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copyright © 2022
luís vidal | mar morto - editora
todos os direitos reservados.
nenhuma parte deste livro pode ser reproduzida ou utilizada sob quaisquer meios existentes sem
autorização por escrito do autor ou da editora. qualquer uso indevido deste conteúdo é passível de
responsabilização civil e criminal, segundo a lei dos direitos de autor e conexos.
sinopse
os “monstros” – usando apenas essa palavra como
um item para nos situar – são na verdade pessoas que
chegaram a um nível extremo do “fora do padrão”, são os
que menos se encaixam, ou melhor, os que não se encaixam,
e em função disso, são deixados de lado e servem como
objecto de exemplo para o ridículo e o imprestável, sendo
que o suposto é agir categoricamente, mas eles saíram da
linha de produção.
criam-se monstros nas cabeças das pessoas todos os
dias. quando as pessoas são renegadas, criam-se monstros.
quando pessoas não se conseguem encontrar meio a tantas
rotulações e padrões, criam-se monstros. todos os dias,
quando pessoas são incompreendidas, quando são tratadas
como produto, e deste modo vistos como fora da linha de
produção e, consequentemente descartados, eles são
considerados “monstros”. só que esses monstros têm
sentimentos e boa parte deles eu os escrevi.
à todos os julgamentos, à todos os apontar de dedos,
à toda gente que eu não pude agradar sendo quem elas
queriam que eu fosse, porque em todas essas vezes eu escolhi
ser eu, apesar de que teria de sofrer uma espécie de retaliação
por isso…
à todos os rótulos que não me serviram, aliás, que
não os usei, porque sempre soube quem era e do que queria
ser…
à todas as pessoas que determinavam para mim, um
jeito bem específico de falar, vestir, cortar o cabelo, defender
as minhas ideologias, e em geral, igualmente um jeito bem
específico de ser, e não pude satisfazer essas vontades e ser
passivo a tudo isso, a resposta para tudo é que OS
MONSTROS TAMBÉM SENTEM e eu não pude fugir a
eles.
a prova é que boa parte do que esse “monstro” sente
está bem cravado nessas páginas.
índice
introdução
nota do autor
sobre o autor
mar morto
introdução
LUÍS VIDAL,
EM MEMÓRIA DE
OSÉIAS COIMBRA.
“REST IN PEACE”.
“... certos homens nunca morrem e certos homens nunca
vivem, mas estamos todos vivos nesta noite”
– Charles Bukowski, in Você fica tão sozinho às vezes
que até faz sentido.
para Oséias Coimbra
eras feito de carne
e osso
daquele sorriso
daquele olhar
e do que estava
bem dentro de ti
e te fazia
ser quem eras
hoje és feito
apenas de lembranças
eu não consigo
tocar você
eu não alcanço você
nem em pensamentos
mas ainda consigo
ouvir a tua voz
falo de respirar
e ao mesmo tempo
sentir-mo-nos sufocado
vivos mortos
molhados secos
ricos pobres
felizes tristes
distantes perto
altos baixos
bons maus
arco-irís
várias cores
nunca monocromático
nunca somos um único conceito
estamos a ser cada vez mais criaturas mutantes
nós somos o que as condições do nosso ambiente o
determina
sorridentes hoje
amanhã chorando como se não tivéssemos sorrido tanto
no dia anterior
não somos satisfeitos pelas mesmas coisas todos os dias
cada dia um instrumento de lazer diferente
por vezes até pessoas tornam-se instrumentos de outras
e mesmo assim não nos sentimos satisfeitos
procuramos tudo
todos os dias
e encontramos nada
todos os dias
sabemos o que queremos
o que precisamos
o que nos deixa tristes
o que nos torna felizes
volta e meia já não.
