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SUMÁRIO

1 COOPERAÇÃO JÚRIDICA INTERNACIONAL ........................................... 3

1.1 FOREIGN CORRUPT PRACTICES ACT (FCPA) ................................ 5

1.2 Breve comparação entre a LEI 12.846/13 e Norte-Americano FOREIGN


CORRUPT PRACTICES ACT (FCPA)..................................................................... 9

1.3 Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico –


OCDE ........................................................................................................... 13

1.4 Reflexos no Brasil .............................................................................. 15

1.5 Parâmetros Internacionais e Nacional ................................................ 18

1.5.1 US Sentencing Guidelines............................................................ 18

1.5.2 Resource Guide to The US Foreign Corrupt Practices Act........... 18

1.5.3 Good Practices on Internal Controls, Ethics and Compliance ...... 19

1.5.4 Six Principles to Prevent Bribery .................................................. 22

1.5.5 Business Principles for Countering Bribery .................................. 22

1.5.6 Instituição de um Programa de Integridade e Combate à Corrupção


da CGU ..................................................................................................... 23

1.5.7 Elementos Essenciais .................................................................. 24

2 CORRUPÇÃO NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO ............................. 25

2.1 Licitações Internacionais e Compliance ............................................. 28

2.2 Cláusulas de Compliance nos Contratos Nacionais e Internacionais e


Lei Anticorrupção ................................................................................................... 31

3 CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO ........ 39

3.1 Sobre o UNODC ................................................................................. 44

3.2 Convenção da ONU ........................................................................... 47

4 CONVENÇÃO DA OEA ............................................................................ 49

5 COMPLIANCE INTERNACIONAL - EMPRESAS TRANSNACIONAIS .... 51

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5.1 A Governança e a Tolerância ao Risco .............................................. 52

5.2 Atividades de Controle ....................................................................... 52

5.3 Identificação de Eventos e Avaliação de Riscos ................................ 53

5.4 Controles e Monitoramento ................................................................ 53

5.5 Ambiente de Controles e Riscos ........................................................ 54

5.6 Os Programas de Compliance ........................................................... 54

5.7 Adaptação de Políticas ....................................................................... 55

5.8 Governança ........................................................................................ 56

5.9 Regulação Estrangeira ....................................................................... 56

5.10 Diferenças Culturais ........................................................................ 57

BIBLIOGRAFIA ............................................................................................... 58

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1 COOPERAÇÃO JÚRIDICA INTERNACIONAL

Fonte: www.efficienza.com.br

O setor empresarial, desde os seus primórdios, revela-se como um ramo


dinâmico e de constante evolução, o que sempre contribuiu para a sua considerável
complexidade. Ademais, em posição ainda mais relevante quando se leva em conta o
caráter complexo do ramo, encontra-se o amplo conjunto de elementos que o compõe,
como as relações interpessoais estabelecidas, as constantes e por vezes volumosas
transações financeiras realizadas e, em especial, a diversidade de particulares nos
mais diferentes cargos e funções e com variáveis graus de responsabilidade e
capacidade de alteração dos cenários em que se encontram.
Está-se diante, portanto, de um setor cujo grau de susceptibilidade aos desvios
de conduta, dos quais o homem jamais estará imune, demonstra-se elevadíssimo. Isto
porque as relações empresariais estão sempre intimamente ligadas a pessoas físicas
e tratam-se, em última instância, de relações interpessoais, não raro embasadas em
emoções, anseios e fraquezas inerentes ao ser humano.
Assim, ao longo do tempo percebeu-se que tais desvios de conduta eram
capazes de causar significativos prejuízos às empresas e ao setor empresarial como
um todo, haja vista que além de representarem infrações legais (como corrupção e

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suborno), as penalizações dali decorrentes prejudicavam financeira e estruturalmente
os envolvidos.
Diante desse contexto, os ordenamentos jurídicos ao redor do mundo,
buscando combater as situações acima descritas, construíram conjuntos normativos
visando à proibição e, em especial, a penalização das condutas infratoras cometidas
no meio empresarial, em especial os atos de corrupção e suborno.
Nesse cenário, o primeiro conjunto de normas a abordar direta e
especificadamente o tema e a positivar as prescrições legais a serem adotadas
nesses casos data de 1970 e consiste no FCPA – Foreign Corrupt Protection Act,
legislação dos Estados Unidos da América que visa a coibir e punir práticas de
corrupção cometidas por pessoas jurídicas naquele país.
O FCPA surgiu após um escândalo provocado por inúmeras investigações
realizadas na década de 1970 pela U.S. Securities and Exchange Commission (SEC)
– o equivalente, nos Estados Unidos, à Comissão de Valores Mobiliários brasileira
(CVM) – sobre pagamentos questionáveis efetuados por inúmeras empresas
americanas a funcionários públicos, políticos e partidos políticos nacionais e
estrangeiros. Dessa investigação, constatou-se a participação de mais 400
companhias americanas em esquemas de pagamentos ilegais ou duvidosos na ordem
de U$$ 300 milhões (trezentos milhões de dólares), utilizados para obter “favores” e
benefícios.
A escancarada vulnerabilidade dos EUA aos desvios praticados por aquelas
empresas, bem como a insuficiente penalização a ser aplicada, aliadas à pressão
popular, levaram o então presidente Jimmy Carter a assinar o FCPA, em 19 de
Dezembro de 1977. O referido ato foi ainda complementado pela ratificação, pelos
EUA, do International Anti-Bribery and Fair Competition Act, de 1998, assinado por
membros da comunidade internacional na Convenção para Combate do Suborno dos
Agentes Públicos Estrangeiros nas Transações Negociais Internacionais, promovida
pela OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
Em paralelo e mais recentemente, mas também de considerável importância
para a construção das políticas de combate à corrupção ao redor do mundo, surge no
Reino Unido o Bribery Act 2010, de origem semelhante à legislação americana, ou
seja, originada a partir de denúncias de atos de corrupção cometidos por empresas
britânicas.
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1.1 FOREIGN CORRUPT PRACTICES ACT (FCPA)

A partir da década de 1990, por pressão da comunidade internacional, países


desenvolvidos e em desenvolvimento iniciaram processos legislativos para
estabelecer medidas a fim de regulamentar o mercado e coibir práticas corruptas.
Antes dos anos 90, apenas os Estados Unidos possuíam normas de combate à
corrupção, o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), ato aprovado em 19 de dezembro
de 1977, pelo Congresso norte-americano, com objetivo de pôr fim ao suborno de
funcionários públicos estrangeiros e de restaurar a confiança do público na integridade
do sistema empresarial.
O ato foi assinado em lei pelo presidente Jimmy Carter em 19 de dezembro de
1977, e foi alterado em 1988, para introduzir, dentre outras medidas, a exceção aos
pagamentos de facilitação e pagamento feitos por terceiros, e, em 1998, pela Lei Anti-
Suborno Internacional, que visava adequar a norma à Convenção Anti-suborno da
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A propósito, os Estados Unidos em muito influenciaram na construção
legislativa mundial, sendo o país no qual se iniciou definitivamente a repressão das
condutas corruptas, por meio da aprovação da FCPA, conforme exposto. Frise-se a
existência de duas importantes normas, a Lei Sarbanes-Oxley, de 30 de julho de 2002,
que tem por objetivo a prevenção de fraudes nas demonstrações financeiras, e a Lei
Dood-Frank de Reforma de Wall Street, de 21 de julho de 2010, que possui incentivos
financeiros aos denunciantes de violações ao sistema. Mais ainda, os Estados Unidos
apresentam uma doutrina consolidada e vasta jurisprudência acerca da matéria.
O FCPA foi editado como resposta às críticas da opinião pública à maneira
como as empresas americanas conduziam seus negócios (e ao próprio sistema
capitalista), mais especificamente em razão do escândalo das propinas pagas (US$22
milhões) a funcionários públicos estrangeiros e organizações políticas pela Lockheed
Corporation, empresa do ramo de desenvolvimento e produção de aeronaves.
Naquela época, o pagamento de propinas não era considerado ilegal, sendo
esta uma prática corriqueira nos Estados Unidos e no mundo. Em alguns países,
inclusive, havia possibilidade de deduzir, do imposto de renda devido, esse montante
pago a título de suborno. Contudo, era usual a confissão de tais pagamentos ilícitos à
U.S. Securities and Exchange Commission (SEC), que, por sua vez, exigia uma
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declaração de que tal prática não seria mais adotada. Além da Lockheed Corporation,
a Gulf Oil, United Brands, Northrop, Ashand Oil, Exxon e outras foram implicadas em
escândalos.
A diferença entre os casos mencionados foi que Lockheed Corporation se
recusou a informar os beneficiários e a parar de pagar as propinas. Ademais disso, a
companhia emitiu declaração alegando que o suborno era normal, necessário e
“consistente com as práticas de inúmeras empresas estrangeiras”. Ou seja,
manifestou-se no sentido de que tal proibição era deletéria aos negócios e
competitividade das empresas americanas na medida em que prejudicava a
concorrência (levando-se em conta que as outras pagavam). Aliás, essa foi crítica
comum à época, a de que a proibição prejudicava a competição das empresas
americanas. A outra crítica é a de que a corrupção possui efeito positivo na economia,
na medida em que diminuiu a burocracia em países fortemente regulados. A propósito,
os impactos da corrupção sobre a economia permanecem discutíveis até a atualidade.
Fato é que o Congresso não tinha como punir a Lockheed Corporation, pois,
como mencionado acima, o pagamento de suborno não era proibido pela legislação
americana. Existiam leis que eram indiretamente aplicáveis, relacionadas às matérias
tributária e societária, mas nenhuma se aplicava diretamente a essa situação. E o
Congresso houve por bem atuar neste vácuo legislativo.
Em termos gerais, o FCPA, que é parte do Securities Act de 1934, proíbe que
empresas americanas ou aquelas que emitem ações nos Estados Unidos paguem
ilicitamente qualquer quantia em dinheiro ou coisa de valor a funcionários públicos
estrangeiros, tanto para obtenção de novos negócios, quanto para renovação dos
contratos já existentes. A norma também exige que as sociedades mantenham seus
livros e registros contábeis em boa ordem e guarda, e possua sistema de controles
internos para garantir que as transações somente sejam realizadas se previamente
autorizadas pelo management. Essa regra é importante na medida em que aplicável
não só às empresas, como também aos administradores, diretores, empregados,
terceiros e agentes (consultores, distribuidores, representantes etc). Em suma, essas
são as duas principais provisões: (i) as anti-bribery provisions (dispositivos legais
contra suborno), e (ii) the books and records and internal control provisions
(disposições acerca dos livros, registros e controles internos).

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Ressalte-se que os responsáveis pela aplicação são a Comissão de Valores
americana, a Securities Exchange Commission (SEC), e o Departamento de Justiça
(Department of Jutice (DOJ)), sendo que este último tem competência criminal para
investigar e oferecer denúncia das violações às provisões criminais do FCPA (criminal
law enforcement), e, a primeira, competência civil (civil law enforcement). Geralmente,
os dois órgãos atuam em conjunto, proferindo suas decisões no mesmo instante.
Importante mencionar ainda que a norma não se aplica ao pagamento de
dinheiro ou bens de qualquer valor a sujeitos privados com a intenção de corromper,
mas tão-somente a funcionários públicos. O FCPA é aplicado indiretamente a sujeitos
privados em algumas situações, como, por exemplo, nas tentativas de ocultação de
ilícitos.
O FCPA também é aplicável no pagamento de propina ao próprio governo
estrangeiro, ao invés de ser direcionado aos funcionários destes governos. O DOJ e
a SEC aplicaram mais de U$ 200 milhões em multas e outras penalidades às
empresas GE, Chevron, AB Volvo, Innospec, Ingersoll-Rand, Akzo-Nobel, York,
Textron, EL Paso, Agco, Flowserve, Novo Nordisk, e a Fiat, em razão do pagamento
ao governo iraquiano violarem o programa “Oil for Food” das Nações Unidas.
No que concerne às penalidades, o DOJ impõe sanções cíveis e criminais e a
SEC sanções cíveis e administrativas. As penalidades cíveis representam multas e
outras modalidades de sanções governamentais, bem como a suspensão do mercado
de valores imobiliários. As penalidades criminais podem variar entre multas de até
US$2 milhões para cada ato ilícito para as empresas, e, para as pessoas físicas,
multas de até US$100 mil e prisão de até 5 anos, multas que podem ser elevadas, de
acordo com o Alternative Fines Act, em até duas vezes o benefício obtido pela
empresa.
Os US Sentencing Guidelines são utilizados para calcular o valor das multas e
levam em consideração aspectos como o número de funcionários da organização,
histórico de violações, presença de executivos seniores, cooperação, prestação de
informações voluntárias, declaração de responsabilidade e existência de programas
de Compliance.
Os Guidelines também são utilizados para aplicação de penalidade às pessoas
físicas, sendo que estes levam em conta a quantidade e periodicidade dos

