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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO ACADÊMICO DE RECIFE

MARIA BEATRIZ MARQUES DA SILVA

DIREITO E ESPORTES ELETRÔNICOS: a insuficiência jurídica no âmbito


digital e impactos nas atividades dele advindas

RECIFE

2022
2

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO ACADÊMICO DE RECIFE

CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

DIREITO

MARIA BEATRIZ MARQUES DA SILVA

DIREITO E ESPORTES ELETRÔNICOS: a insuficiência jurídica no âmbito


digital e impactos nas atividades dele advindas

TCC apresentado ao Curso de Direito da


Universidade Federal de Pernambuco, Centro
Acadêmico de Recife, como requisito para a
obtenção do título de bacharel em Direito.

Orientador(a): Sérgio Torres Teixeira

RECIFE

2022
3

MARIA BEATRIZ MARQUES DA SILVA

DIREITO E ESPORTES ELETRÔNICOS: a insuficiência jurídica no âmbito


digital e impactos nas atividades dele advindas

TCC apresentado ao Curso de Direito da


Universidade Federal de Pernambuco,
Centro Acadêmico de Vitória, como
requisito para a obtenção do título de
bacharel em Direito.

Aprovado em: ___/___/______.

BANCA EXAMINADORA

________________________________________
Profº. Dr. Sergio Torres Teixeira (Orientador)
Universidade Federal de Pernambuco

_________________________________________
Profº. Dr. Xxxxxxxxx Xxxxxxx (Examinador Interno)
Universidade Federal de Pernambuco

_________________________________________
Profº. Dr. Xxxxxxxxx Xxxxxxx (Examinador Externo)
Universidade Estadual de Campinas
4

Aos meus pais, padrinhos, à minha avó Lia,

amigos, familiares, e,

especialmente, ao meu tio Xando.


5

AGRADECIMENTOS

Gostaria de agradecer e dedicar, com maior especificidade, essa dissertação,


em seu inteiro teor, às seguintes pessoas, pelos seguintes motivos:

À minha mãe, que desde 1998 torce pelo meu sucesso e apoia minhas
escolhas. Por entender cada dia de estresse e eventuais perdas de controle, por
entender cada noite virada e apenas oferecer preocupação. Mãe, obrigada por
retornar para nós em 2021, para poder compartilhar comigo, de perto, mais esse
momento.

Ao meu pai, por cada noite indo me buscar nos arredores da Faculdade de
Direito do Recife, por ouvir cada opinião jurídica de uma graduanda “revoltada”,
mesmo sem entende-las, muitas vezes. Pelo suporte emocional, pela confiança, e,
principalmente, pelo orgulho escancarado que, muitas vezes, me motivou e deu forças
para seguir. Pai, sem o seu companheirismo, não teria chegado à metade do caminho,
quem dirá à linha de chegada.

Aos meus padrinhos, que, desde que me recordo, me proporcionam o suporte


que me fora necessário, desde minha formação em Curso de Inglês, até o computador
em que redijo o presente trabalho. Na vida, muito se fala sobre oportunidades e portas
que se abrem, e só posso dizer que, todas as vezes que vi uma porta aberta, vocês
estavam atrás segurando-as. Marcos Netto e Beatriz Cabral, a vocês, toda minha
gratidão.

À minha avó Lia, que tanto me ensina sobre bondade, amor, carinho e respeito.
Cada abraço da senhora restaurou a energia que a rotina cotidiana me sugou. Que
sorte a minha de a vida ter me colocado no seu caminho. Eu escolheria a senhora
para o cargo de avó quantas vezes fosse necessário.

À minha família, que sempre serviu de rede de apoio, mesmo de um jeito que
destoa do considerado normal. Mas, principalmente, ao meu tio Xando, que sempre
teve muito orgulho de me chamar de sobrinha, que era meu maior entusiasta, e que
nunca dispensou uma conversa séria e minhas opiniões. Por você, redijo esse
Trabalho de Conclusão de Curso, a você, dedico meu diploma, que você o celebre
onde quer que você esteja.

Às minhas amigas, as do mundo jurídico e aquelas que não o integram. Vocês,


mais do que ninguém, aguentaram meus surtos e momentos de desespero. Vocês,
mais do que ninguém, me lembraram da minha capacidade e se disponibilizaram.
Claras, Júlia, Marluce, Maria Eduarda, Patsy, vocês dividem comigo tudo que eu
conquisto, e sou sortuda por isso.

Por fim, aos meus orientadores, que aceitaram embarcar comigo nesse desafio,
em um tema tão pouco apreciado nos berços tradicionais do Direito, que partiu de
6

uma mera paixão por video games e questionamentos acerca do Direito do Trabalho.
Espero ter alcançado todas as expectativas criadas acerca do presente trabalho.
7

RESUMO

Os video games, a modalidade esportiva derivada, as influências nas relações


jurídico-trabalhistas e insuficiência da produção legislativa nesse teor são os objetos
do presente estudo. Objetiva-se desenvolver uma análise crítica da realidade fática
vivenciada pelos cyber-atletas, perpassando pelas suas respectivas atribuições, seu
enquadramento jurídico, os dispositivos legais que os protegem e, por fim, buscar
soluções para as lacunas existentes. Para tal, foram utilizados um acervo de análise
legislativa, análise contratual. A construção do presente estudo evidencia a seguinte
realidade: o direito não acompanha as evoluções digitais, fazendo-se necessária a
reforma legislativa em que pese as mais diversas ramificações do Direito Digital.

Palavras-chave: esporte eletrônico; cyber-atleta; enquadramento jurídico; direto do


trabalho; direito digital.
8

ABSTRACT

Video games and the sport which derived from it, its influence on the legal-labor
relations, as well as the insufficient legal production when it comes to said topics are
the subjects to the following study. The aim is to develop a critical analysis of the factual
reality to which the cyber-athletes are submitted, going through their respective
responsibilities, their regulatory framework, legal regulations that protect them and,
finally, find solutions to the existing gaps. For this purpose, it was used a collection of
legal analysis, contractual analysis. The construction of the following study led to the
ensuing reality: law does not keep up with the digital evolutions, for which is necessary
a law reform, which contemplates the most diverse digital law ramifications.

Keywords: electronic sports; cyber-athlete; regulatory framework; labor law; digital


law.
9

LISTA DE ABREVIAÇÕES

ABCDE Associação Brasileira de Clubes de E-Sports

CBLOL Campeonato Brasileiro de League of Legends

CF CrossFire

CPL Cyber Athlete Professional League

CS Counter Strike

CS:GO Counter Strike: Global Offensive

DotA Defense of the Ancients

FPS First Person Shooter

KeSPA Korean eSports Association ou Associação Coreana de eSports

LoL League of Legends

MMORPG Massively Multiplayer Online Roleplaying Game

PNG PaiN Gaming

RPG Roleplaying Game

PLS Projeto de Lei do Senado


10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

1 A modernização das modalidades esportivas ................................................... 13

1.1 Conceito do esporte ...................................................................................... 13

1.2 Conceito de jogo eletrônico e sua evolução ................................................... 15

1.3 Atletas e cyber atleta..................................................................................... 20

2. O ESPORTE ELETRÔNICO NO ÂMBITO JURÍDICO.......................................... 23

2.1 Regulamentação jurídica brasileira: Projeto de Lei do Senado 383/2017 e


Projeto de lei 3.450/2015 ......................................................................................... 23

2.2 Uso análogo da lei Pelé: inadequação e lacuna jurídica existentes ............. 26

3. DA REALIDADE TRABALHISTA DOS CYBER-ATLETAS ................................. 30

3.1 Dos elementos constitutivos do vínculo empregatício: do princípio da


realidade sobre a forma .......................................................................................... 30

3.2 O caso Nappon e o caso Santos ...................................................................... 36

4. CONCLUSÃO ....................................................................................................... 38

5. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 41

ANEXO I – CONTRATO DE CONCESSÃO DE IMAGEM ........................................ 45

ANEXO II – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS .................................... 50


11

INTRODUÇÃO

Importante entender, inicialmente, que, sendo o Direito uma ciência feita pelo
povo e para o povo, há a indiscutível necessidade de acompanhamento das
mudanças sociais, econômicas e políticas vivenciadas pelo mundo moderno, vez que
o não acompanhamento da realidade pelo Direito, geraria um efeito rebote por parte
de referida ciência1.

Nesse diapasão, traz-se à baila as transformações que o advento da World


Wide Web acarretou, a destacar, no presente trabalho, a nova dinâmica das relações
sociais, o impacto do mundo digital nisso e como os frutos digitais se interligam com
o mundo jurídico-trabalhista.

A percepção antiga do que se enquadraria enquanto esporte não mais pode


ser encarada como absoluta. Isso é, esporte, atualmente, não se limita à atividade
intrinsecamente relacionada a esforço físico, e, muitas vezes, manuseio de bolas. A
bem da verdade, a noção atual de esporte segue à risca aquilo que fora definido pela
Constituição Federal de 1988, quando erigiu a prática enquanto direito fundamental,
vez que resta mantido o caráter de integração social, união dos povos, pacificação, e
transmissão de valores éticos e morais.

Em assim sendo, o enfoque da discussão gira em torno da modernização das


modalidades esportivas, a perceber os chamados e-sports, que, por definição
consolidada pela Confederação Brasileira de E-sports, são “competições profissionais
de games que ocorrem em uma plataforma digital, envolvendo dois ou mais
competidores (sejam indivíduos ou equipes), em partidas online ou presenciais
sincrônicas e montadas de forma a permitir o acompanhamento de uma audiência.”2,
bem como a dificuldade jurídica de acompanhar os negócios advindos desse novo
gerador de relações.

