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ANDRÉ SALGADO DE MATOS

Responsabilidade Civil
Administrativa
Direito Administrativo Geral
Tomo IH
Inclui texto da Lei n. o 67/'.l,007, de 31 de DezeDlbro
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DIREITO ADMINISTRATIVO GERAL
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MARCELO REBELO DE SOUSA
Prof~ssor cat~drático da Faculdad~ d~ Dir~ito d~ Lisboa
ANDRE SALGADO DE MATOS
Assist~nt~
da Faculdad~ de Dir~ilo de Lisboa

Direito Administrativo Geral


Tomo III

Actividade administrativa

Responsabilidade civil administrativa


(de acordo com o novo Regime da responsabilidade civil extracontratual
do Estado e demais entidades públicas, aprovado pela Lei n. o 67/2007.
de 31 de Dezembro)

L ..

1
DOM Q!]IXOTE
I
I

Nota prévia

Antes mesmo da introdução na 2. a edição do Tomo III do Direito


Administrativo Geral. entendemos ser de publicar autonomamente a
matéria respeitante à responsabilidade civil. o que se justifica pela recente
aprovação e entrada em vigor do Regime da responsabilidade civil extra-
contratual do Estado e demais entidades públicas (RRCEC). Não podemos
deixar de sublinhar a importância simbólica e doutrinária do novo
Publicações Dom Quixote
Edifício Areis diploma. que veio revogar legislação com quatro décadas de vigência e
R. Ivone Silva, n.O 6_2.°
1050-124 Lisboa - Ponuga!
contribuir. espera-se. para que a administração pública portuguesa
repense uma postura muitas vezes desajustada num Estado de direito
Reservados rodos os direitOs
de acordo com a legislação em vigor
democrático tal como o consagrado na Constituição portuguesa de
1976.
© 2008, Marcelo Rebdo de Sousa,
André Salgado de Matos Note-se que este livro não constitui uma exegese ou anotação ao novo
e Publicações Dom Quixore regime legal. nem tão-pouco uma análise exaustiva da matéria da respon-
Oesign sabilidade civil na esfera do direito público. Assim. a matéria da responsa-
Atelier Henrique Cayatte bilidade civil por actos político-legislativos e jurisdicionais. que não inte-
com Rita Múrias
ressa directamente ao direito administrativo. não é aqui desenvolvida.
Revisão: João Vidigal
O texto que agora se publica corresponde à perspectiva do direito admi-
I. a edição: Maio de 2008 nistrativo geral. mantendo fundamentalmente o mesmo âmbito e o mesmo
DepósilO legal n.O 275 173/08 tipo de abordagem da primeira edição do Tomo III do Direito Administra-
tivo Geral. Aproveitou-se para actualizar também a matéria das pretensóes
Paginação: Segundo Capitulo
indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados. em que
Impressão e acabamento: Guide _ Anes Gráficas o novo regime pretendeu também tocar. As remissóes feitas sem indicação
ISBN,978-972-20-3629_0 precisa do local para o qual se remete respeitam aos dois volumes até agora
www.dquixote.pt
publicados do nosso Direito Administrativo Geral. no qual estão também
descodificadas as abreviaturas utilizadas.
Dado o carácter muito recente do texto legal que motiva esta ediçã fndice
julgou-se oportuna a sua inclusão. o,

Lisboa, Fevereiro de 2008

Marcelo Rebelo de Sousa


André Salgado de Matos
',/;f:!~l~~D",~,i1i~ad: civil administrativa ........................................................................ . II
~oção de responsabilidade civil administrativa e aspectos gerais ................... . II
. Evolução histórica da responsabilidade civil administrativa ........................... . 12
, ",)",';,',J. Classificações da responsabilidade civil administrativa ......~ ........................... . 16
.:~ '.4~·Bases legais da disciplina da responsabilidade civil administrativa ................. . 18
,··~~;·,,:~5. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: responsabilidade
extracontratual delitual .................................................................................. . 18
a) Fundamento da responsabilidade administrativa delitual ......................... .. 18
'o. \".:. , . :b) Responsabilidade administrativa e responsabilidade pessoal ...................... . 18

:"~~;~.~.::'.:.'!~.'.~,'~~,,~,':j!,,. c) Pressupostos da responsabilidade administrariva delituaL""""""""""."., 19


