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NOTÍCIAS

ma
ga-
5 fevereiro 2023 / Número 1602
Esta revista faz parte integrante
do Jornal de Notícias n.º 249/135
e do Diário de Notícias n.º 56173 e não
pode ser vendida separadamente

zi
ne
Igreja Católica
Radiografia a dias de ser
apresentado o relatório
dos abusos sexuais

AS DORES, OS DESAFIOS MANUAL DE INSTRUÇÕES PARA AS REUNIÕES


E AS LUTAS DAS PESSOAS TRANS NÃO SEREM UMA PERDA DE TEMPO
VISITE A EXPOSIÇÃO DN
TESOURO NACIONAL NO MUSEU DE MARINHA
17 DEZ 2022 - 28 FEV 2023 10H00 - 17H00 PRAÇA DO IMPÉRIO, LISBOA

O Museu de Marinha abre as portas ao espólio


do Diário de Notícias, reconhecido como Tesouro
Nacional. Uma exposição única, com os momentos
mais marcantes do país e do mundo, contados ao
longo de 158 anos pelo Diário de Notícias.

De 17 de dezembro a 28 de fevereiro, todos os dias das 10h00 às 17h00


(encerrado dias 25 de dezembro e 1 de janeiro). Sala Dom Luís I do Museu
de Marinha, Praça do Império, Lisboa
alma-
O MEU OBJETO
POR Sara Sofia Gonçalves
naque

RUI OLIVEIRA/GLOBAL IMAGENS

MUNDO “O meu objeto de eleição é um microfone. Além de me acompanhar em


palco e em estúdio, ao longo de mais de duas décadas de trabalho como mú-
SEGUNDO sico, tem um significado muito especial para mim. Recuemos ao início da
minha vida. Uma fase difícil e mais introspetiva da minha adolescência
Rapper e produtor permitiu-me dar voz e exteriorizar frustrações e sentimentos que há mui-
44 anos to necessitavam de ser enviados e libertados para o espaço. É por isso que
afirmo que o microfone, mais do que parte do meu trabalho, é também um
instrumento de cura pessoal. Com o passar dos anos este objeto levou-me
a conhecer de lés a lés o meu país e a viajar inclusivamente além-frontei-
ras, partilhando experiências e pensamentos como forma de vida. Hoje,
não me imaginaria sem ele. No fundo, acabei por me profissionalizar com
No ano em que celebra três décadas este companheiro de batalha, que me tem acompanhado ao longo da vida,
de Segundo Piso, estúdio icónico tanto nos bons como nos maus momentos da minha caminhada. E, claro,
associado a si, está a preparar não podia deixar de escolhê-lo como sendo o objeto mais presente na mi-
o lançamento de um novo álbum. nha vida.” ●m

Notícias Magazine 05.02.2023 3


4
HISTÓRIA
DA SEMANA

e pés de barro

mudou de género

continua a lutar por um papel. Seja


São Luiz, em Lisboa, serviu de mote

Rodrigues assina as fotografias. P. 30


A crise é grave e exige mudanças. P. 20

O recente episódio ocorrido no Teatro

no mercado de trabalho, na educação,


Telhados de vidro

no palco da vida real, essa comunidade


Dois mil anos de história não garantem a

de pessoas trans. Ouviu-lhes as dores, os


gadores, fiéis, leigos e padres na tentativa

escondem traços relevantes para o futuro.

para a jornalista Ana Tulha ir ao encontro


de Abusos Sexuais de Crianças, a jornalista

no acesso à habitação ou à saúde. Reinaldo


de fazer um raio-X à Igreja. Ainda que num
país maioritariamente católico, os números
eternidade. A dias de ser conhecido o relató-

desafios, as lutas. E constatou que, também


Filomena Abreu falou com teólogos, investi-

A sociedade ainda não


rio da Comissão Independente para o Estudo

BEM-ESTAR
AS VERDADEIRAS
PROVAS DOS NOVE

COMPORTAMENTO
a testar sabores. P. 38

A EXIGÊNCIA DOS DENTES

as quais não se brinca. P. 52


REUNIÕES, ESSE PESADELO

Não servem só para mastigar.


São provadores oficiais. Helena

mais práticos e produtivos. P. 48


Comunicações que se resolviam

xeira traz propostas para sermos

um guia prático para cuidar deles


las para depois não haver conclu-

desde tenra idade. Há coisas com


sões. E o trabalho que se acumula
contaram ao jornalista Pedro Ema-

na secretária. A jornalista Sofia Tei-


nuel Santos como é a passar a vida

ma e na forma como falamos. A jor-


(mel), Manuel (água), Eduardo (gela-

Têm importância na nossa autoesti-


com um email. Horas e horas em sa-

nalista Sara Dias Oliveira mostra-nos


do) e José (queijo da Serra da Estrela)

noticiasmagazine.pt magazine@noticiasmagazine.pt @revistanoticiamagazine


Diretor-Geral Editorial Domingos de Andrade Diretora Inês Cardoso Diretores-adjuntos Manuel Molinos, Pedro Ivo Carvalho e Rafael Barbosa Diretor de Arte Pedro Pimentel Diretor-adjunto de Arte António Moreira
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tóvão, 195, 4049-011 Porto, Tel.: 222096100 Diretor digital Manuel Molinos Head of Social Media Artur Madeira Data Protection Officer António Santos Diretor Geral Comercial Miguel Simões Direção Comercial Porto: Vitor
Cunha; Lisboa: Pedro Veiga Fernandes; Classificados: Carlos Rebocho Publicidade (Norte) Edifício Jornal de Notícias, Rua Gonçalo Cristóvão, 195, 4049-011 Porto, Tel.: 222096172 / Fernanda Ally (diretora de conta), Sofia Silva
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Venda Seca – 2739-511 Agualva Cacém, Tel.: 214337000; Fax: 214326009 Depósito Legal n.º 55418/2001 Tiragem deste número 57 813 ex. Registada na ERC sob o n.º 126807 Conselho de Administração Marco Galinha
(Presidente), Domingos de Andrade, Guilherme Pinheiro, António Saraiva, José Pedro Soeiro, Kevin Ho, Phillippe Yip, Helena Ferro de Gouveia Secretário-geral Afonso Camões Propriedade Global Notícias – Media Group, S.A,
matriculada na Conservatória do Registo Comercial de Almada sob o NIPC 502535369. Detentores de 5% ou mais do capital da empresa: Páginas Civilizadas, Lda. - 29,75% KNJ Global Holdings Limited - 35,25%; José Pedro Soeiro

3
sumário#1602

05.02.2023 Notícias Magazine


- 24,5%; Grandes Notícias, Lda. - 10,5% Sede Rua Gonçalo Cristóvão, 195-219, 4049-011 Porto, Tel.: 222096100, Fax: 222006330 Filial Rua Tomás da Fonseca, Torre E, 3.º piso, 1600-209 Lisboa, Tel.: 213187500 Fax: 213187501
alma-
naque
FLASH

6 05.02.2023 Notícias Magazine


Serviços mínimos, contestação máxima
Depois das pujantes manifestações professores e pessoal não docente,
dos professores por todo o país, os ser- mas as aulas ficam de fora. Na ima-
viços mínimos. Desde a última quar- gem, a Escola João de Meira, em Gui-
ta-feira, 1, que as escolas estão obriga- marães. Nas grades, uma comprida tar-
das a garantir apoio aos alunos que be- ja branca não deixa ninguém esquecer
neficiam de medidas seletivas e adi- que nem os serviços mínimos cessam
cionais, aos que estão sinalizados pelas o protesto dos docentes. “Estamos em
CPCJ, aos mais vulneráveis também. greve! Por nós, pelos nossos alunos,
Os serviços mínimos decretados pelo pela Escola Pública e pela Educação, de
Colégio Arbitral dizem respeito à gre- qualidade e para todos!”, pode ler-se.
ve convocada pelo S.T.O.P. e abrangem FOTO: Miguel Pereira/Global Imagens

Notícias Magazine 05.02.2023 7


alma-
naque

ADOBE STOCK
RAIO-X
POR Ana Tulha

“Intolerável indefinição”
deixa eutanásia a marinar
À terceira não foi de vez e a despenalização da morte medicamente assistida
voltou a bater no poste. Juízes do Tribunal Constitucional (TC) apontaram o dedo
à conjunção utilizada na caracterização da tipologia do sofrimento – um “e”. Mas
não só. Partidos que escreveram o texto garantem que impasse é fácil de resolver.

O ARGUMENTO DO TRIBUNAL E ANTES?


CONSTITUCIONAL O diploma já tinha feito marcha-atrás em
A maioria dos juízes do Palácio Ratton en- duas ocasiões: em março de 2021, quan-
tendeu que a conjunção utilizada na ca- do o TC considerou excessivamente “in-
racterização da tipologia do sofrimento – determinado” o conceito de lesão defini-
“físico, psicológico e espiritual” – dá azo tiva de gravidade extrema; em novembro
a uma “intolerável indefinição”. Ou seja, do mesmo ano, quando o presidente da
entende o tribunal que o texto não é cla- República, Marcelo Rebelo de Sousa, ve-
ro sobre se este sofrimento tem de ser tou o diploma por causa da indefinição en-
“cumulativo” ou se basta que exista uma
das três dimensões antes referidas para
tre “doença grave”, “doença incurável” ou
“doença fatal”.
“O direito
que se possa recorrer à morte medica- a viver
mente assistida. Os juízes consideraram
ainda inconstitucionais outros artigos, re- DA CORREÇÃO DE UMA PALAVRA não pode
ferentes ao papel dos médicos e ao Có- AO REFERENDO transfigurar-se
digo Penal. Na reação à decisão do TC, Isabel Morei-
ra, do PS, defendeu que basta corrigir uma num dever
palavra, Cotrim Figueiredo, da IL, conside-
rou que se trata de mero “problema de re-
de viver em
dação” e José Manuel Pureza, do Bloco, qualquer
O número de juízes do
Tribunal Constitucional
concordou que está em causa uma “pe-
quena questão”. PAN e Livre apelaram a
circunstância”
que votou pelo veto ao di- uma resolução rápida do impasse. Nos par- JOÃO CAUPERS
ploma da eutanásia. O TC tidos que votaram contra a lei, o PCP ape- Presidente do Tribunal Constitucional,
é constituído por um total lou a uma maior reflexão, PSD e Chega de- citando uma frase do último acórdão
de 13 juízes. fenderam a realização de um referendo. do TC sobre esta matéria

8 05.02.2023 Notícias Magazine


1 ANO
PELO VALOR DE 6 M E S E S
*
PELO VALOR DE 6 MESES

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* Campanha válida até 28 de fevereiro de 2023, para uma assinatura digital anual da revista Volta ao Mundo, pelo valor de 19,90 €. Campanha não acu-
mulável com outras em vigor. Valor com IVA incluído. Para mais informações: assinaturas.quiosquegm.pt | apoiocliente@noticiasdirect.pt | 219249999
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alma-
naque
AS HISTÓRIAS OS ROSTOS
DA SEMANA
DOS DIAS
POR Sara Sofia Gonçalves

À direita, obra
encontrada num celeiro

Amesterdão abre Lula da Silva


em 2002. Em baixo,
autorretrato datado de

parque de bicicletas Presidente do Brasil


Acenando com a
1613-14

debaixo de água sugestão de criar


um grupo de países
para ajudar na ne-
Uma cidade futurista faz-se de acessos e infraestruturas que permi- gociação para a
tam a deslocação quotidiana em meios de transporte sustentáveis. paz, confirmou o
E Amesterdão, nos Países Baixos, é um exemplo de sucesso. A capital que estava em
inaugurou um parque de bicicletas (aqui não entra um único carro) aberto: o Brasil não
submerso, junto à Estação Central. A estrutura, que suporta cerca de vai enviar tanques
sete mil velocípedes, localiza-se debaixo dos canais de água e procura para a Ucrânia.
ser a solução para o estacionamento desordenado de bicicletas à su-
perfície. A obra custou cerca de 60 milhões de euros e demorou qua-
tro anos a ser construída. A capacidade do parque será expandida para
12 mil bicicletas quando, ainda neste mês de fevereiro, uma segunda OBRA DE
secção da estrutura submersa for inaugurada.
VAN DYCK
KOEN VAN WEEL/EPA

Ana Rita Cavaco


ENCONTRADA
Bastonária da Or-
dem dos Enfermeiros COBERTA
É acusada de dois
crimes de peculato DE FEZES
e dois de falsifica-
ção de documentos DE PÁSSARO
num processo do
Ministério Público
que indicia outros
13 colegas seus.

ESCOLA TEM AS
LUZES LIGADAS HÁ
MAIS DE UM ANO
PEDIATRAS Seis pediatras norte-americanos decidiram,
em nome da ciência e dos pais preocupados, Sérgio Conceição
Há quase um ano e
meio que as luzes da

ENGOLEM PEÇAS conduzir uma experiência fora do comum: to-


dos engoliram uma cabeça de boneco da Lego
Técnico do F. C. Porto
Levou os azuis e
Escola Secundária Min-
nechaug Regional, nos
DE LEGO EM NOME para determinar quanto tempo esta demora, brancos a erguer, Estados Unidos, não se

DA CIÊNCIA
em média, até ser expulsa do organismo. Os re- pela primeira vez, o desligam. Um proble-
sultados foram publicados numa revista cien- caneco da Taça da ma no software que
tífica dos Estados Unidos e concluíram que o Liga e somou um re- controla a iluminação
tempo médio de excreção do pequeno objeto é corde: com um total faz com que as lâmpa-
de 1,71 dias. Os médicos podem agora, com de nove conquistas, das se mantenham liga-
base científica, assegurar aos pais que um obje- passou a ser o trei- das 24 horas por dia – e
to de dimensões semelhantes será expulso do nador com mais tí- ninguém consegue re-
corpo em menos de dois dias. tulos nos dragões. solver o problema.

10 05.02.2023 Notícias Magazine


A CULTURA
SOTHEBY’S

Eva Ângelo
Por
Escolhas
da cineasta

MULHERES VISÍVEIS,
TRANSPORTE E UMA VOZ
JOANA CRAVEIRO
O contacto com os textos de Joana
Craveiro é precioso. Dramaturga,
antropóloga, atriz, encenadora,
realizou recentemente o documen-
tário “Elas também estiveram lá”,
sobre a invisibilidade das mulheres
Algures numa quinta em Kinderhook (Nova Iorque, Esta- em acontecimentos históricos. A
dos Unidos da América), esquecida dentro de um celeiro, sua escrita cruza diferentes figuri-
foi encontrada uma obra do artista Anthony van Dyck. O nos em que a recolha de histórias de
estado do quadro não era o melhor, já que foi achado co- vida é central na construção de
berto de fezes de pássaro. A descoberta aconteceu em narrativas em que memória e poesia
2002 e a pintura foi comprada por um colecionador por são traços essenciais. O humor subtil
menos de 600 euros. A autoria foi certificada em 2019 e, é outra força irresistível na sua obra.
quando em 2021 o colecionador detentor do quadro mor-
reu, a mesma foi entregue à casa de leilões Sotheby’s, que
a vendeu agora por 2,8 milhões de euros. BÉLA TARR
O quadro trata-se de um teste para uma obra final que está
atualmente em exibição no Museu Boijmans van Beunin- A sua cinematografia é uma forte
gen, em Roterdão (Países Baixos) e que retrata um homem experiência sensorial, “transporte”
nu sentado. puro. É surpreendente a forma como
trata a dignidade na errância, a esco-

7,5
lha dos lugares/atmosferas. Uma
alternativa de acesso à sua obra é a
coleção “Béla Tarr Volume I e II”,
com design e ilustrações belíssimas
de Rui Guerra.

INÊS MENESES
É uma voz singular. Nas suas entre-
vistas ouvimos conversas. Nelas
viajamos entre questões das mais
quilogramas é o peso com que simples e triviais às mais complexas
e contraditórias. “Fala com ela” e “O
uma criança nasceu no Hospital amor é”, com Júlio Machado Vaz, na
Padre Colombo, no Brasil. O recém- Antena 1, são companhia regular.
-nascido tem 60 centímetros e é um
dos bebés mais pesados nascidos
no Mundo. O recorde, de 10,2 Estreia a 16 de fevereiro “Morada”, filme documental
realizado por Eva Ângelo sobre a experiência de mulheres
quilogramas, mantém-se em Itália. cinéfilas, entre os 70 e os 90 anos, no Porto.

Notícias Magazine 05.02.2023 11


alma-
naque
MÁQUINA DO TEMPO
POR Filomena Abreu

DIREITOS RESERVADOS
???
DIREITOS RESERVADOS
HEMEROTECA MUNICIPAL DE LISBOA

Fu
Fundados a 14 de março de 1945
1945, por Ordem de Serviço de Humberto
Delgado, então diretor do Secretariado da Aeronáutica Civil, os Transportes
Aéreos Portugueses tiveram um rápido crescimento. A 19 de setembro de
1946 foi aberta a primeira linha comercial, entre Lisboa e Madrid, e a 31
de dezembro foi inaugurada a Linha Aérea Imperial, entre Lisboa, Luanda
(na então ‘colónia’ de Angola) e Lourenço Marques, anterior designação
de Maputo (Moçambique). Portugal, com 12 escalas e duração de 15 dias
(ida e volta), era a mais extensa linha a nível mundial operada com os
aviões bimotores. Já a primeira linha doméstica, entre Lisboa e Porto foi
aberta em 1947. No ano seguinte, a TAP passou a ter voos para Paris e
Sevilha. As viagens para Londres, no Reino Unido da Grã-Bretanha e
Irlanda do Norte, iniciam-se em 1949; e para Casablanca e Tânger, em
Marrocos, em 1953. E assim continuou. Um início auspicioso que contrasta
com os sucessivos fracassos dos últimos anos. Os seus anúncios publicitários
mostravam longas rotas, exibiam mensagens acolhedoras para quem
partia e para quem chegava. Hoje, os cartazes que vemos são outros.
Empunhados por trabalhadores, falam de despedimentos, de polémicas
indemnizações, de má gestão da empresa, de frotas de luxo desnecessárias,
de bónus avultados para uma elite. Nacionalizar ou privatizar, que rota
tomar? Polémicas atrás de polémicas. Reestruturações. Prejuízos sem fim.
O voo do sucesso da companhia de bandeira portuguesa parece ter-se
perdido. E o preço do bilhete tem saído caro aos contribuintes.

12 05.02.2023 Notícias Magazine


Cidadania Impura
Por Valter Hugo Mãe

Salvar os professores,
salvar o país
Com a saúde a ser Portugal é o país onde sempre se espera o melhor resultado com o pior dos in-
empurrada para os seguros vestimentos. Temos uma política de fé, quero dizer, uma que aposta mais numa
privados e com a educação a espécie de sorte do que na competência e na força inequívoca de se tomarem
ser empurrada para os decisões justas num sentido de missão pública. O PS e o PSD têm sido iguais no
colégios, o português que respeita ao esperado pela Educação. A vontade é ir empurrando o maior nú-
mero possível de alunos para as escolas privadas, depauperando a escola públi-
comum tem de ser um ca através, sobretudo, da desclassificação da carreira dos professores.
cidadão em extinção. A Curiosamente, sabe-se que as mais recentes são as gerações mais bem prepa-
hipótese de sobreviver às radas de sempre do país. Curiosamente, com a escola a ser desmontada lenta-
contas no fim de mês é mente, ainda se conseguiu esse incrível resultado. Embora estejamos a falar de
absolutamente nenhuma. alunos que, havendo oportunidade, fogem para trabalhar em países onde os sa-
lários tenham de verdade dignidade para tanto empenho.
Como poderíamos, pois, continuar a retirar aos professores os ovos e esperar
que produzam omeletas e, desde logo, as melhores omeletas de sempre?
Portugal tem sido o país que, pagando entre os piores salários da Europa, tem
as casas mais caras do Mundo. A simples oportunidade de habitar começa a tor-
nar-se impossível para tanta gente que, mesmo estudada como nunca, não pas-
sa depois de uma miséria contida. Com a saúde a ser empurrada para os seguros
privados e com a educação a ser empurrada para os colégios, o português comum
tem de ser um cidadão em extinção. A hipótese de sobreviver às contas no fim
de mês é absolutamente nenhuma.
O problema das escolas não pode começar em saber se os programas estão ade-
quados à estranheza das novas gerações que, pelos vistos, não entendemos bem
como são e não sabemos que lhes fazer. O problema tem de começar pela defe-
sa franca dos professores, que precisam de ser respeitados como aqueles que nos
entregam todas as ciências e desenvolvem todas as capacidades. Aqueles que
efectivamente estruturam o país e o Mundo em todas as valências e todas as
complexidades. São eles que têm por ofício sofisticar o nosso pensamento, en-
riquecer o nosso imaginário de informação e favorecer, com isso, a nossa auto-
-estima abrindo o futuro.
Salvar os professores é salvar o país. Porque nenhum país sairá da miséria com
cidadãos educados pelo Google. Gente que nem saberá perguntar no sentido de
chegar à resposta de que precisa.
É um desastre que, uma e outra vez, se assista à tragédia contínua das escolas.
Há décadas que o mais que se faz é estrangular as carreiras e apontar a emigra-
ção como caminho para quem ensina e para quem aprendeu. Quem ainda não
viu que destruir os professores é destruir o país, ou não foi à escola ou foi e ca-
bulou do princípio ao fim.

O AUTOR ESCREVE DE ACORDO COM A ANTERIOR ORTOGRAFIA

Notícias Magazine 05.02.2023 13


alma-
naque
PERFIL
POR Alexandra Tavares-Teles

Luís Guerreiro

14 05.02.2023 Notícias Magazine


O motard paciente
As motas são uma paixão. Alentejano de Odemira, é calmo, e contido,
mas só à primeira vista. Otimista com os pés no chão. Gosta de passar das
palavras aos atos, não deixando para amanhã o que pode fazer hoje.