O presente estudo será dividido em três capítulos, de maneira a construir, de


modo coerente, a discussão acerca da necessidade de produção jurídica compatível

1
George Ripert: “Quando o direito ignora a realidade, a realidade se vinga ignorando o direito”
2
Disponível em: < http://cbesports.com.br/esports/esports-o-que-sao/>. Acessado em 07 de dezembro
de 2021.
12

com a realidade vivida pelos cyber-atletas, mormente patente insuficiência protetiva


quando do uso análogo da lei Pelé.

Para tanto, o primeiro capítulo irá se debruçar acerca dos conceitos básicos
necessários para o pleno entendimento da problemática apresentada, quais sejam o
conceito de esporte e a visão jurídica, o conceito de atleta, a diferença existente entre
atleta e cyber-atleta, o que são os jogos eletrônicos e suas modalidades mais
conhecidas e jogadas a nível mundial.
De modo contínuo àquilo que fora abordado no primeiro capítulo, discute-se,
então, o enquadramento jurídico dos esportes eletrônicos, pontuando-se as principais
problemáticas acerca da inexistência de legislação específica, bem como as
perniciosidades acarretadas pelas lacunas jurídicas existentes ante indiscutível
insuficiência jurídica.
Por fim, vez que restem estabelecidos os preceitos basilares, o último capítulo
passa à análise da modalidade contratual dos cyber-atletas, explorando as eventuais
ilicitudes contratuais, bem como o uso de práticas que visam mascarar os elementos
constitutivos de vínculo empregatício, e a aplicação em caso de repercussão
conhecida.
Ante o exposto, fica clara a natureza educativa do presente estudo, embora não
se atenha meramente a expor as problemáticas já preambuladas, mas também propor
soluções coerentes e compatíveis com os dados coletados acerca da rotina vivida e
obrigações mantidas por parte dos cyber-atletas.
13

1 A modernização das modalidades esportivas

1.1 Conceito do esporte

Quando se pensa em esportes, muito se remete às modalidades esportivas às


quais fomos expostos desde muito jovens. No caso do Brasil, tem-se o futebol, nos
Estados Unidos, futebol americano e basquete, no Canadá, hockey. A diversidade de
memórias relativas àquilo que se entende por esporte demonstra, em seu cerne, que
não pensamos em conceito, mas sim ramificações.

Antes da conceituação, passa-se a explicar porque a noção amplamente


difundida não preenche de maneira satisfatória o entendimento de esporte.

O contato quase que precoce com as modalidades esportivas torna nebuloso o


entendimento do seu conceito – isso, aliado ao fato de não se haver finalidade prática,
ou cotidiana, para entendimento do conceito de esporte. Na realidade, muito se sabe
sobre a “necessidade” da prática esportiva, uma vez que esta traz inúmeros benefícios
à saúde, além de ser forte aliada do processo de socialização.

Assim, incorpora-se o esporte à rotina, desde as aulas de Educação Física, até


os momentos de lazer com amigos, trazendo um sentimento de naturalidade e
organicidade, fazendo com que a sua natureza3 pouco seja relevante.

A bem da verdade, quase que de maneira induzida, o entendimento partilhado


pela população mundial é de que esportes nada mais são do que atividades físicas
aliadas ao jogo. Contudo, jamais poderia haver a limitação de esporte ao mero
desgaste físico.

Desse modo, pontua-se o seguinte: conceituar não pode ser enquadrada


enquanto tarefa simples. O debate acerca do que viria a ser o conceito de esporte é
extenso, impedindo a limitação a apenas uma linha teórica.

Existem diversas vertentes teóricas para que se alcance um conceito ao que


teremos como esporte, com enfoque em duas: a publicista e a privatista4. As doutrinas

3
TEIXEIRA, Cláudio Barbosa. O Desporto na História e na Sociedade. In: Direitos Humanos e Ética
no Desporto. Coimbra: Coimbra Editora, S.A. 1ª ed., Junho 2015. ISBN 978-989-20-5813-9. p. 13.
4
FURTADO JÚNIOR, Elberto - Definir o Esporte. In: Curso de Direito Desportivo Sistêmico. vol II. São
Paulo: Quartier Latin, 2010. p.271.
14

convergem nos elementos referentes à questão da definição de atividade física, ao


desempenho, competitividade e regramento, contudo, a doutrina privatista é dotada
de maior flexibilidade no tocante aos autores que classificam determinadas atividades
como esporte, ou mesmo autores que não veem os elementos a serem citados como
fatores da definição de Esporte.

No presente estudo faremos a conceituação através dos elementos


característicos do esporte. Os requisitos, então, consistem no seguinte: a) atividade
física; b) caráter interpessoal; c) regras previamente existentes; d) ocorrência de
competição; e) objetivo final competitivo e não meramente artístico.5. Não se pode
discutir esporte sem que todos os elementos previamente citados coexistam. Se
tivermos atividade que contenha os elementos “a”, “b”, “c” e “d”, mas não contenha o
elemento “e”, não se fala, dessa maneira, em esporte.

Abre-se aqui o primeiro parêntese em relação à discussão de conceito do


esporte, vez que os jogos eletrônicos, objetivo principal do presente estudo,
encontram o primeiro obstáculo para o seu enquadramento enquanto modalidade
esportiva. Isto é, embora seja dotado de caráter interpessoal, regras previamente
existentes, ocorrência de competição e objetivo final competitivo e não meramente
artístico, o jogo eletrônico não envolve o elemento “a”, atividade física.

Por esse motivo, passa-se à apreciação do entendimento contrario sensu do


que viria a ser atividade física. A atividade física comumente compreendida pela
sociedade nada mais é do que o exercício físico. Jamais poderia se limitar o
entendimento a apenas essa ramificação. Vejamos assim: a atividade física seria uma
flor, enquanto o exercício físico constituiria apenas uma de suas pétalas.

Nesse sentido, explica a profissional de Educação Física do Hospital


Universitário de Brasília, Lidiane Gomes6:

Atividade física é qualquer movimento corporal produzido pela contração


muscular que resulte num gasto energético acima do nível de repouso. Já o
exercício trata-se de movimentos corporais planejados, organizados e

5
CASTRO, Luiz Roberto Martins. Conceito e Evolução Sociológica do Esporte. In: Enciclopédia de
Gestão, Marketing e Direito Desportivo. Porto Alegre: INEJE, 2017. ISBN 978-85-66277-03-6. p. 17.
6
Disponível em: <https://www.gov.br/ebserh/pt-br/comunicacao/noticias/atividade-fisica-e-diferente-de-
exercicio-fisico-explica-especialista>. Acesso em: 30 abr. 2022.
15

repetidos com o objetivo de manter ou melhorar uma ou mais componentes


da aptidão física.

Assim, restando bem definidos os conceitos de atividade e esforço físico,


ressalta-se o seguinte: atividade física, por si só, não atrai a noção de exaustão
àqueles que a praticam, ao contrário de esforço físico. A perceber pela inclusão de
modalidades esportivas como arco e flecha e tiro ao alvo no maior evento
multiesportivo, as Olimpíadas. Questiona-se: com a modernização dos aparatos
utilizados nas respectivas modalidades, qual seria a diferenciação prática desses
esportes para um e-sport?

Por fim, superadas as ponderações acerca do “fator impeditivo” ao


enquadramento de e-sports enquanto modalidade esportiva, é necessário que se
abandone qualquer tipo de presunção engessada do que viria a ser o conceito, vez
que a discussão é extensa, sendo quase que impossível a limitação do conceito de
esporte a um só. Muito mais valioso é entender o motivo pelo qual a conceituação se
faz pertinente ao presente estudo.

A insuficiência jurídica a ser discutida em linhas futuras muito se deriva da


inconsistência conceitual do que se tem por esporte. Ora, jamais se poderia legislar
acerca do que não se conhece. É necessário entender o objeto da produção jurídica,
sobretudo para que se tenha uma legislação adequada a se aplicar, respeitando o
princípio da autonomia da lei esportiva e sua especificidade, a lex sportiva.

A exemplo, somente fora possível legislar acerca da necessidade de


fomentação e incentivo de práticas esportivas, bem como a obrigação estatal em fazê-
lo7, uma vez que entendido o papel social do esporte.

1.2 Conceito de jogo eletrônico e sua evolução

É seguro afirmar que o esporte deriva do jogo. Seguindo o caminho da analogia


já previamente utilizada nesse estudo, enquadraremos o jogo enquanto uma árvore,
na qual o esporte é uma das flores e a atividade física é uma pétala. Está tudo em
uma cadeia quase que hierárquica. Desse modo, conseguimos facilmente visualizar a

7
BRASIL. Constituição (1988). Capítulo III – DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO,
Art. 217. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso
em 30 abr. 2022.
16

existência do jogo sem o esporte (é possível que a árvore exista sem a flor), contudo,
jamais se poderia presumir a existência do esporte sem o jogo (a flor precisa da árvore
como seu suporte).

Antes de definir jogo eletrônico, é pertinente que se entenda, antes de tudo, o


que viria a ser o jogo, por si só. Um apanhado temporal da visão de jogo revela quase
que uma metamorfose social.

De início, tem-se quase que uma vinculação do jogo à matemática, mormente


seu caráter metódico, regrado, e intimamente relacionado à natureza humana que se
revela pela “engenhosidade” do homem.