'.. i) Facto voluntário .................................................................................... . 20
'}:': .~'-~, ,~1: :' ii) Ilicitude ............................................................................................... . 20
~.' :.", : ,~:.). ,i.);-. iii) Ilicitude (cont.): causas de justificação da ilicitude ............................. .. 21
. ":.j ';~.:.}~:.: iv) Culpa,,,.,,.,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,,.,,.,,.,,,,.,,.,,",,,,,,,,,,. 25
,,::, ·;",','~,:' .1\.,.~·~l.;~,~.'.:\·' v) Culpa (con[,), culpa pessoal e ,funcionamento anormal do serviço"""" 26
• ~ , vi) Culpa (cont.): prova da culpa e presunções de culpa........................... .. 28
.' ~ vii) Culpa (COnt.): causas de exclusão da culpa ........................................ .. 28
viii) Dano ................................................................................................ . 29
ix) Nexo de causalidade ............................................................................ . 30
x) Nexo de causalidade (eont.): causa virtual e comportamento
lícito alternativo ................................................................................... . 32
.:!.". ';. d) A culpa do lesado como causa de exclusão ou modificação
da responsabilidade administrativa delitual ............................................... . 33
e) Sujeitos do dever de indemnizar na responsabilidade administrativa
delitual ..................................................................................................... . 35
'''''''].\-
6. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: responsabilidade
;:- extracont[atual pelo risco .............................................................................. . 37
a) O caráeter geral da responsabilidade administrativa pelo risco ................. .. 37
b) Fundamento da responsabilidade administrativa pelo risco ....................... . 38
c) PressupostOS da responsabilidade administrativa pelo risco ....................... .. 38
d) Causas de exclusão ou modificação da responsabilidade administrativa
pelo risco ................................................................................................. . 39
7. Responsabilidade civil por aeto de gestão pública: responsabilidade
extracontralua! por facto lícito ...................................................................... . 41
a) Fundamento da responsabilidade civil administrativa por facto lícito ........ . 41
b) Modalidades da responsabilidade civil administrativa por facto lleito ....... . 42
,
c) Responsabilidade pelo sacrifício de bens pessoais ............ """ .................... . 42
d) Responsabilidade pelo não restabelecimento legf[imo de posições jurídicas
subjectivas violadas ................................................................................... . 44
8. Responsabilidade civil por acto de gestão públiça: responsabilidade contratual 44
9. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: terceira via
da responsabilidade civil ............................................................................... . 46
10. Responsabilidade civil por ac[o de gestão pública: a indemnização ....... ,....... . 49
11. Responsabilidade civil por acto de gestão privada ........................................ .. 51
a) Responsabilidade extracontratual delitual, pelo risco e pelo sacrif(cio ........ . 51
b) Responsabilidade contratual e terceira via da responsabilidade civil ......... .. 53
As pretensóes indemnizat6rias pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados ........... .. 57 A responsabilidade civil administrativa
1. Noção de pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais
privados e aspectos gerais .............................................................................. . 57
2. Pretensões indemnizatórias pelo sacriffcio de direitos patrimoniais privados
1. Noção de responsabilidade civil adminisrrativa e aspectos gerais
e responsabilidade civil ................................................................................. . 57
3. Fun~ame~~o d~ pretensões indemnizarórias pelo sacrifkio de direitos Em sociedade (ou mesmo, hipoteticamente, sem ela), é inevitável a ocor-
patrimOniaiS privados ..................... ,......................................................... ,... . 59 rência de danos para as pessoas e o seu património. A crescente complexifi-
4. Fontes das pretensões indemnizat6rias pelo sacrif(cio de direitos patrimoniais
privados........................................................................................................ . 60 cação da vida, em grande parte motivada pela evolução tecnológica, multi-
5. Pr~upos.t~s d~ pretensões indemnizat6rias pelo sacrifício de direitos plicou exponencialmente tal probabilidade, de tal modo que se fala hoje
patrimOniaIS privados ................................. ,..................................... ,........... . 60 correntemente numa sociedade de risco. O princípio vigente na ordem jurí-
6. A indemnização pelo sacriffcio de direitos patrimoniais privados .................. . 62
a} A exigência de uma indemnização contemporânea do sacrifício ............ " .. .
dica é o de que os prejuíws são suportados por quem os sofre, mas a situação
62
b} A exigência de uma indemnização justa ................................................... .. 63 pode inverter-se quando sejam causados por factos imputáveis a pessoas
c) O conteúdo da indemnização pelo sacrifkio de direitos patrimoniais distintas daquela em cuja esfera jurídica ocorrem. Nestes casos, impõe-se
privados ................................................................................................... .. 64 prima facie que os lesados sejam ressarcidos dos danos sofridos por aqueles
7. As garantias jurisdicionais preventivas de legitimidade do sacrifício de direitos
patrimoniais privados no caso da expropriação em sentido estrito ................ .. 64
que os provocaram.
Anexo: Lei n.067/2007, de 31 de Dezembro .............................................................. .. 67 A responsabilidade civil administrativa é o conj unto de circunstâncias
da qual emerge, para a administração e para os seus titulares de órgãos,
funcionários ou agentes, a obrigação de indemnização dos prejuíws causa-
dos a outrem no exercício da actividade administrativa. O qualificativo
civil da responsabilidade não remete para o direito privado: trata-se apenas
de esclarecer que a responsabilidade em causa não é política, criminal,
contra-ordenacional ou disciplinar. Todas estas modalidades de responsa-
bilidade têm fins diferentes da responsabilidade civil: esta visa predominan-
temente a reparação de danos, enquanto a responsabilidade política visa a
efectivação do controlo democrático no quadro do funcionamento do sis-
tema de governo e as responsabilidades criminal, contra-ordenacional e
disciplinar visam finalidades de prevenção, geral ou especial, e de repressão
de condutas antijurídicas.
simultânea da administração e dos seus titulares de órgãos, funcionários e pelo disposto no regime da responsabilidade civil de direito privado esta-
agentes em caso de factos ilícitos e culposos (foutes) funcionais. O sistema belecido no Cc.
francês de responsabilidade civil é, ainda hoje, fundamentalmente de ori- O actual CC (em vigor desde 1967) consagrou pela primeira vez dispo-
gem jurisptudencial. sições especificamente aplicáveis à responsabilidade civil administrativa
Em Portugal, o Código Civil de 1867, em consonância com o espírito extracontratual por acros de gestão privada (arts. 500.°-501.° CC), dei-
do seu tempo, estabeleceu a irresponsabilidade do Estado pelos prejuíws xando para lei especial o regime da responsabilidade civil administrativa
provocados no exercício da sua actividade de execução da lei (art. 2399.0); extracontratual por acto de gestão pública. Aquela disciplina viria a constar
pelos danos resultantes de actividades ilegais eram responsáveis os funcio- da LRCAP (entrada em vigor em 1967), que incluía disposições sobre
nários administrativos, a título exclusivamente pessoal (art. 2400.0). responsabilidade civil delitual, pelo risco e por facto lícito mas não sobre
A garantia administrativa deixou de vigorar para a responsabilidade civil responsabilidade civil administrativa contratual por acto de gestão pública.
precisamente em 1867 (embora tenha subsistido intermitentemente até ao A Constituição de 1976 consagtou o princípio da responsabilidade civil
Decreto-Lei n.O 74/75, de 21 de Fevereiro, para a responsabilidade crimi- solidária da administração e dos seus titulares de órgãos, funcionários e
nal em geral e aflore ainda, embora em termos muito mitigados, no regime agentes pelos prejuíws causados no exercício das suas funções [art. 22.°
da detenção de militares fora de flagrante delito: art. 24.°, 1 EMFAR). CRP, do qual decorre um direito fundamental dos particulares à reparação
Na ausência de previsão legal específica, a doutrina e a jurisprudência acei- dos danos, análogo aos direitos, liberdades e garantias do Título 11 da
tavam a responsabilidade civil do Estado pelos prejuíws ptovocados por Parte I da CRP (art. 17.° CRP)] e proibiu a garantia administrativa (art.
actividades de gestão privada, como tal reguladas pelo direito privado. 271.°, 1 CRP, parte final).
A responsabilidade civil das entidades públicas suscitou o interesse da A mudança de regime ocorrida em 1974, as novidades trazidas na maté-
doutrina civilista e administrativista da I República. A consagração legal ria em causa pela CRP, bem como o emergir de novos problemas, práticos
da responsabilidade civil administrativa extracontratual por actos ilíciros de e teóricos, no domínio da responsabilidade civil, geral e administrativa,
gestão pública data dos anos trinta do século xx (portanto, antes do seu contribuíram para a insuficiência do regime legal vigente desde 1967 e para
aparecimento na Alemanha, em Espanha, Estados Unidos e Inglatetra e, a premência da sua revisão. Em 2001 foi apresentada à Assembleia da
paradoxalmente, num período de autoritarismo político): em 1930, o República uma proposta de lei que visava substituir a LRCAP, na qual se
art. 2399.° CC foi revisto no sentido de acrescentar à responsabilidade dos intentava o aperfeiçoamento do regime vigente e se regulava a responsabi-
agentes estaduais a responsabilidade solidária do próprio Estado; em 1936, lidade civil por actos das funções legislativa e jurisdicional; a proposta não
o CA passou a estabelecer a responsabilidade civil das autarquias locais chegou a ser votada, em virtude da demissão do XIV Governo constitucio-
pelos prejuíws resultantes de actos ilegais de gestão pública compreendidos nal, e não foi retomada nas legislaturas seguintes. Em 2006 voltou a ser
nas suas atribuições e competência (art. 366.° CA), embora mantendo a apresentada uma proposta de lei de teor muiro próximo, da qual veio a
regra da responsabilidade estritamente pessoal quanto aos prejuíws provo- resultar, após um complexo processo legislativo que incluiu um vero polí-
cados por actos de gestão pública viciados de incompetência, excesso de tico presidencial, o novo Regime da responsabilidade civil extracontratual do
poder ou preterição de formalidades essenciais (art. 367.° CA). A respon- Estado e demais entidades públicas, que entrou em vigor em 30 de Janeiro
sabilidade civil administrativa pelo risco e por acto lícito não foram objecto de 2008. Se bem que, no plano da responsabilidade civil administrativa,
de previsão genérica, pelo que se entendia só existirem nos casos expressa- este não tenha introduzido alterações tão revolucionárias como na respon-
mente previstos na lei (embora M. Caetano tenha sustentado um princípio sabilidade civil do Estado por acros das funções jurisdicional (arts. 12.°-14.°
geral de responsabilidade por facto lícito a partir de 1950). A responsabili- RRCEC) e político-legislativa (art. 15.° RRCEC), ainda assim trouxe algu-
dade civil administrativa por actos de gestão privada continuou a reger-se mas inovações, comO a introdução de um regime da indemnização (arts. 3.°,
Geralmente. fala·se em responsabilidade civil do Estado e das demais pessoas colectivas de
pessoal dos funcionários era fortemente limitada nas ordens jurídicas euro-
direito público; mas a administração pública em sentido orgânico também compreende pessoas
colectivas de direiw privado. sujeitas a um regime de direito administrativo no ~mbi(O da sua peias continentais, que durante muito tempo exigiram uma autorização supe-
actividade de gestão pública (supra,m. Às pessoas colectivas de direito privado integrantes da rior para que ela pudesse ter lugar (sistema da garantia administrativa, vigente
administração pública aplica·se, na medida em que exerçam a função administrativa, o regime na Alemanha até 1879, em França até 1873 e em Espanha até 1869).
da responsabilidade civil administrativa [é neste sentido que deve entender.se a referência da
parte final do art. 1.0, 5 RRCEC; em termos processuais, ano 4.°, 1, i) CPTA].
Embora anunciada por alguma pressão doutrinai e por decisões jurisdi-
cionais anteriores, a afirmação de uma responsabilidade civil do Estado e
das demais pessoas colectivas administrativas por actos de autoridade foi
uma conquista do século xx e, em particular, do Estado social de direito.
2. Evolução histórica da responsabilidade civil administrativa
Na Alemanha, a responsabilidade civil administrativa foi consagrada pelo
art. 131 da Constituição de Weimar e, posteriormente, pelo art. 34 GG;
No Estado absoluto, o poder público era considerado irresponsável pelos
apenas em 1981 foi aprovada uma lei federal geral da responsabilidade civil
prejuízos que provocasse aos particulares («the king can do no wrong»);
administrativa que, todavia, viria a ser declarada inconstitucional pelo
a reparação de tais prejuízos só ocorreria por uma graça do monarca. Para
BVerlG, mantendo-se até hoje um vazio da legislação federal nesta matéria.
tal entendimento contribuíram diversos factores: a herança da noção romana
Em Espanha, o art. 41.° da Constituição republicana de 1931 afirmou a
de potestas, a fundamentação divina do poder, as concepções bodiniana («la
responsabilidade civil da administração, embora apenas a título subsidiário
souveraineté n'est limitée, ni en puissance, ni en chargc») e hobbesiana ('prin-
em relação à dos seus titulares de órgãos, funcionários e agentes; à consa-
ceps legibus solutus») da soberania, bem como a imunidade de jurisdição da
gração, a partir de 1935, de um princípio geral de responsabilidade civil da
coroa (no direito britânico: teoria da non suability). No período do Estado
administração municipal, sucedeu-se o estabelecimento, em geral, da res-
de polícia, aceitava-se, todavia, a responsabilidade do Estado no âmbito das •... ponsabilidade civil da administração na Lei da Expropriação Forçada de
relações de carácter patrimonial que mantivesse com os particulares, justifi-
1954, que passaria para a Lei do Regime Jurídico da Administração do
cada com a teoria do Fisco (supra, !, 4-3).
Estado (1957) e para a Lei do Regime Jurídico das Administrações Públicas
Pu; preocupações fundamentais com a subtracção da administração aos
e do Procedimento Administrativo Comum {I 992). Nos Estados Unidos,
esquemas igualitários do direito privado e com a afirmação da sua supre-
foi preciso esperar até ao Federal Torts Claims Act {I 946) para que fOsse
macia perante os particulares, bem como a circunstância de a administra-
consagrada a responsabilidade civil do Estado. Em Inglaterra, a responsa-
ção ter passado a ser vista como actividade puramente executiva da legisla-
bilidade civil da Coroa foi consagrada pelo Crown Proceedings Act de 1947
ção, por sua vez considerada como resultado infalível da expressão da que, na tradição anglo-saxónica, manda aplicar-lhe o regime da responsa-
vontade geral (supra, !, 4-4), levaram a que - tal como sucedeu com outros bilidade civil de direito comum (a responsabilidade civil da Coroa por
aspectos do absolutismo - o princípio da irresponsabilidade do Estado actos de polícia só foi, no entanto, instituída em 1964). Em França, a res-
tivesse passado para o direito administrativo do liberalismo oitocentista. ponsabilidade civil administrativa tinha, por via da jurisprudência do Con-
Nesta época fez escola a ideia segundo a qual «é próprio da soberania selho de Estado, começado a autonomizar-se da responsabilidade civil geral
impor-se a todos sem compensações» (E. Laferriere). Também numa linha com o a"êt Blanco (l873), que afirmou a competência jurisdicional dos
de continuidade com a fase final do Estado absoluto, era aceite a responsa- tribunais administrativos em matéria de responsabilidade civil administra-
bilidade do Estado no âmbito das relações de carácter patrimonial e não tiva, e com o a"êt Pclletier {I 873), que iniciou uma tendência para a des-
soberano estabelecidas com os cidadãos. No restante, pelos danos provoca- valorização da responsabilidade pessoal dos funcionários; o primeiro de
dos a particulares responderiam, quando muito, os funcionários adminis- uma série de resultados significativos desta evolução deu-se com o a"êt
trativos, a título estritamente pessoal; mas mesmo a responsabilidade Anguct (1911), no qual se admitiu pela primeira vez a responsabilidade
5.° RRCEC), com destaque para a regra da reintegração específica de danos
(art. 3.°, 1 RRCEC), a definição do conceito de funcionamento anormal
do serviço (art. 7.°, 3, 4 RRCEC), o estabelecimento da obrigatoriedade
direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos. Nos últimos anos,
a doutrina tem vindo a identificar uma terceira via da responsabilidade
civil, a meio caminho entre a responsabilidade contratual e a responsabili-
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,!
do exercício do regresso contra os responsáveis concretos pelo dano (art. 6. ° dade extracontratual, que abrangeria situações de violação de deveres espe-
RRCEC) e de duas presunções de culpa leve na responsabilidade delitual cíficos de protecção, informação e lealdade, não decorrentes de contratos
(art. 10.°,2,3 RRCEC), bem como o alargamento do âmbito da respon- mas com densidade superior aos deveres genéricos de respeito de direitos
sabilidade civil pelo risco (art. 11.°, 1 RRCEC, que passou a referir-se a subjectivos e interesses legalmente protegidos cuja violação gera responsa-
actividades. serviços ou coisas ((especialmente» e já não «excepcionalmente» bilidade extracontratual.
perigosos). O CCP, que entrou em vigor quase simultaneamente com o c) Quanto ao ramo de direito pelo qual é regulada, a responsabilidade
RRCEC, regulou, pela primeira vez no direito português, a responsabili- civil pode ser por acto de gestão pública ou por acto de gestão privada. Trata-se
dade civil administrativa contratual (infra). de uma repercussão do problema, transversal a todo o direito administrativo,
da distinção entre gestão pública e gestão privada (supra, 18-8; tb. I, 3-69 ss.,
lI). A distinção entre actos de gestão pública e acros de gestão privada só
3. Classificações da responsabilidade civil administrativa suscita dificuldades reais quanto aos contratos e aos actos materiais; os regu-
lamentos e aeros administrativos são, sem excepção, actos de gestão pública
A responsabilidade civil administrativa pode ser classificada atendendo (supra, 19-14, 20-1). Tradicionalmente, a distinção entre estas duas modali-
ao título da imputação do prejuíw, à natureza da posição jurídica subjec- dades de responsabilidade acarretava consequências substantivas (a responsa-
tiva violada e ao ramo de direito pelo qual é regulada. Cada uma das moda- bilidade administrativa por acto de gestão pública era regida por disposições
lidades de responsabilidade civil está sujeita a um regime jurídico pelo de direito administrativo; a responsabilidade administrativa por acto de ges-
menos parcialmente diferente. tão privada era regida por disposições de direito privado) e processuais
a) Quanto ao título de imputação do prejuíw, a responsabilidade civil (a responsabilidade administrativa por acto de gestão pública era efectivada
pode ser delitual, pelo risco ou por focto lícito. A responsabilidade delitual perante os tribunais administrativos; a responsabilidade administrativa por
decorre de uma conduta reprovada pela ordem jurídica; por isso, é também acto de gestão privada era efectivada perante os tribunais judiciais). Actual-
por vezes designada por responsabilidade por facto ilícito e culposo. A res- mente, o ETAF submeteu aos tribunais administrativos toda a responsabili-
ponsabilidade pelo risco e a responsabilidade por facto lícito prescindem dade civil administrativa extracontratual [art. 4.°, 1, g), h), i) ETAF], mesmo
daquela reprovação, pelo que são modalidades de responsabilidade objectiva: por acto de gestão privada, bem como os litígios emergentes de alguns con-
a primeira decorre de regras objectivas de distribuição dos riscos sociais, traros tradicionalmente considerados como de direito privado [art. 4.°, 1, e),
assentando na ideia de que, apesar de não ter sido praticado qualquer facto f) ETAF]. O art. 1.°,2 RRCEC, ao considerar abrangidas pelo regime legal
ilícito e culposo, um determinado dano exorbita da esfera de risco do lesado, as acções e omissões «reguladas por disposições ou princípios de direito admi-
devendo outra pessoa responder por aquele; a segunda decorre da necessi- nistrativo», que são virtualmente todas as acções e omissões administrativas,
dade de compensar alguém por sacrifícios que lhe sejam impostos, mediante abre o caminho para a superação substantiva da dicotomia, mas não de modo
condutas juridicamente conformes, em benefício do interesse público. tão claro que seja neste momento previsível o rumo que vai ser adoptado pela
b) Quanto à natureza da posição jurídica subjectiva violada, a responsa- jurisprudência. O alcance inequívoco da distinção resume-se hoje, por isso,
bilidade civil pode ser contratual ou extracontratual. A responsabilidade à responsabilidade contratual.
contratual decorre da violação de direitos de crédito resultantes de con-
. trato. A responsabilidade extracontratual decorre da afectação de outros
pelo sacriflcio de direitos patrimoniais privados; se fàltar o pressuposto da conduta que viole o bloco de legalidade (isto é, que seja ilegal): assim, são
culpa pode ter lugar a pretensão à reconstituição da situação actual hipoté- ilícitos os actos que violem princípios ou regras constitucionais, legais ou
tica ou o enriquecimento sem causa). regulamentares (ou ainda internacionais ou comunitários) ou infrinjam
regras técnicas ou deveres objectivos de cuidado (art. 9.°, 1 RRCEC), bem
i) Facto voluntário como aqueles que violem os parâmetros pelos quais deve reger-se o funcio-
namento normal dos serviços (art. 9.°, 2 RRCEC).
Só há responsabilidade civil delitual por danos resultantes de factos No entanto, para haver responsabilidade civil delitual não basta a veri-
humanos domináveis pela vontade - ou seja, de actos em sentido próprio, ficação de qualquer ilegalidade, devendo esta consistir na violação da norma
que podem consistir, quer em acções, quer em omissões (arts. 7.0, 1 e 8.0, que tutela a posição jurídica subjectiva cuja lesão se pretende ver reparada