infância
e se eu
me embebedar desse Gin
e tentar não ficar desperto
estar offline
ou desconecto de tudo
pelo menos não do efeito
do Ginsobre mim
mas ainda assim
tentar frear os pensamentos
deixar-me mais slow
e no entanto
a garrafa está bem aí
na garrafeira
sem olhos
mas olhando pra mim
2 metros de distância a direita
os copos estão na cozinha
a 18 metros de mim
já um coxe distante
mas eu posso muito bem
beber da garrafa
e se eu der um gole
e não conseguir mais parar,
a menos que além da garrafa
a garrafeira toda acabe
penso nisso durante
um intervalo de tempo
suficiente pra me fazer desistir
da ideia de levantar
desse sofá que mais parece
um urso de peluche
a abraçar-me
e não mais querer largar
me perco nesse conforto
e não me consigo levantar
são 8 horas e meia
estou atrasado pro trabalho
vou enfrentar a vida assim mesmo
sem a garrafa de Gin
nem a garrafeira
o que eu queria
e se o cupido
não fossse o cupido
aliás
se fóssemos nós mesmos
envolvidos nessa equação
acertaria-mo-nos com as ditas flechas?
querias tu apaixonar-te por esse preto
de óculos, jeans e cabelos africanizados
bem à frente de ti?
e mesmo sem
as ditas flechas
eu
apaixonar-me-ia por ti
só precisava daquele momento
aquela revirada angular perfeita
dos meus olhos
ao encontro dos teus
eu só precisaria chegar perto
perguntar o teu nome
ouvir-te pronunciá-lo
segurar a tua mão alguns instantes
e essas seriam as minhas únicas flechas
realidades aleatórias e paradoxais
passeios
compras ao shopping,
jantares
crianças
leite e cereais
choradeiras por todo canto da casa
e um quintal vasto
pros domingos reunidos
conheci a Hailly
era doce
como todos os doces juntos
era um exagero
tipo chocolates
em cima do mel
e depois a azaléia
que tinha quedas por flores
de todas as cores
ela dizia
flores como as cores do arco íris
flores como as estrelas
que são todas lindas
e brilhantes
e que os meus olhos
só conseguem ver
e não consigo contar
rosas
orquídeas
não importa
só flores
todas elas
brilhando ao brilhar do sol
e os seus cheiros
ah, sim
eu lembro que
não se comparavam aos dela
dessa lista
tem também a Kelly
louca por compras
instagram
fotos
cinemas
parques de diversão
e festinhas privadas
ela amava viver
aproveitar a vida
sem amanhã
apenas hoje
além da partícula
mais ínfima
de que sou feito
átomo ou célula
sou feito
também
daqueles beijos
abraços
olhares
e daqueles sentimentos
que me fazem
um pouquinho mais humano
é meio estranho
esse contraste
como é possível
eu não gostar tanto de mim
às vezes
e ela gostar tanto de mim
sempre
porque
eu sou isso tudo aqui
eu sou esse andar desajeitado
esse falar sem dicção compreensível
esse estilo de vestir meio sem graça
eu sou também
os meus medos
eu sou feito
das minhas imperfeições
também
não tão só
demoro um tempão
decidindo o que fazer
pra me sentir
um pouquinho menos só
penso em
músicas
redes sociais
e também em
ir ter com o meu avô
e adormecer mais uma vez
em seu colo
ouvindo suas histórias
só preciso de um pouco
de paz aqui dentro
antes que tudo
enlouqueça de novo
aqui dentro
continuo lendo
Charles Bukowski
apesar de dizerem que
os seus conteúdos
são só sobre
mulheres
sexo
drogas
e coisas assim
o sol brilha
e a pretidão do meu sombreado
fica cada vez mais notório
acho que já não estou tão só…
ela acompanha-me
em todos os lugares que vou
falo da sombra
e de mim
como se fóssemos
individualidades diferentes
apesar do brilho da luz
o escuro do sombreado
ainda está lá
e as vezes
de forma mais acentuada
aos 12
aos 12
como qualquer
adolescente comum
(acho)
passava tempo
pensando em ter
mais pares de ténis
no primeiro beijo
pensava nas palavras certas
pra dizer se tivesse bem ao lado
do meu primeiro crush
a Clarice
que morava do outro lado da rua
mas que antes de chegar à escola
eu dava a volta passando por lá,
só pra esbarrar com ela no meio da rua
pensava em crescer
ser adulto
ganhar pelos no rosto
uma voz super grave
e uma altura
que me permitisse chegar
às prateleiras lá de cima
aos 12
eu pensava em ser
como o meu irmão mais velho
usar as suas roupas
falar com pessoas que ele falava
ir em lugares que ele ia
viver os seus sonhos
e realidades também
mesmo filme
mesmo filme
as mesmas falas
o Theodore Finch
continua solitário,
sonhador,
altruísta
e uma aberração
para alguns,
menos pra Violet
e pra ele
ela continua
com todas as cores nela
com muito brilho
é o mesmo filme
já o vi 3 vezes hoje
e umas 20 vezes
nos últimos 8 meses
o Theodore Finch
continua morrendo
em cada final
não é que eu tenha
alguma esperança
de que o roteiro mude...
