Você está na página 1de 11

Prova oral de melhoria – Direitos Reais

Ano 2016/2017, turma B

Tema: Acessão e benfeitorias


1. Benfeitorias
2. Acessão
2.1. Referência ao Direito Romano
2.2. Primeiro encontro com o regime da acessão
2.3. Classificações da acessão
2.4. Requisitos da figura
2.5. Momento da operação da aquisição
3. Acessão natural
4. Acessão industrial
4.1. A relevância da boa-fé na acessão
4.2. Acessão industrial mobiliária
4.3. Acessão industrial imobiliária
4.4. Que tipo de boa-fé é compreendida no art. 1340º/4?
4.5. Os beneficiários da acessão
4.6. Os direitos de terceiros perante a acessão

Professor regente: Luís Manuel Teles de Menezes Leitão

Professores assistentes: Rui Paulo Coutinho de Mascarenhas Ataíde


Vítor Palmela Fidalgo

Aluno: Luhofet Dmytro Petrovych, nº26742.


1. As benfeitorias

Legalmente são consideradas benfeitorias as despesas naturais ou materiais (e exclui


jurídicas e civis em PLIMA e AVARELA CC anotado) feitas para conservar ou melhorar
a coisa (art.º 216/1).
É de rápida compreensão a abstração da norma, o critério subjacente às benfeitorias é de
que haja uma incorporação numa coisa pré-existente, quer seja: uma benfeitoria
necessária em que deve evitar a perda, destruição ou deterioração, quer seja uma
benfeitoria útil a qual, sendo dispensável, aumenta-lhe o valor à coisa, por fim, as
benfeitorias voluptuárias que se consubstanciam no mero aumento do gozo da coisa, isto
é, são dispensáveis, sem tampouco lhe aumentarem valor à coisa.
Interessa-nos para a discussão procurar determinar o alcance do regime das benfeitorias
e estabelecer as destrinças entre este e o regime da acessão. Deste modo, para melhor
entendimento, a jurisprudência tem vindo a concretizar a noção de benfeitoria:
-Não são benfeitorias as despesas feitas com sementeiras, limpeza de matos e árvores,
adubação destas e retirada de ramada (estas despesas são reguladas pelas disposições
atinentes aos frutos art.º 212º a 215º).
-Um pequeno barraco de madeira para WC não é considerado uma benfeitoria útil (RPorto
3 de abril 1974 BMJ 238 (1974). Por outro lado, uma casa de banho com janela
incorporada já poderá ser considerada uma benfeitoria útil (apoiado por Acórdão STJ 26
de fevereiro de 1992 (Cura Mariano), BMJ 414 (1992)).
-Despesas de transporte e de deslocação não são benfeitorias porque não se incorporam
na coisa (Acórdão STJ 16 de maio de 1975 (Correia Guedes), BMJ n.º 247 (1975)).
-Benfeitorias têm como paradigma as regras do enriquecimento sem causa e assim o autor
terá que provar a medida do seu empobrecimento e, cumulativamente, a medida do
enriquecimento da outra parte. Assim decidiu o Tribunal de Relação do Porto em 11 de
maio de 1993 no processo n.º 083273.
- Quem quiser prevalecer-se deste regime deve destrinçar que tipo de benfeitorias realizou
e se as pode ou não remover, “…pormenorizando a obra que levou a cabo, especificando
a sua utilidade e finalidade imediata…” -> (STJ 3 abril 1984 (Joaquim Figueiredo), BMJ
336 (1984) e o segundo acórdão STJ 28 maio 1986 (Góis Pinheiro), BMJ 357 (1986)).

