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DISCLOURE

Todas as informações disponibilizadas na presente apostila e no Curso Online de


Investigações Internas de Compliance da LEC – Legal, Ethics & Compliance (“LEC”) são
públicas e de fontes de pesquisa disponíveis na Internet.

As pessoas físicas e jurídicas aqui mencionadas refletem apenas casos para estudo, sem
qualquer juízo de valor da LEC e de seus professores e coordenadores.

A reprodução deste material e de qualquer outro material concedido pela LEC no Curso
Online de Investigações Internas de Compliance, no todo ou em parte, é vedada, exceto se
mediante autorização prévia e por escrito da LEC.

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SUMÁRIO

Apresentação

Recomendações Preliminares

Compliance Overview

1. O que é Compliance?
1.1. Compliance x Ética

2. A origem do Compliance
2.1. Caso Watergate e FCPA
2.2. Caso Enron e SOx
2.3. Caso Siemens

3. Princípios do Compliacce

4. O que é fraude?
4.1. Origem da fraude
4.2. Triângulo da fraude

5. O que é corrupção?
5.1. Índice de Percepção da Corrupção

6. Pilares de um Programa de Compliance

Combate à corrupção no mundo

7. Convenções Internacionais
7.1. Convenção Interamericana contra a Corrupção da Organização dos Estados
Americanos
7.2. Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos
Estrangeiros em Transações Comercais Internacionais da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico
7.3. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção
7.3.1. Penalização e Aplicação da Lei
7.3.2. Recuperação de Ativos
7.3.3. Cooperação Internacional
7.3.4. Conferência dos Países Membros da Convenção das Nações Unidas

8. Organizações Internacionais

9. Legislação Anticorrupção Estrangeira


9.1. Foreign Corrupt Practices Act

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9.1.1. Atos penalizados pelo FCPA
9.1.2. Autoridades competentes
9.1.3. Quem pode ser penalizado?
9.1.4. Casos emblemáticos
9.1.5. Empresas sob investigação
9.1.6. Top 15 dos países listados com empresas sob investigação sobre
violações da FCPA, excluindo empresas americanas
9.2. U.K. Bribery Act
9.2.1. Atos penalizados pelo UKBA
9.2.2. Autoridades
9.2.3. Quem pode ser penalizado?
9.2.4. Casos emblemáticos

Combate à corrupção na América Latina

10. Legislação Anticorrupção na América Latina


10.1. Argentina
10.2. Chile
10.3. Colômbia
10.4. México

11. Casos emblemáticos de corrupção na América Latina

Sistema de Normas Anticorrupção Brasileiras

12. Contexto legislativo anterior à Lei Anticorrupção brasileira


12.1. Contexto histórico nacional
12.2. Mensalão

13. Aspectos gerais da Lei Anticorrupção brasileira


13.1. Atos penalizados pela Lei Anticorrupção brasileira
13.2. Penalidades da Lei Anticorrupção brasileira
13.3. Agravantes e atenuantes da multa
13.4. Acordo de Leniência
13.5. Quem é o funcionário público?
13.6. Penalidades para a pessoa física

14. Decreto Federal n.º 8.420/15


14.1. Aspectos gerais do Decreto n.º 8.420/15
14.2. Parâmetros do Programa de Compliance efetivo

15. Portaria n.º 909/2015 da CGU

16. Portaria n.º 910/2015 da CGU

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17. Instruções Normativas n.º 1/2015 e 2/2015 da CGU

18. Instrução Normativa nº. 13/2019 da CGU

19. Portaria Conjunta n.º 2279/2015 da CGU e da Secretaria da Micro e Pequena


Empresa

20. Regulamentos estaduais e municipais


20.1. Decreto n.º 60.106/14 (Estado de São Paulo)
20.2. Decreto n.º 55.107/14 (Município de São Paulo)
20.3. Decreto Nº 522/16 (Estado de Mato Grosso)

21. Quadro comparativo: FCPA x UKBA x Lei n.º 12.846/13

22. Compliance nas empresas públicas e sociedades de economia mista


22.1. Abrangência
22.2. Regras de Integridade
22.2.1. Transparência
22.2.2. Programa de Compliance
22.2.3. Controles internos, gestão de risco e conformidade
22.2.4. Licitações e contratos

23. Compliance como requisito para contratar com o Poder Público

Versões

Quadro de atualização periódica

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APRESENTAÇÃO

A LEC – Legal, Ethics & Compliance (“LEC”) existe para cumprir a missão de identificar,
reunir e formar agentes transformadores, líderes de uma revolução ética, sustentada por uma
grande comunidade de pessoas aliadas por identidade de valores.

A visão da LEC é difundir cultura de compliance, direito e ética, a fim de elevar as exigências
de transparência e integridade corporativa no Brasil e na América Latina, cumprindo a sua
parte na luta por um mundo livre de corrupção.

Assim, o principal objetivo da LEC é difundir conhecimento em compliance, ética, riscos,


fraudes e direito. Além disso, a LEC contribui com a construção de um mundo melhor,
inclusive por meio da orientação e capacitação de gestores e especialistas que possam
aprimorar o seu trabalho promovendo cultura de integridade e ética corporativa.

Nesse sentido, a LEC criou o Curso Online Anticorrupção focando no estudo da corrupção,
da legislação anticorrupção nacional e estrangeira, e na aplicação prática de implementação
do programa de compliance considerando o dia a dia de uma empresa.

Nesta linha, um dos principais objetivos foi o de guiar os profissionais que atuam na área de
compliance nas mais diversas empresas, independentemente do tamanho e da natureza
jurídica. Portanto, o Curso Online Anticorrupção terá diversos exemplos e situações práticas
que poderão ser adaptados à realidade e necessidade de cada empresa.

Além disso, vale lembrar que as empresas devem assegurar e existência de um programa
de compliance robusto e efetivo que previna e detecte condutas impróprias, bem como auxilie
na remediação de tais condutas. Nesta linha, um programa de compliance deve conter
elementos e procedimentos que assegurem: (i) suporte da alta administração; (ii) avaliação
de riscos; (iii) código de conduta e políticas; (iv) controles internos; (v) comunicação e
treinamento; (vi) canais de comunicação (dúvidas e denúncias); (vii) investigações internas;
(viii) due diligence de terceiros e em estruturações societárias; e (ix) auditoria e
monitoramento.

Bom curso!

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RECOMENDAÇÕES PRELIMINARES

A existência de um Programa de Compliance robusto requer, dentre diversos fatores, o


conhecimento pelo profissional de compliance da empresa em que trabalha, bem como do
setor de atuação e das práticas de mercado. Assim, quanto mais informações o profissional
de compliance tiver, melhor.

Além disso, com relação à implementação do programa de compliance, é sempre válido


lembrar que o profissional de compliance deverá buscar compreensão da legislação nacional
e estrangeira relacionada à anticorrupção. Também é importante lembrar que a legislação
estrangeira deve ser adaptada as práticas locais e peculiaridades de cada cultura.

Assim, o conteúdo que será apresentado neste Curso Online Anticorrupção busca ser uma
base no estudo da corrupção, da legislação anticorrupção nacional e estrangeira, e na
aplicação prática de implementação do programa de compliance considerando o dia a dia de
uma empresa. Este conteúdo deve ser um guia que deverá ser ajustado caso a caso, não
devendo ser utilizado como um instrumento rígido e imutável.

Em caso de dúvidas, entre em contato com a equipe da LEC, através do e-mail


suportecursoonline@lecnews.com.br.

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COMPLIANCE OVERVIEW

1. Conceito de Compliance

Compliance é uma palavra que tem origem no verbo inglês “to comply” que em português
significa cumprir, consentir. O termo “compliance” não possui uma tradução para o
português, porém há algumas palavras que se aproximam de uma tradução como
conformidade, concordância.

A definição técnica de compliance oferecida pelo U.S. Federal Sentencing Guidelines


Manual 1 (em tradução livre para o português, “Manual do Departamento de Justiça
Americano”) trata do dever das empresas de promover uma cultura organizacional que
estimule a conduta ética e um compromisso com o cumprimento da lei.

Assim, compliance é o cumprimento das normas, sejam elas as leis de um país, sejam elas
as políticas internas de uma empresa. O compliance está diretamente associado ao
cumprimento de um determinado padrão de conduta, ou seja, uma ação ou uma omissão
abalizada por uma norma, seja ela uma lei ou uma política interna de uma empresa. De
maneira simplista, para o mundo jurídico, estar em compliance significa agir dentro da
legalidade; em conformidade com as leis.

No mundo jurídico, estar “em compliance” significa estar em conformidade com as leis, ou
seja, agir dentro da legalidade. Porém, no mundo corporativo, estar em compliance vai além
de estar em conformidade com as leis e regulamentos internos. Cada vez mais as empresas
buscam, através do compliance, atitudes éticas e transparentes.

No dia a dia das organizações, sejam elas públicas ou privadas, as leis nem sempre
disciplinam adequadamente a respeito de toda a gama de relações que podem ser
estabelecidas entre si. Por isso, o conceito do termo pode ser ampliado e entendido como
os esforços adotados para garantir o cumprimento das exigências legais (e
regulamentadoras de uma determinada atividade empresarial), observando os princípios da
ética, da transparência e da integridade corporativa.

Fundamentalmente, o compliance exige uma mudança profunda no ambiente corporativo e,


por este motivo, cada vez mais, as empresas estão reconhecendo e adotando uma postura
mais vigilante e diligente.

1.1. Compliance X Ética

Compliance muitas vezes se confunde e/ou é vinculado como sinônimo de ética, o que não
está correto. Como mencionado, compliance trata do dever das empresas em promover uma

1
http://www.ussc.gov/guidelines

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cultura organizacional que estimule a conduta ética e um compromisso com o cumprimento
das leis.

Ética é uma parte da filosofia que se dedica aos estudos dos valores morais e ideais do
comportamento humano na sociedade. Assim, cada indivíduo poderá ter um valor moral
daquilo que considera um comportamento humano ideal, correto na sociedade.

Ainda, ética “é uma atividade do intelecto, um pensamento mesmo, que tem por objeto a
maneira como vamos agir – e interagir. É um esforço de razão para a identificação da melhor
alternativa. Mas não só. Também é ética a ação ela mesma. A conduta. Quando for o
resultado dessa escolha pensada. Pensamento e ação, portanto. A ética implica pensar a
vida e viver o pensamento”.2

A previsão inicial dos requisitos formais de um Programa de Compliance foi estabelecida


pela agência norte-americana U.S. Federal Sentencing Commission, em 1991, com a
publicação U.S. Federal Sentencing Guidelines daquele ano. Acontece que, com o tempo,
uma considerável quantidade de empresas passou a adotar programas meramente formais,
a fim de preencher os requisitos estabelecidos na mencionada normativa, sem, contudo,
buscar a sua efetividade. Foi assim que a referida agência, em 2004, alterou o teor da
normativa para estabelecer a necessidade de implementação de um Programa de
Compliance e de Ética.

Assim, pode-se dizer que, a partir dessa mudança de interpretação, o Programa de


Compliance passou a buscar uniformização da cultura organizacional estimulando que todos
(colaboradores e terceiros) compartilhem da conduta ética determinada pela empresa.

2. Origem do Compliance

Desde o final do século XIX, o Governo norte-americano passou a regular a atividade


empresarial, especialmente com a criação de normas de natureza criminal que previam a
responsabilidade criminal da pessoa jurídica por práticas anticoncorrenciais. Quando as
primeiras condenações começaram a surgir, em meados do século XX, tanto das pessoas
jurídicas, quanto de seus executivos, um grupo de advogados americanos, especializados
em direito concorrencial, iniciaram as primeiras iniciativas de implementação de mecanismos
de prevenção à prática de condutas lesivas pelas empresas, o que foi, desde aquela época,
nomeado como Programa de Compliance.

Internacionalmente3, desde os primórdios dos anos 70, com a criação do Comitê da Basiléia
para Supervisão Bancária, procurou-se fortalecer o Sistema Financeiro por meio da maior
conceituação sistemática de suas atividades, parametrizando as pelas boas práticas

2
CORTELLA, Mario Sergio e FILHO BARROS DE, Clóvis. Ética e Vergonha na Cara! São Paulo: Papirus
Editora, 2014.
3
http://www.abbi.com.br/download/funcaodecompliance_09.pdf

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financeiras e munindo-as de procedimentos prudenciais na sua atuação. Iniciava-se o
processo para a tentativa de saneamento do Sistema Financeiro Internacional.

Em paralelo a esse cenário, as instituições financeiras brasileiras continuaram a enfrentar


uma acirrada disputa interna por uma fatia cada vez mais representativa do mercado. Essa
competitividade contribuiu para a quebra de algumas instituições que, entre outros fatores,
não adequaram seu ambiente de controles internos de acordo com o risco do seu segmento.
Fatos relevantes no cenário mundial, como o ato terrorista nos EUA em 2001 e os escândalos
financeiros em Wall Street em 2002, despertaram a necessidade de regulamentações ainda
mais efetivas e rapidamente aplicáveis em todos os países, a fim de gerir os riscos aos quais
as instituições estão sujeitas.

Com isso, as instituições financeiras foram compelidas a iniciar um ciclo de mudanças cada
vez mais radicais, com reestruturações estratégicas, organizacionais e tecnológicas, para
construir uma imagem forte da instituição financeira perante clientes e fornecedores. Nesse
contexto, destaca-se a “Função de Compliance” de grande importância na proteção e no
aprimoramento do valor e da reputação corporativa.

O conceito de compliance se solidifica com o advento da lei norte-americana Foreign Corrupt


Practices Act – FCPA (em tradução livre, Lei sobre Práticas de Corrupção no Exterior), a
qual foi promulgada em 1.977 com o objetivo de combater as práticas de corrupção no
exterior, ou seja, fora dos Estados Unidos. Foi justamente neste contexto que o programa de
compliance ganhou o viés anticorrupção, assim como maior notoriedade no cenário global.

2.1. Caso Watergate e FCPA

Um dos fatos que impulsionaram a criação da do FCPA ocorreu em 1.972, quando as


autoridades norte-americanas realizaram uma investigação sobre doações corporativas para
fins políticos que revelaram um grande esquema de pagamentos a funcionários públicos
estrangeiros. As empresas utilizavam fundos offshore4 para o pagamento de propinas aos
funcionários públicos estrangeiros e assegurar seus negócios fora dos Estados Unidos.

Após as investigações, mais de 400 empresas admitiram a realização de pagamentos ilícitos


e o montante destes pagamentos somava mais de USD 300 milhões.

Referida investigação ficou conhecida como o caso Watergate e custou o segundo mandato
do presidente Richard Nixon. O caso se chama Watergate, pois se refere ao edifício
Watergate em Washington DC em que cinco homens foram presos em 1.972 tentando
colocar escutas no escritório do Comitê Democrata Nacional. Os invasores eram apoiadores
do Partido Republicano de Richard Nixon e ele estava disputando as eleições para o seu

4
Fundos ou empresas offshore significa fundos ou empresas que possuem a sua contabilidade em país diverso
ao país em que exerce a sua atividade. O termo offshore também tem é utilizado para designar empresas ou
contas abertas em paraísos fiscais que são utilizadas para fins ilícitos e crimes do colarinho branco.

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segundo mandato como presidente. O objetivo era obter informações relevantes dos
adversários e usá-las durante a campanha eleitoral.

No ano seguinte, os invasores foram julgados e o caso parecia encerrado. Porém um dos
invasores revelou que o governo, já sob o comando de Richard Nixon, conduzia uma
operação para abafar o escândalo de Watergate. O caso tomou proporções maiores e uma
série de investigações revelaram operações ilegais do governo Nixon e negociações escusas
que ocorreriam nos bastidores políticos da época. Ficou comprovado também que Richard
Nixon estava ciente das ilegalidades que ocorriam em seu governo.

Assim, o Congresso americano iniciou um processo de impeachment contra o presidente e


em 1.974, Richard Nixon foi o primeiro presidente norte-americano que renunciou o cargo.

Diante do cenário de incertezas e informações a respeito do pagamento de subornos no


exterior, os Estados Unidos decidiram aprovar o FCPA com o objetivo de reduzir os casos
de pagamento de propinas para funcionários públicos estrangeiros e restaurar a confiança
das empresas norte-americanas no mundo dos negócios.

Além disso, os Estados Unidos também aprovaram o FCPA por estarem preocupados com
a sua economia e precisarem proteger o mercado interno de ações. Muitas empresas
negociam seus papéis na bolsa de valores norte-americana e os norte-americanos possuem
tradição em investir na bolsa de valores. Assim, o FCPA busca combater o pagamento de
propina fora dos Estados Unidos e punir a fraude nos livros contábeis e balanços das
empresas.

Em razão desta origem do FCPA que os programas de compliance possuem um enfoque tão
grande no combate à corrupção.

2.2. Caso Enron e SOX

Um outro aspecto histórico interessante é o famoso caso da Enron Corporation (“Enron”). A


Enron foi uma empresa norte-americana do setor de energia que foi alvo de denúncias de
fraudes contábeis e fiscais. A empresa estava com uma dívida bilhões de dólares, porém
esta dívida não aparecia em seus registros contábeis.

Em dezembro de 2001, a Enron pediu falência e levou consigo a empresa Arthur Anderson,
empresa de auditoria responsável por auditar as demonstrações financeiras da Enron. A
Enron manipulou seus balaços e inflou artificialmente seus lucros por dois anos com a ajuda
da Arthur Anderson e de diversos bancos. A dívida da Enron estava em torno de USD 25
bilhões.

As autoridades norte-americanas conduziram diversas investigações criminais contra os


executivos da Enron e da Arthur Anderson. Ambas as empresas fecharam e em razão deste
escândalo financeiro, e de muitos outros que também aconteceram, os Estados Unidos
aprovaram a Lei Sarbanes-Oxley.

