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O Diretor de Aeródromo e as suas funções

Margarida Dias Baptista Tempera

O presente artigo elaborado para fins de avaliação do IV Curso de Pós-Graduação em


Direito Aéreo ministrado pelo Centro de Investigação de Direito Privado da Faculdade
de Direito da Universidade de Lisboa pretende debater o papel do diretor de aeródromo e
as suas funções.

Sumário: 1. Introdução; 2. O diretor de aeródromo; 2.1. Decreto-Lei número 186/2007


de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio; 2.1.1.
Classificação de aeródromos; 2.1.2. Funções a exercer pelo DA; 2.1.3. Violação dos
deveres do diretor de aeródromo; 2.2. Programa Nacional de Segurança na Aviação Civil;
2.3. Manual de aeródromo; 2.3.1. Manual do aeródromo municipal de Cascais; 3. Notas
em tom conclusivo; 4. Referências Bibliográficas.

Abreviaturas

AMC- Aeródromo Municipal de Cascais

ANAC- Autoridade Nacional da Aviação Civil

ANSAC-Autoridade Nacional da Segurança da Aviação Civil

CAFALSEC- Comissão aeroportuária de facilitação e segurança da aviação civil

DA- Diretor de Aeródromo

NAV- Navegação Aérea de Portugal

PSP- Polícia de Segurança Pública

SEF- Serviço de Estrangeiros e Fronteiras

SNSAC- Sistema Nacional de Segurança da Aviação Civil

1
1. Introdução

O aeródromo é a área definida em terra ou na água, incluindo edifícios, instalações e


equipamentos, destinada a ser usada no todo ou em parte para a chegada, partida e
movimento de aeronaves1 e assim sendo, a si está inerente um conjunto de atividades,
obrigações e responsabilidades, para que a sua atividade seja definida como segura.

O transporte aéreo, ao ser caraterizado como uma atividade exponencial, denota de


constantes modificações legais a ele inerentes, uma vez que, neste setor, uma falha
genérica pode assumir uma relevância de dimensões preocupantes- tal como se verificou
no 11 de setembro de 2001, o dia que marcou a aviação civil como o dia em que nos
tornamos mais cientes de que é necessária uma constante otimização dos sistemas e
procedimentos de segurança para que atos terroristas ou atos ilícitos não entrem na esfera
deste setor.

Assim sendo, não me afastando do tema a expor, importa saber em que medida é
relevante a figura do diretor de aeródromo na prossecução da segurança operacional e da
segurança contra atos ilícitos.

As funções do diretor de aeródromo, os deveres, direitos e responsabilidade a elas


inerentes, são os temas que pretendo dissertar. Serão trazidos os aspetos considerados
mais importantes, tendo em conta a pesquisa efetuada e os conhecimentos adquiridos
durante a frequência deste Curso de Pós-Graduação em Direito Aéreo ministrada na
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

De antemão, importa definir o que se entende por diretor de aeródromo.

Diretor de aeródromo é a entidade responsável pela segurança aeroportuária. É o


representante do Estado no aeródromo, pois colabora na prossecução do interesse público
estatal da segurança da aviação. Consequentemente, ele é crucial para o funcionamento
de qualquer aeródromo.

1
Cfr. o artigo 2.º, alínea a) do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.

2
É então um dos agentes com atuação direta e imediata na garantia da segurança da
aviação civil.

Visto estes considerandos introdutórios, dirige-se a análise deste concreto agente.

2. O diretor de aeródromo

O diretor de aeródromo é o elemento designado pelo operador do aeródromo, após


prévia autorização da Autoridade Nacional da Aviação Civil2, doravante ANAC, que
superintende o respetivo funcionamento e assegura o cumprimento das leis e
regulamentos em vigor, e o dos procedimentos estabelecidos no manual do Aeródromo3.

Este é assim a entidade responsável perante a ANAC relativamente à supervisão do


cumprimento das normas, regulamentos e instruções desta autoridade em matérias
respeitantes à segurança operacional, segurança e facilitação4.

