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SUMÁRIO

1. GLOBALIZAÇÃO E EXPANSÃO DO MERCADO DE CAPITAIS ............ 2

2. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E LEI ANTICORRUPÇÃO............... 6

3. LAVAGEM DE DINHEIRO ..................................................................... 15

4. CORRUPÇÃO ....................................................................................... 22

5. A LEI DE LICITAÇÕES .......................................................................... 29

6. RESPONSABILIZAÇÃO POR ATOS DE CORRUPÇÃO E FRAUDES A


LICITAÇÕES E CONTRATOS .................................................................................. 39

7. BIBLIOGRAFIA ...................................................................................... 44

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1. GLOBALIZAÇÃO E EXPANSÃO DO MERCADO DE CAPITAIS

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Este capítulo aborda as questões éticas de uma pesquisa de mercado. Por isso,
antes de tudo, você deve ter em mente o conceito de ética. A ética abrange os
princípios que regem o comportamento das pessoas em sociedade. Tais princípios
norteiam a forma de agir de cada cidadão. Segundo Stukart (2003, p. 14), “[...] a ética
não analisa o que o homem faz, como a psicologia e a sociologia, mas o que ele
deveria fazer. É um juízo de valores, como virtude, justiça, felicidade, e não um
julgamento da realidade”. Já para Alencastro (2007, p. 31), “A ética seria a instância
geral, muitas vezes utópica, mas que é capaz de promover a reflexão e a crítica em
relação às ações humanas” (SILVA, 2019).
Assim como as pessoas, as empresas também seguem padrões éticos na
condução de seus negócios, que sempre envolvem algum tipo de relação, seja com
seu público interno, seja com seu público externo. Uma das formas de as empresas
interagirem com seus públicos, a fim de entender seus desejos, necessidades, perfil
e hábitos de compra, é a pesquisa de mercado. Há diversas técnicas de pesquisa de
mercado, mas o que todas elas têm em comum é a necessidade de serem conduzidas
segundo padrões éticos, respeitando a individualidade dos entrevistados e a
privacidade dos dados coletados e ainda promovendo uma análise correta das
informações geradas (SILVA, 2019).
Embora o mercado esteja cada vez mais competitivo e agressivo, não há
espaço para condutas antiéticas na realização de pesquisas de mercado. Assim, é
indispensável uma postura responsável e correta para que haja confiabilidade dos
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clientes em relação às marcas pesquisadas. O pesquisador possui, então, um
importante papel, no sentido de realizar seu trabalho sem ferir a ética que deve
caracterizar uma pesquisa de mercado (SILVA, 2019).
O pesquisador é aquele responsável por conduzir a pesquisa, podendo ser uma
pessoa ou até mesmo uma empresa. A Câmara Internacional de Comércio (ICC) e a
Sociedade Europeia para Pesquisa de Opinião e Mercado (Esomar) elaboraram um
código de ética que é referência para as pesquisas de mercado. O Código ICC/Esomar
para Pesquisa de Mercado e Pesquisa Social (2008) define pesquisador como aquele
indivíduo, agência ou departamento responsável pela realização de uma pesquisa de
mercado. Assim, o pesquisador é peça fundamental na condução de uma pesquisa
de mercado, sendo responsável pela elaboração dos questionamentos realizados,
pela coleta de dados, pela interpretação das informações e pela divulgação posterior
de uma pesquisa de mercado (SILVA, 2019).
O pesquisador deve observar as questões éticas para não ser negligente no
exercício da sua profissão. Ele deve preservar a confiança de clientes e pesquisados
na condução das pesquisas de mercado, além de zelar pela segurança dos dados e
informações coletados.
O Código ICC/Esomar (MARCHESI; FONTOURA, 2008) elenca as principais
responsabilidades relativas à ética em uma pesquisa de mercado. Veja:
 Os pesquisadores não devem, de forma consciente ou negligente, agir de modo a
trazer descrédito a uma pesquisa de mercado;
 Os pesquisadores não podem depreciar outros pesquisadores;
 Os pesquisadores devem planejar uma pesquisa aliando eficiência a custo
adequado;
 Os pesquisadores devem zelar pela segurança de todos os registros da pesquisa
em sua pose;
 Os pesquisadores não devem permitir de forma consciente que sejam
disseminadas conclusões que não estejam corretamente embasadas;
 Os pesquisadores não devem utilizar os dados de pesquisados para atividades de
marketing direto (MARCHESI; FONTOURA, 2008).
 Os pesquisadores não devem, de forma consciente ou negligente, agir de modo a
trazer descrédito a uma pesquisa de mercado;

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 Os pesquisadores não podem depreciar outros pesquisadores;
 Os pesquisadores devem planejar uma pesquisa aliando eficiência a custo
adequado;
 Os pesquisadores devem zelar pela segurança de todos os registros da pesquisa
em sua pose;
 Os pesquisadores não devem permitir de forma consciente que sejam
disseminadas conclusões que não estejam corretamente embasadas;
 Os pesquisadores não devem utilizar os dados de pesquisados para atividades de
marketing direto (MARCHESI; FONTOURA, 2008);
É evidente a importância do papel do pesquisador e as suas responsabilidades
para que as pesquisas de mercado sejam conduzidas dentro de padrões éticos. Isso
possibilita que haja confiabilidade de todas as partes envolvidas nesse processo, que
é vital para a competitividade organizacional.

A ética e a pesquisa de mercado

Como você viu, é muito importante que o pesquisador observe as questões


éticas que envolvem uma pesquisa. Essas questões incluem desde o problema de
pesquisa — ou seja, as perguntas que se deseja responder por meio da ferramenta
— e permeiam a elaboração dos questionamentos e a sua aplicação. A ética deve ser
observada, inclusive, na fase de análise e constatação dos resultados obtidos.
No Quadro 1, veja as principais questões éticas presentes em cada uma das
fases do processo de pesquisa de mercado. Uma pesquisa de mercado tem o intuito
de responder a algum questionamento de mercado, suprindo necessidades
empresariais (SILVA, 2019).
Quadro 1: Possuem um profundo grau de complexidade e definem o rumo dos
negócios das empresas envolvidas. Dessa forma, a ética é um elemento indispensável
em cada uma dessas etapas.
Quadro 1. Questões éticas da pesquisa de mercado:

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Etapas da pesquisa de mercado Questões éticas a serem observadas
No problema de pesquisa Beneficiar ou não prejudicar os participantes.
Na coleta de dados Não coagir participantes a participar da
pesquisa. Deixar clara a natureza da pesquisa.
Respeitar a privacidade do participante.
Na interpretação dos dados Manter o anonimato das pessoas e pesquisas
envolvidas. Evitar a reutilização dos dados de
uma pesquisa em outro momento e por terceiros.
Gerar informações precisa e extas.
Na divulgação da pesquisa Evitar supressão, invenção ou falsificação de
resultado. Não realizar análises equivocadas por
despreparo técnico.

Uma pesquisa de mercado tem o intuito de responder a algum questionamento


de mercado, suprindo necessidades empresariais. As quatro etapas apresentadas no
Quadro 1 possuem um profundo grau de complexidade e definem o rumo dos
negócios das empresas envolvidas. Dessa forma, a ética é um elemento indispensável
em cada uma dessas etapas (SILVA, 2019).

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2. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E LEI ANTICORRUPÇÃO

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A Carta Constitucional de 1988, ao dispor sobre os princípios que regem a


Administração Pública, elenca o princípio da moralidade administrativa, que se traduz
como a atuação conforme o padrão jurídico da moral, boa-fé, lealdade e honestidade
perante o Poder Público. É nesse sentido que o seu artigo 37 prevê que os atos de
improbidade administrativa deverão ser responsabilizados.
Por esta razão, as leis 8.429/92 e 12.846/13 apresentaram-se como resposta
do legislador para aqueles que praticam atos que resultam no enriquecimento ilícito,
danos ao erário público e ofensa aos princípios norteadores da Administração na
seara pública. Embora tenham sido criadas em épocas distintas, ambas
representaram a insatisfação da população em geral com condutas que lesavam de
alguma.
Em verdade, a Constituição Federal não apresenta uma definição específica no
tocante à forma a atividade pública (BRASIL, 2013).
Muitos doutrinadores apresentam distinções quanto ao sentido de probidade e
moralidade, uma vez que ambas as expressões são mencionadas na Constituição
Federal. improbidade administrativa, embora a ela se refira diversas vezes. Há,
contudo, a previsão em seu artigo 37, de que as ações de improbidade administrativa
resultarão nas seguintes sanções: suspensão dos direitos políticos, indisponibilidade
dos bens, perda da função pública e o ressarcimento ao patrimônio público, na forma
e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível (SOUZA, 2018).

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O princípio da moralidade não traduz um conceito de fácil compreensão, na
medida em que não é possível compactar em um ou dois vocábulos a ampla gama de
condutas e práticas desvirtuadoras das verdadeiras finalidades da Administração
Pública (SOUZA, 2018).
Em geral, a percepção imoralidade administrativa ocorre no enfoque contextual;
ou melhor, ao se considerar o contexto em que a decisão foi ou será tomada. A
decisão, de regra, destoa do contexto, destoa do conjunto de regras de conduta
extraídas da disciplina geral norteadora da Administração (SOUZA, 2018).
O princípio da moralidade administrativa é de alcance maior, é conceito mais
genérico, a determinar, a todos os ‘poderes’ e funções do Estado, atuação conforme
o padrão jurídico da moral, da boa-fé, da lealdade, da honestidade. Já a probidade,
que alhures denominamos ‘moralidade administrativa qualificada’, volta-se a particular
aspecto da moralidade administrativa. Parece-nos que a probidade está
exclusivamente vinculada ao aspecto da conduta (do ilícito) do administrador. Assim,
em termos gerais, diríamos que viola a probidade o agente público que em suas
ordinárias tarefas e deveres (em seu agir) atrita os denominados ‘tipos’ legais
(SOUZA, 2018).
Destaca-se, contudo, que as expressões moralidade e probidade se equivalem,
compreendo-se a moralidade como um princípio apresentado no artigo 37, caput, da
Constituição Federal e a improbidade como lesão ao referido princípio (SOUZA,
2018).
Neste sentido a associação das expressões torna-se inquestionável, aduzindo
ser uma afirmação embasada pelos dicionaristas. Em sua visão, não haveria
necessidade na busca por diferenças semânticas, já que ambas as expressões são
utilizadas para o mesmo fim: a preservação do comportamento moral e leal no âmbito
público. E por esta razão, conclui, diante do direito positivo, o agente ímprobo sempre
se qualificará como violador do princípio da moralidade (SOUZA, 2018).
Os conceitos de probidade e moralidade se complementam, é possível concluir
que as Leis 8.429/92 e 12.845/13 representam um conjunto de regras disciplinadoras
da boa administração, em que o ato ímprobo, ou ordinariamente traduzindo-se em
imoral, não pode ter espaço na atuação pública, seja pelo agente público ou pelo