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2.3. Caso Siemens

O FCPA, por estar em vigor há mais de 30 anos, possui diversos casos emblemáticos que
demonstram a sua forte atuação com empresas e indivíduos no mundo todo.

Atualmente o caso mais emblemático, talvez por ser o caso de aplicação da maior multa da
história do FCPA até hoje, é o caso da Siemens. A empresa de origem alemã utilizava um
sistema mundial de corrupção pelo qual fazia pagamentos ilícitos. O modelo de negócios da
Siemens funcionava através destes pagamentos ilícitos.

Dentre outras atividades, a Siemens falsificava contratos e emitia faturas simbólicas para
esconder a real natureza dos pagamentos ilícitos. A Siemens foi condenada nos Estados
Unidos e na Alemanha e no acordo celebrado com as autoridades norte-americanas pagou
uma multa de USD 800 milhões. A multa aplicada pelas autoridades alemãs também foi de
USD 800 milhões. Além disso, a Siemens foi obrigada a contratar um monitor de compliance
independente por quatro anos.

Até setembro de 2017 era a multa mais alta paga por uma companhia, por violação da FCPA,
quando foi ultrapassada pela sueca Telia Company AB que acordou com o DOJ e a SEC
para pagar USD 965 milhões para colocar fim ao seu processo de investigação por ofensas
à FCPA em operações no Uzbequistão.

Infelizmente, em 2018, o caso envolvendo a empresa brasileira Petrobras, objeto da


operação Lava Jato, gerou à estatal brasileira, que tem capital aberto nos Estados Unidos,
um acordo perante DOJ e SEC, com multa fixada pelas autoridades americanas em USD
1,78 bilhões, a maior da história da FCPA.

Para ver o quadro das maiores multas da historio da FCPA veja o item 9.1.4 (Casos
emblemáticos).

3. Princípios do Compliance

O Programa de Compliance é uma estrutura ou área empresarial, que tem como princípios
PREVENIR, DETECTAR E REMEDIAR fraudes e corrupções que são ou poderão ser
praticadas por colaboradores, representantes e terceiros, em nome da pessoa jurídica e em
benefício desta.

Em outras palavras, “observa-se que a exclusão ou a atenuação de responsabilidades só


aparenta ser adequada ou possível, se o compliance programa revelar-se um mecanismo de
gestão exitoso que comprove ser capaz de prevenir, detectar e remediar descumprimentos
que podem ocorrer no meio empresarial”.5

5
SILVEIRA, Renato de Mello Jorge; SAAD-DINIZ, Eduardo. Compliance, Direito Penal e Lei Anticorrupção.
São Paulo: Saraiva, 2015, p. 129.

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4. O que é fraude?

4.1. Origem da fraude6

Desde as origens da economia (alguns milhares de anos atrás) existem, na vida das pessoas
e no mundo dos negócios, “golpistas” que se dedicam a por em prática vários tipos de
fraudes, armadilhas, sistemas e esquemas para enganar e roubar o próximo.

O código de Hammurabi (aproximadamente 1750 A.C.), um dos mais antigos conjuntos de


leis já encontrados, define vários casos de fraudes e suas punições (por exemplo, na lei nº
265).

Pesquisas recentes descobriram, também, que antigos egípcios, por volta de 500 A.C.,
fraudavam ricos e nobres vendendo falsos gatos e outros animais sagrados embalsamados
para suas cerimônias fúnebres. As múmias de animais fraudulentas, na realidade, continham
somente gravetos e algodão, em alguns casos continham também pedaços de ossos de
outros animais.

Na idade média, eram muito comuns as fraudes com pesos e medidas e com adulteração de
alimentos e bebidas, como comprovam vários documentos e normativas contras estas
fraudes que chegaram até nos. Por volta de 1100 D.C., com a invenção e difusão das letras
de câmbio, iniciou também uma nova era de fraudes “documentais” (com certeza bem menos
frequentes naquela época, onde a palavra tinha valor, do que hoje).

Por volta de 1637 veio a famosa “bolha” das Tulipas, na Holanda, uma fraude coletiva que
levou à falência milhares de pessoas que tinham especulado no comércio dos bulbos desta
flor.

Em 1720 veio outra grande fraude contra investidores, a famosa bolha da “South Sea Co.”,
uma empresa inglesa de navegação e comércio que, divulgando informações falsas, levava
os investidores a comprar sempre mais ações e sempre mais caras (que eram prontamente
emitidas), até que o castelo desabou e todos perderam seu dinheiro.

Por volta de 1920 vale ainda lembrar a criação do famoso “Esquema de Ponzi”, que
prejudicou mais de 20.000 pessoas no leste dos EUA. É interessante mencionar também a
origem histórica e etimológica de duas famílias de termos muito comuns e relacionados ao
mundo das fraudes:

Conto do Vigário e Vigarista. – Na verdade a expressão inicial era cair na “conta do vigário”,
pois esses recebiam ouro roubado e pagavam pouco aos escravos que o vendiam (depois
de tê-lo roubado, é claro). Várias igrejas foram construídas, segundo alguns pesquisadores,

6
http://www.fraudes.org/showpage1.asp?pg=2

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graças à “conta do vigário”. Daí que veio a palavra “vigarista”, pessoa que agia como os
vigários d’então.

É importante observar que, assim como os demais fenômenos econômicos, as fraudes


também se globalizaram. Hoje os mesmos esquemas de fraude aplicados são encontrados,
com poucas adaptações, em vários países do mundo inteiro. Além disso, da mesma forma
que existem as Multinacionais, já existem quadrilhas de golpistas transnacionais, com
integrantes de diferentes nacionalidades e “filiais” que operam (ou seja, aplicam golpes) em
vários países ao mesmo tempo, através de estruturas centralizadas e com um planejamento
global.

4.2. Triângulo da fraude7

Em 1953 Donald Cressey, Ph.D. em criminologia pela Universidade de Indiana e grande


estudioso dos crimes financeiros nos Estados Unidos, desenvolveu a teoria do “triângulo da
fraude” (“fraud triangle”), onde segundo ele se fazem necessários três componentes básicos
para que uma determinada fraude possa ocorrer: motivo, técnica e oportunidade.

O primeiro componente diz respeito ao motivo que leva o fraudador a cometer o delito. O ser
humano tem uma capacidade imensa de julgar situações onde sua conduta foi equivocada
e buscar uma justificativa capaz de amenizar ou absolver o próprio sentimento de culpa. O
principal perigo está em realizar o julgamento da questão e convencer-se de que o prejuízo
que irá recair sobre o lesado já fora compensado anteriormente ou então que existe margem
para esta compensação.

Para exemplificar podemos imaginar a seguinte situação, você foi até o supermercado e
percebeu que vários produtos tiveram aumentos significativos de preço. Ao dirigir-se ao caixa
e efetuar o pagamento a atendente lhe entrega o troco errado, devolvendo uma quantia maior
do que deveria. Você sabe que está supostamente fraudando o estabelecimento, ou a
funcionária, mas tem um bom argumento para satisfazer o seu ego, a elevação dos preços.
É quase impossível acreditar que não passaria pela sua cabeça, no mínimo a hipótese de
tirar vantagem da situação.

Outro componente está ligado a questões relativas à técnica, ao conhecimento específico


daquilo que pode vir a ser o objeto da fraude. Quanto mais o fraudador souber a respeito de
uma determinada situação, maior será a possibilidade de vir a cometer algum delito em
relação a ela. Como aquele assaltante que recebeu do funcionário da empresa a informação
privilegiada e sabe exatamente o horário em que o malote de pagamentos e depósitos será
encaminhado ao banco, assim como quem efetuará o transporte do mesmo.

O último vértice deste triângulo está centrado na oportunidade, e talvez seja esta a
possibilidade de evitar a fraude. Mesmo que um indivíduo repleto de más intenções tenha
motivos suficientes, a partir de seu próprio julgamento, e disponha de amplo conhecimento

7
http://www.gostodeler.com.br/materia/16240/o_triangulo_da_fraude.html

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do objeto do delito pretendido, ele jamais conseguirá consumar o fato se lhe faltar
oportunidade.

5. O que é corrupção?

Corrupção pode ser entendida como a promessa, oferecimento, pagamento ou autorização


de pagamento ou qualquer coisa de valor a funcionário público (ou não), direta ou
indiretamente com a finalidade de obter ou manter negócios, garantir uma vantagem indevida
ou obter favorecimentos.

O dicionário define corrupção como a “ação ou efeito de corromper, decomposição,


putrefação, depravação, desmoralização”9.

O exemplo mais comum e fácil de identificar com corrupção é o pagamento em dinheiro.


Porém há outras formas de subornar um funcionário público (ou não), como através de
brindes e presentes; entretenimento; doações para organizações não governamentais;
contribuições para partidos políticos; contratações de empresas ou indivíduos ligados ao
funcionário público (ou não); despesas de viagens; etc.

Abaixo seguem formas de corrupção entendidas pelo Guia de Avaliação de Riscos da


Organização das Nações Unidas (“ONU”).10

Formas de Corrupção – Guia de Avaliação de Riscos da ONU


Define-se por oferecer, prometer, dar, aceitar ou solicitar vantagem como
Suborno
forma de induzir uma ação, que é ilegal, antiética ou uma quebra de

8
http://www.usi.edu/internalaudit/what-is-fraud/
9
MICHAELES: Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, 2014.
10
http://ibdee.org.br/wp-content/uploads/2016/02/Guia-de-Avaliac%CC%A7a%CC%83o-de-Risco-de-
Corrupc%CC%A7a%CC%83o.pdf

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confiança por deixar de agir. Suborno pode ser uma vantagem indevida,
financeira ou em espécie, que pode ser paga diretamente ou através de
intermediários. A empresa deve levar em conta as formas mais prevalentes
de suborno na sua avaliação de risco, incluindo propinas, pagamentos de
facilitação, presentes, hospitalidade, despesas, contribuições políticas e
beneficentes, patrocínios e despesas promocionais.
Um conflito de interesse ocorre quando uma pessoa ou entidade com uma
obrigação com a empresa tem um interesse, obrigação ou compromisso
Conflito de conflitante. A existência de um conflito de interesse não caracteriza, por si
Interesses só, corrupção, mas ela pode surgir quando um diretor, funcionário ou
terceira parte contratada violar sua obrigação com a entidade, agindo em
favor de outros interesses.
Conluio pode ocorrer de várias formas, sendo as mais comuns são
Conluio
manipulação de propostas, cartéis e fixação de preços.
Trata-se de corrupção ligada ao movimento de funcionários de alto nível
de cargos do setor público para cargos do setor privado e vice-versa. As
principais preocupações são relativas à forma como a prática de uma
Porta giratória empresa pode comprometer a imparcialidade e integridade do cargo
público. Para empresas, pode haver riscos ao discutir ou prometer
emprego futuro para funcionários públicos ou usar antigos funcionários
públicos como membros de conselho, funcionários e consultores.
Favoritismo em que a pessoa é selecionada, independentemente de suas
Patronagem qualificações, mérito ou direito, a um emprego ou benefício, devido a
afiliações ou conexões.
Agenciamento Trata-se do agenciamento de informações corporativas confidenciais
de informação obtidas através de métodos ilegais.
ilegal
Uso de Transação de títulos feita quando a pessoa por trás da negociação tem
informações conhecimento de informações substanciais não públicas e está, então,
privilegiadas violando sua obrigação de manter confidencialidade de tal conhecimento.
Não pagamento de imposto para o governo de uma jurisdição onde o
Evasão fiscal referido imposto é devido por pessoa, empresa ou fundo fiduciário que
deve ser contribuinte naquela jurisdição.

5.1. Índice de Percepção da Corrupção

O índice de percepção da corrupção (Corruption Perceptions Index, “CPI”) da Transparência


Internacional é mundialmente conhecido pelas empresas e os governantes. O CPI apresenta
a percepção de corrupção de mais de 120 (cento e vinte) países, o que não representa a
quantidade de atos corruptos que acontecem em determinado país, pois como o próprio
nome diz é uma percepção da corrupção no local.

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Este índice é um balizador para as empresas fazerem negócios no mundo todo. Basta olhar
rapidamente para o mapa para perceber os países que possuem mais riscos ou estão mais
propícios para a corrupção.

Anualmente ele é divulgado pela TI com informações referentes ao ano anterior. Assim,
baseado em uma série de indicadores, o índice apresenta a percepção da corrupção nos
diferentes países.

Duas constatação são fundamentais: 1) países em que se opera regimes autoritários, em


que não há transparência dos dados públicos e controle social, os níveis de corrupção são
mais perceptíveis; 2) se comparado aos índices globais de desenvolvimento humano, os
países cuja corrupção é menos perceptível, possuem maior IDH.

Veja abaixo o mapa atualizado do índice de percepção da corrupção de 2018 (publicado em


2019).11

Como podem ser observados, os países com melhores notas (países mais amarelados do
mapa) são os países que possuem os menores índices de percepção da corrupção;
enquanto os países com as piores notas (países mais avermelhados do mapa) são os países
que possuem os maiores índices de percepção da corrupção.

A tabela abaixo apresenta a classificação atual de alguns países.12

Classificação País Nota


1 Dinamarca 88
2 Nova Zelândia 87

11
https://www.transparency.org/cpi2018
12
https://www.transparency.org/cpi2018

16

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3 Finlândia 85
11 Alemanha 80
22 Estados Unidos 71
23 Uruguai 70
27 Chile 67
85 Argentina 40
87 China 39
99 Colômbia 36
105 Brasil 35
105 Peru 35
176 Coréia do Norte 14
178 Síria 11
180 Somália 10

Por fim, vejamos a situação histórica do Brasil no IPC dos últimos anos.13

Ano Pontos Posição


2018 35 105º
2017 36 96º
2016 40 79º
2015 38 76º
2014 43 72º
2013 42 72º
2012 43 69º

6. Pilares de um Programa de Compliance

Antes da regulamentação da Lei Anticorrupção no Brasil, um Programa de Compliance para


ser considerado efetivo deveria se submeter aos parâmetros previstos no U.S Federal
Sentencing Guidelines Manual14. Dessa maneira, o programa poderia ser observador em 7
pilares fundamentais:

13
https://www.transparency.org/cpi2018
14
http://www.ussc.gov/guidelines

17

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No entanto, a partir da edição do Decreto n o. 8.420/2015, que regulamentou a Lei
Anticorrupção no âmbito federal, os parâmetros de efetividade de um Programa de
Compliance foi estabelecido em 16 pilares, descritos no seu artigo 42. No entanto, se
fizermos uma análise de comparativa entre ambas as metodologias, acabam por ser
correspondentes. Vejamos:

QUADRO COMPARATIVO
DEC. 8.420/2015 x U.S. SENTENCING

MECANISMOS PREVISTOS NO MECANISMOS PREVISTOS NO


ART. 42 DO DEC. 8.420/2015 U.S. SENTENCING GUIDELINES MANUAL

“I – comprometimento da alta direção da pessoa


SUPORTE DA ALTA
jurídica, incluídos os conselhos, evidenciado pelo
ADMINISTRAÇÃO
apoio visível e inequívoco ao programa;”
“II – padrões de conduta, código de ética, políticas e
POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
procedimentos de integridade, aplicáveis a todos os
CÓDIGO DE CONDUTA E
empregados e administradores, independentemente
CONTROLES INTERNOS
de cargo ou função exercidos;”
“III – padrões de conduta, código de ética e políticas
POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
de integridade estendidas, quando necessário, a
CÓDIGO DE CONDUTA E
terceiros, tais como, fornecedores, prestadores de
CONTROLES INTERNOS
serviço, agentes intermediários e associados;”
“IV – treinamentos periódicos sobre o programa de TREINAMENTO
integridade;” E COMUNICAÇÃO

18

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“V – análise periódica de riscos para realizar
adaptações necessárias ao programa de RISK ASSESSMENT
integridade;”
“VI – registros contábeis que reflitam de forma POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
completa e precisa as transações da pessoa CÓDIGO DE CONDUTA E
jurídica;” CONTROLES INTERNOS
“VII – controles internos que assegurem a pronta POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
elaboração e confiabilidade de relatórios e CÓDIGO DE CONDUTA E
demonstrações financeiros da pessoa jurídica;” CONTROLES INTERNOS
“VIII – procedimentos específicos para prevenir
POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
fraudes e ilícitos no âmbito de processos licitatórios,
CÓDIGO DE CONDUTA E
na execução de contratos administrativos ou em
CONTROLES INTERNOS
qualquer interação com o setor público, ainda que
(BASTA QUE A COMPANHIA TENHA UMA
intermediada por terceiros, tal como pagamento de
POLÍTICA ESPECÍFICA DE CONTRATAÇÃO
tributos, sujeição a fiscalizações, ou obtenção de
COMA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)
autorizações, licenças, permissões e certidões;”
“IX – independência, estrutura e autoridade da
instância interna responsável pela aplicação do
SUPORTE DA ALTA ADMINISTRAÇÃO
programa de integridade e fiscalização de seu
cumprimento;”
“X – canais de denúncia de irregularidades, abertos
e amplamente divulgados a funcionários e terceiros,
INVESTIGAÇÃO E REPORTE
e de mecanismos destinados à proteção de
denunciantes de boa-fé́ ;”
“XI – medidas disciplinares em caso de violação do
INVESTIGAÇÃO E REPORTE
programa de integridade;”
“XII – procedimentos que assegurem a pronta
interrupção de irregularidades ou infrações
MONITORAMENTO E AUDITORIA
detectadas e a tempestiva remediação dos danos
gerados;”
“XIII – diligências apropriadas para contratação e,
conforme o caso, supervisão, de terceiros, tais como,
DUE DILIGENCE
fornecedores, prestadores de serviço, agentes
intermediários e associados;”
“XIV – verificação, durante os processos de fusões,
aquisições e reestruturações societárias, do
cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da DUE DILIGENCE
existência de vulnerabilidades nas pessoas jurídicas
envolvidas;”
“XV – monitoramento contínuo do programa de
integridade visando seu aperfeiçoamento na
prevenção, detecção e combate à ocorrência dos MONITORAMENTO E AUDITORIA
atos lesivos previstos no artigo 5º da Lei nº 12.846,
de 2013;”
POLÍTICAS, PROCEDIMENTOS,
“XVI – transparência da pessoa jurídica quanto a
CÓDIGO DE CONDUTA E
doações para candidatos e partidos políticos.”
CONTROLES INTERNOS

19

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O Curso Online Anticorrupção da LEC abordará de forma específica e detalhada cada um
dos pilares mencionados, nos módulos 2 e 3. No entanto, metodologicamente, a LEC optou
por abordar o Programa de Compliance com nove pilares, conforme o e-book “Os Pilares do
Programa de Compliance” publicado pela LEC (disponível para download, gratuitamente, no
site da LEC).