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pagamentos, grau de envolvimento e reincidência do indivíduo. Nos últimos anos, as
autoridades americanas têm aplicado multas com mais rigor.
O entendimento no sentido de que a proibição dificultava os negócios impediu
outros países de adotarem regras similares ao FCPA. Em verdade, empresas de
países como Austrália, Áustria, Bélgica, França, Alemanha, Luxemburgo, Holanda,
Portugal, Nova Zelândia e Suíça levavam vantagem, em termos competitivos, sobre
as empresas americanas, uma vez que podiam corromper funcionários públicos
estrangeiros, e, como mencionado, até mesmo deduzir o valor pago a título do
suborno do imposto devido. Assim, as empresas norte americanas perdiam negócios
após a edição do FCPA.
O FCPA também foi e continua sendo alvo de críticas, seja pela falta de
transparência nas decisões, seja – principalmente - pela possibilidade de acordo para
evitar as punições, o que ocorre frequentemente. O autor Brandon L. Garrett traz
dados empíricos que demonstram que a justiça norte-americana trata de maneira
diferente os cidadãos e as empresas comuns e as grandes corporações e seus
executivos, beneficiando estes últimos por meio de negociações, acordos e penas
reduzidas.
Os Estados Unidos tentaram por muitos anos pressionar os demais países a
adotarem norma semelhante ao FCPA, contudo, sem obterem sucesso; a corrupção
ainda era considerada eficiente em termos econômicos. A realidade só começou a
mudar a partir do momento em que estudos acadêmicos chegaram à conclusão de
que a corrupção trazia mais malefícios do que benefícios ao comércio internacional, à
medida que corroíam a credibilidade das instituições democráticas e o estado de bem-
estar social.
Por pressão dos Estados Unidos, a partir dos anos 1990, foram editadas
convenções internacionais de combate à corrupção. A primeira foi a Convenção
Interamericana contra a Corrupção, em 29 de março de 1996 (Convenção da OEA).
Posteriormente, em maio de 1997, foi aprovada a Convenção sobre o Combate da
Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais
Internacionais, a qual foi adotada pelos 29 (vinte e nove) Estados membros e outros
5 (cinco) não membros da Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE). E, por fim, a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção,
aprovada em 31 de outubro de 2003.
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Das três, a de maior relevância é a Convenção da OCDE, pois é a pioneira na
cooperação internacional entre países com representatividade mundial para
prevenção e combate ao crime de corrupção de funcionários públicos estrangeiros.
Todos os países signatários da Convenção da OCDE se comprometeram a adequar
suas legislações no sentido de criminalizar o oferecimento de qualquer vantagem
indevida a funcionário público estrangeiro.
A partir daí, tem-se que leis em diversos países foram editadas, com destaque
para UK Bribery Act de 2010, que tipifica também a corrupção de sujeitos privados.
Atos como o pagamento a título de facilitação de negócios (grease payments), que
não são coibidos pelo FCPA, são vedados sob a ótica do Bribery Act.
Além da prevenção e combate ao crime de corrupção, outro objetivo da
Convenção da OCDE é o estabelecimento da responsabilização civil, administrativa
das pessoas jurídicas pelos atos de corrupção, bem como a responsabilização penal,
caso seja combatível com a legislação do país.
Muito embora tivesse dado passos significativos em relação ao combate à
corrupção, as medidas adotadas pelo Brasil estavam longe de ser suficientes. Nos
dias 7 e 8 de setembro de 1998, ocorreu em Buenos Aires o Workshop on Combating
Corruption and Bribery of Public Officials in International Business Transactions,
evento promovido pela OCDE, OEA e pela Argentina, com a presença do Fundo
Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, cujo objetivo foi promover uma
discussão a respeito das Convenções de ambas as entidades, bem como mostrar os
avanços que estavam ocorrendo no âmbito da cooperação internacional. O Brasil
participou ativamente das discussões, comprometendo-se a se empenhar na
aprovação das normas e medidas anticorrupção.

1.2 Breve comparação entre a LEI 12.846/13 e Norte-Americano FOREIGN


CORRUPT PRACTICES ACT (FCPA)

O combate à corrupção demanda cuidados que se entrelaçam numa incessante


tentativa de evitar desvios comportamentais e incentivar a adoção de práticas que
possam minimizar os riscos de sua ocorrência. Evidentemente, é preciso considerar
a falibilidade dos mecanismos voltados a impedir o malfeito, pelo que ferramentas que
permitam a detecção dos atos ilícitos e medidas repressivas, voltadas à punição de

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pessoas físicas e jurídicas, também compõem o artefato com o qual se poderá frear a
corrupção.
No cenário das licitações e contratações públicas, certamente não há um
conjunto perfeito de ferramentas e mecanismos capazes de eliminar os desvios, mas
a existência de um sistema que possa de forma harmônica contribuir para
desincentivar/ reduzir/ detectar/ punir é fundamental para sinalizar a preocupação da
sociedade e do governo.
Os Estados Unidos da América também convivem com a corrupção e
estabeleceram uma vastidão de medidas com o propósito de evitar sua ocorrência,
sem descuidar da penalização dos responsáveis.
Dentre os diversos procedimentos e previsões normativas encontradas, uma
especial atenção merece o Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) o FCPA remonta ao
ano de 1977, após uma série de escândalos sobre pagamentos de propinas em
ambiente doméstico e internacional, atingindo aproximadamente 400 empresas. Não
se trata da mais poderosa arma de combate à corrupção (se é que se pode assim
reconhecer qualquer uma delas), sobretudo porque não atinge os atos de corrupção
a envolver agentes públicos norte-americanos, mas o elegemos para este breve
comentário considerando a possibilidade de oferecer uma contraposição com a Lei nº
12.846/13.
Substancialmente, o FCPA proíbe a oferta e a efetiva realização de
pagamentos impróprios a “foreign official”, destinados a garantir um ajuste ou a
manutenção de um vínculo preexistente, mesmo que o ajuste que se queira
estabelecer ou preservar não envolva o governo estrangeiro ou suas entidades. O
fato de o agente ser capaz de influenciar o governo estrangeiro a adotar
comportamento desejado também atrai a aplicação do FCPA.
A abrangência do conceito de “foreign official” é maior do que a literalidade
poderia sugerir. Está a se incluir não apenas o que no Brasil chamaríamos de agentes
públicos, mas qualquer pessoa que possa estar a atuar em benefício de órgãos
públicos ou organismos internacionais, como o Banco Mundial e a Organização dos
Estados Americanos. Inclui, como já se suporia pela menção a agentes públicos,
empregados de organizações do terceiro setor e de empresas estatais.
O Departamento de Justiça (DOJ) e a Secutiries and Exchange Commision
(SEC) são os órgãos encarregados de aplicar o FCPA, pelo que deles emerge a
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interpretação da norma. Já se considerou foreign official o membro de um comitê na
Índia, responsável por decidir sobre o registro/licença de produtos químicos naquele
país.
A primeira e importante distinção para a nossa lei está na ausência de distinção
entre agentes estrangeiros ou brasileiros como destinatários da propina. Nos Estados
Unidos, trata-se de forma apartada, mediante outras regras, a corrupção interna, a
atingir os agentes norte-americanos.
Repudia-se pagar, oferecer ou prometer pagar dinheiro, presente ou algo de
valor, como viagens, joias, desde que com o intento de corromper. A comprovação do
“evil motive”, da intenção de influenciar de forma inaceitável o destinatário da
vantagem indevida a obter ou manter vínculos comerciais é requerida nos EUA, tanto
sob a influência do FCPA quanto nas hipóteses de corrupção interna. Deve ser
demonstrado que havia consciência do ato ilícito do ato praticado, ainda que não
necessariamente o responsável pelo pagamento ou oferta tenha conhecimento de que
o destino final seria o “foreign official”. A responsabilidade das empresas subsistirá se
a empresa autorizar (implícita ou explicitamente) ou tiver conhecimento de atos de
terceiros, como advogados ou consultores, considerados ilícitos nos termos do FCPA.
A Lei brasileira estabelece responsabilidade objetiva, não importando se a
empresa tinha ou não conhecimento, se havia autorizado ou demandado a prática dos
atos considerados nocivos por seus colaboradores. Trata-se de regra que facilita a
responsabilização das empresas, dado que desnecessária a comprovação do intuito
de corromper exigido nos Estados Unidos.
Ao apresentar a Lei Brasileira, a reação dos norte-americanos foi de surpresa.
Consideram um excesso a responsabilização de uma empresa sem que se investigue
em que medida ela estava efetivamente ciente do “wrongdoing”. Contudo, soa
inocente imaginar que a corrupção, sobretudo, e de forma muito acentuada, a que
ocorre para além dos mares, assunto abordado no FCPA, possa ocorrer sem que a
empresa tenha ciência. De toda sorte, não é possível ignorar a prática brasileira de
criar regras extremamente rígidas, em especial quando o propósito é a
responsabilização civil, penal ou administrativa, cuja efetiva aplicação apenas se torna
mais difícil.
Explicar que as existências de um forte sistema de integridade, da
demonstração de cooperação por parte das empresas, da ausência de histórico prévio
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apenas servirão como balizas para a aplicação das penalidades, mas não as
afastarão, também causa perplexidade na terra de George Washington.
Regra a sugerir uma excessiva flexibilidade, relaciona-se com a possibilidade
constante no FCPA de se admitirem alguns tipos de pagamentos e dois tipos de
defesas, o que não existe na realidade legislativa brasileira, ao menos não de forma
expressa.
À luz do FCPA, justifica-se o pagamento, a título de “facilitating payments”,
assim consideradas despesas destinadas ao escalão inferior do governo (e
equivalentes) para sustentar ações rotineiras, chamadas de “routine government
actions", como licenças, vistos. Evidentemente que a nomenclatura não alcança
decisões sobre o destinatário de dado contrato. A despeito de a Lei nº 12.846/13 não
excluir pagamentos dessa ordem do seu guarda-chuva de abrangência, parece
razoável concluir pela impossibilidade de condenação dado que não estaria
configurada a ilicitude que a lei visa reprimir.
O FCPA refere-se ainda a duas “affirmative defenses”. Não se condena o
pagamento de dinheiro ou equivalente quando ajustado expressamente à legislação
do país estrangeiro. Entretanto, ainda que se faça o pagamento de algo tolerado pela
legislação estrangeira, a existência do intento de corromper poderá atrair a incidência
do FCPA, a transparência do pagamento é um dos fatores que o DOJ e a SEC irão
considerar para decidirem as ações a serem adotadas em casos assim.
A Legislação brasileira não traz regra semelhante. Os argumentos para a
previsão no FCPA acima descrita não foram convincentes. A regra parece ignorar que,
ainda que a legislação externa autorize o pagamento, a preocupação mundial deve
ser a de evitar qualquer sorte de ofensa ao ambiente competitivo, pelo que todos os
esforços devem ser congregados com vistas a desestimular de forma irmanada
práticas incorretas, sobretudo porque a corrupção danifica de forma mais acentuada
os países mais pobres, impedindo o bem-estar social e por vezes afetando a
democracia.
A segunda defesa é relativa ao que no FCPA é denominado como “reasonable
and bona fide expenditures”. Quando se verifica que a empresa pagou despesas
razoáveis e imbuída de boa-fé, tais como viagens em favor do “foreign official” para
promover, demonstrar ou explicar os produtos e serviços, afastam-se as penalidades.
Vê-se, como o nome sugere, que apenas razoáveis despesas são admitidas. Por isso,
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em 1999, o DOJ não aceitou a utilização da defesa quando a empresa americana
Metcalf & Eddy Inc. pagou viagens de primeira classe de agentes egípcios para os
Estados Unidos com todas as demais despesas da viagem incluídas, inclusive valores
em dinheiro.
Defesa assim igualmente não é reconhecida na legislação brasileira, cuja ideia
central é a rigorosa responsabilidade objetiva.

1.3 Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico –OCDE

A Convenção da OCDE sobre o Combate à Corrupção de Funcionários


Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, promulgada em
1997, dispõe que os países signatários deverão criminalizar a conduta de corromper
agentes públicos estrangeiros e, no campo da responsabilização das pessoas
jurídicas, impõe, no Artigo 2, que: “cada Parte deverá tomar todas as medidas
necessárias ao estabelecimento das responsabilidades de pessoas jurídicas pela
corrupção de funcionário público estrangeiro, de acordo com seus princípios jurídicos”
A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE é
uma organização internacional, formada pela associação de países membros, cuja
missão é a promoção de políticas que proporcionem a melhoria das condições
econômicas das nações e o bem-estar econômico e social das pessoas.
As suas origens remontam à aplicação do Plano Marshall, após a Segunda
Guerra Mundial, quando surgiu a Organização para a Cooperação Econômica
Europeia, que gerava recursos trazidos por este plano e coordenava os esforços de
reconstrução da Europa.
A Convenção sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos
Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE como o mais
importante instrumento no combate internacional à corrupção. A Convenção da OCDE
ensejou avanços na legislação anticorrupção na União Europeia e em vários países.
Dos diplomas legais editados após a Convenção da OCDE cabe destacar o UK
Bribery Act, do Reino Unido, que entrou em vigor em 1.º de julho de 2011. Tal diploma
foi inovador por tratar como ofensa criminal a “Failure of commercial organization stop
prevent bribery” que, traduzindo, significa: “O fracasso de organizações comerciais
para evitar o suborno e a corrupção”. Em análise, a lei britânica criminaliza a
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inobservância do dever de cuidado que deve ser inerente às organizações de natureza
empresarial.
De outra banda, o UK Bribery Act contempla que, na hipótese de a sociedade
comprovar a presença de procedimentos adequados no sentido de prevenção da
corrupção, os chamados programas de Compliance, sua conduta poderá não sofrer
qualquer sanção, o que vem estimulando sobremaneira a adoção, por empresas com
atuação no âmbito da União Europeia, de programas de Compliance.
Quais os objetivos da Convenção?
Fazer com que os países participantes possam, de maneira coordenada, adotar
mecanismos para prevenir e reprimir a corrupção de funcionários públicos
estrangeiros na esfera das transações comerciais internacionais;
Estabelecer responsabilidades às pessoas jurídicas que corrompam
funcionários públicos estrangeiros;
Considerar a imposição de sanções cíveis ou administrativas a pessoas sobre
as quais recaiam condenações por corrupção aos referidos funcionários;
Estabelecer a prestação de assistência jurídica recíproca de forma efetiva e
rápida entre os Estados Partes;
Eliminar a concorrência desleal gerada pela corrupção.
De que maneira a Convenção ajuda a combater a corrupção?
Os países signatários são obrigados a criminalizar o ato de corrupção de
funcionários públicos estrangeiros em transações internacionais. Além
disso, devem adotar as recomendações específicas da OCDE, como:
 Criar mecanismos para eliminar a dedução fiscal dos subornos;
 Garantir a transparência das práticas contábeis e de auditorias;
 Criar medidas preventivas e repressivas contra a corrupção nos
sistemas de contratação públicos, entre outras.
Conforme prescreve a Convenção, as empresas envolvidas na corrupção de
funcionário público estrangeiro também deverão ser responsabilizadas, seja penal,
civil ou administrativamente. As penalidades se aplicam também à obtenção de
contratos e autorizações ou tratamentos preferenciais em procedimentos fiscais,
aduaneiros, judiciais ou legislativos.
O que o Brasil está fazendo para cumprir as determinações da Convenção?

