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CURSO SOBRE

oNOVO
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO
CURSO SOBRE
oNOVO
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO
ADMINISTRATIVO
2015· 5ª Edição revista eatualizada

José Fontes
Agregado eDoutor em Ciências Políticas
Mestre em Ciências Jurídico-Políticas
Professor da Universidade Aberta eda Academia Militar
Investigador científico do CAPP/ISCSP/Universidade de Lisboa,
do CEDlS/FD/Universidade Nova de Lisboa edo CINAMIL

\11X
ALMEDINA
CURSO SOBRE
o NOVO Ao Professor Doutor Paulo Otero, a quem
CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
continuo a dedicar este livro, (grato) pelo
AUTOR
muito que me ensinou e continua a ensinar
José Fontes
EDITOR e
EDIÇÕES ALMEDINA, S.A. porque a exigência do seu magistério continua
Rua Fernandes Tomás, nOs 76-80
a ser, para mim, exemplar.
3000-167 Coimbra
Te!.: 239 851904 . Fax: 239 851 901
www.aJmedina.net·editora@almedina.net
DESIGN DE CAPA
FBA.
PRÉ-IMPRESSÃO
EDIÇÕES ALMEDINA, SA
IMPRESSÃO E ACABAMENTO

Setembro, 2015
DEPÓSITO LEGAL

398264115

Apesar do cuidado e rigor colocados na elaboração da presente obra, devem


os diplomas legais dela constantes ser sempre objeto de confirmação com as
publicações oficiais.
Toda a reprodução desta obra, por fotocópia ou outro qualquer processo,
sem prévia autorização escrita do Editor, é ilícita e passível de procedimento
judicial contra o infrator.

~ \ GRUPOALMEDINA
ALMEDINA
,-------------
BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL - CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO

FONTES, José, 1970-


Curso sobre o novo código do procedimento administrativo. - 5' ed. rev. e
Atualiz. - (Manuais universitários)
ISBN 978-972-40-6151-L
CDU 342
NOTA 00 AUTOR

Publica-se agora a 5~ edição, revista e atualizada, do Curso Sobre o Novo


C6digo do Procedimento Administrativo, que começou por ser um Curso
Breve e que cada vez mais se vai aproximando de um Tratado de Direito
e de Procedimento Administrativos, organizado em torno da relação
jurídico-procedimental administrativa e no qual se tenta abordar as dife-
rentes temáticas da organização e da atividade administrativas, bem como
a das garantias dos particulares.
Após mais de 20 anos de vigência do Código do Procedimento Admi-
nistrativo de 1991, o Governo aprovou, por via de autorização legislativa,
um novo Código com novos institutos, mantendo embora muito do enqua-
dramento jurídico que vigorou até à data da entrada em vigor deste novo
diploma.
Na presente edição, mantivemos a estrutura do Curso, por palestras,
já anteriormente adaptada às regras e às exigências do ensino a distância
(e-Ieaming) (que cada vez mais são úteis aos estudantes de ensino presencial),
levando em linha de conta a estrutura do diploma legal agora aprovado.
A linguagem utilizada, simples e descritiva, organizada esquematica-
mente, possibilita que este livro seja destinado a todos os que têm neces-
sidade de trabalhar sob as regras do procedimento administrativo e não
apenas a juristas ou a estudantes de cursos de Direito. Por isso mesmo, a
leitura deste Curso deve fazer-se em estrita ligação com os próprios textos
do agora novo Código do Procedimento Administrativo e, também, da Carta
Ética da Administração Pública. Continua, assim, a existir, deliberadamente,
uma complementaridade nos textos em presença.
Este trabalho pretende contribuir para o estudo e para uma melhor
compreensão do novo Código do Procedimento Administrativo, bem
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como para a divulgação e o conhecimento da Carta Ética da Adminis-


traçáo Pública. Por outro lado importa a sinalar que não se esgotou a
bibliografia di ponível nem a jurisprudência já rica, dos nosso tribuoai
admini trativo a qualfoi resultando designadamente da aplicação - em
concreto - do anterior Código.
Agradeço ao me tre TIAGO MARTINS a permanente disponibilidade, as
sugestõ e a lcitura atenta e crítica do texto desta edição. A sua ajuda foi
absolutamente inestimável.
Por fim, expresso o meu maior desejo: que esta nova edição seja útil aos
Estudantes e a todos os Leitores interessados na importante temática do
procedimento admini tramo, na certeza de que s trata de um diploma PREFÁCIO À1ª EDIÇÁD (2000)
que entrando agora em vigor obriga a um acompanhamento permanente
para melhor se perceber o modo e a forma como será operacionalizado. Conheci o Autor na última década do século passado (XX), quando cola-
Qualquer suge tão ou crítica poderá ser enviada para o seguinte ende- borámos durante alguns anos na lecionação da disciplina de Direito
reço eletrónico: jfontes@uab.pt Administrativo I do Curso de Licenciatura em Direito da Universidade
Internacional, e cedo me apercebi das suas qualidades humanas: a capa-
Lisboa, julho de 2015. cidade intelectual, a dedicação ao estudo, o rigor científico, o nível de
exigência e a disponibilidade para o diálogo.
JosÉ FONTEs Tais qualidades eram e são um sinal para uma promissora carreira uni-
versitária, que eu próprio sempre incentivei, e o primeiro andamento foi já
preenchido com a obtenção do grau de Mestre em Ciências Jurídico-Políticas
pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, com a apresentação
de uma tese sobre o controlo parlamentar da Administração Pública.
Mas reconheci também logo no Autor uma outra qualidade: a de estar
disponível, como autor ou como coautor, a revelar ao público o produto
dos seus estudos e das suas reflexões, não escondendo para si próprio esse
produto.
É O que uma vez mais mostra com a presente obra sobre o procedi-
mento administrativo, que o legislador em boa hora codificou em 1991,
complementando-a com os atos legislativos próprios.
Sendo hoje quotidianas as situações de confronto da Administração Pú-
blica, lato sensu, com os particulares, quando ela é agressiva, ou as situações
de cooperação ou colaboração da mesma Administração Pública com os
particulares, quando ela é providencial, só com regras de jogo conhecidas
pelas partes é que tais situações podem existir ou coexistir saudavelmente.
Foram essas regras, pelo menos, as mínimas, que o legislador felizmente
condensou no Código do Procedimento Administrativo, ficando agora os
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órgãos da Administração Pública e os particulares ~ saber com~ tratar as


relações jurídico-administrativas entre i e tabel cIda (o na5cuncnto, a
vida e a morte dessas relações) e ficando também os particulare a conhecer
as armas de defesa dos seus direitos ou interesse legalmente protegidos.
Com o presente Curso Breve - que de breve nada tem -, o Autor, as-
sumindo um projeto inovador, percorre todo o Código do Procedim~~to
Administrativo, analisando-o em toda a sua extensão, no plano dogmabco
e no plano prático-jurídico, indo ao ponto de fornecer exempl~s prá.ti~os,
e colhendo os frutos de uma leitura atenta e crítica das suas diSposlçoes,
em vigor há quase dez anos. . ,
O leitor da obra perde facilmente a sensação de secura que subJaz a PLANO DO CURSO SOBRE O NOVO
consulta de um qualquer Código e é atraído pelo interesse nas matérias, CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
todas elas, que são versadas na obra, dadas a forma e a linguagem - claras,
simples e acessíveis - utilizadas pelo Autor. 1. Palestra introdutória
A mensagem da obra - tratar-se de um elemento indispensável de 1.1. Introdução à temática
consulta para um largo universo, o de todos os intervenientes nas ~e~ações 1.2. O novo Código do Procedimento Administrativo
jurídico-administrativas e o de todos os estudiosos destas m,atenas de 1.2.1. Enquadramento geral
Direito Público - é plenamente conseguida pelo Autor e este e o melhor 1.2.2. Estrutura do novo Código do Procedimento Administrativo
elogio que se lhe pode fazer. 1.2.3. Algumas inovações
Daqui a um Manual de Direito Administrativo vai um passo e um 1.2.4. O que vigora, diplomas próprios e diplomas cuja aprovação se
passo que JosÉ FONTES, no futuro, com facilidade poderá dar: este é o aguarda
meu augúrio. 1.2.5. Eventuais erros de sistematização, inexatidões e redundâncias
1.2.6. Disposições preliminares
Lisboa, dezembro de 2000 1.3. Códigos de Conduta e a Carta Ética - Dez Princípios Éticos da
Administração Pública
GUILHERME DA FONSECA
Juiz Conselheiro do Tribunal Constitucional edo Supremo Tribunal de Justiça 2. Palestra sobre princípios gerais da atividade administrativa
2.1. Enquadramento geral
2.2. O princípio da legalidade
2.3. O princípio da prossecução do interesse público e da proteção dos
direitos e interesses dos cidadãos
2.3.1. A prossecução do interesse público
2.3.2. A proteção dos direitos e interesses dos cidadãos
2.4. O princípio da boa administração
2.5. O princípio da igualdade
2.6. O princípio da proporcionalidade
2.7. Os princípios da justiça e da razoabilidade
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2.8. O princípio da imparcialidade 4.2.2. Procedimento privativo do ato administrativo


2.8.1. As garantias procedimentais de imparcialidade 4.2.2.1. Da iniciativa particular
2.9. O princípio da boa-fé 4.2.2.2. Das notificações
2.10. O princípio da colaboração (da Administração Pública) com os par- 4.2.2.3. Da instrução
ticulares 4.2.2.4. Da audiência dos interessados
2.11. O princípio da participação 4.2.2.5. Da decisão e outras causas de extinção do procedimento
2.12. O princípio da decisão 4.2.2.6. Comunicações prévias
2.12.1. O ato tácito
2.13. Os princípios aplicáveis à administração eletrónica S. Palestra sobre atividade administrativa
2.14. O princípio da gratuitidade 5.1. Do regulamento administrativo: disposições gerais
2.15. O princípio da responsabilidade 5.1.1. Da eficácia do regulamento administrativo
2.16. O princípio da administração aberta 5.1.2. Da invalidade do regulamento administrativo
2.17. O princípio da proteção dos dados pessoais 5.1.3. Da caducidade e da revogação do regulamento administrativo
2.18. O princípio da cooperação leal com a União Europeia 5.1.4. Da impugnação de regulamentos administrativos
5.2. Do ato administrativo
3. Palestra sobre os órgãos da Administração Pública 5.2.1. Enquadramento e disposições gerais
3.1. Dos órgãos administrativos: natureza e regime 5.2.1.1. Tipologia dos atos administrativos
3.1.1. Dos órgãos colegiais 5.2.1.2. Classificação dos atos administrativos
3.1.2. Da competência 5.2.2. Da eficácia do ato administrativo
3.1.3. Das suplência e substituição 5.2.3. Da invalidade do ato administrativo
3.1.4. Da delegação de poderes 5.2.4. Da revogação e da anulação administrativas
3.1.5. Dos conflitos de atribuições e de competências 5.2.4.1. Das alteração, substituição e retificação dos atos admi-
nistrativos
4. Palestra sobre procedimento administrativo 5.2.5. Da execução do ato administrativo
4.1. Regime comum: disposições gerais 5.3. Dos contratos da Administração Pública
4.1.1. Dos acordos endoprocedimentais
4.1.2. Da relação jurídica procedimental 6. Palestra sobre garantias administrativas
4.1.2.1. Dos sujeitos do procedimento 6.1. Enquadramento geral
4.1.2.2. Dos interessados no procedimento 6.2. As garantias administrativas impugnatórias: regime geral
4.1.3. Da conferência procedimental 6.2.1. Da reclamação
4.1.4. Do direito à informação 6.2.2. Dos recursos administrativos
4.1.5. Dos prazos 6.2.2.1. Do recurso hierárquico
4.1.6. Das medidas provisórias 6.2.2.2. Dos recursos administrativos especiais
4.1.7. Dos pareceres
4.1.8. Da extinção do procedimento
4.2. Procedimentos do regulamento e do ato administrativos
4.2.1. Procedimento privativo do regulamento administrativo
1. Palestra introdutória

SUMÁRIO:
Introdução à temática. O novo Código do Procedimento Administrativo. Enqua-
dramento geral. Estrutura do novo Código do Procedimento Administrativo.
Algumas inovações. O que vigora, diplomas próprios e diplomas cuja aprovação
se aguarda. EvenUlais erros de sistematização, inexatidões e redundâncias. Dispo-
sições preliminares. Códigos de Conduta e a Carta Ética - Dez Princípios Éticos
da Administração Pública. Recomendação. Exercício formativo.

1.1. Introdução à temátical


A satisfação das necessidades coletivas representa, desde sempre, uma
das principais razões da existência de Administrações Públicas. Na sua

1Como obras e artigos importantes de Direito Administrativo vide entre muitos outros: Mar-
cello Caetano, Manual de Direito Administrativo, Volume I, 10" Edição (reimpressão), revista e
atualizada pelo Prof. Doutor Diogo Freitas do Amaral, Livraria Almedina, Coimbra, 1980;
Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Volume I, 2' Edição, Livraria Alme-
dina, Coimbra, 1994; Guilherme Frederico Dias Pereira da Fonseca, Direito Administrativo
(Sumdrios Desenvolvidos), segundo as aulas dadas na Universidade Internacional de Lisboa,
Departamento de Direito, ao 3~ Ano pós laboral, no ano letivo de 1991/92, Associação Acadé-
mica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, 1992; Marcello Caetano, Prindpios
Fundamentais do Direito Administrativo, reimpressão da edição brasileira de 1977, I' reimpressão
portuguesa, Livraria Almedina, Coimbra, 1996; Guilherme Frederico Dias Pereira da Fon-
seca, A Constituição e aDefesa dos Administrados, Temas da Constituição, 7, DIABRIL, 1'- Edição,
Lisboa, março, 1977; Guilherme Frederico Dias Pereira da Fonseca, Direito Administrativo -
A Administração Pública, Temática I, Textos de Apoio, E. I. - Editora Internacional, Lisboa,
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essência, administrar a res publica compreende, entre outros aspetos, o Disposição de conteúdo normativo similar consta hoje do disposto no
reconhecimento e o diagnóstico destas necessidades públicas, a captação artigo 267º, nº 5, da versão atual da nossa Lei Fundamental4 •
e a afetação dos recursos necessários à sua satisfação e as definição e hie- O Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de novembro, veio dar cumprimento
rarquização de prioridades, no caso de inexistência de recursos suficientes, a esta exigência constitucional, tendo sido através dele que o Governo
em estreita ligação com os órgãos do poder político. aprovou, pela primeira vez, um Código do Procedimento Administrativo
A prossecução da atividade da Administração Pública encontra-se, em (CPA ou adiante também designado por Código). Isto significa que, até à
grande medida, subordinada ao Direito Administrativo que, sendo um entrada em vigor deste diploma legal, existiu uma inconstitucionalidade
ramo do Direito Público, integra um conjunto diversificado de normas que por omissãos nunca verificada pelo nosso Tribunal Constitucional.
regulam, entre outros aspetos, a organização, o funcionamento e a atividade São várias as contribuições do Direito Comparado para o primeiro
das várias estruturas públicas administrativas e das que, não fazendo parte Código a que, aliás, o preâmbulo daquele Decreto-Lei faz referência.
da Administração Pública e no que à sua ação diga respeito, nos termos Por imposição do disposto no artigo 3º do Decreto-Lei que aprovou o
legais, atuem ao abrigo de poderes jurídico-administrativos. Nos nossos primeiro CPA, o mesmo veio a ser revisto, mais tarde, pelo Decreto-Lei
dias, regula ainda as relações que se estabelecem com os particulares, na nº 6/96, de 31 de janeiro. O referido artigo 3º determinava uma revisão
sua qualidade de administrados. ordinária, passados três anos da data da entrada em vigor do Código, com
A Constituição da República Portuguesa de 1976 (CRP) previa 2, no vista a serem recolhidos os elementos úteis resultantes da sua aplicação.
seu artigo 268º, nº 3, que As alterações então aprovadas, embora de pormenor, são bastante impor-
tantes, conforme pode ser verificado pelo texto do próprio preâmbulo e
"(...) o processamento da atividade administrativa será objeto de lei pelo disposto no artigo 1º daquele Decreto-Lei.
especiaP, que assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e O CPA de 1991 veio, ainda, a sofrer algumas alterações, em virtude de
a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes legislação entretanto aprovada e que entrou em vigor no âmbito da re-
disserem respeito!' forma da Administração Pública portuguesa, mas a última grande alteração
surgiu atento o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 14º do Decreto-Lei
nº 18/2008, de 29 de janeiro, que aprovou o Código dos Contratos Públicos
(CCP), e que estabeleceu a disciplina aplicável à contratação pública, bem
1996; Jorge Miranda, A Administração Pública nas Constituições Portuguesas, O Direito, Ano 120º, como o regime substantivo dos contratos públicos que revistam a natureza
1988, III e IV (julho dezembro), Factos e Documentos, págs. 607 a 617; Paulo Otero, Conceito de contrato administrativo. Com base nesta disposição normativa, veio a ser
e Fundamento da Hierarquia Administrativa, Coimbra Editora, 1992; Paulo Otero, O Poder de
revogado todo o Capítulo III da Parte IV do ePA de 1991, que continha o
Substituição em Direito Administrativo - Enquadramento Dogmático Constitucional, Volumes I e II,
Lex, Lisboa, 1995; Afonso Rodrigues Queiró, Lições de Direito Administrativo, Volume I, Coim- regime jurídico geral sobre o contrato administrativo. Desta forma, o CPA
bra, 1976; Rogério Ehrhart Soares, Direito Administrativo, Lições ao Curso Complementar de ficou privado de uma parte substancial do regime jurídico que regulava
Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito de Coimbra no ano letivo de 1977/78, uma das mais importantes formas de atividade jurídica da Administração
Coimbra, 1978; Marcelo Rebelo de Sousa, Administração Pública eDireito Administrativo em Por- Pública, a par dos ato e regulamento administrativos, restando assim muito
tugal, Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Lisboa, 1992; Marcelo Rebelo
de Sousa, Lições de Direito Administrativo, Volume I, Pedro Ferreira - Editor, Lisboa, 1995; José
poucas disposições normativas, previstas no CPA, que se aplicassem aos
Tavares, Administração Pública e Direito Administrativo - Para o seu estudo ecompreensão, livra- contratos administrativos.
ria Almedina, Coimbra, 1992; Fernando Brandão Ferreira-Pinto, Código do Procedimento
Administrativo Anotado, 2' edição, Digital JurisBook, Lisboa, março, 2012; e Mário Aroso de 4 Versão da quarta revisão constitucional de 1997, sem alterações nas posteriores revisões
Almeida, Teoria Geral do Direito Administrativo, 2' edição, Almedina, Coimbra, 2015. constitucionais de 2001, 2004 e 2005.
2 Na versão da segunda revisão constitucional de 1989. 5 A propósito da fiscalização da inconstitucionalidade por omissão, vide o disposto no artigo

3 Sublinhado nosso. 283º daCRP.


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Com a Lei nº 42/2014, de 11 de julho (vide Anexos), veio a Assembleia as Administrações Públicas e os particulares (administrados). Promoveu
da República, nos termos do disposto no artigo 161º, alínea d), da CRP, ou determinou a alteração de normas e de padrões de referência que vin-
autorizar o Governo a aprovar um novo CPA. Esta Lei, no seu artigo 1º, culam os cidadãos e as Administrações Públicas, regulando e definindo
concede autorização legislativa ao Governo para aprovar o novo diploma, as suas condutas, prevendo direitos, garantias e obrigações para ambas as
estabelecendo os limites e as condições para a referida aprovação. partes. Mostrou uma Administração Pública cada vez mais virada para os
É nesta sequência que é aprovado pelo Governo o Decreto-Lei cidadãos, preocupada com a transparência e colocando os particulares no
nº 4/2015, de 7 de janeiro, o qual, nos termos do disposto no seu artigo centro do processo de tomada de decisão.
lº, aprova o novo Código e, por consequência do estipulado no seu artigo O Preâmbulo do Decreto-Lei nº 442/91, de 15 de novembro, que agora
7º, revoga totalmente o anterior CPA e o Decreto-Lei que inicialmente cessou a sua vigência, estabeleceu os objetivos que visavam alcançar, de
o aprovou, bem como o que ordinariamente o reviu, em 1996. Trata-se, forma genérica, os códigos dos procedimentos administrativos (e o nosso
como verificamos, de um decreto-lei autorizado que deve, por isso, obe- CPA, em particular) e que, sendo designadamente os seguintes, são ainda
diência à respetiva lei autorizante. E é este CPA, apresentado como novo, de grande atualidade:
que importa agora analisar e estudar.
É, pois, objetivo geral deste Curso dotar todos os interessados de conhe- - Disciplinar e regular a atividade e o funcionamento da Administração
cimentos que contribuam para um saber mais aprofundado sobre o novo Pública, procurando racionalizar a atividade dos diferentes órgãos e
CPA e o procedimento administrativo em particular e que permitam a serviços que desenvolvem a função administrativa do Estado;
adoção de condutas pautadas pela legalidade estipulada no novo Código, - Regular a formação da vontade da Administração Pública por forma
que os vincula, ou pode vincular, direta e imediatamente. a que sejam tomadas decisões justas, legais e oportunas;
Desta forma, fomenta-se a correta preparação a priori do processo - Assegurar a informação dos interessados e a sua participação na for-
decisório ou deliberativo, bem como aposteriori do processo de execução, mação das diferentes decisões que lhes digam diretamente respeito;
daqui podendo advir muitos benefícios para as Administrações Públicas - Salvaguardar em geral a transparência da ação administrativa e o
e, nomeadamente, para os particulares interessados (administrados). respeito pelos interesses e direitos dos cidadãos; e
Procura-se, assim, aproveitar esta oportunidade para proporcionar a - Evitar a burocratização e aproximar os serviços públicos dos cidadãos.
todos os que neles têm interesse, numa linguagem acessível e tenden-
cialmente simplificada, conhecimentos relativos ao regime jurídico geral Em síntese, podemos afirmar que eram, e continuam a ser, objetivos
do procedimento administrativo português e também, por ser relevante, gerais dos códigos dos procedimentos administrativos promover e imple-
sobre um dos principais códigos de ética - a Carta Ética da Administração mentar uma cultura jurídica nos diferentes tipos de Administração Pública
Pública - que se aplica à generalidade das diversas estruturas da Adminis- que visa obter e garantir que sejam tomadas decisões legais, em tempo
tração Pública, e de que é um dos melhores e paradigmáticos exemplos. oportuno, observados todos os princípios constitucional e legalmente
Daí a importância deste Curso, no quadro da legislação reguladora do previstos com base na transparência e, sobretudo, evitando a burocrati-
Direito Público em geral e do Direito Administrativo em particular, de zação administrativa, que tem e aporta, como sabemos, pesados custos de
modo a que todos esses conhecimentos possam tornar-se num instrumento contexto à economia nacional. Ou seja, visa-se uniformizar condutas, para
de trabalho útil e eficaz. que os cidadãos possam antecipar as ações das Administrações Públicas e
O anterior CPA veio, ao longo dos anos em que se encontrou em vigor6 , as considerem previsíveis.
alterar, e em muito, a conjuntura em que se desenvolvem as relações entre Como se disse, a linguagem utilizada neste Curso tende a ser simples
para ajudar à perceção mais rápida dos institutos e dos conceitos jurídico-
6 Foram mais de 20 anos. -procedimentais, utilizando-se o mais das vezes os dispositivos legais, que
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se transcrevem, para melhores entendimento e interpretação do conteúdo Parte I - Disposições gerais


dos mesmos. Capítulo I - Disposições preliminares
No que diz respeito à estrutura do Curso, optámos por seguir de perto Capítulo II - PrincípiOS gerais da atividade administrativa
a estrutura do próprio CPA publicado em 2015, para melhor compreensão
dos diferentes conceitos e institutos jurídicos em análise. Parte II - Dos órgãos da Administração Pública
Importa assinalar que a vigência do CPA de 1991 foi relativamente Capítulo I - Natureza e regime dos órgãos
pacífica e que mereceu apenas duas intervenções decisivas do Tribunal Capítulo II - Dos órgãos colegiais
ConstitucionaF. Capítulo III - Da competência
Capítulo IV - Da delegação de poderes
1.2. O novo Código do Procedimento Administrativo Capítulo V - Dos conflitos de atribuições e de competência
1.2.1. Enquadramento geral
O novo CPA e o decreto-lei que o aprova resultam, como vimos, de uma Parte III - Do procedimento administrativo
lei de autorização legislativa solicitada pelo Governo e concedida pela Título I - Regime comum
Assembleia da República para aquele legislar sobre o novo CPA. Capítulo I - Disposições gerais
A referida autorização legislativa foi concedida, como se disse já, pela Lei Capítulo II - Da relação jurídica procedimental
nº 42/2014, de 11 julho, e nela se estipulavam, nos termos constitucionais, o Secção I - Dos sujeitos do procedimento
objeto, o sentido, a extensão e a duração da referida autorização. Importa, Secção II - Dos interessados no procedimento
desta forma, assinalar que o Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de janeiro, que Secção III - Das garantias de imparcialidade
aprova o novo CPA, é um ato legislativo subordinado à competente lei Capítulo l i - Da conferência procedimental
autorizante e deve com ela conformar-se, sob pena de ilegalidade. Capítulo IV - Do direito à informação
Capítulo V - Dos prazos
1.2.2. Estrutura do novo Código do Procedimento Administrativo Capítulo VI - Das medidas provisórias
Quanto à estrutura do novo CPA, o legislador optou por dividi-lo em Partes, Capítulo VII - Dos pareceres
em Títulos, em Capítulos, em Secções e, por fim, em Subsecções. Capítulo VIII - Da extinção do procedimento
Vejamos, então, a sistematização8 do novo Código que seguimos de perto
no plano deste Curso: Parte TI - Dos sujeitos
Capítulo I - Dos órgãos administrativos
Capítulo I1- Dos interessados

7 Vide o Acórdão do TC n~ 118/97, publicado em 24 de abril de 1997, que declarou a incons- Parte IIl- Do procedimento administrativo
titucionalidade, com fomla obrigatória geral, da norma do nO 1 do artigo 53º, em parte; e Capítulo I - Princípios gerais
o Acórdão do TC n 2 636/2013, publicado em 21 de outubro de 2013, que declarou, com Capítulo I1- Direito à informação
força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do artigo 70~, n 2 1, alí- Capítulo l i - Das notificações e dos prazos
nea a), em certa interpretação. Para além disso, o Supremo Tribunal Administrativo proferiu Capítulo IV - Da marcha do procedimento
o Acórdão n~ 5/2010, publicado em 14 de julho de 2010, que uniformizou jurisprudência no
âmbito do disposto no artigo 2º, nº 2. Parte IV - Da atividade administrativa
8 A estrutura do anterior CPA, atualmente revogado, era a seguinte: Capítulo I - Do regulamento
Parte I - PrincípiOS gerais Capítulo II - Do ato administrativo
Capítulo I - Disposições preliminares Capítulo III - Do contrato administrativo (Este capítulo veio a ser revogado pelo
Capítulo I1- PrincípiOS gerais decreto-lei que aprovou o CCP).
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Título II - Procedimento do regulamento e do ato administrativo Importa, no entanto, fazer a sua identificação, embora sem caráter
Capítulo I - Procedimento do regulamento administrativo exaustivo e sem a pretensão de analisar - aqui e agora -, criticamente, as
Capítulo II - Procedimento do ato administrativo referidas inovações. Vejamos algumas delas:
Secção I - Da iniciativa particular
- Novo regime de conferências procedimentais;
Secção II - Das notificações
- Referência expressa à eventual responsabilidade por incumprimento
Secção III - Da instrução
Secção IV - Da audiência dos interessados de prazos;
- Imposição de códigos de conduta;
Secção V - Da decisão e outras causas de extinção do pro-
cedimento - Autonomização de novos princípios gerais, designadamente o da boa
Secção VI - Comunicações prévias administração, o da responsabilidade, o da segurança dos dados, o da
cooperação leal com a União Europeia e os aplicáveis à administração
Parte IV - Da atividade administrativa eletrónica;
Capítulo I - Do regulamento administrativo - Ligação entre o princípio da justiça e o princípio da razoabilidade;
Secção I - Disposições gerais - Acordos endoprocedimentais;
Secção II - Da eficácia do regulamento administrativo - Eliminação da figura do indeferimento tácito e revisão do regime do
Secção III - Da invalidade do regulamento administrativo ato tácito, em virtude da possibilidade de ação (contenciosa) admi-
Secção IV - Da caducidade e da revogação nistrativa especial de condenação à prática de ato devido; e
Secção V- Da impugnação de regulamentos administrativos - Regime substantivo aprofundado do regulamento administrativo.
Capítulo II - Do ato administrativo
Secção I - Disposições gerais 1.2.4. O que vigora, diplomas próprios e diplomas cuja aprovação
Secção II - Da eficácia do ato administrativo se aguarda
Secção III - Da invalidade do ato administrativo Neste momento, para além de vigorar o novo CPA e o Decreto-Lei
Secção IV - Da revogação e da anulação administrativas nº 4/201S, de 7 de janeiro, que o aprova, continua vigente o disposto no
Secção V - Da execução do ato administrativo nº 2 do artigo 149º do revogado CPA de 1991, nos termos do estipulado
Secção VI - Da reclamação e dos recursos administrativos no artigo 6º deste Decreto-Lei.
Subsecção I - Regime geral Por outro lado, importa referir que se aguarda a publicação de outros
Subsecção II - Da reclamação diplomas ou que existem matérias objeto de legislação própria. Vejamos
Subsecção III - Do recurso hierárquico alguns exemplos:
Subsecção IV - Dos recursos administrativos especiais
Capítulo III - Dos contratos da Administração Pública i. Resolução do Conselho de Ministros que aprove um Guia de boaspráticas
administrativas, nos termos do disposto no artigo Sº, nº 1, do Decreto-Lei
1.2.3. Algumas inovações nº 4/201S, de 7 de janeiro;
Para melhor percebermos o alcance das inovações do novo CPA, torna-se ii. Diploma que defina os casos, as formas e os termos em que os atos
indispensável uma leitura, atenta e aturada, do preâmbulo do Decreto-Lei administrativos podem ser impostos coercivamente pela Administração,
nº 4/201S, de 7 de janeiro, que estabelece um elenco aprofundado das de acordo com o previsto no nº 2 do artigo 8º do referido Decreto-Lei;
várias alterações aprovadas e das mais significativas inovações introduzidas iii. Diploma próprio que regule o processo administrativo em suporte
e que iremos analisar no decurso deste livro. eletrónico, atento o disposto no artigo 64º, nº 4, do novo CPA;
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iv. Legislação relativa ao acesso aos arquivos e registos administrativos, ii. Também na nossa ótica, o Capítulo V da Parte II, com a epígrafe Dos
de acordo com o previsto no artigo 17º, nº 2, do CPA, que hoje consta, conflitos de atribuições ede competência, deveria seguir-se ao Capítulo III que
designadamente, da Lei nº 46/2007, de 24 de agosto (Regula o acesso aos regula a competência e que até integra, no artigo 39º, uma disposição sobre
documentos administrativos e a sua reutilização), da Lei nº 19/2006 de 12 de conflitos de competência territorial;
junho (Regula o acesso à informação sobre ambiente, transpondo para a ordem iii. A posição do artigo 108º do CPA é outro bom exemplo de desorga-
jurídica interna aDiretiva n!! 2003/4/CE do Parlamento Europeu edo Conselho, nização sistémica, pois deveria ser antes colocado como artigo 103º, já que se
de 28 de Janeiro) e da Lei nº 12/2005, de 28 de janeiro (Sobre informação refere expressamente ao artigo 102º e apenas a ele diz respeito;
genética pessoal einformação de saúde); iv. Do mesmo modo, o artigo 196º do CPA deveria anteceder o artigo
v. Legislação sobre proteção de dados pessoais, como resulta do dis- 195º, por se referir a condições liminares que obstam ao prosseguimento
posto no artigo 18º do CPA, e que consta da Lei nº 67/98, de 26 de outubro efetivo do recurso hierárquico.
(Regimejurídico da proteção de dados pessoais que transpõe para a ordem jurídica
portuguesa aDiretiva n!! 95/46/CE, do Parlamento Europeu edo Conselho, de 24 Mas voltemos, ainda, à questão dos princípios:
de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao
tratamento dos dados pessoais e à livre circulação desses dados); e v. O legislador veio agora consagrar o principio da adequação procedimen-
vi. Legislação própria que habilite a adoção de medidas policiais de tal (no artigo 562) que aparenta ser um princípio geral determinante na
coação direta, atento o disposto no artigo 175º, nº 2, do CPA. forma de organização e de condução do procedimento administrativo e que
poderia, por esse motivo, ter sido inscrito logo inicialmente, na sistemática
1.2.5. Eventuais erros de sistematização, inexatidões dos princípios gerais;
e redundâncias vi. O princípio do inquisit6rio previsto e regulado no artigo 58º do CPA é
Se é verdade que no anterior CPA existiam alguns exemplos de questões outro bom exemplo que, a nosso ver, poderia ser inscrito como princípio
controversas quanto à localização sistemática de algumas normas e princípios, geral da atividade procedimental administrativa.
o atual CPA vem, nalguns casos, manter esses eventuais lapsos.
Por exemplo, se é certo que o princípio da administração aberta se Por outro lado, vejamos agora alguns exemplos de inexatidões e de re-
encontra hoje previsto na sequência sistemática dos princípios gerais dundâncias que nalguns casos são inúteis, por serem vazias de quaisquer
que regem a atividade administrativa, corrigindo aquilo que parecia ser inovações:
um erro de sistematização da anterior versão do CPA, que o colocava no vii. A previsão, no artigo 60º do CPA, dos princípios da cooperação eboajé
capítulo respeitante ao direito à informação (artigo 65º do anterior CPA procedimental, com um conjunto de disposições genéricas sobre cooperação
revogado), outros há que aparecem agora distantes do elenco inicial relativo entre órgãos administrativos e interessados, não deixa de ser parcialmente
aos princípios gerais. redundante (ainda que em parte substantiva) com o disposto inicialmente,
São também de assinalar outros exemplos de desorganização normativa: no artigo 10 2 do CPA.
i. O artigo 28º do CPA deveria, em bom rigor, ser, em nossa opinião, Estabelece o artigo 60º sobre Cooperação eboajéprocedimental:
colocado imediatamente a segUir ao artigo 25º, dado que se refere apenas "1 - Na sua participação no procedimento, os 6rgãos da Administração
à inobservância das disposições previstas nos artigos 23º, 24º e 25º do Pública eos interessados devem cooperar entre si, com vista àfixação rigorosa dos
CPA. Em termos de técnica legística, não fará qualquer sentido, a nosso pressupostos de decisão e à obtenção de decisões legais ejustas.
ver, intercalar dois normativos com o teor do dos artigos 26º e 27º, quando 2 - Os interessados devem concorrerpara aeconomia de meios na realização
as disposições do artigo 28º dizem respeito, direta e imediatamente, aos de diligências instrut6rias epara a tomada da decisão num prazo razoável,
artigos que antecedem aqueles; abstendo-se de requerer diligências inúteis ede recorrer aexpedientes dilat6rios."
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Comparemos com o disposto no referido artigo lO Q , cuja epígrafe é xii. De alguma perplexidade é, igualmente, o que resulta do disposto no
Prindpio da boa-fé: artigo 127Q do CPA, que determina que o procedimento do ato adminis-
trativo (conforme se estuda e resulta do Capítulo II do Título II da Parte
"1 - No exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas III em que o mencionado normativo se encontra inserido) pode terminar
efases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se pela prática (óbvia e natural) de um ato administrativo ou - surpreenden-
segundo as regras da boajé. temente - pela celebração de um contrato. O procedimento administrativo
2 - No cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os diz respeito a um ato mas pode terminar com a celebração de um con-
valoresfundamentais do Direito relevantes emface das situações consideradas, trato... Terá sido isto o que o legislador efetivamente quis dizer, ou antes
e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa e o que o contrato determinará o conteúdo final do ato? E o que se pretendia
objetivo a alcançar com a atuação empreendida." afirmar era que os contratos endoprocedimentais, por força e nos termos
do disposto no artigo 57 Q, n Q 3, do CPA, podem condicionar a prática de
viii. E não deixa de ser curioso verificar (como se verá mais adiante) que, um ato, que há de ser sempre a decisão final no procedimento dos atos
no n Q 2 do artigo 109Q do CPA, o legislador apresenta nova redundância que administrativos? Ideia semelhante é a que decorre do disposto no artigo
torna o teor da norma inútil, por ser remissivo sem ser inovador. Não era 77 Q, n Q 4, do CPA, que possibilita que as conferências procedimentais se
necessário o legislador estipular este normativo porque vem dizer o que concluam com a celebração de um contrato...
já diz, de igual modo e de forma inequívoca, no artigo 41Q que se aplica a xiii. O Governo refere, erradamente, no Preâmbulo que "(...) foram
qualquer requerimento apresentado a órgão incompetente. É um reforço inclufdos no C6digo os novosprincipios (...) da administração aberta (artigo 17º)
normativo redundante e inútil; e (...)" o que não corresponde à verdade porque tal princípio constava já
ix. O mesmo sucede com o estipulado no artigo 196Q, n Q 2, do CPA. do disposto no artigo 65 Q do CPA revogado. Não se trata de um novo
princípio;
Por fim, para além da apresentação de um elenco meramente exemplifi- xiv. Outro exemplo é o que resulta, igualmente, do Preâmbulo, quando
cativo dos muitos erros e lapsos contidos no diploma, que mereceriam, pelo se afirma no ponto 16 que "(...) onovo C6digo limita-se à clarificação norma-
menos, uma declaração de retificação (alguns dos quais estão assinalados tiva de situações que suscitaram dúvidas (...) sobre a diferença entre publicidade e
nos textos do CPA e do decreto-lei que o aprova, em Anexos a este Curso), publicação (artigo 1589) ( •••)". Se verificarmos o teor do disposto no referido
importa fazer referência, ainda que exemplificativamente, a alguns deles. artigo 158Q não se vislumbra qualquer referência a publicidade nem qualquer
Reparemos, assim, também noutras situações equívocas ou a que falta referência a critério que permita distinguir esta figura da da publicação a
clareza ou rigor, sem pretensão de esgotar os exemplos: que o artigo faz exclusivamente referência (cremos que a distinção resulta
antes do estipulado no artigo 159 Q do CPA);
x. O preceituado no artigo 43Qdo CPA sobre a suspensão da "(...) aplicação xv. Também é aqui de referir o disposto no artigo 142Q , n Q 2, do CPA,
da norma atributiva da competência deste último", ou seja, do órgão substituído, que proíbe a derrogação do regulamento por via de "(...) atos administra-
não é de todo percetível à primeira vista. Se o legislador pretendesse evi- tivos de caráter individual econcreto (...)". Esta última referência ao caráter
tar a cumulação de normas atributivas de competências, então a norma individual econcreto parece ser desnecessária e pode até, nalguns casos, ser
suspensa seria a atributiva da competência do substituto... geradora de hesitações e leituras, a nosso ver, equívocas. Seguindo uma
xi. A referência, no n Q 2 do artigo 113Q do CPA, ao tribunal não deveria interpretação meramente literalista, poder-se-ia admitir a existência de
estar aqui contemplada porque o CPA regula a atividade da Administração atos administrativos que não fossem individuais ou concretos e que, deste
Pública e não a dos Tribunais. Parece - à primeira vista - uma referência modo, fosse admissível a derrogação. Ora, não parece ser esse o caso. Mesmo
muito grave e até descontextualizada e inexata; tratando-se dos chamados atos administrativos sui generis (gerais, plurais
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e coletivos), que visam também situações individuais e casos concretos, artigo 1º, apresenta as definições legais de procedimento e processo ad-
cremos que não é admissível que possam ter efeitos derrogatórios sobre ministrativos, que mais adiante analisaremos.
regulamentos. Será porventura exigido ao intérprete que faça a'iui uma Importa referir que o novo ePA, nos termos do disposto no artigo 2º,
interpretação restritiva dado que entendemos que o Jegislador, através da delimita o seu âmbito de aplicação. As disposições normativas relativas
lerra da lei, di se mais do que o seu pensamento desejava que fosse expresso' (i) aos princípios gerais, (ii) ao procedimento e (iii) à atividade adminis-
xvi. O artigo 152º, nº 2, do CPArefere- e à desnecessidade de fundamen- trativa aplicam-se, de acordo com o disposto no nº 1, genericamente, não
tação das"(...) ordens dadas pelos superiores hierárquicos aos seus subalternos em apenas às estruturas da Administração Pública quando atuam ao abrigo
matéria de serviço ecom aforma legar'. Ora, mas o artigo 1482 do mesmo Código da atividade administrativa de gestão pública mas antes "(...) à conduta de
não estipula que, para efeitos do CPA o conceito de ato administrativo quaisquer entidades, independentemente da sua natureza, adotada no exercício de
integra apenas (...) as decisões que (...) viSem produzir efeitosjurídicos externos poderes públicos ou regulada de modo específico por disposições de direito adminis-
(...)"? Considerará o legislador a ordem hierárquica um ato administrativo trativo". Deste modo, aplicar-se-ão, por exemplo, às entidades de natureza
com efeitos externos? privada que exerçam, ainda que temporariamente, poderes públicos de
xvii. Também nos questionamos sobre a razão que leva o legislador a, autoridade, como sucede com os concessionários (aliás, como resultava já
no artigo 171º, nº 4, do CPA, colocar a referência expressa "(...) e quando do disposto no artigo 2º, nº 3, do anterior CPAlO).
tenha por objeto a anulação de um ato revogat6rio (...)". A formulação desta A Parte II do novo CPA é, de acordo com o disposto no nº 2 do seu artigo
norma parece um pouco confusa dado que só há efeitos repristinatórios 2º, naturalmente ll, aplicável ao funcionamento dos órgãos administrativos
na presença de atos revogatórios. Em que pensa o legislador quando faz e, por outro lado, "osprincípiosgerais da atividade administrativa eas disposições
esta ressalva expressa? Fica a dúvida. (...) que concretizampreceitosconstitucionaissão aplicáveis atoda equalquer atuação
xviii. Outra aparente contradição insanável reside no disposto no artigo da Administração Pública, ainda que meramente técnica ou degestãoprivada", de
169º, nº 6, do CPA, quando esta norma, contrariando o disposto no artigo acordo com o previsto no artigo 2º, nº 3.
165º, permite que um ato administrativo praticado por órgão incompetente Parece ainda que o novo CPA, atento o disposto no nº 1 do seu artigo 2º,
pos a vir a ser revogado. Ora a menos que o legislador entendesse que vai continuar a aplicar-se aos atos em matéria administrativa praticados
esse ato não seria inválido se admitiria tal revogação. No entanto, a falta pelos órgãos do Estado que, embora não integrados na Administração
de competência invalida juridicamente qualquer ato praticado e sendo Pública, desenvolvem funções materialmente administrativas, ou seja,
assim - na coerência do novo CPA - apenas pode ser, neste âmbito, sujeito pode vir a reger a atividade em matéria administrativa de órgãos como o
a anulação administrativa. Presidente da República, a Assembleia da República ou os Tribunais,
e serviços deles dependentes (os quais, como sabemos, não integram o
Podiam ser apresentados outros exemplos mas estes, como se disse, são perímetro da Administração Pública portuguesa) porque, pese embora a
paradigmáticos da necessidade de uma retificação do diploma. alteração substantiva que se verificou no artigo 2º do CPA, não deixa de
considerar-se agora que este se aplica, como se disse, "(...) à conduta de quais-
1.2.6. Disposições preliminares quer entidades, independentemente da sua natureza, adotada no exercício depoderes
O novo CPA entendeu manter algumas disposições normativas com defi- públicos ou regulada de modo específico por disposições de direito administrativo".
nições concetuais que já vigoravam anteriormente "(...) com o objetivo de
facilitar a interpretação e a aplicação (...)" do Códig09 e, logo no nº 1 do seu
10 Que expressamente referia: "As disposições do presente C6digo são ainda aplicáveis aos atos prati-
cados por entidades concessionárias no exercício de poderes de autoridade".
11 Porque a epígrafe da Parte II é suficientemente esclarecedora quanto ao âmbito de apli-

9 Vide ponto 3 do preâmbulo do Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de janeiro. cação.


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Importa também referir que, atento o disposto no artigo 2º, nº 4, alínea com o fundamento de que não deveria ser o Governo a aprovar a Carta
c), do CPA, as entidades administrativas independentes integram, para Deontológica mas que apenas deveria dela tomar conhecimento como órgão
efeitos do disposto no Código, a Administração Pública, a par das restan- superior da Administração Pública.
tes estruturas orgânicas e subjetivas que constam das restantes alíneas. Desta forma, a atual Carta Ética da Administração Pública (vide Anexos)
Esta referência expressa na mencionada alínea c) visa, de acordo com o resultou da concorrência da vontade das associações sindicais que acor-
preâmbulo do decreto-lei que aprova o novo CPA, desfazer "(...) eventuais daram num texto, no âmbito de um pacto mais amplo subscrito no acordo
dúvidas sobre a pertença destas entidades à Administração Pública, em sentido salarial de 1996.
subjetivo". A Carta Ética é, assim, uma manifestação da vontade dos próprios funcio-
Por fim, importa fazer menção ao disposto no nº 5 do mesmo artigo nários públicos portugueses e dos trabalhadores com contrato de trabalho
2º que manda aplicar, subsidiariamente, as disposições do Código e, em em funções públicas, bem como um compromisso claramente assumido
particular, as referentes às garantias dos particulares, a todos os procedi- de modernizar a Administração Pública portuguesa e uma afirmação de
mentos administrativos especiais. princípios antigos, por vezes esquecidos mas sempre atuais.
Para que a Administração Pública funcione de acordo com os valores
1.3. Códigos de Conduta e a Carta Ética - Dez Princípios Éticos éticos que fazem parte de um património comum por todos aceite, é indis-
da Administração Pública pensável criar novas formas de responsabilidade pessoal dos titulares dos
O artigo 5º do Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de janeiro, a propósito de boas órgãos e agentes administrativos.
prática administrativas determina que É inequívoco que a formação dos funcionários públicos nesta área é
imprescindível mas, como sabemos, a Ética não se aprende exclusivamente
"1- No prazo de um ano, a contar da data da entrada em vigor do presente
nas escolas, embora estas devam saber fomentá-la e considerá-la nos vários
decreto-lei, o Governo aprova, por Resolução do Conselho de Ministros, um
planos curriculares.
«Guia de boas práticas administrativas,>.
2 - O guia referido no número anterior tem caráter orientador e enuncia Por muitos princípios previstos em Códigos Deontológicos, em Cartas Éticas
padrões de conduta a assumirpela Administração Pública." da Administração Pública ou em Códigos de Boas PráticasU que existam ou que
venham a ser aprovados, de nada servirão se os recursos humanos não se
Dado que este diploma ainda não foi aprovado e, por isso, não se encon- propuserem a efetivá-los e se não existir uma preocupação permanente
tra em vigor, importa analisar, ainda e agora, a Carta Ética da Administração de (in)formação.
Pública, assinalando, no entanto, que são realidades distintas. Não poderemos, no entanto, afastar a importante vertente preventiva
Em 17 de março de 1993, foi publicada a Resolução do Conselho de que o Direito sancionatório geral deve ter e, por isso, a necessidade de
Ministros nº 18/93, que aprovou a Carta Deontológica do Serviço Público (vide adoção de novas medidas penalizadoras para a "pequena" e, por maioria de
Anexos). razão, para a "grande" corrupção que pode recair sobre as Administrações
Este diploma pretendeu ser, como resulta da sua nota preambular, "(...) Públicas. O mesmo deve suceder para as situações de fraude administrativa
um modelo para a ação do quotidiano (...)" e "(...) umguia que, por ser moral, se e criminalidade conexa. Todas as medidas são importantes para garantir a
coloca aos níveis mais elevados de exigência das consciências individuais, isto é, ao transparência e para o incremento da responsabilização dos trabalhadores
nível da autoavaliação;por isso, os deveres éticos ultrapassam os meros deveresjurí- que exercem funções públicas 13 , bem como para sua defesa perante parti-
dicos, deixando para estes as incidências disciplinares ereservandopara os primeiros culares (administrados) sem valores éticos.
acensura da consciência coletiva".
12Cfr. o disposto no artigo Sº do Decreto-Lei nº 4/2015, de 7 de janeiro.
Passados alguns anos, o Executivo veio a revogar aquela Carta, pela Reso-
13A terminologia relativa aos recursos humanos da Administração Pública deixou de prever
lução do Conselho de Ministros nº 47/97, de 22 de março (vide Anexos), os clássicos conceitos de "funcionário público" e "agente administrativo", tendo passado a
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É, desta forma, importante a aprovação que há de ser feita pelo Governo


de um Guia de boaspráticasadministrativas com caráter orientador, mas também
é de questionar se é a instância adequada para o efeito e se a natureza não
vinculativa do futuro diploma não poderá vir a criar ou a ampliar eventuais
conflitos que possam existir entre estruturas da Administração Pública
que não sigam o determinado no Guia de boas práticas administrativas e os
interessados que podem olhar para o diploma, considerando-o inútil por
ser apenas emeramente orientador de práticas administrativas.

1.4. Recomendação
O estudante deve começar por analisar o novo Código do Procedimento
Administrativo, a Lei de autorização legislativa, o respetivo Decreto-Lei
2. Palestra sobre princípios gerais
que aprova o novo CPA, a Carta Ética da Administração Pública e as Resoluções da atividade administrativa
do Conselho de Ministros nº 47/97, de 22 de março, e nº 18/93, de 17 de
março, que se encontram todos publicados como anexos.
SUMÁRIO:
1.5. Exercício formativo Enquadramento geral. O princípio da legalidade. O princípio da prossecução do
a) Diga quais são, de forma genérica, os grandes objetivos que visam interesse público e da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos. A pros-
alcançar os Códigos do Procedimento Administrativo; secução do interesse público. A proteção dos direitos e interesses dos cidadãos.
b) Diga como está estruturado o novo Código do Procedimento Admi- O princípio da boa administração. O princípio da igualdade. O princípio da
nistrativo; proporcionalidade. Os princípios da justiça e da razoabilidade. O princípio da
c) Explique o âmbito de aplicação do novo Código do Procedimento imparcialidade. As garantias procedimentais de imparcialidade. O princípio da
boa-fé. O princípio da colaboração (da Administração Pública) com os particulares.
Administrativo; e
O princípio da participação. O princípio da decisão. O ato tácito. Os princípios
d) Refira-se ao processo de elaboração da Carta Ética da Administração
aplicáveis à administração eletrónica. O princípio da gratuitidade. O princípio da
Pública. responsabilidade. O princípio da administração aberta. O princípio da proteção
dos dados pessoais. O princípiO da cooperação leal com a União Europeia. Reco-
mendação. Exercício formativo.