COMBATE À CORRUPÇÃO NO MUNDO

A corrupção é um fenômeno que perpassa as fronteiras dos países, sendo um problema


existente em todo o mundo. As diferenças dos atos corruptos ao redor do globo encontram-
se na extensão e alcance.

De acordo com uma matéria publicada no site da BBC Brasil, em 03 de fevereiro de 2014,
por exemplo, a corrupção custa em torno de EUR 120 bilhões para a Europa por ano. 15 Além
disso, em 2013, o Banco Mundial calculou que as propinas pagas tanto nos países em
desenvolvimento como nos desenvolvidos atingiram em 2001-2002 a quantia de um trilhão
de dólares, 3% do PIB mundial.

Importante salientar que não é de hoje que os países e organizações internacionais atuam
no combate à corrupção. Como será verificado nos itens abaixo, diversas convenções
internacionais e leis de alcance extraterritorial já foram aprovadas e aplicadas visando punir
e minimizar os danos causados pela corrupção.

Antes de estudarmos a FCPA, a UKBA e a Lei Anticorrupção brasileira e suas implicações,


precisamente entender o contexto em que a construção e aplicação destas normas estão
inseridos.

7. Convenções Internacionais16

7.1. Convenção Interamericana contra a Corrupção da Organização dos Estados


Americanos

A Organização dos Estados Americanos17 (“OEA”) foi fundada em 1.948 com o objetivo de
alcançar uma ordem de paz e justiça, para promover a solidariedade, intensificar a
colaboração e defender a soberania, integridade e independência dos estados membros.
Hoje, a OEA congrega 35 (trinta e cinco) estados membros, dentre os quais está o Brasil.

15
http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/02/140203_europa_corrupcao_custos_fn
16
Este material é adicional em relação às aulas ministradas, com a finalidade de acrescentar aos alunos do
curso, ainda mais conhecimento sobre o tema. Aproveite a leitura.
17
http://www.oas.org/pt/

20

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A OEA possui 04 (quatro) pilares que se apoiam mutuamente com a finalidade de fortalecer
a cooperação entre os países do continente americano e proteger os interesses em comum.
Os pilares da organização são: democracia, direitos humanos, segurança e
desenvolvimento.

Assim, uma das medidas adotadas pela OEA, foi a criação da Convenção Interamericana
contra a Corrupção (“Convenção da OEA”), a qual foi o primeiro instrumento internacional de
combate a corrupção que dispunha de medidas preventivas e punitivas aos atos corruptos.

A Convenção da OEA tem como objetivo, através de cada um dos estados membros,
promover e fortalecer o desenvolvimento dos mecanismos necessários para prevenir,
detectar, punir e erradicar a corrupção. Além disso, a Convenção da OEA facilita e regula a
cooperação entre os estados membros para assegurar a eficácia das medidas adotadas no
combate contra a corrupção.

Ainda, os estados membros devem adaptar a legislação interna para possuírem, em seus
próprios sistemas institucionais, medidas preventivas que contribuam para a aplicação
efetiva da Convenção da OEA. As principais medidas preventivas são: (i) a criação,
manutenção e fortalecimento de normas de conduta para o correto, honrado e adequado
desempenho das funções públicas; (ii) o fortalecimento de mecanismos que estimulem a
participação da sociedade civil e de organizações não governamentais nos esforços para
prevenir a corrupção; e (iii) a instituição de sistemas de arrecadação fiscal que impeçam a
prática da corrupção.18

O Brasil aprovou a Convenção da OEA através do Decreto Legislativo n.º 152/2002 19 e do


Decreto Presidencial n.º 4.410/2002.20

7.2. Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos


Estrangeiros em Transações Comercais Internacionais da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico21 (“OCDE”), foi fundada


em 1.961 com o objetivo contribuir para o crescimento econômico e comercial mundial,
desenvolvendo o emprego e aumentando a estabilidade financeira. Hoje, a OCDE congrega
35 (trinta e cinco) estados membros ao redor do mundo.

18
http://www.cgu.gov.br/sobre/perguntas-frequentes/articulacao-internacional/convencao-da-oea#o-que-
representa
19
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/2002/decretolegislativo-152-25-junho-2002-459890-convencao-
1-pl.html
20
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4410.htm
21
http://www.oecd.org/about/

21

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A OCDE busca ajudar governos no mundo todo com a finalidade de restabelecer um sistema
de finanças públicas saudável que seja a base para um futuro sustentável de crescimento
econômico.

Assim, uma das medidas adotadas pela OCDE, foi a criação da Convenção sobre o Combate
da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comercias
(“Convenção da OCDE”), a qual foi promulgada em 1.977 sendo assinada por mais de 30
(trinta) países com todos os signatários se comprometendo a aprovarem suas próprias leis
de combate à corrupção. O Brasil foi um dos países signatários.

A Convenção da OCDE tem como objetivo obrigar os países signatários a adotarem


mecanismos para prevenção e punição da corrupção de funcionários públicos estrangeiros
nas transações comerciais internacionais. Além disso, a Convenção da OCDE também
determina a responsabilidade das empresas que corrompam funcionários públicos
estrangeiros, bem como a prestação de assistência jurídica recíproca entre os países
membros para assegurar a eficácia das medidas adotadas no combate contra a corrupção.

O Brasil aprovou a Convenção da OCDE através do Decreto Presidencial nº 3.678/2000.22

7.3. Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção

A Organização das Nações Unidas23 (“ONU”) foi fundada em 1.945 com o objetivo (i) manter
a paz e a segurança internacionais; (ii) desenvolver relações amistosas entre as nações; (iii)
realizar a cooperação internacional para resolver problemas mundiais de caráter econômico,
social, cultural e humanitário, promovendo o respeito aos direitos humanos e às liberdades
fundamentais; e (iv) ser um centro destinado a harmonizar a ação dos povos para a
consecução dos objetivos comuns. Hoje, a ONU possui 193 (cento e noventa e três) países
membros, dentre os quais está o Brasil.

A ONU possui como função: (i) administrar as forças da paz; (ii) analisar problemas
econômicos e sociais; (iii) preparar relatórios sobre meio ambiente ou direitos humanos; (iv)
sensibilizar a opinião pública internacional sobre o trabalho da ONU; (v) organizar
conferências internacionais; e (vi) traduzir todos os documentos oficiais da ONU nas línguas
oficiais da organização.

Assim, naturalmente o combate à corrupção é uma das atribuições da ONU em conjunto com
os países membros. A Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção24 (“Convenção
das Nações Unidas”) é posterior às Convenções da OEA e da OCDE, porém é a convenção
internacional mais abrangente sobre prevenção e combate à corrupção.

22
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/D3678.htm
23
https://nacoesunidas.org/conheca/
24
https://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/corrupcao/convencao.html

22

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A Convenção das Nações Unidas tem como objetivo promover e fortalecer as medidas para
prevenir e combater eficaz e eficientemente a corrupção, bem como facilitar e apoiar a
cooperação internacional e a assistência técnica na prevenção e na luta contra a corrupção,
incluindo a recuperação de ativos. Além disso, a Convenção das Nações Unidas também
promove a integridade, a obrigação de prestação de contas e gestão dos assuntos e bens
públicos.

Importante mencionar que a Convenção das Nações Unidas aborda também os temas de
recuperação de ativos e cooperação internacional. Ao todo, a Convenção das Nações Unidas
possui 08 (oito) capítulos, porém os principais são: (i) prevenção; (ii) penalização; (iii)
recuperação de ativos; e (iv) cooperação internacional. Esses capítulos que requerem
adaptações legislativas e/ou ações concomitantes à aplicação da convenção a cada país.

O Brasil aprovou a Convenção das Nações Unidas através do Decreto Legislativo nº.
348/200525 e do Decreto Presidencial nº. 5.687/2006.26

7.3.1. Penalização e Aplicação da Lei

No capítulo sobre penalização e aplicação da lei, a Convenção das Nações Unidas pede aos
países membros que introduzam em seus ordenamentos jurídicos tipificações criminais que
abranjam não apenas as formas básicas de corrupção, como o suborno e o desvio de
recursos públicos, mas também atos que contribuem para a corrupção, tais como obstrução
da justiça, tráfico de influência e lavagem de recursos provenientes da corrupção. A
penalização à corrupção é condicionada pela existência de mecanismos que permitam o
sistema de justiça criminal realizar ações de detenção, processo, punição e reparação ao
país.

Os países membros devem obrigatoriamente tipificar como crime: (i) o suborno a funcionários
públicos: (ii) a corrupção ativa a oficiais estrangeiros; (iii) a fraude e a apropriação indébita;
e (iv) a lavagem de dinheiro e a obstrução da justiça. Também devem, na medida do possível,
buscar tipificar as condutas de: (i) corrupção passiva de oficiais estrangeiros; (ii) tráfico de
influências; (iii) abuso de poder; (iv) enriquecimento ilícito; (v) suborno no setor privado; e (vi)
desvios de recursos no setor privado.

A Convenção das Nações Unidas orienta os países membros a considerar o suborno como
crime e o define como a promessa, a oferta ou a entrega, direta ou indiretamente, a um
servidor público ou outra pessoa ou entidade, de uma vantagem indevida, a fim de agir ou
de não agir no exercício de suas funções oficiais. Da mesma forma, quem solicita ou aceita
essas mesmas vantagens indevidas, também comete o crime de suborno.

25
http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decleg/2005/decretolegislativo-348-18-maio-2005-536880-convencao-
28439-pl.html
26
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/decreto/d5687.htm

23

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Os países membros devem estabelecer como crime, quando cometido intencionalmente: (i)
a fraude; e (ii) a apropriação indébita ou qualquer outro desvio de recursos por parte de
funcionário público, em seu benefício, ou em benefício de terceiros, de qualquer propriedade,
fundos públicos ou privados ou qualquer outra coisa de valor a ele confiada em virtude de
sua função. O mesmo se aplica aos atos de converter, transferir, ocultar ou dissimular
produtos oriundos do crime, e também a quem adquire, possui ou se utiliza desses produtos.

A Convenção das Nações Unidas também conta com um artigo que aborda a obstrução da
justiça: influenciar testemunhas em potencial em posição de prover evidências, por meio do
uso da força, de ameaças ou intimidação; e interferir no exercício da função de oficiais ou
membros da justiça pelos mesmos meios.

7.3.2. Recuperação de Ativos

A recuperação de ativos é uma importante inovação e um princípio fundamental da


Convenção das Nações Unidas. Os países membros devem apoiar-se entre si com extensas
medidas de cooperação e assistência neste campo, a fim de fazer valer os interesses das
vítimas e dos donos legítimos desses recursos.

Os países membros devem solicitar suas instituições financeiras a: (i) verificar a identidade
de seus clientes; (ii) determinar a identidade de beneficiários de contas volumosas; (iii)
aplicar controle reforçado a contas mantidas por altos funcionários públicos; (iv) reportar
transações suspeitas às autoridades competentes; e (v) prevenir o estabelecimento de
bancos sem presença física.

Um artigo sobre recuperação direta foca na possibilidade de os países membros terem um


regime que permita a outro país membro iniciar um processo civil para a recuperação de
ativos ou para intervir ou agir no processo doméstico para reforçar seu pedido por
compensação. Dessa forma, os países membros podem iniciar uma ação civil nas cortes de
outra parte para estabelecer direito à propriedade de bens adquiridos por meio de corrupção.
E os tribunais devem poder ordenar culpados por corrupção a ressarcir outro país membro,
e reconhecer, em decisões de confisco, pedido de outra parte como legítima dona dos bens.
A vantagem do processo civil se mostra útil quando o processo criminal não é possível, pois
a morte ou ausência do suspeito permite o estabelecimento de culpa com base nos padrões
civis, com diferentes procedimentos processuais.

Os países membros devem permitir que suas autoridades cumpram uma ordem de confisco
ou de congelamento por um tribunal de outro país membro solicitante. Da mesma forma,
devem considerar medidas que permitam o confisco, mesmo sem uma condenação no
âmbito criminal, quando o acusado não pode ser mais processado por conta de sua morte
ou ausência.

Como princípio geral, os países membros devem alienar os bens confiscados, devolvendo-
os a seus legítimos donos, tanto no que se relaciona à fraude e ao desvio de recursos
públicos, quanto à lavagem de recursos obtidos ilegalmente. Para outros crimes de

24

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corrupção, os mesmos procedimentos devem ser adotados, quando for razoavelmente
estabelecida a legitimidade do dono. Em todos os outros casos, será dada prioridade ao
retorno dos bens confiscados à parte solicitante, o retorno dos bens aos legítimos donos, ou
a utilização para a compensação das vítimas.

7.3.3. Cooperação Internacional

O capítulo sobre cooperação internacional enfatiza que todos os aspectos dos esforços
anticorrupção necessitam de cooperação internacional, tais como assistência legal mútua na
coleta e transferência de evidências, nos processos de extradição, e ações conjuntas de
investigação, rastreamento, congelamento de bens, apreensão e confisco de produtos da
corrupção.

A Convenção das Nações Unidas inova em relação a tratados anteriores ao permitir


assistência legal mútua mesmo na ausência de dupla incriminação, quando não envolver
medidas coercitivas. O princípio da dupla incriminação prevê que um país não necessita
extraditar pessoas que cometeram atos que não são considerados crimes em seu território.
Mas a partir da Convenção das Nações Unidas, esses requisitos se tornam mais maleáveis,
pois a Convenção das Nações Unidas prevê que mesmo crimes que não são definidos com
os mesmos termos ou categoria podem ser considerados como equivalentes, possibilitando
a extradição.

A extradição deve ser garantida nos casos de crimes citados pela Convenção das Nações
Unidas, e quando os requisitos de dupla incriminação são preenchidos. Os países membros
não devem considerar os crimes de corrupção como crimes políticos. E os estados que
condicionam a extradição à existência de acordos podem usar a Convenção das Nações
Unidas como base legal. Se um país não extradita nacionais, deve usar o pedido do outro
país como fundamento para um processo interno. Além disso, a Convenção das Nações
Unidas prevê que os países membros busquem harmonizar suas leis nacionais aos tratados
existentes.

Os países membros podem recusar o pedido de extradição se for observada perseguição


por gênero, raça, religião, nacionalidade, etnia ou opiniões políticas. Em todo o caso, ainda
que não seja obrigatório, a Convenção das Nações Unidas recomenda uma consulta ao país
solicitante antes de uma recusa, a fim de possibilitar a apresentação de informações
adicionais que possam levar a um resultado diferente.

A Convenção das Nações Unidas prevê medidas mais amplas de assistência legal mútua
em investigações, processo e procedimentos legais em relação a crimes previstos na própria
Convenção das Nações Unidas. Entre essas medidas, destacam-se a (i) designação de uma
autoridade central para receber, executar e transmitir pedidos de assistência legal mútua; (ii)
a vedação à recusa de assistência legal mútua com base no sigilo bancário; e (iii) a
possibilidade de a assistência legal mútua ser ofertada na ausência de dupla criminalização,
desde que não haja medidas coercitivas.

25

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Os países membros deverão cooperar entre si para aumentar a eficácia da aplicação da lei
e estabelecer canais de comunicação para assegurar o intercâmbio rápido de informações
sobre todos os aspectos dos crimes abrangidos pela Convenção das Nações Unidas.

Também devem considerar a celebração de acordos bilaterais ou multilaterais que permitam


a criação de órgãos mistos de investigação em relação às matérias que são objeto de
investigações, processos ou ações judiciais em um ou mais países.

Além disso, os países devem permitir a utilização de técnicas especiais de investigação, tais
como a vigilância eletrônica e outras formas de operações sigilosas, além de permitir a
admissibilidade das provas obtidas por meio dessas técnicas nos tribunais.

7.3.4. Conferência dos Países membros da Convenção das Nações Unidas27

Como guardião da Convenção das Nações Unidas, o Escritório das Nações Unidas sobre
Drogas e Crimes (“UNODC”) atua no sentido de: (i) promover a ratificação da convenção; (ii)
prover assistência técnica; (iii) apoiar a realização de conferências dos Países membros; (iv)
promover a implementação efetiva e eficiente da convenção; (v) assistir os Países membros
no cumprimento integral da convenção; e (vi) facilitar a ratificação universal da Convenção
das Nações Unidas.