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terceiro, pessoa física ou jurídica, que da máquina administrativa se utiliza (SOUZA,
2018).
Neste sentido, o princípio da moralidade se traduz como uma bússola que age
norteando a conduta do administrador no sentido de que, embora a prática
administrativa esteja restrita à legalidade, esta terá que ser obrigatoriamente uma
conduta de acordo com os ditames éticos e morais presentes atualmente na
sociedade (SOUZA, 2018).
A Lei 8.429/92 trouxe para o ordenamento jurídico um instituto legal de combate
à improbidade administrativa, na medida em que a improbidade promove um
desvirtuamento de Estado quanto gestor público e afronta aos princípios nucleares da
ordem jurídica, que se revela através da obtenção de vantagens patrimoniais
indevidas às custas do erário, bem como através o exercício nocivo das funções e
empregos públicos e o favorecimento de determinadas pessoas em detrimento dos
interesses da sociedade (SOUZA, 2018).
O combate à improbidade administrativa, contudo, não teve início com a Lei
8.429/92. Ao contrário, a improbidade administrativa, como ato ilícito, já vinha sendo
prevista no ordenamento jurídico brasileiro na forma de outros institutos, tais como os
“crimes de responsabilidade”, no tocante aos agentes políticos, e o enriquecimento
ilícito no exercício do cargo ou função, no que se refere aos servidores públicos em
geral (SOUZA, 2018).
Em verdade, em Constituições anteriores, como as de 1946 e 1967, a
preocupação do legislador resumia-se em combater o enriquecimento ilícito do agente
público, cenário este que foi gradualmente sendo alterado com a promulgação da
Constituição de 1988, que trouxe conceitos mais abrangentes, tais como os princípios
norteadores da Administração Pública (SOUZA, 2018).
Foi assim que a Lei de Improbidade Administrativa consolidou-se como
instrumento de aperfeiçoamento do controle administrativo indo mais além, na medida
em que buscou disciplinar o que a Constituição Federal de 1988 chamou de
moralidade administrativa, tratando este princípio como um dos princípios
constitucionais impostos à atuação frente a máquina pública (SOUZA, 2018).
A inclusão do princípio da moralidade administrativa na Constituição foi um
reflexo da preocupação com a ética na Administração Pública e com o combate à

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corrupção e à impunidade no setor público. Até então, a improbidade administrativa
constituía infração prevista e definida apenas para os agentes políticos. Para os
demais, punia-se apenas o enriquecimento ilícito no exercício do cargo. Com a
inserção do princípio da moralidade na Constituição, a exigência de moralidade
estendeu-se a toda a Administração Pública, e a improbidade ganhou abrangência
maior, porque passou a ser prevista e sancionada com rigor para todas as categorias
de servidores públicos e a abranger infrações outras que não apenas o
enriquecimento ilícito (SOUZA, 2018).
Desse modo, a Constituição de 1988, ao trazer expressamente os princípios
constitucionais regentes da Administração na esfera pública, quais sejam, legalidade,
impessoalidade, publicidade e eficiência ao lado do princípio da moralidade, buscou
sedimentar a compreensão da prática administrativa não apenas sob o viés da
legalidade estrita, como também efetivou a necessidade de respeito a princípios
éticos, ou seja, o atendimento a regras que estabelecessem uma administração
coerente e pautada na boa-fé (SOUZA, 2018).
A Lei 12.846/2013, popularmente conhecida como “Lei Anticorrupção”, entrou
em vigor no primeiro semestre de 2014 e representou uma resposta do Poder
Legislativo às diversas manifestações ocorridas no ano de 2013, em prol da
transparência na Administração Pública e a luta contra a corrupção no Brasil, assim
como a incorporação, ao direito brasileiro, de regras da Convenção sobre o Combate
da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais
Internacionais, concluída em 1997 e promulgada pelo Brasil pelo decreto n.
3.678/2000 (SOUZA, 2018).
Não obstante referida lei seja conhecida como "lei anticorrupção", a nova lei
não se limitou aos atos vinculados à prática corruptiva, abrangendo, ademais, todas
as condutas que atentam em face do patrimônio público nacional ou estrangeiro,
contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais
assumidos pelo Brasil (SOUZA, 2018).
O grande foco da norma em comento, como pontuado em sua exposição de
motivos, é suprimir lacuna existente no sistema jurídico pátrio no que tange à
responsabilização de pessoas jurídicas pela prática de atos ilícitos contra a

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administração no setor público, em especial por atos de corrupção e fraude em
licitações e contratos administrativos (SOUZA, 2018).
Desse modo, conforme será exposto ao tratar-se do sujeito ativo na Lei n°
12.846/13, está se destaca ao responsabilizar objetivamente a pessoa jurídica, na
seara cível e administrativa, por atos lesivos à Administração Pública, sendo
irrelevante, para tanto, a incidência do agente público nas ações ilícitas descritas, o
que, neste ponto, se diferencia quando comparada à Lei de Improbidade
Administrativa (SOUZA, 2018).
Cumpre registrar que, embora a lei 12.846/2013 não se traduza em verdadeira
inovação legislativa, seus dispositivos legais apresentam mecanismos que, se
corretamente utilizados, podem traduzir-se num aparato eficiente ao combate à
improbidade, tais como a responsabilização objetiva da pessoa jurídica, bem como as
sanções a ela impostas (SOUZA, 2018).
De modo geral, além da obrigação que tem o administrador público de observar
os princípios constitucionais, cujo descumprimento já ensejaria a necessária
reprimenda judicial, o constituinte originário fixou, especificamente com relação à
probidade administrativa, comandos para a regulamentação legal dos sujeitos, atos e
sanções que envolvessem o ato ímprobo.
A Lei de Improbidade considera duas categorias de sujeito ativo: o agente
público, previsto em seu artigo 1º, assim como o terceiro, previsto no artigo 3º, que
mesmo não configurando agente público, induz ou concorre para a prática do ato de
improbidade, ou dele se beneficia.
O artigo 1º, da Lei 8.429/92, assim disciplina:

Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público,


servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou
de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra
com mais de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão
punidos na forma desta lei.
Parágrafo único. Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de
improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba
subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem
como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou
concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita
anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do
ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos (Lei 8.429/92).

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Conforme dispõe o referido artigo, considera-se, primeiramente, sujeito ativo
do ato de improbidade o agente público, servidor ou não, que comete as infrações
disciplinadas nos artigos 9º, 10 e 11 da Lei 8.429/92. O artigo 2º teve a cautela de
definir o conceito de agente público, na medida em que tratou ser:

Todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração,


por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de
investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades
mencionadas no artigo anterior.

Não é o fato de um indivíduo ser servidor público, ou seja, possuir com o Estado
um vínculo de emprego, que o tornará apto a enquadrar-se como sujeito ativo da
improbidade administrativa, em verdade qualquer pessoa, no momento em que efetiva
um serviço ao Estado, torna-se agente público, sejam eles: um agente político, como
parlamentares; os próprios servidores públicos; os militares; assim como os
particulares em colaboração com o Poder Público (SOUZA, 2018).
Questão tormentosa envolve a discussão se os agentes políticos respondem
por improbidade administrativa. Sobre a sua sujeição à Lei 8.429/92, há duas
correntes: a primeira, já superada, defendia que os agentes políticos apenas se
submetiam ao crime de responsabilidade. A segunda corrente, que atualmente
representa a posição do Supremo Tribunal Federal, ensina que os agentes políticos
podem responder por crime de responsabilidade e também por improbidade
administrativa, não configurando bis in idem. Esta demanda deve correr perante o
juízo de primeiro grau, com a exceção do Presidente da República, que deverá
responder somente pelo crime de responsabilidade, possuindo foro privilegiado
(SOUZA, 2018).
No tocante aos magistrados, membros Ministério Público e Tribunal de Contas,
são também estes considerados sujeitos ativos de improbidade, uma vez que se
adequam ao amplo conceito apresentado pelo artigo 2º da lei. Nesse sentido,
inclusive, é o posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, ao afirmar que sejam
considerados agentes comuns, sejam considerados agentes políticos, a Lei n.
8.429/92 é plenamente incidente em face de agentes supracitados por atos
alegadamente ímprobos que tenham sido cometidos em razão do exercício de seu
mister legal (SOUZA, 2018).

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No conceito de agente público e sujeito ativo de improbidade também se
incluem os notários e registradores, bem como médicos conveniados ao SUS, uma
vez que exercem atividade delegada do Poder Público (SOUZA, 2018).
Os empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, bem
como as entidades beneficiadas por auxílio e subvenção estatal não se qualificam
tecnicamente como agente públicos, falando-se, em verdade, em empregados
privados. Contudo, são assim considerados para efeitos da Lei de Improbidade
Administrativa, por haver expressa determinação legal. Ressalva-se em relação aos
empregados e dirigentes de concessionários e permissionários de serviços públicos.
Sustenta que as pessoas citadas, não obstante estejam prestando serviço público por
delegação, não se sujeitam à Lei de Improbidade, pois são remuneradas por tarifas,
de modo que o Estado, como regra, não lhes destina benefícios, auxílios ou
subvenções (SOUZA, 2018).
Por sua vez, também será sujeito ativo o terceiro, ou seja, toda a pessoa física
ou jurídica que praticar o ato de improbidade administrativa, concorrer para a sua
prática, ou dele se beneficiar (SOUZA, 2018).
Para que o terceiro seja responsabilizado pelas sanções da Lei n. 8.429/92 é
indispensável que seja identificado algum agente público como autor da prática do ato
de improbidade. Assim, não é possível a propositura de ação de improbidade
exclusivamente contra o particular, sem que haja a presença de agente público no
polo passivo da demanda (SOUZA, 2018).
Cumpre registrar, ainda, que apenas titulariza a pessoa física como terceiro
sujeito ao ato de improbidade, excluindo-se a pessoa jurídica. As condutas de indução
e colaboração para a improbidade são próprias de pessoas físicas, na medida em que
quanto à obtenção de benefícios indevidos, em que pese a possibilidade de pessoa
jurídica ser destinatária deles, terceiro será o dirigente ou responsável que
eventualmente coonestar com o ato dilapidatório do agente público (SOUZA, 2018).
A discussão quanto à responsabilização da pessoa jurídica pela Lei de
Improbidade Administrativa, contudo, perdeu força diante da promulgação da Lei
12.846/13, uma vez que esta apresenta expressamente a pessoa jurídica como sujeito
ativo, incluindo, destarte, mecanismos eficazes para sua responsabilização (SOUZA,
2018).