A “queda” dos jogos se dá com a força da Igreja Católica, que apresentou


diversos empecilhos, manchando a visão do que se entendia por jogo com uma
associação quase que inevitável às discussões relativas ao vício. A proibição das
práticas, com exceção dos jogos em festas religiosas, se apresenta enquanto fator
impedidor da disseminação das práticas.

Contudo, jamais se poderia vincular a imagem do jogo com o mal do vício. A


natureza do jogo não é sólida, se adequando à realidade que está inserida. A bem da
verdade, definir jogos não é tarefa simples, como já bem adiantado por Kishimoto 8:

Tentar definir o jogo não é tarefa fácil. Quando se pronuncia a palavra jogo
cada um pode entendê-la de modo diferente. Pode-se estar falando de jogos
políticos, de adultos, crianças, animais ou amarelinha, xadrez... Por exemplo,
no faz-de-conta, há forte presença da situação imaginária; no jogo de xadrez,
regras padronizadas permitem a movimentação das peças.

A primeira conceituação de jogo foi feita por Huizinga 9:

...uma atividade ou ocupação voluntária, exercida dentro de certos e


determinados limites de tempo e espaço, segundo regras livremente
consentidas, mas absolutamente obrigatórias, dotado de um fim em si
mesmo, acompanhado de um sentimento de tensão e alegria e de uma
consciência de ser diferente da vida cotidiana.

8
KISHIMOTO, T. M. Jogo, brinquedo, brincadeira e a educação. São Paulo: Cortez, 1997. p. 13.
9
HUIZINGA, Johan. Homo ludens: o jogo como elemento da cultura. 5edição. São Paulo: Perspectiva,
2007. p. 33.
17

Com o passar dos anos, o jogo perdeu seu viés predominantemente lúdico,
dando espaço a uma noção de jogo com o caráter muito mais competitivo, acabando
por reduzir, também, seu conceito sociocultural10. Isso, atrelado aos avanços da
ciência, advento da computação e modernização de todas as áreas de vivência
afetaram, de maneira inevitável, o âmbito dos jogos, a notar pelos video games.

A trajetória dos video games muito se conecta com a trajetória do avanço da


tecnologia. Vejamos: em 1940, na New York World Fair, foi demonstrado ao mundo a
primeira interação lúdica, por assim dizer, entre o homem e a máquina. Aqueles que
frequentaram o evento, totalizando 50 mil pessoas, jogaram o “jogo da matemática”
contra o computador, que resultou em um aproveitamento de 90% da máquina em
cima dos humanos.

Embora receba o título de primeiro game criado por alguns, o “Tennis for Two”,
desenvolvido pelo físico William Higinbotham, em 1958, projetado para rodar em
computadores analógicos11, foi antecedido pelo “OXO”, do professor britânico A.S.
Douglas para sua tese de doutorado, mais conhecido como jogo da velha. Com uma
tecnologia muito mais avançada, o segundo game a ser lançado, no ano de 1961, foi
o conhecido Space War, desenvolvido por Stephen Russell, Peter Samson, Dan
Edwards, Martin Graetz, Alan Kotok, Steve Piner e Robert A. Saunders, todos
estudantes do MIT12, sendo ele o primeiro a ser considerado jogo interativo de
computadores, a ser jogado em várias instalações de computador.

O primeiro video game em console foi inventado em 1967, chamando de Brown


Box, trazendo até seis jogos diferentes, tendo sido aceito entre 1972 e 1975, pela
empresa Magnavox, subsidiária da Philips, com o nome de Magnavox Odyssey,
ficando conhecido pelo fenômeno de conectar-se à televisão, muito embora suas
limitações, para os dias atuais, fossem expressivas, uma vez que não havia a
reprodução de sons e não era compatível com todos os tamanhos de televisão.

10
TUBINO, Manoel José Gomes. Dimensões Sociais do Esporte. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
ISBN 978-85-249-1689-2. p. 31.
11
“O computador analógico é uma forma de computador que usa fenômenos elétricos, mecânicos ou
hidráulicos para modelar o problema a ser resolvido. Genericamente um computador analógico usa um
tipo de grandeza física para representar o comportamento de outro sistema físico ou função
matemática.” Disponível em <https://pt.wikipedia.org/wiki/Computador_anal%C3%B3gico>. Acesso em
8 mai 2022.
12
Massachussetts Institute of Technology.
18

Os jogos de arcade, pouco depois, se tornaram sensação. O investimento


pesado por parte da SEGA nesse tipo de jogo trouxe a Atari, a primeira empresa de
jogos eletrônicos do mundo, responsável pelas sensações mundiais Space Invaders,
Pong, Donkey Kong e Pac-Man.

Nos anos de 1980, posteriormente à criação dos computadores pessoais, e o


primeiro microprocessador da Intel, houve o lançamento do Nintendo no Japão, mais
tarde apresentado ao mercado como o Nintendo Entertainment System, popularmente
chamado de NES.

Notadamente, houve a criação de mais modalidades de games ao longo dos


anos 1980, destacando-se, tão somente, o fenômeno dos consoles, em sua quinta
geração, nos anos 1990, como, por exemplo: Nintendo 64 (1996), Sony Playstation
(1994) e o Sega Saturn (1994).

Atualmente, contudo, também há a popularização evidente dos “computer


games”. O avanço da Microsoft, nos anos 1990, com o lançamento do Windows ’95
desencadeou uma série de avanços que possibilita, atualmente, a discussão quase
que em tom de brincadeira do que viria a ser melhor, console ou PC 13.

Ferreira e Costa14, relativamente ao que seria o eSport, afirmam o seguinte:


O e-Sport é a atividade física e intelectual, de forma organizada e competitiva,
que segue normas internas e externas, que objetiva a integração de relações
sociais, e tem como característica principal o ambiente virtual como
plataforma da prática desportiva.

Assim, a noção do que se tem por jogo, preconizada por Huizinga, não muito
se afasta do espetáculo que envolve os games atualmente, mas tão somente reforça
a ideia inicial, consoante explica Gastaldo e Helal15:

Huizinga não viveu o suficiente para ver a indústria contemporânea dos jogos
eletrônicos, dos videogames e aplicativos lúdicos para smartphones, tablets
e PCs. Mas não se teria surpreendido em ver que, quanto mais esforço
fazemos para expurgar o “espírito do jogo” de nossas atividades “sérias”,
mais ele nos cerca e povoa o mundo com “diversões” e “espetáculos”,
oferecidos por uma indústria que faz da produção de lazer o seu trabalho. [...]
Entretanto, [...] acreditamos que o princípio lúdico da Humanidade está mais

13
Personal Computer.
14
FERREIRA, Vanessa Rocha; COSTA, Pietro Lazaro. Os contratos de trabalho dos esportistas
eletrônicos no Brasil e a necessidade de sua regulamentação. Meritum, Belo Horizonte, v.14, n.1,
Jan/Jun. 2019. p. 256-279.
15
GASTALDO, É; HELAL, R. Homo Ludens e o futebol-espetáculo. Revista Colombiana de
Sociologia, jun. 2013, v.36 nº 1, p.111-122.
19

profundamente impregnado na vida das pessoas do que o mercado de


consumo consegue alcançar.

No presente estudo, embora não entremos no mérito do debate acerca de qual


vem a ser melhor, iremos focar nos computer games e suas respectivas
espetacularizações e campeonatos.

Há diversas modalidades de jogos eletrônicos, com diferentes objetivos. Pela


característica de competitividade, a divisão dos tipos de jogos se dará nas seguintes
categorias16:

a) Two player competitive: modelo popularmente conhecido como “um contra o


outro”, enquadrando alguns games como FIFA e PES;
b) Multiplayer competitive: todos contra todos, não há bilateralidade, ou jogo em
equipe. Alguns exemplos são os jogos de battle royale, como H1Z1 e algumas
modalidades do Fortnite;
c) Multiplayer cooperative: todos os jogadores trabalham em equipe para atingir
um objetivo comum, como acontece no Left 4 Dead, Diablo, Don’t Starve
Together;
d) Team-based: em linhas simples, é quando há o embate de uma equipe contra
a outra, como ocorre no CS:GO, LoL, DotA, World of Warcraft, etc;
e) Single player: um único jogador contra a situação criada, como na maioria dos
jogos de arcade;
f) Hybrid competition mode: jogos em que há uma mescla entre cooperação e
competição, como Final Fantasy, Runescape e, até mesmo, alguns jogos já
previamente citado, como o World of Warcraft.

Os jogos online possuem diversos gêneros, sendo os mais populares


atualmente os MOBA, FPS e RPG.

Os jogos MOBA são um subgênero do RTS, que permite o manuseio de um


único personagem por parte do jogador, proporcionando a criação de times que
entram em combate um ao outro. Os FPS, como já demonstrado pelo nome, são jogos
de tiro em primeira pessoa, focado no combate com armas de fogo. Os RPG já
existiam anteriormente à sua modalidade online, como o jogo Dungeons and Dragons,

16
ADAMS, E. Fundamentals of game design. 2. ed. Berkeley: New Riders, 2010. (Ebook) E-ISBN
978-0-321-64337-7.
20

são jogos de interpretação de papeis, e costumam oferecer uma aventura fantástica.


Os principais jogos do gênero MOBA são League of Legends e DotA; do FPS, Counter
Strike: Global Offensive, Call of Duty e Battlefield; do RPG, The Witcher, Diablo.