Por iniciativa do UNODC, em novembro de 2009, mais de 1.000 delegados de 125 países se
reuniram em Doha, no Catar, para examinar a implementação da Convenção das Nações
Unidas. O principal resultado obtido foi a criação de um mecanismo de monitoramento da
implementação da convenção. Pelo acordo, todos os Países membros serão monitorados a
cada cinco anos, com o intuito de se avaliar como estão cumprindo suas obrigações.

Os resultados dessas avaliações, baseadas em processos de autoavaliação e em visitas de


especialistas internacionais, serão compilados em relatórios de revisão por país. Assim, os
Países membros passarão a ser julgados pelo que estão efetivamente fazendo contra a
corrupção e não apenas por suas promessas.

Além disso, essa avaliação mostrará as lacunas existentes em cada país e, assim, guiará a
atuação do UNODC em termos de cooperação técnica.

8. Organizações Internacionais

Além das organizações mencionadas acima, há também diversas outras organizações


nacionais e internacionais que também atuam no combate à corrupção, apesar de não
possuírem convenções com força de lei que vinculem seus membros.

Na tabela abaixo constam algumas dessas organizações, as quais possuem materiais sobre
o tema.

27
https://www.unodc.org/lpo-brazil/pt/corrupcao/convencao.html

26

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Organização Web Site
Instituto Ethos de Responsabilidade
www.ethos.org.br
Social
SCCE Society of Corp. and Ethics www.corporatecompliance.org
Global Compliance www.globalcompliance.com
Ethics World www.ethicsworld.com
Compliance Certification Board –
www.compliancecertification.org
SCCE
Global Compact www.unglobalcompact.org
Alliance for Integrity www.allianceforintegrity.org

Além dessas organizações, existe ainda a organização não governamental Transparência


Internacional28 (“TI”) sediada em Berlim cuja principal finalidade é a luta contra a corrupção.
A TI é organização responsável pelo índice de percepção da corrupção.

As prioridades da TI na luta contra à corrupção são: (i) corrupção política; (ii) corrupção em
contratos internacionais; (iii) corrupção no setor privado; (iv) convenções internacionais para
prevenir a corrupção; e (v) pobreza e desenvolvimento.

9. Legislação Anticorrupção Estrangeira

A legislação anticorrupção, nacional e estrangeira, é o resultado de um conjunto de leis,


normas e convenções que foram criadas a partir das convenções acima mencionadas e do
Foreign Corrupt Practices Act (em tradução livre, Lei sobre Práticas de Corrupção no
Exterior) em 1.977 com a finalidade de combater a corrupção nos negócios no exterior.

As Convenções da OEA, OCDE e das Nações Unidas, em conjunto com o FCPA e demais
leis anticorrupção internacionais visam alcance extraterritorial e possuem a finalidade de
punir empresas e indivíduos pelas práticas de atos corruptos em qualquer lugar do mundo,
incluindo o Brasil.

9.1. Foreign Corrupt Practices Act

O Foreign Corrupt Practices Act 29 (“FCPA”) foi a primeira lei anticorrupção estrangeira
aprovada. A promulgação do FCPA ocorreu após investigações das autoridades norte-
americanas que verificaram que as grandes empresas mantinham fundos offshore e
pagavam propinas para garantir negócios fora dos Estados Unidos no caso famoso
Watergate. Em complemento ao FCPA, as autoridades norte-americanas disponibilizam um
guia que auxilia na compreensão das disposições do FCPA e implementação do programa

28
https://www.transparency.org/
29
https://www.justice.gov/sites/default/files/criminal-fraud/legacy/2012/11/14/fcpa-portuguese.pdf

27

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de compliance, nos termos exigidos pela lei norte-americana. Referido guia se chama A
Resource Guide to the U.S. Foreign Corrupt Practices Act (“FCPA Guide”).30

As investigações revelaram doações corporativas para fins políticos que revelaram um


grande esquema de pagamentos a funcionários públicos estrangeiros. Além disso, as
investigações do caso Watergate resultaram na renúncia do presidente Richard Nixon que
estava ciente das operações ilegais e das negociações escusas que aconteciam em seu
governo.

Assim, o congresso norte-americano aprovou a lei que combate o pagamento de propina no


exterior, ou seja, fora dos Estados Unidos.

Um aspecto histórico interessante é o famoso caso da Enron Corporation (“Enron”). A Enron


foi uma empresa norte-americana do setor de energia que foi alvo de denúncias de fraudes
contábeis e fiscais. A empresa estava com uma dívida bilhões de dólares, porém esta dívida
não aparecia em seus registros contábeis.

Em dezembro de 2001, a Enron pediu falência e levou consigo a empresa Arthur Anderson,
empresa de auditoria responsável por auditar as demonstrações financeiras da Enron. A
Enron manipulou seus balaços e inflou artificialmente seus lucros por dois anos com a ajuda
da Arthur Anderson e de diversos bancos. A dívida da Enron estava em torno de USD 25
bilhões.

As autoridades norte-americanas conduziram diversas investigações criminais contra os


executivos da Enron e da Arthur Anderson. Ambas as empresas fecharam e em razão deste
escândalo financeiro, e de muitos outros que também aconteceram, os Estados Unidos
aprovaram a Lei Sarbanes-Oxley.

9.1.1. Atos penalizados pelo FCPA

O FCPA é divido em dois capítulos: (i) anticorrupção; e (ii) registros contábeis e controles
internos.

As disposições anticorrupção penalizam os atos de prometer, oferecer, pagar ou autorizar


pagamento ou qualquer coisa de valor para funcionários públicos estrangeiros com a
finalidade de obter ou manter negócios ou adquirir qualquer vantagem indevida. Como
qualquer coisa de valor entende-se brindes, presentes, entretenimento, doações, favores,
etc.

As disposições de registros contábeis penalizam a fraude nos livros e registros das


empresas, bem como a ausência de controles internos que assegurem a confiabilidade das
transações.

30
https://www.justice.gov/sites/default/files/criminal-fraud/legacy/2015/01/16/guide.pdf

28

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Importante mencionar que os atos ilícitos são punidos cumulativamente, ou seja, as penas
são aplicadas por cada ato ilícito praticado.

9.1.2. Quem pode ser penalizado?

O FCPA se aplica aos (i) issuers; (ii) domestic concerns; e (iii) foreign nationals and entities
(“other persons”). De modo geral, o FCPA se aplica a qualquer um que seja considerado
norte-americano, pessoa física ou jurídica, bem com as empresas que possuem seus papéis
negociados na bolsa de valores de Nova Iorque ou a qualquer um que de alguma forma
tenha conduzido seus negócios sob a jurisdição norte-americana.

O FCPA é atualmente conhecido e temido por executivos do mundo todo por conta da sua
ampla jurisdição. O alcance do FCPA é extraterritorial, logo, as autoridades norte-americanas
podem investigar e punir fatos que ocorreram fora dos Estados Unidos, mas que de alguma
forma estão sob sua jurisdição.

9.1.3. Autoridades competentes

As autoridades norte-americanas que têm competência para punir no âmbito do FCPA são:
(i) Department of Justice (“DOJ”); e (ii) U.S. Securities and Exchange Commission (“SEC”).

O DOJ apura os atos das disposições anticorrupção e a SEC apura os atos das disposições
de registros contábeis e controles internos. As sanções são cíveis e penais. Vale mencionar
que as penalidades aplicadas pela SEC são maiores que as penalidades aplicadas pelo DOJ.

9.1.4. Casos emblemáticos

O FCPA, por estar em vigor há mais de 30 anos, possui diversos casos emblemáticos que
demonstram a sua forte atuação com empresas e indivíduos no mundo todo.

Atualmente o caso mais emblemático, talvez por ser o caso de aplicação da maior multa da
história do FCPA até hoje, é o caso da Siemens. A empresa de origem alemã utilizava um
sistema mundial de corrupção pelo qual fazia pagamentos ilícitos. O modelo de negócios da
Siemens funcionava através destes pagamentos ilícitos.

Dentre outras atividades, a Siemens falsificava contratos e emitia faturas simbólicas para
esconder a real natureza dos pagamentos ilícitos. A Siemens foi condenada nos Estados
Unidos e na Alemanha e no acordo celebrado com as autoridades norte-americanas pagou
uma multa de USD 800 milhões. A multa aplicada pelas autoridades alemãs também foi de
USD 800 milhões. Além disso, a Siemens foi obrigada a contratar um monitor de compliance
independente por quatro anos.

Outro caso emblemático de aplicação do FCPA é o caso do banco Morgan Stanley. Este
caso ficou famoso não por conta da aplicação de uma multa altíssima, mas justamente
porque a empresa não foi penalizada.

29

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Neste caso, o ex-Diretor Geral Garth Peterson do banco foi condenado pelo pagamento de
propinas a funcionários públicos chinês a título de comissão. O Morgan Stanley conseguiu
provar que o executivo foi treinamento presencialmente diversas vezes sobre a legislação
anticorrupção e as normas de compliance da empresa.

Assim, o DOJ e a SEC não responsabilizaram o banco pela conduta ilícita do executivo por
conta do programa de compliance robusto que o Morgan Stanley possuía. Garth Peterson
foi condenado a nove meses de prisão, ao pagamento de multa de USD 250 mil e foi proibido
de trabalhar em instituições financeiras reguladas pela SEC.

O caso do Morgan Stanley é uma exceção dentro os diversos casos de aplicação do FCPA,
pois a lei anticorrupção norte-americana é conhecida e temida no mundo todo por conta das
altas multas que são impostas.

Além dos casos da Siemens e do Morgan Stanley, é importante mencionar os casos da


Odebrecht e da Braskem que foram recentemente penalizadas no âmbito do FCPA. Ainda,
a Braskem foi penalizada a contratar um monitor de compliance que acompanhará as
atividades da empresa e implementação do programa e compliance pelos próximos anos.

Abaixo, as dez maiores multas do FCPA. 31

Empresa País/Origem Multa (USD) Ano

1. Petróleo Brasileiro S.A. – Petrobras Brasil 1,78 bilhões 2018

2. Telia Company AB Suécia 965 milhões 2017

3. MTS Rússia 850 milhões 2019

4. Siemens Alemanha 800 milhões 2008

5. VimpelCom Holanda 795 milhões 2016

6. Alstom França 772 milhões 2014

7. Société Générale S.A. França 585 milhões 2018

8. KBR/ Halliburton EUA 579 milhões 2009

9. Teva Pharmaceutical Israel 519 milhões 2016

10. Keppel Offshore & Marine Ltd. Singapura 422 milhões 2017
*Odebrecht / Braskem appeared on the Top Ten list in late 2016 but were removed in April
2017 after the DOJ reduced their overall penalties based on "ability to pay."

31
Fonte: http://www.fcpablog.com/blog/2019/3/11/with-mts-in-the-new-top-ten-just-one-us-company-
remains.html

30

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9.1.5. Empresas sob investigação

Abaixo a atual lista de empresas sob investigação das autoridades norte-americanas, bem
como a contagem por país de tais empresas demonstrando que há empresas de diversas
nacionalidades. Lembrando que apenas estão relacionadas aquelas companhias que se
declararam investigadas (geralmente com informação no balanço contábil). Podem existir
várias outras empresas sob investigações sigilosas.

Importante destacar que, a partir de 2017 a referida listagem parou de ser publicada, o que
impede a atualização.

Lista das empresas sob investigações das autoridades norte-americanas (SEC e do


DOJ), atualizada em abril de 201732
1. ABB Ltd. 43. Kimco Realty Corporation
2. ABM Industries Incorporated 44. Kinross Gold Corporation
3. Aegerion Pharmaceuticals Inc 45. Laureate Education Inc
4. Affinia Group Intermediate Holdings Inc 46. Lennox International Inc
5. Alere Inc 47. LM Ericsson Telephone Company
6. Alexion Pharmaceuticals Inc 48. McDermott International Inc
7. Amaya Inc 49. Microsoft Corporation
8. Barclays PLC 50. Millicom International Cellular as
9. Beam Inc 51. Misonix Inc
10 Bilfinger SE 52. Mobile Telesystems PJSC
11. Brookfield Asset Management Inc 53. MTS Systems Corporation
12. Cardno Limited 54. NCR Corporation
13. CEMEX SAB de CV 55. Net 1 UEPS Technologies Inc
Centrais Elétricas Brasileira–SA -
14. 56. NewMarket Corporation
Eletrobrás
15. Citigroup Inc 57. Newmont Mining Corporation
16. Cobalt International Energy Inc 58. Noble Corporation PLC
Cognizant Technology Solutions
17. 59. Novartis International AG
Corporation
18. Core Laboratories NV 60. Panasonic Avionics Corporation
19. Crawford & Company 61. PAR Technology Corporation
20. Delphi Automotive PLC 62. Park-Ohio Industries Inc
21. Deutsche Bank AG 63. Petrofac PLC
22. The Dun & Bradstreet Corporation 64. Petróleo Brasileiro–SA - Petrobras
Platform Specialty Products
23. Elbit Imaging Ltd 65.
Corporation
24. Eni SpA 66. Quad/Graphics Inc

32
http://www.fcpablog.com/blog/2017/4/6/the-corporate-investigations-list-april-2017.html

31

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25. Ensco PLC 67. Rio Tinto PLC
26. Exterran Corporation 68. Roust Corporation
27. Flowserve Corporation 69. Sanasi SA
28. FMC Technologies Inc 70. SBM Offshore NV
29.’Frank's International NV 71. Sensata Technologies Holding NV
30. Fresenius Medical Care AG & Co KGaA 72. Sevan Marine ASA
31. Goldman Sachs Group Inc 73. SL Industries Inc
32. Halliburton Company 74. Sweett Group PLC
33. Herbalife Ltd 75. Tata Communications Limited
34. Herc Holdings Inc 76. Teasnip SA
35. Hertz Global Holdings Inc 77. Telasónica SA
36. Hines Interests Limited Partnership 78. TeliaSonera AB
37. HSBC Holdings PLC 79. Transocean Ltd
International Business Machines
38. 80. Unaoil SAM
Corporation
39. iRhythm Technologies Inc 81. United Technologies Corporation
40. Juniper Networks Inc 82. USANA Health Sciences Inc
41. KBR Inc 83. Vantage Drilling Company
42. Keppel Corporation Limited 84. Wal-Mart Stores Inc
85 Wynn Resorts Limited -

9.1.6. TOP 15 dos países listados com empresas sob investigação sobre
violações da FCPA, excluindo empresas americanas.

Das mais de 120 empresas que divulgaram ser alvo de investigações em curso por violações
da FCPA, 85 nomearam pelo menos um país de atuação. Algumas empresas nomeiam mais
de um país e alguns nomeiam nenhum.

Importante destacar que, a partir de 2017 a referida listagem parou de ser publicada, o que
impede a atualização.

Contagem por país das empresas sob investigações das autoridades


norte-americanas (SEC e do DOJ), atualizada em outubro de 201733
1. Brasil (37)
2. China (16)
3. Peru (4)
4. Colômbia (3)
5. Índia (3)

33
http://www.fcpablog.com/blog/2017/10/9/the-top-15-countries-named-in-fcpa-related-disclosures.html

32

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6. México (3)
7. Rússia (3)
8. Turquia (3)
9. Angola (2)
10 Itália (2)
11. Cazaquistão (2)
12. Moçambique (2)
13. Polônia (2)
14. Coreia do Sul (2)
15. Ucrânia (2)

9.2. U.K. Bribery Act

O Reino Unido, como diversos outros países, assinou a Convenção contra a corrupção da
OCDE se comprometendo a promulgar uma lei específica no combate à corrupção de
funcionário públicos estrangeiros. Assim, em 2010, o U.K. Bribery Act 34 (“UKBA”) foi
promulgado.
Assim como o FCPA, o UKBA também dispõe sobre elementos do programa de compliance.
De acordo como UKBA, os elementos que serão analisados e/ou devem ser implementados
por uma empresa são: (i) procedimentos proporcionais ao risco de envolvimento em atos de
corrupção, tamanho, escala e complexidade de suas atividades; (ii) comprometimento da alta
administração; (iii) avaliação de riscos; (iv) due diligence de terceiros; (v) comunicação e
treinamento; e (vi) monitoramento e revisão periódica das políticas e procedimentos.
9.2.1. Atos penalizados pelo UKBA

O UKBA penaliza (i) o suborno de indivíduos funcionários públicos ou não; (ii) o indivíduo
que aceita ser subornado; (iii) o indivíduo que desempenha inadequadamente atividade
relacionada ao suborno; e (iv) as empresas que falham em prevenir a prática corrupta.

Assim, é importante notar que o UKBA inovou ao penalizar também a chamada “corrupção
corporativa”, conhecida ainda como “bola” e “kickback”.

9.2.2. Autoridades competentes

Diferente dos Estados Unidos, o Reino Unido estabeleceu apenas uma autoridade
responsável por investigar e aplicar as disposições do UKBA, o Serious Fraud Office.
9.2.3. Quem pode ser penalizado?

O UKBA se aplica aos (i) cidadãos ou residentes do Reino Unido; (ii) cidadãos do território
britânico; (iii) indivíduos considerados cidadão britânico, de acordo com as leis do Reino

34
https://www.justice.gov.uk/downloads/legislation/bribery-act-2010-guidance.pdf

33

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Unido; (iv) pessoas jurídicas constituídas sob as leis de qualquer um dos países do Reino
Unido; e (v) sociedade escocesa de pessoas.

Assim como o FCPA, o UKBA também possui alcance extraterritorial podendo punir
indivíduos considerados cidadãos do Reino Unido ainda que fora do país.
9.2.4. Casos emblemáticos

O UKBA não possui, ainda, tantos casos emblemáticos como o FCPA. Porém é válido
mencionar a condenação de dois executivos, Gary Lloy West e Stuart John Stone, por terem
utilizado dinheiro de investidores para a compra de carros esportivos de luxo, incluindo Aston
Martins e Bentleys.

