidade da cláusula implica ou não a nulidade de todo o contrato, aqui também
há o problema de saber como reagir, quando por causa da nulidade da cláusula, um ponto
relevante do contrato passa a ser lacunar.

Para esclarecer estas questões, temos que atender ao disposto nos artigos 12º a 14º e neste
caso, os artigos de mais complexa interpretação, são os artigos 13º e 14º.

O artigo 12º é o tal artigo que diz que as cláusulas proibidas são nulas.

Depois o artigo 13º nº 1 diz que “o aderente que subscreva ou aceite clausulas contratuais
gerais pode optar pela manutenção dos contratos singulares quando algumas dessas
clausulas sejam nulas”.

Lendo o nº 1 do artigo 13º, concluímos que quando há uma clausula contratual nula, em
principio se nos basearmos apenas na letra deste artigo, quando há uma clausula contratual
nula, o aderente é que decide se o resto do contrato se mantém, ou se todo o contrato é nulo,
porque este artigo diz que “o aderente e pode optar pela manutenção do contrato” e se pode
optar pela manutenção do contrato, quer dizer que também pode fazer a opção inversa, e

Serafim Cortizo 20100059 Página 180

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manter o contrato, é mantê-lo sem a clausula nula, que é aqui a que chamaríamos uma
redução, mas se ele pode optar pela manutenção do contrato, conclui-se que ele pode optar
pela alternativa, e a alternativa é obter a nulidade de todo o contrato.

Lendo o nº 2 do artigo 13º diz que “a manutenção de tais contratos implica a vigência, na
parte afectada, das normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às regras de
integração dos negócios jurídicos”.

O nº 2 do artigo 13º, está a pressupor que o aderente, ao ser confrontado com uma, ou várias
cláusulas proibidas, optou por manter a parte válida do contrato e pela manutenção do
contrato sem as cláusulas nulas.

E no artigo 13º nº 2, o aderente optou pela manutenção do contrato sem aquelas clausulas,
aquilo a que podemos chamar tecnicamente uma redução, manter-se a parte sã e extirpar do
contrato a parte inválida, e segundo este artigo, como há uma parte que é afectada, vai surgir
forçosamente uma lacuna ou várias no contrato, ou seja, havia um ponto que estava regulado,
mas como a clausula é nula, deixa de estar regulado, e então o artigo 13º nº 2 vem dizer que
num caso desses vai-se aplicar a esse ponto que passou a ser lacunar e omisso, as normas
supletivas aplicáveis, mas aqui está-se a pressupor que existem normas supletivas que regulem
aquele ponto, e caso não existam normas supletivas que regulem aquele ponto, recorrem-se
às regras de integração dos negócios jurídicos, do artigo 239 do CC.

Na realidade no artigo 13º nº 2 não se diz nada de diferente do artigo 239, pois no artigo 239
também se diz que primeiro vai-se ver às normas aplicáveis, e se não houver normas aplicáveis
é que se recorre á integração da lacuna, de acordo com a vontade hipotética das partes, ou se
essa vontade hipotética das partes for contrária á boa-fé, de acordo com os ditames da boa-fé
(artigo 239).

No artigo 14º induz em erro porque a epígrafe “redução” pode complicar a interpretação do
preceito.

Artigo 14º “se a faculdade prevista no artigo anterior não for exercida, ou sendo-o, conduzir
a um desequilíbrio das prestações gravemente atentatório á boa-fé, vigora o regime da
redução dos negócios jurídicos”.

Para perceber o artigo 14º é preciso perceber que se está aqui a distinguir duas situações.

Começa por dizer que “se a faculdade prevista no artigo anterior não for exercida” e isto é
uma hipótese e a faculdade prevista no artigo anterior é a faculdade de manter o contrato
sem a parte inválida, e então “não exercer a faculdade do artigo anterior” que era manter o
contrato singular, significa que é optar pela invalidade total.

Mas depois também é referido “ou sendo-o” e aqui já temos que admitir a hipótese de o
aderente ter optado pela manutenção, portanto, o artigo 14º tanto se aplica se o aderente
optou pela nulidade total (primeira parte do artigo 14º), como também se aplica o artigo 14º
se o aderente optou por exercer a faculdade do artigo anterior, ou seja, optou por manter a
parte válida deitando fora apenas a parte inválida.

Serafim Cortizo 20100059 Página 181

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E nestes casos, tem que se aplicar o artigo 14º, quer o aderente peça a nulidade total, quer
na situação em que o aderente quer apenas a invalidade parcial.

Neste artigo, como são duas situações distintas, temos que as analisar de modo distinto apesar
de virem no mesmo artigo, e então comecemos pelo início:

Diz o artigo 14º “se a faculdade prevista no artigo anterior não for exercida” e como eu já
disse, está-se aqui a pressupor que o aderente não se prevaleça da faculdade de manter o
contrato, logo, pede a nulidade total.

Na continuação é dito que “se a faculdade prevista no artigo anterior não for exercida (…)
vigora o regime da redução dos negócios jurídicos” e isto é um pouco estanho, porque o
legislador não está a dizer que “se o aderente pedir a nulidade total, vigora a redução”, o que
o legislador está a dizer é que, se o aderente pedir a nulidade total, e se ela não exerce a
faculdade do artigo anterior é porque está a optar pela nulidade total, visto que a faculdade do
artigo anterior era manter a parte válida e neste caso, não exercer essa faculdade, é de crer
que seja tudo inválido.

Imaginemos que o aderente quer que seja tudo nulo com o pretexto de que há uma clausula
nula, e ele quer a nulidade de todo o contrato, neste caso isso pode acontecer, porque
imaginem que o aderente está arrependido do investimento que fez, e ele ao ver que há uma
clausula nula, ele quer aproveitar-se desse facto para se tentar libertar de todo o contrato e
conseguir reaver todo o investimento, e pode ser que o aderente já não queria o contrato,
apesar de haver apenas uma clausula nula, mas nestes casos a lei, se ele disser que quer a
nulidade total, a lei diz na parte final do artigo 14º, que se aplica o regime da redução, mas não
que se reduz, o que não é a mesma coisa, porque aplicar-se o regime da redução significa que
está a haver aqui uma clara remissão para o artigo 292 do CC e quando a lei diz que se aplica o
regime da redução, que está a remeter para o artigo 292 que diz “a nulidade ou anulação
parcial não determina a invalidade de todo o negócio, salvo quando se este se mostre que
este não teria sido concluído sem a parte viciada”.

Se o aderente pedir a invalidade total, ele só vai conseguir a nulidade total, e a questão só tem
interesse se o aderente quiser a invalidade total e o utilizador discordar, tendo que haver uma
redução, por achar que havendo uma invalidade parcial não se justifica a nulidade total, e aqui
estamos a imaginar um cenário em que o aderente pede a nulidade total, mas em que o
utilizador pretende que haja apenas redução. E o que o legislador diz aqui, é que
contrariamente ao que se diz no artigo 13º nº 1, em que se fica com a ideia que é o aderente
que decide, na realidade, se o aderente optar pela nulidade total, ainda é preciso ir ver o artigo
292 do CC.

Isso significa, que se o utilizador defende ele próprio a redução, e quem quer a nulidade total é
o aderente, o juiz só decreta a nulidade total, se se aplicar a parte final do artigo 292, e se se
concluir, que caso as partes tivessem previsto o vício, teriam preferido a invalidade total, ou
seja, o juiz só decreta a nulidade total, se for feita prova pelo aderente que a vontade
hipotética das partes, no caso de terem previsto o vício, teria ido no sentido da nulidade total.
Porque se o aderente não conseguir provar que as partes teriam querido a nulidade total, o
aderente fica sujeito a que o contrato se mantenha sem a parte nula.

Serafim Cortizo 20100059 Página 182

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RESUMINDO A 1ª PARTE DO ARTIGO 14º

Contrariamente á ideia que inculca o artigo 13º nº 1, em que o aderente é que, quando há
uma clausula proibida, se quer manter o contrato sem a clausula proibida, e se quer a redução,
ou se quer a hipótese alternativa, que é a nulidade total, no artigo 13º nº 1 conclui que é o
aderente que decide, mas na realidade, o aderente decide apenas num primeiro momento, o
que é que quer, mas se o aderente quer a invalidade total, mas se a outra parte não concordar,
o juiz decidirá com base nas regras do artigo 292 do CC, e a regra do artigo 292, vai mais no
sentido da redução, e só há nulidade total quando se prova que as partes, se tivessem previsto
o vicio, não o teriam querido.

Na continuação, diz o artigo 14º, e neste caso quando é dito “ou sendo-o”, e agora esta
expressão está a pressupor que o aderente se prevaleceu da faculdade prevista no artigo
anterior, e essa faculdade prevista, é a faculdade de manter o contrato sem a parte inválida, e
no fundo significa reduzir o contrato, nesta caso reduzir é deitar fora a parte viciada e manter
a parte sã, e quando diz “ou sendo-o” está-se a imaginar que o aderente está a pedir a
redução e manter o contrato sem a parte viciada, mas a lei está a pressupor que pode
acontecer, que o aderente possa querer manter o contrato sem a parte viciada, e dessa sua
opção possa “conduzir a um desequilíbrio das prestações gravemente atentatório á boa-fé”,
mas aqui, desequilíbrio de prestações em detrimento do utilizador, ou seja, a lei está a
imaginar um cenário, em que porque o aderente quer a redução do negócio (manter o
contrato sem a parte viciada), e essa opção por manter o contrato sem a parte viciada,
provoca um desequilíbrio de prestações gravemente atentatória da boa-fé, e obviamente, é
um desequilibro em favor do utilizador e não do aderente, que já conseguiu que a parte
desfavorável para ele saísse do contrato.

Mas neste caso, a lei está a imaginar que o aderente, ao querer manter o contrato sem a parte
viciada, que aquele contrato ao manter-se sem a parte viciada, passe a ser um contrato
desequilibrado, muito vantajoso para o aderente, e muito prejudicial para o utilizador, no
fundo, é isso que a lei está a imaginar e isso é possível, se no caso em que tenha sido
celebrado um contrato de adesão, e naquele caso no contrato havia clausulas contratuais
gerais proibidas que beneficiavam o utilizador e que a lei não permitia, mas o legislador está a
pensar que aquele mesmo contrato tinha outras clausulas, que até podiam não ser clausulas
contratuais gerais, mas que tinha outras clausulas que eram muito favoráveis ao aderente, ou
seja, o contrato na sua globalidade estava equilibrado, porque tinha clausulas muito boas para
o utilizador e muito boas para o aderente, e portanto, não se podia dizer que o contrato fosse
desequilibrado ou injusto.

E quando o aderente obtém a nulidade das cláusulas que eram favoráveis ao utilizador, e
subsistindo apenas aquelas cláusulas que eram favoráveis ao aderente, o contrato que estava
equilibrado, torna-se equilibrado em proveito do aderente e em detrimento do utilizador, pois
parece ser isto em que o legislador está a pensar, quando ao optar pela manutenção do
contrato sem a parte viciada, e daí resulta um desequilíbrio de prestações gravemente
atentatórias da boa-fé.

Serafim Cortizo 20100059 Página 183

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E se for este o caso, a lei ao dizer que se plica o regime da redução, a lei não está a dizer que
reduz porque aplicar o regime da redução não implica sempre a redução, porque se se provar
que a vontade hipotética teria sido em favor da nulidade.

No fundo, nesta parte final, o artigo 14º quer dizer que se o aderente optar por manter o
contrato sem a parte viciada, se optar por reduzir, o utilizador pode vir defender-se dizendo
que nunca teria celebrado esse contrato se tivesse previsto que essas clausulas não poderiam
ter feito parte do contrato, e nunca seria celebrado porque este contrato com essas clausulas,
é um contrato claramente injusto e desfavorável para o utilizador, e claramente demasiado
vantajoso para o aderente, e portanto, quando o aderente opta pela redução, o utilizador
poderá dizer que quer a nulidade total do contrato, e o juiz decretará a nulidade total do
contrato se concluir que, manter-se o contrato sem as clausulas nulas implica um grave
desequilíbrio a favor do aderente, e concluir-se que a vontade hipotética das partes, do
utilizador, que teria ido no sentido de celebrar contrato algum.

Este diploma não protege só os aderentes de certas cláusulas, mas também protege os
aderentes de outras maneiras, pois o diploma protege os aderentes, impondo ao utilizador
certos deveres pré contratuais e esses deveres pré contratuais vêm nos artigos 4º e seguintes
do diploma.

O artigo 4º diz que “as cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos
singulares incluem-se nos mesmos, para todos os efeitos, pela aceitação, com observância do
disposto neste capítulo”

O artigo 4º nem era necessário, pois o que a lei está a dizer é que as cláusulas contratuais
gerais, se não tiverem sido aceites pelos aderentes, não fazem parte do respectivo contrato, e
isso é evidente, porque para se formar contrato tem que haver acordo sobre as cláusulas e que
estas têm que ser efectivamente aceites.

No artigo 5º é previsto o dever de comunicação que é um dever que recai sobre o utilizador
das clausulas e diz este artigo no nº 1 que “as clausulas contratuais gerais devem ser
comunicadas na integra aos aderentes que se limitem a subscreve-las ou a aceitá-las” artigo
5º nº 2 “a comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência
necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade
das clausulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de
comum diligencia”.

As cláusulas têm que ser comunicadas na íntegra, pois não basta ver no contrato uma remissão
para outro documento e neste caso, é preciso que se prove que nas tais condições gerais que o
aderente foi confrontado com elas, pois não basta uma remissão para outro documento e
comunicar apenas a sua existência que não são conhecidas do aderente.

Aqui quando se diz “a comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a
antecedência necessária”, aqui quando se diz “com a antecedência necessária”, é evidente
que se o contrato, tem por exemplo 300 clausulas, e cláusulas complexas, com mecanismos
jurídicos sofisticados pois não faz sentido ser comunicada com 5 minutos de antecedência
porque é impossível conhecê-las, agora, um contrato que tenha, uma ou duas clausulas

Serafim Cortizo 20100059 Página 184

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perfeitamente lineares, não é preciso anunciar com um ano de antecedência a clausula. A


comunicação tem que ser atempada e de modo a poder ser conhecida, ou seja, não se
considera uma comunicação adequada alguém chegar ao pé do aderente e falar muito
depressa. E esse tipo de maneira de apresentar as cláusulas, não seria considerada uma
comunicação adequada.

Artigo 5º nº 3 “o ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante


que submeta a outrem as clausulas contratuais gerais”.

Neste caso, não é o aderente que tem que provar que as clausulas não lhe foram comunicadas,
ou foram mal comunicadas, é o utilizador que tem que provar que as comunicou bem e de
modo atempado, e isto é muito importante, porque se o utilizador não conseguir fazer prova
de que procedeu a essa comunicação, neste caso é violado o artigo 5º e a consequência da sua
violação está no artigo 8º alínea a) que nos vem dizer que “consideram-se excluídas dos
contratos singulares, as clausulas que tinham sido comunicadas nos termos do artigo 5º” e
isto é muito importante.

A lei não está a dizer que as clausulas são nulas, porque o problema não está no conteúdo da
clausulas, pois só seriam nulas se fossem proibidas, mas se fossem proibidas, estes artigos nem
eram necessários, porque a clausula proibida, de per si, já não faz parte do contrato porque é
nula e estes artigos têm interesse para clausulas que até sejam válidas, a clausula, pelo seu
conteúdo, seria válida, e não é proibida, mas porque não foi comunicada de modo adequado e
com a antecedência suficiente, na pratica a clausula vai ser considerada como ficando fora do
contrato, ela é excluída do contrato, pois a lei não diz que ela é nula, pois não tem um vicio
intrínseco, o problema não está na clausula, mas no modo em como foi comunicada, mas na
realidade é um resultado muito parecido com o da nulidade.

Porque se a cláusula é nula, acaba por não fazer parte do contrato, porque não produz efeitos.
Aqui poderá ser válida, mas mesmo que seja válida, se não foi comunicada nos termos do
artigo 5º, ela não vai fazer parte do contrato, e na pratica não se aplica sendo uma
consequência parecida com o caso em que a clausula fosse nula, sendo uma consequência
grave para o utilizador, porque não comunicou bem, ou porque não consegue provar que
comunicou bem, e então aquelas clausulas acabam por não fazer parte do contrato.

O mesmo acontece, se em vez de ser a violação do dever de comunicação, for a violação do


dever de informação que vem no artigo 6º.

Artigo 6º nº 1 “o contratante que recorra a clausulas contratuais gerais deve informar, de


acordo com as circunstancias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração
se justifique” artigo 6º nº 2 “devem ainda ser prestados todos os esclarecimentos razoáveis
solicitados”.

Até podemos começar pelo nº 2, e o que resulta do nº 2, é que se o aderente pediu um


esclarecimento, o utilizador não se pode recusar e tem obrigação de prestar esclarecimentos
“razoáveis” pois há perguntas que o aderente tem toda a legitimidade de fazer, e se se provar
que o utilizador não prestou aqueles esclarecimentos e deu aquelas informações, no fundo, a

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consequência é a mesma o artigo 8º alínea b), que também diz que a cláusula fica fora do
contrato.

Mas aqui é importante chamar á atenção para o artigo 6º nº 1 porque diz “o contratante que
recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstancias, a
outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique”.

Ou seja, o dever de informar não é só se o aderente pedir esclarecimentos, quando o aderente


pede esclarecimentos é o nº 2. Mas o que nos diz o nº 1, é que o utilizador, em certos casos e
por sua iniciativa se aquela pessoa é suposta não perceber se forem cláusulas em que se
justifique que seja ele a tomar a iniciativa.

Se for violado o artigo 6º, nº 1 e nº 2, aplica-se a mesma consequência da violação do dever de


comunicar, só que agora é o artigo 8º aliena b) que diz que se “consideram excluídas do
contrato as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não
seja de esperar o seu conhecimento efectivo”.

Há jurisprudência que tem considerado excluídas de contratos, casos em que as cláusulas


contratuais gerais vêm numa folha frente e verso, e o aderente só assinou a folha da frente e
neste caso, a jurisprudência considera que as clausulas que vêm no verso não contam.

Artigo 8º aliena c) “consideram-se excluídas dos contratos singulares as clausulas que, pelo
contexto em que surjam, pela epígrafe que as precede ou pela sua apresentação gráfica,
passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real”.

Aqui são os casos em que as clausulas passam despercebidas, que são aqueles contratos em
que de repente a letra fica tão pequena que as pessoas não conseguem ler o que lá está, como
por exemplo, no caso dos cartões de crédito, em que as condições respeitantes ao cartão de
crédito aparecem em letra minúscula em que a pessoa não consegue ler, ou que é um tal
esforço que a pessoa deve pensar que está tudo bem. E nesse tipo de cláusulas o utilizador
arrisca-se a que num tribunal, sejam consideradas excluídas dos contratos por causa da
apresentação, como diz a lei.

Até pode acontecer que existam clausulas que sejam excluídas dos contratos por causa de
epígrafes enganosas, por exemplo, é frequente em certos contratos de adesão haver um artigo
ou uma cláusula que diga “garantia do aderente” e depois eu leia o texto está lá escrito “neste
caso o aderente não goza da garantia”, de facto, o artigo está falar da garantia, mas está a falar
em a retirar. E isto é o exemplo de uma cláusula em que, se se entender que a epígrafe era
enganosa, ou que poderia levar a que um aderente se apercebesse do teor da própria clausula,
e essa cláusula arrisca-se, do ponto de vista do utilizador, a ser também considerada excluída
do contrato.

O artigo 8º alínea c) também abrange os casos em aquilo que a doutrina chama “as cláusulas
surpresa” e estas cláusulas, são as cláusulas que nenhum aderente está á espera de encontrar
naquele contrato, porque é uma cláusula que foi lá “enfiada completamente a martelo” e não
tem nada a ver com aquele assunto, por exemplo, numa cláusula que é de compra de um
barco, de repente, entre 80 clausulas, aparece uma a dizer “e por acréscimo também compra
um avião do pais do barco”, ou por exemplo, o caso de num contrato de compra de um barco,

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havia uma clausula em que o aderente ficava vinculado a arbitrar um jogo de futebol, pois
quem está a comprar um barco não está á espera que lhe apareça uma clausula em que se
vincula em arbitrar um jogo de futebol, e isto seria uma surpresa, e logo isto á partida é uma
clausula que passa despercebida, pois a pessoa não está a contar com ela pois é uma cláusula
que tem que ver com outro assunto completamente diferente da compra de um barco, e este
artigo 8º alínea c) aplica-se a estas clausulas que a doutrina chama de clausulas surpresa.

No artigo 8º aliena d) “consideram-se excluídas dos contratos singulares as cláusulas inseridas


em formulários, depois da assinatura de algum dos contraentes”.

Mas aqui é logico, porque se forem inseridas depois das assinaturas essas cláusulas não terão
sido aceites pelo contraente, e portanto aqui, está dentro da lógica do artigo 4º.

RESUMINDO:

Afinal, não são só as cláusulas proibidas que acabam por ficar excluídas dos contratos. As
cláusulas proibidas ficam excluídas dos contratos porque são nulas, mas estas cláusulas que
violam o dever de comunicação, ou o dever de informação, ou passam despercebidas, ou são
cláusulas surpresa ou que foram inseridas á posteriori, também acabam por ser consideradas
como estando fora do contrato e ficam excluídas, e nestes casos o problema não é o conteúdo
e o teor das clausulas, pois o problema delas não é um problema intrínseco, o problema é o
modo em como foram comunicadas, como foram informadas, como foram apresentadas estas
mesmas clausulas, se tivessem sido cumpridos estes deveres todos eram válidas, o problema
está no modo como foram apresentadas ao aderente.

Claro que aqui num caso destes, estas cláusulas ficam excluídas de um contrato e também
surge o mesmo problema que vimos há bocado, quando uma cláusula é nula que é, a cláusula
nula dava origem a uma lacuna no negócio, e uma cláusula excluída do contrato também dá
origem a uma lacuna no negócio.