1.3 Atletas e cyber atleta

Art. 69. A profissão de atleta é reconhecida e regulada por esta Lei, sem
prejuízo das disposições não colidentes contidas na legislação vigente, no
respectivo contrato de trabalho ou em acordos ou convenções coletivas.
Parágrafo único. Considera-se como atleta profissional o praticante de
esporte de alto nível que se dedique à atividade esportiva de forma
remunerada e permanente e que tenha nesta atividade sua principal fonte de
renda por meio do trabalho, independentemente da forma como receba sua
remuneração.17

Atrelado ao conceito de esporte, traz-se a ideia de atleta. Como progressão do


jogo ao esporte, a ideia de profissionalismo é inserida. O artigo acima referido, que
integra o corpo da PLS 68/2017, muito faz referência à atividade física. Contudo,
sabendo que já desvinculamos o conceito de esporte da necessidade de atividade
física no primeiro tópico do presente estudo, passa-se a apreciar, agora, qual a efetiva
definição de atleta, sem que seja considerada a ideia de profissionalismo ou
amadorismo.

Considera-se a diferenciação entre atleta e desportista para tal, nos termos de


Affonso Miguel18:

Contudo, particularmente entendemos haver distinção entre estas figuras,


tendo o atleta uma conceituação mais profissional que o desportista. Para
nós, desportista é o indivíduo que pratica exercícios físicos com conotação
de divertimento saúde e lazer.

Já atleta, que vem do grego athletes, e está relacionado aos lutadores que
combatiam em jogos oficiais, portanto com o ânimo de competição. Assim,
exemplificativamente, aquele que pratica corrida, inscreve-se em maratonas
e outras corridas de rua, mas nada recebe por isso, ao contrário, paga a sua
inscrição e todos os seus gastos, é apenas um desportista, ainda que tenha
rendimento similar ao de atletas. Logo, a diferenciação do atleta do
desportista é didática do ponto de vista da prática do esporte de diversas
formas e incentivos por cada uma delas recebido.

17
Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-
getter/documento?dm=5070182&disposition=inline>. Acesso em 8 mai 2022.
18
MIGUEL, Ricardo Georges Affonso – Atleta: Definição, Classificação e Deveres. In: Direito do
Trabalho Desportivo. Os aspectos jurídicos da lei Pelé frente às alterações da Lei. N. 12.395/2011.
(Org.) BELMONTE, Alexandre Agra; MELLO, Luiz Philippe Vieira de; BASTOS, Guilherme Augusto
Caputo. São Paulo: LTr, 2013. p. 145.
21

Essa classificação deve ser entendida em conjunto com a definição de atleta


para que os esportes participativos e educativos sejam praticados pelos desportistas
e os esportes de rendimento sejam praticados pelos atletas. Os esportes de
treinamento, por outro lado, podem ser recreativos, competitivos ou altamente
competitivos e envolvem desportistas e atletas. Ao praticar a prática recreativa ou
competitiva, seu praticante será considerado um desportista. No entanto, como um
esporte altamente competitivo, de aprendizagem para o esporte de rendimento, o
praticante em treinamento será um atleta.

“Nem sempre os atletas profissionais foram vistos como trabalhadores, tendo


isso ocorrido por várias razões, dentre as quais o fato de que a prática do
esporte sempre teve uma conotação lúdica, além da complexa evolução do
amadorismo ao profissionalismo. Alie-se a isso, o fato de os atletas poderem
ser celebridades e despertar paixões e no momento seguinte caírem no
ostracismo ou gerar o sentimento de ódio em alguns19. Tal é muito comum no
contexto do futebol, especificamente. Aliás, a prática de qualquer esporte, de
forma profissional ou amadora, até hoje carrega o estigma de ser um
divertimento, sendo comum ouvirmos as pessoas dizerem em relação aos
atletas do voleibol de praia, por exemplo, que invejam o trabalho deles dado
a forma e local da prestação dos serviços. Apenas se esquecem de que além
do treino no dia de sol, há o treino no frio, chuva, os treinos complementares
nas academias, a alimentação e sono regrados, além de outras limitações. O
trabalho não se resume no prazer do jogo apenas.

[...]

Neste contexto, várias teorias foram cogitadas para explicar o trabalho do


atleta, seja de natureza civil, seja um trabalho autônomo. Porém, sagrou-se
vitoriosa a tese consagrada na Lei Pelé de contrato especial desportivo,
portanto, de relação empregatícia para o atleta profissional.

Já para o atleta amador, hoje denominado não profissional, este só não é


chamado de profissional porque a lei não o trata assim para efeitos do
reconhecimento da relação de emprego, salvo algumas decisões da Justiça
do Trabalho. De toda sorte, o importante na conceituação de atleta que
acrescentamos à definição acima, é que este pode ser profissional ou
amador, mas deve viver do esporte, daí tirar o seu sustento, seja por meio de
contrato especial de trabalho desportivo, seja por incentivo de bolsas e
patrocínios”20

Com o advento dos jogos online, uma nova categoria de atletas surgiu, os
cyberathletes, termo usado para jogadores que decidem jogar profissionalmente,
sendo contratados por um clube e pagos por isso. Muito similarmente ao procedimento
adotado na seleção de times de futebol, é criada uma “peneira”, para selecionar alguns
jogadores de uma multidão de jogadores que sonham com uma carreira no mundo
dos jogos online. Essa categoria será o foco do presente estudo.

19
BARBAGELATA, Héctor-Hugo, apud BARROS, Alice Monteiro de. Contratos e regulamentações
especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e tendências. 3. ed. São Paulo: LTr,
2008. p. 97.
20
MIGUEL, op. cit. p. 145.
22

Tammy Tang21 fala sobre a espetacularização que envolve a ideia de uma


carreira como cyber atleta: “everyone is searching for something. Fulfillment. Fame.
Satisfaction. It gives you the ability to become someone else” (tradução: “todo mundo
está à procura de algo. Realização. Fama. Satisfação. Isso te dá a habilidade de se
tornar outra pessoa.”).

Embora tenha-se a imagem de fama e “trabalho fácil” quando se pensa em


jogador profissional de jogos eletrônicos, é preciso entender que a noção é aquém da
realidade vivida por esse grupo.

Enquanto se pensa em jogar como forma de passatempo e diversão, para os


proplayers o tempo de tela entra como treinamento para melhorar seu desempenho,
envolvendo horas de jogo sozinho, ou, ainda, scrims22, aprofundado estudo do jogos,
das atualizações de patches23.

Um dos maiores nomes do League of Legends mundial, Yiliang “Doublelift”


Peng, já falou abertamente sobre os desafios de se trabalhar em uma rotina de
proplayer, além das dificuldades da carreira:

Mental health though, yeah, like towards the end I did resent the lifestyle of
being a pro, and I just did it because the sacrifices we were making and the
goal that we all wanted to achieve, and it just seems so bad, it's such a bad
life to scrim, 10-12 hours a day for 11 months in a row, and at the end of it...
99% of pro players don't win, so at the end of it feel empty and disappointed.

Tradução: Saúde mental, sim, no final eu ressenti o estilo de vida de ser um


profissional, e fiz isso porque os sacrifícios que estávamos fazendo e o
objetivo que todos queríamos alcançar, e isso parece tão ruim, é tão uma vida
ruim a de treinar 10-12 horas por dia por 11 meses seguidos, e no final... 99%
dos jogadores profissionais não vencem, então no final se sente vazio e
desapontado. 24

O cenário de pressão em cima dos jogadores, seja pela vontade de vencer,


mesmo diante das chances mínimas de sucesso, seja pela responsabilidade de
manter o nível de jogabilidade, uma vez que a equipe técnica verifica, constantemente,
quais jogadores irão jogar em cada campeonato, além das suas posições a serem

21
VALVE. Free to Play: The Movie (US). Youtube. 19 de março de 2014. Disponível em:
<https://www.youtube.com/watch?v=UjZYMI1zB9s>. Acesso em: 28 abr 2022.
22
Partidas organizadas contra outro times profissionais em servidor privado.
23
Os videogames recebem patches para corrigir problemas de compatibilidade após o lançamento
inicial, assim como qualquer outro software, mas também podem ser aplicados para alterar as regras
ou algoritmos do jogo.
24
REDAÇÃO. YAHOO!Sports. Publicado em: 02 Novembro 2016. Disponível em: <
https://sports.yahoo.com/doublelift-takes-break-starts-streaming-012000560.html >. Acesso em: 18 set.
de 2022.
23

desempenhada dentro do jogo, atrai quadros psicológicos de ansiedade e depressão


de maneira quase que comum.

Demais disso, há de se ponderar as inúmeras condições de saúde física


desenvolvidas pelos jogadores profissionais, apesar de todo o acompanhamento por
psicólogo, nutricionista e fisioterapeuta que muitos clubes oferecem.

‘There's a lot of health issues I've run into when playing for so long,’ he
continued. ‘There's a lot of people with wrist issues, you know, they've only
been playing for a few years [...] Freeze is [a] big example. You know for me
it's not so much my wrist as much as it is my overall health. I've always had
like weird stuff come up, like knees feel funny and hurt all the time, right now
my neck feels really bad and hurts all the time. It's like, I haven't been to the
doctors since I was a teenager, I've never had a checkup or anything like that,
physical examination, because there's no time. And lately I've been feeling
very lethargic, I guess, and fatigued, from doing the same repetitive stuff every
day.’