COMBATE À CORRUPÇÃO NA AMÉRICA LATINA

As causas da corrupção no Brasil estão relacionadas com as mesmas causas apresentadas


em outros países da América Latina.

As raízes da corrupção se repetem na maior parte dos países da América Latina, pois são
países que foram fortemente explorados na época colonização; sofreram ditadura política;
possuem uma economia frágil e com presença excessiva do Estado; possuem governos que
não possuem transparência em suas ações; e sofrem com o excesso de burocracia.

Este cenário somado a tolerância da população e a certeza da impunidade proporcionam


atos constantes de corrupção. Só no Brasil, por exemplo, estima-se que a corrupção
consome 2.3% do Produto Interno Bruto – PIB anual que é torno de R$ 95 bilhões por ano,
conforme apresentado por uma matéria no Jornal Valor Econômico em 29 de maio de 2012. 35

O problema da corrupção na América Latina e no Brasil também pode ser observado a partir
de alguns casos de aplicação do FCPA, conforme tabela abaixo.

Empresa Ano
Baker Hughes 2001
Biomet 2012
Bizjet 2012
Bridgestone Corporation 2008
Control Components 2008
Control Systems Specialist 1998
Eli Lilly 2012

35
http://www.valor.com.br/especiais/2679858/crescimento-precisa-incluir-questao-etica-e-
transparencia#ixzz1wRlqMGHY

34

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Internacional Materials Solution 1999
Nature`s Sunshine Products 2009
Odebrecht/ Braskem 2016
Orthofix 2012
Panalpina 2010
Ralph Lauren 2013
Stryker 2013
Tyco Internacional 2006

Além disso, existem também as atitudes antiéticas que são chamadas de pequenas
corrupções. As pequenas corrupções são atos praticados em desconformidade com a
legalidade, ética, integridade e transparência. Muitas vezes, o indivíduo nem percebe que
aquela ação está em desconformidade com a lei; ou o indivíduo até sabe que aquela ação é
contrária à lei, mas a certeza da impunidade faz com o que o ato seja praticado naturalmente.

Alguns exemplos que podem ser citados são: falsificar carteirinha de estudante, apresentar
atestado médico falso, aceitar troco errado, roubar TV a cabo, comprar produtos falsificados,
colar na prova, não dar nota fiscal, bater ponto pelo colega de trabalho, etc.

10. Legislação Anticorrupção na América Latina36

10.1. Argentina

Apesar de ser um dos países com maior importância na América Latina e ser signatária das
principais convenções e tradados internacionais, a Argentina ainda não possui uma lei que
vise coibir o pagamento de suborno para funcionários públicos locais e estrangeiros.

Esta é a principal crítica da OCDE em relação ao país que vem tardando demasiadamente
para construir esta legislação.37

Os fatos puníveis hoje em dia na Argentina são (i) o oferecimento/pagamento; e (ii) o


recebimento de suborno por agentes públicos realizado por indivíduos. A pena é de 01 a 6
anos de prisão.

36
Este material é adicional em relação às aulas ministradas, com a finalidade de acrescentar aos alunos do
curso, ainda mais conhecimento sobre o tema. Aproveite a leitura.
37
http://www.oecd.org/countries/argentina/argentina-must-seize-chance-to-fight-corruption.htm

35

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A Argentina considera a agente público “qualquer pessoa que temporária ou
permanentemente desenvolva funções públicas, seja como resultado de uma eleição ou por
nomeação por uma autoridade competente”.

Nas últimas décadas o reflexo deste insuficiente arcabouço legislativo anticorrupção ficou
evidente com o grande número de investigações envolvendo o país. O caso Siemens
demonstrou o elevado grau de corrupção dentro do Governo Memen e sucessores, tendo a
companhia pago por volta de USD 100 milhões em propinas para diversos níveis de
governantes, de acordo com o relatório expedido pelas autoridades.38

No caso das empresas Ball Corporation e Ralph Lauren, por exemplo, as práticas de suborno
envolviam funcionários responsáveis por fiscalizar importação de produtos e aduana,
respectivamente. No caso Ralph Lauren, a companhia acabou não sendo processada, mas
precisou pagar cerca de USD 1,6 milhões em multas e penalidades relativas ao suborno de
oficiais ocorrido entre os anos de 2005 a 2009.

Neste caso, o ponto interessante foi a colaboração extrema da Ralph Lauren, que chegou a
traduzir todos os documentos em espanhol, oferecendo às agências norte-americanas uma
visibilidade completa sobre as suas falhas de conduta.39

O depoimento da SEC é claro ao apontar está coperação: "When they found a problem,
Ralph Lauren Corporation did the right thing by immediately reporting it to the SEC and
providing exceptional assistance in our investigation," disse George S. Canellos, Acting
Director ’f the SEC's Division of Enforcement. "The NPA in this matter makes clear that we
will confer substantial and tangible benefits on companies that respond appropriately to
violations and cooperate fully with the SEC”.

De acordo com a TI,40 a corrupção na Argentina é um dos maiores desafios atualmente


enfrentados pelo país. Estima-se que a corrupção custou à economia argentina USD 6,2
bilhões entre 1990-2013.

O impacto social e econômico da corrupção no país é enorme, afetando especialmente a


qualidade e eficiência dos serviços públicos, como educação, saúde e transporte. O ex-
presidente Mauricio Macri, disse em seu discurso de posse que ele "será implacável com a
corrupção". Ele fez da luta contra a corrupção uma prioridade para sua administração. A fim
de cumprir esta promessa do novo governo, Mauricio Macri teve a oportunidade de
implementar leis e reformas para melhorar a transparência, prestação de contas e supervisão
das instituições públicas, mas de fato, isso não ocorreu.

38
https://www.sec.gov/news/press/2008/2008-294.htm
39
http://www.sec.gov/News/PressRelease/Detail/PressRelease/1365171514780
40
http://www.transparency.org/news/feature/a_transparency_agenda_for_argentina

36

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10.2. Chile

O Chile pode se orgulhar de ser um dos únicos países da América Latina com um índice
percepção de corrupção considerado saudável. De acordo com o CPI de 2015, o Chile está
na 23ª, de 168 países, tendo atingido uma nota 70/100.41

Enquanto outros países da região, como o Brasil, Argentina e Peru relutaram em estabelecer
a responsabilidade penal pelos atos corruptos das pessoas jurídicas, o Chile caminhou em
sentido contrário. O Congresso aprovou a Lei de Responsabilidade Criminal Corporativa (Ley
20.392), em 2009, que se aplica a (i) suborno de funcionários públicos nacionais e
estrangeiros; (ii) lavagem de dinheiro; e (iii) financiamento do terrorismo.

As empresas condenadas nos termos da lei poderão (i) ser multadas com mínimo de USD
14 mil e o máximo de USD 700 mil; (ii) estar sujeitas a dissolução compulsória; (iii) a proibição
de celebrar contratos com a administração pública; e (iv) perder o direito de receber
subsídios.

Curiosamente, no caso de suborno, a legislação chilena não atribui responsabilidade penal


as empresas com base em uma teoria de que a empresa dolosamente realizou um ato
criminoso, mas que teria deixado de implementar os controles necessários para a prevenção
dos delitos.

Outro ponto interessante é a concessão de crédito para as empresas que possuem um


programa de compliance. De acordo com dados extraoficiais, cerca de 25% das empresas
do país hoje em dia são certificadas em compliance e esta certificação é outorgada por
empresas listadas pelo governo.42

Entretanto, não está claro o alcance da certificação (se a certificação transfere o ônus ao
governo em provar que a empresa não cumpriu os parâmetros estabelecidos) e a sua
necessidade real em caso de uma empresa não certificada possuir os controles devidos.
Neste último caso, é possível crer que uma empresa que não possua a certificação oficial,
porém possua um programa de compliance robusto e eficiente e consiga provar isto ao
governo, poderia se valer dos créditos mencionados na lei.

A Lei de Responsabilidade Criminal Corporativa traz, ainda, dispositivos interessantes em


relação aos acordos de leniência, os quais são permitidos pela nova legislação.

Em abril de 2016, as autoridades chilenas celebraram um acordo de leniência com a empresa


Indústrias Ceresita no montante de USD 2,5 milhões, em razão de pagamentos para
funcionários públicos para obtenção de licenças de construção para instalações industriais.

41
https://www.transparency.org/country/#CHL
42
http://www.svs.cl/sitio/mercados/otra_inscripciones_ent_certificadoras_modelos_prevencion_de_delitos.php

37

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Este é o acordo mais significativo celebrado desde que a Lei de Responsabilidade Criminal
Corporativa entrou em vigor estabelecendo a responsabilidade criminal das empresas. 43

10.3. Colômbia

O panorama anticorrupção da Colômbia é bastante interessante, uma vez que o país sofreu
demasiadamente nos anos 90 com o narcotráfico e grupos armados, como a Forças
Armadas Revolucionárias da Colômbia – FARC. Entretanto, nos últimos anos, devido
principalmente aos investimentos do governo para fortalecer a economia e o comercio
internacional, a Colômbia vem se solidificando como um dos países que mais recebem
investimento estrangeiro na América Latina, sendo considerado um dos países mais estáveis
politicamente nos dias de hoje.

Além disso, a Colômbia também é signatária das convenções contra a corrupção da ONU,
da OCDE e da OEA.

O presidente, Juan Manoel Santos, aprovou em julho de 2011 uma lei anticorrupção, a qual
é uma política abrangente que fornece novas ferramentas para extirpar corrupção e penas
mais severas para os culpados. O objetivo da lei é criar uma maior responsabilização e
transparência na contratação de obras públicas. As reformas governamentais criminalizam
(i) a extorsão; (ii) a corrupção ativa e passiva; (iii) o suborno estrangeiro; (iv) a corrupção
política; (v) a negociação com informações confidenciais de estado; e (vi) a lavagem de
dinheiro.

Qualquer pessoa que faça um pagamento indevido ou dá qualquer outra vantagem indevida,
seja em dinheiro ou em qualquer outra forma, a um funcionário público com a finalidade de
obter ou manter negócios pode ser penalizado com (i) multa de até USD 30.000; (ii) pena de
03 – 06 anos de prisão; (iii) proibição de executar contratos com o governo por um período
igual aos anos de prisão; e (iv) uma proibição de concorrer a cargos públicos por um período
igual aos anos de prisão.

Importante mencionar que em 02 de fevereiro de 2016, a Colômbia aprovou a Lei n.º 1.778,
a qual é conhecida como Lei Transacional de Combate à Corrupção (“TCA”). A TCA é a
primeira lei colombiana que visa punir os atos de corrupção praticados no exterior. Referida
lei ajuda a Colômbia a cumprir seus compromissos perante a OCDE e cria a responsabilidade
corporativa para subornos pagos no exterior.

A TCA estabelece crédito explícito para as empresas com programas de compliance efetivos
para o cálculo das penalidades tanto para as violações de suborno nacionais quanto
internacionais. A lei aplica-se a empresas colombianas, incluindo as subsidiárias

43
http://fcpamericas.com/english/anti-corruption-compliance/anti-corruption-laws-chile-
companies/#sthash.ERuJUrSi.dpuf

38

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colombianas de empresas não colombianas registradas para fazerem negócios no país
(Colômbia).

Os principais pontos da TCA estão no quadro abaixo.

Lei n.º 1.778/16 – Lei Transacional de Combate à Corrupção


O TCA cria a responsabilidade corporativa quando (i) um diretor,
funcionário, contratado ou acionista; (ii) dá, ofertas ou promessas;
(iii) a um funcionário público estrangeiro; (iv), direta ou
indiretamente; (v) o dinheiro, qualquer outro bem com valor
Violações
monetário, ou qualquer outro benefício; (vi) em troca do oficial para
realizar, omitir ou retardar qualquer agir relacionados com o
exercício de suas funções; e (vii) em relação a transações
comerciais internacionais.
A lei cria responsabilidade administrativa para as empresas
envolvidas em um ato de violação. A responsabilidade corporativa
não tem um aspecto penal, seguindo uma abordagem que é
consistente com as abordagens adotadas em muitos outros países
da América Latina, incluindo o Brasil.
Responsabilidade
Corporativa As empresas podem ser sancionadas com multas de até 200.000
vezes o salário mínimo mensal da Colômbia, o que equivale a
aproximadamente USD 45 milhões. Além disso, as empresas
podem ser impedidas de contratar com o governo colombiano por
até 20 anos e excluídas do regime de subsídios governamentais ou
incentivos por 05 anos.
Responsabilidade Os indivíduos podem ser sancionados penalmente, incluindo pena
Individual de 09 a 15 anos de prisão, além de multas consideráveis.
Autoridade reguladora única para aplicar a TCA, a Superintendência
de Sociedades (“Supersociedades”). Referida autoridade
supervisiona todas as empresas domiciliadas na Colômbia. A
Autoridade Supersociedades, entretanto, não tem poderes de investigação
para procurar e apreender os bens, efetuar escutas e outras formas
de vigilância, embora possa coordenar com os promotores federais
para apoio à investigação.
As empresas podem reduzir ou evitar penalidades quando
autodenúncia. Para serem elegíveis para receber nenhuma
penalidade, as empresas devem atender a duas condições: (i)
Autodenúncia
conduzir o reporte antes que a Supersociedades inicie sua própria
investigação; e (ii) reportar antes que o pagamento de suborno
tenha sido efetivado.
Fatores agravantes e atenuantes para efeitos de cálculo da
Programas de
penalidade. Programas de compliance com foco em anticorrupção
Compliance
como um fator atenuante específica.

39

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Altera proibições para as empresas relacionadas com suborno em
âmbito nacional. Ele permite que as Supersociedades apliquem o
mesmo nível de sanções para suborno estrangeiro para empresas
Suborno em
que fazem pagamentos indevidos a funcionários públicos
âmbito nacional
colombianos, mas só depois de uma condenação penal contra um
representante legal ou diretor da empresa já tenham sido
anteriormente.

Além da TCA, a Colômbia também conta com os casos de aplicação do FCPA como mais
uma forma de intolerância a corrupção no país. Segue abaixo os principais exemplos.

Empresa Caso
Suborno para profissionais de saúde para a compra de produtos
Olympus
Olympus. Multa de USD 22,8 milhões.
Segundo caso de FCPA que as autoridades norte-americanas
Petro Tiger decidem por não punir a empresa pelos atos praticados pelos
indivíduos.

10.4. México

O México possui, em âmbito federal, o Código Penal Mexicano traz uma lista de crimes
relacionados à corrupção, tais como (i) peculato; (ii) suborno de funcionários públicos,
nacionais e estrangeiros; (iii) tráfico de influências; (iv) abuso de autoridade; (v) exercício
indevido de serviço público; e (vi) crimes contra a administração da justiça.

No âmbito estadual, o México possui um dispositivo para punir funcionários públicos


envolvidos com corrupção, entretanto, o México possui 31 estados em seu território e são os
estados que possuem legitimidade para aprovar as suas próprias leis.

Assim, como o Brasil, o México também começou a sofrer pressão da OCDE para promulgar
a sua lei anticorrupção. Além disso, o México também estava sofrendo pressão dos Estados
Unidos, que tem o país como o seu terceiro maior parceiro comercial. De acordo com o
Census Bureau de 2015, por exemplo, o México representa 14% do comércio total dos
Estados Unidos.44

Além disso, assim como o Brasil, o México também possui uma nota baixa na TI, por conta
de um alto índice de percepção da corrupção. O México enfrenta os mesmos problemas que
muitos países da América Latina, como um ambiente regulatório complexo, aquisições
públicas em grande escala e riscos de extorsão com a justiça.

44
http://www.taftlaw.com/news/publications/detail/1259-mexico-adopts-national-anti-corruption-enforcement-
system-the-global-trend-of-anti-corruption-statutes

40

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Diante das pressões externas da OCDE e dos Estados Unidos em 2012, o México aprovou
a Lei Anticorrupção Federal que visa combater a corrupção em contratações públicas e punir
empresas e indivíduos.

A Lei Anticorrupção Federal é semelhante ao FCPA, UKBA e a Lei Anticorrupção Brasileira,


pois também (i) proíbe a oferta de dinheiro ou presentes para obter ou manter uma vantagem
comercial em contratos com o governo mexicano; (ii) penaliza a corrupção dos funcionários
públicos nacionais e estrangeiros; e (iii) proíbe o uso de pagamento de facilitação (o que é
permitido no âmbito do FCPA).

A Lei Anticorrupção Federal estabelece (i) multas de –SD 4.100 - USD 205.000 para os
indivíduos que agem em nome das empresas; sendo que se tais multas forem consideradas
inferiores aos lucros e benefícios auferidos pela parte sancionada, a pena máxima poderá
ser aumentada em 50%, resultando em uma multa no valor de USD 307.500. Caso esta
multa ainda seja considerada inferior aos lucros e benefícios auferidos, as autoridades
poderão aplicar uma multa de 30% - 35% do valor total do contrato firmado com o governo;
(ii) multas de USD 41.000 – USD 8.199.000 para as empresas; sendo que se tais multas
forem consideradas inferiores aos lucros e benefícios auferidos pela parte sancionada, a
pena máxima poderá ser aumentada em 50%, resultando em uma multa no valor de USD
12.298.500. Caso esta multa ainda seja considerada inferior aos lucros e benefícios
auferidos, as autoridades poderão aplicar uma multa de 30% - 35% do valor total do contrato
firmado com o governo.