LUÍS FILIPE Diz a amigos que “quase todo ele” é alentejano. para chefe de setor de Planeamento Mineiro da
PRATAS Paciente, calmo, descomplicado, teimoso, se- Mina de Neves Corvo, em Castro Verde. Mais
GUERREIRO nhor das origens. Bom ouvinte, apreciador do tarde, na petrolífera Partex, encontrou António
trabalho de grupo, é reservado e contido à pri- Costa Silva, que conhecera na faculdade. À rela-
Cargo meira vista. Mas as poucas falas desaparecem à ção profissional juntou-se uma “forte amizade”.
Presidente mesa, lugar de culto interdito a telemóveis, onde Homem de total confiança do ministro da Eco-
do IAPMEI se revela um bom contador de anedotas. Gostas- nomia, assumiu as funções de adjunto de Costa
se de “migas e papas” e seria “um alentejano per- Silva a 30 de março de 2022. “Os adjuntos são
Nascimento feito”, afirmam amigos. Não lhe falta, sequer, o uma espécie de pau para toda a obra, assessores
04/04/1961 gosto pela confeção de petiscos. Raro é o sábado que acompanham os ministros para todo o lado
(61 anos) em que não vai ao Mercado do Livramento, em e preparam os diferentes dossiês”, revela fonte
Setúbal, à procura de matéria-prima para a cal- do ministério. Onde era dos primeiros a chegar,
Nacionalidade deirada. depois de uma passagem pelo ginásio, que fre-
Portuguesa É também ao fim de semana que dá azo a um an- quenta por obrigação.
(Odemira) tigo prazer – a Triumph Tiger 800 XC, todo-o-ter- “Com gosto”, garantem amigos, assumiu ago-
reno de 193 quilos. Equipado a rigor. “Ele gosta so- ra a presidência da Agência para a Competitivi-
bretudo da adrenalina, da velocidade, da sensa- dade e Inovação (IAPMEI), criada em 1975 e “des-
ção de que se pode ir a todo o lado sem limitações.” tinada a promover a competitividade e o cresci-
Em viagens planeadas – Espanha ou Marrocos, mento empresarial das pequenas e médias em-
países que percorreu em duas rodas. Ou por deci- presas, visando o reforço da inovação do em-
são tomada em cima da hora – Bairrada, para o lei- preendedorismo”. Qual a ligação do engenheiro
tão, a Évora, para a tradicional carne de porco. “Se de minas à inovação? “A Partex é muito mais do
tivéssemos de lhe dar um presente seria decerto que uma empresa petrolífera. Investe muito na
algo ligado à mota”, concordam colaboradores. inovação. O Luís é uma pessoa extremamente
Luís Guerreiro nasceu há 61 anos, em Vale de interessada e curiosa.” Geriu vários projetos de
Santiago, terra de Odemira, em tempos perten- investigação e inovação com universidades na-
ça da ordem eclesiástica que lhe daria o nome. É cionais e estrangeiras, assinala o currículo apre-
uma freguesia do interior do concelho, situada sentado no site do IAPMEI.
entre o rio Sado e a ribeira de Campilhas, que “É um otimista com os pés no chão. Gosta de
abandonaria quando o pai, funcionário público, passar das palavras aos atos, não deixando para
e a mãe, doméstica, trocaram o sul por São João amanhã o que pode fazer hoje. É um líder que faz
da Madeira. Porém, apesar de ter apenas cinco parte da equipa, capaz de ouvir, mas com atitu-
anos, não perdeu a memória da planície, contac- de disruptiva perante o status quo, agora numa
to restabelecido de vez quando, com a família, casa com alguns vícios, que necessita de frescu-
regressou ao sul. Setúbal, onde cresceu ao som ra e revitalização.”
de Jorge Palma, Xutos & Pontapés, Zeca Afonso, O currículo realça a “liderança de equipas mul-
ILUSTRAÇÃO: JOÃO VASCO CORREIA

ainda hoje preferências musicais. tidisciplinares responsáveis pela operação, pro-


A engenharia resulta de uma vocação natural dução, estudos técnico -económicos de pesqui-
para “fazer e refazer, construir e desconstruir coi- sa e avaliação de recursos naturais”. Lecionou e
sas”. Minas, “pela proximidade com a natureza”, fez palestras no Instituto Argelino de Petróleo,
dizem amigos. na Agência Nacional de Petróleo do Brasil, na
Aluno do Instituto Superior Técnico, em Lis- Companhia Onshore de Petróleos de Abu Dha-
boa, foi convidado para assistente estagiário mal bi, na Companhia Nacional de Petróleos do Ba-
concluiu a licenciatura. Pouco depois, entrou hrain. Tem três filhos. ●m

Notícias Magazine 05.02.2023 15


alma- Susana Romana
naque Partida, Largada, Fugida

1 2345 678
1 8
Esta semana foi o fecho do A organizadora
or profissional
mercado e posso assegurarar Marie
Ma Kondo, famosa por
o,
os mais inquietos que não, cau de uma série docu-
causa
não foi desta que o mental
men na Netflix, admitiu
“The Guardian” me levou. u. que ao terceiro filho desis-
Ainda não sou o Porro ti “A minha casa está
tiu:
do cronismo. desarrumada”.
de Ao ouvir
isto,
isto Costa terá olhado para
G
o Governo e suspirado “ai,
2
filha,
filh a minha também”.
Começam a circular váriosos
anúncios de quartos paraa
7
alugar aos visitantes da
Jornada Mundial da Juven- n- Foi uma semana fria, com
tude, todos eles com preçosos aler do IPMA por todo o
alertas
pouco católicos. Por doiss país.
p Mesmo assim, o
mil euros espero bem quee executivo
ex da Câmara do
inclua brunch com o corpopo Port rejeitou a atualização
Porto
de Cristo coberto de abacate
ate do plano de contingência
e ovo escalfado. para as pessoas em situação
de sem-abrigo. Querem
3 aquecer-se?
aque Façam como os
especuladores
espe imobiliários
Também se soube que vai ai e peguem fogo a um
existir um Parque do prédio da Baixa.
Perdão, com um total dee
150 confessionários, cadaa
6
um com um sacerdote para ra
ns
“acolher e escutar os jovens Por
Po falar em estátuas: foi
peregrinos”. É assim umaa inau
inaugurada uma estátua da
espécie de speed dating, atriz
at Eunice Muñoz, em
que também acaba sempre re Paço de Arcos. É uma bonita
com uma das pessoas a hom
homenagem, já que como
sentir-se muito culpadaa Eunice
Eu se transformava
pelas suas escolhas. tanto
tan para os papéis, fize-
ram uma escultura em que
4 5
está irreconhecível.
Ainda sobre a Jornada:
A Por razões logísticas, vai ter
de
depois do palco dos cinco de ser retirada do parque a
milhões,
mi foi a vez do palco escultura de 90 toneladas
no
no Parque Eduardo VII, que feita por João Cutileiro.
te tido avanços e recuos.
tem É uma estátua muito
Para
P quem não conhece famosa porque, curiosa-
bem aquela zona de mente, se parece muito
L
Lisboa, posso dizer que é com o sítio para onde estão
muito pródiga em Marias
m a mandar o dinheiro dos
Madalenas. contribuintes com esta
Jornada.

16 05.02.2023 Notícias Magazine


FUTUROS Debaixo da terra há interações que acontecem a

FOTOS: DIREITOS RESERVADOS


cada segundo e que dão frutos. Os microrganis-
POR Sara Dias Oliveira
mos, sejam vírus, bactérias ou fungos, não têm
de ser necessariamente inimigos das plantas, ape-
sar de serem olhados como agentes patogénicos
que causam doenças nas culturas. Há uma ver-
tente benéfica a ser espremida. Esses bichinhos
microscópicos podem manter a saúde dos solos
e garantir a produtividade das plantas. Há que
pesquisar mais fundo.
A Timac Agro, A Timac Agro, especialista em nutrição dos so-
especialista em los, das plantas e dos animais, em Portugal des-
nutrição dos solos, das de 1994, tem mais de 160 investigadores de 24
plantas e dos animais, nacionalidades concentrados no futuro da agri-
está em Portugal desde cultura. Quer no CMI – Centro Mundial de Ino-
1994, tem mais de 160 vação, do Grupo Roullier, em Saint-Malo, na Bre-
investigadores de 24 tanha, França, em estufas feitas à medida e em
nacionalidades laboratórios sofisticados, quer em universidades
concentrados no futuro espalhadas pelo Mundo numa rede deslocaliza-
da agricultura da de pesquisa à escala global.
Marco Morais, diretor-geral da Timac Agro em
Portugal, fala nesse aproveitamento de sinergias
na terra, em que os microrganismos dão de si para
trazer benefícios às culturas. E enumera algumas
vantagens. “Maior resistência às doenças, mais
capacidade de exploração dos solos, mobilização
de certos nutrientes.” Benefícios nutricionais,
benefícios nas plantas.
As investigações têm em consideração vários
aspetos. O Mundo terá mais gente para alimen-
tar, mas terá menos terra para plantar e menos
água para regar. Em 1950, um hectare de terreno
alimentava duas pessoas, em 2030, o mesmo es-
paço terá de satisfazer uma mão-cheia de gente.
Até 2050, a produção de bens alimentares tem
de aumentar mais de 50%, a produtividade cer-
ca de 70%, a sustentabilidade dos sistemas agrí-
colas mais de 40%. E as alterações climáticas não
ajudam.
O grande desafio, sublinha Marco Morais, é
produzir de forma sustentável e, simultanea-
mente, aumentar a produtividade. Ou seja, pro-
duzir mais e melhor, uma equação que exige ajus-
tes constantes. “Há toda a questão das alterações
climáticas, o impacto de todas as atividades no
ambiente, e a agricultura acaba por ser desafiada
no modo de produzir”, repara. Sobretudo a agri-
cultura europeia, que vive cheia de normas e res-
trições. “Nós, que estamos na cadeia, temos de
responder com soluções novas, com um novo
olhar”, acrescenta o responsável.

Produzir Criar soluções para uma agricultura sustentá-


vel e eficiente ocupa os dias da Timac Agro em vá-

mais e melhor
rias partes do Globo. No ano passado, lançou um
novo conceito de bioestimulantes naturais e, em
2023, fruto de pesquisas em andamento, prepa-
ra-se para entrar num mundo da microbiologia
O futuro da agricultura também está no que acontece com uma gama de biofertilizantes à base de mi-
no solo e a relação entre microrganismos e plantas crorganismos. Será mais uma resposta aos enor-
pode ser benéfica. A Timac Agro, especialista em mes reptos que se colocam à fileira agrícola, que
nutrição vegetal e animal, estuda estas sinergias. quer ser mais responsável e mais eficiente. ● m

Notícias Magazine 05.02.2023 17


alma-
naque
A SEMANA
QUE VEM
POR Catarina Silva
SEGUNDA-FEIRA
TRANSDEV E
ENFERMEIROS EM GREVE

Após a paralisação de 13 de janeiro, os trabalha-
dores do grupo de transportes Transdev
voltam à greve para reivindicar, sobretudo,
aumentos salariais na mesma percentagem do
salário mínimo nacional ou da inflação. Aliás,
o dia ficará marcado por greves. Continua a dos
professores que tem vindo a percorrer os distri-
tos, desta feita em Vila Real. E está também
agendada uma parali-
Fevereiro será mês de
greves para os enfermei- sação dos enfermei-
ros, caso não haja acordo ros no IPO de Lisboa,
com a tutela. Há outra que acontece entre
agendada para terça-feira as 8 e as 12 horas.

TERÇA-FEIRA Arranca a segunda


volta das eleições para
SEGUNDA o cargo de bastonário
da Ordem dos Médi-
VOLTA DAS cos, que se estende até

ELEIÇÕES NA
dia 16. Entre os seis
candidatos ao lugar,

ORDEM DOS
os médicos Carlos
Cortes, atual presi-


MÉDICOS dente da secção regio-
nal do Centro, e Rui
Nunes, professor
catedrático da Facul-


dade de Medicina da
Universidade do
Porto, foram os mais
votados e vão à ronda
decisiva.

QUARTA-FEIRA
MÁRIO LAGINHA
NO PALÁCIO DE BELÉM
O programa que junta músicos e alu-
nos do 3.º Ciclo e Ensino Secundário
na casa da Presidência leva, desta vez,
Mário Laginha a palco, às 11 horas.
“Músicos no Palácio de Belém” decor-
re no Antigo Picadeiro Real e, até 31
de maio, ainda estão previstos nomes
como David Fonseca ou Camané.
18 05.02.2023 Notícias Magazine
5ª 6ª SEXTA-FEIRA
FESTIVAL POLÍTICA ESTREIA-SE EM COIMBRA,
LINDA MARTINI COMEÇAM TOUR EM LISBOA
Começa o warm-up do Festival Política – maior
evento do país dedicado aos direitos humanos
e à cidadania. Pela primeira vez em Coimbra,
no Convento São Francisco, é um aquecimento
para a edição de novembro, com atividades
gratuitas. Uma delas é uma conversa com Dino
D’Santiago, às 10.30 horas. No mesmo dia,
às 22 horas, os Linda Martini celebram 20 anos
de carreira com um
No sábado à noite, Hugo
van der Ding leva o espe- concerto no Lisboa

S
táculo de humor “A gran- ao Vivo, que marca
de mentira” ao warm-up o arranque da tour
do Festival Política “Merda & Ouro”.

DOMINGO
DIA DE CLÁSSICO:
SPORTING-F. C. PORTO
No futebol, é dia de clássico. Depois de se
terem defrontado na final da Taça da Liga
(os dragões saíram vencedores, uma
conquista inédita na história do clube),
Sporting e F. C. Porto voltam a medir
forças, desta feita na 20.ª jornada da Liga.
QUINTA-FEIRA SÁBADO A partida arranca às 18 horas, no Estádio

PROTESTOS MARIZA ATUA NA


José Alvalade, e tem transmissão na
Sport TV. No mesmo dia, no mundo dos

E MAIS PROTESTOS CASA DA MÚSICA


espetáculos, Luísa Sobral atua no Centro
Cultural e Congressos das Caldas da

As lutas pelo aumento NOS 20 ANOS Rainha, no âmbito da 9.ª edição do festi-
val “Montepio às vezes o amor”. O festi-

DE CARREIRA val que celebra o Dia dos Namorados

D
dos salários multipli- arranca no sábado, dia 11, e tem concertos
agendados em 14 cidades, de Viana do
cam-se em Dia Nacio- A fadista está a cele- Castelo a Lagoa, até 14 de fevereiro.
nal de Indignação, Pro- brar 20 anos de
carreira e atua às 21.30
testo e Luta, convocado horas na Casa da
Música, no Porto. Há
pela CGTP. Há greve uma certeza: Mariza
em vários setores, no- vai interpretar
canções de Amália
meadamente na CP e Rodrigues, a quem
IP. No futebol, no Mi- dedicou o seu mais
recente álbum,
nho, Sp. Braga e Benfi- “Mariza Canta
Amália”, editado em
ca disputam, às 20.30, novembro de 2020.
os quartos de final da No mesmo dia, a Cruz
Vermelha Portuguesa
Taça de Portugal. celebra 158 anos.

Notícias Magazine 05.02.2023 19


SEJA
FEITA
A VOSSA
VONTADE Perdoai-os e livrai-os do fogo do inferno.
Nestes tempos em que tudo se deslaça, a Igreja
procura que o escândalo dos abusos sexuais, a falta de
transparência, o fosso entre a instituição e a sociedade,
o afastamento dos crentes não mine irremediavelmente
dois mil anos de história. São tesouros transportados
em vasos de barro.

TEXTO
Filomena Abreu

20 05.02.2023 Notícias Magazine


ADOBE STOCK

Notícias Magazine 05.02.2023 21


mais. E esta casta acha que manda, que controla, que dirige.
Faltam 11 dias. A 16 de fevereiro, quan-
do os relógios marcarem as 10 horas, rostos com nomes que já
Uso a palavra casta propositadamente. Isto é o oposto do que
deve ser a religião”, considera António Marujo, jornalista com
todos vimos, semblantes carregados, estarão na Fundação Ca- mais de 35 anos de carreira, especializado em informação re-
louste Gulbenkian, em Lisboa. Não é futurismo o que aqui se ligiosa e atualmente diretor do jornal digital Sete Margens,
escreve. E é de passado que ali se vai falar. Vão dedicado à temática das religiões. “Podemos
com a missão de “dar voz ao silêncio”, pela falar de questões como o dinheiro, como é o
mão de Pedro Strecht, que encabeça a Comis- caso desta polémica à volta do altar da Jorna-
são Independente para o Estudo de Abusos da Mundial da Juventude (JMJ); padres que
Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portu- ficam com dinheiros; bispos que administram
guesa, composta por seis especialistas de vá- mal o poder. Tudo radica no poder”, reforça.
rias áreas e um conjunto de testemunhos de
abusos ocorridos nos últimos 70 anos. O tema “Se o grão de trigo não morrer na terra
é o epicentro da violenta crise que abala a Igre- é impossível que nasça fruto”
ja em Portugal e no Mundo. O verso consta do cancioneiro católico e é ins-
Na última comunicação, a 11 de outubro, a pirado no Evangelho segundo São João, em
Comissão já tinha re- que Jesus Cristo pre-
cebido 424 relatos. A ga sobre o significado
maior parte dos cri- da sua própria morte,
mes prescreveu. Mas inevitavelmente li-
há mais, muitos gado ao propósito da
mais, como alertou o sua vida. O grão de
coordenador: “O nú- trigo, lançado à terra
mero mínimo de ví- para se transformar
timas será muitíssi- em planta, despe-se
mo maior do que as da sua casca, desnu-
quatro centenas e os da-se e ressurge com
abusos compreen- nova aparência, por
dem todas as formas descritas na lei portu- dentro e por fora. Ao contrário da natureza, o
guesa”. Nesse dia, os meios de comunicação homem tende a ser mais lento nas suas trans-
voltarão a agitar as águas. Perguntas. Muitas. formações. E a Igreja, uma instituição com
Mas a derradeira é apenas uma. Pode uma ins- dois mil anos, está cheia de vícios, sombras e
tituição com dois mil anos e em declínio escândalos. São muitas as pontas soltas que
transformar-se a tempo de sobreviver a um formam um nó difícil de desatar.
abalo sem precedentes? Abusos sexuais a menores.
“Vivemos, de facto, uma crise. Mas uma cri- Liberdade sexual e de género.
se tem duas faces, impugna uma situação e Falta de transparência.
desperta uma evolução num melhor senti- Profunda hierarquização.
do. A escuta do divino nunca acabará, mas Comunhão dos recasados.
mudará de figura.” As palavras são de Jorge Ganância e poder.
Teixeira da Cunha, teólogo, cónego e profes- A palavra “crise” anda há muito ao peito da
sor catedrático da Universidade Católica do Igreja. Como uma cruz. Irónico. Até porque
Porto. No seu ponto de vista, as bases dessa a ninguém pode ser apontado o dedo senão à
crise são evidentes. “Por um lado, as lideran- própria, que sabe que tem muito por onde
ças, que são hoje menos eficientes. Os nossos morrer se quiser renascer.
bispos são escolhidos de um grupo pequeno, Uma instituição bolorenta, profundamen-
não tem havido forma de cativar gente com te hierarquizada, apodrecida por dentro, que
mais qualidade.” Exatamente como acontece na política, re- definha. Com uma forte ala conservadora, que teima em agar-
fere. Depois, “a Igreja não pode ter líderes que se associam a rar-se a discursos que não se adequam à realidade dos dias. Es-
ela por interesse, pessoas sem carisma”. tes são só alguns dos pontos sobre os quais o Papa Francisco
Uma opinião partilhada por muitos. “Os abusos são reflexo chamou todos a refletir. Leigos, religiosos, sacerdotes, bispos
de várias coisas. O clero constituiu-se como uma casta acima e cardeais, todos os que participam de um importante proces-
dos outros fiéis, considera ter poder ascendente sobre os de- so que culminará em Roma, daqui a dois anos, com o Sínodo

22 05.02.2023 Notícias Magazine


dos Bispos. “Encontrar, escutar, dis-
cernir” são as palavras de ordem.
Para o padre jesuíta Miguel Almei-
da, provincial da Companhia de Je-
sus em Portugal, o objetivo de Fran-
cisco é bastante claro. “O Papa está a
pôr em prática o que foi sonhado pelo
Concílio Vaticano II, uma Igreja em
que o sucessor de Pedro deixa de ser
o ápice piramidal e passa a ser o cen-
tro da comunidade, onde há uma cer-
ta horizontalidade. E, por isso, este tempo de sinodalidade está a exigir de nós uma
atitude diferente, uma postura participativa como nunca antes aconteceu. O que
é revolucionário. E já se notam diferenças, mas caminha-se devagarinho, porque
isto requer uma autêntica mudança de mentalidades.” O provincial esclarece ain-
da que tem havido de facto mais debate, fóruns em que se participa, discute e le-
vantam questões, mas há ainda muita gente que não aderiu, “há resistência, seja
por inércia, por já haver vícios instalados, seja por em alguns casos e setores acha-
rem que este não é o caminho e que a hierarquia deveria continuar a ser piramidal.”
Miguel Almeida diz ser necessário tempo para essa mudança de mentalidade.
Um tempo que virá com as novas gerações. Mas o relógio do Mundo não parou.
O resultado dessa espera tem nú-
meros. Em 1991, os católicos repre-
sentavam 95% da população, e em
2001 chegavam aos 93%. Na última
década, diminuiu 8,1%, passando
nos últimos dez anos de 88,3% para
80,2%. Os dados foram revelados nos
Censos 2021, que indicam também
que há mais 6,6% de pessoas sem re-
ligião. Importa considerar que a per-
gunta relativa às crenças era faculta-
tiva, mas obteve 97% de respostas.
Traduzindo para palavras: a taxa
de católicos portugueses é uma das
maiores da Europa. Mas o número
esconde as transformações que o
catolicismo português tem atraves-
sado nas últimas décadas. Alfredo
Teixeira, que desenvolve a sua ati-