Porque imaginemos que 1, 2 ou 3 cláusulas ficam excluídas do contrato por causa do artigo 8º,
quer dizer que passa a haver 1, 2 ou 3 assuntos que deixam de estar regulados, e portanto, a
sua exclusão nos termos do artigo 8º pode dar origem a lacunas, e então aplica-se aqui o artigo
9º que diz “nos casos previstos no artigo anterior os contratos singulares mantêm-se,
vigorando na parte afectada as normas supletivas aplicáveis, com recurso, se necessário, às
regras de integração dos negócios jurídicos” e portanto, aqui é um regime exactamente igual
ao que vimos no artigo 13º nº 2 para as clausulas nulas, que é que como há uma lacuna que
resulta da exclusão de uma clausula, vai-se ver se há normas supletivas que regulem aquele
ponto, se há aplicam-se, se não houver normas imperativas nem supletivas, recorre-se aos
outros critérios do artigo 239 do CC, e portanto, como se vê, há uma segunda maneira de
proteger os aderentes, para além da proibição de certas clausulas, que é através da exclusão
de outras.

Há uma outra maneira de proteger os aderentes, que é através de uma regra especial em
matéria de interpretação do negócio jurídico, e quando eu expliquei o artigo 236, e na altura
chamei á atenção para o facto de haverem regras especiais sobre interpretação das clausulas
contratuais gerais que vem no artigo 11º deste diploma, e portanto, quando estamos perante

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uma clausula ambígua em que há duvidas sobre o seu sentido, se for uma clausula contratual
geral, não devemos basear-nos no artigo 236 do CC, mas sim no artigo 11º deste diploma que
é uma terceira maneira de proteger os aderentes, e diz assim o artigo 11º nº 1 “as cláusulas
contratuais gerais ambíguas têm o sentido que lhes daria o contratante indeterminado
normal que se limitasse a subscreve-las ou aceitá-las, quando colocado na posição de
aderente real”.

É evidente, que lendo o artigo 11º nº 1, é quase igual ao artigo 236 nº 1, mas não é, porque há
uma pequena diferença entre estes dois artigos. Há um ponto em comum, em ambos os casos
o juiz vai ver o que é que uma pessoa normal perceberia, mas há uma diferença, é que no
artigo 236 nº 1 na parte final há uma ressalva que diz, “salvo se o declarante não puder
razoavelmente contar com aquele sentido” enquanto que no artigo 11º nº 1, não há igual
ressalva àquela que havia na parte final do artigo 236 nº 1, e portanto, o artigo 11º nº 1 não é
exactamente igual ao artigo 236 nº 1, porque não contem a ressalva da parte final do artigo
236 nº 1.

Por outro lado, tínhamos visto a propósito da interpretação dos negócios jurídicos em geral,
que se mesmo aplicando o artigo 236, e se se mantivesse a dúvida aplicava-se o artigo 237, e
no artigo 237, se era um negócio gratuito, era num sentido mais favorável ao disponente, se
era oneroso, era o mais equilibrado, mas agora aqui é o artigo 11º nº 2, e diz neste artigo, que
em caso de dúvida prevalece sempre o sentido mais favorável ao aderente, e aqui não se
distingue se é oneroso ou se é gratuito, neste caso se houver duvidas, mesmo aplicando o 11º
nº 1, dá-se á cláusula contratual geral o sentido que seja mais favorável ao aderente.

Até agora neste diploma vimos três maneiras de proteger os aderentes;

1) Proibindo certas clausulas que se forem utilizadas são nulas.


2) Impondo ao utilizador certos deveres pré contratuais que esses não forem
respeitados ficam excluídas do contrato.
3) Através de uma regra mais favorável em matéria de interpretação.

E há uma quarta maneira de proteger os aderentes que é através de uma figura jurídica que
é a “acção inibitória”.

ACÇÃO INIBITÓRIA (Artigo 25º e seguintes)


Artigo 25º “as clausulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando
contrariem o disposto nos artigos 15º, 16º, 18º, 19º, 21º, e 22º podem ser proibidas por
decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares”.

O que a lei está a dizer neste artigo é que, se alguém pretender utilizar na sua contratação
clausulas proibidas, é possível ir pedir a proibição das cláusulas.

Á primeira vista, isto parece um absurdo, porque se sabemos que as clausulas proibidas são
nulas, saber qual é o interesse pratico de ir pedir a um juiz que proíba a inclusão nos contratos
de clausulas que a lei já proíbe, e quem pode pedir a proibição, diz o artigo 26º que não é
qualquer pessoa, nem qualquer aderente que pode intentar um acção inibitória, pois segundo
a lei quem tem legitimidade para intentar a acção são as associações de defesa do consumidor,

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associações sindicais e profissionais, o Ministério Publico, ou seja, só podem intentar a acção


inibitória e pedir ao juiz que proíba a utilização de clausulas que a lei proíbe, entidades que
visam tutelar interesses colectivos.

Os utilizadores das clausulas contratuais gerais sabem perfeitamente que muitas vezes
utilizam clausulas proibidas, mas os aderentes muitas vezes não sabem, e teoricamente vale a
pena arriscar por parte dos utilizadores, e a vantagem da acção inibitória é que, a partir do
momento em que o juiz proíba as clausulas, já não é muito vantajoso arriscar, porque uma das
consequências da acção inibitória, não é propriamente tornar a clausula nula, porque ela já o
é, a grande consequência da acção inibitória está no artigo 33º que diz “e o demandado
vencido na acção inibitória (quem utiliza clausulas contratuais gerais proibidas) e se infringir a
obrigação de se abster de utilizar ou de recomendar clausulas contratuais gerais proibidas
(…) incorre numa sansão pecuniária compulsória que não pode ultrapassar o dobro do valor
da alçada da Relação por cada infracção”.

Ou seja, se é uma empresa que vende 1000 automóveis por mês, se celebrar 1000 contratos
em que inclui nos 1000 contratos, uma clausula que já foi considerada proibida por sentença
num acção inibitória, arrisca-se por cada carro que venda, a pagar uma sansão pecuniária
compulsória, correspondente ao valor da alçada da Relação, e a sansão pecuniária pode ser o
dobro.

RESUMINDO

Se se perguntar qual é o interesse do juiz em proibir uma cláusula que já está proibida? E o
interesse é, por um lado poder aplicar sanções pecuniárias compulsórias, por outro lado,
apesar de tudo, inibe o utilizador de saber que o próprio tribunal e as associações de defesa
dos consumidores estão atentas e neste caso, a pessoa inibe-se.

Os aderentes são protegidos pela lei de quatro maneiras;

1) Clausulas proibidas.
2) Clausulas excluídas porque violaram deveres pré contratuais.
3) Norma interpretativa favorável aos aderentes.
4) Acção inibitória.

Mas, sempre que o aderente encontre noutros diplomas normas mais favoráveis, e imaginem
que no Código Civil há uma norma mais favorável ao aderente do que as normas do diploma
446/85, e nestes casos o aderente é sempre livre de invocar em seu proveito normas
exteriores a este diploma, pois ele não fica circunscrito apenas a este diploma como diz o
artigo 37º “ficam ressalvadas todas as disposições legais que em concreto se mostram mais
favoráveis ao aderente que subscreva ou aceite propostas que contenham clausulas não
negociadas individualmente”.

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Aula 27 e 28

CLAUSULAS ACESSÓRIAS DO NEGÓCIO JURÍDICO:

CONDIÇÃO – TERMO – MODO (Clausula modal) – Artigo 270 (Condição e


termo)
ARTIGO nº 270 (Noção de condição) “ as partes podem subordinar a um acontecimento futuro
e incerto a produção dos efeitos do negócio jurídico ou a sua resolução: no primeiro caso, diz-se
suspensiva a condição; no segundo caso; resolutiva ”.

Primeira ideia;

A condição é um facto futuro de verificação incerta, ou um facto futuro incerto, pois é um


facto que não existe á partida a certeza se se irá ou não verificar.

Só podemos dizer que o negócio está sujeito a uma condição, se de algum modo os seus
efeitos tiverem dependentes de um facto futuro que não existe a certeza de que se se vai ou
não verificar, tem que ser um facto de verificação incerta.

E quando um negócio jurídico está dependente de um facto futuro de verificação incerta,


dizemos que é um negócio condicional, e diz-se condicional, porque está sujeito a uma
condição.

A condição pode ser suspensiva ou resolutiva (artigo 270).

Exemplo:

CONDIÇÃO SUSPENSIVA
Imaginemos que eu celebro com este senhor um contrato de doação, ou seja, um contrato por
força do qual, eu lhe doo um bem e ele declara que aceita, mas no contrato diz-se que esse
contrato só produzirá efeitos quando ele acabar o curso de direito.

Estamos aqui perante um facto futuro e incerto, pois ninguém pode ter a certeza que
enquanto o curso não acaba, ninguém pode ter a certeza que ele vai acabar o curso, e se os
efeitos de um negócio jurídico estão dependentes de alguém fazer uma certa cadeira, mas que
ainda não a fez, ou de acabar determinado curso, ou ainda de abraçar uma certa profissão, ou
de ser eleito para um certo cargo, por muito provável que seja que isso aconteça, não é
absolutamente garantido, e portanto, está-se a fazer depender, se eu lhe dou-o o bem, mas
digo que a doação só produz efeitos quando ele acabar o curso de direito, no fundo, o que
estamos a fazer depender desta doação é de um facto futuro e incerto, que é acabar o curso, e
esta condição é suspensiva, porque estamos a dizer que, enquanto ele não acabar o curso o
negócio não produz efeitos, pois os efeitos estão paralisados até que ele acabe o curso.

Neste exemplo, eu estou a doar um bem ao vosso colega, mas estamos a dizer no contrato que
a doação só produzirá efeitos, e que a propriedade só se transmite para ele quando ele acabar
o curso, e como acabar o curso é um facto futuro e incerto, isso é uma condição, mas como
estamos a combinar que enquanto isso não acontecer, o negócio não produz efeitos, então
quer dizer que os efeitos estão paralisados, ou suspensos, até que se verifique a condição, que

Serafim Cortizo 20100059 Página 190

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neste caso é que ele eventualmente acabe o curso, e como até ele acabar o curso, o negócio
não produz efeitos, dizemos que é uma condição suspensiva, até que se verifique o tal facto
futuro incerto.

Exemplo:

CONDIÇÃO RESOLUTIVA
Imaginemos que eu fazia a mesma doação, mas o que se dizia lá era que se por acaso ele tiver
um neto, que a doação fica sem efeito, mas nesta doação, ela deixará de produzir efeitos se se
verificar um faco incerto que é ele vir a ter um neto.

Neste caso, a doação também está dependente de um facto incerto, alguém vir a ter um neto,
e enquanto não o tiver, é certo pois não pode haver a certeza de que eu não venha a ter um
neto, mas aqui esta condição já não é suspensiva, porque ainda há pouco era suspensiva
porque os efeitos não se produziam até que se verificasse a condição, mas agora estamos a
fazer o contrário que é, eu ficar imediatamente dono do bem, mas se ele vier ter um neto, o
bem regressa á procedência, ou seja, a relação extingue-se se ele vier a ter um neto, e então
aqui dizemos que a condição é resolutiva porque quando ela se verifica provoca a extinção
dos efeitos do negócio.

Quando a condição provoca a extinção dos efeitos do negócio, dizemos que ela e resolutiva e
que o negócio é resolvido, e sempre que a condição ao verificar-se, implica a extinção dos
efeitos dizemos que é uma condição resolutiva.

TERMO

Para se perceber bem o que é uma condição, tem que se distinguir condição e o termo, (artigo
278 e 279), mas a lei não define o que é que é um termo, mas podemos dizer que o termo; é
um facto futuro de verificação certa

Pode acontecer que as partes do negócio, façam depender do negócio a verificação de um


facto futuro certo, e então dizemos que o negócio não depende de um condição, mas que
depende de um termo.

Exemplo:

Eu posso celebrar um contrato de arrendamento com esta senhora hoje, imaginemos que ela é
dona de uma casa e celebra hoje comigo um contrato de arrendamento, mas combinamos que
o contrato só começa a produzir efeitos a 1 de Fevereiro, e portanto, se celebramos hoje um
contrato de arrendamento em que combinamos que só começa a produzir efeitos a 1 de
Fevereiro, o negócio tem os seus efeitos suspensos até dia 1 de Fevereiro, aqui os efeitos do
negócio estão dependentes de um facto certo (dia 1 de Fevereiro) e então dizemos que aqui
há um termo suspensivo, é um termo porque é certo que o decorrer do tempo levará a que
cheguemos ao dia 1 de Fevereiro.

O negócio só começa a produzir efeitos a partir de uma certa data futura, no fundo está-se a
estipular um termo, e aqui é um termo inicial ou suspensivo, porque está-se a dizer que o

Serafim Cortizo 20100059 Página 191

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negócio é celebrado hoje, mas só começa a produzir efeitos a partir de uma certa data, e isto é
um termo inicial ou suspensivo.

As pessoas estão mais habituadas a ouvir falar num termo final, ou seja, percebe-se mais
facilmente quando é um termo, quando se diz que um contrato é celebrado hoje, mas começa
imediatamente a produzir efeitos, mas termina a 31 de Agosto de 2012, aqui está-se a
estipular um termo final ou um termo resolutivo, porque agora está-se a dizer que o contrato
é imediatamente eficaz, mas deixará de produzir efeitos quando chegarmos ao dia 31 de
Agosto, e portanto, o negócio está dependente de um facto certo, porque é certo que chegará
o dia 31 de Agosto, só que é um termo resolutivo ou final, porque aqui está-se a prever que o
negócio produz imediatamente efeitos jurídicos, e deixará de produzir esses efeitos quando
chegarmos àquela data.

A ideia é a seguinte:

Quando as pessoas celebram negócios jurídicos, não são obrigadas a estipular uma condição
ou um termo, pois há imensos negócios que não têm condição nenhuma nem termo nenhum,
mas a lei admite, que ao abrigo da liberdade contratual se possa estipular num negócio
jurídico uma condição ou um termo (artigo 405 principio da liberdade contratual) e já vimos
que ao abrigo da liberdade contratual, não há só liberdade de celebração, mas há também
liberdade de estipulação, e portanto, faz parte da liberdade contratual estipular as clausulas
que bem nos aprouver, excepto as que sejam proibidas por lei, e se a lei não proibir a condição
ou o termo, elas podem ser estipuladas.

Regra geral, a lei não proíbe a condição, nem proíbe o termo, e na esmagadora maioria dos
negócios jurídicos é possível apor uma condição e um termo se se quiser, ao abrigo da
liberdade contratual.

Mas há no entanto negócios em que a lei não permite a estipulação de condição ou de termo,
e um dos casos é o casamento, onde não pode haver nem um termo inicial nem um termo
final, nem pode haver um casamento sob condição, que está previsto no artigo 1618 nº 2 onde
se diz que “consideram-se não escritas as clausulas pelas quais os nubentes em convenção
antenupcial, no momento da celebração do casamento ou em outro acto, pretendam
modificar os efeitos do casamento, ou submete-lo a condição, termo ou á preexistência de
algum facto”, portanto, num casamento não pode haver condição nem termo, pois é uma
norma que expressamente o proíbe e também acontece no acto de perfilhação no artigo 1852
nº 1, que diz que “o acto de perfilhação não comporta clausulas que limitem ou modifiquem
os efeitos que lhe são atribuídos por lei, nem admite condição ou termo”, ou seja, não posso
perfilhar uma pessoa e dizer que só produz efeitos daqui a X anos, e como diz o artigo 1852, o
acto de perfilhação não admite condição nem termo.

E isto para demonstrar que quando a lei quer proibir a condição ou o termo, a lei não faz
cerimónias e proíbe mesmo, e quando a lei nada diz é porque pode haver condição ou termo,
e por isso é que eu digo que na esmagadora maioria dos negócios jurídicos, é possível, se se
quiser, estipular-se uma condição ou um termo porque a liberdade contratual assim o
concede.

Serafim Cortizo 20100059 Página 192

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A condição é um facto futuro de verificação incerta, o termo é um facto futuro de verificação


certa. Quando um negócio está dependente de um facto futuro, que não é certo se se vai ou
não verificar é uma condição, se está dependente de um facto futuro, que é certo que se vai
verificar, então é um termo.

Nos exemplos que eu dei, quer a condição, quer o termo, podem ser suspensivos e quer a
condição, quer o termo podem ser resolutivos, e o termo resolutivo também se chama termo
final, por exemplo, um contrato de trabalho válido até certa data.

Dentro do termo, há que distinguir termo certo e termo incerto, e aqui a questão chave é,
apesar de haver um conceito de termo incerto, o termo incerto não é a mesma coisa que
condição, e portanto, a primeira questão é saber distinguir condição e termo, (condição facto
futuro e incerto, e o termo facto futuro e certo) mas depois dentro do termo, existe o termo
certo e o termo incerto, porque quando de diz que o termo é um facto futuro certo, o que se
quer dizer com isso é que se houver a certeza de um certo facto se vai verificar é um termo,
mas há casos em que há a certeza de que um facto se vai verificar, mas que não se sabe
quando, por exemplo a morte de alguém, e no caso da morte de alguém, é certo que alguém
irá morrer, e então há aqui um termo, mas já não é certa a data da morte, e quando um facto,
é certo que se vai verificar, mas que não se sabe quando, dizemos que é um termo incerto,
pois é certo que o termo se vai verificar, mas não se sabe é quando, mas se for um caso em
que há uma dupla certeza quanto à verificação do facto e a certeza quanto ao momento,
dizemos que e um termo certo, se houver apenas certeza quanto á verificação do facto, mas
não há certeza quanto ao momento, é um termo incerto, como por exemplo, dizer que
determinado negócio só produz efeitos quando fulano tal morrer, mesmo que se diga “se
morrer”, agora, já seria condição se se dissesse “se morrer esta semana” e se um negócio está
dependente da morte de alguém, seja como causa suspensiva ou resolutiva, está dependente
de um termo.

Se é certo que se vai verificar um facto, mas não se sabe quando, é um termo incerto, se há a
certeza quanto ao facto e quanto ao momento, é termo certo.

Exemplo:

Se se diz assim “este contrato só começa a produzir efeitos se o José Seguro chegar a primeiro-
ministro ” isso é uma condição, pois depende de um futuro incerto, mas se disser “que este
negócio só começa a produzir efeitos quando o Passos Coelho deixar de ser primeiro-
ministro”, aqui é absolutamente certo que ele deixará de ser primeiro-ministro e se um
negócio tem os efeitos dependentes de alguém sair de um cargo, como é profundamente
certo que alguém, mais tarde ou mais cedo deixará de exercer certo cargo, isso é um termo,
pode ser é um termo incerto, porque não se sabe a data exacta, mas é um termo.

Mas já alguém ir para um cargo, mas que não é garantido que para lá irá, chegar a primeiro-
ministro, é uma condição que está aqui em causa, e é um facto futuro e incerto, mas se está
dependente de alguém que é ministro e deixar de o ser, então não é uma condição, é um
termo porque é certo que o vai deixar de o ser, pode não se saber é quando.

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No artigo 270 mostra-nos que a condição é um acontecimento futuro incerto, e é por isso que
depois a doutrina diz que o termo é um acontecimento futuro certo, e portanto, na condição
há uma dupla incerteza, pois não se sabe quando é que um facto se vai verificar e muito
menos se sabe quando.

ARTIGO 271 (Coisas ilícitas ou impossíveis) nº 1 “é nulo o negócio jurídico subordinado a uma
condição contrária à lei ou á ordem publica, ou ofensiva dos bons costumes”, nº 2 “é
igualmente nulo o negócio sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente
impossível; se for resolutiva, tem-se a condição por não escrita”.

Nos já vimos que eram nulos os negócios contrários á lei, à ordem pública ou aos bons
costumes (artigo 280) onde o objecto era contrário á lei, á ordem publica e aos bons costumes,
ou o objecto impossível, mas aqui (artigo 271) está-se a imaginar um caso em que há um
negócio em que poderá ser todo ele válido, só que tem uma clausula, uma condição, e essa
sim, é uma condição contraria á lei, á ordem publica e aos bons costumes, e então o nº 2 do
artigo 271 também diz que é nulo o “negócio jurídico sujeito a uma condição suspensiva que
seja física ou legalmente impossível e se a condição for resolutiva, tem-se esta condição por
não escrita”. O artigo 271 tem que ser relacionado com o artigo 280 como já vimos.

Aqui a ideia é a seguinte;

Podemos estar confrontados com um negócio jurídico, e quando eu digo negócio jurídico, não
quer dizer que é forçosamente um contrato, porque a matéria da condição e do termo, aplica-
se, quer o negócio seja um negócio unilateral, quer seja um contrato, pois pode haver
condições e termos em negócios unilaterais, como podem haver condições e termos em
contratos e a lei prevê a hipótese de haver condições e termos, por exemplo, em testamentos,
que é um negócio unilateral, e também já vimos condições e termos em contratos, portanto,
desde que a lei não o proíba, é possível haver uma condição ou um termo.

No entanto a lei diz que “é nulo o negócio subordinado a uma condição contrária á lei, á
ordem publicam ou ofensiva dos bons costumes”, estilo “este negócio só produzirá efeitos
quando matares a tua mulher” e neste tipo de cláusulas está-se a fazer depender uma
condição suspensiva contrária á lei, pois está-se a pressupor a prática de uma conduta ilegal
que é o homicídio de outra pessoa.

A lei diz que também é nulo “o negócio sujeito sujeito a uma condição suspensiva que seja
física ou legalmente impossível”, mas aqui no nº 2 há uma diferença, pois quando a condição
é suspensiva, se for fisicamente ou legalmente impossível o negócio é nulo, mas se for uma
condição resolutiva, se ela for fisicamente ou legalmente impossível, o negócio é válido visto
que a lei diz que a condição se considera não escrita.

Portanto, quando é uma condição suspensiva, se ela for fisicamente ou legalmente


impossível, isso torna o negócio nulo, enquanto se for uma condição resolutiva, física ou
legalmente impossível, o que a lei diz é que a condição se considera não escrita, mantém-se
o resto do negócio sem esta condição.

O problema deste artigo é que se aplica a todos os negócios jurídicos, excepto às doações e
aos testamentos, e quem leia este artigo (artigo 271) não tem pista nenhuma para concluir

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que não se aplica às doações e aos testamentos, mas de facto o artigo 271 aplica-se a todo e
qualquer negócio jurídico, excepto a testamentos e a doações, e se houvesse uma condição
impossível, ou contrária á lei num testamento ou numa doação, não se pode ir ao artigo 271, e
digo isto, porque no capitulo das doações e dos testamentos encontramos regras especiais
para as condições e termos que sejam ilícitas ou impossíveis, e portanto, se há um regime
especial, aplica-se o regime especial, mas há uma diferença entre o regime especial e o regime
geral.