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Para cumprir as determinações e aperfeiçoar os mecanismos de combate à
corrução de funcionários públicos estrangeiros em transações comerciais
internacionais, o Brasil tomou as seguintes medidas:
 Tornou crime o ato de oferecer, prometer ou dar qualquer vantagem
indevida, seja diretamente ou por meio de intermediários, a funcionários
públicos estrangeiros para facilitar a realização de transações comerciais
ou para obter outra vantagem na condução de negócios internacionais;
 Proibiu práticas contábeis e de auditorias que possam ser empregadas
para acobertar a corrupção;
 Estabeleceu acordos de assistência jurídica com os principais parceiros
comerciais do País, permitindo, inclusive, a extradição por corrupção;
 Elaborou Projeto de Lei que aumenta a pena para o crime de corrupção
ativa de funcionário público estrangeiro em transações comerciais
internacionais.

1.4 Reflexos no Brasil

O Brasil, apesar de signatário das referidas Convenções, não tinha aprovado


nenhuma legislação recepcionando-as, o que só veio a ocorrer em 14 de junho de
2000, com a aprovação da Convenção da OCDE (Decreto n.º 3.678/00). Como parte
dos compromissos assumidos pelo Brasil na Convenção da OCDE, foi aprovada a Lei
n.º 10.467, de 11 de junho de 2002, que incluiu os artigos 337 B, C e D, capítulo Dos
Crimes Praticados por Particular Contra a Administração Pública Estrangeira, no
Código Penal.
Desde então, o país adotou medidas de combate à corrupção e demais atos
ilícitos contra a administração pública mais intensas, mediante a promulgação das
supramencionadas Convenção Interamericana contra a Corrupção, por meio do
Decreto n.º 4.411, de 7 de outubro de 2002, e a Convenção das Nações Unidas Contra
a Corrupção, pelo Decreto n.º 5.687, de 31 de janeiro de 2006, bem como a aprovação
de leis, tais como: a Lei Complementar n.º 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal),
a Lei Complementar n.º 105/2001 (Lei da Ficha Limpa), a Lei n.º 10.520/2002 (Lei do
Pregão), a Lei n.º 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação) e a Lei n.º 12.813/13 (Lei
do Conflito de Interesses).
15
O Grupo de Trabalho sobre Suborno da OCDE (WGB – Working Group on
Bribery), o qual foi criado em maio pelo Comitê sobre Investimento Internacional e
Empresa Internacional, é responsável por monitorar a adequação do Brasil ao acordo
assinado. O processo de monitoramento pelo qual passam os países constitui-se de
três fases: a primeira, que parte da análise da adequação da legislação aos termos
da Convenção; a segunda, os avanços concretos obtidos pelos países signatários às
recomendações feitas na primeira fase; e a terceira, para os avanços em relação à
segunda e análise de jurisprudência nacional de casos de corrupção internacional
envolvendo pessoas físicas e jurídicas.
A Controladoria Geral da União (CGU) é o órgão responsável por assistir
diretamente ao Presidente da República quanto aos assuntos relativos, dentre outros,
ao combate a corrupção, e também pela coordenação das avaliações, tanto quando
é país analisado, quanto analisador, além de conduzir a participação brasileira no
referido Grupo.
Importante mencionar que o Brasil teve boa avaliação nas Fases 1 e 2, que
ocorreram, respectivamente, em agosto de 2004 e dezembro de 2007, sendo que,
com relação à segunda (Relatório sobre a Aplicação da Convenção de Combate ao
Suborno de Funcionários Públicos Estrangeiros e Recomendações de Combate ao
Suborno em Transações Comerciais Internacionais de 1997 ), o WGB recomendou ao
governo brasileiro a implementação da supramencionada Convenção da OCDE de
maneira mais efetiva, sugerindo que o país:
(i) Tomasse medidas urgentes para estabelecer a responsabilidade direta
de pessoas jurídicas pelo delito de suborno de um funcionário público
estrangeiro;
(ii) Criasse sanções efetivas, proporcionais e dissuasivas, incluindo
sanções monetárias e confisco; e
(iii) Assegurasse que, em relação ao estabelecimento de jurisdição sobre as
pessoas jurídicas, uma ampla interpretação da nacionalidade das
pessoas jurídicas fosse adotada (Convenção, artigos 2,3 e 443 e
recomendações revisadas, parágrafo I).
Com efeito, a fim de atender aos compromissos internacionais firmados, o
Poder Executivo brasileiro apresentou o Projeto de Lei n.º 6.826/10, de autoria da
CGU, do Ministério da Justiça e da Casa Civil, para tratar da responsabilização
16
administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração
pública, nacional ou estrangeira.
Contudo, ainda que tenha ratificado a Convenção da OCDE (e as outras
Convenções), o Brasil, até o ano 2013, ainda não tinha aprovado o projeto de lei que
honrasse tal compromisso. Até que em junho, durante a Copa das Confederações,
quando milhares de pessoas no país (e também no exterior) saíram às ruas para
protestar contra, dentre outras, o aumento das tarifas do transporte público e a
corrupção, foi aprovada no Brasil a Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Apelidada
de “lei anticorrupção” e “lei da empresa limpa”, a norma entrou em vigor, em 29 de
janeiro de 2014, objetivando responsabilizar, nas esferas cível e administrativa, as
pessoas jurídicas pelas práticas de atos criminosos contra a Administração Pública,
nacional ou estrangeira.
Chama atenção para o fato de que, após a aprovação da Lei n.º 12.846/13, foi
publicado em 29 de outubro de 2014, pelo WGB, o relatório sobre a Fase 3 da
implementação da Convenção da OCDE, cujo objetivo foi a análise dos avanços
obtidos em relação à segunda fase. O relatório indicou que o país evoluiu com a
publicação da Lei n.º 12.846/13 e aumentou o número de medidas de cooperação
com outros países nas investigações, possibilitando o crescimento dos números de
casos analisados pelo Poder Judiciário. Por outro lado, apresentou 16
recomendações, como a edição do decreto que irá regulamentar a referida lei e maior
atuação do Poder Judiciário nos casos envolvendo corrupção.
Embora o relatório tenha apontado uma evolução positiva, como a promulgação
da Lei da Empresa Limpa, também conhecida como Lei Anticorrupção, esforços
amplos de sensibilização sobre o combate à corrupção e um aumento na utilização
de cooperação jurídica internacional em casos de suborno estrangeiro, também
identificou outras áreas de que precisam melhorar.
A Lei da Empresa Limpa determina que o Governo Federal emita um
regulamento sobre programas de Compliance. As autoridades brasileiras têm
mencionado em diferentes fóruns públicos que o regulamento não será limitado
apenas a descrever os critérios de avaliação desses programas. Artigos já publicados
discutem as principais questões que deverão fazer parte da regulamentação. É
importante notar que a Lei da Empresa Limpa é aplicável, apesar da falta de
regulamentação.
17
1.5 Parâmetros Internacionais e Nacional

1.5.1 US Sentencing Guidelines

Em 1991, a United States Sentencing Comission (USSC) promulgou os Federal


Sentencing Guidelines for Organizations (FSGO), estabelecendo os elementos
(standards) para um efetivo programa de Compliance, bem como criando diretrizes
para os juízes norte-americanos para aplicação das penas. Muito importante o fato de
que houve uma tentativa da USSC de criar incentivos para que as empresas
adotassem os Guidelines, uma vez que a adoção das medidas tem o condão de
reduzir as penalidades a que estão sujeitas, caso seus funcionários se envolvam em
atos de corrupção.
O FSGO (capitulo 8) lista “sete passos” (“seven-step” standards”) para a criação
de programas de Compliance efetivos:
1. Implementação de um código de conduta, políticas e procedimentos
2. Especificação das responsabilidades
3. Não delegação de poderes a indivíduos que têm propensão a se
envolverem em atividades criminosas
4. Comunicação e treinamento
5. Monitoramento, auditoria, incluindo canal para denúncias
6. Atitude adequada e consistente processo disciplinar
7. Remediação e ações corretivas, incluindo revisão periódica do
programa de Compliance
Os Guidelines vêm sendo usados pelas empresas como base para construção
dos seus programas. Ressalte-se, aliás, que não existe um “guia” que sirva para todas
as empresas, em razão da particularidade intrínseca a cada uma; os sete-passos são,
dessa forma, os elementos mínimos que devem constar dos programas.

1.5.2 Resource Guide to The US Foreign Corrupt Practices Act

O Guia FCPA (FCPA Guidance) foi publicado pela US Department of Justice


(DJO) e pela US Securities and Exchange Comission (SEC) em 2012, com o objetivo
de fornecer as primeiras informações para todas as empresas, desde aquelas que
estão iniciando as operações no exterior, quanto as multinacionais que possuem filiais

18
em todo o mundo. O FCPA Guidance lista dez hallmarks (marcas características) que
podem tornar os programas de Compliance efetivos. São eles:
1. Compromisso da Gerência Sênior e política claramente articulada contra
a Corrupção
2. Código de Conduta e Políticas de Compliance e procedimentos
3. Supervisão, autonomia e Recursos
4. Avaliação de Risco
5. Treinamento Contínuo
6. Incentivo e Medidas Disciplinares
7. Due Diligence de Terceiros e Pagamentos
8. Denúncia Confidencial e Investigação Interna
9. Melhoria Contínua: exames periódicos e avaliação
10. Fusões e Aquisições: Due Diligence de pré-aquisição e da Integração
de pós aquisição.

1.5.3 Good Practices on Internal Controls, Ethics and Compliance

Em 9 de dezembro de 2009, no aniversário de 10 anos da entrada em vigor da


sua Convenção, a OCDE publicou a Recomendação para Combate ao Suborno de
Funcionários
Públicos Estrangeiros (Recommendation for Further Combating Bribery of
Foreign Public Officials), o qual continha o documento Boas Práticas em Controles
Internos, Ética e Compliance (Good Practices on Internal Controls, Ethics and
Compliance).
Este Good Practice Guidance é direcionado para as empresas, como forma de
orientação, a fim de garantir a eficácia do controle interno, da ética e dos programas
de Compliance ou medidas para prevenir e detectar o suborno de funcionários
públicos estrangeiros nas transações comerciais internacionais, e para as
organizações empresariais e associações profissionais.
As empresas devem considerar as seguintes boas práticas para garantir
controles internos, programas de Compliance e ética com a finalidade de prevenir e
detectar o suborno estrangeiro:

19
1. forte, explícito e visível apoio e comprometimento da gerencia sênior aos
controles internos da empresa, programa de Compliance e ética ou de
medidas de prevenção e detecção de suborno estrangeiro;
2. política corporativa claramente articulada e visível que proíbe o suborno
estrangeiro;
3. cumprimento desta proibição e dos controles internos relacionados,
programas de Compliance e ética é o dever dos indivíduos em todos os
níveis da organização;
4. supervisão dos programas de Compliance e ética relativas a suborno
estrangeiro, incluindo o poder de comunicar os incidentes diretamente para
organismos de controle independentes, tais como comitês de auditoria
interna dos conselhos de administração ou dos órgãos de fiscalização, é o
dever de um ou mais funcionários sênior das empresas, com um nível
adequado de autonomia de gestão, recursos e autoridade;
5. programas de Compliance e ética destinados a prevenir e detectar o
suborno estrangeiro, aplicável a todos os conselheiros, diretores e
funcionários, e aplicável a todas as entidades sobre as quais a empresa
tem controle efetivo, incluindo as subsidiárias, relativo às seguintes áreas:
i) presentes;
ii) hospitalidade, entretenimento e despesas;
iii) viagens de cliente;
iv) contribuições políticas;
v) doações e patrocínios;
vi) pagamentos de facilitação; e
vii) solicitação e extorsão;
6. programas de Compliance e ética destinados a prevenir e detectar o
suborno estrangeiro aplicável, onde for necessário e sujeito às disposições
contratuais, a terceiros, como agentes e outros intermediários, consultores,
representantes, distribuidores, prestadores de serviços e fornecedores,
consórcios e sócios de Joint Venture, incluindo, os seguintes elementos
essenciais:

20
i) Due Diligence devidamente documentada com base no risco
referente à contratação, bem como a supervisão adequada e regular dos
parceiros de negócios;
ii) informar os parceiros de negócios do compromisso da empresa
em cumprir com as leis sobre as proibições contra o suborno estrangeiro,
e do programa de Compliance e ética da empresa para prevenir e
detectar esse tipo de suborno; e
iii) buscar compromisso recíproco de parceiros de negócios.
7. sistema de procedimentos contábeis e financeiros, incluindo um sistema
de controles internos, razoavelmente desenvolvido para garantir a
manutenção justa e precisa dos livros contábeis, registros e contas, para
garantir que eles não possam ser utilizados para fins de suborno
estrangeiro ou para que se esconda tal prática;
8. medidas destinadas a garantir uma comunicação periódica, e
documentada de treinamento para todos os níveis da organização, sobre o
programa de Compliance e ética da mesma relativas a suborno estrangeiro,
bem como, onde necessário, para as subsidiárias;
9. medidas adequadas para promover e proporcionar um apoio positivo
para a observância dos programas de Compliance e ética contra o suborno
estrangeiro, em todos os níveis da organização;
10. procedimentos disciplinares adequados para abordar, entre outras
coisas, violações, em todos os níveis da organização, das leis contra o
suborno estrangeiro e do programa de Compliance e ética da mesma
relativas ao suborno estrangeiro;
11. medidas eficazes para:
i) fornecer orientações e aconselhamento aos conselheiros,
diretores, funcionários, e, onde for o caso, parceiros de negócios, em
conformidade com o programa de Compliance e ética da organização,
inclusive quando eles precisarem de aconselhamento urgente em
situações difíceis em jurisdições estrangeiras;
ii) a denúncia interna e, se possível confidencial, e proteção dos
conselheiros, diretores, funcionários, e, se for caso, dos parceiros
comerciais, não estão dispostos a violar as normas profissionais ou
21
éticas sob instrução ou pressão de superiores hierárquicos, bem como
para os diretores, funcionários, e, se for caso, aos parceiros de negócios,
disposto a relatar violações da lei ou normas ou ética profissional que
ocorram dentro da empresa, de boa fé e de forma devidamente
fundamentada; e
iii) empreender medidas apropriadas em resposta essas
comunicações internas de improbidade;
12. revisão periódica dos programas de Compliance e ética, destinadas a
avaliar e melhorar a sua eficácia na prevenção e detecção de suborno
estrangeiro, levando em conta a evolução relevante na área, e a evolução
das normas internacionais e da indústria.