Este agente é imprescindível para o funcionamento de todos os aeródromos, sendo


que, salvo a exceção dos aeródromos de classe I5, todos os aeródromos devem possuir um
diretor, sob pena de não ser emitido um certificado de aeródromo, caso esta figura não
seja identificada6.

Sendo o diretor de aeródromo um agente tão importante na prossecução da atividade


do aeródromo, legalmente está disposto que este deve ter na sua posse habilitações
adequadas para o desempenho da sua função. Tal, apesar de constar da letra da lei7, não

2
Cfr. o artigo 25.º, número 2 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
3
Cfr. o artigo 7º., alínea f) do Regulamento número 1079/2020 de 11 de dezembro.
4
Cf.r o artigo 25.º, número 2 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
5
Matéria abordada no ponto 2.1.1. do presente trabalho.
6
Cfr. o artigo 9.º, número 1, alínea b) do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo
Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio.
7
Cfr. o artigo 25.º, número 7 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.

3
é totalmente linear, pois não foi concebida qualquer legislação complementar na qual
conste quais as habilitações necessárias para o desempenho deste cargo.

Visto isto, de acordo com a ANAC, o candidato deve possuir conhecimentos e


experiência de infraestruturas aeronáuticas.

O currículo do agente a desempenhar as funções de diretor de aeródromo deve ser


entregue à ANAC, Autoridade responsável pela análise e aprovação do mesmo.

2.1.Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei


número 55/2010, de 31 de maio

O Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei número


55/2010, de 31 de maio fixa as condições de construção, certificação e exploração dos
aeródromos civis nacionais e estabelece os requisitos operacionais, administrativos, de
segurança e de facilitação a aplicar nessas infraestruturas8.
Aqui encontram-se estabelecidas as disposições relativas às funções a exercer pelo
diretor de aeródromo, alguns dos seus deveres e de que modo esta figura influencia a
existência ou não de um aeródromo.

2.1.1. Classificação de aeródromos

A classificação operacional de aeródromos civis é efetuada para efeitos de ordenamento


aeroportuário9, sendo que, para que seja emitido um certificado de aeródromo, há uma série
de requisitos a ser cumpridos, entre os quais a indicação de um diretor de aeródromo10.

8
Cfr. o artigo 1.º, número 1 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
9
Cfr. o artigo 1.º, número 2 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
10
Cfr. o artigo 9.º, número 1, alínea b) do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo
Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio.

4
Os aeródromos encontram-se classificados por ordem crescente, em classes de I a IV,
em função dos critérios de natureza operacional, administrativa, de segurança e de
facilitação11.
A classificação dos aeródromos em classes de I a IV depende da verificação de alguns
requisitos administrativos, sendo que os aeródromos de classes II a IV devem possuir um
diretor de aeródromo e o aeródromo de classe I, ao invés de possuir um diretor de aeródromo,
pode antes possuir um responsável de aeródromo, conforme determinação da ANAC, em
função da atividade do aeródromo12.

2.1.2. Funções a exercer pelo DA

As funções a exercer pelo Diretor de Aeródromo são vastas, estando as suas


competências e responsabilidades descritas no artigo 25.º do Decreto-Lei número
186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio.

A complexidade das funções exercidas pelo diretor de aeródromo é evidenciada pela


multiplicidade de referências regulamentares que determinam os seus poderes
administrativos e lhe conferem poderes de autoridade.

Assim sendo, o exercício do seu poder realiza-se, sobretudo, através do desempenho


das funções de polícia, vigilância e controlo do aeródromo, bem como das tarefas de
coordenação, segurança e operação, na prossecução do interesse público13, pois o diretor
de aeródromo é a figura institucional que coordena a atividade do aeródromo.

O diretor de aeródromo exerce também a função de supervisão. Esta função é deveras


complexa, pois tem o objetivo de assegurar que a atividade de transporte aéreo é realizada
em conformidade com a legislação internacional, comunitária e nacional.