No caso dos testamentos, a lei tem um regime especial para as condições impossíveis,
contrarias á lei, á ordem publica e aos bons costumes no artigo 2230, que se aplica
directamente aos testamentos, e fica desde já demonstrado que se houver um condição
impossível ou uma condição contrária á lei num testamento, não se deve ir ao artigo 271, mas
sim ao artigo 2230, mas este artigo também se aplica às doações, porque no capitulo das
doações há uma norma jurídica remissiva (artigo 967) que remete o regime do testamento,
sendo que este artigo manda aplicar às condições impossíveis ou ilícitas, ou contarias á ordem
publica ou aos bons costumes, dizendo que “ficam sujeitas às regras estabelecidas em
matéria testamentária”, e portanto, o artigo 967, na prática, manda aplicar às condições, a
regra do artigo 2230, e portanto, o artigo 2230 aplica-se tanto quando há uma condição
contrária á lei num testamento, quer uma condição contraria á lei numa doação, quer á
situação impossível num testamento, quer à situação impossível numa doação, e isto por
causa da remissão do artigo 967.

Vamos comparar a redacção dos dois artigos, o que é que há de igual ou diferente no artigo
271 e no artigo 2230.

Artigo 271 nº 1, “é nulo o negócio jurídico subordinado a uma condição contrária á lei ou á
ordem publica ou ofensiva dos bens costumes”.

Artigo 2230 nº 2, “a condição contrária à lei ou à ordem publica, ou ofensiva dos bons
costumes, tem-se por não escrita”.

Isto quer dizer que a condição não vale, mas que o resto da doação e do testamento
mantém-se, e lendo o nº 2 do artigo 2230, se for estipulada uma condição contrária á lei, á
ordem pública ou aos bons costumes, a condição não vale nada, mas o resto do negócio
mantém-se e não é afectado pela condição.

Enquanto no artigo 271 nº 1, se diz que “é nulo o negócio jurídico” e não a condição, e nos
negócios em geral, ou seja, fora do exemplo da doação e do testamento, uma condição que
seja contraria á lei, ou á ordem publica e aos bons costumes, torna nulo todo o negócio,
enquanto na doação ou num testamento, a condição contrária á lei, ou á ordem publica ou
aos bons costumes, só ela é que é considerada nula e só ela é que é retirada do negócio, mas
o restante do negócio mantém-se porque ela até se considera não escrita.

E também há uma diferença no regime da condição impossível, porque no regime da condição


impossível, se for um negócio que não seja uma doação, nem um testamento, aplicando o
artigo 271 nº 2, porque imaginemos que há um negócio qualquer que não é uma doação nem
um testamento, mas que tem uma condição impossível estilo “esta doação produz efeitos se

Serafim Cortizo 20100059 Página 195

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atravessares o Canal da Mancha a nado num minuto” se não é uma doação, nem um
testamento, mas se é um contrato qualquer, aplicando o artigo 271 nº 2, a lei diz que é nulo o
negócio jurídico (venda ou contrato de trabalho sujeito a uma condição suspensiva ou
impossível) sujeito a uma condição suspensiva que seja física ou legalmente impossível, neste
caso, no fundo não é só a condição, é o negócio que é nulo, mas se for uma condição
resolutiva estilo “esta venda fica sem efeitos se tu não conseguires ir até ao Sol”, e num caso
destes, estaremos perante um negócio sujeito a uma condição resolutiva, ao estilo “produz
efeitos mas se não fores lá deixa de produzir”, e se é uma condição resolutiva impossível, diz a
parte final do artigo 271 nº 2 que ela se considera não escrita e se for uma condição
resolutiva que é impossível, o negócio mantem-se sem a condição, ao contrário da
suspensiva onde o negócio é nulo.

Mas imaginemos que era numa doação ou num testamento que havia uma condição
impossível, e neste caso aplicava-se o artigo 2230 nº 1 que diz “a condição física ou
legalmente impossível considera-se não escrita (…) ”, aqui no caso da doação ou do
testamento, qualquer condição impossível considera-se não escrita, mas o resto do negócio
mantém-se e isto é diferente do artigo 271 nº 2, onde só é igual para a condição resolutiva,
porque na suspensiva o negócio era todo nulo, e portanto, o regime do artigo 2230 nº 1 é
parecido ao da parte final do nº 2 do artigo 271.

Para a condição resolutiva impossível não há diferenças, a condição sai do negócio, mas fica
o resto, na condição suspensiva impossível há diferenças, porque no artigo 271 se a condição
impossível é uma condição suspensiva, o negócio é todo nulo, enquanto na doação ou no
testamento, se a condição é impossível, seja resolutiva ou suspensiva, o negócio é sempre
válido, e o que sai do negócio é apenas a condição.

RESUMINDO:

Se se está a resolver um caso pratico em que há um negócio jurídico sujeito a uma condição
impossível, ou sujeito a uma condição contrária á lei, não podemos imediatamente ir para o
artigo 271, devemos ir para o artigo 271, excepto se for uma doação ou um testamento, se
for uma doação ou um testamento, vai-se para o artigo 2230.

Imaginemos que há um caso em que não se sabe bem que negócio é que é, abrem-se duas sub
hipóteses, dizendo-se, se é uma doação ou um testamento resolve-se o caso com base no
artigo 2230, se for um negócio que não seja uma doação nem um testamento, resolve-se o
caso com base no artigo 271.

A lei dá exemplos de condições contrárias á lei, a propósito do testamento, no artigo 2232,


dizendo que “consideram-se contrárias á lei a condição de residir ou não residir em certo
prédio ou local, de conviver ou não conviver com certa pessoa, de não fazer testamento, de
não admitir a determinada pessoa os bens deixados ou de os não partilhar ou dividir, de não
requerer inventário, de tomar ou deixar de tomar o estado eclesiástico ou determinada
profissão e as cláusulas semelhantes”.

Serafim Cortizo 20100059 Página 196

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Exemplo:

Imaginemos um testamento que diz assim, este testamento deixa de produzir efeitos se tu
deixares de ser padre, ou este testamento só produz efeitos se tu passares a ser padre, neste
caso é uma condição contrária á lei, porque a lei não quer que se possam subordinar os efeitos
do testamento ou da doação, a alguém adoptar, ou deixar de adoptar um estado eclesiástico,
ou por exemplo, esta doação fica sem efeitos se fores morar para o bairro tal, e neste caso,
seria uma condição contraria á lei por causa do artigo 2232, essas clausulas são contrarias á lei
e num testamento, ou numa doação, sendo contrárias á lei, consideram-se não escritas, já nos
negócios em geral, no artigo 271, isso pode implicar a nulidade de todo o negócio.

A lei proíbe este tipo de cláusulas porque são cláusulas, que segundo a lei, atentam contra a
liberdade de auto determinação das pessoas em matéria relevante da sua vida privada, e
portanto, a lei entende que essas cláusulas consideram-se não escritas em conformidade com
o artigo 2230.

ARTIGO 272
Artigo 272 “aquele que contrair uma obrigação ou alienar um direito sob condição suspensiva,
ou adquirir um direito sob condição resolutiva, deve agir, na pendência da condição, segundo
os ditames da boa-fé, por forma que não comprometa a integridade do direito da outra parte”.

Exemplo:

Imaginemos que eu transmito um bem àquela senhora, e transmito sob condição suspensiva,
seja uma venda ou uma doação, mas estava previsto que só produziria efeitos quando se
verificar um certo facto futuro, e enquanto não se verificar certo facto futuro, o bem é meu
porque o negócio não produziu efeitos.

Eu vendi-lhe ou doei-lhe sob condição suspensiva, e enquanto não se verificar a condição


aquele negócio não produz efeitos, logo, o bem é meu, mas será que sendo o bem meu eu
posso fazer fazer o que me apetece? Parti-lo ou estraga-lo? Teoricamente poderia porque o
bem é meu, mas isso iria por em causa a expectativa da pessoa a quem eu vendi ou doei,
porque ela tem a expectativa de se verificar a condição, de o negócio vir a produzir efeitos.

Isto era um negócio sob condição suspensiva e enquanto não se verificar a condição, dizemos
que estamos na pendência da condição, a pendência da condição é aquele intervalo de
tempo que se verifica entre a data do negócio e a data da verificação da condição. O negócio
é agora, a condição é, se se verificar é no futuro, neste intervalo de tempo em que há um
negócio mas que ainda não se verificou a condição, dizemos que estamos na pendencia da
condição e a lei diz que “no caso de alienação sob condição suspensiva, o alienante, tem que
agir segundo os ditames da boa-fé ”, e agir segundo os ditames da boa-fé, é agir de modo a
não prejudicar o futuro direito da outra pessoa, e portanto, eu não devo destruir nem danificar
o bem, eu devo cuidar do bem, isto no caso da condição suspensiva.

Exemplo:

Imaginem que eu vendi ou doei a alguém, mas que foi uma transmissão sob condição
resolutiva. Se há uma condição resolutiva a propriedade é minha ou passou a ser do outro?

Serafim Cortizo 20100059 Página 197

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Se é resolutiva, o negócio produz efeitos imediatamente, e só deixará de produzir efeitos se se


verificar a condição, por exemplo, eu vendi ou doei um bem, mas há uma cláusula que diz que
se eu tiver um neto o negócio fica sem efeito, mas enquanto eu não tiver um neto o negócio
produz efeitos, isto é uma condição resolutiva.

Então na condição resolutiva a dona do bem é a pessoa a quem foi transmitido o bem e quem
tem que agir de boa-fé, é a pessoa a quem eu vendi ou doei, porque ele sabe que há a
possibilidade pratica de o bem regressar para mim se se verificar a condição de eu ter o tal
neto, e neste género de situação, há uma condição resolutiva, o bem é do transmissário, a
pessoa a quem eu transmiti esse bem, mas ele sabe que existe a possibilidade prática de
deixar de ser dono do bem se se verificar a condição, e portanto, nesse caso quem tem que
agir segundo os ditames da boa-fé, é a pessoa a quem eu vendi ou doei sob condição
resolutiva, que deve ter cuidado com o bem e deve praticar actos de conservação, que é isso
que a lei quer dizer quando através desta frase um pouco arrevesada diz que “aquele que
contrai uma obrigação ou aliena um direito sob condição suspensiva, ou adquire um direito
sob condição resolutiva deve agir segundo os ditames da boa-fé para não comprometer o
direito do outro”.

Na condição suspensiva era o direito do outro que ia adquirir o bem, na condição resolutiva é
o direito de o bem regressar á primitiva pessoa.

Para completarmos o artigo 272, temos o artigo 273 que diz que “na pendência da condição
suspensiva, o adquirente do direito pode praticar actos conservatórios, e igualmente os pode
realizar, na pendência da condição resolutiva, o devedor ou o alienante condicional”.

Exemplo:

Imaginemos que eu vendi ou doei uma coisa a este senhor sob condição suspensiva, enquanto
não se verificar a condição, o negócio não está a produzir efeitos, e portanto, o bem é meu,
mas já vimos que eu devo agir de modo a não prejudicar o futuro direito dele.

Imaginemos que o bem precisa de obras urgentes e eu não as faço, a casa está a ruir e eu não
faço nada, porque estou a presumir que mais tarde ou mais cedo o bem vai ser dele, e ele que
ainda não é o dono, porque ainda estamos na pendência da condição, ele pode desde já
praticar actos conservatórios que é o que diz a lei, porque mesmo ele não sendo o dono do
bem, tem a expectativa de vir a ser o dono, e então o adquirente sob condição suspensiva,
ainda antes de ter adquirido o bem, pois ainda está na pendencia da condição, já pode praticar
actos de conservação do bem para proteger o seu futuro direito.

E o mesmo se diga, segundo a lei, se for uma condição resolutiva, aí o bem transmitiu-se, e se
eu tiver vendido ou doado sob condição resolutiva, ele ficou imediatamente dono mas sou eu
que tenho a esperança de readquirir o bem, se tiver o tal neto, o bem volta a ser meu e então,
aqui quem tem que agir de boa-fé, é ele face ao bem, pois se ele deixa o bem degradar-se, eu
que já fui dono, mas que o cedi sob condição resolutiva e deixei de ser o dono, eu posso
praticar actos conservatórios, e quem pode praticar actos conservatórios, a originalidade do
artigo não é dizer que o dono pode praticar actos conservatórios, mas também pode praticar
actos conservatórios, aquele que será dono se se verificar a condição, e por isso, tendo em

Serafim Cortizo 20100059 Página 198

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conta os artigos 272 e 273, é que se diz que, num negócio sob condição suspensiva, o
adquirente ainda antes de verificada a condição, já goza de uma expectativa jurídica, é uma
esperança protegida por lei, porque ele até já pode praticar actos conservatórios desse bem,
sendo que quem venda ou doe sob condição suspensiva, apesar de ele ainda não ser dono do
bem, ele já tem uma expectativa e uma esperança de vir a adquirir o bem, e é uma esperança
que é protegida pelo direito, e a prova em como é protegida, é que ele pode exigir de mim que
eu actue segundo os ditames da boa-fé, e ele pode até praticar actos conservatórios, e por isso
é que se diz que quando a sua esperança é juridicamente protegida é chamada de
expectativa jurídica.

Há negócios em que ao abrigo da liberdade negocial, os efeitos do negócio estão


subordinados a um facto futuro, e quando os efeitos de um negócio estão subordinados a um
facto futuro, teremos que saber se é um facto certo ou um facto incerto. Se é certo que
aquele facto se vai verificar, dizemos que é um termo, se não é certo que aquele facto se vai
verificar dizemos que é uma condição.

Quer a condição quer o termo podem ser suspensivos ou resolutivos, portanto a diferença
entre suspensivo e resolutivo não é só para a condição, pois também o termo pode ser
suspensivo ou resolutivo, sendo certo que quando é um termo suspensivo, muitas vezes diz-
se que é um termo inicial e quando é um termo resolutivo diz-se que é um termo final.

Mas é perfeitamente possível haver uma condição suspensiva, em que o negócio é celebrado
agora, mas começa a produzir efeitos no futuro quando se verificar a condição (condição
suspensiva) mas também pode haver um termo suspensivo que é o negócio ser celebrado
agora e combinar-se que só começa a produzir efeitos a partir de certa data.

Mas a condição e o termo também podem ser resolutivos, ou seja, pode haver um negócio que
produza imediatamente efeitos, mas que há uma clausula que diz que, se se verificar um certo
facto futuro e incerto, nesse caso é um a condição, o negócio deixa de produzir efeitos, e
nesse caso é uma condição resolutiva, mas se se disser que deixa de produzir efeitos se se
verificar um facto futuro certo, então é um termo resolutivo.

Dentro do termo há que distinguir termo certo e termo incerto, havendo um ponto em
comum, é que ambos são termos, e quer seja termo certo ou termo incerto são um facto
futuro de verificação certa, a diferença é que no termo certo não é apenas a verificação do
facto que é certa, a data também é certa, chama-se termo certo porque tudo é certo, quer a
verificação do facto, quer a data exacta, enquanto, no termo incerto, é certo que se vai
verificar um facto, mas não se sabe quando, e a incerteza neste caso é apenas quanto á data,
enquanto na condição há uma incerteza quanto á própria verificação. Há aqui uma diferença,
na condição a verificação é incerta, no termo incerto, a verificação é certa mas a data é que
é incerta.

Quando há uma transmissão sob condição suspensiva, o adquirente enquanto não se verifica a
condição, não é dono do bem, mas já goza de uma expectativa jurídica e pode exigir do
alienante, que aja de acordo com a boa-fé, e pode o próprio adquirente praticar actos
conservatórios. Se for uma transmissão sob condição resolutiva, o bem transmite-se
imediatamente, mas quem fica com a expectativa jurídica é o alienante, pois tem a esperança

Serafim Cortizo 20100059 Página 199

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de voltar a ter aquele direito, impondo a boa-fé ao outro, e impondo também actos
conservatórios.

CONDIÇÃO E TERMO – Artigo 270 e seguintes (Conclusão)


Condição: facto futuro de condição incerta, e quando um negócio está subordinado a uma
condição, quer dizer que está dependente de um facto que não há a certeza se se irá ou não
verificar no futuro.

Termo: se um negócio estiver subordinado a um facto que há a certeza que se vai verificar,
então falamos em termo, portanto, é um facto futuro de verificação certa.

Dentro de um termo, há que distinguir termo certo e termo incerto, porque apesar de o
termo ser um facto de verificação certa, nem sempre se sabe o momento exacto, e será um
termo incerto quando há a certeza que o facto se vai verificar, mas não se sabe quando,
como por exemplo, se os efeitos de um negócio estão de algum modo dependentes da morte
de uma pessoa, apesar de não se saber quando é que a pessoa irá morrer, é garantido que vai
morrer, e portanto, aí não estamos perante uma condição, pois é certo que o facto se vai
verificar.

Se é certo que se vai verificar é um termo, mas depois se não se souber quando, é um termo
incerto.

O termo é certo se se souber quando é que vai verificar e é incerto quando não se sabe
quando é que vai verificar, mas é termo porque há a certeza que o facto de vai verificar.

Quer a condição, quer o termo, podem ser suspensivos ou podem ser resolutivos, e quando
certo facto seja uma condição ou um termo que tem caracter suspensivo, isso significa que o
negócio é celebrado agora, mas só produzirá efeitos quando se verificar o tal facto futuro. Se
está dependente de uma condição suspensiva quer dizer que o negócio é celebrado agora e só
produzirá efeitos quando se verificar o tal facto futuro incerto, por exemplo, ao dizer-se “dou-
te isto mas só produzirá efeitos se acabares o curso de direito” e como isto é um facto de
verificação incerta, o negócio está dependente de uma condição, porque é uma condição
suspensiva, porque enquanto não se verificar o facto, o negócio é válido mas não produz
efeitos porque a não verificação da condição suspende os efeitos do negocio, e só quando ela
se verificar é que o negócio produz efeitos.

Mas tal como pode haver uma condição suspensiva, também pode haver um termo suspensivo
que também se chama termo inicial, por exemplo, se se disser assim “este negócio só produz
efeitos a partir de dia 1 de Fevereiro”. O negócio foi celebrado hoje, mas tem os seus efeitos
suspensos até dia 1 de Fevereiro, e como dia 1 de Fevereiro é um termo, e isto é um facto
certo, então dizemos que o negócio está dependente de um termo suspensivo que também se
chama termo inicial.

Também pode acontecer que quer a condição, quer o termo sejam resolutivos e esta distinção
entre suspensivo e resolutivo é feita no artigo 270 a propósito da condição, mas também há
que o fazer a propósito do termo, pois não é só a condição que pode ser suspensiva ou
resolutiva, mas também o termo pode ser suspensivo ou resolutivo, e uma condição resolutiva
seria, por exemplo, fazer uma doação a alguém e dizer “esta doação fica sem efeito se eu tiver

Serafim Cortizo 20100059 Página 200

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um neto”, aí está-se a dizer que o negócio é imediatamente eficaz, mas que deixará de
produzir efeitos, resolve-se, se se verificar um facto futuro incerto e aí é uma condição
resolutiva.

Pode haver um termo resolutivo ou final, por exemplo, se se disser assim “este contrato
produz efeitos até 31 de Janeiro”, quer dizer que até 31 de Janeiro está a produzir efeitos, e
chegados às 24 horas do dia 31 de Janeiro, automaticamente deixa de produzir efeitos, como
por exemplo, nos contratos a prazo, que são contratos sujeitos a um termo resolutivo ou
termo final, mas se se disser que o negócio deixa de produzir efeitos, se se verificar um facto
que não há a certeza que se irá verificar, é uma condição resolutiva.

Convém que fique claro, que quer a condição quer o termo, podem ser suspensivos ou
resolutivos, a diferença é saber, se estamos perante um facto futuro de verificação certa ou se
estamos perante um facto futuro de verificação incerta.

Quer a condição, quer o termo são admissíveis á luz da liberdade contratual, pois é possível,
quer num contrato, quer num negócio unilateral estipular uma condição ou um termo, pois há
inúmeros contratos que estão sujeitos a condição ou a termo, e até negócios unilaterais, como
por exemplo, testamentos sujeitos a condições, e só não é possível estipular uma condição ou
um termo quando a lei o proíbe, pois há limites á liberdade contratual, pois há casos em que a
lei é livre de proibir a condição ou o termo, como por exemplo, num casamento não pode
estar sujeito a condição ou a termo.

ARTIGO 274
Artigo 274 nº 1 “os actos de disposição dos bens ou direitos que constituem objecto do negócio
condicional, realizados na pendência da condição, ficam sujeitos á eficácia ou ineficácia do
próprio negócio, salvo estipulação em contrário”, Artigo 274 nº 2 “se houver lugar á restituição
do que tiver sido alienado, é aplicável, directamente ou por analogia, o disposto nos artigos
1269 e seguintes em relação ao possuidor de boa-fé”.

No artigo 274 nº 1, fala-se em actos de disposição de bens realizados na pendência da


condição, e pendência da condição, é o período de tempo que medeia entre a celebração do
negócio e a verificação da condição, e o artigo 274 prevê que na pendência da condição,
serem celebrados negócios jurídicos e a questão que se coloca é saber o que é que acontece a
estes negócios no dia em que se verificar a condição.

Exemplo:

Imaginemos que eu fiz uma doação a uma pessoa sob condição suspensiva, a uma pessoa
quando ela acabar o curso de direito, e enquanto não se verificar a condição suspensiva, o
bem continua a pertencer-me a mim, porque a doação ainda não produziu efeitos e nesse caso
o bem continua a ser do doador.

E imaginemos que eu, com o argumento de que sou o dono, na pendência da condição, decido
vender esse bem a este senhor, o tal bem que eu doei a este vosso colega sob condição
suspensiva de ele acabar o curso. Eu tenho legitimidade para vender porque sou o proprietário
do bem, mas o que a lei diz no artigo 274 é que “o acto de disposição de bens que constitui
objecto do negócio condicional, que é o caso, porque eu doei, faz de conta, um andar, e agora

Serafim Cortizo 20100059 Página 201

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na pendência da condição, vendo a outra pessoa, temos aqui um acto de disposição de um


bem que é objecto de um negócio condicional que é celebrado na pendência da condição
resolutiva. O que a lei diz não é que o negócio é inválido, diz que fica sujeito á eficácia ou
ineficácia do próprio negócio”.