Após a promulgação da Lei Anticorrupção Federal, houve uma série de escândalos


envolvendo o sistema financeiro. Desta forma, o México lançou em 2015 novas medidas
anticorrupção destinadas a restabelecer a confiança da população e do público externo no
governo e nos sistemas financeiros. A peça central de tais medidas anticorrupção é a criação
do Sistema Nacional Anticorrupcion (Sistema Nacional Anticorrupção, “SNA”), que foi
aprovada em 21 de abril de 2015 e deve ser ratificada pelo Congresso Mexicano até 28 de
maio de 2016.

O SNA criou um Comitê de Coordenação, que tem a função de criar políticas para auditar e
controlar a utilização dos recursos públicos, bem como prevenir, controlar e desencorajar a
corrupção.

Além disso, em 15 de junho de 2016, o senado mexicano aprovou ontem um projeto de lei
anticorrupção que obrigará os servidores públicos que revelem (i) os seus patrimônios; (ii)
declarações de imposto de renda; e (iii) interesses econômicos, pois atualmente os
servidores públicos não são obrigados a prestar contas à população. O projeto de lei adotou
uma proposta assinada por mais de 600 mil cidadãos e deve ser votado ainda esta semana
pelos deputados.

A iniciativa popular teve o apoio de diversas entidades, incluindo o Instituto Mexicano para
La Competividad A.C. (“IMCO”). Além de este projeto, o senado mexicano também aprovou
outros quatro projetos que criam um novo modelo legal de combate à corrupção, os quais

41

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incluem uma procuradoria especial e independente de combate à corrupção, uma agência
federal de auditoria reforçada e cortes especiais para julgar casos de corrupção.

De acordo com o IMCO, a corrupção custa cerca de USD 48 bilhões por ano, cerca de oito
vezes mais que o orçamento anual dos programas de desenvolvimento social.

Como os demais países da América Latina, o México também conta com os casos de
aplicação do FCPA como mais uma forma de intolerância a corrupção no país.

Segue abaixo os principais exemplos.

Empresa Caso
Pagamentos de propina para a empresa PEMEX. Multa de USD
HP
108 milhões.
Pagamentos a funcionários públicos no México e Panamá para
Bizjet
garantir contratos com o governo. Multa de USD 11,8 milhões.
Investigação em curso de pagamentos a funcionários do
Wal-Mart governo do México para garantir as licenças de construção e
variâncias.
Pagamentos de profissionais de saúde para a compra de
Biomet
produtos da Biomet. Multa de USD 22,8 milhões.
Pagamentos de profissionais e saúde do estado mexicano com
Orthofix dinheiro e bens para a compra de produtos da empresa. Multa
de USD 7,7 milhões.
Pagamentos a veterinários para os produtos e certificações.
Alimentos Tyson
Multa de USD 5,2 milhões.

11. Casos emblemáticos de corrupção na América Latina

Além dos casos citados de aplicação do FCPA na América Latina, há também outros
escândalos de corrupção que valem ser mencionados, conforme quadro abaixo. 45

Casos de Corrupção na América Latina


Sucederam-se as denúncias contra a ex-presidente Cristina Fernández e
seu falecido marido e antecessor, Néstor Kirchner, os quais
presumivelmente enriqueceram durante seus mais de 12 anos no poder.
Um fiscal argentino abriu uma investigação contra Cristina Fernández de
Argentina Kirchner pelo delito de suborno em relação às supostas irregularidades
cometido por uma imobiliária próxima à sua família. Por este mesmo caso,
a ex-mandatária já foi imputada, junto com seu filho, Máximo Kirchner, por
suposto enriquecimento ilícito e falsificação de documentos públicos. No
processo fala-se de escândalos de corrupção no governo anterior e

45
“A corrupção, o calcanhar de Aquiles das democracias latino-americanas”, Llorente & Cuenca. Madrid, 2016.

42

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aparece o empresário Lázaro Báez, o máximo adjudicatário de obra pública
no Sul (ainda que tenha negócios em outras zonas também) durante o
período kirchnerista (2003-2015). O empresário, que está detido por
supostos delitos de lavagem de ativos e evasão fiscal, é investigado como
suposto testa de ferro do ex-presidente Néstor Kirchner (falecido em 2010)
e de sua esposa, Cristina, para quem teria expedido aproximadamente 55
milhões de euros ao exterior, especialmente para contas da Suíça,
mediante manobras fraudulentas. Este caso foi revelado em 2013 por uma
investigação jornalística e faz parte do escândalo da denominada Rota do
dinheiro K. A Rota do dinheiro K estende-se a outros funcionários. Um dos
mais midiáticos é o caso do ex-secretário de obras públicas da nação
durante o período kirchnerista, José Francisco López, que foi detido em um
mosteiro levando em bolsas USD 8 milhões não declarados. Até esse
momento estava sendo investigado por suposto enriquecimento ilícito.
Os índices de aprovação de Michelle Bachelet caíram até os mais baixos
registros históricos de ao redor de 22% a 24% depois que foram conhecidos
os detalhes do chamado “noragate” ou “caso Caval” (o filho da presidente,
Chile Sebastián Dávalos, teria tido acesso a informação privilegiada e teria
utilizado sua influência política para conseguir o crédito para a empresa em
que participa sua esposa Natalia Compagnon). Este caso provocou uma
sensação de crise de confiança generalizada no sistema partidário.
2014 foi marcado pela utilização de fundos públicos para “comprar apoios
políticos” e eleitorais (o conhecido reparte de “marmelada”), enfrentou em
2015 um escândalo que fere a confiança dos cidadãos numa instituição-
chave como a Corte Constitucional. Seu presidente, Jorge Pretelt, afastou-
se temporariamente do cargo a fim de se dedicar a demonstrar sua
inocência em um escândalo de suposta corrupção em que estava
envolvido. A denúncia contra Pretelt tem a ver com a versão de um
advogado a quem, segundo ele mesmo, o presidente da Corte pediu ao
Colômbia
redor de 200 mil dólares para que o tribunal emitisse uma sentença a favor
de uma empresa fiduciária que ele representava. Quanto à confiança
institucional, na Colômbia, segundo o informe do Barômetro das Américas
LAPOP 2015, disponível no Observatório de la Democracia da
Universidade dos Andes, a instituição que conta com maior confiança entre
os cidadãos é a Igreja Católica, seguida por Forças Armadas, igrejas
evangélicas e governo. Os partidos políticos são as instituições em que as
pessoas menos confiam (García, Montalvo e Seligson, 2015).
Um escândalo de fraude aduaneira (o caso de “La Línea”) acabou com a
demissão e encarceramento da vice-presidente Roxana Baldetti, no mês
de maio de 2016, e a renúncia em setembro (a poucos dias do primeiro
Guatemala
turno das eleições presidenciais) do presidente Otto Pérez Molina. Assim,
funcionários judiciais e um organismo avalizado pela ONU desmantelaram
uma estrutura criminosa que recebia propinas de importadores para evadir

43

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o pagamento de impostos alfandegários. Presume-se que a rede era
liderada pelo ex-secretário particular de Baldetti, Juan Carlos Monzón, e
por funcionários da Superintendência de Administração Tributária. A
reação dos cidadãos fez-se sentir com multitudinárias concentrações no
Parque Central da capital, nas quais se exigia a renúncia de Pérez Molina
e Baldetti. A demissão da vice-presidente ocorreu a 8 de maio, mas a
situação agravou-se quando a Comissão Internacional contra a Impunidade
na Guatemala (Cicig) e o Ministério Público revelaram dia 22 de maio o
contrato fraudulento entre o Instituto Guatemalteco de Segurança Social
(IGSS) e a Drogaria Pisa. Dia 9 de julho, o governo voltou a ver-se afetado
com a captura de Gustavo Martínez, ex-secretário geral do presidente, o
que conduziu em agosto a uma manifestação que reuniu 100 mil pessoas
no Parque Central da capital guatemalteca, prelúdio da queda do chefe de
Estado. Finalmente, um funcionário, dois ex-ministros e um ex-deputado
figuram entre os 24 detidos durante as operações realizadas contra casos
de corrupção e lavagem de dinheiro em que estaria implicado o ex-
presidente da Guatemala, Otto Pérez Molina.
O presidente Enrique Peña Nieto enfrentou não só problemas econômicos
e de segurança (as chacinas de Tlatlaya e Iguala e a fuga e recaptura de
Chapo Guzmán), mas também viu como explodiam dois escândalos de
possível corrupção: o que afetava sua esposa, Angélica Rivera, e o que
México
afetou seu secretário da Fazenda, Luis Videgaray. Trata-se de um conflito
de interesse do presidente e do secretário da Fazenda pela compra
subsidiada de casas que uma construtora favorecida com múltiplos
contratos do governo lhes vendeu.
O ex-presidente Ricardo Martinelli enfrenta uma complicada situação por
suposta corrupção. O Supremo panamenho acolheu três casos contra
quem fora chefe de Estado entre 2009 e 2014, o último por indultos
outorgados ao final de seu mandato. Em janeiro de 2015, a Corte iniciou
um processo contra Martinelli por ter supostamente cometido delitos contra
Panamá
a administração pública por irregularidades na compra de merenda
desidratada para escolas públicas. Devido a este caso, Martinelli perdeu
seu foro privilegiado como deputado do Parlamento Centro-Americano
(Parlacen) e retirou-se do país horas antes que se iniciasse uma
investigação contra ele por causa da merenda desidratada.
O final do governo Ollanta Humala viu-se salpicado pelas consequências
do caso Belaunde e, sobretudo, pelo que aconteceu com a Primeira Dama,
Nadine Heredia, quem fora investigada pelo Ministério Público pelo suposto
delito de lavagem de ativos. Uma comissão do Congresso do Peru incluiu
Peru
Heredia na investigação levada a cabo pelas supostas atividades ilícitas do
empresário Martín Belaunde Lossio. Ele é investigado pelo caso La
Centralita, um escritório de onde supostamente se espiava opositores
políticos do presidente regional de Áncash, César Álvarez. Também se

44

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atribui a ele um suposto delito de lavagem de ativos ao gerir interesses de
empresas particulares para lhes adjudicar contratos com o Estado em
governos regionais e obter benefícios econômicos pessoais.
A corrupção e o clientelismo político repetiram-se em várias ocasiões ao
longo da história. Não em vão, o regime de Trujillo (1930-1961) foi
considerado como o dos Somozas na Nicarágua, como uma “cleptocracia”.
O longo período de hegemonia política do PLD, que governa desde 1996
de maneira ininterrupta salvo durante o período entre 2000 e 2004, e a
debilidade institucional do país fizeram com que nestes dois últimos anos
o país fosse percebido como um dos mais corruptos da América Latina,
segundo o informe da Transparência Internacional Índice de Percepção de
República Corrupção 2015. Nesta década o mais afamado foi o caso Félix Bautista.
Dominicana O senador dominicano da província San Juan de la Maguana esteve
presumivelmente envolvido com enriquecimento ilícito, lavagem e
falsificação. A Suprema Corte de Justiça ratificou finalmente o auto com a
qualificação Não Procede a favor de Bautista e outras pessoas acusadas
de suposta corrupção e lavagem de ativos contra o Estado, o que foi
duramente criticado por muitos setores. A Transparência Internacional
incluiu Félix Bautista no quarto lugar da lista de pessoas, empresas e
Estados que simbolizam a Grande Corrupção, a fim de abrir uma votação
pública em busca da figura mais notória de corrupção.

45

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SISTEMA DE NORMAS ANTICORRUPÇÃO BRASILEIRAS

12. Contexto legislativo anterior à Lei Anticorrupção brasileira

Anterior à promulgação da Lei Anticorrupção Brasileira – Lei n.º 12.846/13, consta no


ordenamento jurídico nacional um conjunto de leis visam combater não só a corrupção, mas
os demais atos ilícitos que a acompanham. Além disso, importante ressaltar que há também
diversas normas que são aplicadas aos servidores públicos e que devem ser observadas
pelos particulares.

Segue abaixo um quadro informativo com as principais leis nacionais que combatem a
corrupção e outros atos relacionados, incluindo as normas relacionadas à Lei n.º 12.846/13.

Normas Brasileiras contra a Corrupção


(em sentido amplo)
Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Lei nº 1.079/1950
Penal) (Define o Crime de Responsabilidade)
Lei nº 4.717/1965 Lei nº 7.437/1985
(Lei de Ação Popular) (Lei de Ação Civil Pública)
Lei nº 8.137/1990 (Lei dos Crimes Lei nº 8.429/1992
Econômicos e Contra a Ordem (Lei de Improbidade Administrativa)
Tributária)
Lei nº 8.666/1993 Lei nº 9.504/1997
(Lei de Licitações) (Lei das Eleições)
Lei nº 9.613/1998 Lei nº 9.983/2000
(Lei de Lavagem de Dinheiro) (Insere o crime de corrupção de agente
público estrangeiro no Código Penal)
Lei Complementar nº 135/2010 Lei nº 12.527/2011
(Lei da Ficha Limpa) (Lei de Acesso à Informação)
Lei nº 12.529/2011 Lei 12.683/2012
(Lei de Defesa da Concorrência) (Altera a Lei de Lavagem de Dinheiro)
Lei nº 12.813/2013 Lei nº 12.846/2013
(Lei de Conflito de Interesses) (Lei Anticorrupção)
Lei nº 12.850/2013 Decreto nº 8.420/2015
(Lei de Combate às Organizações (Regulamenta a Lei Anticorrupção no
Criminosas) âmbito Federal)
Portaria nº 909/2015 CGU Lei nº 13.303/2016
(Regulamenta o Dec. 8.420/2015) (Lei das Estatais)
Decreto nº 9.203/2017 Instrução Normativa nº 13/2019 CGU
(Decreto da Governança Pública) (Regulamenta o Dec. 8.420/2015)

As normas mencionadas acima são apenas algumas que possuem dispositivos relacionados
à corrupção e demais atos que a acompanham.

46

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Há, ainda, a Lei n.º 8.112/1990 que regula o regime jurídico dos servidores públicos civis da
União, das autarquias e das fundações públicas federais. Importante ressaltar que os
estados e municípios também possuem suas normas aplicáveis aos seus respectivos
servidores, as quais também devem ser analisadas caso a caso.

12.1. Contexto histórico nacional

A Lei Anticorrupção Brasileira46 foi promulgada em 1º de agosto de 2013 e entrou em vigor


em 29 de janeiro de 2014.

Apesar de muitos terem tido a impressão de que a lei foi aprovada de repente e
aparentemente sem motivos, a Lei Anticorrupção Brasileira já estava em processo de
elaboração e aprovação há bastante tempo. Como mencionado acima, o Brasil é signatário
das Convenções da OEA, OCDE e das Nações Unidas. Assim, o país estava obrigado a
possuir em seu ordenamento jurídico uma norma que penalizasse as empresas pela prática
de atos corruptos contra funcionários públicos nacionais e estrangeiros.

Além disso, vale lembrar as manifestações de junho de 2013 que demonstraram a


insatisfação do povo brasileiro contra os atos de corrupção e os desvios de dinheiro que
estavam ocorrendo para a construção e reforma de estádios para a Copa do Mundo de 2014.
Desta forma, o governo brasileiro estava sofrendo pressões internas e externas para
aprovação da Lei Anticorrupção Brasileira.

Ainda, vale lembrar da Ação Penal 470 movida pelo Ministério Público e mais conhecida
como ação do Mensalão que foi um dos julgamentos mais importantes da história do
Supremo Tribunal Federal (“STF”) e posteriores escândalos da Operação Lava Jato.

12.2. Mensalão

Mensalão é o nome dado ao escândalo de corrupção política que envolveu a compra de


votos de parlamentares no Congresso Nacional, de 2005 a 2006. O caso chamou bastante
atenção da mídia e da população, pois dentre os supostos envolvidos estava o então
Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (“Lula”), e membros do Partido dos
Trabalhadores (“PT”). Havia também envolvidos de outros partidos políticos, como o Popular
Socialista, Socialista Brasileiro e Republicano Progressista.

O escândalo ficou conhecido como o escândalo do Mensalão, após o termo ser utilizado pelo
então Deputado Federal Roberto Jefferson, em uma entrevista, para se referir à mesada que
os deputados recebiam para votarem a favor de projetos de interesse do Poder Executivo.
O Deputado Roberto Jefferson também acusou o então Ministro da Casa Civil, José Dirceu,
de ser o mentor de todo o esquema. O Acórdão do Mensalão, ou seja, a sentença da Ação

46
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm

47

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Penal 470, foi publicado no dia 22 de abril de 2013 com 8.405 páginas e como sendo o
julgamento mais longo da história do STF.47

Uma das inovações trazidas pelo Acórdão do Mensalão foi a ampliação das hipóteses de
autoria, com base em uma controversa noção do conceito alemão de “domínio do fato”. Ainda
que se possa não considerar equivocada tal extensão, a bem da verdade esta sentença
reflete um cenário de grande banalização do direito penal de garantias, o que por certo
alcança as novas preocupações com a ética dos negócios.

13. Aspectos gerais da Lei Anticorrupção brasileira

A Lei Anticorrupção Brasileira pune as empresas pelos atos praticados contra a


administração pública, nacional e estrangeira. Os indivíduos são penalizados pelas
disposições estabelecidas no Código Penal e em leis esparsas, como a Lei de Improbidade
Administrativa.

Outro ponto importante é que a Lei Anticorrupção Brasileira não é uma lei penal. As multas
e sanções ocorrem no âmbito civil e administrativo.

A Lei Anticorrupção Brasileira responsabiliza objetivamente a pessoa jurídica pelos atos


práticos por seus indivíduos, o que significa que as autoridades não analisarão se a empresa
teve dolo ou culpa na atuação do ato lesivo contra a administração pública.