1, 2 RRCEC; sobre a noção de acto, supra, 18-3). Para efeitos de respon- (Ac. STA 31/5/2005, Proc. O127/03; o mesmo decorre implicitamente da
sabilidade civil constituem acções os regulamentos e os actos administrati- parte final do art. 9.°, 1 RRCEC). Existem, assim, duas modalidades bási-
vos, bem como as simples actuações administrativas e os actos reais, cas de ilicitude: a ilicitude por violação de direitos subjectivos e a ilicitude
incluindo todas as omissões juridicamente relevantes. A responsabilidade por violação de normas destinadas a proteger interesses (normas de protec-
civil decorrente de actos positivos tem carácter genérico, na medida em que ção). Na primeira situação, incluem-se quaisquer direitos subjectivos (direi-
decorre de um dever também genérico de não lesar activamente as posições tos fundamentais, de personalidade, reais, familiares, de propriedade inte-
jurídicas subjectivas de outrem; já a responsabilidade civil emergente de lectual ou industrial), excepto quando se trate da ofensa de direitos de
omissões, apesar da aparente generalidade das referências legais, depende crédito emergentes de contratos, perpetrada pelo devedor, que gera respon-
da existência de um dever de praticar a acção omitida (quanto a estas situa- sabilidade contratual; na segunda situação, incluem-se os interesses legal-
ções, supra, 22-50 ss.), geralmente designado como .. dever de garante». mente protegidos (supra, I, 10-12). Existem ainda previsões específicas de
Apesar desta exigência, a relevância das omissões é maior na responsabili- ilicitude para efeitos de responsabilidade civil administrativa, designada-
dade administtativa do que na responsabilidade civil em geral: no tráfego mente a decorrente da prestação de informações (art. 7.°, 2 CPA) .
jurídico privado, a esfera de autonomia individual impede a existência de
um dever genérico de evitar a produção de danos para outrem; pelo con- iii) Ilicitude (COnt.): causas de justificação da ilicitude
trário, no direito administrativo, à administração pública assiste sempre
um tal dever nos domínios abrangidos pelas suas tarefas de policia (supra, A antijuridicidade de uma determinada conduta pode ser relevada na
I, 2-15). Não são considerados factos voluntários para efeitos de responsa- presença de circunstâncias específicas, designadas causas de justificação da
bilidade civil, designadamente, os factos naturais e os actos reflexos ou ilicitude; faltando o pressuposto da ilicitude, a responsabilidade delitual ficará
praticados sob coacção física. necessariamente excluída (mas pode ainda haver lugar a responsabilidade
pelo risco ou por facto lícito). O RRCEC não regula esta matéria, mas o seu
ii) Ilicitude regime resulta da CRP, dos princípios gerais em matéria de responsabilidade
civil e dos princípios fundamentais da actividade administrativa. As causas de
O segundo pressuposto da responsabilidade civil delitual é a ilicitude do justificação da ilicitude relevantes em matéria de responsabilidade adminis-
facto voluntário (arts. 7.°, 1 e 8.°, 1,2 RRCEC). Ilicitude é sinónimo de trativa delitual são quatro: o cumprimento de um dever, o estado de necessi-
antijuridicidade, que se expressa num juízo negativo (ou desvalor) formu- dade, o consentimento do lesado e a legítima defesa.
lado pela ordem jurídica (predominantemente incidente sobre o facto ou a) Cumprimento de um dever. Pode suceder que alguém esteja investido
sobre o seu resultado, consoante as situações). I1fcita é, por isso, qualquer no dever de praticar determinado acto danoso; aquele dever está, então, em
4. Bases legais da disciplina da responsabilidade civil administrativa como tais actos podem provocar danos, coloca-se o problema da delimitação
entre a responsabilidade administrativa das pessoas colectivas administrativas
A disciplina normativa mais desenvolvida da responsabilidade civil e dos seus titulares de órgãos e agentes, por um lado, e a responsabilidade
administrativa, e a única objecto de uma codificação legal, respeita à res- estritamente pessoal destes últimos, por outro.
ponsabilidade extracontratual por acto de gestão pública, cujo regime O critério relevante é o da imputação: há responsabilidade administra-
consta do RRCEC: este diploma regula a responsabilidade delitual, a res- tiva pelos prejufzos provocados por actos que sejam imputados a uma pes-
ponsabilidade pelo risco e a responsabilidade por facto lícito (a que a lei soa colectiva administrativa (acros funcionais). Os arts. 7.°, I e 8.°, 2
chama responsabilidade pelo sacrificio). A responsabilidade contratual por RRCEC referem os requisitos cumulativos exigidos para que um acto seja
aCtos de gestão pública é disciplinada pelo CC, mediante remissão do CCP; considerado como funcional (supra, 11): tem que ser praticado por um
as situações de terceira via da responsabilidade civil, quanto a actos de ges- titular de órgão ou agente (ou ainda trabalhador: art. 1.°, 4 RRCEC) de
tão pública, não são disciplinadas por qualquer regime legal, decorrendo o uma pessoa colectiva administrativa (o que pressupõe a investidura de uma
seu regime dos princlpios gerais em matéria de responsabilidade civil e dos pessoa ffsica em tãl estatuto; podem suscitar-se alguns ptoblemas quando
princlpios fundamentais da actividade administrativa. A responsabilidade tal investidura resulte de actos jurídicos nulos ou inexistentes); tem que ser
civil por acto de gestão privada rege-se pelo disposto no Cc. eraticado no exerclcio das funções do titular de órgão ou agente, tal como
decorrente do respectivo estatuto, e por causa dessas funções. Tratando-se
de actos funcionais, o dever de indemnizar emergente da responsabilidade
5. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: responsabilidade civil delitual pode impender, quer exclusivamente sobre a pessoa colectiva
extracontratual delitual a que é imputado o facto gerador do prejuízo (art. 7.0 RRCEC), quer tam-
bém sobre o titular de órgão ou agente que o praticou (art. 8.° RRCEC).
a} Fundamento da responsabilidade administrativa delitual Os actos não funcionais são actos da esfera privada das pessoas que os pra-
ticam; a eventual responsabilidade civil a que dêem lugar é estritamente
A responsabilidade civil delitual da administração tem um duplo fun- pessoal, nada tem que ver com a administração pública ou o direito admi-
damento, subjectivo e objectivo: de um ponto de vista subjectivo, a vin- nistrativo e está sujeita ao regime geral da responsabilidade civil constante
culação da administração pública aos direitos fundamentais (art. 18.°, I do Cc.
CRP) e o princípio do respeito pelas posições jurídicas subjectivas dos
particulares (art. 266.°, I CRP; supra, I, 10-8 ss.); de um ponto de vista c} Pressupostos da responsabilidade administrativa delitual
objectivo, o princípio da legalidade. Da combinação de ambos decorre a
ptoibição de ptovocação ilegal de danos na esfera jurídica dos particulares Existe responsabilidade civil delitual da administração e, como tal, dever
ou, como sucedâneo, a sua reintegração mediante indemnização. de indemnizar, quando se verifiquem cumulativamente cinco pressupostOS,
expressa ou implicitamente resultantes dos arts. 7.°, I e 8.°, 1,2 RRCEC:
b} Responsabilidade administrativa e responsabilidade pessoal o facto voluntário, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade.
A não verificação de um destes pressupostos acarreta automaticamente a
As pessoas colectivas administrativas, como as pessoas colectivas em inexistência de responsabilidade delitual, embora possa ainda haver lugar
geral, actuam através das pessoas ffsicas que são os seus titulares de órgãos a outra modalidade de responsabilidade civil ou a outra pretensão reintegra-
e agentes (supra, 11). Como estes também praticam actos de índole estrita- tória {assim, se faltar o pressuposto da ilicitude, pode haver lugar a respon-
mente privada, que nada têm que ver com as funções por si exercidas, e sabilidade por facto lícito ou pelo risco ou a uma pretensão indemnizatória
conflito com o dever de não provocar o dano. porque não é possível acatar o estado de necessidade não pode justificar a ilegalidade de condutas admi-
um dever sem violar o outro. O conflito de deveres deve ser resolvido nistrativas viciadas de usurpação de poder ou de desvio de poder. pelo
mediante o acatamento do dever que a ordem jurídica considere prevale- menos por motivo de interesse particular. nem mesmo de toda e qualquer
cente. O comportamento de quem sacrifique um dever no cumprimento conduta viciada de violação de lei.
de um outro dever prevalecente sobre o primeiro não pode ser reprovado
Exemplos de acruações cuja ilicitude é justificada por estado de necessidade: os actos de
pela ordem jurídica. sob pena de quebra da unidade do sistema normativo;
destruição de coisas ou de ocupação temporária de imóveis. necessários para realizar operações
o cumprimento do dever prevalecente justifica. pois. a ilicitude da violação de socorro ou alojamento de pessoas ou bens (por exemplo, nos termos dos artS. S2.o~54.o do
do outro dever. Uma situação especifica de cumprimento de um dever é Decreto~Lei n.O 794/76, de 5 de Novembro).
aquela prevista no art. 271.°. 2 CRP e no art. 10.° EDFMP: é justificada
a ilicitude da conduta do subalterno que obedeça a ordens ou instruções O art. 3.°. 2 CPA estabelece expressamente o dever de indemnização
ilegais a que estivesse vinculado (desde que tenha exercido o direito de dos danos provocados pela administração em estado de necessidade; mas.
representação: supra. 11). como este justifica a ilicitude. trata-se de uma responsabilidade civil por
facto lícito (art. 16.° RRCEC; infra).
Exemplo de cumprimento de um dever: não há em princípio lugar a responsabilidade se c) Consentimento do lesado. O consentimento do lesado como causa de
um regimento de bombeiros sapaclores deixar arder um pinhal para apagar um outro incêndio justificação deriva da ideia segundo a qual in volenti non fit injuria: não faz
que põe em causa a vida de pessoas, pois o dever de salvar vidas humanas assume primazia sobre
sentido obrigar à reparação de um dano se o lesado consentiu na sua pro-
o dever de proteger o património.
dução. Não existe qualquer previsão especifica do consentimento do lesado
no direito administrativo; e a sua eficácia justificadora da ilicitude está
b) Estado de necessidade. O estado de necessidade é um conceito fre-
excluída quando estejam em causa direitos indisponíveis ou quando tal seja
quentemente utilizado (por exemplo. nos arts. 3.°. 2 e 151.°.1 CPA) mas
juridicamente proibido (aproximadamente nestes termos. o art. 340.° CC).
nunca definido na legislação administrativa portuguesa. A ideia dominante
Como em direito administrativo a actuação administrativa s6 é juridica-
é a de que o legislador administrativo recebeu. tal como consagrados no art.
mente conforme se for positivamente permitida por lei (precedência total
339.° Cc. os pressupostos do estado de necessidade (existência de um
de lei: supra. I. 8-31 ss.). o consentimento do lesado s6 pode justificar a
perigo actual ou iminente; ameaça de bens jurídicos pessoais ou patrimo-
ilicitude de uma conduta administrativa quando tal esteja normativamente
niais do agente ou de terceiro) e os requisitos das condutas adoptad~ ao
admissível; ao contrário do que pretendia O. Mayer. o consentimento do
seu abrigo [manifesta superioridade dos danos a evitar em relação ao pre-
lesado nunca pode substituir a necessária habilitação normativa para a
ju{w provocado - ou seja. razoabilidade deste último. no sentido que a
actuação administrativa.
expressão assume no princípio da proporcionalidade (supra. I. 10-15);
carácter meramente patrimonial dos bens afectados]. O art. 3.°. 2 CPA Exemplos de actuações cuja ilicitude é justificada por consentimemo do lesado: a revoga-
exige que o resultado visado pela actuação administrativa em estado de ção de actos adminisuativos favoráveis [art. 132.°,2. b) ePA]. a revogação com efeitos retro-
activos desfavoráveis de actos administrativos [art. 127.°,3. b) ePA]. Note-se que em ambos
necessidade não pudesse ser alcançado de outro modo. o que deve ser inter- os casos a lei faz depender a legalidade da conduta administrativa da disponibilidade dos direi-
pretado no sentido de que a ilicitude daquela só está justificada se for toS envolvidos.
estritamente necessária. à luz do principio da proporcionalidade (supra. I.
10-14 ss.). Apesar da formulação do art. 3.°. 2 CPA. o estado de necessi- d) Legítima deftsa. Nos termos do art. 21.° CRP, todos têm o direito de
dade pode justificar a ilicitude decorrente da violação de qualquer norma repelir pela força qualquer agressão quando não seja possível recorrer à
de direito administrativo e não apenas das normas nele contidas. Ao invés. autoridade pública. Esta previsão terá sido especificamente pensada para os
privados, mas não pode ser negada aos agentes da administração a possibi-
estas exigências são mais do que meras explicitações do princípio da pro-
lidade de se defenderem de agressões de que sejam objecto, em princípio
nos mesmos termos que os restan tes cidadãos. porcionalidade e dos requisitos gerais de legitimidade da defesa: por um
lado, em geral, a proporcionalidade da defesa através de arma de ~ogo é
o art. 21.° CRP exige como requisito da legítima defesa a impossibilidade de recurso à al'ficada (podendo falar-se numa exigência de estrita proporclonalzdade);
qu I 'é'
autoridade pública. Numa leitura apressada, esta última restrição parece levar à exclusão da or outro lado, quanto ao uso de armas de fogo contra pessoas, o crI! no
relevância da legítima defesa como causa de justificação da ilicitude das condutas administra- p ponderação entre bens jurídicos está legalmente de fiInl'do e, por .ISSO, em
de
tivas, uma vez que a administração é. por definição, autoridade pública. Comudo, não é assim:
a expressão «autoridade pública» do art. 21. 0 CRP significa apenas a parcela do aparelho públi- larga medida subtraído ao juíw do aplicador do direit~. Do.s aperta~os
co que está especificamente legitimada para o uso da coerção _ ou seja, os tribunais e a poll- requisitos legais resulta, assim, uma verdadeira desproporcIOnal Idade prIma
cia -, sendo evidente que a generalidade dos agentes da administração não se inclui nesta
categoria. Mesmo quanto à administração policial, não parece de excluir a admissibilidade da
facie do uso de armas de fogo e, indirectamente, um reforço do ónus de
legitima defesa, que nesse caso terá como requisito a impossibilidade de recurso aos [tibunais argumentação em favor da legitimidade da defesa.
em tempo útil para repelir a agressão. Os argumemos teleológicos de imerpretação também
apomam neste semido: ao referir-se à impossibilidade de recurso à força pública, o art. 21. 0 Exemplos de actuaçóes cuja ilicitude é justificada por legítima defesa: os danos necessaria-
CRP teve como finalidade exclusiva evitar a generalização da autotutda privada, problema que mente causados por um agente municipal, encarregue de executa~ um ~mhargo de u~a oh:
manifestamente não se põe quanto ao uso da força pela administração, em particular pela il ai à i legridade física de uma pessoa que, agredindo-o, temava Impedi-Ia de cumpnr aqud
policia. Em todo o caso, note-se que não está em causa a admissibilidade de defesa dos agentes eg, n .. . 'dad fls' d '
' - os d anos necessar,'amente causados por um agente poliCial à mtegn
mlssao; e lca , o suspel-
da administração no exercício das suas funções; o que se discute na doutrina é apenas se a to de um crime, de modo a conseguir a sua imobilização na sequência de flagrante dehto,
exclusão da ilicitude opera por via do instituto da legitima defesa, designadameme no sentido
0
do art. 21. CRP, ou por via de uma causa de justificação distinta e inominada,
iv) Culpa
Os requisitos da justificação por legítima defesa inferem-se do art. 21.0
CRP e do princípio da ptoporcionalidade: tem que existir uma agressão, A culpa, terceiro pressuposto da responsabilidade civil delitual (arts. 7.°:
actual ou iminente, que seja ilícita; a defesa tem que ser necessária, no 1 e 8.°, 1,2 RRCEC), consiste na preterição da diligência pela qual a leI
sentido de não ser possível afastar a agressão de outro modo; o prejuíw exigia que o autor do facto voluntário e ilícito tivesse pautado a sua con-
provocado pela conduta defensiva deve constituir um meio adequado e duta; culpabilidade é o juíw formulado pela ordem jurídica sobre qu~m
necessário para repelir a agressão e não pode ser manifestamente superior age com culpa. A palavra «culpa» é também, por vezes, utilizada em sentIdo
ao dano que visa evitar (estas exigências coincidem fundamentalmente com restrito para designar a negligência (por ex., arts. 7.°, I, 8.°, 1 RRCEC).
as da legítima defesa no direito privado: art. 337.°, 1 CC).
No direito penal, há muito que se separou a averiguação da diligência devi~a (e~tendida
O regime geral da legítima defesa não se aplica quando esteja em causa
como elemento do facto típico) do juízo de censura ética formulado pela ~~dem Jurídica sob~re
o uso de armas de fogo por agentes policiais, matéria regulada especial- o agente, em virtude da conduta por si adaptada (entendida como cuJpablhd~de), A exp~essao
mente no Decreto-Lei n.O 457/99, de 5 de Novembto: nestes casos, a con- «culpa» é utilizada aqui no seu sentido tradicional; o conceito de culpa asSOCI~~O a considera-
duta administrativa só está justificada quando o uso da arma de fogo seja ções de ordem ética deve ser reservado para os ramos do d~re~to da responsablhd~de co~ um
escopo imediatamente punitivo (como o direito penal, o dlrel~~ de me,ra, ordenaçao SOCial e o
absolutamente necessário, como medida extrema, se outros meios menos
direito disciplinar), sendo irrelevante para efeitos de responsabilidade CIVIl.
perigosos se mostrarem ineficazes e desde que proporcionado às circunstân-
cias (art. 2.°, 1); quando o uso da arma de fogo se faça contra pessoas, a
São modalidades de culpa o dolo e a negligência. O dolo pressupõe a
conduta só é justificada quando seja necessária para repelir agressões que
intenção de provocar um determinado tesultado danoso (dolo directo, se o
constituam um perigo iminente de morte ou ofensa grave que ameace vidas
autor do facto voluntário pretender primariamente a produção desse resul-
humanas (art. 3.°, 2). Ao contrário do que poderia parecer à primeira vista,
tado; dolo necessário, se o autor do facto voluntário pretender primaria-
mente a produção de um outro resultado cuja verificação implica necessa- agentes. É, portanto, por estas últimas que a indagação da culpa deve prin-
riamente a produção do resultado danoso) ou, pelo menos, a conformação cipiar; haverá culpa da pessoa colectiva administrativa quando haja culpa
com a produção desse resultado (dolo eventual). A negligência pressupõe a (dolo ou negligê~cia) do. seu titular de órgão ou agente. _ ~
violação, consciente ou inconsciente, de deveres de cuidado. Quando Contudo, eXIstem situações em que, apesar de ser objectivamente
a diligência empregue tenha sido manifestamente inferior àquela a que o com provável que um determinado dano se produziu em virtude da má
titular de órgão ou agente se encontrava obrigado em razão do cargo por si organização ou do mau funcionamento de um serviço público, não é
ocupado (art. 8. 0 , I RRCEC) , a negligência diz-se grave (a negligência possível identificar o autor ou os autores dos factos que lhes deram ori-
extremamente grave, na fronteira com o dolo eventual, designa-se habitu- gem; tal ocorre mais frequentemente em situações de omissão. Aplicando
almente por negligência grosseira, mas trata-se de uma categoria sem rele- estritamente os pressupostos da responsabilidade civil, teria que con-
0
vância normativa geral); nas restantes situações, diz-se leve (art. 7. , I cluir-se não ser possível a sua efectivação prática, na medida em que,
RRCEC). A distinção entre a negligência grave e a negligência leve não tem desconhecendo-se o autor do facto a quem respeitam as circunstâncias
grande relevância no direito privado nem no direito penal mas é da maior subjectivas relevantes, não seria possível formular os juízos de dolo ou
importância na responsabilidade administrativa: para a responsabilização negligência dos quais depende o preenchimento do pressuposto culpa da
das pessoas colectivas administrativas basta qualquer tipo de negligência responsabilidade civil (em alguns casos, nem sequer seria possível identi-
(art. 7. 0 , I RRCEC), mas a responsabilidade dos titulares de órgãos ou ficar um comportamento ao qual imputar o facto danoso). Contudo, tal
0
agentes pressupõe pelo menos, precisamente, a negligência grave (art. 8. , solução seria iníqua para o lesado e contrariaria os fundamentos da res-
ponsabilidade delitual (supra), motivo pelo qual se admite, neste caso, a
I RRCEC; infra).
A culpa é apreciada à luz da diligência e aptidão que seja razoável exigir, responsabilização da pessoa colectiva a que pertença o serviço em causa
em função das circunstâncias de cada caso, de um titular de órgão ou agente sem necessidade de apuramento da culpa individual (art. 7. 0 , 3, 4
zeloso e cumpridor (art. 10. 0 , I RRCEC); esta formulação é vazia, nada RRCEC), mediante averiguação da diligência directamente em relação ao
dizendo na realidade quanto aos graus de diligência e aptidão exigidos. serviço público no âmbito do qual se produziu o facto lesivo: haverá,
0
Conforme é corrente no direito da responsabilidade civil (art. 487. , 2 CC), assim, «funcionamento anormal do serviço» quando este esteja organi-
deve entender-se que estão em causa a diligência e a aptidão de um titular zado ou tenha funcionado objectivamente com uma diligência inferior
de órgão ou agente médios. As «circunstâncias de cada caso» não podem àquela que era normativamente exigida (o art. 7. 0 , 4 RRCEC é ambíguo
deixar de levar em consideração os deveres funcionais do concreto titular de quando se refere aos «padrões médios de resultado» e demasiado restrito,
órgão ou agente (como resulta do art. 8. 0 , I RRCEC, parte final), de modo por parecer reduzir-se às omissões, quando se refere a «uma actuação
a que seja respeitado o principio segundo o qual ninguém é obrigado a mais susceptível de evitar os danos produzidos»). O conceito de funciona-
do que aquilo que pode fazer (ultra possenemo obligatur), mas também de mento anormal do serviço é, portanto, pelo menos em parte, um sucedâ-
modo a evitar que as condutas de titulares de órgãos ou agentes administra- neo da culpa; é por isso que, tradicionalmente, se falava mesmo em culpa
tivos de topo sejam avaliadas segundo padrões de diligência benevolentes do serviço.
em razão da importância das funções que lhes estão cometidas.
A teoria da culpa do serviço foi admitida pela primeira vez pela jurisprudência administra-
tiva portuguesa a propósito da responsabilidade do Estado pelos danos provocados pela ruína
v) Culpa (COnt.): culpa pessoal e «funcionamento anormal do serviço» de uma mura1ha no Pono, causada pela omissão das necessárias obras de conservação. apesar
de não ter sido possível apurar a identidade dos titulares de órgãos ou agentes omitentes
A diligência das pessoas colectivas administrativas é. no fundo. a dili- [Ac. STA. 2811111966. ADSTA 51 (1966),321].