2.1. Enquadramento geral


A CRP impõe à Administração Pública que esta se guie por alguns princí-
considerar todos como "trabalhadores em funções públicas" (desde a Lei nº 12-A/200S, de
27 de fevereiro, que introduziu a figura da "relação jurídica de emprego público", até à atual- pios estruturantes, dos quais ressaltam, entre outros, o da legalidade, o da
mente vigente Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei nº 35/2014, imparcialidade, o da igualdade, o da proporcionalidade, o da participação
de 20 de junho, que alterou aquela figura para "vínculo de emprego público", o qual com- e o da decisão oportuna como forma de realização do interesse público.
preende a nomeação, o contrato de trabalho em funções públicas e a comissão de serviço, Na decorrência do constitucionalmente estabelecido, existem vários
ainda que todo e qualquer trabalhador da Administração Pública seja isso mesmo, "traba-
lhador"). De referir, no entanto, que o novo CPA, no seu artigo 44º, nº 2, trata de definir o
princípios procedimentais previstos no novo CPA que agora estudaremos.
conceito de "agente". Estes princípios dizem sobretudo respeito à atividade administrativa mas
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não podemos esquecer que a Lei Fundamental consagra, igualmente, prin- "1. A AdministraçãoPública visa aprossecução do interessepúblico, no respeito
cípios que regem a organização da Administração Pública portuguesa e pelos direitos einteresses legalmente protegidos dos cidadãos.
cujo conhecimento é indispensável para podermos compreender, em toda 2. Os órgãos eagentes administrativos estão subordinados à Constituição e
a sua dimensão, a forma de prossecução pública da ação administrativa. à lei e devem atuar, no exercício das suasfunções, com respeito pelos princípios
Faremos, por isso, uma breve referência a esses princípios fundamentais, da igualdade, da proporcionalidade, dajustiça, da imparcialidade eda boa fé':
que estão necessariamente correlacionados com os que respeitam aos
procedimento e atividade administrativos. .. ~ Vejamos, de seguida, os princípios gerais que regem a atividade admi-
A CRP prevê, no artigo 267º, sob a epígrafe Estrutura da AdmznlStraçao, que nistrativa previstos no novo Código e que, atento o disposto no nº 3 do seu
artigo 2º, "C...) são aplicáveis a toda equalquer atuação da Administração Pública,
"1. A Administração Pública será estruturada de modo a evitar a burocra-
ainda que meramente técnica ou de gestão privada".
tização, a aproximar os serviços das populações eaassegurar aparticipação dos
interessados na suagestão efetiva, designadamentepor intermédio de associações
2.2. O princípio da legalidade
públicas, organizações de moradores eoutrasformas de representação ~emocrática.
O artigo 3º, nº 1, do CPA consagra, tal como determina a Lei Fundamen-
2. Para efeito do disposto no número anterior, a lei estabelecera adequadas
taF4, o princípio da legalidade 15 como um dos primeiros princípios a ser
formas de descentralização edesconcentração administrativas, sem preju.ízo ~a
respeitado, no âmbito do procedimento administrativo, ou seja:
necessária eficácia eunidade de ação da Administração edos poderes de dlreçao,
superintendência etutela dos órgãos competentes. "Os órgãos da Administração Pública devem atuar em obediência à lei eao
3. A lei pode criar entidades administrativas independentes. direito C...)".
4. As associaçõespúblicas só podem ser constituídaspara asatisfação de neces-
sidades específicas, não podem exercerfunções próprias das associações sindicais Trata-se, nos nossos dias, de exigir que a Administração Pública respeite
e têm organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e um bloco de vinculação que vai muito para além da lei em sentido restrito.
naformação democrática dos seus órgãos. Fala-se hoje até de um princípio de juridicidade para abarcar realidades mais
5. Oprocessamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que amplas do que apenas a lei e que integram a totalidade da ordem jurídica.
assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e aparticipação Historicamente, podemos afirmar que este princípio veio a ser uma das
dos cidadãos naformação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito. mais importantes conquistas feita ao Estado absoluto, no qual primava,
6. As entidades privadas que exerçam poderes públicos podem ser sujeitas, sobretudo, o princípio da forte arbitrariedade e, por isso, aquele inexistia.
nos termos da lei, afiscalização administrativa': Os órgãos decisores definiam, aleatória e arbitrariamente, o Direito a
aplicar a cada caso concreto mas quase sempre se encontravam colocados
São, como se pode verificar, princípios que dizem respeito, em primeiro acima dele. Podiam derrogar o Direito e, a qualquer momento, criavam
lugar, à forma de organização das Administrações Públicas na ordem jU~í­ ou podiam conceder exceções, sem critério genérico, como se exige em
dica portuguesa, embora tenham direta influência na forma de prossecuçao qualquer ordem jurídica democrática. O monarca definia, quase sempre
da atividade das estruturas que as integram. Deste artigo constitucional unilateralmente, os direitos e o Direito mas encontrava-se, também, o
podemos extrair a relevância de princípios organizatórios fundamentais mais das vezes, acima deleCs). As monarquias absolutistas do ancien régime
como sejam o da desburocratização, o da descentralização e o da descon- consideravam os monarcas isentos do respeito por princípios que hoje
centração administrativas, entre outros. consideramos como essenciais a uma ordem jurídica universal e democrá-
Vejamos, igualmente, o que dispõe a nossa Lei Fundamental, no seu
artigo 266º, sobre os princípios fundamentais da atividade da Adminis- 1. Cfr. o disposto no artigo 266º, nº 2, da CRP.
tração Pública portuguesa. Este normativo refere que 15 Previsto, também, na Carta Ética - Dez Princípios Éticos da Administração Pública.
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tica, embora se considerassem vinculados e limitados, na sua atuação, por Em grande número de monarquias atuais vigentes, os monarcas deixa-
algum Direito, considerado suprapositivo - designadamente, os Direitos ram de governar e os governos passaram a assumir a plenitude dos poderes
(ditos) Divino e Natural-, devendo agir com justiça e em prol do bem executivos, baseados na confiança permanente que devem ter dos seus
comum. Estes critérios deveriam fundamentar o agir do monarca. Mas, parlamentos.
como sabemos, o rei estaria, muitas vezes, acima do Direito criado pelos É, no entanto, no decurso do séc. XX que se vem a consolidar, mais
homens e, nalguns casos, até pelo seu próprio punhoI6 • cedo ou mais tarde, em diferentes países do chamado mundo ocidental, um
Com o surgimento, em toda a sua amplitude, do conceito de Estado de reforço dos direitos dos particulares, consagrados e reconhecidos por via
Direito - e, mais recentemente, do conceito de Estado de Direito democrá- democrática. Acentua-se o papel dos parlamentos no controlo dos atos do
tico, com a exigência de subordinação à lei, geral e abstrata, aprovada pelos governo e o papel dos executivos no governo da res publica.
órgãos representativos dos povos, expressão da vontade da coletividade -, As Constituições e as leis passam a ser títulos jurídicos atribuidores,
deu-se uma mudança extraordinária, que afetou positivamente os meca- entre outros, de importantes direitos sociais. O Estado de Direito demo-
nismos de decisão e de aprovação dos atas dos órgãos de poder público. crático passa a ser Estado social de Direito, que exige a sua intervenção
E deu-se uma viragem histórica, também, na organização das Adminis- na modelação da vida social, onde o mercado liberal é frágil para resolver
trações Públicas mas, sobretudo, nas suas formas de atuar. algumas das dificuldades emergentes.
A Constituição e a lei passam, assim, a ter uma função de garantia dos Também este facto leva ao aumento das estruturas da Administração
direitos e das liberdades dos cidadãos e a estatuir importantes limites à Pública e daí a importância do estudo do Direito Administrativo em geral
atuação dos órgãos públicos de autoridade. Dura e longa foi a luta que e do regime jurídico do procedimento administrativo em particular, que
permitiu alcançar e garantir este património jurídico dos cidadãos adminis- grandemente organiza a forma de atuação, designadamente, dos órgãos
trados. Durante o séc. XIX, as lutas entre liberais e absolutistas permitiram administrativos, pretendendo dar resposta e corresponder às variadas
a evolução num sentido democrático. Lutas que só muitíssimo mais tarde exigências dos cidadãos.
vieram a permitir a consolidação de verdadeiros regimes democráticos em A conjugação e a efetivação do supra invocado princípio da arbitrarie-
que a tutela dos direitos, liberdades e garantias existe verdadeiramente. dade realizavam-se, frequentemente, em estrita união com os princípios
Muitas décadas mais tarde, a CRP veio até a prever o importante poder da centralização e da concentração administrativas, o que dizia bem das
de controlo parlamentar dos atos do Governo e da Administração Pú- características definidoras destes tipos de Estado e de Administração
blica. A total irresponsabilidade dos governantes, característica de certos Pública. Por isso, qualificamos o sistema administrativo17 da época como
tipos de Estados, veio a dar lugar a situações de responsabilidade política tradicional, caracterizado pelos seguintes traços mais marcantes:
junto dos parlamentos e, até, a situações de responsabilidades disciplinar,
- Poder político-administrativo arbitrário e absoluto (quase sem limites);
financeira e criminal.
- Centralização e concentração de poderes no topo da pirâmide da
organização do sistema político;
- Ausência de um verdadeiro e eficaz sistema multidimensional de
1& No entanto, os ministros eram responsáveis perante o monarca e, quando existiam, peran- controlo dos poderes públicos;
te as corres parlamentares. Nos nossos dias, nos sistemas de governo mistos, como o semi-
pre idencialismo, o governo está sob responsabilidade política perante o parlamento e pe-
rante o chefe de Esmdo. Aliás, a referenda ministerial, como aposição da assinatura do chefe
de governo junto dos atos do chefe de Estado, demonstra, de alguma fOm13. (ainda que resi- 17 O conceito de "sistema administrativo" prende-se com os traços essenciais que respeitam
dual), uma corresponsabilização política dos governantes perante o atos da chefia do Esta- à forma de organização da Administração Pública, ao modo como funciona e prossegue a
do - o que, no caso português, ainda se mantém formalmente (cfr. o disposto no artigo 1409 atividade e aos principais institutos e instituições jurídicos que os enformam, como sejam
daCRP). grandes princípios estruturantes e conceitos operativos.
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- Inexistência (total ou quase total) de subordinação à lei por parte da bunais administrativos e onde vigora, em toda a sua plenitude, o referido
classe dirigente; e privilégio de execução prévia, mais ou menos limitado mas sempre de
- Ausência efetiva de um sistema real e eficaz de garantias dos parti- acordo com o legalmente estipulado.
culares. O sistema português é, tendencialmente, de administração executiva
com um poder estadual, por natureza e tradicionalmente, forte, onde
A este sistema administrativo veio a contrapor-se um modelo de sistema existem tribunais próprios e especializados de âmbito administrativ0 21 ,
oposto e que começou por ser dual, por encontrar dois sistemas modernos que integram plenamente o poder judicial e que administram um Direito
com traços comuns mas com alguns aspetos divergentes 18 : (i) o sistema de Administrativo autónomo de onde emerge um privilégio de execução
matriz anglo-saxónica19 e (ii) o sistema de matriz francesa2o . prévia legalmente consagrado mas nos quais se assegura, igualmente, um
Como traços comuns podemos encontrar em ambos, genericamente, amplo e reforçado sistema integrado e multidimensionaP2 de garantias dos
as seguintes marcas: administrados. Importa frisar que o exercício da função administrativa do
Estado está, hoje, submetido plenamente à Constituição, à lei e à função
- Um poder limitado pela lei, que é fronteira (limite) e fundamento
legislativa, quer através do princípio da constitucionalidade dos atos previsto
de atuação; no artigo 3º, nº 3, da CRP, quer atento o disposto, constitucionalmente,
- Uma vinculação rigorosa ao princípio da separação de poderes; no já citado artigo 266º, nº 2. O desempenho administrativo está, ainda,
- Uma descentralização e uma desconcentração de poderes em vários
submetido à função jurisdicional do Estado, atribuída aos tribunais, atento
níveis (geográficos, hierárquicos e funcionais); o disposto no artigo 20Sº, nº 2, da CRP, que determina que "as decisões dos
- Inexistência de zonas de atuação administrativa imunes ao bloco da
tribunais são obrigatóriaspara todas as entidadespúblicas (...) eprevalecem sobre
juridicidade; as de quaisquer outras autoridades".
- Consagração de um amplo e eficaz sistema integrado de monitorização Ora, foi em parte com o surgimento dos Estados Liberal e Constitucional
e de fiscalização da atividade pública; e e com a subordinação dos órgãos decisores à lei do parlamento, tomada
- Existência de um sistema real de garantias dos particulares admi-
como expressão da vontade da coletividade, que os órgãos do Estado se
nistrados. submeteram também a um conjunto normativo, a um bloco prévio de lega-
lidade e de juridicidade, assegurando com isso uma vertente garantística
Evidentemente que encontramos alguns traços que acentuam a dife-
ao sistema político e, essencialmente, aos cidadãos. Do governo de homens
rença de paradigma e eles residem, essencialmente, no seguinte: o sistema
passamos ao governo de leis, da arbitrariedade à legalidade, da subjetividade
de administração judiciária (inglês) assenta a sua conceção na Common
das condutas e das decisões à objetividade legal das soluções, das dispo-
Law e, por isso, sobretudo, numa jurisdição de tribunais comuns e onde sições em função da pessoa à consagração de normas com conteúdo geral
prevalece a ideia de Coroa em detrimento da ideia de Estado. A concre- e abstrato.
tização do (mais à frente estudado) privilégio de execução prévia tem
uma leitura e contornos diferentes dos considerados no sistema francês.
Quanto ao sistema de administração executiva (francês), importa referir
a existência de um poder estadual forte com autonomização do Direito
21 A propósito dos tribunais administrativos, vide o disposto nos artigos 209º, nº 1, alínea b), e
Administrativo, surgindo instâncias jurisdicionais especiais como os tri-
212º da eRP.
22 Pois nele se podem incluir não apenas os vários tipos de garantias dos particulares mas

18Que, em termos gerais e no âmbito da União Europeia, tendem a aproximar-se. também a consagração de exigências para a Administração Pública que se traduzem, verda-
19Ou sistema judiciário ou de administração judiciária. deiramente, em garantias dos particulares, como sejam, entre outras, o dever de fundamen-
20 Ou sistema continental ou de administração executiva. tação dos atos administrativos praticados.
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Nestes termos, a Administração Pública, como um dos corpos especiais muito mais importantes do que a preterição de algumas normas legais
do Estado a que incumbe a prossecução da função administrativa 23, só pode meramente procedimentais. De salientar, desde logo, que a exceção não
agir até (limite) e onde (fundamento) a lei o permitir. Nisto se traduz o comporta aqui, a nosso ver, os casos de simples urgência, embora esta seja,
princípio da legalidade, na sua vertente atual. quase sempre, um dos requisitos para verificação do estado de necessidade.
Podemos, deste modo, afirmar que a lei legitima e é, ao mesmo tempo, Para que possamos enquadrar uma determina situação em estado de
limitadora de toda e qualquer atividade administrativa. necessidade administrativa é necessário observarem-se alguns pressupostos
O princípio tem, assim, uma formulação positiva, já que é fundamento que decorrem, ainda que analogicamente, do regime jurídico geral da
de atuação e da intervenção administrativas, mas, para além disso, é limite figura do estado de necessidade, previsto no artigo 339º do Código Civil, que
de atividade, no que traduz uma formulação negativa. Concluindo, pode- regula este mecanismo no âmbito do Direito Privado, enquanto meio de
mos afirmar que o bloco amplo da legalidade é fundamento e limite de tutela privada. Podemos verificar que da importação desse regime para
atuação de toda a atividade das Administrações Públicas, quer no âmbito o Direito Público e para a figura do estado de necessidade administrativa se
da gestão pública quer no âmbito da gestão privada, que traduzem dois exige a verificação da ocorrência de situações extremamente graves, que
meios alternativos de atuação das estruturas administrativas. se vise remover o perigo atual de um dano manifestamente superior e que
A atuação ao abrigo da gestão pública pressupõe o uso de poderes de as exigências previstas no Código impossibilitem que as medidas admi-
autoridade (ius imperii) em que o Estado ou outra qualquer entidade, de- nistrativas sejam praticadas em tempo oportuno e de modo eficaz para
signadamente, pública, aparece revestido de todos os seus poderes mais salvaguarda de interesses superiores. Deve ainda fazer-se a conjugação com
fortes, atuando ao abrigo do Direito Público. Por outro lado, a atuação das o disposto, no que diz respeito à execução dos atos, no artigo 177º, nº 2,
entidades públicas em mera gestão privada desinveste-as de qualquer reforço do CPA (correspondente ao anterior artigo 151º, nº 1, do CPA revogado).
de autoridade e aparecem, na relação jurídica, em situação de paridade, As estruturas da Administração Pública não ficam, no entanto, desoneradas
como qualquer entidade privada, sem possibilidade de recurso a poderes de respeitar os princípios da proporcionalidade e da adequação de meios,
de natureza pública. Neste caso, a relação jurídica é regulada pelo Direito avaliando, a cada momento, a imperiosa necessidade da ação, que deve ser
Privado e os sujeitos não estão vinculados a qualquer privilégio que os considerada excecional e sempre fundada, exclusivamente, no interesse
diferencie ou hierarquize. °
público, atento disposto no artigo 178º, nº 1, do CPA.
No entanto, são apresentadas algumas exceções a este princípio, de que Nestes casos, o Código prevê a possibilidade, como vimos, de preterição
destacamos o estado de necessidade administrativa 24, também previsto no de algumas regras nele previstas, tomando válidos atos que à partida o não
artigo 3º, nº 2, do novo CPA, que se verifica quando, em situações de urgên- seriam, porque violariam normas previstas legalmente. Compreende-se a
cia e de perigo iminente, os fins não possam ser alcançados no respeito razão de ser desta possibilidade. As situações de estado de necessidade admi-
por toda a tramitação do procedimento administrativo e sejam, por isso, nistrativa são sempre excecionais e as condutas praticadas legitimamente
praticados atos "(...) com preterição das regras estabelecidas (...)" no referido ao seu abrigo visam proteger valores superiores que o legislador entende
Código. Ou seja, o estado de necessidade administrativa vai como que tornar como deverem merecer uma tutela particular. Isso determina que algu-
válidos atos ou operações materiais que à partida o não seriam, porque não mas das regras previstas possam ser afastadas com vista a obter um ganho
respeitariam, em toda a sua plenitude, as disposições legais estipuladas no superior ou prevenir a perda ou a lesão de um direito que se considere
CPA. Tal ocorre porque o legislador tem em vista a salvaguarda de bens aquando do estado de necessidade. Releva notar que se prevê, no CPA,
que a validade dos atos depende de se demonstrar "(...) que os resultados não
13Esta função traduz, genericamente, a exigência de satisfação, de forma regular e pudessem ter sido alcançados de outro modo (...)", ou seja, sem preterição das
contínua, das necessidades coletivas. regras procedimentais, e o direito a indemnização para ressarcir eventuais
14 Vide, por exemplo, situações de calamidade em que se procede à requisição de uma casa
para aí se instalar uma valência de socorro.
danos provocados, decorrentes da atividade pública desenvolvida com
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base e durante o referido estado de necessidade administrativa, como resulta eem matéria de serviço, quando previamente delas tenha reclamado ou exigido
do disposto no artigo 3'1, nº 2, parte final, do CPA. asua transmissão ou confirmação por escrito.
Por outro lado, quanto à atividade interna2S da Administração Pública, 2 - Considerando ilegal a ordem ou instrução recebidas, o trabalhadorfaz
é de referir que, perante uma ordem ilegal manada d superior hierár- expressamente menção dessefacto ao reclamar ou ao pedir asua transmissão ou
quico legítimo ao seu ubalterno pode existir, regra geral, dever jurídico confirmação por escrito.
de obediência e, logo, podemo concluir que a legalidade interna26 tem 3 - Quando a decisão da reclamação ou a transmissão ou confirmação da
algumas especificidades. Assim, o cumprimento destas ordens é também, ordem ou instrução por escrito não tenham lugar dentro do tempo em que, sem
de alguma forma cz~mprimento erespeito pela lei27 , porque esta opta por dar preju(zo, o cumprimento destas possa ser demorado, o trabalhador comunica,
grande importância ao dever legal de obediência que é suporte fundamental também por escrito, ao seu imediato superior hierárquico, os termos exatos da
da hierarquia administrativa 28 • ordem ou instrução recebidas e da reclamação ou do pedido formulados, bem
O enquadramento legal que permite ao subalterno questionar e pedir como a não satisfaçãO destes, executando seguidamente a ordem ou instrução.
esclarecimentos ao seu superior hierárquico, além de estar previsto no 4 - Quando aordem ou instrução sejam dadas com menção de cumprimento
disposto no artigo 271!~ da CRP, que se refere à Responsabilidade dos fim- imediato esemprejuízo do disposto nos n. os 1 e2, acomunicação referida naparte
cionários eagentes, está também referido no disposto no artigo 1779. da Lei final do número anterior éefetuada ap6s a execução da ordem ou instrução.
Geral do Trabalho em Funções Publicas'-9 aprovada pela Lei nº 35/2014 de 5 - Cessa o dever de obediência sempre que o cumprimento das ordens ou
20 de junho, e constante de seu anexo, sob a epígrafe Exclusão da respon- instruções implique aprática de qualquer crime."
sabilidade disciplinar.
Vejamos, em conclusão, o que diz o referido artigo: Por fim, importa assinalar que é do disposto na parte final do n'1 1 do
artigo 3º do CPA que resulta, em abstrato, o mínimo de vinculação legal
"1 - É excluída a responsabilidade disciplinar do trabalhador que atue no de um ato público, designadamente, de um ato administrativo. Assim,
cumprimento de ordens ou instruções emanadas de legítimo superior hierárquico pelo menos a competência e o fim serão sempre elementos legalmente
vinculados e nunca podem resultar do exercício de discricionariedade
::s Aquela que esgota os seus efeitos no interior da própria Admin.istI"aç3.o Públio.
administrativa. No entanto, nos nossos dias, como veremos, muitos outros
:!6Seguindo até princípio diferentes dos que norteiam a atividade administrativa externa.
TT A lei prevê o dever legal de obediência para todas as ordens de legítimo superior hierir- elementos do ato estão juridicamente vinculados, aliás, como determina
quico em ma:t~ria de serviço e desde que não constitUam prática de crimes, admitindo-se o próprio CPA.
constitucionalmente, nos termos do disposto no artigo 2719 , n~ 2, o direito de rcspeitOs.1
representação, através do qual o subalterno pode pedir ao seu superior hierárquico que lhe 2.3. O princípio da prossecução do interesse público e da proteção
transmita ou confirme, consoante os casos, a ordem por escrito, evitando assim eventUais
responsabilidades que lhe possam ser imputadas mas mantendo-se o dever de obediência.
dos direitos e interesses dos cidadãos
O direito de respeitosa representação isenta da responsabilidade mas não desonera o subal- Este princípio da prossecução do interesse públic030 e da proteção dos di-
terno do dever de obediência. reitos e interesses dos cidadãos, para melhor compreensão do seu alcance,
_S A hierarquia administrativa é uma das mais importantes instituições do Direito Adminis-
pode ser estudado nas suas duas vertentes: (i) a da prossecução do interesse
trativo português e traduz um modelo de organização vertical da Administração Pública,
público e (ii) a da proteção dos direitos e interesses dos cidadãos. Vejamos.
esrrururando-a de forma a. que existam vínculos jurídicos entre superiores e subalternos,
como verdadeira cadeia de comando, e onde o superior hierárquico dispõe do poder de con-
trolo, do poder dispositivo da competência e do importante e indispensável poder de dire-
ção, enquanto que o subalterno está vinculado a um dever ju.ddico-legal de obediência.
29 Disposição prevista, anteriormente, no artigo 5J! da Lei n~ 58/2008, de 9 de setembro, que

aprovou o Estatuto disdplinar dOI trabalhador~sque exercemfunções públicas, entretanto revogada. 30 Vide, a propÓsito, o princípio do serviço público previsto na Carta Ética - Dez Prindpios Éti-

O anterior texto do artigo era de igual teor. cos da Administração Pública.


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2.3.1. A prossecução do interesse públic031 público com respeito não só pelos direitos mas também e até pelos inte-
O interesse público é definido, em regra, de forma primária pelos órgãos resses legalmente protegidos dos cidadãos.
políticos do Estado. A definição é, portanto, e por regra, externa à Admi- Interessa, pois, estabelecer uma breve distinção entre a figura dos di-
nistração Pública, impõe-se exogenamente e pode ser variável, em razão do reitos subjetivos e a dos interesses legalmente protegidos.
tempo e da circunscrição territorial. O interesse público pode ser, assim, Quanto aos direitos subjetivos, a lei protege de forma direta e imediata
mutável no tempo e no espaço. Na ação quotidiana das Administrações um interesse próprio de um sujeito de direito, podendo o titular, neste
Públicas, cabe aos órgãos dirigentes avaliar o respeito e o cumprimento caso, exigir da Administração Pública um comportamento que satisfaça
das normas legais bem como do interesse público. positivamente esse mesmo direito. Desta forma, verificamos que o par-
Importa referir que as estruturas administrativas não podem prosseguir ticular tem o direito via legis a uma decisão favorável e a Administração
interesses privados, pelo que se exige que, nos termos do disposto no artigo Pública está adstrita à sua efetivação. Podemos concluir que a lei dá ao seu
4º do CPA, a Administração Pública prossiga sempre o interesse público titular o poder de obter a plena realização do seu direito. Neste caso, se a
da comunidade, previamente definido. Administração Pública indeferir o pedido, essa decisão será ilegal e o ato
Desta forma, se órgãos da Administração Pública emanam atos adminis- administrativo de indeferimento estará ferido de violação de lei.
trativos cujos "motivos principalmente determinantes da sua prática não Vejamos o seguinte exemplo:
condigam com o fim visado na lei para a concessão do poder discricionário", Suponhamos que a lei confere aos estudantes do ensino superior,
estes estão feridos de desvio de poder32 e podem ser agora33 nulos, atento cujo rendimento do agregado familiar seja inferior a lOOO€ mensais,
o disposto no artigo 161º, nº 2, alínea e), do novo CPA, quando o desvio de uma bolsa de estudo no valor de 2S0€.
poder ocorre para fins privados. O "aluno Pt, que reúne os requisitos cumulativos previstos na lei,
Por fim, importa referir que o interesse público não se encontra pela tem um direito subjetivo e pode exigir a referida bolsa de estudo.
mera soma dos interesses particulares e, também por isso, ganha conce- A estrutura da Administração Pública a quem está, legalmente, con-
tualmente autonomia. ferida a competência para decidir tem de conceder a bolsa de estudo,
sob pena de cometer um ato ilegal se proceder ao seu indeferimento
2.3.2. A proteção dos direitos e interesses dos cidadãos34 3S administrativo.
Este subprincípio está previsto, igualmente, no artigo 4º do CPA e
completa a visão global da questão a que atrás se fez referência. Limita Quanto aos interesses legalmente protegidos, têm relevância mas são,
a ação da Administração Pública, o que está em consonância com a natureza no entanto, mais frágeis no confronto com os direitos subjetivos. Embora
personalista e não totalitária do Estado português, visando-se o interesse a tutela sobre aqueles também exista e se faça sentir, o particular só pode
exigir que a Administração Pública respeite a legalidade mas já não tem
direito a uma decisão favorável- quanto muito, pode impor que as estru-
31Prevista no artigo 266 2 , n~ 1, da CRP. turas administrativas, perante situações iguais, as tratem de forma idêntica.
32 Anterionnente, a definição deste vício constava do disposto no artigo 19º, § único, da Lei O seu titular pode exigir que não seja ilegalmente prejudicado e que o seu
Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo, aprovada pelo Decreto-Lei nº 40768, de 8 interesse seja respeitado.
de setembro de 1956, entretanto revogado pela Lei n 2 15/2002, de 22 de fevereiro, que apro-
Vejamos, também aqui, um exemplo:
vou o novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
33 No anterior CPA, quaisquer atas feridos de desvio de poder eram anuláveis, nos termos Suponhamos agora que a lei prevê que aos alunos que frequentem o
gerais. ensino superior, e nas mesmas condições do exemplo anterior, poderá
34 Prevista no artigo 266 2 , n 2 1, da CRP.
35 Este princípio não diz apenas respeito aos cidadãos nacionais mas também, entre outros,
a Administração Pública conceder bolsas de estudo até ao montante
aos estrangeiros, aos apátridas e às pessoas coletivas. de2S0€.
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Neste exemplo a Administração Pública não está obrigada a conce- nas decisões da Administração Pública e a possibilidade de obtenção de
der a bolsa de estudo e pode conferir o subsídio em montante variável, decisões ótimas, com os melhores resultados e com os menores custos.
desde que dentro dos limites legais. Este princípio tem, por exemplo, reflexo imediato no que dispõe o artigo
Cada aluno tem um interesse legítimo em que a Administração 99º do Código, quando exige uma "(...) ponderação dos custos ebenef{cios das
Pública não viole o bloco de legalidade edejuridicidade. Nem todos os estu- medidas projetadas (...)" sobre regulamentos a aprovar, e no que estipula
dantes terão direito a uma decisão favorável e a Administração Pública o artigo 59º do CPA, quando impõe às estruturas com competência para
poderá conceder bolsas de montantes diferentes. Os particulares devem decidir ou intervir nos procedimentos administrativos um dever legal
conhecer, no entanto, previamente os critérios de decisão. de celeridade. Aqueles critérios estão, igualmente, relacionados com a
Pode apenas exigir-se que as estruturas administrativas tratem de eliminação da lentidão dos serviços, tornando os procedimentos menos
forma igual situações iguais. complexos e redundantes, devendo encontrar-se, a todo o tempo, novas
formas de simplificação administrativa que promovam, também, decisões
2.4. O princípio da boa administração céleres.
O legislador veio, pela primeira vez, no CPA, autonomizar o princípio da Desta forma, são critérios de atuação administrativa, previstos no artigo
boa administração, obrigando agora a que, nos termos do disposto no seu 5º, nº 1, do CPA, (i) a eficiência, (ii) a economicidade e (iii) a celeridade,
artigo 5º, nº 1, a Administração Pública paute a sua atuação por importantes e se estes critérios não forem respeitados pelos órgãos da Administração
critérios de eficiência, economicidade e celeridade. Estes critérios foram Pública os atos por eles praticados (ou omitidos) serão ilegais e, conse-
há muito adotados pela legislação financeira vigente no País e permitem quentemente, inválidos.
que o Tribunal de Contas possa emitir juízos críticos e sancionatórios sobre Como veremos também a propósito do princípio da razoabilidade, o
a atuação de um conjunto muito diversificado de órgãos e serviços com legislador pode ter encontrado, ainda que inadvertidamente, ao consa-
capacidade de aprovação de atos com expressões financeira e orçamental. grar estes princípios, um mecanismo que pode possibilitar ao tribunais
Alguns destes critérios encontram os seus plenos conteúdo e âmbito nou- administrativos a apreciação do mérito das decisões administrativas, o
tras ciências que não o Direito. A ciência jurídica recorre, muitas vezes, que sempre esteve afastado dos poderes de cognição do poder judiciário,
a conceitos muito técnicos que têm de ser preenchidos por outras áreas do aliás como decorre do disposto no artigo 3º, nº 1, do C6digo de Processo nos
saber. Para além disso, o novo CPA vem impor estes critérios, agora de Tribunais Administrativos (CPTA).
forma expressa, obrigando a uma organização público-administrativa não
burocratizada e próxima das populações, de acordo com o estipulado no 2.5. O princípio da igualdade37
artigo 5º, nº 2, do CPA. Previsto, agora, no artigo 6º do CPA (correspondendo ao antigo artigo 5º
Os anteriores princípios da desburocratizaçã036 e da eficiência, previstos do Código revogado), o princípio da igualdade38, agora autonomizado, deve
autonomamente no então artigo 1Oº do CPA revogado, vieram dar origem ser visto enquanto disposição que determina que todos são iguais perante
a um mais amplo princípio da boa administração, agora regulado, como se a lei e que proíbe qualquer discriminação arbitrária e preconceituosa que
disse, no artigo 5º do CPA, e são dele corolários. se possa basear, entre outros, em critérios de sexo, raça, língua, território
Este princípio também se pode concretizar, nomeadamente, com a de origem, orientação sexual, etnia, ou religião para fundamentar opções
desconcentração e a descentralização administrativas e com a aproximação ou decisões administrativas.
dos decisores aos administrados e tem em vista uma maior racionalidade

J6A propósito da modernização administrativa dos serviços e dos organismos da Administra- J7 Também previsto na Carta Ética - Dez Prindpios Éticos da Administração Pública.
ção Pública, vide, entre outros, o Decreto-Lei nº 135/99, de 22 de abril. J8 A este propósito, cfr. o disposto no artigo 13º da CRP.
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o artigo 6º veio assim, por força da Lei de autorização legislativa, dar caso disso), para que exista e se encontre alguma relação de proporção e
maior densidade ao princípio da igualdade, de modo a que a Administração de equilíbrio entre os danos que se antecipe possam causar e a natureza e
Pública não possa privilegiar, beneficiar, prejudicar ou privar ninguém de o valor dos bens que se querem proteger; entre os custos que se podem ou
qualquer direito, agora também em razão da sua orientação sexuaP9. vão verificar e os benefícios que se vão obter com a conduta administrativa.
O princípio da igualdade não se confunde, no entanto, com o da não Nem sempre é, temos de reconhecer, um exercício fácil de ser cumprido,
discriminação mas este não deixa, de alguma forma, de ser corolário da- sobretudo quando há uma necessidade de intervenção operacional das
quele e de estarem ambos intimamente relacionados. Forças e Serviços de Liberdade e Segurança, porque se lhes exige uma
Deste normativo resulta, por consequência, a proibição de (i) privilégios, grande capacidade de resiliência, de resistência e de formação jurídica
(ii) benefícios, (iii) prejuízos, (iv) privação de direitos ou de (v) isenção indispensável para se compreenderem os limites impostos pela lei e a
de deveres, que advenham ou assentem nos critérios atrás referidos e que, forma de melhor exercer a atividade (coerciva) policial.
agora, estão elencados no já referido artigo 6 Q do CPA. Assim, podemos concluir que deste princípio resulta a opção pela
Os diferentes órgãos das Administrações Públicas, ao atuarem, não proibição do excess041 e pela ponderação e adequação de meios a utilizar.
podem nortear-se por critérios distantes dos previstos legalmente, embora Este princípio é cada vez mais importante e aplica-se sobremaneira ao
por vezes, para que haja realização plena do princípio da equidade, sejam uso legítimo da força pública, designadamente pelas já referidas Forças e
necessários tratamentos distintos, atendendo às circunstâncias particula- Serviços de Liberdade e Segurança, sobretudo quando atuam ao abrigo
res dos casos concretos. A desigualdade de tratamentos não poderá, no legítimo do privilégio de execução prévia (que à frente estudaremos), que
entanto, ser discriminatória ou, de qualquer outra forma, violadora da lei, é uma manifestação do exercício democrático do uso da força coerciva
havendo de ser sempre fundamentada de modo a que possa ser sindicada para implementação de decisões administrativas. O legislador opta por
pelos interessados e até contrariada, quando for caso disso. considerar a proporcionalidade como um princípio estruturante de todo
o procedimento administrativo, procurando que a Administração Pública
2.6. O princípio da proporcionalidade se sinta vinculada a encontrar, no âmbito da sua ação, um justo equilíbrio
Quanto ao teor do princípio da proporcionalidade40 , significa afirmar que tendencialmente otimizado: o menor prejuízo possível causado aos direitos
as medidas administrativas devem ser adequadas, proibindo-se o excesso, dos particulares, com repercussão na sua esfera jurídica, em vista a salva-
optando-se por um equilíbrio entre os meios e os efeitos ou resultados a guardar o interesse público e os limites impostos na ação determinada por
obter. Aliás, isso mesmo resulta do disposto no artigo 7 Q , n Q 1, do CPA, ato administrativo prévio e não respeitado. Digamos, em conclusão, que
quando esta norma impõe que os órgãos da Administração Pública de- o legislador não deixou este aspeto ao livre exercício discricionário e ao
vam "(...) adotar os comportamentos adequados aosfins prosseguidos (...)", o que arbítrio das estruturas administrativas públicas, considerando-o um ele-
significa, uma vez mais, a exigência de estreita e direta ligação entre fins mento legalmente vinculado. Deste modo, qualquer violação ao princípio
legais e utilização de meios adequados para os alcançar. Digamos, em sín- °
da proporcionalidade invalida, nos termos legais, ato, qualquer que seja
tese, que a proporcionalidade deve ser conjugada com a necessidade de a sua natureza, ou a conduta praticada, por exemplo, no decurso de uma
intervenção e com a adequação dos meios e da força a utilizar (quando for execução administrativa.
°
Para além da ponderação e da adequação, legislador faz ainda menção,
39 A orientação sexual está expressamente consagrada pelo legislador como potencialmen- quando a atuação administrativa colida "(...) com direitos subjetivos ou interesses
te violadora do princípio da igualdade. Pese embora o anterior CPA não consagrar expres-
samente esta referência, ela era já tacitamente aceite até por imposição constitucional (efr.
artigo 13", nº 2, da CRP, na redação atual conferida pela revisão constitucional de 2004~. ..I Ou seja, os diferentes órgãos administrativos devem amar de forma a causar o menor nú-
40 Consagrado constitucionalmente, no artigo 266º, nº 2. Também previsto na Carta Etica- mero de danos aos direitos dos particulares, não devendo imputar-se na esfera do particular
Dez Princípios Éticos da Administração Pública. danos para além do estritamente necessário.
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legalmenteprotegidos dosparticulares (...)", da exigência de que essas posições 2.8. O princípio da imparcialidade
dos cidadãos só possam ser afetadas na estrita medida do necessário para A imparcialidade a que estão vinculadas todas as estruturas orgânicas da
alcançar os objetivos a realizar, como decorre expressamente do nº 2 do Administração Pública determina que o tratamento dado aos particula-
artigo 7º do CPA. Deste modo, podemos afirmar que, na prossecução do res deve ter em conta o interesse público e os critérios previstos na lei,
interesse público, o princípio da proporcionalidade impõe, cumulativa- independentemente das posições pessoais dos titulares dos cargos públi-
mente, (i) adequação e (ii) necessidade de ação, ou seja, exigibilidade da cos, sendo que, nomeadamente, os órgãos administrativos são terceiros
conduta - no fundo, um justo equilíbrio entre os bens a salvaguardar, o relativamente aos interessados, devendo no seu agir ser justos, isentos e
interesse público (fim último e critério único que preside à atuação pú- imparciais. Proíbe-se a parcialidade de tratamentos e fomenta-se a isenção
blica) e os meios a utilizar. No caso do uso da força pública, é importante administrativa e a objetividade da decisão, atento o teor do previsto no
atender sobretudo à intensidade da coaçãofísica e ao modo como a mesma artigo 9º do CPA.
é exercida e aplicada. Tendo em atenção tal proibição, o legislador entendeu consagrar um
conjunto privativo de algumas garantias procedimentais de imparcialidade
2.7. Os princípios da justiça e da razoabilidade que assegurasse, em concreto, de forma direta e imediata, a plena realização
A efetivação da justiça faz-se pela conjugação de diferentes princípios pro- deste importante princípio e pudesse corresponder ao previsto na parte
cedimentais, embora o CPA tenha entendido autonomizar este princípio, final do referido artigo, ou seja, "(...) à preservação da isenção administrativa
conjugando-o agora com o da razoabilidade, em vez de o fazer com o da e à confiança nessa isenção".
imparcialidade (como sucedia anteriormente) e, por isso, se exige que na
atuação dos órgãos da Administração Pública se deva atender a todos os 2.8.1. As garantias procedimentais de imparcialidade
interesses juridicamente relevantes para a boa decisão do processo. Nessa Tendo em linha de conta o que dissemos até agora, em matéria de princí-
medida, o artigo 8º do CPA refere agora que pios procedimentais, em geral, e quanto ao princípio da imparcialidade,
em particular, importa assinalar que o CPA consagra algumas importantes
"A Administração Pública deve tratar deforma justa todos aqueles que com garantias de imparcialidade, no âmbito dos procedimentos administrativos,
ela entrem em relação, e rejeitar as soluções manifestamente desrazoáveis ou dando assim execução prática à ideia de proibição de quaisquer favoritismos
incompatíveis com a ideia de Direito (...)". ou de quaisquer discriminações arbitrárias e contrárias à lei. É, podemos
afirmar, um conjunto de garantias privativas que tutelam, especificamente,
Deste modo, o referido artigo 8º do Código impõe, claramente: (i) o princípio da imparcialidade.
tratamento justo e (ii) rejeição de soluções manifestamente desrazoáveis
Com base nesta ideia, veio ainda a proibir-se a decisão pelos órgãos
ou incompatíveis com a ideia de Direito (e de justiça). administrativos em matérias que lhes digam direta ou indiretamente
Pese embora tratarem-se de conceitos vagos e indeterminados mas que
respeito e, bem assim, a um conjunto de pessoas que lhes estão próximas,
são concretizáveis, o legislador não deixa de dar pistas de molde a que, pelo designadamente por laços de família 42 •
menos por interpretação sistémica, se perceba o sentido e o alcance dos Estas garantias procedimentais de imparcialidade são, atento o disposto
critérios agora exigíveis para uma boa tomada de decisão administrativa.
nos artigos 69º e seguintes do CPA, essencialmente três:
Mas o que nunca pode acontecer é permitir que os tribunais possam exer-
cer a sua jurisdição sobre o mérito das decisões administrativas porque, - O impedimento;
por regra, a questão da razoabilidade seria de apreciação exclusiva pela
Administração Pública. A interpretação a fazer deste preceito deve ser 42 A propósito das fontes de relações jurídicas familiares, vide o disposto no artigo 1576" do
exigente, cautelosa e restritiva. ° °
Código Civil, que refere: "São fontes das relações jurídicasfamiliares casamento, parentesco, a
afinidade ea adoção".
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- A escusa; e "Sob pena das sanções cominadas pelos n."S 1 e 3 do artigo 76!!, não pode
- A suspeição. haver lugar, no âmbito do procedimento administrativo, àprestação de serviços
de consultoria, ou outros, afavor do responsável pela respetiva direção ou de
Quanto aos casos de impedimento, estão taxativamente previstos no quaisquer sujeitos públicos da relação jurídica procedimental, por parte de en-
disposto no artigo 69º do CPA (correspondente ao anterior artigo 44º do tidades relativamente às quais se verifique qualquer das situações previstas no
CPA revogado) e, com esta garantia, existe uma proibição legis, direta e n!! 1, ou que hajamprestado serviços, há menos de três anos, aqualquerdos sujeitos
imediata, de intervenção do titular em procedimento administrativo, em privadosparticipantes na relaçãojurídica procedimentaL:'
ato ou em contrato de Direito Público ou Direito Privado, sob pena de
aplicação de sanções, nos termos do artigo 76º, n.O 1 a 3, do CPA. S
O nº 5 estipula, em sequência, um dever de comunicação imediata, por
O nº 1do referido artigo 69º do Código é esclarecedor quando afirma que parte da entidade prestadora de serviços, ao responsável pela direção do
procedimento, quando ocorra, naquele âmbito, qualquer facto superve-
"(...) os titulares de 6rgãos da Administração Pública eos respetivos agentes, niente, cessando obrigatória e imediatamente a sua atividade.
bem como quaisquer outras entidades que, independentemente da sua natureza, O regime jurídico-procedimental do impedimento está consagrado nos
se encontrem no exercício de poderes públicos, não podem intervir em procedi- artigos subsequentes 44, aí se prevendo a forma como se deve proceder para
mento administrativo ou em ato ou contrato de direito público ou privado da arguir e declarar esse impedimento e os efeitos das respetivas arguição e
Administração Pública, nos seguintes casos (...) ': declaração, quando estas ocorram.
Sucintamente, podemos afirmar que, quando se verifica uma qualquer
A proibição de intervenção dos titulares, designadamente, ~os ór~ãos situação de impedimento, a questão deve ser imediatamente colocada ao
da Administração Pública, mas não apenas destes, nos casos ali preVIstos órgão competente para dela conhecer, nos termos do disposto no artigo
e enumerados43, importa reforçar, é direta e imediata. Se ocorrer a inter- 70º, n.O 1 e 2, do CPA (parcialmente correspondentes ao anterior artigo
S

venção do titular impedido no procedimento administrativo, o ato ou o 4Sº, nº 1, do CPA revogado). Está, por isso, consagrado um dever expresso
contrato, por ele praticado ou em cuja deliberação haja intervindo, se for de comunicação. Existindo superior hierárquico, a comunicação deve ser-
membro de órgão colegial e este haja deliberado, são inválidos, atento o -lhe dirigida, mas se se tratar de um membro de órgão colegial, a questão
disposto no artigo 76º, nº 1, do CPA. _ deve ser apresentada ao presidente do órgão. Tratando-se de impedimento
O nº 2 do mesmo artigo 69º, nas suas três alíneas, elenca as intervençoes do próprio presidente e como caberá ao órgão colegial deliberar sobre o
relativamente às situações excecionais que, legalmente, são admissíveis. incidente sem a sua presença, naturalmente que a comunicação deve ser
Estas situações, por razões diversas, não colocam em crise a imparcialidade dirigida ao plenário do respetivo órgão, atento o disposto no artigo 70º,
exigida, por se tratarem, por exemplo, de meras intervenções certificatórias nº 5, doCPA.
(cfr. alínea a) do referido nº 2). Deve atender-se, ainda, ao consagrado no nº 2 do mesmo artigo 70º,
Por outro lado, importa assinalar a exigência, agora prevista no nº 4 do que se refere às situações fora do âmbito da hierarquia administrativa ou
mesmo artigo, que impende sobre as entidades prestadoras de serviços no da de membros de órgãos colegiais. Assim, a referida norma estipula que
âmbito de procedimentos administrativos, de "(...) juntar uma declaração a comunicação deverá ser efetuada junto de "(...) quem tenha opoder de
de que se não encontram abrangidaspela previsão do número anterior', dado que, proceder à respetiva substituição (...)".
atento o teor desse referido nº 3

43 As alíneas a) a f) do n~ I do artigo 69~ (correspondentes às antigas alíneas a) a g) do n~ I do .... Vide o disposto nos artigos 70~ a 72º do ePA (correspondentes aos anteriores artigos 4S~ a
artigo 44~ do ePA revogado) estipulam estes casos. 47º do ePA revogado).
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Por outro lado, importa referir que "(...) qualquer interessadopode requerer revogado). Assim, nos termos do disposto no nº 1, tratando-se de um órgão
a declaração do impedimento (...)", "(...) até ser proferida a decisão definitiva ou singular, ressalvado o poder de avocaçã0 45 pelo órgão competente, e
praticado oato (...)", de acordo com o previsto no nº 3 do mesmo artigo,
fundamentando o seu pedido e invocando "(...) as circunstâncias de facto' "Declarado o impedimento, é o impedido imediatamente substituído no
que constituam asua causa". Tratam-se aqui, evidentemente, de factos que procedimento pelo respetivo suplenté6 ( •••)".
o Direito entende que são causa de impedimento legal.
A decisão para conhecer e declarar o impedimento compete ao superior Tratando-se, porém, de um membro de órgão colegial, este funciona
hierárquico ou ao presidente do órgão colegial, "(...) ouvindo, se considerar nos termos do nº 2 do mesmo artigo, ou seja, sem o membro declarado
necessdrio, otitular do órgão ou agente (...)", atento o disposto no nº 4 do artigo impedido, se não existir ou não puder ser designado suplente.
70ºdo CPA. No caso de o titular impedido participar no procedimento (logo, em
A arguição do incidente de imPedimento tem como efeito imediato a sus- incumprimento das garantias procedimentais de imparcialidade), os atos
pensão do respetivo titular da intervenção no procedimento administrativo, administrativos praticados ou os contratos celebrados são anuláveis, nos
conforme estipulado no nº 1 do artigo 71º do Código, salvo determinação' termos gerais, atento o disposto no artigo 76º, nº 1, do CPA (correspon-
em contrário de quem tenha competência para proceder à substituição, dente ao anteriormente disposto no artigo 51º, nº 1, do CPA revogado) e
podendo, no entanto, praticar atos com carácter de urgência, de forma a sobre o próprio titular poderá recair uma sanção subjetiva, como resulta
assegurar o interesse público, nos termos do disposto no nº 2 do mesmo do estipulado no nº 2 do mesmo artigo (correspondente ao anterior artigo
artigo. Importa assim referir que sobre os eventuais impedidos recai um 51º, nº 2, do Código revogado), ou seja
dever de suspensão que, necessariamente, há de ser cumprido. A suspen- "A omissão do dever de comunicação aque alude on!! 1 do artigo 70!!constitui
são deve ocorrer aquando da comunicação feita pelo eventual impedido faltagrave 47 para efeitos disciplinares."
ou logo que este tenha conhecimento que o incidente (de impedimento)
tenha sido suscitado por qualquer interessado, de acordo com consagrado De todo o modo e neste âmbito do normativo sancionatório, importa fazer
no nº 1 do mesmo artigo. Ainda assim, devem os eventuaisfuturos impedidos ainda referência ao disposto no nº 3 do artigo 76º do CPA, que estipula que
tomar todas as medidas que, excecionalmente, cumpram os requisitos da
(i) inadiabilidade, desde que em casos de (ii) urgência ou de (iii) perigo. , "A prestação de serviços em violação do disposto nos n. os 3 a 5 do artigo 69!!
Estes atos serão, no entanto, posteriormente submetidos a ratificação, constitui oprestador no dever de indemnizar aAdministração Pública eterceiros
se e quando a substituição ocorrer, de acordo com o mesmo normativo. de boa-fépelos danos resultantes da anulação do ato ou contrato."
A ratificação é, como veremos, um ato administrativo secundário.
Importa referir que a suspensão de exercício de funções decorre até à , Relativamente à escusa e à suspeição, os seus fundamentos estão regu-
decisão definitiva e final sobre o incidente do impedimento, ou seja, se o : lados no artigo 73º do ePA (correspondente ao anterior artigo 48º do ePA
mesmo for declarado, a suspensão converte-se em afastamento definitivo: revogado). Aqui, ao contrário do impedimento, não existe uma proibição
do procedimento, do ato ou do contrato, por parte do titular originaria- : direta e imediata de participação no procedimento administrativo.
mente competente, mas, ao invés, se a decisão for de não procedência do Ambas as figuras têm os mesmos fundamentos, contudo, no primeiro
impedimento, cessará imediatamente a suspensão e o titular reassume a ' caso, o pedido de escusa é formulado pelo próprio titular do órgão, com
totalidade dos seus poderes legais, no âmbito do procedimento adminis- J base na ocorrência, designadamente, de alguma das situações previstas nas
trativo, do ato ou do contrato em concreto.
Por outro lado, temos os efeitos da declaração do impedimento previstos i 45 Traduz-se na faculdade de chamar a si a resolução do processo.
46 Anteriormente, fazia-se referência ao substituto legal.
no artigo 72º do Código (correspondente ao anterior artigo 47º do Código! 47 Sublinhado nosso.
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diferentes alíneas do nº 1do referido artigo, de modo que se pode suspeitar, e 50º do Código) e seguem, com as necessárias adaptações, as regras que
em termos de imparcialidade, de isenção ou de retidão de conduta da sua já vimos anteriormente e que se aplicam na situação do impedimento.
intervenção no procedimento administrativo. Para que o pedido proceda, Aliás, nalguns casos, o regime é, até, diretamente remissivo, como acontece,
é necessário a verificação do requisito substantivo previsto no corpo do por exemplo, com o disposto no artigo 75º, n.O 1 e 3, do CPA.
S

nº 1do artigo 73º do CPA, que "(...) ocorra circunstância pela qualsepossa com Decorre do regime jurídico agora em vigor que o pedido há de ser apre-
razoabilidade duvidar da imparcialidade da sua conduta ou decisão (...)" e que, sentado, de acordo com O estipulado no artigo 74º, nº 1, do CPA, à entidade
nomeadamente, se preencha o conteúdo normativo de alguma das alíneas competente para dele conhecer e que o mesmo deve inequivocamente
do referido nº 1 (que são, como vimos, meramente ilustrativas, porque indicar, de forma expressa e com precisão, as razões que fundamentam o
podem existir outros exemplos que coloquem em causa a imparcialidade incidente da escusa ou da suspeição. O pedido de escusa, e apenas este,
que estas garantias tutelam de forma direta e imediata e que aqui não não tem de ser reduzido a escrito, como decorre do nº 2 do mesmo artigo, a
estejam expressamente referidas). Assim, a disposição prevista no nº 1 menos que seja determinado pela entidade competente. No entanto, se se
consagra o pressuposto primário que se há de verificar ou seja, o elemento tratar de suspeição deduzida por interessado, deve a mesma ser reduzida
factual substantivo que se traduz na tal circunstância que pode ocorrer e a escrito, nos termos gerais, c ser promovida, pelo órgão competente, a
que permite instalar-se uma dúvida razoável sobre a isenção da conduta audição do titular do órgão ou do agente visado, atento o previsto no nº 3
da estrutura interveniente. Os pressupostos secundários adjetivam e com- do referido artigo 74º do Código.
plementam aquele pressuposto e estão elencados, como se disse já, nas Importa, ainda, assinalar que o CPA impõe o prazo de oito dias para
diferentes alíneas, que assumem uma natureza meramente exemplifica- ser proferida decisão final sobre o incidente, conforme disposto no seu
tiva. Se verificarmos, o corpo do nº 1 do artigo 69º do CPA refere, literal e artigo 75º, nº 2.
taxativamente, "(...) nãopodem intervir (...) nos seguintes casos (...)", enquanto No que respeita ao teor do disposto no artigo 76º do CPA, falta, por
que o corpo do artigo 73º do Código adota uma formulação radicalmente fim, fazer referência ao estipulado no nº 4. Aí se prevê que
distinta, quando afirma que "(...) devem pedir dispensa (...) designadamente
(...)" nos casos logo a seguir elencados. "A falta ou decisão negativa sobre a dedução da suspeição não prejudica a
Quanto ao segundo caso, o da suspeição, os fundamentos são os mes- invocação da anulabilidade dos atos praticados ou dos contratos celebrados,
mos que estão previstos no já referido artigo 73º, nº 1, do CPA4 8, mas a quando do conjunto das circunstâncias do caso concreto resulte a razoabilidade
distinção com a figura anterior faz-se pelo facto de a suspeição ser oposta
de dúvida séria sobre aimparcialidade da atuação do órgão, revelada na direção
ou deduzida pelo particular, atento o teor do artigo 73º, nº 2, do CPA,
do procedimento, na prática de atos preparatórios relevantes para o sentido da
enquanto que o pedido de escusa é apresentado, como verificámos, pelos
decisão ou na própria tomada da decisão."
próprios titulares de órgãos da Administração Pública e respetivos agentes,
bem como quaisquer outras entidades que, independentemente da sua Aliás, a possibilidade aqui atribuída de invocação de eventual anulabi-
natureza, se encontrem no exercício de poderes públicos, de acordo com lidade dos atas praticados, mesmo tendo havido ausência de dedução de
o disposto no nº 1 do mesmo artigo. suspeição ou quando a mesma haja sido oposta mas tenha sido proferida
O regime jurídico (designadamente, as formalidades do pedido e da decisão de rejeição, parece decorrer do regime geral e aquela invalidade,
decisão final sobre a escusa ou a suspeição) constam agora do disposto a existir, há de ser necessariamente demonstrada e provada.
nos artigos 74º e 75º do CPA (correspondentes aos anteriores artigos 49º Importa, igualmente, fazer referência ao facto de poder acontecer
que o impedimento seja do titular, último superior hierárquico de uma
determinada estrutura administrativa e, nesse caso, devemos atender às
48Este é, como vimos, um preceito aberto e exemplificativo, podendo ocorrer outras situa- regras gerais da organização administrativa e, designadamente, aos poderes
ções que permitam fundamentar a escusa ou a suspeição.
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organizatórios do governo, enquanto órgão superior da Administração exigida. Esta cooperação deve ir para além (i) da prestação das informações
Pública ou, quando disso for caso, aos mecanismos de substituição que e esclarecimentos aos particulares e fomentar (ii) o apoio e estímulo às
podem ocorrer dentro do próprio executivo e que decorrem, quer gene- suas iniciativas e (iii) a receção das suas sugestões e informações, atento
ricamente da CRP quer especificamente de cada lei orgânica do governo. o disposto no artigo llº, nº 1, do CPA.
De notar que, conforme disposto no artigo llº, nº 2, do CódigoS!, os órgãos
Agora que analisámos o conjunto privativo das garantias que tutelam, da Administração Pública são responsáveis pelas informações prestadas
de forma direta e imediata, o princípiO da imparcialidade, voltemos a estu- por escrito aos particulares, ainda que não obrigatórias.
dar os restantes princípios gerais que regulam a atividade administrativa.
2.11. O princípio da participação
2.9. O princípiO da boa-fé O princípio da participação está intimamente relacionado com o princípio
Este princípi049 , estabelecido agora no artigo 1Oº do novo ePA (e corres- anteriormente estudado e ambos se baseiam no estruturante princípio
pondente ao anteriormente previsto no artigo 6º-A do CPA), é estruturante democrático, que enforma a Constituição administrativa portuguesa.
de toda a ordem jurídica portuguesa e pode mesmo considerar-se um Tem previsão no disposto no artigo 12º do CPA (correspondente ao antigo
princípiO geral de Direito. Deve conjugar-se, entre outras, com a exigência artigo 8º do ePA revogado).
que determina que a Administração Pública proceda a um rápido eeficaz Podemos considerá-lo, como vimos, um corolário e, ao mesmo tempo,
andamento do procedimento, promovendo tudo oquefor necessário ao seguimento uma manifestação do princípio democrático e do princípio da intervenção,
do procedimento e àjusta eoportuna decisão, e que impõe aos interessados um caracterizadores da cidadania ativa e participativa. O direito de participação
dever de colaboração para oconveniente esclarecimento dosfactos ea descoberta pode ser, ainda, invocado por associações na defesa de interesses próprios
da verdade. ou na defesa de interesses difusos da coletividade.
A atuação das estruturas da Administração Pública deve pautar-se por Por força deste princípio, vamos encontrar diversas manifestações de
critérios de confiança, de lealdade e de veracidade, e as relações jurídicas participação nos procedimentos administrativos, por parte dos particula-
estabelecidas devem assentar na boa-fé mútua, de modo a assegurar, nos res, de interessados e, até, de associações de defesa de interesses coletivos
termos do estipulado no nº 2 do artigo 1Oº do CPA, "(...) a confiança susci- ou difusos.
tada na contraparte pela atuação em causa e o objetivo a alcançar com a atuação Nalguns casos, o CPA prevê a obrigatoriedade de a Administração
empreendida". Pública solicitar as participação ou intervenção no procedimento adminis-
trativo. São exemplos de manifestações da obrigatoriedade da participação
2.10. O princípio da colaboração (da Administração Pública) com a exigência de audiência dos interessados (cfr. artigos 121º e seguintes do
os particulares CPA) e de audição pública (cfr. artigos 100º e 101º do ePA) no processo
Previsto, atualmente, no artigo llº do CPA (correspondente ao anterior de formação dos atos e regulamentos administrativos, respetivamente.
artigo 7º do CPA revogado), este princípioso está intimamente relacionado Nestes casos, podem os particulares dizer o que se oferecer sobre futuras
com o da participação dos particulares e obriga a um estreita colaboração decisões administrativas.
com todos os administrados. Exige-se que os órgãos e os serviços públicos É de tal modo importante para o legislador a participação dos admi-
atuem em estreita cooperação com os diferentes intervenientes procedi- nistrados que a não verificação daquelas exigências legalmente impostas
mentais e que lhes prestem, designadamente, aos particulares, a colaboração acarreta, muitas vezes, a invalidade formal das decisões tomadas.