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Por fim, faz-se importante ressaltar que a jurisprudência do Superior Tribunal
de Justiça rechaça a responsabilidade objetiva na aplicação da Lei 8.429/1992,
exigindo, desse modo, a presença de dolo nas hipóteses de improbidade previstas em
seus artigos 9º e 11, que coíbem o enriquecimento ilícito e o atentado aos princípios
administrativos, respectivamente, exigindo, ainda, ao menos a culpa nos termos do
artigo.10, que censura os atos de improbidade por danos ao Erário (SOUZA, 2018).
A Lei Anticorrupção, nº. 12.846/13, resultado do Projeto de Lei nº 39/2013,
inaugurou no ordenamento jurídico uma nova fase no combate aos ilícitos cometidos
contra a Administração Pública (SOUZA, 2018).
Seu destaque reside no fato de que ela surgiu como solução a atender os
anseios da população para a criação de mecanismos mais efetivos para coibir a
corrupção no âmbito da esfera pública, especialmente no que se refere à
responsabilização objetiva da pessoa jurídica envolvida na prática de ilícitos (SOUZA,
2018).
O novo diploma legal estabelece, nesse sentido, meios de responsabilizar a
pessoa jurídica independentemente da responsabilidade individual de seus dirigentes
ou administradores ou de quaisquer outras pessoas que tenham concorrido ou
participado da prática do ato ilícito, com previsão de sanções judiciais e
administrativas, havendo a previsão, inclusive, de dissolução compulsória da pessoa
jurídica (SOUZA, 2018).
Nesse sentido, o artigo 1° da referida lei estabelece que “esta Lei dispõe sobre
a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de
atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira” (SOUZA, 2018).
Conforme dispõe o referido diploma legal, são considerados como sujeito ativo
as sociedades empresárias e as simples, personificadas ou não, não importando a
forma em que se organizam ou o modelo societário adotado, incluindo-se, ademais,
as fundações, associações, assim como sociedades estrangeiras, que tenham sede,
filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda
que por período temporário (SOUZA, 2018).
Neste sentido, impende destacar que no tocante ao conceito de pessoa jurídica
responsável pelo do ato de corrupção, não houve exclusão de empresas públicas e
sociedades de economia mista. Por esta razão, é possível afirmar que, também as

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pessoas jurídicas de direito privado pertencentes à Administração Indireta, estarão
sujeitas à Lei nº 12.846/2013 quando a prática de um de seus agentes resultar em
lesão à pessoa de direito público (SOUZA, 2018).
De acordo com Souza, (2018), no que tange à responsabilidade objetiva
apresentada pela Lei, não se estabeleceu uma “corrupção objetiva”, mas sim a lógica
de que, consumada a infração em virtude da conduta reprovável de um indivíduo,
haverá a possibilidade de produzir-se a responsabilização da pessoa jurídica. Objetiva
será a responsabilidade da pessoa jurídica, portanto, uma vez que bastará o vínculo
desta com o infrator para sua configuração (SOUZA, 2018).
Ademais, dentre os diversos mecanismos apresentados pela Lei 12846/2013
no combate à corrupção, faz-se importante registrar a multa, no valor de 0,1% a 20%
da receita bruta da pessoa jurídica referente ao exercício anterior à instauração do
processo administrativo, assim como a criação de um Cadastro Nacional de Empresas
Punidas (CNEP), que reunirá e dará publicidade às sanções impostas aos sujeitos
ativos pelos órgãos ou entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário
(SOUZA, 2018).
Diante das ponderações apresentadas pela Lei 12.846/2013 no tocante ao
sujeito ativo do ato ímprobo, é possível observar que o referido diploma legal revela
uma importante mudança, expandindo mecanismos punitivos para além do Direito
Penal. O legislador, na década de 90, utilizou-se do Direito Penal como grande escudo
para a busca da lisura na máquina pública, de modo que a Lei Anticorrupção buscou
abandonar essa visão restrita, na medida em que reconheceu a existência de
mecanismos diversos e mais adequados ao sistema jurídico no combate à
improbidade na Administração Pública (SOUZA, 2018).
A análise dos sujeitos ativos previstos na Lei n. 8.429/92 e na Lei n. 12.846/13
demonstra que o legislador tem buscado soluções e evoluído com as críticas no que
se refere ao combate à improbidade na Administração Pública (SOUZA, 2018).
É certo que a Lei de Improbidade representou um grande avanço à época de
sua promulgação, porém com o desenvolvimento das atividades empresárias e o
evoluir do Estado, rotineiramente diversas práticas imorais perante a máquina pública
já não eram responsabilizadas, seja por se beneficiarem de omissões da lei, bem
como pela inoperância nas práticas de investigação. Neste ponto, destaca-se a

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responsabilização da pessoa jurídica pelo ato de improbidade, objeto de eterna
divergência doutrinária (SOUZA, 2018).
Por esta razão, a Lei Anticorrupção surgiu como um avanço, na medida em que
trouxe como uma de suas inovações a expressa necessidade de responsabilização
das pessoas jurídicas, que, outrora, eram utilizadas como 'escudo' por pessoas
naturais para prática de atos ímprobos. Destaca-se que muitos outros foram os
aspectos relevantes da Lei 12.846/13, como a previsão da desconsideração da
pessoa jurídica, o estabelecimento de penalidades mais objetivas e severas, a criação
dos cadastros das empresas já responsabilizadas, dentre outras inovações.
O que se destaca com o breve estudo dos sujeitos ativos das leis apresentadas
é que o legislador tem se mostrado eficaz na previsão do maior contingente possível
de pessoas físicas e jurídicas passíveis de responsabilização, efetivando, desse
modo, os objetivos traçados pela Constituição Federal, especialmente no que se
refere à atividade concreta e imediata do Estado, que sob o regime jurídico de direito
público, deve ter como prioridade a consecução dos interesses coletivos (SOUZA,
2018).
Portanto, a Carta Constitucional de 1988, quando estabeleceu o princípio da
moralidade administrativa como vetor da prática da Administração Pública, buscou
consagrar também a expressa necessidade de proteger a moralidade e a
responsabilização do administrador público amoral ou imoral (SOUZA, 2018).

3. LAVAGEM DE DINHEIRO

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O entendimento sobre o conceito de “lavagem de dinheiro” não sofreu
alterações ao decorrer do tempo, consiste no processo por meio do qual se opera a
transformação de recursos obtidos de forma ilícita em ativos com aparente origem
legal, inserindo assim, um grande volume de fundos nos mais diversos setores da
economia.
Ou seja, são técnicas aplicadas, com o objetivo de tornar lícito, ou
aparentemente lícito, os ativos oriundos da prática de uma atividade ilícita, a fim de
aplicar esse lucro no mercado formal, para usufruir os mesmos, sem despertar a
fiscalização das autoridades, sendo possível a repetição da prática de lavagem para
manter e fornecer a manutenção necessária para garantir o funcionamento desse
ciclo.
Uma particularidade é que o crime de lavagem de dinheiro é classificado como
um crime acessório, também chamado de parasitário, uma vez que se trata de um
delito que pressupõe a ocorrência de infração penal anterior, que até a alteração da
Lei, era chamado de “crime antecedente”. A alteração traz o termo “infração penal”,
gênero que engloba as espécies crime e contravenção.
O crime de lavagem de dinheiro tem previsão na Lei 9.613/1998, que sofreu
alterações com a Lei 12.683/2012. Trata-se de crime comum, ou seja, não depende
de uma qualificação especifica do agente lavador.
O agente do crime antecedente pode ser o mesmo da lavagem, desde que sua
conduta posterior ao crime-base se amolde a um dos núcleos do tipo penal de
lavagem.
O crime é de ação múltipla ou conteúdo variado, ou seja, se o agente realiza
mais de uma das condutas incriminadas, responderá por um único crime.
Quanto a consumação, a doutrina majoritária entende que não é requisito que
se confirme a aparente licitude do lucro sujo, sendo o suficiente a conduta de ocultar
e dissimular o patrimônio sujo. Ou seja, a punição versa sobre a conduta em si e não
eventual usufruto dos ativos ilícitos.
Ainda caracterizando o crime, a lavagem de dinheiro é permanente, sendo a
conduta do agente permissiva para que o ilícito se prolongue voluntariamente no
tempo. É o que se dá em cada momento ou fase do modelo de lavagem que se
configura pelo processo trifásico, a ser exposto oportunamente.

16
No caso concreto, poderá também o crime ser instantâneo de efeito
permanente, entretanto, de acordo com as circunstancias do caso, isto é, aquele no
qual a lesividade se protrai ou se repete pontilhada no tempo, a partir de uma ação
delituosa perfeita e acabada. O que se distende no tempo não é a ação ou omissão e
nem o tipo incriminador com lesão ao bem jurídico. Na verdade, o que se prolonga é
a ofensa ao bem objeto da proteção, pois o conceito de consumação é jurídico e
pressupõe a ideia de preenchimento de elementos do tipo penal, o que já ocorreu em
momento anterior.
Em linhas gerais, entende-se que o sujeito passivo do crime é o Estado, sendo
que no caso concreto poderá ser outro além daquele. A doutrina menciona possíveis
danos que o Estado pode sofrer por causa das práticas de lavagem, mas entende-se
que na prática é difícil mencionar quais os riscos de fato o Estado está submetido,
uma vez que o cotidiano forense demonstra que os ativos objetos dos procedimentos
de lavagem não são públicos e por muitas vezes, depois de serem considerados
“lícitos”, acabam passando por tributação, o que acaba gerando consequência
contrária: o Estado acaba se beneficiando financeiramente com o ato.
Quanto ao concurso de crimes, por ser a lavagem de dinheiro uma infração
autônoma, não há necessidade de se demonstrar a participação do agente na infração
antecedente. Caso seja o mesmo autor em ambas as infrações, haverá a aplicação
cumulativa das penas, conforme o artigo 69 do Código Penal:

Art. 69 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica


dois ou mais crimes, idênticos ou não, aplicam-se cumulativamente as penas
privativas de liberdade em que haja incorrido. No caso de aplicação
cumulativa de penas de reclusão e de detenção, executa-se primeiro àquela.
(Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - Na hipótese deste artigo, quando ao agente tiver sido aplicada pena
privativa de liberdade, não suspensa, por um dos crimes, para os demais será
incabível a substituição de que trata o art. 44 deste Código. (Redação dada
pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
§ 2º - Quando forem aplicadas penas restritivas de direitos, o condenado
cumprirá simultaneamente as que forem compatíveis entre si e
sucessivamente as demais. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

No campo processual, trata-se de Ação Pública Incondicionada, sendo privativa


do Ministério Público.
Será possível a ação em caráter privado, caso a ação pública não seja ajuizada
no prazo legal de 5 (cinco dias) a serem contados da data de recebimento do inquérito

17
policial pelo Ministério Público, sendo que o prazo passa a ser de 15 (quinze) dias se
o réu estiver solto.
Por outro lado, se a instauração de ação penal por crime de lavagem tiver por
base a ocultação ou dissimulação de bens, valores e direitos provenientes de infração
penal antecedente, cuja propositura de ação penal seja condicionada à representação
ou ao oferecimento de queixa pelo ofendido, a ausência de apresentação de qualquer
dessas peças de iniciativa da vítima poderá até mesmo prejudicar a instrução e
julgamento do processo de crime de lavagem.
Outra figura presente nos processos de lavagem são os denominados
“laranjas”, que são agentes intermediários, ou também interposta pessoa e que no
caso, poderá responder em concurso de pessoas, com fulcro no artigo 29 no Código
Penal:

Art. 29 - Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a
este cominadas, na medida de sua culpabilidade. (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984)
§ 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser diminuída
de um sexto a um terço. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984).
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-
lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na
hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave. (Redação dada pela
Lei nº 7.209, de 11.7.1984).