mas talvez eu tenha perdido
algum detalhe
de alguma cena do filme
talvez não tenha assistido como deve ser
talvez eu tenha,
tipo numa escala de 10
uns 4 ou 3,5 de esperança
que o roteiro mude
sei lá
que se aumente alguma coisa
ou somente que Finch
não morra em cada final que eu vejo.
momentos
comprou dois
pacotes de batatas
Lays
cigarros
uma Heineken
e dois sumos
veio ter comigo
pra gente ver
a última saga
de Spider Man
depois disso
fomos ao youtube
vimos alguns
vídeos de Charlie Chaplin
eu estou afim
de não levar
isso tudo
pras redes sociais
sem holofotes
acho que isso tudo
tá bem confortável aqui
entre 4 paredes
lençóis
cama,
clima quente
ou frio
abraçados
conectados espiritual
e fisicamente
ou melhor
eu diria
que estou afim
de aproveitar
esse instante aqui
nesse lugar
que dessa vez
está sem paredes
porque conseguimos
sentir essa brisa
embatendo contra
nossos rostos
massageando nossos espíritos
e igualmente
conversando conosco
tenho o que tu precisas
vem logo
porque eu tenho
o que tu precisas
duas taças
e uma garrafa do melhor vinho
se não gostares
eu trago
o melhor champanhe
também
eu tenho
o que tu precisas
tomei um duche
tenho
o meu corpo todo perfumado
estás exausta
deve ser da rotina
acredita
eu tenho o que tu precisas
massagem aos pés
e depois ao corpo todo
eu tenho
a pizza no forno
já tenho
a cama arrumada
e o edredom mais macio
eu tenho
a tua música favorita
o teu filme favorito
o teu poema favorito
e o meu olhar
que é o teu favorito
telegrama
fax
sei lá
só dê um sinal
ligue um farol
acenda uma chama
faça fumaça
não importa
só não deixe
de dizer alguma coisa
dê um sinal
qualquer que seja
assim eu saberei
que ainda estás aí
e se estiveres mesmo aí
eu tenho o que tu precisas
meu ponto fraco
trocamos
o whatsapp
ela puxou-me
cantando
e eu fiquei
todo apaixonado
...
aliás, arrepiado
música
é meu ponto fraco
ela devia saber
ah
eu não lhe contei
então o lance
torna-se logo clichê
fiz um down de sua voz
agora é das melhores
da minha playlist
tanto em minha cabeça
quanto em meu celular
ouço ela
dormindo
acordado
quando triste
e alegre
e...
enquanto escrevo também
e sinto aquela
velha sensação
de se estar seguro de algo
eu fico seguro
de várias coisas
quando ouço
aquela voz,
que ela é linda
e que se morresse ouvindo ela
não me arrependeria
eu devia ouvir
mais os conselhos
da minha velha
quando diz
pra eu evitar usar
fones de ouvido
e sons bastantes altos
mas nesse momento
eu só consigo ouvir ela
então
acho que
devo dizer
azar pra velha
um só coração
um sentimento
um lugar
uma cama
um lençol
uma voz
que me faz
apaixonar
vejo
o inevitável
a acontecer
eu
me apaixonando
por isso tudo
o céu
a ser invadido
por todas as cores
de prazeres
eles
nos insignificam
a poeira estelar
...