Em suma, retira-se que as benfeitorias são despesas naturais ou civis, que devem ficar
incorporadas na coisa e que devem consignar utilidade ou acréscimo patrimonial à coisa
benfeitorizada. Ainda, este regime deve ser aplicado somente nos casos previstos na lei,
posição apoiada pela maioria da doutrina. “Por sua vez, nas benfeitorias apenas é exercida
uma obra de manutenção ou desenvolvimento do valor económico da coisa, o que gera
apenas obrigações de restituição das despesas ou um ius tollendi (direito ao levantamento
da coisa), não criando um conflito de direitos (é conferido um direito de retenção sobre a
coisa, mas somente como garantia do crédito ao reembolso das benfeitorias).”
2. Acessão
2.1. Referência ao Direito Romano
No âmbito do Direito Romano vigoravam regras estruturantes ao regime da acessão,
nomeadamente, a regra da acessoriedade e o princípio absoluto superficies solo cedit. O
primeiro pressupunha uma relação ou vínculo necessário entre as coisas para operar a
acessão, vínculo esse que se traduz na acessoriedade. Este exigia que uma coisa fosse
acessória em relação à coisa principal (JOSÉ ALBERTO VIEIRA nega com a
possibilidade de licitação arts. 1333º/2, 1335º/3 e 1340º/2). Este entendimento gerou
controvérsia entre a escola dos Sabinianos e dos Proculeianos, pois os primeiros
consideravam que a coisa principal era a maior, enquanto os segundos atendiam à função
económica e social da res. Segundo os Proculeianos, a coisa que na união conserva a sua
qualidade, imprimindo-a ao todo, é principal. Esta última conceção veio a prevalecer no
Direito Justinianeu.
Quanto ao segundo, o princípio superficies solo cedit, como o solo era sempre mais
valioso que qualquer incorporação, determinava que todo implante no solo era
pertencente à coisa. Nos tempos atuais, o valor do solo, por norma, não passa dos 30%
do valor da edificação e por isso fala-se numa acessão invertida.

2.2. Primeiro encontro com o regime da acessão


No ordenamento jurídico português é consensual que a acessão trate duas coisas com
proprietários distintos, mais o facto de elas se unirem ou misturarem, resultando na
perda da propriedade de uma das partes que terá o direito de ser indemnizada. Ora,
conforme acrescenta o Prof. MENEZES CORDEIRO, a acessão é aplicável sempre que
a coisa incorporada não seja qualificável como benfeitoria e, ao mesmo tempo: a)
quando valha mais do que a outra coisa, b) quando modifique o destino económico do
conjunto, c) corresponda ao exercício do direito acedido (apoio no Ac. STJ de 17 março
de 1998, BMJ nº 475 (1998) relator Machado Soares*** + jurisprudência espanhola
SANZ FERNÁNDEZ). Enquanto que as benfeitorias eram aplicadas quando a lei o
expressamente disser – locação (art.º 1046º), comodado (art.º 1138º), posse (art.º 1274º
e ss.) e usufruto (art. 1450º). Para este autor, a exceção é o caso da mera posse que terá
que ser solucionado com ponderação em face do caso concreto.
Advoga também JÓSE ALBERTO VIEIRA que a acessão (art. 1325º) faz referência a
requisitos, um expresso e outro subentendido: - a união ou mistura de duas coisas; -a
inseparabilidade com caráter de permanência (em sentido normativo) que resulte de tal
união ou incorporação (irreversibilidade na jurisprudência espanhola). Caso não esteja
este requisito preenchido, cada proprietário pode pedir a divisão da coisa ou instaurar
ação de reivindicação e não opera a acessão. Pressupõe-se, portanto, que se trate de uma
ligação material duradoura.
Bem aponta JOSÉ ALBERTO VIEIRA, no sentido em que o regime do Código Civil
português não coincide com o regime do ordenamento jurídico alemão, mas sim, a par
dos Códigos Civis italiano e francês, ao prever a acessão como um dos quatro modos de
aquisição de propriedade – CCivil Italiano “Dei modi di acquisito della proprietà”: a
acessão, a união, a mistura e a especificação + francês predominância do superficies solo
cedit. (alemão união de móveis ou imóveis, mistura, especificação). Sustenta-se que a
acessão é uma forma aquisitiva de direito, uma aquisição originária (OLIVEIRA
ASCENSÃO), mas tal não deve preterir todo e qualquer direito existente, pelo que os
direitos reais constituídos sobre a coisa antes do registo da acessão devem ser mantidos,
nomeadamente, os direitos reais menores de gozo (CARVALHO FERNANDES) porque
o registo tem natureza meramente consolidativa art. 2º/1,a) CRPredial – “nesta base,
sustentamos que tem de ser considerada a tutela de direitos de terceiros sobre o terreno
com registo anterior ao da acessão”.