Isto quer dizer que, eu vendo-lhe o bem, a propriedade transmite-se para ele, mas se por
alguma razão se vier a verificar a condição, no dia em que se verificar a condição, a doação que
eu lhe fiz torna-se eficaz, e no momento em que a doação que eu fiz a este senhor se tornar
eficaz, no mesmo instante, a venda que eu fiz àquele senhor torna-se ineficaz, ou seja, ele
adquiriu a propriedade do bem, mas sabe que está sujeito a perder o bem se se vier a verificar
a condição.

Ou seja, isto é um caso, em que a verificação da condição faz este vosso colega adquirir o bem
e faz aquele colega perder o bem, ou seja, no ponto de vista daquele colega tem um efeito
resolutivo, pois resolve o direito que ele adquiriu, e do ponto de vista desse colega tem um
efeito aquisitivo.

Repito este exemplo:

Eu doei a este senhor, mas sob condição suspensiva, mas o bem continua a ser meu porque
ainda não se verificou a condição, e como o bem é meu, eu tenho legitimidade para o vender,
porque a lei não o proíbe, e eu posso ir vender a um terceiro, e o terceiro torna-se dono
porque comprou ao dono, mas a eficácia deste negócio de disposição, como diz a lei, depende
da eficácia do outro, quer dizer, este negócio é eficaz enquanto o outro negócio for ineficaz e
no dia em que o primeiro negócio for eficaz o segundo negócio torna-se ineficaz.

Vamos ver um exemplo e aplicação deste artigo mas desta vez numa condição resolutiva.

Exemplo:

Eu fiz uma venda a esta senhora sob condição resolutiva, dizendo que, se por acaso eu não
herdar bens de uma certa pessoa, terei direito reaver o bem, portanto, eu vendi-lhe sob
condição resolutiva e ela fica dona do bem, mas se quando essa pessoa morrer não me deixar
bens em testamento, que é um facto incerto, visto que há sempre a possibilidade prática de
me serem deixados bens em testamento.

A venda é imediatamente eficaz, mas se estipularmos que quando uma certa pessoa morrer se
não me deixar bens em testamento, que o bem reverteria á procedência.

Eu fiz uma venda sob condição resolutiva, e a vossa colega tornou-se dona do bem, mas
deixará de ser dona do bem no dia em que se verificar a condição resolutiva, mas até lá é
dona, e como na pendência da condição ela é dona, imaginemos que ela na pendência da
condição vai vender ou doar o bem a um terceiro, ou seja, este negócio é eficaz e como dia
aqui a lei, “o acto de disposição realizado na pendencia da condição fica sujeito á eficácia ou
ineficácia do negócio condicional”, ou seja, enquanto o negócio condicional estiver a produzir
efeitos, esta transmissão também produz, no dia em que o negócio condicional deixar de
produzir efeitos, porque se verificou a condição resolutiva, este segundo negócio também
deixará de produzir efeitos, e como se pode ver, resulta do artigo 274, que na pendência da

Serafim Cortizo 20100059 Página 202

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condição, a pessoa que efectivamente é titular do direito pode dispor do direito, só que quem
o adquirir, na pendência da condição, já sabe que há o risco se se vier a verificar a condição de
num negócio em que ele até é alheio, de o bem reverter á procedência e tornar ineficaz o
negócio feito inicialmente, feito da pendência da condição, era eficaz.

ARTIGO 275
Artigo 275 nº 1 “a certeza de que a condição se não pode verificar equivale á sua não
verificação” nº 2 “se a verificação da condição for impedida, contra as regras da boa-fé, por
aquele a quem prejudica, tem-se por verificada; se for provocada, nos mesmos termos, por
aquele a quem aproveita, considera-se como não verificada”.

No artigo 275 nº 1, há casos em que se o negócio está dependente de que chegará amanhã, se
constatarmos que depois de manhã não choveu, não se vai continuar á espera não se sabe do
quê, e portanto, há casos em que os factos levam a que haja a certeza de um determinado
momento, pois pode haver aquela situação em que se chega á conclusão em que será
eventualmente impossível a uma determinada mulher ser mãe, admitindo que determinado
negócio depende do facto de ela vir a ser mãe.

O nº 2 do artigo 275, quer prever o seguinte, um caso em que a pessoa que transmitiu o bem
sob condição, entretanto, está arrependida e vai agir de modo a impedir a verificação da
condição.

Exemplo:

Imaginemos que eu doei um bem a uma pessoa sob condição suspensiva de ela acabar o curso
de direito, só que entretanto, eu estou arrependido do negócio que celebrei e imaginem que
eu agia de modo ilegal para tentar impedir que a pessoa pudesse acabar o curso de direito, e
se se viesse a provar que a pessoa “impedir a verificação contra as regras da boa-fé a
condição considera-se como verificada”, neste caso, se a verificação da condição for obtida
contra as regras da boa-fé, é como se tivesse tirado o curso “considera-se como verificada” e
isto é uma ficção jurídica, porque a lei ficciona algo que não aconteceu, de facto, a pessoa não
acabou o curso de direito, mas é como se tivesse acabado, e portanto, temos aqui a
consagração de algo que a doutrina chama ficção jurídica, que é quando a lei vem dizer que
um facto é igual ao outro apesar de serem diferentes ou seja aqui: não verificação da
condição = a verificação da condição.

ARTIGO 276
“Os efeitos do preenchimento da condição retrotraem-se á data da conclusão do negócio, a
não ser que, pela vontade das partes ou pela natureza do acto, hajam de ser reportados a
outro momento”.

Em principio a verificação da condição opera retroactivamente que é o que a lei quer dizer, ou
seja, se eu doar uma casa a uma pessoa, mas os efeitos da doação ficam dependentes de uma
pessoa acabar o curso de direito, e imaginemos que essa pessoa acaba o curso de direito daqui
a dois anos em 2014, mas quando essa pessoa acabar o curso de direito em 2014 a sua
aquisição retroage ao dia em que foi celebrado o negócio, pois é como se tivesse adquirido a
propriedade desde 5 de Janeiro de 2012, e imaginemos que hoje 5 de Janeiro é que foi feita a

Serafim Cortizo 20100059 Página 203

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doação, com a condição suspensiva de o donatário acabar o curso de direito, e imaginemos


que ele só acaba o curso de direito em 15 de Julho de 2014, no dia em que acabar o curso de
direito, verifica-se a condição e a doação passa a produzir efeitos, mas não passa a produzir
efeitos apenas a partir de 2014, os efeitos do negócio retroagem a 5 de Janeiro de 2012.

Poderá pergunta-se qual é o interesse prático de vir dizer que a pessoa já é dona há mais de
dois anos?

Isso pode ter interesse por várias razões, porque imaginem que durante estes dois anos aquele
que ainda não era dono, tinha celebrado negócios quanto ao bem, esses negócios eram nulos
porque ele não era o dono, e se eu doei a este senhor sob condição suspensiva, e se ele só
acaba o curso em 2014, se ele em 2013 for vender o bem, neste caso é uma venda de bens
alheios que seria nula porque ele não é o dono, o dono sou eu, mas quando ela acabar o curso,
como retroage a Janeiro de 2012, e ao retroagir a Janeiro de 2012, quer dizer que ele é
considerado dono desde Janeiro de 2012, logo, o negócio que tiver feito em 2013 passa a ser
perfeitamente válido, em principio era nulo, porque era uma venda de bens alheios, mas como
a aquisição da propriedade por parte dele retroage a uma data anterior ao negócio que ele
celebrou, vai como que sanar retroactivamente o vicio do negócio que ele tinha celebrado.

ARTIGO 279 - Cômputo do termo


O artigo 279 é uma norma importante porque ajuda a interpretar referências que a lei faz a
prazos e diz este artigo 279 na alínea a) “á fixação do termo são aplicáveis, em caso de dúvida,
as seguintes regras, se o termo se referir ao princípio, meio ou fim do mês, entende-se como
tal, respectivamente, o primeiro dia, o dia 15 e o ultimo dia do mês. Se for fixado no princípio,
meio ou fim do ano, entende-se, respectivamente, o primeiro dia do ano, o dia 30 de Junho e o
dia 31 de Dezembro”.

Ninguém teria dúvidas se se disser que este negócio começaria a produzir efeitos no início do
mês, toda a gente perceberia que o inico do mês é a dia 1, mas se se disser que este negócio
começa a produzir efeitos a meio do mês, num mês que tem 31 dias, poderia haver a dúvida
de sabe se o meio do mês seria dia 15 ou dia 16 de Janeiro, nesta caso a lei esclarece ao dizer
que o meio do mês é sempre a dia 15.

Artigo 279 alínea d) “é havido, respectivamente, como prazo de uma ou duas semanas o
designado por 8 ou 15 dias, sendo havido como prazo de um ou dois dias o designado por 24
ou 48 horas”.

E portanto, sempre que a lei diz 8 dias quer dizer uma semana e quando diz 15 dias quer dizer
duas semanas.

Artigo 1041 nº 2 “cessa o direito indeminização ou á resolução do contrato, se o locatário fizer


cessar a mora no prazo de 8 dias a contar do seu começo”.

As pessoas geralmente têm uma ideia que as rendas são pagas no dia 1, mas que se pagarem
até dia 8 não há problema, de tal maneira que o português já interiorizou que a renda é para
pagar a dia 8, mas porquê a 8 se a lei diz no artigo 141 nº 2 que o locatário pode fazer cessar a
mora no prazo de 8 dias?

Serafim Cortizo 20100059 Página 204

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Ora 8 dias a contar a partir de dia 1 seria dia 9, mas de facto é a 8, porque 8 dias quer dizer
uma semana, e uma semana a partir de dia 1 é 8, porque se não houvesse o artigo 279 alínea
d) que quando a lei diz 8 dias quer dizer 1 semana, então não faria sentido as pessoas
interpretarem o artigo 1041 nº 2 como podendo dizer que se pode fazer cessa a mora até dia
8, não é assim, porque 8 dias a contra de dia 1 dá 9 dias, e como o primeiro dia útil do mês, as
pessoas têm que pagar até dia 8 e não até dia 9, porque quando a lei diz 8 dias, quer dizer 1
semana e a explicação está no artigo 279 alínea d).

Artigo 279 alínea c) “o prazo fixado em semanas, meses ou anos, a contra decerta data,
termina às 24 horas do dia que corresponda, dentro da ultima semana, mês ou ano, a essa
data; mas, se no ultimo mês não existir dia correspondente, o prazo finda no ultimo dia desse
mês”.

Eu falei nesta norma porque se discute quando é que um menor atinge a maioridade, ou seja,
toda a gente diz que o menor atinge a maioridade quando faz 18 anos, e imaginemos que hoje
dia 5 de Janeiro uma pessoa faz 18 anos. A questão que se coloca é a de saber em que
momento é que fez 18 anos, se foi às 00:00 horas do dia 5 ou se é às 24 horas do dia em que
faz 18 anos, e o entendimento da maior parte da doutrina, dizem que, com base nesta alínea,
a pessoa só atingirá a maioridade às 24 horas de hoje, o que equivale dizer que é às 00:00
horas de manhã e isso conduz aquele resultado curioso que é um individuo andar todo o dia a
gabar-se que tem 18 anos e que já é maior, e na realidade ainda é menor, e por força desta
interpretação, se o individuo no dia em que faz 18 anos se faz uma série de contratos, são
todos inválidos porque na realidade ele ainda é menor.

Casos práticos resolvidos Parte 1

Caso prático nº 1
Em Setembro de 2011 A vendeu a B um andar em Lisboa por 400.000 €, mas, para B pagar
menos imposto (IMT), apenas declararam 300.000 € aquando da celebração da escritura
pública de compra e venda.

O Fisco, que entretanto descobriu o que se tinha passado, pretende que B pague o imposto
correspondente aos 400.000 €, mas este alega que o contrato é inválido e que, não só não
tem que pagar nada, como até tem direito á devolução do imposto já pago.

Por sua vez C, que como arrendatário do referido andar tinha um direito legal de preferência
na sua aquisição, mas não tinha sido informado da venda, pretende agora exercer o seu
direito de preferência e adquirir o andar pelos 300.000 € declarados na escritura pública,
mas A afirma que tal só será possível se C pagar os 400.000 € efectivamente acordados
aquando da venda.

Quid Juris?

Este caso é um exemplo clássico de simulação quanto ao preço para enganar o Fisco, o imóvel
é comprado por um preço superior, mas para se pagar menos imposto declara-se um preço
inferior.

Serafim Cortizo 20100059 Página 205

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Temos aqui um negócio simulado, que é o negócio por 300.000 €, que é aquele que as partes
celebraram às claras por escritura publica, que esconde o verdadeiro negócio por 400.000 €,
há aqui uma simulação relativa, pois as partes declararam num contrato que vendiam por
300.000 €, mas a sua vontade real não era essa, mas sim, comprar e vender por 400.000 €,
havendo uma divergência intencional entre a vontade e a declaração e essa divergência
intencional é fruto de um conluio (acordo simulatório) entre o declarante e o declaratário, e
há o intuito de enganar terceiros, neste caso o Fisco (artigo 240 nº 1).

Aqui há uma simulação fraudulenta porque se quer enganar e prejudicar o Estado quanto ao
imposto, sendo uma simulação relativa porque o negócio simulado esconde outro negócio do
mesmo tipo mas de conteúdo diferente (negócio dissimulado). O negócio simulado é a compra
e venda por 300.000 € que esconde o negócio que efectivamente queriam celebrar, que é a
compra e venda por 400.000 €, havendo uma simulação quanto a um elemento do contrato
que é o preço, e então aplica-se o artigo 241 que é o artigo que se aplica á simulação
relativa.

O B que é o simulador adquirente diz que o negócio é inválido e neste caso depende de que
negócio é que estamos a falar, é verdade que o B tem razão, se se refere á compra e venda por
300.000 €, efectivamente é inválido porque é simulado, logo é nulo, porque depois de se ter
provado que era simulado, sendo nulo, nos termos do artigo 240 nº 2, e neste caso o negócio
simulado é inválido. E neste caso numa simulação relativa temos também que analisar o
negócio dissimulado se tem algum vício que o torna inválido.

Neste caso, depois de se ter demonstrado que a venda por 300.000 € era nula por ser
simulada, tinha-se que analisar a venda por 400.000 €, que era o verdadeiro negócio que as
partes pretendiam celebrar, o tal negócio do mesmo tipo, mas de conteúdo diferente.

Neste caso há que aplicar o nº 1 e o nº 2 do artigo 241, sendo que no nº 1 diz que se aplica ao
dissimulado, o regime que corresponderia se fosse concluído sem dissimulação, sendo que o
problema é a venda por 400.000 € estar escondida pela de 300.000 €, e o que poderemos
dizer á luz do nº 1 do artigo 241, é que se o dissimulado tivesse sido feito às claras, ou seja,
se o A tivesse vendido directamente a B por 400.000 €, á partida não haveria nenhum vicio
intrínseco, o negócio que claramente tem um vicio é a venda por 300.000 € que é o negócio
simulado.

Sendo uma simulação relativa aplica-se ao dissimulado (venda por 400.000) o regime que se
aplicaria se tivesse sido feito às claras sem dissimulação (artigo 241 nº 1) e partindo da
premissa que não havia nenhum vício na venda por 400.000 €, o único problema era estar
escondida por um negócio simulado, mas se o negócio dissimulado em si, não tem nenhum
vício intrínseco, ele será válido porque se aplica o regime que lhe corresponderia se fosse
feito às claras, e se o negócio dissimulado e válido, há uma base legal para o Estado pedir o
pagamento do imposto.

Neste caso prático não se levantava um problema de forma, mas seria relevante dizer que á
luz das interpretações possíveis do nº 2 do artigo 241, que seria de entender que mesmo que o
acordo de declarar 300.000 €, quando o valor foi de 400.000 € tenha sido feito oralmente, e
isso só por si não era suficiente para invocar um vício de forma, podia era esse acordo oral

Serafim Cortizo 20100059 Página 206

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levantar um problema, pois se for invocado pelos simuladores, não pode ser provado por
testemunhas (artigo 394 nº 2).

Á luz do artigo 241, o facto de haver um negócio simulado (venda por 300.000) não implica
forçosamente que também seja inválida a venda por 400.000, e nessa medida o Estado teria
legitimidade para pedir o pagamento do imposto, ou seja, o B que é o comprador simulador,
não pode dizer que o negócio é todo inválido, o que é inválido, é o negócio simulado.

Neste caso o A além de ter feito uma venda simulada a B para enganar o Estado, o A quando
vendeu a B também não consultou o preferente C perguntando-lhe se queria exercer o direito
de preferência.

Aqui surge um problema, pois o preferente tomou agora conhecimento de que tinha sido
violado o seu direito de preferência, porque ele tinha o direito de ser consultado previamente.

O C quer intentar uma acção de preferência pelo valor que foi declarado na escritura publica
que foi de 300.000 €.

Neste caso A é o simulador, e se C foi um terceiro que estiver de boa-fé, o C dirá, acabo de
sabe que foi feita uma venda por 300.000 €, venho exercer o meu direito de preferência por
300.000 €, e o simulador A diz que não pode ser por 300.000 € porque o preço real foi 400.000
€. Neste caso, temos aqui o simulador A a invocar contra o terceiro C a existência de um
negócio simulado, e se o terceiro C estiver de boa-fé, em princípio o simulador não poderia
invocar o vício.

Mas o direito de preferência é uma matéria polémica em que o terceiro de boa-fé quer
preferir pelo preço mais baixo, e a doutrina está dividida nesta matéria (Antunes Varela,
Meneses Leitão, Castro Mendes), porque parte dela diz que o simulador não pode invocar
contra o C o verdadeiro preço, porque isso equivaleria a fazer prova que o negócio era
simulado, e o simulador não pode invocar contra terceiro de boa-fé o negócio simulado, e se
o terceiro está de boa-fé, pode preferir pelo valor declarado e não pelo valor real, aqui neste
caso pelo valor mais baixo de 300.000 e não pelo valor mais alto de 400.000.

Mas existe outra posição doutrinária maioritária (Almeida e Costa, Meneses Cordeiro, Carvalho
Fernandes) que defende que o espirito do artigo 243 nº 1 ao proteger o terceiro de boa-fé, é
apenas para evitar que o terceiro de boa-fé seja prejudicado pela invocação da simulação, e
não dar-lhe um beneficio injusto, e se o terceiro de boa-fé, com o argumento que está de
boa-fé puder preferir por 300.000 €, vai adquirir um bem por um valor inferior ao que o bem
efectivamente vale, e esses autores dizem que isso não é razoável pois eles entendem que a
lógica do artigo 243 nº 1 é apenas evitar que o terceiro de boa-fé seja prejudicado e não dar-
lhe benefícios injustificados e com base nesta construção há quem faça uma interpretação
restritiva do artigo 243 nº 1 dizendo que o simulador não pode opor a simulação a terceiro de
boa-fé, se ao opor-lhe a simulação lhe for causar prejuízo, mas pode opor a simulação a
terceiro de boa-fé, se o objectivo for apenas evitar que o terceiro de boa-fé obtenha um
beneficio injustificado á custa do simulador, e no caso do direito de preferência, o preferente
tem que preferir pelo valor real e não pode preferir pelo valor mais baixo declarado,
argumentando que como é de boa-fé, não se lhe pode opor o vicio da simulação.

Serafim Cortizo 20100059 Página 207

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Caso prático nº 2
A vendeu por escritura pública uma casa a B, no dia 02/11/2011, tendo ficado estipulado que
o preço seria pago o mais tardar até ao dia 18/11/2011.

No dia 07/11/2011 houve um acordo oral entre A e B, perante testemunhas, no sentido de o


preço só ter que ser pago a 31/12/2011.

Hoje, dia 18/11/2011, A veio reclamar a B o pagamento do preço, mas este recusou-se.

Quid Juris?

A questão é saber se o A pode exigir o pagamento a dia 18 ou se o B pode recusar o


pagamento dia 18.

Este é claramente um caso prático sobre a forma do negócio jurídico, e por um lado tem que
se saber se aquele acordo oral que é feito dia 7 de Novembro posterior à celebração do
negócio, que altera á posteriori uma cláusula do contrato.

E aqui há dois problemas, um de validade e outro de prova e tem que se ver se o acordo de
dia 7 é válido, e se for válido, se o mesmo pode ser provado por testemunhas.

Quanto á questão da validade, no dia 7 de Novembro veio-se alterar uma cláusula do contrato
de compra e venda da casa que fixava o prazo de pagamento do preço, e que constava da
escritura pública, e neste caso é uma modificação que não é anterior nem contemporânea,
pois é posterior, e saber se válida ou inválida, depende do que concluamos relativamente ao
artigo 221 nº 2 (estipulação oral posterior) e este artigo diz que as estipulações posteriores
ao documento só estão sujeitas à forma legal (escritura publica ou documento autenticado)
se as razões da exigência especial da forma lhes forem aplicáveis.

No fundo, o que está a dizer o nº 2, é que em princípio a cláusula oral posterior é válida,
excepto, se se concluir que a razão que leva a lei a exigir escritura pública ou documento
autenticado para a compra e venda de imóveis, também deve ser respeitada neste tipo de
cláusula, e para que esta cláusula seja nula por vício de forma, temos que atender ao elemento
teleológico, porque é o que a lei exige escritura pública para a venda de casas (artigo 875).

Aplicando o artigo 221 nº 2, a tal estipulação oral, veio alterar uma estipulação escrita, essa
estipulação oral será válida, (só esta sujeita á forma legal se as razões de exigência especial da
lei forem aplicáveis), e neste caso temos que ir ver se quando a lei exige escritura pública ou
documento autenticado para a compra e venda de imóveis, se o tipo de elementos do negócio
que pretende que sejam abrangidos pela escritura pública ou por documento autenticado, se
abrangem também o prazo de pagamento.

Aqui haveria que dizer que, isto é uma cláusula oral que foi introduzida num contrato que
tinha que ser por escritura pública ou documento autenticado, é uma cláusula posterior e
aplica-se o artigo 221 nº 2, e aplicando-se o artigo 221 nº 2, a cláusula é válida, a não ser
que se conclua que a razão de ser da exigência da escritura pública ou do documento
autenticado, também vale para este tipo de cláusula.