mas
somos especiais
somos
poesia sobre estrelas
teorias
de como ela
consegue me amar
por completo
quando eu
me odeio
por inteiro
invadem logo
o meu cérebro
minha poesia
minha poesia
é reflexo de ti
se leres
consegues ver
e sentir
tem vezes
que eu próprio
nem sei como reagir
se digo
o que sinto
na tua cara
ou só fico aí
especado
a olhar pra ti
não sei
se vai ter um fim
parece que
sou um jardineiro
que nunca colhe
as flores desse jardim
é assim
que me sinto
ora triste
volta e meia a sorrir
pensando em ti
o que me fazes sentir
é só eu pensar em ti
que tudo parece
ganhar um outro ritmo
me sinto mais vivo
mesmo sem
explicação óbvia
sorrindo
sabe…
eu estou deixando
o orgulho de lado
pra dizer
que eu te amo
e que…
o exagero é premeditado
quando falo
que te faço
ter orgasmos
só te olhando
te deixando
com as pernas bambas
que nem as cordas de uma guitarra
e quando ligo pra ti
digo
que a tua voz é um mimo
tu ficas sorrindo
e aquilo
fica parecendo
o sol no cacimbo
jeito estranho e esquisito ao mesmo tempo
estou tentando
achar um jeito
de fechar os olhos
e não pensar em ti
tem vezes
que nem é preciso
fechar os olhos
a tua imagem
está grudada em mim
de um jeito estranho
e esquisito ao mesmo tempo
olhas pra mim
e logo me sinto completo
de um jeito estranho
e esquisito ao mesmo tempo
a gente se ama
e eu fico fascinado
com o teu cheiro
de um jeito estranho
e esquisito ao mesmo tempo
tu olhas pra mim
como da primeira vez
sempre com a mesma
delicadez
de um jeito esquisito
e ...
aliás
de um jeito especial
especial do nosso jeito
claro
nos levamos a conhecer
qualidades
nunca antes descobertas
sorrisos lindos
que passavam
totalmente despercebidos
nostalgias
transmitidas
através das nossas vidas
o amor
já foi
muitas coisas
pra mim
mas tu
és a melhor delas
mesmo despercebidas
as pessoas
conseguem notar
a diferença
é muito brilho
parece que namoro
com uma estrela
ou sei lá
uma deusa
se calhar
uma princesa
que faz parte
duma verdadeira
realeza
és cereja
no topo da natureza
perfeita
como a cinderela
ou os meus poemas
tem gente
sentindo inveja
que se foda
sem tempo
pra essas
babuzeiras
tu és linda
sem pedir licença
e é uma
verdade sincera
ao mesmo tempo
concreta
parece que não
mas estou
em sã consciência
não fumei
nenhuma erva
serás sempre
eterna
devias ganhar
uma estatueta
porque a tua beleza
exagera
e deixa esses haters
com a mão na cabeça
tu
tu brilhas
mesmo sem o sol
as pessoas
sentem ódio de ti
mas tu dás amor
nos passeios
que nós demos
fizeste-me perceber
que existia
sinfonia
nas maravilhas
que tu sentias
e vias
o trânsito
não era só o trânsito
pessoas passando
tansmitiam
uma aura diferente
e tu dizias
que só sente
quem sente
e quem
te compreende
não é só
um inteligente
tu ainda
disseste
sobre os risos
que branqueavam
os dentes
meninos de rua
sem nada
mas
ao mesmo tempo
tudo
esquecendo
um pouco o orgulho
gente procurando
abrigo
e tu eras
o teu grande
lugar no mundo
o nosso jeito de amar
o nosso
jeito de amar
faz o tempo parar
os passáros
cantar
os nossos corações
acelerar
o nosso
jeito de amar
diz tudo
mesmo sem
a gente falar
mesmo acordados
sempre a sonhar
o nosso
jeito de amar
traz luz
nos faz brilhar
e as pessoas
não param de olhar
o nosso
jeito de amar
faz lembrar
o namorar
do céu
e do mar
ou o céu
estrelado
nas noites de luar
o nosso
jeito de amar
nos devolve o ar
nos faz
voltar a respirar
você
tu és muito linda
e isso é notório
até no teu jeitinho de olhar
eu fico pasmo
como tu consegues
fazer o teu olhar cintilar
o que sinto é imenso
parece-se com o mar
quando não estás
minha respiração
fica aeróbica
sem ar
meu passatempo favorito
é te amar
tu és uma estrela
devias estar no céu
só quero estar
ao teu lado
pareço Romeu
eles julgam-me por te amar
chamam-me de réu
só querem ouvir
que o nosso amor morreu
mas a verdade
é que ele cresceu
e é como as crianças dizem
“saiu daqui
até ao céu”
diferente
discussões
sabem a café sem açúcar
olhares
já não são os mesmos
parecem disputas
a mágica se foi
as coisas ficaram
realistas demais
nem sei
como a gente
chegou a esse ponto
se é uma opção?