2.3. Classificações de acessão


Se a união ou mistura de coisas resulta de um facto da natureza, nomeadamente, do vento
ou da água, a acessão diz-se natura e, se, diversamente, ela surge de uma ação humana, a
acessão é industrial.
Relativamente à natureza das coisas, quando ambas as coisas forem móveis será acessão
mobiliária, enquanto que basta apenas uma coisa imóvel para que a acessão seja
considerada imobiliária. Ainda podemos atender à distinção de classificação entre
acessão intencional e causal (art.º 1335º). Outras modalidades de acessão discutidas na
doutrina (GUIDO ALPA) poderão ser tidas em conta, fala-se da acessão vertical e lateral
consoante se adquira a propriedade das obras construídas sobre o solo ou se proceda à
delimitação de imóveis por factos naturais (subtipos de acessão natural). Por acessão
invertida pretende-se significar a hipótese em que o direito à acessão é atribuído ao
construtor de obra ou implante em detrimento do proprietário do solo (e do princípio
superfícies solo cedit) por vingar hodiernamente, regra geral, o princípio accesorium
sequitur principale.

2.4. Requisitos da figura


Uma vez que a lei não clarifica quanto a este ponto, e em conformidade com a teoria
dominante da jurisprudência até hoje, os professores Drs. PIRES DE LIMA E ANTUNES
VARELA afirmam que na acessão “verifica-se um fenómeno vindo do exterior, alguém
que não tem contacto jurídico com a coisa. Deste modo, a acessão requer sempre a
inexistência de um título jurídico que origine e discipline a situação criada. Serão
consideradas benfeitorias os melhoramentos feitos à coisa por qualquer detentor de um
direito real menor de gozo sobre a coisa – proprietário, enfiteuta, possuidor, locatário,
comodatário e usufrutuário. Por outro lado, não pode subsistir qualquer vinculo jurídico
do incorporador com a coisa beneficiada para ocorrer a acessão, nem que seja por terceiro
mero detentor ocasional.”.
Com similitudes mas um traço distinto, JOSÉ ALBERTO VIEIRA sustenta que ao abrigo
da autonomia privada, as partes podem celebrar um negócio que afaste a solução legal da
acessão, ao mesmo passo que assim poderá acontecer por força da lei, sendo o exemplo
recorrido o do direito de superfície art.º 1524º e ss. no qual o proprietário do solo não tem
poder para reclamar a acessão sobre os implantes feitos pelo titular do direito de superfície
enquanto este direito durar uma vez que a lei atribui diretamente a aquisição automática
da propriedade dessa mesma obra ou plantação a favor do proprietário do solo – art.º
1538º/1.
Nesta sequência de ideias, JOSÉ ALBERTO VIEIRA defende a subsidiariedade da
acessão perante as benfeitorias, no sentido em que haveria lugar ao regime da acessão
sempre que algum regime específico não se aplicasse. A sua posição com os profs. PIRES
DE LIMA E ANTUNES VARELA apenas diverge no facto de o primeiro não restringir
a posse às benfeitorias (art.º 1273º a 1275º), porque desse modo esvaziaria a utilidade da
acessão ao cingi-la apenas a terceiros que não fossem possuidores. E ainda afirma que
seria muito difícil fazer operar a acessão sem se ser possuidor.
Em posição diversa, MENEZES CORDEIRO considera as benfeitorias como regime
subsidiário, sendo antes a acessão a regra geral. Penso que a solução prática é a mesma
que JOSÉ ALBERTO VIEIRA sustenta.
Por fim, LUÍS MENEZES LEITÃO vem referir que o regime das benfeitorias será
aplicável independentemente de a lei para ele remeter, deve ceder sempre que esteja em
causa uma situação de acessão, podendo esta assim ocorrer nos casos em que exista uma
relação prévia com a coisa, a menos que esta exclua a aplicação do seu regime por
imperativo legal – como acontece no contrato de empreitada art.º 1212º ou no direito de
superfície conforme o exposto no art.º 1524º.