1.5.4 Six Principles to Prevent Bribery

Com relação ao UK Bribery Act, verifica-se a existência do documento Seis


Princípios para Prevenção do Suborno (Six Principles to Prevent Bribery), um guia de
sugestões ou princípios para as organizações a fim de combater crimes e/ou atos de
corrupção e ainda para orientar procedimentos de combate a suborno:
1. Procedimentos proporcionais ao risco
2. Comprometimento do alto escalão
3. Avaliação de risco
4. Due diligence
5. Comunicação (incluindo treinamento)
6. Monitoramento e avaliação

1.5.5 Business Principles for Countering Bribery

A Transparência Internacional, uma organização mundial que representa a


sociedade civil sediada em Berlim, por meio dos Princípios para Prevenção do
Suborno em Negócios (Business Principles for Countering Bribery), fornece, em sua
segunda edição, as seguintes recomendações para construção de um programa de
combate de suborno:
1. A empresa deverá ter uma política proibitiva de suborno, seja de forma
direta ou indireta;

22
2. Comprometer-se à implementação de um programa para combater o
suborno. O Programa deve incluir esforços concernentes aos valores, ao
código de conduta, às políticas detalhadas e aos procedimentos, à gestão
de riscos, à comunicação interna e externa, à formação e orientação de
controles internos, à supervisão, ao monitoramento e à garantia.
Esses princípios empresariais são baseados em compromisso com valores
fundamentais de integralidade, transparência e prestação de contas. As empresas
devem ter como objetivo criar e manter uma cultura interna de base de confiança, com
responsabilidade individual, na qual não se admite o suborno.
Especificamente, estas são as recomendações da Transparência Internacional:
1) Adoção de políticas anticorrupção
2) Planejamento da implementação: análise de riscos
3) Desenvolvimento de políticas anticorrupção
4) Implementação: comunicação/treinamento
5) Monitoramento
6) Avaliação e aperfeiçoamento

1.5.6 Instituição de um Programa de Integridade e Combate à Corrupção da


CGU

A CGU elaborou em parceria com o Instituo Ethos de Empresas e


Responsabilidade Social, recomenda que as organizações adotem os seguintes
princípios e políticas:
1) Elaboração de Códigos de Conduta
2) Implantação de política de comunicação permanente
3) Criação de um Comitê de Ética
4) Sistema de recrutamento centrado em ética
5) Instituição de sistemas de controle interno e auditoria
Frise-se que a CGU também recomenda em seu site que a melhor forma de
implementar as políticas e princípios de integridade é adotando as sugestões
introduzidas pela Transparência Internacional e pela OCDE, ressaltando que a
metodologia desta última deve ser utilizada pelas empresas multinacionais.

23
1.5.7 Elementos Essenciais

Basicamente, os elementos que mais aparecem nos parâmetros


supramencionados são:
(i) comprometimento/engajamento da alta administração;
(ii) avaliação dos riscos;
(iii) política corporativa (criação de um código de ética);
(iv) comunicação e treinamento contínuo;
(v) canal de denúncia e controles internos
(vi) auditoria em terceiros (due diligence);
(vii) revisão periódica.
Dois elementos de suma importância não são comuns aos programas, mas
constam apenas individualmente em dois dos modelos apresentados. O primeiro,
“supervisão, autonomia e recursos”, do Resource Guide to the US Foreign Corrupt
Practices Act, e, o segundo, os “pagamentos de facilitação”, que aparece no Nine
Business Principles for Countering Bribery da Transparência Internacional. Autonomia
e recursos são essenciais para que um programa possa ser de fato considerado
efetivo. Um bom programa de Compliance possui elevados custos e tem que estar
imune a qualquer tipo de interferência interna. A alta administração é a responsável,
em última instância, pelo Compliance da organização. Da mesma forma, faz-se
necessário que as empresas se atentem e proíbam o pagamento de facilitação, ainda
que não seja vedado pelas legislações de alguns países, como o Brasil e os Estados
Unidos, por exemplo.
No Brasil, estudiosos do assunto divergem pouco com relação a esses
elementos. Bruno Carneiro Maeda observou que “a partir dos elementos comuns
contidos nas principais referências internacionais, é possível verificar significativa
convergência e agrupá-los em cinco aspectos centrais para que programas de
Compliance em matéria de anticorrupção possam ser considerados efetivos. (...) Cada
um desses elementos essenciais se desdobra em diferentes componentes. ” São os
seguintes: (i) suporte da administração e liderança; (ii) mapeamento e análise de
riscos; (iii) políticas, controles e procedimentos; (iv) comunicação e treinamento; e (v)
monitoria, auditoria e remediação.

24
Já Carlos Henrique da Silva Ayres divide os grupos em (i) suporte da alta
administração, (ii) análise de risco; (iii) políticas e procedimentos; (iv) comunicação e
treinamento; (v) due diligence; (vi) canais de denúncia e investigação internas; e (vii)
revisão periódica.
Dessa maneira, é possível concluir que os parâmetros internacionais e o
modelo da CGU estão, de certa forma, alinhados, e que, para fins de autoproteção
contra penalidades, e, principalmente, para que tenham um programa que
verdadeiramente combata as práticas ilícitas, as organizações têm que se atentar não
só para implantação desses elementos mínimos, mas, principalmente, para as suas
particularidades e necessidades, pois não existe um modelo que sirva para todas elas.
Para que o programa não seja apenas “de papel”, para que possa contribuir com o
fortalecimento da governança corporativa, os valores organizacionais devem ser
pautados pela ética.

2 CORRUPÇÃO NO CONTEXTO DA GLOBALIZAÇÃO

Fonte: canalcienciascriminais.jusbrasil.com.br

Com a globalização, isto é, com o crescimento da interdependência econômica,


a corrupção se expande, juntamente com o aumento das transações comercias e fluxo
de capitais entre países. De acordo com estudo realizado pela ONG One em 2014, a
25
corrupção tem custado à sociedade um trilhão de dólares por ano. O World Bank
também estima em $1 trilhão o valor pago por ano a título de propina e a International
Transparency diz que, somente na África, o valor envolvido é de U$ 148 bilhões. O
que evidencia o efeito perverso de aumento da desigualdade e desintegração social
em países mais pobres.
E, vale mencionar, a corrupção proliferou mesmo com a mudança de atitude
que passou a ocorrer a partir dos anos 90, quando surgiram várias iniciativas para
contê-la por parte dos governos, sociedades civis e empresas.
A corrupção afeta sobremaneira todos os países, o estudo da Organização para
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), publicado em 02 de dezembro
de 2014, o qual foi baseado em dados extraídos de 427 casos que foram julgados
pela justiça dos países signatários a partir de 1999, quando a Convenção entrou em
vigor, chegou à conclusão que um em cada dois casos de corrupção transnacional
tem envolvimento de agentes públicos de países cujo índice de desenvolvimento
humano é alto. Como em 43% dos casos envolviam corrupção de autoridade de
países desenvolvidos ou em desenvolvimento, desmistificou-se, assim, a ideia de que
subornos são pagos a autoridades públicas de países menos desenvolvidos. As
outras conclusões do relatório foram as seguintes: subornos são mais frequentemente
oferecidos a funcionários de empresas públicas ou agentes alfandegários, sendo que,
na maioria dos casos, os pagamentos são realizados para vencer licitações ou obter
contratos com o setor público, ou em casos de desembaraço aduaneiro; dois terços
dos casos ocorrem nos seguintes setores: mineração, construção, transporte e
armazenagem e setores ligados à informação e comunicação; os intermediários
(pessoas físicas ou veículos jurídicos - filiais ou empresas situadas em paraísos
fiscais) estiveram envolvidos em três de cada quatro casos.
Recentes casos de corrupção envolvendo multinacionais vieram à tona graças
à contribuição dos departamentos de Compliance (área responsável pela
conformação da empresa à legislação e à regulamentação, interna e externa, a que
sua atividade está submetida) das próprias instituições envolvidas. Não se tratam, no
entanto, de movimentos aleatórios, sem conexão. Ao contrário, revelam tendência
mundial. Esses fatos – ligados à gradativa mudança de percepção do empresariado
quanto à sua relação com o Estado – coloca em evidência a área de Compliance,
ainda pouco conhecida pelos brasileiros.
26
Historicamente, a corrupção se arraigou de forma endêmica na cultura
nacional, assim como em outros países em desenvolvimento. As grandes
multinacionais incorporaram a prática como algo próprio dessas economias, a ponto
de jurisdições, até recentemente, admitirem a prática fora dos limites territoriais e
permitirem a dedução de valores de suborno da base de cálculo para a apuração de
impostos nos países de origem. A Alemanha, por exemplo, só afastou essa
possibilidade em 1999, quando entrou em vigor a Convenção sobre o Combate à
Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais
Internacionais, promovida pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), iniciando um movimento internacional firme de combate à
corrupção, independentemente de onde é praticada. A mudança não provocou, com
a rapidez desejada, alteração da cultura de grande parte das multinacionais – ao
menos nos países com prática corruptiva corriqueira.
Antes disso, desde 1977, a legislação norte-americana já previa punições para
cidadãos e empresas por atos corruptivos cometidos em jurisdição estrangeira. Outros
países, incluindo-se membros da União Europeia, não vinham incorporando
dispositivos semelhantes, algo que vem mudando. Um exemplo é a Grã-Bretanha,
que aprovou em 2010 o Bribery Act, lei que pune agentes por corrupção no exterior.
Nessa mesma esteira, veio a promulgação no Brasil da Lei 12.846/13 – a “Lei
Anticorrupção” –, que incluiu a responsabilização civil e administrativa de pessoas
jurídicas envolvidas em atos lesivos à administração pública e introduziu mecanismos
de investigação, como o acordo de leniência (espécie de delação premiada) para
companhias, e estendeu punições a quem pratica esses atos fora do território
nacional.
Essa conjuntura, aliada à evolução do controle e do monitoramento financeiro,
se constitui como um dos principais elementos para aumento de revelações de casos
de corrupção ao redor do globo, inclusive no Brasil. Mas o Compliance não se resume
a isso. A atividade econômica – seu amplo espectro legislativo e regulatório – deve
ser alvo de monitoramento constante e orientação por departamentos e pessoas com
experiência no setor, tornando-se um diferencial para as empresas que se
movimentam nesse sentido. É também cada vez mais comum, companhias
levantarem informações sobre a estrutura de Compliance de parceiros antes de firmar
compromissos, e grande parte das instituições financeiras avaliam esse item nas suas
27
avaliações de risco. Por outro lado, empresas e órgãos, da administração pública
ainda carecem dessa cultura.
A evolução do universo jurídico nacional e internacional tem revelado que as
empresas devem ter a conformação legal como parte indissociável de sua cultura e
elemento indispensável na sua gestão de risco. Em um mundo mais competitivo,
globalizado e conectado, e em uma sociedade que exige cada vez mais a postura
ética, qualquer descuido pode resultar em grandes prejuízos.