Tradução: ‘Há muitos problemas de saúde com os quais me deparei jogando


por tanto tempo’, continuou ele. ‘Há muitas pessoas com problemas no pulso,
você sabe, eles jogam há apenas alguns anos [...] Freeze é [um] grande
exemplo. Para mim não é tanto meu pulso, mas minha saúde geral. Eu
sempre tive coisas estranhas surgindo, como os joelhos parecem engraçados
e doem o tempo todo, agora meu pescoço está muito ruim e dói o tempo todo.
É tipo, eu não vou ao médico desde a adolescência, nunca fiz check-up ou
algo assim, exame físico, porque não dá tempo. E ultimamente eu tenho me
sentido muito letárgico, eu acho, e cansado, de fazer as mesmas coisas
repetitivas todos os dias.’25

Assim, é evidente a necessidade de se quebrar a noção de trabalho fácil e


glamour advindo da fama no mundo online quando se fala de cyber-atletas. A rotina
enfrentada apresenta riscos à saúde mental e física dos jogadores, sem qualquer
respeito ao limite de jornada de trabalho imposto pela Constituição Federal de 1988,
em seu artigo 7º, inciso XIII.

2. O ESPORTE ELETRÔNICO NO ÂMBITO JURÍDICO

2.1 Regulamentação jurídica brasileira: Projeto de Lei do Senado 383/2017 e


Projeto de lei 3.450/2015

A legislação brasileira ainda não tem previsão para o enquadramento dos jogos
eletrônicos enquanto prática esportiva. Contudo, as casas legislativas possuem,
atualmente, grande discussão nesse sentido, tal qual o Projeto de Lei do Senado
383/2017:

25
REDAÇÃO. YAHOO!Sports. Publicado em: 02 Novembro 2016. Disponível em:
<https://sports.yahoo.com/doublelift-takes-break-starts-streaming-012000560.html >. Acesso em: 18
set. de 2022.
24

Art. 1º O exercício da atividade esportiva eletrônica obedecerá ao disposto


nesta lei.

Parágrafo único. Entende-se por esporte as atividades que, fazendo uso de


artefatos eletrônicos, caracteriza a competição de dois ou mais participantes,
no sistema de ascenso e descenso misto de competição, com utilização do
round-robin tournament systems, o knockout systems, ou outra tecnologia
similar e com a mesma finalidade.

Art. 2º O praticante de esportes eletrônicos passa a receber a nomenclatura


de “atleta”

Art. 3º É livre a atividade esportiva eletrônica, visando torna-la acessível a


todos os interessados, de modo que possa promover o desenvolvimento
intelectual, cultural esportivo contemporâneo, levando, juntamente a outras
influências das Tecnologias da Informação e Comunicação – TIC, à formação
cultural e propiciando a socialização, a diversão e a aprendizagem de
crianças, adolescentes e adultos.

Parágrafo único. São objetivos específicos do esporte eletrônico:

I – promover, fomentar e estimular a cidadania, valorizando a boa convivência


humanada, por meio dessa prática esportiva;

II – propiciar a prática esportiva educativa, levando os jogadores e se


entenderem como adversários e não como inimigos, na origem do jogo justo
(fair play), para a construção de identidades, com base no respeito;

III – desenvolver a prática esportiva cultura, unindo, por meio de seus


jogadores virtuais, povos diversos em torno de si, independentemente do
credo, raça e divergência política, histórica e/ou cultural e social;

IV – combater a discriminação de gênero, etnias, credos e o ódio, que podem


ser passados subliminarmente aos sujeitos-jogadores nos jogos;

V – contribuir para a melhoria da capacidade intelectual fortalecendo o


raciocínio e a habilidade motora de seus praticantes.

Art. 4º Fica reconhecida como fomentadora da atividade esportiva a


Confederação, Federação, Liga e entidades associativas, que dentro das
suas competências normatizam e difundem a pratica do esporte eletrônico.

O PLS 383/2017 não é a única produção legislativa neste sentido, há projetos


em similar caminho para promover alteração à Lei Geral do Desporto, passando, esta,
a considerar o jogo eletrônico como modalidade desportiva.

O deputado João Henrique Caldas, do PSB de Alagoas, propôs o projeto de lei


3.450/2015, que visa a adição do inciso V ao artigo 3º da Lei Geral do Desporto, com
o objetivo de que haja o reconhecimento do desporto virtual enquanto prática
esportiva.

PROJETO DE LEI Nº 3450 DE 2015: Acrescenta o inciso V ao artigo 3º da


Lei 9.615/1998, que “Institui normas gerais sobre desporto”, para reconhecer
o desporto virtual como prática esportiva. O Congresso Nacional decreta:

Art. 1º Essa lei altera a Lei 9.615/1998, que “Institui normas gerais sobre
desporto”, para reconhecer o desporto virtual como prática esportiva.
25

Art. 2º O artigo 3º da Lei Federal nº 9.615/1998 fica acrescido do seguinte


inciso V:

‘Art. 3º ................................................................................

V – Desporto virtual, assim entendido jogos eletrônicos transcorridos


individual ou coletivamente, contra a máquina ou em rede, como também a
competição entre profissionais e amadores do gênero.’

Art. 3º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação.

O projeto, que se encontra pendente de aprovação, busca ressaltar a natureza


benéfica da prática de esportes eletrônicos, que auxilia no aumento da capacidade
cognitiva daqueles que aderem à prática, servido como exercício para memória,
mormente o constante treinamento estabelecido na rotina dos jogadores.

Demais disso, o projeto traz a visão empreendedora que circula o mercado dos
jogos enquanto prática esportiva: “muitos jogos eletrônicos possuem status de
verdadeiras obras de arte, com investimentos – e retorno – bilionários, guiando a
indústria de filmes e de livros em muitos casos”26.

O projeto denuncia a inércia da produção legislativa brasileira relativamente ao


fenômeno do mundo dos games.

Como é nos outros países?

Em 2013, os EUA começaram a considerar jogadores de eSports como


atletas do mesmo nível que jogadores de basquete, por exemplo. A decisão
foi tomada para facilitar o pedido e autorização de vistos de proplayers para
campeonatos realizados no país.

Também em 2013, a China definiu e registrou o eSports na Administração


Geral de Esporte da China. Por lá, regras, campeonatos, times e jogadores
são fiscalizados pela Association for Chinese Esports (ACE).

Porém, mais cedo do que todo mundo, a Coreia do Sul considera o eSports
um esporte desde 2000, com a criação da Korea e-Sports Association
(KeSPA). Aprovada pelo Ministério da Cultura, Esporte e Turismo do país, a
KeSPA tem como objetivo fazer do eSports um evento oficial de esporte e
solidificar a posição do eSports em todos os setores. Entre suas tarefas está
a de fiscalizar a transmissão de campeonatos, a criação de novos torneios e
o trabalho (e direitos) de times e jogadores de mais de 25 títulos.27

26
Disponível em: <https://www.camara.leg.br/noticias/786979-projeto-reconhece-desporto-virtual-
como-pratica-esportiva>. Acesso em 18 set 2022.
27
Disponível em: http://www.espn.com.br/noticia/562185_projeto-de-lei-quer-transformaresports-em-
esporte-no-brasil. Acesso em 18 set. 2022.
26

Os projetos encontram-se, ainda, em tramitação, de modo que não há nenhum


entendimento ou enquadramento firmado acerca dos jogos eletrônicos enquanto
modalidade esportiva.

2.2 Uso análogo da lei Pelé: inadequação e lacuna jurídica existentes

Diante da inexistência de legislação específica, cabe ao ordenamento jurídico


pátrio a avaliação de possíveis soluções cabíveis ao problema.

Maurício Godinho Delgado28 preconiza que a analogia não é propriamente uma


fonte do direito, mas, tão somente, “instrumento de concretização da chamada
integração jurídica, pela qual se pesquisam outras fontes normativas para aplicação
ao caso concreto figurado”. Em assim sendo, seria necessária a similaridade do caso
concreto para que haja a aplicação da norma.

Delgado29 afirma, ainda, que a analogia que instigasse a aplicação da Lei Pelé
aos cyber-atletas seria do tipo legis, observando três requisitos elencados por ele:

a) que o fato considerado não tenha sido tratado especificamente pelo


legislador, através de uma específica norma jurídica; b) que exista, na ordem
jurídica, norma regulando situação ou relação que apresente ponto de
contato, semelhança, coincidência ou identidade; c) que esse aspecto comum
seja o elemento central a autorizar a operação analógica.

Com base no entendimento de Delgado, há quase que um consenso acerca da


aplicação da Lei Pelé para regular as relações jurídicas entre cyber-atletas e os clubes
que os contratam, vez que o disposto no artigo 3º, III, da Lei 9.615/98 se assimila à
realidade do e-sports:

III - desporto de rendimento, praticado segundo normas gerais desta Lei e


regras de prática desportiva, nacionais e internacionais, com a finalidade de
obter resultados e integrar pessoas e comunidades do País e estas com as
de outras nações;

Referida analogia regula desde o contrato especial de trabalho desportivo, até


os direitos de imagem, arena e de transferência, que são, originalmente, garantias de
atletas profissionais, estendidas aos proplayers.

28
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019, p. 412.
29
DELGADO, op. cit. p. 412.
27

De análise dos contratos de trabalho desportivo eletrônico, Ramos30 entende


que é necessário o reconhecimento dos contratos firmados como contratos
desportivos, uma vez que as características de tais contratos afastariam a
possibilidade de regência por dispositivos que regulam contratos de prestação de
serviços, tais quais os artigos 593 e 609 do Código Civil Brasileiro, por exemplo. Para
o autor, é muito mais apropriada a aplicação dos artigos 28 e 28-A da Lei nº 9.615/98,
que, para além de abranger competição individual e em equipe, abrem janela para a
contratação de atletas autônomos.