Há três modalidades dos denominados “laranjas”; pode se tratar de pessoa


ingênua, que não tendo a capacidade econômica, são utilizadas nas transações
ilegais e até podem ignorar a operação de lavagem. Há também a pessoa que cede
ou empresta seus documentos, mediante o pagamento de determinada quantia,
permitindo a sua utilização para finalidade que desconhece. Por fim, há a pessoa que
além de emprestar seu nome, ainda alicia outros laranjas para o trabalho.
Sobre a atuação dessa figura um dos métodos empregados é a intermediação
de laranjas para ocultar a titularidade real e a origem dos capitais utilizados. Nesses
casos, normalmente se utilizam identidades falsas ou pertencentes a colaboradores
da organização de lavagem, indigentes, imigrantes, pessoas humildes etc. Também
se recorre a familiares, mas nesses casos os lavadores tomam preocupações como a
ausência de um vínculo matrimonial ou uma suposta separação legal, ou ainda, a
alteração da ordem dos sobrenomes dos filhos no Registro Civil, tudo para que se
evite a ligação e o confisco de bens no caso de serem descoberto
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Outra figura que não configura obrigatoriamente a relação dos procedimentos
de crime de lavagem, mas constantemente está presente nos atos criminosos do tipo
é o “doleiro”.
A atividade do doleiro no âmbito de branqueamento de capitais está
configurada no artigo 16 da Lei 7.492/86 (Lei sobre Crimes Financeiros):

Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida
mediante declaração (Vetado) falsa, instituição financeira, inclusive de
distribuição de valores mobiliários ou de câmbio:
Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

O doleiro é o realizador da operação conhecida como “dólar à cabo”, que


consiste em possibilitar o envio de dinheiro para o exterior, sem a devida comunicação
ao BACEN. O interessado repassa o dinheiro ao doleiro, que dá a ordem para que
uma empresa no exterior mande dinheiro para a conta desse interessado em um
paraíso fiscal.
No processo de lavagem de dinheiro e baseado nas recomendações do Grupo
de Ação Financeira - GAFI é possível identificar e distinguir três etapas destinadas a
compor integralmente o processo de lavagem, sendo a colocação, dissimulação e a
integração.
A colocação também denominada internacionalmente como placement,
consiste na ocultação dos ativos ilícitos, com o intuito de distanciar os bens, direitos
ou valores provenientes do crime antecedente, sendo geralmente utilizado nesta
etapa os bancos e empresas de créditos, casas de câmbio, investimentos em
operações e paraísos fiscais para assim encobrir a natureza a localização, e o controle
dos recursos obtidos da atividade ilícita.
Pode se dizer então que a ocultação se constitui no momento no qual são
introduzidos os recursos ilícitos nos sistemas econômicos, através de depósitos em
contas bancarias, aquisição de produtos financeiros e valores mobiliários.
A segunda etapa é a dissimulação, também conhecida como acumulação,
controle, circulação, estratificação e transformação ou layering, na qual consiste ao
acúmulo de investimentos visando disfarçar o caminho percorrido pelos ativos
provenientes do crime antecedente.
Nota se assim que a essência da dissimulação se constitui em dificultar o
rastreamento do dinheiro ilícito, com o intuito de romper as evidencias que direcionam
19
à origem do dinheiro. Sendo comum nesta etapa a identificação de contas de
“laranjas” ou contas “fantasmas” para realizar a movimentação do dinheiro.
E por fim a última etapa é a integração, etapa corrente a própria finalização da
lavagem, após a realização das etapas anteriores os lucros e bens obtidos
criminalmente aparentam agora ser lícitos, estando aptos a serem introduzidos
novamente na economia legal ou no sistema financeiro.
Percebe-se que nesta etapa ocorre a legitimação do dinheiro ilícito, inserido no
sistema econômico de maneira aparentemente licita.
As organizações criminosas buscam investir em empreendimentos que
facilitem suas atividades, podendo tais sociedades prestarem serviços entre si. Uma
vez formada a cadeia, torna-se cada vez mais fácil legitimar o dinheiro ilegal.
Por fim, a título ilustrativo, um dos mecanismos usados pelo lavador a fim de
legitimar todo esse procedimento é através da constituição de entidades conhecidas
como “empresas fantasmas”:
O mecanismo utilizado é denominado de ‘caixas vazias’, que consiste na
constituição ou aquisição de sociedades para incluir nelas outras empresas,
estratificando assim, a organização e dificultando a investigação. Por intermédio de
uma empresa fantasma, normalmente domiciliada em um paraíso fiscal, uma pessoa
ou organização criminosa pode emprestar a si mesmo seus próprios fundos de origem
ilícita em uma transação aparentemente legítima.
São três as gerações das legislações que tratam sobre o assunto de
branqueamento de capitais. Trata-se de uma classificação doutrinária, de cunho
didático, que tem como base os tipos de condutas a serem consideradas como “crime
antecedente” da lavagem de capitais e que junto com o contexto histórico, irá auxiliar
na compreensão do sistema político-jurídico que versa sobre o tipo. Necessário expor
que não se trata de uma evolução cronológica linear, sendo que atualmente o mundo
convive com países que possuem legislação considerada de 2ª geração.
A primeira geração está relacionada com a Convenção de Viena (Convenção
Contra o Tráfico Ilícito de Entorpecentes e Substâncias Psicotrópicas) de 1988, que
representa um termo relevante na matéria aqui tratada, abrangendo os países que
preveem apenas o tráfico de drogas como crime antecedente da lavagem de dinheiro.

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A segunda geração, na qual fazia parte a legislação brasileira até a
promulgação da Lei de 2012, e caracteriza o diploma legal vigente em países como a
Alemanha e Portugal, é mais abrangente e traz um rol de condutas a serem
consideradas como eventual crime antecedente em casos de branqueamento de
capitais. O rol tem caráter taxativo e por isso foi alvo de críticas, uma vez que foi
presente, no caso do Brasil, o questionamento do motivo pela adoção desse modelo,
diante da sensação de injustiça que alguns julgamentos traziam em casos concretos.
Ou seja, por diversas vezes eram constatadas diversas ações em que havia uma
atividade ilícita envolvida e eram empregados meios de lavagem, mas o Judiciário não
podia condenar os agentes, diante da falta de encaixe entre a atividade ilícita e o rol
de condutas expostas na Lei, a saber:

Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição,


movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes,
direta ou indiretamente, de crime:
I - de tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins;
II - de terrorismo;
II – de terrorismo e seu financiamento;
III - de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado à
sua produção;
IV - de extorsão mediante sequestro;
V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para
outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou
preço para a prática ou omissão de atos administrativos;
VI - contra o sistema financeiro nacional;
VII - praticado por organização criminosa.
VIII – praticado por particular contra a administração pública estrangeira.

Por fim, há a legislação de terceira geração, que estabelece que qualquer ilícito
penal pode ser antecedente do crime de lavagem de dinheiro. Ou seja, qualquer
infração penal poderá ser conectada aos procedimentos caracterizadores do
branqueamento de ativos. A Lei de 2012 entrou nesse parâmetro, como já
mencionado.

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4. CORRUPÇÃO

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Uma definição de corrupção ou da ação de corromper, no âmbito da


Administração Pública, conquanto não exaustiva ou definitiva, mais consagrada no
ordenamento jurídico, é a que consta no tipo penal da corrupção passiva, art. 317, do
Código Penal (BRASIL, 1940), sob a ótica da postura do agente público, quer seja, a
conduta de solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda
que fora da função pública ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem
indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem.
Destaque-se ainda um outro formato do ato de corromper, mais grave, que é a
concussão, tipificada no caput do art. 316, do Código Penal (BRASIL, 1940), por
envolver um aspecto de coerção moral mais explícita do agente público, que para
além de simplesmente solicitar ou receber (cuja gravidade já é indiscutível), exige
(ordena, impõe, obriga) do particular uma vantagem indevida (para si ou para terceiro),
em razão do cargo que ocupa.
Neste crime de concussão a exigência não poderá ter como beneficiário o
próprio Estado ou órgão público que, em verdade, é o sujeito passivo do delito, daí
que em tal hipótese estaria descaracterizado este crime, podendo eventualmente as
condutas serem colhidas por outros tipos penais. Deveras, pois se o terceiro
(beneficiário) for a própria Administração Pública, pode configurar-se excesso de
exação (art. 316, § 1º, Código Penal) e, ainda, somente se essa exigência se referir a
tributo ou contribuição social, hipótese em que o sujeito passivo será o contribuinte e
não mais o Estado. Num sentido mais amplo outros crimes contra o patrimônio podem
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se caracterizar se a vantagem indevida não se der em razão das funções de
funcionário público – v.g. extorsão e estelionato, previstos nos arts. 158 e 171 do
Código Penal (BRASIL, 1940).
Os pontos que unem ambos os crimes (corrupção passiva e concussão) são:
a) o bem jurídico protegido que é a Administração Pública notadamente os
consectários da moralidade e da probidade administrativa;
b) o sujeito ativo que é sempre o funcionário público, ainda que através de
interposta pessoa;
c) o sujeito passivo imediato que é o Estado e num plano secundário o
particular que paga ou que é assediado com a proposta de pagamento
indevido;
d) as elementares normativas consistentes na vantagem que deve sempre
ser indevida e na circunstância de que a oferta, a solicitação, a exigência
ou o recebimento, de tal vantagem, tem que se dar em razão das funções
que exerce (ou tem a expectativa de exercer) o funcionário público;
e) a característica de que são delitos formais, cuja consumação independe
do resultado, isto é, da obtenção efetiva da vantagem indevida (embora na
corrupção passiva convivam duas condutas: solicitar ou receber) ou, ainda,
da efetiva prática do ato de ofício, conquanto na corrupção passiva tal
evento, se o ato for ilegítimo ou ilegal, configure causa de aumento de pena,
art. 317, § 1º, Código Penal (BRASIL, 1940);
f) a tentativa é admissível na hipótese de exigência ou solicitação escrita.