2.5. Momento da operação da aquisição


A favor da operação automática da aquisição do direito, conforme dispõe o art. 1317º/d),
é no momento “da verificação dos factos respetivos”, encontram-se: PIRES DE LIMA E
ANTUNES VARELA, LUÍS MENEZES LEITÃO, JOSÉ ALBERTO VIEIRA apenas
relativamente à acessão natural (e com exceção da avulsão) e, ainda, CARVALHO
FERNANDES advoga que na acessão natural esta opera automaticamente bem como na
acessão industrial, mas na qual é atribuída apenas uma faculdade de aquisição. (tema que
abordaremos posteriormente)
Em defesa da acessão como uma “faculdade” ou direito potestativo especialmente na
acessão industrial imobiliária, autores assinalaram que: a união ou mistura apenas
preenche um pressuposto de facto para a atribuição do direito de acessão a um dos
titulares dos direitos reais unidos ou misturados, sem determinar necessariamente uma
aquisição só por si. Estes autores são, primordialmente, OLIVEIRA ASCENSÃO na sua
obra “Estudos do Direito de Superfície e Acessão”, JOSÉ ALBERTO VIERIA e
MENEZES CORDEIRO numa fase posterior. É sustentando por CARVALHO
FERNANDES que este direito potestativo é condicionado pelo respetivo pagamento da
indemnização, considerando-se sem cabimento a transferência de tal propriedade sem que
antes haja lugar ao devido pagamento. Os argumentos a favor desta teoria são muito
fortes, como aponta OLIVEIRA ASCENSÃO, os preceitos legais ao firmar que o titular
“adquire pagando” (arts. 1339º + 1340º) ou pode adquirir pagando (art. 1343º) admite
esta solução, retroagindo os efeitos ao momento da verificação dos factos. Fala também
de que se possa estar a exigir uma indemnização a quem não quer adquirir o direito de
propriedade, ou ainda que naquele momento não consegue satisfazer o pagamento da
indemnização. Desta forma o risco seria transmitido para o beneficiário da acessão
mesmo que este não tivesse conhecimento da união das coisas e afastaria a possibilidade
de as partes estabelecerem um negócio que fixasse solução diversa. E, na verdade, o
Direito português faz depender a aquisição de um direito patrimonial do consentimento
daquele em cuja esfera jurídica ocorre (doação contrato deve ser aceite art. 940º; a
sucessão igual art. 2050º/1). – JOSÉ ALBERTO VIEIRA
Tem, esta última teoria, apoio em jurisprudência: Ac. STJ de 17 de NOV de 2006, doc.
NºSJ200610170042706; Ac. STJ de 6 JULHO 2006, proc. 02ª4704; Ac. STJ de 16
NOV 2004.
Por fim, advoga JOSÉ ALBERTO VIEIRA que a acessão natural é um facto jurídico,
enquanto que na acessão industrial já se trata de um direito em coerência com o caráter
potestativo da mesma.

3. Acessão natural
A acessão natural em certas hipóteses nem comporta uma modalidade de acessão, porque
nem se verifica uma forma de aquisição de direitos reais. Segundo OLIVEIRA
ASCENSÃO “Quando a acessão natural resulta da contínua incorporação num imóvel de
elementos estranhos por força de agentes como a água ou o vento, sem que se
individualize o que foi depositado, falta imediatamente base mínima que demarcámos na
acessão – a união de coisas.”. (O.A. referia-se à aluvião neste caso)
Em termos muito sintéticos, o Aluvião (art. 1328º) comporta os casos de união de coisas
causada pelo movimento sucessivo e impercetível das águas e ao terreno ou coisa que
insensivelmente se for deslocando (forma mediata). OLIVEIRA ASCENSÃO: “como
corolário prático, teremos que aqui a aquisição, porque se reduz a uma transformação do
objeto, é automática; por outro lado, quando existir uma adjunção de uma coisa, a
aquisição é potestativa”.
A acessão por Avulsão (art. 1329º) trata já de situações em que a ação da natureza seja
violenta, esta não atua imediatamente, constitui antes um ónus do proprietário remover a
coisa para poder recupera-la, caso contrário perderá o seu direito findo 6 meses, momento
em que o dono do terreno adquire automaticamente a propriedade da coisa avulsa. Neste
sentido, por se constatar uma mera justaposição de coisas em vez da sua integração ou
união inseparável de coisas, e, deste modo, a resposta será sempre de que não há acessão
em avulsão.
Quanto à mudança de leito (art. 1330º), CARAVALHO FERNANDES afirma que se dá
acessão quanto às águas e não à propriedade, em concordância com o disposto do art.
1387º/1, b), uma vez que as águas navegáveis ou flutuáveis são pertencentes ao Estado.
A formação de ilhas, mouchões (art. 1331º), lagos e lagoas (art.1332º) pode-se dar por
meio de aluvião art. 1331º/1 ou por meio de avulsão art. 1331º/2.
4. Acessão industrial
4.1. A relevância da boa-fé na acessão
Chegados à acessão industrial, é indispensável atender à boa-fé ou má-fé do beneficiário
da acessão e, caso sejam pessoas distintas, a do autor da união ou mistura dado que o
regime legal tende a beneficiar exclusivamente quem esteja de boa-fé ao beneficia-lo
imediatamente da acessão ou atribuir-lhe o direito potestativo de a fazer operar. Nos casos
de má fé, é usual o autor da união ou mistura ter de restituir a coisa, coloca-la no seu
estado inicial e pagar uma indemnização, esta com especial importância nos casos em que
não é possível fazer a divisão da coisa unida ou misturada. (excepto art. 1334º/2 em que
o autor pode ser indemnizado pela união se este estiver de má-fé e a outra parte preferir
ficar com as coisas adjuntas.)