i dont know
mas eu sei
que acontece
toda vez que você
não está aqui
talvez eu me apaixone
desse jeito
com olhares discretos
meio inquieto
tremendo
sempre que tenho
a pessoa amada por perto
talvez eu me apaixone
desse jeito
cruzando com a pessoa
meio à rua
ou em qualquer beco
com olhares um sobre o outro
atentos
a cada detalhe de nossos movimentos
talvez eu me apaixone
com balões ao ar
luz de luar
fogos de artifício
e momentos que nos fazem perder o ar
talvez eu me apaixone
tentando decifrar poesias
no sorriso da pessoa amada
talvez eu me apaixone
contemplando o pôr do sol
ou as estrelas
tentando entender o universo delas
ou o quão são belas
eu tenho de me decidir
mas pensando bem
talvez seja no estar frente a pessoa
querer dizer tudo
e mesmo assim não conseguir dizer nada
como se tivesse algo preso à garganta
...
fazer durar
o durante,
apreciar-te
que nem uma
obra de arte,
beijar-te
e com isso
tocar
a Lua
e Marte,
amar-te
ao ponto de
estar distante
e a mesma
conseguir
tocar-te,
cada pedaço
de ti
está grudado
em mim
que em
pensamentos
consigo
desenhar-te,
são insuficientes
as palavras
então
diz como
elogiar-te,
porque
eu fico
me perguntando
se existe
um jeito melhor
de apreciar-te,
porque eu
fico dizendo
que te amo
a toda hora
como se
só de amor
se tratasse
eu
Luís
que nem
Camões
tentando
alcançar a
sabedoria
e calma
de um monge
a natureza
se comunica comigo
por sons
e vibrações
a arte
quer que
a gente namore
estou voando
sem passaporte
sem direção
procurando o norte
querendo
que essa dor some
mas em torno de mim
ela se move
gente olhando
mas ninguém se comove
não me conhecem
mas me chamam nomes
dizem horrores
mas isso não muda o meu humor
tem muito mais em mim
aquilo que chamam de amor
o poder em mim
acendo um baseado
mas não o fumo
só fico mesmo observando
a chama consumindo
tudo de que ele é feito
mas ele não deixa de existir
tomando apenas outras formas
fumo
e cinza
que de seguida são arrastados pelo vento
enquanto aprecio
conscientizo-me de que
ninguém vai cuidar tão bem de mim
senão eu mesmo
eu sinto as minhas dores
melhor que ninguém
do mesmo jeito
conheço as minhas cicatrizes
como ninguém
todos os contornos
e o que representa
cada uma delas
posso me erguer
ou também
me consumir por dentro
que nem aquelas chamas
fazem com o baseado
meus medos
derrotas
ansiedades
depressão
tudo isso concorre
pra minha autodestruição
mas meio a isso tudo
eu lembro
que fui eu
que acendi o baseado
então
em mim
está o poder
de apagá-lo
sobre a miúda que estuda medicina
chama-se Day
tem 21 anos
estuda medicina
tom de pele
que faz lembrar
café e leite juntos
cheiro à flores frescas
aliás, ela tem cheiro próprio
então é justo dizer
que essas mesmas
flores frescas
cheiram a ela
ama músicas
as menos dançantes
por isso
não para de ouvir
Carolina Deslandes
eu queria baijá-la
bem antes de a conhecer
antes do aperto de mãos
do abraço
ou mesmo
dos dois beijinhos no rosto
soaria estranho
dois desconhecidos
se esbarram no meio da rua
e daí se beijam
ou melhor
um beija o outro
anos se passaram
e a impressão que
tenho dela agora
é a mesma de antes
de a ter conhecido
continuo apaixonado
e continuo querendo beijá-la
apesar de já não ser
um total desconhecido
apesar de hoje
ela ser mais minha
que o meu próprio ADN
mais minha
que a minha própria
impressão digital
nossa língua
nossas mãos
se tocam
nossas células
vibram
se comunicam
falamos a mesma língua
eu amo você
e você me ama
e isso conforta
a minha alma
dá uma paz enorme
que não traduz apenas
ausência de conflitos
mesmo distante
eu sinto
lembranças suas
não faltam
é como se eu
tivesse a reviver
o momento
again
and again
como um carrossel
em minha cabeça
pra gente
eu quero
um conjunto
de infinitos
infinitos olhares
infinitos beijos
infinitos abraços
infinitas risadas