É importante pontuar que o contrato de trabalho não é comparável àqueles


outros contratos de natureza civil. A remuneração prevista no contrato de trabalho não
o assimila ao contrato de compra e venda, uma vez que não se poderia igualar a força
de trabalho com mercadoria.

Há, também, situações em que é firmado contrato de concessão de imagem


como forma de regularizar as relações firmadas com os cyber-atletas, a exemplo do
Anexo 1, ou, ainda, contrato de prestação de serviço, conforme Anexo 2.

Gagliano e Pamplona31 definem contrato de prestação de serviços como “o


negócio jurídico por meio do qual uma das partes, chamada prestador, se obriga a
realizar uma atividade em benefício de outra, denominada tomador, mediante
remuneração”.

Dessa maneira, é seguro afirmar que a prestação de serviços se dá a partir da


contratação de uma atividade, sem se preocupar com o resultado. Há a presença de
autonomia nas escolhas do prestador de serviços. O prestador de serviços não se
encontra subordinado ao contratante, havendo uma relação quase que igualitária
entre as partes – excluindo-se, portanto, a ideia de hipossuficiência.

Como pontuado, há inexistência de subordinação no contrato de prestação de


serviço, o que o diferencia do contrato de emprego, uma vez que essa característica

30
RAMOS, Rafael Teixeira. Contrato de trabalho desportivo eletrônico (e-Sports). Coluna Jus
Desportiva do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo (IBDD). 2019. Disponível em:
http://ibdd.com.br/contrato-de-trabalho-desportivo-eletronico-e-sports/. Acesso em: 19 set. 2022.
31
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA, Rodolfo, Novo curso de direito civil, volume 4: tomo II,
2014. p. 207.
28

é fundamental e indispensável ao contrato de emprego. Logo, é de simples dedução


que a presença de subordinação na relação jurídica caracteriza contrato de emprego.

A lei 9.615/98 regula uma modalidade especial de contrato de trabalho, comum


às relações firmadas entre um empregado-atleta e um clube-empregador32, afastando
a aplicação da Consolidação das Leis do Trabalho. Essa modalidade contratual é
regida pelo artigo 28 da lei supracitada, dispositivo este o qual estabelece que essa
modalidade contratual é, necessariamente, escrita, havendo uma série de demais
requisitos.

O dispositivo traz a aplicação subsidiária da Consolidação das Leis do Trabalho


e demais normas trabalhistas, contanto que não haja conflito com as disposições
existentes na legislação especial.

Como se pode notar, muitos argumentam a perfeita aplicabilidade da Lei Pelé


aos cyber-atletas, mormente inegável similaridade do caso concreto ao texto
normativo. Contudo, é imprescindível que se pondere acerca das lacunas existentes
quando se abre mão de uma produção normativa específica, para a mera aplicação
análoga de leis previamente existentes.

É preciso que se entenda que a pendente aprovação dos projetos de lei


impedem fator basilar: o enquadramento dos jogos eletrônicos enquanto esportes.
Esse impedimento, por si só, pode afastar todo o texto normativo da Lei 9.615/98.

Explica-se: em um cenário em que haja a aprovação de um projeto de lei em


sentido contrário ao que se espera, ou seja, que afaste o enquadramento dos jogos
eletrônicos enquanto modalidade esportiva, os cyber-atletas ficariam à míngua, sem
a possibilidade da aplicação da Lei Pelé, ante inegável quebra da similaridade do caso
concreto com o texto normativo.

Há, ainda, a crescente problemática das manobras de fraude à relação jurídica


firmada entre atletas e cyber-atletas que, reiteradamente, vêm sendo contratados sob
a modalidade contratual distinta àquela de contrato de emprego, como já citado no
corpo do presente estudo.

32
ZAINAGHI, Domingos Sávio. “Nova Legislação desportiva. Aspectos trabalhistas.”, São Paulo,
LTr, 2002.
29

Argumenta-se, portanto, a necessidade de uma produção normativa específica,


que abranja todas as particularidades do mundo dos jogos eletrônicos, de modo que
inexistam brechas, ou, ainda, reduzam-se as atualmente existentes. Não se pode
tutelar aquilo que é desconhecido pelo Direito, estando este suscetível às manobras
aqui citadas, restando vulneráveis os cyber-atletas.
30

3. DA REALIDADE TRABALHISTA DOS CYBER-ATLETAS


3.1 Dos elementos constitutivos do vínculo empregatício: do princípio da
realidade sobre a forma

Buscando maior riqueza para o presente estudo, imprescindível seria o estudo


de variados contratos firmados entre os cyber-atletas e os clubes. Contudo, o
problema que sonda essa análise é a existência, quase que padrão, de cláusulas de
confidencialidade, que impedem a disponibilização dos documentos a partes
estranhas ao negócio jurídico.

Ainda que diante de tamanho impasse, dois cyber-atletas, que preferiram


continuar anônimos, disponibilizaram os seus antigos contratos para o presente
estudo, sendo o primeiro (ANEXO I), um contrato de concessão de imagem, e o
segundo (ANEXO II), um contrato de prestação de serviços.

Não se alega, no presente estudo, que são inexistentes os casos em que há


firmação de contrato de trabalho. Aliás, é determinação da Riot Games,
desenvolvedora do League of Legends, que as equipes que participam de suas
competições formalizem os vínculos empregatícios33. Contudo, ressaltam-se os casos
em que não há o cumprimento dessa determinação pelas equipes profissionais de
LoL, ou, ainda, as hipóteses de jogos eletrônicos que não caem sob o domínio da Riot
Games.

É importante que se trate, de início, da diferença entre relação de trabalho e


relação de emprego. A primeira, trata de conceito amplo, igualando-se a um gênero,
abarcando as situações de prestação de serviços remunerados, com previsão no
artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho.

Relação de emprego atrai a ideia de trabalho subordinado entre empregado,


que obrigatoriamente é pessoa física e empregador, que pode ser pessoa física ou
pessoa jurídica34, através de um negócio jurídico – contrato de trabalho –, sem a ideia
de autonomia, trabalho avulso ou, ainda, o eventual. Diferentemente do que fora
explanado acerca do contrato de prestação de serviços, no contrato de trabalho

33
Disponível em: http://www.espn.com.br/noticia/724367_carteira-de-trabalho-e-apenas-uma-das-
formas-de-contrato-nos-esports-entenda. Acesso em 19 set. 2022.
34
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13ª ed. LTR. 2014.
31

contrata-se a atividade e não apenas o resultado. Ou seja, parte-se do pressuposto


que haverá uma prestação contínua do serviço, a ser financeiramente recompensada
e supervisionada por quem contrata a prestação. Sérgio Pinto Martins afirma que “Tais
características evidenciam a existência de um acordo de vontades, caracterizando a
autonomia privada das partes”35.

Existem requisitos pré-determinados para que haja a constituição de uma


relação de emprego. Amauri Mascaro Nascimento traz a ideia de que “[...] a relação
jurídica de natureza contratual tendo como sujeitos o empregado e o empregador e
como objeto o trabalho subordinado, continuado e assalariado”36.

Definem-se, portanto, quatro características para concretização de uma relação


de emprego:

a) Subordinação, que, segundo Delgado, se expressaria “pela inserção do


trabalhador na dinâmica do tomador de seus serviços, independentemente de
receber (ou não) suas ordens diretas, mas acolhendo estruturalmente sua
dinâmica de organização e funcionamento”37;
b) Pessoalidade, que se relaciona à noção de que o serviço não poderia ser
executado por pessoa distinta do empregado, ou seja o contrato de emprego é
dotado do intuitu personae relativamente ao empregado;
c) Não eventualidade da prestação de serviço, característica observada no artigo
3º da Consolidação das Leis do Trabalho, que não exclui a possibilidade de
trabalho intermitente, mas, tão somente, verifica a frequência da prestação;
d) Onerosidade, é a ideia da correspondência pecuniária ou in natura da
prestação de trabalho.

Elencados os requisitos existentes para a firmação de uma relação de emprego,


passa-se a destrinchar os motivos pelos quais os cyber-atletas fazem jus ao vínculo
empregatício com os clubes, devendo estes serem incluídos ao regime celetista.

A rotina dos cyber-atletas, como já demonstrado no presente estudo, exige


extrema dedicação, disciplina, foco e possui rigorosidade que não se imagina quando

35
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 22. ed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 82.
36
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 19.ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
37
DELGADO, Maurício Goldinho. Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed. LTR. 2015. p. 667.
32

se pensa em trabalho com jogos eletrônicos, muito se assimilando ao regime cotidiano


dos atletas de esportes mais comuns como vôlei, futebol, natação, basquete e afins.
Tais fatores, somados à condição existente nas gaming houses e os contratos trazidos
ao presente estudo, permitem uma análise que elucida, cada vez mais, a existência
de vínculo empregatício.