Notícias Magazine 05.02.2023 23


vidade de docência e investigação na Universidade Católi- E o que hoje sente é que isso não melhorou. “Quem tem fé
ca Portuguesa, enquanto professor associado da Faculdade é visto como alguém esquisito. E mesmo os católicos com
de Teologia, e que é diretor do Instituto de Estudos de Re- um certo nível de educação acabam por se afastar.” Motivos
ligião, explica o que não se vê nessa percentagem. não faltam. Joana Rigato enumera alguns: “A Igreja tem um
O catolicismo português permaneceu até tarde como discurso um bocado anacrónico. É uma instituição que não
prática religiosa, através do campesinato, tem sabido perceber que está em decadên-
da aldeia, do imaginário agrário, de uma cia, compreender essas causas e alterar o que
certa pobreza e iliteracia. “A Igreja é tal- há a alterar. Que são questões fundamen-
vez a instituição em Portugal que mais ve- tais, como é o discurso à volta da sexualida-
zes se cruzou na vida das pessoas, mas ao de. A relação da Igreja com a sexualidade é
mesmo tempo essa transformação da vida desatualizada, absurda. E quando se agarra
dos outros, que atravessa várias gerações, a questões que não fazem sentido e critica
é hoje vivida com distanciamento.” As pes- quem é diferente – como se a intimidade das
soas consideram-se católicas, mas a sua li- pessoas fosse algo sobre a qual valesse a pena
gação à comunidade é pequena. “Vivem a discutir – perde credibilidade, principalmen-
religião numa dimensão mais interior, não te junto das gerações mais novas que pen-
tão participativa.” sam: se a Igreja diz
Pela experiência de disparates sobre a se-
Alfredo Teixeira, há xualidade, dirá dis-
vários fenómenos parates sobre outras
objeto de análises. coisas importantes”.
Um deles é que os É também por tudo
católicos que estão isto que Joana se
vinculados a práti- sente uma outsider.
cas comunitárias, ao “Para os meus ami-
religioso vivido, gos, eu ser cristã e
tendem a ter um dis- identificar-me par-
curso de minoria. cialmente com a
“Julgo que até por isto atravessamos uma Igreja e não desertar depois de tantas polé-
grande transformação no tecido católico.” micas é um mistério total. Para eles a Igreja
é uma coisa medieval.”
A ESQUISITICE DA FÉ Um sentimento que se estende a vários as-
Joana Rigato é disso exemplo. Entusiasta suntos, recorda o cónego Jorge Teixeira da Cu-
dos encontros de jovens na comunidade nha. “Como os recasados. A possibilidade ju-
ecuménica de Taizé e da espiritualidade ina- rídica do divórcio foi benéfica para a qualida-
ciana, dedicou-se durante alguns anos à Edu- de da vida matrimonial, sobretudo da mu-
cação para o Desenvolvimento (para o Ban- lher, para a qualidade da relação, para a recom-
co Alimentar e para a Comissão Nacional posição. Ninguém se quer divorciar, é sem-
Justiça e Paz, de que foi membro seis anos), pre um fracasso, mas se um processo não deu
bem como ao trabalho voluntário em Mo- vamos recompor a vida.”
çambique e na Argentina. É doutorada em Alfredo Teixeira tem explicação para esse
Filosofia da Ciência pela Universidade de afastamento das recentes gerações. Uma par-
Lisboa, fez investigação em Filosofia das te reside nos filhos e netos dos primeiros que
Ciências Cognitivas na Fundação Champa- saíram do Interior, das aldeias, dos que se ur-
limaud e é atualmente professora de Filoso- banizaram, que foram procurar oportunida-
fia no Colégio católico S. João de Brito. Ca- des nos grandes centros. “Essa dimensão de
sada, dois filhos e com 42 anos, diz ter per- substituição geracional tem, e vai continuar
manentemente essa sensação de ser um bicho raro entre os a ter, efeitos no número de católicos no país.” Comparando
seus pares. “Ao longo da minha juventude, era das poucas com outros estudos internacionais, “Portugal está sempre en-
pessoas que tinha Educação Moral e Religiosa Católica tre os três, quatro países com indicadores de religiosidade mais
(EMRC) na escola e participava em atividades da paróquia. elevados”. Mas se dividirmos a amostra observada pelos que
Aos 12 anos dava catequese às escondidas, não queria contar nasceram nas décadas de 30, 40, 50 do século passado, “obser-
a ninguém porque ia ser alvo de troça por parte dos amigos.” vamos uma crista decrescente contínua, o que quer dizer que

24 05.02.2023 Notícias Magazine


VATICAN MEDIA HANDOUT

Notícias Magazine 05.02.2023 25


A Basílica de São Pedro
é a sede da Santa Sé,
o templo religioso mais
importante do catolicismo
e leva o nome do primeiro
Papa da história

este limiar de 80% católicos na sociedade portuguesa se ex- nhecerem mal o pensamento destes pontífices, “aderem subs-
plica pelo peso do envelhecimento da população”. O que quer tancialmente a uma Igreja que não é a mais correta”, na opi-
dizer também que, “à medida que conhecemos uma certa nião do jornalista. “Aderem apenas a uma perspetiva da dou-
substituição geracional, esta paisagem religiosa pode sofrer trina deles, que é sobretudo a questão da moral individual,
grandes alterações”. O catolicismo em Portugal “representa aborto, eutanásia, bioética, não aderem depois a uma série de
um substrato importante de referência para a população e po- propostas que dizem respeito à prioridade das pessoas sobre
demos estar a viver uma mudança.” Por esse motivo, o espe- o laboral, o bem comum em relação ao uso da propriedade, a
cialista não vê eventos como a JMJ a ter um impacto durável, perspetiva da construção da paz, do armamento, da reforma
apesar da aparente adesão. “Não é seguro que este aconteci- da terra. Estas gerações nada conhecem destes pontos. Assim,
mento, que obviamente vai marcar a vida de muitos jovens, é natural que as gerações mais novas adiram às experiências
tenha reflexos no tecido católico da sociedade portuguesa.” como a JMJ, mas depois é uma adesão epidérmica, sem mui-
A jornada, que vai decorrer em Portugal entre 1 e 6 de agos- ta consistência e é normal que mais tarde se afastem.” O dire-
to, tem, para já, números de adesão que se situam “dentro da tor do jornal Sete Margens vai mais longe. “Por exemplo, em
fasquia dos 300 mil”, de acordo com o bispo auxiliar de Lisboa, relação à preparação da jornada, ainda não se percebeu uma
Américo Aguiar, coordenador geral da JMJ. Que faz questão ideia sobre o que os jovens andam a refletir e a debater nos te-
de alertar para a “montanha russa” previsível no evoluir de mas que se referem à sua vida, à guerra e paz, à educação, à saú-
inscritos. Aliás, a “incerteza é a palavra” que marca a organi- de mental, à habitação. O que vai ser destes jovens daqui a 20
zação deste encontro dos jovens com o Papa desde a primeira anos quando forem eles a decidir?”
hora: no início estava previsto para 2022, mas devido à pan-
demia acabou remarcado para 2023. Por isso, ninguém se ar- Uma transformação imposta há muito
risca a antecipar cenários, nomeadamente quanto à adesão José Manuel Pureza, professor universitário em Coimbra, di-
de participantes. Mas o bispo está confiante. “A minha leitu- rigente do Bloco de Esquerda, ex-vice-presidente da Assem-
ra é que os jovens estão despertos, estão aí e estão na perspe- bleia da República, o bloquista católico português mais reco-
tiva de acolher o que a JMJ pode significar para eles e para a nhecido, recorda precisamente a importância do Concílio Va-
Igreja. E esta é a primeira JMJ em que a idade nos coloca a to- ticano II. “Este processo de conversão de que hoje tanto ou-
dos na geografia do digital e nos posiciona, mais uma vez, na vimos falar, porque é disso que se trata, não nasceu agora. A
necessidade de refletirmos naquilo que significa comunicar Igreja como comunidade mundial impôs-se a si própria essa
de forma diferente.” Reforçando que há uma “feliz oportu- transformação há já muito tempo. O problema é que as pistas
nidade de nos convertemos a esta juventude que tem sede, renovadoras enunciadas nesse Concílio têm sido deliberada-
vontade e está disponível”, o bispo, um dos mais jovens do mente ignoradas por esse mecanismo de autoridade que tem
país, apelidado de “comunicador nato”, “fazedor” e tido como travado o processo.” Como praticante, o político cuja identi-
muito próximo da ala mais revolucionária da Igreja, assume dade como católico tem como centro absoluto a referência do
que nem sempre tem sido fácil o entendimento entre gera- testemunho da vida de Jesus Cristo, diz que resiste como cren-
ções. “Às vezes, parece que nem nós entendemos os mais jo- te porque a sua fé vai “para lá daquilo que são as vicissitudes,
vens, nem eles nos entendem a nós. Por isso, é muito impor- oscilações e fragilidades que a Igreja vai tendo”. E conhece
tante seguir as palavras do Papa Francisco. A expressão que muitas outras pessoas que procuram justamente viver dessa
ele usa é ‘hacer lio’. Os jovens têm de fazer barraca, barulho, forma, mais próxima do que Cristo pregou. “Isto não está tudo
temos de ouvir o que lhes vai nos corações. E eles têm de sen- mal, mas há uma tensão que está à vista de toda a gente.” Uma
tir que a Igreja encarna e ouve os seus problemas e dificulda- tensão entre a Igreja, uma estrutura de poder masculina, uma
des. É preciso proporcionar-lhes essa coragem de lutar. E va- estrutura de poder envelhecida e que zela por uma doutrina
mos fazer caminho juntos. Esta é a experiência que tenho tido e não por um estilo de vida, que é absolutista, com uma orto-
ao percorrer o país de Norte a Sul.” doxia que em muitos casos não tem muito ou nada a ver com
o primado da pobreza, da simplicidade e do amor. Tem a ver
“Adesão epidérmica” com os outros valores e esquemas. E isso tem vários nomes,
Em discordância, António Marujo toma precisamente a JMJ um deles é clericalismo. O Papa Francisco tem denunciado de
como referência para falar da relação da Igreja com os jovens. forma fortíssima o clericalismo, ou seja, uma estrutura de po-
Que, no seu entender, também tem graves lacunas. “Eu diria der que se legitima a si própria. Essa estrutura não tem tanto
que ainda há jovens que se mobilizam, isso é evidente, no- o primado do serviço, mas faz distinção entre povo e hierar-
meadamente nesta JMJ. Mas há cada vez menos na Europa. E quia. É no fundo um grande pecado da Igreja contemporânea.”
os que se mantêm são os que têm menos conhecimento da José Manuel Pureza chama à cena a recente polémica do pre-
doutrina social da Igreja das últimas décadas, mais concreta- ço do palco-altar. “Muita gente crente e não crente veio dizer
mente do Concílio Vaticano II e do pensamento dos diferen- que ofendia o primado da humildade e o pensamento e teste-
tes papas, João XXIII, João Paulo II, Papa Francisco.” E, por co- munho do Papa, um homem que tem tido a coragem de re-

26 05.02.2023 Notícias Magazine


RICCARDO ANTIMIANI/EPA
centrar a Igreja nos pobres. Há aqui um descasamento, uma ver, a Igreja, neste momento, vive nessas comunidades qua-
dessintonia entre uma comunidade de povo que segue Jesus se autónomas e com outra abertura, que pensam de maneira
Cristo e uma prática muito feita de poder, de autoridade, de diferente, que têm imensa liberdade em relação ao que diz a
ortodoxia.” E o que se pode fazer? “Denunciar com coragem hierarquia. Porque a hierarquia está a morrer, tem pouquíssi-
este vício, esta situação, esta supremacia de uma estrutura so- mo impacto, é alvo de pouquíssimo respeito. A Igreja enquan-
bre outra e convocar à fraternidade. O ponto seguinte é dar to instituição está sem voz. E o pobre do Papa Francisco tem
importância à vida comunitária, de pequenos grupos e comu- um mono gigante que não quer mudar, que quer resistir.”
nidades de pessoas que se conhecem, em vez das grandes mas- Chegados aqui, é inevitável falar da pluralidade. As palavras
sas e manifestações e de efervescência e espetacularidade, o de Joana Rigato coincidem com as do cónego Jorge Teixeira da
testemunho de vida, a centralidade da vida concreta, com pes- Cunha: “A palavra do padre já não é única palavra de Deus. O
soas com os seus problemas, fragilidades e capacidades de criar padre hoje tem de ter uma autoridade inata. Se não tiver, as
laços.” pessoas não lhe ligam. A cátedra de Moisés não tem efeito au-
Joana Rigato toca o mesmo ponto. Ou não fosse ela testemu- tomático. Se não se preparar e não tiver vocação, esse padre e
nho real de quem necessitou de procurar respostas fora das esse bispo estão condenados a definhar.” O cónego vai mais
estruturas hierárquicas estabelecidas. “A Igreja tem mundos longe. “A Igreja e todos os melhoramentos têm encontrado
dentro dela. Há comunidades que são extremamente desem- uma oposição intensa e um confronto quase letal. Mas hoje a
poeiradas, o verdadeiro oxigénio dentro da religião.” Certa Igreja é uma comunidade plural, com muitas vozes.”
vez, conta, sentia-se “perdida”, mas Deus, acredita, pôs-lhe
no caminho Conceição Moita – ativista na luta contra a dita- O tempo, esse devorador de almas
dura do Estado Novo, católica e progressista. “Foi quem me O mesmo partilha o padre jesuíta Miguel Almeida. “A socie-
falou de um grupo, o GRAAL - Associação de Caráter Social e dade hoje, não só pela Internet, é muito mais acessível a toda
Cultural, um movimento cristão ecuménico”, a que perten- a gente, é muito mais plural. Atualmente, todas as vozes sur-
ceu Maria de Lurdes Pintassilgo, uma das suas principais di- gem quase ao mesmo nível. A Igreja estava habituada, espe-
namizadoras. Na altura, foi a resposta de que precisava. “In- cialmente na nossa cultura portuguesa, a ter uma palavra
tegrei-me assim numa comunidade interessantíssima, não credível e única. Mas, agora, a palavra da Igreja é uma entre
controlada pela hierarquia da Igreja, de pessoas cheias de dú- muitas. E nem sequer é considerada a mais credível e autên-
vidas, revoltadas, que viviam a fé de uma forma prática.” Com tica. A Igreja também tem de aprender a fazer esse caminho,
a pandemia, o grupo desagregou-se, mas Joana e o marido en- a saber conviver num mundo plural. A saber escutar as ou-
contraram outra comunidade de oração, A Casa Velha, onde tras vozes e a dialogar sem se impor, sem abdicar do que tem
fazem muitas iniciativas que ligam ecologia e espiritualida- para oferecer, sem perder a sua identidade, princípios e va-
de. “Tenho encontrado estes oásis no meio do deserto. Eu não lores. E isso mexe com a forma como comunicamos e não co-
abandono a Igreja porque ela ainda me dá muito. Mas, a meu municamos.” Essa é visivelmente uma das lacunas, muito

Notícias Magazine 05.02.2023 27


Uma verdadeira profecia para a
vida da Igreja. Foi assim que João
Paulo II e Bento XVI entenderam
o último Concílio, que agora
o Papa Francisco se esforça
por continuar a incrementar

ARQUIVO GLOBAL IMAGENS

ARTUR MACHADO/GLOBAL IMAGENS

MAURIZIO BRAMBATTI/EPA
visível em todo este processo dos escândalos mais acesos da perto de alguns casos, é que a comunicação social usa histó-
Igreja. A debilidade no mundo da comunicação. “O tempo rias de vítimas que ficam à vista de todos, desveladas, para
que demora a reagir ainda é muito lento. A Igreja ainda tor- chegar a saber se o processo foi bem conduzido. É preciso cui-
na tudo muito pesado e acho que também aqui há uma apren- dado para que as vítimas não se sintam novamente traídas
dizagem a fazer: a maneira como comunicamos, escutamos na sua intimidade.”
e falamos com os outros”, aponta. O provincial volta aos abu- Mas voltemos à pluralidade da Igreja, sobre a qual Alfredo
sos. “Porque é o tema.” Assumindo que, neste momento, “é Teixeira também tem algo a dizer. “Este projeto do Papa Fran-
muito doloroso para as próprias vítimas e aí há que se cen- cisco, esse caminho sinodal, tem no fundo um objetivo refor-
trar nesse ponto, o que podemos fazer para minorar o sofri- mista, não é sequer consensual dentro do tecido católico. Há
mento, repor alguma justiça, fazer todo o possível e reco- mais pessoas e grupos que vivem e querem viver um outro
nhecer que não estivemos bem. Só fazendo assim sabemos modelo de Igreja.” Regressamos ao significado do Concílio.
e mostramos que estamos a fazer caminho.” Há mais. “Esse “Este pontificado quer recuperar coisas que não foram bem
caminho de verdade é exigente. É uma luta contra o enco- recebidas nos pontificados de João Paulo II e de Bento XVI. O
brimento. Nesse ponto já se fez muito, mas ainda temos de projeto deste Papa lida com uma máquina institucional anti-
aprender com os muitos erros conhecidos.” Porque só reco- ga, viciada. Portanto, nesse sentido, o que se está a viver é, até
nhecer não chega. “Como é óbvio, e com razão, todo este do ponto vista do estudo das organizações, interessante.”
processo tem retirado credibilidade à Igreja. Afinal, a insti- Como é que uma organização tão complexa adota recursos
tuição que se apresentava como referência moral, quase ima- para a sua modernização? “Eu diria que o Papa Francisco ado-
culada, também tem telhados de vidro e pés de barro. Acei- tou este projeto do sínodo, com uma vasta ocultação das ba-
tar a nossa condição e não nos fecharmos em trincheiras é ses católicas, como instrumento de reforma mais importan-
fundamental. E não achar, como acontece em alguns seto- te. Elege este projeto sinodal como instrumento de reforma
res da Igreja, que as notícias são um ataque e uma persegui- interna. E ninguém tem bem noção do impacto que pode ter.
ção.” E neste ponto Miguel Almeida pede “um contributo Mas há claramente a ideia de que as pessoas sabem que se vive
mais eficaz” à comunicação social. “Por vezes, dão a enten- um momento de crise: a consciência clara de que algumas coi-
der que no fundo éramos todos um conjunto de encobrido- sas como existiam não podem substituir e de que há oportu-
res, ou que não quisemos ver o que se estava a passar. E não nidade de criar outras.” Particularmente sobre Portugal, o in-
é verdade. Não sabíamos mesmo. Estamos também nós a vestigador é perentório. “É preciso compreender que muito
aprender a lidar com isto. Esses que encobriram também daquilo que definia o catolicismo pode estar a desmoronar-
eram pessoas em quem confiávamos, mas afinal eram abu- -se. Estamos no epicentro de uma transformação importan-
sadores.” Além disso pede que se protejam as vítimas. “Cla- te que terá impacto na forma como a Igreja católica se inscre-
ro que descobrir quem encobriu é importantíssimo, mas o ve na sociedade portuguesa.”
que está a acontecer, quem está perto de vítimas, e estou A sociologia da religião tem estudado a fundo essa mudan-

28 05.02.2023 Notícias Magazine


ça. Hoje, como já foi referido, as pessoas têm mais meios para bilidade para pôr tudo em questão, que se estenda a discus-
projetar a sua vida e para o fazerem a partir das suas escolhas são à formação dos padres e religiosos. Os seminários têm 500
pessoais, o que reduz a importância de instituições como a anos. Será que continuam a responder às necessidades de
Igreja nas suas vidas. Alfredo Teixeira explica. “Esse tem sido hoje? A formação do clero, o modo como os leigos podem par-
o fenómeno mais significativo em Portugal, pessoas que não ticipar, vai acontecendo em alguns fóruns de discussão. Mas
tendo religião estão abertas ao religioso e ao vai demorar. E vai requerer de facto uma
espiritual. Os que mais crescem são os cren- nova atitude de ser Igreja. Saibamos nós apro-
tes sem religião, uma espécie de última peri- veitar para nos pormos em questão, para vol-
feria de católicos. Não são ateus, nem agnós- tarmos ao essencial, para vermos o que na es-
ticos. Até podem fazer escolhas educativas trutura faz sentido, para haver maior trans-
para os seus filhos que incluem colégios e uni- parência dentro e fora. Acho que este tem-
versidades católicas, mas sem sentimento de po, se soubermos aproveitar e não jogarmos
pertença.” Em Portugal, estes fenómenos de à defesa, pode ser um momento de conver-
individualizar têm vincado a erosão e a des- são e purificação.” Até porque, como refere
vinculação da religião. “A meu ver, a socie- o padre jesuíta, é evidente o papel primor-
dade portuguesa vai enfrentar este fenóme- dial que a Igreja tem tido na construção da
no de amplo cresci- sociedade. “Há toda
mento. De pessoas uma face que conti-
sem religião. O que nua a fazer bem a
não nos deve fazer es- muita gente, como
quecer que esta mo- instituições sociais,
dernidade complexa apoio a refugiados, a
que vivemos tem si- migrantes, a todos os
nais contrários. Por carenciados, que
um lado, vemos o continua a operar
crescimento de não para lá da grande ins-
crentes e de pessoas tituição na igreja que
sem religião, mas comete erros. Há zo-
também encontramos o fenómeno da diver- nas do Mundo onde nada funciona a não ser
sificação, também a sociedade portuguesa a instituição, a humana e humilde Igreja.” E
deixará de ser monoliticamente constituída depois há toda a parte espiritual. “Estamos a
por uma entidade religiosa, haverá plurali- chegar a um ponto em que as pessoas bus-
dade, ofertas de sentido, propostas diversas, cam respostas espirituais e não tão religio-
e essa diversidade vai causar erosão nessa so- sas, de busca de interioridade, de encontrar
ciedade que viveu durante muito tempo sentido para vida e há muita gente na Igreja
numa espécie de monopólio religioso”, con- a fazer esse serviço, a acompanhar vidas, a
clui o investigador. orientar”, conclui Miguel Almeida.
O bispo Américo Aguiar segue essa linha.
“Trazemos, porém, este tesouro Evidenciando que, em todo o caso, “podemos
em vasos de barro” fazer sempre melhor, em cada tempo, em
Desta forma, as questões ditas mais fratu- cada circunstância, em cada desafio em que
rantes, de género, de orientação sexual, es- estamos envolvidos”. O Papa Francisco, ti-
tão a surgir muito mais fortes e com muito moneiro da Igreja, convidou o rebanho de
mais liberdade para serem conversadas, “pu- Deus a caminhar junto. “Pede-nos para nos
xando por uma reflexão mais profunda den- escrutinarmos, ajudarmos e depois sermos
tro da teologia e da pastoral para a Igreja, para capazes de fazer caminho juntos. O que não
que sejam dadas respostas mais concretas significa sermos todos iguais, mas descobrir-
aos cristãos que vivem estas questões na pele”, refere o pro- mos a riqueza da diversidade. E no que aos bispos e pastores
vincial jesuíta. No entanto, Miguel Almeida reclama por mais. diz respeito, temos a agilidade de irmos à frente a puxar. De
“Tenho a sensação de que a discussão se limita muito a essas irmos atrás a acompanhar os últimos. E de estarmos no meio
questões fraturantes e ainda estamos longe de ser o modo a ajudar quem não quer desistir.”
normal de ser Igreja e que isto se aplique a tudo. À liturgia, à Como diz José Manuel Pureza. “Seja o que Deus quiser. Mas
maneira como se faz catequese, que haja coragem e disponi- o homem e a mulher também têm que querer.” ● m

Notícias Magazine 05.02.2023 29


A REVOLUÇÃO AINDA
30 05.02.2023 Notícias Magazine
A ESTÁ POR CHEGAR
Discriminação no mercado de trabalho e no acesso à habitação, dificuldades nas escolas
e nos cuidados de saúde, uma representatividade que ainda é miragem. As dores, os desafios
e as lutas de uma comunidade que continua a ser “altamente ostracizada e incompreendida”.