49 Também previsto na Carta Ética - Dez Princípios Éticos da Administração Pública.


50 Também constante da Carta Ética - Dez Principias Éticos da Administração Pública. 51 Correspondente ao anterior anigo 79 , n 9 2, do CPA revogado.
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2.12. O princípio da decisão "(...) podem decidir sobre coisa diferente ou mais ampla do que apedida,
O artigo 13º do CPA (correspondente ao antigo artigo 9º do CPA revo- quando ointeresse público assim oexija:'
gado) diz-nos quando existe dever legal de decisão, ou seja, quando é que
as diferentes estruturas administrativas estão juridicamente vinculadas à • Isto permite que a Administração Pública não fique sujeita ao pedido, o
resolução dos assuntos que lhes são apresentados. A regra geral prevê que que significa que quando o interesse público o impuser pode ir para além
daquilo que é solicitado pelos interessados sem que estes se possam opor
"Os 6rgãos da Administração Pública têm odever de sepronunciarsobre todos ao alargamento do que foi fixado no pedido ou a uma decisão diferente
os assuntos da sua competência que lhes sejam apresentados (...)". ' daquela que havia sido requerida. Pese embora esta possibilidade apenas
poder ocorrer verificado o requisito substantivo da exigência do interesse
o mesmo artigo, cujo nº 1é meramente exemplificativo, vem referir, no público, não deixa de permitir uma larga margem de liberdade aos titulares
número seguinte, as situações em que, verificando-se os pressupostos aí de poderes públicos decisórios.
previstos, inexiste o referido dever jurídico de decisão. Assim, nos termos
do disposto no nº 2 do mesmo artigo 2.12.1. O ato tácito
52
"Não existe o dever de decisão quando, há menos de dois anos, contados da Genericamente, o ato tácito resulta do silêncio da Administração Pública,
data da apresentação do requerimento, o6rgão competente tenha praticado um . da sua omissão e da não resposta a um pedido de um particular, mesmo
ato administrativo sobre omesmo pedido,formuladopelo mesmoparticular com. que um ato haja sido emitido e não tenha existido notificação.
os mesmosfundamentos." O CPA prevê o enquadramento do ato tácito no âmbito da decisão e
das causas de extinção do procedimento do ato administrativo (Secção V
Ou seja, a delimitação do dever jurídico de decisão que decorre do' - Da decisão eoutras causas de extinção do procedimento do Capítulo II - Proce-
princípio agora estudado faz-se por via positiva, como resulta do estipu- dimento do ato administrativo do Título II - Procedimento do regulamento edo
lado no nº 1 e, por via negativa, como decorre do que se consagra no nº 2. ato administrativo da Parte III - Do procedimento administrativo). Esta secção
Assim, podemos concluir que, regra geral, os órgãos da Administração tem o seu conteúdo previsto nos artigos 126º a 133º do CPA.
Pública devem decidir ou deliberar (se se tratar de órgãos colegiaiS) sobre I Não parece totalmente errado o entendimento que alguns autores têm
todos os assuntos relativamente aos quais sejam competentes. No entanto, de que o silêncio é um meio ou urna forma alternativos de prossecução da
como decorre do normativo em vigor, o órgão pode ser competente mas atividade administrativa, ainda que com algumas reservas e não menos
não ter dever legal e procedimental de decidir, atento o disposto no nº 2 particularidades. Para facilidade de compreensão da figura, vamos estudá-
do artigo 13º do CPA. -la a propósito do princípio da decisão.
Parece correto que assim seja, a fim de se não causarem estrangulamentos Historicamente, a figura do ato tácito surge para evitar a ausência de
desnecessários nos serviços, com requerimentos que os vinculariam a dar controlo dos silêncios e das inércias das estruturas da Administração Pública,
múltiplas e sucessivas respostas aos mesmos pedidos, elaborados nos mes-
mos termos, com os mesmos fundamentos e fundados na mesma legislação, :
52Muito sucintamente, podemos referir que existem várias correntes explicativas da natu-
gerando-se um verdadeiro ciclo vicioso que obstaria ao regular, saudável, reza juridica do ato tácito, nomeadamente, defendidas por Marcello Caetano (que, em sín-
e racional exercício da atividade dos diferentes órgãos administrativos. tese, refere que o ato tácito é como outro qualquer ato), por André Gonçalves Pereira (que
Importa ainda referir, neste âmbito, que os órgãos da Administração: defende a posição de que o ato tácito é um mero pressuposto do recurso contencioso), por
Pública, de acordo com o agora estipulado no artigo 13º, nº 3, do CPA, não, Diogo Freitas do Amaral (para quem o ato tácito é uma ficção legal de ato administrativo) e
por Paulo Otero (que afirma ser um ato criado por lei mas imputado por ela à Administra-
estão vinculados ao pedido e, desta forma, ção, independentemente de ser de deferimento ou de indeferimento). Outros autores tra-
tam aprofundadamente desta temática.
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ou seja, tem por finalidade, entre outras, a de impedir que a Administração a 2 de agosto de 2014 (e o "senhor N' recebe um recibo de entrega com
encontre no silêncio uma forma de evitar ser fiscalizada, designadamente, a data de entrada do seu requerimento). Se passassem 90 dias, atento
pelos tribunais. o disposto no então artigo 108º, n.OS 2 e 3, alíneag), do CPA revogado,
Contudo, segundo alguma doutrina, a Administração Pública encontrou sem que houvesse obtido uma resposta expressa do reitor, o "senhor N'
já no silêncio, como se disse, uma forma de prosseguir a sua atividade. Seria poderia considerar que a autorização lhe havia sido concedida desde
assim sempre que o ato tácito tivesse os mesmos efeitos que resultariam que respeitados todos os restantes requisitos legalmente exigidos e os
da vinculação de uma decisão administrativa expressa, isto é, se a lei de- pressupostos cumulativos do ato tácito.
terminasse, naquelas circunstâncias, o sentido e o teor do ato, e o mesmo Pergunta-se: mas como se provava a existência de algo que inexiste
fosse tacitamente proferido. de facto? Através da data de entrada do requerimento apresentado,
Atualmente, o CPA faz apenas referência ao ato tácito de deferimento. passados que fossem os 90 dias, e desde que, como se disse, todos os
De notar que, na vigência do anterior CPA, agora revogado, existiam dois pressupostos do ato tácito se verificassem.
tipos de atas tácitos que advinham da nossa tradição jurídico-administrativa:
Podemos afirmar que o silêncio tem hoje efeitos neutros, dado que
- O ato tácito de indeferimento S3 , que traduzia uma presunção de indeferi-
não tem, regra geral, efeitos negativos (como era regra no passado) e,
mento da pretensão do particular. Aqui, o silêncio era interpretado como
para ter efeitos positivos, é necessário expressa disposição legal nesse
tendo efeitos negativos de indeferimento, ou seja, o particular requeria
sentido.
algo à Administração Pública e no silêncio desta, verificados os restantes
Deste modo, hoje o legislador consagra apenas a figura do deferimento
requisitos cumulativos, tudo se passava como se a sua pretensão tivesse
tácito, dado que a figura do indeferimento tácito fOi, para alguns, perdendo
sido recusada, podendo assim abrir-se a via contenciosa e recorrer-se aos
relevância em virtude da possibilidade de os tribunais administrativos
tribunais administrativos para impugnar esta decisão; e
poderem ser chamados a condenar a Administração Pública à prática do
ato ilegalmente omitido. Ou seja, o efeito que se pretendia obter com a
- O ato tácito de deferimentoS"', que neste caso traduzia a presunção de autonomização do indeferimento tácito e que, durante anos, foi de grande
deferimento da pretensão do particular. Ao contrário do ato tácito nega- relevância jurídica, consegue agora alcançar-se seguindo as regras do
tivo ou de indeferimento, aqui o silêncio teria efeitos positivos, tudo se contencioso administrativo, que prevê um meio jurisdicional ao dispor
passando como se do órgão da Administração Pública emanasse uma dos lesados a fim de estes poderem ver satisfeitos os seus direitos, que
resposta positiva ao administrado. podem passar pelo exercício, pleno e vinculado, do dever legal de decisão.
Aliás, isto mesmo resulta, expressamente, do disposto no artigo 129º do
Vejamos um exemplo: CPA, que mais adiante teremos oportunidade de aprofundar.
O "senhor N', professor universitário, pretendia acumular fun- Importa, no entanto, assinalar que o deferimento tácito pode não resul-
ções públicas com funções privadas e apresentava um requerimento tar diretamente do silêncio decisório da administração mas antes da ausência
ao reitor da sua Universidade (órgão com competência para decidir de notificação da decisão final, como decorre do disposto no artigo 130º,
na matéria), nos termos da lei, a solicitar autorização para a referida nº I, do CPA, e, portanto, de um silêncio notificador.
acumulação. O respetivo requerimento dá entrada no serviço respetivo São vários os pressupostos legais para verificação do ato tácito de
deferimento. Estes requisitos de verificação cumulativa ou simultânea
estão previstos, de forma genérica, no disposto no artigo 130º do CPA
53 o ato tácito de indeferimento era, aliás, a regra geral no nosso Direito Administrativo. (correspondente aos anteriores artigos 108º e 109º do CPA revogado), e
54O anterior CPA alargou os casos de deferimento tácito. A este propósito, cfr. o disposto no
artigo 108º do ePA revogado.
são os seguintes:
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_ Apresentação de um requerimento com pedido para a prática de ato comunicação, os modelos de e-governo e de e-administração impõem novas
administrativo que defina a situação jurídica do particular; formas de atuação e de relacionamento com os interessados e das próprias
- Que esse requerimento tempestivo seja dirigido ao órgão competente; estruturas administrativas.
_ Existir por parte do referido órgão o dever legal de decisão, cuja regra O artigo 14Q do CPA impõe agora, no seu n Q 1, a obrigação de utilização
geral está prevista no artigo 13Q do CPA (a ausência de notificação da de meios eletrónicos no desempenho da atividade regular dos órgãos e
decisão final pode decorrer do facto de o órgão não ter de emitir, nos serviços da Administração Pública, com o objetivo de "(...) promover a efi-
termos legais, qualquer ato); ciência ea transparência administrativas eaproximidade com os interessados (...)".
- Ausência de notificação da decisão final sobre a pretensão apresentada O legislador é cuidadoso ao estipular, no n Q 3 do já referido artigo 14Q
ou necessidade de não expedição da notificação até ao primeiro dia útil do CPA, que a utilização de meios digitais e eletrónicos está sujeita ao
seguinte ao termo do prazo da decisão (aqui se pode verificar que a conjunto amplo e diversificado de limites e de garantias previsto na CRP
decisão pode até ter sido tomada mas dela não foi dado conhecimento e na lei, designadamente no próprio Código.
ao interessado); e Na economia do artigo em análise, importa ainda destacar o disposto
- A lei ou regulamento atribuírem o significado de deferimento tácito no seu n Q 4, que refere que
ao silênci055, como decorre da parte inicial do n Q 1 do artigo 130 Q do
"Os serviços administrativos devem disponibilizar meios eletr6nicos de rela-
Código. cionamento com a Administração Pública e divulgá-los de forma adequada,
de modo a que os interessados os possam utilizar no exercício dos seus direitos e
o CPA dá agora relevância à notificação da decisão (e não à própria interesses legalmenteprotegidos, designadamenteparaformular as suaspreten-
decisão administrativa) para efeitos de deferimento tácito, dado que
sões, obter eprestar informações, realizar consultas, apresentar alegações, efetuar
os órgãos da Administração Pública poderiam encontrar uma forma de
pagamentos eimpugnar atos administrativos."
ultrapassar a lei; o órgão competente poderia praticar o ato mas este não
ser notificado, e o particular não conheceria o seu teor, pelo que o mesmo
Importa, no entanto, atender ao cuidado com o que legislador trata
poderia não ganhar eficácia jurídica.
desta questão do uso de meios eletrónicos, até pela elevada taxa de iliteracia
Importa, ainda, referir que o prazo legal para produção do deferimento
digital que existe no País. E, por isso, conforme disposto no n Q 5
tácito se suspende quando o procedimento, por causa imputável ao interes-
sado, estiver parado e apenas se interrompe com a notificação da decisão "Os interessados têm direito à igualdade no acesso aos serviços da Adminis-
expressa, atento o disposto no artigo 130 Q, n Q 3, do CPA. tração, nãopodendo, em caso algum, ouso de meios eletr6nicos implicar restrições
Em conclusão, podemos também verificar que não existe, como no ou discriminações não previstaspara os que se relacionem com aAdministração
passado, um elenco previsto no CPA de casos de atos de deferimento por meios não eletr6nicos:'
tácito - o que, a nosso ver, é de algum modo um retrocesso garantístico
dos particulares. Ora, embora se salvaguardem os direitos de todos os cidadãOS, o n Q 6
permite que sejam adotadas "(...) medidas de diferenciaçãO positiva para a
2.13. Os princípios aplicáveis à administração eletrónica utilizaçãO, pelos interessados, de meios eletr6nicos no relacionamento com aAdmi-
O novo CPA não poderia ignorar os avanços tecnológicos, sobretudo nistração Pública (...)". Parece que é o que ocorre, por exemplo,
em matéria eletrónica. As novas tecnologias digitais de informação e de
"Aquando da entrega, por via eletrónica, das declarações relativas
ao Imposto sobre o Rendimento de Pessoa Singular (IRS) que possi-
55Importa referir que o CPA remete, agora, para leis especiais que, em concreto, particulari- bilita que os contribuintes, quando for caso disso, venham a receber
zem o regime geral e os pressupostos do ato tácito, elencando as situações de deferimento.
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mais cedo o valor a devolver pelo Estado, se tiver sido pago, durante o causados. Importa referir que existe legislação própria que regula os casos
exercício anual, um valor superior àquele que foi considerado devido deste tipo de responsabilidadé 7•
na liquidação e no encontro de contras feito entre particular e Adminis-
tração Tributária". 2.16. O princípio da administração aberta
O CPA consagra agora, no seu artigo 17º, o princípio da administração
2.14. O princípio da gratuitidade aberta junto do elenco dos princípios gerais da atividade administrativa.
O procedimento administrativo deixa de ser, por regra, gratuito, como Anteriormente, o teor deste princípio com idêntica formulação constava
resultava do disposto no artigo 11º do CPA revogado, para passar a ser, do antigo artigo 6Sº do CPA revogado, ou seja, fora da sistemática dos
regra geral, "tendencialmentegratuito", aliás, como consta agora do disposto princípios gerais e no âmbito do então Capítulo II - Do Direito à Informação
no artigo 15º, nº 1, primeira parte, do novo CPA. da Parte III - Do Procedimento Administrativo. O legislador faz, portanto,
No entanto, este diploma legal56, como lei geral que é, possibilita que um acerto à localização do princípio que permite o livre acesso, nos ter-
outras leis especiais prevejam"(...) opagamento de taxaspor despesas, encargos mos de legislação própria, aos arquivos e aos registos administrativos.
ou outros custos suportados (...)" pelas Administrações Públicas. De qualquer Não se trata, pois, como se diz no preâmbulo do decreto-lei que aprova
forma, o nº 2 do mesmo artigo prevê a possibilidade de as entidades parti- o novo CPA, de um novo princípio que haja agora sido introduzido pelo
culares não disporem dos meios económicos suficientes para fazerem face legislador.
ao pagamento de tais taxas ou despesas, pelo que concede à Administração Relativamente a esta matéria, importa assinalar a existência, em Por-
Pública a faculdade de isentar desses mesmos pagamentos todos os que tugal, de uma Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA),
demonstrarem, nos termos da lei sobre o apoio judiciário, dificuldades entidade pública independente que funciona junto da Assembleia da
económicas. Importa referir que tal isenção pode ser total ou parcial, de República e que tem como fim zelar, nos termos da lei, pelo cumprimento
acordo com o estipulado no nº 2 do mesmo normativo, e que, atento ainda das disposições legaiS referentes ao acesso à informação administrativa.
o disposto no nº 3, a insuficiência económica deve ser demonstrada, nos Importa, no entanto, referir que o princípio da administração aberta
termos gerais e com as necessárias adaptações, de acordo com a legislação garante "(...) o direito de acesso aos arquivos e registos administrativos, mesmo
em vigor relativa, como se disse, ao apoio judiciário. quando nenhum procedimento que lhes diga diretamente respeito esteja em curso
(...)", nos termos da legislação própria que regula a matéria (nº 2) e de
2.15. O princípio da responsabilidade acordo com os limites estipulados no nº 1 do citado artigo 17º do CPAss.
O novo CPA vem agora consagrar o princípiO da responsabilidade no artigo
16º do CPA. Trata-se de autonomizar em princípiO geral algo que resulta 2.17. O princípio da proteção dos dados pessoais
já da Constituição e da lei e, por isso, "a Administração Pública responde, nos O CPA prevê agora, no seu artigo 18º, o princípio da proteção dos dados
termos da lei, pelos danos causados no exercício da sua atividade". pessoais, que é igualmente regulada por legislação própriaS9 •
Ora, das ações ou das omissões da Administração Pública podem
emergir diferentes tipos de responsabilidades, consoante a natureza dos
danos causados e das infrações eventualmente cometidas. A responsabili-
57 Vide o disposto na Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, alterada pela Lei nº 31/2008, de 17
dade pode ser apurada, por exemplo, em termos cíveis e, portanto, poder de julho, que aprovou o regime da respomabilidade civil extracontratual do Estado e demais enti-
dar origem e determinar o pagamento de uma indemnização por danos dades públicas.
58 Deve atender-se ao disposto na Lei nº 46/2007, de 24 de agosto, que regula o acesso aos
documentos administrativos ea sua reutilização.
59 Vide, por todos, o disposto na Lei nº 67/98, de 26 de outubro, relativa à proteção de dados
56 o novo CPA. pessoais.
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Importa assinalar a existência, em Portugal, de uma Comissão Nacional de c) Diga quais são as garantias procedimentais de imparcialidade;
Proteção de Dados (CNPD). A CNPD é uma entidade administrativa inde- á) Distinga impedimento, escusa e suspeição;
pendente com poderes de autoridade que funciona junto da Assembl ia e) Diga quais são os pressupostos de verificação de um ato tácito;
da República. Nos termos da lei, dispõ de atribuições genérica de con- /) Diga em que se traduz o princípio da responsabilidade; e
trolo ou de fiscalização do processam nto de dado pessoais, em rigoroso g) Refira-se aos princípios da administração aberta e da proteção dos
respeito pelos direitos humanos e pelos direitos, liberdades e garantias dados pessoais.
consagrados na eRP e na lei.
Em Portugal, a CNPD é a Autoridade Nacional de Controlo de Dados
Pessoais. Neste âmbito, coopera com as autoridades de controlo de proteção
de dados de outros Estados, nomeadamente, na defesa e no exercício dos
direitos de pessoas residentes no estrangeiro.

2.18. O princípio da cooperação leal com a União Europeia


Por fim, o ePA consagra, no seu artigo 19º, o princípio da cooperação leal
com a União Europeia, que se traduz no seguinte:

"1- Sempre que o direito da União Europeia imponha à Administração


Pública a obrigação de prestar informações, apresentar propostas ou de, por
alguma outraforma, colaborar com aAdministração Pública de outrosEstados-
-membros, essa obrigação deve ser cumprida no prazo para tal estabelecido.
2 - Na ausência deprazo específico, aobrigação referida no número anterior
é cumprida no quadro da cooperação leal que deve existir entre aAdministração
Pública ea União Europeia."

2.19. Recomendação
O estudante deve, neste momento, conhecer os diferentes princípios gerais
que vinculam a atividade das Administraçõe Públicas e que se encontram
previsto na Constituição da República Portuguesa, no C6digo do Procedimento
Administrativo e na Carta Ética da Administração Pública. Deve ainda ter
um pleno conhecimento sobre as garantias de imparcialidade previstas
no CPA e sobre a figura do ato tácito.

2.20. Exercício formativo


a) Diga quais são, na sua opinião, os princípios mais importantes
que o legislador previu para regulação do procedimento adminis-
trativo;
b) Dê exemplos de manifestações do princípio da participação;
3. Palestra sobre os órgãos da Administração Pública

SUMÁRIO:
Dos órgãos administrativos: natureza e regime. Dos órgãos colegiais. Da compe-
tência. Das suplência e substituição. Da delegação de poderes. Dos conflitos de
atribuiçóes e de competências. Recomendação. ExerCÍcio formativo.

3.1. Dos órgãos administrativos: natureza e regime


Entramos agora no estudo da Parte II do novo CPA, relativa aos órgãos da
Administração Pública60 6162.

60 Existem diferentes classificações de órgãos administrativos, os quais podem ser, entre

outros: órgãos singulares e coletivos; órgãos centrais, regionais e locais; órgãos primários,
secundários e vicários; órgãos representativos e não-representativos; órgãos ativos, consulti-
vos e de controlo; órgãos temporários e permanentes; órgãos simples e complexos; e órgãos
com autonomia administrativa e financeira.
61 Podem ser várias as funções dos órgãos administrativos, designadamente: funções prepara-

tÓrias, executórias ou auxiliadoras.


62 São vários os sujeitos que intervêm no procedimento administrativo e que estabelecem

relações jurídico-procedimentais. Destes, podemos salientar, por um lado, as estruturas


da Administração Pública e as entidades ou órgãos referidos no artigo 2º do CPA que não
integram a Administração Pública e, por outro lado, os interessados (os particulares ou ou-
tros sujeitos) que pretendem ver realizadas as suas pretensões. Evidentemente que o con-
ceito de sujeito aqui utilizado não tem plena coincidência com o conceito técnico-jurídico.
Desde logo, porque os órgãos da Administração Pública não têm personalidade jurídica e
integram-se em pessoas coletivas, estas sim dotadas da suscetibilidade de serem titulares de
direitos e de obrigações e, portanto, verdadeiros sujeitos de Direito.
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A Administração Pública portuguesa é constituída, grosso modo, por A Administração Pública das Regiões Autónomas tem no Governo Regio-
pessoas coletivas de Direito Público. Como entidades jurídicas que são, nal o seu órgão de direção superior. Por outro lado, existem autoridades
e tas dispõem de p rsonalidade jurídica63 e pela sua natureza, integram administrativas independentes que não têm dependência hierárquica do
um conjunto de esrrururas que são, designadamente, os órgãos e os ser- Governo e, logo, integram a Administração independente do Estado, hoje
viços administrativo . com expressa referência no artigo 2º, nº 3, alínea c), do CPA.
O artigo 199º alínea d), da CRP estipula que "compete ao Governo, no A Administração Pública portuguesa pode, ainda, organizar-se tendo
exercício defunções administrativas (...) dirigir os smiços e a atividade da admi- em conta critérios territoriais. Assim, surgem as Administrações central,
nistraçâo direta do Estado civil e militar superintenderna administração indireta e regional e local.
exercer a tutela sobre esta esobre aadministração autónoma (...) '. Daqui resulta, Em conclusão e de forma genérica, podemos verificar que o conceito de
atentos os podere organizatórios administrativos adstritos ao executivo, Administração Pública corresponde, hoje e cada vez mais, a uma realidade
um critério que ajuda a presidir à organização da Admini tração Pública muito complexa e multidimensional.
portuguesa dele emergindo o conceito de Administração direta do Estado, Por outro lado, são várias as definições doutrinais e os critérios utilizados
Admini tração indireta do Estado, Administração autónoma do Estado e, para encontrar um conceito de órgão da Administração Pública. Como
realidade institucional, é um centro organizado de competências ou de
por decorrência sistémica, Administração independente do Estado.
poderes e de vinculações com capacidade para expressar uma vontade
Sobre o primeiro tipo, o Governo exerce pod r de direção; sobre a
juridicamente imputável à pessoa coletiva da qual faz parte. Para o CPA,
Administração indireta exerce poder de superintendência' sobre a Admi-
no seu artigo 20º, nº 1, são órgãos administrativos
nistração autónoma do Estado pode usar poderes de tutelaM e perante a
Administração independente não exercerá qualquer um destes tr poderes. A
"(...) os centros institucionalizados titulares depoderes edeverespara efeitos
Integram a Administração direta do Estado, por exemplo, os ministérios, da prdtica de atosjurídicos imputdveis à pessoa coletiva".
que são a forma típica de organização dos serviços do Estado, e as estru-
turas nele integradas. Os institutos públicos integram a Administração Deste modo, é este o conceito legal de órgão que vigora na ordem jurídica
indireta do Estado e as autarquias locais65 a Administração autónoma. portuguesa. Mais uma vez, o legislador aproveita o conteúdo substantivo de
uma norma para estabelecer uma definição concetual vestibular que era, há
muito, adotada, quase genericamente, pela doutrina publicista portuguesa.
63 Conceito jurídico qualitativo (ou se tem ou não se tem) que traduz a suscetibilidade de se
Existem muitas e variadas tipologias e classificações para os órgãos da
ser titular de direitos e de obrigações.
64 Por exemplo, as associações de municípios, sobre as quais o Governo apenas exerce poder
Administração Pública, que variam consoante os critérios adotados na
de tutela, nos termos da lei. Embora de base associativa, estas pessoas coletivas de Direito distinção. Contudo, importa assinalar que o disposto no artigo 20º, nº 2,
Público não deixam de assentar, em termos jurídicos, ainda que indiretamente, numa base do CPA, faz referência, por um lado, a órgãos singulares ou colegiais e, por
territorial e populacional, com a vantagem de, junto destas associações, não existir nenhum
outro lado, a órgãos permanentes ou temporários. A primeira distinção
representante do Governo, ao contrário do que sucederá aquando da instituição em con-
creto das regiões administrativas, nos termos do disposto no artigo 262º da CRP.
decorre de serem compostos por um único titular, quando singulares, ou
65 Em Portugal, são autarquias locais, nos termos constitucionais, as freguesias, os municí- por vários membros, quando colegiais ou coletivos. No segundo caso, a
pios e as regiões administrativas (estas últimas ainda não instituídas em concreto). Em ter- natureza do órgão depende da sua permanência no tempo. Por exemplo, um.
mos reais, as regiões administrativas, sendo autarquias supramunicipais, são verdadeiras júri de um procedimento concursal público é um órgão colegial temporário.
associações de municípios, com afinidades económicas, culturais e sociais para a resolução
Por outro lado, importa referir que o disposto no artigo 20º, nº 3, do
de problemas comuns. Importa assinalar que as nossas populações são muito ciosas das suas
autonomias, quer municipais quer mesmo distritais. O distrito, que continua a existir, está CPA, possibilita a adoção de um regimento por cada órgão colegial de
personalizado quase como "autarquia" e é uma realidade difícil de esquecer e de substituir acordo com "(...) as normas legais eestatutdrias aplicáveis". O regimento não
por uma região administrativa sem qualquer tradição no país.
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é mais do que um regulamento interno, com um conjunto normativo que para a designação destes cargos, por influência do princípio democrático,
regula o funcionamento mais específico de um órgão colegial. é, regra geral, o eleitoral. Assim, nos termos do nº 1 do referido artigo

"Sempre que a lei não disponha de forma diferente, cada 6rgão colegial da
3.1.1. Dos órgãos colegiais Administração Pública tem um presidente eum secretdrio, aelegerpelos membros
No que diz respeito aos órgãos colegiais, ou seja, àqueles que integram
que o compõem'~
uma pluralidade de membros, o novo CPA consagra, no seguimento do
anterior regime 66 , um conjunto de regras particulares previstas no disposto
De acordo com o CPA, podem existir órgãos colegiais cujo presidente é
nos seus artigos 21º a 35º e que importa analisar.
nomeado pelo Governo, por exemplo, através de resolução do Conselho de
Um dos primeiros momentos a considerar quando estudamos os órgãos
Ministros. Desta forma, podemos afirmar que o Código estipula o regime
colegiais é aquilo a que podemos chamar a fase de instalação do 6rgão.
geral que há de aplicar-se, na inexistência de regime jurídico privativo
Ou seja, ab initio, é preciso apurar a regularidade dos mandatos e verificar
para o órgão colegial em causa.
se os mesmos são legalmente válidos. Esse exercício depende do respeito
Cabe ao presidente do órgão colegial, em termos genéricos, designada-
por vários elementos. Consoante a forma de designação dos membros do
mente, abrir e encerrar as reuniões, dirigir e orientar os trabalhos e velar
órgão colegial prevista na lei, assim teremos de analisar os instrumentos
pelo cumprimento da lei, atento o disposto no nº 2 do artigo 21º do CPA.
jurídicos designat6rios. Se os membros forem eleitos, é necessário verificar se
Aquele artigo consagra, ainda, nos números seguintes, algumas compe-
a eleição foi válida e quem foi legalmente eleito, ou seja, a quem corresponde
tências genéricas do presidente, em matéria de funcionamento das reuniões
o mandato em concreto, o que se pode fazer analisando, nomeadamente,
e em matéria de controlo da legalidade das deliberações68 , atribuindo-lhe
a ata de apuramento dos resultados. Mas se os membros forem nomeados,
até ~egitimidade judiciária para intentar, junto dos tribunais competentes,
há então necessidade, nestes casos, de verificar a perfeição jurídica do ato
deSIgnadamente, ação judicial para impugnação dos atos ou para requerer
de nomeação: a sua validade jurídica, a competência do órgão, O respeito
a suspensão jurisdicional da eficácia das deliberações tomadas pelo órgão
pelos elementos atribuidores de eficácia, entre outros aspetos vincula-
a que preside, de acordo com o previsto no artigo 21º, nº 4, do Código.
dos. Só depois de verificada a validade dos mandatos e pode proceder
~estes casos, o CPA impõe que o presidente ou quem o substitua, con-
à primeira convocatória do órgão e, de seguida, à sua instalação a fim de
SIderando as deliberações ilegais, quer contenham atos ou regulamentos
poder iniciar o exercício pleno de funções. Pode acontecer ser necessário
administrativos, possa "(...) reagirjudicialmente (...)".
a publicação de uma ata ou de um ato de nomeação, ou que os membros
Importa fazer referência ao facto de o nº 3 do mesmo artigo permitir
do órgão colegial venham, todos ou alguns, tomar posse dos cargos que
que o presidente possa, ainda, suspender ou dar, antecipadamente (ao que
vão exercer. Nalguns casos, a lei dispensa essa tomada de posse, bastando,
estava previsto), por findas reuniões,
para o efeito, a comunicação da eleição ou da nomeação aceites pelo eleito
ou pelo nomeado, respetivamente. "(...) quando circunstâncias excecionais ojustifiquem, mediante decisão
O disposto no artigo 21º do CPA (correspondente ao anterior artigo fundamentada, a incluir na ata da reunião, podendo a decisão ser revogada
14º) é relativo ao presidente e ao secretário dos órgãos administrativos em recurso imediatamente interposto e votado favoravelmente, de forma não
colegiais. Aqui se consagram as regras gerais neste campo, as quais, obvia- tumultuosa, por maioria de dois terços dos membros com direito a voto."
mente, podem ser derrogadas 67 por lei especial. O método consagrado
Reparemos que o CPA exige, nestes casos, que se verifiquem os seguin-
Q
tes (i) requisito prévio e (ii) formalidades posteriores: (ia) circunstâncias
66 Anterionnente, o regime jurídico constava do disposto nos artigos 14Q a 28 do CPA revo-
gado.
67 Ou seja, afastadas parcialmente.
68 Cfr., a este propósito, o disposto no artigo 21 Q, n.o'2 a 4, do CPA.
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excecionais, (iib) decisão presidencial fundamentada com razões de facto de designar o suplente do presidente ou do secretário, quando os critérios
e de Direito e (iic) obrigatória inclusão em ata da decisão e da sua funda- da antiguidade ou da idade não sejam suficientes e não existir legislação
mentação. própria para aquele órgão.
Aquela decisão (iib) pode ser objeto de imp%onação imediata atravé de O nº 3 do artigo 22º do CPA vem esclarecer a forma de solucionar
uma (i) reclamação junto do próprio presidente nos tennos gerais (embora eventual conflito "(...) entre opresidente e o órgão quanto aos pressupostos de
e ta po ibilidade não esteja prevista expressamente no normativo há de, intervenção de um seu suplente (...)", prevalecendo, nesses casos, a vontade
por maioria de razão, ter-se por admissível), ou mediante a apresentação do colégiO em detrimento da vontade presidencial, desde que, nos termos
de um (ii) recurso administrativo para o plenário do órgão, que apenas legais, não caiba a órgão externo o poder de dirimir o conflito.
procede ou tem ganho de causa se (a) votado favoravelmente por maioria Resulta do disposto nos artigos 23º e 24º do CPA (correspondentes aos
de dois terços dos membros com direito a voto e desde que o não seja (b) anteriores artigos 16º e 17º do CPA agora revogado) que podem existir dois
de forma tumultuosa. tipos diferentes de reuniões dos órgãos colegiais.
Os artigos seguintes estipulam um conjunto de regras que se prendem Assim, as reuniões podem ser ordinárias, ou seja, regulares, e a data ou
com a substituição em sentido amplo, através da suplência do presidente a periodicidade das mesmas é determinada pelo presidente, sempre que
e do secretário, as reuniões ordinárias e extraordinárias e a ordem do dia 69 não decorrer da lei ou de deliberação orgânica. Exige-se que os membros
que, no fundo, é a agenda da reunião onde se elencam os assuntos a tratar do órgão, de acordo com o teor do artigo 23º, nº 2, do CPA, tenham conhe-
cimento" seguro eoportuno" da fixação dos dias e das horas das reuniões bem
e que podem ser objeto de deliberação colegial.
como de quaisquer alterações supervenientes que surjam.
Vejamos agora como e procede no caso de ausência ou de impedi-
As reuniões dos órgãos colegiais podem também ser extraordinárias,
mento do presidente ou do secretário do órgão colegial. A este problema
de acordo com o que resulta do disposto no artigo 24º do CPA.
responde, de forma clara, o disposto no artigo 22º, nº 1, do CPA. Assim, a
As reuniões extraordinárias ocorrem fora do plano normal das reuniões
menos que outra coisa se preveja na lei, em norma estatutária ou no regi-
ordinárias dos órgãos, por qualquer razão excecional, imprevista ou urgente
mento do órgão em causa, serão suplentes, respetivamente, o "(...) vogal
que imponha a sua convocação. As reuniões extraordinárias ocorrem por
mais antigo eovogal mais modem070 ". Só haverá necessidade de intervenção do convocação oficiosa do presidente do órgão colegial, que a ela procederá, no
critério da idade (quem tiver mais idade e quem for mais jovem) "no caso
entanto, obrigatoriamente, "(...) sempre quepelo menos um terço dos vogais lho
de os vogais possuírem a mesma antiguidade reportada ao momento da assunção solicitem por escrito (...)", atento o disposto nos n.OS 1e 2 do artigo 24º do CPA.
do cargo (...)", como resulta expressamente do previsto no nº 2 do mesmo Como é imposto nos números seguintes, (i) a reunião deverá ocorrer
artigo. Ainda as im, pode sempre existir um conflito dado que os vogais nos 15 dias seguintes à solicitação apresentada pelos membros, mas sempre
podem ter a mesma idade. Nesta circunstância., cremos que a Solução mais com (ii) uma antecedência mínima de 48 horas sobre a data da reunião e
correta deve passar pela deliberação do plenário do órgão, seguindo-se, (iii) devendo dar-se previamente a conhecer "(...) deforma expressa eespe-
com as necessárias adaptações, a solução prevista no nº 3 do artigo 22º cificada (...)" a ordem do dia e os assuntos nela a serem objeto de análise.
do CPA. Deste modo, será por deliberação colegial através de escrutínio O novo CPA vem, agora, estipular que, havendo improcedência ilegal do
secreto, por decorrência do disposto no artigo 31º, nº 2, do CPA, que se há pedido formulado, nos termos do nº 2 do citado artigo, pode a convocatória
da reunião extraordinária ser feita diretamente pelos proponentes, nos
69 Ou ordem de trabalhos. termos expressamente previstos nos artigos 24º, n.O 5 e 6, e 25º, nº 3, do
S

70 O legishdor deveria querer dizer"o vogal mais recente" ou poderia ter recorrido à. expressão CPA. Nestes casos, a convocação é divulgada invocando-se a circunstância
"o vogsl menos antigo", pois se se recorre ao conceito de antiguidade. basta graduá-lo em que determina a legitimidade dos proponentes para assim procederem,
mais (antigo) e menos (antigo), em vez de se socorrer de conceito difttentes do de antigui-
nos termos e disposições previstos no referido nº 5, sempre respeitando
dade (como eri, no caso, o conceito de modernidade, por oposição o de antiguicL'tde - que
manifestamente não se aplica ao caso). o prazo estipulado no nº 6.
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A ordem do dia corresponde à ordem de trabalhos ou à agenda das a inclusão na ordem do dia de algum assunto a tratar ou com o teor da
reuniões e é estabelecida pelo presidente que dispõe, nos termos previstos deliberação final tomada que defina uma qualquer situação jurídica. Po-
no artigo 25º, nº 1, do CPA, de competência própria para a elaborar, salvo demos concluir que o legislador assegura uma estabilidade da ordem do
no caso estabelecido no artigo 24º, nº 5, do CPA, em que, por força do dia, dado que, como vimos, apenas podem ser tomadas deliberações cujo
dispo to no nl! 3 daquela norma, O poder de fixação da ordem do dia da objeto dela conste.
reunião é devol-vido aos respetivo proponentes. Isto significa que a ordem O artigo 28º do CPA deveria, em bom rigor, ser, em nossa opinião e
do dia não deve regra geral, ser votada pelos vogais. É uma manifestação conforme já referido, colocado sequencial e imediatamente a seguir ao
de exercício de competência própria e exclusiva do presidente. Os vogais artigo 25º, dado que se refere apenas à inobservância das disposições
podem, no entanto, regra geral, indicar matérias que queiram ver apre- previstas nos artigos 23º, 24º e 25º do CPA. Contudo, independentemente
ciadas na reunião, de acordo com aquele preceito normativo (artigo 25 2, da crítica à sua localizaçãO sistemática, é importante o teor do normativo aí
fixado: as ilegalidades que resultem, genericamente, do incumprimento
nº 1, do CPA).
A ordem do dia é um instrumento decisivo para a boa condução das das regras previstas nos artigos referidos só se considerarão sanadas desde
que a totalidade dos membros do órgão colegial esteja presente na reu-
reuniões colegiais e para a regularidade das deliberações colegialmente
nião e "(...) nenhum suscite logo de inicio oposição à sua realização (...)". Pode,
tomadas, dado que o órgão coletivo apenas pode aprovar deliberações sobre
no entanto, colocar-se legitimamente a questão de se saber se a sanação
as matérias incluídas na referida ordem de trabalhos, atento o disposto
pode ser superveniente e ocorrer nas condições exigidas no preceito agora
no artigo 26º, nº 1, do CPA. Esta exigência legal visa evitar que os órgãos
estudado mas em reunião posterior àquela em que a inobservância das dis-
colegiais decidam assuntos que não constam na agenda previamente enviada
posições ocorreu. Independentemente de se ter de analisar cada situação
aos membros, na ausência de algum(ns) deles, que não estejam presentes
em concreto, não parece, à primeira vista, ser de afastar tal possibilidade.
nas reuniões, porque conhecendo os temas a tratar não compareceram à
Importa agora referir que, salvo disposição legal em contrário, as reu-
reunião como o fariam sabendo que determinado assunto seria objeto de
niões dos órgãos colegiais administrativos não são públicas, como resulta
deliberação. O legislador alvaguarda - e bem - as situações que envol aro do disposto no artigo 27º, nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo
decisões urgentes desde que e verifique o respeito pelos pres upostoS 20 2 do CPA revogado), mas quando o sejam, nos termos do disposto no
vigentes no nº 2 do artigo 26º do CPA, designadamente, (i) estejamos pe~ nº 2 do mesmo artigo,
rante uma reunião ordinária e (ii) pelo menos dois terços do membros do
órgão reconheçam a urgência de deliberação imediata sobre a sunto não "(...) deve ser dada publicidade aos dias, horas e locais da sua realizaçãO,
agendado. S tal se verificar teremos neces ariamente deliberações distintas, deforma agarantir oconhecimento dos interessados com uma antecedência de,
que devem er devida e legalmente fundamentadas e registadas em ata: pelo menos, 48 horas sobre a data da reunião."

i. A deliberação colegial aprovada por pelo menos dois terços dos Atento o disposto no nº 3 do mesmo artigo, as pessoas que assistam às
membros que po sibilit a inclusão de novo(s) ponto( ) na ordem do dia; e reuniões (quando elas sejam públicas) podem, nos termos legais, estatu-
ii.A(s) deliberação(ões) que e vier(em) a apurar mediante as maiorias tários, regimentais ou mediante deliberação orgânica, "(...) intervir para
legalmente exigida.!, relativas ao( ) pomo(s) que vier(em) a ser inscrito(s) comunicar ou pedir informações, ou expressar opiniões, sobre assuntos relevantes
ex novo e que decorre(m) de (i). (... )~ que sejam da competência do órgão respetivo.
E também neste Capítulo II do CPA que se consagram, ainda relativa-
De recordar que o órgão terá de reconhecer a urgência e que esta terá mente aos órgãos colegiais, as regras sobre o quórum, no seu artigo 29º
de ser fundamentada pois as deliberações a aprovar (i e ii) podem vir a (correspondente ao antigo artigo 22º do CPA revogado). Antes de mais,
ser objcto de impU::,crnação se algum interessado não se conformar com importa definir este conceito.
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o quórum é O número mínimo de membros que devem estar presentes Importa ainda salientar que, nos termos do disposto no artigo 30ª do
na reunião para que o órgão possa funcionar ou deliberar validamente. CPA (correspondente ao antigo artigo 23 Q do CPA revogado) e nos casos
Assim, temos, respetivamente, o quórum de funcionamento e o quórum em que a lei nada diga,
deliberativo. "(...) éproibida aabstenção aos membros dos órgãos colegiais consultivos72 e
No já referido artigo 29Q consagra-se o quórum deliberativo. Assim,
aos dos órgãos deliberativos, quando no exerdcio defunções consultivas".
71
"Os órgãos colegiais só podem, em regra, deliberar quando esteja presente a
maioria do número legal dos seus membros com direito a voto': Naturalmente que este artigo se refere, apenas, aos membros que es-
tejam presentes na reunião e não se encontrem impedidos73 de intervir,
Vejamos o seguinte exemplo: aliás, como decorria expressamente do anterior regime, agora revogado.
Deve conciliar-se o teor deste artigo com o disposto no artigo 69Q, n Q 2,
Um órgão colegial composto por dez membros só pode deliberar, alínea b), do CPA.
validamente, se estiverem presentes pelo menos seis membros, ou seja, O artigo 31 Q do Código (correspondente ao anterior artigo 24Q do CPA
metade dos membros mais um. revogado) estabelece as possíveis formas de votação.
Assim se o órgão persi tir em deliberar em desrespeito e inobser- Regra geral, de acordo com o prescrito no n Q 1 daquela disposição
vando as regras do quórum o CPA considera a deliberação nula, ate~to normativa, e salvo estipulação legal em contrário, "(...) as deliberações
o disposto no seu artigo 161º,nQ 2 alínea h) (corre pondente ao antIgo são tomadas por votação nominal (...)", ou seja, a votação é conhecida (e
artigo 133Q nº 2, alíneag) do CPArcvogado). pública para os membros do órgão) e todos ficam a saber o sentido de
voto de cada vogal e do presidente (por esta ordem). Prevê a norma
O CPA prevê, também a siruaçõe cm que se não verifica o quórum que a votação seja antecedida de uma discussão sobre os assuntos em
na primeira convocatória atemo o di posto no artigo 29Q n~_2 do CP~, presença, quando nisso se vejam interesse e utilidade e no respeito pela
as quai determinanl que deva ser convocada uma nova reuruao do órgao ordem de votação.
OS
coleQial com um intervalo mínimo de pelo meno 24 horas. Os n. 2 e Contudo, importa referir que existem situações que, obrigatoriamente,
3 doome mo artigo alvaguardam situações excecionais, em defesa do impõem uma votação por escrutínio secreto, como decorre do disposto no
bom funcionamento dos órgãos administrativo colegiais. As i.m. desde artigo 31 Q, n Q 2, do CPA (correspondente ao anterior artigo 24Q, nQ 2, do
que a lei nada preveja em contrário, podem os ór~ãos colegiais, em se- CPA revogado), que determina que, nas situações "(...) que envolvam um
gunda convocatória, deliberar (i) desde que esteJ~.presente.um~er~o juízo de valor sobre comportamentos ou qualidades de pessoas (...)", as delibera-
dos membros com direito a voto e tratando-se de (li) uma trolka (orgao ções respetivas sejam, assim, obrigatoriamente "(...) tomadaspor escrutínio
colePiaI composto por apena trê membros) não pode ocorrer qualquer secreto". Deste modo, nunca ficaremos a conhecer o sentido individual
delib ração sem qu estejam presentes pelo menos, dois membros, o de cada votante, a menos que exista unanimidade na deliberação e não
que significa afirmar que ne tes caso ,ap nas pode faltar um ~emb~o existam votos nulos ou em branco. Se existir uma "(...) dúvidafundada (...)"
à reunião deliberativa. Esta última imposição impede que a deliberaçao sobre a forma de votação, o legislador determina que deva ser seguido o
orgânica pudesse ser tomada individualmente, por apenas um membro. escrutínio secreto, atenta a parte final do n Q 2 do artigo 31 Q do CPA. Dada
Nestes casos, o quórum deliberativo necessário, mesmo que em segunda a imposição constitucional e legalmente prevista de fundamentação dos
convocatória, é de dois membros.
n Designadamente, aqueles que têm competências de emissão de pareceres.
73A este propósito, vide o dispostO nos artigos 69 2 e seguintes do ePA (correspondentes aos
71 Sublinhado nosso. anteriores artigos 44 Q e seguintes do ePA revogado), já estudado.
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atas administrativos, o nº 3 deste artigo estipula que, naquelas situações, Maiorias


"(...) afundamentação das deliberações tomadas por escrutínio secreto éfeita pelo Tipos Regra Universo
presidente do órgão colegial após a votação, tendo presente a discussão que a tiver Num universo de 10 votantes,
precedido '. por exemplo:

Por fim, importa referir que naturalmente o nº 4 do artigo agora em 6 votos a favor
Maioria absoluta - regra geral No mínimo, metade mais
análise proíbe a presença na r união de qualquer membro do órgão que (artigo 32", n"l, do CPA) um dos votantes.
4 votos contra
ou
c encontre ou se considere impedido, nos termo legais, quer durante a
6 votos a favor
discussão, quando a ela haja lugar, quer durante a votação. 3 votos contra
O disposto no artigo 32º do Código estipula a regra geral para 1 abstenção

apuramento da vontad do órgão olegiaL Con alITa-se que a maioria Num universo de 10 votantes,
por exemplo:
ab oluta, ou seja, metade mais um dos votOs dos membros presentes
na reunião seja a regra, embora o disposto no n 2 1 (correspondente ao 1 voto a favor
anterior nº 1 do artigo 2Sº do CPA revogado) admita a po sibilidade, Pluralidade de votos, ou seja, Ovotos contra
Maioria relativa ou simples mais votos a favor do que 9 abstenções
legal ou estatutária, de se exigir74- uma maioria qualificada ou agravada 5 contra, não contando ou
ou por outro lado er suficiente 6 uma maioria relativa ou imples dos as abstenções para 4 votos a favor
o apuramento da maioria. 3 votos contra
membros presentes77• 3 abstenções
Quando a maioria absoluta for exigida e não seja alcançada, nem se ou
verifique uma situação de empate, nos termos do disposto no artigo 32º, 7 votos a favor
3 votos contra
nº2, doCPA,
Num universo de 10 votantes,
"(...) procede-se imediatamente anova votação e, se aquela situação se man- por exemplo:

tiver, adia-se adeliberação para a reunião seguinte, na qual a maioria relativa 2/3
é suficiente". Maioria qualificada Maioria agravada, superior à 7 votos a favor
maioria absoluta 3 votos contra