genda das pessoas singulares que constituem os seus titulares de órgãos e


vi) Culpa (cont.): prova da culpa e presunções de culpa dade administrativa. As causas de exclusão da culpa relevantes em matéria
de responsabilidade administrativa delitual são duas: o erro desculpável e o
A lei não dispõe directamente sobre a prova da culpa, mas a regra geral estado de necessidade desculpante.
infere-se da parte inicial do art. \0. 0 ,2 RRCEC: sobre a culpa deve incidir a) Erro desculpdvel. O erro é uma falsa representação da realidade,
uma demomtração, pelo que é ao lesado que cabe o ónus de provar a culpa podendo consistir, quer no desconhecimento, quer na suposição, de algo;
do autor da lesão. A lei administrativa geral prevê duas presunções legais de é desculpável, excluindo a culpa, quando não seja objecto de censura pela
culpa leve, que invertem o ónus da prova, quanto à prática de acros imate- ordem jurídica.
riais ilíciros e em caso de violação de deveres de vigilância (art. 10.0 ,2,3
Exemplos de situaçóes em que a culpa é excluída por erro desculpável: condutas causadas
RRCEC). por erro em que a administração tenha sido induzida por actuação dolosa de um particular;
condutas adoptadas em erro, não imputável ao titular do órgão ou agente da administração,
Na ausência de presunções de culpa administrativa e na inexistência de normas que deter- sobre os pressupostos de uma causa de justificação da ilicitude. .
minem a aplicação à administração de presunções de culpa estabelecidas na lei civil, estas têm
que considerar-se inaplicáveis à responsabilidade administrativa, em virtude da nalUreza do
direico administrativo como direito comum da função administrativa (supra, I, 1-1. 2).
b) Estado de necessidade desculpante. Há estado de necessidade descul-
No entanto, o art. 10.°, 3 RRCEC contém um elemento perturbador desta conclusão. ao pante quando uma conduta da qual decorre o sacrifício de bens alheios,
referir que a presunção de culpa leve em caso de violação de deveres de vigilância decorre da apesar de não preencher os pressupostos ou requisitos de uma causa de
«aplicação dos prindpios gerais da responsabilidade civik Em todo o caso, o sentido desta
justificação da ilicitude, ocorre contudo em circunstâncias que excluem a
norma parece não ser o de importar para a responsabilidade civil administrativa todas as pre-
sunções de culpa do direito civil. quer porque em tal caso não faria sentido a própria existência culpa do agente.
do art. 10.°,3 RRCEC. quer porque o modelo de presunção da culpa leve do RRCEC, sobre-
ponivel às situações de responsabilização exclusiva das pessoas colectivas públicas. parece Exemplos de situações em que a culpa é excluída em virtude de estado de necessidade
incompatível com. o sistema civil de presunções integrais de culpa. A ausência de presunções desculpante: condutas praticadas sob coacção moral exercida sobre um citular de órgão ou
legais de culpa não afasta, no emanto, as chamadas presunções judiciais de culpa, resultantes da agente da administração; a omissão de realização de uma intervenção cirúrgica num paciente
experiência do julgador, quanto a condutas ostensivamente ilegais da administração (M. Cor- em risco de vida para que possa ser efectuada uma outra intervenção cirúrgica em outro pacien-
tez, A responsabilidade civil da administraçáo por lUtos administrativos ilegais e concurso tÚ omis- te na mesma situação.
sáo culposa do lesado. 102-105). Em sentido contrário ao defendido, a jurisprudência adminis-
trativa tem-se orientado ultimamente no sentido da aplicação à administração das presunções
de culpa estabdecidas na lei civil. embora a questão não seja pacífica. No sentido da aplicação
viii) Dano
das presunções de culpa do CC, entre outros, os Acs. STA 16/5/1996. BMj 457 (1996). 423;
3/12/1996, BMj 462 (1996), 470; 7/12/1999, BMj 492 (2000), 236; 2/2/2000, AD 473 O dano, ou preju'w, pode ser definido como a diminuição ou extinção
(2001),635; 10/2/2000. BMj 494 (2000). 150; 2012/2002, AO 487 (2002). 1023; 25/3/
de uma vantagem que é objecto de tutela jurídica. Trata-se de um pressu-
12004. Proc. n.O 01718/03; 3/1 112004. Proc. n.O 0811/03; 15/312005. Proc. n,O 036/04;
16/512006. Proc. 0121/06. posto da responsabilidade civil administrativa (arts. 7. 0 , 1,8.0 , 1 RRCEC)
que decorre da própria função do instituto da responsabilidade civil em
vii) Culpa (cont.): causas de exclusão da culpa geral (supra). O conceito de dano para efeitos de responsabilidade civil
administrativa abrange uma pluralidade de situações:
Tal como sucede com a ilicitude, também um j uíw de culpa formulado a) Danos emergentes e lucros cessantes. Danos emergentes são aqueles que
prima facie pode ser afastado em circunstâncias particulares, o que acarreta correspondem à privação de vantagens que já existiam na esfera jurídica do
a exclusão da responsabilidade delitual. O RRCEC não regula em geral esta lesado à altura da lesão; lucros cessantes são aqueles que correspondem à
matéria, mas o seu regime resulta da CRI: dos princípios gerais em matéria privação de vantagens que iriam formar-se na esfera jurídica do lesado se
de responsabilidade civil e penal e dos princípios fundamentais da activi- não tivesse ocorrido a lesão (art. 564. 0 , 1 CC).
b} Danos presentes e danos foturos (arto 30 0 , 3 RRCEC}o Danos presentes si só é imprestável, pois dela resulta um número de causas potencialmente
são aqueles qUe já ocorreram no momento da fixação da indemnização; infinito para cada resultadoo
danos futuros são I od - d _
. . aque es que am a nao ocorreram no momento a fixaçao Existem actualmente três teorias do nexo de causalidade com expressão
da Indemmzação (arto 5640 0 , 2 CC)o
doutrinai, todas elas conduzindo a resultados praticamente idênticos na
c) Danos patrimoniais e danos morais (arto 30 0 , 3 RRCEC; também arto grande maioria das situações: a teoria da causalidade adequada, a teoria da
850 0 .' 6 EDFAAP) . O s da nos dOlzem-se patnrnonlals
o o o quan do susceptíveis
o de
esfera de protecção da norma e a teoria da conexão do riscoo
avalIação pecunloárloao d o o ( - o oo 3
' lzem-se morais ou nao patrimOniais: 3rt. .0, 3 a} Para a teoria da causalidade adequada, um dano é imputado a um
RRCEC) quando insusceptfveis de tal avaliaçãoo O arto 30 0 , 3 RRCEC facto voluntário quando, perante a prática deste, fosse previsível, em con-
remete
. a matéria p ara Os ((termos geraIS o d e dOaeltO»,
o peIo que parece dever dições de normalidade social, a produção do primeiro; em caso de omissão,
aph~r-se o arto 4960 , 1 CC, que resrringe a indemnizabilidade dos danos
0
existe nexo de causalidade quando tenha sido omitida a acção que, em
moraIs aos casos qu e, peIa sua gravl°dad e, mereçam a ruteIa d o d trena;
o o Isto
o
condições de normalidade social, teria previsivelmente permitido impedir
POUCO acrescenta ao eclto é fiO
o d e d elOIffiaaçao
o - d os d anos ressarcÍvelS o aca-
a produção do danoo A avaliação desta previsibilidade, que não dispensa a
bando a decisão sob ce a ressarCI°bolod
1 I ad e ou nao
- d os d anos por ser ceI'egad a
noção de causalidade ontológica, é efectuada mediante um juíw virtual de
Para uma ponderaçao - a erectuar
c
no caso concreto. Q uestao- ceIatIva
o aos
prognose formulado após a ocorrência do facto voluntário e do resultado
danos morais que se encontra rod ead a d e grand o ,e a de saber
e controvérSIa (prognose póstuma); e deve atender aos conhecimentos específicos do agente
se. o dano consistente na morte e'oIn d emm°záveI'a pcó prJa
o v fUma
o (transmi-
o que lhe permitam dominar processos causais à partida anormaiso É esta a
tIndo-se necessária e imediatamente por via sucessória); mas só à custa de teoria da causalidade actualmente dominante no direito português da res-
conceptualismo extremo pode tal possibilidade Ser admitidao ponsabilidade civil (quer privada, quer administrativa) e penal, estando
implicitamente consagrada no arto 5630 0 CC e no arto 100 0 , 1 CP.
Na jurisprudência d o o o ST'A °d oo o
a rnlOlstratlva, o conSI crou que as meras angustia e Incerteza
causadas por uma cond d" . - - da fio
b} Para a teoria da esfera de protecção da norma (ou, mais precisamente,
uta a rnlnlstrauva nao sao nos su IClentemente graves para merece-
rem tutela em sede de responsabilidade civil (Ac. STA 31/512005, Proc. 0127/03), mas aceitou do fim de protecção do mandado de cuidado), existe nexo de causalidade
a ressarcibilidade dos d .. d o oo
anos morais consistentes no« esgosto, nervosismo angustia e depres- sempre que o dano ontologicamente causado por um facto voluntário
são» sofridos pelo lesad ê od d d" . '
o em consequ nCla a con ma a mInlstratlva (Ac. STA 24/1012006, (acção ou omissão) incida sobre as vantagens conferidas pela norma que
Proco 0539/06)0
consagra um direito subjectivo ou pela norma de protecçãoo Esta concep-
ção resulta de críticas à teoria da causalidade adequada, com base no argu-
ix) Nexo de causalidade
mento de que esta, por envolver considerações de teor subjectivo acerca da
conduta do agente (designadamente, quando incide sobre os seus conheci-
. Para
. que haJoa responsa bOlod
1 I ad e CIVl
o OI é necess áfiO
o que O d ano possa ser
mentos subjectivos que lhe permitem dominar processos causais anormais),
obJectlvamente im pu t ad o ao f:acto vo I ' o o
u'I umo
un tano; o pressuposto d a ultrapassa a matéria da imputação objectivao
responsabilidade CIVI
o oI d e lOItua I é ,aSSim,
o um nexod e causa10d
I ad e entre o
fàcto voluntário e d o , o á o If
o c} Para a teoria da conexão do risco, há imputação objectiva quando exista
o ano: esta eXlgencla est Imp cita nos arts. 7.0, I e 8.0, a criação ou o aumento (em caso de acção), bem como a não eliminação
1 RRCEC, quando se referem aos prejufws que resultem de actos ilícitos e ou a não diminuição (em caso de omissão) de um risco não permitido, e
culpososo A terminologOla Iegal parece apontar para uma noçao - onto I'oglca
o
esse risco se concretize num resultado danoso; para esta concepção, a teoria
de causalidade-. em termos ontológICOS,
o f a ' d
um cto e causa e um evento se da esfera de protecção da norma serve como limite negativo da imputação
este, sem o primeIoro, nao
- tivesse
o ocorn o. Esta noçao
°d - d e causa Como con-
objectivao A teoria da conexão do risco foi concebida pelo penalista alemão
dih"o sine qua non é a base das teorias normativas da causalidade, mas por C. Roxin, sendo actualmente maioritária na doutrina jurídico-penal alemã
1
e constituindo um aperfeiçoamento da teoria da esfera de protecção da cionalidade a imposição ao lesante do dever de indemnizar um dano que,
norma, sobretudo quanto às omissões e aos factos voluntários danosos dos em qualquer caso, se produziria através de uma acção lícita; é, todavia, de
quais resulte a diminuição (e não a criação ou o aumento) de riscos não exigir, uma demonstração absoluta de que o comportamento lícito alter-
permitidos; trata-se, porventura, da construção mais aperfeiçoada da teoria nativo não permitiria evitar o dano (pois, no caso de a evitação do dano
da causalidade jurídica. ser uma mera possibilidade, terá havido uma criação ou aumento do risco
proibido que justifica a imputação objecriva, à luz da teoria da conexão
x) Nexo de causalidade (cont.): causa virtual e comportamento lícito do risco: supra). Algumas das situações previstas na lei civil a propósito
al ternativo da relevância negativa da causa virtual podem abranger comportamentos
lícitos alternativos (por ex., nos arts. 491.°, 492.°, 493.°, 1 CC). Os tri-
A base ontológica do conceito normativo de causalidade implica que bunais administrativos consideram não existir nexo de causalidade entre
esta se refira a factos reais. O que acontece, então, nas situações em que, actos administrativos materialmente válidos, mas padecendo apenas de
a não ter ocorrido a causa real, o dano produzido se tivesse verificado na vício de forma ou de violação de lei por falta ou vício de fundamentação,
mesma por efeito de uma causa diversa, consistente num comportamento e os danos eventualmente verificados: nestes casos, os danos ter-se-iam
de outrem? E o que acontece nas situações em que, a não ter ocorrido a ptoduzido na mesma se os actos administrativos em causa tivessem sido
causa real, o dano produzido se tivesse verificado na mesma por efeito de praticados sem o vício que os inquinava (assim, quanto a actos adminis-
um comportamento conforme ao dever violado por parte do autor do trativos ilegais por falta de audiência dos interessados, Ac. STA 25/ 1/2005,
facto que o causou efecrivamente? O primeiro problema remete para a Proc. O1116/04; quanto a actos administrativos ilegais por falta de fun-
teoria da causa virtual; o segundo, para a teoria do comportamento licito damentação, embora com uma formulação algo elíptica, Acs. STA
alternativo. 91212006, Proc. 0294/05, 13/2/2003, Proc. 01961/02); trata-se de uma
No que respeita à causa virtual, a doutrina é unânime no sentido de o aplicação, embora sem invocação expressa, da teoria do comportamento
autor da causa virtual não poder ser responsabilizado pelo dano ocorrido, lícito alternativo.
na medida em que este se deveu realmente a uma causa diversa; solução
inversa seria mesmo inconstitucional, por implicar uma intromissão não Esta doutrina não exclui, naturalmente, a existência de nexo de causalidade quando o vício
justificada no património do autor da causa virtual (assim, vigora a regra não substancial em causa «tiver inquestionavelmente determinado o conteúdo substancial e
resolutório do .etO ilegal, (Ac. 13/2/2003. Proc. 01961102).
da irrelevância positiva da causa virtual). É também praticamente unânime
que a existência de uma causa virtual não pode servir para eximir o autor
d) A culpa do lesado como causa de exclusão ou modificação da respon-
da causa real da responsabilidade que lhe cabe pelo dano que efectivamente
sabilidade administrativa delitual
provocou; caso contrário, inexistiria em ·princípio qualquer responsabili-
dade pelos danos provocados pelo facto ilícito e culposo em causa, com
violação dos fundamentos constitucionais das pretensões reintegratórias A responsabilidade civil é um desvio à regra geral de imputação de pre-
dos particulares e dos eventuais direitos subjecrivos e mesmo jusfundamen- juízos à esfera jutídica em que eles ocorrem (supra); esta regra pode, no
tais do lesado (assim, vigora a regra da irrelevância negativa da causa vir- entanto, ser reposta se os prejuízos forem imputáveis à preterição da dili-
tual). Por vezes, e a título excepcional, a lei civil dá expressamente relevân- gência devida pelo próprio lesado, já que a este incumbe um ónus de pro-
cia negativa à causa virtual (arts. 491.°, 492.°, 493.°, 1,616.°,2 CC). tecção diligente da sua esfera jurídica. Assim, a culpa do lesado pode excluir
Ao contrário do que sucede com a causa virtual, o comportamento licito a responsabilidade do lesante ou implicar a distribuição proporcional da
alternativo é genericamente relevante, pois violaria o princípio da propor- responsabilidade pelas esferas patrimoniais do lesante e do lesado. A culpa
do lesado está prevista em geral no art. 4.° RRCEC: quando o comporta- e} Sujeitos do dever de indemnizar na responsabilidade administrativa
mento culposo do lesado tenha concorrido para a produção ou o agrava- delitual
mento dos danos causados, a indemnização pode ser totalmente concedida,
reduzida ou excluída, consoante a gravidade das culpas de ambas as partes A responsabilidade delitual não impende apenas sobre as pessoas colec-
e as consequências que delas tenham resultado (art. 4.° RRCEC). Note-se, tivas administrativas, mas também sobre os seus titulares de órgãos ou
no entanto, que a culpa do lesado não exclui em abstracto a efectivação da agentes que, do ponto de vista ontológico, praticaram o facto voluntário
responsabilidade civil; o juízo sobre a subsistência, e em que termos, do ilícito, culposo e danoso (supra). A articulação das responsabilidades de
direito à indemnização será efectuado em concreto pelo tribunal na acção cada um está sujeita a algumas regras.
de indemnização que for intentada. A responsabilidade do lesante é auto- a) Independência parcial entre a respomabilidade das pessoas colectivas
maticamente excluída sempre que resultasse da presunção da sua culpa (art. administrativas e a responsabilidade dos titulares de órgãos ou agentes.
570.°,2 CC, disposição que deve considerar-se abrangida pela remissão do As pessoas colectivas administrativas respondem pelos prejuíws resultantes
art. 10.°,3 RRCEC para os princípios gerais da responsabilidade civil de actos ilícitos e culposos dos seus órgãos ou agentes (arts. 7.°, I, 8.°, I, 2
quanto às presunções de culpa administrativa especificamente previstas). RRCEC). Os titulares de órgãos e agentes administrativos respondem pelos
A diligência do lesado é aferida nos mesmos termos que a do lesante prejuíws resultantes de actos ilícitos praticados com dolo ou negligência
(supra). grave (art. 8.°, I RRCEC). Daqui resulta a irresponsabilidade dos titulares
Caso paradigmático de culpa do lesado, durante muito tempo o único de órgãos ou agentes pelos seus actos praticados com negligência leve (solu-
expressamente previsto na lei e hoje objecto de individualização no art. 4.° ção tradicional no direito português mas muito discutível e mesmo de
RRCEC é o de o lesado não ter utilizado a via processual adequada à eli- duvidosa constitucionalidade, à luz do art. 22.° CRP; recusando a incons-
minação de um acto jurídico lesivo, assim concorrendo para a produção ou titucionalidade, Ac. STA 28/9/2006, Proc. 0855/04). Ou seja, a responsa-
o agravamento dos danos causados. Contudo, esta referência é passível de bilidade das pessoas colectivas administrativas pressupõe a prática de um
generalização a todas as situações em que o lesado não tenha utilizado o acto ilícito e culposo por um titular de órgão ou agente, mas não pressupõe
meio processual adequado para reagir contra qualquer acção ou omissão a sua respomabilidat/e, pode, portanto, haver responsabilidade das primei-
administrativa da qual possam resultar danos para a sua esfera jurídica. ras e não dos segundos.
Assim, tem sido considerado que o não requerimento da suspensão de b) Solidariedade entre as pessoas co/ectivas administrativas e os titulares de
eficácia de actos administrativos pode dar origem a culpa do lesado; órgãos ou agentes. A responsabilidade das pessoas colectivas administrativas
discutivelmente, o Ac. STA 18/3/1993 (Proc. 030914) foi mesmo ao ponto e dos seus titulares de órgãos e agentes é solidária (art. 22.° CRP), o que
de aplicar esta doutrina aos aeros nulos e inexistentes. significa que o lesado pode exigir individualmente de cada um dos respon-
sáveis, ou simultaneamente a todos eles, a satisfação da totalidade da
Exemplos de situações em que a responsabilidade civil administrativa é excluída ou redu- indemnização (art. 512.° CC). Naturalmente que a solidariedade pressu-
zida em virtude de culpa do lesado: um automóvel conduzido por um funcionário público ao
abrigo do poder de direcção do superior hierárquico atropela um peão, mas este estava a atra-
põe a responsabilidade do titular de órgão ou agente; por isso, este regime
vessar a rua no sinal encarnado; um ageme da polícia dispara ilegalmente sobre uma pessoa. só se aplica nos casos de dolo ou negligência grave (art. 8.°,2 RRCEC, que
mas as lesões corporais sofridas agravam-se em consequência da recusa do lesado em subme- suscita dúvidas de conformidade constitucional, mas em todo o caso pro-
ter-se a tratamemo médico; uma licença de exercício de determinada actividade económica é
gride em relação ao chocante regime anterior, que restringia a solidariedade
ilegalmente revogada, implicando o incumprimento de contratos celebrados pelo seu titular,
mas ta! não teria ocorrido caso este tivesse impugnado o acto revogat6rio e pedioo a suspensão à responsabilidade emergente de actos dolosos).
jurisdicional da sua eficácia. c) Dever de regresso. Em regra, quando satisfaça uma indemnização com
fundamento em responsabilidade delitual, a pessoa colectiva administrativa
deve, por sua vez, exigir ao titular de órgão ou agente que ontologicamente 4 RRCEC, que, inexplicavelmente, contempla apenas a presunção de culpa
praticou o fàcto que lhe pague o montante da indemnização suportada; a isto do art. 10.°,2 RRCEC).
chama-se o exercício do regresso (art. 8.°, 3 RRCEC). A possibilidade de
regresso só não existe em três situações: caso a negligência do titular do órgão Nesta matéria. o RRCEC representou um avanço em relação à situação normativa anterior,
ou agente tenha sido leve, porque nesse caso aquele será irresponsável (arts. que permitiu a total inefecrividade do mecanismo do regresso, com a consequênóa prática de
que os titulares de órgãos e agentes adminisrcativos dispunham de um seguro gratuito e ilimi-
7.°, 8.°, 1,2,3 RRCEC); caso tenha havido funcionamento anormal do
tado de responsabilidade civil, cujos custos eram suportados pela totalidade dos contribuintes.
serviço, uma vez que nesse caso não é possível apurar a identidade do autor No entanto, teria sido preferível ir mais longe, estabelecendo expressamente a responsabilidade
do fàcto voluntário (assim, desde o Ac. TConf. 10/7/1969, ADG 411111971); solidária entre os titulares de órgãos e agentes primariamente responsáveis e aqueles que omi-
caso o autor do fàcto voluntário tenha actuado ao abrigo de ordens ou ins- tam as providências necessárias a efectivar o direito de regresso (solução que. todavia. já decor-
re do conjumo do regime legal geral) bem como. do ponto de vista processual. impor ao
truções ilegais às quais devesse obediência e tenha exercido o seu direito de
Ministério Público o dever de, nas acçóes de responsabilidade civil administrativa, suscitar a
representação (supra, 11; neste caso, contudo, haverá lugar a regresso contra o imervenção dos titulares de órgãos e agemes que praticaram o delito, quando tal imervenção
superior hierárquico que emitiu as ordens ou instruções). A existência do não seja solicitada pelas partes.