TEXTO Ana Tulha FOTOGRAFIA Reinaldo Rodrigues/Global Imagens

Notícias Magazine 05.02.2023 31


M
aria João Vaz passou
mais de 50 anos às vol-
tas com as contradi-
ções da sua própria
existência. “Vivi sem-
pre sem saber quem
era. Sentia que havia
uma incongruência,
mas não sabia o que se
passava comigo.”
Hoje, a atriz que ganhou um protagonis-
mo-relâmpago graças à participação de
última hora na peça “Tudo sobre a minha
mãe” (lá iremos), não tem dúvidas de que
foi sempre uma mulher. Tanto que, com
cinco anos, já gostava de trocar de sapa-
tos com as meninas. A paixão não esmo-
receu, fez-se apenas mais só. Na adoles-
cência, continuava a vestir tudo o que fos-
se roupa feminina, mas passou a fazê-lo
às escondidas de todos. E assim se foi mo-
vendo numa existência solitária, com
poucos ou nenhuns amigos, uma namo-
radinha aqui e ali. Mas a vida seguiu. Ca-
sou, teve três filhas, dedicou-se à repre-
sentação e às dobragens, teve papéis em
várias novelas, protagonizou até um icó-
nico anúncio de uma empresa de teleco-
municações que muitos ainda hoje recor-
darão. “‘Tô xim?’ Um momento. É para
mim”, dizia então João Vaz, na pele de
pastor. “Mas, às escondidas, vivia como
mulher.” E então, algures em 2018, teve
a sua epifania, como lhe chama. Dois anos
depois, em plena pandemia, fez, por fim,
o “coming out”, através de uma entrevis-
ta a um jornal regional. Esteve também
num programa televisivo, para relatar o
caminho que a levou até à assunção pú-
“HÁ NA SOCIEDADE UMA mente: foi convidada por uma produto-
ra para representar, numa novela, o pa-
blica da sua identidade de género. Para IDEIA DE QUE AS PESSOAS pel de uma personagem trans. “Seria um
“dar visibilidade” às pessoas trans. TRANS, E SOBRETUDO AS projeto de longa duração em que iam es-

MULHERES TRANS, TÊM


Mas se, a título pessoal, o momento re- crever um papel para mim, com que me
presentou uma libertação, um alargar de identificava, em que havia um ‘coming
horizontes, a nível profissional os cami- DE PARECER CIS. ESTA out’, em que havia filhas.” Maria João
nhos têm-se estreitado. O currículo re-
cente resume-se em poucas linhas. Umas EXPRESSÃO DE GÉNERO exultou. “Fiquei muito contente.Até por-
que precisava mesmo de trabalhar. Dis-
dobragens para a Disney, uma participa- TEM DE SER DESMISTIFI- seram-me que faltava apenas a aprova-
ção em vídeo para o Teatro Nacional D.
Maria II, uma pequena participação
CADA. ATÉ PORQUE ASSE- ção da estação [em que iria passar a nove-
la].” Mas esta nunca chegou. “Contacta-
numa série televisiva, outra numa cur- MELHAREM-SE MAIS A ram-me da produtora a dizer que a dire-
ta-metragem, um papel na novela “Fes- PESSOAS CIS IMPLICA ção do canal tinha recusado. Não sei por-
ta é festa”, da TVI, outro no espetáculo
“Sagração da primavera”, do Teatro Pra- SEREM SUBMETIDAS A quê. Sei que havia uma possibilidade de
tornar visível a causa e foi recusada.” E as-
ga. Oportunidades tão escassas que não MAIS CIRURGIAS” sim continuou à míngua de trabalho.
lhe deixaram alternativa a procurar tra- A atriz não esconde o inconformismo.
balho fora da área. Foi estafeta numa em- Hélder Bértolo Mesmo que tenha dificuldade em fazer
presa de takeaway (mas teve um aciden- Presidente da Opus uma leitura simplista. “Não sei se é por
Diversidades
te de mota e rompeu os ligamentos), vi- ser trans, se é por uma questão geracio-
gilante em museus, trabalhou por duas nal, porque a maior parte dos anúncios
vezes no Burger King. Pelo meio, viveu são para jovens. Mas sei que há pessoas
um episódio que a marcou particular- que estão sempre a trabalhar e eu estou

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Maria João Vaz, soas trans – o estigma, a violência, a gri-
a atriz que foi tante falta de representatividade em
chamada a quase todas as esferas da sociedade, as
substituir o ator cis dificuldades prementes no acesso ao
André Patrício na mercado laboral, à habitação, à forma-
peça “Tudo sobre ção, aos próprios cuidados de saúde.
a minha mãe”, fez O “Estudo nacional sobre necessidades
o “coming out” das pessoas LGBTI e sobre a discrimina-
já depois dos ção em razão da orientação sexual, iden-
50 anos. Desde tidade e expressão de género e caracte-
então, sente-se rísticas sexuais”, apresentado em abril
mais leve, mas do ano passado, é particularmente elu-
arranjar trabalho cidativo a este propósito. “Dentro da si-
tem sido difícil. gla LGBTI+, as pessoas trans – e sobretu-
Aproveitou para do as mulheres trans – foram identifica-
escrever a sua das como as mais discriminadas, por for-
autobiografia, ça da conjugação do sexismo com o cis-
mas ainda genderismo”, pode ler-se no capítulo de-
continua à procura dicado às conclusões. O relatório “Trans
de uma editora Discrimination in Europe”, publicado
que a queira em 2019 pela TGEU, organização de de-
publicar fesa dos direitos das pessoas trans da
União Europeia, esmiúça a questão. As-
sente em dados de um inquérito da Fun-
damental Rights Agency, difundido por
associações ativistas, o documento rela-
ta que, na Europa, mais de um terço das
pessoas trans sente discriminação em
serviços de saúde, mais de metade no sis-
tema educativo, um terço já foi vítima
de assédio (incluindo ofensas e amea-
ças). O relatório conclui ainda que, quan-
to mais abertamente as pessoas trans as-
sumem a sua identidade, maior é a pro-
babilidade de serem vítimas de discrimi-
nação e assédio. Pelo que apenas um ter-
ço dos inquiridos a assume. Não espan-
no deserto. Acho que em parte é por não suas próprias palavras. Envergando ape- ta, por isso, que os indicadores de saúde
me conseguirem interpretar, por não co- nas uma tanga, a ativista subiu ao palco mental sejam particularmente preocu-
nhecerem a realidade trans. Não há in- em protesto, defendendo que o ator An- pantes nesta população, com taxas de
teresse, não há solidariedade. Recebo dré Patrício não deveria interpretar Lo- comportamentos suicidários acima da
muitas mensagens solidárias, até de di- la (personagem trans), por ser cisgéne- média.
rigentes de grupos de teatro. Mas não bas- ro (alguém que se identifica com o seu Em Portugal, faltam estudos mais
ta agitar a bandeirinha LGBTI+ para ficar género de nascença, por oposição a aprofundados – “nem sequer sabemos
bem. Não precisamos de palmadinhas transgénero). “Transfake [termo refe- quantas pessoas trans existem em Por-
nas costas, precisamos de convites.” Há rente à interpretação de personagens tugal”, lamentam as associações –, mas
pouco mais de duas semanas, recebeu transgénero por atores e atrizes cis]! Des- há uma dissonância notória, que deve
um inesperado. Era uma sexta-feira de ce do palco! Tenha respeito por este lu- inspirar reflexão. Sandra Saleiro, inves-
manhã e Maria João tomava tranquila- gar”, gritou, com vários ativistas na pla- tigadora do ISCTE que coordenou o tal
mente o pequeno-almoço quando lhe li- teia a juntarem-se ao protesto. A produ- trabalho apresentado no ano passado so-
garam da produção da peça “Tudo sobre ção prontamente baixou a cortina, o es- bre as condições das pessoas LGBTI+ em
a minha mãe” (uma adaptação do filme petáculo já não foi retomado naquele Portugal, aprofunda a questão. “Todos
homónimo Pedro Almodóvar, com en- dia, mas a narrativa esteve longe de ter- os estudos têm identificado o hiato que
cenação de Daniel Gorjão, a partir de um minar ali. Nos dias que se seguiram, foi existe entre os direitos que foram con-
texto de Samuel Adamson) a convidá-la aceso o debate sobre as nuances e a ra- quistados, a propósito da questão da
para representar o papel de Lola, perso- zoabilidade de um protesto com tais con- identidade de género, e a vida real des-
nagem transexual. Curiosamente, a atriz tornos. Entre argumentos antagónicos sas pessoas. Isto é, apesar de Portugal
acabara de ver nas redes sociais o que se e inflamados (lá chegaremos, mais para comparar muito bem com outros países
passara no Teatro São Luiz, em Lisboa. o final), a discussão teve o condão de con- em termos de direitos consagrados na
O espetáculo foi interrompido por vocar uma reflexão sobre as dificulda- lei [neste parâmetro, é particularmen-
Keyla Brasil, “atriz e prostituta”, nas des diárias com que se deparam as pes- te relevante a segunda Lei da Identida-

Notícias Magazine 05.02.2023 33


de de Género, aprovada em 2018], quan- Andreo Gustavo,
do vamos ver as práticas e os indicado- 34 anos e natural
res das condições das pessoas trans, já de Faro, fez a
não há paralelo com esse lugar cimeiro transição há mais
que o país ocupa ao nível dos direitos. ou menos uma
Não há uma repercussão direta e propor- década. Antes
cional na vida das pessoas.” disso, viu-se
Jorge Gato, investigador da Faculdade “forçado” a desistir
Psicologia e Ciências da Educação da do curso de
Universidade do Porto que trabalha Direito, por causa
amiúde questões relacionadas com a co- dos muitos
munidade LGBTI+, reforça este ponto. estereótipos de
“Em termos de discriminação, as pes- género que
soas trans e intersexo [não-binárias] es- dominavam a
tão sistematicamente pior. Seguramen- faculdade. Já foi
te porque, no caso das pessoas LGB, a consultor da
consciencialização para os seus direitos UNICEF Nova
começou mais cedo.” Iorque para as
questões LGBTI+
“OLHA, OLHA, UM TRAVESTI” e está prestes a
Mesmo mergulhando no universo lançar a “primeira
trans, as experiências vão divergir em plataforma digital
função de múltiplos fatores. Com a car- portuguesa para
ga negativa a acentuar-se no caso de pes- as questões da
soas que não conseguem esconder que inclusão, da
são trans. Hélder Bértolo, presidente da diversidade sexual
Opus Diversidades, deixa o alerta. “Há e de género”
na sociedade uma ideia de que as pessoas
trans, e sobretudo as mulheres trans,
têm de parecer cis. Esta expressão de gé-
nero tem de ser desmistificada. Até por-
que assemelharem-se mais a pessoas cis
implica serem submetidas a mais cirur-
gias.” Só que o inverso traduz-se, quase
sempre, em dificuldades acrescidas, no-
meadamente ao nível da inserção no
mercado laboral, com a maioria das pes-
soas trans que são reconhecidas como que foi o dinheiro que fez com esse tra- migo não tem acontecido.”
tal a verem vedado o acesso a trabalhos balho que lhe permitiu fazer a transição No entanto, os estudos apontam uma
que impliquem contacto direto com o tão desejada. E porque são raros os epi- realidade menos risonha. O que foi con-
público. “São quase sempre remetidas sódios de discriminação que recorda. duzido por Sandra Saleiro, e apresenta-
para trabalhos em call centers ou arma- “Costumo falar que sou uma pessoa de do no ano passado, é muito claro a este
zéns. Ou, em muitos casos, para o traba- sorte. Porque é muito difícil sofrer pre- propósito, referindo que pessoas LGBTI+
lho sexual”, realça o dirigente associati- conceito nos lugares onde vou. Claro que sujeitas a discriminação múltipla e in-
vo, que insiste: “Chegou a altura de dar já aconteceu. Já aconteceu entrar num terseccional, nomeadamente mulheres
voz às próprias pessoas”. sítio e uma família negra dizer: ‘Olha trans, trabalhadoras sexuais, racializa-
Renata, 41 anos, encaixa neste perfil. olha, um travesti.’ Mas aí eu fui e respon- das e imigrantes, “encontram-se em si-
Renata não é mesmo o nome dela, mas di: ‘Como é possível, pessoas que são ví- tuação de acentuada vulnerabilidade”.
prefere que lhe chamemos assim para timas de preconceito a serem preconcei- Se forem toxicodependentes ou seropo-
se resguardar. Nasceu no Brasil, veio para tuosas’. E a mulher ficou com o garfo pa- sitivas, ou se se encontrarem em situa-
Portugal em 2011, fez a transição (como rado na boca a olhar para mim. Mas agra- ção administrativa irregular, ainda mais.
é designado o processo da mudança de deço todos os dias por não sentir essa dis- É também por ter conhecimento des-
género) já tarde – não sabe ao certo a criminação. Quando entro nos sítios as ta realidade que Andreo Gustavo, 34
data, mas sabe que foi já em Portugal –, pessoas olham, sou uma mulher muito anos, uma dezena deles vividos já assu-
é facilmente percecionada como pessoa alta, mas rapidamente faço amizade. E midamente como homem, admite en-
trans, é trabalhadora do sexo. No Brasil aí as pessoas me veem com os outros contrar-se numa certa “posição de pri-
não, no Brasil fazia espetáculos de trans- olhos.” Sabe, no entanto, que não é sem- vilégio” em relação a outras pessoas
formismo. Depois, veio para o nosso país pre assim. “Vejo casos em que proíbem trans. “Eu sou um homem trans, mas
à procura de outras oportunidades. Aca- mulheres trans de entrar no banheiro passo bem por homem cis, porque,
bou a fazer trabalho sexual, no norte do feminino, ou em que lhes pedem para quando ando na rua, não há nada que
país, e não se lamenta por isso. Até por- sair de certos sítios. Mas felizmente co- diga que sou trans.” Lembra, por isso,

34 05.02.2023 Notícias Magazine


do se começa a transição, passa-se ali por
uma fase meia estranha, em que parece
que não se é nem carne nem peixe. Nes-
sa fase, eu até tentava não arranjar tra-
balho para não me expor. Mas a verdade
é que já tinha acabado o curso e precisa-
va de trabalhar.” Conseguiu então em-
prego numa loja de artesanato do aero-
porto. “Na altura, já estava a fazer tera-
pia hormonal, mas optei por não contar.
Passado uns meses, quando me aborda-
ram para ser chefe de equipa, achei que
devia abrir o jogo. Felizmente correu
tudo bem. Mas cheguei a ter alguns epi-
sódios desagradáveis no aeroporto, por
causa das revistas que tínhamos que fa-
zer. Porque os homens revistam os ho-
mens e as mulheres as mulheres. E eu
andava sempre com uma carta que com-
provava a minha identidade de género.
Mas houve uma pessoa que simples-
mente se recusou a fazê-lo mesmo as-
sim.” O episódio não o impediu de com-
pletar a transição. Nem de se sentir con-
fortável na nova pele. Hoje, está plena-
mente dedicado ao ativismo LGBTI+,
através da “Transparente”, “a primeira
plataforma digital portuguesa para as
questões da inclusão, da diversidade se-
xual e de género”. “Vai ser lançada em
fevereiro e inclui quizes, glossários, um
portal de informação, outro de serviços
e ainda serviços de consultoria.”

“É UMA RAPARIGA OU UM RAPAZ?”


Mas, para muitas pessoas trans – que
conseguem “passar” por pessoas cis, en-
que não representa toda a comunidade, “JÁ TRABALHEI EM VÁRIOS tenda-se –, a política do “don’t ask, don’t
diversa e heterogénea nas suas caracte-
rísticas e especificidades. E mesmo que SÍTIOS E NUNCA CONTO tell” continua a ser a postura mais segu-
ra. É o caso de Alexandre, de 23 anos, li-
o percurso escolar e profissional pareça, [QUE É UMA PESSOA cenciado em Antropologia e com uma
à primeira vista, imaculado – licenciou-
-se em Ciências Forenses e Criminais,
TRANS]. SE ME PERGUNTA- pós-graduação em Reinserção Social e
Criminologia. Começou a ter acompa-
fez mestrado em Ação Humanitária, REM DIRETAMENTE DIGO, nhamento psicológico aos 16 anos, ini-
chegou a ser consultor de comunicação NÃO MINTO. MAS NUNCA ciou a terapia hormonal aos 18, já fez
na UNICEF Nova Iorque para as ques-
tões LGBTI+ –, não se livrou, em dados SEI QUAL VAI SER A REA- “quase todas as operações”. “Falta a fa-
loplastia, mas para já ainda não é muito
períodos da sua vida, das dores do estig- ÇÃO. VOLTA E MEIA OIÇO segura, vou esperar mais uns tempos,
ma. “Em 2009, 2010, estava a estudar
Direito em Lisboa e na altura, naquela
HISTÓRIAS DE PESSOAS que a ciência está sempre a evoluir”, de-
talha. Quando, com 14 ou 15 anos, ini-
faculdade, ainda era tudo muito ‘qua- DESPEDIDAS POR CAUSA ciou a vida sexual, chegou a ter “dificul-
drado’, havia muitos estereótipos de gé-
nero e eu comecei a sentir-me muito
DISSO” dade” em perceber o que se passava com
ele, mas acha que teve “alguma sorte”,
preso para ser eu próprio. Acabei por mu- Alexandre porque os amigos e a família “sempre
dar para outra faculdade muito mais compreenderam e aceitaram”. A nível
aberta, onde me sentia bem. Mas esta laboral, também não se queixa. “Sem-
questão condicionou as minhas esco- pre tive trabalho. Mesmo durante a fa-
lhas académicas, porque se não fosse isso culdade, trabalhei em vários sítios. Mas
tinha acabado o curso de Direito.” escolhia sempre não contar a ninguém.”
Condicionou-lhe também os primei- Quando começou com as hormonas,
ros passos do percurso laboral. “Quan- quis até despedir-se do McDonald’s,

Notícias Magazine 05.02.2023 35


onde trabalhava naquela altura. “Por-

GUSTAVO BOM/GLOBAL IMAGENS


Em 2014, Júlia
que não sabia qual ia ser a reação. Mas Mendes Pereira
quando o meu chefe percebeu porque tornou-se a
é que eu queria ir embora disse logo que primeira mulher
não havia problema nenhum. Até mu- trans dirigente de
daram logo o nome que tinha no cra- um partido político
chá.” Volta e meia faziam-lhe pergun- em Portugal, ao
tas curiosas, mas sempre se sentiu aco- ser eleita para a
lhido entre colegas. “Os clientes é que Mesa Nacional do
volta e meia me perguntavam: ‘Descul- Bloco de Esquerda
pe, é uma rapariga ou um rapaz?’ E só
me apetecia responder: ‘Mas isso inte-
ressa?’.”
Entretanto, completou a transição e
tudo se tornou mais “simples”. “Já tra-
balhei em vários sítios e nunca conto
[também por isso, optou por não dar a
cara neste artigo]. Se me perguntarem
diretamente digo, não minto.” Mas por
iniciativa dele não. Por medo, no fundo.
“Nunca sei qual vai ser a reação. Volta e
meia oiço histórias de pessoas despedi-
das por causa disso.” De resto, no dia a
dia, garante que não se sente discrimi-
nado. Já quando entramos no campo
amoroso, a conversa é outra. “Há pes-
soas que fetichizam e se envolvem co-
migo só para ter uma experiência, por
ser trans. E há outras com as quais está
tudo a correr muito bem e quando per-
cebem que sou trans fecham a porta.”
Mas a aparente facilidade com que Ale-
xandre se tem movido no mercado de
trabalho é mais exceção do que regra. Os
dados da Agência da União Europeia para
os Direitos Fundamentais (FRA), que
datam de 2020, são a prova disso. Refe-
rem que cerca de 40% das pessoas trans to, muito grande dentro da própria fa- no a fazê-lo, terá de ser a Assembleia da
e intersexo em Portugal experienciaram mília. Os estudos mostram que o prin- República.”
episódios de discriminação ao procurar cipal agressor é, muitas vezes [em cerca
emprego (o dobro da comunidade LGB). de 50% dos casos, mais precisamente], “A DIFERENÇA ENTRE A VIDA E A MORTE”
Daniela Bento, pessoa trans e membro um familiar próximo.” Só que, na prática, a decisão veio criar
da direção da ILGA, assinala isso mesmo. As próprias escolas estão ainda longe um clima de caos, “em que se estão a ten-
“Muitas vezes, no momento em que, de ser um meio isento de problemas. “Há tar legitimar as posições da extrema-di-
numa entrevista de emprego, as pessoas uma lei [38/2018] que foi aprovada, que reita”. E o efeito nos mais jovens, garan-
são percecionadas como tal, surge logo existe, que diz que as pessoas abaixo dos te Manuela, é brutal. “Isto empurra para
à cabeça essa dificuldade para consegui- 16 anos têm direito a fazer a sua transi- a depressão, para a ansiedade. E às vezes
rem uma oportunidade de trabalho. E ção social. Já na altura em que foi apro- acaba da pior maneira de todas. Quem
mesmo depois, se houver problemas de vada motivou grande polémica, tanto está de fora pode não perceber, mas cha-
transfobia ou assédio, a verdade é que que ficou conhecida como a ‘lei das ca- mar o jovem pelo nome por que quer ser
não existem mecanismos para defender sas de banho’. Mas as escolas começaram chamado pode ser a diferença entre a
as pessoas. Há uma lei referente a isso no a perceber que isto era uma questão que vida e a morte. É uma questão fulcral.”
Código de Trabalho, mas na prática tra- existia e que tinha que ser tratada com a E ainda aponta o dedo à falta de forma-
duz-se em muito pouco.” devida atenção. Depois saiu o despacho ção específica dos professores para estas
Aliás, o problema começa a desenhar- com as medidas administrativas, que foi matérias. Já para não falar no bullying.
-se bem antes, muitas vezes ainda den- considerado inconstitucional, e se ha- Um emaranhado de obstáculos que, não
tro de casa. Manuela Ferreira, presiden- via escolas que demonstravam resistên- raras vezes, traz o desânimo, a falta de
te da AMPLOS – Associação de Mães e cia, esta tornou-se muito maior. Quan- aproveitamento, até o abandono esco-
Pais pela Liberdade de Orientação Se- do o que o acórdão do TC diz é que as ga- lar precoce. E que, por consequência, vai
xual e Identidade de Género, põe o dedo rantias e liberdades estão asseguradas.A impactar de sobremaneira no percurso
na ferida. “Há uma discriminação mui- questão aqui é que não pode ser o Gover- profissional.