4.2. Acessão industrial mobiliária


MENEZES LEITÃO refere que a acessão industrial mobiliária comporta 3 vias: união,
quando se verifica a junção de dois ou mais objetos num novo, sem ser possível a sua
separação sem a perda do valor incrementado; confusão quando se dá uma reunião de
objetos, os quais perdem por isso a sua individualidade; e a especificação que consiste no
facto de alguém modificar com o seu trabalho alguma coisa que pertence a outrem.
Tal como é facilmente percetível, os arts. 1333º a 1338º inclusive, tratam do regime da
acessão nas situações em que o objeto é constituído por coisas móveis. Contudo, este
regime tem as suas particularidades, a começar desde logo pelo art. 1333º/2, 3 e 4 em que
primeiro, refuta-se a necessidade da acessoriedade, princípio defendido no direito romano
(JOSÉ ALBERTO VIEIRA) e no número 4 defende-se que o autor da união ou mistura
não tem propriamente um direito.
Outro caso será a confusão ou mistura casual, a qual JOSÉ ALBERTO VIEIRA comenta
o seguinte: apesar de não ter intenção o autor de tal união ou mistura, ainda nos
encontramos no âmbito da acessão industrial. Afirma ser aplicável o art.º 1333º/4 em
relação à indemnização do dono coisa que não causou a união ou mistura por analogia.
Ainda advoga que são subsumíveis no art.º 1335º os casos de o autor da união ou mistura
causal ser um terceiro e, portanto, não ser proprietário de nenhuma das coisas. Se não
adotar esta posição, considera ser analogicamente aplicável o art.º 1342º com as devidas
adaptações a coisas móveis e que o resultado será o mesmo (este caso é um dos quais a
lei não exige apurar a boa fé ou má fé do autor pois não é este o beneficiário da acessão).
Em último, a problemática da especificação reside no facto de não se tratar de uma
verdadeira acessão porque não existe uma união ou mistura de coisas, mas antes de uma
coisa e de trabalho (a escrita, a pintura, o desenho, a fotografia, etc – art. 1338º). Ou seja,
aplica-se trabalho próprio a matéria pertencente a outrem. Muito resumidamente, quando
a especificação for de boa-fé, quem ficar com a coisa transformada, indemniza o outro
art. 1336º/1 e 2. Já na especificação de má-fé depreende-se que o dono da coisa fica
automaticamente com (1/3) um terço do valor da coisa, e apenas recai o dever de
indemnizar sobre este quando a especificação aumentar em mais de um terço o valor da
coisa art. 1337º. Para OLIVEIRA ASCENSÃO “Há antes uma nova causa de aquisição
de direitos reais, que apenas oferece analogia com a acessão no que respeita ao critério
da atribuição da coisa.”