Apesar de a maioria dos contratos entre organizadores e “cyber-atletas”


sugerirem típica relação de “patrocínio” e, na prática, serem denominados de
contratos de “adesão e outras avenças”, a situação que se desencadeia no
dia a dia desses atletas muitas vezes desborda completamente daquela
condição inicial sob a qual foram contratados, sugerindo, assim, uma
natureza jurídica diversa da pactuada – e esse fato pode atrair sérias
implicações jurídicas tanto aos organizadores quanto aos próprios atletas,
especialmente sob a ótica do Direito do Trabalho.38

O advogado Nicholas Bocchi, especialista em direito desportivo, afirma o seguinte:


“O certo é ter um contrato de trabalho, pois estão presentes todos os elementos de
uma relação empregatícia: pessoalidade, habitualidade, subordinação e
onerosidade”39

Passa-se, então, a um paralelo com as características elencadas previamente no


presente estudo.

Relativamente à subordinação, esta é colocada enquanto característica que gera


maior discussão. Godinho40 faz a divisão dessa característica, dando surgimento a o
que chamamos de subordinação por inserção do trabalhador na dinâmica de serviços
do contratante.

Com essa proximidade diária mantida entre as partes, decorrem outras


obrigações contratuais, que podem indicar a presença da subordinação
jurídica, a saber: a) permanecer diariamente (segunda a sexta-feira) na
infraestrutura fornecida pela organizadora para os treinos e competições, sob
pena de descumprimento do contrato e até mesmo da aplicação de punições
ou outra sorte de penalidades; b) presença física, pessoal e artística do atleta
em eventos e campeonatos; c) cumprimento fiscalizado de horário de almoço
e início e término de treino; d) dedicação mínima de 8 (oito) horas por dia; f)
presença virtual em outras atividades que determinar a contratante; g)

38
COELHO, Hélio Tadeu Brogna. E-sport: os riscos nos contratos de Cyber-Atletas. Publicado em: 12
de janeiro de 2016. Disponível em: https://pt.slideshare.net/moacyrajunior/e-sport-os-riscos-nos-
contratos-decyberatletas. Acesso em 21 set de 2022.
39
Disponível em: < https://www.uol.com.br/start/ultimas-noticias/2019/12/17/contratacoes-em-league-
of-legends-nappon-processou-pain.htm>. Acesso em 25 set de 2022.
40
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 13ª ed. LTR. 2015.
33

exclusividade; h) cessão de uso de direito de imagem; i) participação da


organização ou do patrocinador nos prêmios obtidos pelo time nos
campeonatos que vencerem.41

É bem demonstrada a situação, inclusive, pelos contratos trazidos à baila. Veja-


se a redação do contrato de concessão de imagem, anexo I:

PRESSUPOSTOS CONTRATUAIS

A) O direito de cessão onerosa de imagem, apelido desportivo, nome e voz


de atleta profissional pode ser transacionado civil e comercialmente,
consoante a previsão dos inciso X e XXVIII do art. 5º da Constituição Federal,
c/c com inciso XXI, parágrafo 9º do art. 214 do Decreto 3.048/99, não
integrando ao Contrato de Trabalho para todos os efeitos legais.

B) A lei nº 10.406/2002 (Código Civil), inovou ao instituir um capítulo com o


nome de “Direitos da Personalidade”, fixando a partir de seu artigo 11 até o
artigo 21 as condições de uso e exploração desses direitos;

C) Os artigos 18 e 20 do referido diploma legal exigem, ainda, autorização


para a exploração comercial do nome e das imagens de uma pessoa;

D) O CRF, no exercício dos seus objetivos sociais, costuma veicular, por meio
de diversos procedimentos de marketing e em vários tipos de mídia, o nome,
apelido desportivo, voz e imagem dos seus atletas e membros da comissão
técnica.

E) O CONCEDENTE é contratado para atuar como integrante da equipe


profissional de ‘e-sports’.

As obrigações da “concedente”, determinadas pelo clube, possui rol extensivo,


acentuando, ainda mais, a condição de subordinação do atleta:

CLÁUSULA SEGUNDA – OBRIGAÇÕES DO CONCEDENTE

Em face da concessão ajustada na Cláusula anterior, o CONCEDENTE


assume as seguintes obrigações:

2.1. O CONCEDENTE deverá estar disponível para todos os tipos de


promoção, publicidade, eventos e/ou ações de marketing que venham a ser
desenvolvidos pelo CRF e seus patrocinadores, tais como promoções,
publicidades, eventos e/ou ações não conflitem com outros compromissos
profissionais assumidos até a data de assinatura deste contrato, incluindo
períodos de concentração.

2.2. Manter íntegra a sua imagem de atleta profissional de e-Sports,


abstendo-se de praticar qualquer ato contrário à probidade, à moral e aos
bons costumes ou que possa afetar de forma negativa sua imagem, assim
como a do CRF e/ou dos seus patrocinadores, sob pena de pagamento, por
parte do CONCEDENTE, de eventuais perdas e danos.

2.3. Participar de jogos e/ou eventos promocionais através do qual o CRF


tenha interesse em divulgar a imagem do CRF e do CONCEDENTE sob
consulta da agenda do atleta.

41
COELHO, op. cit. p. 5.
34

2.4. Não divulgar, em nenhuma hipótese, todo e qualquer assunto interno do


CRF, sem prévia e expressa anuência do CRF e conforme orientações da
Assessoria de Imprensa do CRF.

2.5. Utilizar, nas dependências do CRF, em entrevistas em televisão ou


participação em programas de auditório ou esportivos, durante treinos,
competições oficiais e/ou amistosas, nos embarques e desembarques de
viagens realizadas pelo CRF, bem como em eventos sociais e esportivos
promovidos pelo CRF, os uniformes oficiais que levem o nome, logotipo,
logomarca, marca mista e nominativa do CRF e de seus patrocinadores e/ou
parceiros comerciais, ressalvado o direito ao uso de bonés, por serem de livre
escolha do CONCEDENTE, sob pena de multa de R$ 20.000,00 (vinte mil
reais) por cada evento faltoso. (ANEXO I)

De igual forma, o contrato de prestação de serviços, anexo II do presente


estudo, utiliza-se da manobra de modalidade contratual que se afasta do regime
celetista, contudo, faz inúmeras determinações que ressaltam a existência de
condição de subordinado do contratado, e não de igualdade, como se faz pretender:

Cláusula Sétima – Das Obrigações do Contratado: São obrigações do


Contratado, dentre outras decorrentes da execução deste contrato:

a. Cumprir integralmente as disposições deste instrumento, executando os


serviços com todo o zelo e diligência e com as cautelas de segurança
necessárias;

b. Realizar os serviços de acordo com as orientações fornecidas pela


Contratante, ciente que quaisquer serviços mal executados ou julgados pela
Contratante tecnicamente não satisfatórios ou imperfeitos, deverão ser
refeitos às suas expensas, sem ônus adicional algum à Contratante;

c. Manter íntegra sua imagem de analista de eSports, abstendo-se de praticar


ou se envolver em quaisquer atividades nocivas à sua imagem, da
Contratante e de seus patrocinadores, inclusive quanto a emissão de opiniões
ou informações pessoais;

d. Manter-se atualizado às alterações/atualizações realizadas no Valorant,


seja na modalidade em si, como em todos os aspectos que o cenário da
modalidade abrange;

e. Resguardar a Contratante contra perdas e danos de qualquer natureza,


oriundos dos serviços executados sob este contrato, suportando os prejuízos
resultantes da negligência ou má prestação dos serviços;

f. Fornecer à Contratante, escrita ou verbalmente, sempre que solicitado,


todas as informações e esclarecimentos decorrentes do vínculo obrigacional
oriundo do presente instrumento;

g. Manter em segurança todos os documentos e assuntos que lhe forem


disponibilizados pela Contratante, em especial esboços de programas e suas
respectivas cópias, assegurando, também, que terceiros não tenham acesso
ou conhecimento de seu conteúdo;

No tocante à pessoalidade, é importante pontuar que, ante a natureza da


atividade desempenhada, não há como haver substituição do prestador de serviço.
35

Explica-se: a contratação de um cyber-atleta se dá em decorrência de sua habilidade


e seu destaque individual no game que se presta a jogar, dessa maneira, a noção de
poder se fazer substituir é incabível. Inexiste a possibilidade de passar a habilidade
de um indivíduo a outro.

Demais disso, os contratos firmados entre atleta-empregado e clube-


empregador são firmados nas pessoas dos jogadores, não se fazendo representar por
empresa.

A não eventualidade da prestação de serviço muito se relaciona à rotina dos


cyber-atletas, que, muitas vezes, moram em gaming houses para facilitar o
treinamento em conjunto com os companheiros de equipe, e, ainda, a periodicidade
das partidas dos campeonatos oficiais. No caso do Campeonato Brasileiro de League
of Legends, por exemplo, as partidas ocorrem todo final de semana durante a
temporada, de modo que, ao longo da semana, os jogadores encontram-se obrigados
a horas de treinamento diárias.

Não somente, os atletas que, eventualmente, não se encontram em regime de


gaming house (seja por escolha própria, seja por determinação do clube) não
poderiam ser excluídos da hipótese de não eventualidade, uma vez que cumprem,
igualmente, a rotina de treinos junto aos demais. Traz-se, também, a previsão
contratual de prazo de contratação, com a possibilidade de renovação, como fator que
atrai a não eventualidade da prestação de serviço.

A onerosidade, por sua vez, encontra bojo na contraprestação pecuniária, como


aqui já adiantado, havendo previsão contratual de remuneração desses cyber-atletas.
Em entrevista ao G1, o gerente da INTZ (time de League of Legends) informou que o
salário de jogador profissional, à época, variava de R$ 3.000,00 a R$ 20.000,00 42.