36 05.02.2023 Notícias Magazine


Os obstáculos estendem-se a outras “esteve sempre disponível para discu-

DIREITOS RESERVADOS
áreas. Desde logo à Saúde. “Há proble- tir quotas”. “É um debate que o Bloco
mas enormes para ter acesso. Consultas está preparado para fazer. Há uma sub-
muito demoradas, filas de espera gigan- -representatividade clara das pessoas
tes, muitas queixas, profissionais de saú- trans na vida social e isso preocupa-nos
de que não estão minimamente prepa- porque ela decorre de um preconceito,
rados para receber pessoas trans,”, apon- de uma discriminação muito presente
ta Daniela Bento, da ILGA. Às vezes, até e violenta. Sendo que finalmente isto é
a alteração de nome pode ser um proble- algo que estamos a discutir.”
ma. “Há conservatórias que dizem que Júlia Mendes Pereira, que em 2014 se
não têm informação de que a lei mudou, tornou a primeira mulher trans dirigen-
que não fazem esse tipo de trâmites, que te de um partido político em Portugal,
não têm pessoal indicado para o fazer. ao ser eleita para a Mesa Nacional do Blo-
Quando, em teoria, todas as conserva- co de Esquerda (embora hoje já não in-
tórias o deviam fazer.” O acesso à habi- tegre aquele órgão), não tem dúvidas de
tação é outro bico de obra. “As pessoas que o caminho passa por aí. “É preciso
trans sentem uma dificuldade acresci- abrir espaços e postos para as pessoas da
da. Só o facto de irem ver uma casa ins- comunidade trans poderem entrar nas
pira receio. Porque temem ser percecio- mais variadas esferas”, entende a ativis-
nadas como tal e discriminadas. E depois Daniela Bento é ta. E, por falar em ativismo, de volta ao
vemos muitas vezes anúncios que são coordenadora do episódio no São Luiz e à discussão acesa
claros a dizer que determinados quartos GRIT – Grupo de que se seguiu. De um lado, os que enten-
são só para rapazes ou só para raparigas”, Reflexão e dem que, perante a falta de respostas a
alerta Tiago Castro, do Centro Gis – cujo Intervenção Trans outros protestos e a crónica opressão a
nome homenageia Gisberta, assassina- da ILGA que a comunidade trans está sujeita, só
da na cidade do Porto em 2006 –, a pri- um grito de revolta assim pode ser ouvi-
meira unidade no norte do país dedica- do. Do outro, os que entendem que foi
da a dar resposta às necessidades especí- cruzado o limite da razoabilidade, com
ficas da população LGBTi+. um ataque injustificado ao ator cis em
O psicólogo e técnico de apoio à vítima causa e, no limite, à classe artista no seu
desta unidade, que está integrada na as- todo. Júlia é clara. “Eu entendo que to-
sociação Plano i, chama ainda a atenção das as formas de protesto que sejam pa-
para outra questão, que nas últimas se- cíficas fazem sentido. Ali não se fugiu do
manas tem vindo a ganhar relevância: a pacifismo, não houve intenção de ma-
da representatividade das pessoas trans goar, mas sim de fazer ouvir uma men-
nas várias áreas da sociedade – que é hoje sagem que ainda não tinha sido ouvida.”
praticamente inexistente – e da impor- Aponta ainda o dedo à conotação pejo-
tância que ela teria. “Sobretudo no com- soas, que está em curso “a preparação de rativa do termo “transativismo”, que
bate à invisibilidade. Sabemos que a novos conteúdos pedagógicos” para as tem vindo a ser repetido pela extrema-
questão da identidade de género fica de- escolas. Lembrou ainda as campanhas -direita como algo subversivo.
finida desde muito cedo, por volta dos de sensibilização que têm sido promo- Dani Bento, da ILGA, está no mesmo
três anos. Se cresço com modelos posi- vidas e o mecanismo de queixa eletró- comprimento de onda. “Enquanto pes-
tivos, se vejo pessoas que sentem o mes- nica que tem disponível no seu site. soas privilegiadas, tendemos a achar que
mo que eu, isso valida o que estou a sen- Na esfera política, Isabel Moreira, do outras formas de ativismo são menores
tir. É empoderador e motivador, para PS, reconhece que ainda há um “enor- do que as nossas. Falta-nos entender que
que as pessoas trans tenham o mesmo me véu de ignorância em relação ao que estas vozes vêm muitas vezes de sítios
potencial de realização das outras.” é a comunidade trans”. Ignorância essa marginalizados e violentados, de uma
E isso leva-nos a uma questão-chave: que “alimenta o preconceito” e faz com necessidade mais premente de fazer
o que pode ser feito para reverter a frá- que falemos de “uma comunidade alta- uma mudança estrutural.” Maria João
gil situação em que se encontram as pes- mente ostracizada e incompreendida Vaz, a atriz trans que foi chamada para
soas trans em Portugal? Contactada pela em vários pontos do Globo”. Por isso, re- fazer de Lola na peça encenada por Da-
“Notícias Magazine”, a Comissão para conhece que as especificidades desta co- niel Gorjão, é mais comedida. “Eu subs-
a Cidadania e a Igualdade de Género munidade devem “estar presentes nas crevo a causa. Eu e a Keyla somos irmãs
(CIG) lembrou que tem vindo a traba- políticas públicas, em termos de acesso de luta. Mas, a título pessoal, não me
lhar as questões da diversidade LGBTI+ à saúde, à educação, ao emprego, à habi- identifico com este tipo de atos. Não vou
nos locais de trabalho “com algumas em- tação”. Mas prefere, para já, deixar a dis- cortar o trânsito nem vou atirar toma-
presas públicas e privadas e parceiros so- cussão das quotas de lado. Diz apenas tes. Embora entenda que as revoluções,
ciais”, que está a ser desenvolvido um que “medidas de outro tipo têm de ser muitas vezes, são feitas com sangue.” E,
programa de formação para órgãos de pensadas de um ponto de vista mais glo- a avaliar por todos os relatos que cons-
polícia criminal, “para um melhor aten- bal”. Já Joana Mortágua, deputada do tam destas linhas, esta revolução ainda
dimento, apoio e proteção” destas pes- Bloco de Esquerda, frisa que o partido está por chegar. ● m

Notícias Magazine 05.02.2023 37


Provadores
para todos
os gostos
Provar, provar e provar. Até nunca cansar e sempre
em nome da qualidade suprema de um produto. Há
quem se dedique a testar sabores durante uma vida
inteira. Um ofício singular em que a dedicação e a
capacidade de entrega são colocadas à prova
em todos os momentos. Nada pode falhar num
processo com muito para contar, desde o primeiro
contacto até à avaliação definitiva.

TEXTO
Pedro Emanuel Santos

Helena Guedes faz


parte do único painel
oficial de provadores
que certifica a
qualidade dos nove
méis DOP portugueses

38 05.02.2023 Notícias Magazine


U
ma vida de mel. Toda ela de mel. As-

NUNO PINTO FERNANDES/GLOBAL IMAGENS


sim é a de Helena Guedes, 47 anos,
zootécnica de formação e um dos 17
membros do painel oficial de prova-
dores que certifica a qualidade dos
nove méis Denominação Origem
Protegida (DOP), que corre debaixo
da alçada da Federação Nacional dos
Apicultores de Portugal. Dele fazem
parte produtores, representantes de
marcas, embaladores, até consumidores comuns.
Há quase uma década que Helena Guedes o in-
tegra, 70 provas por ano. Desde Mesão Frio, onde
habita, até seja onde for. Sempre em nome da qua-
lidade do mel, por um amor que vem de longe: as
abelhas. “Nunca tive medo, desde criança que fa-
miliares tinham produções de apicultura e sem-
pre lidei com elas. Daí que sempre queira ter
aprendido mais e mais sobre o mel”, conta. E as-
sim tem sido. Ao ponto de ser das poucas que sabe
ponto por ponto o que tem que um mel que con-
ter para ser de qualidade. E como lá chegar, a essa
avaliação exigente.
“É um processo moroso”, começa por explicar.
“Os meus principais instrumentos de trabalho
são a língua e o nariz. A parte sensorial tem que
estar muito ativa e desperta para ter atenção a
tudo o que é relativo à cor, ao sabor e ao aroma do
mel em questão. Os diferentes tipos de texturas
também são importantes”, salienta.
Porque os méis, ao contrário do que um leigo
possa imaginar, “não são todos iguais, apesar de
a sua composição natural ser praticamente idên-
tica e comum: 80% de açúcar, 18% de água e 2%
de outros componentes, como proteínas, vita-
minas e minerais”, descreve. São as diferenças
que fazem todo o segredo, essas diferenças tão
delicadas de detetar. Há-os mais doces, mais sal-
gados, mais amargos, mais adstringentes. “Daí
que seja necessário treinar com frequência para
os conseguir e saber distinguir dentro dessas pe-
quenas grandes diferenças”, reforça.
Para lá chegar, há que levar à letra de obrigação
pequenos truques essenciais na hora de consul-
tar o mel. “Antes da prova, o ideal é evitar bebi-
das quentes ou ácidas, até mesmo água. Fumar
está fora de questão, assim como alimentos for-
tes e tudo o que não seja possível limpar a nível
de palato”, revela. Mas há mais por entre cada
mel testado. “Além das pausas fundamentais, há
que ir limpando a boca com maçã ou bolacha, as-
sim como a cavidade nasal. E ir cheirando café,
de forma a libertar o cérebro.” Porque cada pro-
va é simples e rápida, apenas duas inspirações na-
sais e não mais do que três velozes idas à boca
“para não cansar muito a língua”. Então, “há que

Notícias Magazine 05.02.2023 39


FERNANDO FONTES/GLOBAL IMAGENS
diluir o suficiente para o sentir”. Manuel Antunes da do o suprassumo das escolas da especialidade a
Para chegar a provadora, tal como os restantes Silva, o primeiro nível mundial, corria o ano de 2018. Tornou-se
parceiros de tarefa, Helena Guedes teve que rea- sommelier de águas de então um “sommelier de água”, como prefere ser
lizar um conjunto de treinos comuns até à devi- sempre em Portugal mencionado. E tem passado a sua experiência
da autorização por parte do Instituto Português em vários palcos, como empresas e escolas, para
de Acreditação. “Começou-se com um processo dar a conhecer as características que fazem da
de 120 candidatos a provadores, fez-se uma bate- água esse bem tão precioso e diverso. “No fundo,
ria de testes que os reduziu gradualmente até a explicá-la às pessoas. A detalhá-la, a mostrar as
chegar aos atuais 17”, aponta Helena Guedes, pro- suas qualidades”, completa.
vadora em formação contínua, “inclusive com “Qualquer água mineral tem como base o ciclo
colegas de outros países”, participante em con- hidrológico. Cai como chuva ou neve, infiltra-se
cursos mundiais da especialidade, júri. E com um na terra em profundidade e ao contactar com as
sonho por concretizar, “o de que as pessoas pos- rochas vai dela retirar elementos para a sua cons-
sam finalmente desconstruir o sabor do mel e tituição, o que lhe dá composições diferentes”,
que parem de afirmar que todos eles são doces, pormenoriza Manuel Antunes da Silva. As pro-
que não são”. Garantia de especialista. vas, sobretudo em Portugal, onde a maioria das
águas “são de baixa mineralização e, portanto,
O sommelier de águas difíceis de se distinguir”, têm como objetivo tra-
É possível ser um provador de... águas, o mais no- çar marcas próprias. “Porque não há duas águas
bre dos líquidos nobres? É, e Manuel Antunes da iguais”, garante.
Silva, geólogo de 57 anos, é exemplo disso mes- O processo para as caracterizar durante a pro-
mo. Foi o primeiro de todos do género em Portu- va não é fácil. As provas devem ser feitas com as
gal, tem essa primazia e privilégio, e o título já águas à temperatura normal – entre os 11 e os 12
ninguém o retira depois de ter feito um curso na graus. “Se estiverem mais frias do que isso ador-
Doemmens Academy, na Alemanha, considera- mecem as papilas gustativas e retiram a eficácia

40 05.02.2023 Notícias Magazine


da experiência”, sublinha. Depois, vêm etapas

PAULO SPRANGER/GLOBAL IMAGENS


essenciais em que nada pode faltar. “Primeiro,
cheiro a água e percebo se há algum aroma erra-
do provocado por um eventual mau engarrafa-
mento. Segue-se a observação visual, para ana-
lisar a transparência e comprovar a presença ou
ausência de partículas em suspensão, ou como
se comportam as bolhas de gás”, partilha o
sommelier.
Durante a prova, a água não devia ser total-
mente bebida, pelo contrário. “O ideal é que
deslize ao longo da língua e tome contacto com
toda a boca. Ao degluti-la, há aromas que se li-
bertam e que se percebem na prova nasal, os
quais são realçados quando, depois, a água é sor-
vida”, especifica.
Manuel Antunes da Silva, que entretanto viu
juntar-se à sua categoria outros companheiros
de tarefa, “poucos, nem uma dezena”, lamenta
que as pessoas ainda não deem à agua o verdadei-
ro valor. “Bebem-na mas não a saboreiam. O que
é uma pena, porque estão a perder sabores que
não imaginam”, considera. É, precisamente, para
dar à estampa essas características únicas que
desenvolve o seu trabalho através de empresa
própria, depois de anos e anos ligado a uma gran-
de companhia do setor. Explica tudo a todos, so-
bretudo a quem lida com água e não lhe sabe dar
a devida consideração. “Num restaurante, por
exemplo, os clientes deveriam ser informados
sobre o que vão beber. Tal e qual se faz com um
vinho, uma água deveria ser descrita ao porme-
nor, seria um valor acrescido”, sugere. Mas ain-
da não é e o caminho é longo para lá chegar. Ma-
nuel Antunes da Silva tem a tarefa de o encurtar,
explicando os segredos de algo que “parece igual
mas está longe, muito longe, de o ser”.

Gelados, segredos e provocações


O apelido não engana. Eduardo Santini é neto do
homem que mudou a forma de ver e consumir Eduardo Santini já inesperadas e pouco prováveis. “Sou eu que te-
gelados artesanais em Portugal e que criou uma provou e testou mais nho a responsabilidade de descobrir o que esse
marca que é muito mais do que isso. Aos 46 anos, de 500 gelados novo sabor vai representar para quem o experi-
Eduardo não se lembra de mais nada a não ser de mentar pela primeira vez”, admite. Não se arre-
gelados. E de viver com eles, de conviver com pende nem se atemoriza. “Não há segredo al-
eles, de os ver a nascer, de lhes conhecer os pas- gum, apenas manter um paladar bem atento. E
sos e processos até chegarem a quem mais inte- ter atenção particular à textura, à resistência e
ressa, o consumidor final. E de os provar. Sem- à temperatura, porque o gelado vai estar sempre
pre. Até hoje. a 15 graus negativos e não pode apresentar-se
“Trabalhei toda a minha vida na Santini e sou nem demasiado mole, nem demasiado duro”,
provador e responsável pela produção de gela- assegura com simplicidade. O equilíbrio é, pois,
dos e pelos novos sabores”, define-se. Daí a de- o “grande segredo”. E há as matérias-primas,
licada e sempre incansável tarefa de os testar, “que devem ser o mais naturais possível, sem-
dia após dias, mês após mês, sabor após sabor. pre frescas e de qualidade”. A tática é “nunca per-
Até encontrar a alquimia perfeita que faça nas- der de vista que um gelado deve captar a essên-
cer uma nova relíquia, às vezes de combinações cia e o sabor das matérias-primas que o fazem”.

Notícias Magazine 05.02.2023 41


Ser provador de gelados em Portugal não é ca-
tegoria oficial. “Não há cursos nesse sentido,
cada empresa tem os seus procedimentos pró-
prios, até porque têm produtos diferentes para
oferecer aos clientes”, detalha Eduardo Santi-
ni, saber feito depois “de horas e horas a apren-
der com o avô e, sobretudo, com o pai” os segre-
dos dessa arte tão única. “Tive a vida facilitada”,
reconhece. “O primeiro gelado que fiz, devia ter
uns 15 anos, foi de limão e pedaços de chocola-
te”, recorda-se bem.
Desde então, quase perdeu a conta aos que ten-
tou, aos que concebeu, aos que procurou que
combinassem algo diferente mas que acabaram
por ficar pelo caminho dos testes. “A Santini vai
em 550 sabores, quase todos criados por mim”,
orgulha-se. “Por vezes, há que tentar combinar
o impossível. Como os gelados de brigadeiro ou
de mousse de chocolate, por exemplo, que têm
que manter a vertente típica do gelado, como a
frescura, sem perder a cremosidade do original
que o compõe.”
Eduardo Santini confessa que gosta de “provo-
car os sentidos” e propor gelados que parecem
peças de puzzles diferentes, mas que acabam por
casar sem sobressalto. “Como o de queijo gor-
gonzola com nozes ou o de pipocas”, elenca. Por-
que não há impossíveis no que a gelados diz res-
peito. Nem rotinas na hora de os provar. “Sou e
serei um eterno apreciador”, garante Eduardo
Santini.

Sensibilidade e gosto apurado


A tarefa vem de longe, corria o ano de 1998, mas
José Matias não faz da rotina motivo de desalen-
to. Pelo contrário. Este provador oficial de Quei-
jo Serra da Estrela é, aos 52 anos, um dos mais ex-
perientes do país e faz parte do painel de 12 que
experimentam esta especialidade única, feita de
especificidades muito próprias, para comprovar
que a qualidade está lá e vai chegar intacta ao con- José Matias testa quando a boca e o palato estão limpos, assim
sumidor final, de acordo com as normas e regras Queijo da Serra da como o olfato e as papilas gustativas. É desacon-
traçadas pelo exigente processo de certificação Estrela desde 1998 e selhável ingerir café ou consumir alimentos que
exigido aos produtores. garante que não há possam interferir com o gosto sensorial. E não se
Uma maratona que tem de novembro a maio, dois iguais deve fazer a barba por causa dos cremes, que po-
“meses de maior produção”, os picos mais inten- dem desviar odores do essencial e deturpar a ava-
sos de testes. “Pelo menos de 15 em 15 dias há liação final”, assinala José Matias, engenheiro
uma prova”, frisa. “A responsabilidade é imen- agroalimentar de formação e profissão. Tudo para
sa, nada pode ficar para trás”, diz José Matias. que o melhor do Queijo da Serra da Estrela seja
Para tal, há uma tabela de avaliação que é segui- aferido com toda a precisão e detalhe. Um pro-
da à letra, com atenção particular para pormeno- cesso que deve ser lento e pleno de cuidados aper-
res como a “crosta, a forma e a pasta dos queijos”. tados para que nada se perca pelo caminho, nem
São atribuídos pontos de sensibilidade, medidos se confundam atribuições e pormenores que pos-
numa escala que vai até cinco pontos, percebi- sam fazer a diferença final. “Avaliam-se apenas
dos os sabores, detalhados os aromas. cinco queijos de cada vez, de forma a evitar o can-
“As provas são sempre realizadas de manhã, saço dos sabores e das características”, refere.

42 05.02.2023 Notícias Magazine


OFICIAIS

MIGUEL PEREIRA DA SILVA/GLOBAL IMAGENS


DE QUALIDADE
Existem várias cate-
gorias de provadores
oficiais certificados
pelo IPAC – Instituto
Português de Acredi-
tação.

Os vinhos concen-
tram o grosso dos
provadores nacionais,
praticamente todos
reunidos debaixo da
alçada da Câmara de
Provadores do Insti-
tuto dos Vinhos do
Douro e do Porto.

O azeite conta com


um painel de cerca
de 20 provadores
oficiais, que todos
os anos se juntam
no Concurso Nacio-
nal de Azeites de
Portugal.

A Autoridade de
Segurança Alimentar
e Económica (ASAE)
possui uma Câmara
de Provadores, que
avalia uma vasta
gama de alimentos
e bebidas.