11
Cfr. o artigo 13.º, número 1 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
12
Cfr. o artigo 14.º, número 2, alínea a) do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo
Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio.
13
Cfr. DE STTEFANI, GEORGIO- Obblighi e responsabilità del direttore di aeroporto, in Atti del
convegno e responsabilità Cagliari, 24-25 ottobre 2003, Cagliari: Edizioni AV, 2005, p.35.

5
O diretor de aeródromo tem a sua responsabilidade ligada ao exercício da função
pública14.

Visto isto, o diretor de aeródromo deve fiscalizar todas as atividades operacionais;


deve supervisionar o cumprimento das normas, regulamentos e instruções da ANAC em
matérias respeitantes a segurança operacional, segurança e facilitação; deve comunicar à
ANAC todas as ocorrências suscetíveis de afetarem a segurança operacional do
aeródromo e deve participar à ANAC e à autoridade policial competente quaisquer atos
ilícitos15.

A atribuição pelo legislador dos deveres supra mencionados confere ao diretor de


aeródromo um conjunto de competências no exercício das suas funções, designadamente
competências de fiscalização16.

Face à fiscalização de todas as atividades operacionais, é atribuído ao diretor de


aeródromo (e ao seu substituto) o direito a solicitar a apresentação dos documentos de
bordo de qualquer aeronave e respetiva tripulação, sendo que, sempre que os mesmos
não forem apresentados aquando da sua solicitação e que tal figure uma recusa ilegítima,
o agente está sob pena de prática de contraordenação, estando consubstanciados indícios
da prática de um crime de desobediência17. O diretor ou quem o substitua deve então, no
momento em que o sujeito se recuse a apresentar a documentação, comunicar ao mesmo
que tal recusa configura crime de desobediência. O diretor deve também chamar os
serviços e forças de segurança mais próximos para que o indivíduo seja identificado e
elaborada a respetiva participação. O agente em incumprimento deve retirar-se de
imediato da infraestrutura. O diretor deve assim comunicar o sucedido à ANAC para que
esta autoridade possa tomar as devidas medidas.

14
Cfr, DE STTEFANI, GEORGIO- Obblighi e responsabilità del direttore di aeroporto, in Atti del
convegno e responsabilità Cagliari, 24-25 ottobre 2003, Cagliari: Edizioni AV, 2005, p.34.
15
Cfr. o artigo 25.º do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei número
55/2010, de 31 de maio.
16
Competências previstas no artigo 18.º, número 1, alínea d) do Decreto-Lei número 10/2004 de 9 de
janeiro.
17
P.p. no Artigo 348º. do Código Penal Português.

6
Esta é assim uma responsabilidade funcional do diretor perante a ANAC, pois este é
um dos agentes com atuação direta e imediata na garantia da segurança da aviação civil.18

As funções policiais atribuídas ao diretor de aeródromo são competências relevantes,


pois podem afetar também a esfera jurídica de terceiros que operam no aeroporto.

Sendo que é vasto o leque de deveres do diretor de aeródromo adveniente das


competências e responsabilidades a este atribuídas pelo artigo 25º. do Decreto-Lei em
análise, encontramos na Circular de Informação Aeronáutica número 21/2010 de 9 de
agosto exaustivamente enumerada a lista de deveres pelos quais o diretor de aeródromo
deve zelar.

2.1.3. Violação dos deveres do diretor de aeródromo

O diretor de aeródromo é responsável perante a ANAC, sendo que a sua função


pressupõe o cumprimentos dos mais diversos deveres. Sempre que tais deveres forem
violados, será instaurado um processo especial de inquérito, com vista à eventual perda
da titularidade do cargo19.

Este processo especial de inquérito é instruído, com vista ao apuramento dos fatos,
pela ANAC sempre que esta Autoridade tiver conhecimento, por qualquer meio, da
violação destes deveres do diretor de aeródromo20.

Estando o processo em curso, antes da decisão ser proferida, deverá ocorrer sempre a
audição prévia do diretor de aeródromo sobre as razões invocadas para a instauração deste
processo21.