Na doutrina se denomina de corrupção passiva imprópria aquela em que o


funcionário público, em razão da obtenção da vantagem, efetivamente pratique um
ato legítimo, lícito. Veja-se que o ato de ofício a ser hipoteticamente realizado (o que
já configura o crime), ou o efetivamente praticado, não precisa ser ilegal ou ilegítimo,
mas sim a vantagem solicitada, prometida ou recebida é que há de ser indevida, pois
o que se pune é a mercancia da função pública. Se, entretanto, o agente público
pratica ato ilegal ou ilegítimo, ou, mesmo não sendo ilegal ou ilegítimo (corrupção
passiva imprópria), retarda-o ou se omite em relação a ele (em razão do recebimento

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ou promessa de obtenção da vantagem indevida), a pena do crime será majorada,
conforme previsão do parágrafo primeiro do art. 317 do Código Penal (BRASIL, 1940).
Neste sentido:
Classifica a doutrina como corrupção própria a solicitação, recebimento ou
aceitação de promessa de vantagem indevida para a prática de ato ilícito, contrário
aos deveres funcionais, bem como de corrupção imprópria, quando a pratica se refere
a ato lícito, inerente aos deveres impostos pelo cargo ou função.
Incoerentemente, no entanto, quanto ao preceito cominatório, na corrupção
passiva a lei penal ficou mais severa quanto à pena máxima privativa de liberdade
(doze anos de reclusão, enquanto a concussão prevê oito anos). O aumento na pena
máxima da corrupção passiva se deu pela modificação introduzida pela Lei nº
10.763/2003 (BRASIL, 2003), mantendo-se para ambas as infrações penais a mesma
pena mínima (dois anos de reclusão).
Verifica-se, no mais, que essa tipificação dicotômica (corrupção passiva,
concussão versus corrupção ativa) decorre da constatação de que a corrupção,
quando concretizada (vantagem indevida prometida ou paga pelo corruptor e aceita
ou recebida pelo corrupto) na Administração Pública, está como que grafada nas duas
faces de uma mesma moeda, ostentando de um lado a figura do corruptor (o
particular) e no outro a do corrupto ou corrompido (o agente público).
É bem verdade que, considerado o caráter formal de tais tipos penais, e a
independência entre determinadas ações típicas, é possível que se configure um ato
de corrupção do particular, no oferecimento ou promessa de vantagem indevida, sem
que o agente público a ela venha a aderir, e vice-versa. Sobre este aspecto:
Punem-se, alternativamente, as ações de:
(a) solicitar (pedir, manifestar que deseja algo): aqui não há emprego de
qualquer ameaça explícita ou implícita. O funcionário (intraneus) solicita a
vantagem, e a vítima (extraneus) cede por deliberada vontade, não por
metus publicae potestatis. Aqui não há a necessidade da caracterização do
anterior crime de corrupção ativa; ou
(b) receber (aceitar, entrar na posse): aqui a proposta parte de terceiros
(extraneus) e a ele adere o funcionário (intraneus), havendo, portanto, a
necessidade da caracterização do anterior crime de corrupção ativa.

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A corrupção nas modalidades de ‘receber’ e ‘aceitar’, que presumem a
correspondente ‘oferta’ ou ‘promessa’ do corruptor, são condutas física e
subjetivamente vinculadas umas às outras. Embora o pactum sceleris não seja
requisito obrigatório, repetindo, em todas as hipóteses o crime de corrupção, nas
modalidades de receber (vantagem indevida) ou aceitar (promessa) a bilateralidade é
inerente a referidas condutas, pois somente recebe ou aceita se houver em
contrapartida quem ofereça ou prometa.
No plano concreto, todavia, que impacta em maior grau quanto aos danos ao
erário e à moralidade administrativa, a corrupção, propiciando ganhos indevidos ao
particular, e ao agente público, é essa sua face dicotômica ou bilateral, que se observa
na realidade cotidiana (mundo do ser), para além da previsão abstrata da tipificação
penal (mundo do dever ser).
Anote-se ainda que no crime de corrupção ativa, do art. 333, do Código Penal
(BRASIL, 1940), que agora no plano da responsabilidade civil objetiva das pessoas
jurídicas encontra paralelo no art. 5º, I, da Lei nº 12.846/2013 (BRASIL, 2013),
pressupõe que:
a) o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa;
b) o sujeito passivo é exclusivamente o Estado, embora o agente público
figure como destinatário da ação do sujeito ativo;
c) o ato a ser praticado tem que estar dentro da esfera de competência do
funcionário público (se assim não o for, poderá caracterizar outro crime,
mas não corrupção ativa);
d) a configuração com simples oferta ou promessa, revelando-se como
crime de mera conduta, independente da aderência do funcionário público;
e) a oferta da vantagem indevida pode se dar por interposta pessoa;
f) a tentativa é possível se a oferta for escrita;
g) um aumento de pena, para o caso do funcionário público efetivamente
praticar um ato de ofício ilegal ou ilegítimo, ou ainda retardar ou se omitir
em relação a ato lícito.
Imperioso ainda observar que o Código Penal (BRASIL, 1940) confere um
significado amplo ao conceito de funcionário público, pois em seu art. 327, caput e
parágrafo primeiro, considera como tal, para os efeitos penais, quem, embora

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transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública e,
por equiparação, também quem exerce cargo, emprego ou função em entidade
paraestatal, ou trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou
conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. Tal
significado, como norma geral, se espraia e tem incidência em relação a todos os
demais crimes previstos no ordenamento penal, contidos ou não do Código Penal,
conquanto exista quem refira-se à extensão dessa definição de funcionário público
apenas para as demais figuras penais previstas no Código Penal (nos demais títulos
da codificação).
Ademais, em decorrência dessa inquietação global com o fenômeno da
corrupção, a Lei nº 10.467/2002 (BRASIL, 2002) acrescentou ao Código Penal
(BRASIL, 1940) o art. 337-B, tipificando a corrupção ativa em transação comercial
internacional. Tal tipo penal tem também pouca variação com o do art. 333, pois tão
somente acrescentou a ação de “dar”, àquelas de prometer ou oferecer vantagem
indevida (o que para fins de enquadramento não traz maiores consequências,
conquanto possa influenciar na dosagem da pena, em caso de condenação). A
mesma Lei nº 10.467/2002 (BRASIL, 2002) inseriu os arts. 337-C e 337-D, no Código
Penal (BRASIL, 1940) o primeiro tipificando o crime de tráfico de influência em
transação comercial internacional e, segundo, delineando a definição de funcionário
público estrangeiro (identificado como aquele, que mesmo transitoriamente ou sem
remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública em entidades estatais ou em
representações diplomáticas de país estrangeiro).
Cumpre consignar que se trata de inovação legislativa que atende a
compromisso internacional assumido pelo Brasil, na Convenção sobre o Combate da
Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais
Internacionais (BRASIL, 2000), que no seu art. 1º estabelece que os países aderentes
deverão tomar todas as medidas necessárias ao estabelecimento de que (segundo
suas leis) passa a ser delito criminal a conduta intencionalmente adotada por qualquer
pessoa, de oferecer, prometer ou dar qualquer vantagem pecuniária indevida ou de
outra natureza, seja diretamente ou por intermediários, a um funcionário público
estrangeiro, visando uma ação ou a omissão desse funcionário no desempenho de

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suas funções oficiais, com a finalidade de realizar ou dificultar transações ou obter
outra vantagem ilícita na condução de negócios internacionais.
No plano de temas específicos ou setoriais, cumpre consignar, além da
corrupção eleitoral, já mencionada no Capítulo anterior, conforme art. 299, do Código
Eleitoral (BRASIL, 1965), o crime de corrupção (ativa) de testemunha, perito,
contador, tradutor ou intérprete, para fazer afirmação falsa, negar ou calar a verdade
em depoimento, perícia, cálculos, tradução ou interpretação, previsto no art. 343, do
Código Penal (BRASIL, 1940), bem como a corrupção (passiva) e concussão
praticada especificamente por funcionário público da administração fazendária, para
deixar de lançar ou cobrar tributo ou contribuição social, ou cobrá-los parcialmente,
previsto no art. 3º, II, da Lei nº 8.137/90 (BRASIL, 1990).
No art. 343, do Código Penal (BRASIL, 1940), a pena é de três a quatro anos
de reclusão, aumentando-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado com o
fim de obter prova destinada a produzir efeito em processo penal. No art. 3º, II, da Lei
nº 8.137/90 (BRASIL, 1990), a pena privativa de liberdade é de três a oito anos.
Importante outrossim obtemperar que as definições dos tipos de concussão,
corrupção passiva e ativa, dos arts. 316, 317, 330 e 337-B, do Código Penal (BRASIL,
1940), todos crimes punidos apenas na modalidade dolosa, são de uma forma ou de
outra, com pequenas variações, equivalentes às adotadas nos tratados internacionais
sobre o tema, subscritos pelo Brasil e incorporados ao ordenamento jurídico pátrio,
conforme já se relatou.
O que cabe vincar, de qualquer forma, é que nos casos da corrupção passiva
e corrupção ativa – arts. 317 e 333, Código Penal (BRASIL, 1940) –, se o funcionário
público efetivamente pratica ou retarda o ato, ou ainda se omite, em tais hipóteses, a
pena é agravada – art. 317, § 1º e art. 317, par. único, Código Penal (BRASIL, 1940)
–, independente de gerar danos ao erário, prejuízo material ao patrimônio público. Já
na tipificação do crime de concussão – art. 316, Código Penal (BRASIL, 1940) – não
existe nenhuma agravante, quanto a tal aspecto.
Ou seja, no âmbito penal, a existência de dano não tem qualquer repercussão
quanto à tipificação delituosa, podendo, contudo, influenciar:

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a) na fixação da pena já que o art. 59, do Código Penal (BRASIL, 1940)
preceitua que as consequências do crime devem ser sopesadas na
dosagem da pena;
b) nos efeitos da condenação, pois o art. 91, I e II, “a”, do Código Penal
(BRASIL, 1940) estabelece a certeza da obrigação de indenizar o dano
causado pelo crime, além da perda, em favor da União, ressalvado o direito
do lesado ou de terceiro de boa-fé, do produto do crime ou de qualquer
bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do
fato criminoso;
c) sobre a execução penal, pois o art. 33, § 4º, do Código Penal (BRASIL,
1940) estipula que o condenado por crime contra a Administração Pública
terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à
reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito
praticado, com os acréscimos legais.
Cumpre destacar que no direito penal (quando os agentes são pessoas físicas)
vige apenas a responsabilidade subjetiva, de modo que a imposição de condenação
fica condicionada à comprovação de culpabilidade, de efetivo dolo, vontade de agir e
praticar as condutas previstas em dado tipo penal, ou culpa, quando o crime prevê
essa modalidade de conduta. Uma consequência desse entendimento é o que
estabelece o art. 386, V, do Código de Processo Penal (BRASIL, 1941), no sentido de
que o julgador deverá sempre decidir pela absolvição quando não existir prova de ter
o réu concorrido para a infração penal. Sobre o tema:
Não existe, no ordenamento positivo brasileiro, ainda que se trate de práticas
configuradoras de macro delinquência ou caracterizadoras de delinquência
econômica, a possibilidade constitucional de incidência da responsabilidade penal
objetiva. Prevalece, sempre, em sede criminal, como princípio dominante do sistema
normativo, o dogma da responsabilidade com culpa (‘nullum crimen sine culpa’),
absolutamente incompatível com a velha concepção medieval do ‘versari in re illicita’,
banida do domínio do direito penal da culpa. (BRASIL, 2009)
No caso dos crimes aqui tratados como foco central, quais sejam, os de
concussão, corrupção passiva e corrupção ativa conforme arts. 316, 317 e 333, do

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Código Penal (BRASIL, 1940), exige-se o dolo para a configuração, não havendo
hipótese de sanção a título de culpa, ante a ausência de expressa previsão legal.
Vê-se assim que existem, no tocante à corrupção pública, claros e concretos
pontos de contato entre a responsabilização penal do agente público e do particular
(pessoas físicas), com aquela decorrente dos atos de improbidade administrativa dos
agentes públicos e dos particulares (pessoas físicas/naturais e pessoas
jurídicas/morais). E, mais recentemente, dessas duas hipóteses de responsabilidade
com a da lei anticorrupção (BRASIL, 2013), essa destinada à responsabilização
objetiva, administrativa (estrito senso) e civil (administrativa na via judicial) das
pessoas jurídicas.