Serafim Cortizo 20100059 Página 208

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E depois há que se dizer se a razão de ser da escritura publica, e se esta clausula é muito
importante do ponto de vista do legislador, pois a clausula que fixa o montante do preço,
também parece lógico que conste da escritura publica, e aí não há duvida nenhuma que se eles
viessem alterar o preço oralmente, seria uma clausula que deveria constar também de
escritura publica, e neste caso concreto, do ponto de vista de validade é de admitir uma
clausula oral, e admitindo que face ao artigo 221 nº 2, este acordo oral é válido, e neste caso o
B não pode fazer prova desse acordo oral que não pode ser provado por testemunhas, porque
é um acordo oral que contraria um documento (artigo 394 nº 1).

Neste caso, tinham-se que focar os artigos 221 nº 2 para discutir a validade da prova e o
artigo 394 nº 1 a propósito das testemunhas.

Caso prático nº 3
A comprou ao joalheiro B uns brincos de safiras para oferecer á sua namorada C. Os brincos
tinham um espigão e destinavam-se a mulheres com orelhas furadas. Quando A descobriu
que C não tinha as orelhas furadas e se recusava a furá-las, foi ter com B pedindo-lhe que
substituísse os referidos brincos por outros iguais, com mola em vez de espigão, ou então
que lhe devolvesse o dinheiro, mas B recusou-se.

Quid Juris?

Este caso prático gira em torno do erro, porque se diz que ele descobriu algo que ignorava,
que era que a namorada não tinha as orelhas furadas, e temos aqui uma situação em que ele
só comprou os brincos com espigão porque estava enganado acerca das orelhas da sua
namorada, pois ignorava que ela não tinha as orelhas furadas, e logo, ele não está em erro
sobre os brincos, e não está em erro sobre o objecto (os brincos com espigão), nem sobre os
brincos em si, nem sobre o declaratário que é quem vende, ou seja, ele não está em erro
acerca dos brincos, nem do ourives que os vendeu, e qualquer erro na formação da vontade
que não tenha a ver com o objecto, nem com o declaratário, é um erro sobre os motivos e
aplica-se o artigo 252 nº 1, pois ele no fundo está em erro acerca do facto de a sua namorada
não poder usar aquele tipo de brincos, pois estava convencido que aqueles brincos serviriam á
sua namorada, porque pensava que tinha as orelhas furadas, e isto é um erro sobre os
motivos.

Mas se a hipótese dissesse que pensava que era sobre a mola ou o espigão dos brincos, aí
sim seria um erro sobre o objecto.

Sendo que é um erro sobre os motivos, mostram que é um erro sobre os motivos por exclusão
de partes, ele não está em erro sobre o declaratário que é o vendedor, nem está
verdadeiramente em erro sobre os brincos, ele estava em erro era sobre um elemento que
tinha a ver com a pessoa a quem ele iria oferecer os brincos, sendo que ele está em erro
sobre a namorada, e portanto aplica-se neste caso o artigo 252 nº 1, e segundo este artigo,
para anular seria necessário demonstrar que o errante A e o declaratário B, tinham aquando
da compra e venda tinham reconhecido por acordo a essencialidade do motivo, o que neste
caso não aconteceu.

Serafim Cortizo 20100059 Página 209

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1. Como é que o juiz deve proceder se o declarante e o declaratário tiverem entendimentos


divergentes acerca do sentido a atribuir a determinada declaração negocial?

Neste caso, se é uma declaração negocial de A para B se um lhe dá um sentido e o outro lhe dá
outro, e neste caso há uma polémica relativamente á interpretação da declaração negocial, e o
juiz deve aplicar os critérios previstos na lei, e então resumem-se os artigos 236 e 237
dizendo, o juiz vai ter que ele próprio interpretar a declaração negocial, e se o juiz concluir
que o declaratário percebeu o que é que o declarante querida dizer, então a declaração vale
com o sentido que o declarante lhe queria dar (artigo 236 nº 2) e então há um entendimento
comum a ambas as partes, e se isso acontece, aplica-se o artigo 236 nº 2 e dá-se á
declaração o sentido que o declarante lhe queria dar.

Mas se por acaso o declaratário não percebeu o que é que o declarante lhe queria dizer,
então há que aplicar o artigo 236 nº 1, e nesse caso, o juiz vai ver o que é que um
declaratário normal, na posição do verdadeiro declaratário teria percebido, ou seja, o que é
que uma pessoa média, com o mesmo grau de informação do verdadeiro declaratário, o que
é que essa pessoa média perceberia, se tivesse sido a ela que a declaração tivesse sido
dirigida exactamente naqueles termos, e o juiz nos termos do artigo 236 nº 1, dá á
declaração o sentido que a tal pessoa normal lhe daria, que até pode não ser o sentido do
declarante nem o sentido do declaratário.

Mas se aplicando o artigo 236, se mesmo assim o juiz estiver na dúvida sobre o sentido da
declaração, vai-se para o artigo 237, e consoante o negócio seja oneroso ou gratuito a
interpretação será feita pelo juiz no negócio gratuito, faz-se a interpretação mais favorável ao
disponente, e no negócio oneroso a interpretação que conduz ao resultado mais equilibrado.

2. Qual é o regime aplicável a uma declaração negocial obtida pela força?

Aqui quando se fala em declaração obtida pela força, obviamente que isto abrange casos de
coacção física, mas pode haver situações de coacção moral em que houve constrangimento
físico porque não basta ter havido força para ter havido coacção física, é preciso que a força
tenha suprimido totalmente a vontade do coagido.

Aqui tem que se dizer;

Se houver uma declaração negocial obtida pela força, consoante os casos, pode ser coacção
física ou coacção moral. É coacção física se a vontade do coagido foi totalmente abolida, e se
for coacção física aplica o artigo 246, e a declaração não produz efeito nenhum.

Se o constrangimento físico for apenas para influenciar a vontade do coagido, e se o coactor


não prescinde da vontade do coagido, então esse constrangimento físico consubstancia uma
coacção moral, e portanto, pode haver constrangimento físico e ser coacção moral, e se for
coacção moral, aplica-se o regime dos artigos 255 e 256 e nesse caso a declaração negocial é
anulável.

Serafim Cortizo 20100059 Página 210

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Casos práticos resolvidos Parte 2

Caso prático nº 1
A pai de B e de C pretendia vender um terreno seu a B por 100 mil Euros. Mas por recearem
que C não desse a autorização exigida no artigo 877 do Código Civil, A e B optaram por
celebrar um contrato de doação por escritura pública, acordando oralmente, sem que C
soubesse, que B teria mesmo teria mesmo que pagar a referida quantia a A.

Quid Juris?

Este caso prático tem a ver com a matéria da simulação.

Há aqui um negócio simulado que é uma doação prevista no artigo 240 nº 1 e neste caso há o
intuito de enganar terceiros, que neste caso é o filho C, tendo celebrado um acordo
simulatório, sendo que A e B estão de conluio, havendo uma divergência intencional entre A e
B entre a vontade e a declaração, tendo que se demonstrar a declaração que foi feita não
corresponde à vontade real dos simuladores e que foi feita intencionalmente uma declaração
que não corresponde á vontade real, sendo que A e B queriam realizar uma venda mas
declararam que era uma doação, havendo uma divergência intencional entre a vontade e a
declaração, porque A e B declararam um que doava e outro que aceitava a doação, quando na
realidade, nem A queria doar nem B queria receber uma doação, porque o que eles na
realidade queriam algo diferente, pois a sua vontade real era efectuar uma venda mas
declararam que foi uma doação.

Então dir-se-ia que há uma divergência entre a vontade e a declaração porque declararam
doar, quando a vontade real era vender, sendo que há um conluio entre o declarante e o
declaratário porque eles fizeram isso por acordo entre si e havia o intuito de enganar terceiros,
neste caso o C, assim sendo, o negócio é simulado (artigo 240 nº 1).

Depois de se demonstrar que é um negócio simulado nulo (artigo 240 nº 2) sendo uma
simulação relativa prevista no artigo 241, porque por detrás de um negócio simulado da
doação, esconde-se outro negócio dissimulado que é aquele que as partes efectivamente
quiseram celebrar que é uma venda, sendo neste caso uma simulação fraudulenta porque há o
objectivo de enganar e prejudicar o terceiro C (artigo 242 nº 1) pois pretendia-se frustrar o
direito de C, como outro filho que é, de se opor ou não á venda (artigo 877) e ao fingirem que
é uma doação estão a frustrar o direito que C teria em se opor, porque se a venda tivesse sido
feita á claras ele poder-se-ia opor, mas ao fazer uma venda encapotada ao fingir que é uma
doação, estão a impedir o C de exercer um direito que a lei lhe dá que é o direito de se poder
opor a vendas feitas pelos seus pais a irmãos seus e neste caso, é uma simulação fraudulenta.

Voltando à simulação, que sendo relativa, conclui-se que há dois negócios e neste caso tem
que se analisar os tais dois negócios quanto à sua validade.

Quanto á doação, é nula porque é simulada nos termos do artigo 240 nº 2, apesar de ter sido
feita por escritura pública, não havendo o vício de forma, mas sim o vício da simulação.

No negócio dissimulado, que é a venda, está em causa saber se a venda é válida ou inválida,
porque objectivamente o bem foi parar ao B à revelia do C, sendo que neste caso na venda,

Serafim Cortizo 20100059 Página 211

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que é um negócio formal porque respeita a forma exigida por lei, (escritura publica, artigo
875), sendo que o regime que a lei aplica ao negócio dissimulado que lhe corresponderia se
tivesse sido concluído sem dissimulação, ou seja, se tivesse sido feito às claras (artigo 241 nº
1). Mas se A tivesse vendido às claras a B, o negócio seria inválido e anulável nos termos do
artigo 877 nº 2, porque o C não autorizou a venda, porque a venda entre A e B foi feita
encapotadamente escondida por uma doação, sendo que a doação é nula por simulação, à
venda aplica-se o regime que lhe corresponderia se tivesse sido concluída sem dissimulação e
tem que se ir ver o que é que aconteceria se A tivesse simplesmente vendido a B nos termos
em que o fês, sendo que neste caso, faltaria a autorização do outro filho (C). E se A vendendo
às claras a B é anulável, (artigo 877 nº 2), é á mesma anulável tendo sido feita às escondidas,
pois o facto de estar escondido não apagou o vício.

Então dir-se-ia que no negócio a doação é nula por ser simulada, a venda é anulável pela
violação do artigo 877 nº 2, mas se houver um vício de forma esta venda será nula e neste caso
o vício mais grave absorve o menos grave, pois quando o negócio e simultaneamente nulo e
anulável e então não produz efeitos, pois a venda, sendo um negócio formal porque o artigo
875 exige escritura publica ou documento autenticado e quando o negócio dissimulado é
formal, só é valido se respeitar a forma, e portanto, poderia haver uma situação em que
independentemente da anulabilidade por falta de autorização, subsiste um problema que é
saber se afinal o vício não será ainda mais grave e se não haverá uma verdadeira nulidade.

Chegados a este ponto temos uma doação simulada por escritura publica, que esconde uma
venda que é o negócio dissimulado e o acordo que foi feito por trás, combinado que não era
uma doação mas sim uma venda, o acordo em que se consubstancia o chamado acordo
simulatório, o que nos permite concluir que não há uma doação, mas sim uma venda, foi o
acordo oral feito por trás, mas que foi dito que teria que ser pago o preço e neste caso o
negócio que se transmite contra um preço chama-se venda que consubstanciada por um
acordo oral prévio entre A e B onde disseram que seria pago o preço.

Conclui-se que a doação é nula por ser simulada, mas já foi visto que a venda é anulável e
neste caso é que surgem as opiniões divergentes da doutrina e neste caso Mota Pinto diria que
o negócio era nulo porque as declarações que revelam a vontade de vender foram feitas por
trás e essas declarações feitas por trás, são aquelas a que a doutrina chama de contra
declarações, porque vêm contradizer o que foi dito às claras. Ou seja, às claras diz-se que é
uma doação e por detrás contariam o que foi dito às claras, e neste caso, no tal acordo
simulatório, aquelas declarações feitas por trás e que traduzem a verdadeira vontade, elas são
simultaneamente contra declarações, no sentido em que vêm contradizer aquilo que foi dito
às claras que foi o tal acordo oral em que se combinou uma doação e que às escondidas se
pretendia fazer uma venda e que tinha que se pagar o preço.

O que Mota Pinto defendia é que, se a lei exige escritura publica ou documento autenticado
para a venda, então têm que ser aquelas declarações que traduzem a vontade de vender que
tem que ser por escritura publica ou por documento autenticado e neste caso as declarações
que traduzem a vontade de vender, foram aquelas que foram feitas por trás, mas que foram
feitas oralmente, então conclui-se que são nulas por vício de forma e para Mota Pinto não
interessa que a doação tenha sido feita por escritura publica, mas o que interessa não é a

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escritura publica da doação, mas sim a da venda e aqui neste caso o negócio dissimulado seria
nulo por vício de forma e segundo a tese de Mota Pinto, teria que dizer-se que o negócio é
anulável pela violação do artigo 877 e por acréscimo, á luz desta posição, seria formalmente
nulo.

Mas ainda há outra posição antagónica defendida por Antunes Varela e Castro Mendes, em
que vem dizer que o que conta é que o negócio dissimulado pode aproveitar ao simulado a
forma que foi usada no negócio simulado, sendo que o raciocínio é o seguinte, para cumprir o
artigo 241 nº 2 e para se considerar que foi respeitada a forma que a lei exige para o
dissimulado, não é necessário que as contra declarações sejam por essa forma, basta que no
negócio simulado que se está a esconder, tenha sido respeitada a forma que a lei exige para o
dissimulado que neste caso, é a escritura publica ou documento autenticado, sendo que a
forma utilizada na doação foi a escritura publica, sendo que a forma usada no negócio
simulado é uma forma que de per si seria suficiente também para o dissimulado e estes
autores entendem que o artigo 241 nº 2, que seria inaplicável na tese de Mota Pinto, eles
acham que o espírito da lei é salvar os negócios dissimulados, porque basta que no simulado
tenha sido usada a forma que tenha sido suficiente para o dissimulado.

Neste caso, segundo Mota Pinto, se se entender que a forma tem que ser respeitada nas
contra declarações o negócio dissimulado seria nulo porque foi oral e deveria ter sido por
escrito (escritura publica e documento autenticado), se se entender que forma do simulado
aproveita o dissimulado, como na doação foi usada escritura publica que é a forma mais do
que suficiente para aquela venda, então não haverá vício de forma.

Mas há uma posição intermédia que diz que a forma do simulado só aproveita ao dissimulado,
quando o simulado contém os elementos essenciais do dissimulado e aqui a doutrina também
se divide porque Oliveira Ascensão acha que a doação contém os elementos essenciais da
venda, porque a forma da doação não pode aproveitar á venda porque há um elemento
essencial da venda que não estava contido na doação que é a referência ao preço e então,
naqueles que defendem esta tese intermédia, dirão que a forma do simulado só aproveitaria
ao dissimulado naqueles casos em que o simulado contém os elementos essenciais do
dissimulado, mas quando há uma doação a esconder uma venda, o elemento essencial da
venda que é o preço não constaria da doação.

Caso prático nº 2
A devedor de C, combinou com B fingir que lhe vendia um automóvel seu por escrito, a fim
de pôr esse bem ao abrigo do credor C. Acontece que posteriormente á celebração desse
negócio, B vendeu o referido carro a D, o qual registou a aquisição.

a) Poderão quer A quer C arguir a eventual invalidade da venda de B a D?


b) Terá D algum fundamento para alegar que o automóvel lhe pertence?

Alínea a) na alínea a) estão-se a fazer duas perguntas distintas e aqui levanta-se logo um
problema para a venda de B a D, que é preciso que essa venda seja inválida, pois se fosse
válida ninguém poderia arguir a sua invalidade, mas se se concluir que poderá ter algum vício,
vai-se ver se o A pode arguir o vício e se o C pode arguir o vício.

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Este caso está relacionado com o vício da simulação, sendo um negócio simulado é entre A e B
que combinam fingir um negócio (artigo 240 nº 1) reunindo os requisitos da divergência
intencional entre a vontade e a declaração entre o A e o B, porque o A não quer vender o bem
ao B, pois quer evitar que os credores o penhorem e quer criar a aparência que o bem foi
vendido a B, mas aqui, resulta do texto que as partes não celebraram uma compra e venda,
mas apenas para enganar o C que é o credor do A através de declarações que não
correspondem á sua vontade real, mas tem que se verificar outro requisito que é um conluio
(acordo simulatório) que existe aqui neste caso, quando se diz que combinaram/fingiram.

Neste caso tem que se dizer que se verificam os requisitos do artigo 240 nº 1, porque existe
uma divergência intencional entre a vontade e a declaração, porque quer A quer B declararam
propositadamente algo que não corresponde à sua vontade real, há um conluio entre eles pois
combinaram previamente que iriam agir desse modo e há o intuito de enganar terceiros, neste
caso o C, que é o terceiro face ao negócio. Portanto, ficou provado que o negócio é simulado
com base no artigo 240 nº 1.

Neste caso é uma simulação fraudulenta porque há o intuito de prejudicar o C criando uma
aparência de que o bem não é do devedor A, prejudicando o direito ao crédito do C, sendo
uma simulação absoluta porque o negócio simulado não pretende esconder nenhum outro
negócio, portanto, esta venda não pretendeu esconder outro negócio de tipo diferente nem
sequer fazer uma venda com um conteúdo diferente pois essa não era a vontade real de A e B,
sendo que este negócio simulado é nulo.

O negócio entre B e D, é nulo, porque o negócio entre A e B sendo nulo não produz efeitos
porque um negócio nulo é ineficaz desde o início e então quer dizer que o negócio simulado
entre A e B nunca chegou a produzir efeitos e os efeitos desta compra e venda era transmitir a
propriedade e era fazer nascer um direito de crédito e neste caso podemos afirmar que aquela
venda simulada não tornou o B proprietário do bem nem fez com que o A passasse a ter
direito ao preço, pois mesmo que o bem tenha sido entregue a B a entrega do bem não
substitui a necessidade de o negócio ser válido e mesmo que o bem tenha sido entregue, o B
não ficou dono do bem mesmo que tenha eventualmente pago o preço, a lei diz que o negócio
é nulo.

Se o negócio é nulo, não produziu efeitos, se não produziu efeitos a propriedade não se
transmitiu de A para B e se não se transmitiu para B, B não é o dono do bem e se o B não é
dono do bem isso vai ter repercussões quando o B pretender transmitir o bem a D. Já
tínhamos concluído que o B não era o dono do bem e não sendo dono, vende o bem a D,
sendo essa venda do segundo negócio, uma venda de bens alheios feita sem legitimidade,
sendo por consequência uma venda nula ao abrigo do artigo 892.

Sendo uma venda nula sem legitimidade, o A para invocar o vício da venda entre B e D
depende se o D comprou de boa ou de má-fé, porque o A tem que provar previamente que o B
não era o dono do bem tendo que provar que o seu próprio negócio com B era nulo por
simulação, na prática para o A atacar o negócio entre B, e D vai ter que arguir contra o D a
simulação do primeiro negócio, pois o simulador não pode invocar o vício da simulação contra
terceiro de boa-fé (artigo 243 nº 1) mas não se sabe que o terceiro D estava de boa-fé, mas se
o terceiro D estava de má-fé, o A pode invocar o vício contra ele.

Serafim Cortizo 20100059 Página 214

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Então terá que se dizer que no texto da hipótese não se sabe se o terceiro D estava ou não de
má-fé, que não sabia que havia sido feito previamente um negócio simulado e assim sendo, se
por acaso o D era um terceiro de má-fé, porque sabia que quando comprou ao B tinha havido
um negócio simulado, então o A tem legitimidade para arguir o vício contra D que neste caso,
é um terceiro de má-fé (artigo 243 nº 2), mas se o D era um terceiro de boa-fé porque ignorava
que tinha havido um negócio simulado, então se o D era um terceiro de boa-fé, o A não pode
invocar o vício contra D com base no artigo 243 nº 1.

O C tem interesse em invocar a nulidade deste negócio porque é credor do A e convém ao C


que o bem pertença ao A que sendo devedor de C, os bens que o C pode penhorar são os bens
do seu devedor A e o C só pode penhorar aquele automóvel numa acção executiva se aquele
bem pertencer a A e o C para poder penhorar o carro, precisa de fazer regressar o carro à
esfera do A ou demonstrar que nunca saiu da esfera do A.

Neste caso, o C terá que argumentar, que visto, que houve um negócio simulado de A para B
que é nulo, sendo nulo, o B não ficou dono e se não ficou dono não tem legitimidade para
transmitir posteriormente a D e assim sendo, esse segundo negócio é nulo nos termos do
artigo 892 por ter sido uma venda de bens alheios sendo que o C terá que invocar o vício da
simulação para provar que o negocio entre A e B é nulo.

Sendo um conflito entre dois terceiros, o credor do simulador alienante e o sub adquirente do
simulador alienante e aqui um terceiro que quer invocar o vício contra outro terceiro, mas aqui
o terceiro que quer invocar o vício é o C e só há polémica na doutrina quando os terceiros
estavam de boa-fé, mas quando estão os dois de má-fé, o vício pode ser invocado por
qualquer interessado e o C mesmo estando de má-fé e se o D também estiver, temos duas
pessoas de má-fé a invocar o vício uma contra a outra.

Mas se estiver C de boa-fé e o D de má-fé, não há qualquer problema em o C poder invocar o


vício contra o D invocando o vício da simulação para poder destruir o negócio seguinte que é
uma venda de bens alheios.

Na hipótese de o C estar de má-fé e invocar o vício contra D que está de boa-fé, aqui a
doutrina diz que a protecção do artigo 243 nº 1 também se aplica a este caso, sendo que a
doutrina faz uma interpretação extensiva do artigo 243 nº 1 porque a letra do 243 nº 1 apenas
diz que os simuladores não podem invocar o vício contra terceiro de boa-fé, mas a doutrina
defende que o espírito da lei é impedir que o vício da simulação possa ser arguido conta
alguém que está de boa-fé e que acreditou numa aparência que existia na ordem jurídica e a
doutrina também é unânime em dizer, que o terceiro de má-fé não pode invocar o vício contra
terceiro de boa-fé por força de uma interpretação extensiva do artigo 243 nº 1 atendendo ao
elemento teleológico, à razão de ser da norma, pois a finalidade da norma é proteger quem
confiou numa aparência e protege-lo perante pessoas que contribuíram para essa falsa
aparência.