A propósito das maiorias vejamos a seguinte tabela: 4/5


8 votos a favor
2 votos contra

Sempre que do apuramento dos votos resulte um empate, o presidente


dispõe de voto de qualidade, ou de voto de desempate, o que significa
afirmar que o sentido do seu voto é determinante para apurar o sentido
da deliberação final do órgão, de acordo com o previsto no artigo 33º,
nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo 26º, nº 1, do CPA revogado),
à exceção - óbvia - das situações de votação que decorrem por sufrágio
7~ Porque é mais exigente. secreto. Nestes casos, o disposto no artigo 332, n. os 2 e 3, do CPA (corres-
75 Por exemplo, 2/3 ou 4/5 dos membros. pondentes ao anterior artigo 26º, nº 2, do CPA revogado), regula a forma
76 Porque é menos exigente.
de ultrapassar o impasse que resulte da situação de empate, acabando na
n A regra da maioria relativa remete-nos para a pluralidade de votos, não contando as abs-
tenções para o apuramento da maioria, ou seja, mais votos a favor do que contra. situação limite (e de duvidosa legalidade) de se recorrer à votação nominal,
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atento o disposto no nº 3, infine, e sendo a maioria relativa suficiente para ata com as formalidades previstas no seu artigo 34º (correspondente ao
aprovar a deliberação 6nal. anterior artigo 27º do CPA revogado).
Importa agora assinalar algumas das diferenças entre o sistema de voto De acordo com o previsto no nº 1, a ata conterá um resumo, isto é, uma
de qua.lidade e o de voto de desempate. No primeiro caso, o president participa síntese, do que ocorreu na reunião do órgão colegial e que será útil para
ab initio na votação e, no segundo caso somente ex rce o direito de voto se apreciar as eventuais irregularidade e ilegalidade das deliberações tomadas.
ocorrer um empate na votação. Ambos os sistemas permitem ultrapassar Impõe o artigo 34º, nº 2, do CPA, que
o impasse criado por uma votação quantitativamente igual.
Vejamos a propósito dois exemplos: "As atas são lavradaspelo secretário esubmetidas à aprovação dos membros
nofinal da respetiva reunião ou no início da reunião seguinte, sendo assinadas,
Exemplo 1 ap6s a aprovação, pelo presidente epelo secretário."
A lei atribui voto de qualidade ao presidente do órgão x.
Verificam-se 8 presenças (o presidente e 7 vogais) e 8 votos. Apuram- Pode ocorrer que as atas sejam assinadas por todos os membros pre-
-se 4 votos na proposta y e 4 votos na proposta z. Há uma situação de sentes, ou porque decorra da lei esse reforço de formalidade ou porque se
empate. entenda que o mesmo deve ocorrer. Trata-se de uma situação que não
Mas o presidente - em votação nominal- optou pela proposta y. afeta a validade jurídica do ato.
É considerada aprovada a proposta y. Importante é referir que o legislador veio agora, no nº 3 do mesmo ar-
tigo, esclarecer uma situação que criava algumas dificuldades e sobretudo
Exemplo 2 hesitações78 , prevendo expressamente que
A lei atribui voto de desempate ao presidente do órgão x.
Verificam-se 9 presenças (o presidente e 8 vogais) e 8 votos (o pre- "Não participam na aprovação da ata os membros que não tenham estado
sidente não participa na votação). Apuram-se 4 votos na proposta y e presentes na reunião a que ela respeita."
4 votos na proposta z. Há uma situação de empate.
O presidente é chamado a votar e opta (desempatando) pela pro- Como complemento ao disposto no artigo 34º, nº 2, do CPA, importa
atender ainda ao disposto no nº 4 do mesmo artigo (correspondente ao
postay.
É aprovada a propostay. anterior artigo 27º, nº 3, do CPA revogado), que possibilita que, nos casos
em que o órgão colegial assim decida, seja aprovada na própria reunião
Daqui resulta o seguinte: (i) se a votação for nominal, os mecanismos de uma minuta sintética da ata, "(...) devendo ser depOiS transcrita com maior
ultrapassagem do impasse são os dos votos de qualidade ou de desempate. concretização enovamente submetida a aprovação (...)". Trata-se, no fundo, de
Estas figuras parecem esquec r que O presidente pode escolher abster-se consolidar extratos da ata com vista a que as deliberações neles contidas
de votar e quase que tOmam o eu voto obrigatório... (ii) se a votação for possam, igualmente, produzir efeitos jurídicos imediatos, o que evita al-
por escrutínio secreto então o sistema escolhido pelo legislador é o da guma perda de tempo que sempre pode ocorrer entre a data da aprovação
sucessão de votações. Após a votação inicial, podem ocorrer mais três votações, de qualquer deliberação administrativa e a da nova reunião subsequente
duas delas por renovados escrutínios secretos, esperando-se que algum ou do órgão colegial respetivo em que, a final, se aprove a respetiva ata
alguns dos votantes alterem o sentido de voto e com isso cesse o empate,
e terminando, em caso limite, em votação nominal, que será vinculativa
apenas por maioria simples.
78 Ocorria muita vezes que os faltosos sentiam a necessidade óbvia de se absterem nessa
Por fim, no que diz respeito às reuniões dos órgãos colegiais da Admi- votação mas nalguns casos votavam a ata, por confiarem no teor descritivo da mesma (com
nistração Pública, importa referir que o CPA exige a elaboração de uma as consequências que daí poderiam advir). Deste modo, ficou - e bem - resolvida a questão.
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(momento a partir do qual, regra geral, passam a ser eficazes as deliberações 3.1.2. Da competência
tomadas e inscritas em ata). No âmbito deste quadro temático em que estudamos o conjunto norma-
Ora, através desta faculdade, permite-se que as deliberações aprovadas tivo regulador das estruturas orgânicas da Administração Pública, importa
ganhem imediata eficácia jurídica, atento o disposto no nº 6 do mesmo artigo. fazer referência à competência como o conjunto de poderes atribuídos
A eficácia das deliberações dos órgãos colegiais depende, assim, da legalmente aos órgãos administrativos para que prossigam as atribuições
aprovação das respetiva atas ou da assinatura das minutas, cessando a que estão cometidas às pessoas coletivas das quais fazem parte.
eficácia das que constem destas últimas se a ata da mesma reunião não as As pessoas coletivas prosseguem os fins estabelecidos na leF9 e aos
reproduzir, de acordo com o disposto no artigo 34º, nº 6, do CPA. seus órgãos estão afetos poderes funcionais para desenvolvimento dessas
Por outro lado, o artigo 34º, nº 5, do CPA, estipula agora que atribuições. A esta reunião de poderes funcionais podemos chamar com-
petênciassD •
"O conjunto das atas é autuado epaginado de modo afacilitar a sucessiva
O disposto nos artigos 36º e 372 do Código (correspondentes aos ante-
inclusão das novas atas ea impedir oseu extravio".
riores artigos 29º e 30º do CPA revogado) estipula as mais importantes
características gerais da competência em Direito Público e que, no âmbito
Isto significa que devem ser colocadas em processo com numeração pró-
tanto do Direito Administrativo como do procedimento administrativo,
pria e paginadas de modo a que se não percam nem possam ser adulteradas.
são genericamente as seguintes:
Importa, finalmente, assinalar que se admite que da ata constem as
declarações de votos de vencido, que isentam os seus membros de even- - Origem exclusivamente legal, já que a lei ou o regulamento são as
tuais responsabilidades que possam advir da execução das deliberações fontes primárias e imediatas dos poderes públicos (artigo 36º, nº 1);
tomadas, de acordo com o disposto no artigo 35º do mesmo diploma legal - Irrenunciabilidade, o que significa que nenhum órgão pode renunciar
(correspondente ao anterior artigo 28º do CPA revogado). Assim, qual- à titularidade ou ao exercício da competência legalmente atribuída,
quer membro que vote contra uma determinada deliberação pode fazer sendo nulo qualquer ato nesse sentido (artigo 362 , n.os 1 e 2);
constar da ata as razões do seu voto de vencido ou fazer menção na reunião - Inalienabilidade, que expressa a impossibilidade de transmissão ou
e juntar, mais tarde, uma declaração de voto vencido, com os argumentos de transferência da competência para outros órgãos, fora dos casos
que presidiram à sua opção, a qual fica junta à ata e o exonera de eventuais tipificados na lei (artigo 36º, nº 1); e
responsabilidades de natureza diversa qu possam advir da aplicação da - Imodificabilidade (limitada), já que a competência se estabelece no
deliberação tomada. momento em que se inicia o procedimento administrativo (artigo
Naturalmente que se mantém a obrigatoriedade de, tratando-se de 37º, nº 1), mas podem ocorrer mudanças substantivas relevantes e
emissão de pareceres a dar a outros órgãos administrativos, esses serem com expressão jurídica.
acompanhados das eventuais declarações de voto que sejam formuladas
e apresentadas pelos membros presentes nas reuniões e que podem ser Assim, podemos afirmar que um órgão não pode, sob qualquer pre-
declarações de votos vencidos ou apenas declarações de votos justificativas texto, renunciar ou não exercer as competências que lhe foram legalmente
ou explanadoras do seu sentido, atento o disposto no artigo 35º, nº 3, do
CPA, que, por isso, não restringe o envio apenas às declarações de voto
vencidos mas a todas as declarações apresentadas. Esta situação é em tudo 79 Estão, nos termos da lei, vinculadas ao princípiO da especialidade, s6 podendo prosseguir
semelhante à que ocorre com as decisões, designadamente, dos tribunais os fins previstos nos seus títulos jurídicos constitutivos. Desta forma se delimita o campo de
superiores, em que conhecemos as declarações proferidas, por exemplo, atuação das pessoas coletivas.
80 Quanto à fixação da competência, vide o disposto no artigo 372 do CPA (correspondente
pelos juízes conselheiros que votam contra um acórdão ou que explanam ao anterior artigo 30º do CPA revogado). No que diz respeito às questões prejudiciais, cfr.
o sentido do seu voto. o disposto no artigo 382 do CPA (correspondente ao anterior artigo 31º do CPA revogado).
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afetas, não pode transferir ou alienar esses poderes e que, regra geral, a nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo 342 do CPA revogad0 8l)
competência se fixa, nomeadamente, nos termos previstos no artigo 37 2 impõe que, sendo
do Código. Deste modo, "é nulo todo o ato ou contrato que tenha por objeto a
renúncia à titularidade ou ao exercício da competência (...)", atento o disposto "(...) apresentado requerimento, petição, reclamação ou recurso a órgão
no nº 2 do artigo 36º do CPA. Daqui decorre a importância em distinguir
incompetente, odocumento recebido é enviado oficiosamente ao órgão titular da
dois conceitos que podem estar interligados: o da (i) titularidade e o do
competência, disso se notificando oparticular."
(ii) exercício, ambos relacionados com a competência administrativa dos
Importa assinalar também a relevância do disposto no nº 2 do mesmo
diferentes órgãos da Administração Pública.
Importa, no entanto, fazer referência ao disposto na parte final do artigo, que determina que, nos casos do nº 1, valerá "(...) adata da apresentação
nº 1do artigo 36º do CPA, que ressalva as situações (que a seguir estudare- inicial do requerimento para efeitos da sua tempestividade", afastando-se, desta
mos) da delegação de competências, da suplência e da substituiçãO, estas forma, o êxito de qualquer manobra no sentido de ultrapassar os prazos
últimas apresentadas também como figuras afins, de acordo com a parte estabelecidos, recorrendo ilegitimamente ao mecanismo de entrega de
final do nº 2 do mesmo artigo. documentos a órgãos incompetentes, protelando, dessa forma, os prazos
Como vimos aquando do estudo do princípio da decisão, os órgãos legais.
administrativos estão legalmente vinculados a exercer as competências
legalmente atribuídas e a decidir. 3.1.3. Das suplência e substituição
Um dos aspetos liminares a que os órgãos da Administração PÚ- Também no Capítulo III, relativo àcompetência, se faz referência à suplên-
blica devem dar atenção, antes de assumirem qualquer posição, é o de, cia e à substituiçãO, como decorre do disposto nos artigos 42º e 43º do CPA
nos termos do disposto no artigo 40º, nº 1, do CPA, se certificarem de (correspondendo o primeiro ao anterior artigo 41º do CPA revogado).
que têm competência para conhecer da questão que lhes é presente. Trata- Quanto à suplência, vejamos o artigo 42º do CPA:
-se, portanto, de um efetivo controlo inicial e liminar da competência.
"1- Nos casos de ausência,falta ou impedimento do titular do órgão ou do
Ora, atento o estipulado no artigo 40º, nº 2, do CPA, qualquer incompe-
agente, cabe ao suplente designado na lei, nos estatutos ou no regimento, agir no
tência orgânica: exerdcio da competência desse órgão ou agente.
(i) "(...) deve ser suscitada oficiosamentepelo órgão (...)", ou seja, trata-se 2 - Nafalta de designação, asuplência cabe ao inferior hierdrquico imediato
de uma obrigação legal e, por isso, o legislador impõe na norma um dever e, em caso de igualdade de posições, ao mais antigo.
que deve ser exercido por dever de ofício, por regra, se o procedimento 3 - O exerdcio de funções em suplência abrange os poderes delegados ou
administrativo se iniciar por impulso do interessado; e subdelegados no órgão ou no agente."
(ii) "(...) pode ser arguida pelos interessados (...)", ou seja, trata-se agora
de uma possibilidade que permite que a incompetência de um órgão 81E '
ste arago, agora revoga do, consagrava uma solução dual: a primeira, prevista no então
administrativo possa ser questionada por qualquer interessado, quando nº 1, para as situações de erro que fosse desculpável; a segunda, de acordo com o nº 3, para
as restantes situações, em que o erro não seria desculpável. Esta solução criava dificulda-
o procedimento administrativo é iniciado oficiosamente pela Adminis- des acrescidas, não apenas porque só podiam ser avaliadas as situações perante casos con-
tração Pública ou por particular contrainteressado. cretos mas porque, atento ainda o disposto no então nº 4 do referido artigo 34º do ePA,
da qualificação do erro como desculpável ou não desculpável cabia reclamação e recurso,
Em sequência do que atrás ficou dito, importa ainda analisar o disposto pese embora a necessidade de ser sempre corretamente fundamentada aquela qualificação.
Ou seja, esta questão apenas podia ser dirimida caso a caso e atendendo à situação em con-
no artigo 41º do CPA. Vejamos.
creto, competindo a cada órgão recetor decidir se se podia considerar que a apresentação de
Este artigo trata de regular os procedimentos a seguir aquando da apre- requerimento assentava em erro desculpável ou em erro indesculpável, fundamentando de
sentação de requerimento a órgão incompetente. Neste caso, o artigo 41º, todo o modo, nos termos legais, a qualificação que fazia.
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A suplência visa, genericamente, a substituição do titular do órgão ou hierárquico. No entanto, o problema não se coloca apenas quando se
do agente que é feita através do suplente designado na lei, nos estatutos trata de situações jurídico-hierárquicas, bem pelo contrário, como parece
ou no regimento. resultar do nº 1 que, sendo genérico, abarca todas as restantes situações
A suplência ocorre quase sempre em situações de transitoriedade e visa jurídico-organizacionais.
dar solução à ausência ou ao impedimento do titular de um determinado Por fim, no que respeita ao nº 3 do mesmo artigo, importa assinalar que
órgão. Por exemplo, o próprio CPA, no seu artigo 22º, consagra o regime o regime jurídico da suplência "(...) abrange os poderes delegados ou subdele-
da suplência do presidente edo secretdrio dos órgãos colegiais. Assim, de acordo gados no órgão ou no agente"82, o que derroga, ainda que temporariamente,
com o disposto no nº 1 do mesmo artigo, se o presidente do órgão faltar à um dos elementos em que assenta a delegação de poderes - a fidúcia ou
reunião ou, por qualquer razão legal, estiver ou se considerar impedido, a confiança entre delegante e delegado ou entre estes e o subdelegado,
assume a presidência o vogal mais antigo, pois ele é o suplente do presi- dado que o regime jurídico da delegação de poderes, como iremos ver de
dente. Se se tratar do secretário, será suplente o vogal mais recente ou seguida, determina que esta caduca sempre que exista qualquer alteração
menos antigo. A idade dos vogais é apenas importante quando não há subjetiva nos titulares da relação delegatória. Neste caso, isso não acontece.
diferença na antiguidade da vogalidade. A solução aqui prevista é interna ao Olhemos agora para o previsto no artigo 43º do CPA, que estipula que
órgão, podendo ocorrer uma impossibilidade de reunião, se e quando não
"Nos casos em que a lei habilita um 6rgão asuceder, tempordria ou pontual-
forem respeitadas as regras gerais do qu6rum. A solução externa de recurso
mente, no exerc(cio da competência que normalmentepertence a outro órgão, o
a vogais suplentes pode ser o caminho para ultrapassar algumas destas
órgão substituto exerce como competência própria eexclusiva os poderes do órgão
situações, desde que as mesmas sejam conhecidas em tempo oportuno.
substituído, suspendendo-se a aplicação da norma atributiva da competência
Reparemos que a norma atrás invocada se refere às ausências. No en-
deste último:'
tanto, este conceito é um dos que, em Direito Administrativo, chamamos
vago e indeterminado, podendo existir vários graus de indeterminação.
O legislador trata aqui, agora e apenas, de órgãos Oá não do titular de
Hoje, o conceito de ausência deve ser interpretado atendendo aos cir-
órgão ou do agente, como no artigo anterior) que sucedem tempordria (por
cunstancialismos da nossa atualidade.
um período de tempo mais alargado) ou pontualmente (para uma situação
Estes preceitos destinam-se a evitar ausências de poder e indicam-nos
em concreto, mais limitada temporalmente) no exercício da competência de
formas de proceder, na defesa da lei e do interesse público, nos casos em
outro órgão. Aqui, o regime da substituição trata de salvaguardar o exercício
que os titulares da competência a não podem exercer. Em todo o caso,
da competência do (i) substituído, que competirá ao (ii) substituto.
qualquer decisão tomada deve ser fundamentada e quem se sentir lesado
Nestes casos, o substituto vai exercer como competência própria e
pode sempre (por regra) dela interpor reclamação ou recurso ou utilizar as
exclusiva as competências do substituído, o que pressupõe que este não
garantias contenciosas, invocando, por exemplo, o vício da incompetência
pode exercer qualquer poder de direção sobre o desempenho daquele.
relativa ou o de violação de lei, na sequência de não verificação do regime
Não se percebe, no entanto, conforme se teve já oportunidade de referir,
geral de funcionamento dos órgãos (colegiais) e dos seus titulares.
o conteúdo útil da parte final do preceito que determina a suspensão da
O regime da suplência trata de salvaguardar o exercício da competên-
norma atributiva da competência do substituído...
cia do (i) titular de órgão ou do (ii) agente (a) ausentes, (b) faltosos, ou
(c) impedidos, que competirá, nos termos da lei, em qualquer dos casos
3.1.4. Da delegação de poderes
(titular de órgão ou agente) ao (iii) suplente.
A propósito das regras gerais sobre órgãos da Administração Pública, o novo
Importa ainda referir que o nº 2 do artigo 42º do CPA apenas parece
ePA estabelece o regime jurídico da delegação de poderes, que decorre
aplicar-se às situações de hierarquia administrativa, dado que resolve o
problema da falta de designação do suplente através da figura do inferior 82 Regime em tudo idêntico ao previsto no artigo 41º, n Q 3, do anterior erA.
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do disposto nos seus artigos 44º a SOº (anteriormente, o regime jurídico Estes são, portanto, os elementos estruturais da delegação de poderes
da delegação de poderes constava dos artigos 3Sº a 40º do CPA revogado). expressa, ou seja, aquela que reúne os quatro componentes e, designada-
Este instituto consiste na faculdade legal, via ato administrativo, de um mente, um ato administrativo delegatório autónomo que concretiza, na
órgão primariamente competente para tomar uma decisão permitir que prática e de forma expressa, a delegação de competências.
outro possa exercer a competência sobre a mesma matéria. Como esta Existe, contudo, a possibilidade de a delegação de poderes ser tácita, o
possibilidade decorre da lei, não há qualquer violação das características da que significa que resulta diretamente da lei, inexistindo, por isso, a neces-
competência já estudadas, designadamente, a da inalienabilidade, prevista sidade de outro ato jurídico permissivo expresso e independente. Esse ato
no artigo 36º, nº 1, do CPA. administrativo existe mas não é autónomo e está incorporado na própria
Vejamos, pois, o que diz o Código, no nº 1 do seu artigo 44º (corres- lei habilitadora da delegação de competências.
pondente ao anterior nº 1 do artigo 3Sº do CPA revogado): Atendamos aos seguintes exemplos:

"Os 6rgãos administrativos normalmente competentes para decidir em Como exemplo de delegação de poderes expressa temos a que resulta
determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, do regime jurídico das autarquias locais87 e que está prevista no seu
permitir, através de um ato de delegação de poderes, que outro 6rgão ou agente artigo 34º, nº 1. Aqui se possibilita que as câmaras municipais possam
da mesma pessoa coletiva ou outro 6rgão de diferente pessoa coletiva pratique delegar nos seus presidentes um conjunto de matérias aí previstas.
Sempre que uma câmara municipal delibera delegar no seu presi-
atos administrativos sobre a mesma matéria."
dente, de acordo com esta lei, um conjunto de competências, estaremos
Verificamos que este preceito prevê, por um lado, a (i) delegação de na presença de uma delegação de poderes expressa.
poderes intrasubjetiva (dentro do mesmo sujeito coletivo), a qual se esta- Assim: a lei habilitadora é o supra referido regime jurídico, o dele-
belece entre (a) um órgão delegante e (bi) um órgão delegado da mesma gante é a câmara municipal, o delegado será, neste exemplo, o presidente
pessoa coletiva ou (bii) um agente da mesma entidade. Tratando-se de (ii) da câmara municipal e o ato jurídico permissivo constará da delibera-
delegação de competências intersubjetiva (entre estruturas orgânicas de ção aprovada pela câmara que procede, em concreto, à delegação de
distintas pessoas coletivas), esta norma habilita em potência a delegação de competências e que elenca os poderes que possibilita que possam ser
poderes entre (a) um órgão delegante e (b) um órgão delegado externo à exercidos, em concreto, pelo delegado.
entidade coletiva a que pertence o delegante.
Daqui resultam os elementos do instituto da delegação de poderes, que Como exemplo de delegação de poderes tácita temos a que está
prevista na Lei Orgânica do XIX Governo Constitucional88 , especifi-
passam pela exigência legal de
camente no seu artigo 6º, nº 2, que diz:
- Uma lei de habilitaçãO ou habilitante83;
"A competência atribuída por lei ao Conselho de Ministros no âmbito dos
- Dois elementos subjetivos:
assuntos correntes da Administração Pública, considera-se delegada no Primeinr
- Um delegante 8\
-Ministro, comfaculdade de subdelegação em qualquer membro do Governo':
- Um delegad085; e
- Um ato jurídico permissivo de delegação de poderes86 •
87 Cfr. Lei nº 75/2013, de 12 de setembro, que estabelece o regime jurídico das autarquias lo-
83 Aquela que prevê, expressamente, a possibilidade de delegação de competências. cais, aprova o estatuto das entidades interrnunicipais, estabelece o regime jurídico da trans-
8~ O que procede e efetiva a delegação de poderes. ferência de competências do Estado para as autarquias locais e para as entidades Interrnuni-
as O destinatário da delegação de poderes. cipais e aprova o regime jurídico do associativismo autárquico.
86 Que, em concreto, proceda à delegação de poderes. 88 Cfr. Decreto-Lei nº 86-A/2011, de 12 de julho.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE OS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Ora, como podemos verificar neste caso, existem aqui dois órgãos "(...) especificar os poderes que são delegados (...) ou os atas que o delegado
administrativos distintos: o órgão delegante, que é o Conselho de (...) podepraticar, bem como mencionar anorma atributiva do poder delegado
Ministros; o órgão delegado que é o Primeiro-Ministro; e existe uma eaquela que habilita o6rgão adelegar"
lei habilitadora que dispensa o ato administrativo expresso e autónomo
de delegação de poderes, já que é ela que procede, de forma direta e e, nos termos do nº 2 do mesmo artigo 47º,
imediata, à delegação de competências, considerando via legis que a
mesma competência se encontra já delegada no Primeiro-Ministro. "os atas de delegação ou subdelegação de poderes estão sujeitos apublicação,
O que significa afirmar que a lei habilitante incorpora um ato adminis- nos termos do artigo 1599."
trativo de delegação de poderes.
Agora, a publicação é alargada à publicidade, atento o disposto no artigo
Parece ser de assinalar a definição legal de agente, que nos é apresentada 159º do CPA. Deste modo, a delegação de poderes terá de ser publicada
agora pelo legislador, no nº 2 do artigo 44º do CPA. Assim, agente é todo no jornal oficial e também na Internet, no sítio institucional. Vejamos,
"(...) aquele que, a qualquer título, exerça funções públicas ao serviço da pessoa "Quando a lei impuser apublicação do ato, mas não regular os respetivos
coletiva, em regime de subordinaçãojurídica (...)". termos, deve a mesma serfeita no Diário da República ou na publicação oficial
O nº 3 estipula que os órgãos competentes para decidir em deter- da entidadepública, ena Internet. no sítio institucional 89da entidade em causa,
minada matéria podem sempre (o que dispensa a existência de uma lei no prazo de 30 dias (...)".
habilitadora autónoma) "(...) permitir que oseu imediato inferior hierárquico,
adjunto ou substituto pratiquem atas de administração ordinária nessa matéria". Em síntese, podemos afirmar que o ato delegatório deve especificar os
A questão da administração ordinária - e, sobretudo, os seus âmbito e poderes delegados e os fundamentos jurídicos delegatórios e ser submetido
conteúdo - não se encontra definida no CPA. Há de ser o intérprete a a publicação, bem como ser publicitado.
verificar a admissibilidade de qualquer conduta naquele âmbito, que Neste caso, inexistindo publicação do ato delegatório, deve o mesmo
necessariamente requererá fundamentação expressa. O nº 4 remete para considerar-se ineficaz, porque se se considerasse que a falta de publicação
os casos de delegações de poderes de administração ordinária de órgãos era geradora de um vício legal e, por consequência, de uma invalidade jurí-
colegiais nos seus presidentes. dica, apenas poderia ser a da anulabilidade. Ora, se assim fosse, embora
O novo CPA veio consagrar expressamente, no seu artigo 44º, nº 5, que
inválido, o ato seria eficaz, contrariando o que se pretende ao estipular a
"(...) os atas praticados ao abrigo de delegação ou subdelegação de poderes exigência de publicidade que está, regra geral, na ordem jurídica, intima-
valem como se tivessem sido praticados pelo delegante ou subdelegante". mente relacionada com o conhecimento do teor dos atos e, desta forma,
com a eficácia jurídica.
Já havia, anteriormente, um certo entendimento na doutrina em como os Convém ainda referir que o artigo 4Sº do CPA estipula, agora, a proi-
delegados, ao abrigo da delegação de poderes, praticariam atos definitivos bição genérica de uma delegação global dos poderes do delegante, atento
quando os delegantes os pudesse praticar nos termos da sua competência. o consagrado na sua alínea a), e nas duas alíneas seguintes consagra dois
Importa ainda, neste âmbito, fazer referência aos requisitos do próprio tipos de poderes insuscetíveis de delegação, que são:
ato administrativo de delegação de competências, que se encontra vin-
culado aos princípios da especificação e da publicidade, devendo indicar i) os poderes suscetíveis de serem exercidos sobre o próprio dele-
os fundamentos em que assenta a delegação. Isto significa, respetivamente, gado, atento o teor da alínea b).
que o delegante deve, nos termos do disposto no nº 1 do artigo 47º do novo
CPA (correspondente ao nº 1 do artigo 37º do CPA revogado), 89 Sublinhado nosso.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEOlMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE OS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Por exemplo, o conselho administrativo de um instituto público não do artigo 46º do CPA é o regime jurídico habilitador para a subdelegação
pode delegar no presidente do instituto competências para este autorizar de competências.
despesas próprias. Esta solução agora adotada, c que proíbe o exercício Tal como fizemos para a delegação de competências, vejamos os ele-
de poderes sobre o próprio, já resultava - e continua a resultar - do mentos estruturantes do instituto da subdelegação de poderes, que passam
disposto nas garantias de imparcialidade. É, por isso, coerente. Assim, pela exigência de:
qualquer titular de órgão ou agente não pode intervir em procedimento,
- Uma lei de habilitação ou habilitante não proibitiva91;
ato ou em contrato administrativos quando neles tenha interesse, nos
- Três elementos subjetivos:
termos do alínea a) do nº 1 do artigo 69º do CPA; e
- Um delegante;
- Um subdelegante 92 ;
ii) os poderes a exercer pelo delegado fora do âmbito da respetiva
- Um subdelegad093 ;
competência territorial, nos termos do disposto na alínea c).
- Um ato jurídico de delegação de poderes expressamente autorizante 9\
Por exemplo, um ministro não pode delegar num diretor de serviços
atento o disposto no artigo 46º, nº 1, do CPA; e
de Lisboa (isto é, cuja competência administrativa se circunscreve ao
- Um ato jurídico permissivo, o de subdelegação de poderes.
distrito de Lisboa) competências que possam ser exercidas por este
órgão no distrito de Viseu. Ou, uma câmara municipal não pode dele-
Esquematizemos de seguida as figuras jurídicas estudadas:
gar numa junta de freguesia competências de forma a que esta atue no
território de outra freguesia diferente.
lh
Consagra-se, desta forma, um núcleo de poderes indelegáveis e um
princípio de indelegabilidade.
Para além de tudo o que ficou dito, importa referir que, dentro deste
instituto da delegação de poderes, existe a possibilidade de haver uma
subdelegação depoderes. Através desta figura, o destinatário da delegação de a (t+e) b (t) c(t)
competências - o delegado - pode, nos termos do disposto no artigo 46º do
CPA (anteriormente, o regime jurídico da subdelegação de competências
estava previsto no artigo 36º do CPA agora revogado), subdelegar os poderes l~(e)~(e)
que recebeu, tornando-se, desta forma, subdelegante, e permitindo, através
de um novo ato administrativo permissivo, neste caso, de subdelegação de
poderes, que outro órgão - o subdelegado - exerça a mesma ou parte da
ajp (dp) ajp (sdp)
competência que ele recebera por delegação de competências. Legenda: lh -lei habilitante; a - delegante; b - delegado/subdelegante; c - subdelegado; ajp - ato jurídico
Nestes casos, contudo, exige-se que o delegante autorize expressamente permissivo; dp - delegação de poderes; sdp - subdelegação de poderes: t - titularidade; e - exercício
a subdelegação de poderes, caso contrário ela não é admissível, embora a
lei habilitante possa ser, no mínimo, omissa90 quanto a esta possibilidade. 91 Pode ser omissa quanto à possibilidade de subdelegação de poderes, o que significa que o

Se a lei for omissa quanto à subdelegação de poderes, o disposto no nº 1 título habilitador é, indiretamente, o disposto no anigo 46 9 , nº I, do novo ePA.
92 Que é o delegado.

93 Destinatário da subdelegação de poderes.

90Quer isto dizer que a lei habilitante apenas não pode proibir expressamente a subdelega- 94 Neste caso, a omissão pelo delegante é sinónimo de proibição de subdelegação de pode-
ção de competências, podendo, deste modo, ser omissa ou autorizar expressamente. res.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE OS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Por fim, é de referir que, atento o disposto no nº 2 do artigo 46º do CPA, - Mudança dos titulares dos órgãos envolvidos; ou
o subdelegado também pode subdelegar as competências que recebeu, - Verificação de um termo resolutivoIOo •
"(...) salvo disposição legal em contrdrio ou reserva expressa do delegante ou subde-
legante". Importa assinalar que o exercício de competências em regime de dele-
O CPA, no artigo 49º (correspondente ao anterior artigo 39º do CPA gação de poderes deve ser sempre, obrigatoriamente, mencionado, atento
revogado), prevê, de forma genérica, os poderes do delegante e do sub- o disposto no artigo 48º, nº 1, do CPA, e que a falta de menção da qualidade
delegante e que, em síntese, são os seguintes: de delegado ou subdelegado e dos respetivos atos habilitadores ou a "(...)
menção incorreta da sua existência edo seu conteúdo, não aJeta a validade do ato,
- Poder de direçã0 9s ; mas os interessados não podem ser prejudicados no exerdcio dos seus direitos pelo
- Poder de avocação 96 ; desconhecimento da existência de delegação ou subdelegação", de acordo com o
- Poderes desintegrativos: previsto no artigo 48!!, n!! 2, do CPA. Parece, portanto, haver apenas uma
- Poder anulatóri097; mera irregularidade.
- Poder revogatóri0 98 ; e Em conclusão, importa assinalar que a delegação de poderes, como
- Poder de substituição ou de modificaçã0 99 • verificámos, resulta sempre de uma possibilidade legal. Quando existe
delegação de competências, o órgão delegante não perde os seus poderes
Estes poderes, como vimos, podem ser exercidos pelo delegante e pelo mas passa a existir uma competência que pode ser exercida por dois órgãos,
subdelegante, mas o primeiro pode exercê-los plenamente sobre todos os como se ela fosse agora concorrencial. No entanto, enquanto a competência
atos praticados pelos delegado e subdelegado, enquanto que o segundo do delegante é firme, porque resulta direta e imediatamente da lei, a dos
apenas pode exercer os poderes agora estudados perante o subdelegado. delegado e subdelegado é sempre precária, porque pode cessar a qualquer
Por fim, de referir que são causas de extinção da delegação ou da sub- momento, por ato do delegante.
delegação de poderes, nos termos do disposto no artigo SOº do novo CPA
(correspondente ao anterior artigo 40º do CPA revogado): 3.1.5. Dos conflitos de atribuições e de competências
O Capítulo V da Parte II do CPA refere-se aos conflitos de atribuições e
- A anulação (quando é juridicamente imperfeita e se gera anulabilidade
de competência lOI • Importa precisar estas realidades, embora sem uma
da delegação de poderes);
preocupação de esgotar o seu tratamento.
- A revogação; e
Os conflitos podem, neste âmbito, ser de dois tipos diferentes, atento
- A caducidade, que pode operar por:
o disposto no artigo Slº do CPA. Vejamos:
- Esgotamento de efeitos;

9S Significa que o delegante pode emanar ordens e diretivas sobre a forma de exercício da 100 Embora não prevista expressamente, decorre da possibilidade legal de se determinar!

competência delegada. !estabelecer um prazo de vigência para a delegação ou subdelegação de poderes.


96 É o poder de chamar a si a resolução de um processo administrativo ou de um incidente lO! Antes, previa-se igualmente a questão dos conflitos de jurisdiçãO, ou seja, todos aqueles

autónomo, no âmbito do procedimento administrativo. que opõem um órgão da Administração Pública a um órgão jurisdicional, sendo resolvidos,
97 A faculdade administrativa de desintegrar um ato administrativo, por invalidade geradora nos termos do disposto no então artigo 42º, nº 1, do CPA revogado, pelo Tribunal de Con-
de anulabilidade. flitos. (Na nossa ordem judiciária, existem diversas categorias de tribunais. O artigo 209º da
98 Traduz-se no poder de fazer cessar a delegação de poderes, bem como os atos praticados CRP prevê essas categorias. Além do Tribunal Constitucional, existem ainda o Supremo Tri-
ao abrigo desta, por razões de mérito. bunal de Justiça e os tribunais judiciais; o Supremo Tribunal Administrativo e os restantes
99 Traduz a faculdade de alterar o conteúdo do ato e, portanto, a disciplina por ele estabele- tribunais administrativos e fiscais; o Tribunal de Contas, entre outros.) Estas questões são,
cida. hoje, reguladas pela legislação do contencioso.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE OS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

- Conflitos de atribuições são todos aqueles que opõem, nomeadamente, 3.2. Recomendação
órgãos administrativos de diferentes pessoas coletivas, autoridades admi- O estudante deve, neste momento, conhecer as principais regras gerais
nistrativas independentes ou órgãos de diferentes ministérios10 2 e que que dizem respeito às estruturas orgânicas da Administração Pública.
são resolvidos nos termos das diferentes alíneas do nº 1 do mencionado
artigo; e 3.3. Exercício formativo
a) Diga o que entende por órgão administrativo;
- Conflitos de competêncialO3 são todos aqueles que opõem órgãos da mesma b) Distinga quórum deliberativo de quórum de funcionamento;
pessoa coletiva ou órgãos do mesmo ministério, resolvidos de acordo com c) Distinga suplência de substituição;
o previsto no nº 2 do mesmo normativo. d) Refira-se às características genéricas da competência;
e) Enumere os elementos de uma delegação de poderes;
Para terminar, importa, no entanto, referir que estes conflitos podem ser: f) Distinga delegação de poderes expressa de delegação de poderes
tácita. Dê exemplos; e
- Positivos, quando as entidades ou os órgãos em causa entendem que g) Elenque os poderes do delegante, no âmbito da delegação de po-
têm atribuições ou competência, respetivamente, para decidir sobre a deres.
matéria; ou

- Negativos, sempre que as entidades ou os órgãos entendem não ter


atribuições ou competência, respetivamente, para conhecer da questão,
havendo como que um vazio em termos estruturais. Nenhum dos órgãos
reconhece, por isso, ter atribuição ou competência para agir, para a prática
do ato administrativo ou para intervir no procedimento administrativo.

A resolução de qualquer destes conflitos está, ainda, sujeita ao disposto


no artigo 52º do CPA.
Note-se que o legislador impõe regras que se destinam a ser aplicadas por
órgãos ou titulares de órgão de governo próprio das Regiões Autónomas
dos Açores e da Madeira, o que pode de alguma forma, u citar a dúvida
sobre se estas questõesnâo deveriam ser prevista cm legislação regional.

102 Não esqueçamos que os ministérios são conjuntos de serviços estaduais organizados

tendo em atenção as atribuições ou fins prosseguidas. Organizam-se, portanto, como se se


tratassem de verdadeiras pessoas coletivas.
103 A propósito, especificamente, dos conflitos de competência territorial, vide os pressupos-

tos de resolução dos mesmos, previstos no artigo 39 2 do ePA (correspondente ao anterior


artigo 32º do ePA revogado).
4. Palestra sobre procedimento administrativo

SUMÁRIO:
Regime comum: disposiçóes gerais. Dos acordos endoprocedimentais. Da rela-
ção jurídica procedimental. Dos sujeitos do procedimento. Dos interessados
no procedimento. Da conferência procedimental. Do direito à informação.
Dos prazos. Das medidas provisórias. Dos pareceres. Da extinção do procedimento.
Procedimentos do regulamento e do ato administrativos. Procedimento privativo
do regulamento administrativo. Procedimento privativo do ato administrativo.
Da iniciativa particular. Das notificaçóes. Da instrução. Da audiência dos interes-
sados. Da decisão e outras causas de extinção do procedimento. Comunicações
prévias. Recomendação. Exercício formativo.

4.1. Regime comum: disposições gerais


O novo CPA prevê, na Parte III - Do procedimento administrativo, dois
títulos: o Título I respeitante ao regime comum do procedimento admi-
nistrativo (artigos 53º a 95º) e, a partir do artigo 96º, o Título II com as
regras peculiares dos procedimentos privativos do regulamento e do ato
administrativos, em dois capítulos autónomos (artigos 97º a 101º e artigos
102º a 134º, respetivamente).
Estudemos, para já, as principais disposições do regime comum a todos
os procedimentos mas, antes, vejamos alguns conceitos que são importantes.
Por procedimento administrativo104 entende-se, nos termos do nº 1 do
artigo 1º do CPA,

\04Víde, a este propósito, Diogo Freitas do Amaral, Fases do procedímento decís6rio do 1" grau,
Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa,
Volume VI, 1992, pág. 2S e segs.
CURSO SOBRE O N01D CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

"(...) asucessão ordenada de atos eformalidades relativos àformação, mani- estão nos artigos 58º e 59º do CPA, respetivamente (correspondentes aos
festação eexecução da vontade dos órgãos da Administração Pública." anteriores artigos 56º e 57º do CPA revogado).
O princípio do inquisitório permite ao responsável pela direção do
São vários os elementos constitutivos da definição legal e que importa procedimento e aos outros órgãos que participem na instrução, atento
sintetizar: o disposto no artigo 58º do CPA, em suprimento dos interessados ou de
qualquer dos sujeitos procedimentais, e até independentemente da suas
- Sucessão juridicamente ordenadà (por lei);
vontades, poderem
- De um conjunto de atos e de formalidades;
- Com o objetivo de aferir (ou formar), manifestar (revelar ou exte- "(...) proceder aquaisquer diligências que se revelem adequadas enecessárias
riorizar) ou executar (aplicar ou cumprir) a vontade dos órgãos da àpreparação de uma decisão legal ejusta, ainda que respeitantes amatérias não
Administração Pública. mencionadas nos requerimentos ou nas respostas dos interessados."

Depois de encontrarmos esta definição legal, podemos estabelecer Ou seja, as instâncias com poderes jurídico-administrativos responsáveis
a distinção com o conceito de processo administrativo, que, nos termos pela direção do procedimento administrativo ou que participem na sua
do disposto no nº 2 do referido artigo 1º do CPA, é o suporte físico ou a instrução, ainda que instaurado por iniciativa dos interessados, podem
plataforma em que se reúnem os diferentes documentos necessários ao realizar ou ordenar, mesmo que oficiosamente, todas as diligências que
desenvolvimento do procedimento administrativo e toda a informação útil considerem necessárias ao apuramento da melhor decisão administrativa
à boa decisão da Administração Pública. No processo administrativo, que a tomar, independentemente de as partes terem requerido tais diligências.
pode ser eletrónico, podemos encontrar diferentes tipos de documentos, Mais uma vez se exigem (i) adequação e (ii) necessidade, que terão de ser
desde os oficiais, passando por documentos particulares e nominativos demonstradas porque, cada vez mais, o que interessa ao legislador é que a
e que podem conter dados pessoais, desde que respeitadas as normas Administração Pública possa, de forma substantiva, atuar de acordo com
legalmente em vigor sobre a matéria, informações de serviços, pareceres a lei, tomando a melhor e mais justa decisão em tempo considerado útil.
técnicos, entre muitos outros. O tradicional princípio do dispositivo, que permite ao decisor em sen-
Como podemos verificar, o CPA, que comporta alguns artigos mera- tido lato, qualquer que seja, decidir apenas e somente conforme os factos
mente doutrinais, define, igualmente, no aludido nº 2 do seu artigo 1º, o apresentados pelos interessados, proibindo-se-Ihe a promoção de novas
processo administrativo, dizendo que é diligências para ir mais longe eprocurar novos factos, opõe-se ao princípio
"(...) o conjunto de documentos devidamente ordenados em que se traduzem do inquisitório, que possibilita o contrário, como resulta, entre nós, do
os atos eformalidades que integram oprocedimento administrativo." referido no artigo 58º do ePA: buscar factos não alegados pelos interessa-
dos no procedimento administrativo, promover oficiosamente diligências
Não restam, por isso, quaisquer dúvidas sobre estas duas realidades adequadas e necessárias, alargando os poderes do órgão da Administração
concetuais, dado que o legislador dispensou a doutrina de estabelecer as Pública e possibilitando um melhor conhecimento com vista a uma mais
definições, sendo estas, por isso, legais. acertada decisão.
No Capítulo I do Título I da Parte III do CPA (artigos 53º a 64º), con- Em conclusão, podemos afirmar que o princípio do inquisitório se opõe
sagram-se algumas disposições gerais e estruturantes (de regime comum) ao princípio do dispositivo, dado que com este o titular do procedimento
do procedimento administrativo, em parte influenciadas por algumas está plenamente limitado nos seus poderes, em função daquilo que são os
regras do contencioso administrativo português. Uma destas instituições pedidos das partes envolvidas. O CPA adotou como princípio fundamental,
é o princípio do inquisitório e outra o dever de celeridade, previstas que desde 1991, o do inquisitório, alargando o poder de intervenção de quem
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

é titular do procedimento ou do órgão que conduz a instrução ou nele Importa igualmente assinalar que, nos termos do disposto no artigo 54º
intervém. Com esta opção, o legislador valorizou e valoriza a justiça mate- do CPA, consagra-se a partir de agora a Língua Portuguesa com a língua
rial da decisão em detrimento da justiça formal e, com isto, visa a decisão do procedimento administrativo.
legal e justa, como resulta da parte final do disposto no artigo 58º do CPA. No artigo 55º do CPA, consagram-se novas regras sobre a direção do
Quanto à imposição de rapidez, importa recordar, de novo, que é no procedimento administrativo. Aqui se prevê, no nº 1, que a direção do pro-
artigo 59º do CPA que se estipula um dever geral de celeridade. Vejamos cedimento cabe ao órgão com competência para a decisão final mas o nº 2
a norma, que é clara na suas disposições: do mesmo artigo impõe um dever de delegar num inferior hierárquico o
poder de direção do procedimento, embora, como se refere no preâmbulo
"O responsdvelpela direção do procedimento e os outros 6rgãos intervenientes do decreto-lei que aprova o novo CPA, "(...) rodeado de prudentes cldusulas de
na respetiva tramitação devem providenciarpor um andamento rdpido eeficaz, salvaguarda (...)". Há assim, por regra, uma separação clara entre a função
quer recusando eevitando tudo o quefor impertinente edilat6rio, quer ordenando instrutória e a função decisória. Este dever de delegar apenas não deve ser
epromovendo tudo o que seja necessdrio a um seguimento diligente e à tomada exercido se existir "(...) disposição legal, regulamentarou estatutdria em contrdrio
de uma decisão dentro de prazo razodvel:' ou quando a isso obviarem as condições de serviço ou outras razõesponderosas (...)",
atento o disposto na parte final do nº 2 do artigo 55º do CPA.
A questão da celeridade está muito presente ao longo de todo o CPA, Importa assinalar que, nos termos do disposto no nº 4 do mesmo artigo,
designadamente, no âmbito dos princípios da boa administração e da tratando-se de um órgão colegial que tenha competência para a decisão
adequação procedimental, previstos nos artigos 5º, nº 1, e 56º do CPA, final, a delegação deve ter como destinatário um membro do respetivo
respetivamente. órgão ou um agente que dele dependa.
Depois de termos analisado dois aspetos estruturantes do procedimento Uma das questões que se levanta é a de saber se esta delegação deve
administrativo, importa referir que este pode iniciar-se, nos termos do seguir, na íntegra, o regime jurídico da delegação de poderes. Fica a dúvida.
disposto no artigo 53º do CPA (correspondente ao anterior artigo 54º do Importa ainda assinalar que, atento o disposto no artigo 55º, nº 5, do
CPA revogado), CPA, o nome da pessoa responsável pela direção do procedimento é noti-
"(...) oficiosamenteIOS ou asolicitação dos interessados': ficado oficiosamente aos participantes, figura com grande amplitude que
remete não apenas para o universo dos interessados mas que inclui no
Isto significa que a própria Administração Pública pode, independen- seu perímetro, igualmente, todos os que participarão no procedimento
temente da vontade dos particulares ou de quaisquer interessados, dar administrativo e que podem não ser os interessados. Esta comunicação
início ao procedimento administrativo. Como podemos verificar, a função pode ainda vir a ser prestada"(...) aquaisquer outraspessoas que, demonstrando
administrativa do Estado é uma função ativa, já que, ao contrário da ju- interesse legítimo, requeiram essa informação."
risdicional 106 - afeta aos tribunais - a quem compete a administração da Por outro lado, o artigo 60º do CPA estipula, sob a epígrafe Cooperação
justiça e a justa composição de litígios, não necessita de impulso externo eboaféprocedimental, um conjunto de disposições genéricas sobre coope-
para atuar. ração entre órgãos administrativos e interessados, bem como, nos termos
do nº 2, um conjunto de deveres gerais dos interessados, designadamente,
lOS Por dever e vontade da Administração Pública e independentemente de impulso procedi- no decurso do procedimento administrativo. Mais uma vez, o legislador
mental externo de qualquer particular ou interessado. inscreve (e repete IO?) princípios gerais fora da sua sistemática inicial.
106 Caracterizada por ser uma função passiva, que necessita, para intervir, de um impulso

processual externo que resulta de as partes (as pessoas singulares, coletivas ou o Ministé-
rio Público) levarem ao seu conhecimento factos que determinem legalmente a sua inter- o princípio da boa-fé está anteriormente previsto como vinculando todo o procedimento
107

venção. administrativo, no artigo 1Oº do ePA.


CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

o princípio geral que vigora é o da estrita colaboração e cooperação do da Ciência Jurídica, designadamente, da Informática e das Tecnologias de
entre a Administração Pública e os interessados, devendo estes evitar todas Informação e Comunicação. Daí a importância da partilha de conhecimento
as manobras dilatórias que impedem a celeridade procedimental, que se entre as diversas áreas do Saber, dado que algumas expressões, conceitos
pretende seja um dos pilares do procedimento gracioso e que por todos e realidades que o Direito acolhe apenas podem ser totalmente conhecidas
os intervenientes deve ser fomentada. e integradas com o aUXIlio de outras áreas técnicas.
Importa ainda salientar que os interessados estão vinculados ao prin- O disposto no artigo 63º do CPA refere-se às comunicações efetuadas por
cípio da veracidade dos factos relatados e ao princípio da legalidade da telefax, telefone ou meios eletrónicos. Atento o estipulado no nº 1 e salvo
pretensão. Desta forma, não devem e não podem articular factos contrários disposição legal em contrário, as comunicações da Administração Pública
à verdade nem apresentar requerimentos ou quaisquer outras petições, com os interessados só podem ser efetuadas através daqueles meios "(oo.)
representações ou impugnações contrárias à lei. mediante seu prévio consentimento, prestado por escrito (oo.)". Para isso devem os
Como vimos anteriormente, o novo CPA veio dar grande ênfase ao uso interessados, aquando da sua primeira intervenção procedimental, "(oo.)
dos meios eletrónicos pela Administração Pública. O artigo 61º do CPA indicar, para o efeito, o seu número de teleJax, teleJone ou a identificação da caixa
impõe a utilização preferencial dos meios eletrónicos no decorrer do postal eletrónica de que é titular, nos termos previstos no serviço público de caixa
procedimento administrativo, se lei avulsa não determinar coisa diferente. postal eletrónica:'
O nº 2 do artigo impõe, aquando da utilização de meios eletrónicos Quanto à questão do serviçopúblico de caixapostal eletrónica, importa referir
durante a instrução, a obrigatoriedade de indicação do "(...) responsável que, em Portugal, é um serviço que permite receber correio em formato
pela direção do procedimento 108 e o órgão competente para a decisão (...)" e o eletrónico e digital com valor legal e que tem estado concessionado aos
nº 3 assegura aos interessados um conjunto de garantias que salvaguarda CIT, através do serviço ViaCTT, que é gratuito. É de salientar, no entanto,
o exercício de direitos dos interessados, designadamente, o conhecimento que se podem colocar questões de vária ordem sobre a obrigatoriedade de
do estado do procedimento administrativo. recorrer a este serviço. Por um lado, porque se os interessados indicarem,
Neste mesmo artigo, nos termos do disposto no nº 3, alínea b), o le- voluntariamente, outro qualquer endereço eletrónico que não corres-
gislador vai ao ponto de se preocupar com a necessidade de facilitar aos ponda ao endereço eletrónico do serviço ViaCTT não deverá o mesmo
interessados, designadamente, nome do utilizador e palavra-passe de modo deixar de ser usado, pois recai sobre o interessado um dever de consulta
a poderem comunicar eletronicamente, através de plataformas, com as da sua caixa de correio eletrónica, mas, por outro lado, não deixa de ser
estruturas administrativas e, quando a lei preveja, ainda "(...) conta de correio correto afirmar que o legislador se refere expressamente àquele serviço.
eletrónico eassinatura digital certificada." Reconhecemos, por isso, que se trata de uma questão complexa e que pode
A utilização dos meios eletrónicos visa desmaterializar fisicamente os levantar algumas reservas, quer por parte dos interessados quer por parte
procedimentos e, sobretudo, os processos administrativos. das entidades administrativas.
O novo CPA impõe, de seguida, no seu artigo 62º, que, sempre que pos- O nº 2 do mesmo artigo consagra uma presunção de consentimento
sível, o procedimento administrativo deve correr através de um balcão único quando, na ausência de consentimento prévio escrito, nos termos do nº 1,
eletrónico, nos termos e observadas as regras previstas naquele normativo. "(oo.) ointeressado (.oo) tenha estabelecido contacto regular através daqueles meios."
Estas regras relativas à utilização genérica de meios eletrónicos necessitam Neste caso, exige-se à Administração Pública que preencha o conceito
de ser interpretadas à luz de alguns conceitos que são de domínios distintos vago e indeterminado de contacto regular, necessitando de se fundamentar,
em qualquer dos casos, a verificação ou não do pressuposto substantivo
108Naturalmente que, aqui, o legislador está a pensar não apenas no órgão decisor mas igual- da regularidade. O nº 3 do referido artigo 63º estipula regras específicas
mente, a nosso ver, no delegado que vai assumir a direção do procedimento, de acordo com relativas às comunicações da Administração Pública com pessoas coletivas,
imposição que decorre do artigo 55r, nº 2, do ePA; caso contrário, há coincidência de estru-
turas, atento o disposto no n" 1 do mesmo artigo.
reduzindo algumas das exigências anteriormente referidas e relativas a
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pessoas singulares e dispensando o "(...) consentimento, quando sejam efetuadas condução do procedimento, ou seja, "na ausência de normasjurfdicas injun-
para plataformas informáticas com acesso restrito ou para os endereços de correio tivas-° 9, o responsável pela direção do procedimento goza de discricionariedade na
eletrónico ou número do telefax ou de telefone indicados em qualquer documento por respetiva estruturação (...)", atento o disposto na parte inicial do já referido
elas apresentado no procedimento administrativo ." artigo 56º do CPA. Esta liberdade está, no entanto, vinculada (i) pelos
Por fim, o artigo 64º do CPA encerra o capítulo I relativo às disposições princípios gerais da atividade administrativa e deve ser orientada (ii) pelos
gerais do procedimento administrativo e trata, em concreto, da documen- interesses públicos da participação, da eficiência, da economicidade e da
tação das diligências e integridade do processo administrativo. Assim se prevê, celeridade na preparação da decisão, atento o estipulado no mesmo arúgo
no seu nº 1, que 56º, infine, do CPA. Ou seja, a tal liberdade concedida pelo legislador para
"Das diligências realizadas oralmente são lavrados autos e termos, que de- estruturar discricionariamente o procedimento não pode desrespeitar os
vem conter a menção dos elementos essenciais eda data elugar da realização da limites e não deixar de ter em conta os fins determinados pelo legislador,
diligência a que respeitam." no referido artigo do CPA. Este novo princípio parece um pouco incon-
gruente com a própria ideia da existência de um diploma legal codificador
Por outro lado, o nº 2 refere que de regras injuntivas que visam organizar e reger o próprio procedimento
administrativo. A final, é disso que se encarrega o próprio CPA...
"Oprocesso administrativo em suporte depapel é autuado epaginado de modo Na sequência do que atrás ficou dito, o legislador veio a consagrar a
afacilitar a inclusão dos documentos que nele são sucessivamente incorporados possibilidade de se celebrarem acordos endoprocedimentais, nos termos
ea impedir oseu extravio." previstos'no artigo 57º do CPA. Estes acordos, dada a expressão endopro-
cedimentais que os identifica, regulam o que está dentro do procedimento.
Isto é, os documentos devem ser juntos e reunidos numa única peça (que Por isso, o decisor público e os interessados podem, por escrito, acor-
pode vir a ter vários volumes), o que passa a permitir a junção e numera- dar termos do procedimento, de acordo com o disposto no artigo 57º,
ção de nova documentação e que ajuda a impedir o seu desaparecimento. nº 1º, do CPA. Trata-se, verdadeiramente, de um modo de articular e de
O nº 3 vem impor a necessidade de o órgão responsável pela direção do conciliar, de forma vinculativa para ambas as partes acordantes, alguns
procedimento "(...) rubricar todas as folhas do processo administrativo (...)" aspetos do procedimento. Se atendermos ao referido no nº 2 do artigo
e assegurar o direito aos interessados e seus mandatários de rubricar, 57º do CPA, podemos verificar que "(...) o seu objeto pode, designadamente,
igualmente, quaisquer folhas que desejem do processo administrativo, consistir na organização de audiências oraispara exercício do contraditório entre os
salvaguardando o nº 4 os casos específicos de processos administrativos em interessados quepretendam uma certa decisão eaqueles que se lhe oponham" mas,
suporte eletrónico. Ora, o facto de se permitir aos interessados e aos seus como a própria norma refere, este é apenas um mero exemplo que ilustra
mandatários a rubrica das páginas dos processos administrativos significa a possibilidade do conteúdo de um acordo endoprocedimental. Aqui, o
mais uma garantia dos particulares interessados, que assegura a veracidade legislador sentiu a necessidade de explicitar o que pretende e com o teor
dos documentos juntos e existentes no processo e que dificulta a junção da norma exemplifica uma das possibilidades legalmente admissíveis.
de documentos, designadamente, extemporâneos. Por isso, os acordantes podem alargar, dentro dos limites legais, o objeto
de incidência do acordo endoprocedimental.
4.1.1. Dos acordos endoprocedimentais Não deixa de ser de assinalar o prescrito no nº 3 do referido artigo 57º
O novo CPA veio consagrar um novo princípio, inscrito fora da sistemá- Vejamos o conteúdo da norma, que parece, de alguma forma, diminuir o
tica inicial dos princípios gerais que regulam a atividade administrativa: papel do órgão público decisor a parte procedimental, quase em situação
o princípio da adequação procedimental, previsto no artigo 56º do CPA.
Este princípio passa a ser determinante na forma de organização e de
109 Normas imperativas.
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de igualdade com os interessados, o que pode levantar algumas questões ii) Os particulares, cumpridos os requisitos de legitimidade previstos
de legalidade e de coerência e unidade do sistema, sobretudo quando haja no nº 1 do artigo 68º do CPA (alínea b) do nº 1);
alteração superveniente do interesse público que contrarie o clausulado iii) Entidades singulares ou coletivas de Direito Privado, na defesa de
acordado e firmado pelas partes. A norma estipula o seguinte: interesses difusos (alínea c) do nº 1); e
iv) Outros órgãos com funções administrativas, nas condições previstas
"Durante o procedimento, o órgão competente para a decisão final e os no nº 4 do artigo 68º do CPA (alínea ti) do nº 1).
interessados também podem celebrar contrato para determinar, no todo ou em
parte, o conteúdo discricionário do ato administrativo apraticar no termo do Ainda nesta secção, o artigo 66º trata de regular o aUXIlio administra-
procedimento;' tivo. Esta figura estabelece, supõe e exige uma articulação e cooperação
intensas entre órgãos da Administração Pública, visto que determina que
o exercício das competências discricionárias dos órgãos das Adminis-
trações Públicas é uma manifestação do poder de autoridade pública, o que "1 - Para além dos casos em que a lei imponha a intervenção de outros
os obriga a saberem interpretar correta e legalmente, e a todo o tempo, o órgãos no procedimento, o órgão competente para a decisão final deve, por ini-
interesse público.
ciativa própria, por proposta do responsável pela direção do procedimento ou a
requerimento de um sujeito privado da relaçãojur{dica procedimental, solicitar
4.1.2. Da relação jurídica procedimental o auxflio de quaisquer outros órgãos da Administração Pública, indicando um
O Capítulo II do Título I apresenta três secções: a primeira diz respeito, prazo útil, quando:
genericamente, aos sujeitos do procedimento, a Secção II trata dos inte- a) O melhor conhecimento da matéria relevante exija uma investigaçãopara
ressados no procedimento administrativo e, por fim, a Secção III regula as aqual oórgão aquem édirigida asolicitação disponha de competência exclusiva
garantias procedimentais de imparcialidade, já estudadas anteriormente, ou de conhecimentos aprofundados aos quais oórgão solicitante não tenha acesso;
a propósito da tutela direta do princípio da imparcialidade. Estudemos b) Só o órgão aquem édirigida asolicitação tenha em seu poder documentos
as secções iniciais, que assentam sobretudo na teoria da relação jurídico- ou dados cujo conhecimento seja necessário à preparação da decisão;
-administrativa e que atribuem um paralelismo de posição aos sujeitos
c) A instrução requeira aintervenção depessoal ou oemprego de meios técnicos
que vão intervir na relação. No entanto, nada disto nega ou diminui a
de que o?rgão competentepara a decisãofinal não disponha.
2 - A comunicação de documentos ou dados solicitados nos termos do nú-
publicização do Direito Administrativo e, sobretudo, os poderes públicos
mero anterior aplicam-se as restrições fixadas na legislação sobre o acesso aos
de autoridade de que são titulares, designadamente, os órgãos da Admi-
documentos administrativos.
nistração Pública. Não deixa de se assinalar, contudo, uma tendência que
3 - Em caso de recusa de auxílio administrativo requerido nos termos do
pretende colocar em crise este aspeto do nosso sistema administrativo.
n!! 1, ou de dilação na sua prestação, aquestão é resolvida, consoante o caso, pela
autoridade competentepara aresolução de conflitos de atribuições ou de compe-
4.1.2.1. Dos sujeitos do procedimento
tência entre os órgãos solicitante e solicitado ou, não a havendo, por órgão que
O artigo 65º do CPA vem dizer-nos quais são os sujeitos da relação jurídica
exerça poderes de direção, superintendência ou tutela sobre o órgão solicitado."
procedimental. Deste modo, podemos encontrar na relação jurídica,

i) Os órgãos de quai quer entidades independ ntemente da sua natureza, Podemos verificar que o legislador, atento o disposto no nº 2, impõe
que atuem ao abrigo do exercício de poder públicos ou cuja conduta eja um especial dever de reserva, de confidencialidade e de sigilo, até em virtude
regulada de modo particular por disposições de Direito Adminisrrati o de legislação particular sobre a matéria que salvaguarda o acesso aos
(alínea a) do nº 1); documentos administrativos.
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De igual modo, para evitar o incumprimento ou recusa do solicitado exemplo, entre muitas outras, as associações para defesa de interesses
apoio administrativo, o nº 3 impõe um meio direto para a sua resolução: coletivos e, até, os órgãos administrativos.
caberá à autoridade competente para a resolução de conflitos de atribuições ou de Relativamente a este artigo, importa assinalar que o legislador deixou
competência entre os 6rgãos solicitante e solicitado ou, não a havendo, por 6rgão cair a exigência de as entidades não terem caráter político ou sindical,
que exerça poderes de direção, superintendência ou tutela sobre o6rgão solicitado a dada a jurisprudência do nosso Tribunal Constitucional sobre a matéria.
decisão da questão. Os conflitos de atribuições ou de competências são hoje O nº 1do artigo 68º do CPA atribui, expressamente, legitimidade para
dirimidos, como vimos já, nos termos do disposto no artigo 51º do CPA. dar início a procedimento administrativo aos interessados e, aqui, parece
referir-se, direta e imediatamente, aos particulares e às entidades privadas
4.1.2.2. Dos interessados no procedimento e ainda às associações, na defesa singular de interesses coletivos e na de-
Os artigos 67º e 68º do CPA (correspondentes aos anteriores artigos 52º e fesa coletiva de interesses individuais dos seus associados de acordo com
53º do Código) estabelecem um conjunto de regras, em termos de legiti- o princípio da especialidade ou fim das pessoas coletivas, ou seja, desde
midade para intervenção no procedimento administrativo. Deste modo, a que essas defesas caibam no respetivo âmbito de atuação estatutária.
suscetibilidade para iniciar e para intervir no procedimento administrativo Na defesa de interesses difusos, a legitimidade decorre do disposto
afere-se pelas regras gerais da capacidade jurídica, previstas designada- no nº 2 e, no caso da defesa de "(...) bens do Estado, das regiões aut6nomas e
mente no Código Civil português. de autarquias locais afetadospor ação ou omissão da Administração (...)", rege o
Importa salientar que os órgãos e os agentes da Administração Pública nº 3 do mesmo artigo.
devem atender às regras gerais de Direito, no que diz respeito à personali- O nº 4 dirá respeito a outros órgãos que exerçam funções administrativas
dade e à capacidade jurídicas das pessoas singulares e coletivas, previstas, e que podem ser, por exemplo, estruturas integrantes de concessionários.
como se disse, no Código Civil. É neste Código que vamos encontrar,
igualmente, as regras gerais aplicáveis ao suprimento das incapacidades, 4.1.3. Da conferência procedimental
designadamente, dos menores, interditos e inabilitados. Atento ainda o A conferência procedimental, quando tenha lugar, assume-se como uma
disposto no artigo 67º do CPA, os particulares podem fazer-se represen- nova fase do procedimento administrativo.
tar (ou estar em lugar do representado) ou assistir (uma função de apoio Ou seja, a conferência procedimental está prevista para permitir
ou de aconselhamento, menos intensa que a da representação; no fundo, que órgãos conferenciem e se articulem, atento o disposto no artigo
colocar-se ao lado do assistido) através de mandatário. Assim, a capacidade 77º, nº 1, do CPA, no exercício das suas competências, "(...) no sentido
de intervenção nos diferentes procedimentos administrativos vai depender, de promover a eficiência, a economicidade e a celeridade da atividade adminis-
em concreto, da capacidade jurídica do interessado. Sendo titular de um trativa." É, portanto, um mecanismo que possibilita um desempenho
direito mas estando impossibilitado de o exercer, por ser menor, interdito mais eficiente da competência e, por isso, tem uma função meramente
ou inabilitado, devem seguir-se as regras, previstas na legislação civil, de instrumental e adjetiva no exercício dos poderes legalmente atribuídos
suprimento das incapacidades e terão de intervir os titulares do poder aos órgãos do poder público.
paternal, da tutela ou da curatela, conforme os casos. As conferências procedimentais, atento o previsto no referido artigo
Por outro lado, a participação no procedimento administrativo pode 77º, nº 1, do CPA, podem ter as seguintes finalidades:
fazer-se, como se viu, segundo as regras gerais de representação forense,
através de mandatário.
i) O exercício em comum de competências; ou
De acordo com o disposto no artigo 68º do CPA, são várias as entidades,
ii) O exercício conjugado de competências, por diferentes órgãos da
Administração Pública.
organismos e órgãos que podem dispor de legitimidade para dar início ao
procedimento administrativo, na defesa de interesses difusos. São disso
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Deste modo, o legislador regula, atento o disposto no artigo 77º, 4.1.4. Do direito à informação
nº 3, do CPA, duas modalidades de conferências procedimentais, e que são O direito à informação dos interessados é uma garantia prevista nos arti-
gos 82º e seguintes do CPA (correspondentes aos anteriores artigos 61º
i) A conferência deliberativa, que se destina, nos termos da alínea a) do e seguintes do CPA revogado). Recorramos uma vez mais ao texto legal,
nº 3, à obtenção de um único ato de conteúdo complexo (que substitui a que é claro e elucidativo. O nº 1 do referido artigo 82º diz que
prática por diversos órgão de vários atOs autónomo ). e
ii) A conferência de coordenação que, atento o disposto a alínea b) do nº 3, "Os interessados têm o direito de ser informadospelo responsávelpela direçiio
visa a obtenção de vário atO admini trativos autónomos, individualmente do procedimento, sempre que orequeiram, sobre o andamento dosprocedimentos
praticados (pelos diferentes órgãos da Administração Pública) mas de que lhes digam diretamente respeito, bem como odireito de conhecer as resoluções
forma simultânea. definitivas que sobre elesforem tomadas."