5. A LEI DE LICITAÇÕES

Fonte:stock.adobe.com

Nos termos do art. 174 da Constituição compete ao Estado a fiscalização das


atividades econômicas a função de incentivador e planejador, sendo obrigatório no
setor público e recomendável sua atuação no setor privado é também indene de
dúvidas que o Estado é um grande consumidor, de bens, insumos e serviços,
produzidos e ofertados no (e pelo livre) mercado (BRASIL, 1988).
Os contratos firmados pela Administração Pública têm significativo impacto na
economia, consistindo em intensa relação entre o Estado (inclusive suas entidades
paraestatais) e o setor produtivo, isto é, com os agentes de mercado. Não se trata de
uma afirmação de caráter meramente empírico. É possível se ter uma ideia de tal

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dimensão, através de dados colhidos no Painel de Compras de Governo Federal, no
âmbito do SIASG (Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais do
Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão), que apresenta em um só local os
principais números das contratações públicas e tem por finalidade oferecer um
panorama dos gastos públicos e do comportamento licitatório no âmbito da
Administração Pública Federal (BRASIL, 2016).
Acresça-se a estes dispêndios de recursos públicos, em contratos de aquisição
de bens, insumos e serviços, os que são realizados pelos demais vinte e sete
Governos dos Estados da Federação, além dos mais de 5.560 municípios, quantitativo
que consta dos dados demográficos do Sistema IBGE de recuperação automática –
SIDRA (BRASIL, 2010). Ante tais dados, vale registrar sobre a pena administrativa de
inidoneidade aplicada ao licitante, pelo Tribunal de Contas da União, na forma do art.
46, da Lei nº 8.443/92 (BRASIL, 1992c), impedindo quem é apenado de participação
em novos certames pelo prazo de até cinco anos.
Em termos pragmáticos, a importância da legalidade no manejo dessa sanção
deve-se basicamente aos seus efeitos econômicos devastadores na atividade
finalística de muitas empresas ou licitantes pessoas físicas que ficam impedidas de
participar de licitações realizadas com recursos públicos federais por um período de
até cinco anos (RICCI, 2021).
Não se deve olvidar que as compras governamentais são indutoras da atividade
econômica e representam parcela significativa das receitas de licitantes; de alguns, a
totalidade, via de consequência, ceifam também inúmeros empregos (RICCI, 2018).
E os contratos celebrados com o Poder Público se implementam a partir
peculiaridades próprias, sob a regência e observância de postulados setoriais, no caso
do direito administrativo. No Brasil as contratações do setor público se dão,
notadamente, sob a égide dos princípios constitucionais da Administração Pública,
quer seja, da legalidade, da impessoalidade, da publicidade, da moralidade e da
eficiência, consoante art. 37, caput, da Constituição e, especialmente, como regra,
mediante prévio procedimento licitatório, ex vi do art. 37, XXI; art. 175; também da
Constituição. Com tal arcabouço jurídico visa-se conferir isonomia e impessoalidade
no trato da Administração Pública com particulares, buscando impor ambiente de leal
e real competição, entre os interessados em contratar com a Administração Pública

30
direta e indireta, com o desiderato de obter a contratação mais vantajosa e com o
menor custo para o erário e para o interesse social, dispensando-se tratamento
isonômico e imparcial aos licitantes, contratantes e, enfim, aos interessados em
celebrar contratos com a Administração Pública (BRASIL, 1988).
Em reforço ao que já se afirmou, a licitação ou o procedimento licitatório, que é
o certame através do qual as entidades governamentais realizam suas contratações,
abrindo a disputa entre os interessados em firmar com elas relações de conteúdo
patrimonial, visando escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas, é
um imperativo que decorre dos princípios da igualdade de todos perante a lei e da
impessoalidade, que inclusive deve se impor também nos casos de permissões de
uso exclusivo de bem público, ou qualquer ato da administração que pretenda investir
terceiros no desfrute de situação jurídica especial à qual outros administrados,
particulares, podem ter interesses. Decorre ademais da imparcialidade e da
consideração e respeito que a Administração Pública deve a todos dispensar,
atendendo ao princípio da moralidade administrativa (RICCI, 2021).
O procedimento licitatório visa assim, de um lado conferir eficiência à aplicação
dos recursos públicos, através da obtenção da melhor proposta para a contratação
que vier a ser celebrada (mormente preço e qualidade), além de propiciar, de forma
impessoal, que todos os interessados em firmar contratos com a Administração
Pública, que atendam aos requisitos de qualificação técnica, profissional e jurídica,
possam apresentar suas propostas, que serão apreciadas com imparcialidade e
critérios previamente fixados na lei e no edital de licitação (regras e condições pré-
fixadas, publicamente, para cada certame) (RICCI, 2021).
Desta forma, considerado o volume de recursos empregados cotidianamente
nas contratações realizadas pelas Administrações Públicas Federal, Estadual e
Municipal, direta e indireta (o que inclui, portanto, as suas autarquias, fundações,
empresas públicas, sociedades de economia mista, enfim as entidades paraestatais),
é induvidoso que se trata de campo fértil para que aí se instale práticas corruptas.

A Lei nº 14. 133, de 1º de Abril de 2021, estabelece normas gerais de licitação


e contratação para as Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e abrange: os órgãos dos

31
Poderes Legislativo e Judiciário da União, dos Estados e do Distrito Federal e os
órgãos do Poder Legislativo dos Municípios, quando no desempenho de função
administrativa; os fundos especiais e as demais entidades controladas direta ou
indiretamente pela Administração Pública (BRASIL, 2021).

Nessa perspectiva de que o Estado atua e influencia o mercado como um


grande consumidor de bens, insumos e serviços, tem-se, inclusive, sob a égide do
direito econômico, de condutas violadoras da livre concorrência, previsão legal
específica de infração administrativa contra a ordem econômica (e respectiva sanção),
por violação à competitividade nas licitações públicas (SOUZA, 2021).
Nesse sentido o art. 2º, IV, “b”, Lei nº 4.137/62 (BRASIL, 1962), já previa
expressamente como abuso do poder econômico o exercício de concorrência desleal
mediante combinação prévia de preços ou ajuste de vantagens na concorrência
pública ou administrativa. Esse diploma legal foi revogado pela Lei nº 8.884/94
(BRASIL, 1994), que em seu art. 20, VIII, também tipificou de forma similar essa
conduta anti-concorrencial voltada estritamente para as licitações promovidas pela
Administração Pública. Por fim, a Lei nº 8.884/94 (BRASIL, 1994) foi revogada pela
Lei 12.529/2011 (BRASIL, 2011), atualmente em vigor, que em seu art. 36, § 3º, I, “d”,
estabelece que constitui infração à ordem econômica acordar, combinar, manipular
ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma, os preços, as condições, as
vantagens ou a abstenção em licitação pública.
Tratam-se de infrações administrativas que são apuradas, e quando
identificadas, punidas pelo CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica,
ente autárquico da Administração Pública Federal, vinculado ao Ministério da Justiça,
atualmente composto de um Tribunal Administrativo de Defesa Econômica, de uma
Superintendência-Geral, e de um Departamento de Estudos Econômicos conforme
art. 4º, da Lei nº 12.529/2011 (BRASIL, 2011). Tal estrutura punitiva encontra
fundamento de validade no art. 24, I e art. 173, §§ 4º e 5º, da Constituição (BRASIL,
1988).
Na tutela específica do mercado e do consumidor, o art. 4º e incisos, da Lei nº
8.137/90 (BRASIL, 1990) tipifica os crimes contra a ordem econômica, tutelando
mormente a livre concorrência. No ponto vale observar que:

32
Atualmente, mesmo nos modelos econômicos mais liberais, nota-se a
preocupação com os cartéis e a criação de regramentos para coibi-los. Isso porque a
eficiência econômica deve sustentar-se em uma ordem econômica juridicamente
determinada, atendendo assim, aos anseios de que o Estado garanta e regule a
competitividade entre os mercados.
Seguindo tendência mundial, nosso ordenamento jurídico prevê regras, na
seara administrativa, penal e civil, voltadas para o objetivo de desencorajar e coibir a
prática infracional desestabilizadora do principal pilar do sistema capitalista: a livre
concorrência.