Outros aspectos relevantes da Lei Anticorrupção Brasileira são: (i) aplicação a qualquer
pessoa jurídica que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas
de fato ou de direito, ainda que temporariamente; (ii) responsabilização solidária entre as
entidades do grupo econômico; (iii) responsabilização sucessória nas reorganizações
societárias; (iv) extensão dos atos lesivos contra a administração para atos ilícitos também
em licitações; (v) julgamento do ato lesivo através do Processo Administrativo de
Responsabilização – PAR; (vi) possibilidade de celebração de acordos de leniência; (vii)
cadastro das empresas condenadas no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e
Suspensas – CEIS e Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP; e (viii) incentivo para
a implementação de programas de compliance.

Importante ressaltar que diferente do que ocorre com outras leis, como a Lei 12.529/11,
conhecida como a Lei do CADE, não há uma autoridade única ou de fácil identificação para
julgamento do PAR e/ou celebração do acordo de leniência. De acordo com o artigo 8º da
Lei Anticorrupção Brasileira a “instauração e o julgamento de processo administrativo para
apuração da responsabilidade de pessoa jurídica cabem à autoridade máxima de cada órgão
ou entidade dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”.

Além disso, no âmbito do Poder Executivo Federal a extinta Controladoria-Geral da União


(“CGU”), atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União

47
Acórdão do Mensalão na íntegra: ftp://ftp.stf.jus.br/ap470/InteiroTeor_AP470.pdf

48

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(“Ministério da Transparência”),48 também tem competência para instaurar e julgar o PAR e
para celebrar acordos de leniência.

13.1. Atos penalizados pela Lei Anticorrupção brasileira

A Lei Anticorrupção Brasileira pune os atos lesivos contra a administração pública, nacional
ou estrangeira. Além de punir atos lesivos praticados em licitações.

Assim, as condutas reprimidas pela Lei Anticorrupção Brasileira são: (i) prometer, oferecer
ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a
ele relacionada; (ii) financiar, custear, patrocinar ou subvencionar a prática dos atos ilícitos;
(iii) utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais
interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados; (iv) dificultar investigação
ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação; e (v)
fraudar licitações e contratos com o governo.

13.2. Penalidades da Lei Anticorrupção brasileira

As penalidades da Lei Anticorrupção Brasileira são aplicadas nas esferas administrativas e


judiciais. Na esfera administrativa, as penalidades são:

(i) multa: de 0,1 a 20% do faturamento bruto do último exercício ao início do PAR ou
de R$ 6.000 a R$ 60.000.000, caso não seja possível utilizar o critério do
faturamento bruto; e
(ii) publicação extraordinária da decisão condenatória a expensas da pessoa jurídica.

Na esfera judicial, as penalidades são:

(i) perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagens ou proveitos,
direta ou indiretamente, obtidos da infração;
(ii) proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos
públicos pelo prazo de 01 a 05 anos;
(iii) suspensão ou interdição parcial de suas atividades; e
(iv) dissolução compulsória da pessoa jurídica.

Além das penalidades mencionadas acima, a empresa é obrigada a reparar integralmente o


dano causado e a inclusão em cadastros públicos de empresas inidôneas, suspensas e
punidas. No âmbito federal são chamados de Cadastro Nacional de Empreses Inidôneas e
Suspensas – CNEIS e Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP.

48
A Medida Provisória 726/2016 extinguiu a Controladoria-Geral da União e criou o Ministério da Transparência,
Fiscalização e Controle com as mesmas competências da extinta CGU. A MP 726/2016 entrou em vigor na
data de sua publicação, em 12 de maio de 2016.

49

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13.3. Agravantes e atenuantes da multa

As agravantes e atenuantes estão previstas na Lei Anticorrupção Brasileira, 49 porém os


percentuais de aumento ou redução das penas foram estabelecidos no Decreto n.º 8.420/15,
o qual será abordado mais adiante.

Seguem abaixo as tabelas das agravantes e atenuantes da Lei Anticorrupção Brasileira, com
os respectivos percentuais.

Agravantes
Continuidade dos atos lesivos no tempo 1% - 2,5%

Tolerância ou ciência de pessoas do corpo diretivo ou gerencial


1% - 2,5%
da pessoa jurídica
Interrupção no fornecimento de serviço público ou na execução
1% - 4%
de obra contratada
Apresentação de índice de solvência geral e de liquidez geral
superiores a um e de lucro líquido no último exercício anterior ao 1%
da ocorrência do ato lesivo
Reincidência 5%
Existência de contratos mantidos ou pretendidos com a
1% - 5%
administração pública50

Atenuantes
Não consumação da infração 1%
Comprovação de ressarcimentos dos danos 1,5%
Grau de colaboração (independentemente do acordo de
1% - 1,5%
leniência)
Comunicação espontânea da pessoa jurídica para instauração
2%
do PAR
Existência de um programa de compliance 1% - 4%

49
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2015/Decreto/D8420.htm
50
O percentual será verificado de acordo com o valor do contrato mantido ou pretendido com a administração
pública. Acima de: (i) R$ 1.500.000 – 1%; (ii) R$ 250.000.000 – 4%; (iii) R$ 10.000.000 – 2%; (iv) R$
1.000.000.000 – 5%; e (v) R$ 50.000.000 – 3%.

50

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13.4. Acordo de Leniência

O acordo de leniência no âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira é aplicável apenas para as


empresas. Em dezembro de 2015 foi promulgada a MP 703/2015, a qual visava incluir a
participação do Ministério Público nas negociações dos acordos de leniência e, assim, incluir
os indivíduos. Referida medida provisória gerou diversos debates e controvérsias, inclusive
quando a sua constitucionalidade. No final, a MP 703/2015 não virou lei e, portanto, suas
alterações para incluir a participação do Ministério Público nos acordos de leniência no
âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira não ocorreram.

Para celebrar um acordo de leniência, a empresa deve: (i) ser a primeira a se manifestar; (ii)
cessar completamente a sua participação e/ou envolvimento na infração; e (iii) cooperar
integralmente com as investigações.

A empresa que celebrar o acordo de leniência poderá ter até 2/3 do valor da multa reduzido
e ser isenta da publicação extraordinária condenatória. Vale mencionar que a celebração de
um acordo de leniência, entretanto, não isenta a empresa de reparar integralmente o dano
causado.

Ainda, vale mencionar a Instrução Normativa n.º 74/2015 do Tribunal de Contas da União, a
qual visa disciplinar a fiscalização do processo de celebração dos acordos de leniência pela
administração pública federal no âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira.

Por fim, verifica-se que os acordos de leniência e delações premiadas51 estão auxiliando as
autoridades ampliando: (i) as buscas e apreensões em empresas; (ii) os fundamentos para
condenação de executivos; e (iii) o número de funcionário públicos e políticos envolvidos nos
escândalos e corrupção. Desta forma, verifica-se que os acordos de leniência e delação
premiadas são instrumentos significativos para as autoridades no combate à corrupção e
atos correlatos.

Abaixo, um quadro comparativo dos acordos de leniência nos âmbitos da Lei Anticorrupção
Brasileira e infrações contra a ordem tributária, bem como da delação premiada. 52

Infrações contra a Delação Lei Anticorrupção


ordem econômica premiada Brasileira
Atos lesivos contra à
Crimes e infrações
Crimes praticados por administração pública
Aplicação contra a ordem
organização criminosa. nacional ou estrangeira, e
econômica.
ilícitos em licitações.

51
Acordo celebrado pelos indivíduos com as autoridades por atos praticados, incluindo de corrupção, porém
não no âmbito da Lei Anticorrupção Brasileira.
52
Fonte: Caderno do Pacto. Anticorrupção. Cultura de Integridade e Ética nos Negócios. Pacto Global Rede
Brasileira. 2015.

51

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Instrumentos Artigos 86 e 87 da Lei Artigos 4º a 7º da Lei Artigos 16 e 17 da Lei
legais 12.529/2011. 12.850/2013. 12.846/2013
Polícia ou Ministério Autoridade máxima do órgão
Órgão Superintendência
Público (federais ou público (no âmbito federal, a
responsável Geral do CADE.
estaduais). CGU).
Somente pessoas
Pessoas físicas ou físicas. Pessoas
Quem pode? Somente pessoas jurídicas.
jurídicas jurídicas somente em
crimes ambientais.
Publicidade Por meio de Wainer Países que possuem
Por meio de Wainer
para outros (autorização do acordos de cooperação
(autorização do leniente).
países leniente). com o Brasil.
Extinção da ação Redução de até 2/3 da pena,
punitiva ou redução da exclusão da pena de
penalidade de 1/3 a publicidade da condenação e
Efeitos civis Não se aplica.
2/3. Não exclui a exclusão da reparação
reparação judicial das judicial, mas o leniente deve
vítimas. reparar o dano causado.
Extinção da ação Perdão judicial ou
punitiva ou redução da redução da pena de 1/3
Efeitos penalidade de 1/3 a a 2/3, substituição da
Não se aplica.
penais 2/3. Não exclui a pena de prisão por
reparação judicial das restritiva de direito, não
vítimas. ser denunciado.
Extensão às empresas Medidas de proteção,
do mesmo grupo manutenção do
Outros Extensão às empresas do
econômico e aos seus anonimato,
benefícios mesmo grupo econômico.
colaboradores e sigilo cumprimento de pena
da proposta. em regime diferenciado.
Identificação dos
demais envolvidos,
Identificação dos revelações sobre a Identificação dos demais
demais envolvidos, organização criminosa, envolvidos, obtenção célere
obtenção de provas da prevenção de ações de provas da infração, e
Cooperação
infração, arcar com os criminosas, recuperação arcar com os custos
custos envolvidos com de valores obtidos pela envolvidos com a
a cooperação. organização criminosa e cooperação.
localização de vítimas,
se houver.
Colaboração voluntária
Ser o primeiro a efetiva para a redução
noticiar a infração, da pena ou sua
cessar a infração substituição. Para o não Ser o primeiro a noticiar a
totalmente, não haver oferecimento de infração, cessar a infração
Requisitos
provas suficientes da denúncias, o delator não totalmente, confessar, e
infração, confessar, e pode ser líder da oferecer plena cooperação.
oferecer plena organização criminosa e
cooperação. deve ser o primeiro a
prestar a colaboração.
Homologação Tribunal do CADE Juiz de direito O próprio órgão responsável.
Caso realizada após
Há possibilidade de se
Vantagens sentença, a pena
noticiar outras Não se aplica.
adicionais poderá ser reduzida
infrações para
pela metade ou ser

52

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obtenção dos garantida a progressão
benefícios. de regime.
Informações
repassadas não
As provas produzidas
podem ser Não importa em
não poderão ser
Negativa consideradas como reconhecimento de prática de
utilizadas em desfavor
confissão, nem ato ilícito.
do colaborador.
reconhecimento da
licitude.
Programa de Está em fase de
Não se aplica. Pode atenuar as penas.
Compliance análise.

13.5. Quem é o funcionário público?

No Brasil há uma série de leis e normas que estabelecem quem é funcionário público ou não.
Além disso, há nomenclaturas diferentes que variam de acordo com o regime de contratação,
quais sejam: (i) agente público; e (ii) servidor público.

A definição mais abrangente é a definição estabelecida no artigo 327, do Código Penal,


a qual segue transcrita abaixo. –Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os
efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo,
emprego ou função pública.

§1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em


entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada
ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.

Além disso, é importante verificar também a definição que é trazida na Lei Anticorrupção
Brasileira, a qual determina quem é o agente público estrangeiro.

Art. 5º, §3 Considera-se agente público estrangeiro, para os fins desta Lei, quem, ainda
que transitoriamente ou sem remuneração, exerça cargo, emprego ou função pública
em órgãos, entidades estatais ou em representações diplomáticas de país estrangeiro,
assim como em pessoas jurídicas controladas, direta ou indiretamente, pelo poder
público de país estrangeiro ou em organizações públicas internacionais.

13.6. Penalidades para a pessoa física

Apesar de a Lei Anticorrupção Brasileira não punir os indivíduos pela prática de atos contra
a administração pública, nacional ou estrangeira, deve-se ressaltar que a legislação
brasileira possui normas esparsas que asseguram a penalidade para os indivíduos.

O Código Penal tipifica a corrupção ativa, passiva e a em transação comercial internacional.


Veja abaixo os tipos penais e as respectivas penas.

53

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Corrupção Ativa: Artigo 333, Código Penal: “Oferecer ou prometer vantagem indevida a
funcionário público determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício”. Pena de 02 a 12
anos e multa

Corrupção passiva Artigo 317, Código Penal: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem,
direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela,
vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”. Pena de 02 a 12 anos e multa

Corrupção ativa em transação comercial internacional: Artigo 337-B, Código Penal:


“Prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a funcionário público
estrangeiro, ou a terceira pessoa determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício
relacionado à transação comercial internacional. Pena de 01 a 08 anos e multa.

Além do Código Penal, há a disposição da Lei n.º 9.613/98, alterada pela Lei 12.683/2012,
conhecida como Lei de Lavagem de Dinheiro. O artigo 1º desta lei determina que “ocultar ou
dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de
bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal” é punível
com pena de 03 a 10 anos e multa.

As pessoas físicas ainda podem ser punidas no âmbito da Lei do CADE, Lei de Improbidade
Administrativa, Lei de Licitações etc.

14. Decreto Federal n.º 8.420/15

14.1. Aspectos gerais do Decreto n.º 8.420/15

O Decreto n.º 8.420/1553 contém os parâmetros de avaliação do programa de compliance.


Assim como a Lei Anticorrupção Brasileira, o Decreto n.º 8.420/15 também foi aprovado em
um cenário de insatisfação da população contra os atos de corrupção praticados pelo
governo, conforme foi demonstrado nas manifestações de março de 2015. O Decreto n.º
8.420/15 foi uma das medidas aprovadas no Pacote Anticorrupção lançado pelo governo
federal.

Importante mencionar que o Decreto n.º 8.420/15 vai além dos parâmetros do programa de
compliance, possuindo disposições também sobre a celebração do acordo de leniência, do
PAR e dos cadastros nacionais CEIS e CNEP.

14.2. Parâmetros do Programa de Compliance efetivo

Os parâmetros do programa de compliance estabelecidos no Decreto n.º 8.420/15 não


diferem dos parâmetros já consolidados pelo FCPA. O primeiro parâmetro, o qual também é
considerado o mais importante, é o comprometimento da alta direção.

53
Verificar nota de rodapé 49.

54

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Com o comprometimento da alta administração, as empresas seguem para as demais etapas
do programa de compliance, conforme tabela abaixo.

Parâmetros do Programa de Compliance do Decreto n.º 8.420/15

Comprometimento da alta direção


Independência, estrutura e autoridade da instância interna responsável pela aplicação
do programa de integridade e fiscalização de seu cumprimento
Padrões de Conduta e Código de Ética aplicáveis aos empregados, administradores e a
terceiros (fornecedores, prestadores de serviço, agentes intermediários e associados)
Treinamentos periódicos
Análise periódica de riscos para realizar adaptações necessárias ao programa de
integridade
Monitoramento contínuo do programa de compliance
Medidas disciplinares em caso de violação do programa de integridade
Registros contábeis precisos e controles internos que assegurem a confiabilidade dos
registros contábeis
Canais de denúncia
Due diligence para contratação de terceiros (fornecedores, prestadores de serviço,
agentes intermediários e associados) e, conforme o caso, monitoramento de terceiros
Due diligence durante os processos de fusões, aquisições e reestruturações societárias,
do cometimento de irregularidades ou ilícitos ou da existência de vulnerabilidades nas
pessoas jurídicas envolvidas
Transparência quanto a doações para candidatos e partidos políticos
Procedimentos que assegurem a pronta interrupção de irregularidades ou infrações
detectadas e a tempestiva remediação dos danos gerados
Procedimentos específicos para prevenir fraudes e ilícitos no âmbito de processos
licitatórios, na execução de contratos administrativos ou em qualquer interação com o
setor público, ainda que intermediada por terceiros, tal como pagamento de tributos,
sujeição a fiscalizações, ou obtenção de autorizações, licenças, permissões e certidões

15. Portaria n.º 909/2015 da CGU

Em vigor desde abril de 2015, a Portaria n.º 909 54 da CGU, atual Ministério da Transparência,
Fiscalização e Controladoria-Geral da União, estabelece os elementos reprovadores do
programa de compliance. Assim, os programas de compliance meramente formais e
ineficazes e os programas de compliance criados após a ocorrência do ato lesivo não serão
considerados para a possibilidade de redução da pena.

54
http://www.cgu.gov.br/sobre/legislacao/arquivos/portarias/portaria_cgu_909_2015.pdf

55

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O Ministério da Transparência avaliará os programas de compliance com base nos relatórios
de perfil e de conformidade do programa. Abaixo os requisitos de cada relatório.

Relatório de Perfil Relatório de Conformidade do Programa

Estrutura do programa
Setor de atuação
(conforme Decreto n.º 8.420/15)

Estrutura organizacional Funcionamento do programa de compliance

Quantitativo de funcionários e Atuação na prevenção, detecção e


colaboradores remediação

Interações com a Administração Pública -

Participações societárias na condição de


controladora, controlada, coligada ou -
consorciada

16. Portaria n.º 910/2015 da CGU

A Portaria n.º 910/2015 55 da CGU, atual Ministério da Transparência, Fiscalização e


Controladoria-Geral da União, está em vigor desde abril daquele ano e define os
procedimentos para apuração e condução da responsabilidade administrativa. Além disso,
também disciplina o procedimento da investigação preliminar para decidir o cabimento da
instauração do PAR e estabelece o procedimento para a celebração do acordo de leniência,
a qual poderá ser realizada até a conclusão do relatório do PAR.

Por fim, importante mencionar que a Portaria n.º 910 ainda possibilita que especialistas com
notório conhecimento, de órgãos e entidades públicos ou de outras organizações, atuem
auxiliando a comissão de instauração e julgamento do PAR na análise da matéria sob exame.