4.3. Acessão industrial imobiliária


Como bem repara JOSÉ ALBERTO VIEIRA, a acessão industrial imobiliária é possível
de ser repartida em 4 tipos: 1) obras, sementeiras e plantações feitas em solo próprio com
materiais alheios (art. 1339º); 2) obras, sementeiras ou plantações com matérias próprios
em terreno alheio, distinguindo-se se de boa-fé ou de má-fé (art. 1340º e 1341º); 3) as
obras feitas com materiais alheios e em terreno alheio (art. 1342º); 4) o prolongamento
de edifício por terreno alheio (art. 1343º). – consctrucción extramilitada na
jurisprudência espanhola LÓPEZ VILAZ, o solo cede perante a coisa implantada.
CARVALHO FERNANDES denota que a obra, sementeira ou plantação feita em terreno
próprio com materiais alheios se assemelha à compra e venda, porém, trata-se de uma
espécie de compra e venda forçada pois não é atendida a vontade do titular dos materiais,
consequentemente, é natural a reparação dos danos causados por parte do autor da obra.
Estando o autor da obra, sementeira ou plantação de boa fé, as consequências da sua
feitura em terreno alheio são, em primeira mão, ditadas pela relação entre o seu valor e o
do terreno. O maior valor de um dos bens em causa determina, para o respetivo titular, a
aquisição do outro. Se o autor da obra adquirir a propriedade, indemniza o dono, se for
este último a adquirir a propriedade das obras deve indemnizar a outra parte no valor delas
antes da sua implementação (regras do enriquecimento sem causa). Havendo má fé, ao
dono do terreno são atribuídas duas soluções (i) adquirir a propriedade da obra e pagar o
valor ao incorporador na medida do seu enriquecimento sem causa, (ii) exigir a restituição
da restituição do status quo ante (art.º 1341º) do terreno que se consubstancia da
restituição ao seu estado anterior à custa do autor da obra e pode (iii) não ser beneficiário
da acessão e pertencer o direito ao dono dos materiais (art. 1342º).
A terceira opção é a do autor da obra, sementeira ou plantação não ser dono, nem do
terreno, nem dos bens por ele usados. Caso o dono dos materiais não tenha culpa, serão
atribuídos ao mesmo os direitos que caberiam ao autor da obra, sementeira ou plantação
caso este esteja de boa fé ex vi art.º 1340º. Na hipótese de o dono dos materiais estar
também de má fé é aplicado o disposto para a incorporação de má-fé em terreno alheio
do art.º 1341º, o que significa que se houver indemnização será o dono dos materiais
responsável solidariamente com o autor da obra, sementeira ou plantação.
A construção de edifícios, quando invade terreno alheio, ocupando-o parcialmente, pela
sua frequência deve ser tida em conta e não se poderá olvidar de averiguar a boa fé ou má
fé do construtor sendo apenas operável a primeira. Havendo boa fé e decorridos 3 meses
desde o início da ocupação sem que tenha havido oposição do proprietário do terreno
ocupado, o construtor tem o direito de adquirir esse terreno, pagando o seu valor e
prejuízo que causar. No dano a indemnizar será atendida a desvalorização que resultar da
perda de valor verificada em relação ao terreno restante, por efeito específico da
diminuição da sua área art.º 1343º/1. Ainda sobre este artigo, Rui Pinto Duarte,
Carvalho Fernandes e Abílio Neto (no CC anotado) entendem que deve ser adquirida
toda a propriedade e não apenas um fragmento da mesma, considerando que tal “prejudica
os proprietários e favorece a fragmentação dos prédios – contra aquilo que parece ser a
orientação da nossa ordem jurídica, no seu todo”. Por outro lado, J. Alberto González e
a jurisprudência têm entendido que não haverá problema da expropriação de “apenas a
parcela de terreno ocupada”, salvo daí “resultar violação de normas de interesse e ordem
pública, como sejam, por exemplo, as normas sobre loteamentos urbanos”.
No Código Civil espanhol não é consagrada tal figura, contudo, alguma doutrina e
jurisprudência requer necessariamente a boa-fé do construtor e tem vindo a aplicar
analogicamente o art. 361º e 363 do derecho civil.