18
Cfr. a Circular de Informação Aeronáutica número 12/2017 de 13 de dezembro.
19
Cfr. o artigo 26.º, número 1 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
20
Cfr. o artigo 26.º, número 1 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
21
Cfr. o artigo 26.º, número 2 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.

7
O DA pode, como medida cautelar, ter as suas funções suspensas de imediato, caso
tal se revele necessário para a instrução do processo ou para a defesa da segurança da
aviação civil22 ou, quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o
justifiquem, pode a ANAC comunicar ao diretor a decisão de proferir uma admoestação
e ainda determinar que o mesmo adote o comportamento legalmente exigido dentro do
prazo que a ANAC lhe fixe para o efeito.23

Caso o diretor de aeródromo não acate a admoestação prevista ou este não adote o
comportamento legalmente exigido, o processo prossegue com vista à perda da
titularidade do cargo de diretor24.

Na eventualidade da decisão a favor da perda da titularidade do cargo , deve ser


nomeado um novo diretor, pelo operador, no prazo máximo de 15 dias25.

2.2. Programa Nacional de Segurança na Aviação Civil

O Programa Nacional de Segurança foi adotado por Portugal, no decorrer das medidas
implementadas no plano europeu e internacional como reforço dos sistemas de segurança
na aviação civil pelo Decreto-Lei 142/2019 de 19 de setembro.

No âmbito deste Programa encontra-se definida a respetiva organização, as


atribuições e objetivos e as regras e procedimentos de segurança, estando também
estabelecido o Sistema de Segurança da Aviação Civil, estruturado em quatro níveis de
atuação (o nível político/estratégico, o nível de coordenação técnica, o nível de gestão e

22
Cfr. o artigo 26.º, número 3 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
23
Cfr. o artigo 26.º, número 4 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
24
Cfr. o artigo 26.º, número 5 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.
25
Cfr. o artigo 26.º, número 8 do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio, alterado pelo Decreto-Lei
número 55/2010, de 31 de maio.

8
o nível da operação). O nível da operação, a nível aeroportuário é composto pelo diretor
do aeroporto2627.

Não desviando do tema a abordar, o diretor de aeródromo, no âmbito da segurança


aeroportuária tem como competências28:

- Supervisionar e coordenar o sistema de segurança aeroportuária, definido no


programa de segurança do aeródromo;

- Assegurar a implementação e a operação do centro de operações de emergência;

- Assegurar a implementação e o funcionamento do centro de operações de segurança


do aeródromo;

- Aprovar regras de procedimento em execução e adaptação local das normas legais


e regulamentares em matéria de segurança da aviação civil;

- Assegurar a aplicação do cumprimento das leis, regulamentos, normas e requisitos


técnicos vigentes, em matéria de segurança da aviação civil;

- Submeter o programa de segurança do aeródromo à aprovação da ANSAC;

- Dar cumprimento às orientações e determinações da ANSAC;

- Autorizar, com a observância dos requisitos previstos nas normas de base comuns e
demais legislação aplicável, a emissão de cartões de identificação aeroportuária que
permitam o acesso ao lado ar ou à zona restrita de segurança, ou a partes desta, do
respetivo aeródromo;

- Convocar e presidir as reuniões da CAFALSEC;

26
A definição de aeroporto encontra-se no artigo 2º. alínea f) do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de
maio, alterado pelo Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio, sendo ela: «Aeroporto» o aeródromo que
dispõe de forma permanente de instalações, equipamentos e serviços adequados ao tráfego aéreo
internacional, de acordo com as condições estabelecidas no presente decreto-lei.
27
Cfr. Artigo 5º. do Decreto-Lei número 142/2019 de 19 de setembro.
28
Cfr. Artigo 13º. do Decreto-Lei número 142/2019 de 19 de setembro.

9
- Informar o serviço executivo da ANSAC, sobre o estado de implementação das
normas, recomendações e procedimentos em vigor, no respetivo aeroporto ou aeródromo,
sempre que solicitado.