Há produtos, como
Para chegar a provador, tal como os colegas de o café e o chocolate,
ofício, José Matias passou por uma “formação es- que não contam com
pecial” onde testou a avaliação sensorial. Todos uma categoria especí-
os anos realiza o que apelida de “ações de recicla- fica de provadores
gem” e procura intensificar os conhecimentos. oficiais, mas que têm
“Tudo em nome da afinação total”, realça. Por- profissionais com tal
que a responsabilidade é imensa e pelo seu crivo tarefa que desempe-
passam anualmente uma média de 80 queijos nham funções em
Serra da Estrela, “todos eles diferentes, devido à empresas da especia-
alimentação dos animais e ao seu leite”. lidade.
Um desígnio que José Matias jura “nunca ser sa-
turante”. Em nome de um bem maior, o de um
produto singular recheado de processos também
eles singulares. E que dá fama em forma de sabor
especial e proveito à zona mais alta de Portugal
continental. ●m

Notícias Magazine 05.02.2023 43


Brincar na rua
é importante
(e não é difícil
perceber porquê)
Mexer o corpo torna-te mais ágil e autónomo. Puxar
pela cabeça em jogos e aventuras ao ar livre ajuda-te
a exercitar o raciocínio. Os especialistas
recomendam. Por muitos motivos.
POR Sara Dias Oliveira

Carlos Neto, um dos maiores espe-


EM AÇÃO

O panorama está identificado cialistas do Mundo na área da brincadeira


PENSAMENTO

e não é animador. Sedentaris- e do jogo, professor catedrático da Faculdade de Mo-


mo infantil, inatividade física, tricidade Humana da Universidade de Lisboa, avisa que
brincar é um assunto sério. “Brincar não é um passa-
horas em frente aos ecrãs e
tempo ou um entretenimento. É um modo de pôr em
outros aparelhos digitais (me- ação o pensamento”, escreve no seu livro “Libertem as
xendo apenas olhinhos e de- crianças”.
dinhos), agendas preenchidas Brincar na rua é brincar de forma livre, é ser ativo, é pes-
com atividades formatadas, quisar e é explorar, é correr riscos, é ganhar independên-
isolamento social cada cia a nível de mobilidade e destreza física, é encontrar
vez mais evidente e desafios motores, cognitivos, emocionais e sociais em
preocupante. Esta variados contextos. É ser mais ágil no corpo e na cabe-
forma estática ça. É conquistar autonomia. É aprender. É colocar todos
de passar os os membros em ação, mãos e pés, olhos e
dias tem con- ouvidos, cérebro e emoções, senti-
mentos e linguagem.
sequências.
Carlos Neto deixa vários
Falta tempo e recados aos adultos, aos
falta espaço? pais. “Conhecer e ex-
É uma ques- plorar os espaços
tão de organi- exteriores através
zação. Brincar da promoção de
na rua tem muitas autonomia impli-
vantagens – enten- ca sair de casa e
da-se por rua, espaços experimentar
a céu aberto, parques uma grande va-
riedade de am-
verdes, sítios para correr,
bientes físicos.
jogar, dar asas à imagina- Não atrapalhem
ção (não estradas cheias as crianças. Dei-
de carros). xem-nas brincar
livremente.”

44 05.02.2023 Notícias Magazine


FANTASIA, IMAGINAÇÃO,
FAZ DE CONTA
Rute Agulhas, psicóloga e terapeuta fa-
miliar, viu crianças a brincar na rua em
Cabo Verde, onde esteve recentemen-
te. “Umas jogavam ao que chamamos
70%
É a percentagem de
crianças portuguesas
de ‘lencinho’ e outras faziam de conta
que as poças de lama eram mares na- que passam menos
vegados por navios, feitos de pedri- tempo ao ar livre do
nhas”, conta. Um cenário que não es-
quece. São brincadeiras que, refere,
que os 60 a 120 minu-
“facilitam a socialização e a integração tos recomendados
no grupo de pares, bem como a fanta-
sia, a imaginação e o faz de conta”.
para os presos, pelo
Todavia, brincar na rua é cada vez Alto Comissariado das
mais raro, a resistência a sair de casa Nações Unidas para
é cada vez mais forte, os ecrãs do-
minam os tempos livres. E não
os Direitos Humanos.
pode ser. “Nos dias de hoje, os
maiores riscos e perigos an-
dam no bolso das crianças e, “BRINCAR É ESTIMU-
muitas vezes, dormem com
LAR O SENTIDO DE
elas na cama”, observa Ru-
te Agulhas. “É desejável que HUMOR E DE JUSTI-
exista um equilíbrio entre as ÇA, A POSITIVIDADE
atividades online o offline, DO CÉREBRO E DO
sendo certo que brincar na
PENSAMENTO, A CA-
rua e em contacto com a Na-
tureza e com outras crianças PACIDADE DE RE-
permite desenvolver e estimular SOLVER PROBLE-
diversas competências”, refere. MAS E DE APRENDER
Competências de comunicação, re-
A LIDAR COM O IN-
solução de problemas, cooperação ou
competição. Por isso, há que correr, sal- CERTO E A IMPREVI-
tar, jogar à bola, andar de baloiço. Brin- SIBILIDADE E, PRIN-
car ao ar livre. CIPALMENTE, É PAR-
TILHAR O SENTIDO
DA VIDA EM EMPA-
TANTO PARA FAZER, TIA COM OS OU-
TROS”
TANTO PARA EXPLORAR Carlos Neto, no seu livro
“Libertem as crianças”

10,8%
Carlos Neto dá vários exemplos. Subir às árvores,
escorregar, rebolar no chão e na areia, jogar à bola,
andar de patins, de skate, de bicicleta, chapinhar na
água. Correr, saltar, dançar, o toca e foge, as escon-
didinhas, observar as maravilhas da Natureza, me-
É a percentagem de crianças que fre-
xer na terra. Há tanto para fazer fora de casa. Uma quentam creches e jardins de infân-
criança saudável tem os joelhos esfolados, segundo cia que brincam nos espaços exterio-
Carlos Neto. A roupa suja. res (recreios) durante os três meses
de inverno. É uma percentagem bas-
Estamos a falar de segurança e autonomia, sobrevi- tante baixa. Em média, os bebés com
vência e confronto com adversidades, superação e menos de um ano têm duas saídas ao
capacidade adaptativa. Brincar lá fora tem tudo isto. exterior no inverno.

Notícias Magazine 05.02.2023 45


tag.jn.pt
SÓ TENS MAIS UNS
MUNDO DIAS PARA VISITAR
BAIXA LITERACIA ESTÁ LIGADA A PIOR AS LUZES
SAÚDE MENTAL, DIZ ESTUDO SELVAGENS NO ZOO!
As pessoas com níveis de literacia baixa (de forma simples, é a capacida-
de para interpretar o que é lido corretamente) estão expostos a maiores
problemas de saúde mental. A conclusão é de um estudo da Universida-
de de East Anglia, no Reino Unido, que concluiu que 14% da população
sem literacia ou analfabeta tem maior incidência de problemas como de-
pressão e ansiedade.

AFEGANISTÃO
TALIBÃS CAUSAM AUMENTO DE TAXAS DE DESNUTRIÇÃO
A tomada do poder pelos talibã em 2021 levou à pobreza da população
e, agora, a fome está a bater recordes no Afeganistão. Segundo o Pro-
grama Alimentar Mundial, da ONU, metade do país está atualmente a
passar fome severa, com taxas de desnutrição críticas. De acordo com
a instituição, “existem quatro milhões de crianças e mães desnutridas”.
À volta do Mundo

46 05.02.2023 Notícias Magazine


ANOTA AÍ

INSTAGRAM WORKIDSHOP
Mais de dez mil
pessoas já visita-
ram a primeira edi-
ção das Luzes Sel-
vagens no Zoo
Santo Inácio, em
Vila Nova de Gaia.
A inédita exposição
luminosa, que che-
gou a este espaço
em setembro, ter-
mina a 26 de feve-
reiro. Lê tudo em
tag.jn.pt.

APRENDER ARQUITETURA
É DESDE PEQUENINO
Há workshops e formações disto e daquilo, do que aprender sobre arquitetura, serve para
mas alguma vez ouviste falar de um sobre ar- aprender sobre o que nos rodeia.
quitetura? É a proposta da WorKIDshop e da Para os mais velhos há também novidades.
arquiteta Ana Teresa Verdasca. O próximo O WorKIDshop estreou recentemente os
evento acontece em Sesimbra, na próxima “Arch TEEN Talk”, uma conversa descontraí-
TESTE DO PEZINHO. semana, a 11 de fevereiro. da e divertida sobre arquitetura. “O que é a
SABES O QUE É? Através de noções básicas de arquitetura, profissão?”; “como é o curso?”; ou “o que se
o WorKIDshop de Sesimbra procura trans- faz como arquiteto?” são algumas das dúvi-
É uma picada no mitir conceitos “de uma forma simples e das que vão ser respondidas. Tudo isto acom-
calcanhar do bebé criativa”. E divertida! A formação de Sesim- panhado de bebidas e petiscos.
para colher algumas bra chama-se “Luz F” e já andou por outras O workshop de Sesimbra acontece a 11 de
gotas de sangue cidades do país. Aqui, vais aprender sobre jo- fevereiro, às 10 horas, no CAIES (Centro de
pouco depois do gos de luz e sombra – pondo mãos à obra. No Apoio à Incubação de Empresas de Sesim-
nascimento, entre final, vais poder levar a tua criação para casa, bra). As informações estão disponíveis na pá-
os terceiro e sexto para a “usar e relembrar os conceitos apren- gina de Instagram e as inscrições devem ser
dias de vida. Não é didos”. feitas através do email do grupo
uma bola de cristal, Destinado também aos mais pequenos, o (worKIDshop@outlook.pt). Cada bilhete
mas quase. O teste WorKIDshop está a preparar uma nova for- tem o custo de 15 euros. Para quem procura
do pezinho permite mação: “cor de vista”. E sobre isto, o que se oferecer uma prenda aos mais novos, o
detetar várias doen- sabe, para já, é que envolve cores e pulseiras WorKIDshop, um coletivo criado no ano pas-
ças de uma forma brilhantes. A inauguração do novo formato sado pela arquiteta com 15 anos de experiên-
precoce, ou seja, acontece a 4 de março, na Quinta dos Avós, cia na área, Ana Teresa Verdasca, vende vou-
bastante cedo. em Leiria. chers para as formações. ● m
Sabe mais no site Os workshops para crianças são destinados SARA SOFIA GONÇALVES

do TAG. aos mais pequenos com idades entre os cin-


co e os dez anos e têm como objetivo fomen- WorKIDshop
tar o espírito crítico, de estética e a noção de 11 de fevereiro, às 10 horas. Bilhetes a 15 euros
tridimensionalidade, através da aprendiza- Centro de Apoio à Incubação de Empresas de
gem de conceitos de espaço. Por isso, mais Sesimbra

Notícias Magazine 05.02.2023 47


GESTÃO DE TEMPO
POR Sofia Teixeira

Outra
vez uma
reunião
?
KAI001/ADOBE STOCK

48 05.02.2023 Notícias Magazine


tagens que a reunião possa ter tido.”
Um dos grandes benefícios das reuniões pre-
senciais bem geridas, explica a investigadora, é
“a experiência afetiva positiva, motivadora e co-
laborativa” que é criada, que ajuda “a desenvol-
ver a cultura organizacional através das relações
interpessoais positivas”. Assim, se o encontro é
É uma queixa comum entre os trabalhadores: o percepcionado de forma negativa por quem par-
tempo que passam em reuniões, enquanto o ticipou, além dos custos diretos com a reunião –
como o pagamento do tempo em salários –, a em-
trabalho se acumula em cima da secretária.
presa gera um gigante custo indireto: o stresse,
Têm alguma razão: estes encontros são muitas desânimo e insatisfação a que sujeita as pessoas.
vezes desnecessários e pouco produtivos e, Há um conjunto de crenças e expectativas, não
contas feitas, servem para pouco mais do que escritas, que o trabalhador e o empregador têm
roubar tempo e paciência à equipa e um sobre o outro: por exemplo, o trabalhador es-
produtividade à empresa. Como organizar pera que a empresa confie no seu trabalho e a em-
e conduzir boas reuniões? presa espera que a pessoa se empenhe em fazê-

H
-lo. A isto se chama o contrato psicológico e as reu-
niões desnecessárias podem quebrá-lo. “Se acon-
tece sistematicamente a pessoa ir para uma reu-
á reuniões que podiam ter sido um nião e sentir que perdeu tempo, seja porque o ob-
email ou um memorando interno. jetivo não foi cumprido, seja porque a sua opi-
São incontáveis as que começam nião não foi ouvida, gera-se uma sensação de in-
com atraso e não têm hora para ter- satisfação que faz com que as pessoas se vão des-
minar. Grande parte não tem uma vinculando das equipas e da organização”, con-
agenda definida e, mesmo as que sidera Gabriela Gonçalves.
têm, rapidamente derivam para te-
mas estranhos aos objetivos do en- O ABC das reuniões
contro. Numas ninguém fala, nou- Muitos textos com orientações sobre como rea-
tras fala toda a gente ao mesmo tem- lizar uma reunião de sucesso começam com esta
po. No fim, uma parte significativa dos partici- recomendação: definir bem a agenda. Mas há
pantes não faz ideia da conclusão a que se chegou uma pergunta que tem de vir antes: é mesmo pre-
– provavelmente porque não se chegou a conclu- ciso marcar uma reunião? “Há três perguntas a
são nenhuma – e regressa à sua secretária a pen- fazer antes do agendamento: ‘Tenho uma razão
sar: ‘Afinal, o que é que estivemos a fazer?’. de peso para reunir pessoas?’, ‘preciso que as pes-
Em Portugal há poucas estatísticas disponíveis soas interajam com o conteúdo da reunião?’,
sobre o número de reuniões realizadas e as per- ‘pode outro formato, como um email, funcionar
cepções que os trabalhadores têm delas. Mas os tão bem ou melhor e ser mais eficiente?”, defen-
dados dos Estados Unidos da América mostram de Steve Rogelberg, que é uma espécie de guru
que as organizações gastam cerca de 15% do seu das reuniões. “Se as respostas forem sim, sim e
tempo em reuniões, onde os trabalhadores pas- não, vá em frente e tenha uma reunião. Qualquer
sam, em média, 31 horas por mês. Cerca de 45% outra combinação de respostas sugere que ela
dos funcionários sentem-se assoberbados com provavelmente não é necessária”, resume o pro-
tanto tempo despendido, 65% consideram que fessor de Psicologia Organizacional da Universi-
a atividade lhes rouba tempo de trabalho e 41% dade da Carolina do Norte – Charlotte, nos Esta-
admitem passar estes encontros a fazer, parale- dos Unidos (EUA), que já publicou mais de 150
lamente, outras tarefas. “O problema não são as artigos sobre eficácia, liderança e envolvimento
reuniões, é a maneira como elas são geridas”, fri- em equipas – parte deles sobre reuniões.
sa Gabriela Gonçalves, professora e investigado- Só depois disso é altura de pensar na agenda.
ra do Departamento de Psicologia e Ciências da Para isso, o especialista – também autor do livro
Educação da Universidade do Algarve. “De fac- ‘The surprising science of meetings: how you
to, a maioria das pessoas considera as reuniões can lead your team to peak performance’ (sem
desnecessárias, cansativas, desmotivantes e pou- edição em português – “A surpreendente ciên-
co produtivas. E que, se os participantes têm uma cia das reuniões, como levar a sua equipa ao de-
experiência tão negativa, isso acaba com as van- sempenho máximo”, numa tradução livre) – su-

Notícias Magazine 05.02.2023 49


GESTÃO DE TEMPO

tos da reunião também podem e devem atender


aos hábitos, normas e costumes de quem partici-
pa. “Hoje em dia, as empresas trabalham muito na
gestão da multiculturalidade”, assinala a professo-
ra e investigadora da Universidade do Algarve. Diz
que, ao passo que em al-
guns países asiáticos, tradi-
gere que, em vez de se estabelecer um conjunto cionalmente, as reuniões “DE FACTO, A MAIORIA
de tópicos a discutir, se tente organizar a agenda começam com as pessoas a DAS PESSOAS CONSIDERA AS
como um conjunto de perguntas a serem respon- perguntar mutuamente REUNIÕES DESNECESSÁRIAS,
didas. “Isso faz com que o líder da reunião pense como está a família, “para
sobre o que espera alcançar e também há uma no- mostrar respeito e interes-
CANSATIVAS, DESMOTIVAN-
ção melhor de quem deve ser convidado: as pes- se”, nos países nórdicos TES E POUCO PRODUTIVAS”
soas relevantes para responderem às perguntas”, “não há esse hábito e ele
especifica. Por fim, dessa forma, o facilitador sabe pode até ser sentido como Gabriela Gonçalves
quando encerrar o encontro e também se foi bem- intrusivo”. A chave para Professora e investigadora do Departamento
-sucedido: as perguntas foram respondidas. “Se gerir estes momentos é a de Psicologia e Ciências da Educação
a pessoa não consegue pensar em nenhuma per- mestria do facilitador, da Universidade do Algarve
gunta, isso provavelmente significa que não pre- “que deve conhecer a equi-
cisa de uma reunião”, conclui. pa e estar atento a esses
Já a coach empresarial e de executivos Maria- pormenores”. “AS REUNIÕES SÃO
na Arga e Lima considera que “as reuniões são FUNDAMENTAIS PARA
fundamentais para manter o alinhamento e o Desafio: saber gerir MANTER O ALINHAMENTO
compromisso da equipa”. Nas empresas que de tempo
acompanha, incentiva os gestores a marcarem As reuniões em excesso
E O COMPROMISSO
com as suas equipas reuniões de seguimento do são um problema, mas pe- DA EQUIPA”
negócio diárias, semanais e trimestrais. Pode pa- car por defeito não com-
recer muito um encontro programado diaria- pensa. Na sua vida profis- Mariana Arga e Lima
mente, mas a coach justifica que são importan- sional Mariana Arga e Coach empresarial e de executivos
tes para “manter o ritmo e o foco dos colabora- Lima passou por empre-
dores”. São, no entanto, reuniões muito rápidas. sas em que não havia reu-
“Com 10 minutos, no máximo, preferencial- niões e observou as más consequências dessa op-
mente em pé, para garantir que não se esten- ção. “A informação não fluía na empresa, as pes-
dem, [servem] apenas para ver o que foi feito no soas não partilhavam as suas ideias, não conhe-
dia anterior e focar no que vai ser feito no dia.”. ciam os caminhos que a empresa globalmente
Já para as reuniões semanais, aconselha uma du- estava a fazer, não prestavam contas das suas ta-
ração de cerca de uma hora, com o objetivo de refas, não recebiam feedback das suas ações.” O
analisar os resultados da semana anterior, en- resultado revela, “era a alienação completa” e a
tender as maiores dificuldades da equipa e pro- perda de produtividade, “já que havia pessoas a
gramar a semana seguinte. Acredita ainda que fazer funções repetidas e as aprendizagens de uns
os encontros trimestrais são muito importan- não eram aproveitadas pelos outros”.
tes e, embora tenham a duração de um dia intei- Por outro lado, também testemunhou e reco-
ro, refere que, por norma, são os dias mais pro- nhece o peso do excesso de encontros mal orga-
dutivos do ano. nizados, mal conduzidos e com demasiada gen-
A duração, formato ou tom ideal para uma reu- te: assuntos que poderiam ser discutidos entre
nião depende da organização ou empresa, dos duas ou três pessoas, em 15 minutos, eram leva-
participantes e do objetivo do encontro. “Se uma dos para múltiplas reuniões de duas horas e 10 ou
passagem de turno num hospital tem de ser rá- 15 participantes. “Nestas empresas, a sensação
pida, relativamente ‘seca’ e focada no trabalho que todos os colaboradores tinham é que a sua
concreto”, exemplifica Gabriela Gonçalves, uma agenda estava cheia de reuniões pouco produti-
primeira reunião numa empresa para fazer vas e que sobrava pouco tempo para trabalhar.”
brainstorming sobre um novo projeto, “precisa Para as reuniões serem produtivas e motivan-
de tempo, de espaço para o humor, para ser cria- tes há uma competência essencial por parte de
tivo e inovador”. quem as coordena: a gestão do tempo. A investi-
Além disso, o formato e o tom de alguns momen- gação de Steve Rogelberg mostra que habitual-

50 05.02.2023 Notícias Magazine


mente apenas cerca de 50% do tempo de reunião
é eficaz, bem utilizado e envolvente. As suas en-
trevistas a milhares de participantes de reuniões
no Mundo mostram que os bons líderes de reu-
niões têm uma coisa em comum: veem-se como
administradores do tempo dos outros. “Curiosa-
mente, os líderes geralmente adotam esta men-
talidade de gestores do tempo dos outros quan-
do o encontro de trabalho é com clientes impor-
tantes ou com os chefes, porque não gostariam
que estas pessoas saíssem a dizer que não se sen-
tiram incluídos ou que a reunião foi uma perda
de tempo, mas esta gestão é muitas vezes des-
considerada quando se reúnem com a equipa ou
colegas.”
Esta gestão de tempo que os bons facilitadores
fazem, salienta o autor e investigador, assenta
em quatro pontos: o cuidado com a lista de con-
vidados que não deve ser excessiva; um arranque
do encontro que defina um tom enérgico e bem-
-humorado; uma facilitação ativa que vá dando
palavra aos intervenientes e, em quarto lugar,
um período de encerramento onde “é feita uma
espécie de sinopse do que foi dito” e “identifica-
das as pessoas responsáveis por cada assunto a
tratar”. Este resumo, vinca, deve ser disponibi-
lizado “num formato que torne as informações
o mais acessíveis possível, tanto para aqueles que
participaram da reunião, quanto – e talvez ain-
da mais importante – para aqueles que não com-
pareceram”. Isso é válido tanto para as reuniões
presenciais, como para as online, apesar de o meio
virtual colocar outros desafios.
Um inquérito publicado em novembro de 2022,
realizado pelo Instituto Nacional de Estatística,
mostra que 47% das empresas portuguesas rea-
lizam reuniões à distância. Destas, 61% admite
que favorecem estes encontros por via virtual.
O estudo que Steven Rogelberg fez durante o ve-
rão de 2020, com dados de 150 funcionários de
vários setores de atividade nos EUA e na Europa,
mostra que há acordo quanto ao cansaço causa-
do pelas reuniões via Zoom, mas não há consen-
so sobre o porquê. Uns apontam os horários, ou-
tros a estrutura da reunião, há os que mencio-
nam a falta de contacto social, há os fãs e os ha-
ters da ferramenta bate-papo.
“Não há uma solução universal”, aponta Rogel-
berg, “e isso sinaliza a necessidade de resposta
personalizada dos líderes.” Assim, para evitar o
cansaço e aumentar a eficácia destes encontros
de trabalho online, o líder deve fazer o que geral-
mente os bons líderes fazem: pedir feedback e
tentar incorporar essas preferências no planea-
mento da reunião seguinte. ● m

Notícias Magazine 05.02.2023 51


bem-
estar
ODONTOPEDIATRIA
POR Sara Dias Oliveira

As crianças e os
seus dentes. Escovas,
pastas, rotinas
A higiene oral dos mais pequenos exige atenção desde o nascimento.
Tem a sua arte e os seus cuidados. Limpezas, consultas, práticas.
Não é apenas uma questão estética da imagem, é sobretudo funcional
do mastigar e fonética do falar. E com isso não se brinca.