regresso como regra significa que a responsabilidade delitual das pessoas


colectivas administrativas se aproxima, na verdade, de uma garantia do cum- d) Solidariedade entre os titulares de órgãos e agentes, em caso de plurali-
primento do dever de indemnizar que, fundamentalmente, incumbe aos seus dade de responsdveis. Se houver mais do que um titular de órgão ou agente
titulares de órgãos e agentes; e visa garantir que não é toda a colectividade, responsáveis, o art. 10.°, 4 RRCEC manda atender ao disposto no art.
através dos impostos que constituem a grande parte dos recursos financeiros 497. 0, 1 Cc. Este, por sua vez, determina a solidariedade entre os vários
do Estado, a suportar os danos que apenas são imputáveis a alguns. responsáveis (art. 497.°, 1 CC) e estabelece ainda que o direito de regresso
O exercício do regresso é juridicamente vinculado, tratando-se por isso entre todos eles existe na medida das suas culpas e das consequências que
de um verdadeiro dever jurídico (art. 6.°, 1 RRCEC, do que resulta a ina- delas advieram, presumindo-se serem tais culpas iguais (art. 497.°, 2 CC).
dequação da expressão tradicional «direito de regresso»); para que ele possa Estando esta situação regulada no CC, não se aplica naturalmente o art. 6.°
ser cumprido, a secretaria do tribunal que tenha condenado a pessoa colec- RRCEC (seria, aliás, despropositado que a lei impusesse a obrigatoriedade
tiva administrativa ao pagamento de uma indemnização deve remeter a do exercício do regresso em relações interprivadas).
certidão da sentença transitada em julgado aos órgãos competentes para
promover as diligências necessárias para a sua efectivação (art. 6.°, 2
RRCEC). Os órgãos aos quais incumbe a efectivação do regresso são os 6. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: responsabilidade
detentores dos poderes de direcção, de superintendência ou de tutela sobre extracontratual pelo risco
quem praticou o facto danoso (art. 8.°, 3 RRCEC; havendo vários órgãos
em tais circunstâncias, a competência é deferida pela ordem indicada). a) O cardcter geral da responsabilidade administrativa pelo risco
A omissão daquelas diligências é ilegal, pelo que os órgãos omitentes pode-
rão, eles próprios, tornar-se civilmente responsáveis pela sua não adopção Ao contrário do que se passa no direito privado (art. 483.°, 2 CC), a
perante a pessoa colectiva a que pertençam. Quando uma pessoa colectiva responsabilidade administrativa pelo risco não tem carácter excepcional,
administrativa seja condenada ao pagamento de uma indemnização em antes sendo definida através de uma cláusula geral: as pessoas colectivas
virtude de presunção de culpa leve, a acção judicial prossegue, após a con- administrativas respondem pelos danos causados por actividades, coisas ou
denação, entre aquela pessoa colectiva e o responsável individual, para serviços administrativos especialmente perigosos (art. 11.°, 1 RRCEC).
apuramento do grau de culpa e do eventual exercício do regresso (art. 8.°,
L
(ambos no art. 11.°, I. parte final, RRCEC) e a responsabilidade de rer- pode, logicamente, ser um titular de órgão ou agente da pessoa colectiva
ceiro (art. 11.°,2 RRCEC). A5 três causas de exclusão ou modificação são responsável pelo risco, no exercício das suas funções e por causa delas (pois,
cumuláveis entre si, devendo nesse caso apurar-se em que proporção cada I nesse caso, estar-se-ia perante responsabilidade administrativa delitual).
!
urna delas, bem como o risco criado pela administração, concorreu para o A responsabilidade de terceiro pode excluir ou reduzir a responsabilidade
I
dano. I da administração, devendo, no último caso, apurar-se em que proporção o
a) Caso fortuito ou de força maior. Existe caso de força maior, excludente ! risco criado e o facto de terceiro concorreram para a produção do dano
da responsabilidade pelo risco, quando a criação ou o aumento do risco que !,
; ,
(embora apenas a possibilidade de redução esteja implícita no art. 11.°, 2
conduziu ao dano tenha sido provocado por uma circunstância inevitável RRCEC). Quando a responsabilidade pelo risco coexista com a responsa-
(por exemplo, uma catástrofe natural, uma guerra); apesar de a lei não se bilidade de terceiro, a administração responde solidariamente com o ter-
lhe referir expressamente, parece que também exclui a responsabilidade ceiro, sem prejuízo do exercício do regresso: trata-se de uma solução alta-
pelo risco o chamado caso fortuito, consistente em circunstâncias imprevi- mente discutível, na medida em que nada justifica que o erário público
síveis, ainda que, a terem sido previstas, fossem evitáveis (por exemplo, um funcione como garante da responsabilidade de pessoas que não são titulares
comportamento humano não gerador de responsabilidade civil). Apesar de de órgãos ou agentes públicos.
a lei não o dizer, deve entender-se que, para que o caso fortuito ou de força
maior exclua a responsabilidade pelo risco, repondo-se a regra geral segundo
a qual cada esfera jurídica suporta os danos que nela se produzam (supra), 7. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: responsabilidade
é necessário que aquele seja estranho ao funcionamento do serviço; ou seja, extracontratual por facto lícito
o risco de um caso fortuito ou de força maior inerente ao serviço corre pela
administração. O caso fortuito ou de força maior pode, consoante as cir- a) Fundamento da responsabilidade civil administrativa por facto licito
cunstâncias, excluir ou reduzir a responsabilidade da administração (art.
11.°, I RRCEC); no último caso, haverá que apurar em que proporção o Por vezes, a lei permite que, no exercício da função administrativa e em
risco criado e o caso fortuito ou de força maior concorreram para a produ- benefício do interesse público, a administração sacrifique posições jurídicas
ção do dano. subjectivas dos particulares. Em alguns destes casos, a lei determina que a
b) Culpa do lesado. A culpa do lesado afere-se nos mesmos termos administração seja responsável pelos danos provocados, independente-
que na responsabilidade delitual (supra), podendo, consoante as cir- mente de qualquer ilicitude ou risco especial: trata-se, portanto, de uma
cunstâncias, excluir ou reduzir a responsabilidade da administração responsabilidade por faCto lícito. A responsabilidade civil por facto licito
(art. 11.°, I RRCEC); no último caso, haverá que apurar em que pro- decorre do princípio da justa distribuição dos encargos públicos: segundo
porção o risco criado e a culpa do lesado concorreram para a ptodução aquele princípio, os prejuízos resultantes do exercício de uma actividade
do dano. que visa a prossecução do interesse colectivo devem ser suportados pela
c) Responsabilidade de terceiro. A responsabilidade de terceiro depende colectividade que dela beneficia e não exclusivamente pelo lesado: pelo
da verificação, quanto a outrem, dos pressupostos da responsabilidade civil: dispêndio de recursos públicos na reparação de prejuízos causados, os titu-
ao falar em «facto culposo de terceiro», a lei parece apontar apenas para a lares dos órgãos administrativos respondem, por Sua vez, perante a colecti-
responsabilidade delitual daquele, mas pode também tratar-se de responsa- vidade pagadora de impostos. O princípio da justa distribuição dos encar-
bilidade pelo risco (embora não pelo mesmo risco). O terceiro responsável gos públicos fundamenta-se, por sua vez, no princípio do Estado de direiro
pode ser uma pessoa colectiva administrativa ou um particular, o que deter- (art. 2.° CRP) e no princípio da igualdade (art. 13.° CRP).
mina a aplicação do correspondente regime de responsabilidade civil: não
b} Fundamento da responsabilidade administrativa pelo risco Anteriormente ao RRCEC. a lei exigia um perigo não apenas especial mas ~upcional,
entendido como uma potenciali.dade de lesão de bens absolutamente exorbitante da normalida-
de social. Na prática, isto reduzia a responsabilidade administrativa pelo risco a uma expressão
Não existe acordo na doutrina acerca do exacto fundamento da impu- insignificante. Os exemplos clássicos de serviços administrativos. actividades e coisas excepcio-
tação pelo risco: para a teoria da criação do risco, a responsabilidade fun- nalmente perigosos eram extremos: operações policiais que envolvam armas de fogo ou coacção
da-se na exigência de que quem cria um risco responda pelas suas conse- física sobre as pessoas; transfusões de sangue realizadas em hospitais públicos após a existência
de meios de diagnóstico do vírus HIV/SIDA (Ac. STA de 1/3/2005. Proc. 01610/03); mano-
quências; para a teoria do risco-proveito, a responsabilidade funda-se na bras militares; depósitos de armas, substâncias inAamáveis, explosivas ou radioactivas; centrais
exigência de que quem tira proveiro de uma actividade responda pelos de produção e as redes de distribuição de energia eléctrica ou gás; centrais nucleares. O conceito
riscos por ela criados; para a teoria do risco de autoridade, a responsabili- de serviços administrativos, actividades ou coisas especialmente perigosos abrange, por maioria
de razão, as situações anteriormente referidas. mas também, por exemplo, a realização de obras
dade funda-se na exigência de que quem tem sob o seu controlo uma coisa
na via pública, a condução de veículos prioritários (ambulâncias, veículos policiais) a velocidades
ou uma actividade responda pelos riscos que elas envolvem. A formulação normalmente não permitidas e, eventualmente, o bloqueamento e o reboque de viaturas. Pelo
do art. 11.°, 1 RRCEC parece pressupor a teoria do risco de auroridade; contrário, parece não dever considerar-se como tendo carácter especialmente perigoso a deten-
ção ou condução, em circunstâncias normais. de auromóveis, aeronaves ou navios, que no
mas ao regime legal estão também subjacentes, ainda que de forma nega-
direito privado origina situações expressamente previstas como sendo de responsabilidade pelo
tiva, as teorias da criação do risco e do risco-proveito: a primeira, porque a risco (arts. 503.° e 506.°, CC; art. 4.° Decreto-Lei n.O 202/98, de 10 de Julho).
responsabilidade pelo risco é excluída ou modificada se houver culpa do Para além do art. 11.° RRCEC. existem ainda previsões específicas de responsabilidade do
risco, com regimes especiais, formuladas em termos tão amplos que abrangem a administração
lesado ou de terceiro, ou seja, se existirem outras fontes de risco (infra);
pública no exercício de gestão pública: é o caso da responsabilidade do producor pelos danos
a segunda, porque a responsabilidade pelo risco é apenas das pessoas colec- causados pelos defeitos dos produtos que põe em circulação (Decreto~Lei n.O 383/89, de 6 de
tivas administrativas e não dos seus titulares de órgãos ou agentes, uma vez Novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.O 13112001, de 24 de Abril).
que o risco é criado em benefício exclusivo do interesse público prosse-
guido pelas primeiras e não dos interesses particulares dos segundos. b) Dano. Para efeitos de responsabilidade pelo risco, o dano não apre-
senta qualquer especificidade em relação à responsabilidade delitual (supra).
c} Pressupostos da responsabilidade administrativa pe'" risco Ao contrário do que se passa na responsabilidade por facto lícito, não existe
qualquer limite qualitativo à ressarcibilidade dos danos (infra); ao contrário
a) Facto. Ao contrário do que se passa na responsabilidade delitual, não do que se passa em algumas situações de responsabilidade pelo risco no
é todo e qualquer facto que pode gerar responsabilidade pelo risco: é neces- direito privado (por exemplo, art. 508.°, 1 CC), a ressarcibilidade dos
sário que esse facto resulte de uma actividade, do funcionamento de um danos também não tem qualquer limite quantitativo.
serviço ou de uma coisa especialmente perigosos (art. 11.°, 1 RRCEC). c) Nexo de causalidade (implícito na expressão .. danos decorrentes Je," no
O conceito de perigo especial exprime uma potencialidade de lesão de bens art. 11.°, 1 RRCEC). Também o nexo de causalidade na responsabilidade
que normalmente não se verifica na vida social; estão, nomeadamente (mas pelo risco não difere substancialmente da responsabilidade delitual (supra);
não apenas), abrangidos pelo conceito aqueles perigos que decorrem de mostra-se aqui especialmente apropriada a teoria da esfera de protecção da
circunstâncias especificamente atinentes à prossecução da actividade admi- norma (supra).
nistrativa e que, por isso, não se verificam correntemente em actividades
desenvolvidas por particulares ou em coisas que estejam na sua posse. d} Causas de exclusão ou modificação da responsabilidade administra-
A natureza especial do perigo não deve ser averiguada em abstracto, mas tiva pelo risco
tendo em conta os concretos funcionamento do serviço, coisa ou actividade
que estejam em causa. A responsabilidade administrativa pelo risco pode ser excluída ou modi-
0" ficada em três situações: o caso fortuito ou de força maior, a culpa do lesado
b} Modalidades da respomabilidade civil administrativa por facto licito A responsabilidade civil pelo sacrifício de bens pessoais tem três pressu-
postos:
Existem duas modalidades de responsabilidade civil por facto lícito: a) Facto voluntdrio. O facto voluntário pode ser um acto administrativo
a responsabilidade pelo sacrifício de bens pessoais e por danos causados em ou um acto material; a exclusão dos regulamentos do conceito de acto
estado de necessidade (art. 16.° RRCEC) e a responsabilidade civil pela voluntário prende-se com a sua impossibilidade natural para produzir
legítima não reconstituição da situação actual hipotética (arts. 45.°, 49.°, danos ressardveis no âmbito desta modalidade de responsabilidade civil,
102.°,5, 166.° e 178.° CPTA). em virtude do carácter necessariamente especial do dano (infra).
b) Licitude. Para haver responsabilidade pelo sacrifício de bens pessoais,
A disciplina legal da matéria da responsabilidade por facto Ikito no art. 16. 0 RRCEC é o facto voluntário tem que ser lícito. O art. 16.° RRCEC não refere expres-
bastante infeliz. Provavelmente, partindo da verificação de que as pretensões inclemnizatórias
samente este pressuposto, mas ele infere-se sistematicamente da conjugação
pelo sacrifício de direiws patrimoniais privados são fundamentalmente alheias à responsabilida~
de civil, o legislador quis afastar-se dos quadros conceptuais deste instituto (daí o ter-se referido
com os preceitos respeitantes à responsabilidade delitual e à responsabili-
a «inclemnização» e não a «responsabilidade»). Contudo, esqueceu-se de que o dever de indem- dade pelo risco. No caso de responsabilidade por danos causados em estado
nizar por factos IfcilOS pode também decorrer do sacrifício de direiws de carácter pessoal e, ao de necessidade, a ilicitude da actuação administrativa tem que estar justifi-
regular unitariamente o dever de I<indemnização pelo sacriffcio», visou sujeitar as pretensões
cada por estado de necessidade (supra). abrangendo todos os seus pressu-
indemni1.3.tórias pelo sacrifício de direiws patrimoniais privados à ocorrência de um dano espe~
cial e anormal e, afina], submeter aquelas pretensões ao modelo de reintegração sucessiva da postos e requisitos, designadamente a estrita necessidade da actuação admi-
responsabilidade civil. em ambos os casos com violação do an. 62. 0 , 2 CRP (infra). Esta circuns~ nistrativa para a obtenção do objectivo visado (que inclui a exigência de
tância deve levar a uma interpretação restritiva conforme com a Constituição do ano 16. 0 que ela seja ditada pelo interesse público, expressa no art. 16.° RRCEC);
RRCEC, dele se excluindo as pretensões indemnizat6rias pelo sacrifício de direitos patrimoniais
privados; o que resta para a disposição em causa é. assim. apesar da sua epígrafe. exclusivamente
caso não haja justificação da ilicitude, recai-se na esfera da responsabilidade
matéria de responsabilidade civil por facto lícico. Por outro lado, o ano 16. 0 RRCEC eliminou delitual.
o regime especifico anteriormente existente para a responsabilidade por actos praticados em c) Dano. Nem todos os danos são susceptíveis de ressarcimento no
estado de necessidade. que, assim, numa solução de conformidade constitucional duvidosa e não
âmbito desta modalidade de responsabilidade civil. Assim, em primeiro
passível de superação através de interpretação constitucionalmente conforme (uma vez que esta
pretensão reintegratória não pode, por definição, reconduzir~se ao modelo de indemnizaçao lugar, tem que tratar-se em regra de um dano em bens pessoais; apenas
concomitante das pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direicos patrimoniais privados). poderá tratar-se de um dano em bens patrimoniais se tiver sido causado
passa a ficar dependente do carácter especial e anormal do encargo ou dano. em estado de necessidade; fora desta situação, tratando-se de danos em
bens patrimoniais, recai-se na pretensão indemnizatória pelo sacrifício de
c} Responsabilidade pelo sacriftcio de bens pessoais direitos patrimoniais privados (infra). Em segundo lugar, tem que se
tratar de um encargo ou dano especial e anormal (art. 16.° RRCEC):
o art. 16.° RRCEC refere-se à responsabilidade pelo sacrifício em ter- é especial o encargo ou dano causado a pessoas individualmente identifi-
mos excessivamente amplos: por interpretação conforme com a Constitui- cáveis; é anormal o encargo ou dano que ultrapassa o risco normal da vida
ção, as pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais social.
privados devem ser excluídas do seu âmbito (supra) e enquadradas em ter- d) Nexo de causalidade. A exigência de nexo de causalidade entre o facto
mos substancialmente diversos dos nele previstos (infra). Assim sendo, o lícito e o encargo ou dano especial e anormal retira-se implicitamente do
âmbito do art. 16.° RRCEC fica reduzido à responsabilidade pelo sacrifício art. 16.° RRCEC (<<imponham encargos ou causem danos»). A averiguação
de bens pessoais (designadamente a vida, a integridade física, a saúde e a do nexo de causalidade não apresenta especificidades em relação à respon-
qualidade de vida, bem como os direitos de personalidade referidos no sabilidade delitual (supra).
art. 26.°, 1 CRP) e por danos causados em estado de necessidade.
d) Responsabilidade pelo não restabelecimento legitimo de posições jurl- o art. 325.°, 4 CCP remete para o CC quanto à disciplina legal geral
dicas subjectivas violadas do incumprimento contratual, e portanto também da responsabilidade
civil administrativa contratual. A regra geral vigente em matéria de respon-
Em regra, os particulares lesados nas suas posições j~rídicas subjectivas sabilidade contratual é a de que o devedor que falte culposamente ao cum-
por condutas administrativas têm direito à eliminação daquelas condutas e primento da obrigação se torna responsável pelo dano causado ao credor
a que seja reconstituída na sua esfera jurídica a situação que existiria se (art. 798.° CC); à falta culposa de cumprimento é equiparada a impossibi-
aquelas condutas não tivessem ocorrido (infra). Por vezes, a lei admite que lidade de cumprimento por causa imputável ao devedor (art. 801.°, 1 CC).
a reconstituição não ocorra, por tal ser impossível ou manifestamente A simples mora [ou seja, o atraso na efectivação da prestação devida em
inconveniente, mas impõe à administração - que, recorde-se, praticou a relação ao momento contratualmente estipulado ou após interpelação do
conduta ilegal - o dever de indemnizar o lesado. credor: art. 805.°, 1,2, a) CC] constitui o devedor na obrigação de reparar
Esta indemnização é um sucedâneo do restabelecimento das posições o dano causado ao credor (art. 804. 0 , 1 CC).
jurídicas subjectivas violadas (e, em particular, da reconstituição da situa-
ção actual hipotética: infra) e não visa, por isso, ressarcir o lesado de todos
o cumprimento defeituoso resuha de um comporlamemo que. sendo ontológica e/ou nor-
mativamente aproximado do comportamento devido, não corresponde todavia ao cumprimento
os danos provocados pela conduta ilegal da administração. Em coerência pontual (ou seja, ponto por ponto) do contrato. Existem normas relativas ao cumprimento defei-
com isto, os pressupostos da responsabilidade civil por facro lícito são sim- tuoso de contratos específicos (arts. 905.°, 913.°,1032.°,1218.° CC) mas não um regime legal
geral. O cumprimento defeituoso é ainda uma modalidade de não cumprimento, pois só existe
plificados: para que haja lugar a esta modalidade de responsabilidade civil
cumprimento se a obrigação for integral (art. 762.°, 1 CC) e pontualmente cumprida (an. 406.°,
é apenas necessário que se verifiquem os pressupostos das pretensões ao 1 CC). Assim, havendo cumprimento defeituoso, o devedor continua adstrito, pelo menos em
restabelecimento de posições jurídicas subjectivas violadas e que se verifi- parte ou em certa medida, às obrigações contratuais assumidas, tendo por isso. para cumprir o
que uma situação em que é legítima a sua não satisfação pela administração contrato, que corrigir o defeito. Se o devedor corrigir o defeito depois do momento em que
deveria ter ocorrido o cumprimento pontual do contrato haverá lugar a indemnização por mora.
(infra). A subsistência deste regime, não previsto na legislação geral da Se o devedor não corrigir o defeito, o credor pode, dentro dos limites da boa fé, recusar a presra-
responsabilidade civil, é assegurada pelo art. 2.°, 1 RRCEC. ção defeituosa (art. 763.°, I CC. a flrtion) ou resolver o contrato (art. 802.°, 1, 2 CC), determi-
nando assim a aplicação do regime da responsabilidade civil contratual; pode, também. reduzir-se
Diferentes destas situações são aquelas em que a administração responde pelo não restabe· a contraprestação do credor na proporção do incumprimento (art. 802.°, 1 CC).
lecimento i/egitimo de posições jurldicas subjecüvas violadas: neste caso, as condutas adminis·
traüvas são ilegais e. por isso. a responsabilidade civil a que dêem lugar é delitual e não por
Os pressupostoS da responsabilidade civil contratual, implícitos no
facto lícito (assim. a propósito da inexecução ilegal de sentenças dos tribunais administrativos.
arts. 159.·. 1. al. 168.·.3.179.·.6 ePTAI. art. 798.° CC, coincidem com os da responsabilidade extracontratual deli-
tual. Exige-se um facto voluntário, o incumprimento, que consiste sempre
numa omissão (embora possa por vezes constituir uma omissão por acção:
8. Responsabilidade civil por acto de gesrão pública: responsabilidade supra), a ilicitude do facto, a culpa do agente do facto voluntário e ilícito,
contratual o dano e o nexo de causalidade entre o in cumprimento e o dano. A única
diferença fundamental em relação aos pressupostos da responsabilidade
A exisrência de uma responsabilidade civil administrariva contratual delitual está na existência de uma presunção de culpa do devedor (art. 799.°,
decorre dos mesmos fundamentos apontados para a responsabilidade deli- 1 CC; no entanto, a diferença é menos sensível no direito administrativo
tual (supra), aos quais pode acrescentar-se o princípio geral de direito do que no direito privado, uma vez que no primeiro existe uma presunção
segundo o qual os contratos devem ser pontualmente cumpridos (pacta geral de culpa quanto aos actos imateriais ilícitos na responsabilidade deli-
sum servanda). tual: art. 10.°,2 RRCEC; supra). Todavia, o funcionamento prático destes
pressupostos apresenta particularidades: estando em causa a violação de de pacificação doutrinaI. Trata-se de situações que não são, nem de pura
deveres específicos de prestar (e não de deveres genéricos de respeito, como responsabilidade extracontratual, na medida em que os deveres violados
sucede na responsabilidade delitual), os pressupostos da responsabilidade não são genéricos mas específicos (deveres de protecção, lealdade e infor-
contratual têm menor autonomia entre si, sendo a verificação de um deles mação), nem de pura responsabilidade contratual, na medida em que os
normalmente acompanhada da verificação dos restantes (o incumprimento deveres violados não são os deveres de prestar emergentes do contrato
de um contrato é normalmente ilícito por violação do direito subjectivo do (supra). Em causa estão, sobretudo, a responsabilidade pré-contratual, a
credor ao cumprimento; dificilmente o incumprimento contratual não responsabilidade pós-contratual, os contratos com eficácia de protecção
causará O dano da privação do bem que é objecto do contrato; em vista do para terceiros e as relações correntes de negócios. Todas estas situações
carácter específico dos deveres violados, o nexo de causalidade entre o podem suscitar-se no direito administrativo, onde não foram ainda objecto
incumprimento e o dano é praticamente autodemonstrado). Assim, a de atenção suficiente por parte da doutrina.
verificação de uma situação de incumprimento contratual justifica a for- a) Responsabilidade pré-contratual. A responsabilidade pré-contratual
mulação de presunções judiciais de ilicitude e de nexo de causalidade (para está prevista no art. 227.° CC, nos termos do qual, quem negoceia com
A. Menezes Cordeiro, Da responsabilidade civil dos administradores de socie- outrem para a conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como
dades comerciais, 469-470, 485 ss., a presunção legal do art. 799.°, 1 CC na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de res-
refere-se mesmo, abrangentemente, à culpa, à ilicitude e ao nexo de causa- ponder pelos prejuíws provocados. Não existe previsão específica da res-
lidade). Acresce a isto que, sendo o incumprimento um facto negativo, o ponsabilidade pré-contratual, mas ela decorre directamente do princípio da
credor não tem que provar a sua verificação, antes cabendo ao devedor boa fé, na sua dimensão de tutela da confiança [art. 6. 0 -A, 2, a) CPA; supra,
provar que cumpriu (art. 343.° CC) ou que não se verificou um facto 1,10-33 ss.]. Existem alguns afloramentos de um princípio de responsabi-
voluntário. lidade pré-contratual no direito administrativo: a entidade adjudicante
Além da presunção de culpa, o único aspecto específico da responsabili-
deve indemnizar os concorrentes pelos encargos incorridos com a elabora-
dade contratual é o regime da responsabilidade por actos praticados por
ção das propostas apresentadas, quando não adopte a decisão de escolha do
auxiliares: o devedor responde perante o credor pelos actos dos seus repre-
procedimento de ajuste directo no ano seguinte à adjudicação do concurso
sentantes legais ou das pessoas que utilize para o cumprimento da prestação
de concepção ou quando aquela decisão caduque (art. 21.°, 8 CCP) e
como se aqueles actos fossem por si próprio praticados (art. 800.°, 1 CC);
quando decida não adjudicar por ser necessário alterar aspectos fundamen-
não deve em princípio admitir-se a exclusão da responsabilidade do contra-
tais dos documentos do procedimento ou por circunstâncias de manifesto
tante privado da administração pelos actos dos seus auxiliares, pois os deve-
interesse público relativas aos pressupostos da decisão de contratar o justi-
res impostos ao primeiro decorrem normalmente de normas que visam
ficarem, desde que as razões justificativas da não adjudicação ocorram após
tutelar o interesse público (<<normas de ordem pública .. : art. 800.°, 2 CC).
o termo do praw para a apresentação das propostas (arts. 79.°, 4, 80.°, 2,
a contrario, CCP); do mesmo modo, a entidade adjudicante deve indem-
nizar o adjudicatário das despesas incorridas com a elaboração da proposta
9. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: terceira via da res-
e com a prestação de caução quando, por facto que lhe seja imputável, não
ponsabilidade civil
outorgar o contrato no praw legalmente previsto (art. 95.°, 3 CCP).
o problema da chamada «terceira via da responsabilidade civil.. não está Exemplos de responsabilidade pré-contratual: a admini.sccação abre um concurso público,
ainda resolvido no direito privado, uma vez que se trata de matéria que que anula sem celebrar quaJquer contrato, daf decorrendo prejuízos patrimoniais para os con-
emergiu sobretudo após a última vaga de codificação e ainda não foi objecto correntes; é celebrado um contrato administrativo que padece de um vício exclusivamente
imputável à administração, vindo o contratante particular a sofrer danos em consequência da
sua anulação; é celebrado um contrato administrativo válido, mas a administração não infor-
d) Relação corrente de negócios. Existe uma relação corrente de negócios
mou o contratante particular de determinados condicionamentos relativos à execução do quando duas pessoas estão habitualmente ligadas por conttatos; nestes
comrato, circunstância em virtude da qual aquele vem a sofrer danos. casos, as prestações eFecruadas entre elas, mesmo que não correspondentes
a obrigações contratuais, são produto de uma vinculação específica ditada
b) Responsabilidade pós-contratual. A responsabilidade pós-contratual pelo princípio da boa fé. Não existe qualquer previsão genérica da respon-
parte da ideia segundo a qual, por vezes, a satisfação do interesse de uma sabilidade civil em situações de relação corrente de negócios, quer no direito
das partes do contrato exige o respeito, pela outra, de determinados deveres privado, quer no direito administrativo; ela pode ser retirada do princípio
não impostos pelo próprio contrato mas decorrentes do princípio da boa da boa fé, na dimensão de tutela da confiança [art. 6. 0 -A, 2, a) CPA]. Não
fé. Não existe qualquer norma que estabeleça a responsabilidade pós-con- obstante, trata-se, provavelmente, da situação de terceira via da responsa-
tratual no direito português, embora seja por vezes invocado o art. 339.° bilidade civil de mais difícil justificação.
CC; no direito administrativo, pode fundar-se directamente no princípio
da boa fé, na sua dimensão de tutela da confiança [art. 6. o_A, 2, a) CPA; Tendo em conta a formalização da contratação administrativa, as situações de responsabi-
lidade civil emergente de relações correntes de negócios não serão de verificação frequente no
supra, I, 10-33 ss.]. direito administrativo. Pode, no entanto, pensar-se na situação em que a administração presta
uma informação errada, não emergente de qualquer dever contratual e da qual vêem a resultar
Exemplos de responsabilidade pós-contrawal: após a extinção de um contrato, a adminis- danos, a um contratante com quem tem diversos contratos em execução.
tração dá a conhecer a terceiros o teor de documentos e informações confidenciais fornecidos
pelo seu contratante particular, provocando-lhe prejuízos.
Existindo uma lacuna de regulação legal das situações de terceira via da
responsabilidade civil, o seu regime jurídico terá que ser obtido caso a caso
c) Contrato com eficdcia de protecção para terceiros. Um contrato terá
pela aplicação das normas relativas à responsabilidade contratual ou extra-
eficácia de protecção para terceitos quando os deveres nele estabelecidos
contratual que se mostrem funcionalmente mais adequadas. Em princípio,
visem a tutela de pessoas que não sejam partes no contrato; nestes casos,
ser-lhes-á principalmente aplicável o regime específico da responsabilidade
considera-se justificada a inclusão do terceiro na esfera de protecção do
contratual, designadamente quanto à presunção de culpa (art. 799.° CC,
contrato. Alguns contratos administrativos, como as concessões de serviço
ex vi art. 325.°, 4 CCP) e à responsabilidade pelos actos dos auxiliares (art.
público ou de obras públicas, são muito facilmente qualificáveis como
800.° CC, ex vi art. 325.°,4 CCP); contudo, o art. 227,°, 2 CC manda
contratos com eficácia de protecção para terceiros, na medida em que con-
aplicar à responsabilidade pré-contratual o regime de prescrição da respon-
têm disposições expressamente destinadas a salvaguardar a posição de pes- sabilidade delitual.
soas estranhas ao círculo contratual.