2.1 Licitações Internacionais e Compliance

A globalização acarreta novas modelagens da atuação do Estado. O limite das


fronteiras cede espaço para o que se convencionou denominar como Direito Global,
em uma concepção de que os diplomas legislativos acabam, na prática, espraiando
efeitos para as mais diversas partes do mundo.
O Direito Administrativo contemporâneo sofre influência dessas tendências,
passando a não limitar mais a relação da Administração-cidadão, mas também
interagindo com diversos entes externos e transnacionais, que impactam diretamente
em diversos ramos da vida social.
Nesta seara, surge o trans administrativismo oriundo de “centros de poder trans
estatais: aqueles que se originam de necessidades ordinatórias das diversas
sociedades, que não são providas pelos Estados, nem nacional, nem
internacionalmente.”
Neste intenso influxo normativo mundial, nota-se que a eficiência impõe que as
contratações públicas também estejam atentas às novas formatações comerciais.
Com isso, o princípio da subsidiariedade das licitações internacionais (que informa
que não sendo disponível bem ou serviço em território nacional, deve ser permitida a
participação de licitantes estrangeiros) acaba perdendo fôlego na atual configuração
econômica mundial.
A busca pelo melhor preço e produto não pode mais prescindir de players
internacionais. O argumento de que isso afetaria o desenvolvimento nacional não
pode mais preponderar, em especial quando estão disponíveis medidas que podem
aplacar eventual evasão de capitais, como é o caso de regulamentar adequadamente
os investimentos locais que serão necessários para implantar o empreendimento.
28
Destaque-se que a licitação é, imediata e primordialmente, o mecanismo para
se atingir a busca pelo melhor preço/melhor produto ou serviço para o Poder Público,
sendo inadequado imputar uma intrínseca característica regulatória ao certame.
Especialmente, ao se tratar de Sociedades de Economia Mista, quando deve
preponderar a busca do lucro – afastada quando muito pela finalidade que motivou
sua criação, como indica o art. 27 do novo Estatuto das Estatais (Lei n° 13.303/16) e
o art. 238 da Lei das Sociedades Anônimas (Lei n° 6.404/76). Finalidade esta que não
se confunde com as metas perseguidas pela dita função reguladora da licitação, por
mais moralmente desejáveis que sejam essas aspirações.
O planejamento governamental deve ser o meio suficiente para permitir o
desenvolvimento local sustentável coadunado com a busca pela melhor oferta pelo
Poder Público, não se exigindo o obrigatório exercício do poder de compra estatal
para viabilizar tal desiderato. É necessária uma aplicação do art. 174 da Carta Magna,
que trata do planejamento e incentivo econômico (determinante para o setor público
e indicativo para os particulares), para esta finalidade, que não passe pelo uso do art.
37, XXI, dispositivo que erige a obrigação de licitação.
Além disso, adotar as licitações internacionais como regra geral, permite a
concretização do princípio da livre iniciativa, ao passo que franqueia a todos a
participação de certame, bem como permite o melhor atendimento ao princípio da
impessoalidade, pois trata todos, independentemente da nacionalidade, de forma
igual.
O mesmo raciocínio pode ser estendido para se concluir pela
inconstitucionalidade da necessidade da empresa líder de um consórcio público ser
nacional (art. 33, §1º, da Lei nº 8.666/1993).
Em primeiro lugar, sobressai a noção de intervenção indevida na autonomia
empresarial privada. O consórcio formado por empresas para participar de um
certame público é associação privada, sendo que a sua composição deve ser de livre
pactuação entre os envolvidos. Ademais, a empresa líder do consórcio ser nacional
parece em nada influenciar para a administração pública sob o prisma da eficiência.
Em segundo lugar, a busca da competitividade, fundamental no âmbito das
contratações públicas, acaba tendo sua força normativa sensivelmente reduzida,
quando se confere primazia as empresas nacionais neste caso, sem nenhuma
justificativa prática ou axiológica que lhe confiram consistência.
29
Em terceiro lugar, critério de melhor preço, melhor técnica ou melhor produto,
que apresenta relação intrínseca com a competitividade, é violado, haja vista que a
limitação em favor de sociedade empresárias nacionais não permite que se consiga
verificar no mercado internacional que é capaz de oferecer o melhor preço.
(i) Outra questão que necessita de uma releitura, a partir da ótica transnacional e
global, diz respeito à obrigatoriedade de nacionalidade brasileira para atuação
nos Portos brasileiros, conforme previsto no art. 29, da Lei nº 10.233/2001. Não
se verifica qualquer justificativa de ordem nacional que resista ao teste de
proporcionalidade, justamente porque:
i. viola qualquer exame de competitividade;
ii. o princípio da livre iniciativa;
iii. o critério de obtenção da melhor oferta.
Por fim, argumentos de segurança interna não devem ser invocados, pois são
facilmente administrados por um sistema de fiscalização e monitoramento adequado,
bem como sobre um influxo constante de regras regulatórias claras.
Diante deste cenário de internacionalização, percebe-se que a Administração
Pública precisará de uma nova modelagem para lidar com o setor privado com a
preparação adequada de seu corpo técnico, pois, inevitavelmente, será necessária a
confecção de editais mais complexos, diante da gama de possibilidades que
necessariamente surgirão e demandarão um planejamento transparente e prévio por
parte do administrador.
Além disso, diante das diversas culturas éticas que são particulares a cada
país, percebe-se a necessidade de adoção de regras de Compliance, a fim de garantir
a governança corporativa adequada aos ditames dos padrões éticos que se exige dos
particulares para lidar com a coisa pública.
Assim, não basta, simplesmente, abrir-se o mercado nacional para a atuação
de agentes externos. Trata-se mais de publicar novos editais de concessões e
parcerias público-privadas incluídos no Programa de Parcerias em Investimento (PPI)
serem publicados em inglês e português. Ao lado do road show, é forçosa a atenção
a outra expressão inglesa: Compliance.
É preciso preparar e qualificar os agentes públicos para lidar com este novo
cenário. Uma maneira que vem sendo adotada em diversos países, é a necessidade
que as empresas privadas tenham um programa de Compliance certificado. No caso,
30
brasileiro, Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União
(CGU) conferem o selo Pró-ética para aqueles programas de probidade empresarial
que sejam bem qualificados, de acordo com critérios pré-estabelecidos.
Em síntese, pode-se constatar que é preciso empreender meios de
compatibilização entre os interesses privados e estatais, de modo a permitir o
desenvolvimento da infraestrutura por meio de financiamentos nacionais e
internacionais, sempre pautados na segurança jurídica para todos os envolvidos.

2.2 Cláusulas de Compliance nos Contratos Nacionais e Internacionais e Lei


Anticorrupção

De fonte constitucional, o exercício dos direitos e obrigações contratuais está


bem regulado na legislação civil e empresarial. Contanto, para saldar a denominada
crise do inadimplemento, que é comum na rotina das relações jurídicas, visando à
satisfação do direito do credor e a liberação patrimonial do devedor, o Compliance
desponta como um dos princípios mais importantes da responsabilidade profissional.
De modo simples e objetivo, o Compliance corresponde à observância estrita
de cumprimento as normas legais e regulamentares relativas às políticas e as
diretrizes estabelecidas para o negócio e para as missões de uma dada organização
ou empresa.
No âmbito empresarial, o fim precípuo do Compliance é, portanto, evitar,
detectar e tratar qualquer desvio ou inconformidade que possa ocorrer no plano legal
de uma entidade, abrangendo, também, o campo ético das suas relações internas e
externas.
O Compliance, hoje mais que uma mera tendência, é uma exigência universal
para as organizações como um todo, no sentido de que os preceitos e regulamentos
existentes devem ser minuciosamente obedecidos por funcionários, sócios, diretores
e investidores, com vistas à afirmação da credibilidade de valores fundamentais
perante a sociedade, à segurança dos mercados e à promoção do bem-estar das
partes envolvidas.
Para que a entidade se mantenha viva, competitiva e atinja os níveis de
excelência, com o retorno do investimento perseguido, o Compliance é vital, sobretudo
na área contratual, tendo em vista que a realização de resultados e da produtividade

31
de uma empresa depende de um escopo preventivo, de planejamento e de correção
jurídica.
O Compliance é uma ferramenta de administração especial destinada à
redução dos passivos legais e contratuais das entidades públicas e privadas.
Acresçam-se à recente temática do Compliance os ajustes corporativos à
legislação anticorrupção e à política de combate de lavagem de dinheiro, que estão
incluídos na ponta das agendas dos compromissos governamentais e nos atos
negociais.
Em linhas gerais, o Compliance tem a ver com a implantação de uma cultura
sólida e ampla de prevenção de ilícitos de todas as ordens, mediante o uso de técnicas
de treinamento, programas permanentes de pregação de integridade, controle e
providências saneadoras dos problemas verificados nos processos organizacionais.
O Compliance se afigura, pois, como uma energia motivacional que governa as
relações pessoais e interprofissionais das mais diversas áreas, visando à estruturação
de uma política de confiança, à otimização de mecanismos de uma vida sustentável e
que, em última análise, procura qualificar a gestão dos ambientes de trabalho,
mitigando riscos, perdas e danos em virtude de erros, dos acidentes, das crises e dos
conflitos institucionais que afetam, corriqueiramente, todas as esferas de poder das
organizações.
O conhecimento e a introdução de Compliance contratual têm a ver, portanto,
não apenas como instrumento de garantia da higidez e dos direitos básicos da
empresa, mas senão com enunciados ético-normativos mais amplos que buscam
proteger todos os atores das investidas danosas ocorridas em suas respectivas vidas
e ações negociais.
Neste sentido, entende-se que, como procedimento adequado ao Compliance,
as tratativas estabelecidas pelos empresários hão de ser governadas com o objetivo
de que os direitos e os deveres oriundos de suas contratações sejam respeitados.
Em um planejamento empresarial, a noção do Compliance empresarial é
fundamental e a gestão de uma carteira saudável de contratos depende, em boa
medida, do domínio sistêmico de conhecimento de seus representantes e operadores,
notadamente dos institutos nas áreas do Direito Constitucional e Administrativo;
Direito Tributário, Ambiental, Penal e Processual; Direito Econômico e Financeiro;
Direito do Consumidor; Estatuto do Idoso; Direito do Trabalho; normas da
32
Organização Internacional do Trabalho (OIT); Direito Internacional Público e Privado;
dentre outros.
Logo, a atuação e os fundamentos do Compliance contratual valem-se de
conceitos jurídicos fundamentais de Direito Público e Privado que são, absolutamente,
estratégicos para auxiliar a tomada de decisões, para a excelência social e
empresarial.
O arsenal de atos que se oportunizam da vida empresarial gera um leque de
direitos e obrigações que se abre tanto para o setor governamental quanto para a
sociedade civil, alcançando ainda uma impressionante massa de pessoas, dentre
trabalhadores ou não, dispostas a consumirem produtos e serviços.
Nesse aspecto, as atividades empresariais envolvem riscos porquanto é natural
que, dentro deste esquema de hipercomplexidade de relações jurídicas, haja conflitos,
dúvidas ou litígios decorrentes das posições e dos interesses políticos, sociais e
econômicos os mais diversos e divergentes das pessoas envolvidas nesses
processos.
Com vistas a evitar a eclosão, individual ou coletiva, de desvios ou abusos aos
vetores da legalidade e da dignidade na prática empresarial, que comprometem o
bem-estar comum e o tecido da paz social, a nossa ordem jurídica proclama um
extenso catálogo de direitos e deveres que devem ser conhecidos. Afinal, a imposição
de danos, sanções e punições acabam minando ou prejudicando a rentabilidade da
sociedade.
Em contraponto à prevenção e à inibição de ilícitos, eis que o Compliance
exsurge como ferramenta adequada para controlar a responsabilização jurídica
empresarial, derivada seja do sistema de culpa contratual, seja do regime
extracontratual. Assim, coexistindo a uma infinidade de normas que versam acerca de
preceitos que podem degenerar em lesões patrimoniais empresariais, vigem os
direitos fundamentais assegurados às pessoas, ora sedimentados nos incisos dos
arts. 5º e 6º, da CF/88. A adesão do Brasil a outros pactos, tratados e protocolos
internacionais dos quais nosso país é signatário também é curial para que se evite o
direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de violações jurídicas.
De outra parte, imperioso destacar que as condutas empresariais,
materializadas, no âmbito negocial, através da celebração de contratos, também
produzem repercussões na órbita tributária, o que acabam por influir no processo
33
produtivo e de consumo das pessoas e das organizações. Neste espectro, ressai-se
de novo o papel do Compliance, em especial o jurídico, que deve nortear, portanto, as
atividades, os investimentos, os recursos humanos e as decisões corporativas.
Remetendo a um conjunto de princípios e a regras primárias fundamentais de
transparência e correção, no afã de ofertar credibilidade da empresa perante a
sociedade, o mercado e as partes interessadas, o Compliance contratual é de grande
utilidade na vida das organizações, sobretudo nos entes sujeitos à forte
regulamentação e controle.
Dentro do sistema que vigia as medidas anticorrupção e que se acautela contra
os ilícitos praticados por organizações criminosas, o Compliance contratual é hoje
uma lógica estratégica da performance organizacional, que condensa as empresas,
em especial, as de perfil multinacional. Ao desaprovar a corrupção e ao tentar afastar
os grupos criminosos infiltrados nos seios das corporações, a concepção, a
consistência e a continuidade do compromisso da Justiça Contratual se
consubstanciam em planos de treinamentos de grupos, equipes ou pessoas que se
identifiquem e são recomendáveis em procedimentos nas ações relacionadas à
política de uma entidade. Há hoje uma preocupação central, hoje, com a
standardização contratual diz respeito às providências necessárias à neutralização
dos negócios ilícitos das organizações.
Neste ponto, no Direito Empresarial brasileiro, vigoram as Leis n°s 12.846/13 e
12.850/13, que tratam, respectivamente, da responsabilização civil e administrativa
das empresas pela prática de atos contra a administração pública nacional e
estrangeira, que define, de vez, o conceito de organização criminosa recortado pela
Convenção de Palermo (Decreto nº 5.015/04), em ab-rogação à Lei no 9.034/95.
Fruto da Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos
Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais, do ano 2000, da Estratégia
Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCLA) e atendendo
ainda à cobrança da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE), órgão que engloba 40 nações, foi criado o Cadastro Nacional de Empresas
Punidas (CNEP), que reúne e dá publicidade às punições aplicáveis às instituições,
após o processo administrativo dirigido pelo órgão governamental.
A legislação em tela enseja a cobrança de multas entre 0,1% (zero vírgula um
por cento) e 20% (vinte por cento) do faturamento bruto de empresas, podendo esse
34
valor chegar até a R$ 60 (sessenta) milhões de reais, se comprovado o ato típico,
independente das alterações contratuais, incorporações, fusões, cisões societárias e
transformações. As condenações por corrupção podem acarretar ainda suspensão ou
interdição parcial das atividades da empresa, sua dissolução compulsória e gerar
restrições para contrair empréstimos, participar de licitações e de créditos bancários.
As duras penalidades estatuídas forçam, então, a ideia de que as operações da due
diligence anticorrupção e qualquer ato negocial com o governo devem ser redobrados
em cautela, havendo, ainda, a possibilidade da desconsideração da personalidade da
pessoa jurídica ex vi do art. 50, do CC (disregard doctrine), razão pela qual o
Compliance empresarial é hoje imprescindível nos processos de avaliação de riscos
e de decisões contratuais.
A Lei nº 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa de Consumidor (CDC), é
imprescindível para o planejamento da Logística empresarial, exigindo
adequabilidade, a exequibilidade, a flexibilidade, o equilíbrio e a integralidade das
ações e meios dos gestores jurídicos para a formulação de políticas de ambientes
internos e externos das organizações, desde o nível estratégico até o tático. Estes
contratos, em comum, devem compatibilizar a uniformidade dos procedimentos à
continuidade de todas as operações de apoio que servirão para a tomada das
decisões empresariais.
No que tange ao contexto da Logística contratual, o CDC surgiu no nosso
ordenamento jurídico a partir da imposição do mandamento constitucional inserto no
inciso XXXII, do art. 5º, c/c o art. 170, V, da Constituição Federal, segundo o qual “o
Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”.
A consciência do respeito aos direitos dos consumidores, no desempenho dos
processos de fluxo dos produtos e nas etapas da cadeia de abastecimento da
organização, requer que tanto a administração da empresa quanto o operador
logístico compreendam que, no planejamento, na programação e na execução das
atividades de produção, gerenciamento e processamento logístico, atenção máxima
seja dada também ao destinatário final do produto, dentro do conceito de Supply Chain
Management.
Assim, o provimento dos contratos de logística, além de observar normas gerais
e específicas para cada setor e atividade modal, precisa estar em sintonia com as