4.3.1. Que tipo de boa-fé é compreendida no art. 1340º/4


Cabe introduzir muito brevemente a discussão sobre a boa-fé necessária para operar a
acessão, pois “A implantação de uma construção em terreno alheio deliberadamente, sem
qualquer prévia autorização dos donos deste constitui mera usurpação e não é susceptível
de integrar os requisitos da acessão industrial imobiliária”. – ABÍLIO NETO E
HERLANDER MARTINS em CC anotado.
Assim, coerentemente, JOSÉ ALBERTO VIEIRA a par de MENEZES CORDEIRO
sustentam a boa-fé subjetiva ética (o dever de indagar se não serão matérias e solo alheio)
em contraposição com CARVALHO FERNANDES que advoga a boa-fé subjetiva
psicológica (conhecimento efetivo). Parece-nos unicamente defensável a posição de uma
boa-fé subjetiva ética no art. 1340º/4 por razões de tráfico jurídico e as pessoas não podem
ficar à mercê da inércia e da ignorância dos outros no conhecimento dos seus direitos.
Deve haver, portanto, um desconhecimento desculpável o qual opera na acessão industrial
mobiliária e na imobiliária.

4.3.2. Os beneficiários da acessão


Perante a referência legal de o beneficiário da acessão ser sempre proprietário, o que
acontece se a coisa estiver onerada com um direito real menor?
MEZENES CORDEIRO, OLIVEIRA ASCENSÃO e JOSÉ ALBERTO VIEIRA têm
vindo a afirmar que o titular de um direito real de gozo beneficia da acessão quando a
união ou mistura se dá no âmbito do conteúdo do direito real de gozo. “Se dentro deste
conteúdo se encontra a atividade que originou a união ou mistura, deve o titular do direito
real menor beneficiar da acessão, do mesmo modo que poderia fazer ele próprio a união
ou mistura em causa no exercício do seu direito.” (JAV).
É do entendimento de OLIVEIRA ASCENSÃO e MENEZES CORDEIRO que, na
acessão, o titular de um direito real menor beneficia do direito de acessão, mas somente
no âmbito e extensão do seu direito (adquire o seu direito e não a propriedade arts. 691º
+ 1449º). -> princípio da elasticidade dos direitos reais
Para o autor JOSÉ ALBERTO VIEIRA o direito adquirido por acessão é sempre o direito
de propriedade, mesmo que seja um terceiro o autor da união ou mistura. O titular de um
direito real de gozo sobre a coisa unida ou misturada adquire a propriedade da coisa e
contraria, deste modo, o disposto dos arts. 691º e 1449º com suporte no art. 1538º/1.
Através deste preceito retira que o titular do direito real de gozo é proprietário do implante
até ao final do decurso do prazo e, nestes moldes afirma que a própria lei admite a
aquisição da propriedade pelo titular do direito real menor, para além disso, havendo lugar
a uma indemnização por preterição de um proprietário, não faz sentido não receber o
direito que se está a indemnizar e, ainda por cima, ver esse direito de propriedade ser
adquirido pelo proprietário uma vez que o titular do direito real menor não o pode ser,
estar-se-ia onerar injustificadamente este último.
A posição que sigo é em grande parte concordante com o sr. Prof. JAV, contudo, penso
que será correto atribuir o direito de propriedade ao titular de um direito real de gozo em
caso de acessão quando for esse mesmo titular o autor do implante pelas razões acima
referidas. Serão excluídos desta solução os casos em que um terceiro seja o autor do
implante na coisa onerada por um direito real de gozo, adquirindo somente o seu direito
em correspondência com as disposições dos arts. 691º e 1449º.

4.3.3. Os direitos de terceiros perante a acessão


Dado que a acessão é uma forma aquisitiva de um direito originário, coloca-se a questão
de saber se, em casos de acessão industrial imobiliária, se o registo da acessão produz
efeitos enunciativos a par da usucapião art. 5º/2 CRPredial.
Dá-nos a resposta PIRES DE LIMA E ANTUNES VARELA: “ao contrário do que
sucede na usucapião (art. 5º/2 CRPredial), o registo da acessão não é meramente
enunciativo, mas antes consolidativo, pelo que, no caso de esta estar sujeita a registo,
serão tutelados os direitos adquiridos por terceiro e registados antes da acessão.”. De
acordo com esta linha de pensamento está também OLIVEIRA ASCENSÃO E
CARVALHO FERNANDES.
Conclui-se que o registo é consolidativo art. 2º/1 CRPredial e poderá, deste modo, haver
lugar à aquisição tabular caso terceiro de boa-fé registe um direito de propriedade legítimo
antes do registo da acessão art. 5º/1.