Então sobra a situação duvidosa que é o C e o D de boa-fé, ou seja, o terceiro que quer invocar
o vício e que está de boa-fé porque ignorava que quando se constituiu o seu direito que existia
previamente um negócio simulado, mas também um terceiro contra quem é invocado o vício,

Serafim Cortizo 20100059 Página 215

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neste caso o D que estava de boa-fé, porque quando comprou ao B ignorava que tinha havido
previamente um negócio simulado.

Se C e D estiverem ambos de boa-fé, neste caso não há uma resposta unívoca na doutrina e se
estão os dois de boa-fé, existem três posições na doutrina e há uma posição que considera que
deve sempre ter prevalência o terceiro que acreditou no negócio simulado o D, que em
principio está de boa-fé, porque quando comprou a B acreditou que o B era o dono, mas ao
acreditar que o B era o dono, acreditou na validade da compra que B fez a A e há quem
considere que o espírito da lei, tendo em conta a redacção do artigo 243 nº 1, é proteger
sempre o terceiro de boa-fé que acreditou no negócio simulado, porque no fundo Galvão
Telles ao defender esta tese, de que os simuladores não podem invocar o vício contra terceiros
de boa-fé, porque o terceiro de má-fé é equiparado ao simulador.

Mas há outra posição oposta que dirá que deve prevalecer a posição do C porque se estiverem
os dois de boa-fé, não há uma maneira razoável de os desempatar com base na boa-fé e o
facto de desempate mais lógico é saber quem é que face á realidade substantiva tem um
verdadeiro ou um falso direito e neste caso o D não tem direito sobre o bem porque comprou
ao falso dono mesmo que o D ignorasse que o B não era o dono, pois efectivamente o B não
era o dono porque o primeiro negócio era simulado e B não ficou dono do bem e não podia
transmitir a D e mesmo que D tenha comprado de boa-fé, o facto é que ele comprou a um
falso dono e por tal motivo ele não tem o direito de propriedade porque o segundo negócio é
nulo por ilegitimidade pois o carro continua a pertencer ao A, pois sendo uma venda simulada
de A para B que é nula, a propriedade não passou para B e consequentemente quando B
vendeu a D a venda era nula por ilegitimidade e o bem não passou para D, logo á luz da
realidade substantiva, o bem continua a ser do A e neste caso é mais lógico que se proteja a
pessoa de boa-fé mas que tem o direito que deriva do A que é o C que é o credor do A e neste
caso, parece mais lógico quando estão os dois de boa-fé, entender que o critério para aferir
qual é que deve prevalecer que é aquele que quer invocar a nulidade da simulação que é o C.

Nas teses intermédias há que atender às datas, saber se penhorou antes da compra ou se
comprou primeiro e penhorou depois, se registou a penhora antes do outro ter registado a
compra e nesta tese, se o C registar a penhora do bem antes do D registar a compra do mesmo
bem, prevalece o C, mas se o D tiver registado a sua compra antes do C ter registado a
penhora, prevalece o D.

Alínea b) Terá D algum fundamento para alegar que o automóvel lhe pertence? Em que caso é
que o D se tornaria dono do automóvel?

Aqui pode-se levantar a questão da aplicabilidade do artigo 291 pois temos um primeiro
negócio inválido entre A e B e temos um segundo negócio inválido entre B e D como
consequência da invalidade do primeiro e estamos perante um bem registável e se o D reunir a
seu favor todos os requisitos do artigo 291, mas neste caso só há dois requisitos que estão
preenchidos, ele registou a aquisição e adquiriu a titulo oneroso mas não se sabe se foi de boa
e ou de má-fé e também não se sabe se o seu registo foi anterior ao registo da acção de
invalidade, mas há um limite, porque segundo o artigo 291, o terceiro que regista só fica
verdadeiramente protegido ao fim de três anos (artigo 291 nº 2) sendo que o D poderá vir a
beneficiar do artigo 291, desde que preencha os seus requisitos e neste caso, o D preenche

Serafim Cortizo 20100059 Página 216

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alguns os requisitos do artigo 291, tais como, aquisição onerosa de um bem registável e
registo, mas ignoramos se preenche os outros requisitos, como a boa-fé e como o facto de já
terem passado três anos e se por acaso o D preencher estes requisitos todos, tornou-se
proprietário do bem nos termos do artigo 291 e aí ficaria protegido mesmo contra outro
terceiro de boa-fé o C, a não ser que o D consiga mostrar que é dono através de uma aquisição
tabular (pelo registo) do artigo 291.

Mas há autores que defendem que não se aplica o artigo 291 quando estamos perante um
negócio simulado e quando o primeiro negócio tem por objecto um bem registável for um
negócio simulado, há quem defenda que nunca se aplica o artigo 291, mas sim a regra especial
do artigo 243 nº 1 que seria uma regra mais favorável ao terceiro porque é menos exigente
pelo facto de se desconhecer a simulação por boa-fé, sendo que não se exige que o terceiro
tenha adquirido o bem a titulo oneroso e também não exige que um bem adquirido por um
terceiro tenha sido registado e também não é falado no artigo 243 na protecção dos três anos
exigida no artigo 291, pois neste caso, há quem ache que o artigo 243 é uma norma especial
face ao artigo 291 e então dir-se-á que o terceiro que confiou no negócio simulado, se estiver
de boa-fé, aplicar-se-ia o artigo 243 nº 1 em vez do artigo 291 e a sua aquisição seria muito
mais fácil.

E neste caso só há duas maneiras de o terceiro ter a garantia absoluta que ficou dono do bem,
ou graças ao artigo 291, ou graças ao uso capião se já tiver a coisa em seu poder há um
número de anos suficientes para o uso capião.

Caso prático nº 3
A decidiu pregar uma partida ao seu colega de trabalho B, dizendo-lhe que tinha ganho o
“euromilhões” e que lhe queria doar 10.000 €, oferta essa que B aceitou imediatamente.
Após ter entregue o correspondente cheque a B, e perante a esfusiante alegria deste, A,
confessou às gargalhadas, perante os demais colegas de trabalho, que tudo não tinha
passado de uma brincadeira, pedindo a devolução do cheque, mas B recusou, alegando que
o tinha adquirido validamente.

Quid Juris?

Introdução ao caso prático

A dúvida é saber se isto é reserva mental ou se é uma declaração não séria e a dúvida é
importante porque a resposta e radicalmente distinta.

Havendo reserva mental no negócio o B poderia ficar com o cheque com base no artigo 244 nº
2 que diz que a reserva mental não prejudica a validade da declaração e o negócio é válido e
produz efeitos porque o declaratário ignorava a reserva, mas se for uma declaração não séria o
B não tem direito a ficar com o dinheiro, porque no artigo 245, resulta quanto á declaração é
não séria, esta não produz efeitos e se transmitiu o direito sobre aquela quantia.

O principal critério para distinguir reserva mental e declaração não séria tem que se provar
que na reserva mental houve uma divergência intencional entre a vontade e a declaração, mas

Serafim Cortizo 20100059 Página 217

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na declaração não seria que tem que haver um divergência intencional entre a vontade e a
declaração e também na simulação tem que haver uma divergência intencional entre a
vontade e a declaração e portanto, há um ponto em comum entre a simulação, a reserva
mental e a declaração não séria, sendo que o ponto em comum entre as três situações é
alguém consciente e voluntariamente emitir uma declaração que sabe não corresponder á sua
vontade real.

Aqui neste caso, sabemos que o que o A declarou não corresponde á sua vontade real, ele
declarou que doava 10 mil euros, mas não o queria fazer e a questão chave é saber se ele
queria enganar, ou não o declaratário B e para se saber se há reserva mental tem que se
provar que o declarante quis mesmo enganar pois haverá declaração não séria se o
declarante não quis enganar.

No artigo 244 diz-se que na reserva mental houve o intuito de enganar e no artigo 245 quando
se fala em declaração não séria, não há o intuito de enganar, ou seja, quando há declaração
não séria, o declarante está convencido que não está a enganar e que o outro vai perceber que
ele não está a falar a sério.

E neste caso concreto em que o A diz que ganhou o euromilhões e faz questão de oferecer 10
mil euros e passa um cheque desse valor e entregou-o a B e neste caso, não há duvida
nenhuma que há uma divergência intencional ente a vontade e a declaração, porque na
hipótese do caso pratico diz que ele apenas queria pregar uma partida e não tinha vontade de
oferecer e a questão é saber se ele quis ou não enganar o outro. Se quis enganar é reserva
mental, se não quis enganar é uma declaração não séria.

Face a estes dados do texto da hipótese, seria uma situação de reserva mental, pois neste caso
é plausível que B tenha acreditado que A lhe tinha dado mesmo os 10 mil euros porque não o
fês com ar de brincadeira e entregou-lhe o dito cheque, não o tendo feito, numa fase inicial,
no meio de gargalhadas ou com ar de gozo, sendo duvidoso que o A tenha feito tudo aquilo na
expectativa de a sua falta de seriedade que seria detectada e pelo texto da hipótese o A quis
mesmo que o B acreditasse, porque também não era uma quantia exorbitante, para depois
poder gozar com a situação como de facto aconteceu e se este caso chegasse a tribunal o A
correria o sério risco de o juiz dizer que, face aos dados do caso prático, o A quis mesmo
enganar o B e isto já é suficiente para ser considerado um caso de reserva mental.

Há aqui uma divergência intencional entre a vontade e a declaração e há aqui o intuito da


brincadeira por parte do A, mas a distinção entre reserva mental e discussão não séria não é a
diferença entre ser ou não ser uma brincadeira, a diferença é saber se quis ou não enganar. Se
quis enganar é reserva mental, se não quis enganar é uma declaração não séria pois estaria
convencido que o B não iria acreditar, mas no caso desta hipótese houve mesmo o intuito de
enganar, logo é um caso de reserva mental.

Tendo que se dizer que sendo reserva mental, tinha havido uma divergência entre a vontade e
a declaração de A e que em principio o B não levaria sério e se era para pregar uma partida, a
partida pressupunha que o B não levasse isto a sério e neste caso, em principio não se tratava
de uma partida e foi entregue o cheque de 10 mil euros, isto indicia mais que é uma situação
de reserva mental do que uma declaração não séria.

Serafim Cortizo 20100059 Página 218

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Caso prático nº 3
Em 2008, A, devedor de B, espancou-o até que este aceitasse celebrar por escrito um acordo,
mediante o qual lhe perdoava a divida. B pretende agora reclamar o pagamento da referida
divida, alegando que aquele perdão nunca produziu efeitos, mas A firma que B já nada pode
fazer.

Quid Juris?

Isto é um problema de coacção moral, pois há um pessoa que foi coagida através da força
física, mas à partida o constrangimento físico para obrigar alguém a celebrar um negócio,
tanto pode ser coacção moral como coacção física, depende das circunstâncias e aqui é uma
situação de coacção moral. Mas quando há constrangimento físico não podemos dizer,
automaticamente, isto é coacção física, porque o recurso à força física só é coacção física
quando a vontade do coagido seja totalmente abolida, mas neste caso a vontade do coagido
foi de facto a de desejar celebrar este acordo do perdão da divida em virtude dos
constrangimentos físicos a que foi sujeito, pois o A bateu no B até que o B tivesse mais
vontade de assinar o acordo de perdão da divida do que tinha inicialmente, sendo que a ideia
do A foi quebrar emocionalmente e influenciar o B para ele assinar o acordo.

Este caso de coacção moral aconteceu em 2008 e agora em 2011, o B quer reclamar o
pagamento da divida por parte do A alegando que o perdão não produziu efeitos e agora a
questão é saber se o perdão não produziu efeitos. Não basta dizer que é coacção moral porque
o constrangimento físico visou influenciar a vontade do B e depois têm que se provar os
requisitos da coacção moral do artigo 255 nº 1 e neste caso a coacção moral provém do
declaratário e o que recorreu á força foi o A que é parte deste contrato e neste caso os
preceitos que se aplicam são; provar que a ameaça foi ilícita por ser um crime de ofensas
corporais e a continuação ou agravamento do mal (espancamento) e para anular é fácil
demonstrar que se tudo isto aconteceu, mas também há o objectivo de extorquir uma
declaração negocial como foi o caso e tem que se provar finalmente que aquela conduta foi
essencial, pois se não tivesse havido a ameaça o B não teria celebrado o negócio ou teria
havido um negócio diferente.

É claro neste texto que se não tivesse havido aquela coacção moral com constrangimento
físico por parte do A que o B nunca teria perdoado a divida.

Dirão assim: houve aqui um ameaça ilícita que se consubstanciou em agressões físicas, o
intuito foi obter uma declaração negocial do perdão da divida e resulta do texto da hipótese
que essa conduta terá tido um efeito determinante na vontade do B, pois a prova é que o B,
inicialmente, recusava-se a perdoar a divida e a dada altura já aceitou perdoar a divida.

Provando os requisitos da coacção moral, dir-se-á que este acordo é anulável nos termos do
artigo 256. Mas o B diz que o negócio não produziu efeitos, porque os negócios que são
anuláveis, começam por produzir efeitos até serem anulados, mas este cordo inicialmente
produziu efeitos que foi o perdão da divida e a questão é o B pretender destruir esses efeitos,
que sendo anuláveis, destroem retroactivamente o perdão da divida desde o inicio (artigo 289)
e depois de ter sido anulado, é como se ele nunca tivesse produzido efeitos.

Serafim Cortizo 20100059 Página 219

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A outra questão que se coloca é saber se o B pode destruir esses efeitos, poderá, se puder
anular o negócio desde que B consiga provar todos os requisitos da coacção moral, ele
consegue anular o negócio excepto se o vício já estiver sanado e o único problema que se
coloca aqui é saber se o vício já está sanado, que neste caso seria pelo decurso do tempo e
aqui a data da celebração do negócio foi em 2008 e agora estamos em 2011 e neste caso, a
questão que se coloca é saber, se estando passados 3 anos se é suficiente para dizer que o B já
não poderá anular o negócio, porque se se concluir que ele já não poderá anular o negócio,
então é porque o vício se sanou pelo decurso do tempo e o perdão da divida fica
efectivamente eficaz e fica perdoada. Mas se o B ainda for a tempo de anular o negócio, então
o negócio é destruído.

A lei diz quanto ao prazo para anular o negócio e aqui mesmo aplicando o nº 1 do artigo 287, a
lei diz que é um ano a contar da cessação do vício, neste caso, da coacção e neste caso o vício
cessa quando o B deixa de estar ameaçado mas aqui o texto não é esclarecedor. Aqui terá que
ser dito o seguinte; depois de se provar que há coacção moral o negócio é anulável pois neste
caso a única coisa que falta saber é se o B pode anular o negócio ao fim de 3 anos, se o vício
tinha cessado há mais de 3 anos ele não pode anular, caso contrario pode se o vício cessa e o B
deixou de estar numa situação de ameaça pois se o A durante estes 3 anos ameaçava
periodicamente o B, mas se entretanto cessaram essas ameaças ao B, ele já poderá anular o
negócio que foi celebrado há 3 anos por coacção moral, pois só agora é que cessou o vício.

Caso prático nº 5
No decurso de uma festa, A, que se encontrava embriagado, vendeu um quadro seu muito
valioso a B, por um preço bastante inferior ao seu valor real. A pretende agora que o tribunal
invalide o negócio, ou que, pelo menos, condene B a pagar a A, a título de preço, uma
quantia superior á estipulada pelas partes.

Quid Juris?

Este caso, em principio tem a ver com incapacidade acidental ou com a usura e terão, que
inicialmente referir-se, tanto os requisitos da incapacidade acidental como os da usura mas
terão que se consultar o respectivos artigos e no artigo 257 na incapacidade acidental é a
pessoa estar incapacitada de entender por falta de discernimento, ao dizer que estava
embriagado, pois a embriaguez é causa de perda e redução do discernimento, tendo que ser
uma embriaguez notória, logo, dir-se-á, o A celebrou um negócio estando embriagado e para
se poder anular o negócio com base na incapacidade acidental, o A para além deter que provar
que estava bêbado no momento em que celebrou o negócio, vai ter que provar que o B se
apercebeu desse estado, ou que se não se apercebeu, tinha obrigação de se aperceber, porque
a lei assim o exige na incapacidade acidental, ou que o facto seja conhecido (as consequências
da embriaguez), que isso lhe diminuiu o discernimento e tem que provar, uma de duas coisas,
ou que o B se apercebeu desse estado mental perturbado pelo álcool, ou que se não se
apercebeu, tinha obrigação de se ter apercebido se a embriaguez fosse notória, logo o negócio
é anulado por incapacidade acidental nos termos do artigo 257. Sendo certo que o A na

Serafim Cortizo 20100059 Página 220

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incapacidade acidental não pode pedir um preço mais alto, pois na incapacidade acidental não
se permito que o incapaz possa pedir a modificação do negócio.

Mas também tinha que se ver se neste caso havia o vício da usura, porque este caso prático
justifica que se falem nos dois vícios.

Mas aqui neste caso prático há um negócio bastante desequilibrado, mas não basta ser
desequilibrado para haver usura que vem no artigo 282 e tem também que se provar que o A
que foi a vitima da usura, que concedeu os benefícios excessivos ou injustificados ao B porque
estava numa situação de vulnerabilidade mental resultante da embriaguez, mas ainda falta um
requisito por que é de ele ter dado benéficos excessivos porque estava numa situação de
fragilidade e além disso é preciso que o comprador B, tenha explorado essa situação de
fragilidade, tendo-se aproveitado conscientemente da vulnerabilidade do outro para lhe ter
extorquido benefícios excessivos ou injustificados e admitindo que se verificam estes
requisitos, então estão reunidos também os requisitos para se chamar a este negócio, um
negócio usurário, sendo que a vitima da usura pode anular o negócio ou pedir a sua
modificação, nesta caso, pedir ao juiz que o outro, B pague mais pelo valor do quadro, pois o
problema era que o preço da venda tinha sido demasiado baixo em relação ao valor do
quadro.

A vítima da usura pode optar por pedir a anulação do negócio ou por pedir a modificação do
negócio celebrado.

Caso prático nº 6
A, grande admirador desde criança do celebre viajante italiano Marco Polo, ficou
entusiasmado quando B lhe propôs vender-lhe por apenas 1.000 € uma folha escrita pelo
punho do próprio Marco Polo. Só depois deter aceite a proposta é que A se apercebeu que o
escrito não era da autoria de Marco Polo, mas sim de Marco Paulo, célebre cantor português
do século XX.

a) Terá A algum fundamento para se desvincular do contrato?


b) Imagine que agora o B tinha dito “Marco Paulo”, mas A, por lapso seu, percebeu
“Marco Polo” e respondeu aceito. Quid Juris?
c) Na situação imaginada na alínea anterior, a sua resposta seria diferente se A, em vez
de apenas ter dito “aceito”, tivesse respondido “aceito comprar o texto escrito pelo
Marco Polo”?
Aliena a)Terá A algum fundamento para se desvincular do contrato? Se tiver será, isto tem a
ver com a matéria do erro e para o A se desvincular do contrato teria que ser através de uma
anulação da compra. Mas aqui a anulação seria com base num erro e há aqui um erro evidente
porque há uma falsa ou inexacta interpretação da realidade, porque o A pensava que estava a
comprar uma folha escrita pelo Marco Polo e na realidade estava a comprar uma folha escrita
pelo Marco Paulo e neste caso há um erro na formação da vontade pois o vendedor disse que
lhe estava a vender um papel do Marco Polo. E neste caso se o B sabia que o texto que estava
a vender ao A e mentiu ao dizer que era um texto do Marco Polo, próprio B já poderia ter sido
engando por outra pessoa e podia estar convencido que tinha um texto do Marco Polo e

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quanto ao dolo, o texto não é claro em dizer se há dolo do B, pois não se diz aqui em momento
algum que o B mentiu e que sabia a verdade, pois limitou-se a dizer que tinha uma folha
escrita pelo Marco Polo e isso induziu o A em erro, mas se sabia induziu em erro o A por dolo,
(artigo 254) e quando o erro foi devido a dolo, o negócio é anulável.

Aqui não há duvida nenhuma que o A foi objectivamente engando pelo B, sendo que a
vontade do A foi de a comprar aquela folha tendo-a comprado, pois neste caso não há
divergência entre a vontade e a declaração, pois a vontade do A foi a de comprar aquela folha,
tendo declarado que comprava afolha, logo, não há divergências entre a vontade e a
declaração e neste caso não há erro na declaração.

Mas o A quis comprar a folha porque pensava que era do Marco Polo, ou seja, houve um erro
da parte dele que o levou a querer algo que em condições normais ele não quereria, ou seja,
se ele soubesse que era do Marco Paulo, nunca teria comprado, mas ele pensava que era do
Marco Polo, ou seja, porque ele tinha uma visão errada acerca da autoria do texto, ele desejou
comprar uma folha que caso contrario não compraria e neste caso, a vontade dele formou-se
mal e sendo um caso de erro na formação da vontade (artigo 251), seria um erro sobre o
objecto e o objecto é o texto e a sua autoria.

Mas se por acaso se demonstrar que o B sabia que o texto não era do Marco Polo, então não
só havia erro sobre o objecto, como também havia dolo e portanto, não só o negócio era
anulável com base no artigo 251, mas também com base no artigo 254, porque quando há
dolo o negócio é anulável, a não ser que se for um erro sobre o objecto, o negócio é anulável
nos termos do artigo 251 (erro na formação da vontade) que remete para o artigo 247 mas
não significa que os vícios sejam iguais, mas os requisitos para anular são iguais aos do artigo
247 (erro na declaração), logo, houve um erro na formação da vontade do A, erro esse que
incidiu sobre o objecto, com efeito ele comprou aquilo que queria comprar, mas só o comprou
porque estava em erro sobre a autoria do texto, sendo um erro na formação da vontade e um
erro sobre o objecto e o negócio é anulável nos termos dos artigo 251 que remete para o
artigo 247, sendo que o errante vai ter que demonstrar a essencialidade e que se não tivesse
havido um erro ele nunca teria comprado aquele texto e também terá que provar que o
declaratário sabia ou não deveria ignorar que para o A era essencial comprar o texto do Marco
Polo.