infinitos “eu amo você”
em cada manhã
que a gente
seja infinitos
num mundo
onde nada
parece durar
pois é
quero ser folha
só pra colar nos troncos
e bailar com o soprar do vento
sem medo de cair e me ferir
só pra ter o gosto de não sentir
o que os humanos sentem
mas
nem sempre era assim
tinha dias em que se sentia leve
onde aquele peso se iria embora
nesses dias o Isak teve ao lado
tirava fotos de seu sorriso
só pra lhe lembrar todos os dias
do quão lindo era
escrevia poemas
e lhe descrevia neles
Cleópatra
Aristóteles
Charles Darwin
Albert Einstein
todos serão esquecidos um dia
é inevitável
mas pelo menos serão lembrados
em um determinado intervalo de tempo
cada um tem o seu
e no meu intervalo de tempo
quero ser lembrado como
o cara que te amou
de um jeito que ninguém o fez
– disse Isak
continuando
contava coisas sobre ela mesma
coisas que ela não sabia
da combinação de seu olhar
através de seus óculos
do andar desajeitado
mas especial
e que só tudo o que ela representava
fazia dele tão bom fotógrafo
ou escritor
café da manhã
tomamos à tarde
bacon
ovos
chá
ela odeia chá
então
tem café ao lado
apanhamos sol
enquanto ele morre ao seu pôr
leio poemas
ela devolve o favor
cantando pra mim
canções como
“Monarquia”
o ivandro devia
aprender com essa menina
e sobre ela
eu falo
sobre ela
sem falar
aliás, sem linguajar
ela dança
enquanto o vento
faz o tecido de seu vestido
colar bem na sua pele
parecendo uma só
fazendo delineações
do seu corpo
eu não paro de olhar
God
ela é tão...
calma,
eu devia arranjar
um novo adjetivo
esse não serve
enquanto não arranjo
vou só ficar aqui
mais um pouco
sem palavras
olhando pra como ela
dança
desligar-me
comprimidos ajudam-me a adormecer
o Gindá as boas vindas
aos comprimidos dentro do meu estômago
vários problemas
acrescentam-se ao facto
de não conseguir adormecer
a tv já não me entretém
nem o sexo casual com diferentes mulheres
eu preciso dormir
no dia seguinte
o meu maldito emprego
espera por mim
e eu tenho de pagar as contas
mas não consigo me desligar
os comprimidos
e o Ginnão apagaram-me
eu continuo aqui
sentado sobre o sofa velho
com os olhares sobre
o piano velho da minha falecida mulher
conversas sobre
onde os mortos vão quando morrem
ou os vivos que mesmo vivos desistem de viver
de onde vem todas as ansiedades
todos os medos
sonhos e pesadelos
conversas sobre a origem de tudo e do todo
conversas sobre a existência de outros seres fora dessa
bolinha azul
outros céus
outras terras
outros ares
outros mares
outros olhares
conversas sobre
o que é realmente importante pra nós
conversas hoje
sem existir amanhã
ou seja
sobre um agora
sem um depois
ou qualquer coisa antes disso
conversas
é o que tenho
sempre que me vou deitar
conversas
o que me faz conversar
mesmo sem alguém pra conversar
a gente
conversamos
mas dessa vez sem falas
olhares ou contacto
apenas com o fumo da erva que partilhamos
e é com ele que digo “te amo”
a lua, as estrelas
o sistema do sol
o universo
está tudo radiante
mas estou cagando pra tudo isso
só preciso olhar pra ti
nem que surgisse agora uma super-nova
nem que acontecesse um big-bang agora
e fizesse surgir novos universos
perfeito imperfeito
meio ausente de mim
tão presente em ti
eu usei
em minhas escritas
um pouco de ti
um pouquinho de mim
e muito de nós
muito dos beijos
muito dos desejos
muito das falas
muito dos momentos
e tudo pareceu perfeito
porém imperfeito
um meio termo
deixa
o teu cheiro
as tuas roupas
os teus gestos
quando fores
ao menos deixa
os teus beijos comigo
deixa o teu abraço comigo
deixa a tua paz comigo
deixa as piadas
e as risadas
e não só
as memórias
das tuas risadas
acho que
estás mais pra aquela
bendita nuvem que tapa
aquele ardente
e radiante sol
numa tarde de calor
eu te amo
e não é algo
que eu simlpesmente acho
o que somos?