Vejamos o que refere, concetualmente, o nº 3 sobre esta matéria: O preceito é, como dissemos, claro e não necessita de grandes escla-
recimentos. O direito dos interessados à informação está, assim, consagrado
"As conferências procedimentais relativas a vários procedimentos conexos
em duas vertentes:
ou a um único procedimento complexo, em que há lugar à tomada de diferentes
decisões por diferentes órgãos, podem assumir uma das seguintes modalidades: - Quanto ao conhecimento do andamento dos procedimentos admi-
a) Conferência deliberativa, destinada ao exercício conjunto das competências nistrativos que lhes digam respeito; e
decisórias dos 6rgãosparticipantes através de um único ato de conteúdo complexo, - Quanto ao conhecimento das resoluções definitivas que sobre eles
que substitui aprática, por cada um deles, de atas administrativos aut6nomos; (interessados) forem tomadas.
b) Conferência de coordenação, destinada ao exercício individualizado, mas
simultâneo, das competências dos 6rgãos participantes, através da prática, por Releva notar que as informações solicitadas devem ser prestadas pela
cada um deles, de atas administrativos autónomos." Administração Pública no prazo máximo de 10 dias, de acordo com o dis-
posto no nº 3 do artigo 82º, conjugado com o previsto no artigo 84º, nº 1,
As conferências procedimentais podem surgir, assim, no âmbito de um ambos do CPA (este último correspondente ao anterior artigo 63º, nº 1,
procedimento administrativo ou de procedimentos conexos ou interrela- do CPA revogado). É ainda de assinalar o disposto no artigo 82º, nº 4, do
cionados, atentO o disposto no nº 2 do artigo 77º do CPA. Código, que determina que nos procedimentos administrativos eletrónicos
O legislador, no nº 4, admite a forma contratual, em substituição dos se deve obter, por igual via, a "(...) informaçiio sobre oestado de tramitação do
ato cuja preparaçiio se visava com os procedimento que deram origem às procedimento".
cont rências procedimentais. Só com a prática administrativa se pode afe- Ao abrigo deste direito llO , os particulares que demonstrem interesse
rir da validade deste novo mecanismo qu parec elevar os interessados à podem, nomeadamente, e nos termos do disposto nos artigos 83º c
categoria de quase coautores de atos administrativos, com forma contratual 84º do CPA (correspondentes aos anteriores artigos 62º e 63º do CPA
mas natureza originariamente unilateral. revogado):
Os artigos seguintes tratam de regular um conjunto de elementos que
se prendem, genericamente, com regras de instituição, cm concreto, e
operacionalização das conferências procedimentais.
110 Este direito é extensível, nos termos do disposto no artigo 85º do CPA (correspondente

ao anterior artigo 64º do CPA revogado), a todos quantos demonstrem um interesse legí-
timo no conhecimento dos elementos que constem do processo administrativo.
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- Consultar processos administrativos que não contenham matérias iv. Os prazos estipulados em 24 ou 48 horas corresponderão a um ou
classificadasIll ou que revelem segredo comercial ou industrial ou dois dias, respetivamente, atento o teor da alínea e); e
segredo relativo, genericamente, à propriedade autoral; v. Se, no último dia do prazo, o serviço público respetivo estiver fechado
- Solicitar a passagem de certidões; ou não funcione durante o período normal, o termo do prazo transfere-
- Solicitar reproduções; e -se para o primeiro dia útil imediatamente seguinte (por exemplo, se o
- Requerer declarações autenticadas. serviço se encontrar fechado a uma sexta-feira, por tolerância de ponto, o
termo do prazo transferir-se-á para a segunda-feira seguinte), de acordo
4.1.5. Dos prazos com as alíneas j) e g).
No que diz respeito aos prazos, a regra geral para a prática dos atos, segundo
o disposto no artigo 86º, nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo O artigo 88º do CPA estipula as regras relativas à dilação, que é um
7lº, nº 1, do CPA revogado), é de la dias, tendo-se sempre entendido que tipo de prazo não perentório, ou seja, findo o qual não preclude o direito
este prazo, embora meramente disciplinador, deva ser cada vez mais res- que se visa exercer.
peitado e cumprido, evitando-se o recurso aos tribunais administrativos, a quadro que segue apresenta, de forma esquematizada e segundo a
que dispõem da possibilidade de determinar - e, em certos casos, impor organização sistemática do diploma, os principais prazos previstos no CPA.
- a prática de atos pelos órgãos da Administração Pública. Exceciona-se
o prazo de decisão do procedimento de acordo com a primeira parte da- PRAZOS-REGRASGERAlS
quele normativo. Prazo igual é atribuído ao interes ados nos temos do Procedimento administrativo Prazo(s) Normativo
disposto no nº 2, para "(...) requererem ou praticarem quaisquer atas, promoverem PARTE 1- DISPOSIÇÕES GERAIS
diligências, responderem sobre os assuntos acerca dos quais se devam pronunciar ou Capítulo 11- Princípios gerais da atividade administrativa
exercerem outrospoderes no procedimento." Prática, pelo órgão competente, Há menos de 2 anos, contados Artigo 13·, n" 2, do ePA
As regras de contagem dos prazos estão previstas no artigo 87º (e no de um ato administrativo sobre da data da apresentação do re-
artigo 113º) do CPA (correspondentes aos anteriores artigos 72º e 67º, o mesmo pedido, formulado querimento
pelo mesmo particular com os
nº 2, do CPA revogado, respetivamente) e as relativas às dilações estão mesmos fundamentos, a qual
previstas no artigo seguinte. origina inexistência do dever
legal de decisão
As principais regras de contagem dos prazos previstas no referido artigo
87º do CPA são: Cumprimento de obrigação Prazo para tal estabelecido Artigo 19", n" I, do CPA
imposta pelo direito da Uníão
Europeia à Administração PÚ-
i. A contagem do prazo inicia-se independentemente de quaisquer
blica de prestar informações,
formalidades, de acordo com a alínea a); apresentar propostas ou, por
ii. Não se inclui na contagem o dia em que ocorre o evento ou o facto a alguma forma, colaborar com a
Administração Pública de ou-
partir do qual o prazo se inicia (por exemplo, se um ato produzir efeitos 10 tros Estados-membros
dias depois do dia 7 de janeiro isso significa que o dia 7 de janeiro não conta PARTE 11- DOS ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
e se inicia a contagem a partir do dia 8 de janeiro), nos termos da alínea b);
Capítulo II - Dos órgãos colegiais
iii. Só se contabilizam os dias úteis, exceto se o prazo administrativo for
Dever de comunicação a todos De forma a garantir o seu conhe- Artigo 23·, n· 2, do ePA
superior a seis meses; neste caso, contabilizam-se também os sábados, os os membros do órgão colegial cimento seguro e oponuno
domingos e os feriados, nos termos do disposto nas alíneas c) e d); de quaisquet alterações ao dia
e hora fixados para as respetivas
reuniões
111 Por exemplo, como "segredo de Estado".
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Realização de reunião extraor- Um dos 15 dias seguintes à apre- Artigo 24·, n· 3, do CPA Capitulo V - Dos conflitos de atribuições e de competência
dinária do órgão colegial scntação do pedido para reali-
Dccisão do procedimento de 30 dias Artigo 52., n" 2, do ePA
zação da reunião
resolução de conflito de atri-
Convocatória de reunião extra- Sempre com uma antecedência ArtigO 24·, n· 3, do CPA buições ou de conflito de com-
ordinária do órgão colegial mínima de 48 horas sobre a data petência pelo órgão competente
da reunião
PARTE III - DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
Convocatória de reunião extra- Antecedência mínima de 48 Artigo 24·, n' 6, do CPA
Título I - Regime comum
ordinária do órgão colegíal efe- horas
tuada diretamente pelos reque- Capítulo I - Disposições gerais
rentes, caso o respetivo presi-
Tomada de decisão em proce- Dcntro de prazo razoável Artigo 59· do ePA
dente não proceda à convocação
dimento administrativo, atento
requerida
o dever de celeridade do res-
Apresentação, por qualquer vo- Anteccdência mínima de 5 dias Artigo 25·, nO 1, do CPA ponsável pela direção do pro-
gal do órgão colegial, de pedido sobre a data da reunião cedimento e dos outros órgãos
escrito relativo a inclusão de as- intervenientes na respetiva tra-
suntos na ordem do dia de cada mitação
reunião, desde que sejam da
Tomada de decisão em procedi- Num prazo razoável Artigo 60·, n· 2, do ePA
competência do órgão
mento administrativo, atentas
Entrega da ordem do dia de reu- Antecedência de, pelo menos, Artigo 25·, n· 2, do CPA as cooperação e boa-fé proce-
nião do órgão colegial a todos os 48 horas sobre a data da reunião dimental exigidas aos intcrcs-
membros sados

Dever de dar publicidade aos Antecedência de, pelo menos, Artigos 27·, n' 2, do CPA Inserção, nas plataformas ele- S dias contados do inicio do pro- Artigo 62., n· 6, alínea b), do
dias, horas e locais de realiza- 48 horas sobre a data da reunião trónicas, dos valores ou fórmu- cedimento ePA
ção de reuniões do órgão cole- las de cálculo das taxas a pagar
gial, quando estas hajam de ser pelo interessado no procedi-
públicas, de forma a garantir o mento administrativo e notifica-
conhecimento dos interessados ção do interessado para proce-
der ao seu pagamento
Convocação de nova reunião do Intervalo mínimo de 24 horas ArtigO 29·, n' 2, do CPA
órgão colegial, quando não se Capítulo II - Da relação jurídica procedimental
verifique, na primeira convoca-
Prestação de auxílio, por quais- Prazo útil Artigo 66°, n·l, do ePA
ção, o qu6rum legalmente esta-
quer órgãos da Administração
belecido
Pública, ao órgão competente
Capitulo III - Da competência para a decisão final do procedi-
mento administrativo
Dever do órgão administrativo Até que tenha havido pronúncia Artigo 38·, n·l, do CPA
competente para a decisão final sobre a questão prejudicial, sal- Dilação na prestação de auxílio - Artigo 66°, n· 3, do CPA
de suspender o procedimento vo se da não resolução imediata administrativo
administrativo, se a decisão final do assunto resultarem graves
Decisão de escusa ou suspeição 8 dias Artigo 75·, n· 2, do ePA
depender da decisão de questão prejuízos para interesses públi-
prejudicial cos ou privados Capítulo III - Da eonferêneia procedimental
Cessação da suspensão do pro- - Artigo 38·, n· 2, alíneas a), b) e Dever de convocar a conferên- IS dias Artigo 79·, n· 2, do ePA
eedimento administrativo por c), do ePA cia procedimental
questões prejudiciais
Dever de convocatória da pri- Antecedência miníma de 5 dias Artigo 79·, n· 3, do ePA
meira reunião da conferência em relação à data da reunião
procedimental
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Proposta de adiamento da reu- Não superior a 10 dias Artigo 79', n' 3, do CPA Passagem, por via eletrónica ou Máximo de 3 dias Artigo 84', n' 3, do CPA
nião da conferência procedi- mediante impressão nos servi-
mental pelos órgãos participan- ços da Administração, das cer-
tes, em caso de impossibilidade tidões, reproduções ou declara-
fundamentada ções, com a devida autenticação,
quando os elementos constem
Invocação de justo impedi- 8 dias Artigo 79', n' 6, do CPA
de procedimentos informatiza-
mento, por órgão que tenha fal-
dos
tado 11 conferência procedimen-
tal deliberativa Capítulo V - Dos prazos

Juntada de parecer escrito, por 8 dias Artigo 79', n2 7, do CPA Prática de atos, pelos órgãos ad- 10 dias Artigo 86 2 , n·1, do CPA
órgãos titulares de competência ministrativos, exceto a decisão
consultiva que participem na do procedimento
conferência procedimental
Requerimento ou prática, pelos 10 dias Artigo 86', n· 2, do CPA
Suspensão do prazo para con- Durante a realização da au- Artigo 80', n2 3, do CPA interessados, de qlli\isquer atos,
clusão da conferência proeedi- diêneia pública obrigatória na promoção de diligências, res-
mental pendência da conferência pro- posta sobre os assuntos acerca
cedimental dos quais se devam pronunciar
ou exercício de outros poderes
Realização/conclusão da confe- 60 dias Artigo 81', n'l, do CPA
no procedimento
rência procedimental

Prorrogação do prazo para reali- Mais 30 dias (prazo máximo de


Contagem dos prazos - Artigo 87' do CPA
Artigo 81', n'l, do CPA
zaçâo/conclusão da conferência 90 dias) Dilações dos prazos 5 dias, 15 dias ou 30 dias Artigo 88· do CPA
procedimental
Capítulo VI - Das medidas provisórias
Suspensão dos prazos para a No decurso da conferência pro- Artigo 81', n'l, do CPA
conclusão dos procedimentos cedimental Caducidade das medidas provi- a fixado para as medidas pro- Artigo 90', allnea b), do CPA
sórias por expiração do prazo visórias ou a respetiva prorro-
nos quais deveriam ser pratica-
gação
dos os vários ates envolvidos

Prática, pelos órgãos partici- 8 dias, a contar do termo da con- Artigo 81', n' 6, do CPA
Caducidade das medidas provi- a fixado na lei para a decisão Artigo 90·, alínea .:), do CPA
sórias por expiração do prazo final
pantes na conferêncü\ que não ferência
tenham apresentado objeções Caducidade das medidas provi- Dentro dos 180 dias seguintes Artigo 90·, alínea ti), do CPA
quanro à matéria da sua compe- sórias por a decisão final não ser à instauração do procedimento
tência, individualmente, do ato proferida
administrativo que lhes com-
pete Capítulo VII - Dos pareceres

Capítulo IV - Do direito à ínformação Emissão de pareceres, na falta 30 dias Artigo 92', n' 3, do CPA
de disposição especial
Prestação das informações soli- Máximo de 10 dias Artigo 82', n' 3, do CPA
Prazo diferente para emlssao - Não inferior a 15 dias nem supe- Artigo 92', n' 4, do CPA
citadas ao abrigo do direito dos
interessados à informação pro- de pareceres, quando fixado, rior a 45 dias
cedimental fundamentadamente, pelo res-
ponsável pela direção do proce-
Obrigação de os serviços com- Máximo de 10 dias, a contar da Artigo 84', n' 1, do CPA dimento
petentes passarem certidão, apresentação do requerimento
Interpelação, pelo responsável 10 dias Artigo 92', n' 6, do CPA
reprodução ou declaração au-
tenticada de documentos re- pela direção do procedimento,
queridos, independentemente do órgão competente para emi-
de despacho tir o parecer obrigatório e vin-
culativo
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Proferimento da decisão final 20 dias a contar da interpelação Artigo 92', n' 6, do CPA Confirmação, por carta regis- Dia útil imediato Artigo 112', n' 5, do CPA
do procedimento sem a prévia para emissão do parecer tada, da notificação feita por
emissão do parecer obrigatório telefone
e vinculativo, por o órgão com- Notificação por telefone, confir- Considera-se fcita na data da Artigo 112', n' S, do ePA
petente não o ter emitido mada por cana registada primeira comunicação
Título II - Procedimento do regulamento e do ato administrativo Presunção de notificação feita 3' dia útil posterior ou l' dia útil Artigo 113', n' 1, do ePA
Capitulo I - Procedimento do regulamento administrativo por cana registada seguinte, quando aquele dia não
seja útil
Submissão a audiência dos inte- Razoável, mas não inferior a 30 Artigo 100', n'l, do ePA
ressados, pelo responsável pela dias Presunção de notificação feita Data da emissão Artigo 113", n" 3, do ePA
direção do procedimento, do portelefax
projeto de regulamento admi- Notificação por meios eletrÓni- Considera-se efetuada no mo- Artigo 113', n' S, do ePA
nistrativo que contenha disposi- cos, feita por correio eletrónico mento em que o destinatário
ções que afetem de modo direto aceda ao específico correio en-
e imediato direitos ou interesses viado para a sua caixa postal
legalmente protegidos dos cida- detrónica
dãos
Notificação por meios eletró- Considera-se efetuada no mo- Artigo 113', n' 5, do CPA
Suspensão da contagem dos Durame a realização da audién- Artigo 100', n' 5, do ePA
nicos, feita por outras vias de mento em que o destinatário
prazos do procedimento admi- cia dos interessados, no âmbito transmissão eletrónica de dados aceda ao específico correio en-
nistrativo de procedimento do regula- viado para a sua conta eletrónica
mento administrativo abena junto da plataforma in-
Dever de os interessados dirigi- 30 dias, a contar da data da pu- Artigo 101', n' 2, do CPA formática disponibilizada pelo
rem, por escrito, as suas suges- blicação do projeto de regula- sitio eletrónico institucional do
tões ao órgão com competência menta administrativo órgão competente
regulamentar Notificação por meios eletró- Considera-se efetuada no 25' Artigo 113', n' 6, do CPA
Capítulo II - Procedimento do ato administrativo nicas, em caso de ausência de dia posterior ao seu envio
acesso à caixa postal eletrónica
Remessa aos órgãos competen- 3 dias após o seu reccbimento Artigo 103', n' 3, do CPA ou à conta eletrónica abena
tes dos requerimentos dirigidos junto da plataforma informática
aos órgãos centrais, apresenta- disponibilizada pelo sitio ele-
dos nos serviços locais descon- trónico institucional do órgão
cemrados do mesmo ministério competente
ou organismo ou nos Gabinetes
de apoio aos Representantes da Notificação por telefone Considera-se eferuada na data Artigo 113', n' 7, do ePA
República das Regiões Autóno- em que ocorreu a comunicação
mas dos Açores ou da Madeira telefónica

Data da apresentação dos re- Data da respetiva entrega Artigo 104', n' I, do CPA Notificação por edital Considera-se cfetuada no dia Artigo 113', n' 8, do CPA
querimentos dirigidos a órgãos em que os editais sejam afixados
administrativos, remetidos pelo ou publicados na Internet, con-
correio, sob registo soante o que ocorrer em último
lugar
Data da apresentação dos re- Data do termo da expedição ArtigO 104', n' 2, do CPA
qucrimentos dirigidos a órgãos Notificação por anúncio Considera-se feira no dia em Artigo 113', n' 9, do ePA
administrativos, enviados atra- que for publicado o último
vés de telcfax ou transmissão anúncio
eletrónica de dados
------------ -

CURSO SOBRE O NOrO CÓDIGO DO PROCEDrMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDrMENTO ADMINISTRATIVO

Utilização do meio de impug- 30 dias, a contar do trânsito em Artigo 114', n' 4, do ePA Contagem do prazo para deci- Da data de entrada do reque- Artigo 128', n' 3, do ePA
nação administrativa necessária julgado da decisão jurisdicional são dos procedimentos adminis- rimemo ou petição no serviço
de ato administrativo sobre cuja trativos de iniciativa particular, competente
notificação houve reconheci- na falta de disposição especial
mento jurisdicional da existên-
cia de erro ou omissão na indi- Contagem do prazo para deci- Do termo do prazo fixado para Artigo 128', n' 4, do ePA
cação do meio de impugnação são dos procedimentos adminis- a conclusão das referidas forma-
administrativa a utilizar contra o trativos de iniciativa particular, !idades
ato notificado quando a lei imponha formali-
dades especiais para a fase pre-
Notificação dos atos adminis- 8 dias Artigo 114', n' 5, do ePA paratória da decisão e fixe prazo
trativos, quando não haja prazo para a respetiva conclusão
fixado na lei
JustificaÇão da inobservância dos Dentro dos !O dias seguintes ao Artigo 128', n' 5, do CPA
Tomada de uma decisão legal e Dentro do prazo razoável Artigo 115', n'l, do ePA prazos para decisão dos proce- termo dos referidos prazos para
justa, para a qual deve o respon- dimentos administrativos de ini- decisão
sável pela direção do procedi- ciativa particular, para eventual
mento procurar averiguar todos apuramento de responsabili-
os factos cujo conhecimento dade disciplinar
seja adequado e necessário
Caducidade dos procedimen- 180 dias Artigo 128', n'6, do CPA
Suspensão da contagem de pra- Na realização da audiência pré- Artigo 121', n' 3, do ePA tos administrativos de iniciativa
zos em todos os procedimentos via oficiosa, passíveis de conduzir
administrativos à emissão de uma decisão com
efeitos desfavoráveis para os
Audiência dos interessados Não inferior a !O dias Artigo 122', n' 1, do ePA
interessados, na ausência de
Apresentação de justificação de Até ao momento fixado para a Artigo 123', n' 2, do ePA decisão
falta do interessado à audiência audiência
Falta de decisão final sobre pre- No prazo legal Artigo 129' do CPA
prévia, a qual origina o dever
tensão dirigida a órgão adminis-
de se proceder ao adiamento da
trativo competente, a qual cons-
mesma
titui incumprimento do dever
Realização de audiência oral, Dentro dos 20 dias seguintes Artigo 123', n' 3, do CPA de decisão e confere ao interes-
após adiamento da mesma por sado a possibilidade de utilizar
motivo de justificação da falt,\ os meios de tutela administrati-
de comparência do interessado va e jurisdicional adequados

Juntada, à ata da audiência pré- Durante a diligência ou poste- Artigo 123', n' 4, do CPA Não expedição da notificação Até ao I' dia útil seguinte ao ter- Artigo 130', n' 2, do CPA
via, de alegações escritas pelo riormente do ato, considerando-se que há mo do prazo para deciSão
interessado deferimento tácito

Possibilidade de serem eferua- Após a audiência dos interessa- Artigo 125' do CPA Suspensão do prazo legal de Se o procedimento estiver pa- Artigo 130', n' 3, do ePA
das diligências complemcntares dos produção de deferimento tácito rado por motivo imputável ao
interessados
Decisão dos procedimentos 90 dias Artigo 128', n' I, do ePA
administrativos de iniciativa Interrupção da suspensão do Com a notificação de decisão Artigo 130', n' 3, do CPA
particular, salvo se outro prazo prazo legal de produção de defe- expressa
decorter da lei rimento tácito

Prorrogação, cm circunstâncias Um ou mais períodos, até ao lí- Artigo 128', n'l, do CPA
excecionais, do prazo para deci- mite máximo de 90 dias
são dos procedimentos adminis-
trativos de iniciativa particular
CURSO SOBRE O NO\'O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Interpelação do órgão compe- Decorridos 10 dias, a contar do Artigo 130', n' 5, do ePA PARTE IV - DA ATIVIDADE ADMINISTRATIVA
tente para emitir autorização termo do prazo para a autoriza-
Capitulo 1- Do regulamento administrativo
prévia ou aprovação, quando a ção ou aprovação
prática de um aro administra- Emissão de regulamento admi- 90 dias Artigo 137', nO 1, do ePA
tivo dependa de autorização nistrativo, quando a sua adoção
prévia ou um ato esteja sujeito seja necessária para dar exequi-
à aprovação dc um órgão da Ad- bilidade a ato legislativo carente
ministração Pública ou de outra de regulamentação, no silêncio
entidade no exercicio de pode- da lei
res públicos
Entrada em vigor dos regula- Na data neles estabelecida ou no Artigo 140' do ePA
Dever de emitir as necessárias 20 dias Artigo 130', n' 5, do ePA mentos administrativos 5' dia após a sua publicação
autorização prévia ou aprovação
Data ii qual se não podem repor- Data anterior àquela a que se Artigo 141', nO 2, do ePA
Declaração de procedimento Procedimento parado por mais Artigo 132', n' I, do ePA tar os efeitos dos regulamentos reporta a lei habilitante
deserto, por causa imputável ao de 6 meses administrativos
interessado
Invocação da invalidade do re- A todo o tempo Artigo 144', n' 1, do ePA
Falta de pagamento de qu,\is- No prazo devido Artigo 133', n' 1, do ePA guiamento administrativo
quer taxas ou despesas de que
Declaração da invalidade do re- A todo o tempo Artigo 144', n' 1, do ePA
a lei faça depender a realização
guIamento administrativo pelos
dos atos procedimentais, a qual
órgãos administrativos compe-
origina a extinção do procedi-
tentes
mento
Nos 10 dias seguintes ao termo Artigo 133', n' 2, do ePA Impugnação ou deelaraçJo ofi- 6 meses, a contar da data da res- Artigo 144', n' 2, do ePA
Realização do pagamento em
do prazo fixado para o paga- ciosa de invalidade pela Admi- petiva publicação
dobro da quantia cm falta, rela-
mentos das referidas taxas ou nistração de regulamentos ad-
tiva a taxas ou despesas de que
despesas ministrativos que enfermem de
a lei faça depender a realização
ilegalidade formal ou procedi-
dos atos procedimentais, a qual
mental da qual não resulte a sua
constitui os interessados na pos-
inconstitucionalidade
sibilidade de obst,tr à extinção
do procedimento ProduçJo de efeitos d,\ declara- Desde a data de emissão do re- Artigo 144', n' 3, do ePA
De forma imediata Artigo 134', n'I, do ePA ção administrativa de invalidade guIamento
Possibilidade legal de a produ-
de um regulamento administra-
ção de determinados efeitos
tivo
jurídico-adminístrativos c o seu
aproveitamento pelo interes- Caducidade dos regulamentos Com a verificação do termo ou Artigo 145', nO 1, do ePA
sado resultarem da mera comu- administrativos sujeitos a termo condição resolutiva
nicação prévia pelo interessado ou condição resolutiva
do preenchimento dos corres-
pondentes pressupostos legais e Caducidade dos regulamentos Com a revogação das leis que Artigo 145', nO 2, do ePA
regulamentares de execução regulamentam

Não pronúncia em sentido con- Dentro de determinado prazo Artigo 134', n' 2, do ePA Vigência, para todos os efeitos, Até ao início da vigência do Artigo 146', n' 3, do ePA
trário, pelo órgão competente, das normas regulamentares do novo regulamento
quanto à produção de efeitos da diploma revogado de que de-
comunicação prévia do interes- penda a aplicabilidade da lei
sado, no âmbito de um regime exequenda
legal de comunicação prévia Capitulo II - Do ato administrativo
com prazo
Comunicação da fundamenta- 10 dias Artigo 154', n' 1, do ePA
ção integral dos atas orais, redu-
zida a escrito
CURSO SOBRE O N01"O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Produção de efeitos do ato ad- Desde a data em que é praticado Artigo 155', n'l, do CPA Caducidade do prazo para anu- 5 anos Artigo 168', n' 1, do CPA
ministrativo lação administrativa de atas ad-
ministrativos
Prática do ato administrativo Considera-se efetuada quando Artigo 155', n' 2, do CPA
scja emitida decisão que identi- Anulação administrativa de atos lano Artigo 168', n" 2, do CPA
fique o autor e indique o desti- constitutivos de direitos
natário e o objeto a que se refere
o seu contcúdo Anulação administrativa de ato Até ao encerramento da discus- Artigo 168', n' 3, do CPA
administrativo que tenha sido são
Publicação obrigatória dos atas 30 dias Artigo i59" do CPA objeto de impugnação jurisdi-
administrativos cional
Oponibilidade, aos destinatá- A partir da resperiva notificação Artigo 160" do CPA Anulação adminisrrativa de atas 5 anos Artigo 168', n' 4, do CPA
rios, dos atas administrativos constitutivos de direiros, em cir-
que imponham deveres, encar- cunstâncias específicas
gos, ónus, sujeições ou sanções,
que causem prejlúzos ou res- Retificação, pelos órgãos com- A todo o rempo Artigo 174', n·l, do CPA
trinjam direitos ou interesses petentes para a revogação do
legalmente protegidos ato administrativo, dos erros de
cálculo e dos erros materiais na
Invoe'lção da nulidade dos atas A todo o rempo Artigo 162', n' 2, do CPA expressão da vontade do órgão
administrarivos administrativo, quando mani-
festos
Conhecimento, por qualquer A todo o rempo Artigo 162', n" 2, do CPA
autoridade, ou declaração, pelos Cumprimento da obrigação exe- Prazo razoável Artigo 177', n' 3, do CPA
tribunais adminisrrativos ou pe- quenda, na sequência de notifi-
los órgãos administrativos com- cação ao destinatário da decisão
petentes para a anulação, da nu- de proceder à execução de um
lidade dos atas adminisrrativos ato adminisrrativo
Impugnação dos atas anuláveis Dentro dos prazos legalmente Artigo 163', n' 3, do CPA Secção IV - Da reclamação e dos recursos administrativos
perante a própria Administra- estabelecidos
ção ou perante o rriblmal 'ldmi- Apresentação de reclamações c I ano Artigo 187' do CPA
nistrativo competente recursos contra a omissão legal
de atas ,tdministrativos
Anulação dos ,ltOS anuláveis Nos prazos legalmente estabe- Artigo 163", n" 4, do CPA
pela Administração lecidos Inicio/contagem dos prazos de - Artigo 188', n.O' 1, 2 e 3, do CPA
reclamação e recursos
Retroação dos efeitos da ratifi- À dara dos atas a que respeitam Artigo 164', n" 5, do CPA
cação, da reforma e da conver- Pedido de suspensão da exe- A qualquer momento Artigo 189', n" 3, do CPA
são dos atos 'ldministrativos, cução de um ato adminisrrativo
desde que não tenha havido al- sujeito a impugnações faculta-
reração ao regime legal tivas

Revogação de atas administra- i ano, prorrogável por mais 2 Artigo 167', n" 4, do CPA Decisão de suspensão da exe- 5 dias Artigo 189', n' 3, do CPA
tivos consritutivos de direitos, anos, por razõcs fundamcntadas cução de um 'ltO administrativo
com fundamento na superveni- (prazo máximo de 3 anos) sujeito a impugnações faculta-
éncia de conhecimentos técni- tivas
cos e científicos ou na alreração Apresentação de reclamação, IS dias Artigo 191', n' 3, do ePA
objetiva das circunstãndas de quando a lei não estabeleça
facto, em face das quais, num ou prazo diferente
noutro caso, não poderiam ter
sido praticados Alegações dos contrainteres- IS dias Artigo 192', n" I, do ePA
sados na reclamação
Anulação adminisrrativa de aros 6 meses Artigo 168', n'l, do CPA
adminisrrarivos Decisão da reclamação 30 dias Artigo 192', n' 2, do CPA
CURSO SOBRE O NOl'O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO
PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Interposição de recurso hierár- 30 dias Artigo 193', n' 2, do ePA caducando estas, nos termos do disposto no artigo 90º do ePA (corres-
quico necessário
pondente ao anterior artigo 8Sº do ePA revogado).
Interposição de recurso hierir- No prazo de impugnação con- Artigo 193', n' 2, do ePA
quico facultativo tcnciosa do ato em causa
Importa ainda referir que, nos termos do disposto no nº 3 do artigo
89º do Código, a revogação das medidas provisórias, a ocorrer, carece de
Remessa, ao autor do ato, do re- 3 dias Artigo 194', n' 2, do ePA
qucrimento de intcrposição do fundamentação nos termos gerais.
recurso hierárquico, pela auto- Por fim, é de notar que os atas administrativos que, em concreto, orde-
ridadc a quem seja dirigido
nem medidas provisórias são suscetíveis de impugnação contenciosa, nos
Alegações dos contrainteressa- 15 dias Artigo 195", n" 1, do ePA termos do nº 4 do mesmo artigo, e, por maioria de razão, são passíveis de
dos no recurso hierárquico
impugnação administrativa.
Pronúncia, do autor do ato ou 15 dias ou 30 dias, quando hou- Artigo 195', n' 2, do ePA
da omissão, sobre o recurso ver contrainteressados
hierárquico e remessa ao órgão 4.1.7. Dos pareceres
competente para dele conhecer,
Quanto aos pareceres, a regra geral consta do estipulado no artigo 91º do
notificando o recorrente
ePA (correspondente ao anterior artigo 98º do ePA revogado) e, salvo lei
Apresentação, pelo recorrente Dentro do prazo previsto para a Artigo 195', n' 7, do ePA
ou os contrainteressados, de re- interposição de recurso hierár- especial em contrário, os pareceres legalmente previstos são obrigatórios
querimento para que o recurso qtÚCO contra o ato praticado mas não vinculativos. Isto significa que, no silêncio da lei, os pareceres
hierárquico prossiga contra o
não vinculam o decisor mas devem, obrigatoriamente, ser emitidos.
ato praticado, quando o órgão
responsável pelo incumprimen- Assim, a decisão final pode ser contrária ao teor do parecer mas, se este
to do dever de decisão pratique não for solicitado ou emitido, o ato administrativo que dele carecia para
o ato ilegalmente omitido na
pendência do mesmo recurso ser proferido sofre de vício de forma, porque foi preterida uma formali-
Decisão do recurso hierárquico 30 dias Artigo 198', n' 1, do ePA
dade legalmente considerada como essencial. No entanto, como vimos,
se a decisão for contrária, total ou parcialmente, ao teor do parecer, já o
Prorrogação da decisão do rC- GO dias (prazo máximo de 90 Artigo 198", n' 2, do ePA
curso hierárquico, quando haja dias) ato administrativo é inatacável por esta via. O ato administrativo, nestes
lugar ii realização de nova ins- casos, só é inválido se o parecer for vinculativo. Nestas situações em que
trução ou diligências comple-
mentares
a própria lei atribui vinculatividade ao parecer é que o ato é inválido se
o seu conteúdo for materialmente contrário ao teor do parecer emitido
nos termos da lei.
4.1.6. Das medidas provisórias
A qualquer momento do procedimento administrativo, e de acordo com Importa ainda chamar a atenção para o disposto no artigo 92º do ePA
o previsto no artigo 89º, nº 1, do ePA (correspondente ao anterior artigo (correspondente ao anterior artigo 99º do Código revogado), que estipula,
84º do ePA revogado), pode impor-se a necessidade de algumas em concreto e pormenorizadamente, regras designadamente relativas à
forma e aos prazos para emissão dos pareceres.
"(...) medidas provisórias que se mostrem necessárias, se houverjusto receio Deste modo, vem agora o legislador exigir que os pareceres sejam
de, sem tais medidas, se constituir uma situação defacto consumado ou se pro- sempre fundamentados e com conclusões (i) expressas, (ii) claras e (iii)
duzirem prejuízos de difícil reparação para os interesses públicos ou privados sem omissões.
em presença, e desde que, uma vez ponderados esses interesses, os danos que O responsável pela direção do procedimento administrativo deve solicitar
resultariam da medida se não mostrem superiores aos que se pretendam evitar em simultâneo a emissão dos pareceres necessários, que serão emitidos,
com a respetiva adoção", salvo disposição especial, no prazo de 30 dias, tendo este responsável a
possibilidade de fixar prazo diferente desde que o fundamente, atento o
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disposto no artigo 92º, n.O> 2 e 3, do CPA. A possibilidade de estipulação de 4.2. Procedimentos do regulamento e do ato administrativos
prazo diferente para emissão dos pareceres deve respeitar os limites i~fe­ O CPA estipula de seguida, no Título II da Parte III, as regras gerais
rior (15 dias) e superior (45 dias) que decorrem do nº 4 do mesmo artIgo. privativas dos procedimentos administrativos do regulamento e do ato
De salientar que o legislador consagra, nas situações de incumprimento administrativos ll2 • São esses regimes que vamos agora estudar.
dos prazos estipulados, a possibilidade de o procedimento prosseguir,
podendo vir a ser decidido sem o parecer que seria obrigatório, salvo dis- 4.2.1. Procedimento privativo do regulamento administrativo
posição legal expressa em contrário, atento o disposto no nº 5 do. artigo 92º Nos termos do disposto no artigo 97º, nº 1, do CPA (correspondente ao
do CPA. Importa ainda atender à solução encontrada pelo legislador, no anterior artigo 115º, nº 1, do CPA revogado), o procedimento de forma-
nº 6 do mesmo artigo, que prevê que ção dos regulamentos pode iniciar-se, (i) ao abrigo do direito de petição,
exercido pelos cidadãos e dirigido aos órgãos com competência para
"No caso de oparecer obrigatório ser vinculativo, a decisão final só pode aprovarem normas regulamentares e, também, (ii) oficiosamente. Mas
ser proferida sem prévia emissão daquele desde que o responsável pela direção
O exercício daquele direito de petição, constitucionalmente previsto, no
do procedimento tenha interpelado, no prazo de 10 dias, o órgão competente
artigo 52º da CRP, e regulado pela Lei nº 43/90, de 10 de agosto, com as
para o emitir, sem que este o tenha feito no prazo de 20 dias a contar dessa
alterações introduzidas pelas Leis n.O> 6/93, de 1 de março; 15/2003, de 4
interpelaçãO." de Junho; e 45/2007, de 24 de agosto, não obsta a que a pretensão para
elaboração, modificação ou alteração de regulamentos seja conveniente-
4.1.8. Da extinção do procedimento mente fundamentada e, se tal não ocorrer, a Administração Pública pode,
O Capítulo VIII trata da extinção do procedimento administrativo, em
legalmente, não tomar conhecimento de tal petição. Ora, se tal acontecer,
termos de regime comum. Aqui se prevê, no artigo 93º do CPA, que o por via da falta de fundamentação, os interessados deverão poder corrigir
procedimento administrativo se exTIngue eom a (...) tomada da decisão o lapso formal, fundamentar a proposta e submeter de novo o pedido aos
final (...) , que competir no caso ou por qualquer um dos outrOS factos
competentes órgãos administrativos.
previstos no Código. O artigo 94º do CPA impõe que na decisão final a Por imposição legal, os órgãos destinatários de tais petições, compe-
proferir devam ser resolvidas todas a questões pertinentes su citadas ao tentes para a aprovação de regulamentos, deverão informar, nos termos do
lono-o do procedimento e que não hajam ido anteriormente deddidas, em disposto no nº 2 do artigo 97º do CPA (correspondente ao anterior nº 2 do
sed~ de incidentes procedimentais. Por outro lado, atento o estipulado no artigo 115º do CPA revogado), o destino dado às propostas apresentadas,
nº 2 do mesmo artigo, será necessariamente aposta à decisão final proferida
bem como os "(...) fUndamentos da posição que tome em relação a elas".
através de meios eletrónicos assinatura eletrónica ou outro meio idóneo
Atento o disposto no artigo 98º do CPA, serão publicitados na Internet,
de autenticação do titular do órgão competente, que deve ser identificado,
no sítio institucional da entidade pública, não apenas o início do proce-
de acordo com a legislação própria. dimento administrativo de formação do regulamento mas, igualmente,
Ainda, nos termos gerais, prevê o artigo 95º do CPA que o procedimento a indicação do órgão que decidiu desencadear o referido procedimento,
administrativo será declarado extinto, mediante decisão fundamentada, a data em que o mesmo se iniciou, o seu objeto e a forma como se pode
quando se verificar a impossibilidade ou a inutilidade superveniente
processar a constituição como interessados e a apresentação de contributos
deste. A decisão de declarar extinto o procedimento é suscetível de para elaboração do regulamento administrativo. Também aqui, atento o
impugnação nos termos gerais, atento o disposto no nº 2 do referido disposto no nº 2 do mesmo artigo, podem ser estabelecidos, através de
artigo 95º do CPA.

m Nessa medida, o artigo 96~ do ePA constitui, apenas, uma mera nonna indicadora de se-
quência (de resto, inexistente no anterior ePA agora revogado).
CURSO SOBRE O NO\'O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

acordo endoprocedimental, os termos de acompanhamento regular do 2ª série do Diário da República ou na publicação oficial da entidade pública
procedimento de feitura do regulamento, a celebrar com as associações e respetiva.
fundações representativas dos interesses envolvidos e com as autarquias Em síntese, podemos verificar que as fases mais relevantes do proce-
locais, em relação à proteção de interesses nas áreas das respetivas cir- dimento gracioso de feitura do regulamento administrativo, enquanto
cunscrições. encadeamento sequencial de momentos distintos, são as seguintes:
No desenrolar do procedimento de elaboração dos regulamentos, exige
- Iniciativa ou abertura (norma privativa: artigo 97º do CPA);
o disposto no artigo 99º do CPA (correspondente ao anterior artigo 116º
- Instrução (normas privativas: artigos 97º a 99º do CPA);
do CPA revogado) que o projeto seja obrigatoriamente acompanhado de
- Audiência dos interessados e!ou consulta pública (normas privativas:
uma nota explicativa que justifique e fundamente a necessidade do regula-
artigos lOOº e 101º do CPA);
mento, bem como inclua "(oo.) umaponderação dos custos ebenefícios das medidas
- Decisória/deliberativa ou extintiva (normas de regime comum: artigos
projetadas". A exigência de nota justificativa no projeto não desonera os
93º a 9Sº do CPA); e
órgãos da Administração Pública de aprovação de um preâmbulo ou de uma
- Complementar ou de integração da eficácia (nos termos gerais de
nota preambular que deve acompanhar o regulamento, dele fazendo parte
Direito).
integrante, e que deve, entre outros elementos, conter a indicação sobre
as entidades que eventualmente foram ouvidas, ao abrigo da audiência dos
4.2.2. Procedimento privativo do ato administrativo
interessados prevista no disposto no artigo lOOº do CPA (correspondente
O procedimento administrativo privativo do ato administrativo, como
ao anterior artigo 117º do Código revogado). O preâmbulo do regulamento
sequência 16gica e ordenada de momentos, de atos e de formalidades, pode
deve, igualmente, fazer menção à consulta públical13 , atento o disposto no
ser dividido horizontalmente por diversas fases e está previsto no Capítulo
artigo lOlº, nº 3, do CPA (correspondente ao anterior artigo 118º, nº 3, do
II do Título II da Parte III.
CPA revogado), se o mesmo a ela foi sujeito.
São, nomeadamente, as seguintes as mais importantes fases do procedi-
Como se acaba de referir, o regime jurídico privativo do procedimento
mento gracioso do ato administrativo, enquanto encadeamento sequencial
do regulamento administrativo previsto no CPA consagra regras relativas
de momentos distintos:
à audiência dos interessados, no seu artigo lOOº.
O nº 1 deste artigo estipula que - Iniciativa ou abertura (normas privativas: artigos 102º a 113º do CPA);
- Instrução (normas privativas: artigos l1Sº a 120º do CPA);
"Tratando-se de regulamento que contenha disposições que afetem de modo
- Audiência dos interessados (normas privativas: artigos 121º a 12Sº do
direto e imediato direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos, o
CPA);
responsávelpela direção do procedimento submete oprojeto de regulamento por
- Decisória/deliberativa ou extintiva (normas privativas: artigos 126º a
prazo razoável, mas não inferior a 30 dias, aaudiência dos interessados que como
133º do CPA, e normas de regime comum: artigos 93º a 95º do CPA);
tal se tenham constituído no procedimento."
e
- Complementar ou de integração da eficácia (normas privativas:
Nalguns casos, a audiência dos interessados não afasta a exigência de
designadamente artigos 111º a 114º do CPA e nos termos gerais do
consulta pública para recolha de sugestões, de acordo com o disposto no
Direito).
nº 1 do artigo 101º do CPA (correspondente ao anterior nº 1do artigo 118º
do CPA revogado), devendo o projeto de regulamento ser publicado na
Vejamos agora, especificamente, as fases para as quais o legislador
estabeleceu normas privativas no CPA.
III Anteriormente, o ePA previa a apreciação pública.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

4.2.2.1. Da iniciativa particular expressamente à inobservância do disposto no artigo 102º e apenas a ele
Genericamente, a primeira fase do procedimento do ato administrativo diz respeito. Assim, daquele normativo (artigo 108º do CPA) decorre
é a fase da iniciativa e está regulada, como vimos, designadamente nos que, se o requerente não respeitar o estipulado no artigo 102º do CPA,
artigos 53º, 102º a 109º (correspondentes aos anteriores artigos 74º a 83º será oficiosamente convidado a suprir as deficiências existentes, desde que a
do CPA revogado) e 110º a 113º do CPA. Este conjunto normativo é, em Administração Pública não consiga suprir de modo próprio as deficiências
grande parte, descritivo, pelo que nos dispensamos de grandes comentá- evidenciadas. DaqUi decorre um dever jurídico, que impende sobre as
rios. O procedimento administrativo pode iniciar-se oficiosamente ou por estruturas públicas e que visa expressamente obviar a que os interessados
iniciativa dos interessados. sofram prejuízospor virtude de simples irregularidades ou de mera impeifeição na
Na fase da iniciativa, e antes de qualquer decisão, o órgão administrativo formulação dos seus pedidos. Contudo, atento o previsto no nº 3, será profe-
deve verificar, sempre e liminarmente, como vimos já, se tem competência rido despacho liminar de rejeição em todos os casos de requerimentos que
para a resolução da questão administrativa que lhe é apresentada, de acordo desrespeitem a exigência prevista no artigo 102º, nº 1, alínea b), do CPA e
com o disposto no artigo 40º do CPA (correspondente ao antigo artigo que apresentem pedidos ininteligíveis, violando o exigido no artigo 102º,
33º do CPA revogado), que é regra geral para todos os procedimentos nº 1, alínea d). Aqui, o legislador deveria ter ponderado a possibilidade de
administrativos. rejeição liminar de requerimentos manifestamente ilegais, embora o dis-
O particular interessado no procedimento administrativo pode apresentar posto no artigo 109º do CPA consagre algumas questões que prejudicam
requerimento inicial, atento o disposto no artigo 102º do CPA. Mas pode o desenvolvimento do processo, entre as quais algumas que se prendem
ocorrer que o interessado se dirija a órgão que não seja o competente, e com questões de legalidade.
nesses casos, segue-se o estipulado nos termos do disposto no já estudado O artigo 103º do Código estabelece as regras relativas ao local da apre-
artigo 41º, nº 1, do CPA, que impõe que "(...) odocumento recebido éenviado sentação dos requerimentos, com imposições expressas e injuntivas sobre
oficiosamente ao órgão titular da competência, disso se notificando oparticular". prazos e procedimentos.
Regra geral, o CPA exige agora, no seu artigo 102º, nº 1, que o reque- Quanto às formas de apresentação dos requerimentos, elas constam do
rimento inicial "(...) deve serformulado por escrito (...)", a menos que a lei se nº 1 do artigo 104º do CPA. Vejamos:
baste com o pedido verbal, e que deve conter um conjunto de dados, elen- "Os requerimentos dirigidos aórgãos administrativospodem serapresentados
cados nas diferentes alíneas do referido número. De realçar a exigência por uma das seguintesformas:
da necessidade de indicação do pedido, em termos claros eprecisos, nos termos a) Entrega nos serviços, valendo como data da apresentação a da respetiva
da alínea d), ou a possibilidade de identificação da caixa postal eletrónica do entrega;
interessado, de acordo com a alínea g), na sequência da prevalência dos b) Remessapelo correio, sob registo, valendo como data da apresentação ada
meios eletrónicos e digitais na comunicação com a Administração Pública. ejetivação do respetivo registo postal;
Por outro lado, prevê o nº 2 a possibilidade de cumulação de pedidos c) Envio através de telefax ou transmissão eletr6nica de dados, valendo como
conexos ou afins apresentados pelo mesmo interessado e, de igual forma, data da apresentação a do termo da expedição;
e salvo lei em contrário, a faculdade de, no mesmo e único requerimento, d) Envio por transmissão eletr6nica de dados, valendo como data da apre-
serem formuladas pretensões de várias "(...) pessoas que tenham conteúdo e sentação a da respetiva expedição;
fundamento idênticos ou substancialmente similares", atento o disposto no nº 3 e) Formulação verbal, quando a lei admita essaforma de apresentação."
do referido artigo 102º do CPA.
Como se disse anteriormente, o artigo 108º do Código é outro bom Os n.O 2 a 6 do artigo 104º do Código complementam o regime jurídico
S

exemplo de desorganização sistémica ou um mau exemplo de técnica legís- da forma de apresentação de requerimentos e o artigo seguinte regula o
tica, pois deveria ser, antes, colocado como artigo 103º, já que se refere registo que deles há de ser feito.
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Importa referir que o artigo 106º prevê a possibilidade de ser solicitado o CPA, enquanto regulador do procedimento administrativo, atribui,
à Administração Pública um recibo comprovativo da entrega dos requerimentos como vimos já, até por imposição constitucional, um papel de intervenção
apresentados que pode ser emitido de várias formas, em duplicado ou em ativa aos particulares administrados.
fotocópia do requerimento apresentado pelo requerente para esse efeito. Para tomar efetiva a participação dos mesmos, mostra-se necessário,
Isto significa que deve ser o interessado a levar o duplicado ou fotocópia desde logo, que tenham conhecimento dos atas administrativos que lhes
do requerimento, a fim de ser aposto, por exemplo, carimbo com a data digam respeito, ainda que preparatórios da decisão final, a fim de sobre
da receção do documento. Esta norma dispensa a Administração Pública eles poderem formular juízos desfavoráveis ou de concordância e assim
de ser obrigada a suportar os custos, ainda que sem expressão, designa- participarem no procedimento e na formação da decisão administrativa.
damente, das fotocópias dos requerimentos que sirvam como recibo l14 • Com base neste enquadramento, o Código veio prever, nos artigos 110º e
Por fim, o registo eletrónico deverá emitir, nos termos do disposto no seguintes (correspondentes aos anteriores artigos 66º e seguintes do CPA
nº 3, automaticamente, um recibo comprovativo contendo a indicação da data revogado), as notificações como uma das formas de levar ao conhecimento
ehora da apresentação eo número de registo. dos particulares não apenas o conteúdo dos atas administrativos mas,
Finalmente, o CPA prevê, no seu artigo 109º, algumas questões que igualmente, nos termos do nº 1 do artigo 110º, o início do procedimento
prejudicam o desenvolvimento normal do procedimento gracioso do ato às pessoas cujos direitos ou interesses legalmente protegidos possam ser
administrativo e que impedem o normal andamento do procedimento ou a to- lesados pelos atos a praticar e que possam ser desde logo nominalmente
mada de decisão, que são a incompetência do órgão administrativo (nos termos identificadas (correspondente ao anterior artigo 55º do CPA revogado).
da alínea a), do nº 1), acaducidade do direito que sepretende exercer (nos termos De referir que, nos termos do disposto no artigo 110º, nº 2, do CPA
da alínea b), do nº 1), a ilegitimidade dos requerentes (nos termos da alínea c), (correspondente ao anterior artigo 67º do CPA revogado), é dispensada
do nº 1) e a extemporaneidade do pedido (nos termos da alínea d), do nº 1). a notificação ao conjunto de atos administrativos aí previstos. As notifica-
Curioso é notar, como já se disse inicialmente, que no nº 2 deste artigo o ções devem ainda obediência ao disposto no nº 3 do referido artigo 110º
legislador apresenta nova redundância que torna o teor da norma inútil, do Código.
por ser remis ivo sem er inovador. Não era nece sário o legislador vir, com Os artigos seguintes, designadamente do artigo 111º ao 114º (correspon-
dentes aos anteriores artigos 68º ao 70º do CPA revogado), consagram o
este preceito, dizer o que já diz, de igual modo e de forma plenamente
regime jurídico das notificações, do qual constam normas sobre os desti-
conseguida, no já estudado artigo 41º do CPA.
natários, a forma, e a perfeição das mesmas.
Por regra, as notificaçóes são efetuadas na pessoa do interessado ou,
4.2.2.2. Das notificações
quando haja sido constituído mandatário, na sua pessoa, atento o disposto
O ato de notificação está diretamente relacionado com o conceito de efi-
no artigo 111º, nº 1, do CPA. Sobre as entidades constituídas como inte-
cáciajurídica e a suscetibilidade de produção de efeitos de Direito dos atos
ressadas ou mandatárias recai o dever de manter atualizada a informação,
administrativos a notificar. Não esqueçamos que o conceito de eficácia,
junto do procedimento administrativo respetivo, dos respetivos domicílios,
que traduz a suscetibilidade de produção de efeitos jurídicos, não tem
de acordo com o estipulado no nº 2 do mesmo artigo.
correspondência direta, como veremos, com o conceito de validadejurídica, A notificação pode ocorrer sob qualquer uma das formas que a lei
isto porque existem atos válidos ineficazes e atos inválidos que produzem preveja como válida, desde a publicação em jornais ou boletins oficiais até
efeitos na ordem jurídica, como sucede com os atos anuláveis. à afixação de editais em lugares de estilo ou por anúncios, nos termos do
disposto no artigo 112º do CPA.
O inicialmente referido artigo 113º do Código (que, surpreendente-
114 Embora não desonere a Administração Pública de dispor de outros meios ou formas de
mente, se reporta aos tribunais) estabelece as condições para a perfeição
emissão de recibo de entrega de requerimentos, nomeadamente, mediante registo eletrónico. das notificações.
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CURSO SOBRE O NOI'O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