Caso ocorra, por parte do diretor de aeródromo a violação destes deveres no âmbito
da segurança aeroportuária, será instaurado um processo especial de inquérito, pela
ANAC, com vista ao apuramento dos fatos29.

O diretor de aeródromo deve ainda implementar medidas e definir tarefas no âmbito


da segurança aeroportuária, que serão executadas pelo gabinete de segurança do
aeródromo, coordenado pelo gestor de segurança do aeródromo30 e presidir o centro de
operações de emergência, que é o serviço de coordenação de situações de emergência31.

2.3. Manual de aeródromo

O Regulamento número 36/2013, de 21 de janeiro padroniza a informação que o


manual de aeródromo deve abranger, estando nele definidas as especificações dos
elementos a incluir no manual32. Sendo este trabalho relativo ao papel e funções a
executar pelo diretor de aeródromo e não relativo aos pressupostos presentes no manual,
considero relevante a análise de um concreto manual de aeródromo.

Assim sendo, o Manual do Aeródromo Municipal de Cascais será objeto deste estudo.

2.3.1. Manual do aeródromo Municipal de Cascais

Visto que decorre do artigo 25º. do Decreto-Lei número 186/2007 de 10 de maio,


alterado pelo Decreto-Lei número 55/2010, de 31 de maio que todos os aeródromos
devem ter um diretor que superintenda os procedimentos estabelecidos no manual de

29
Cfr. Artigo 13º. número 2 do Decreto-Lei número 142/2019 de 19 de setembro.
30
Cfr. Artigo 14º. do Decreto-Lei número 142/2019 de 19 de setembro.
31
Cfr. Artigo 15º. do Decreto-Lei número 142/2019 de 19 de setembro.
32
Cfr. Artigo 1º. do Regulamento número 36/2013 de 21 de janeiro.

10
aeródromo, importa analisar o manual de um aeródromo de forma a compreender quais
os deveres que, por norma, deste advêm.

Ainda antes de entrar efetivamente nos preceitos constantes do manual, temos


disposto no número 8 do artigo acima referido que o manual de aeródromo deve
identificar expressamente o substituto do respetivo diretor, nas suas ausências, bem como
prever as competências que o mesmo delegue naquele, ou noutros funcionários ao serviço
do aeródromo, em conformidade com legislação complementar.

Assim sendo, no caso do Aeródromo Municipal de Cascais, doravante AMC o diretor


de aeródromo é apoiado pelos serviços de safety e security33 e coadjuvado pelo
coordenador de operações, estando este indicado como o seu substituto na sua ausência.

O diretor de aeródromo tem responsabilidade para com a Cascais Dinâmica, sendo


que este deve assegurar aos clientes e utentes a prestação dos serviços do aeródromo em
condições de segurança e de qualidade, cabendo-lhe assim34:

- Coordenar a atividade dos diversos operadores presentes no aeródromo;

- Assegurar a interface com outras entidades presentes no serviço do aeródromo,


designadamente e quando aplicável: Alfândega; PSP e SEF;

- Garantir a segurança das operações realizadas no lado ar do aeródromo municipal


de cascais;

- Assegurar a eficaz prestação dos serviços de assistência em escala e fiscaliza o seu


exercício;

- Supervisionar os serviços de Operações, de Salvamento e Luta contra Incêndios


(SSLCI), os Comerciais (COM) e os de Manutenção (SM);

- Garantir níveis de qualidade apropriados nos diversos serviços aos clientes.

Neste caso foi delegado no coordenador de operações a competência de assegurar que


o diretor de aeródromo toma conhecimento de todas as situações que possam ser inerentes
a comunicações obrigatórias à ANAC.

33
Safety é a segurança operacional e a Security a segurança contra atos ilícitos.
34
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.23.