Alínea b) A percebeu mal a declaração do B, o B disse Marco Paulo mas o A percebeu Marco
Polo, no fundo aqui há um erro no entendimento da declaração do B, pois aqui o A percebeu
mal a declaração do B pois ouviu uma coisa que o outro não disse e como percebeu mal a
declaração do outro aceitou fazer o negócio e formou-se um contrato relativamente ao texto
do Marco Paulo. Só que o A dirá que não queria um texto do Marco Paulo, mas sim um texto
do Marco Polo e só disse que aceitou porque percebeu mal, sendo que há aqui um erro na
declaração, mas há teses doutrinárias que dizem que há um erro na formação da vontade
porque A ouviu mal a proposta do B.

Aliena c) Neste caso constatamos que as duas declarações são discrepantes porque há um que
diz “vendo o texto do Marco Paulo” e o outro diz “aceito comprar o texto do Marco Polo”,
sendo que nesta caso não há acordo de vontades e num contrato tem que haver convergência
de declarações e estas declarações não são convergentes, pois aqui nem as vontades nem as

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declarações coincidem porque um tem vontade de vender o texto do Marco Paulo e o outro
tem vontade de comprar o texto do Marco Polo, um diz “vendo o texto do Marco Paulo” o
outro diz “compro o texto do Marco Polo”, aqui não há um problema de anulabilidade pois
não se formou nenhum negócio e nem existe, porque o negócio para ser nulo ou anulável é
preciso que se tenha formado e o que se dira neste caso é que houve declarações negociais
mas essas declarações negociais são discrepantes havendo aqui um dissenso (contrario de
consenso) ou seja, a falta de consenso.

Caso prático nº 7
A prometeu comprar uma casa a B porque estava convencido de que tinha herdado de uma
tia uma levada quantia de dinheiro. Ao aperceber-se de que tal não era o caso, A pretendeu
desvincular-se do contrato promessa, mas B respondeu-lhe que os contratos são para
cumprir.

Quid Juris?

No artigo 251 fala-se no erro na formação da vontade que incide sobre o objecto ou sobre a
pessoa do declaratário, mas pode haver erros na formação da vontade em que o elemento
sobre o qual recai o erro, não seja, nem o objecto nem a pessoa do declaratário porque pode
haver um caso em que a vontade se forma mal num negócio, mas o erro não tem a ver, nem
com aquilo que é o objecto do negócio, nem com a pessoa com quem se está a contratar, pois
até poderia haver um caso em que alguém estivesse em erro sobre si mesmo e se o erro não é
sobre o objecto ou sobre a pessoa do declaratário aplica-se o artigo 252 nº 1.

Neste caso, o A convenceu-se erradamente que tinha herdado da sua tia e a primeira coisa que
faz o A é prometer a B que lhe vai comprar uma casa e depois apercebe-se que não herdou e
quer desvincular-se do contrato promessa, neste caso, por erro.

Neste caso há um erro na formação da vontade, porque o que o levou a querer comprar a casa
foi o estar convencido que tinha dinheiro para o fazer e a vontade dele formou-se mal devido a
um erro, pois ele teve vontade de comprar aquela casa porque pensava que tinha ganho
dinheiro na herança que lhe permitia fazer isso, foi, portanto, um erro na formação da
vontade, sendo que neste caso pratico teria que se recorrer ao artigo 252 nº 1.

É mais difícil anular um negócio com base no artigo 252 nº 1 do que com base no artigo 251,
porque para anular com base no artigo 252 nº 1 tem que se provar que houve um acordo
entre as partes que combinaram se por acaso o A não herdasse o negócio ficaria sem efeito.

Casos práticos – A formação dos contratos

Caso prático nº 1
No dia 11/12/2011 A enviou um fax a B, oferecendo-lhe 15.000 € por um quadro deste, não
lhe fixando qualquer prazo para a aceitação.
No dia 12/12 chegou ao domicílio de B um novo fax em que A reduzia a sua proposta para
10.000 €.
No dia 13/12 B regressou de férias, só então tomando conhecimento de ambos os faxes.

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No dia 15/12, B escreveu uma carta a A, dizendo-lhe que aceitava a proposta de 15.000 €,
tendo A recebido a carta no dia 18/12.
A alega que essa aceitação é duplamente ineficaz; em primeiro lugar porque a proposta de
15.000 € tinha sido substituída pela de 10.000 €; em segundo lugar porque a aceitação de B
tinha chegado ao poder de A já fora do prazo legal.

Quid Juris?

Desde já conclui-se que não há vício de forma, porque há liberdade de forma para a compra
e venda de quadros, e na proposta feita através de um fax, não há nenhum problema formal.

O A no dia 11 faz uma proposta de venda por 15.000 €, e no dia seguinte mudou de ideias e faz
uma nova proposta de 10.000 €, e só no dia 13 é que o B regressa de férias e toma
conhecimento dos dois faxes, e o B decidiu aceitar a primeira proposta, sendo que o A com a
segunda proposta pretendia revogar a primeira, e aqui levanta-se a questão de saber se o A
podia revogar a proposta inicial, e o B abstraiu-se da revogação, como se ela não existisse e
aceitou a primeira proposta que era a mais vantajosa. E agora o A que não lhe interessa que o
contrato seja por 15.000 €, vem agora dizer que a aceitação do B, é duplamente ineficaz.

O A diz que a primeira proposta de 15.000 € é ineficaz porque tinha sido substituída por uma
de 10.000 €, dizendo que revogou a proposta de 15.000 €, mas depois há um segundo
argumento do A ao dizer que, em segundo lugar a aceitação do B já tinha chegado fora do
prazo legal. O A não diz apenas que revogou a primeira proposta, pois também diz que o B já
não podia aceitar porque a sua aceitação tinha chegado fora do prazo legal.

Aqui o primeiro argumento é o da revogação, porque o A diz que revogou, mas a questão é
saber se ele podia revogar a primeira proposta. A hipótese não nos diz se ele tinha fixado na
proposta uma clausula de irrevogabilidade, pois se no fax de 15.000 € ele tiver dito que se
reserva o direito de revogar, então não há duvida nenhuma que ele poderia revogar, porque o
artigo 230 nº 2, logo na parte inicial, diz “salvo estipulação em contrário” e isto quer dizer que
pode haver uma estipulação do proponente declarando aquando da feitura da proposta que a
mesma é revogável. Neste caso, mesmo não havendo clausula de revogabilidade, a lei admite
que a revogação seja eficaz, se a revogação chegar ao destinatário da proposta, antes, ou ao
mesmo tempo que a própria proposta.

Mas isso aqui não aconteceu, porque a proposta inicial chegou no dia 11/12, e a revogação
chegou no dia 12/12 e neste caso, face á teoria da recepção, a proposta inicial,
independentemente de o B estar, ou não de férias, a proposta inicial é eficaz a partir do
momento em que está á disposição do destinatário, sendo que, a proposta de 15.000 €
tornou-se eficaz no dia 11/12, enquanto a proposta de 10.000 € só se tornou eficaz no dia
12/12, e à luz da aplicação do artigo 224 nº 1, primeira parte, que consagra a teoria da
recepção nas declarações receptícias ou recipiendas, pois esta declaração tem destinatário
determinado, pois o A quer na proposta, quer na revogação dirige-se sempre a uma pessoa
concreta que é o B.

Em principio, e segundo a opinião da maioria da doutrina, esta revogação não é eficaz porque
apesar de o B ter lido os dois faxes no mesmo dia, a recepção não foi simultânea, pois recebeu

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primeiro a de 15.000 € e só depois a de 10.000 €, e portanto, segundo o entendimento


dominante, o que conta é o momento em que as declarações ficaram eficazes, que foi no
momento da recepção e não do seu conhecimento, e como uma foi recebida a 11 e outra a 12,
a segunda não pode ter como consequência revogar a primeira, porque em principio a
resposta a dar será dizer que; a revogação não é eficaz porque não havia clausula de
revogabilidade e porque não está preenchido o requisito do artigo 230 nº 2.

Neste caso, haveria que referir a posição doutrinária do professor Heinrich Horster ao dizer
que apesar de a declaração ter chegado depois da proposta, como ambas as declarações
forma conhecidas ao mesmo tempo, ele considera que o destinatário da proposta não
chegou a criar nenhuma expectativa que devia vender por 15.000 €, e atendendo ao
elemento teleológico, que a razão que leva a lei a proibir a revogação das propostas é evitar
frustrar as expectativas do destinatário, e num exemplo destes, apesar de o B ter recebido as
declarações em momentos diferentes, como tomou conhecimento delas ao mesmo tempo,
que o B não teria chegado a criar nenhuma expectativa digna de protecção de vender por
15.000 €, e neste caso a segunda proposta, que no fundo é uma revogação da primeira, seria
eficaz apesar de ter chegado depois.

Aqui o que haveria de dizer, é se havia uma cláusula de revogação, poderia revogar, se não
havia uma cláusula de revogabilidade, em princípio a revogação que fez é ineficaz porque
apesar de terem sido conhecidas ao mesmo tempo, a revogação chegou depois da proposta,
no entanto, há um autor que defende a tese de que neste caso deve prevalecer a revogação.

E agora resta saber se a aceitação do B, tinha ou não tinha chegado fora do prazo, porque o A
não alega apenas que revogou a primeira proposta, pois o A também alega que, mesmo
quanto á primeira proposta, ela já não poderia ser aceite porque a aceitação chegou fora do
prazo e aqui tem que se ver qual era o prazo para aceitar a primeira proposta, porque o B ao
aceitar a primeira, a questão é saber se aceitou dentro ou fora do prazo.

Neste caso diz-se que o A não fixou o prazo ao B, e também não pediu resposta imediata,
neta caso, tem que se ir imediatamente para a alínea c) do artigo 228.

E então tem que se averiguar, admitindo que a primeira proposta de 15.000 € é eficaz, até
quando é que poderia ser aceite, sendo certo que se aplica a alínea c) do artigo 228 e a
aplicação da aliena c) do artigo 228, consiste em somar 5 dias ao prazo da alínea b).

Neste caso, se são 5 dias a somar ao prazo da aliena b) (prazo da resposta imediata) a
dificuldade não é somar 5 dias a um prazo, mas sim saber qual é o prazo da alínea anterior,
pensando qual seria o prazo se se tivesse pedido resposta imediata, e depois de achado este
prazo, somam-se então 5 dias, mas é preciso ter em atenção que isto não é uma carta, mas sim
um fax, e neste caso não se deve ir para a hipótese de somar 3 dias + 3 dias.

O raciocínio é, se no dia 11/12 ela mandava o fax e pedia resposta imediata, o B deveria neste
caso responder ao fax no dia 11/12 e então somando 5 dias, e neste caso como a aceitação
chegou no dia 18/12, esta chegou claramente fora do prazo, mas chegou fora do prazo, se
raciocinarem que é um fax e não uma carta, porque aí a contagem dos prazos seria diferente.

Caso Prático nº 2

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Em 07/12/2011, A escreveu uma carta a B, dizendo que lhe vendia certa jóia sua por 20.000
€. B recebeu a carta de A em 10/12/2011, um dia depois de A ter morrido. Ignorando a
morte deste, B enviou um telegrama em 15/12/2011, dizendo que aceitava. Porém, por
lapso dos CTT, o telegrama só foi recebido por C, filho de A e que vivia com este, em
28/12/2011.
C telefonou imediatamente a B, prontificando-se para lhe entregar a jóia e receber o
dinheiro, mas B, que entretanto se tinha arrependido de ter aceite a proposta, veio alegar
que não se formou contrato porque a sua aceitação foi recebida por C fora de prazo e
porque a pessoa com quem ele queria contratar era A e não C.
a) Analise os dois argumentos de B.
b) Imagine agora que, após ter enviado a carta a B, A tinha vendido a referida jóia a D,
em 08/12/2011.
Quid Juris?

Alínea a)

O B tem dois argumentos, um deles é, não se formou contrato porque a sua aceitação foi
recebida por C fora do prazo, portanto, é o próprio aceitante B que alega que recebeu fora do
prazo, pois está arrependido de ter aceite, vindo argumentar que a aceitação foi feita fora do
prazo.

No segundo argumento, o B alega que não era com o C que queria contratar, mas sim com o
falecido A.

O argumento de que o B não queria contratar com o C mas sim com o A, este argumento não é
procedente porque há um artigo que diz que a morte do proponente não obsta à formação do
contrato (artigo 231 nº 1) e não é porque o proponente morre que se impede a formação do
contrato pois este ao formar-se, forma-se com os seus herdeiros, e portanto, não é argumento
do aceitante dizer que não queria contratar com o C, mas sim com o A.

Mas o outro argumento do B é o de que, ele B, aceitou fora de prazo, vindo invocar o caracter
tardio da sua própria aceitação, e isto obriga-nos a ver qual é o prazo que efectivamente o B
tinha para aceitar.

Nesta hipótese, mais uma vez, o proponente não tinha fixado prazo ao destinatário para
aceitar a proposta e se não lhe fixou um prazo, aplica-se a alínea c) do artigo 228, e tendo,
neste caso, a proposta sido feita por carta, e então há que calcular qual seria o prazo se se
tivesse pedido resposta imediata, e somar-lhe 5 dias.

Se o A tivesse pedido resposta imediata, na melhor das hipóteses para o B seria 3 dias mais 3,
admitindo que se aplicava por analogia aquela norma do CPC, em que se presume que as
notificações judiciais enviadas pelo correio chegam ao destino 3 dias depois do carimbo.

Vamos admitir que, se se tivesse pedido resposta imediata, o destinatário teria 6 dias, a partir
da emissão da proposta, e se a proposta foi emitida em 07/12 e se se pedisse resposta
imediata, o outro poderia aceitar até dia 13/12, mas como não foi pedida resposta imediata,
ainda temos 5 dias, 5+13= 18, e a aceitação deveria ter chegado, o mais tardar no dia 18/12,
mas chegou a 28/12 por causa de um lapso dos correios, porque a aceitação foi emitida por

Serafim Cortizo 20100059 Página 226

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telegrama a 16/12, e o aceitante com o argumento em que a resposta chegou tardiamente,


alega que a sua aceitação, por ser tardia, não é válida.

Só que neste caso, quem decide se a aceitação tardia conta, ou não conta, neste caso é o
proponente, porque há aceitações tardias que o proponente pode considerar eficazes ao
abrigo do artigo 229 nº 2 primeira parte, onde é previsto que em certos casos em que a
aceitação é tardia, ainda assim, o proponente pode considerá-la eficaz, pois é preciso que
apesar de a declaração ter chegado tardiamente, que tenha sido emitida em tempo oportuno,
ou seja, a recepção pode ser tardia, mas a emissão ter sido feita em tempo oportuno, e neste
caso quem decide se ela é ou não é eficaz, é o proponente (artigo 229 nº 2 primeira parte) que
pode considerar eficaz, e aqui o proponente é o A, mas como o A morreu, agora é o C como
herdeiro, e é o C que decide se considera ou não eficaz, a aceitação tardia do B, porque a
declaração apesar do atraso, foi emitida em tempo oportuno.

Aqui o se deve dizer é;

Quanto aos argumentos do B, ele não tem razão em nenhum dos argumentos, pois não tem
razão quando diz o contrato não se formou porque queria contratar com o proponente A e
não com o herdeiro (artigo 231 nº 1), o B também não pode dizer que o contrato não se
formou parque a sua aceitação foi tardia, mas é um caso em que foi tardia mas o
proponente pode considerá-la eficaz (artigo 229 nº 2 primeira parte).

Alínea b)

Aqui está a pedir-se para imaginar um cenário, recordando que a carta do A com a proposta do
A foi escrita ao B em 07/12, e só foi recebida pelo B a 10/12.

No dia 08/12 o A vendeu a jóia a um terceiro D, e aqui aplica-se o artigo 226 nº 2 porque é um
caso em que o proponente perde o poder de disposição depois de ter emitido a proposta, mas
antes de ela ter sido recebida.

A proposta é feita a 07/12, foi recebida a 10/12, mas ele vendeu a 08/12, e nesse momento
deixou de se dono do bem e deixou de ter poder de disposição sobre a jóia, o quer dizer, que
quando o B recebeu uma proposta no dia 10, recebeu uma proposta vinda de uma pessoa que
no momento em que aquela proposta se tornou eficaz, o proponente já não tinha o poder de
disposição (artigo 226 nº 2).

Neste caso não se forma contrato porque a proposta do A para o B nunca chegou a produzir
efeitos, porque o artigo 226 nº 2 diz claramente que a declaração é ineficaz, se o declarante
enquanto o destinatário não tiver conhecimento a proposta, perder o poder de disposição, e
neste caso o proponente A perdeu o poder de disposição a 08/12, e o destinatário da proposta
só a recebeu a 10/12, e portanto, a proposta já chegou ineficaz quando chegou ao poder de B,
sendo que aqui nunca haverá uma revogação da proposta porque esta nunca chegou a
produzir efeitos tendo caducado por força da perda do poder de disposição.

Serafim Cortizo 20100059 Página 227

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Caso prático nº 3
No dia 10/12/2011, B proprietário de uma jóia muito valiosa, recebeu uma proposta de
compra emitida por A. No dia 20/12/2011, A recebeu uma carta de B dizendo que aceitava.
Partindo do princípio de que a aceitação ocorreu dentro do prazo legal, imagine as 3
seguintes hipóteses, independentemente umas das outras:

1ª Hipótese: No dia 27/12/2011 foi declarada pelo Tribunal a inabilitação de B.


2ª Hipótese: No dia 15/12/2011 foi declarada pelo Tribunal a inabilitação de B.
3ª Hipótese: No dia 06/12/2011 tinha sido decretada pelo Tribunal a inabilitação de B.

Pretende-se saber se nessas três hipóteses, independentes umas das outras, se chegou a
formar algum contrato e se, no caso afirmativo, tal contrato, é válido ou inválido.

1ª Hipótese

Nesta primeira hipótese, se se formou contrato antes da sentença de inabilitação, dir-se-ia, o


contrato formou-se no dia 20/12 e a aceitação ocorreu dentro do prazo, houve uma sentença
de inabilitação posterior à celebração do contrato, ou seja, quando o contrato foi celebrado, o
B era juridicamente capaz, mas depois nos artigos 149 e 150 (interdição) aplicados por força
do artigo 156 (inabilitação) pois os artigos 149 e 150 prevêem que quando uma pessoa é
declarada interdita ou inabilitada, que o tutor ou o curador, possam vir invalidar negócios
antes de ter sido proferida a sentença.

O negócio foi celebrado 7 dias antes da sentença, e na altura em que foi celebrado o negócio já
estava a decorrer o processo, a dúvida era saber se já tinha sido anunciada a acção, porque o
artigo 149, é quando o contrato foi celebrado e já está a decorrer o processo, e já houve o
anuncio a anunciar que decorre uma acção de interdição ou de inabilitação. Se na altura em
que é celebrado o negócio já está a decorrer um processo, mas se ainda não tinha havido
anúncios, aplica-se o artigo 150 que remete para o artigo 257 (incapacidade acidental).

Então dir-se-ia que :

A aceitação ocorreu antes da sentença de inabilitação e tendo em conta que a aceitação foi
dentro do prazo, neste caso formou-se o contrato, quanto á sua validade, sendo certo que o
contrato se formou na altura em que ainda não havia a sentença, e em que o B era capaz, é
preciso não esquecer que os artigos 149 e 150, aplicáveis por força do artigo 156, que
permitem ao tutor ou ao curador, virem mais tarde anular os negócios celebrados antes da
sentença, se se verificarem os requisitos do artigo 149, se o negócio foi celebrado numa altura
em que já estava a decorrer a acção, como é este o caso, se ainda não havia os anúncios, seria
com base no artigo 150, e teria que se provar que a outra parte sabia, ou devia saber que o
outro não estava mentalmente apto, mas nos termos do artigo 149, terá que se demonstrar
que o negócio causou prejuízo ao inabilitado.

2ª Hipótese

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Aqui a diferença face á primeira hipótese, é que na primeira hipótese o contrato já estava
formado quando a pessoa é declarada inabilitada, nesta segunda hipótese, o contrato ainda
não estava formado quando a pessoa é declarada inabilitada.

Neste caso dir-se-ia;

Aqui a inabilitação é antes de o contrato estar formado, mas também pode ser importante
saber se quando é inabilitado se já tinha respondido a emitir a aceitação.

O B recebeu a proposta no dia 10/12, e no dia 10/12 o B ainda não estava inabilitado, quando
a proposta chegou ao destinatário, o destinatário era capaz, mas quando a aceitação chegou
ao proponente, o aceitante já era incapaz.

Pode interessar saber se no dia 15/12 em que foi decretada a inabilitação, o B já tinha ou não
tinha respondido a dizer que aceitava, e pelos dados da hipótese, o B ainda não tinha
respondido quando foi declarado inabilitado.

Se quando o B foi declarado inabilitado e ainda não tinha respondido, nesse caso, aplica-se
claramente o artigo 231 nº 2. Mas se o B no dia 15/12 já tinha emitido a aceitação, o que não
é provável, porque pelos dados da hipótese a carta teria demorado 6 dias até chegar á sua
posse, mas se ele já tinha emitido a aceitação, e só depois é que fica incapaz, e neste caso o
artigo 231 nº 2 está a pressupor que o destinatário da proposta morre ou fica inabilitado ou
incapaz, antes de ter emitido a sua própria aceitação, porque se por acaso o destinatário da
proposta já tiver emitido a aceitação, e só depois é que se torna incapaz ou morrer, nesse
caso, o que se aplicaria era o artigo 226 nº 1 que fala apenas em declarante e tanto é
declarante quem propõe, como quem aceita, e eu, pessoalmente só aplicaria o artigo 231 nº
2 àqueles casos em que o destinatário morre ou fica incapaz, antes de receber a proposta, ou
já depois de a ter recebido, mas antes de ter respondido.

Fundamentalmente, nesta hipótese era ir para o artigo 231 nº 2, e depois distinguir


consoante o momento da incapacidade, porque aquilo que sabemos é que ele ficou incapaz
durante a formação do contrato, mas não se sabia se já tinha ou não emitido a aceitação,
pois só sabemos que chegou dia 20/12, mas não sabe quando é que partiu.

3ª Hipótese

Neste caso, imaginando-se que a proposta partiu dia 7/12 mas que foi recebida a 10/12, e
vamos imaginar que a proposta demorou 2 ou 3 dias. Quer dizer que quando a proposta foi
feita, foi dirigida a uma pessoa que já era incapaz e que depois aceitou e essa hipótese da
venda de uma jóia valiosa que é um acto de disposição entre vivos, e aplica-se o artigo 153,
onde se diz que os actos de disposição de bens do inabilitado têm que ter o consentimento do
curador.