35
normas cogentes que tutelam o consumidor, abarcando a preocupação com o time da
entrega do produto, a constatação de avarias até o eventual ressarcimento de danos.
O trato com as questões consumeristas, portanto, é uma das chaves que
indicam não só a produtividade e a lucratividade da empresa, como também permite
que seja feita a aferição do grau de satisfação do cliente através do Key Performance
Indicators (Indicadores de Desempenho-ID). Na direção empresarial, a
sustentabilidade e saúde de seus contratos dependem, pois, da integração de uma
filosofia que chancela o consumidor, ainda mais em face do surgimento dos Juizados
Especiais e dos Procons.
Demais disso, as métricas que medem a eficiência das empresas levam em
conta hoje não só sua situação financeira, mas também os seus processos de gestão
logística, a engenharia dos seus negócios, o benchmarking (que quantifica as
melhores práticas e os objetivos da empresa), a adoção do modelo SCOR e as
políticas consumeristas que auxiliam, enfim, à tomada de decisões sociais dos
administradores.
Na esteira do que já se sustentou, os grandes laços eletrônicos, em uma época
de globalização e da internet, carreiam impactos expressivos para todos os países
envolvidos e nas transações nacionais, em particular, a população se organiza e
desenvolve eventos e relações que consagram excelentes oportunidades de
expansão civil, comercial, cultural e econômica.
Mesmo sem estar planificadas por um organismo supranacional, a Justiça
Contratual, neste quadro, é quem afirma os estatutos ordinários para regular o regime
jurídico das relações civis, empresariais e de consumo, nacional e internacional. Os
contratos comuns e governamentais devem, entretanto, encaixar-se, pois, aos
princípios da dignidade da pessoa humana, da transparência, da boa-fé, do equilíbrio,
da segurança, da proteção dos interesses econômicos e da vulnerabilidade do
consumidor.
Neste aspecto, a Lei nº 12.741/12 obrigou que fosse discriminado o valor do
tributo nas notas fiscais, enquanto que a Lei nº 12.965/14 que inaugurou o marco civil
da internet, agregando valor especial ao sistema jurídico. O resultado foi o benefício
para a cadeia produtiva em razão de uma justiça contratual, posta para suscitar a
confiança dos negócios jurídicos e para propor relações equilibradas entre
consumidores e fornecedores; extensivas também às operações virtuais e eletrônicas.
36
Sob o pálio da Inter juridicidade do Direito, notáveis impulsos foram dados a novas
regras para a contratação, fiscalização e execução da responsabilidade de
profissionais de todos os setores que ligam o comércio, a logística, os fornecedores e
os prestadores de serviço.
Em virtude da amplitude da internet, em todas as fases procedimentais das
relações de consumo, a mecânica atual do Direito Empresarial e o Compliance
contratual formam, pois, um sistema que repele as práticas abusivas ou lesivas
derivadas das relações e sujeitos sociais. Logo, os pactos estritamente comerciais e
os pontos de contato consumeristas se tutelam por normas que impedem maiores
danos ex vi dos paradigmas constitucionais, com notória chancela aos
hipossuficientes.
Na realização de negócios consumeristas, os fatores jurídicos que permeiam
as suas relações contratuais hão de considerar os parâmetros jurídicos internos, que,
no caso do Brasil, evidenciam a primazia dos princípios constitucionais sobre os
institutos privados e a vulnerabilidade civil de algumas pessoas, consoante critérios
de idade, saúde, conhecimento ou condição social, dentre outras premissas
principiológicas.
No solo pátrio, ipso jure, a Justiça Contratual é garantida por um sistema amplo
que começa pela existência de uma plêiade de regras objetivas que dispõem sobre
os direitos, meios e deveres atinentes às práticas mercantis ou consumeristas.
Neste ponto, aliás, a nossa legislação é pródiga e uma das mais completas do
mundo. A proteção aos direitos subjetivos é assegurada por organismos públicos e
privados, tais como os PROCONs, os serviços do SPC e SERASA, que não excluem
a própria preferência de acessibilidade direta ao Poder Judiciário daquele que se julga
lesado, ou que, assim, prefira buscar a prevenção ou a resolução de um dado conflito.
O ônus que se importam destas lides, sejam provenientes de dissensões entre
empresários ou destes com os consumidores, incluem, hoje, mecanismos
relativamente rápidos e eficientes de reembolso a favor dos hipossuficientes, sob o
pormenor legal da possibilidade de inversão do ônus da prova em detrimento da parte
mais forte.
Nesta paisagem jurídica, a classe empresarial, fornecedora de produtos ou
tomadora de serviços, deve agir diligentemente para que os prejuízos à sua
lucratividade sejam evitados ou minimizados, sobretudo porque outros meios
37
alternativos de composição de litígios, tais como a arbitragem, não podem ser
empregados para elidir direitos e garantias do Código de Defesa do Consumidor e da
Lei nº 12.965/14.
Deste modo, tendo em conta a responsabilidade empresarial que, hoje,
praticamente, é objetiva, frente ao reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor,
dependente apenas da prova do nexo causal entre o dano sofrido e o objeto pactuado,
infere-se que, mesmo em contratos celebrados em época de grandes eventos
internacionais, as matérias relativas à Justiça Contratual continuam sendo, em parte,
de reserva pública, completada, outrossim, por organismos oficiais de fiscalização.
Neste sentido, além da existência dos já citados PROCONs e do Sistema
Nacional de Informações de Defesa do Consumidor (SINDEC), cabe reiterar que é da
alçada de competência do poder governamental a atribuição de fiscalizar, diretamente
ou mediante convênio, o cumprimento dos preceitos legais e regulamentares dos
contratos de concessão, permissão ou autorização, dentre outras atribuições.
Diante das novas relações jurídicas que se desenham nesta Era da Informação,
mais precisamente a partir da década de 80, as radicais transformações no mundo
como um todo aceleram a remodelação do Direito Contratual.
As experiências mercantis de um mercado ilimitado, em razão da automação e
dos eventos globais, massificaram de forma parabólica os contratos consumeristas,
criando uma nova ordem de direitos e obrigações, de extensão nacional e
internacional.
Os acertos interparticulares, antes demasiadamente formais, fixos, rígidos e
inflexíveis, cederam lugar a um estilo mais ágil, rápido e direto de contratação, que
contempla hoje até mesmo os meios telemáticos; agora acessíveis e popularizados
graças ao aumento vertiginoso dos intercâmbios culturais e comerciais entre os
países.
Neste passo, em que as economias convivem e se aquecem ao cabo de
agressivas relações entre os investidores, gestores, trabalhadores, governos e
consumidores, em suas disputas intestinas por fatias do mercado, o espetacular
aumento da demanda demográfica e espacial dos novos negócios jurídicos trouxe o
inconveniente de desencadear alardes políticos e acentuados desequilíbrios sociais.
Sentiu-se, então, a necessidade de ofertar-se um processo contínuo de
melhoria sustentável nas relações existenciais, como um todo. A distribuição de
38
riquezas e o tratamento empresarial dispensado ao consumidor, antes casuísticos,
evoluíram rápido sob o timão de uma legislação estatal interventiva na cadeia
produtiva.
Doutrinadores e juristas, de logo, aperceberam-se que o fenômeno da
simplificação e da automação das relações sinalagmáticas dos negócios precisavam
de uma nova engenharia jurídica, em que coubesse uma reformulação dos conceitos,
da classificação, da interpretação e da solução de conflitos gerados pelas situações
civis.
Neste panorama, alucinados pela barbárie de um mercado guiado pelas
vantagens competitivas e pela explosão do consumismo desenfreado, como resultado
do exponencial crescimento econômico dos países, os nichos privados e a prática
empresarial experimentaram um significativo controle do Estado, que passou, assim,
a institucionalizar os negócios jurídicos. Sem perder de vista a natureza e as
qualificações da missão do Direito Empresarial, há de se falar, sim, em uma Revolução
Contratual.

3 CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS CONTRA A CORRUPÇÃO

Fonte: www.unodc.org

39
Desde 1996, a corrupção começou a ser tema de interesse dos mais diferentes
países que, de modo regional, iniciaram processos de acordos de ação conjunta
nesse âmbito. Entretanto, as primeiras convenções firmadas não cobriam todas as
regiões do mundo, deixando de lado grande parte dos países da Ásia e do Oriente
Médio. Também alguns acordos apenas se referiam a abordagens específicas, como
o suborno, por exemplo. Assim, a comunidade internacional manifestou o interesse
de delinear um acordo verdadeiramente global e capaz de prevenir e combater a
corrupção em todas as suas formas. Assim, nasceu a Convenção das Nações Unidas
contra a Corrupção.
A convenção é composta por 71 artigos, divididos em 8 capítulos. Os mais
importantes estão reunidos em quatro capítulos e tratam dos seguintes temas:
prevenção, penalização, recuperação de ativos e cooperação internacional. São
esses capítulos que requerem adaptações legislativas e/ou ações concomitantes à
aplicação da convenção a cada país.
• Prevenção à corrupção
No capítulo que trata sobre prevenção à corrupção, a convenção prevê que os
Estados Partes implementem políticas contra a corrupção efetivas que promovam a
participação da sociedade e reflitam os princípios do Estado de Direito tais como a
integridade, a transparência e a accountability, entre outros.
Os Estados Partes devem adotar sistemas de seleção e recrutamento com
critérios objetivos de mérito. Também devem tomar medidas para aumentar a
transparência no financiamento de campanhas de candidatos e partidos políticos.
Devem desenvolver códigos de conduta que incluam medidas de estímulo a
denúncias de corrupção por parte dos servidores, e de desestímulo ao recebimento
de presentes, ou de qualquer ação que possa causar conflito de interesses. Os
processos licitatórios devem propiciar a ampla participação e dispor de critérios pré-
estabelecidos, justos e impessoais.
Também devem adotar medidas para ampliar o acesso às contas públicas para
os cidadãos e estimular a participação da sociedade nesse processo, além de adotar
medidas preventivas à lavagem de dinheiro. Finalmente, sublinha que a
independência do Poder Judiciário e do Ministério Público é fundamental para o
combate à corrupção.

40
A convenção contempla medidas de prevenção à corrupção não apenas no
setor público, mas também no setor privado. Entre elas: desenvolver padrões de
auditoria e de contabilidade para as empresas; prover sanções civis, administrativas
e criminais efetivas e que tenham um caráter inibidor para futuras ações; promover a
cooperação entre os aplicadores da lei e as empresas privadas; prevenir o conflito de
interesses; proibir a existência de "caixa dois" nas empresas; e desestimular isenção
ou redução de impostos a despesas consideradas como suborno ou outras condutas
afins.
• Penalização e aplicação da lei
No capítulo sobre penalização e aplicação da lei, a convenção pede aos
Estados Partes que introduzam em seus ordenamentos jurídicos tipificações criminais
que abranjam não apenas as formas básicas de corrupção, como o suborno e o desvio
de recursos públicos, mas também atos que contribuem para a corrupção, tais como
obstrução da justiça, tráfico de influência e lavagem de recursos provenientes da
corrupção. A penalização à corrupção é condicionada pela existência de mecanismos
que permitam o sistema de justiça criminal realizar ações de detenção, processo,
punição e reparação ao país.
Os Estados Partes devem obrigatoriamente tipificar como crime: o suborno a
funcionários públicos, a corrupção ativa a oficiais estrangeiros, a fraude e a
apropriação indébita, a lavagem de dinheiro e a obstrução da justiça. Também devem,
na medida do possível, buscar tipificar as condutas de: corrupção passiva de oficiais
estrangeiros, tráfico de influências, abuso de poder, enriquecimento ilícito, suborno no
setor privado e desvios de recursos no setor privado.
A convenção orienta os Estados Partes a considerar o suborno como crime e o
define como a promessa, a oferta ou a entrega, direta ou indiretamente, a um servidor
público ou outra pessoa ou entidade, de uma vantagem indevida, a fim de agir ou de
não agir no exercício de suas funções oficiais. Da mesma forma, quem solicita ou
aceita essas mesmas vantagens indevidas, também comete o crime de suborno.
Os Estados Partes devem estabelecer como crime, quando cometido
intencionalmente, a fraude, a apropriação indébita ou qualquer outro desvio de
recursos por parte de funcionário público, em seu benefício, ou em benefício de
terceiros, de qualquer propriedade, fundos públicos ou privados ou qualquer outra
coisa de valor a ele confiada em virtude de sua função. O mesmo se aplica aos atos
41
de converter, transferir, ocultar ou dissimular produtos oriundos do crime, e também a
quem adquire, possui ou se utiliza desses produtos.
Também conta com um artigo que aborda a obstrução da justiça: influenciar
testemunhas em potencial em posição de prover evidências, por meio do uso da força,
de ameaças ou intimidação; e interferir no exercício da função de oficias ou membros
da Justiça pelos mesmos meios.
• Cooperação internacional
O capítulo sobre cooperação internacional enfatiza que todos os aspectos dos
esforços anticorrupção necessitam de cooperação internacional, tais como
assistência legal mútua na coleta e transferência de evidências, nos processos de
extradição, e ações conjuntas de investigação, rastreamento, congelamento de bens,
apreensão e confisco de produtos da corrupção. A convenção inova em relação a
tratados anteriores ao permitir assistência legal mútua mesmo na ausência de dupla
incriminação, quando não envolver medidas coercitivas. O princípio da dupla
incriminação prevê que um país não necessita extraditar pessoas que cometeram atos
que não são considerados crimes em seu território. Mas a partir da convenção, esses
requisitos se tornam mais maleáveis, pois a convenção prevê que mesmo crimes que
não são definidos com os mesmos termos ou categoria podem ser considerados como
equivalentes, possibilitando a extradição.
A extradição deve ser garantida nos casos de crimes citados pela convenção,
e quando os requisitos de dupla incriminação são preenchidos. Os Estados Partes
não devem considerar os crimes de corrupção como crimes políticos. E os estados
que condicionam a extradição à existência de acordos podem usar a convenção como
base legal. Se um país não extradita nacionais, deve usar o pedido do outro país como
fundamento para um processo interno. Além disso, a convenção prevê que os Estados
Partes busquem harmonizar suas leis nacionais aos tratados existentes.
Os Estados Partes podem recusar o pedido de extradição se for observada
perseguição por gênero, raça, religião, nacionalidade, etnia ou opiniões políticas. Em
todo o caso, ainda que não seja obrigatório, a convenção recomenda uma consulta
ao país solicitante antes de uma recusa, a fim de possibilitar a apresentação de
informações adicionais que possam levar a um resultado diferente.
A convenção prevê medidas mais amplas de assistência legal mútua em
investigações, processo e procedimentos legais em relação a crimes previstos na
42
própria convenção. Entre essas medidas, destacam-se a designação de uma
autoridade central para receber, executar e transmitir pedidos de assistência legal
mútua; a vedação à recusa de assistência legal mútua com base no sigilo bancário; e
a possibilidade de a assistência legal mútua ser ofertada na ausência de dupla
criminalização, desde que não haja medidas coercitivas. Os Estados Partes deverão
cooperar entre si para aumentar a eficácia da aplicação da lei e estabelecer canais de
comunicação para assegurar o intercâmbio rápido de informações sobre todos os
aspectos dos crimes abrangidos pela convenção. Também devem considerar a
celebração de acordos bilaterais ou multilaterais que permitam a criação de órgãos
mistos de investigação em relação às matérias que são objeto de investigações,
processos ou ações judiciais em um ou mais Estados. Além disso, os Estados devem
permitir a utilização de técnicas especiais de investigação, tais como a vigilância
eletrônica e outras formas de operações sigilosas, além de permitir a admissibilidade
das provas obtidas por meio dessas técnicas nos tribunais.
• Recuperação de ativos
A recuperação de ativos é uma importante inovação e um princípio fundamental
da convenção. Os Estados Partes devem apoiar-se entre si com extensas medidas
de cooperação e assistência neste campo, a fim de fazer valer os interesses das
vítimas e dos donos legítimos desses recursos.
Os Estados Partes devem solicitar suas instituições financeiras a: verificar a
identidade de seus clientes; determinar a identidade de beneficiários de contas
volumosas; aplicar controle reforçado a contas mantidas por altos funcionários
públicos; reportar transações suspeitas às autoridades competentes; e prevenir o
estabelecimento de bancos sem presença física.
Um artigo sobre recuperação direta foca na possibilidade de os Estados Parte
terem um regime que permita a outro Estado Parte iniciar um processo civil para a
recuperação de ativos ou para intervir ou agir no processo doméstico para reforçar
seu pedido por compensação. Dessa forma, os Estados Parte podem iniciar uma ação
civil nas cortes de outra parte para estabelecer direito à propriedade de bens
adquiridos por meio de corrupção. E os tribunais devem poder ordenar culpados por
corrupção a ressarcir outro Estado Parte, e reconhecer, em decisões de confisco,
pedido de outra parte como legítima dona dos bens. A vantagem do processo civil se
mostra útil quando o processo criminal não é possível, pois a morte ou ausência do
43
suspeito permite o estabelecimento de culpa com base nos padrões civis, com
diferentes procedimentos processuais.
Os Estados Partes devem permitir que suas autoridades cumpram uma ordem
de confisco ou de congelamento por um tribunal de outro Estado Parte solicitante. Da
mesma forma, devem considerar medidas que permitam o confisco, mesmo sem uma
condenação no âmbito criminal, quando o acusado não pode ser mais processado por
conta de sua morte ou ausência.
Como princípio geral, os Estados Partes devem alienar os bens confiscados,
devolvendo-os a seus legítimos donos, tanto no que se relaciona à fraude e ao desvio
de recursos públicos, quanto à lavagem de recursos obtidos ilegalmente. Para outros
crimes de corrupção, os mesmos procedimentos devem ser adotados, quando for
razoavelmente estabelecida a legitimidade do dono. Em todos os outros casos, será
dada prioridade ao retorno dos bens confiscados à parte solicitante, o retorno dos
bens aos legítimos donos, ou a utilização para a compensação das vítimas.