Exemplos de responsabilidade emergente de contratos com eficácia de protecção para


terceiros: em cumprimento de um contrato administrativo, a administração entrega ao con- 10. Responsabilidade civil por acto de gestão pública: a indemnização
tratante particular determinado maquinismo, cujo mau funcionamento vem a provocar danos
a um empregado daquele ou de um subcomratante; um cão introduz-se numa auto-estrada Quem esteja obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação
concessionada, daí resultando danos num veículo que ali circulava. Situações do tipo desta
que existiria se não tivesse ocorrido o evento que obriga à reparação (art.
última têm-se suscitado nos tribunais judiciais a propósito da responsabilidade dos concessio-
nários, com soluções divergentes [v. os acórdãos comentados por J. Sinde Monteiro na RLJ 3.°, 1 RRCEC). Esta concepção da obrigação de indemnização traduz uma
133 (2000), 17 e ainda os Acs. TRC 281572002, CJ 27-3 (2002), 22; 111012002, CJ 27·4 concepção real do dano e expressa uma preferência pela reparação natural
(2002), 15J.
ou específica do dano sobre a sua reparação estritamente pecuniária:
a indemnização só é fixada em dinheiro quando a reconstituição natural
não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente pagamentos por parte da administração (art. 326.° CCP) e da regra da
onerosa (art. 3.°, 2 RRCEC). Apesar da inclusão desta norma no regime da dedução do montante da indemnização devida por responsabilidade do
responsabilidade extracontratual, parece tratar-se de um princípio geral co-contratante das quantias devidas nos casos de resolução sancionatória
da responsabilidade civil administrativa, aliás em coerência com a respon- (art. 333.°, 3 CCP).
sabilidade civil do direito privado (art. 562.° CC) e justificado pela abso-
luta identidade de fundamentos de ambas.
5e não houver elementos suficientes para a fixação do montante da 11. Responsabilidade civil por acto de gestão privada
indemnização, o tribunal pode remetê-Ia para execução de sentença, sem
prejulw de condenação imediata na parte que já seja líquida (art. 661.°, 2 a) Responsabilidade extracontratual delitual, pelo risco e pelo sacriflcio
CPc. ex vi art. 1.°, I CPTA).
O art. 5.° RRCEC manda aplicar à prescrição do direito à indemnização A responsabilidade extracontratual da administração por acto de gestão
emergente de responsabilidade extracontratual o regime do art. 498.° Cc. privada está prevista no art. 50 I. ° CC; este remete a responsabilidade civil
Assim, o direito à indemnização prescreve no praw de três anos a contar da do Estado e das demais pessoas colectivas administrativas pelos acros pra-
data em que o lesado dele teve conhecimento ou de vinte anos a contar do ticados pelos seus titulares de órgãos, agentes ou representantes para o
facto danoso (art. 498.°, I CC); a possibilidade de regresso prescreve no regime da responsabilidade do comitente (i. e, aquele que encarrega alguém
praw de três anos a contar do cumprimento do dever de indemnizar (art. de qualquer actuação) pelos actos praticados pelo comissário (i. e, aquele
498.°, 2 CC); se o fucto danoso constituir crime para o qual a lei estabeleça que é encarregado de qualquer actuação por um comitente). Este regime
praw de prescrição mais longo, é este o aplicável (art. 498.°,3 CC). Como I consta do art. 500.° Cc. A doutrina identifica geralmente como pressupos-
o art. 5.° RRCEC respeita a todas as modalidades de responsabilidade civil I tos da responsabilidade do comitente (e, logo, da responsabilidade extra-
extracontratuallegalmente reguladas, este regime aplica-se também à respon- contratual das pessoas colectivas administrativas) a existência de uma rela-
sabilidade pelo risco e por facto lícito. O direito à indemnização emergente 1 ção de comissão, o exercício da função cometida e a responsabilidade do
de responsabilidade contratual prescreve no praw em que prescreveria o comissário (art. 500.°, I, 2 CC). Contudo, utilizando os conceitos e a
direito à prestação incumprida, solução vigente em geral no direito civil e terminologia próprios do direito administrativo, os dois primeiros aspectos
aplicável no âmbito administrativo por remissão do art. 325.°, 4 CCP. Não reconduzem-se à noção de facro funcional: só há responsabilidade adminis-
é claro qual o praw de prescrição do direito à indemnização emergente de trativa emergente de factos praticados por titulares de órgãos, agentes ou
situações de terceira via da responsabilidade civil, mas o art. 227.°, 2 CC representantes da administração pública, no exercício das suas funções e
manda aplicar à responsabilidade pré-contratual o regime de prescrição da por causa desse exercício (tal como sucede na responsabilidade delitual por
responsabilidade delitual. A prescrição suspende-se e interrompe-se nos casos acto de gestão pública: supra); não se trata, portanto, de pressupostos espe-
e nos termos previstos na lei civil (art. 5.° RRCEC), interrompendo-se nome- cíficos da responsabilidade administrativa por acto de gestão privada, mas
adamente com a impugnação de actos lesivos (art. 41.°,3 CPTA). Embora de um pressuposto de toda e qualquer responsabilidade administrativa.
tal não decorra do art. 5.° RRCEC, parece dever aplicar-se à responsabilidade O único pressuposto propriamente dito da responsabilidade adminis-
civil administrativa o art. 311.°, I CC, nos termos do qual, uma vez transi- trativa por acto de gestão privada é, assim, a responsabilidade do titular de
tada em julgado a sentença que reconheça o direito à indemnização, passa a órgão, agente ou representante (art. 500.°, I, parte final, CC). A verifica-
aplicar-se em qualquer caso o praw geral de prescrição. ção deste pressuposto depende necessariamente da averiguação dos pressu-
O CCP inclui algumas disposições específicas da indemnização na res- postos da responsabilidade do próprio titular de órgão, agente ou represen-
ponsabilidade contratual. É o caso do regime da mora por atrasos nos tante; o regime desta, por sua vez, segue integralmente e sem qualquer
especialidade o regime da responsabilidade civil extracontratual (ares. da responsabilidade civil administrativa por acto de gesrão pública: são
483.°-510.° CC). mais amplas as presunções de culpa (arts. 491.°-493.° CC), o direito de
A doutrina civilista divide-se quanto à questão de saber se o art. 500.° regresso existe em todos os casos de responsabilidade delitual e não apenas
CC comporta a responsabilidade do comitente quando a imputação ao em casos de dolo e negligência grave; a responsabilidade pelo risco é excep-
comissário não seja a título de responsabilidade delitual; independente- cional e não geral (art. 499.° CC), embora contemple algumas situações
mente da resposta a esta questão no direito privado, o regime do art. 500.° não abrangidas pelo art. 11.° RRCEC (arrs. 502.°, 503.°, 509.° CC), e são
CC, na medida em que se aplique à responsabilidade administrativa, tem impostos limites à indemnização dos danos (arrs. 508.°, 510.° CC).
que ser interpretado conforme ao art. 22.° CRP, permitindo assim a res- A responsabilidade delitual e a responsabilidade por danos causados em
ponsabilização da adminisrração quando sobre o titular de órgão, agente estado de necessidade rêm regimes praticamente idênticos quanto aos seus
ou representante recaia um dever de indemnizar a qualquer título, ainda pressupostos. No entanto, à luz do art. 1.°, 2 RRCEC, não é hoje claro que
que não de responsabilidade delitual. Assim sendo, os arts. 50 l. ° e 500.° a dicotomia entre responsabilidade por acto de gestão pública e por acto de
CC estabelecem indirectamente a responsabilidade delitual, pelo risco e gestão privada subsista no âmbito da responsabilidade civil extracontratual
por facto lícito das pessoas colectivas administrativas por acto de gestão (supra).
privada, na medida em que sejam aqueles os títulos do dever de indemnizar
que recai sobre os seus titulares de órgãos, agentes e representantes (é, con- b) Responsabilidade contratual e terceira via da responsabilidade civil
tudo, difícil configurar situações de responsabilidade administrativa por
facto lícito de gestão privada). A responsabilidade civil contratual por acro de gestão privada da admi-
nistração pública segue integralmente o regime previsto no CC (arrs.
A doutrina priv3tista considera geralmente a responsabilidade do comitente. e com ela a 798.°-800.° CC); o mesmo se aplica às situações de tetceira via da respon-
responsabilidade da administração por acro de gestão privada, como uma responsabilidade pelo
sabilidade civil (em termos substancialmente idênticos aos vigentes em
risco. na medida em que é independente de culpa (ano 500.°, 1 CC). Esta qualificação faz senti~
do quando o comitente seja uma pessoa singular. mas não quando seja uma pessoa coleaiva matéria de responsabilidade civil por acto de gestão pública e com as mes-
adminisrraciva. na medida em que a culpa do titular de órgão. agente ou representante (<<comis· mas dúvidas dourrinais nesra maréria: supra).
sário») é automaticamente imputada à pessoa colectiva oomo simples efeito do carácter funcional
do ac[O praticado (é este o pressuposto subjacente ao regime dos am. 7.° e 8.° RRCEC). Nessa Bibliografia. Em geral sob.. a responsabilidade civil enracontratual (gestão pública),
medida, o art. 500.°,3 CC tem que ser interpretado com cautela, na medida em de implica um D. Freitas do Amaral, A rtsponsabiliJam da administração no direito portugub, Lisboa, 1973;
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não poderá ter lugar no caso de o comitente ser uma pessoa colectiva administrativa. prazo de prescrição do direito à indemnização», CJA 12 (I998), 31; C. A. Fernandes Cadilha.
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virtude dos arts. 501.° e 500.° CC goza de direito de regresso integral con- constitucional português e o estado de necessidade: poderes e limites da actuação da adminis-
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danoso (art. 500.°,3 CC); no entanto, apesar da amplitude do texto nor- Hidra de lema?». eJA 41 (2003).3; J. M. Sérvulo Correia, "A efectivação processual da res-
ponsabilidade civil extra-contratual da administração por acros de gestão pública», in La m-;
mativo, não parece aceitável a admissibilidade do direito de regresso em ponsabi/id,ad patrimonial tk los potkres publicos, Madrid. 1999.267: M. G. Dias Garcia. A res-
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I
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tive~,. in &cu~i: d'liU&s en Ho"'.mage à Charles Einsenmann, Paris. 1977. 233. Sobre a respon-
moniais privados e aspectos gerais
sabilidade avil por facto licito (gestão pública), J. J. Gomes Canotilho, O problema da
mponsabilidtuk civil do Estado por aetos IIcitor, Coimbra, 1974; M. ). Rangel de Mesquita,
«O fio da navalha: (ir)responsabilidade da administração por facto lícito», CJA 46 (2004), 41: Na esfera da administração pública em sentido material é inevitável a
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Quadros (org.). &sponsabilidar.k civil nctracontratual da administração pública. Coimbra,
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sendo que, frequentemente, os segundos devem ceder perante os primeiros.
prudence administrative», in Recueil d'études en Hommage à Charles Eimenmann. Paris, 1977, Isto significa que os direitos privados, em particular aqueles que têm carác-
233. Sobre a responsabilidade civil por não reconstituição legítima da situação actua1 ter patrimonial, podem ser restringidos ou mesmo extintos por decisões
hipot~ca, M. Aroso de Almeida. Anulação tk actos administrativos e rr/ações jurldicas emergen-
administrativas legítimas. Todavia, como consequência do princípio do
tes, COImbra, 2002, 771-831. Sobre a .erceira via da responaabilidade civil (gestão públi-
ca), M. Rebelo de Sousa. «Responsabilidade pré-contratual. Vertentes privatfstica e publicísti- Estado de direito e da sua decorrência do respeito pelas posições jurídicas
ca», 00 125 (19931 IH-IV), 383; S. Littbarski. «Die Haftung aus culpa in contrahendo im subjectivas dos particulares, a administração é obrigada a reparar os prejuí-
õ~endichen Recht" JuS (1979), 573. Sobre a responsabilidade civil por acto de gestão zos provocados pela sua actividade, ainda que juridicamente conforme, à
pnvada, A. Menez.es Cordeiro, Direito das obrigações, Lisboa, 11. 1980,257-432; L. Menezes
Leitão, Direito das obrigações. I, Coimbra, 42005, 349; F. Pires de Limai). M. Antunes Varela,
esfera patrimonial das pessoas. Ou seja, a afectação legítima de direitos
Código Civil anotado, I, Coimbra, 41987. sub arts. 500.°-501.0, 507-511; A. Vaz Serra. «Res- patrimoniais privados pela administração faz nascer na esfera dos particula-
ponsabilidade civil do Estado e dos seus órgãos ou agentes», BMJ 85 (1959), 476; idem, res em causa uma pretensão ao ressarcimento dos prejuízos provocados.
,Anotação" RLJ 103 (1971), 331; idem, «Anotação" RLJ 110 (1978), 308; J. M. Antunes
Varela, Das obrigações em geral, I. 1112000, 646-651. Em geral, sobre a responsabilidade civil
no. direito privado, E M. Pereira Coelho, O fUXO de causalidar.k na responsabilidade civil,
COImbra. 1951: A. Menezes Cordeiro, Direito das obrigações, Lisboa. 11, 1980. 257-432; idem, 2. Pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais
Da responsabilidat:k civil dos administradom das sociedades comerciais, Lisboa. 1997; M. Carnei- privados e responsabilidade civil
ro ~~ Frada: ~ontr~to e tkveres tk profecção. Coimbra. 1994; idem, Teoria da confiança e respon-
sab,bdade ctvll. COimbra, 200 I; H.-E. Hõrster, «Esboço esquemático da responsabilidade civil
de acordo com as regras do Código Civil», in Estudos em comemoração do dtcimo aniversdrio da Tradicionalmente, e ainda actualmente para a maior parte da doutrina,
licenciatura em dirrito da Universidtuk do Minho, Coimbra, 2004, 323; F. Pessoa Jorge, Ensaio as pretensões indemnizatórias emergentes pelo sacrifício de direitos patri-
sobre or prrsmpostos da rrsponsabilidade civil. 1968 (reimp. 1995); L. Menezes Leitão, Dirrito moniais privados são tratadas pela doutrina no capítulo da responsabili-
das obrigará", Coimbra, I, 42005, 267-382, 11, '2003, 243-281; F. Pires de LimalJ. M. Antu-
nes Varela, Código Civi/anotado, Coimbra, I, 41987, s~b arts. 483.°-510.°, 470-526, 11, 11986,
dade civil por facto lícito: o art. 16. 0 RRCEC inclui, em sede de responsa-
sub arts. 798.°-808. 0 , 54-72:). F. Sinde Monteiro. Responsabilidat:k por conselhos. recomendações bilidade civil administrativa por facto lícito, o dever administrativo de
e inf!rmações. Coimbra, 1989; M. Gomes da Silva, O dever de prestar e o her de indemnizar, indemnizar os particulares a quem, por razões de interesse público, impo-
I. Lisboa, 1944; J. M. Antunes Varela, Das obrigações em geral, I. 1°2000. 518-717.
nham encargos ou causem danos especiais ou anormais (supra), previsão
cujo texto é suficientemente amplo para abranger as lesões de bens, quer
pessoais, quer patrimoniais. A história da disposição, que tem origem no
pensamento de M. Caetano parece confirmar esse entendimento: a partir
de 1950, na ausência de normas gerais sobre a matéria, aquele autor defen-
deu a existência de um princípio geral de responsabilidade administrativa
por facto lícito com base no art. 2397. 0 do Código Civil então vigente, que
consagrava precisamente o dever de indemnização em caso de expropriação cedidos do pagamento de uma justa indemnização (sobre as noções de
(supra). Em 1998, sob influência do direito alemão, a autonomização das expropriação e requisição, supra, 19-65). E é precisamente este mecanismo
pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados que escapa totalmente aos quadros da responsabilidade civil, ainda que por
foi pela primeira vez expressamente defendida na doutrina nacional por fàcto lícito: na responsabilidade civil a indemnização é uma consequência
M. L. Amaral (Respomabilidade do Estada e dever de indemnizar do legisla- dos actos danosos e no art. 62.°, 2 CRP é um verdadeiro requisito de lega-
dor, esp. 414-423,561-581), embora o problema já tivesse sido analisado lidade daqueles actos.
anteriormente em abstracção dos quadros da responsabilidade civil admi- A interpretação jurisprudencial e doutrinai do art. 62.° CRP, não sem
nistrativa por fàcto lícito (E de Quadros, A protecção da propriedade privada algum paralelo com a evolução verificada no direito comparado, no direito
pelo direito internacional público, esp. 187-366). internacional público e no direito comunitário, foi mesmo mais longe do