A referida portaria foi revogada pela Instrução Normativa nº. 13/2019 da CGU.

17. Instruções Normativas n.º 1/2015 e 2/2015 da CGU

O atual Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União publicou


em conjunto com as Portarias n.º 909 e 910, as Instruções Normativas n.º 1 e 2.56

A Instrução Normativa n.º 1 estabelece a metodologia para a apuração do faturamento bruto


e dos tributos a serem excluídos para fins de cálculo da multa administrativa. De acordo com

55
http://www.cgu.gov.br/sobre/legislacao/arquivos/portarias/portaria_cgu_910_2015.pdf
56
http://www.cgu.gov.br/sobre/legislacao/arquivos/instrucoes-normativas/in_cgu_01_2015.pdf
http://www.cgu.gov.br/sobre/legislacao/arquivos/instrucoes-normativas/in_cgu_02_2015.pdf

56

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esta norma, o faturamento bruto compreende a receita bruta (i) o produto da venda de bens
nas operações de conta própria; (ii) o preço da prestação dos serviços em geral; (iii) o
resultado auferido nas operações de conta alheia; e (iv) as receitas da atividade ou objeto
principal da pessoa jurídica.

Além disso, o faturamento bruto poderá ser apurado pelo compartilhamento de informações
tributárias, e pelos registros contábeis produzidos ou publicados pela empresa, no país ou
no exterior.

A Instrução Normativa n.º 2 regula o registro no Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas


e Suspensas – CEIS e no Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP. Esta instrução
reafirma, ainda, a competência do Ministério da Transparência para gerir e definir os
procedimentos operacionais e a política de uso do CEIS e do CNEP, bem como do Sistema
Integrado de Registro do CEIS e do CNEP.

18. Instrução Normativa nº. 13/2019 da CGU

A Instrução Normativa nº. 13/2019 da CGU define os procedimentos para apuração da


responsabilidade administrativa de pessoas jurídicas de que trata a Lei nº 12.846/2013, a
serem observados pelos órgãos e entidades do Poder Executivo federal. Na referida norma
estão estabelecidas diretrizes importantes ao processo administrativo de responsabilidade
(PAR), como a competência para instaurar, avocar e julgar o processo, sobre o juízo de
adminissibilidade (com foco em adequar à Lei de Abuso de Autoridade – Lei nº. 13.869/2019),
investigação preliminar, instrução e julgamento do processo e pedido de reconsideração. A
referida norma revogou a Portaria n.º 910/2015 da CGU.

19. Portaria Conjunta n.º 2279/15 da CGU e da Secretaria da Micro e Pequena Empresa57

Além das normas mencionadas anteriormente, a CGU, atual Ministério da Transparência,


Fiscalização e Controladoria-Geral da União, também publicou a Portaria Conjunta n.º
2279/15 com a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, a qual dispõe sobre a avaliação de
programas de integridade de microempresa e empresa de pequeno porte.

Anexo à Portaria estão os parâmetros que serão exigidos das microempresas e empresas
de pequeno porte, bem como o que deverá constar nos respectivos relatórios de perfil e de
conformidade. Importante ressaltar que a referida portaria não estabelece parâmetros
diferentes daqueles estabelecidos no Decreto n.º 8.420/15. Entretanto, esclarece os
parâmetros apresentados, bem como cita exemplos. Desta forma, o anexo da Portaria
Conjunta n.º 2279/15 pode ser utilizado como guia para toda e qualquer empresa na
implementação de seu programa de compliance.

57
http://pesquisa.in.gov.br/imprensa/jsp/visualiza/index.jsp?data=10/09/2015&jornal=1&pagina=2&totalArquivo
s=80

57

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20. Regulamentos estaduais e municipais

Como mencionado acima, o Decreto n.º 8.420/15 regulamente a Lei Anticorrupção Brasileira
em âmbito federal. Assim, cada estado e cada município também poderá ser o seu próprio
regulamento. Nos casos em que o estado e/ou o município não possuir um regulamento, o
Decreto n.º 8.420/15 poderá ser utilizado como parâmetro. Abaixo, três decretos, dois
estaduais e um municipal, como exemplos.
20.1. Decreto n.º 60.106/14 (Estado de São Paulo)58

O Decreto n.º 60.106/14 está em vigor desde 31 de janeiro de 2014 e, dentre outros aspectos,
(i) detalha o trâmite do processo administrativo para apurar ato de corrupção praticado junto
a órgão estadual de São Paulo; (ii) define a competência das autoridades para celebrar de
acordo de leniência; (iii) remete à aplicação subsidiária do Decreto n.º 8.420/15; e (iv) cria o
Cadastro Estadual de Empresas Punidas – CEEP, para reunir e disponibilizar informações
acerca das sanções aplicadas com base na regra federal.

20.2. Decreto n.º 55.107/14 (Município de São Paulo)59

O Decreto n.º 55.107/14 está em vigor desde 14 de maio de 2014 e, dentre outros aspectos,
(i) indica a Controladoria-Geral do Município de São Paulo como órgão responsável pela
instauração da sindicância e do processo administrativo para apurar ato de corrupção
praticado contra a administração municipal, com possibilidade de delegação ao Controlador-
Geral do Município de São Paulo para o Corregedor-Geral do Município de São Paulo; (ii)
define a competência da Controladoria-Geral do Município de São Paulo como órgão
responsável pela celebração do acordo de leniência no município; e (iii) cria o Cadastro
Municipal de Empresas Punidas – CMEP, que reunirá e dará publicidade às sanções
aplicadas com base na norma federal.

20.3. Decreto Nº 522/16 (Estado de Mato Grosso) 60

O Decreto n.º 522/16 está em vigor desde 18 de abril de 2016 e, dentre outros aspectos, (i)
prevê o processo administrativo de irregularidade contratual (vide Decreto 572/2016 –
Cláusula Anticorrupção); (ii) detalha o trâmite do processo administrativo para apurar ato de
corrupção praticado junto a órgão estadual; (iii) define a competência das autoridades para

58
http://www.corregedoria.sp.gov.br/adm/App_Cadastro/Uploads/Visualizar.aspx?id=95
59
http://www3.prefeitura.sp.gov.br/cadlem/secretarias/negocios_juridicos/cadlem/integra.asp?alt=14052014D
%20551070000
60
http://app1.sefaz.mt.gov.br/0325677500623408/7C7B6A9347C50F55032569140065EBBF/1BDF5CF9533C
7C2F84257F9900442345

58

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celebrar de acordo de leniência; e (iv) Cria o Cadastro Estadual de Empresas Punidas –
CEEP, para reunir e disponibilizar informações acerca das sanções aplicadas.

21. Quadro comparativo: FCPA x UKBA x Lei n.º 12.846/1361

FCPA UKBA Lei n.º 12.846/13


Corrupção de
funcionários públicos Sim Sim Sim
estrangeiros
Corrupção de
funcionários públicos Não Sim Sim
nacionais

Alcance extraterritorial Sim Sim Sim

Não
Dispositivos contábeis
Sim Não (*incisos VI e VII do art. 42,
e de controles internos
Decreto n.º 8.420/15)
Sim
Outros atos lesivos Não Não
(atos ilícitos em licitações)
Exceção para
pagamento de Sim Não Não
facilitação
Responsabilidade Penal
Sim Sim Não
da PJ
Objetiva
Responsabilidade Subjetiva (por “failure to Objetiva
prevent bribery”)
Violação anticorrupção:
até USD 2.000.000
0,1% - 20% do faturamento
Violação dispositivo
bruto
Multas contábil: até USD Ilimitada
OU
25.000.000
R$ 6.000 a R$ 60.000.000
2x o benefício obtido ou
almejado
Publicação extraordinária da
Declaração de
Declaração de decisão condenatória,
Outras sanções inidoneidade, monitores,
inidoneidade suspensão ou interdição das
etc.
atividades, etc.
Sim
Crédito pela existência Sim
(defesa absoluta Sim
de programas de (U.S. Sentencing
para “failure to (até 4% de redução da pena)
compliance Guidelines)
prevent bribery”)
Sim
Crédito por reporte Sim (redução de até 2/3 da multa
Sim
voluntário e cooperação (mas limitado) e exclusão das demais
sanções)

61
Quadro comparativo preparado por Carlos Ayres.

59

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22. Compliance nas empresas públicas e sociedades de economia mista

É importante reconhecer que o Compliance não é destinado apenas a empresas privadas.


Com o advento da Lei n. 13.303/2016, o legislador brasileiro passou a exigir das empresas
estatais a implementação de um efetivo Programa de Compliance, inclusive com critérios
mais específicos do que aqueles previstos na Lei Anticorrupção e suas regulamentações.
Ainda, com sua vigência a referida norma estabeleceu o prazo de 2 anos para que tais
empresas promovam as adequações necessárias.

A Lei n. 13.303/2016 é datada de 1º de julho de 2016. Trata-se de uma norma de Direito


Administrativo, que dispõe sobre o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de
economia mista e de suas subsidiárias, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal ou
Municípios. Ela visa disciplinar a exploração direta de atividades econômicas pelo Estado,
regulamentando o artigo 173, parágrafo 1 o, da Constituição Federal.

22.1. Abrangência

EMPRESAS PÚBLICAS são pessoas jurídicas de direito privado, com criação autorizada por
lei e com patrimônio próprio, cujo capital social é integralmente detido pela União, por um
Estado, pelo Distrito Federal ou por um Município.

Elas podem ter a participação de outras pessoas jurídicas de direito público interno e de
outras entidades da administração pública indireta, como autarquias e fundações, desde que
a maioria do seu capital permaneça com a União, o Estado, o Distrito Federal ou o Município.

São exemplos de empresas públicas no âmbito da Federal a Caixa Econômica, o BNDES,


os Correios, e a INFRAERO. Estaduais temos a Empresa Maranhense de Administração
Portuária – EMAP e a Empresa Gaúcha de Rodovias – EGR. Já a nível municipal temos a
Empresa Municipal de Informática – EMI do Recife e a Empresa de Desenvolvimento Urbano
e Social – URBES de Sorocaba.

Já as SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA são pessoas jurídicas de direito privado, com


criação autorizada por lei, sob a forma de sociedade anônima, cujas ações com direito a voto
pertençam em sua maioria a União, um Estado, o Distrito Federal ou Município, ou ainda, a
alguma entidade da administração indireta.

São exemplos de sociedades de economia mista da União, o Banco do Brasil, a Eletrobrás


e a Petrobrás. No âmbito estadual, a Companhia Energética de Minas Gerais – CEMIG, a
Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo - SABESP e a Companhia do
Metropolitano de São Paulo – METRO. Já exemplos a nível municipal temos a Empresa de
Transportes e Trânsito de Belo Horizonte – BHTRANS, a Companhia Municipal de Limpeza
Urbana do Rio de Janeiro – COMLURB e a Companhia Metropolitana de Habitação de São
Paulo – COHAB.

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22.2. Regras de Integridade

A Lei n. 13.303/2016 estabeleceu que as empresas estatais cumpram regras de governança


corporativa, transparência, gestão de riscos e controles internos, estabelecendo políticas
claras de integridade empresarial, composição da administração e de proteção aos seus
acionistas, quando as companhias foram de capital aberto. Não há dúvidas de que o Estatuto
Jurídico das Empresas Estatais integra esse microssistema e, por isso, deve com ele estar
absolutamente afinado em sua interpretação e aplicação, principalmente naquilo que diz
respeito à Lei Anticorrupção Empresarial, diploma do qual ele mais se aproxima.

22.2.1. Transparência

Em relação à Transparência, as estatais estão obrigadas a publicar anualmente uma carta


assinada pelos membros do Conselho de Administração, contendo informações claras como
políticas públicas criadas e implementadas, qual o interesse coletivo que justifica sua criação
e manutenção, seu planejamento estratégico e quais os impactos econômicos dos seus
objetivos. Ainda devem adequar seus estatutos às leis que as criaram e divulgar suas
estruturas internas de controles, fatores de risco, dados econômico-financeiros, desempenho
e remuneração dos colaboradores, composição dos conselhos e diretorias, políticas e
procedimentos de Governança Corporativo, Compliance e Gestão de Riscos. Tudo em
respeito também à Lei de Acesso à Informação.

22.2.2. Programa de Compliance

Os parâmetros mínimos de um Programa de Compliance que são exigidos das estatais são:
a) criação de uma instância interna responsável pela atualização e aplicação do Programa
de Integridade, com reporte direto ao Conselho de Administração; b) a edição e atualização
de um Código de Conduta com princípios, valores e missão contendo prevenção de conflito
de interesses e vedação de atos de corrupção e fraude; c) a criação, gestão e divulgação de
um canal de denúncias com política efetiva de proteção ao denunciante de boa-fé e aplicação
das sanção devidas e proporcionais nos casos de violação; d) treinamentos periódicos aos
colaboradores e conselheiros.

No entanto, é importante lembrar que um Programa de Compliance deve seguir os


parâmetros estabelecidos nos artigos 41 e 42, do Decreto n. 8420/2015, que regulamenta a
Lei Anticorrupção no âmbito federal.

22.2.3. Controles internos, gestão de risco e conformidade

Em relação às áreas internas a serem criadas e estruturadas, com previsão expressa nos
estatutos, destacam os controles internos e gestão de risco, Compliance, auditoria interna e
conformidade. A área de controles internos e gestão de risco deve ser vinculada ao diretor-
presidente e liderada por diretor estatutário, para implementação e fiscalização de
mecanismos eficiente de controles para administradores e empregados, além de mapear e
gerir os riscos da empresa. Já a área de CONFORMIDADE deve absorver um comitê

61

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estatutário para verificar a conformidade na indicação de membros do Conselho de
Administração e Conselho Fiscal.

22.2.4. Licitações e Contratos Administrativos

Um outro ponto interessante dessa lei se apresenta no sentido de que ela veio regular,
inclusive, o artigo 173, § 1º, inciso III, da Constituição Federal, o qual determina que o
Estatuto Jurídico das Empresas Estatais deva dispor sobre “licitação e contratação de obras,
serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública”.

Assim, a Lei n. 13.303/2016 procurou disciplinar a estrutura do procedimento licitatório de


modo geral e deixou que os regulamentos internos de licitações e contratos de cada empresa
estatal complementem esse procedimento, trazendo cada um deles as regras próprias que
atentem para as especificidades de cada uma das estatais.

Por outro lado, frustrou as expectativas da comunidade jurídica de um modo geral, pois não
trouxe grandes inovações em relação ao procedimento licitatório, repetindo as fórmulas da
Lei Geral de Licitações e perdendo, assim, uma ótima oportunidade de modernizar e
simplificar os modelos já existentes.

23. Compliance como requisito para contratar com o Poder Público

A partir de 2017, uma série de entes federados passaram a adotar normas que exigem dos
contratantes com o poder público, a obrigatoriedade de implementação de programas de
compliance.

O primeiro estado a apresentar essa iniciativa foi o Rio de Janeiro, com a Lei nº7753/2017,
que define a exigência do Programa de Integridade, quando empresas que celebrarem
contrato, consórcio, convênio, concessão ou parceria público--privado com a administração
pública direta, indireta e fundacional do Estado, quando os valores sejam superiores a R$
1.500.000,00 para obras e serviços de engenharia e R$ 650.000,00 para compras e serviços
e o prazo do contrato seja igual ou superior a 180 dias (os requisitos são CUMULATIVOS).

O prazo para o cumprimento da obrigação é de 180 dias a partir da assinatura do contrato,


sob pena de multa de 0,02% por dia, incidente sobre o valor do Contrato, limitado a 10% do
e a impossibilidade de contratação com a administração pública até o cumprimento da
obrigação, sendo a implantação fará cessar a aplicação, mas não implicará ressarcimento
das multas aplicadas.

Em sequências outros entes como o Distrito Federal, os estados do Rio Grande do Sul,
Amazonas e Goiás e os municípios de Vila Velha e Aracajú, adoram similar iniciativa, que é
objeto de projeto de lei em diversos outros entes.

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VERSÕES

Data Versão Descrição Autores


Daniel Sibille (Coordenador do Curso de
Compliance Anticorrupção da LEC)
1.0 Criação
14/09/2016
Cláudia Massaia (Monitora do Curso de
Compliance Anticorrupção da LEC)

Fábio Risério (Coordenador do Curso de Gestão


01/2017 1.1 Revisão
e Riscos, Crises e Continuidade de Negócios)

Cláudia Massaia (Monitora do Curso de


21/04/2017 1.2 Revisão
Compliance Anticorrupção da LEC)

Atualização,
Matheus Cunha (Coordenador do Curso Online
11/10/2017 1.3 revisão e
Anticorrupção da LEC em 2017)
remodelagem

Atualização e
31/10/2019 1.4 Matheus Cunha
revisão

QUADRO DE ATUALIZAÇÃO PERIÓDICA

Data Pag. Descrição Referência


31/10/2019 17 Imagem Índice de Percepção da Corrupção 2018
Melhores e piores países no Índice de
31/10/2019 17/18 Quadro
Percepção da Corrupção 2018
Situação histórica do Brasil no Índice de
31/10/2019 18 Quadro
Percepção da Corrupção
31/10/2019 30 Quadro 10 maiores multas da FCPA
Lista das empresas sob investigações das
autoridades norte-americanas (SEC e do DOJ).
04/06/2017 31/32 Quadro
Obs. A partir de 2017 a referida listagem parou
de ser publicada, o que impede a atualização
Contagem por país das empresas sob
investigações das autoridades norte-
09/10/2017 32/33 Quadro americanas. Obs. A partir de 2017 a referida
listagem parou de ser publicada, o que impede a
atualização

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