Na fase complementar ou de integração da eficácia, leva-se ao conheci- c) Importar a revelação de factos puníveis, praticados pelo próprio interes-
mento dos interessados o teor da decisão final do órgão da Administração sado, pelo seu cônjuge ou por seu ascendente ou descendente, irmão ou afim nos
Pública, através da notificação, da publicação ou do anúncio da decisão mesmosgraus;
administrativa. O disposto no artigo 114º do CPA trata, em parte, desta d) For suscetível de causar dano moral ou material aopróprio interessado ou
fase e, por isso, impõe um dever de notificação de um conjunto diverso a alguma das pessoas referidas na alínea anterior."
de atas administrativos, no prazo geral de oito dias.
Tal como ocorre no âmbito do contencioso, também no âmbito do
4.2.2.3. Da instrução procedimento gracioso (administrativo) se pode produzir prova antecipa-
Na fase da instrução, cujo regime normativo consta agora do disposto nos damente, como decorre do disposto no artigo 120º do CPA, oficiosamente
artigos 115º a 120º do CPA (correspondentes ao anteriores artigos 861! a ou a requerimento fundamentado dos interessados, e aquela pode, nos
93º do Código revogado), desenvolve- e e aprofunda-se o procedimento termos do nº 2, ocorrer até antes da instauração do procedimento. Para que
administrativo, aqui ocorrendo a produção da prova legalmente admitida ocorra produção e recolha antecipadas de prova com interessepara adecisão
e que se entenda necessária, bem como todas as diligências que sejam é necessário a verificação de um dos seguintes pressupostos: (i)justo receio
oportunas. É nesta fase que se prepara, verdadeiramente, o teor da decisão de vir a tornar-se impossível ou (ii) de difícil realizaçãO.
final a tomar pelos órgão competentes.
A instrução, no âmbito do procedimento do ato administrativo, deve 4.2.2.4. Da audiência dos interessados
obediência, igualmente, às disposições gerais do regime comum do pro- A audiência prévia dos interessados, que se efetiva em toda a sua plenitude
cedimento administrativo, anteriormente estudadas. nesta fase e que consta do disposto nos artigos 121º e seguintes do CPA
O disposto na artigo 115º, nº 1 deve conjugar- e, de ignadarnente com (correspondentes aos anteriores artigos 100º e seguintes do ePA revogado),
o disposto no artigo 59º ambos do CPA. De acordo com estipulado no veio a ser uma impo ição do antigo CPA, por decorrência constitucional,
referido artigo n5º,nº 2 do CPA, os factos notórios dada a sua evidência, e assume-se como corolário do já estudado princípio da participação dos
e nos termos gerais do Direito, não carecem nem de prova nem de alega- interessados. Através de audiência aos interessados, o responsável pela
ção. O me mo sucede com (...) osfactos de que o responsável pela direção do direção do procedimento (ou quem assume a função de instrutor do pro-
procedimento tenha conhecimento em virtude do exerdcio das suasfimções " embora cesso) dá conhecimento aos particulares interessados do sentido provável
ne te ca o este eja obrigado a 'fazer constardo procedimento" aquele factos da decisão final ou da deliberação final do órgão, concedendo prazo para
atendendo ao disposto nos n. 2 e 3 do mesmo normativo.
OS

se pronunciarem, querendo, e para que possam vir ao processo dizer o


De acordo com as regras gerais de Direito, o ónus da prova compete ao que tiverem por conveniente. Trata-se, como resulta do disposto no nº 1
interessado, atento o disposto no nº 1 do artigo 116º do CPA. do artigo 122 do CPA, de um direito dos interessados à audição.
De acordo com o disposto no artigo 117º, nº 1, do Código, o responsável
A audiência prévia é um momento crucial do procedimento de feitura
pela direção do procedimento pode exigir aos interessados um conjunto
do ato adminisuativo e visa ouvir uma última vez, antes da decisão final, o
variado de dados, sendo legítimo recusar as determinações públicas, nos
interessado no ato administrativo a proferir. Esta audiência não é necessária
termos das diversas alíneas do número seguinte. Assim,
nem terá sentido útil se se tratar apenas de deferir plenamente o pedido e
"É legítima arecusa às determinações previstas no número anterior, quando se não existirem contrainteressados ou contra-opositores. Neste momento,
a obediência às mesmas: podem os interessados reafirmar o pedido, bem como contrariar o sentido
a) Envolver aviolação de sigiloprofissional ou segredo comercial ou industrial; da decisão eventual da Administração Pública, pronunciando-se "(...) sobre
b) Implicar oesclarecimento defactos cuja revelação esteja proibida ou dis- todas as questões com interesse para adecisão, em matéria defacto ede direito, bem
pensada por lei; como requerer diligências complementares ejuntar documentos", de acordo com
CURSO SOBRE O NOl-O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEOlMENTO ADMINISTRATIVO

o estipulado no artigo 121º, nº 2, do CPA. A realização da audiência prévia (discricionário) do ato administrativo pode decorrer do contratualmente
dos interessados suspende, nos termos do disposto no nº 3 do mesmo ar- estabelecido? Se assim for, o procedimento do ato administrativo termi-
tigo, a contagem dos prazos em todos os procedimentos administrativos. na sempre - como seria expectável e normal - com a prática de um ato
De referir que o artigo 124º do CPA (correspondente ao anterior arti- administrativo unilateral.
go 103º do CPA revogado) dispensa a audiência prévia em determinados O CPA estipula ainda um prazo geral para decisão dos procedimentos
casos, prevendo-se que a mesma pode ser escrita ou oral, nos termos do administrativos, de acordo com o previsto no seu artigo 128º (correspondente
disposto nos artigos 122º e 123º do CPA, respetivamente (correspondentes ao anterior artigo 58º do CPA revogado). Importa aqui referir a eventual
aos antigos artigos 101º e 102º do CPA revogado). responsabilidade disciplinar que pode decorrer do não cumprimento dos
Posteriormente, e após a audiência prévia dos interessados, podem vir prazos, atento o disposto no nº S. É igualmente de assinalar, de acordo com
a ser efetuadas outras diligências complementares que se mostrem conve- os n.O 1 e 6, a distinção em termos de prazos para decisão, dependendo
S

nientes, de acordo com o disposto no artigo 125º do CPA (correspondente de o procedimento ter início por via de requerimento de particular ou
ao anterior artigo 104º do CPA revogado). oficiosamente e passível, neste caso, "(...) de conduzir à emissão de uma deci-
são com efeitos desfavoráveis para os interessados (...)". No primeiro caso, os
4.2.2.5. Da decisão e outras causas de extinção do procedimento procedimentos administrativos "(...) devem ser decididos no prazo de 90 dias
Nos termos do disposto no artigo 126º do CPA (correspondente ao anterior (...)", com as salvaguarda e exceções previstas na norma, e, no segundo
artigo 105º do CPA revogado), finda a instrução e efetuada a audiência dos caso, "(...) caducam, na ausência de decisão, no prazo de 180 dias!'
interessados, o responsável pela direção do procedimento, quando não for De acordo com o previsto no nº 1, o prazo de 90 dias pode ser prorrogado
o órgão competente para a decisão final, pelo responsável pelo procedimento administrativo, mediante autorização
expressa do órgão competente para a decisão final, em situações conside-
"(...) elabora um relatório no qual indica opedido do interessado, resume o radas excecionais, "(...) por um ou mais períodos, até ao limite máximo de 90
conteúdo do procedimento, incluindo afundamentação da dispensa da audiência dias (...)", disso se dando, nos termos do disposto no nº 2, conhecimento
dos interessados, quando esta não tiver ocorrido llS, eformula uma proposta de ao interessado.
decisão, sintetizando as razões defacto e de direito que ajustificam." Atento o disposto no artigo 129º do Código, "(...) o incumprimento do
dever de decisão (...)" previsto no artigo 13º do CPA confere ao interessado
No caso em que não haja coincidência ou identidade subjetiva entre a "(...) possibilidade de utilizar os meios de tutela administrativa ejurisdicional
o responsável pela direção do procedimento e o órgão competente para adequados", designadamente, a ação administrativa especial para obter a
decidir, todo o processo administrativo é concluso ao órgão decisor ou condenação da estrutura administrativa, dentro de determinado prazo, à
deliberativo para decisão final, ou seja, é-lhe remetido. prática de um ato administrativo ilegalmente omitido ou recusado.
Parece que, por força do disposto a propósito dos acordos endoproce- Para além da tomada da decisão final expressa1l6, segundo o previsto
dimentais e, nomeadamente, do consagrado no artigo 57º, nº 3, do CPA, nos artigos 93º do CPA (correspondente ao anterior artigo 106º do CPA
o legislador vem agora, no artigo 127º do mesmo diploma, determinar revogado), relativo ao regime comum, e 127º e seguintes, relativos ao pro-
que o procedimento do ato administrativo (que se estuda e que resulta cedimento administrativo dos atas administrativos, este pode extinguir-se
deste Capítulo II) pode terminar pela prática (óbvia e natural) de um ato ainda por:
administrativo ou - surpreendentemente - pela celebração de um contrato.
O procedimento diz respeito a um ato mas pode determinar a celebração de
um contrato... Não será que o legislador quis, antes, dizer que o conteúdo O órgão decisor deve, na decisão final, nos teml0S do disposto no artigo 94" do ePA (cor-
116

respondente ao anterior artigo 107º do ePA revogado), resolver todas as questões perti-
LI5 A dispensa pode ocorrer, como vimos, nos termos do disposto no artigo 1240 do ePA. nentes.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

- Ato tácito de deferimento ll7 (quando o silêncio da Administração o interessado a desenvolver a atividade pretendida, sem prejuízo dos poderes de
Pública tem valor positivo), nos termos do disposto no artigo 130º fiscalização da Administração e da possibilidade de esta utilizar os meios ade-
doCPA; quados à defesa da legalidade."
- Desistência1l8 , mediante requerimento escrito;
- Renúnciall9 , igualmente mediante requerimento escrito; Trata-se de obter os efeitos tradicionais da emissão de um ato admi-
- Deserção120 , quando o interessado abandona o procedimento admi- nistrativo sem que o mesmo seja emitido e sem que decorra qualquer
nistrativo e este esteja "(...) parado por mais de seis meses, salvo se houver procedimento administrativo. Deste modo, a lei poderá prever que "(...)
interesse público na decisão do procedimento", embora a deserção não aprodução de determinados efeitosjurídico-administrativos (...)" seja imediata e
extinga o eventual direito do interessado; direta, decorrendo de mera comunicação prévia pelo interessado à Admi-
- Impossibilidade ou inutilidade superveniente121 ; e nistração Pública de que preenche os requisitos e pressupostos objetivos
- Falta de pagamento de taxas ou de despesas122• tipificados na lei para a verificação daqueles efeitos. Esta norma permite
dispensar ato e procedimento administrativos. Os efeitos operam quase
4.2.2.6. Comunicações prévias ipso facto. O mesmo artigo, no seu nº 2, prevê a possibilidade de a mera
Para finalizar, relativamente ao procedimento do ato administrativo, o CPA comunicação prévia apenas produzir efeitos jurídicos positivos benéficos
prevê agora, no seu artigo 134º, a figura das comunicações prévias. Vejamos: para os interessados em caso de não pronúncia negativa pelo órgão com-
petente, em prazo legalmente estipulado. O nº 3 vem apenas referir que,
"1 - A leipodeprever que aprodução de determinados efeitosjurídico-admi- nestes casos, não se trata de um ato tácito de deferimentoU3 •
nistrativos e o seu aproveitamento pelo interessado não dependa da emissão de
um ato administrativo procedimentalizado, mas resulte, deforma imediata, da 4.3. Recomendação
mera comunicaçãoprévia pelo interessado do preenchimento dos correspondentes Neste momento, o estudante deve estar habilitado com conhecimentos
pressupostos legais eregulamentares. sobre os regimes comum do procedimento administrativo e privativos
2 - A lei também pode estabelecer um regime de comunicação prévia com do regulamento e do ato administrativos. Importa conhecer, nomeada-
prazo, determinando que a comunicação prévia do interessado só produza os mente, as suas diferentes fases e as suas formas de extinção. É essencial o
efeitos visados se o órgão competente não se pronunciar em sentido contrário conhecimento do regime jurídico da relação jurídica procedimental, da
dentro de determinado prazo. conferência procedimental, das notificaçóes, das audiçóes e das audiências
3 - Nas situações de comunicaçãoprévia com prazo, aausência depronúncia prévias dos interessados, bem como dos prazos graciosos e suas regras de
do órgão competente não dá origem aum ato de deferimento tácito, mas habilita contagem, entre outros.
117 O novo ePA deixou de consagrar o ato tácito de indeferimento (quando o silêncio da
Administração Pública tem valor negativo), dado o enquadramento jurídico do contencioso 4.4. Exercício formativo
administrativo atualmente vigente e que supre esta figura. a) Distinga procedimento administrativo de processo administrativo;
118 Nos termos do disposto no artigo 131º do ePA (correspondente ao anterior artigo 110º do b) Diga quais são as diferentes fases dos procedimentos administra-
ePA revogado). tivos do regulamento e do ato administrativos;
119 Vide nota anterior.

110 De acordo com o disposto no artigo 132º do ePA (correspondente ao anterior artigo 111
2 c) Distinga sujeitos do procedimento de interessados no procedi-
do cpA revogado). mento;
111 Nos termos do disposto no artigo 95º do ePA, relativo ao regime comum dos procedi-

mentos administrativos (correspondente ao anterior artigo 112º do cpA revogado). 113A este propÓSito vide, por todos, o constante do regime do Licenciamento Zero, estabele-
[11 efr. o disposto no artigo 133º do ePA (correspondente ao anterior artigo 113º do ePA cido no Decreto-Lei nº 48/2011, de 1 de abril, alterado pelos Decreto-Lei n.O' 141/2012, de 11
revogado). de julho, e 10/2015, de 16 de janeiro.
CURSO SOBRE O NOVO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO

d) Indique o prazo geral de conclusão do procedimento do ato admi-


nistrativo;
e) Refira-se às conferências procedimentais; e
j) Elenque, explicitando, as diferentes formas de extinção do proce-
dimento administrativo do ato administrativo.

5. Palestra sobre atividade administrativa

SUMÁRIO:
Do regulamento administrativo: disposições gerais. Da eficácia do regulamento
administrativo. Da invalidade do regulamento administrativo. Da caducidade e
da revogação do regulamento administrativo. Da impugnação de regulamentos
administrativos. Do ato administrativo. Enquadramento e disposições gerais.
Tipologia dos atos administrativos. Classificação dos atos administrativos.
Da eficácia do ato administrativo. Da invalidade do ato administrativo. Da revo-
gação e da anulação administrativas. Das alteração, substituição e retificação
dos atos administrativos. Da execução do ato administrativo. Dos contratos da
Administração Pública. Recomendação. Exercício formativo.

A atividade administrativa é aquela que é exercida, designadamente,


pelos órgãos da Administração Pública, ao abrigo da função administra-
tiva do Estado124 e, mais concretamente, no âmbito da gestão pública12s•
Mas, nos dias de hoje, o universo das entidades que prosseguem aquela

124 Esta função estadual tem como fim a satisfação regular e contínua das necessidades cole-
tivas, que, genericamente, são a segurança, a cultura e o bem-estar.
125 A que é exercida ao abrigo do Direito Administrativo e em que os órgãos administrativos

aparecem dotados de poder de autoridade. Não podemos esquecer que estes mesmos órgãos
podem atuar ao abrigo da gestão privada, regulada pelo regime do Direito Privado, sempre
que atuam desinvestidos de ius imper"ii ou do poder de autoridade e surgem, nas relações juri-
dicas, em situação de paridade com os particulares.
CURSO SOBRE O NOI-O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA

função e dispõem de poderes jurídico-administrativos foi-se alargando e 5.1. Do regulamento administrativo 128: disposições gerais
inclui outras entidades de natureza diversa. A Administração Pública dispõe de competência regulamentar, que se
Juridicamente, a atividade administrativa é prosseguida por regula- traduz na possibilidade de emanar atos normativos 129 • A competência
mentos administrativos, atos administrativos e contratos administrativos. regulamentar é, por isso, uma competência normativizadora característica
Como vimos, o ato tácito pode, igualmente, ser considerado, de alguma da Administração Pública.
maneira, uma forma de prossecução muito peculiar da atividade adminis- Importa assinalar que a Constituição protege, nalguns casos, a compe-
trativa, sobretudo porque são casos de deferimentos cujo sentido decorre, tência regulamentar de várias estruturas administrativas, pelo que o poder
expressamente, da lei. legislativo ordinário não pode, através de qualquer meio legal, atacar ou
A esta enumeração jurídica convém adicionar as operações materiais e as suprimir esta capacidade normativizadora tutelada pela Lei Fundamental,
atividades operacionais que reúnem todos aqueles atos não-jurídicos, mas sob pena de inconstitucionalidade material da lei.
vinculados, relevantes e enquadráveis juridicamente, que são praticados Em primeiro lugar, o Governo da República, enquanto órgão superior
por estruturas administrativas, designadamente, serviços públicos, e que da Administração Pública, nos termos do disposto no artigo 182º da CRP,
são empregues para dar execução às decisões administrativas. São disso tem a sua margem de competência para elaborar regulamentos prevista no
exemplo o uso da força e as atividades operacionais das forças eserviços de artigo 199º, alínea c), da CRP. Depois, as Regiões Autónomas dos Açores e
liberdade e segurança 126 , por exemplo, quando intervêm em situações de da Madeira, pessoas coletivas de base territorial e populacional, de acordo
manutenção da ordem pública. com o previsto no artigo 227º, nº 1, alínea d), da CRP, detêm o exercício da
A Constituição Administrativa portuguesa 127 consagra alguns princípios competência, atribuído quer às respetivas Assembleias Legislativas quer
gerais em matéria de atividade administrativa, que vinculam o legislador aos Governos Regionais, atento o disposto no artigo 232º, nº 1, da CRP.
e a própria Administração Pública. Por outro lado, também a mesma competência se encontra atribuída às
A este propósito não parece despiciendo transcrever o disposto no autarquias locais (Freguesias, Municípios e Regiões Administrativas130), de
artigo 266º da nossa CRP, que estipula que acordo com o previsto no artigo 241º da Constituição. Por fim, as Universi-
dades públicas veem a sua autonomia administrativa constitucionalmente
"1. A Administração Pública visa aprossecução do interessepúblico, no respeito
tutelada pelo disposto no artigo 76º e, por esta via, podemos verificar a
pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. tutela constitucional à sua capacidade regulamentar.
2. Os órgãos eagentes administrativos estão subordinados à Constituição e
Releva notar que este poder atribuído a algumas estruturas administrati-
à lei e devem atuar, no exercício das suasfunções, com respeito pelos princípios
vas não é um poder livre e discricionário, estando sujeito, designadamente,
da igualdade, da proporcionalidade, dajustiça, da imparcialidade eda boajé." aos princípios da constitucionalidade e da legalidade em sentido amplo, ou
seja, não podem os regulamentos contrariar o que, constitucional e legal-
Ora, a estes princípios devem obediência e respeito direto e imediato mente, estiver estatuído. Vigora, na sua plenitude, o princípio da preferência
as diferentes estruturas administrativas e têm desenvolvimento legislativo, da Constituição e da Lei. É, portanto, um poder subordinado, de acordo,
como vimos já, na Parte I do CPA. aliás, com a hierarquia das fontes de Direito na ordem jurídica nacional.
O artigo 13Sº do CPA consagra, hoje em dia, o conceito legal de regu-
126 Ternos preferido esta expressão em detrimento da de uso corrente e legal, forças e serviços
de segurança, dado que, constitucionalmente, é ao binómio segurança e liberdade que estão vin- lamento administrativo para os efeitos do novo CPA. Há, deste modo, agora,
culadas.
127 Habitualmente, a doutrina refere-se à "Constituição Administrativa" corno o conjunto 128 Vide Jorge Manuel Coutinho de Abreu, Sobre os regulamentos administrativos e o princípio da
dos normativos constitucionais relativos à Administração Pública. Da mesma forma se uti- legalidade, Livraria Almedina, Coimbra, 1987.
lizam, entre outras, as expressões "Constituição Política", "Constituição Militar", "Constitui- 129 Dotados de generalidade e de abstração, sendo, portanto, leis em sentido materiaL

ção da Defesa e Segurança", "Constituição Financeira" e "Constituição Económica". 130 Ainda não instituídas em concreto.
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uma definição legal da figura. Assim, consideram-se regulamentos admi- legal que não exceciona, de alguma forma, os diversos tipos de regula-
nistrativos "(...) as normasjurídicasgerais eabstratas que, no exercício de poderes mentos, obriga à aplicação de um conjunto de regras que pode, nalguns
jurídico-administrativos, visem produzir efeitosjurídicos externos!' casos, não fazer sentido e ser causa de morosidade na tomada de decisões
O regulamento administrativo, como expressão unilaterall3l da vontade normativas, dado que quando a lei não distingue não cabe ao intérprete
da Administração, manifesta uma dupla natureza: fazer qualquer destrinça. De todo o modo, deveria o legislador ter equacio-
nado a possibilidade de limitar a aplicação do regime jurídico, também, a
- É normativo, já que se trata de um conjunto de normas gerais e abstratas alguns regulamentos internos, sempre e quando as circunstâncias de cada
(e, por isso, é uma lei em sentido material); e . _ situação a regulamentar em concreto o impusessem.
- É materialmente administrativo, pois é emanado ao abngo da funçao Voltando, de novo, aos tipos de regulamentos, é de notar que os que
administrativa, sendo elaborado no exercício de poderes jurídico-adminis- resultam do exercício da competência administrativa do Governo podem
trativos de autoridade e de gestão públicas. Deste modo, esta componente assumir a forma de decreto regulamentarl34 , de resoluçãO normativa, de
estrutural sobrepõe-se à natureza orgânica, ou seja, as normas podem não portaria ou de despacho normativo. A hierarquia entre os regulamentos
ser emanados por estruturas organicamente administrativas (não resultam, governamentais está, como veremos adiante, prevista no disposto no artigo
exclusivamente, de estruturas que integram a Administração Pública em 138Q , n Q 3, do CPA. Os atos regulamentares provenientes das estruturas
sentido restrito), aliás como decorre do âmbito de aplicação do próprio regionais podem assumir a forma de decretos regulamentares regionais e
CPA e, designadamente, do disposto no seu artigo 2Q, n Q 1. Desta forma, o os que provêm de órgãos das autarquias locais podem assumir, nomeada-
elemento orgânico da definição concetual é, agora, dispensado e releva o mente, a forma de posturas.
exercício material da função administrativa, que pode ser prosseguido por Os regulamentos podem, ainda, ser independentes ou de execução
estruturas fora do perímetro orgânico-formal da Administração Pública. (complementares). Os regulamentos independentes, previstos no disposto
no artigo 112Q, n Q 7, da CRP, existem quando a lei em que se fundam e que
Os regulamentos podem ser i.nter~os132ou e~ernos, consoa~t~os se~s visam regulamentar apenas consagra "(...) a competência subjetiva eobjetiva
destinatários se encontrem no mtenor do penmetro da Admlmstraçao para a sua emissão"; ao contrário, os regulamentos de execução assumem
Pública ou da entidade que os emana, ou, por outro lado, ultrapassem as uma função secundária, e complementam um regime jurídico-legal que é
.,. L 133
suas fronteiras, e po dem assumu vanas lormas . mais denso e que deixa menos margem de manobra ao órgão com poderes
De assinalar que, para efeitos do novo CPA e atento o já referido artigo para os aprovar. Embora ambos os tipos de regulamentos (independentes
13S Q , importam apenas os regulamentos que "(...) visem produzir efeitos ou de execução) sejam ou possam ser inovadores, desde que respeitem a
jurídicos externos" o que não deixa de ser de alguma forma su~re~ndente, lei, é natural que o regime jurídico dos primeiros seja mais criativo, porque
dado existirem regulamentos que, produzindo meramente efeItos mternos, a única vinculação àlei é a obrigação de respeitar o previsto quanto à com-
não deveriam ser afastados do regime vinculativo previsto no novo CPA, petência para regulamentar (competência subjetiva) e quanto à matéria
não apenas pela natureza dos efeitos mas, sobretud?, pelas suas dimen~ão, suscetível de regulamentação (competência objetiva).
amplitudes territorial e funcional e importância. E certo que um regIme O CPA prevê agora, para além do disposto, genericamente, no Capítulo
I do Título II da Parte IIF35, nos seus artigos 13SQ a 147Q (anteriormente, o
131 A par do ato administrativo, são manifestações da atuação unilateral da Administração PÚ-

blica ou de detentores de poderes jurídico-administrativos.


regime jurídico - bastante simplificado - constava do disposto nos artigos
132 Os regulamentos internos podem revestir, designadamen~~, .a forma ?e. circul~res,

quando são comuns a vários serviços, ou de instruções, quando dlngIdas a um umco se~Vlç~.
133 Existem diferentes categorias de regulamentos, desde logo e entre outros, os naCIOnaIS, 134 Estes carecem de promulgação do Presidente da República, nos termos do disposto no
regionais e locais; os regulamentos complementares, independentes e autónomos; os regu- artigo 134º, alínea b), da CRP.
lamentos de assistência, policiais, militares, de ensino. 135 Cfr. o disposto nos artigos 97º a 101º do CPA.
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114º a 119º do CPA revogado), o regime e o processo de elaboração dos os conteúdos normativos, aliás, como decorre do disposto no artigo 136º,
regulamentos administrativos. nº 3, do CPA.
Há, no entanto, disposições de caráter genérico que necessitam de ser Por fim, mas ainda quanto ao disposto no artigo 136º do Código, im-
referidas. O teor do artigo 136º, nº 1, do CPA, é decorrência direta do que porta fazer uma breve referência ao estipulado no seu nº 4, a propósito
se prevê, genericamente, sobre a competência em Direito Público. A lei é da necessária habilitação legal para "(...) quaisquer comunicações dos 6rgãos
a fonte dos poderes, aliás, como vimos anteriormente, quando estudámos da Administração Pública que enunciem de modo orientador padrões de conduta
o regime jurídico da competência136 e definimos a origem legal como uma na vida em sociedade com, entre outras, as denominações de "diretiva': "recomen-
das suas características marcantes. Ora, como sabemos, a competência e o dação': "instruções': "c6digo de conduta" ou" manual de boas práticas", embora
fim são sempre elementos vinculados e que resultam da lei. Ou seja, a lei não assumam natureza regulamentar.
é que nos indica que órgão pode exercer determinado poder e com que De acordo com o previsto no artigo 137º, nº 1, do CPA, no silêncio da
fim o pode fazer. Podemos, assim, afirmar que é sempre necessária uma lei lei, é de 90 dias o prazo para adotar um regulamento devido e que seja
habilitante para que o regulamento possa ser emitido por uma determinada necessário para dar execução prática a ato legislativo que careça de regu-
estrutura em concreto. Por outro lado, o nº 2 do mesmo artigo limita-se a lamentação. Atento o disposto no nº 2 do mesmo artigo, a inobservância
transcrever, quase textualmente, o disposto no artigo 112º, nº 7, da CRP. do prazo imposto atribui aos interessados, que possam ser afetados nega-
Destes dois artigos resultam as seguintes vinculações: tivamente pela omissão de regulamentação, legitimidade para requererem
i) Tratando-se de regulamentos complementares, é necessária a a emissão do ato normativo ao órgão com competência subjetiva, podendo
indicação expressa, por estes, das leis que visam regulamentar; e ainda recorrer contenciosamente junto dos tribunais administrativos.
ii) Tratando-se de regulamentos independentes, é necessária a indi- É curioso notar, como já afirmámos, que o CPA vem estabelecer, nas
cação expressa, por estes, das" (...) leis que definem acompetência subjetiva diferentes alíneas do nº 3 do artigo 138º do CPA, a hierarquia dos regula-
eobjetiva para asua emissão". mentos governamentais, cuja ordem de prevalência é, agora, a seguinte:
1º Decretos regulamentares;
Importa precisar dois conceitos a que já tínhamos feito, anteriormente, 2º Resoluções do Conselho de Ministros com conteúdo normativo;
referência e que são os seguintes: 3º Portarias; e
4º Despachos (normativos).
i) O da competência subjetiva, que significa a indicação da estrutura
que tem poderes para aprovar o regulamento, ou seja, a referência à
competência subjetiva responde à pergunta "Quem pode emitir o regu- 5.1.1. Da eficácia do regulamento administrativo
lamento?"; e A Secção II do Capítulo I da Parte IV trata da eficácia do regulamento
ii) O da competência objetiva, que significa, neste caso, a indicação da administrativo e integra quatro artigos relativos à publicaçãO, à vigência,
matéria que será objeto de regulamentação, ou seja, com este conceito à proibição de eficácia retroativa e à aplicação de regulamentos.
responde-se à questão de saber "Que matéria carece ou pode ser objeto de O conceito de eficácia jurídica prende-se com a suscetibilidade de um
regulamentação?" ato, independentemente da sua natureza, poder produzir efeitos jurídicos.
O artigo 139º do CPA impõe a publicação como a forma juridicamente
Como vimos anteriormente, o regulamento independente visa inovar adequada de levar ao conhecimento dos destinatários o teor dos regula-
na ordem jurídica, com grande amplitude e larga margem de opção sobre mentos. A publicação deve ser feita no (i) Diário da República, sem prejuízo
de poder ser feita na (ii) publicação oficial da entidade pública e na (iii)
136 Cfr. o disposto nos artigos 36º e seguintes do CPA.
Internet, no sítio institucional da entidade em causa. Dado que o legislador
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estabelece, agora, uma expressa distinção entre publicação e publicidade competentes suspender a vigência de regulamentos por prazos que,
e parece exigir, cumulativamente, a publicação em boletins oficiais e na materialmente, sejam confundíveis com uma revogação. A suspensão é
Internet (nos sítios institucionais), pode colocar-se a questão de se saber uma forma temporária e pontual de fazer cessar efeitos e não pode ser
qual a data a partir da qual os efeitos se começam a produzir. No caso dos utilizada como instrumento de fuga ou contorno da lei, ou seja, quando a
regulamentos, essa questão é expressamente resolvida com o disposto no lei impõe a irrevogabilidade do regulamento, não pode ser determinada
artigo 140 Q do ePA. uma suspensão por um período tão extenso e longo que seja em tudo
Assim, sob a epígrafe vigência, o artigo 140Q do CPA trata verdadei- similar, material e substantivamente, a uma revogação. Somente caso a
ramente do período de vacatio legis137 , dado que aqui se estipula que os caso pode ser emitido um juízo, em concreto, sobre a validade jurídica
regulamentos iniciam a vigência na "(...) data neles estabelecida ou no quinto da suspensão, mas prazos de meses ou, sobretudo, de anos podem não
dia ap6s asua publicação." Ora, existindo divergência nas datas da publicação ser conformes com o bloco da legalidade e da juridicidade aplicável,
e da publicidade, valerá a primeira para efeitos de eficácia. por corresponderem materialmente a uma revogação de vigência.
O artigo 141Q do CPA impõe uma proibição de eficácia retroativa, ou
seja, os efeitos do regulamento não podem incidir sobre o passado, se forem De referir, ainda, que o n Q 2 do artigo 142Q do ePA proíbe a derroga-
penalizadores para os seus destinatários. A contrario sensu, podemos assumir ção do regulamento por via de ato administrativo (de caráter individual e
que a lei admite a possibilidade de os regulamentos retroagirem os seus concreto). Esta última referência ao caráter individual econcreto parece ser
efeitos, no limite, à data a que se reporta a lei habilitante do regulamento desnecessária, podendo até, nalguns casos, ser geradora de hesitações e
em causa, atento o disposto no artigo 141Q, n Q 2, do CPA, nos casos em que, leituras, a nosso ver, equívocas. Seguindo uma interpretação meramente
designadamente, exista benefício para o interessado. literalista, poder-se-ia admitir a existência de atos administrativos que não
Por fim, o artigo 142Q do CPA prevê, no seu n Q 1, que os órgãos com tivessem carácter individual e concreto e que, deste modo, fosse admis-
competência subjetiva dispõem dos seguintes poderes conSignados na lei: sível a derrogação. Ora, não parece ser esse o caso. Mesmo tratando-se
dos chamados atas administrativos suigeneris (gerais, plurais e coletivos),
i. Poder de interpretação autêntica: o órgão competente para a
cremos que não é admissível que possam ter efeitos derrogatórios sobre
emissão do regulamento tem o poder de interpretar plenamente os
regulamentos. Será, porventura, exigido ao intérprete que faça aqui uma
seus conteúdo, sentido e alcance normativos. A interpretação autêntica
interpretação restritiva, dado que entendemos que o legislador, através
apenas pode ser efetuada pelo órgão que aprova e emite o regulamento;
da letra da lei, disse mais do que eventualmente queria. Seguramente,
ii. Poder modificativo: a estrutura orgânica competente pode alterar queria reforçar a ideia de irrevogabilidade do regulamento por decisão
ou substituir o teor do normativo do regulamento, dando-lhe novo
individual, mas a forma dessa decisão assumir-se-ia sempre como a de
conteúdo; e ato administrativo.
iii. Poder de suspensão: o órgão com poder regulamentar em con-
creto pode suspender a eficácia do regulamento que aprova, no respeito
5.1.2. Da invalidade do regulamento administrativo
pelos limites legalmente impostos. Este poder tem de se conjugar, mais
Vejamos, agora, a questão da invalidade do regulamento administrativo.
à frente, com o poder de revogação dos regulamentos que, em deter-
O conceito de invalidade jurídica prende-se, de forma direta e imediata,
minados casos, é limitado e não pode ocorrer, como veremos, de forma
com a perfeição jurídica do ato, neste caso, o regulamento administrativo.
simples, exigindo-se, nos termos do disposto no artigo 146Q, n Q 2, do CPA,
Para que o ato seja juridicamente perfeito e, por isso, válido, é necessário,
pelo menos uma revogação substitutiva. Assim, não podem os órgãos
antes de mais, que cumpra e respeite o bloco integral da legalidade, hoje
designado como bloco de juridicidade, aliás, como é referido no n Q 1 do
137Prazo que medeia entre a data da publicação de um diploma e a data da sua entrada em
vigor.
artigo 143 Q do CPA. Assim, se o regulamento violar o bloco da legalidade
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(em sentido amplo) é inválido. De igual modo, a invalidade do regulamento não padecereem) de qualquer inconstitucionalidade, "(oo.) só pode(m) ser
administrativo decorre também do estipulado nas diversas alíneas do nº 2 do impugnado(s) ou declarado(s) oficiosamente inválidospela Administração noprazo
mesmo artigo. Nos termos deste número, os regulamentos serão inválidos de seis meses, a contar da data da respetiva publicação, salvo nos casos de carência
se (i) contrariarem o disposto nos regulamentos "(oo.) emanados dos órgãos absoluta de forma legal ou de preterição de consulta pública exigida por lei", nos
hierarquicamente superiores ou dotados depoderes de superintendência", nos termos termos do nº 2. Trata-se, como se pode verificar, de um importante limite
da alínea a), ou seja, estabelece-se uma hierarquia de regulamentos e pre- à ação dos órgãos administrativos, no seu poder de atuação oficiosa em
ferem os regulamentos das estruturas orgânicas hierarquicamente superiores defesa da legalidade.
ou superintendentes; (ii) desrespeitarem os regulamentos emanados pelo
órgão delegante, salvo se a delegação incluir a competência regulamentar, 5.1.3. Da caducidade e da revogação do regulamento administrativo
nos termos da alínea b); e (iii) desrespeitarem os estatutos emanados ao Aos regulamentos administrativos podem ser apostos termos ou condições
abrigo de autonomia normativa nas quais se funde a competência para a resolutivas que, ao verificarem-se, fazem caducar aqueles regulamentos,
respetiva emissão, de acordo com o estipulado na alínea c). atento o disposto no artigo 145º do ePA. O seu nº 2 determina a caducidade
O artigo 144º do Código, a propósito do regime jurídico da invalidade do consequente em função da revogação das leis de que dependem e que regula-
regulamento administrativo, parece abandonar agora a trilogia tradicional mentam, salvo «(...) na medida em que sejam compatíveis com alei nova eenquanto
das invalidades jurídicas nominadas: (i) inexistência jurídica, (ii) nulidade não houver regulamentação desta' e, embora o artigo o não refira desde que
e (iii) anulabilidade, optando por uma categoria genérica de invalidade a lei não disponha em sentido contrário. A caducidade é, por i 50, uma
inominada, sem outra qualquer designação nominativa. das árias formas de extinção de efeitos do regulamento administrativo.
Aliás, esta opção é claramente firmada no nº 3 do referido artigo, quando Outra das formas genéricas e usuais de extinção de efeitos jurídicos é a
se refere à declaração administrativa de invalidade. Aqui se estipula que - quando revogação. Importante disposição legal é a prevista no artigo 146º do ePA
proferida - esta declaração produzirá efeitos desde a data de emissão do (correspondente ao anterior artigo 119º do ePA revogado). Esta ocorre
regulamento, o que nos parece um lapso do legislador, dado que nos pare- em virtude de entrar em vigor um novo regulamento com capacidade
ceria mais curial consagrar-se que a declaração administrativa de invalidade desintegrativa, ou seja revogatória. A regra geral consta do disposto no
produziria efeitos à data da entrada cm vigor do regulamento inválido e artigo 146º, nº 1, do ePA: "Os regulamentos podem ser revogados pelos órgãos
competentespara a respetiva emissão (oo.)".
não à da emissão, porque, como vimos, só a partir daquele momento, o
Ao abrigo do princípio da irrevogabilidade simples dos regulamentos
seu conteúdo se reflete e produz efeitos na ordem jurídica. Ora, o que se
necessários à execução das leis em vigor ou de Direito da União Europeia,
visa destruir são eventuais efeitos produzidos. Importa, ainda, referir que
o nº 2 do referido preceito legal proíbe a sua revogação global simples,
a revogação tem efeitos repristinatórios nas condições impostas no refe-
admitindo, apenas, a revogação ubstitutiva para evitar o retrocesso nor-
rido nº 3. Aliás, a consagração pelo legislador de efeitos repristinatórios à
mativo e o vazio de regulamentação complementar necessária e indis-
declaração administrativa de invalidade parece vir dar-nos razão, dado que
pensável à boa exequibilidade das leis ou do Direito da União Europeia.
a revogação de eventuais normas regulamentares apenas se efetiva com a
Assim, os regulamentos complementares ou de execução não comportam
entrada em vigor do regulamento agora declarado inválido.
a revogação simples global, mas admitem a revogação substitutiva, ou seja,
O regime da invalidade previsto no nº 1do referido artigo 144º do CPA a que põe fim à vigência de um determinado regime jurídico e estipula,
parece aproximar-se do regime tradicional da nulidade, dado que: (i) pode imediatamente e de forma sucessiva, uma nova regulamentação para a lei
ser invocada a todo o tempo, (ii) por qualquer interessado, e (iii) pode ser, em causa, possibilitando assim a sua imediata aplicabilidade. Admite-se,
a todo o tempo, declarada pelos órgãos administrativos competentes. Este igualmente, a revogação meramente parcial, desde que não implique a
regime jurídico é, em tudo, semelhante ao habitual regime jurídico da nuli- inexequibilidade da lei regulamentada ou de alguma das suas normas que
dade. Se a ilegalidade for formal ou procedimental e o(s) regulamento(s) não seja de aplicação direta e imediata.
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o nº 3 da norma em análise vem agora, e bem, estipular que a inobser- aos particulares a possibilidade de acesso aos tribunais administrativosl39
vância da proibição de revogação prevista no nº 2 determina a vigência sempre que a Administração Pública incumprl e algum preceito legal.
forçada, para todos os efeitos, das normas regulamentares revogadas ilegal- Era através desta figura que os tribunais podiam primordialmente, , olhar '
mente que sejam indispensáveis à aplicabilidade da lei exequenda e que para a Administração Pública e para a sua atividade e>..'tema casuística e
vigorarão apenas até ao início da vigência de todo um novo regulamento unilateral.
ou apenas das novas normas regulamentares necessárias. Neste campo, a primeira ideia a reter é a que estabelece a diferença
De salientar, ainda, que o disposto no artigo 146º, nº 4, do ePA (cor- entre o ato administrativo e o regulamento administrativo, dado que este
respondente ao anterior artigo 119º, nº 2, do ePA revogado) prevê que os tem, como vimos, um comando geral e abstrato, ou seja, é um conjunto
regulamentos revogatórios devam, expressamente, especificar as normas de normas, enquanto aquele é uma decisão individual num caso concreto.
regulamentares que revogam. O preceituado no artigo 148º do ePA consagra uma definição legal de
ato administrativo para efeitos de regime jurídico previsto no Código e
5.1.4. Da impugnação de regulamentos administrativos que passamos a transcrever:
O artigo 147º do ePA atribui aos interessados o direito de solicitar (i)
a modificação, (ii) a suspensão, (iii) a revogação ou (iv) a declaração "Para efeitos do disposto no presente Código, consideram-se atos adminis-
administrativa de invalidade dos regulamentos diretamente lesivos dos trativos as decisões que, no exercício de poderesjurz'dico-administrativos, visem
seus direitos ou interesses legalmente protegidos. Do mesmo modo, essa produzir efeitosjurídicos externos numa situação individual econcreta."
norma atribui legitimidade aos interessados para reagirem "(...) contra a
omissão ilegal de regulamentos administrativos", por exemplo, quando eles são Podemos, assim, analisar os elementos concetuais do ato administra-
necessários e devidos para a boa execução de uma lei, que necessita da tivo que são apontados, genericamente, pela doutrina e que constam do
intermediação regulamentar para ser suscetível de ser aplicada e produzir referido artigo 148º do ePA:
efeitos positivos sobre a esfera jurídica dos interessados.
Os direitos atrás elencados podem ser exercidos, nos termos do disposto - Juridicidade: o ato resulta da conduta voluntária por parte da Admi-
no nº 2, mediante reclamação ou recurso e as impugnações administrativas nistração Pública e visa produzir efeitos de Direito;
de regulamentos seguem, por remissão do artigo 147º, nº 3, do ePA, o - Unilateralidade: o ato administrativo é o resultado de uma declaracão
regime jurídico-procedimental disposto nos artigos 189º e 190º do Código de vontade de estruturas com poderes jurídico-administrativo (e não ape~as
e que se referem, respetivamente, aos efeitos das impugnações facultativas de órgãos da Administração Pública) que, para a sua perfeição jurídica, não
dos atas administrativos e aos efeitos sobre os prazos. neces ita da concorrência da ontade de terceiro . O ato administrativo
juridicamente perfeito indepcndememem de outra qualquer vontade que
5.2. Do ato administrativo 138 não a das estruturas orgânicas competentes detentoras dos tais poderes
Vejamos, de seguida, o regime jurídico aplicável aos atas administrativos. jurídico-adminisrrativosHO (independentemente de integrarem ou não o
perímetro orgânico da própria Administração Pública) para a sua emissão,
5.2.1. Enquadramento e disposições gerais
O ato administrativo, definido no artigo 148º do ePA (correspondente 139Aliás, em França, o estudo do ato administrativo é feito no âmbito do estudo do conten-
ao anterior artigo 120º do ePA revogado) como decisão individual num cioso administrativo.
caso concreto, começou por ser, no fundo, uma construção que permitia 1.0 No entanto, o titular do órgão autor do ato administrativo pode expressar uma vontade

que não seja a real e, assim, existir uma divergência entre a vontade declarada e a vontade
real, por exemplo, no caso do subalterno que, devendo obediência ao seu legítimo superior
Ch. Marcelo Rebelo de Sousa, Regime do ato administrativo, Direito e Justiça, Revista da
138 hierárquico, expressa uma vontade contrária à sua mas assente na vontade da chefia hierár-
Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume VI, 1992, pág. 37 e segs. quica, a que deve obediência.
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mesmo a admitir-se agora (como parece admitir-se) que o procedimento - A presunção de legalidadeI4S;
do ato administrativo termine num contrato; - A imperatividadel46;
- Materialmente administrativo: o ato administrativo é praticado no - A revogabilidade147 ou suscetibilidade de anulação administrativa148;
âmbito da função administrativa, ao abrigo da gestão pública e no exercício e
de poderesjurídico-administrativos. Parece que a definição prevista agora na - A sanabilidade149•
lei, como vimos e para efeitos do CPA, afasta a exigência de o ato ser orga-
nicamente administrativo, ou seja, praticado por órgão da Administração o artigo 149º do CPA consagra a possibilidade de aposição de cláusulas
Pública 141• Recorde-se que, anteriormente, esta era uma exigência primária acessórias. Estas, regra geral, estão previstas no nº 1: (i) condição, (ii) termo,
prevista no artigo 120º do CPA revogado. Importa relembrar que não eram (iii) modo ou (iv) reserva, desde que, entre outros, respeitem os princípios
atos administrativos todos aqueles praticados por órgãos de pessoas coleti- gerais aplicáveis e, particularmente, o princípio da proporcionalidade.
vas que não integrassem a Administração Pública. Também não eram atos Por outro lado, o disposto no artigo lS0º do CPA (correspondente ao
administrativos os praticados por usurpação de funções públicas, através anterior artigo 122º do CPA revogado) consagra que os atos administrativos
da qual alguém, consciente e dolosamente, exercia funções administrati- devem ter, regra geral, a forma escrita e que deles deve constar um conjunto
vas sem ter título jurídico público válido para o efeito, como sucederá em de elementos mínimos, previstos como menções obrigatórias no artigo
casos de atuações de falsos trabalhadores em funções públicas. O mesmo lSlº do CPA (correspondente ao anterior artigo 123º do CPA revogado).
sucedia com os atos praticados pelos órgãos do Estado integrados num
Importa, no entanto, precisar agora o conceito essencial da definitividade
poder estadual que não o administrativo, embora para efeitos conten-
do ato administrativo. Os autores falam em três tipos de definitividade, ou
ciosos (e até graciosos) alguns desses órgãos pudessem praticar atos em seja, na tripla definitividade:
matéria administrativa142• De todo o modo, importa afirmar que mesmo a
Administração Pública pode praticar atos ao abrigo da gestão privada, os - A definitividade vertical;
quais não são pois atos administrativos; e - A definitividade horizontal; e
- Visa a disciplina jurídica de uma situação individual num caso con- - A definitividade material.
creto143 : não é por definição normativo, contendo um comando concreto
para um destinatário, pelo menos, determinável. Fixa, por isso, uma dis- vinculados à lei, nunca podendo ser aspetos discricionários. De assinalar que, em caso de
ciplina jurídica para a tal situação individual e concreta. violação da lei, são ilegais e inválidos.
14S Todos gozam desta presunção até prova em contrário. esta presunção pode ser atàstada

por decisJo Jurisdicional, através de uma declaração de nulidade ou da anulação do ato, ou


São várias as características e os traços comuns à generalidade dos atos pode ser :lfastada por decisão administrativa, através de uma declaração graciosa de nulidade
administrativos e que podem, designadamente, ser as seguintes: ou anulaçãO administrativa graciosa, com fundamento em ilegalidade, se o ato for anul, vel.
146 É obrigatório para os seus destinatário . Embora somente sejam executórias os atas admi-
- A integral subordinação à lei 144; nistrativos eficazes, conforme se afirma mais adiante a propÓSito do conceito de executorie-
dade.
l~l
Isso mesmo resulta do expressamente referido no Preâmbulo do Decreto-Lei que aprova 147Têm como característica a possibilidade de serem revogados, atendendo à modificação do
o CPA, que no seu ponto 16 refere, a propósito, que se eliminou "(...) a referência ao elemento interesse público mas sempre fundada em razões de mérito. Há, no entanto, atos adminis-
orgânico da respetiva autoria (...)". trativos que são irrevogáveis. A este propósito, vide, por exemplo, o disposto nos artigos 166º
1~2 Para alguns autores, também conhecidos como atos materialmente administrativos. e 167º do CPA.
1~3 A este propósito, é importante analisar a já referida categoria de atos administrativos sui 148 Quando por razões de ilegalidade geradora de anulabilidade. Neste caso, os atas ilegais
generis que integra as seguintes espécies: os atos coletivos, os atos plurais e os atos gerais (o anuláveis devem mesmo ser anulados.
que se fará adiante). 149 Em princípio, a invalidade é sanável pela Administração, salvo quando gera inexistência
14-l Em diversos aspetos, v. g. a competência do autor, formas e formalidades, procedimento, jurídica ou nulidade (neste caso, apenas através de atos de reforma ou de conversão e nunca
conteúdo da sua estatuição e fim. No entanto, a competência e o fim são sempre elementos de ratificação saneadora).
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Quanto ao conceito de definitividade vertical, significa a exigência de Ainda em termos de disposições gerais, importa analisar o dever de
prática do ato administrativo pelo órgão que está no topo da hierarquia fundamentação, uma das formalidades essenciais hoje previstas no CPA,
administrativa, no que à competência administrativa para a emissão daquele que obriga a que os órgãos da Administração Pública exponham as razões
ato diz respeito. Tem, portanto, sobretudo a ver com a posição vertical do da sua própria solução e que seja explicada a adoção de posição diferente
autor do ato administrativo face à natureza da competência para decidir da habitual ou a adoção de posição oposta à pretensão do particular.
sobre determinada matéria. Desta forma, apenas têm competência para a Nos nossos dias, a regra geral é, até por imposição constitucional, a que
prática de atas verticalmente definitivos os órgãos superiores da Adminis- está prevista no nº 1 do artigo 152º do CPA (correspondente ao anterior
tração Pública, como sejam os órgãos de topo de qualquer entidade pública, nº 1 do artigo 124º do CPA revogado). No entanto, existem atos que não
do Estado15 0, das autarquias locais, dos institutos públicos e, entre outros, carecem de fundamentação, a menos que alguma lei especial o exija, de
os órgãos delegados, ao abrigo da delegação de poderes, se o delegante acordo com o disposto no nº 2 do mesmo artigo 152º, e que são
tinha competência para a prática de atas definitivos.
No que diz respeito à definitividade horizontal, traduz a exigência de "(...) os atos de homologação de deliberações tomadas porjúris, bem como
o ato administrativo em causa colocar fim, em regra, ao procedimento as ordens dadas pelos superiores hierdrquicos aos seus subalternos em matéria
administrativo151 ou a um incidente procedimental autónomo. de serviço ecom aforma lega!."
Por fim, a definitividade material que determina e delimita a situação
jurídica substantiva do particular face à Administração Pública, o que o dever de fundamentação é efetivado nos termos do disposto no artigo
implica a definição ou disciplina de uma relação jurídico-pública152 • 153º do CPA (correspondente ao anterior artigo 125º do CPA revogado).
Assim, a fundamentação dos atos administrativos deverá ser:
150 Por exemplo, os ministros que são órgãos da pessoa coletiva Estado. - Expressa, podendo embora ser feita por remissão;
151 Desta maneira, não são definitivos horizontalmente os atos administrativos anteriores ao - Com fundamentos de facto e de Direito, ainda que sucintos;
ato definitivo - corno os atos preparatórios, os atos pré-decisórios, os atos pressupostos (por
- Clara e objetiva;
exemplo, pareceres e propostas) -, os atos posteriores ao ato definitivo - como os atos com-
plementares, que a lei manda praticar depois da emissão do ato administrativo (como sejam - Congruenté53; e
a publicação ou a notificação, que nada acrescentam ao ato e apenas lhe atribuem eficácia; - Bastante e suficiente.
no entanto, a recusa da sua prática pode tipificar-se como um ato definitivo, pois define ino-
vadoramente uma situação jurídica), os atos de execução e os atos meramente confirmati-
A fundamentação do ato administrativo pode ainda, nos termos do nº 1
vos (porque estes atos traduzem apenas um juízo de concordância sobre um ato que já era
definitivo). Pelo contrário, os atos administrativos confirmativos traduzem um juízo de con- do artigo 153º do CPA, "(...) consistir em mera declaração de concordância com
cordância relativamente a atos não definitivos e, por isso, estes são inovadores, traduzem a osfundamentos de anteriorespareceres, informações ou propostas, que constituem,
última palavra da Administração Pública, e, por isso, são definitivos. Por outro lado, há atos neste caso, parte integrante do respetivo ato."
administrativos não definitivos horizontalmente mas que podem vir a sê-lo, como sejam os Quando a fundamentação dos atos administrativos seja contraditória,
atos sujeitos a ratificação confirmativa (como, por exemplo, acontecia com os atos praticados
obscura ou insuficiente, considera-se que há falta de fundamentação, nos
pelos então Governadores Civis, ao abrigo da sua competência extraordinária, nos termos
do disposto no artigo 8º do Decreto-Lei nº 252/92, de 19 de novembro, alterado pelo De- termos do disposto no artigo 153º, nº 2, do CPA, dado que não esclarece
creto-Lei nº 316/95, de 28 de novembro, pelo Decreto-Lei nº 21312001, de 2 de agosto, pelo em concreto a motivação do ato.
Decreto-Lei nº 264/2002, de 25 de novembro, pela Lei nº 52-A/2005, de 10 de outubro, que Por seu lado, o disposto no artigo 154º do CPA (correspondente ao
consagrava o Estatuto ecompetência dos Governadores Civis; entretanto a figura deixou de existir anterior artigo 126º do CPA revogado) prevê o regime normativo da
na ordem legal portuguesa) ou, como vimos, os atos sujeitos a confirmação, já que somente
depois de esta ocorrer é que o ato se toma definitivo.
152 Nestes termos, podemos concluir que não são materialmente definitivos os atos adminis- 153 O ato administrativo deve surgir como a conclusão lógica da fundamentação e dos moti-
trativos meramente opinativos e os atos internos. vos apresentados, caso contrário, será incongruente.
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fundamentação dos atos administrativos orais, que depende, nalguns 266º, nº 2, da Lei Fundamental, a interpretação do preceito do artigo 1612,
casos, de requerimento dos interessados, não sendo por isso apresentada nº 2, alínea á), do CPA deve fazer-se de forma restrita e não de forma ampla,
oficiosamente. Importa, deste modo, assinalar que, depois de proferido o aplicando-o apenas aos direitos, liberdades e garantias, caso contrário, o
ato oral- de conhecimento imediato -, o interessado pode, como vimos, legislador ordinário havia consagrado restrições às amplitude e eficácia
solicitar que a fundamentação seja reduzida a escrito. do preceito constitucional do artigo 268 2, nº 3. Como o legislador cons-
Por fim, importa referir que o dever de fundamentação dos atos admi- tituinte originário e derivado não distinguiu, não é legítima, para alguma
nistrativos traduz, para os interessados, um verdadeiro direito à funda- doutrina, a distinção ou a restrição imposta, por via legislativa ordinária
mentação dos atos, direito fundamental formalmente constitucional mas ou por mera interpretação doutrinal ou jurisprudencial restritiva. É urna
não integrante da sistemática constitucional destes direitos154 • questão controvertida para a doutrina analisar.
Assim, qualquer ato administrativo ferido de vício de forma por falta Parece, no entanto, de aceitar a tese corrente, em termos doutrinais,
de fundamentação violaria o conteúdo de um direito fundamental, termos mas sobretudo jurisprudenciais, de que a falta de fundamentação gera
em que, segundo alguns autores1SS, se deveria considerar o mesmo inválido, mera anulabilidade.
nulo e logo ineficaz, de acordo com o previsto no artigo 161º, nº 2, alínea Quanto à tipolOgia e à classificação dos atos administrativos, é matéria
á), do Código (correspondente ao anterior artigo 133, nº 2, alínea á), do complexa e bastante extensa (e não se pretende aqui apresentar todos os
CPA revogado). Este normativo do CPA sanciona, assim, como nulos critérios distintivos), remetendo-se este estudo exaustivo para os vários
todos "os atas (administrativos) que ofendam o conteúdo essencíal de um direito manuais de Direito Administrativo existentes.
fundamental", impedindo-os de produzir quaisquer efeitos jurídicos e, por Ainda assim, vejamos alguns dos aspetos mais importantes.
isso, sendo jurisdicionalmente sindicáveis (a todo o tempo), não existindo
prazo para a arguição do vício. Para os autores que defendem aquela tese, S.2.1.1. Tipologia dos atos administrativos
assim se justifica a importância atribuída pelo legislador constituinte à Existe uma grande variedade de tiposlS6 de atos administrativos. Podemos
vinculação constitucional de fundamentação dos atos administrativos e começar por distinguir os atos administrativos primários, que são aqueles
à constitucionalização de tão importante direito dos administrados, que que pela primeira vez disciplinam juridicamente uma situação concreta,
lhes permite conhecer os fundamentos de facto e de Direito suscetíveis e os atos administrativos secundários, também conhecidos como atas sobre
de afetarem os seus direitos e interesses legalmente protegidos, de modo atas, porque incidem sobre atos administrativos primários.
a poderem promover o exercício pleno do direito de impugnação con- De entre os atos administrativos primários, temos os atos administrativos
tendosa ou graciosa dos atos. Deste modo, estes autores consideram que imperativos, que impõem aO seu destinatário uma conduta ou o sujeitam a
se a final o CPA apenas sancionasse a falta de fundamentação com mera certos efeitos, e são exemplos deste tipo de atos as ordens (comandos de
anulabilidade, sujeita a arguição a prazo, ter-se-ia encontrado o meca- ação), as proibições (comandos de omissão), os atos punitivos ou sancio-
nismo de, por via legislativa ordinária, restringir um direito fundamental natórios, que consubstanciam uma pena ou medida disciplinares, os atos
constitucionalmente consagrado, violando-se assim o disposto no artigo ablativos, que restringem ou eliminam determinados direitos, comportando
18º, nº 3, da CRP. sacrifícios para os particulares e de que são exemplos a expropriação e a
Atentos os princípios da constitucionalidade dos atos, previsto no artigo requisição. A par dos atos imperativos, encontramos ainda os atos permissivos,
3º, nº 3 da CRP, e da legalidade da administração, consagrado no artigo que são todos aqueles que permitem ou possibilitam urna determinada
conduta e que podem ser positivos, como sucede com a autorização (que é
154 Na expressão de J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in Fundamentos da Constituição,
Coimbra Editora, 1991, pág. 114 e 115.
155 Vide Guilherme Frederico Dias Pereira da Fonseca, in Direito Administrativo (Sumários Desen- 156 A propÓSito da tipologia dos atos administrativos, vide, por todos, os ensinamentos de

volvidos), ob. cit., pág. 163. Diogo Freitas do Amaral.