É uma responsabilidade, uma enorme responsa- mento. O normal é o bebé ter 20 dentes de leite
bilidade, entre tantas tarefas diárias. Cuidar dos que geralmente nascem a partir dos seis meses
dentes dos bebés e das crianças exige muita aten- de idade”, explica João Espírito Santo, dentista,
ção e bastante cuidado. De todos os lados. Não se especialista em cirurgia oral. Pode ser mais cedo,
pode facilitar nesta questão porque os dentes não pode ser mais tarde, varia muito. Pode ser um pro-
são um pormenor na vida de miúdos e graúdos. cesso simples, sem complicações, ou mais com-
Desde cedo, muito cedo. Até porque os dentes de plexo que causa desconforto. Cada caso é um
leite formam-se ainda na barriga da mãe e rom- caso. “Os dentes de leite têm vários papéis im-
pem as gengivas antes do primeiro ano de vida. portantes desde estéticos (autoestima), funcio-
Comecemos pelo princípio, portanto. “Todos nais (mastigação), fonéticos, além do papel ime-
os dentes temporários estão formados ao nasci- diato têm um papel importante de manter o es-

52 05.02.2023 Notícias Magazine


IMAGENS: ADOBE STOCK
paço para o dente permanente”, acrescenta o uma ervilha ou equivalente à unha do dedo min-
dentista da Medical Art Center no Porto. dinho da criança”, indica João Espírito Santo.
Aos três anos, a criança deverá ter os 20 dentes À medida que a criança cresce, incentiva-se a
de leite à mostra. Os permanentes começam a nas- sua própria escovagem. De qualquer forma, até
cer por volta dos seis anos, aos 14, mais ano menos aos sete anos, é essencial supervisionar a limpe-
ano, a maioria desses dentes devem ter termina- za dos dentes. E mais um dado. “Uma escova de
do a erupção. “A exceção são os dentes do siso, que dentes manual usada corretamente é tão eficaz
tendem a surgir entre os 17 e os 21 anos de idade”, quanto uma escova elétrica”, garante Mariana
adianta Mariana Seabra, especialista em odonto- Seabra, que também está na Medical Art Center
pediatria. Os adultos têm 32 dentes, em regra, in- “UMA ESCOVA no Porto.
cluindo os dentes do siso, caso os tenham. DE DENTES
Os dentes têm uma vertente estética e uma MANUAL Cáries, infeções, extrações
componente funcional. Tratar deles desde cedo USADA COR- A primeira consulta num odontopediatra, mé-
é essencial. Mariana Seabra deixa um aviso im- dico especialista no atendimento a bebés, crian-
portante. “Como o esmalte é fino, os dentes de
RETAMENTE ças, adolescentes, deve acontecer antes dos 12
leite têm maior probabilidade de serem afetados É TÃO EFICAZ meses, logo que os primeiros dentes rompam a
por cáries e erosão se forem expostos a muito açú- QUANTO UMA gengiva. Depois, é necessário colocar na agenda
car ou bebidas ácidas.” ESCOVA ELÉ- consultas ao dentista de forma regular. Até aos
A higiene oral tem de começar logo que os den- TRICA” 18 anos, o intervalo entre consultas deve ser
tes nasçam. Não há outra forma. A escova e a anual. Não menos do que isso.
quantidade de pasta merecem atenção, assim Mariana Seabra Há aspetos a ter em consideração, procedimen-
como a frequência da lavagem. Escova macia, es- Odontopediatra tos a fazer, cuidados a não esquecer. Mariana Sea-
covagem regular como rotina matinal e notur- no Medical Art Center bra avança com vários: “Nunca deixe o seu bebé
na, pasta com flúor. “O importante será a quan- no Porto ou criança com biberão/copo na boca por longos
tidade de pasta que é colocada na escova. Inicial- períodos de tempo. Nunca mergulhe a chupeta
mente o equivalente a um bago de arroz, depois em bebidas doces e não ‘limpe’ as chupetas dos
dos três anos uma quantidade do tamanho de seus bebés colocando-as na própria boca”. “Evite

Notícias Magazine 05.02.2023 53


bem-
estar
ODONTOPEDIATRIA

a ingestão, antes de ir para a cama, de leite e de ali- tar, o inchaço, por vezes. É tudo o que advém daí.
mentos líquidos açucarados”, sublinha. E quando Não conseguir comer, não conseguir sossegar.
o bebé tiver idade suficiente para beber qualquer Mariana Seabra é clara neste ponto. “Se não for
outra coisa que não leite, a melhor bebida é água. tratada, a cárie pode ocasionar dor e infeção, o
João Espírito Santo acrescenta mais conselhos. que pode prejudicar a alimentação, reduzindo a
Depois de um ano de idade, não comer ou beber, ingestão de alimentos, causar irritabilidade e dis-
exceto água, antes de ir para a cama. “Não colo- túrbios do sono.” A fase aguda da infeção não é
que outras bebidas além do leite no biberão do para brincadeiras. Por isso, tudo fazer para que os
seu bebé, nem adicione qualquer coisa, como açú- dentes não cheguem a esse estado. “Os cuidados
car ou mel.” Incentivar a escovar os dentes pelo “OS DENTES preventivos devem incluir aconselhamento so-
menos duas vezes ao dia quando tiverem idade DEVEM SER bre o uso de pasta dentífrica com flúor, aconse-
para isso. “Os dentes devem ser escovados antes ESCOVADOS lhamento dietético adequado, aplicação de se-
de ir para a cama, para que a última coisa na boca ANTES DE IR lantes de fissuras e instruções de higiene oral”,
seja pasta de dentes com flúor”, afirma. especifica a odontopediatra.
A higiene oral dá trabalho. A preguiça de lavar
PARA A CAMA, Tirar dentes não é bom, sobretudo dentes per-
os dentes todos os dias, várias vezes ao dia, du- PARA QUE manentes, não restauráveis. As desvantagens fi-
rante toda a vida. O que está dentro da boca não A ÚLTIMA cam à vista. “A extração prematura de molares
ocupa espaço nas preocupações do dia a dia. Mas COISA NA decíduos pode resultar na perda de espaço para a
devia. E atenção, muita atenção. “A cárie dentá- BOCA SEJA erupção dos dentes permanentes”, diz João Es-
ria ainda é uma das doenças mais prevalentes em PASTA DE pírito Santo. E mais. “A perda precoce dos den-
crianças”, revela João Espírito Santo. A cárie, ao tes incisivos também pode afetar negativamen-
contrário do que se possa pensar, diagnostica-se
DENTES COM te a aparência da criança e diminuir a sua autoes-
muito antes do dente surgir com uma cavidade. FLÚOR” tima”, repara Mariana Seabra. Daí a importância
“Muitas vezes, é possível reverter lesões de cá- João Espírito Santo de consultas preventivas, em vez de curativas, e
rie de mancha branca através de medidas conser- Dentista, especialista o acompanhamento regular da higiene dos mais
vadoras”, avança o especialista em cirurgia oral. em cirurgia oral pequenos. Por isso, os cuidados desde cedo, mui-
Uma cárie é tramada. São as dores, é o mal-es- to cedo, para que os dentes durem uma vida. ● m

54 05.02.2023 Notícias Magazine


A vida como ela é
Por Margarida Rebelo Pinto

O mestre e o aprendiz
A arte também serve como “A Fuga de Wang-Fô” é um dos mais belos contos escritos por Marguerite Your-
cenar que recria uma lenda chinesa milenar. Wang-Fô era o mais famoso pin-
meio para projetarmos os tor do seu tempo, o Imperador cresceu fechado no seu palácio a admirar o tra-
nossos sonhos e ideais, balho do génio que decorava salas e corredores, retratando a China bela, limpa
sejam eles para o Universo, e pura, sem sombras nem maldade. Quando o Imperador se fez homem e co-
nheceu o país com todos os seus horrores, sentiu-se enganado pelo pintor, or-
ou para o nosso coração, o denou a sua prisão e condenou-o à morte. Wang-Fô, como todos os grandes mes-
que no fundo é quase a tres, tinha por companhia um jovem aprendiz chamado Lin, que o seguia por
mesma coisa. todo o lado. Perante a crueldade da sentença, pediu um último desejo: pintar
uma parede do palácio. O imperador acedeu em conceder-lhe a derradeira von-
tade e Wang-Fô começou por pintar o mar, com suaves ondas. O mar galgou as
paredes e foi inundando a sala. Então, o pintor desenhou uma pequena embar-
cação com dois remos e um rochedo. Quando a água já atingira uma altura con-
siderável, subiu para a embarcação com Lin, e remou em direção ao rochedo. Ao
passar por trás deste, a embarcação desapareceu.
Um artista nunca vê as coisas como elas realmente são. Se visse, deixaria de
ser artista. A bela China retratada no interior do palácio talvez fosse a China que
o pintor via, através dos seus olhos iluminados pela arte, ou a China como ele
gostaria que fosse. A arte também serve como meio para projetarmos os nossos
sonhos e ideais, sejam eles para o Universo, ou para o nosso coração, o que no
fundo é quase a mesma coisa. O Imperador não lhe perdoou a ilusão que tomou
como uma mentira, sem perceber que uma das funções da arte é exatamente a
de iludir a realidade, ainda que por vezes a retrate de forma crua. Como dizia a
minha querida Agustina, é preciso mascarar a realidade para a ir domesticando.
Quando o mestre e o aprendiz escapam à morte através de um artefacto fanta-
sioso, é fácil fecharmos os olhos e imaginarmos que foi assim que tudo aconte-
ceu. A narrativa é tão bela e libertadora que nos dá uma sensação de vitória pelo
sucesso da fuga.
Quantos de nós, em momentos crucialmente dolorosos da nossa existência,
não desejámos pintar uma fuga que nos liberte do caminho das pedras a que a
realidade nos obriga, a via cruccis da eterna repetição dos mesmos erros, o peso
de subir todos os dias a mesma montanha, qual Sísifo dos tempos modernos? A
fuga do pintor é um hino à liberdade e à capacidade de superação, por mais difí-
ceis que sejam as circunstâncias.
Às vezes gosto de imaginar o que aconteceu ao pintor e ao seu aprendiz depois
de terem escapado à sentença cruel do Imperador. A China sempre foi imensa,
um mundo dentro do Mundo, em parte fechada por uma muralha mais exten-
sa do que a fronteira de muitos reinos. Será que o Imperador, ultrajado com tal
proclamação de liberdade, ordenou a captura dos foragidos ou, vencido pelo en-
genho da arte, encolheu os ombros e secretamente se regozijou com tamanha
audácia?
Todos carregamos dentro de nós um Imperador, alguém que se agarra à rea-
lidade e à razão e que condena os sonhadores, ou um sonhador otimista e in-
curável, que nunca se cansa de desafiar todas as paredes e muros. Prefiro ser o
mestre, despojado e livre, que vence todos os muros com a suavidade da água,
a servir o monstro da racionalidade. Prefiro a ausência e o vazio à tristeza das
sombras.

Notícias Magazine 05.02.2023 55


esti-
los
RECEITAS DA ÉPOCA
POR Ana Bravo
Nutricionista, autora e blogger (Nutrição com Coração)

TODOS OS MESES, PÃO DE AIPO


AS MINHAS RECEITAS
TÊM UM ALIMENTO
EM DESTAQUE. O que hoje vos proponho pode preparar-se no forno,
EM FEVEREIRO É O AIPO no micro-ondas ou na frigideira. Nesta receita apenas
aproveitei as folhas, os talos ficaram para usar depois.

CARACTERÍSTICAS INGREDIENTES PREPARAÇÃO


NUTRICIONAIS
Uma unidade 2 colheres de sopa de folhas ❶ Numa taça misturei
100 g de aipo têm apenas
15 kcal. O seu principal de aipo picadas todos os ingredientes
constituinte é a água e as 1/2 chávena de farinha de arroz e deixei repousar cinco
fibras. Em termos de vitami- (ou outra, a gosto) minutos antes de cozi-
nas, a que tem em maior 20 minutos 1 colher de sopa de linhaça nhar numa frigideira
quantidade é a C, contendo
triturada antiaderente, previa-
também vitamina B6. No que
se refere a sais minerais, 1 colher de sopa de amido de milho mente aquecida, de
apresenta em maior quanti- 3/4 chávena de água ambos os lados. ❷ Ser-
dade potássio, seguindo-se Fácil 1 colher de sobremesa de vinagre vi com paté de beterra-
o sódio, o cálcio, o fósforo, q.b. noz-moscada ba (misturei beterraba
o magnésio, o ferro e o zinco.
1 colher de café de fermento em pó ralada, ervas secas a
q.b. paté de beterraba (para servir) gosto e ricota).

56 05.02.2023 Notícias Magazine


IDEIAS

FOTOS: DIREITOS RESERVADOS


Cristina Cardoso, gestora da marca
POR Zulay Costa portuguesa Liquid-Land, pretende
desenvolver outros produtos nesta área
da cosmética, além do óleo que já está
no mercado

“Os resultados mostram que, se utili-


zarmos este óleo de pinhão durante 28
dias consecutivos de forma bidiária, va-
mos ver o aumento dos níveis de hidra-
tação na pele e a atenuação das linhas das
rugas”, explica Cristina Cardoso, gesto-
ra da marca, sublinhando que a ideia é
aproveitar estas características em be-
nefício daquele que é o maior órgão do
corpo humano: a pele. A começar pela
do rosto, que é muito sensível.
A empresa compra pinhão mediterrâ-
nico (que tem qualidades superiores),
com certificação biológica, a produtores
nacionais. É prensado a frio para extrair
o óleo sem destruir as propriedades e de-
pois fica a repousar durante 30 dias, pra-
zo durante o qual as impurezas descem
e o óleo fica limpo.
Até agora, a indústria cosmética não
aproveitava as características “únicas”
desta semente, “conhecida como o ouro
branco ou o caviar da floresta”, o que faz
deste creme facial algo inovador, conta
Cristina Cardoso. A empresa, sediada em
Lisboa, pretende no futuro vir a desen-
volver outros produtos nesta área da cos-
mética.
Há cuidado em “respeitar o que a Na-
A SUSTENTÁVEL tureza nos dá”, assegura a gestora. As
propriedades do produto são integral-
BELEZA DO PINHÃO mente resultado da essência do pinhão
mediterrânico, não existindo qualquer
Óleo facial Liquid-Land é feito de forma natural processamento, aditivos, preservantes
e sem desperdício a partir da semente do pinheiro. ou aroma artificial. É um “produto
Chegou a era do “ouro branco” e do “caviar da floresta”. 100% vindo da Natureza” que “respei-
ta o ciclo de crescimento e desenvolvi-
mento do pinheiro e do pinhão”, refe-
As mãos “luminosas e hidratadas” das re a marca.
pessoas que extraem o óleo de pinhão O teor de óleo representa cerca de 50%
para fins alimentares foi o primeiro si- da semente e, para não haver desperdí-
nal. Seguiu-se um “estudo científico” cio, a massa restante é enviada para ou-
que tornou evidente que este produto tros países, onde é aproveitada para fazer
funcionava como “ouro nas farinha para a indústria panificadora.
mãos”. E assim nasceu a Li- O produto, à venda em liquid-
quid-Land, uma marca por- -land.com por 87 euros a embalagem de
tuguesa, 100% natural, que 30 ml, vai ao encontro das tendências
acaba de lançar no de mercado. A cosmética vegana ou or-
mercado um óleo gânica tem vindo a crescer, com os con-
facial de pinhão, sumidores a manifestarem cada vez
que respeita os maior preocupação com a origem das
valores e a essên- matérias e impacto dos produtos no am-
cia da Natureza. biente. ●m

Notícias Magazine 05.02.2023 57


esti-
los
PRODUÇÃO
POR Rute Cruz FOTOGRAFIAS Global Imagens

PELE A SALVO DO FRIO


As mãos, tal como os lábios, o rosto e algumas partes do corpo,
como o pescoço, são zonas muito expostas ao frio e ao vento, o
que as torna vulneráveis. Por isso, exigem cuidados especiais para
enfrentar o inverno rigoroso que se tem feito sentir, sem perder o
conforto. Confira as nossas sugestões para hidratar a pele.

10

O
ROST

9
7

6 4

58 05.02.2023 Notícias Magazine


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14. S V R , Baume Levres 15
gel-sérum, 49,99 euros
4. F I L O R G A , Hydra-Hyal, Cicavit +, bálsamo protetor
creme de hidratação de lábios, 8,10 euros
e de volume, 54,90 euros 15. N U X E , Rêve de Miel,
5. M E S O E S T E T I C , Hydra-vital Baume Lèvres au Miel,
Light, gel-creme, bálsamo de lábios com 14
48,70 euros mel e manteiga de karité,
6. I N N I S F R E E , Intensive 12,95 euros
Hydrating Serum, sérum 16. T H E B O D Y S H O P , Shea
com chá verde, 28,90 euros Body Butter Vegan, creme
(na Sephora) de corpo, 17,50 euros
17. I S D I N , Ureadin, gel de 12
7 D V I N E , Invincible Tawny
Night, creme de noite banho, 13,34 euros (400 ml)
enriquecido com puro 18. K I E H L’ S , Nourishing Dry
ouro, 96,01 euros Body Oil, óleo de corpo,
8. M A R T I D E R M , Hidro Mask, 34 euros
máscara de limpeza, 19. O L E O B A N , Skin First, 13
19,98 euros creme de corpo, 11,99 euros
9. C A U D A L I E , Premier Cru, 20. B E N A M Ô R , Creme de
creme rico, 93,90 euros Banho Gordíssimo, com
10. C L A R I N S , UV Plus Ecran manteiga de karité, 15 euros
Multi-protection Hydratant (na Perfumes & Companhia)

HIDRATAÇÃO
CORP
16

O UMA MISSÃO DIÁRIA


Nesta altura do ano as Em relação ao corpo, a
20
temperaturas são mais pele pode ficar tão seca
baixas e a ingestão de que chega a doer. É de
água é menor, logo a pele evitar banhos com a água
fica mais sensível, seca, muito quente. Uma dica,
áspera, gretada e até fazer uma sobreposição
mesmo desconfortável ao de produtos; lavar o corpo
toque. A pele do rosto tem com um creme de duche,
tendência para descamar depois, e ainda com a
e a ressentir-se com a pele húmida, aplicar um
sensação de repuxar. Os óleo, e de seguida um
lábios, tendo uma pele creme hidratante. Antes
mais fina, ficam secos e de dormir, reforçar os
gretados. No caso das lábios e as mãos com um
17
mãos, os vasos sanguí- boost de hidratação.
neos contraem-se e a Mesmo nesta altura, é
19 circulação também, essencial também aplicar
promovendo frieiras. Para durante o dia um protetor
mimar estas zonas mais solar, sem dúvida um dos
expostas foram criadas principais aliados para
fórmulas nutritivas e manter a pele protegida
suavizantes, protegendo- do frio. Não esquecer de
-as das agressões exter- beber muita água, tudo
nas, facilitando a circula- começa por dentro. Um
18
ção da água entre as célu- autêntico reforço de
las e restaurando a hidratação cutânea para
barreira da pele. cumprir à risca.

Notícias Magazine 05.02.2023 59


esti-
los
TENDÊNCIAS UM CLÁSSICO
POR Sara Sofia Gonçalves
ETERNIZADO
Flores conservadas, secas, de
papel, em madeira, são algumas
das soluções aos efémeros
ramos, reinventando uma
prenda que nunca passa de
moda no Dia dos Namorados.