Aqui temos uma pessoa que já estava inabilitada a 6/12, e aceitou a proposta algures entre
dia 10 e dia 20/12, e portanto, essa pessoa quando lhe foi feita a proposta e quando recebeu
a proposta já era incapaz, e nesse caso é um vulgar caso de contrato celebrado por um
incapaz, e por força do artigo 156, tinha que se ir às regras dos artigos 148 e seguintes, e se
já houvesse o registo da sentença era o artigo 148 que se aplicava.

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O B foi declarado inabilitado dia 6/12, e ficou incapaz nesse dia, e se a proposta foi feita depois
do dia 6/12, quer dizer, que quando foi emitida a proposta, ela já foi dirigida a uma pessoa que
naquele momento já era incapaz e que aceitou a proposta. Aqui há um vulgar caso de um
contrato que é aceite por um incapaz no qual se aplicam as regras normais da inabilitação,
mas admitindo que a proposta foi feita a dia 5/12 e por alguma razão chegou a dia 10/12, é
que se proposta foi feita numa altura em que ela ainda não era incapaz, e entretanto tornou-
se, aí já voltamos a cair no artigo 231 nº 2.

Caso prático nº 4
A enviou a B em 09/12/2011 a seguinte carta: “Quero comprar o teu quadro X por 10.000 €.
Pretendo resposta muitíssimo urgente. Porém só aceito vincular-me por escritura pública”. B
que recebeu a referida carta em 11/12, deixou em 18/12 no gravador de chamadas de A, a
seguinte mensagem: “De acordo. Marca a escritura”. A em 20/12 enviou um telegrama
dizendo:
“Considero a tua aceitação eficaz”. No mesmo dia, B, já depois de ter recebido esse
telegrama, enviou a C a seguinte carta. “Vendo-te o meu quadro X por 20.000 €. Tendo em
conta os usos existentes na venda de antiguidades, caso não respondas no prazo de cinco
dias, considerarei que concordas". Em 21/12 D visitou B e oferece-lhe 30.000 e pelo referido
quadro, tenho B aceite e entregue de imediato o quadro a D. logo de seguida B escreveu a C
comunicando-lhe já não pretender o negócio. A 22/12 C recebeu a primeira carta de B que
porém não abriu e, em 23/12, recebeu a segunda carta de A, tendo lido ambas nesse
momento.

a) A diz que o quadro é seu, mas quer C, quer D alegam que a aceitação de B foi tardia e
que não foi respeitada a forma previamente estipulada.
Quid Juris?

b) Abstraindo da resposta dada á pergunta anterior e partindo da premissa que o quadro


não foi adquirido por A, quem é que tem direito ao quadro?

Isto é um negócio que em principio há liberdade de forma, pois a compra de um quadro pode
ser oral, mas o proponente ao fazer a proposta, declarou logo á partida que só aceitava
vincular-se por escritura publica, ou seja, o proponente exigir a adopção de um forma
condicional, ou seja, o A disse peremptoriamente ao B que só se consideraria vinculado por
escritura publica, ou seja, ela está a exigir para o negócio uma forma mais solene do que
aquela que a lei prevê, nos termos do artigo 223 que prevê a forma convencional.

Neste caso, constatamos que o A que inicialmente dizia que só se vinculava por escritura
pública, quando o B responde a aceitar e a pedir para marcar a escritura pública, o A retorquiu
dizendo que considera a aceitação eficaz.

No fundo o A veio prescindir da sua exigência de adopção de escritura publica, porque o A diz
ao B que só se aceita vincular por escritura publica, o B responde que aceita e pede para
marcar a escritura, e o B na realidade concordou com a proposta do A também na parte em
que o A lhe propunha que fosse por escritura publica, tendo o B concordado com os termos
em que a proposta lhe foi feita na parte em que exigia a forma mais solene, só que depois o A
responde ao B dizendo que considera a sua aceitação eficaz, e aqui neste caso temos que ver o

Serafim Cortizo 20100059 Página 230

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que é que o A quer dizer, se aceita que se forme o contrato sem ser por escritura pública, ou
se quando diz que considera eficaz, é no sentido de estar a admitir que uma resposta tardia
possa ser considerada como sendo em tempo útil. E aqui a questão é saber se havia aqui
algum prazo para aceitar, porque na primeira pergunta em que o A diz que o quadro é seu,
mas o C e o D alegam que a aceitação do B foi tardia, e que não foi respeitada a forma
previamente estipulada.

Aliena a)

Na primeira pergunta há dois problemas, que é saber se há contrato, visto que não foi
respeitada a forma previamente estipulada, e isso é ponto assente que o contrato não se
formou por escritura publica, é certo que a lei não exigia escritura publica, mas é certo que o A
disse previamente que teria que ser por escritura publica, e o B respondeu que aceitava e pede
para marcar a escritura, e a questão é saber se o A pode unilateralmente dizer que considera a
aceitação eficaz, neste caso é a mesma coisa que dizer que se formou contrato.

A resposta do B não é uma resposta eficaz da aceitação do contrato, porque ele ao concordar
com o A, concordou em que se estipulasse a adopção de uma forma condicional, que é a
escritura publica, e eles no fundo concordaram que tinha que ser por escritura pública, neste
momento quando há a resposta do B não há nenhum contrato formado, mas há apenas um
acordo das partes em que já estão de acordo sobre o preço, mas ambos combinaram que se se
vinculariam por escritura pública, e neste caso enquanto não houver escritura publica não há
contrato.

Mas o problema é que o A diz que considera a aceitação eficaz, e se ele com isso quer dizer
que considera que há contrato, dizendo que desiste da escritura publica, o A não pode sozinho
exigir a escritura publica porque há um acordo das partes na adopção da escritura publica,
sendo que foi uma ideia do A com a qual o B concordou, pois o A sozinho não pode vir agora
dizer que mesmo sem escritura publica há contrato, porque o B pode vir dizer que já tinha sido
combinado previamente que tinha que ser por escritura publica, e portanto, se o A quando diz
que considera a aceitação eficaz está com isso a querer dizer que desiste da escritura publica,
o A sozinho não pode desistir da escritura pública, pois seria preciso preciso que o outro
concordasse, pois é evidente que eles podem revogar um acordo sobre a forma, pois o artigo
223 admite que apesar de haver uma forma convencional, presume-se que as partes não se
querem vincular a não ser pela forma convencional.

O A não pode unilateralmente vir dizer que a aceitação do B é eficaz, porque a aceitação do B
não é juridicamente vinculativa para a formação do contrato por causa do artigo 223, pois aqui
na hipótese, o B em momento algum diz isso.

Nesta primeira hipótese há uma segunda pergunta que é saber se a aceitação do B foi tardia,
neste caso, em primeiro lugar é discutível dizer que tenha havido uma aceitação, pois o A é
que decidiu que era uma aceitação, o que o B aceitou foi a proposta do A para que fizessem a
venda por escritura publica, e neste caso, tecnicamente falando, não há uma proposta de
compra e uma aceitação de venda, neste caso, o que há é um pré acordo em que um diz que
está disponível para lhe comprar o quadro por X, mas que tem que ser por escritura publica e o
outro aceita, e portanto, á partida, nem a declaração inicial do A nem a declaração inicial do B

Serafim Cortizo 20100059 Página 231

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valem como declarações de compra e venda, quanto muito poderá dizer-se que quando o A diz
que considera a aceitação eficaz, poderá dizer-se que o A, por ele já está a prescindir da
escritura publica, mas na hipótese o B não prescinde da mesma, e enquanto o B não
prescindir, o B pode sempre dizer que o contrato não foi celebrado pela forma legalmente
exigida, e se for violado o artigo 223, é de entender que nem sequer se formou o contrato e
nem sequer existe um problema de nulidade.

Mas há aqui outro problema que é o do carácter tardio ou não relativamente à aceitação do B.

Em primeiro lugar, até defendo a tese, de que aquilo nem é uma verdadeira aceitação, mas
admitindo que era uma aceitação do B, pois a carta com a proposta foi enviada no dia 9/12 e
diz que quer resposta imediata, aqui aplica-se a alínea b) do artigo 228 sobre a resposta
imediata, mas se se entende que é uma resposta urgente, aplicar-se-ia a aliena c) do artigo
228, mas se se entender que se pedia resposta muto urgente, seria a alínea c) do artigo 228
que são mais 5 dias.

Imaginemos que foi muitíssimo urgente, equivale a resposta imediata, então aplicar-se-ia o
artigo 228 aliena b), mas como isto foi por carta, admitindo que se aplicava por analogia a
regra dos 3 dias, e neste caso, uma resposta imediata, seria 3 dias para a carta ir do
proponente para o destinatário e mais 3 dias para regressar ao proponente, e quanto muito 1
dia de reflexão, porque resposta imediata, pode não querer dizer resposta no mesmo dia, e
então uma proposta enviada no dai 9/12, se se aplicar a regra dos 3 dias para as cartas,
presumia-se que chegava ao destino dia 12/12, e depois mais 3 dias de regresso, e neste caso,
se se pedisse resposta imediata, teria que se chegar o mais tardar dia 15, ou eventualmente no
dia 16, se a resposta imediata ainda permitiria 1 de dia de reflexão, mas nesta hipótese ele deu
a resposta no dia 19/12, e se neste caso, muitíssimo urgente era sinónimo de resposta
imediata, mesmo que se entendesse que aquelas eram verdadeiras propostas e aceitações, se
fosse uma aceitação para a qual se pedia resposta imediata, tinha que ser o mais tardar até dia
15 ou 16/12, e portanto, dia 19/12 seria sempre tardio.

Mas se se entender que muitíssimo urgente não é resposta imediata, mas se se entender que
era resposta imediata, o dia 18/12 já era fora do prazo, mas se se entender que muitíssimo
urgente não é a resposta imediata, então ainda haveria mais 5 dias para somar ao dia 15/12 o
que daria dia 20/12, e por aí já não haveria problema do prazo, mas sim o de saber se seria
uma verdadeira aceitação.

Alínea b)

Na segunda aliena, o B depois de ter dito que concordava e pede para marcar a escritura, e o A
responde a dizer que considera a aceitação eficaz, mas nesse dia o B já depois te ter recebido a
resposta do A, enviou a C uma carta a dizer que vende o quadro por 20.000 €, e caso não haja
resposta no prazo de 5 dias, considera-se que o C concorda.

Nesta segunda alínea estamos a partir do principio que o quadro não é do A, e se o quadro não
é do A, quer dizer que o B ainda o poderia vender e o B tenta vender ao C por 20.000 € e tendo
em conta os usos, se não houver resposta no prazo de 5 dias, considera-se que o C concorda.

Serafim Cortizo 20100059 Página 232

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Neste caso há aqui um tópico em que se dá valor ao silêncio, onde se diz que caso não se
responda no prazo de 5 dias, considera-se que a proposta foi aceite.

Neste caso está-se a dar valor ao silencio do outro, e está dar valor invocando um uso, porque
unilateralmente, uma pessoa não pode decidir que o silencio de outra pessoa, tem valor
declarativo, porque o artigo 218 diz que o silencio só tem valor declarativo em 3 casos, ou
quando há uma normal legal que o diz, ou quando há um uso, ou quando há uma convenção, e
portanto, uma pessoa sozinha não pode decidir ao outro que se ele nada disser é porque
aceita, mas se efectivamente for verdade que havia um uso, então o silencio do destinatário
poderá valer como um sim.

Neste caso, em condições normais, mesmo que o outro não respondesse, formar-se-ia
contrato se não respondesse no prazo de X dias, porque o seu silêncio valeria como
declaração.

Aqui o problema é que quando o C recebe a proposta, já tinha entretanto o bem sido vendido
a B e já havia uma quebra do poder de disposição.

Respostas a perguntas de testes e exames


1. Se alguém comprar uma fotocopiadora a fim de fabricar notas falsas, tal compra será
válida ou inválida?
Neste caso a compra da máquina de fotocópias era um negócio perfeitamente válido, sendo
que o que será ilícito será a utilidade que venha a ser dada á maquina de fotocópias que é a
falsificação de notas, sendo que, a lei prevê a sua nulidade no artigo 280 nº 2 e também no
artigo 281, onde um possível acordo, ou conluio entra duas partes no sentido de dividirem os
lucros, da falsificação de notas, quem, vende a fotocopiadora e quem a adquiriu
posteriormente, se há um acordo ilícito que viole o exposto no artigo 281, sendo um negócio
contrario à lei, ou á ordem publica, ou aos bons costumes, tal finalidade é o vicio que torna
nula a compra desta máquina de fotocópias.

2. Qualifique as seguintes cláusulas: “este contrato não produzirá efeitos enquanto a,


minha mãe for viva e deixará de produzir efeitos quando eu tiver um neto”.
Neste caso estamos perante uma cláusula acessória do negócio jurídico, verificando-se neste
caso uma condição suspensiva do negócio jurídico, em conformidade com o artigo 270, pois
inicialmente a produção de efeitos está dependente de um facto de verificação incerta, sendo
que, a produção de efeitos deste contrato está posteriormente dependente de um
acontecimento futuro, e atendendo ao exposto, estamos também perante uma condição
resolutiva deste mesmo contrato.

3. Distinga as várias modalidades de simulação subjectiva e diga qual é o regime jurídico


que lhe é aplicável.
Fala-se em simulação subjectiva quando o elemento sobre o qual incide a simulação é a pessoa
ou pessoas que celebram o negócio, podendo distinguir-se duas modalidades dentro da
simulação subjectiva como sendo:

Serafim Cortizo 20100059 Página 233

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A simulação por interposição fictícia de pessoas e a simulação por supressão do sujeito real.
Em ambos os casos, é uma simulação subjectiva e em ambos os casos há uma aparência que o
negócio é celebrado entre certas pessoas, mas na realidade não é exactamente entre essas
pessoas, mas sim com outras pessoas e por isso é que é uma simulação subjectiva, pois é o
próprio sujeito do negócio que é o elemento sobre o qual incide a simulação, sendo que o vício
destes negócios celebrados através da simulação subjectiva levará á sua nulidade.

4. Concorda com a afirmação de que á proposta contratual e a aceitação se aplica sempre o


regime das declarações recipiendas ou receptícias?
A declaração recipienda ou recepetícia, verifica-se quando a proposta se destina ou se dirige a
um destinatário determinado, em conformidade com o exposto no artigo 224 nº 1, primeira
parte, mas a proposta contratual dirigida a um destinatário indeterminado que se designa por
declaração não recipienda ou não recepetícia, também é válida com o exposto no artigo 224
nº 1, segunda parte, através de uma oferta ao público em conformidade como exposto no
artigo 225, logo, esta afirmação está errada.

5. Se A fizer uma proposta contratual a B advertindo-o de que se não responder dentro de


certo prazo considerará o contrato celebrado. Poderá interpretar uma eventual falta de
resposta de B com sendo um aceitação.
Este caso engloba-se na figura jurídica do silêncio como está referida no artigo 218 e em
conformidade com o exposto neste artigo, o silencio nem sempre é válido como declaração
negocial, exceptuando três situações previstas na lei, por uma norma legal, por um uso, ou por
uma convenção, sendo que o silêncio nunca poderá ser imposto unilateralmente pois tal não é
permitido por lei.

6. Pronuncie-se sobre a validade de um contrato pelo qual o juiz, em troca de uma


determinada quantia, se compromete a julgar um caso a favor de certa pessoa.
Neste caso estamos perante um contrato que tem um objecto contrário á lei, pois neste caso o
juiz está a prescindir da sua autonomia e a aceitar ser corrompido constituindo um acto ilícito,
sendo um contrato nulo, em conformidade com o artigo 280 nº 1.

7. Tendo A emitido uma declaração negocial dirigida a B, surgiu um conflito entre eles
acerca do sentido a atribuir à referida declaração?
Neste caso, se é uma declaração negocial de A para B se um lhe dá um sentido e o outro lhe dá
outro, e neste caso há uma polémica relativamente á interpretação da declaração negocial, e o
juiz deve aplicar os critérios previstos na lei, e então resumem-se os artigos 236 e 237 dizendo,
o juiz vai ter que ele próprio interpretar a declaração negocial, e se o juiz concluir que o
declaratário percebeu o que é que o declarante querida dizer, então a declaração vale com o
sentido que o declarante lhe queria dar (artigo 236 nº 2) e então há um entendimento comum
a ambas as partes, e se isso acontece, aplica-se o artigo 236 nº 2 e dá-se á declaração o sentido
que o declarante lhe queria dar.

Mas se por acaso o declaratário não percebeu o que é que o declarante lhe queria dizer, então
há que aplicar o artigo 236 nº 1, e nesse caso, o juiz vai ver o que é que um declaratário
normal, na posição do verdadeiro declaratário teria percebido, ou seja, o que é que uma
pessoa média, com o mesmo grau de informação do verdadeiro declaratário, o que é que essa
pessoa média perceberia, se tivesse sido a ela que a declaração tivesse sido dirigida

Serafim Cortizo 20100059 Página 234

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exactamente naqueles termos, e o juiz nos termos do artigo 236 nº 1, dá á declaração o


sentido que a tal pessoa normal lhe daria, que até pode não ser o sentido do declarante nem o
sentido do declaratário.

Mas se aplicando o artigo 236, se mesmo assim o juiz estiver na dúvida sobre o sentido da
declaração, vai-se para o artigo 237, e consoante o negócio seja oneroso ou gratuito a
interpretação será feita pelo juiz no negócio gratuito, faz-se a interpretação mais favorável ao
disponente, e no negócio oneroso a interpretação que conduz ao resultado mais equilibrado.

8. Distinga forma ad substancian e ad probationen no tocante aos seus regimes jurídicos.


Nos casos em que a lei exige uma determinada forma para um negócio, há que distinguir,
atendendo aos regimes, existem dois tipos de forma legal.

Forma ad substancian quando a forma é exigida por lei com requisito de validade, ou seja,
sempre que se conclua que a violação da forma implique a invalidade do negócio.

Forma ad probationen quando a forma legal é exigida, não como requisito de validade, mas
apenas como requisito de prova do negócio o que significa que se a forma não for respeitada,
o negócio é válido mas não pode ser provado.

Se a forma é ad substancian, se a forma for violada, o contrato é nulo (artigo 220), mas se for
ad probationen, se a forma for violada, o contrato é válido, mas só pode ser provado por
confissão (artigo 364 nº 2).

9. Se uma aceitação for recebida fora do prazo, poderá o proponente mesmo assim, exigir
do aceitante o cumprimento do contrato?
Neste caso só porque a aceitação é tardia, mas que a expedição não é tardia e feita em tempo
oportuno, aplica-se a primeira aparte do artigo 229 nº 2 e se o proponente ainda estiver
interessado no contrato poderá considerar eficaz a sua aceitação, pois apesar de ter sido uma
aceitação tardia, mas eficaz por ter sido expedida em tempo oportuno, mas quando a
aceitação é tardia e foi espedida tardiamente, não se pode formar o contrato por vontade do
proponente, e neste caso, tem que haver duas novas declarações de proposta e duas novas
declarações de aceitação.

10. Quando é que um contrato pode ser qualificado como contrato de adesão?
Um contrato de adesão é um contrato onde as clausulas estão pré determinadas pela entidade
ou pessoas que contrata em série e essas clausulas são apresentadas aos clientes em termos
que não admitem discussão e como os clientes não poderiam discutir as clausulas, esses
contratos foram designados por contratos de adesão porque neste caso existe liberdade
contratual, sendo que quem o aceitar tem que o aceitar em bloco, aceitando todas as
cláusulas do contrato, sendo que as características dessas cláusulas contratuais têm que ser
clausulas pré determinadas, têm que ser cláusulas gerais com vista a serem utilizadas numa
multiplicidade de contratos futuros, e têm que constar de cláusulas rígidas que são cláusulas
relativamente às quais não existe nem liberdade nem possibilidade de negociação.

11. Distinga as figuras e os regimes jurídicos do erro ostensivo e do erro sobre a base do
negócio.

Serafim Cortizo 20100059 Página 235

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Fala-se em erro sobre a base do negócio quando o erro recai sobre um elemento que foi
decisivo para a vontade de ambas as partes contratarem, ou seja, ambas as partes assentaram
a sua decisão de contratar no mesmo pressuposto erróneo, sendo que se lhe aplica o regime
do artigo 252 nº 2 onde o negócio poderá ser resolvido ou modificado, aplicando-se-lhe o
regime da alteração de circunstancias vigentes no momento em que o contrato foi celebrado.

O erro ostensivo segundo a lei (artigo 249) é um erro detectável, ou seja, nas circunstancias
em que a declaração é feita é possível apercebermo-nos de um erro cognoscível, detectável,
por isso a doutrina lhe chama um erro ostensivo, sendo a sua consequência prevista na lei, é a
rectificação da declaração o que significa, pô-la de acordo e em harmonia com a vontade real,
mas sem tal divergência entre a vontade e declaração.

12. Qualifique a seguinte clausula e pronuncie-se sobre a sua admissibilidade “esta doação
deixará de produzir efeitos no dia em que tu te casares”.
Neste caso estamos perante uma condição resolutiva pois estamos perante um facto futuro e
incerto, pois os seus efeitos estão suspensos até ao possível casamento, que é neste caso um
facto futuro e incerto, sendo que neste caso será uma condição resolutiva porque quando ela
se verificar (casamento) irá provocar a extinção dos efeitos do negócio jurídico da doação.

13. Até quando é que pode ser aceite uma proposta contratual oral sem indicação de prazo
para a aceitação, feita no decurso de uma conversa telefónica?
No artigo 228 alínea c) onde esse fala em pessoa ausente e pessoa presente não se refere a
uma distinção puramente geográfica, pois o que interessa neste caso é que as partes estejam
em comunicação instantânea, e neste caso comunicação instantânea é a comunicação que
permite ao destinatário, imediatamente dar a sua aceitação se quiser, como por exemplo
numa conversa telefónica, ou por vídeo-conferência em que uma declaração é emitida e o
outro está em condições de imediatamente aceitar a proposta, sendo que neste caso, num
raciocino á contrário sensu do artigo 228 alínea c), que se perante uma pessoa presente se se
receber uma carta tem 5 dias para responder, e neste caso, a lei entende que á contraio sensu
que se há um prazo para a proposta escrita, no caso de uma proposta oral não haverá
qualquer prazo e a resposta deverá ser imediata.

Serafim Cortizo 20100059 Página 236

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