11
Posto isto, no manual do AMC estão atribuídas as seguintes competências ao diretor
de aeródromo:

- O DA é o responsável máximo pela segurança contra atos ilícitos no aeródromo35;

- O DA providenciará, pelo menos uma vez por ano, uma auditoria ao aeródromo na
área da segurança36;

- O DA investigará, dentro do serviço de segurança contra atos ilícitos, os arquivos


da formação resultantes do recrutamento e treino de pessoal, de forma a inteirar-se de
alguma anomalia37;

- O DA é responsável por supervisionar a eficácia de todas as medidas de segurança


do Programa de Segurança do Aeródromo, elaborando para o efeito um relatório anual
das atividades de segurança desenvolvidas no aeródromo. Esta avaliação será feita de 2
em 2 anos38;

- O DA é responsável pela identificação da necessidade de emendar o MVFR39, sendo


a mesma feita pelos serviços de Informação Aeronáutica da NAV Portugal. A atualização
do MVFR processa-se através de emendas ao mesmo e para o cumprimento deste objetivo
e em conformidade com o estabelecido, o DA será responsável pela manutenção
permanente e atualizada dos dados constantes no MVFR relativos ao aeródromo40;

35
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.44.
36
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.45.
37
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.45.
38
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.46.
39
Manual Visual Flight Rules é a publicação emitida pelo prestador de serviços de informação aeronáutica
em nome do Estado Português, que contém informação aeronáutica de caráter duradouro, destinada à
navegação aérea segundo as regras visuais. cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª
Revisão, 2 de setembro de 2020, p.55.
40
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.54.

12
- O DA é responsável por elaborar uma notificação que origine um suplemento ao
AIP41, sempre que se verifique uma alteração permanente da informação constante e neste
publicada42;

- O DA é responsável pela elaboração de notificação que origine um NOTAM 4344;

- O DA pode emitir cartões de acesso pontual ao aeródromo, caso estes sejam emitidos
localmente. Quando se trate de cartões de acesso a viatura, a entidade ou a serviço, o DA
receciona os seus pedidos, reencaminhando a informação para o coordenador de
operações45;

- Face a anomalias de grau crítico, o DA colabora para que seja providenciada a


implementação de medidas de contingência, de forma que os efeitos da anomalia
operacional do aeródromo se atenuem46;

- Caso haja acidentes/acidentes na placa de estacionamento, estes devem ser


reportados ao DA47, sendo que, caso estejamos perante uma situação em que seja
necessária a remoção de uma aeronave cujo proprietário ou operador se encontrem
incapazes ou revelem comportamentos dilatórios, o DA tem autoridade para agir de
imediato em substituição dos responsáveis, de forma a preparar a devida remoção da
aeronave em causa48;

- O DA é responsável pela implementação e revisão do sistema de gestão de segurança


operacional49;

41
Aeronautical Information Publication é a publicação de informação aeronáutica emitida sob
responsabilidade do Estado. cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de
setembro de 2020, p.14.
42
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.55.
43
Notice to Air Man é o aviso à navegação aérea cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª
Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.44.
44
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.56.
45
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.62.
46
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.80.
47
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.90.
48
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.101.
49
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.122.

13
- O DA é incumbido, em conjunto com o responsável pelo sistema de gestão de
ocorrências, de definir que ocorrências investigar. O DA é também responsável por
nomear uma equipa ou investigador de forma a ser auferida qual a causa principal dos
eventos registados50;

- Caso ocorram alterações permanentes ou temporárias que se verifiquem na


organização, pessoal, sistemas, processos, procedimentos, equipamentos ou legislação
aplicável, a autorização para o plano de trabalhos deve ser dada pelo DA ou, se necessário,
pela Administradora Executiva51.

3. Notas em tom conclusivo

Em tom conclusivo importa destacar dois aspetos relevantes neste estudo: a


desproporcionalidade encontrada relativamente às sanções aplicadas ao diretor de
aeródromo e a forma como este agente tem a sua independência e autonomia asseguradas.

Assim sendo, face à desproporcionalidade devemos destacar que o diretor de


aeródromo possui um vasto leque de funções e de deveres e, devido à sua complexidade,
o seu cumprimento por vezes pode advir de terceiros ou mesmo ser incompatível, na sua
integra.