De acordo com o artigo 178 da Lei nº Lei nº 14. 133, de 1º de Abril de 2021 o
Código Penal passa a vigorar acrescido do Capítulo II-B (DOS CRIMES EM
LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS) onde estão previstas as
infrações e sanções administrativas para atos que atentem contra a regularidade das
licitações e contratos públicos, assim como o estabelecimento de tipos penais, que
visam tutelar o mesmo fim (SOUZA, 2021).
Reavive-se mais uma vez a constatação de que o Estado é um grande
consumidor e realiza cotidianamente um grande número de contratações. Ocorre que
quando vai ao mercado para adquirir produtos, insumos e serviços, o faz por meio de
disciplina própria, notadamente a observância de prévia licitação, que pressupõe a
observância de postulados como o do tratamento isonômico e impessoal a ser
dispensado aos licitantes, num procedimento que tem como desiderato a efetiva e leal
competitividade entre esses licitantes, para que as contratações estatais se deem à
vista da seleção da proposta mais vantajosa, tutelando-se assim o erário, o interesse
público e o bem comum (SOUZA, 2021).
Logo, constituindo-se a essência da licitação a promoção da justa disputa de
interessados, alheios aos quadros estatais, em celebrar contrato com o Poder Público,
enaltecendo-se a imparcialidade, é natural que o resultado deva ser promissor e
vantajoso à Administração. Aliás, em qualquer ambiente de negócios privados busca-
se, por estímulo à competição e à livre concorrência, o melhor negócio o Estado, não
podendo sair em busca de um fornecedor de seu interesse, pois deve atuar com
imparcialidade, produz por intermédio da competição regrada, o mesmo resultado:
consegue o melhor produto com o mais baixo custo possível (SOUZA, 2021).
33
Essa intensa e complexa atividade de contratações dos mais diversos produtos
e serviços, realizada cotidianamente pela Administração Pública, constitui também
seara na qual vicejam os aproveitadores, isto é, aqueles que pretendem obter
vantagens indevidas, contratações prejudiciais ao erário e aos interesses públicos, à
custa de fraudar o procedimento licitatório ou a própria execução dos contratos, que
como já se afirmou, constitui campo igualmente fértil para a corrupção (SOUZA, 2021).
Cabe obtemperar que as licitações e contratos, de forma geral (e notadamente
em setores monopolizados ou oligopolizados), propiciam uma oportunidade
econômica para que viceje a corrupção.
O governo compra e vende bens e serviços, distribui subsídios, organiza a
privatização de empresas estatais e faz concessões. As autoridades frequentemente
detêm monopólio de informações valiosas. Todas essas atividades criam incentivos
para a corrupção.
Quando o governo está na posição de comprador ou na de fornecedor, surgem
diversas razões para o pagamento de propinas aos agentes públicos. Primeira: uma
companhia pode pagar para que seja incluída no rol de concorrentes habilitados.
Segunda: essa companhia pode pagar para que agentes organizem as especificações
da concorrência de tal modo que a empresa corrupta seja a única a atender os
requisitos. Terceira: a companhia pode pagar para ser selecionada como vencedora
da concorrência. Finalmente: uma vez selecionada a empresa pode pagar para obter
preços inflacionados ou para poupar em qualidade (SOUZA, 2021).
Certas decisões como aquelas que concernem às concorrências e às
infraestruturas governamentais somente podem ser tomadas em escalões superiores
do governo (Quanto maior a complexidade do projeto mais difícil é provar que foi o
suborno, e não especificações técnicas, que determinou o resultado da licitação).
Ademais tais números revelam que o Estado brasileiro, seja diretamente, seja
através de empresas nas quais detém o controle acionário, realiza contratações de
vulto, o que justifica, sem sombra de dúvidas, a preocupação legislativa de tutelar as
licitações e contratações públicas, através da lei anticorrupção, Lei nº 12.846/2013
(BRASIL, 2013).
É preciso saber o que está motivando as pessoas a pagar propinas e tentar
mudar as estruturas institucionais para que os incentivos à corrupção não sejam tão

34
altos. É muito importante ‘quebrar’ essa ligação entre o financiamento político e os
gastos públicos. Poder ser difícil, mas é um ponto chave a atacar. Nos contratos de
infraestrutura, que são os mais caros, é preciso ‘quebrar’ os acordos de empresas nas
licitações. Também deve haver mais transparência nos processos de licitação.
Por esse motivo a Nova Lei nº 14. 133/2021 prevê sanções para os atos de
crimes em licitações e Contratos Administrativos, quais sejam:
Contratação direta ilegal: Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação
direta fora das hipóteses previstas em lei: Pena - reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito)
anos, e multa (BRASIL, 2021).
Frustração do caráter competitivo de licitação: Frustrar ou fraudar, com o
intuito de obter para si ou para outrem vantagem decorrente da adjudicação do objeto
da licitação, o caráter competitivo do processo licitatório: Pena - reclusão, de 4 (quatro)
anos a 8 (oito) anos, e multa (BRASIL, 2021).
Patrocínio de contratação indevida: Patrocinar, direta ou indiretamente,
interesse privado perante a Administração Pública, dando causa à instauração de
licitação ou à celebração de contrato cuja invalidação vier a ser decretada pelo Poder
Judiciário: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.
Modificação ou pagamento irregular em contrato administrativo: Admitir,
possibilitar ou dar causa a qualquer modificação ou vantagem, inclusive prorrogação
contratual, em favor do contratado, durante a execução dos contratos celebrados com
a Administração Pública, sem autorização em lei, no edital da licitação ou nos
respectivos instrumentos contratuais, ou, ainda, pagar fatura com preterição da ordem
cronológica de sua exigibilidade: Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos,
e multa.
Perturbação de processo licitatório: Impedir, perturbar ou fraudar a
realização de qualquer ato de processo licitatório: Pena - detenção, de 6 (seis) meses
a 3 (três) anos, e multa (BRASIL, 2021).
Violação de sigilo em licitação: Devassar o sigilo de proposta apresentada
em processo licitatório ou proporcionar a terceiro o ensejo de devassá-lo: Pena -
detenção, de 2 (dois) anos a 3 (três) anos, e multa.
Afastamento de licitante: Afastar ou tentar afastar licitante por meio de
violência, grave ameaça, fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo: Pena

35
- reclusão, de 3 (três) anos a 5 (cinco) anos, e multa, além da pena correspondente à
violência. Incorre na mesma pena quem se abstém ou desiste de licitar em razão de
vantagem oferecida (BRASIL, 2021).
Fraude em licitação ou contrato: Fraudar, em prejuízo da Administração
Pública, licitação ou contrato dela decorrente, mediante:
I - entrega de mercadoria ou prestação de serviços com qualidade ou em
quantidade diversas das previstas no edital ou nos instrumentos contratuais;
II - fornecimento, como verdadeira ou perfeita, de mercadoria falsificada,
deteriorada, inservível para consumo ou com prazo de validade vencido;
III - entrega de uma mercadoria por outra;
IV - alteração da substância, qualidade ou quantidade da mercadoria ou do
serviço fornecido;
V - qualquer meio fraudulento que torne injustamente mais onerosa para a
Administração Pública a proposta ou a execução do contrato:
Pena - reclusão, de 4 (quatro) anos a 8 (oito) anos, e multa.
Contratação inidônea: Admitir à licitação empresa ou profissional declarado
inidôneo: Pena de reclusão, de 1 (um) ano a 3 (três) anos, e multa.
Incorre ainda no caso de celebrar contrato com empresa ou profissional declarado
inidôneo: Pena - reclusão, de 3 (três) anos a 6 (seis) anos, e multa.
Aquele que, declarado inidôneo, venha a participar de licitação ou venha a
contratar com a Administração Pública incorre na Pena de reclusão, de 1 (um) ano a
3 (três) anos, e multa (BRASIL, 2021).
Impedimento indevido: Obstar, impedir ou dificultar injustamente a inscrição
de qualquer interessado nos registros cadastrais ou promover indevidamente a
alteração, a suspensão ou o cancelamento de registro do inscrito: Pena - reclusão, de
6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa.
Omissão grave de dado ou de informação por projetista: Omitir, modificar
ou entregar à Administração Pública levantamento cadastral ou condição de contorno
em relevante dissonância com a realidade, em frustração ao caráter competitivo da
licitação ou em detrimento da seleção da proposta mais vantajosa para a
Administração Pública, em contratação para a elaboração de projeto básico, projeto

36
executivo ou anteprojeto, em diálogo competitivo ou em procedimento de
manifestação de interesse: Pena - reclusão, de 6 (seis) meses a 3 (três) anos, e multa.
Consideram-se condição de contorno as informações e os levantamentos
suficientes e necessários para a definição da solução de projeto e dos respectivos
preços pelo licitante, incluídos sondagens, topografia, estudos de demanda,
condições ambientais e demais elementos ambientais impactantes, considerados
requisitos mínimos ou obrigatórios em normas técnicas que orientam a elaboração de
projetos. Se o crime é praticado com o fim de obter benefício, direto ou indireto, próprio
ou de outrem, aplica-se em dobro a pena (BRASIL, 2021).
A pena de multa cominada aos crimes previstos neste Capítulo seguirá a
metodologia de cálculo prevista neste Código e não poderá ser inferior a 2% (dois por
cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta.”
Para esse tipo penal de frustração ou fraude ao procedimento licitatório, o que
se tutela é a moralidade administrativa e a lisura da licitação, ou seja, a competição
do procedimento licitatório, como objeto material e a proteção patrimonial e moral da
Administração Pública, no aspecto jurídico, sendo certo que é crime próprio e o sujeito
ativo há de ser um participante da licitação, diante da finalidade específica de obter
vantagem indevida para si ou outrem, decorrente da adjudicação do objeto da licitação
. Adjudicação, por sua vez é o ato pelo qual a promotora do certame convoca o
vencedor para travar o contrato em vista do qual realizou-se o certame (BRASIL,
2021).
Assim, sob o aspecto penal é punível a conduta de qualquer participante da
licitação, ainda que sem a coautoria ou adesão do agente público ou mesmo de outro
licitante, embora seja natural e, no mais das vezes ocorre, a associação entre licitantes
para a prática desse delito. Aliás, nem mesmo é exigida para a tipificação a efetiva
obtenção da vantagem indevida, mas só o intuito de obtê-la (SOUZA, 2021).
Não há, portanto, como sustentar o entendimento doutrinário de que todas as
condutas do art. 5º, IV, e suas alíneas, da Lei nº 12.846/2013 (BRASIL, 2013), exigem
para sua configuração a necessidade de participação do agente público (em conjunto
com pessoa jurídica), ou mesmo de mais de um licitante, embora (repise-se) tais
conluios, ordinariamente, acabem se concretizando. Isso porque a lei anticorrupção

37
tem como desiderato justamente o outro lado da relação Estado-particular, no caso as
pessoas jurídicas que participem das licitações públicas.
Reafirme-se, portanto, que sob o prisma penal não se exige esse ajuste (acordo
de vontades entre o particular e o agente público, ou a adesão deste, para a
configuração do crime de corrupção ativa), sendo certo, contudo, que no mais das
vezes é o que se verifica, inclusive com a tipificação de delito de corrupção passiva
do agente público.
Sujeito ativo do delito é, em regra, o particular que concorre ao certame
licitatório, que pode atuar, em concurso, com outros participantes da licitação (na
hipótese e ajuste ou combinação) ou mesmo sozinho (quando pratica qualquer outro
expediente que viole o caráter competitivo do procedimento licitatório). Pode
outrossim, o servidor público ser co-autor, autor, ou partícipe do delito, caso não se
concretize o crime de corrupção passiva (o que é claro exige o aperfeiçoamento dos
elementares deste tipo de injusto – art. 317 do CP).
Mutatis mutandis, é o que também se extrai da leitura do art. 5º, I, da Lei nº
12.846/2013 (BRASIL, 2013), sendo possível a configuração da prática inflacionária
de suborno (oferta ou promessa de vantagem indevida a agente público ou terceira
pessoa a ele relacionada), mesmo que o agente público não aceite a vantagem ou
não pratique nenhum ato de ofício em favor da pessoa jurídica (que seria a beneficiária
do ato de corrupção). Em tal hipótese a pessoa jurídica responde por tal conduta
delituosa, praticada em seu nome (responsabilidade objetiva), na forma da Lei nº
12.846/2013 (BRASIL, 2013), pois o seu art. 5º, I, não exige para a configuração da
infração que o agente público aceite ou receba a vantagem indevida, nem tampouco
que pratique ato de ofício em razão dela (vantagem indevida). Isto porque o que se
tutela é também a moralidade administrativa.
Para tanto, é preciso relembrar e reforçar as premissas de que os atos de
improbidade administrativa, previstos nos arts. 9º, 10 e 11, da Lei nº 8.429/92
(BRASIL, 1992), somente são passíveis de punição, quando praticados de forma
dolosa, conforme posição francamente majoritária na jurisprudência, que inclusive
afirma que somente as condutas previstas no art. 10 admitem também a conduta
culposa.