3.1 Sobre o UNODC

Como guardião da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, o


UNODC atua no sentido de: promover a ratificação da convenção, prover assistência
técnica, apoiar a realização de conferências dos Estados Partes, promover a
implementação efetiva e eficiente da convenção, assistir os Estados Partes no
cumprimento integral da convenção e facilitar a ratificação universal da convenção.
Por iniciativa do UNODC, em novembro de 2009, mais de 1.000 delegados de
125 países se reuniram em Doha, no Catar, para examinar a implementação da
Convenção das Nações Unidas contra Corrupção. O principal resultado obtido foi a
criação de um mecanismo de monitoramento da implementação da convenção. Pelo
acordo, todos os Estados serão monitorados a cada cinco anos, com o intuito de se
avaliar como estão cumprindo suas obrigações. Essa avaliação é feita por um
software, que inclui um checklist sobre a aplicação da convenção. Os resultados
dessas avaliações, baseadas em processos de auto avaliação e em visitas de
especialistas internacionais, serão compilados em relatórios de revisão por país. Ou
seja, a partir de agora, os Estados passarão a ser julgados pelo que estão
efetivamente fazendo contra a corrupção e não apenas por suas promessas. Além
44
disso, essa avaliação mostrará as lacunas existentes em cada país e, assim, guiará a
atuação do UNODC em termos de cooperação técnica.
O Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) implementa
medidas que refletem as três convenções internacionais de controle de drogas e as
convenções contra o crime organizado transnacional e contra a corrupção. O trabalho
do UNODC está baseado em três grandes áreas: saúde, justiça e segurança pública.
Dessa base tripla, desdobram-se temas como drogas, crime organizado, tráfico de
seres humanos, corrupção, lavagem de dinheiro e terrorismo, além de
desenvolvimento alternativo e de prevenção ao HIV entre usuários de drogas e
pessoas em privação de liberdade.
No campo da saúde, o UNODC trabalha no sentido de garantir o acesso
universal aos serviços de saúde como um direito humano fundamental,
independentemente da condição social ou da situação jurídica das pessoas. Nesse
sentido, o UNODC se esforça para garantir o acesso a tratamento para usuários
problemáticos de drogas e para garantir o atendimento integral de saúde também nos
ambientes prisionais. Além disso, conduz esforços de prevenção voltados para a
população em geral, a fim de conscientizar as pessoas sobre os riscos do uso abusivo
de drogas.
Na área de justiça, o UNODC trabalha pela manutenção e pelo
desenvolvimento do Estado de Direito, auxiliando os países, por meio da
implementação de instrumentos jurídicos internacionais relevantes, a desenvolver
sistemas de justiça íntegros e justos, além de sistemas prisionais adequados, sempre
a partir da perspectiva do respeito aos direitos humanos.
No campo de segurança pública, o UNODC trabalha para ampliar a capacidade
dos países em oferecer uma resposta à criminalidade. Para isso, busca reforçar a
ação internacional contra a produção de drogas, o tráfico e a criminalidade associada
às drogas, por meio de iniciativas como projetos de desenvolvimento alternativo,
monitoramento de cultivos ilícitos e programas contra a corrupção e a lavagem de
dinheiro. Promovendo o intercâmbio de boas práticas e soluções, o UNODC busca
concertar a ação conjunta dos países no enfrentamento ao crime organizado
internacional, buscando reforçar o Estado de Direito e promover a estabilidade dos
sistemas de justiça criminal.

45
O UNODC possui escritórios de campo, nacionais e regionais, que cobrem mais
de 150 países. Trabalhando diretamente com governos e organizações não-
governamentais, as equipes de campo desenvolvem e implementam programas de
controle de drogas e de prevenção à criminalidade, sempre adaptados às
necessidades locais dos países atendidos.
Os três pilares do trabalho do UNODC são:
 Trabalho normativo, para ajudar os Estados na ratificação e na
implementação dos tratados internacionais, e no desenvolvimento de
suas legislações nacionais em matérias de drogas, criminalidade e
terrorismo, além de oferecer serviços técnicos e operacionais para
órgãos de execução e controle estabelecidos pelos tratados
internacionais.
 Pesquisa e análise, para aumentar o conhecimento e a compreensão
dos problemas relacionados às drogas e à criminalidade e para ampliar
a definição de políticas e de estratégias com base em critérios baseados
em evidências.
 Assistência técnica, por meio de cooperação internacional, para
aumentar a capacidade dos Estados-membros em oferecer uma
resposta às questões relacionadas às drogas ilícitas, ao crime e ao
terrorismo.
Desde 1991, o UNODC atua no Brasil com o objetivo de apoiar o governo
brasileiro no cumprimento das obrigações assumidas ao ratificar as Convenções da
ONU sobre Controle de Drogas e os doze instrumentos multilaterais sobre o
terrorismo. O Brasil ratificou a Convenção da ONU contra o Crime Organizado, seus
três Protocolos (contra o Tráfico de Seres Humanos, contra o Contrabando de
Migrantes e contra o Tráfico de Armas) e a Convenção da ONU sobre Corrupção.
O crescimento das áreas de trabalho do UNODC foi complementado pela
expansão na área geográfica de atuação. Isso ocorreu pela primeira vez em 2001,
quando o Escritório passou a ser regional, cobrindo os países do Cone Sul: Argentina,
Chile, Paraguai e Uruguai. Já em maio de 2013, o escritório regional passou a ser um
Escritório de Ligação e Parceria do UNODC no Brasil, focado em cooperação regional
e inter-regional, incluindo iniciativas Sul-Sul, com ênfase em promover a colaboração
e o diálogo com outros países.
46
3.2 Convenção da ONU

A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção trata de quatro temas


principais: a prevenção, a criminalização dos atos de corrupção, a cooperação
internacional e a recuperação de ativos.
No Brasil, a Convenção da ONU contra a Corrupção foi ratificada pelo Decreto
Legislativo nº. 348, de 18 de maio de 2005, e promulgada pelo Decreto Presidencial
nº. 5.687, de 31 de janeiro de 2006.
A Convenção da ONU é o mais abrangente tratado internacional sobre
prevenção e combate à corrupção. Ela é o maior instrumento internacional
juridicamente vinculante, ou seja, que obriga os Estados Partes que a ratificaram a
cumprir os seus dispositivos, sob pena de serem pressionados pela comunidade
internacional. Pelo seu caráter global, a Convenção demonstra a preocupação de
todos com o problema da corrupção.
Além disso, a partir da ratificação da Convenção pelo Brasil, ela ingressa no
ordenamento jurídico pátrio como lei ordinária, ou seja, a partir desse momento, torna-
se lei interna brasileira, exceto para as cláusulas de direito penal, e seu cumprimento
é obrigatório por todos.
Quais os objetivos da Convenção?
• Promover e fortalecer as medidas para prevenir e combater mais eficaz
e eficientemente a corrupção;
• Promover, facilitar e apoiar a cooperação internacional e a assistência
técnica na prevenção e na luta contra a corrupção, incluída a recuperação
de ativos;
• Promover a integridade, a obrigação de render contas e a devida gestão
dos assuntos e dos bens públicos.
De que maneira a Convenção ajuda a prevenir e combater a corrupção?
A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção trata de quatro temas
principais: a prevenção, a criminalização dos atos de corrupção, a cooperação
internacional e a recuperação de ativos. No que se refere à prevenção, foram previstas
medidas como a criação de agências anticorrupção, maior transparência no setor
público, participação da sociedade, criação de códigos de conduta para funcionários
públicos e regras para a contratação pública e gestão da Fazenda Pública.
47
Com relação à criminalização, os Estados Partes se comprometeram-se a
penalizar diversos atos considerados atos de corrupção, muitos dos quais já
tipificados pela legislação brasileira. No que tange à cooperação internacional, estão
previstas ações em conjunto voltadas para a prevenção, investigação e assistência
jurídica, além da possibilidade da extradição de réus. A recuperação de ativos é um
princípio fundamental da presente Convenção e tem por objetivo restituir ao Estado
Parte lesado os bens desviados e transferidos a outros Estados Partes em
decorrência de delito qualificado como ato de corrupção de acordo com a Convenção.
O Brasil está fortalecendo as suas instituições responsáveis pela prevenção e
combate à corrupção e adequando sua legislação para que essa sirva como efetivo
instrumento de repressão desse delito. A Controladoria-Geral da União (CGU), desde
que foi criada, vem realizando seguidas ações de auditoria e apuração de fraudes e
desvios de recursos, algumas, inclusive, em parceria com a Polícia Federal, com o
Ministério Público Federal e com os Ministérios Públicos dos Estados.
Além disso, a CGU vem desempenhando funções típicas de uma agência
anticorrupção. Nesse contexto, também estão sendo desenvolvidas estratégias e
políticas de prevenção e combate à corrupção. Devido a sua destacada atuação, a
CGU está caminhando para se tornar um órgão de referência da ONU no combate à
corrupção para os países do continente, como já anunciado pelo Escritório das
Nações Unidas contra Drogas e Crime (UNODC) no Brasil.
No que se refere à legislação, podemos destacar o envio de dois projetos de
lei ao Congresso Nacional. O primeiro prevê a inclusão do artigo 317-A ao Código
Penal, instituindo o crime de Enriquecimento Ilícito. O segundo é o projeto de lei que
prevê situações que configuram o Conflito de Interesses e institui a nova "quarentena"
no Poder Executivo Federal.