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CURSO SOBRE O NOFO CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA

uma permissão para adoção, pelo administrado, de um comportamento), corrigido; a suspensãd57, que visa paralisar temporariamente a produção
a concessão, a admissão, a delegação e a licença, que possibilita um com- de efeitos do ato administrativo; e a aclaração, sempre que se impõe um
portamento que em regra seria proibido; ou podem ser negativos, que esclarecimento ou uma especificação sobre o alcance do ato administrativo.
serão todos aqueles atos que eliminam ou reduzem um encargo e de que Podemos ainda considerar os atos saneadores, que são todos os que visam
são exemplos a dispensa (que permite o não cumprimento de obrigações sanar algumas invalidades. Como exemplos de atos saneadores temos a
legais), a isenção (que está relacionada com razões objetivas), a exclusão ratificação saneadora, a reforma e a conversão. De referir que os atos nulos
(relacionada com razões subjetivas) ou a renúncia. Por fim, no âmbito da são insuscetíveis de sanação por ratificação e, deste modo, só admitem a
categoria mais ampla de atos administrativos primários, encontramos os reforma e a conversão. Esta foi uma inovação formalmente introduzida
atas administrativos simples, que não traduzem uma declaração de vontade pela reforma de 2015 do atual CPA.
mas, apenas, uma mera declaração de conhecimento e não comportam
quaisquer inovações na ordem jurídica. São exemplos deste tipo de atos 5.2.1.2. Classificação dos atos administrativos
simples as certidões, os certificados e os atestados. Para facilidade de estudo, a doutrina classifica os atos administrativos
Por outro lado, existem os atos administrativos secundários, que, como tendo em conta igualmente vários critérios. Sem qualquer preocupação
vimos, contêm uma segunda diSciplina jurídica de determinada situação de esgotar as classificações existentes, porque podem ser doutrinalmente
concreta e que, por isso, são conhecidos como atas sobre atas. A revogação é muito diversas, apresentamos alguns exemplos.
o exemplo mais usualmente oferecido, já que visa fazer cessar os efeitos de Tendo em conta o critério da autoria, podemos estar na presença de deci-
um primeiro ato administrativo. Do mesmo modo, a anulação administra- sões' quando são provenientes de órgãos singulares, ou de deliberações,
tiva é hoje um exemplo de ato secundário, porque visa fazer cessar efeitos quando os atos são provenientes de órgãos colegiais. Com base no mesmo
de um ato administrativo (primário ou secundário) com fundamento em critério, os atos podem ser simples, sempre que resultam da intervenção
razões de legalidade. de um só órgão administrativo, ou podem ser complexos, quando resultam
Estes atos secundários podem ser integrativas, quando visam completar da intervenção de vários órgãos administrativos.
ou aperfeiçoar anteriores atos administrativos, como sucede, por exemplo, Quanto aos destinatários, podem ser atos administrativos concretos ou
com a aprovação, através da qual um órgão administrativo competente singulares, ou podem ser atos suigeneris, logo, coletivos, plurais ou gerais.
exprime a sua concordância com um ato administrativo anterior, dando- Os atos coletivos são aqueles que têm como destinatários um conjunto
-lhe eficácia; com a homologação, que é o ato administrativo que torna unificado de pessoas. Aqui, estamos na presença de um ato administrativo
seus os fundamentos e conclusões de uma decisão proposta por um órgão coletivo e não de um ato normativo, visto que os destinatários são deter-
terceiro; com a confirmação, através da qual um órgão emite um juízo de mináveis. Por exemplo, a dissolução de um órgão colegial por parte de um
concordância sobre um ato de outro órgão; ou, finalmente, com a ratificação órgão superior da Administração Pública, quando a lei lhe atribui tal poder.
confirmativa, que é o ato administrativo através do qual o órgão normalmente Os atos plurais juntam em si um conjunto de atos administrativos; formal-
competente emite um juízo de concordância, atribuindo definitividade a mente são apenas um ato mas é como se fosse um ato administrativo para
um ato praticado por outro órgão, ao abrigo de competência extraordinária. cada um dos seus destinatários. Por exemplo, se a Administração Pública
Para além dos atos secundários integrativos, podemos ainda considerar resolvesse promover todos os trabalhadores que são atualmente chefes
os atos desintegrativos, cujos exemplos mais marcantes são os atos de revo-
gação e de anulação administrativas. 1S7Ao contrário, a revogação vis:l a extinção di:.finitil.a dos efeitos, enquanto que aqui a nno
Em sequência, temos os atos modificativos, como sejam a alteração, que produção de efeitos é meramente temporária. Contudo parece evidente que uma uspensão
leva à modificação do conteúdo, do teor ou dos efeitos do ato; a retifica- muito prolongada, consoante os casos, é: materialmente uma revogação devendo aplicar-se
o regime jurídico da revogação. A uspensão do ato administrativo pode ser jurisdicional, ou
ção, que mais não é do que a correção de lapsos materiais do próprio ato seja, determinada pelos tribunais.
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CURSO SOBRE O N01"O CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE ATlVroADE ADMINISTRATIVA

de divisão no Ministério da Educação ou se através de um ato concedesse Esta matéria está hoje regulada no artigos 1552 a 160º do CPA
permissão genérica para condução de viaturas a todos os trabalhadores de (correspondente aos anteriores artigos 127g a 132l! do CPA revogado) e
um certo serviço da Administração Pública; ou, outro exemplo, um ato de reconduz- e, na prática, à exigências legais complementares para que um
nomeação dos membros de um órgão colegial da Administração Pública determinado ato administrativo produza, efetivamenre efeitos jurídicos.
(um conselho de administração ou mesmo um júri de um procedimento Regra geral e de acordo com o previsto no nl! 1 do artigo 155º do CPA
concursal). Estes atas administrativos aplicam-se aos seus destinatários (correspondente ao anterior n2 1 do artigo 127º do CPA revogado) o ato
como se fossem tantos os atas administrativos quantos os chefes de divisão administrativo é eficaz
promovidos, tantos quantos os autorizados a conduzir e tantos quantos os
membros dos órgãos nomeados. Por fim, os atas gerais destinam-se a um "(...) desde adata em que épraticado, salvo nos casos em que alei ou opr6prio
grupo inorgânico de pessoas mas cujos sujeitos são determináveis num ato lhe atribuam eficácia retroativa diferida ou condicionada. '
determinado local. Por exemplo, uma ordem de dispersão da polícia; aqui
existe um comando dirigido a um grupo de pessoas determinável num Para o CPA, o ato considera-se praticado nos termos do nº 2 do mesmo
determinado local. artigo.
Quanto ao critério que assenta nos efeitos, os atas podem ser declarativos, Assim, podem ser requisitos gerais de eficácia1GO dos atas administrativos:
quando se limitam a verificar ou a reconhecer uma situação pré-existente, - A publicaçãdG1 ;
ou constitutivos, quando introduzem uma alteração na ordem jurídica, - A publicidade na Interner G2 ; e
criando, modificando ou extinguindo situações jurídicas. Os atas admi- - A notificação aos interessados163 •
nistrativos, ainda quanto aos efeitos, podem ser de execução instantânea1S8
ou de execução continuada 159.
Atento o disposto nos artigos 158'2 e lS9º do CPA, verificamos que a
Por fim, importa referir que, quanto ao conteúdo, podem ser atas vin-
publicação só é obrigatória quando for legalmente exigida e que natural-
culados ou discricionários.
mente, a sua falta determina a ineficácia jurídica do ato administrativo em
causa. Ou seja, este não produzirá efeitos na ordem jurídica.
S.2.2. Da eficácia do ato administrativo
No termos do di posto no artigo 159º do CPA, quando a lei determina a
O conceito de eficácia prende-se, como vimos anteriormente, em termos publicação de um ato administrativo mas nada mais diz quanto aos termos
gerais, com a suscetibilidade de produção de efeitos jurídicos. Também da respeti a publicação deve entender-se que a mesma será feita no Diário
como vimos já, este conceito não se confunde com o de validade jurídica,
que está intimamente relacionado com a perfeição legal do ato e que
160 Estes permitem, em princípio, o conhecimento do teor do ato administrativo. Existem
impede que o mesmo possa ser colocado em crise por razões de juridici-
tltos administrativos que somente adquirem eficácia através de uma declaração positiva do
dade. Já tínhamos visto que não existe, por isso, uma relação direta entre seu destinatário, como sucede com o atO administrativo de nomeação, que exige a aceitação
validade e eficácia jurídicas, dado que podem existir atas eficazes que são do destinatário, o que pnrece óbvio, já que se alguém é nomeado o ato de nomeação somente
inválidos (os anuláveis) e atas ineficazes que são válidos (os que estejam, produz efeitos se esta for aceite. Por isso, a didcJa do aro administrativo nada tem a ver com
por exemplo, suspensos). a sua perfeição estrutural. Por outro lado, importa referir que o visto do Tribunal de Contas
pode ser considerado, por legislação avulsa, um requisito de eficácia de detemlinados atos
Importa, agora, precisar alguns requisitos de eficácia dos atas admi- administrativos.
nistrativos. 161 Nos termos do disposto nos artigos 158" e 159" do CPA (correspondentes aos anteriores

artigos 130" e 1319 do CPA revogado).


Por exemplo, os que ordenam a demolição de um muro.
ISk 161 Nos termos do disposto no artigo 159" do CPA.

159Quando prolongam os seus efeitos durante um período de tempo, como é o caso da re- 16.1 Nos termos do disposto no artigo 160" do CPA (correspondente ao anterior artigo 1329 do
forma/aposentação. CPA revogado).
CURSO SOBRE O NOra CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA

da República ou noutro jornal oficial, corno os jornais oficiais das Regiões - Atas sujeitos a condição ou termo suspensivos, atento o disposto na
Autónomas dos Açores e da Madeira, ou corno os boletins municipais, no alínea b); e
caso das autarquias locais de que deles disponham, e simultaneamente na - Quando se verifiquem as condições da alínea c).
Internet no sítio institucional da entidade em causa, no prazo imperativo
de 30 dias. O disposto no artigo 160º do ePA (correspondente ao anterior artigo
Importa ainda salientar que, corno já afirmámos, existem atos adminis- 132º do ePA revogado) consagra urna importante regra quanto aos atos
trativos com eficácia retroativa, ou seja, que fazem incidir os seus efeitos constitutivos de deveres ou de encargos e concede urna garantia aos des-
sobre o passado, embora sejam excecionais, atento o prescrito no artigo tinatários de inoponibilidade destes atas. Assim, estes atos não lhes são
156º, nº 1, do ePA (correspondente ao anterior artigo 128º, nº 1, do ePA oponíveis antes que o seu teor lhes seja previamente notificado.
revogado). Estes atos administrativos são, nomeadamente: Podemos verificar, ainda, que podem existir atos com eficácia jurídica
interrompida, ou seja, que surgiram eficazes mas que deixaram de o ser
- Os atos interpretativos (nos termos da alínea a) do referido nº 1); e (corno, por exemplo, os atos objeto de urna suspensão da eficácia, graciosa
- Os atos a que a lei atribua essa eficácia (nos termos da alínea b) do ou jurisdicional), e atos com eficácia condicionada, ou seja que nasceram
mesmo nº 1). sem eficácia mas que podem tornar-se eficazes (corno sucede com os atos
sujeitos a urna condição suspensiva ou a um termo inicial). Por fim, há atas
Fora destes casos, o autor do ato administrativo só pode atribuir-lhe que, embora válidos, são ineficazes porque, corno vimos já, não foram objeto
esta eficácia retroativa nos termos do disposto no nº 2 do mesmo norma- de publicidade ou de adequada notificação, e atos de eficácia excluída, ou
tivo, ou seja, seja, todos aqueles que, desde a sua origem, não têm eficácia nem nunca
- Quando, genericamente, a retroatividade for mais favorável para os poderão ser eficazes.
interessados, mas nos termos expressos no disposto na alínea a); Em conclusão, podemos afirmar e sublinhar de novo que, corno já
- Quando estejam em causa decisões revogatórias de atos administra- havíamos verificado, o conceito de validade jurídica não é confundível
tivos objeto de reclamação ou de recurso hierárquico, nos termos do com o de eficácia jurídica. Existem atos inválidos que são eficazes (por
disposto na alínea b); exemplo, todos os atos anuláveis até serem anulados) e, por outro lado,
- Quando tal seja devido para dar cumprimento a deveres, encargos, existem atos válidos que podem ser ineficazes (por exemplo, os que têm
ónus ou sujeições constituídos no passado, atento o disposto na alínea a eficácia suspensa ou condicionada).
c); e, finalmente,
- Quando a lei o permitir ou o impuser, nos termos do disposto na 5.2.3. Da invalidade do ato administrativo
alínea d). Importa, agora, fazer referência aos requisitos de validade dos atos admi-
nistrativos, já que eles visam a observância de um conjunto de regras legais
Por outro lado, o ePA prevê, igualmente, situações opostas, ou seja, de previstas também no epA.
atos administrativos com eficácia diferida ou condicionada, nos termos do Essas exigências legais prendem-se, embora aqui possam não se esgotar,
disposto no artigo 157º do ePA (correspondente ao anterior artigo 129º designadamente, com:
do ePA revogado). Estas situações, em que um ato não produz imediata- - Os sujeitosl64;
mente efeitos mas produzi-Ios-á no futuro, são, entre outras, as seguintes:

- Atos sujeitos a aprovação ou a referendo, atento o disposto na alínea 164É necessário, designadamente, que o órgão tenha competência para a prática do ato em
causa. Tratando-se de órgão colegial, que se encontre regularmente constituído e que ex-
a); prima uma vontade juridicamente válida.
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- A forma e as formalidades 16s ; exercício da função legislativa ou no da função jurisdicional, violando,


- O conteúd%bjeto; e desta forma, o princípio constitucional da separação de poderes.
- O fim 166 •
Assim podemos ter:
Vejamos as situações de incumprimento ou de desrespeito pelos requi-
- Usurpação de poderes legislativos; e
sitos de validade do ato administrativo, o que acarreta a sua imperfeição
- Usurpação de poderes judiciais.
jurídica, o surgimento de vícios do ato administrativo e a consequente
invalidade do ato administrativo:
Este vício gera a nulidade 168 do ato, ao abrigo do disposto no artigo
- As violações quanto ao sujeito, que podem gerar os vícios de usurpação 161º, nº 2, alínea a), do CPA (correspondente ao anterior artigo 133º, nº 2,
de poderes, de incompetência absoluta ou de incompetência relativa; alínea a), do CPA revogado). É um vício orgânico, porque se prende com
- As violações formais ou procedimentais, que podem gerar vício de a falta agravada de competência do órgão que emite o ato administrativo,
forma; e pode ser considerado uma incompetência qualificada, atenta a natureza
- As violações de conteúdo, que podem gerar o vício de violação de lei; da norma e do princípio constitucional violados;
e
- As violações ao fim legal, que podem gerar o vício de desvio de poder. ii) Incompetência absoluta: vício que se gera quando um órgão de uma
pessoa coletiva de Direito Público pratica um ato que se integra na compe-
A invalidade jurídica do ato administrativo resulta, muitas das vezes, tência de outro órgão de pessoa coletiva diferente ou de outro ministério.
das ilegalidades cometidas e que se traduzem na violação de normas pre- Este vício determina a nulidade do ato administrativo, ao abrigo do dis-
vistas, designadamente, no CPA. Embora não seja o único desvalor167 que posto no artigo 161Q, n Q 2, alínea b), do CPA (correspondente ao anterior
gera a invalidade, é, seguramente, o mais importante que gera invalidades artigo 133Q , n Q 2, alínea b), do CPA revogado). É um vício que se prende
jurídicas (de legalidade). com a violação das atribuições ou fins das entidades ou dos ministérios
Em regra, como vimos atrás, os vícios dos atos administrativos são seis. (que se organizam como se fossem verdadeiras pessoas coletiva, embora
E são os seguintes: não percam a natureza de serviços do Estado);
iii) Incompetência relativa: vício que atinge o ato administrativo sempre
i) Usurpação de poderes: vício que se traduz no facto de um ato admi- que o órgão de uma pessoa coletiva pratica um ato administrativo que se
nistrativo praticado por órgão da Administração Pública se integrar no integra na competência de outro órgão da mesma pessoa coletiva169 ou
do mesmo ministério. Este vício gera, apenas a anulabilidade do ato, ao
165 Com a entrada em vigor da versão originária do CPA, deu-se um aumento acentuado das
abrigo do disposto no artigo 163 Q do CPA (correspondente ao anterior
formalidades legais a que as decisões administrativas devem obedecer. Estas tendem a asse-
artigo 13SQ do CPA revogado).
gurar as garantias dos particulares e a efetivar os seus direitos.
166 O ato administrativo deve prosseguir o fim efetivamente atribuído por lei, caso contrário,

o mesmo é inválido. Para se aferir da conformidade, há que ter em conta os motivos princi-
palmente determinantes da prática do ato. Em situações de desconformidade entre o fim
real e o fim legal, o ato está ferido de desvio de poder e pode ser nulo, nos termos do dis- 168Veremos, adiante, o regime das invalidades.
posto no artigo 161º, nº 2, alínea e), do CPA. 169Importa, no entanto, notar que, como vimos, os ministérios estão organizados em função
167 A ilicitude pode gerar a invalidade do ato. Por exemplo, sempre que um ato, sem violar a
dos fins. Assim, quando os ministros praticam atos da esfera da competência de outros mi-
lei, ofenda um direito absoluto de um particular que lhe advém por via contratual. Quanto nistros, os mesmos estão feridos de incompetência absoluta e são nulos (e não anuláveis),
aos vícios de mérito, em que se podem traduzir a inoportunidade e a inconveniência, não nos termos do disposto no artigo 161º, nº 2, alinea b), do CPA (anterior artigo 133º, nº 2,
geram ilegalidade. alínea b), do CPA revogado).
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A incompetência pode ser ainda analisada, designadamente: - Desvio de poder para fins de interesse público, o qual gera a anulabi-
- Em razão da matéria; lidade de eventual ato administrativo emitido, nos termos gerais de
Direito, de acordo com o previsto no artigo 163º do CPA.
- Em razão da hierarquia;
- Em razão do território; e
Por fim, importa referir que o ato administrativo inválido pode, nos
- Em razão do tempo.
termos do CPA, ser objeto de sanação. Esta pode ocorrer, como estudámos
iv) Vício de forma: é gerado sempre que existe qualquer preterição das já, através de outro ato administrativo secundário, que o pode sanar, ou
pode ocorrer por efeito automático da lei, em que o decurso do tempo
formalidades legais170 , ou quando existe carência de forma legaL Este vício
desempenha um papel essencial, mas neste caso apenas no que toca, regra
gera, em regra, a anulabilidade do ato, ao abrigo do disposto no artigo 163º
geral, aos atos anuláveis.
do CPA (correspondente ao anterior artigo 135º do CPA revogado), mas
O CPA prevê, no disposto no artigo 164º (correspondente ao anterior
pode gerar nulidade, nos termos, por exemplo, do disposto no artigo 161º,
artigo 137º do CPA revogado), a possibilidade de existência de atos sanea-
nº 2, alíneasg) ou h), do CPA (correspondente ao anterior artigo 133º,
dores. Estes atos são os seguintes:
nº 2, alíneas}) eg), do CPA revogado);
v) Violação de lei: é o vício de que padece o ato administrativo sempre - A ratificação saneadora172;
que existe uma desconformidade entre o conteúdo do ato e o bloco da - A reformal73 ; e
juridicidade (ou da legalidade em sentido amplo). É um vício residual mas - A conversão174 •
de grande amplitude e dos mais importantes. Este vício gera, em regra, a
anulabilidade do ato administrativo, ao abrigo do disposto no artigo 163º Atualmente, os atos nulos podem ser, atento o disposto no artigo 164º,
do CPA (correspondente ao anterior artigo 135º do CPA revogado), mas nº 2, do CPA, objeto de reforma ou de conversão, ao contrário do que
pode gerar, nalgumas situações, a nulidade do mesmo; e sucedia até agora, em que expressamente se consideravam insuscetíveis
vi) Desvio de poder: que afeta o ato administrativo quando os motivos de sanação os atos nulos e os inexistentes.
principalmente determinantes da prática do mesmo não coincidem com os São várias as invalidades jurídicas que podem afetar o ato administrativo.
fins previstos pela lei ao abrigo da qual determinado órgão administrativo Deste modo, temos:
dispõe das competências para atuar com poderes de autoridade. Ocorre
- A inexistência jurídica;
no âmbito do exercício dos poderes discricionários l7l e este desvalor, que
- A nulidade; e
invalida juridicamente o ato administrativo, pode ser:
- A anulabilidade.
- Desvio de poder para fins de interesse privado, o qual gera agora, de
acordo com o novo CPA, a nulidade do ato praticado, atento o disposto Vejamos, em concreto, cada uma das figuras.
no seu artigo 161º, nº 2, alínea e); ou A inexistência é a forma de invalidade jurídica mais grave e significa
que o ato nem sequer existe para o ordenamento jurídico.

170 Por exemplo, quando a lei exige um parecer prévio e a eventual decisão é tomada sem ln A ratificação sanação ou saneadora é o ato através do qual um órgão competente para tal
o mesmo ter sido emitido, quando não é realizada a audiência prévia aos interessados ou decide sanar ou validar um ato ilegal anulável.
quando os órgãos colegiais deliberam sem se ter verificado a existência do quórum legal- 173 Quanto à reforma, conservam-se os elementos válidos de um ato que era ilegal e aprovei-

mente exigido. tam-se somente os elementos legais, ou seja, aqui exclui-se a ilegalidade.
17l Estes poderes traduzem uma competência optativa. 174 Com a conversão, aproveitam-se os elementos válidos para compor um novo ato.
- - - -- - --- - - - --

CURSO SOBRE O ,vom CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA

A nulidade do ato administrativo é, também, uma forma de invalidade podem existir outras disposições legais, no Código ou em outra legislação
dos atas administrativos e é excecional, impedindo-os de produzir, regra avulsa, que consagrem a nulidade de um determinado ato desconforme
geral, quaisquer efeitos na ordem jurídica, atento o disposto no artigo com a lei e que afaste a regra geral da anulabilidade estipulada no ePA.
162º, nº 1, do CPA. Quanto ao seu regime jurídico, pouco difere do re- Contudo, essa disposição há de ser expressa, porque a nulidade não é a
gime geral da inexistência, embora o ato nulo, ao contrário do inexistente, regra geral.
exista juridicamente, podendo afirmar-se que a nulidade acarreta já não a Vejamos um exemplo:
insanabilidade total do ato, como anteriormente acontecia, mas que não
pode ser sanada por ratificação (os atos nulos apenas podem ser objeto O conselho diretivo de um Instituto Público profere o seguinte
de reforma e conversão, atento o disposto no nº 2 do já referido artigo despacho, que manda publicar em Diário da República: "Determina-se
162º do CPA), a impossibilidade de consolidação na ordem jurídica e a por esta deliberação que este órgão renuncia às competências x, y, z,
possibilidade de impugnabilidade a todo o tempo, podendo ser arguida e que lhe são atribuídas pela lei."
declarada em qualquer tribunal ou órgão administrativo com competência Se seguíssemos a regra geral e verificando que a competência é irre-
para a declaração de nulidade 175 ,nos termos do disposto nos artigos 162º nunciável, poderíamos dizer que a deliberaçãO, sendo ilegal, seria por
do CPA. O seu reconhecimento assume a forma de declaração contenciosa consequência anulável. Assim seria se para esta violação se nãoprevisse outra
de nulidade, quando declarada pelos tribunais, ou de declaração graciosa sanção, como decorre do disposto no artigo 163º, nº 1, do CPA. Ora, pese
ou administrativa de nulidade, quando declarada por qualquer órgão da embora a nulidade não resultar do elenco previsto nas diversas alíneas
Administração Pública. Importa assinalar que, seguindo as regras de boa do nº 2 do artigo 161º do CPA, ela vai decorrer de uma outra disposição,
interpretação jurídica, pode e deve o ato ser oficiosamente declarado prevista no artigo 36º, nº 2, do CPA, que expressamente comina que
nulo pelo seu próprio autor, designadamente, ao abrigo do princípio da são nulos os atas que tenham por objeto a renúncia à competência.
autotutela de legalidade que determina que os órgãos da Administração
Pública devem afastar da ordem jurídica os atos inválidos. O ato anulável produz efeitos, ou seja, é, portanto, nos termos do
No que diz respeito à anulabilidade, esta forma de invalidade menos grave nº 2 do artigo 163º do CPA, juridicamente eficaz. Estes efeitos podem todos
tem um carácter geral e afeta o ato administrativo, mas não o impede de eles ser apagados da ordem jurídica se os tribunais ou a Administração
produzir efeitos jurídicos até à sua anulação administrativa ou contenciosa. Pública proferirem, respetivamente, decisão jurisdicional de anulação ou
Trata-se, portanto, como decorre do disposto no artigo 163º, nº 1, do CPA, decisão administrativa de anulação e desde que as decisões retroajam à
da regra geral, porque aqui se estipula expressamente que" (...) são anuláveis data de início de produção de efeitos.
os atos administrativos (violadores da juridicidade) para cuja violação se não Ao contrário da nulidade, aquela permite a consolidação do ato na
preveja outra sanção." Ora, esta norma impõe que o legislador possa escolher ordem jurídica, com decurso do prazo de impugnação sem que a mesma
sancionar um ato administrativo ilegal com outra forma de invalidade que seja exercida ou através da eliminação das ilegalidades com ato saneador.l76,
será a nulidade (ou a inexistência), mas para que isso ocorra é necessário sendo portanto plenamente sanável. Ao contrário da nulidade, a impug-
que o estipule expressamente - o que faz, por exemplo, no artigo 161º do nação desta forma de invalidade tem prazos legalmente estabelecidos
CPA, ainda que a título meramente ilustrativo, como decorre do que se para ser arguida e declarada, nos termos do disposto no artigo 163º, n.O S 3
diz no corpo do seu nº 2, dado que o elenco constante das várias alíneas é e4, doCPA.
apenas exemplificativo e não uma lista exaustiva. Quer isto dizer que todas Importa referir de novo e sublinhar que a nulidade é sempre uma san-
as situações ali elencadas geram nulidades dos atos administrativos, mas ção objetiva177, excecional, sendo a regra geral a da anulabilidade do ato.

176Recordemos que os atas nulos apenas podem ser objeto de reforma e conversão.
l7S Embora o CPA refira competência para anulação. ln Porque recai sobre atas, enquanto as sanções subjetivas recaem sobre entidades.
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Por isso, o artigo 161º, nº 2, do ePA estipula, de forma genérica, mas ape- houvera de ser praticado com o mesmo conteúdo em virtude de vinculação
nas exemplificativamente, os atos que são nulos, enumerando-os. Se uma legal. Não deixa de ser curioso...
determinada ilegalidade nele não estiver prevista, ou inexistir previsão Vejamos, de seguida, uma tabela com a síntese sobre os vários elementos
em qualquer outra lei especial, então conclui-se que essa ilegalidade gera relativos às principais formas de invalidade jurídica dos atos praticados
apenas a anulabilidade do ato administrativo. Não há, assim, nulidades por pela Administração Pública.
natureza. Todas terão de estar previstas na lei.
Importa referir ainda, que, existindo uma cumulação de vícios, preva- PRINCIPAIS FORMAS DE INVALIDADE JURÍDICA DO ATO ADMINISTRATIVO
lecerá sempre a forma de invalidade mais grave: inexistência, nulidade ou ANULABILIDADE NULIDADE INFXIsrtNCIA

anulabilidade (por esta ordem) e, portanto, os respetivos efeitos. EXISttNCIA TURfDICA Existe juridic:llIlente Existe juridic:llIlente
Nlo existe
juridicamente
Neste âmbito genérico, importa também assinalar que os atos adminis-
Não permite a produçlo
trativos são passíveis de ser objeto de vícios de vontade, mas a autonomia da de quaisquer efeitos
vontade do titular do órgão só deveria assumir relevância jurídica quando jurídicos do ato, mas tal
Permite a produção de regra não prejudica :l Não permite :l
tivesse, legalmente, capacidade para poder optar, já que, na realidade, no EFICÁCIA TURfDICA
efeitos do ato possibilld.de de produção de efeitos do ato
âmbito do exercício de poderes vinculados, somente interessa que a vontade atribuição de alguns
efeitos (artigo l62', nO 3.
expressa esteja de acordo com a lei. Quando estamos perante o exercício doePA)
de poderes discricionários (a tal autonomia pública) é que podem emergir, Admite a sanaçio (por Nio admite :l ratificação!
com relevância material e substantiva, os vícios da vontade na formação SANABILIDI\DE rati.fic3ç-J.O, reform:l e m:lS apenas a reforma e 3. Não admite a sanaçáo
conversão) conversão
da decisão, por isso, o ato discricionário aproxima-se mais, neste âmbito,
Admite a consolidaçáo Não admite a consolidação
do negócio jurídico. CONSOLIDAÇÃO
na ordem jurídica, por na ordem jurídic:1} mas Não admite a consolidaçio
sanação ou por decurso alguns efeitos podem na ordem jurídica
No Direito Administrativo, podemos verificar, muitas vezes e em
do tempo consolidar-se
momentos diversos, a existência de divergência legítima entre a vontade
Não obsta:l. impe"'ti-
Pode opor-se resistência Pode opor-se resistênci.
real e a vontade declarada, expressa a final pelo órgão administrativo. Por IMPERI\TIVIDADE
vidade

exemplo, desde logo, como vimos anteriormente, no âmbito da hierarquia A arguição não depende
A arguição e a declaração A "rguição não depende
administrativa, se e quando o superior hierárquico, no exercício do poder TEMPESTIVIDADE de prazo (salvo disposição
dependem de prazo de prazo
legal em contdrio)
de direção, dê uma ordem para a prática de um ato cujo conteúdo não seja
Em tribunal ou na Em tribunal ou na Em tribunal ou na
da concordância do subalterno. Deste modo, a vontade do inferior hierár- SEDE DE INVOCAÇÃO
Administração Pública Administração Pública Administração Pública
quico só tem valor se não houver vontade do superior declarada, ainda que Anulaç.íO contenciosa, Declaração contenciosa Dc:cbraçí.o contenciosa
aposteriori. Mas não esqueçamos, por exemplo, o disposto no artigo 1612 , FORMA DA DECISÃO anulação graciosa ou ou administrativa de ou :l.dministrativa de
administrativa nulidade inexistência
nº 2, alínea j), do ePA (correspondente ao anterior artigo 133º, nº 2, alínea
Excecional e exige Excecional e exige
e), do ePA revogado), que se refere aos atos praticados sob coação física CARÁCTER Geral
tipificação legal tipificação legal
ou coação moral, considerando-os feridos de nulidade. Aqui, a relevância Podem ser definidos e
jurídica da coação física ou da coação moral existe independentemente EFEITOS DI\. DECISÃO
limitados pelo tribunal Retto:>gem ii data da Retroagem :l. data da
ou pela Administraçáo prática do "to prática do ato
de o conteúdo do ato estar ou não substantivamente de acordo com a lei, Pública
porque, como é de salientar, de novo, o legislador não estabelece qualquer Oficiosamente ou a Oficiosamente ou a Oficiosamente ou a
distinção entre atos vinculados ou discricionários praticados sob coação. LEGITIMIDADE
requerimento de requerimento de requerimento de
interessados ou do interessados ou do interessados ou do
O ePA sanciona o ato praticado por órgão cuja vontade estivesse sob coa- Ministério Público Ministério Público Ministério Público
ção e não fosse plenamente livre e esclarecida. Mesmo se o ato praticado
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5.2.4. Da revogação e da anulação administrativas atas administrativos) é "(...) oato administrativo que determina adestruição dos
O novo CPA vem agora, no âmbito do regime jurídico da revisão do ato admi- efeitos de outro ato, comfundamento em invalidade."
nistrativo178 , estabelecer a distinção entre revogação e anulação adminis- Quanto ao fundamento da revogação, ele pode ter por base, apenas
trativas. Esta última correspondia, anteriormente, à revogação anulatória. (porque incidirá sobre atas legais), razões de mérito, de oportunidade ou
No que diz respeito à revogação179 180 e à anulação do ato administrativo, de conveniência. Neste caso, como vimos já, só pode ser objeto de aferição
os seus regimes estão hoje previstos no disposto nos artigos 165º a 174º do por parte das estruturas administrativas, ou seja, os tribunais nunca aferem
CPA (anteriormente, o regime jurídico estava previsto nos artigos 138º a do mérito do ato administrativo.
148º do CPA revogado), pese embora o disposto nos artigos 173º e 174º Quanto ao regime jurídico da revogação administrativa, a regra geral
tratar já das alteração, substituição e retificação dos atas administrativos, estabelece que todos os atas administrativos válidos são, em princípio,
respetivamente. revogáveis. Quanto ao regime jurídico da anulação administrativa, a regra
Existindo outras formas de cessação de vigência de atas administrativosl81, geral estabelece que todos os atas administrativos que padeçam de anu-
com a revogação o ato revogatório tem por objeto a cessação de efeitos de labilidades são, em princípio, submetidos a este regime. O CPA prevê, no
outro ato, tendo como conteúdo funcional a extinção da eficácia jurídica entanto, duas situações distintas em que os atas administrativos não podem
do ato que se visa revogar. Por isso dissemos que a revogação é um ato ser revogados ou anulados administrativamente:
secundário, já que os seus efeitos se repercutem noutro ato administrativo
(primário ou não, porque pode incidir sobre um outro ato secundária). - A de revogação ou anulação administrativas impossível, nos termos
É, como vimos, um ato sobre ato. do disposto no artigo 166º do CPA (anteriormente, a revogação impossível
O disposto no artigo 165º, nº 1, do CPA, define hoje a revogação como constava do artigo 139º do CPA revogado): significa que o conteúdo dos
o "(...) ato administrativo que determina a cessação dos efeitos de outro ato, por atas revogatório ou anulatório não é admissível; há uma impossibilidade
razões de mérito, conveniência ou oportunidade". Reparemos que o exercício de conteúdo, já que se visa extinguir efeitos de atas que os não produzem;
de revogação do ato administrativo apenas terá por fundamento - a partir o ato administrativo que se pretenderia revogar ou anular nunca produziu
de agora - razões de mérito. Deixa-se, assim, para a figura da anulação efeitos ou os seus efeitos estão já totalmente esgotados ou apagados.
administrativa a capacidade desintegrativa de atas administrativos com Vejamos, deste modo, os casos legalmente previstos como sendo insus-
fundamento em razões estritas de legalidade, atento o estipulado no artigo cetíveis de revogação ou anulação administrativas:
165º, nº 2, do CPA, que refere taxativamente que esta figura (que agora i) Os atas nulos (alínea a) do nº 1 do artigo 166º do CPA);
concorre com a revogação administrativa na capacidade desintegrativa de ii) Os atas anulados contenciosamente (alínea b) do nº 1 do artigo
166º do CPA);
iii) Os atos revogados com eficácia retroativa (alínea c) do nº 1 do
17R Na expressão que consta do ponto 18 do Preâmbulo. artigo 166º do CPA); e
179 O ato revogatório é um ato administrativo como qualquer outro e pode estar sujeito a
iv) Os atas cujos efeitos tenham caducado ou se encontrem esgota-
recurso contencioso, em caso de ilegalidade. A revogação não se confunde com a declaração
de caducidade, com as declarações graciosas de inexistência ou de nulidade ou com a sus- dos com eficácia retroativa (artigo 166º, nº 2, acontrario sensu, do CPA).
pensão do ato administrativo. É, como vimos, um ato administrativo secundário.
ISO Cfr., entre outros, José Carlos Vieira de Andrade, Revogação do ato administrativo, Direito Desta forma, a impossibilidade de revogação ou de anulação administra-
e Justiça, Revista da Faculdade de Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume VI, tivas decorre de argumentos de lógica, pois não existem quaisquer efeitos
1992, pág. S3 e segs.
181 O ato administrativo pode cessar os seus efeitos por caducidade, por se tratar de um ato
jurídicos que ainda restem na ordem jurídica e que possam cessar ou ser
de execução instantânea ou por estar sujeito a um termo resolutivo ou a uma qualquer cláu- destruídos. Por isso, se a revogação de um ato não tiver sido total, ainda
sula de caducidade. pode ser objeto de revogação para eliminar os efeitos que permanecem,
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porque nessa medida o ato pode continuar a produzir efeitos, ou pese de vantagem ou eliminem ou limitem deveres, ónus, encargos ou sujeições, salvo
embora o ato já não produzir efeitos, existem alguns que não foram ainda quando asua precariedade decorra da lei ou da natureza do ato".
apagados na ordem jurídica.
Vejamos a segunda das situações: Ficamos, assim, cientes da definição legal do conceito de atas consti-
tutivos de direitos. Deste modo, por atos administrativos constitutivos de
- A de revogação proibida (já não falamos aqui de anulação adminis- direitos consideram-se todos aqueles que ampliam direitos ou interesses
trativa, porque esta apenas se aplica a atas ilegais): neste caso, a revogação legalmente protegidos, compreendendo ambos os conceitos. Ou seja,
seria possível, nada impedindo de facto que ela ocorresse, mas o CPA prevê são aqueles que integram, alternativamente, três ideias: (i) atribuem um
que essa extinção de efeitos, a dar-se, é ilegal, nos termos do disposto no direito, (ii) ampliam um direito preexistente ou (iii) libertam o particular
artigo 167º do CPA. No entanto, não há de facto uma impossibilidade lógica de uma restrição, de um ónus ou de uma vinculação a que estava adstrito.
absoluta, existindo apenas uma proibição legal de revogação, que é uma a regime jurídico relativo aos atos constitutivos de interesses legalmente
opção legítima e correta do legislador. protegidos é muito próximo.
a artigo 167º do CPA consagra assim as situações em que a revogação
pode gerar ilegalidade, sendo proibida, deSignadamente: Vejamos, agora, os condicionalismos aplicáveis à anulação administrativa
i) Quando extingue efeitos de atos administrativos cuja existência re- previstos no artigo 168º do CPA.
sulta de vinculação legal, ou seja, a lei exige a prática e a manutenção Nos termos do disposto no seu nº 1, designadamente, "os atas adminis-
de determinado ato (artigo 167º, nº 1, do CPA); e trativospodem ser objeto de anulação administrativa noprazo de seis meses, acontar
ii) Quando extingue efeitos dos atos administrativos que sejam cons- da data do conhecimento pelo órgão competente da causa de invalidade (...) desde
titutivos de direitos, com as seguintes exceções: que não tenham decorrido cinco anos, a contar da respetiva emissão."
Também quanto aos atos constitutivos de direitos, só podem ser objeto
- Se tiverem uma parte desfavorável aos interesses dos beneficiários de anulação administrativa no prazo de um ano a contar da data da sua
e somente quanto a esta, nos termos do disposto no artigo 167º, emissão, atento o disposto no nº 2 do artigo 168º do CPA, mas se o ato tiver
nº 2, alínea a), do CPA; sido impugnado contenciosamente com vista à sua anulação judicial, então,
- Quando os beneficiários deem concordância e não seja matéria atento o disposto no nº 3 do mesmo artigo, a Administração Pública apenas
indisponível para as partes, de acordo com o previsto na alínea b) pode exercer o poder anulatório "(...) até ao encerramento da discussão", que
do nº 2 do mesmo artigo; é uma fase prévia ao julgamento.
- "Comfundamento na superveniência de conhecimentos técnicos ecientíficos No caso dos atos constitutivos de direitos, o prazo de um ano para a
ou em alteração objetiva das circunstâncias defacto, emface das quais, num anulação administrativa alargar-se-á até aos cinco anos se, nos termos do
ou noutro caso, nãopoderiam tersidopraticados", nos termos do disposto nº 4, e no respeito por outra qualquer disposição em contrário, se verificar
no artigo 167º, nº 2, alínea c), mas de acordo com o estipulado nos o preenchimento de alguma das alíneas aí elencadas.
n.OS4, 5 e 6; e A limitação decorrente do nº 5 resulta dos prazos impostos, sobretudo
- Nos termos gerais da alínea d) do nº 2 do artigo 167º do CPA. para os particulares, de impugnação contenciosa que, regra geral, é de três
meses, atento o disposto no artigo 58º, nº 2, alínea b), do CPTA.
De acordo com o previsto no artigo 167º, nº 3, do CPA, Também este artigo garante aos interessados um eventual direito a
"para efeitos do disposto na presente secção, consideram-se constitutivos de indemnização, nos termos do disposto no seu nº 6.
direitos os atas administrativos que atribuam ou reconheçam situaçõesjurídicas Quanto à iniciativa para as revogação ou anulação administrativas,
pode partir, oficiosamente, do próprio órgão com competência, ou pode
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partir dos interessados, através de recurso ou de reclamação graciosos, nos - Outras estruturas com poderes não hierárquicos, mas cuja esfera
termos do disposto no artigo 169º do CPA (correspondente ao anterior de competências comporte poderes de supervisão l83 revogatórios ou
artigo 138Q do CPA revogado). anulatórios, de acordo com o disposto no artigo 1692, n Q 5, do CPA; casos
Quanto à competência para a revogação, ela pode ocorrer por via do em que exista superintendência ou tutela revogatória ou anulatória, que
autor do ato, através de uma retratação, nos termos do disposto no artigo são sempre excecionais e que não se presumem. A lei terá de prever,
169º, n Q 2, do CPA (correspondente ao anterior artigo 142º do CPA revo- expressamente, esses poderes no leque de poderes que atribui ao órgão
gado). Contudo, nos termos do mesmo dispositivo, para além do autor do superintendente e/ou tutelar. Se a lei o não fizer, as estruturas não terão
ato, podem revogar atos administrativos órgãos diferentes daqueles que competência desintegrativa dos atos administrativos inválidos ou inopor-
os praticaram. Assim, dispõem de competência legal para o efeito, salvo tunos ou inconvenientes praticados e restará aos particulares o recurso às
disposição legal em contrário, o superior hierárquico do autor do ato que garantias contenciosas; e, por fim,
pode sempre revogar os atos praticados pelos seus subalternos, ao abrigo - O órgão competente, quando o ato for praticado por órgão incom-
do poder de supervisão, que é um dos poderes hierárquicos de controlo petente, de acordo com O disposto no artigo 169Q nº 6, do CPA. A opção
- a par do poder de inspeção e do poder disciplinar -, a menos que exista do legislador clara, mas talvez. não fosse de rejeitar a po sibilidade de o
competência exclusiva do subalterno182 (de acordo com o disposto no órgão incompetente poder proceder à desintegração atravé da anulação
artigo 169º, nº 2, do CPA). do ato. Reparemos que o legislador anos o ver cai aqui, salvo melhor opinião
O nº 3 diz apenas respeito à competência anulatória, que compete num erro enuma contradição. Vejamos: se a revogação diz apenas respeito a
ao órgão que praticou o ato ou ao superior hierárquico, não sendo aqui questões de mérito e a anulação a questões de invalidade, de acordo com
salvaguardada, pelo legislador, a competência exclusiva do subalterno, o disposto no artigo 165º do CPA, então não se pode admitir a revogação
como o foi no número anterior a propósito da revogação administrativa. do ato praticado por órgão incompetente, porque ele é inválido e apenas
Por outro lado, enquanto vigorar a delegação de poderes, de acordo comportará a anulação administrativa, por se fundar em questões estritas
com o disposto nos artigos 169º, nº 4, e 49º, nº 2, do ePA (este último de legalidade.
correspondente ao anterior artigo 39º, nº 2, do CPA revogado), os atos
administrativos praticados podem ser objeto de revogação ou anulação Quanto às formas da revogação ou da anulação administrativas, elas
administrativas, com fundamento no regime normativo da delegação de devem revestir, nos termos do disposto no artigo 170Q, nº 1, do CPA, as
poderes, pelos: mesmas formas legalmente exigidas para os atos colocados em crise, seguindo
ainda de perto o prescrito no nº 2 do mesmo artigo se o ato a revogar ou
- Delegante,
a anular tiver sido praticado com excesso deforma.
- Subdelegante;
No que diz respeito à eficácia do ato administrativo revogatório, releva
- Delegado; ou
notar que o conteúdo do ato de revogação visa, primária e diretamente,
- Subdelegado.
fazer cessar efeitos do ato revogado com eficácia ex nunc (para o futuro).
Do mesmo modo, e nos casos expressamente previstos por lei, podem Contudo, nos termos do disposto no artigo 171Q, n Q I, do CPA (correspon-
dente ao anterior artigo 145Q , nº 3, do CPA revogado), pode existir uma
proceder à revogação ou à anulação administrativas:

183Designadamente, entidades tutelares com poderes de tutela revogatória e/ou anulatória.