A doutrina tradicional não é sustentável (e, provavelmente, nunca o foi) que o seu texto: por um lado, os conceitos de requisição e expropriação
no direito português. Com efeito, o tratamento das pretensões indemniza- passaram a ser entendidos num sentido material que não abrange apenas
tórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados em sede de respon- os tipos de actos jurídico-públicos com essas designações mas quaisquer
sabilidade civil por facto lícito não tem qualquer fundamento teórico: actoS ablativos análogos, ainda que não administrativos, de alcance similar;
a afectação lícita e normal de posições jurídicas subjectivas alheias, mediante por outro lado, o conceito de propriedade privada passou a ser entendido
actos imperativos, não ocorre paradigmaticamente no direito privado, pelo num sentido amplo que inclui não apenas o direito de propriedade regu-
que os quadros gerais do instituto da responsabilidade civil, nele forjados, lado no CC como outros direitos de natureza real (usufruto, servidão) e
não estão vocacionados para o seu enquadramento. E também não tem mesmo direitos patrimoniais de carácter creditício, como os emergentes de
qualquer fundamento histórico: enquanto a responsabilidade civil do contratos (direitos pessoais de gozo, como o arrendamento, e puros direitos
Estado por actos de autoridade foi consistentemente negada durante todo de crédito).
o século XIX e durante parte do século xx (supra), o dever de indemnizar Desta evolução resultou a subordinação a um regime comum das pre-
por expropriações da propriedade privada é aceite e mesmo enfaticamente tensões indemnizatórias pelo sacrifício de todo e qualquer direito patrimo-
proclamado nos Estados europeus continentais desde a Revolução Fran- nial privado, situado à margem da lógica do art. 16.° RRCEC (aliás, sob
cesa; o art. 17.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do pena de inconstitucionalidade parcial deste, na medida em que o art. 62.°,
Cidadão (J 789), que ignorava a responsabilidade civil administrativa, esta- 2 CRP não exige a demonstração do carácter especial e anormal dos prejuí-
belecia que o sacrifício excepcional do «inviolável e sagrado» direito de zos provocados como condição da sua ressarcibilidade), que assim vê o seu
propriedade pelos poderes públicos só poderia fazer-se mediante «uma campo de aplicação restringido à responsabilidade civil pelo sacrifício de
justa e prévia indemnização». É desta norma que derivam em linha recta bens pessoais (supra).
disposições constitucionais contemporãneas como a do art. 62.°, 2 CRP
- dispositivo que, significativamente, foi autonomizado da previsão geral
da responsabilidade civil administrativa no art. 22.° CRP. 3. Fundamento das pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direi-
O art. 62.°, 2 CRP, relativo ao direito de propriedade privada, é actual- tos patrimoniais privados
mente a disposição-chave nesta matéria na ordem jurídica portuguesa.
Segundo este preceito, a requisição e a expropriação por utilidade pública As pretensões indemnizatórias pelo sacrifício de direitos patrimoniais
só podem ser efectuadas com base na lei e mediante o pagamento de justa privados têm a mesma função que a responsabilidade civil por facto lícito
indemnização: ou seja, para a Constituição, os actos de expropriação e e apresentam-se com uma acentuada afinidade estrutural em relação a este
requisição só são juridicamente conformes se forem acompanhados ou ante- instituto. Assim, se o seu fundamento imediato é o art. 62.°, 2 CRP, o seu
i
fundamento último enContra .
d os encargo 'bl' ( -se também no princípio da justa distribuição b) Conformidade jurldica do focto voluntdrio. Para haver lugar a uma
s pu ICOS supra).
pretensão indemnizatória pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados
o acto em que se traduz aquele sacrifício tem que ser conforme ao direito;
4. Fontes das pretensões esta conformidade não pode decorrer de justificação por estado de necessi-
indemnizatórias pelo sacrifício de direitos
patrimoniais privados dade, circunstância em que se recai no art. 16.° RRCEC. Tratando-se de
um acto ilegal, para além de ser possível a exigência da sua remoção, a
Em virtude da interpretaç d I pretensão reintegratória do particular lesado é a responsabilidade civil dei i-
( ) as pretensoes _. ao up amente extensiva do art. 62.°, 2 CRP
supra, Indemniza ' . lUa! (supra).
.. . d d tonas pelo sacrifício de direitos patrimo-
maIs priva os po em emer ir d c) Dano. Só a diminuição ou a supressão de vantagens patrimoniais
C E) ou d e actos anáIogos como g e actos de expropriação (arts. 1.°,23.°-32.°
.. _ podem ser considerados danos para efeitos desta pretensão reintegratória.
ção de servidões (art. 8.0 ~E a requl~lçao (art. 80.°, 1 CE), a constilUi- Ao contrário do que sucede na responsabilidade ci';'il por sacrifício de bens
do Decreto-L' ° 794/ 6 ), a ocupaçao temporária de imóveis (art. 54. ° pessoais, não se exige o carácter especial e anormal do dano (art. 16.°
eln. 7 d e 5d N b
de rescisão e modifi _ :1 e ovem ro; art. 18.°, 4 CE), os actos RRCEC).
lcaçao unI ateral d d .. .
312 o 1 CCP) . e Contratos a mmlstratIvos(arts. 293.°,
." . os Instrumentos d - ....
c_ 'd I' e gestao ternrorlal (ms!l!uto geralmente Para além disw, normas especiais delimitam os danos ressardveis em termos bastante dís-
rel~n o, com a guma Impro ri d d . .
ares. 143 ° 112 ° 6 RJIGT P ~ a e, como «mdemmzação pelos planos»: pares. consoante o alcance assumido pela função ressarcitória deste instituto: assim, os danos
. , . , ) a Im . - d d ressarcíveis são, em caso de expropriação (e também de constituição de servidões e de ocupação
d d Ib - I ' POSlçaO e me idas preventivas no qua-
ro a e a oraçao, a teração o . _ temporária de terrenos para operações de realojamemo: art. 8.°,2 CE, art. 54.°, 2 do Decre-
. ,. ( u revlsao de planos municipais de ordena-
ment o d o ternrorlO arts 112 ° 6 to-Lei n.O 794/76. de 5 de Novembro), «o prejuízo que para o expropriado advém da expro-
condutas le . d d .'. " , 116.°, 2 RJIGT), bem como outras priação. correspondente ao valor real e corrente do bem de acordo com o seu destino efectivo
gals a a mInIstra - . c .
, "aI çao cUJos erellos sobre direitos alheios de ou possível numa utilização económica normal, à data da publicação da declaração de utilida-
caracter patrlmOnI sejam si '1 de pública. tendo em consideração as circunstâncias e condições de faCto existentes naquela
. d 'I ml ares aos dos actos indicados (sobre o con-
ceito e actos ana ogos à ex ro . _ data» (art. 23.°. 1 CE) e «os prejuízos directa e necessariamente resultantes de o bem ter estado
. J _J . J _ l P pnaçao, F. de Quadros, A protecção da pro- sujeito a expropriação (art. 4.°, 6 CE), do que resulta a exclusão da ressarcibilidade dos lucros
Przeuaae przvaua pe o dire't . .
, o tnternaclOnal público, esp. 205-220). cessantes, salvo se as obras não tiverem início dentro do prazo estabelecido (art. 19.°,4 CE);
em (:3$0 de requisição, «o capitaj empregue para a construção ou aquisição e manutenção dos
bens requisitados e o seu normal rendimento, a depreciação derivada do respectivo uso e, bem
5. Pressupostos das pretens- . d . . assim, o lucro médio que o particular deixa de perceber por virtude de requisição» (art. 84.°,
. .. oes In emnlzatÓrlas pelo sacrifício de direi- 3 CE); em caso de ocupação temporária de prédios vizinhos de prédios expropriados. oS mes-
tos patrImonIaIs privados
mos danos ressardveis nos termos gerais do direito da responsabilidade civil (art. 18.°,4 CE);
em caso de indemnização por instrumentos de gestão territorial vinculativos dos particulares,
Em virtude das semelhan s ~ . . as «restrições singulares às possibilidades objectivas de aproveitamento do solo, preexistentes e
pon sab I'l'd d "1 ça unClonals e estruturais em relação à res- juridicamente consolidadas, que comportem uma restrição significativa na sua utilização de
I a e CIVI por facto ]( .
nizatórias pelo 'fi!' d .Clto, os pressupostos das pretensões indem- efeitos equivalentes a uma expropriação» (art. 143.°,2 RJIGT) e, nas revisões de instrumentos
sacCl CIO e dl relt '. . de gestão territorial. apenas quando a revisão ocorra dentro dos cinco anos subsequentes à sua
funda I '. os patrImonIaIs privados são, portanto,
menta mente cOlncldent entrada em vigor e determine a caducidade ou a alteração das condições de um licenciamento
es com os daquele instituto
a) Facto voluntdrio. O fàcto vol ' . . prévio válido (art. 143.°,2 RJIGT), não sendo em caso algum ressarcfveis os danos passíveis
(nos casos d a req ulslção
..
da mod' fi
Untarlo pode ser um acto administrativo
_ de compensação mediante distribuição perequativa dos benefícios e encargos decorrentes dos
to d " . )' I Icaçao e da rescisão unilateral de contra- instrumentos em causa (art. 143.°, 1 RJIGT); em caso de imposição de medidas preventivas,
s a ffilfllstratlVOS Ou um re uI os mesmos danos que dão origem a indemnização por instrumentos de gestão territorial
g amento (no caso dos inSlrumencos de
gestão territorial). vinculativos dos particulares, designadamente a restrição ou supressão substancial de díreitos
de uso do solo preexistentes e juridicamente consolidados. designadamente mediante licença
ou autorização [are 116.°, 2, b) RjIGTJ e. quando tais medidas sejam impostas dentro apenas obrigada a fazer um depósito da quantia em que se estima que tal
do prazo de quatro anos após a caducidade das medidas anteriores, o prejuízo efectivo provo_
indemnização venha a ser fixada [arts. 19.°,20.°,1, b) CE].
cado às pessoas afectadas por aquelas em virtude de terem estado provisoriamente impedidas
de utilizar o seu solo para a finalidade para ele admilida (art. 112. 0 ,6,7 RJIGT); em caso de A exigência de contemporaneidade da indemnização em relação ao
modificação unilateral de contratos administrativos, o desequilíbrio financeiro do COnlrato dano implica três consequências. Primeira, antes do pagamento de indem-
[art. 180.0 , a) CPAJ; em caso de rescisão unilateral de contratos administrativos, aparente_ nização não pode em circunstância alguma ser permitida a extinção, mas
mente, os mesmos prejuízos passíveis de ressarcimento em sede de responsabilidade civil.
apenas a restrição, do direito patrimonial a sacrificar. Segunda, o paga-
mento da indemnização tem, em regra, que ser anterior à produção do
d) Nexo de causalidade. A exigência de nexo de causalidade entre o facto
dano ou simultâneo em relação a ela; por aplicação do princípio da propor-
lícito e o dano retira-se implicitamente de todas as disposições citadas a
cionalidade, na sua dimensão de necessidade, tal só poderá não acontecer
propósito do dano ressarcível. Por vezes, a exclusão expressa da ressarcibili-
quando o diferimento da quantificação da indemnização para depois da
dade de alguns danos tem implícita a inexistência de nexo de causalidade
produção do dano seja estritamente necessário para á prossecução do in te-
[assim, na expropriação não são ressardveis os danos relativos a benfeitorias
resse público em causa. Terceira, no caso de a indemnização não ser paga
úteis ou voluptuárias posteriores à notificação da decisão de expropriar, até à produção do dano, pelo menos o procedimento para a sua quantifi-
porque aqueles não são imputáveis em termos causais ao acto expropriató- cação tem que ser iniciado até àquele momento [assim, a resolução de
rio: art. 23.°, 2, c) CE]. A averiguação do nexo de causalidade não apre- expropriar deve logo conter uma previsão dos encargos a suportar com a
senta especificidades em relação à responsabilidade civil (supra). exptopriação, baseada na avaliação prévia do bem objecto da expropriação:
art. 10.°, 1, c), 4 CE)].
Se a indemnização não for contemporânea da produção do dano, no
6. A indemnização pelo sacrifício de direitos patrimoniais privados sentido referido, o acto danoso é ilegal, pelo que a reintegração da esfera
jurídica lesada se fará através da responsabilidade extracontratual delitual
a) A exigência de uma indemnização contemporânea do sacrificio (supra).

Ao contrário do que sucede na responsabilidade civil, a indemnização b) A exigência de uma indemnização justa
por sacrifício de direitos patrimoniais privados tem que ser contemporânea
desse sacrifício, como se depreende da determinação constitucional de que o art. 62.°, 2 CRP exige que a indemnização tenha um carácter justo,
este se faça mediante justa indemnização (art. 62.°, 2 CRP; supra). A exi- o que parece conter uma remissão para o princípio da justiça (art. 266.°,
gência de contemporaneidade da indemnização em relação ao dano é 2 CRP). Contudo, o alcance da disposição constitucional não pode ser
expressamente reiterada por algumas disposições legais, como sucede em esse, na medida em que a densidade do princípio da justiça enquanto
matéria de expropriações (art. 1.0 CE). A exigência do carácter contempo- limite da margem de livre decisão administrativa é tão reduzido (supra, I,
râneo da indemnização tem, no entanto, que ser entendida com alguma 10-42) que, na prática, tal equivaleria a um largo campo de incontrolabí-
cautela, pois pode suceder que o interesse público imponha a efectivação lidade jurisdicional da actividade administrativa e, em consequência, aO
do sacrifício do direito num praw em que não é possível concluir as ope- esvaziamento da garantia constitucional da propriedade privada. Assim, a
rações de quantificação do dano, por aquelas serem particularmente com- referência à justiça da indemnização deve entender-se, pura e simples-
plexas ou controvertidas. Isto passa-se por vezes em casos de expropriação, mente, como uma exigência de que a indemnização reintegre a esfera
nos quais a prática de actos ablativos do direito sobre o bem expropriado jur{dica do lesado em toda a medida dos danos patrimoniais sofridos e
podem anteceder a fixação da indemnização; neste caso a administraçãO é imPUtáveis ao acto danoso (como, a propósito da expropriação e da requi-
sição, em concretização da disposição constitucional, confirmam os arts. o bem a expropriar após depósito do montante previsível da indemnização
23.°, 1,84.°,2 CE). a suportar [arts. 19.°, 20.°, 1, b) CE]. Estas normas devem aplicar-se à
Se a indemnização administrativamente fixada não for justa, no sentido constituição de servidões (art. 8.°, 3 CE). O regime é diferente na genera-
referido, o acto danoso é ilegal, pelo que a reintegração da esfera jurídica lidade das outras situações, como sucede no caso paradigmático da requi-
lesada se fará através da responsabilidade extracontratual delitual (supra). sição, em que o montante da indemnização é fixado unilateralmente pela
administração [art. 84.°, 4, b) CE].
c) O conteúdo da indemnização pelo sacriftcio de direitos patrimoniais
privados Bibliografia. Sobre as pretensões indemnizatórias pelo sacrific::io de direitos patrimo-
niais privados, além das obras acima referidas a propósito da responsabilidade civil por facto
lícito, F. AJves Correia, As garantias do particular na expropriarão por utilidade pública, Coim-
Em regra, a indemnização pelo sacrifício de direitos patrimoniais priva- bra, 1982; *M. L. Abrantes Amaral Pinto Correia, Responsabilidade do Estado e dever de indem-
dos é paga em dinheiro (assim, para a expropriação, art. 67.°, 1 CE); desde nizardo legislador, Coimbra, 1998, esp. 411-467, 517-631; R. Medeiros, Ensaio sobre a respon-
sabilidade civil do Estado por actos legislativos, Coimbra, 1992, esp. 235-331; F. P. Oliveira,
logo, a reintegração específica do dano seria impossível em virtude do
«Medidas preventivas de planos urbanísticos e indemnização», CEDOUA 1 (1998), 53: F. de
carácter lícito do acto danoso da administração. Todavia, não está excluída Quadros, «Expropriação por utilidade pública», DJAP IV (1991), 306; A protecrão da proprie-
a possibilidade do seu pagamento em espécie: na expropriação amigável, a dade privada pelo direito internacional público. Coimbra, 1998, esp. 187-366; J. Miranda,
entidade expropriante, o expropriado e os demais interessados podem acor- «Apreciação da dissertação de doutoramento da mestra Maria Luísa da Conceição Duarte»,
RFDUL (I998), 399; R. Medeiros. Ensaio sobre a responsabilidade civil do EstadD por actos
dar no pagamento da indemnização através da cedência de bens ou direitos
kgislativos, 235-354.
(arts. 67.°, 2, 69.° CE); a reposição do equilíbrio financeiro na sequência
da modificação unilateral de contratos administrativos pode consistir na
atribuição de novos créditos contratuais à contraparte, desde que essa nisso
acorde. A legislação relativa à expropriação contém regras particularmente
complexas de cálculo da indemnização (arts. 23.°-32.° CE).