Não obstante os prêmios recebidos pela equipe e individualmente pelos


"cyberatletas" ao obterem uma vitória, que é um resultado natural da relação
mantida entre as partes por força do salário pago ao “cyber-atleta”, eles
também percebem, mensalmente, 6 uma quantia fixa a título de salário, ou
seja, uma contraprestação pelas atividades realizadas, o que preenche o
requisito da onerosidade. 43

42
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=4RfUTXVZFQM/ Acesso em 21 set. 2022.
43
COELHO, op. cit. p. 5.
36

Presentes todas as características para a formação de uma relação de


emprego, assim deveriam ser tratados os cyber-atletas, não podendo se argumentar
pela existência de contrato de natureza diferente, prezando pela aplicação do princípio
da primazia da realidade, o qual determina que a verdade real prevalecerá sobre a
verdade formal.

3.2 O caso Nappon e o caso Santos

A discussão de vínculo empregatício vem ganhando força jurídica atualmente.


O caso mais conhecido de judicialização do pedido de vínculo é o do cyber-atleta
Carlos “Nappon” Rücker, que ajuizou ação trabalhista, tombada sob número 1000904-
02.2019.5.02.0084, perante a 84ª vara do trabalho de São Paulo, postulando a
anotação da Carteira de Trabalho pelo tempo em que esteve na PaiN Gaming, mais
o recebimento das verbas rescisórias e salários.

Na ação, o proplayer relata que integrou a equipe da PNG de maio de 2018 a


abril de 2019, contudo, fora afastado das suas atividades, sem qualquer justificativa
em outubro de 2018, deixando, inclusive, de perceber as verbas salariais acordadas
contratualmente em dezembro do mesmo ano.

O jogador recorreu ao disposto pelo artigo 483, alínea “d”, da Consolidação das
Leis do Trabalho, para ter seu contrato de trabalho rescindido de maneira indireta ante
a inadimplência injustificada do clube, uma vez que, conforme relatado na peça de
ingresso: “não procedeu às anotações na Carteira de Trabalho, não recolheu o FGTS
e as contribuições previdenciárias e tampouco pagou as verbas rescisórias”.

A lide não chegou a ser angularizada, não havendo apresentação de


contestação pela PaiN Gaming, que optou por, em audiência de conciliação, firmar os
termos do acordo em R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) a título de verbas rescisórias,
bem como se obrigou à anotação regular da Carteira de Trabalho do atleta.

Em que pese a ausência de comando sentencial, o resultado da ação ainda


possui grande relevância jurídica. Os termos da conciliação estabelecem precedente
de reconhecimento de vínculo empregatício, por parte do judiciário brasileiro, entre
clubes de e-sports e cyber-atletas.
37

Na reclamação trabalhista de número 1001442-18.2021.5.02.0082, o atleta


Nicolas “Destiny” Alves, que possuía contrato de prestação de serviços com a Select
E-Sports Management Eireli – ME, representante do Santos Futebol Clube, postulou
o reconhecimento de vínculo empregatício.

A ação busca demonstrar a natureza fraudulenta da contratação do cyber-atleta


por meio de contrato de prestação de serviços, vez que se trata de manobra utilizada
pelos clubes para se esquivarem das obrigações trabalhistas garantidas pela
Consolidação das Leis do Trabalho.

O caso “Destiny” é a perfeita demonstração do que os clubes buscam se


esquivar ao adotar modalidade contratual que não se regula pela Consolidação das
Leis do Trabalho. O cyber-atleta, que morou em gaming house, alega, em sua
reclamação trabalhista, ter contraído dermatite nos alojamentos do clube, pelo que
persegue a concessão de liminar para determinação de reintegração ao clube para
que o empregador arque com as despesas decorrentes do tratamento médico.

Não se discute, no presente estudo, se faz jus, ou não, o cyber-atleta à


reintegração pelos motivos que ele discorre na peça de ingresso da sua reclamação
trabalhista, mas, tão somente, à pura natureza do direito. A reintegração só poderia
ser concedida caso a natureza contratual fosse de contrato de trabalho, nos termos
do artigo 118, da lei 8.213/91 e súmula 378 do Tribunal Superior do Trabalho.

O processo ainda não fora sentenciado, estando em fase de instrução,


pendente de realização de audiência una, vez que transita no rito sumaríssimo.
38

4. CONCLUSÃO

Os avanços do mundo moderno acarretam mudanças na dinâmica


socioeconômica. De maneira similar ao acontecido à época da Revolução Industrial,
o universo trabalhista sofre impactos diretos dos avanços tecnológicos, em velocidade
superior à produção legislativa que regula as novas dinâmicas empregatícias.

Os jogos eletrônicos, antes atrelados estritamente à ideia de diversão e


passatempo, atualmente, adquiriu nova conotação. Isso porque, o aumento nos dois
lados do binômio produção e interesse gerou um aumento quase que exponencial do
capital envolvido nesse mercado. Tal capital patrocinou o surgimento de competições,
tendo muitas delas se tornado “oficiais” – seja pelo reconhecimento das empresas
desenvolvedoras, que muitas vezes, se envolvem nos campeonatos, seja por criação
de associações nacionais que visam regulamentar os campeonatos.

Atualmente, os estilos de jogos mais consumidos pelo público são os jogos de


RPG, MOBA e FPS, tendo esses dois últimos os jogos com as maiores competições
da atualidade – League of Legends e CS:GO, respectivamente.

As novas modalidades empregatícias, surgidas dos avanços no âmbito digital,


provocam diferentes sentimentos nos diferentes grupos sociais. Os mais velhos
enxergam a opção por trabalhar com jogos eletrônicos como sinal de preguiça ou,
ainda, “vida fácil”. Os mais novos, por sua vez, enxergam a oportunidade de fama e
glória.

Ambas as ideias estão fundamentalmente equivocadas. Não se poderia


enxergar como vida fácil ou, ainda, “sinal de preguiça” a escolha por uma carreira que
exige dedicação quase que exclusiva, rotina de treino de quase 12 horas diárias, além
da vinculação do que outrora fora passatempo enquanto trabalho.

A ideia de fama e glória, por sua vez, não fica muito distante da primeira no
espectro realista da carreira. Dentre os milhares jovens que buscam a carreira de
proplayer, apenas alguns encontram destaque o suficiente para serem consagrados
enquanto “deuses” dos jogos.

Este trabalho buscou focar na discussão acerca de serem, ou não,


enquadradas enquanto relações empregatícias as atividades advindas da modalidade
esportiva surgida dos jogos eletrônicos, perpassando pela dificuldade de se legislar
39

as relações criadas neste universo, com fins de demonstrar a insuficiência jurídica


existente atualmente.

A ausência de produção legislativa que reconheça os jogos eletrônicos


enquanto modalidade esportiva se apresenta enquanto grande ameaça à segurança
jurídica dos atletas, seja pela fragilidade do uso da analogia para aplicação das leis
pré-existentes, como demonstrado no presente estudo, seja pelas manobras adotadas
pelos clubes para fuga ao regime celetista.

A utilização de contratos de prestação de serviço, avenças e concessão de


imagem, prática comum aos clubes de e-sports, demonstra-se, em sua natureza,
fraudulenta. A bem da verdade, a relação mantida entre atleta-empregado e clube-
empregador é a de emprego, uma vez que presente o preenchimento dos requisitos
de subordinação, onerosidade, não eventualidade e pessoalidade.

Os clubes, que possuem jogadores titulares e reservas, treinador, equipe


técnica e psicólogo, estabelecem, em sua maioria, metas diárias e semanais
(subordinação), determinam horários de treinos e as horas em que realizarão scrims
(não eventualidade), realizam “peneiras” – similarmente ao realizado no futebol – para
contratação dos proplayers, escolhendo qual deles mais atende aos parâmetros que
buscam alcançar (pessoalidade) e remuneram os jogadores (onerosidade).

Os documentos trazidos ao presente estudo evidenciam as manobras utilizadas


pelos clubes-empregadores para se distanciar do reconhecimento da relação de
emprego, afastando a incidência da Consolidação das Leis do Trabalho, uma vez que
mais vantajoso é a celebração de modalidades contratuais que não sejam abarcadas
pelas leis celetistas.

Em viés contrário, as entrevistas e ações trabalhistas analisadas apenas


evidenciam, ainda mais, a existência de vínculo empregatício entre os clubes e os
cyber-atletas.

A importância do enquadramento dos proplayers em regime celetista se dá não


somente pelo simples enquadramento deles na hipótese do artigo 3º da Consolidação
das Leis do Trabalho, mas pelas garantias advindas deste regime, como o
recolhimento mensal do depósito fundiário, previdência social por meio do INSS,
assinatura da Carteira de Trabalho e Previdência Social.
40

O crescimento do mercado, em velocidade exponencial, atrai, ainda mais, a


necessidade de produção legislativa que enquadre expressamente os jogos
eletrônicos enquanto modalidade esportiva, para que se torne mais difícil a firmação
de modalidade contratual fraudulenta por parte dos clubes esportivos.

Dessa maneira, os cyber-atletas que dedicam excessivas horas ao jogo e à


instituição, colocam em risco a própria saúde física e mental, em virtude das longas
horas trabalhadas e excessiva exposição ao público ficam inteiramente desprotegidos,
ressaltando a dinâmica de subordinação e a condição de hipossuficiente do
trabalhador.
41

5. REFERÊNCIAS

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regulamentações especiais de trabalho: peculiaridades, aspectos controvertidos e
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45

ANEXO I – CONTRATO DE CONCESSÃO DE IMAGEM


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ANEXO II – CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS


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