O Dia de São Valentim aproxima-se e, quer


seja uma prenda de última hora ou o cum-
STUDIO ABOUT primento de uma tradição, as flores são,
Flores de papel para tantos e tantas, a prenda que surge em
93,83 euros primeiro lugar no pensamento. Mas há
também o drama do tempo. Oferece-se
uma rosa, uma túlipa ou uma orquídea em
perfeito estado, frescas e coloridas, mas ra-
pidamente essa beleza desvanece. Em meia
dúzia de dias perdem cor, murcham e caem
as pétalas. Mas há uma solução para quem
não quer fugir da típica oferta: as opções
eternas.
Como qualquer reinvenção de um clássi-
co, é cada vez mais comum (e uma verda-
deira tendência) encontrar opções de flores
conservadas. São normalmente rosas, que
até podem ser pintadas de cores variadas,
por vezes dentro de campânulas ou caixas
de vidro que, através de um tratamento pró-
prio, estão protegidas do tempo e durarão
SKLUM para sempre.
Flores secas Na moda têm estado também as flores se-
22,95 euros
cas – conhecidas como flores desidratadas.
Estas têm um processo semelhante ao das
flores conservadas, mas estão normalmen-
te associadas a plantas como a lavanda ou as
espigas e até os próprios ramos ou folhas.
Normalmente apresentadas com tons neu-
tr
tros, são a prenda ideal para associar à bele-
FLORES NO CAIS za e serenidade do amor – contrastando, de
Rosa preservada ce
certa forma, com a clássica rosa vermelha
49 euros
YOUR SURPRISE as
associada à paixão intensa.
Flores secas em placa P quem prefere optar por algo verda-
Para
26,95 euros de
deiramente resistente ao tempo (as flores
se
secas ou conservadas têm uma duração de
ce
cerca de dois a cinco anos), há cada vez mais
ar
artistas a venderem ramos feitos em papel
ou madeira. Algumas opções são prepara-
da
das com tal pormenor que nem vai notar a
di
diferença para uma flor desidratada.
T
Todas as soluções referidas, além de serem
pr
prendas clássicas, podem funcionar poste-
rio
riormente como peças decorativas para a
ca
casa. E não esquecer: nenhuma destas flo-
re
res pode ser colocada na água ou em locais
de sol direto e calor, correndo o risco de ar-
ruinar a prenda. ●
ru m

60 05.02.2023 Notícias Magazine


CONSUMO
POR Sara Oliveira

dões e de restaurantes lo-


tados. No dia seguinte,
no Paço da Giela, em Ar-
cos de Valdevez, a partir
das 10.30 horas, é possí-
vel aprender a bordar os
famosos lenços dos na-
morados. Sob orientação
de Edite Teixeira, os partici-
pantes conceberão o desenho
ou quadra e treinarão os diferen-
tes pontos tradicionais portugueses
numa iniciativa gratuita, mas de-
pendendo de inscrição prévia
(tel. 258 520 529). O tempo é
curto para grandes textos,
mas dá sempre para escrever,
com agulha e linha, uma fra-
se para se declarar.
Ainda no Minho, mas em
Vila Verde, “Fevereiro –
Mês do Romance” reúne
atividades até dia 28, num
“casamento perfeito entre
tradição e modernidade”.
Além dos bordados e da tradi-
cional gala, no dia 11, das 15 às
17 horas, o chocolate dá mote a
mais uma oficina sob o signo do
Cupido, na Chocolataria Artesanal
Chocolate com Pimenta (tel. 253 312
017). O chocolate molda-se com amor,
três dias depois do lançamento do novo
sabor de bombom que celebra o São Va-
lentim, à base de maracujá e caramelo.
APRENDER Na véspera do Dia dos Namorados, na

AO RITMO DO AMOR A.M.D.C. Charneca, na Venda do Pinhei-


ro, em Mafra, por oito euros, o workshop
“Lady Style Kizomba” promete desper-
A dois ou a solo, não faltam workshops para apurar tar a sensualidade feminina. Realiza-se
talentos e sentidos. Um pouco por todo o país, há às 20 horas, com inscrição antecipada
sugestões de forma a que não falte nada na hora H. (tel. 961 902 162), a tempo de dançar
para a cara-metade.
Numa data à escolha, que pode até ser
Em contagem decrescente para mais um monta o cenário perfeito, a 11 de feve- 14 de fevereiro, o workshop de “Foto-
Dia de São Valentim, são muitos os cur- reiro, das 10 às 14 horas, na Quinta da grafia à Escolha no Exterior”, em Avei-
sos de curta duração e intensivos que Boeira, em Vila Nova de Gaia. Por 155 eu- ro ou Coimbra, disponível no site Odis-
marcam a agenda à mercê dos mais apai- ros, os participantes vão aprender a criar seias, promete unir os casais ao longo de
xonados. Experiências para saber como tábuas de queijos e enchidos – que se- quatro horas de descoberta e aprendiza-
surpreender o parceiro, ou até mesmo guem, no final, para casa de cada um – gem de técnicas e truques com a máqui-
partilhar a dois, reforçando a cumplici- com toque de chef e a decorar a mesa na fotografia em punho. Uma ideia para
dade. como um profissional. Inclui uma har- presentear o outro e alimentar uma pai-
Diz o ditado que “o homem conquis- monização de vinhos como exemplo xão comum. Custa 50 euros por pessoa,
ta-se pelo estômago (e a mulher tam- para impressionar posteriormente os com direito a retratos no momento e do-
bém)”, por isso a cerimonialista Carla respetivos companheiros, num serão tes para melhores registos a dois no fu-
Magalhães (www.carlamagalhaes.pt) preparado com detalhe, longe de multi- turo. ●m

Notícias Magazine 05.02.2023 61


esti-
los
MODA
POR Sara Oliveira

TEZENIS
Conjunto
corpete e
cuecas

SENSUAIS E 26,98 euros

ELEGANTES
A lingerie pode ter o poder
de apimentar uma relação,
até por tornar os pares atraentes
aos olhos um do outro. Sugestões
em vermelho não faltam para
o Dia dos Namorados, mas
há outras cores a explorar.

Este ano, o Dia dos Namorados calha a meio da


semana, mas não pode faltar tempo para um
serão romântico, com uma dose extra de sen-
sualidade. Até quando impera a timidez, a es-
colha acertada da lingerie pode “apimentar
uma relação, se bem que não seja tudo”, afir-
ma a terapeuta sexual Susana Dias Ramos.
Numa data especial como é o São Valentim,
para a maioria dos casais, a especialista reco- INTIMISSIMI
nhece a importância de se apostar “em algo Conjunto soutien
especial, mas sem ser vulgar”. “Afinal, não e cuecas
51,80 euros
é o Carnaval”, avisa, pondo de lado atrevi-
mento em demasia. Já “uma peça de linge-
rie elegante traz uma vontade extra de ex-
plorar a intimidade”, defende. Susana su-
blinha que “aos olhos do outro fica-se mais
atraente” e que se devia de apostar nestas
surpresas noutras ocasiões e não só no Dia
dos Namorados. Até porque “o sucesso ain-
da é maior quando o outro não está a contar”. V I C T O R I A’ S S E C R E T
Satin
atin & lace romper
Como fonte de inspiração, a NM reuniu al- 79,85
, euros
gumas sugestões para ela e para ele, para sur-
preender os companheiros, quer comprando
para oferecer, quer para usar. Associado à pai-
xão, o vermelho continua a pintar muitas das
propostas, se bem que o rosa cumpra a mesma CALZEDONIA
função, mas o preto é sempre uma aposta ga- Collants de rede
rantida. Para as senhoras, há conjuntos de sou- efeito de ligas
15,95 euros
tien e cuecas, bodies, corpetes, camisas ou ma-
cacões em cetim. Seda, cetim e rendas, assim
como collants de rede ou de liga, são detalhes
que sobressaem no enredo romântico da
vida real.
Para eles, não faltam slips e boxers que se
moldam ao corpo e aos gostos. Tanto de um
como de outro. ● m

62 05.02.2023 Notícias Magazine


CONSULTÓRIO
SUSTENTABILIDADE
Joana Guerra
POR
Tadeu *
DOLCE & GABBANA
Boxers
e venda Recipientes de takeaway:
295 euros
recicláveis ou não?

Embalagens de comida takeaway com gordura:


plástico, alumínio, papel... recicláveis ou não?
Leonor Guerreiro, pergunta recebida por email

Depois de “como acabamos com o sistema que destrói o


Planeta e torna as pessoas miseráveis?” não há pergunta
que surja mais vezes na minha caixa de mensagens. Insó-
C A LV I N K L E I N lito: as respostas a ambas são quase igualmente complexas.
Pack cuecas Quanto aos recipientes de takeaway, vejamos:
47,90 euros • Os de papel, molhados ou com gordura (incluindo as
caixas de piza), não são recicláveis e podem contaminar o
papel e o cartão limpos que já estejam no ecoponto azul.
Devem ir para o lixo indiferenciado.
• Os de plástico e esferovite, incluindo caixas, potes de

A NM TEM UM ESPAÇO PARA QUESTÕES DOS LEITORES NAS ÁREAS DE DIREITO, JARDINAGEM, SAÚDE, FINANÇAS PESSOAIS E SUSTENTABILIDADE.
sopa, tigelas e respetivas tampas, bem como cuvetes de
alumínio, devem ser escorridos e colocados no ecoponto
amarelo, mesmo que estejam sujos de gordura. Atenção:
escorrer não é lavar! Não desperdicemos água em embala-
gens que vão ser lavadas em processos industrializados.
• Talheres descartáveis, palhinhas e guardanapos, inde-
pendentemente do material de que são feitos, não são

AS PERGUNTAS PARA O CONSULTÓRIO DEVEM SER ENVIADAS PARA O EMAIL MAGAZINE@NOTICIASMAGAZINE.PT.


recicláveis. Depois de reutilizados tantas vezes quanto
possível, devem ser colocados no lixo indiferenciado.
• Os sacos de transporte podem ser reciclados, indo os de
plástico para o ecoponto amarelo e os de papel – desde que
estejam limpos e secos – para o azul. Antes de os deitar
fora, devemos reutilizá-los até que já não sirvam o seu
propósito.
INTIMISSIMI • Tendo em conta os sistemas de recolha e tratamento de
Boxers
119,90 euros resíduos atualmente disponíveis em Portugal, embala-
gens bioplásticas, compostáveis e biodegradáveis, salvo
raríssimas exceções, devem ser colocadas no lixo indife-
renciado e acabarão em aterros ou incineradoras.
Só na União Europeia, são usadas 2025 milhões destas
embalagens por ano e reciclá-las pode ajudar a reduzir emis-
sões equivalentes às geradas por 55 mil automóveis anual-
mente (Universidade de Manchester, 2018). Mas, tendo
em conta que a reciclagem é cara, utiliza grandes quantida-
VERSACE des de água e energia e vai reduzindo a qualidade dos mate-
Cuecas
110 euros riais até que se tornem inúteis, a chave está na redução da
utilização de produtos descartáveis a favor dos reutilizá-
veis, através de mudanças sistémicas no nosso estilo de vida
que nos permitam abdicar do conforto do takeway mais
vezes – trabalhar menos horas, por exemplo.

*Ativista pela justiça climática e autora de “Ambientalista Imperfeita”

Notícias Magazine 05.02.2023 63


esti-
los
GARRAFEIRA
POR Jorge Pedroso Faria

O AMOR
ESTÁ NO BAR
O Dia dos Namorados aproxima-se. Aqui ficam cinco boas razões
para o comemorar. Dois espumantes, um tinto com banda sonora,
um moscatel do Douro e um licor de maracujá. Bar aberto de
ç
emoções p
a São Valentim. Boas provas.

E
EXCELÊNCIA
E
EXCELÊNCIA
E
EXCELÊNCIA

AS AMOSTRAS PODEM SER ENDEREÇADAS PARA NOTÍCIAS MAGAZINE – GARRAFEIRA – EDIFÍCIO JORNAL DE NOTÍCIAS - RUA GONÇALO CRISTÓVÃO, 195 – 4049-011 PORTO
OS VINHOS APRESENTADOS FORAM ENVIADOS PELOS PRODUTORES E SELECIONADOS APÓS PROVAS REALIZADAS, SEGUINDO CRITÉRIOS EDITORIAIS.
Espumante Special Passoã Entre Tintas 2020 Es
Espumante Rosé Seco Moscatel Adega
Cuvée Extra Bruto 2016 França Douro Via Latina
Vi de Favaios Edição
Bairrada Passoã Martha’s Wines & Spirits Vinhos Verdes
Vi Comemorativa 70 anos
Global Wines Licor de maracujá Tinta Amarela, Tinta Vercoope Douro
Arinto 19,99 euros (1 litro) Carvalha e Tinta Roriz Espadeiro Adega de Favaios
30 euros 39,99 euros 5,99 euros Moscatel Galego
150 euros (50 cl)

Este 100% Arinto Criado há quase qua- Um tinto com banda Um espumante de Mas que bem está a
possui as qualidades tro décadas, este li- sonora. A garrafa Vinho Verde que é comemorar a Adega
indispensáveis a um cor de maracujá, com exibe um QR code amor à primeira vis- de Favaios os 70 anos
espumante de elei- ADN brasileiro e pro- que dá acesso a uma ta para os amantes de vida. Um blend
ção. Ou não fosse as- dução francesa, con- playlist de músicas da casta Espadeiro. dos anos 1964, 1975,
sinado por Osvaldo tinua a somar fãs. selecionadas por lo- A cor rosa salmão, a 1980, 1999, 2007,
Amado, um dos reis Doce e frutado, per- cutores de rádio. bolha fina, os aromas 2011 e 2020 que é
da enologia nesse re- mite diversas opções Tinta Amarela a nor- cítricos e os aponta- uma homenagem às
gisto. Método clássi- – de misturas mais te ou Trincadeira a mentos de morango sete décadas de his-
co, cinco anos de es- simples a trabalha- sul, para além de ou- e framboesa enamo- tória tão ligadas ao
tágio, bolha fina e dos cocktails –, pro- tras designações ram. O perfil – jo- moscatel e o prenún-
persistente, cor citri- porcionando uma noutras zonas, este vem, fresco, irreve- cio de um futuro ins-
na marcante, aroma inspiradora dose de vinho tem nessa rente – abre portas pirador. A riqueza
complexo com apon- exotismo e uma sur- casta, presente em às mais variadas oca- aromática, onde se
tamentos de tosta, preendente paleta de 80%, a impressão di- siões e pretextos. destacam os aponta-
irreverente, frutado, sabores. Como o po- gital: apontamentos A competente enolo- mentos florais e as
saboroso, estaladiço. pular Porn Star Mar- florais e vegetais, gia de João Gaspar especiarias, e o sa-
Amigo de todas as tini, cuja “fórmula fruta preta, sedutora adota com mestria bor, equilibrado e
ocasiões. Um fiel mágica” poderá en- acidez. Ganha pelo o método charmat. elegante, anunciam
embaixador da Bair- contrar no contrarró- ouvido. E pelo cor- Boa relação qualida- um final longo. Um
rada. Excelente. tulo da garrafa. po, melodioso. de-preço. tesouro fascinante.

64 05.02.2023 Notícias Magazine


HORÓSCOPO
Isabel Guimarães
POR
Astróloga — ISAR/CAP
ANIVERSÁRIO
6 a 12 fevereiro

Carneiro Balança
21.03 a 20.04 23.09 a 23.10
Tendência para se libertar de preconceitos As relações no trabalho podem ser benefi-
e situações que não funcionam. Forte ciadas pela capacidade sinérgica que sente
consciência de tudo o que está a solidifi- na interação com os outros. As ideias
car. As ações podem não ser rápidas. Surge fluem e procura apoio nas suas iniciativas. Dom Sherwood
a oportunidade de sarar feridas antigas. Os investimentos geram desilusão. Ator, 32 anos

Dominic ‘Dom’ Anthony


Touro Escorpião Sherwood, é um ator e
21.04 a 21.05 24.10 a 22.11 modelo inglês, nasceu a
Tendência para querer tudo à sua manei- Tendência para vivenciar pressão e difi- 6 de fevereiro de 1990,
ra, gerando conflito e discórdia. As ideias e culdade de foco, principalmente no tra- no Reino Unido. De si-
os diálogos podem não ser bem recebidos, balho. A procura por novos interesses e gno solar Aquário, a sua
talvez os outros pensem que está a trans- por experienciar oportunidades podem personalidade direcio-
mitir algo inconsistente. Reestruture. trazer alguma precipitação. na-o para um forte sen-
tido de vida, interagindo
com o grupo de forma a
Gémeos Sagitário ser apoiado e reconhe-
22.05 a 20.06 23.11 a 21.12 cido. A dificuldade em
Aproveite agora para estruturar as suas obri- Os investimentos precisam de concentra- aceitar que pode ter
gações e compromissos no trabalho, já que ção e reorganização. Aproveite e aprimore que alterar o seu rumo
sente maior foco e determinação. Pode ter o diálogo para favorecer as negociações. indica alteração de hu-
que lidar com alguma ansiedade e até com Novos interesses podem trazer o entusias- mor criando irritabilida-
assuntos mais sigilosos. Use a prudência. mo que precisa. Invista em conhecimento. de. Pode usar a sua au-
toconfiança para se li-
bertar das diferenças
Caranguejo Capricórnio de opinião.
21.06 a 22.07 22.12 a 20.01
Pode ter que refletir na forma como está A vontade de inovar e permitir-se sair
a levar o seu trabalho aos outros. Apesar da zona de conforto podem levá-lo a ser
da forte determinação e coragem, dire- surpreendido com propostas de trabalho,
cione-se para novos métodos e rumos. ou até a criar o seu próprio trabalho. De- P L A N E TA S
Evite a rigidez e crie empatia. safie as suas estruturas.
A semana começa com a
Lua em Leão, ainda com in-
Leão Aquário fluência da Lua Cheia, ati-
23.07 a 23.08 21.01 a 18.02 vando Saturno e Úrano, o
Procure ter cautela nas negociações. Ape- A cooperação com os outros é fundamen- que traz uma forte pressão
sar de ter maior capacidade de interagir tal para que possa expandir os seus obje- nas nossas escolhas. Os in-
com colegas de trabalho e até chefias, tivos. As questões financeiras, como os vestimentos requerem cau-
pode sentir-se pressionado com o cum- investimentos, precisam de cautela e a tela, e, com o ingresso de
primento de prazos. Evite o confronto. impaciência aumenta. Use estratégias. Mercúrio no signo de Aquá-
rio, a inquietação aumenta.
O planeta das negociações
Virgem Peixes é ativado pela conjunção de
24.08 a 22.09 19.02 a 20.03 Plutão, trazendo intensida-
A busca por uma relação espiritual pode Os recursos podem ser analisados nesta de na altura de decidir, e
estar presente e sentir-se mais carinhoso altura. No entanto, pode dispersar a real abuso de poder desmedido.
e afetivo. Procure um sentido profundo e intenção. Evite deixar-se influenciar e As hierarquias podem ser
evite a teimosia, ou querer tudo à sua ma- aguarde para determinar a sua escolha. abaladas devido ao descon-
neira. Inove nos métodos de trabalho. A precipitação deve ser evitada. tentamento coletivo.

Notícias Magazine 05.02.2023 65


Pai aos 50
Por Joel Neto

Os meus
camaradas pais
Conheço casos, e não Não, não, não: eu não estou disponível para me reduzir ao estranho que volta
necessariamente de más do trabalho às seis da tarde, brinca um pouco com ele no parquinho, trata do ba-
nho e depois passa o resto da semana a gabar-se, naquele misto de vaidade e sen-
pessoas: mães a quem a timento de culpa que tem sido a fragilidade de tantos de nós: “Eu é que lhe dou
escassez dos pais tornou banho”. Quero – e felizmente posso – ser mais do que isso.
proprietárias dos filhos. Não que o estranho seja antipático, note-se. Tem uma barbinha cómica e pa-
rece saber a letra de algumas canções bem parvas. Mas às vezes também pica
um bocado, aquele barbão todo. E, seja como for, a mamã é a mamã.
E vai continuar a sê-lo, claro. Não tenho ilusões: no dia em que pela primeira
vez partir a testa contra a esquina do aparador, o meu filho não vai correr para
mim, mas para a Marta. A Marta tem argumentos poderosos: dá-lhe de mamar,
pode dormir ao lado dele que a biologia não lhe permite esmagá-lo, tem aquele
colo adorável que até ao pai sabe bem e, ademais, pôde parar o trabalho nestes
primeiros meses – é-me impossível equivaler-me a ela.
Mas ainda há pouco, enquanto eu lhe trocava a fralda, o Artur chorava abun-
dantemente, atormentado com os gases intestinais, e chegou a hora em que
não me restava senão entregá-lo à mãe, porque entretanto tinha um zoom. Pen-
sei: se pára agora, parte-me o coração. Mas continuou a chorar com o mesmo en-
tusiasmo, para meu grande alívio. O que prova duas coisas: há pelo menos uma
situação em que o colo do pai não é tão evidentemente menos reconfortante
do que o da mãe; e bastam dois meses de paternidade para qualquer um come-
çar a eengolir as acusações de egoísmo que fez aos seus pais.
Nat
Naturalmente, tudo isto tem custos. Há anos que luto com as dores de cabe-
ça, as pulsáteis e as outras todas – desde que começou isto dos gases, é pior. O tra-
balho também vai mal, muito obrigado: há programas que me custam a fazer,
esta pprópria coluna tem semanas difíceis, os livros planeados estão todos atra-
sados e até o jardim, onde todas as semanas eu passava duas tardes a comple-
ment
mentar o trabalho do Chico, se desorganizou.
Mas também não há dia de stresse ou de sentimento de culpa (sempre o sen-
timento de culpa) em que olhar para aqueles sorrisos que ele me faz enquanto
time
o visto
vist de manhã – mesmo as lágrimas e os soluços com que exige o biberão an-
tes da fralda de madrugada – não valha a pena. E assim a Marta também não cede
tentação de se tornar proprietária dele.
à ten
Nun
Nunca a teria, acho: tudo na sua conduta diária é para me envolver – olha o
papá, que bonito é o papá, que bonito é o bebé ao colo do papá, vamos tirar uma
fotografia ao bebé com o papá. Mas eu podia empurrá-la para uma situação em
fotog
que n não tivesse outra alternativa. Conheço casos, e não necessariamente de
más p pessoas: mães a quem a escassez dos pais tornou proprietárias dos filhos –
enfim, se adaptaram a isso, como num sacrifício não totalmente desprovido
e, enf
de va
vantagens.
E, n
no entanto, continuo a ouvir de outros pais que nem uma fralda mudaram,
mudam e/ou mudarão. Não percebem, com certeza, que foram, são e/ou serão
muda
eles a perder – desde o primeiro dia e para sempre. E, se fosse preciso um homem
chega
chegar aos 50 anos para o perceber, então talvez nenhum devesse ser pai aos 30.

O AUTOR
AUTO ESCREVE DE ACORDO COM A ANTERIOR ORTOGRAFIA.

66 05.02.2023 Notícias Magazine

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