48
4 CONVENÇÃO DA OEA

Fonte: neiarcadas.files.wordpress.com

A Convenção da Organização dos Estados Americanos (OEA) promove o


fortalecimento dos mecanismos necessários para prevenir, detectar, punir e erradicar
a corrupção.
No Brasil, a Convenção foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 152, de 25 de
junho de 2002, e promulgada pelo Decreto Presidencial nº 4.410, de 7 de outubro de
2002.
A Convenção foi o primeiro instrumento internacional de combate à corrupção
que tratou tanto de medidas preventivas como punitivas em relação aos atos
corruptos.
No Brasil, a partir da ratificação de uma convenção, ela é incorporada ao
ordenamento jurídico brasileiro como lei ordinária, ou seja, a partir desse momento
torna-se lei interna brasileira e seu cumprimento é obrigatório para todos.
Quais os objetivos da Convenção?
 Promover e fortalecer o desenvolvimento, por cada um dos Estados
Partes, dos mecanismos necessários para prevenir, detectar, punir e
erradicar a corrupção;

49
 Promover, facilitar e regular a cooperação entre os Estados Partes a fim
de assegurar a eficácia das medidas e ações adotadas para prevenir,
detectar, punir e erradicar a corrupção no exercício das funções públicas,
bem como os atos de corrupção especificamente vinculados a seu
exercício.
De que maneira a Convenção ajuda a prevenir e combater a corrupção?
A Convenção da OEA dispôs, especialmente, sobre a prevenção como uma
das formas de combate à corrupção. Dentre as medidas preventivas abordadas pela
Convenção destacam-se: a criação, manutenção e fortalecimento de normas de
conduta para o correto, honrado e adequado desempenho das funções públicas; o
fortalecimento de mecanismos que estimulem a participação da sociedade civil e de
organizações não governamentais nos esforços para prevenir a corrupção; e a
instituição de sistemas de arrecadação fiscal que impeçam a prática da corrupção.
A Convenção da Organização dos Estados Americanos possui o “Mecanismo
de Acompanhamento da Implementação da Convenção Interamericana Contra a
Corrupção”, constituído pela Conferência dos Estados Partes e pela Comissão de
Peritos, esta última responsável pela análise técnica da implementação da
Convenção. O referido Mecanismo tem, ainda, por finalidade, melhorar a cooperação
técnica de atividades nos Estados Partes.
O que o Brasil está fazendo para cumprir as determinações da Convenção?
O ordenamento jurídico brasileiro já se encontra, em muitos aspectos, em
conformidade com os termos da Convenção da OEA. Para que essa conformidade
seja completa, dois Projetos de Lei foram enviados ao Congresso Nacional pelo atual
Governo.
 PL que prevê a inclusão do artigo 317-A ao Código Penal, tipificando o
crime de Enriquecimento Ilícito;
 PL que prevê situações que definem o Conflito de Interesses.
 Anteprojeto de Lei de Acesso à Informação, encaminhado à Casa Civil
da Presidência da República, para posterior encaminhamento ao
Congresso Nacional.
Em relação às medidas preventivas, foram criadas, dentre outras, as Páginas
e o Portal da Transparência, no intuito de aumentar a transparência governamental, e
o Programa Olho Vivo no Dinheiro Público, com ações de fomento ao controle social.
50
Vale, também, chamar a atenção para a criação da Secretaria de Prevenção da
Corrupção e Informações Estratégicas, da CGU, em janeiro de 2006, atual Secretaria
de Transparência e Prevenção da Corrupção.

5 COMPLIANCE INTERNACIONAL - EMPRESAS TRANSNACIONAIS

Fonte: www.oguiagospel.com.br

Além de desenvolver uma estrutura eficiente de Compliance corporativo, muitas


empresas transnacionais possuem o desafio extra de coordenar ações de Compliance
nas suas unidades estrangeiras a partir de sua matriz. Para isso, aspectos como
adaptação de políticas, governança, regulação estrangeira e diferenças culturais
devem ser corretamente compreendidos para que todas as unidades internacionais
também estejam alcançados e suportados em seus controles conforme parâmetros,
ferramentas e sistemas definidos pela sua sede.
Ao iniciar o desenvolvimento de uma estrutura de Compliance nas suas
unidades estrangeiras, a empresa deve já ter obtido um grau razoável de maturidade
em sua própria matriz. Essa maturidade implica em pressupostos que permitem a
existência dos Programas de Compliance, alguns dos quais serão aplicados nas
unidades internacionais.

51
5.1 A Governança e a Tolerância ao Risco

A alta administração deve expressamente definir o apetite a riscos da


organização bem como a forma como estes riscos são identificados nas diversas
linhas de negócio. O comprometimento inequívoco da alta direção à cultura de
controles deve ocorrer através de foros adequados (conselhos e comitês) e de
políticas internas.
A cultura de controles deve ser capaz de emanar o sentimento dos comitês e
da alta administração por todos os processos e áreas da organização. E o reporte da
aplicação dos controles deve iniciar nos gestores até ser informado ao corpo diretivo.
Nas unidades estrangeiras, a cultura de controles deve estar presente e refletir
o sentimento da alta administração. O monitoramento de que isso esteja ocorrendo é
responsabilidade do Compliance Officer, que apresenta os indicadores no Comitê de
Compliance de sua unidade.

5.2 Atividades de Controle

Através da sua governança, a instituição aprova suas políticas e procedimentos


que asseguram que as respostas aos riscos de descumprimento à lei estejam
eficazes. É necessário, também, que alguma área independente, geralmente de
Compliance, seja responsável por ministrar treinamentos periódicos a todos os
colaboradores, com controle de participação executado pelo setor de Recursos
Humanos. Ainda que o treinamento possa ter vários formatos, é boa prática que seja
segmentado conforme o envolvimento do público com os riscos considerados, e que
tenha validade de um ano.
Cada unidade estrangeira deve ter controles adequados à sua atuação e à
complexidade de seus processos. Entretanto, há a necessidade de formalização,
ainda que tais unidades sejam de pequeno porte. Cabe ao Compliance Officer
organizar e disponibilizar todas as evidências de execução dos controles de sua
unidade.

52
5.3 Identificação de Eventos e Avaliação de Riscos

A origem dos eventos de risco deve considerar não somente os atos dos
funcionários, mas também os praticados por terceiros tais como fornecedores ou
prestadores de serviço, e seus prepostos. Prática também conhecida como KYP
(“know your partner”) - regras, procedimentos e controles internos para identificação
e aceitação de parceiros comerciais. Entretanto, como nem todos os terceiros ou
parceiros possuem o mesmo grau de risco, eles devem ser classificados e receber
controles proporcionais aos riscos que representam. Para os demais alto risco,
recomenda-se diligências aprofundadas de avaliação (tais como “due diligence”) com
alçadas específicas de aprovação.
Nas unidades internacionais, toda ocorrência de evento de risco deve ser
devidamente reportada nos Comitês de Compliance e em sistemas específicos, como
os que coletam eventos de risco operacional. Além disso, toda contratação de
terceiros deve se submeter a critérios de KYP definidos pela matriz, e toda contratação
deve ser aprovada pelos setores jurídicos da matriz e da unidade estrangeira.

5.4 Controles e Monitoramento

Todos os controles devem ser testados periodicamente, com frequência


proporcional à avaliação dos riscos por eles mitigados e todas as matrizes de riscos e
controles devem ser monitoradas continuamente. Isso permite que o próprio programa
de Compliance seja continuamente ajustado. Há duas formas de realização do
monitoramento: através da utilização contínua por parte dos gestores dos processos
envolvidos e por avaliações independentes – tanto das equipes de Controles Internos
e Compliance quanto pela Auditoria, seja ela interna ou externa.
Merecem destaque os procedimentos específicos de pronta interrupção de
irregularidades detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados. Ou seja,
além do aspecto preventivo, há a preocupação de que os casos alertados tenham
planos de ação tanto para correção dos processos internos quanto para “remediação”.
Todos os casos devem ser apresentados em comitês definidos em política,
preferencialmente de riscos e controles internos.

53
Melhor prática já consolidada internacionalmente, o procedimento de
realização de testes de controles ganhou relevo com a lei Sarbanes-Oxley, também
conhecida como SOX. Analogamente, outras iniciativas regulatórias como
Anticorrupção e FATCA (Foreign Account Tax Compliance Act), além das constantes
novas orientações da Basiléia para os Bancos Centrais e do GAFI sobre Prevenção à
Lavagem de Dinheiro, estão a exigir que muitas empresas reforcem suas estruturas
de controle e monitoramento. A tendência internacional é de aumento da regulação e
da fiscalização sobre o Compliance das organizações, independentemente de seu
porte e área de atuação.

5.5 Ambiente de Controles e Riscos

O grande objetivo do programa de Compliance é estabelecer um ambiente


interno, feito pelos colaboradores (funcionários e terceiros), com visão de
gerenciamento de riscos e dentro de um ambiente ético e em conformidade com o
espírito da lei. Como parte do programa, deve haver uma instância interna
responsável pela sua aplicação, fiscalização e aperfeiçoamento, estruturada e
independente. E, de acordo com a governança da empresa, é crucial a previsão de
medidas disciplinares para os casos de desrespeito ao programa de Compliance.
Uma curva de aprendizado típica que se observa nos setores nos quais há a
estruturação do Compliance compreende pelo menos três fases. Inicialmente, o
Compliance é confundido com Auditoria. Os colaboradores sentem temor pelas
eventuais descobertas de falhas cometidas no cumprimento de normativos internos.
Posteriormente, após tomarem consciência do papel de melhoria de processos pelo
setor de Controles Internos, há uma tendência de repasse de execução de controles
dos gestores para o Compliance. Somente numa última fase, com o que se pode
chamar de implantação de “Control Room”, existe o estabelecimento efetivo da cultura
de controles na primeira linha de defesa da organização.

5.6 Os Programas de Compliance

Os programas de Compliance têm uma abordagem imediata: permitem verificar


o quanto um determinado assunto está em conformidade legal. Isso é feito através de
54
testes diretos de controles, independentemente de estarem eles devidamente
mapeados nos catálogos de processos da empresa. Ressalte-se que muitos desses
controles, que mitigam riscos legais, demandam acompanhamento normativo e rápido
acesso à legislação atualizada. Além disso, é imperioso também acompanhar a
jurisprudência, assim como a tendência dos tribunais e o posicionamento setorial das
empresas frente às inúmeras controvérsias geradas por regulamentos cada vez mais
específicos, mas nem sempre em sintonia com os propósitos das linhas de negócio.
Um Programa de Compliance é composto por uma sequência de assertivas
para as quais deve-se verificar o grau de conformidade. Em alguns casos é requerida
seleção de amostras para análise. O resultado final de sua aplicação é uma avaliação
global que mede o grau de conformidade da instituição em relação àquele assunto.
Uma característica desses programas é a diferença entre sua elaboração e sua
execução. Enquanto que na elaboração é fundamental a total participação dos
gestores de negócio, com eventual apoio de setores jurídicos, na execução qualquer
funcionário é capaz de realizar a verificação das assertivas, que são descritas de
forma simples e com pouca margem a questionamentos.
Por fim, os resultados dos Programas de Compliance devem ser apresentados
periodicamente em Comitês. Daí a importância de os processos organizacionais terem
sido objeto de gestão de qualidade: só se deve acompanhar métricas de eficiência em
processos otimizados quanto às suas etapas, observando-se itens como retrabalho,
segregação de atribuições e identificação e avaliação de riscos e controles.
Preenchidos os requisitos, ou pressupostos, a organização está apta para implantar o
Compliance em suas unidades estrangeiras.

5.7 Adaptação de Políticas

Todo o arcabouço normativo desenvolvido pela matriz foi certamente


estabelecido com foco nas linhas de negócio principais e na regulação local. Contudo,
a atuação das unidades estrangeiras geralmente é bastante diverso da sede, o que
exige uma adaptação das políticas às linhas de negócio e ao regulador estrangeiro.
Deve-se claramente definir o que a unidade estrangeira deve fazer para estar
em Compliance com as políticas da empresa. Cada item a ser observado deve ser
acompanhado em comitês locais e depois reportados para a matriz. Assuntos
55
específicos exigirão a montagem e aplicação de Programas de Compliance
adaptados. Dentre os temas principais encontram-se: Plano de Continuidade de
Negócios, Segurança da Informação, Auditoria de TI, Prevenção à Lavagem de
Dinheiro e Anticorrupção.

5.8 Governança

Cada unidade estrangeira deve ter um Compliance Officer, que se reporta


matricialmente à estrutura de Compliance Corporativo da matriz. Sua função
primordial é zelar pelo que se pode denominar de “estrutura operacional mínima” de
controles de sua unidade. Dentre os itens dessa estrutura estão os seguintes:
 Mapeamento dos principais processos;
 Identificação e avaliação dos riscos nos processos;
 Estabelecimento dos controles adequados à mitigação dos riscos
identificados;
 Desenvolvimento de testes de controles, aplicados com periodicidade
associada à criticidade do risco mitigado;
 Manual de Compliance, abrangendo as políticas da unidade adaptadas
às políticas da matriz;
 Manutenção do Comitê de Controles Internos, Compliance e Gestão de
Riscos;
 Reporte à matriz das atas do Comitê e dos registros de riscos
operacionais e regulatórios;
 Atendimento às auditorias internas e externas e aos órgãos reguladores
e fiscalizadores locais e
 Atendimento às equipes de controles internos da matriz para aplicação
dos Programas de Compliance.

5.9 Regulação Estrangeira

A forma de normatizar, fiscalizar e punir dos órgãos reguladores nos diversos


países guarda semelhanças, mas, sobretudo, diferenças perigosas. Sem sombra de

56
dúvida, o chamado risco regulatório é a maior prioridade na agenda de todo
Compliance Officer estabelecido em unidade estrangeira. Provavelmente ninguém
melhor do que ele conhece, na prática, os procedimentos que devem ser seguidos, as
evidências que precisam estar à disposição e os principais controles que precisam
efetivamente estar em funcionamento.
Assim, as requisições feitas à matriz devido a demandas regulatórias de suas
unidades devem sempre levar em consideração o que o Compliance Officer, no
exercício de sua independência e autoridade, reporta imperativamente à estrutura de
controles corporativos.
A exposição ao risco regulatório nas unidades internacionais guarda relação
intrínseca com o risco de imagem, independentemente de seu tamanho ou suposta
importância. A marca da instituição está presente em todas as suas representações.

5.10 Diferenças Culturais

Por fim, porém não menos importante, estão as surpreendentes diferenças


culturais a permear a relação entre as estruturas de Compliance estrangeira e da
matriz. Da forma de se cumprimentar até a maneira de enfrentar os problemas nas
linhas de negócio, as peculiaridades das diversas regiões nas quais a organização
marca presença devem sempre ser levadas em consideração.
O acoplamento dos controles das unidades estrangeiras à estrutura da matriz
representa, mais do que um simples alinhamento de Compliance, o estabelecimento
de uma relação de confiança que permite que, mesmo separados por longas
distâncias e tendo ambientes regulatórios e culturais distintos, a empresa possa estar
realmente presente em suas representações fora de seu país de origem.

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