7. As garantias jurisdicionais preventivas de legitimidade do sacrifício


de direiros patrimoniais privados no caso da expropriação em sentido
estrito

Tendo em conta o ditame do art. 62.°,.2 CRP, a legislação relativa à


expropriação adoptou cautelas particulares para garantir o carácter contem-
porâneo e justo da indemnização: assim, ou a expropriação é amigável,
havendo acordo entre a administração e o particular acerca da indemniza-
ção [arts. 34.°, a)-e), 37.°, 2 CE], ou então, em caso de expropriação liti-
giosa, a adjudicação da propriedade só opera mediante decisão de um tri-
bunal posterior à fixação do montante da indemnização a pagar e ao
depósito desse montante pela administração (art. 51.°, 1, 5 CE); do mesmo
modo, só é admitida a prática de actos materiais restritivos do direito sobre
Anexo
LEI N.o 67/2007. DE 31 DE DEZEMBRO
Aprova o regime da responsabilidade civil extracontratual
do Estado e demais entidades públicas
Lei n.O 67/2007
de 31 de Dezembro
Aprova o regime da responsabilidade civil extracontratuaJ do Estado
e demais entidades públicas

A Assembleia da República decreta, nos termos da alínea c) do artigo 161.° da Constitui-


ção. o seguinte:

Artigo l,tI
ApI"OV8fÕO
É aprovado o Regime da Responsabilidade Civil Extracomratual do Estado e Demais Emida-
des Públicas, que se publica em anexo à presente lei e que dela faz parte imegrame.

Artigo 2.°
Regimes especiais
- O disposto na presente lei salvaguarda os regimes especiais de responsabilidade civil por
danos decorrentes do exercício da função administrativa.
2 - A presente lei prevalece sobre qualquer remissão legal para o regime de responsabilidade
civil extracontratual de direito privado aplicável a pessoas coleçtivas de direito público.

Artigo 3.°
Pagamento de indemnizaçóes
1 - Quando haja lugar ao pagamento de indemnizações devidas por pessoas colectivas perten-
centes à administração indirecta do Estado ou à administração autónoma e a competente
sentença judicial não seja espontaneamente executada no prazo máximo de 30 dias, o crédito
indemnizatório só pode ser satisfeito por conta da dotação orçamental inscrita à ordem do
Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais (CSTAF) a título subsidiário quan-
do. através da aplicação do regime da execução para pagamento de quantia cena regulado na
lei processual civil. não tenha sido possível obter o respectivo pagamento junto da entidade
responsável.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de o interessado solicitar
directamente a compensação do seu crédito com eventuais dívidas que o onerem para com a
mesma pessoa colectiva. nos termos do anigo 170. 0 do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos. sem necessidade de solicitar previamente a satisfação do seu crédito indemni-
zatório através da aplicação do regime da execução para pagamento de quantia certa previsto
na lei processual civil.
3 - Nas situações previstas no n.O 1. caso se mostrem esgotadas as providências de execução para
pagamento de quantia certa previstas na lei processual civil sem que tenha sido possível obter o
respectivo pagamento através da entidade responsável, a secretaria do tribunal notifica imediata-
mente o CSTAF para que emita a ordem de pagamento da indemnização. independentemente
de despacho judicial e de tal ter sido solicitado, a título subsidiário, na petição de execução.
4 - Quando ocorra a satisfação do crédito indemnizatório por via do Orçamento do Estado, ANEXO
nos termos do n. O 1, o Estado goza de direito de regresso, incluindo juros de mora, sobre a REGIME DA RESPONSABILIDADE CML EXTRACONTRATUAL
entidade responsável, a exercer mediante uma das seguintes formas: DO ESTADO E DEMAIS ENTIDADES PÚBLICAS
a) Descamo nas transferências a efectuar para a entidade em causa no Orçamento do
Estado do ano seguinte; CApITULO I
b) Tratando-se de entidade pertencente à Administração indireC(a do Estado, inscrição Disposições gerais
oficiosa no respectivo orçamento privativo pelo órgão tmelar ao qual caiba a aprovação
do orçamento; ou Artigo 1. 0
c) Acção de regresso a intentar no tribunal competente. Âmbito d. aplicação
I - A responsabilidade dvil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direi-
Artigo 4. 0 to público por danos resultantes do exercIcio da função legislativa. jurisdicional e administra_
Sexta alteração ao Estatuto do Ministério Público tiva rege-se pelo disposto na presente lei, em tudo o que não esteja previsto em lei especial.
O artigo 77. 0 do Estatuto do Ministério Público (Lei n. O 47/86, de 15 de Outubro, rectificada 2 - Para os efeitos do disposto no número anterior. correspondem ao exercício da função
no Didrio tÚz República, I.a série, n. O 263, de 14 de Novembro de 1986, e alterada pelas Leis administrativa as acções e omissões adoptadas no exercicio de prerrogativas de poder público
n.~ 2/90. de 20 de Janeiro, 23/92, de 20 de AgOsto, 33 -A/96, de 26 de Agosto, 60/98, de 27 ou reguladas por disposições ou principias de direito administrativo.
de Agosto, e 4212005, de 29 de Agosto), passa a ter a segui me redacção: 3 - Sem prejuízo do disposto em lei especial, a presente lei regula também a responsabilidade
civil dos titulares de órgãos, funcionários e agentes públicos por danos decorrentes de acções
«Artigo 77. 0 ou omissões adoptadas no exerclcio das funções administrativa e jurisdicional e por causa desse
[",J exercido.
Fora dos casos em que a falta constitua crime, a responsabilidade civil apenas pode ser efecti- 4 - As disposições da presente lei são ainda aplicáveis à responsabilidade civil dos demais tra-
vada, mediante acção de regresso do Estado, em caso de dolo ou culpa grave.» .. balhadores ao serviço das entidades abrangidas. considerando-se extensivas a estes as referências
feitas aos titulares de órgãos, funcionários e agentes.
Artigo 5. 0 5 - As disposições que. na presente lei. regulam a responsabilidade das pessoas colectivas de
Norma revogatória direito público, bem como dos titulares dos seus órgãos, funcionários e agentes, por danos
São revogados o Decreto -Lei n. ° 48 051. de 21 de Novembro de 1967. e os artigos 96. 0 e 97. 0 decorrentes do exercIcio da função administrativa. são também aplicáveis à responsabilidade
da Lei n. O 169/99. de 18 de Setembro. na redacção da Lei n. O 5-A/2002. de II de Janeiro. civil de pessoas colectivas de direito privado e respectivos trabalhadores. titulares de órgãos
sociais, representantes legais ou auxiliares, por acções ou omissões que adoptem no exerclcio de
Artigo 6. 0 prerrogativas de poder público ou que sejam reguladas por disposições ou princIpios de direito
Entrada em vigor administrativo.
A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias após a data da sua publicação.
Artigo 2. 0
Aprovada em 18 de Outubro de 2007. Danos ou encargos especiais e anormais
O Presidente da Assembleia da República, Jaim~ Gama. Para os efeitos do disposto na presente lei, consideram-se especiais os danos ou encargos que
Promulgada em 10 de D=mbro de 2007. incidam sobre uma pessoa ou um grupo. sem afectarem a generalidade das pessoas. e anormais
Publique -se. os que. ultrapassando os custos próprios da vida em sociedade, mereçam. pela sua gravidade, a
O Presidenre da República, ANISAL CAVACO SILVA. tutela do direito.
Referendada em 10 de Dezembro de 2007.
O Primeiro-Ministro. Josl Sócrat~s Carvalho Pinto de Sousa. Artigo 3. 0
i:)':; Obrigação de indemnizar
,. ;'.,,' .
I - Quem esteja obrigado a reparar um dano, segundo o disposto na presente lei, deve recon.s-
tituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação.
2 - A indemnização é fIxada em dinheiro quando a reconstituição natural não seja possível.
não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa.
-3 - A responsabilidade prevista na presente lei compreende os danos pauimoniais e não patri-
moniais. bem como os danos já produzidos e os danos futuros, nos termos gerais de direito.
Artigo 4.° Artigo 8.°
Culpa do lesado Responsabilidade solidária em caso de dolo ou culpa grave
Quando o comportamento culposo do lesado tenha concorrido para a produção ou agrava- I - Os titulares de órgãos, funcionários e agentes são responsáveis pelos danos que resultem de
mento dos danos causados, designadameme por não ter utilizado a via processual adequada à acções ou omissões ilfcitas, por eles cometidas com dolo ou com diligência e zelo manifesta-
eliminação do acto jurídico lesivo, cabe ao tribunaJ determinar, com base na gravidade das meme inferiores àqueles a que se encomravarn obrigados em razão do cargo.
culpas de ambas as panes e nas consequências que delas tenham resultado, se a indemnização 2 - O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público são responsáveis de forma soli-
deve ser totalmeme concedida, reduzida ou mesmo exclufda. dária com os respectivos titulares de órgãos, funcionários e agemes, se as acções ou omissões
referidas no número anterior tiverem sido cometidas por estes no exerdcio das suas funções e
Artigo 5.° por causa desse exerdcio.
Prescrição 3 - Sempre que satisfaçam qualquer indemnização nos termos do número anterior. o
O direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado. das demais Estado e as demais pessoas colectivas de direito público gozam de direito de regresso con-
pessoas colectivas de direito público e dos titulares dos respectivos órgãos, funcionários e agen- tra os titulares de órgãos, funcionários ou agentes responsáveis. competindo aos titulares
tes bem como o direito de regresso prescrevem nos termos do anigo 498.° do Código Civil. de poderes de direcção, de supervisão, de superintendência ou de tutela adaptar as provi-
sendo-lhes aplicável o disposto no mesmo Código em matéria de suspensão e imerrupção da dências necessárias à efectivação daquele direito, sem prejuízo do eventual procedimento
prescrição. disciplinar.
4 - Sempre que, nos termos do n.O 2 do anigo 10.°, o Estado ou uma pessoa colectiva de
Artigo 6.° direito público seja condenado em responsabilidade civil fundada no componamento ilícÍlo
Direito de regresso adaptado por um litular de órgão, funcionário ou agente, sem que tenha sido apurado o grau
- O exercício do direito de regresso, nos casos em que este se encontra previsto na preseme de culpa do titular de órgão, funcionário ou ageme envolvido, a respectiva acção judicial pros-
lei. é obrigatório, sem prejuízo do procedimento disciplinar a que haja lugar. segue nos próprios autos. entre a pessoa colectiva de direito público e o titular de órgão, fun-
2 - Para os efeitos do disposto no número anterior, a secretaria do tribunaJ que tenha conde- cionário ou agente, para apuramento do grau de culpa deste e, em função disso, do evemual
nado a pessoa colectiva remete certidão da semença, logo após o trânsito em julgado. à entida- exerdcio do direito de regresso por pane daquela.
de ou às entidades competentes para o exercício do direüo de regresso.
Artigo 9.°
CApITULO II Ilicitude
Responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função administrativa I - Consideram-se jllcitas as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes
que violem disposições ou princípios consrimcionais, legais ou regulamentares ou infrinjam
SECÇÃO I regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa de direitos
Responsabilidade por facto ilícito ou interesses legalmente protegidos.
2 - Também existe ilicitude quando a ofensa de direitos ou interesses legalmente protegidos
Artigo 7.° resulte do funcionamento anormal do serviço, segundo o disposto no n.O 3 do artigo 7.°
Responsabilidade adtuiva do Estado. demais pessoas colectivas d. direito público
I - O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público são exclusivamente responsáveis Artigo 10.°
pelos danos que resultem de acções ou omissões ilícitas. cometidas com culpa leve, pelos titu- Culpa
lares dos seus órgãos. funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por 1 - A culpa dos titulares de órgãos, funcionários e agemes deve ser apreciada pela diligência e
causa desse exercício. aptidão que seja razoável exigir, em função das circunstâncias de cada caso. de um titular de
2 - É concedida indernnizaçao às pessoas lesadas por violação de norma ocorrida no âmbito de órgão. funcionário ou agente zeloso e cumpridor.
procedimento de formação dos contratos referidos no artigo 100.° do Código de Processo nos 2 - Sem prejufzo da demonstração de dolo ou culpa grave, presume-se a existência de culpa
Tribunais Administrativos, nos termos da presente lei. leve na prática de actos jurídicos ilícitos.
3 - O Estado e as demais pessoas colectivas de direito público são ainda responsáveis quando 3 - Para aJém dos demais casos previstos na lei, também se presume a culpa leve, por aplicação
os danos nao tenham resultado do comportamento concreto de um titular de órgão. funcioná- dos princIpias geraís da responsabilidade civil, sempre que tenha havido incumprimento de
rio ou agente determinado, ou não seja possível provar a autoria pessoaJ da acção ou omissão. deveres de vigilância.
mas devam ser atribuídos a um funcionamento anormaJ do serviço. 4 - Quando haja pluralidade de responsáveis, é aplicável o disposto no artigo 497.° do Código
4 - Existe funcionamento anormaJ do serviço quando, atendendo às circunstâncias e a padrões Civil.
médios de resultado, fosse razoavelmente exigível ao serviço uma actuação susceptível de evitar
os danos produzidos.
SECçAO 11 CApITULO IV
Responsabilidade pelo risco Responsabilidade civil por danos decorrentes do exercício da função político-legislativa

Artigo 11,0 Artigo 15. 0


Responsabilidade pelo risco Responsabilidade no exercício da função político-legislativa
I - O Estado e as demais pessoas colecrivas de direito público respondem pelos danos decor- 1 - O Estado e as regiões autónomas são civilmeme responsáveis pelos danos anormais causa-
rentes de actividades. coisas ou serviços administrativos especialmente perigosos, salvo quando, dos aos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos por actos que, no exerdcio da
nos termos gerais, se prove que houve força maior ou concorrência de culpa do lesado, poden- função polCtico-legislativa. pratiquem, em desconformidade com a Constituição, o direito
do o tribunal, neste último caso, tendo em conta todas as circunstâncias. reduzir ou excluir a internacional, o direito comunitário ou acto legislativo de valor reforçado.
indemnização. 2 - A decisão do tribunal que se pronuncie sobre a inconstitucionalidade ou ilegalidade de
2 - Quando um facto culposo de terceiro tenha concorrido para a produção ou agravamento norma jurídica ou sobre a sua desconformidade com convenção internacional, para efeitos do
dos danos. o Estado e as demais pessoas colectivas de direito público respondem solidariamen- número ancerior, equivale, para os devidos efeitos legais, a decisão de recusa de aplicação ou a
te com o terceiro, sem prejufzo do direito de regresso. decisão de aplicação de norma cuja inconstitucionalidade, ilegalidade ou desconformidade com
convenção internacional haja sido suscitada durante o processo, consoante o caso.
CAPITULO 111
3 - O Estado e as regiões autónomas são também civilmente responsáveis peIos danos anormais
que. para os direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, resultem da omissão de
Responsabilidade civil pol' danos deoorrentes do exercício da função jurisdicional
providências legislativas necessárias para tornar exequfveis normas constitucionais.
4 - A existência e a extensão da responsabilidade prevista nos números anteriores são determi-
Artigo 12. 0
nadas atendendo às circunstâncias concretas de cada caso e, designadamente, ao grau de clare-
Regime geral
za e precisão da norma violada, ao tipo de inconstitucionalidade e ao facto de terem sido
Salvo o disposto nos artigos seguintes, é aplicável aos danos ilicitamente causados pela admi-
adoptadas ou omitidas diligências susceptíveis de evitar a sicuação de ilicitude.
nistração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo
5 - A constituição em responsabilidade fundada na omissão de providências legislativas neces-
razoável. o regime da responsabilidade por factos ilícitos cometidos no exercicio da função
sárias para tornar exequíveis normas constirucionais depende da prévia verificação de inconsti-
administrativa.
tucionalidade por omissão pelo Tribunal Constitucional.
6 - Quando os lesados forem em tal número que, por razóes de interesse público de excepcio-
Artigo 13. 0
nal relevo, se justifique a limitaçáo do âmbito da obrigação de indemnizar, esta pode ser fixada
Responsabilidade por erro judiciário
equitativamente em montante inferior ao que corresponderia à reparação integral dos danos
1 - Sem prejuízo do regime especial aplicável aos casos de sentença penal condenatória injusta
causados.
e de privação injustificada da liberdade. o Estado é civilmente responsável peIos danos decor-
rentes de decisões jurisdicionais manifestamente inconstitucionais ou ilegais ou injustificadas CApITULO V
por erro grosseiro na apreciação dos respectivos pressupostoS de facto. Indemnização peJo sacrifício
2 - O pedido de indemnização deve ser fundado na prévia revogação da decisão danosa pela
jurisdiçáo competente. Artigo 16. 0
Indemnização pelo sacrifício
Artigo 14. 0 O Estado e as demais pessoas colecüvas de direito público indemnizam os particulares a quem,
Responsabilidade dos magisttados por razões de interesse público, imponham encargos ou causem danos especiais e anormais,
1 - Sem prejuízo da responsabilidade criminal em que possam incorrer, os magistrados judi- devendo. para o cálculo da indemnização, atender·se, designadamente. ao grau de afectação do
ciais e do Ministério Público não podem ser directamente responsabilizados pelos danos decor- comeúdo substancial do direito ou interesse violado ou sacrificado.
rentes dos actos que praciquem no exercicio das respectivas funções, mas, quando tenham
agido com dolo ou culpa grave. o Estado goza de direito de regresso contra des.
2 - A decisão de exercer o direito de regresso sobre os magistrados cabe ao órgão competen-
te para o exerdcio do poder disciplinar, a título oficioso ou por iniciariva do Ministro da
Justiça.

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