Neste caso, talvez se admita que o superior possa emanar ordens de revogação com funda-
18! O poder administrativo de supervisão traduz a faculdade de confirmação, revogação, anu-
mento na hierarquia administrativa. Cfr., igualmente, o disposto no artigo I97º, nº I (corres- lação ou substituição dos atos administrativos, podendo, por isso, englobar a faculdade de
pondente ao anterior artigo I74º, nO I, do CPA revogado). emanar uma nova disciplina para a situação jurídica.
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eficácia mais ampla, abrangendo os efeitos já produzidos, ou seja, ex tunc No que diz respeito à anulação administrativa, o artigo 171º, nº 3, do
(efeitos retroativos). CPA refere que "salvo disposição especial, a anulação administrativa produz
Desta forma, a revogação pode, assim, ter efeitos retroativos, atri- efeitos retroativos, mas o autor da anulação pode, na pr6pria decisão, atribuir-lhe
buídos pelo autor do ato revogatório, apenas com fundamento em razões eficácia para ofuturo, quando oato se tenha tornado inimpugnávelpor viajurisdi-
de mérito ou de oportunidade, nos termos do disposto no artigo 1712, ciona!." E, por outro lado, a anulação tem, regra geral, efeitos repristina-
nº 1, do CPA, desde que verificado um dos dois requisitos alternativos aí tórios, verificados os limites elencados nos termos do disposto no nº 4 do
enunciados, a saber: mesmo normativo, dado que se funda em invalidade(s) que importa apagar
da ordem jurídica. A formulação desta norma parece um pouco confusa,
- A retroatividade ser favorável aos interessados; ou
dado que só há efeitos repristinatórios na presença de atos revogatórios.
- Os interessados terem dado a sua concordância expressa a essa retro-
Por fim, o artigo 1722 do CPA consagra as consequências da anulação
atividade e não estejam em causa direitos ou interesses indisponíveis.
administrativa. Vejamos os aspetos mais importantes.
O nº 1 é claro quando estipula que
Importa, agora, atender ao disposto no artigo 171º, nº 2, do CPA (cor-
respondente ao anterior artigo 146º do CPA revogado), que se refere aos "Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, a
efeitos repristinatórios da revogação. Estes efeitos prendem-se com o anulação administrativa constitui a Administração no dever de reconstituir a
renascimento de normas anteriormente revogadas. Assim, a questão que situação que existiria se oato anulado não tivesse sido praticado, bem como de
se pode colocar é a de se saber se a revogação de atos administrativos terá, dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido comfundamento naquele
ou não, efeitos repristinatórios. ato, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que
Ora vejamos: deveria ter atuado",

a. 4
b ... C tal como o nº 2 do mesmo artigo:

Legenda: a - ato administnltivo primário; b - ato administrativo revogatório (de a); c - ato administrativo "Para efeitos do disposto no número anterior, a Administração pode ficar
revogatório (de b) constitufda no dever de praticar atos dotados de eficácia retroativa, desde que
não envolvam aimposição de deveres, encargos, 6nus ou sujeições, aaplicação de
Se o ato c revoga expressamente o ato b para o futuro, não se colocam sanções ou arestrição de direitos ou interesses legalmenteprotegidos, assim como
quaisquer dúvidas ou problemas. Mas, caso a revogação do ato b, feita pelo no dever de anular, reformar ou substituir os atos consequentes sem dependência
ato c, tenha efeitos ex tunc, ou seja, eficácia retroativa, e expressamente o deprazo, ealterar as situações defacto entretanto constitufdas, cuja manutenção
determinar, atenta a parte final do disposto no artigo 171º, nº 2, do CPA, seja incompatível com a necessidade de reconstituir asituação que existiria se o
repristina, isto é, coloca de novo em vigor o ato a. ato anulado não tivesse sido praticado."
A repristinação pode, igualmente, ocorrer se for determinada direta-
mente pela lei. Deste modo, para sabermos a final se a revogação (pelo 5.2.4.1. Das alteração, substituição e retificação dos atos
ato c) de um ato revogatório (ato b) tem efeitos repristinatórios (sobre administrativos
o ato a) teremos de, para além de conhecer a lei, conhecer igualmente a De seguida, o legislador trata, no artigo 173º do CPA, das questões rela-
vontade expressa do autor do ato c. Ambas as vontades - a do legislador e tivas à alteração e substituição dos atos administrativos. Regra geral, são
a do autor do ato administrativo secundário - são determinantes para se aplicáveis, nos termos do disposto no artigo 173º, nº 1, do CPA, as normas
saber se existem efeitos repristinatórios. reguladoras da revogação. O nº 2 refere que
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"A substituição de um ato administrativo anulável, ainda que na pendência faculdade de serem impostos com recurso à força e independentemente
deprocessojurisdicional, por um ato válido com o mesmo conteúdo sana os efeitos de prévio recurso aos tribunais.
por ele produzidos, assim como os respetivos atas consequentes." Embora se tenha abandonado o elenco previsto no anterior artigo 150Q
do ePA revogado, que consagrava um conjunto de atos administrativos
Já a retificação dos atos administrativos é regulada no artigo 174Q do epA. que, à partida, não gozava do privilégio de execução prévia, parece que
Trata-se aqui de corrigir erros de cálculo e erros materiais na expressão grande parte daquela enumeração continua a ter pleno cabimento e sen-
da vontade do órgão administrativo que, quando manifestos, podem ser tido. Por exemplo, o caso dos atas administrativos com eficácia suspensa,
retificados a todo o tempo. A retificação pode ser solicitada pelos inte- entre outros.
ressados ou promovida oficiosamente, e pode ser efetivada pelos órgãos O artigo 175º do ePA é claro no que diz respeito ao objeto da execução
competentes para a revogação do ato administrativo. administrativa. A execução pressupõe a existência de "(...) procedimentos
O n Q 2 do referido artigo impõe, no entanto, o uso da forma e do meio de administrativos dirigidos à obtenção, através de meios coercivos, da satisfação de
publicidade do ato retificado e determina a produção de efeitos retroativos. obrigaçõespecuniárias, da entrega de coisa certa, da prestação defactos ou ainda do
respeitopor ações ou omissões em cumprimento de limitações impostaspor atas admi-
5.2.5. Da execução do ato administrativo nistrativos." De referir que, atento o consagrado no n Q 2 do mesmo artigo, a
No que diz respeito ao conceito de executoriedade84 do ato administrativo, tomada de ações policiais de coação direta será objeto de legislação própria.
ele corresponde, grandemente, ao instituto do privilégio de execução Hoje, de acordo com o teor do n Q 1, do artigo 176 Q, do ePA, os atos ad-
prévia ou à faculdade de aplicação coerciva de um ato administrativo, ministrativos só podem ser impostos coercivamente (i) nos casos esegundo
independentemente de qualquer decisão judicial prévia ou da concor- asformas e termos expressamente previstos na lei ou (ii) em situações de urgente
dância do particular, e está intimamente relacionado com a característica necessidadepública, devidamentefundamentada.
da imperatividade do ato administrativo. Este conceito não se confunde Importa referir que não pode existir execução coerciva sem que,
com o de eficácia jurídica, nem com o de validade. previamente, os órgãos administrativos competentes emanem um ato
O regime jurídico da execução (coerciva) do ato administrativo 185 vem, administrativo declarativo do direito a aplicar à situação em concreto - o
agora, previsto no artigo 175Q e seguintes do ePA e tem, desde logo, apli- ato exequendo -, de acordo com o disposto no artigo 177Q, n Q 1, do ePA
cação a atos administrativos que criem obrigações, deveres ou encargos (correspondente ao anterior artigo 151Q, n Q 1, do ePA revogado). A isto se
para os particulares, não existindo um cumprimento voluntário por parte pode chamar de autotutela declarativa da legalidade.
dos mesmos. Nestes termos, para que possa ser promovida a execução de um ato
A executoriedade não é, por isso, característica de todos os atos admi- administrativo com recurso legítimo à força pública, é imperativo que
nistrativos, visto que somente são executórios aqueles atos que são eficazes primeiramente a Administração Pública declare o direito que considera,
e, portanto, nem todos gozam do privilégio de execução prévia e desta naquele caso concreto, como o definidor e disciplinador da situação ju-
rídica. Esta definição é feita, em concreto, através do ato administrativo
juridicamente eficaz e que será considerado o título jurídico executivo
que fundamentará a intervenção coerciva da Administração Pública, após
184 Vide Rui Machete, Execução do ato administrativo, Direito e Justiça, Revista da Faculdade de
Direito da Universidade Católica Portuguesa, Volume VI, 1992, pág. 65 e segs. notificação ao(s) particular(es) interessado(s).
185 Este regime jurídico consta dos artigos 175º a 183º do CPA (correspondentes aos anterio- O artigo 177Q, n Q 2, do ePA impõe que, salvo em estado de necessi-
res artigos 149º a lS7º do CPA revogado). Dos artigos 179º, 180º e 181º do CPA (correspon- dade, é necessária a emissão de uma decisão autónoma fundamentada
dentes aos anteriores artigos 15Sº, 156º e lS7º do Código cessante) constam, respetivamen- de proceder à execução administrativa. Esta decisão administrativa terá
te, os regimes das execuções de obrigações pecuniárias (para pagamento de quantia certa),
para entrega de coisa certa e para prestação de facto.
como objeto a determinação, pelo órgão competente, do conteúdo e dos
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termos da execução. Assim, teremos necessariamente um (i) ato adminis- nizações esançõespecuniárias, por conta do obrigado." Parece ser uma solução
trativo exequendo e um (ii) ato administrativo que determine a execução. ajustada, dado que há um incumprimento por parte do destinatário que fica
Este ato (ii) será notificado, obrigatória e previamente, ao destinatário e terá vinculado à prestação de facto, a qual, por ser fungível, pode ser objeto de
de conceder ao mesmo um prazo razoável para cumprimento voluntário da substituição, mas cujos encargos recairão na esfera jurídica do incumpridor.
obrigação exequenda, que, a suceder, dispensará a execução administrativa. Aliás, O ressarcimento das despesas efetuadas, nestes casos, pode seguir os
Esta notificação pode ocorrer simultaneamente com a notificação do ato trâmites procedimentais previstos no artigo 179Q do CPA para obtenção do
administrativo principal exequendo, atento o estipulado no n Q 4 do mesmo pagamento de obrigações pecuniárias, por força do disposto no seu n Q 3.
artigo. Parece, desta forma, que o legislador determina a existência de um O legislador veio consagrar, no artigo 182º do Código, disposições sobre
prazo razoável a fim de possibilitar o cumprimento da eventual obrigação garantias dos executados. Aqui se consagra o direito de impugnação admi-
que resulte do ato administrativo exequendo. nistrativa e contenciosa, desde o ato exequendo, passando pelo ato que
O disposto no artigo 178Q do CPA, sob a epígrafe Princípios aplicáveis, determina a execução, até aos atos praticados durante a execução, poden-
parece querer ser apenas um reforço de evidência do que anteriormente é do, como é óbvio, requerer a suspensão contenciosa, atento o disposto no
estipulado, de forma genérica, a propósito dos princípios gerais da ação nQ 1 do citado artigo. Parece não ser de afastar, embora o legislador o não
administrativa. Reafirma-se a necessidade de respeito pelo princípio da preveja aqui expressamente, que o pedido de suspensão possa igualmente
proporcionalidade Oá imposto no artigo 7 Q do CPA), pelos direitos fun- ser apresentado à Administração Pública, pedido esse que pode incidir
damentais e pela dignidade da pessoa humana. sobre qualquer dos atos administrativos em questão e assumir natureza
Seguem-se, imediatamente (artigos 179Q, 180Q e 181Q do CPA), os regimes administrativa.
S
autonomizados das execuções de obrigações pecuniárias, para entrega de Os n.O 2 e 3 do referido artigo 182º dizem respeito a aspetos relevantes
coisa certa, e para prestação de facto. do contencioso que podem, aqui, ser utilizados como garantias efetivas e
Vejamos estes regimes de forma sucinta. que visam proteger os direitos dos interessados.
A falta de pagamento de prestações pecuniárias a uma entidade pública Por fim, o disposto no artigo 183 Q do CPA permite à Administração
determina a instauração, nos termos do disposto no artigo 179Q nº 1, do Pública recorrer aos tribunais administrativos para promover a execução
CPA, de um processo de execução fiscal que seguirá os trâmites previstos judicial de atos que, nos termos do mesmo artigo, não possam ser aplica-
na legislação do processo tributário. Para esse efeito, o órgão competente dos coercivamente, e que, portanto, não gozem do chamado privilégio
da entidade pública emitirá, de acordo com a lei, uma certidão, que terá, de de execução prévia, dado que a executoriedade possibilita a execução
acordo com o disposto no n Q 2, valor de título jurídico executivo e que será administrativa sem prévio recurso aos tribunais.
remetida ao competente serviço da Administração tributária, juntamente Importa ainda referir que pode ser requerida pelos interessados a
com o processo administrativo. suspensão da execução, o que mais adiante se estudará a propósito do
O artigo 180 Q do CPA determina que a falta de entrega de coisa devida disposto no artigo 189º, n.O 3 e 4 do CPA.
S

permite ao órgão competente" (...) proceder às diligências queforem necessárias Em conclusão e como se referiu atrás, podemos afirmar que o con-
para tomarposse administrativa da mesma." ceito de executoriedade não deve confundir-se com o conceito de eficácia
A execução para prestação de facto decorre como previsto no artigo 181º jurídica, já que este se prende com a suscetibilidade de um qualquer ato
do CPA. Aqui se diz que, quando a prestação de facto fungível- aquele administrativo produzir, de forma direta e imediata, efeitos jurídicos e não
suscetível de ser substituído, por não ser único, por haver idênticos ou existe uma direta ligação entre os conceitos. Por isso, podem existir atos
semelhantes - não for cumprida, no prazo estipulado, se possibilita ao eficazes que não sejam executórios.
órgão competente"(...) determinar que aexecução seja realizada diretamente ou
por intermédio de terceiro, ficando, neste caso, todas as despesas, incluindo indem-
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5.3. Dos contratos da Administração Pública186 O diploma legal que aprovou o CCp189 veio revogar as disposições do
Nos números anteriores, abordámos os regimes jurídicos substantivos anterior CPA sobre os contratos administrativos.
resultantes do CPA quanto ao regulamento e ao ato administrativos e, O novo CPA veio de novo consagrar, no último dos seus capítulos, três
consequentemente, no que diz respeito à atuação unilateral da Adminis- artigos sobre contratos da Administração Pública.
tração Pública. Do disposto no artigo 200º do CPA decorre a possibilidade de serem
A atuação das várias estruturas administrativas, no âmbito dos contratos celebrados, pelos órgãos da Administração Pública, contratos de Direito
da Administração Pública e, particularmente, no do contrato administra- Público e contratos de Direito Privado. Neste último caso, as entidades
tivo, assenta na bilateralidade e numa participação dos particulares que públicas aparecem desinvestidas dos seus poderes de autoridade e surgem
é mais elevada e intensa, pois pressupõe-se um acordo de vontades que na relação jurídica como se fossem particulares. Há uma clara paridade
visa atingir e conciliar interesses distintos, públicos e privados. Os órgãos hierárquica na relação jurídica contratual.
da Administração Pública podem celebrar contratos administrativos, de Por seu lado, o artigo 201º do CPA reforça o apelo ao respeito pelos
acordo com o previsto agora no Código dos Contratos Públicos (CCP)187 princípios da transparência, da igualdade e da concorrência aquando da
que é, hoje, o principal diploma que regula a contração pública. formação dos contratos.
Podemos definir o contrato administrativo como o acordo de vontades O artigo 202º do Código trata, a final, do regime substantivo dos con-
pelo qual é constituída, modificada ou extinta uma relação jurídico-admi- tratos da Administração Pública. Como se pode comprovar, os três artigos
nistrativa l88 . Para estarmos na presença de um contrato administrativo, fazem referências expressas, como não poderia deixar de acontecer, ao
é necessário que a matéria do mesmo seja de Direito Público e que seja referido CCP.
celebrado ao abrigo da gestão pública.
De referir, contudo, que os contratos administrativos têm algumas
5.4. Recomendação
especificidades de regime jurídico, hoje grandemente previsto no CCP,
Estudada a parte respeitante aos vários modos de ação jurídica da Admi-
desde logo porque podem conferir poderes de autoridade a um particular,
nistração Pública, o estudante deve saber distinguir, claramente, as
podem atribuir direitos ou impor deveres e podem impor restrições de
diversas formas de prossecução da atividade administrativa: regulamen-
interesse público aos particulares.
tos administrativos, atos administrativos e contratos da Administração
Pública.

5.5. Exercício formativo


L86 Vide José Manuel Sérvulo Correia, Legalidade e autonomia contratual nos contratos adminis- a) Diga quais são as formas jurídicas de atividade dos órgãos da Admi-
trativos, Coleção Teses, Livraria Almedina, Coimbra, 1987; Maria João do Rosário Estorni- nistração Pública;
nho, Requiem pelo Contrato Administrativo, Livraria Almedina, Coimbra, 1990; Maria João do
Rosário Estorninho, Princípio da Legalidade e Contratos da Administração, separata do Boletim b) Diga o que entende por regulamento administrativo e dê exem-
do Ministério da Justiça nO 368, Lisboa, 1987. plos;
L87 O CCP foi aprovado pelo Decreto-Lei nº 18/2008, de 29 de janeiro, alterado pela Lei c) Refira-se ao processo de elaboração dos regulamentos;
nº 59/2008, de 11 de setembro, pelos Decretos-Leis n."' 34/2009, de 6 de fevereiro, d) Distinga regulamento de ato administrativo;
223/2009, de 11 de setembro, e 278/2009, de 2 de outubro, pela Lei nº 3/2010, de 27 de
abril, pelo Decreto-Lei nº 131/2010, de 14 de dezembro, pela Lei nº 64-B/2011, de 30 de
e) Defina ato administrativo e dê exemplos;
dezembro, e pelo Decreto-Lei nº 149/2012, de 12 de julho. f) Diga quais são as características comuns aos atos administrativos;
188 O então artigo 178º, n° 1, do CPA revogado definia o contrato administrativo, precisa-

mente, segundo o critério do objeto; "Diz-se contrato administrativo o acordo de vontades pelo
qual éconstituída, modificada ou extinta uma relação jurídica administrativa." 189 Vide nota 187.
- -- - --- - - -

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g) Diga a partir de que momento um ato administrativo é definitivo;


h) Indique e distinga os VÍcios do ato administrativo;
i) Diga o que entende por privilégio de execução prévia; e
j) Diga o que entende por contrato administrativo.

6. Palestra sobre garantias administrativas

SUMÁRIO:
Enquadramento geral. As garantias administrativas impugnatórias: regime geral.
Da reclamação. Dos recursos administrativos. Do recurso hierárquico. Dos recursos
administrativos especiais. Recomendação. Exercício formativo.

6.1. Enquadramento geral


Desde há muito tempo que o legislador consagrou amplas garantias admi-
nistrativas, também chamadas de graciosas19o , e que estiveram dispersas
por vários diplomas legais. Com o movimento codificador da legislação
relativa ao procedimento administrativo, conseguiu compilar-se um
conjunto alargado dessas garantias dado que, como se disse, as garantias
jurisdicionais não são plenamente suficientes para assegurar, na íntegra,
a defesa dos direitos dos particulares.
Assim, para além da possibilidade de recurso aos tribunais administra-
tivos, através, designadamente, do direito de acesso à justiça administrativa
e da garantia de

"(...) tutelajurisdicional efetiva dos seus direitos ou interesses legalmentepro-


tegidos, incluindo, nomeadamente, oreconhecimento desses direitos ou interesses,
aimpugnação de quaisqueratos administrativosque os lesem, independentemente
da suaforma (... )"19\

190 As que são efetivadas junto da própria Administração Pública.


191 Nos termos do disposto no artigo 268º, nº 4, da CRP.
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Os particulares têm a capacidade de impugnação dos mesmos atos junto Vícios de legalidade do ato administrativo: Usurpação de poderes
da própria Administração Pública, através das garantias administrativas Incompetência absoluta
previstas, designadamente, no CPA. Incompetência relativa
O CPA, os princípios gerais nele previstos e que dele decorrem e as Vício de forma
garantias graciosas nele enumeradas, e que agora se estudarão, não coar- Desvio de poder
tam a possibilidade de recurso dos particulares ao conjunto de garantias Violação de lei
jurisdicionais, que resultam do contencioso administrativo português, e da
concretização dos seus direitos através das diferentes garantias efetivadas
junto dos tribunais administrativos. ~ LEGAliDADE Tribunais
Nessa medida, as garantias administrativas graciosas não impedem nem
afastam a possibilidade de recurso aos tribunais administrativos, como Impugnação
resultava já do previsto no artigo 12Q do CPA agora revogado.
Administração Pública
Ou seja, o facto de não se autonomizar, procedimentalmente, o princípio MÉRITO~
do acesso à justiça não afasta a possibilidade de fiscalização jurisdicional
sobre as omissões administrativas e os atos praticados pela Administração
Pública, independentemente de se impugnarem graciosamente, porque I
em rigor aquele não é um princípio direto e imediato de atividade admi- Vícios de mérito do ato administrativo: Inconveniência
nistrativa. Inoportunidade
Importa, no entanto, referir que as garantias contenciosas, efetivadas
junto dos tribunais administrativos, são instrumentos de que os parti- Mas, para além deste tipo de garantias não contenciosas, existem outras,
culares podem dispor para fazer valer os seus direitos, designadamente, como sejam as garantias po/(ticas, que são aquelas em que os particulares
impugnando atos da Administração Pública, mas apenas com funda- não se dirigem a um órgão da Administração Pública mas, sim, a órgãos
mento na ilegalidade, já que os vícios de mérito são apenas suscetíveis que exercem ou participam do exercício de funções políticas, como sucede
de avaliação pela própria Administração Pública, atento o disposto no com o acesso ao direito de petição192 quando exercido junto de órgãos polí-
artigo 3 Q , n Q 1, do CPTA, o que decorre do princípio constitucional da ticos. O recurso ao Provedor de Justiça também pode ser considerado uma
separação de poderes. garantia política e constitucional, a par do próprio direito de resistência
A este conjunto de garantias exercidas e efetivadas junto da Administra- passiva, igualmente previsto na CRP.
ção Pública atribui-se a designação de garantiasgraciosas ou administrativas. Desta forma, podemos verificar, ainda que sucintamente, que existem
Vejamos um esquema sobre a sede de impugnação de atos administra- diferentes tipos de garantias utilizáveis e afetas aos particulares (admi-
tivos desconformes com a legalidade ou com o mérito. nistrados) para efetivação dos seus direitos e com vista a contrariar, com
fundamento diverso 193, os atos administrativos praticados pelos diversos
órgãos da Administração Pública.

A este propósito, cfr. o disposto no artigo 52º da CRP.


192

Nas garantias graciosas, podem ser invocados argumentos de mérito e/ou de ilegalidade
193

mas, ao invés, nas garantias contenciosas, apenas estes últimos são suscetíveis, como vimos,
de apreciação pelos tribunais.
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PALESTRA SOBRE GARANTIAS ADMINISTRATIVAS

No que diz respeito às garantias graciosas, elas podem ser de dois tipos: Importa referir e acentuar uma vez mais, que o exercício destas garantias
- Garantias petitórias; ou não exclui o direito de acesso aos tribunais e a possibilidade de ativação
- Garantias impugnatórias. das garantias contenciosas.
São várias as funções das garantias administrativas impugnatórias. Se é
As garantias petitórias, das quais aqui não nos ocuparemos, são aquelas certo que a sua utilização pode simplificar todo o processo impugnatório
em que, basicamente, o particular (administrado) formula um pedido, ou afastar até o controlo judicial, caso a própria Administração Pública
apresenta uma queixa ou uma representação, no sentido de procurar uma entenda revogar, anular ou declarar nulo o ato administrativo, não exis-
primeira disciplina jurídica para a matéria. Busca sobretudo, embora não tindo necessidade de recurso aos tribunais, as garantias impugnatÓrias
exclusivamente, um ato administrativo primário. permitem, também, o controlo da oportunidade e da conveniência (ou
Entre estas podemos encontrar o direito de petição, dirigido agora a seja, os chamados vícios de mérito insuscetíveis de aferição pelos tribu-
órgãos da Administração Pública, como faculdade de o particular solici- nais, isto é, excluídos dos poderes cognitivos da jurisdição conrenciosa).
tar que esta tome certas decisões quando ainda não agiu (não se visando, Assim, para além da legalidade, as garantias graciosas possibilitam o controlo
portanto, atacar uma decisão anterior). São, também, exemplos de garan- do mérito (invalidades de mérito )197, reforçando-se os meios de controlo
tias graciosas petitórias o direito de queixaI94, o direito de denúncia195 e a da atividade administrativa de forma mais ampla.
oposição administrativa196 • As garantias impugnatórias são, pois, as que visam impugnar ou colocar
A propósito, ainda, da vertente garantística do nosso sistema adminis- em causa uma decisão administrativa prévia já existente e, genericamente,
trativo, importa fazer referência à Resolução do Conselho de Ministros podem ser agrupadas em dois grandes tipos, de acordo com o consagrado
nº 189/96, de 28 de novembro, que veio estabelecer a obrigatoriedade de no artigo 184º, nº 2, do CPA:
adoção do livro de reclamações nos locais onde seja efetuado atendimento - A reclamação; e
de público. A Portaria nº 355/97, de 28 de maio, veio aprovar o modelo - Os recursos administrativos (ou graciosos).
do "Livro de Reclamações" que deve existir em todas as estruturas da
Administração Pública que estabeleçam relações com os particulares, As reclamações e os recursos administrativos são, nos termos do esti-
dela constando os termos em que deve processar-se o acesso ao mesmo. pulado no nº 3 do referido artigo 184º do Código, apresentados pelo
Vejamos de seguida as garantias administrativas impugnatórias. reclamante ou recorrente, através de requerimento instruído com todos
os elementos probatórios que se considere pertinentes, expondo de forma
6.2. As garantias administrativas impugnatórias: regime geral clara os fundamentos que se invoquem a seu favor.
As garantias impugnatórias são, também, manifestações específicas do Isto significa que os interessados (administrados) têm o direito de
direito de petição, em sentido amplo, previsto no já invocado artigo 522
da CRP, só que aqui existe o pressuposto de haver um ato administrativo - "(...) Impugnar os atas administrativosperante aAdministração Pública,
prévio que se visa colocar em crise. solicitando asua revogação, anulação, modificação ou substituição (...)", atento
o previsto na alínea a) do nº 1 do artigo 184º do CPA (correspondente
194 Que se traduz na faculdade de suscitar a abertura de um processo de inquérito ou disci- ao anterior artigo 158º, nº 1, do CPA revogado); e
plinar, podendo levar à condenação do trabalhador em funções públicas.
195 Ato pelo qual o particular leva ao conhecimento da Administração Pública factos que

geram a obrigatoriedade de esta abrir, pelo menos, um processo de sindicância ou de averi-


guações. 197 ~os termos do disposto no artigo 18S·, n· 3, do ePA C correspondente ao anterior artigo
196 Aqui, a Administração Pública chama os cidadãos, a fim de virem apresentar as suas ra-
~59- do ePA revogado), que expressamente refere que as garantias graciosas impugnatórias
zões face a certos projetos da própria Administração. C..·) podem ter porfundamento a ilegalidade ou inconveniência do ato praticado.~
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- "(...) Reagir contra aomissão ilegal de atos administrativos, em incumpri- violar o disposto no artigo 268º, nº 4, da CRP e, desta forma, condicionar
mento do dever de decisão solicitando a emissão do ato pretendido", de acordo o pleno direito de acesso à justiça administrativa, limitando, por conse-
com a alínea b) do nº 1 do mesmo artigo. quência, o direito constitucional à impugnação contenciosa; e
- Facultativa, quando não dependa da prévia utilização do meio impug-
A distinção entre estes dois tipos de garantias assenta, essencialmente, natório administrativo a possibilidade de acesso aos meios contenciosos de
na diferença dos seus destinatários. impugnação ou condenação à prática do ato devido (por exemplo, quando
Assim, a reclamação é a forma de impugnação do ato administrativo incide sobre um ato administrativo já definitivo).
perante o seu próprio autor, enquanto que o recurso gracioso é uma forma
de impugnação perante um órgão diferente daquele que praticou o ato. Ora, como vimos, deixaram de se consagrar, como requisito legal para
A diferença assenta, portanto, no posicionamento do órgão que vai apreciar a impugnabilidade contenciosa dos atos administrativos, as suas executorie-
a impugnação face ao ato colocado em crise. dade e de.finitividade, admitindo-se que a via contenciosa se possa abrir para
O disposto no artigo 184º do CPA, ao fixar genericamente as garantias impugnar atos que ainda não sejam definitivos ou executórios. Deste modo,
impugnatórias, abarca a totalidade das garantias administrativas impug- a figura do recurso hierárquico necessário parece que perdeu relevância
natórias previstas pelo Código (reclamação e recursos graciosos). jurídico-contenciosa, da mesma forma que a distinção, anteriormente,
Refira-se que, no âmbito específico dos recursos, se estipula assim, existente e que continua a estar prevista, como vimos, no CPA. As impug-
também, como regra geral, a recorribilidade graciosa dos atos praticados nações administrativas, mas sobretudo o recurso hierárquico necessário 2oo,
pelo delegado para o delegante 198 , independentemente da natureza da apenas tornarão (eventualmente) o ato administrativo verticalmente defi-
delegação de poderes. nitivo, sem que isso assuma importância decisiva para a suscetibilidade de
Quanto à natureza da reclamação e dos recursos, esta pode ser necessária impugnação jurisdicional imediata do ato administrativo lesivo.
ou facultativa, consoante dependa ou não da sua prévia utilização a possi- Importa, então, referir que a revisão constitucional de 1989 retirou ao
bilidade de acesso às garantias contenciosas, atento o disposto no artigo artigo 268º, nº 4, da CRP as exigências de definitividade e de executo-
18Sº, nº 1, do CPA (em parte, correspondente ao anterior artigo 167º do riedade do ato administrativo como requisitos e pressupostos essenciais
CPA revogado). Regra geral, ambas as garantias impugnatórias graciosas para a efetivação do direito de recurso ou de ação contenciosos contra atos
têm caráter facultativo, salvo se a lei as denominar como necessárias, atento administrativos ilegais.
o previsto no nº 2 do mesmo artigo. Com a reforma do contencioso administrativo, já é possível o recurso
Vejamos mais em pormenor a distinção da diferente natureza das figuras: contencioso de atos administrativos não definitivos, ao contrário do que
- Necessdria, quando dependa da prévia utilização do meio impugnatório se encontrava previsto no presentemente revogado artigo 2Sº, nº 1, da Lei
administrativo (reclamação ou recurso administrativo) a possibilidade de de Processo nos Tribunais Administrativos (LPTA), que referia:
acesso aos meios contenciosos de impugnação ou de condenação à prática
do ato devido 199 • Esta exigência pode ser considerada inconstitucional, por
200 Não podemos, no entanto, deixar de referir que se admite, deste modo, a impugnabili-

dade direta e imediata de atos praticados por subalternos, suscetíveis ainda de aferição valo-
rativa pelos legítimos superiores hierárquicos e de alteração, ao abrigo do poder hierárquico
198 V. g. os atos administrativos praticados pelas juntas de freguesia ao abrigo de delegação de da supervisão que integra a competência revogatóría. Continua, por isso, a fazer sentido a
poderes camarária, para a respetiva câmara municipal, enquanto órgão delegante. existência do recurso hierárquico, agora apenas na modalidade de recurso facultativo e que,
199 Anteriormente, esta natureza verificava-se sempre que o ato administrativo impugnado
em último momento, permite a avaliação, para além das questões de legalidade, das ques-
não fosse definitivo, sendo por isso necessário apresentar este recurso, porque seria o único tões de mérito. Isto significa que pode ter deixado de ser necessário para abertura da via
meio para obtenção da definitividade do ato; era, portanto, necessário como pressuposto pré- contenciosa mas, certamente, não perdeu a utilidade pelas razões substantivas atrás adu-
vio para abrir a via contenciosa. zidas.
CURSO SOBRE O .1'1'0\"0 CÓDIGO DO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO PALESTRA SOBRE GARANTIAS ADMINISTRATIVAS

"Só é admissível recurso dos atas definitivos eexecutórias." 201202 recorrer, nos termos do disposto no artigo 186º, nº 2, do CPA (correspon-
dente ao anterior artigo 53º, nº 4, do CPA revogado).
Assim, e ao invés, desde que o ato administrativo tenha eficácia externa No que diz respeito ao prazo para exercício das garantias administrativas,
e lese posições jurídicas subjetivas dos particulares, é o bastante para que que tenha como objetivo final contrariar a omissão ilegal de ato adminis-
se encontre aberta a via contenciosa, independentemente de o ato admi- trativo, é de um ano, de acordo com o previsto no artigo 187º do CPA, e
nistrativo ser ou não definitivo e executÓrio. conta-se, nos termos do estipulado, expressamente, no nº 3 do artigo 188º
Vejamos, a propÓsito, o que refere o disposto no artigo 51º, nº 1, do do CPA, "(...) da data do incumprimento do dever da decisão."
CPTA, que regula agora esta matéria: Recordemos que a reclamação e o recurso administrativo utilizados para
efeitos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 184º do CPA seguem os
"Ainda que inseridos num procedimento administrativo, são impugnáveis os prazos especialmente previstos a propósito, designadamente, da revogação
atas administrativos com eficácia externa, especialmente aqueles cujo conteúdo e da anulação administrativas. Por outro lado, regra geral, o ato adminis-
seja suscetível de lesar direitos ou interesses legalmente protegidos." trativo nulo pode ser impugnado a todo o tempo, apenas com as reservas
que resultam do seu regime geral.
Por fim, o pressuposto da legitimidade dos reclamantes ou dos recor- O artigo 188º do CPA trata do regime de início da contagem dos prazos
rentes, ou seja, a faculdade de interpor a respetiva garantia para impug- de impugnação. O nº 1 expressamente impõe que, se a notificação do ato
nar o ato administrativo, decorre do disposto no artigo 1862 , nº 1 do CPA administrativo for obrigatória, e ainda que o mesmo haja sido objeto de
(correspondente ao anterior artigo 160º do CPA revogado). Esta norma publicação também obrigatória, o prazo para apresentação de reclamação
consagra a regra geral, em matéria de legitimidade procedimental ativa, e ou para interposição do competente recurso administrativo só começa a
indica-nos as entidades que podem, efetivamente, interpor a reclamação correr a partir da data da notificação. Mas importa referir que, nos termos do
ou o recurso, o que significa que podem, legal e legitimamente, impugnar disposto no nº 2 do mesmo artigo, se a publicação do ato administrativo a
graciosamente o ato administrativo colocado em crise. impugnar não for legalmente obrigatória, então o prazo para a impugnação
Assim, nos termos do previsto no referido artigo 1862 , nº 1, do CPA, administrativa" (...) começa acorrer do seguintefacto queprimeiro se verifique: a)
poderão: Notificação; b) Publicação; c) Conhecimento do ato ou da sua execução."
"(...) reclamar ou recorrer (...) O artigo 189º do CPA consagra o regime jurídico dos efeitos das im-
a) Os titulares de direitos subjetivos ou interesses legalmente protegidos que pugnações dos atos administrativos. Aquelas que sejam necessárias têm
se considerem lesados pela prática ou omissão do ato administrativo; (e) efeitos suspensivos, nos termos do disposto no nº 1 (correspondente ao
b) Aspessoas eentidades mencionadas nos n."S 2 a 4 do artigo 68Q." anterior artigo 170º, nº 1, do ePA revogado), suspendendo-se a eficácia do
ato recorrido, deixando este de produzir provisoriamente efeitos. As que
De qualquer forma, importa referir que todo aquele que tiver aceitado, sejam facultativas não têm esse efeito (não suspendem a produção de efeitos
sem reserva de qualquer natureza, expressa ou tacitamente, um determi- jurídicos dos atos administrativos impugnados e o ato administrativo im-
nado ato administrativo depois de praticado, não poderá dele reclamar ou pugnado continua a produzir os seus efeitos até à decisão final, e somente
no caso de a impugnação proceder e ser favorável ao particular é que o
201 Esta disposição nom1ativa era considerada por parte da doutrina como tendo caducado,
ato deixará de produzir os seus efeitos), salvo se (i) a lei previr os efeitos
por inconstitucionalidade superveniente decorrente, sobretudo, da revisão constitucional suspensivos ou (ii) a estrutura ad quem 203 que apreciará, nos termos legais,
de 1989. No entanto, o Tribunal Constitucional não acompanhou esta posição. a impugnação (o autor do ato ou o órgão com competência para apreciar o
202 A propósito desta questão vide Maria Teresa de Melo Ribeiro, A eliminação do ato definitivo

e executório na Revisão Constitucional de 1989, Direito e Justiça, Revista da Faculdade de Direito


da Universidade Católica Portuguesa, Volume Vi, 1992, pág. 365 e segs. 203 Aquele a quem é dirigida a impugnação.
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recurso administrativo) a requerimento dos interessados ou de motupróprio, artigos 102º (correspondente ao anterior artigo 74º do ePA revogado)
"(...) considere que asua execução imediata causaprejuízos irreparáveis ou de difícil e 184º, nº 3, do CPA;
reparação ao destinatário easuspensão não causeprejuízo de maiorgravidadepara - Instrução (tramitação); e
ointeresse público", atento o estipulado no nº 2 do mesmo artigo. - Decisão final.
O nº 3 do referido artigo 189º do CPA prevê, ainda, a possibilidade de os
interessados requererem a suspensão da execução do ato, a todo o tempo, Importa, no entanto, referir que, no que diz respeito ao pressuposto
devendo a decisão ser tomada, impreterivelmente, no prazo de cinco dias. genérico da impugnabilidade, é importante reter que nem todos os atos
A suspensão graciosa da execução do ato administrativo exequendo surge, administrativos são suscetíveis de impugnação administrativa graciosa.
aqui, quase como uma medida cautelar e, por isso, O legislador impõe que Há, necessariamente, que fazer-se uma interpretação sistémica. Vejamos.
a suspensão deva ser decretada se se fundar em provas que revelem "(...) Genericamente, o ePA estabelece alguns limites aos poderes do ór-
uma probabilidade séria de veracidade dos fatos alegados pelos interessados", nos gão ad quem, que se prendem v.g. com a irrevogabilidade legal ou com a
termos do disposto no nº 4. Atento o consagrado no nº 5 do referido ar- proibição de revogação de atos administrativos constitutivos de direitos
tigo 189º do Código, os interessados, independentemente do previsto nos ou de interesses legalmente protegidos, nos termos do disposto no artigo
OS
n. 2 a 4, podem sempre requerer a suspensão jurisdicional de eficácia, nos
OS
167º, n. 1 e 2, do CPA (correspondentes ao anterior artigo 140º, nº 1, do
termos da legislação reguladora do contencioso administrativo. CPA revogado).
Finalmente, analisemos o disposto no artigo 190º do CPA, que determina A tempestividade da impugnação, que se prende com os prazos da
os efeitos dos prazos. Assim: reclamação e dos recursos, é muito relevante porque a inobservância dos
prazos implica a extemporaneidade dos eventuais pedidos de caducidade
- "A reclamação de atos ou omissões sujeitos a recurso administrativo necessário
do direito à impugnação graciosa dos atos administrativos. Desses prazos
suspende oprazo da respetivamente interposição" (do recurso gracioso), nos
trataremos a propósito de cada um dos meios de impugnação. Importa,
termos do disposto no nº 1;
porém, relembrar que a contagem dos prazos deve obedecer ao prescrito
- A reclamação de atas ou omissões sujeitos a recurso administrativo
no Código, na sua Parte Iil, Capítulo V- Dosprazos, que estabelece o con-
facultativo não suspende o prazo da respetiva interposição, nos termos
junto normativo que regula, de forma genérica, a contagem dos prazos no
do nº 2; e
âmbito do procedimento administrativo.
- As impugnações administrativas facultativas contra atas adminis-
Não esqueçamos, também, o que atrás ficou referido quanto ao regime
trativos suspendem o prazo de interposição de ações nos tribunais admi-
jurídico da nulidade dos atos administrativos. Esta forma de invalidade é
nistrativos, "(...) que SÓ retoma oseu curso com a notificação da decisão proferida
invocável e declarável a qualquer momento, por qualquer tribunal ou por
sobre aimpugnação administrativa ou com odecurso do respetivo prazo lega?', nos
qualquer órgão administrativo.
termos do nº 3; mas esta suspensão do prazo, de acordo com o disposto no
nº 4, "(...) não impede ointeressado de propor açõesnos tribunais administrativos
6.2.1. Da reclamação
na pendência da impugnação administrativa, bem como de requerer a adoção de
No que diz respeito à reclamaçã0 20 4, o princípio geral consta do disposto
providências cautelares", querendo.
no artigo 19Iº, nº 1, do ePA (correspondente ao anterior artigo 16Iº,
nº 1, do CPA revogado), que refere poder reclamar-se de qualquer ato
A tramitação das garantias impugnatórias pode esquematizar-se, sucin-
administrativo ou de qualquer omissão de ato, para o seu autor, desde que
tamente, da seguinte forma:
a lei o não impeça. Evidentemente, os atos administrativos que decidem
- Requerimento impugnatório inicial (de reclamação ou de recurso),
o qual deve ser formulado por escrito, nos termos do disposto nos
204 L'ide o disposto nos artigos 1910 e 192 0 do CPA.
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anteriores reclamações ou recursos administrativos são insuscetíveis de São vários os pressupostos procedimentais gerais de exercício das ga-
impugnação graciosa por reclamação, aliás, como refere o nº 2 do mesmo rantias impugnarórias. Atendamos por ora, aos principais pressupostos
artigo, a menos que o órgão ad quem não se tenha pronunciado sobre a que se aplicam à reclamação administrativa e que são os eguintes:
totalidade da questão a decidir, havendo, por isso, omissão de pronúncia.
Assim, a reclamação de ato que decida anterior impugnação apenas é - Impugnabilidade Cou objeto): no que diz respeito ao pressuposto da
admissível se a decisão for omissa quanto a algum dos aspetos impugnados impugnabilidade, é importante reter que nem todos os atos administrati-
e apenas nessa medida, de acordo com a parte final daquele normativo. vos são suscetíveis de impugnação administrativa graciosa. A regra geral,
A reclamação deve ser, regra geral e na ausência de outro qualquer prazo quanto à impugnabilidade dos atos administrativos no âmbito da recla-
legalmente estipulado, apresentada no prazo de IS dias, de acordo com mação, é a de que se pode reclamar de todos o atos administrativos, salvo
o consagrado no nº 3 do referido artigo 191º do CPA Ccorrespondente ao dos previsro no n!! 2 do artigo 191Q do CPA (corre pondeme ao anterior
anterior artigo 162º do CPA revogado). DI! 2 do artigo 161º do CPA revogado). Pode existir, ainda, reclamação de

Justifica-se este princípio geral, nas suas duas vertentes: por um lado, omissão de aro administrativo;
na vertente positiva ou permissiva2os , pois admite-se que o próprio autor - Natureza: quanto à reclamaçãO admini trativa, o CPA continua a pre-
possa aceitar a argumentação expendida pelos particulares e com isso al- ver que pode ser de duas espécies nos termos do disposto no seu artigo
terar, revogar ou anular os atos impugnados, e por outro lado, na vertente 185: necessária ou facultativa. Como já vimos regra geral e nos tennos do
negativa ou proibitiva206, porque impede um círculo vicioso que em nada disposto no artigo 1852 nº 2 do CPA, tem carácter facultativo;
beneficiaria o particular e o regular funcionamento da Administração - Oportunidade Cou tempestividade): regra geral, o prazo de interpo-
Pública. sição é de IS dias, e de 30 dias o prazo para a decisão; e
Nos termos do disposto no artigo 192º do CPA, os contrainteressados - Legitimidade: têm legitimidade para a reclamação os destinatários e
deverão ser notificados, pelo órgão com competência legal para a decisão os contrainteressados de atas administrativos ou aqueles que se sentem
final, da reclamação para, nos termos do disposto no nº 1 e no prazo (aí lesados pela omissão de atos administrativos.
estabelecido) de IS dias, virem ao procedimento alegar o que entende-
rem sobre o pedido e a causa de pedir. A figura dos contrainteressados 6.2.2. Dos recursos administrativos
abarca todos os que têm interesse na manutenção do ato administrativo Os recursos administrativos podem ser de diferentes tipos. Assim, o atual
ou nos seu efeitos jurídicos, ainda que apenas em parte deles, e que terão, CPA prevê a existência do recurso hierárquico e de recursos administrativos
necessariamente, de ser ouvidos antes da tomada da decisão final sobre a especiais, anteriormente designados como recurso hierárquico impróprio
reclamação interposta. e recurso tutelar.
O órgão ad quem dispõe do prazo de 30 dias para emitir decisão final, Comecemos por fazer referência ao recurso hierárquico.
atento o disposto no nº 2, e se a reclamação tiver natureza necessária
aplicar-se-á, igualmente, o disposto no nº 3, que permite ao reclamante, 6.2.2.1. Do recurso hierárquico
decorrendo o prazo de 30 dias sem que seja proferida decisão final, "C...) O recurso hierárquico pode ser utilizado quando existe hierarquia adminis-
utilizar o meio de tutela, administrativo ou contencioso, adequado para satisfaçãO trativa entre o autor do ato e o órgão ad quem 207, de acordo com o disposto
da sua pretensão." no artigo 193º, nº 1, do CPA. Visa, conforme resulta das duas alíneas do
referido normativo,

205 Prevista no nº 1 do referido artigo 19P do CPA.


200 Prevista no nO 2 do referido artigo 191º do CPA. 207 Como já vimos, o órgão ad quem é aquele a quem é dirigida a impugnação.
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i) "(...) Impugnar atas administrativos praticados por 6rgãos sujeitos aos (correspondente ao anterior artigo 168º, nº 1, do CPA revogado), o prazo
poderes hierárquicos de outros órgãos (...)", nos termos da alínea a); ou para a sua interposição, salvo se lei especial fixar prazo distinto deste e,
ii) "(...) Reagir contra a omissão ilegal de atos administrativos, por parte quanto ao recurso hierárquico facultativo, o prazo de interposição desta
de 6rgãos sujeitos aos poderes hierárquicos de outros 6rgãos (...)", nos termos garantia é igual ao prazo para interposição de recurso contencioso do ato
da alínea b). em causa, de acordo com o disposto na parte final do mesmo normativo,
que se há de encontrar na legislação relativa ao contencioso administrativo
Desta maneira, podemos constatar que a hierarquia administrativa assume (designadamente, no CPTA).
também uma vertente garantística dos direitos dos administrados e não Como se disse já, o requerimento impugnatório deve ser formulado
tem, somente, uma função meramente organizatória. Assim, a legalidade por escrito, nos termos do disposto nos artigos 102º (correspondente ao
e, sobretudo, a oportunidade e a conveniência das decisões dos diferentes anterior artigo 74º do CPA revogado) e 184º, nº 3, do CPA, e, no caso do
subalternos são suscetíveis de controlo ou de fiscalização pelos superiores recurso hierárquico, dirigido ao mais elevado superior hierárquico do
hierárquicos. Se assim não fosse, estaríamos perante uma equiparação do autor do ato administrativo ou da omissão, de acordo com o estipulado
subalterno a um órgão quase independente, perante o qual o superior no artigo 194º, nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo 169º,
não poderia controlar uma parcela da atividade daquele e, portanto, não nº 2, do Código revogado). Isto significa a consagração do recurso per
poderia ser responsabilizado pela sua execução. Como o Direito português saltum, ou seja, "saltam-se" graus da hierarquia administrativa, recorrendo-
desconhece, regra geral, casos de competência exclusiva do subalterno, o -se diretamente para a estrutura hierárquica de cúpula, para se obter mais
superior poderá sempre pronunciar-se, igualmente de forma geral, avaliando rapidamente uma decisão definitiva, salvo se a competência se encontrar
os atos praticados por aquele, exceto nos casos em que, expressamente, a delegada ou subdelegada. Nestes casos, o recurso há de ser apresentado
lei consagre uma competência exclusiva dos subalternos. junto do delegante.
Todos os atos administrativos praticados, ou a omissão deles quando O requerimento de interposição do recurso hierárquico pode ser apre-
devidos, pelo subalterno são sempre passíveis de recurso hierárquico, sentado junto do (i) autor do ato ou da omissão ou da (ii) autoridade ad
independentemente do tipo de competência do seu autor, a menos que quem a quem seja dirigido, atento o previsto no nº 2 do mesmo artigo mas,
a lei expressamente o impeça. Caso contrário, como vimos, seria admitir neste caso, (ii) o mesmo será remetido ao autor do ato no prazo de três dias.
a possibilidade de os subalternos poderem praticar atos insuscetíveis de No que se refere à tramitação ou instrução do procedimento do recurso
apreciação pelos superiores, invertendo-se desta forma as próprias estrutura hierárquico, importa notar que, recebido o requerimento impugnatório
e organização piramidal hierárquica da Administração Pública. inicial peio autor do ato ou pelo órgão adquem, deverá verificar-se se estão
Assim, o CPA deve ser interpretado em termos de admitir a possibilidade reunidas as condições legaiS para apreciar a impugnação, designadamente,
de recurso hierárquico dos atos administrativos praticados pelo subal- nos termos das disposições conjugadas previstas nos artigos 193º e 196 2
terno ao abrigo de competência exclusiva mas com amplitudes distintas, do CPA (este último correspondente ao anterior artigo 173º do ePA revo-
conforme a conciliação que se torna necessário fazer entre o disposto no gado), que dizem respeito, direta e imediatamente, ao recurso hierárquico,
artigo 193º, que se assume como regra geral, e o disposto no artigo 1972 após o que deve o autor do ato, e sempre este, proceder à notificação dos
(correspondente ao anterior artigo 174º do CPA revogado), e desde que contrainteressados. Deste modo, o artigo 196º do ePA deveria anteceder o
lei especial não obste a tal faculdade. artigo 195º, por aquela disposição normativa tratar de condições liminares
No que diz respeito à tempestividade do recurso hierárquico neces- que obstam ao prosseguimento efetivo do recurso...
sári02os , é de 30 dias, nos termos do disposto no artigo 193º, nº 2, do CPA Os contrainteressados são, designadamente, todos aqueles que têm
interesse, regra geral, na manutenção da decisão recorrida, ou seja, têm
108 efr. as referências anteriormente efetuadas à figura do recurso hierárquico necessário. conveniência em não ver o ato administrativo revogado, alterado ou anu-
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lado, vindo ao processo alegar, no prazo de IS dias, tudo o que tiverem por Importa assinalar que o órgão ad quem não fica vinculado, como não
conveniente sobre a impugnação e seus fundamentos, atento o disposto poderia ficar, à posição manifestada pelo autor do ato ou da omissão mas,
no artigo 195º, nº 1, do CPA (correspondente ao anterior artigo 171º do nesse caso, a decisão proferida há de ser fundamentada de acordo com o
CPA revogado). Por exemplo, no caso de procedimentos concursais, os regime estipulado no artigo 153':>, atento o previsto no n':> 2 do artigo 197':>
contrainteressados poderão ser todos aqueles que foram opositores ao do Código.
concurso, independentemente de terem ficado em lugar elegível para Nos termos do disposto no artigo 197º, nº 3, do CPA, o órgão compe-
ocupação does) posto(s) de trabalho colocado(s) a concurso. tente pode, quando existirem razões juridicamente atendíveis, proceder à
São diversos os poderes do órgão ad quem, no âmbito da tramitação
- Anulação total ou parcial do procedimento administrativo que con-
procedimental do recurso hierárquico. Assim, o superior hierárquico
duziu à emissão do ato administrativo;
pode sempre, em regra, confirmar ou anular o ato administrativo e, se a
competência do subalterno autor do ato não for exclusiva, revogar, modi-
podendo ainda
ficar ou substituir o ato impugnado, salvo nos casos em que a lei preveja o
contrário, ainda que em sentido desfavorável ao recorrente. Deste modo, - Determinar a tramitação de nova instrução; ou
o novo CPA parece admitir a reformatio in pejus. Neste caso, podem ser de - Solicitar outras diligências complementares, atento o disposto no
diferentes tipos as decisões finais do procedimento administrativo: artigo 197º, nº 3, do CPA.
- De rejeição liminar, quando a Administração Pública não conhece do
No caso expressamente previsto no nº 4, de incumprimento do dever
fundo da causa, atento o disposto no artigo 196º do CPA;
jurídico de decisão, o órgão ad quem pode:
e existindo ato administrativo impugnável, - Praticar o ato omisso, se a competência não for exclusiva do subal-
terno, substituindo-o, com base no poder dispositivo da competência do
- De negação de provimento, o que significa a manutenção do ato
superior hierárquico; ou
administrativo e, portanto a sua confirmação, atento o disposto no artigo
- Emanar ordem para a prática do referido ato ilegalmente omisso
197º, n':> 1, do CPA; e
pelo subalterno. Verifica-se aqui a opção do legislador em distinguir entre
- De concessão de provimento (ainda que parcial);
competência exclusiva e exercício de poder hierárquico de direção. Pode-
mos, no entanto, discutir se, materialmente, a possibilidade de emissão
o que pode implicar:
de ordens no âmbito da competência exclusiva do subalterno não pode
- A anulação do ato administrativo, por verificação de invalidades legais; contrariar a natureza exclusiva de competência atribuída. Importa referir,
ainda assim, que há uma distinção a fazer-se entre a natureza de uma ordem
ou, se a competência do autor do ato recorrido não for exclusiva, e mesmo para a prática de um ato administrativo e a de uma outra ordem em que se
em sentido desfavorável legalmente admitido, indique o teor do ato a praticar, sobretudo no exercício de competências
discricionárias. Ora, esta última situação não parece ser, aparentemente,
- A revogação do ato administrativo colocado em crise, fazendo cessar a vontade do legislador.
administrativamente os seus efeitos;
- A modificação do ato administrativo colocado em crise, alterando
Em síntese são vários os pressupostos procedimentais de exercício do
o teor do seu conteúdo e os seus efeitos, com fundamento em razões de
recurso hicrárquico. Atendamos, por ora, aos principais, que são os seguintes:
mérito; ou
- A substituição do ato administrativo colocado em crise, por outro, - Impugnabilidade (ou objeto): quanto ao recurso hierárquico, a regra
substituindo os seus efeitos. geral está consagrada no artigo 193º do CPA (correspondente ao anterior
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artigo 166º do Código revogado). Todos os atos administrativos praticados de poderes de supervisão que lhe permitem revogar, alterar ou anular
ao abrigo de uma competência sujeita a poderes de hierarquia administra- os atas administrativos praticados pelo outro órgão (anteriormente,
tiva são passíveis deste tipo de recurso, independentemente da natureza designado como recurso hierárquico impróprio), atento o consagrado
da competência do seu autor e desde que a lei não exclua tal possibilidade; na alínea a) do nº 1. No que diz respeito, portanto e em particular, ao
- Oportunidade (ou tempestividade); e anteriormente designado recurso hierárquico impróprio, o artigo 199º,
- Legitimidade dos interessados. nº 1, alínea a), do CPA (correspondente ao anterior artigo 176º do CPA
revogado) esclarece que, existindo poder de supervisã0 209 entre dois
Vejamos o seguinte diagrama: órgãos da mesma pessoa coletiva de Direito Público, sem que entre os
mesmos exista hierarquia administrativa21O, poder-se-á recorrer para a
Requerimento inicial estrutura orgânica que exerce aquele poder, impugnando-se, por esta
impugnatório
(artigo 194.2 do ePA) via, o ato administrativo;
ii) Para o órgão colegial, de atos ou omissões dos seus membros,
Notiflcaç.:lll aos comissões ou secções, de acordo com o teor da alínea b), do mesmo
cont rai nte ressados
número. Também de acordo com o disposto no corpo do nº 1 (corres-
(artigo 195.2, n. 2 1, do
ePA) pondente ao anterior nº 2 do artigo 176º do CPA revogado), depende
de lei expressa a admissibilidade deste tipo de recurso dos atos de
Intervenção do autor do
ato
diferentes estruturas de órgão colegial para o respetivo colégio de
(artigo 195. 2, n. 2 2, do membros ou plenário;
ePA)
iii) Se existe uma relação de tutela ou de superintendência revogató-
Diligências
rias ou anulatórias entre órgãos, necessariamente, de pessoas coletivas
complementares diferentes (antigo recurso tutelar), nos termos da alínea c) do nº 1 do
(artigo 197. 2, n. 2 3, do •
ePA) artigo 199º do Código (anterior artigo 177º do CPArevogado). Quanto
ao recurso tutelar, agora estudado, a alínea c) fundamenta a possibili-

... Decisão final (artigo


197.2 do ePA)
dade de admissibilidade da impugnação de atos praticados para órgãos
que exerçam poderes de superintendência ou de tutela. De referir, no
entanto, que este tipo de recurso é também sempre excecional, ou seja,
Os prazos para a decisão constam do disposto no artigo 198º do CPA. o CPA somente admite a figura do recurso tutelar quando lei particular
o consagrar expressamente; e
6.2.2.2. Dos recursos administrativos especiais iv) recurso delegatóri0 2ll , sempre que existe delegação ou subdele-
Os recursos administrativos especiais, nos termos do previsto no artigo gação de poderes (atento o teor conjugado das disposições previstas no
199º do Código, podem ser exercidos nas seguintes situações jurídico- nº 2 do artigo 199º, no nº 2 do artigo 49º e no nº 4 do artigo 169º do CPA).
-administrativas e desde que expressamente previstos na lei - o que sig-
nifica afirmar que, ao contrário do recurso hierárquico, são excecionais e, 209 Este poder administrativo traduz a faculdade de revogação, de anulação ou de substitui-
se não tiverem consagração legal, os interessados não podem utilizá-los: ção dos atos administrativos.
210 Caso em que se recorreria através do recurso hierárquico.

2ll Pode ser necessário autonomizar esta modalidade de recurso gracioso, que
i) Se entre dois órgãos não existe hierarquia administrativa, em-
abrange, designadamente, as situações de delegações de poderes íntersubjetivas,
bora integrem a mesma pessoa coletiva, e o órgão ad quem disponha ou seja, entre órgãos de pessoas coletivas de Direito Público diferentes. Pelo menos
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Importa referir que, no caso destes recursos administrativos especiais,


deve analisar-se, em concreto, o enquadramento legal da supervisão e a
sua amplitude, atentas as diferenças de autonomia dos diferentes órgãos
e das diferentes pessoas coletivas de Direito Público presentes na relação
jurídico-pública, já que implicam o confronto entre dois órgãos da mesma
ou de duas pessoas coletivas distintas, respetivamente, mas com amplos e
aprofundados graus de autonomia.
No âmbito dos recursos administrativos especiais, o recurso hierárquico
impróprio e o recurso tutelar, nos termos do disposto, respetivamente, nas
alíneas a) e c) do nº 1do artigo 199º do CPA (correspondentes aos anteriores
artigos 176º, n Q 3, e 177º, nº 5, do CPA revogado), têm um regime jurídico
normativo estabelecido por remissão para o do recurso hierárquico, de acor-
Anexos
do e com as adaptações previstas no disposto no artigo 199º, nº 5, do CPA.

6.3. Recomendação
O estudante deve ter um conhecimento aprofundado sobre o regime
jurídico das garantias administrativas, designadamente, das garantias
impugnatórias.

6.4. Exercício formativo


a) Diga que tipo de garantias dos administrados conhece;
b) Distinga reclamação de recurso;
c) Elenque as espécies de recursos administrativos previstos no CPA;
á) Distinga recurso hierárquico necessário de recurso hierárquico
facultativo e refira-se à atual relevância contenciosa daquele;
e) Refira-se à tramitação do recurso hierárquico; e
j) Indique em que situações podem ser utilizados os recursos admi-
nistrativos especiais.

nestas situações, a autonomia desta figura tem pleno cabimento, não se confun-
dindo com os recursos hierárquicos próprios e impróprios, embora possa ser, even-
tualmente, confundível com o recurso tutelar.

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