é importante sabermos o que somos.
vocês sabem quem são?
a verdade é que a velocidade conta menos que a direção
ódio
amor
o que temos aqui dentro far-nos-á quem somos
o que somos?
problema ou solução?
somos o cidadão que deita o lixo ao chão
e depois tem de lidar com o mosquito e o paludismo?
...
o que somos?
mudamos
provavelmente
estamos cansados
dessa insconstância
estamos cansados
dessas mudanças
o universo
movimentou-se
mudou
as coisas
não são as mesmas
as plantas cresceram
o oceano está mais poluído
as temperaturas climáticas
aumentaram
surgiram novas estrelas
não obstante as antigas
ainda estarem lá
nós seguimos
essa dança do universo
mas cada um
dançando sozinho
ao seu ritmo
aos seus paços
eu lembro,
deve ser por isso
que continuo escrevendo
na única língua
que tu dizias ser perfeita
ou talvez só seja
por não ter aperfeiçoado
outras línguas ainda
mas não precisávamos de muitas
quando era pra dizer te amo
mesmo sem algumas delas
dir-nos-íamos “te amo”
com todas as letras
ou sem elas,
com todos os sons
ou sem eles
palavras
palavras
pavimentam
caminhos
na minha cabeça
palavras
transformam-me
palavras
dizem
o que eu quero dizer
e ao mesmo tempo não
palavras
dão me asas
mas não me tornam
anjo nem ave
palavras
estou cheio delas
que nem os livros estão
precisas de algumas?
viajante do tempo
tudo é diferente
e essa diferença
é muito mais ruim do que boa
mas quando ela está ao lado
o mundo é um pouco menos ruim
nota do autor
decidi escrever uma obra muito mais livre, em que
estou despreocupado com conceitos, padrões, e regras de
estéticas. nesta obra eu estou livre de ideias de vendas e
propagandas astronómicas, livre do que é politicamente aceite,
livre de pré concepções, pois ela (a obra) pode ser ou
significar aquilo que tu menos esperas.
do mesmo modo que eu me senti livre ao escrever
tudo isso, eu quero que vocês sintam-se livres ao ler, sintam-
se livres de algumas amarras que a sociedade nos impõe. que
deixem de lado todos os padrões que vocês aprenderam lá
fora, e sintam-se convidados a experimentar algo novo, pois
desse jeito agregarão algum valor, diferente do que já sabem
ou acreditam, sem terem que julgar.
sintam-se inspirados, sintam-se motivados. e
absorvam alguma coisa, porque a intenção é ser cada vez
melhor pra nós mesmos e também pra os nossos.
escrevi uma obra pra sentir. não escrevi palavras,
escrevi sentimentos. escrevi não pra atingir o maior número
de downloads, e ser visto como o jovem prodígio que bateu
records. escrevi pra tocar, inspirar pessoas a sentirem-se
capazes, a sentirem-se um pouco mais elas mesmas, nesse
mundo onde somos cada vez mais tudo, menos nós mesmos,
sentimos quase tudo, menos a nós mesmos, ouvimos quase
tudo, menos a nós mesmos.
sobre o autor