38
Aqui o raciocínio é o mesmo, pois será cabível também a responsabilização de
ambos, agente público e licitantes ou contratados, por atos de improbidade
administrativa, na forma dos arts. 9º, 10 e 11, da Lei nº 8.429/92 (BRASIL, 1992), a
depender do grau de participação, da existência de vantagem indevida recebida pelo
agente público, do prejuízo ao erário ou, sem comprovação de tais circunstâncias, a
responsabilidade por violação aos princípios regentes da Administração Pública.

6. RESPONSABILIZAÇÃO POR ATOS DE CORRUPÇÃO E FRAUDES A


LICITAÇÕES E CONTRATOS

Fonte: stock.adobe.com

Como já visto, a responsabilização por fraudes a licitações e a corrupção


pública recebe o influxo de normas de direito sancionador penal e administrativo (este
seja na esfera extrajudicial e também judicial).
Há também a sanções administrativas similares aplicáveis pelos Tribunais de
Contas, que na esfera federal, têm previsão no art. 46 e 58, II, da Lei nº 8.443/92
(BRASIL, 1992).
Não se olvide ainda a responsabilização do direito antitruste, perante o
Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, no caso de atos lesivos à
Administração Pública, relativas a práticas cartelizadoras em licitações públicas,
consoante art. 36, incisos e parágrafos, da Lei nº 12.529/2011 (BRASIL, 2011), que
podem se identificar com aquelas previstas no art. 5º, IV e alíneas, da Lei nº

39
12.846/2013 (BRASIL, 2013), além, reafirme-se, da esfera penal, da improbidade
administrativa e da responsabilização perante os Tribunais de Contas.
Tal cumulação de processos, instâncias e punições geram ou podem gerar
questionamento se não estaria a se violar o princípio ou instituto do non bis in idem,
em razão de condenações múltiplas pelos mesmos fatos.
Ou seja, cumpre abordar o aspecto relativo às cumulações de processos
sancionadores e respectivas penas, acerca dos mesmos fatos, considerando o que
previsto nas leis apontadas, sob a perspectiva de eventual alegação de violação ao
non bis in idem.
Pois bem, de início mister observar-se que, conquanto não tenha previsão
constitucional explícita, aponta a doutrina que o postulado do non bis in idem estaria
constitucionalmente conectado às garantias de legalidade, proporcionalidade e,
fundamentalmente, devido processo legal, consoante art. 5º, LIV, da Constituição
(BRASIL, 1988), sendo de rigor reconhecer que o non bis in idem decorre mais do
processo interpretativo do direito, do que de prescrições expressas na constituição ou
nas leis.
De outra banda é preciso não olvidar que o legislador, desde uma vertente de
legitimação democrática, goza, no Estado Democrático de Direito, de uma ampla
liberdade para eleger os vários aspectos de um mesmo fenômeno violador dos
interesses da sociedade, estabelecendo a carga sancionatória que deve ser a ele
dedicada, desde que respeitados os limites constitucionais, como art. 5º, incisos
XXXIX, XL, XLV, XLVI, LIV, LV, XLV, XLVII, da Constituição (BRASIL, 1988).
No Brasil, a ideia preponderante sempre foi a de excluir a aplicabilidade desse
princípio ao abrigo do argumento de que fatos acabam assumindo identidades
distintas, desde diversas perspectivas normativas e valorações autônomas, além de
existir independência entre as instâncias fiscalizadoras, à luz da separação de
Poderes.
Registre-se a título de exemplo que o Supremo Tribunal Federal (BRASIL,
1998) ao julgar o Mandado de Segurança nº 22.728-PR deu como legítima a
cumulação de pena de multa pelo Tribunal de Contas da União, com a pena de
cassação da aposentadoria de agente público, aplicada pela Administração Pública.

40
Todavia, o que existe, é bem verdade, como exceção à independência das
instâncias, é a prevalência das decisões da Justiça Penal, em hipóteses nas quais tal
instância reconhece situações específicas, que se mostrariam contraditórias com o
poder sancionador estatal em outras esferas, quais sejam, nas situações de
absolvição por comprovada a inexistência do fato, ou prova de que o autor não
praticou o fato delituoso, e ainda se provada a existência de causas de exclusão da
ilicitude, conforme art. 386, incisos I, IV e VI, do Código de Processo Penal (BRASIL,
1941).
Isso porque o direito penal sancionador é considerado mais criterioso em
relação a outras esferas de responsabilização, ante o seu caráter fragmentário, de
tipificar somente as condutas mais graves, passíveis de serem sancionadas com
penas privativas de liberdade. Daí que no processo penal a busca pela denominada
verdade material é ampla, não havendo limites, desde que lícitos, à produção
probatória, inclusive por meios que somente são possíveis nesta esfera, como a
interceptação telefônica e telemática, a captação ambiental de sinais
eletromagnéticos, ópticos ou acústicos, a ação controlada, a infiltração, por policiais,
em atividade de investigação. Neste sentido o art. 5º XII, da Constituição (BRASIL,
1988) e o art. 3º, da Lei nº 12.850/2013 (BRASIL, 2013).
Ante tal perspectiva, no direito penal as decisões vinculam-se a uma dogmática
mais comprometida com direitos fundamentais, pois em tal campo, que guarda
conexões profundas com o Iluminismo e o ideário e valores humanistas da Revolução
Francesa, as garantias, tais como do devido processo legal, contraditório, ampla
defesa, in dubio pro reo, historicamente tiveram tratamento dogmático sofisticado e
centrado na dignidade da pessoa humana, tendo assumido, o princípio da
proporcionalidade, ares revolucionários.
Sob outro prisma, pode-se ainda questionar se cabível a cumulação das
sanções administrativas estrito senso e as civis (sanções administrativas aplicadas na
via judicial), da Lei nº 12.846/2013 (BRASIL, 2013), com as sanções da Lei nº 8.429/92
(BRASIL, 1992), que também têm fundamento no direito administrativo sancionador,
conquanto submetido à judicialização. A resposta é positiva, pois ambas têm origem
distinta e servem como preceito secundário de um subsistema específico, ou, visto de
outra maneira, ante a liberdade de conformação legislativa (limitada apenas a não

41
desrespeitar garantias e direitos fundamentais), fatos unitários podem ser valorados
desde perspectivas ou dimensões jurídicas distintas.
De mais a mais, as sanções da lei de improbidade atendem a mandamento
constitucional imperativo, previsto no parágrafo 4º, do art. 37, da Constituição
(BRASIL, 1988), estabelecendo que, sem prejuízo da ação penal cabível, os atos de
improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da
função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e
gradação previstas em lei.
Nessa perspectiva, padeceria de inconstitucionalidade legislação que ao
disciplinar a responsabilidade pelos atos anticorrupção, negasse a aplicação, ainda
que parcialmente, das sanções previstas da Lei de Improbidade Administrativa. Nessa
análise, sobre tal peculiaridade do poder sancionador estatal em relação aos atos de
improbidade administrativa, deve-se ainda levar em conta que:

O art. 37, § 4º, da CF/88, não trata, especificamente, de quaisquer outras


sanções que não as penais. Porém, ao estatuir que as sanções ali
mencionadas são independentes das penais, porquanto a ação penal cabível
ficou resguardada, o constituinte sinalizou que as sanções aos atos de
improbidade ostentam autonomia perante o Direito Penal. E se essa
autonomia se dá perante o mais grave dos ramos jurídicos, certamente
também se dará perante outras ramificações do Direito, notadamente as
responsabilidades civil e administrativa stricto sensu.

Esse entendimento quanto ao alcance do non bis in idem não elimina a sua
relevância e incidência para vedar que qualquer autoridade estatal possa instaurar
processo, e pretender sancionar (por mais uma vez) quem já foi julgado, condenado
ou absolvido, em dada esfera (subsistema específico) do poder sancionador. Em tal
hipótese a observância do non bis in idem é de rigor, para obstar o arbítrio e o abuso
de poder estatal, sob a perspectiva da garantia fundamental do devido processo legal,
conforme art. 5º, LIV, da Constituição (BRASIL, 1988) e, mais especificamente, do
item 4, do art. 8º, da Convenção Americana de Direitos Humanos, conhecida como
Pacto de São José da Costa Rica, promulgada pelo Decreto nº 678/92 (BRASIL,
1992), preceito legal que tem status diferenciado, de norma supralegal, abaixo da
Constituição, porém acima da legislação interna, considerada a sua temática,
conforme entendimento que firmou o Supremo Tribunal Federal no julgamento do
Recurso Extraordinário nº. 349.703-1-RS (BRASIL, 2008).

42
Essa vedação do bis in idem faz também todo o sentido no que tange à
reparação do dano, que não é medida punitiva, mas de caráter ressarcitório, de modo
que havendo condenação (simultânea) a tal obrigação consideradas as várias esferas
de responsabilização, a reparação integral ao erário só ocorrerá uma vez, sob pena
de enriquecimento sem causa do ente estatal credor.
Analisando o sistema administrativo sancionador no tocante à incidência da lei
anticorrupção, da lei de improbidade administrativa, da legislação penal e da lei de
licitações, defende-se que a vedação do bis in idem não tem força pra impedir a
instauração múltipla de investigações ou de apenamentos, a partir da perspectiva de
que o legislador, na sua liberdade de conformação pode exasperar as consequências
sancionadoras de dada conduta ilícita, o que não impede que concretamente se adote
interpretação analógica, como o uso dos critérios de unificação de penas previstas no
Código Penal, nas hipóteses de concurso de crimes, destacando, no entanto, que tal
operação só será possível no momento da execução das sanções.
Portanto, é preciso um olhar atento à cláusula do non bis in idem, no que tange
à proporcionalidade na aplicação das sanções, que devem ser valoradas sob uma
visão global, nos casos concretos postos à apreciação da autoridade administrativa
ou judicial, através, de regras do concurso formal ou crime continuado dos arts. 70 e
71, do Código Penal, por analogia, permitindo a relativização ou atenuação de
repetições e cumulações que porventura se apresentarem abusivas, ainda que tal
análise se dê na fase de execução das decisões condenatórias, sem contudo perder
de vista que a multiplicidade de instâncias e sanções significa que a conduta ilícita
deve, de qualquer forma, ser considerada mais grave, respeitando-se a liberdade de
conformação do legislador, a quem foi conferido, democraticamente, a função ou
missão institucional de definir essa pauta (a qual, observe-se, não é de atribuição do
demais poderes, nem mesmo do Judiciário) (SEVERO, 2014).

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7. BIBLIOGRAFIA

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