Há graves dificuldades de coordenação entre os sujeitos que operam no setor


aeroportuário, sendo que ocorre uma confusa sobreposição de papéis e funções, que
resultam em adversidades operacionais para o desempenho do tráfico, que se podem
traduzir em riscos sérios para os usuários52.

Recorrendo ao Manual do Aeródromo Municipal de Cascais podemos verificar que


no mesmo está disposto que o responsável por alocar recursos e verbas à atividade do
aeródromo e por providenciar que a organização obtenha recursos humanos e materiais
necessários ao seu funcionamento não é o diretor de aeródromo e, posto isto, este apenas

50
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.144.
51
Cfr. Manual do Aeródromo Municipal de Cascais, 2ª Edição, 2ª Revisão, 2 de setembro de 2020, p.145.
52
Cfr. MORANDI, FRANCESCO- Obblighi e responsabilità del direttore di aeroporto, in Atti del convegno
e responsabilità Cagliari, 24-25 ottobre 2003, Cagliari: Edizioni AV, 2005, p.42.

14
tem a capacidade de assegurar o funcionamento do aeródromo dentro destes limites,
sendo necessário sempre uma intervenção de terceiros para que sejam supridas algumas
das necessidades do aeródromo. Por conseguinte, como podemos imputar ao diretor a
obrigação de superintender o funcionamento do aeródromo, quando este não depende na
totalidade deste agente?

Realçando o dever que o diretor de aeródromo possui de fiscalizar todas as atividades


operacionais, sendo-lhe para tal conferido o direito de solicitar a apresentação de
documentos de bordo de qualquer aeronave e os da respetiva tripulação, podemos
verificar que tal não é suscetível de cumprimento na sua integra, pois a função do controlo
documental não pode ser exercida efetuando um controlo pleno e total de toda e qualquer
aeronave e sim um controlo eminentemente documental, sob pena de hiperestesiar os
deveres a cargo do diretor de aeródromo53. Assim sendo, a apreciação da culpa deve ser
efetuada à luz da diligência do homem médio normal, nunca esquecendo que este único
direito estabelecido para o diretor de aeródromo advém de uma das suas obrigações. Tal
dever é um pouco controverso, pois ao depender de terceiros não pode ser inteiramente
cumprido pelo diretor aquando de uma intervenção independente.

Advindo assim o seu direito de uma das suas obrigações, será que as contraordenações
a aplicar ao diretor de aeródromo são desproporcionais na medida em que os seus direitos
se resumem ao direito de fazer cumprir com os seus deveres?

O segundo aspeto relevante para este estudo é a autonomia e a independência que o


diretor de aeródromo possui.

O diretor de aeródromo opera em nome do seu operador e em nome da Autoridade


Nacional da Aviação Civil.

Assim sendo, é a figura institucional que coordena a atividade do aeródromo, cuja


responsabilidade está ligada ao exercício da função pública. É o representante do Estado
no aeródromo e responsável perante a ANAC.

Visto isto, ao lhe serem exigidas garantias de imparcialidade e isenção, será que este
pode exercer uma dupla função no sentido de operar em nome de uma Câmara Municipal

53
ALVES, HUGO RAMOS- O diretor de aeródromo, in Direito Aéreo Uma Introdução, AAFDL Editora,
2019, p.228.

15
enquanto, por vezes, seu funcionário subordinado a uma hierarquia e, cumulativamente,
ser representante da Autoridade Nacional da Aviação Civil enquanto agente do Estado,
sem qualquer contrapartida?

Em suma, o diretor de aeródromo não possui plena autonomia nem independência,


pois está subordinado ou dependente na aplicação das leis a instruções ou deliberações
do operador do aeródromo e não pode auto governar os interesses advenientes das suas
funções, respondendo apenas à letra da lei.

4. Referências bibliográficas

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de direito aéreo, Coimbra, Coimbra Editora, 2012.

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danos causados a terceiros que se encontram à superfície, in Estudos de direito aéreo,
Coimbra: Coimbra Editora, 2012.

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