Jurisprudência
Supremo Tribunal de Justiça, Acórdão de 17 março de 1998, BMJ nº 475 (1998)
relator Machado Soares
No recurso para o STJ, a autora juntou um parecer às alegações de improcedência do
recurso interposto pela contraparte. Este parecer é subscrito pelo Prof. Antunes Varela.
Enquanto que o parecer apresentado pela ré tem a assinatura do Prof. Oliveira Ascensão.
Para “nós”, a mera inexistência de vínculo jurídico ou relação jurídica anterior entre o
autor das obras e o prédio onde são realizadas não é suficiente para a caracterização
jurídica da acessão, deve confirmar-se uma coisa nova ou alteração substancial da coisa
bem como uma incorporação material inseparável sem provocar danos ou destruir o
incremento patrimonial verificado.
Tribunal da Relação de Lisboa, Acórdão de 24 janeiro de 2002 (Salvador da Costa)
Referente ao art.º 1340º, o valor fixado da propriedade apenas é possível com a decisão
de mérito sobre a causa e, deste modo, a aferição do valor das obras ou transformações e
o valor do solo para se poder apurar se existe ou não aumento de valor à coisa
anteriormente existente. Nesta sequência de ideias, por analogia ao art.º 830/5 CC, deve
aplicar-se no disposto do art.º 1340 a obrigação de depósito da quantia fixada como
indemnização ao proprietário preterido deve ter estipulado um prazo para este
depósito/pagamento, sob pena de caducar o seu direito caso ultrapasse esse prazo, após o
trânsito em julgado da sentença.

Direito comparado/ Derecho Civil


A acessão no ordenamento jurídico espanhol, nomeadamente no seu código civil, está
regulada e distribuída em secções, com a seguinte ordem: a acessão respeitante ao produto
dos bens arts. 354 a 357; a acessão relativa a bens imóveis arts. 358 a 374; e por fim, a
acessão quanto a bens móveis arts. 375 a 383.
À semelhança do ordenamento português, existem artigos que apesar de estarem inseridos
no regime ou seção da acessão, nada têm haver com a acessão propriamente dita. São
exemplo disso os casos de acessão relativa a frutos naturais que opera de dentro para fora
uma vez que os frutos são a prolongação da coisa que as genera, ou seja, já através do art.
334º/2 são classificadas como partes integrantes da coisa e, por isso, são igualmente
coisas imóveis enquanto estiverem materialmente ligadas à coisa principal (“puesto que
los frutos forman parte del inmueble mientras de él no se separan” + “porque no pueden
constituirse derechos autónomos o separados sobre las partes integrantes” S. 30-4-1904 e
S. 7-10-1999-> acórdãos de jurisprudência). Acrescem os casos de avulsão (art. 368-369),
de formação de ilhas e mouchões (art. 371, 373 e 374), de mistura (art. 381 e 382) e, para
muitos, da especificação (art. 382). --- Ao contrário, o ordenamento jurídico
FRANCÊS art. 546º CCivil francês recorre à acessão para justificar a aquisição de
frutos de uma coisa. Os pressupostos compreendidos para haver acessão são a união
inseparável de duas coisas, uma acessória e uma principal, que têm proprietários distintos
entre os quais não existe qualquer relação ou vínculo jurídico. União tal que determina
ou pode determinar a atribuição da propriedade do todo (coisa unida ou produto da união)
ao proprietário da coisa principal. Deste modo, a acessão propriamente dita sobre o
princípio acessorium sequitur principale (a coisa acessória segue o regime jurídico da
principal) ao se verificar a absorção da coisa acessória pela coisa principal. Tendo por
base o princípio absoluto das fontes romanas princípio superficies solo cedit aplicado a
coisas imóveis, este também é preterido em grande parte no ordenamento espanhol, uma
vez que, hodiernamente, o valor do solo nas cidades raramente ultrapassa 30% do valor
total da coisa imóvel. A chamada acessão invertida é precisamente a situação inversa ao
princípio do superficies solo cedit pois aqui o solo cede ao edificado.
Na Avulsão o regime é idêntico com o português com a particularidade de se atribuir
apenas um mês de prazo para reclamar a propriedade que foi segregada. -art. 368 e 369.
Os direitos de um terceiro sobre a coisa principal recairão, também sobre a coisa
secundária que tenha sido abrangida por aquela, por outro lado, parece plausível que os
direito de terceiros sobre as coisas secundárias são extintos quando se verifica a acessão.

Você também pode gostar